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Mudanças, políticas de segurança pública e conflitos em três

comunidades pacificadas do Rio de Janeiro1.

Rodrigo Monteiro.

NUPEVI/IESP/UERJ.

Introdução

Desde a primeira favela no Rio de Janeiro, em 1897 até hoje, as relações entre a cidade
formal e as áreas favelizadas foram marcadas por tensões e exibem, com extremo vigor, a
desigualdade social, uma das mais perversas marcas de nosso Estado-Nação.

O Brasil, que construiu a universalidade plena da cidadania somente ao longo do


século XX, teve muitos de seus direitos universalizados na Constituição de 1988, ou seja, não
somos exemplos do modelo evolutivo de direitos proposto por Marshall.

Para alguns autores, o Brasil construiu um modelo de cidadania que era regulada
(SANTOS, 1979), ou seja, concedida pelo Estado a determinados grupos e segmentos sociais
de acordo com alianças e estratégias políticas, especialmente nos anos 1930.

No Brasil, o combate à pobreza e à desigualdade entrou na agenda de governos


nacionais desde os anos 1990, embora tal enfrentamento já tivesse sido consagrado na
Constituição Federal de 1988. De fato, é a partir dos anos 1990 que começam a ser
consolidadas políticas públicas mais permanentes e de caráter universal, como a cobertura de
saúde pública. Na mesma Constituição, definiu-se o esporte como direito social e criou-se a
imperiosa necessidade de associá-lo às políticas públicas (Monteiro, 2009) e atribuiu-se a ele
papel de inclusão social, e ainda associado à política de saúde e de educação, muito embora
não exista, de forma efetiva, uma política pública nacional de massificação do esporte em
marcha no país, apesar de sediar os maiores eventos esportivos globais.

Houve avanços substanciais nos últimos trinta anos, como a estabilidade monetária,
seguidas e seguras transições políticas, redução da pobreza e da miséria, estabilidade
democrática com garantias das liberdades.

Nesse período, a sociedade brasileira ganhou complexidade, tornou-se mais plural,


sem deixar de expor suas práticas preconceituosas e de intolerância, sobretudo no campo
1 Pesquisa realizada com apoio da FAPERJ.
1
religioso. Mas ao mesmo tempo, a sociedade brasileira se tornou menos desigual (ainda que
muito) e tratou alguns de seus problemas, como a universalização do acesso ao ensino
fundamental, sem, no entanto, dar conta da melhoria da qualidade do ensino público
fundamental.

Outra desigualdade produzida no Brasil diz respeito ao acesso à justiça, ou seja, a


forma como ricos e pobres acessam o sistema judiciário não é igual, fato que ofende até
mesmo noções de Direitos Humanos (Pinheiro, 2008). A sensação de injustiça e impunidade
pode ter feito com que ao longo do século XX as classes populares se identificassem
sobremaneira com o futebol, pois esse apresentaria sensação de justiça não encontrada na
justiça formal (DaMatta, 1985). Pior que isso, revela Misse (2011), no Rio de Janeiro, o índice
de esclarecimento de homicídios pela polícia civil é de 15%, o que não quer dizer,
necessariamente, condenação judicial.

Na cidade do Rio de Janeiro, as favelas se tornaram palco de violência a partir do final


dos anos 1970 e suas causas já foram exaustivamente analisadas por cientistas sociais
preocupados com essa questão. Clientelismo, pobreza, patrimonialismo, crescimento
desordenado, baixo engajamento cívico, políticas públicas descontinuadas,
hipermasculinidade são palavras chaves facilmente encontradas em artigos, teses, dissertações
dos que se dedicaram ao tema.

Os anos 1980 e 1990 levaram a um poderoso incremento do poder de traficantes de


drogas responsabilizado por desarticular associações populares (Zaluar, 1985), como
associações de moradores e até mesmo escolas de samba, pequenos clubes de futebol locais,
entre outros. Por outro lado, como local de imagens ambíguas, as favelas (resultados não
apenas da desigualdade, mas também de crescimento desordenado das grandes cidades
brasileiras) não deixaram de produzir uma infinidade de imagens e discursos: local de
trabalhadores ou vagabundos, local de gente ordeira ou desordeira, beleza ou horror, vida ou
morte, saúde ou doença. Dentro desses dualismos, vale tentar não reproduzir no século XXI
um aspecto da antropologia em suas mais remotas eras (Las Casas e Sepulvera): a do bom ou
do mal ‘selvagem’ e a do bom e do mal ‘civilizado’. Tal discurso que projeta a imagem dos
moradores de favelas ou como extremamente inocentes ou como bárbaros confessos ajuda,
ainda hoje, especialistas e estudiosos a cair em armadilhas capazes de cegá-los.

