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EURtPIDES CARDOSO DE MENEZES

DE CLARIDADE
EM CLARIDADE

EDIÇÕES RUMO S . A.
RIO DE JANEIRO - 1981
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NIHIL oa!JTAT - RIO DB JANl!l­

Rn. ll oe AOltSTO DE IMO -

MONS. A. NEOROMONTE. UtrRI·


AIATUR - RIO DB JANBIR00 H
08 AGOSTO OI! 191611 - MONS.

JOSl SILVEIRA. VIG.4.RIO GBRAL.

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A minha eapôaa

Marie Ottonl Cardoso de Menezes

e aos meua filhos

Luiz Eurípides

Vienney

Regina Maria

Angela Maria

Cristiano

Jorge

Alvaro

Maria Tereza

Maria CecDie

Marcelo

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PRE FACIO

E M PLANO internacional, vive hoje o mundo a /rw-


lração da união. Falta-lhe de todo bau para ela.
Não se entendem 01 doil blocoa. Ainda niio foi pas­
sivei didlogo enlre Ocidente e Orienle. Agrava-se por
i110 a diviaão.
Por muilos aéculoa foi lambém eala a aorte da ci­
são 110 Cristianismo. E, todauia, temOI' um mesmo
Deu.o e Salvador.. . um rerreno comum que a E:le no•
conduz. Maa, por quonlo lempo no• ignoramo• ...
t'ram01 inniioa que ae não falavam.. . Adenaara.....e
auim 01 preconcft!OI. Porque "niio IOio apenaa cer-
101 ponloa dou!rinala que aeparam cardlicOI e prole•·
1an1e1. É aobreludo uma monranha de preconceito• e
reuenlimenroa reciprocoa e razõe1 de ordem 1enlimen­
ral e plicolcSgico, a que, não raro, IH! acrescenta o pêao
da lradiçio de familia, que aoa JIOIU'OI IH! uai forman­
do, e que dif;cUlta maia anula o mútuo conhecimento
e uma fraterna aprozimação. Eltllmoa aeparado1, na
nalidade, por um grande equivoco" r11

(1) EolllP- e- - - - Aos,...... s.p..


rodol, Alir, Rio, 11117. Pnüclo ela z.• edlçio.

11
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/lá hoje um cOftvite para o dldlogo. E todo diá­
logo supõe conhecimen&o, rompreenaio, acatamento e
aprloço. Nada mau oportuno para criar em nós êate
din1n deaanuviado do que aeguir ao vivo o itmerdrio
lnlinoo que "' traduziu "" rintese dut4s dwu vldaa.
Também a nós êlle livro letl<lrá, de claridade em cla­
ridade, a uma vi.são tolalmente nOllCI de velhaa nali­
dades. Como não aennos graloa, eat6licos e protellan­
leo, ao auror dellas páginas, por não cleizar perdidas
lanl<U vivências e ezperilneias lnteriorea, linguagem
de Deus no coração dos homens!
t um livro que faz bem. Mau que tudo, fala nêle
a osmoae de nligiiio e vida: ella J17"eoeupação eou­
rante de ;fidelidade cl Venlade . . . êate anaeio sincero
de a ela lender até cl ...., plena posse. t uma vida o
que nelte livro ae noo aJ17"esenlCI. Tem êls por U.O a
fôrça do tellemunho: a de ser idéia encorNlda "" ezis­
tência. Vida intensamente vivida em dois tempoo, em
dois ritmas, em dwu vidas. Maravilhosa a fisionomia
humana e sobreN1tural de Américo de Menezes. e,._
prichosos e misteriosos os caminhos do Senhor em con­
duzir Eurlpides "de claridade em claridade". Há, con­
tudo, uma admirdvel unidade e sequência "" ;fidelida­
de de pai e filho Aquele que d a Verdade. Bem mais
profunda ainda, porm, M a fidelidade perene daque­
le que é a Verdade aos que o Jl7"0CUram "" sincerida­
de de um relo coração.
Senrimos aqui, de perto, todo o respeilO deuido
no l1omem em cu;a alma Deus eterno trabalha no ai­
l•1nrio do lempo. Quando o homem começou a ae en­
rrntl•·r com Deus, mais do que palaoras e criticas, d
n oraçdo "" caridade que fecunda a conoersão. Porque
••ln �. ••mprp e por primeiro, iniciativa de Deus. 1:
u••1·n t: Uru. a concede como e quando lhe apraz.