Entretanto, a forma com que a política de segurança pública tentou tratar do problema
da violência nas favelas era basicamente de fazer intervenções pontuais que ocupavam as

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favelas por um ou dois dias quando havia confronto e depois deixavam a segurança das
favelas às suas próprias sortes, aos traficantes ou milicianos e aos policiais corruptos.
Experiências pontuais como o Grupamento de Policiamento em Áreas Especiais (GEPAE)
existiram mas não tiveram a dimensão e o investimento feito nas UPPs.

As UPPs representam uma política de segurança pública inédita no Rio de Janeiro,


devido à sua amplitude, às articulações envolvendo os três níveis de governo (federal,
estadual e municipal), à articulação com o setor privado, por promover uma ocupação
permanente nas favelas com policiais que são, em sua maioria, recém-formados e pelo
impacto que estas tiveram na vida da cidade.

Implantadas na cidade do Rio de Janeiro desde 2008, inicialmente na favela Santa


Marta, atualmente, as UPPs estão em 32 unidades2, envolvendo 8360 policiais, e atingem um
total de 1,5 milhão de pessoas3. Antes da instalação de uma UPP, a favela a ser ocupada
recebe tropas do Batalhao de Operações Especiais (BOPE) que tenta fazer a saída de
traficantes armados do local, posteriormente se dá a presença do Batalhão de Choque e só
então se inicia o processo de instalação das UPPs, que terá comandante e tropa própria, mas
subordinada burocraticamente ao batalhão local, mas suas atribuições e responsabilidades
serão tratadas com o Comando de Polícia Pacificadora.

O processo de implantação de uma UPP também encerra o domínio armado de


traficantes ou milicianos, e promove a entrada de diversos serviços oferecidos por órgãos
públicos (serviços de saúde, coleta de lixo, iluminação pública, construção de creches, etc) e
outros serviços que podem ser oferecidos por órgãos públicos ou por parcerias com a
iniciativa privada, como oferta de cursos profissionalizantes, projetos sócio-esportivos, entre
outros.

Em alguns casos, por conta de obras estruturais ou por riscos de desabamento, há a


necessidade de remoções de moradias, levando movimentos sociais a acusarem o governo
estadual e municipal de promoverem a especulação imobiliária. É possível notar também uma
valorização imobiliária de áreas agora pacificadas que prejudica alguns moradores e beneficia
aqueles que promovem especulação imobiliária dentro de suas próprias comunidades, além
2 Fonte: http://www.upprj.com/. Acessado em 20/05/2013.

3 Esse número corresponderia a quase 1/3 do total de moradores residentes em favelas na cidade do Rio de
Janeiro, estimado pelo IBGE (http://www.vivafavela.com.br/materias/censo-2010-rio-tem-17-milh%C3%A3o-
de-moradores-de-favelas) em 1,7 milhão de moradores de favelas para toda a região metropolitana do Rio de
Janeiro, o que inclui, evidentemente, outras cidades.

3
das próprias Associações de Moradores que, em geral, recebem um percentual ou uma taxa
diante de cada negociação.

Observando o mapa das UPPs, nota-se que elas estão concentradas em quase todas as
favelas do Centro da cidade e da Zona Sul, em parte de favelas da Zona Norte e em apenas
duas favelas da Zona Oeste.

De todas as atuais 32 UPPs, apenas uma era anteriormente dominada pelos chamados
milicianos, outro modelo de crime organizado que são grupos paramilitares formados em sua
maioria por militares, bombeiros e policiais civis, geralmente aposentados, grupos que
proíbem venda de drogas, mas exploram as comunidades comercialmente, também exercendo
domínio armado e severas repressões.

Nesse artigo tentamos exercer uma característica da antropologia desde suas primeiras
horas: estudar de forma empírica as diferenças entre grupamentos humanos, aqui
representados por três comunidades pacificadas: Batan (40.000 habitantes), Coroa-Fallet-
Fogueteiro (20.000 habitantes) e Complexo do Alemão (60.000) habitantes.

O Caso Alemão

Dominado por comandos de traficantes armados desde os anos 1980, o Complexo do


Alemão foi ocupado por forças do Exército em novembro de 2010, após uma sequência de
distúrbios (atribuídos a traficantes) causados na cidade como ônibus e veículos incendiados.
Em meados de 2012 as forças do Exército dão lugar às quatro 4 UPPs, responsáveis por 14
comunidades. Desde então, o Complexo do Alemão tem passado por um período de relativa
tranquilidade, alternada por eventuais conflitos armados ou ameaças desses. Embora esses
conflitos entre Policiais Militares e traficantes sejam atualmente muito diferentes dos que
ocorriam antes da ocupação, eles não deixam de existir.

Publicados no portal Rio Como Vamos5, dados do DATASUS revelam queda na taxa
de homicídio juvenil masculino na Região Administrativa do Complexo do Alemão:
85/100.000 em 2009, 79,92/100.000 em 2010 e 47,69/100.000 em 2011. Para toda a cidade,
os dados também mostram queda nesse item: 115,81 em 2009, 100,26 em 2010 e 63,74 em

4 Alemão, Nova Brasília, Fazendinha e Adeus/Baiana.

5 Outro dado para ilustrar a situação do Complexo do Alemão é o de analfabetismo, que na região é de 6,95%,
enquanto o percentual de analfabetos para toda a cidade é de 2,9%, ambas menores que a média nacional que é
de 9,6% (Censo 2010).

4
20116. O jornal “O Globo” de 24 de março de 2013 também revela queda no número de
disparos de armas de fogo de policiais: em 2007 foram 40.332 disparos, em 2008 foram
53.657, 28.484 em 2009, 23.334 em 2010, 4.244 em 2011 e 2395 em 2012.

É comum que políticos e gestores locais afirmem que as UPPs recuperam o direito de
ir e vir de moradores das comunidades. De fato, esse direito se estende a moradores de toda a
cidade e também de turistas que visitam o Complexo do Alemão tendo como porta de entrada
o teleférico7. As UPPs também deram fim ao tribunal do tráfico, prática onde traficantes
julgavam acusados de traição que deveriam pagar até mesmo com a vida. Essa nova
conjuntura abre espaço para novas lideranças e reconfigura as relações de poder nas
comunidades.

Comerciantes ouvidos por essa pesquisa revelam grande alívio com o fim do tráfico
armado. Segundo alguns deles, os traficantes não traziam benefício algum para a comunidade,
sobretudo aos comerciantes, que em muitos casos eram coagidos a dar alimentos, dinheiro ou
bebidas a traficantes. Para esses mesmos comerciantes, as reclamações agora são as mesmas
dos comerciantes da chamada cidade formal: alta carga tributária, concorrência desleal de
produtos não regulamentados, concorrência de comércio ambulante.

Há, por outro lado, comerciantes prejudicados com o advento da ocupação e das UPPs,
por serem fornecedores privilegiados para as festas de traficantes e bailes funks promovidos
por eles. Para os traficantes, portanto, parecia haver dois tipos de comerciantes, os que eram
remunerados pelo que forneciam e os que eram extorquidos.

No que pese o fato de novos comércios estarem em andamento em algumas áreas


agora pacificadas.

Uma vez que a ocupação em 2010 deu fim ao domínio armado de traficantes no
Complexo do Alemão, sem prender a maioria dos traficantes locais, mas afastando os
traficantes mais conhecidos e que estavam fichados pela polícia para outras áreas da cidade,
assim, traficantes desconhecidos e com menos prestígio dentro da hierarquia do tráfico

6 Fonte: http://www.riocomovamos.org.br/portal/indicadores/2012/i_1002_.html. Acessado em 09 de março de


2013.

7 De acordo com o Jornal O Globo de 19 de maio de 2013, o teleférico do Alemão recebe 12.000 passageiros
por dia, e aos fins de semana 60% desse público seria de não moradores, o que daria ao teleférico do Alemão um
número maior de visitantes do que outros pontos turísticos tradicionais da cidade do Rio de Janeiro. Fonte:
http://oglobo.globo.com/rio/teleferico-do-alemao-bate-icones-do-rio-em-numero-de-visitantes-8433461.
Acessado em 19 de maio de 2013.

5
continuaram vivendo e atuando nas favelas do Complexo do Alemão de forma discreta, ainda
que sejam relatados confrontos com policiais, ordens para fechamento de comércio, etc. Isto
poderia, em linhas gerais, ser considerado o retorno ao modelo inicial de tráfico de drogas
ilegais como era praticado na década de 1970.

Tal ‘retrocesso’ teria atingido fortemente esses grupos de traficantes que tinham como
estilo de masculinidade, a exibição de armas, carros, joias e motos para todas as suas
comunidades ‘dominadas’, práticas de consumo conspícuo entendidas como estilo de
hipermasculinidade8 (Zaluar, 2004), pois o domínio armado não se restringia apenas ao uso de
armas, mas à sua exibição, bem como na exibição de símbolos de consumo, como carros e
joias e bens que serviam para ostentar e demonstrar quem eram os ‘donos’ poderosos,
servindo para seduzir mulheres e atrair novos ‘soldados’, que se continuassem vivos e
seguissem na estrutura, cresceriam na hierarquia (Zaluar, op. Cit).

A exibição de armas, joias, carros de luxo, motos de elevado custo não é mais
possível, bem como outras atividades de exibição e ostentação de poder econômico e
simbólico, em razão da necessidade de uma nova estratégia que obriga aos traficantes
operadores do comércio local de drogas ilegais a serem discretos. O que também provocou
alterações na economia do tráfico.

A instalação das UPPs, em 2012, gerou um aumento na tensão entre policiais e


traficantes. Alguns traficantes entrevistados estariam se sentido sufocados pela estratégia da
UPP local. Afirmam em entrevistas realizadas no trabalho de campo etnográfico que
reconhecem ‘que perderam’, ou seja, reconhecem a sua real inferioridade frente ao poderio
militar e estratégico da polícia, no entanto, resistem para que possam garantir o ‘beco’, onde
pretenderiam apenas vender drogas ‘em paz’ e garantir o seu ‘sustento’. Um depoimento de
um traficante foi significativo em afirmar que buscavam apenas os becos para que pudessem
‘trabalhar em paz’.

Durante a pesquisa, encontramos presidentes de associação de moradores presentes há


mais de 12 ou 30 anos no cargo. O que explicaria tal fato? O desinteresse e o descrédito (e até
o desprezo) de seus associados (os moradores) para com a entidade ou um trabalho muito bem
feito como líder de Associação? Ressalte-se, por outro lado, a existência de presidentes de

8 Hipermasculinidade: a exacerbação de valores e práticas masculinas associadas ao poder e controle pelos


“machos”

6
associações que estão há menos de um ano no cargo, quando do trabalho de campo. Sinal de
mudança?

É possível notar um enfraquecimento ou uma redefinição do poder de presidentes de


associações com a chegada das UPPs. Isso porque quando há necessidade de solicitação de
serviços públicos, como energia, telefonia ou outros, se esse não for feito diretamente com as
empresas concessionários, a figura do policial militar também poderá ser invocada para essa
função. Além desse fato levar ao enfraquecimento do poder de presidentes de associações de
moradores, isso também evidencia a baixíssima institucionalização das relações no Brasil.

Outro dado de importante impacto no Complexo do Alemão foram as obras do


Progama de Aceleração do Crescimento, cujo maior exponente é o teleférico. Mas, algumas
práticas dos gestores do programa durante o processo de obras do PAC (Programa de
Aceleração do Crescimento), contribuem para divisões sociais internas a essas comunidades, e
entre as beneficiadas e as não beneficiadas. As divisões internas precisam ser pensadas pelos
gestores de políticas públicas para evitar ou mitigar o confronto entre moradores e diminuir os
“Estabelecidos e Outsiders’ (Elias, 2000). Em visitas a muitas obras feitas pelo PAC foi
possível observar certo descompasso destas com os usos feitos pelos moradores: a forma
como foram construídos conjuntos habitacionais populares, a baixa democratização do uso de
espaços públicos e um distanciamento entre instituições responsáveis por preparar para o
mercado de trabalho e para a cidadania e os jovens mais vulneráveis à violência. É preciso se
abrir, também, para os novos atores das políticas públicas (Subirats, 2012).

Batan

Cidade de Deus e Batan são as duas únicas UPPs localizadas em áreas da Zona Oeste
do Rio de Janeiro. Essa região da cidade também é a mais dividida entre milicianos e
traficantes. A área da UPP do Batan corresponde a seis pequenas comunidades: Jardim Batan,
Morrinho, Vila Jurema, Cristalina e, mais recentemente, o Fumacê. Por ser um micro bairro
dentro de Realengo, os dados sobre homicídios no Batan não estão disponíveis, via
DATASUS como no Complexo do Alemão, que é uma região administrativa exclusiva.

Pesquisa divulgada pelo IETS/FIRJAN em outubro de 2010 revelou que a população


do Batan possuía a menor renda per capta de todas as UPPs, R$ 406,00, cerca de U$ 200. O
Batan também era a comunidade com o maior percentual de pobres (36,6%), e de indigentes
(12,3%). Era a menor população em idade ativa (79,1%), dentre esses, é a população com

7
menor percentual de empregados (80,3%) e o maior de desocupados (19,7%).
Paradoxalmente, o Batan é o terceiro maior percentual de moradores funcionários públicos e
militares (2,2%) e é o segundo maior percentual de pessoas empregadas, mas sem carteira
assinada (22,4%). O Batan registra ainda o mais baixo percentual de moradores com
documentos de identidade (94,9%), carteira de trabalho (93%), CPF (91,8%) e título de eleitor
(91,3%). A população do Batan tem média de 6,5 anos de estudo. Ao mesmo tempo era o
Batan a região com o maior interesse por áreas culturais. Apesar disso, logo após a instalação
da UPP, o Batan também recebeu (como parte do programa das UPPs) uma unidade do Centro
de Ensino Técnico Profissionalizante, o CETEP, órgão da Secretaria Estadual de Ciência e
Tecnologia, que oferece cursos básicos de idiomas, camareiras, cabeleireiras e manicures e
noções de informática.

As transformações e ofertas de serviços no Batan correm em um ritmo muito mais


lento do que no Complexo do Alemão, embora, a política de pacificação desenvolvida no
Batan também tenha resultado em transformações nas relações sociais, nas relações com o
espaço público e nas práticas cotidianas de democracia/cidadania. Instalada desde fevereiro de
2009, ocupando o lugar de um Posto de Policiamento Comunitário, que foi resultado da
expulsão de uma milícia que ganhou fama por torturar jornalistas do jornal O Dia9.

É preciso reconhecer, entretanto, que parte do Batan não pode ser considerada um
exemplo clássico de favela, casas mal conservadas, com ligações clandestinas de energia,
água e esgoto sanitário. Ao contrário, a parte central se parece mais com um bairro pobre de
subúrbio do que com uma favela, ainda que não exista uma única agência bancária ou
correspondente como uma simples casa lotérica.

Moradores entrevistados relataram práticas muito violentas tanto por parte de


traficantes quanto por parte de milicianos que controlaram a região antes da UPP. Não há
consenso sobre qual domínio teria sido pior. Até mesmo práticas de trabalho escravo durante
o período da milícia foram relatadas.

Segundo entrevistas com moradores do Batan, um dos grandes dramas dessa região
seria a questão fundiária. Até a instalação da UPP, a venda de terras ilegais seria feita pela
Associação de Moradores, que cobrava não só pela venda da terra como exigia uma comissão
no momento da revenda da propriedade. O título de posse dessas propriedades construídas em

9 Importante jornal impresso da cidade do Rio de Janeiro.


8
áreas ilegais era um documento da Associação. No entanto, há relatos de pessoas expulsas de
algumas dessas casas pela Associação, pelos Traficantes ou pelos milicianos.

A presença de ONGs10, políticas públicas e novos empreendimentos da iniciativa


privada no Batan podem ser considerados tímidos, se comparados aos do Complexo do
Alemão, por exemplo. No bairro, não há equipamentos culturais, embora a Lona Cultural de
Realengo seja muito próxima ao Batan. Não há sala de cinema, biblioteca pública ou Praça do
Conhecimento e, como já há uma UPP instalada, a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro
(FIRJAN) e o Serviço Social da Indústria (SESI) já oferecem cursos profissionalizantes
(camareira, cabelereira, manicure, entre outros) de educação de jovens e adultos, de
alfabetização, além de cursos esportivos.

Entretanto, parece haver apenas duas ONGs na localidade. Uma delas é denominada
de Centro Social e Cultural Tatiane Lima (CSCTL) e atua na comunidade desde 1998. A outra
ONG é ligada ao grupo chamado Rio de Retribuição e foi instalada após a implantação da
UPP, por um policial militar da UPP e pastor evangélico, tal projeto parece ser apoiado pela
UPP do Batan e pela FIRJAN/SESI, como visualizado em placas publicitárias colocadas na
frente de suas sedes.

O Batan teve recentemente eleição para a presidência da associação de moradores, até


então ocupada por um policial militar aposentado e que não estava concorrendo nesse pleito.
Esse então presidente sofreu acusações de ter pertencido à milícia que ocupou a comunidade
antes da pacificação. Deve caber ao novo presidente da Associação ajudar a escolher parte do
destino desses recursos do PAC 2, que seria executado na região.

Outra frente em que os policiais se envolveram no Batan foi o da mediação de


conflitos. Uma sala na sede da UPP, especialmente reservada para isso, celebraria tal fato.
Entretanto, alguns policiais entrevistados informalmente para essa pesquisa reconheceram que
tal projeto de mediação de conflitos no Batan não tem avançado conforme esperado. Tempos
depois na sede da Coordenação de Polícia Pacificadora tive a informação de que a UPP do
Batan possuía um dos melhores números de resolução de conflitos. Provavelmente, algo pode
ter sido aperfeiçoado por lá.

Durante o trabalho de campo também pude observar moradores levarem diversos tipos
de demandas à policiais da UPP local. Desde relatos detalhados de comportamento de

10 Destaque-se a ausência de qualquer uma das grandes ONGs do Rio de Janeiro no Batan.
9
usuários de drogas no bairro até pedidos de intervenção junto a agentes de concessionárias de
serviços públicos para que fizessem reparos na rede elétrica ou telefônica, assim como
relatado no Complexo do Alemão.

Se isso, por um lado, representa a retomada da confiança na Polícia Militar, também


representa, prática e simbolicamente, a consolidação da Polícia Militar com poderes além do
que dela se deveria esperar: seja mediando conflitos, seja gerenciando projetos esportivos,
seja ensinando esportes, seja solicitando reparos a funcionários de concessionárias de serviços
públicos.

Nenhum morador relatou ser vítima direta de abusos ou desvios de policiais militares.
Entretanto, relatam haver ruídos e boatos de desvios de conduta quanto à pequena corrupção e
supostas festas informais na sede da UPP.

A tentativa de aproximação da Polícia Militar com a comunidade vai além. A


realização de cafés comunitários às últimas sextas-feiras do mês com qualquer morador da
comunidade é um exemplo disso. Nesses cafés comunitários, moradores e comerciantes levam
suas demandas e denúncias à público e tentam solucionar esses problemas em conjunto, em
uma prática que não é regra das UPPs. Um dos problemas levados pelos moradores e não
resolvidos foi o do transporte público para ligar o Batan à área mais comercial de Realengo,
onde estão supermercados, bancos, lojas e serviços.

Por conta de tais demandas, o comandante da UPP teria solicitado a uma das empresas
de ônibus que atendem à região que fizesse uma linha ligando o Batan ao centro comercial de
Realengo. A linha funcionou por pouco tempo, tendo sido logo depois descontinuada. O
transporte é feito basicamente por meio de vans e kombis que operam no chamado transporte
alternativo.

Um fato curioso que vem se sucedendo com a UPP do Batan e de outras comunidades
pacificadas diz respeito à imagem da policial feminina. Seja resultado da maior autonomia das
mulheres, ou, resultado de uma estratégia de aproximação da PM com as comunidades, têm
sido observadas policiais militares mulheres mais feminizadas, com imagens menos
masculinizadas, mais maquiadas, com cabelos tingidos, mostrando uma imagem até certo
ponto fragilizada ou menos brutalizada de tais profissionais da segurança.

Outro ponto abordado por moradores diz respeito ao consumo de drogas na localidade.
Embora pacificada, e a grande maioria dos moradores ouvidos reconheça que a UPP gerou

10
ganhos reais para a comunidade, muitos demonstravam desapontamentos pelo fato da
comunidade situada do outro lado da Avenida Brasil, o Fumacê não ter sido pacificada (até a
realização da pesquisa de campo) e ser motivo de constantes riscos por conta de trocas de
tiros11.

Preconceitos e rivalidades estão presentes dentro de moradores do próprio Batan. O


Batan, no discurso dos moradores, é “divido” em três regiões: a parte central, com comércio
mais forte e, provavelmente, de maior densidade; outra região, localizada atrás da atual sede
da UPP, o chamado Morrinho, região de casas de pau a pique, e com a população local mais
pobre; e, por fim, os Ipês, região de conjuntos residenciais recém construídos para receber
moradores da Serrinha e do Morro do Urubu. Divisões que podem passar pelo tempo de
moradia ou por outros critérios de identidade social, aceitação e recusa.

As políticas públicas (sociais) também parecem pouco integradas de forma


intersetorial. Embora o bairro já conte com Clínica da Família, que funciona no Fumacê,
Projetos Sócio-Esportivos, Escolas Públicas e Centros Profissionalizantes, ao exemplo do
Complexo do Alemão não há integração e diálogo entre os diferentes setores das políticas
públicas.

Coroa, Fallet e Fogueteiro

A UPP responsável por esses três bairros foi instalada em 25 de fevereiro de 2011. As
três comunidades ficam próximas ao Centro da cidade do Rio de Janeiro e do tradicional
bairro de Santa Tereza. Juntas, elas somam cerca de 20.000 habitantes. Há poucos dados
socioeconômicos oficiais disponíveis especificamente das três comunidades devido ao seu
reduzido tamanho e por esses dados estarem mais integrados aos bairros formais vizinhos.

Até janeiro de 2013, o comando da UPP local tinha sido substituído três vezes. O
primeiro comandante foi afastado por denúncias de corrupção. O segundo teria sido afastado
pelo fato de moradores denunciarem a cumplicidade dele com policiais truculentos e que
abusavam do poder. Esse segundo comandante da UPP era tido por alguns moradores como
estrategista e não necessariamente como um oficial especializado em policiamento de
proximidade, proposta oficial das UPPs. O terceiro comandante assumiu a UPP quando já
encerrávamos a pesquisa, mas a impressão dada por moradores e comerciantes era de que ele

11 No segundo semestre de 2012, porém, o Fumacê foi incluído na UPP Batan.


11
apontava para uma polícia de proximidade, pois estaria buscando abrir novos canais de
diálogo.

O acesso às comunidades é por ruas asfaltadas, entretanto as ruas são muito íngremes
e estreitas, fato que dificulta o acesso para moradores sem automóveis e para a prestação de
serviços, entrega de mercadorias, etc. Tal fato deve servir também para dificultar ações
policiais mais ostensivas. O acesso de moradores ao topo dos morros se dá apenas por
transporte alternativo ou veículos particulares.

Além das três associações de moradores, poucas ONGs estão presentes nas
comunidades. Isso pode ser explicado pela baixa visibilidade das comunidades na imprensa,
ao ser comparada com o Complexo do Alemão, a Maré ou a Rocinha, por exemplo.

Ao contrário de outras comunidades, o comércio local é muito fraco e parece não ter
crescido após a pacificação. Existem alguns bares e biroscas espalhados pelas comunidades,
mas esses são muito simples e voltados para a população local que busca uma pequena falta
em suas dispensas ou para o consumo de bebidas. Não se percebem pequenos mercados ou
mesmo bancas vendendo serviços de telefonia fixa ou móvel nas ruas, como é o caso das ruas
do Complexo do Alemão, onde suas principais entradas estão lotadas de bancas e
estabelecimentos que vão desde padarias, bares, serviços, roupas a equipamentos eletrônicos,
loterias e agências bancárias.

Há pouca oferta de cursos profissionalizantes e o pacote de cursos oferecidos pelo


sistema FIRJAN/SESI/SENAI e da FAETEC/CETEP em outras comunidades pacificadas não
estavam presentes nessa comunidade até janeiro de 2013. Alguns cursos na área de esportes e
lazer, oferecidos por policiais militares, porém contam com forte rejeição da população local.

Alguns moradores também reconhecem outro aspecto importante com a instalação da


UPP que é o fim de traficantes exibirem publicamente seus armamentos, um deles afirma que:

“....tinha o quadro trágico que era você ver as pessoas circularem com fuzil,
crianças se misturando no meio das armas como se fosse uma coisa normal. Como
morador você até se acostuma.”

Outro dado importante é a existência de diferentes comandos de traficantes nas três


comunidades. Enquanto o Fogueteiro e o Fallet eram dominados pelo “Comando Vermelho”
(CV), a Coroa era dominada pelo “Amigos dos Amigos” (ADA). Os moradores atribuem

12
como fator positivo da instalação da UPP no local, o fato da guerra entre traficantes armados
desses comandos rivais ter se encerrado e com isso se torna possível novamente circular pelas
três comunidades. Não deixam de reconhecer, porém, que o tráfico não se encerrou e que a
divisão de comandos continua, embora a venda de drogas também tenha se tornado mais
discreta e enfraquecida.

Do ponto de vista da chegada de serviços públicos e melhorias urbanas, alguns


moradores apontaram para o fato de que algumas melhorias já vinham se desenvolvendo
pouco antes da instalação da UPP, como o programa Morar Carioca, fato que pode ser
explicado pela expectativa dos gestores de políticas públicas da criação da unidade na região.
Após a UPP, no entanto, os moradores percebem poucos avanços na prestação de serviços,
como a melhoria da coleta de lixo e a instalação de creches municipais.

As instalações da UPP são vistas de forma ambígua por alguns moradores:

“O território é grande, você chega lá na Navarro, tem a sede da UPP, modelo


PAC, bonitona, tudo beleza. Não está dentro da comunidade, está na periferia, na Rua
Navarro. Quando você vem para cá, você vê o container aqui, extremamente precário
e outro ali no final da rua.”

Embora os moradores percebam a existência de muitos policiais com comportamento


mais educado e menos truculento, essa não parecia ser a percepção geral dos moradores. E,
embora, essa UPP já esteja no seu terceiro comandante, a prática de encontros com moradores
era prometia para ser implantada pelo atual e terceiro comandante da unidade.

Conclusão

Pode-se dizer, em linhas gerais, que as UPPs podem vir a encerrar o ciclo de grupos
criminosos armados nas favelas que ocupam, sem necessariamente, conseguir dar fim ao
tráfico de drogas ilegais, o que pode acabar por se tornar um foco de resistência à presença
dos policiais e ao projeto das UPPs, muito por conta da lógica de guerra que preponderou
sobre policiais e traficantes durante mais de 20 anos.

As inegáveis mudanças que a cidade como um todo vem passando não deixam de fora
nem Batan, nem Coroa/Fallet/Fogueteiro e nem o Complexo do Alemão, que, porém,
experimentam tais mudanças de formas, ritmos, cadências e intensidades diferentes. Ou seja,
nem mesmo dentro do Complexo do Alemão, os investimentos são homogêneos.

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A concentração de poderes nas UPPs que passam a se ocupar não só do policiamento,
mas também de papéis como a gestão de ONGs, a mediação de conflitos, a intermediação
com concessionárias de serviços públicos, que deveriam ser deixados a cargo de moradores
locais, ou então, que esses fossem estimulados e encorajados a assumir funções acaba por não
favorecer o fortalecimento das próprias comunidades.

Cabe a gestores, formuladores de políticas públicas e aos protagonistas da sociedade


civil (novas e velhas lideranças) criar novas alianças que vislumbrem possibilidades de
transformar a ocupação policial de forma sustentável a fim de garantir que ela possa deixar as
favelas um dia sem que elas sejam novamente ocupadas por traficantes armados. Estimular a
exploração sustentável de potencialidades locais é um desses deveres. Isso envolve continuar
conquistando garantias, mas com uma polícia verdadeiramente de proximidade e onde essa
população possa ser autônoma em relação a benefícios, projetos sociais, líderes clientelistas e
bolsas governamentais. O primeiro passo pode ter sido dado com o fim de comandos
armados.

Desmontar a teia que garante a manutenção do personalismo sobre as instituições


implicaria em perda de poder não apenas de alguns líderes comunitários, mas também de uma
estrutura política que se beneficia dessas alianças. Em outras palavras, parte de políticos
profissionais e de líderes comunitários que podem ter interesse em que essa estrutura pouco
institucionalizada que não garante ampliação da democracia (via direitos básicos) e da
universalidade se perpetue de forma a alimentar os largos tentáculos do clientelismo político.

A história de cada comunidade e o estilo de gestão das UPPs locais são as chaves para
compreender os conflitos e as trocas entre moradores e policiais. Uma vez que assim como as
comunidades não têm as mesmas histórias e formações, o estilo de comando de cada UPP é
muito importante para entender como será a relação entre policiais e moradores. Uma vez que
também não há homogeneidade absoluta entre os estilos de oficiais e praças das UPPs.

Na outra ponta, os últimos anos vêm mostrando um decréscimo da taxa de homicídios


na cidade do Rio de Janeiro. Pesquisas diversas apontam para essa tendência na cidade.
Zaluar e Monteiro (2012) mostram queda de 40% na mortalidade de pessoas de 15 e 30 anos
de idade nas Regiões Administrativas mais pobres. Dados do CESEC12 também mostram
queda na taxa de homicídios por 100.000 habitantes no Rio de Janeiro (capital e estado): na

12 Disponível em: http://www.ucamcesec.com.br/wordpress/wp-content/uploads/2011/04/Homic1991_2011.jpg.


Acessado em 24/02/2013.

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capital, 45,7/100.000 em 2002 e 22,4/100.000 em 2011, enquanto no estado do Rio de
Janeiro, sai de 46,6/100.000 em 2002 para 26,3/100.000 em 2011. Ainda que considerado
fator elevado pelos padrões da OMS, os dados revelam queda das taxas de homicídios no
estado e na cidade do Rio de Janeiro. Estaríamos caminhando para o controle das emoções, no
sentido de Elias? Isso não é de pouca importância, mas é preciso garantir avanços.

Fortalecer espaços públicos que celebrem a vida social pode ser o caminho para a
construção de sujeitos baseados em valores plurais, lúdicos, democráticos e mais igualitários.

Por fim, como avanços, podemos considerar avanços que deem sustentabilidade às
mudanças que podem estar em curso, o que nos leva a considerar: a necessidade de reforma
da polícia (e do judiciário e suas leis) e levar em conta o justificado temor de moradores que
as UPPs deixem suas comunidades após os Jogos Olímpicos de 2016.

Bibliografia

ELIAS, Norbert & Scotson, John L. Os estabelecidos e os outsiders. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.

MONTEIRO, Rodrigo. Prevenção da Violência: o caso de projetos sócio-esportivos nos subúrbios do


Rio de Janeiro. Tese de doutorado defendida no IMS/UERJ. 2009.

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contradições. Sur, Rev. int. direitos human., São Paulo,v. 5, n. 9, Dec. 2008.
PUTNAM, Robert. “Comunidade e Democracia: a Experiência da Itália moderna”. Rio de Janeiro:
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SUBIRATS, Joan. Algunas ideas sobre política y políticas en el cambio de época: Retos asociados a la
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ZALUAR, Alba. “Integração perversa: pobreza e tráfico de drogas”. Rio de Janeiro: FGV, 2004.
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ZALUAR, Alba & MONTEIRO, Mario. Diferenças espaciais e socioeconômicas do risco de


mortalidade de jovens utilizando informações da amostra dos Censos Demográficos no Município do
Rio de Janeiro. Trabalho apresentado no XVIII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP,
realizado em Águas de Lindóia/SP – Brasil, de 19 a 23 de novembro de 2012.

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