I"'
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t impoaslvel llQUi queimar etapcu. "Nio ae aln-e um
ccuulo", diria LeOMI F..anca. A graça tnl ba!ll4 no
tempo. E, quem diz tempo 114 escala de Deu.a, pode
8ignific4T espe.-a paciente de uma vida ou de ge.-açõe1.
Mil ª"°' nio aio para tle como o dia de ontem? • • •
.t11e liVTo é m<!7WJllem de Graç11. In!Toduz-noa num
clima de genuíM e11ridade cristã, enquanto e.ta diz
união na CCIS4 do P11i, mútuo Teapeito e gprêço depoil
de conhecimento Teclproco. Revelo a Iodai nÓI, cat6-
lico1 e prote.tante1, um mundo p11..a muito• novo e ig­
norado. Aprozima, poia dilata h.orizcnte1, lev11nta bar­
TriT41. Enquadr11-1e 411im, plenamente, no elp{rito de
Concílio convocado pelo Sumo Pontífice Joio XXIll.
Bate Concilio não é, aliál, aenão uma rupoata da Cria­
tandllde cl CllpiTaçiiO de unidade, que pCITCI elo formulou
CIO Pai o próprio Crialo: "Que todoa aejam um, como
um oomo1 nós" (Jo, 18, 22).
Niio é de 11dmiTllT que um tal 11711eio de unidade e
de ama.. ae;a muito moia lntimamente 1entido por quem
ezperimentou ao vivo a .,... falta, por quem ao/Teu em
peuoa a tortura da diviaiio e cmueguiu aupe.-4-14. "O
converti.do não é, como o CTê por vêu1 umo falaa. in­
te,.pretaçio, alguém que ezpre-mente afirma a dolo­
Tosa 1epa..açiio confeuiona!. tle é, antea, alguém que
a 1oube domiMT. Sua autêntica ezperiênci4 não é a
de uma out..a fé cl qual êle 1e p11U4, mao lim a d4 uni­
dade da fé, que o aubme.-ge. Compreende como nin­
guém que a divisão doa criatiloa é, no fundo, menoa ci­
aão 714 fé do que ciaão no a.mor. t preciao triunfaT
de1U1, por primeiTo, pa..a que, em aeguida, ae
vmçam 41 clificuldadea doutrinaia". Eia porque
"o convnrido Tepreaenta. em l'Í a viu união
do amOT dividido. .tle é, poia, por 4.aim dizer,

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a pot1le q11e IOCG e liga a• d....., l'IUlrgena" (J. An­
relel-Huaraclae, Gertnd von le Fort, Bru:reUea, 1954,
p. 6).
Dc1l4 rnusão d.e amor e de união tem cOMCi.!ncia
Eurlpid., Cardo.o de Menezea. Sua primeira obnz ftea-
14 linha, - "Ao• IrmãDi Separadoa" - e eal4 agora
dão diaio eloqüet1te leatemunho. S6 no1 rea la augurar­
lhe que quem tome ""' mãoa o aeu livro 1C1iba lê-lo
com o eaplrito �meftle '"411"4ftimo que o ditou. E
enlão, e1w pdgina1 seriio .emente fecuftda de paz e
de união.

P. MA11c:zLo DE CARVALHO A:r.EVEDO, S . J .


Roma, Pentecostes de 1960

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INTRÓITO

19 DE OUTUBRO de 1935 Ingressava eu, com 26


A onos de idade, na Santa l11reja Católica.
Muitos amigos evangélicos, impregnados dos mes­
mos preconceitos que noutros tempos também tive
contra o Catolicismo, não compreendem como foi pas­
sivei fazer-se católico um protestante sincero, filho de
um pastor piedoslssimo, e que também exercera, por
sua vez, o pastorado.
Por outro lado, não poucos católicos se tim mos­
trado interessados em saber como foi que meu pai se
tomou protestante, filho que era de familia brasileira
e tradicionalmente católica.
Procurando satisfazer a uns e a outros, e reagindo
contra o constrangimento que sinto em focalizar a mi­
nha própria pessoa, tenho leito em v6rios lugares, prin­
cipalmente para auditórios de sacerdotes, seminaristas
e noviços, uma palestra s6bre "a psicologia de wna
conversão", iniciada com um "retrospecto cronológico".
em que narro, do melhor modo que posso, a vida de
meu pai, e, portanto, como se fêz protestante.

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Lendo trechos do "diário espiritual'', e penetnm­
do, melhor do que muitos pastores evangélicos, na psi­
cologia de Américo de Menezes, disse-me um dia o meu
saudoso amigo Pe. Leonel Franca: "Entre nós, católl­
cos, nio seria de admirar-se que se pensasse na sua
beaülicação... Era uma personalidade realmente extra­
ordinilria."
Mostra, com efeito, a sua vida como é passivei um
protestante convicto ser, deveras, como diz Moos. Pe­
nido, 11um membro potencial", 11tendencial" ou 11laten­
te" da Igreja Verdadelra;U> e por que motivo "admite
o catolicismo que nas comunidades protestantes até
santos e mArtires possa haver." 12>
Oulnl grande figura dos meios cat6llcos, arcebispo
dos de maior prestfgio entre nós, também se manifes­
tou vivamente interessado na publicação da biografia
de meu pai. Várlu vêzes tem lmislld o para que o
faça.
Relutei, porém, durante anos, em tirar da pveta
êste lnlbalho, notadamente pelo receio de apresentar
uma caricatura em lugar do retrato; que nio há, tal­
vez, mais 6rdua tarefa que a de escrever uma biogra­
fia. Se o autor não conheceu o biografado, seri qua­
se de lodo imposslvel; se tal se deu, mais diflcil se lhe
aligurari, por certo, e maior angústia h6 de sentir ao
constatar a impossibilidade de lhe reproduzir a fisio­
nomia, de faz!-lo mover-se, falar, viver diante do lei­
tor. Consegui.ri, sim, vez por outra, com a rememo­
ração de (atos históricos, tornA-lo momentaneamente

(1) O Jfldblo dG Igreja - 11am. Dr. M. T.-L. Pmnlo, Ed.


Vmeo, 11152, ""P· V, "'8. 220 e iep.
(2) A ...- do c.tolldnlo - X-. ,.,,_, Ed. V-,
"'-· 1113.

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redivivo para os que o conheceram, - o que já aerA,
em certos casos, de real proveito; mas . . . e os outros,
que não foram seus contemporlneos?
Há, outrossim, o perigo de pretender o autor inter­
pretar o biografado, de o apresentar à sua própria ima­
gem e semelhança, como desejaria que l!le tives..e sido
e não como de fato �e foi, o que seria distorcer-lhe
a fisionomia moral, desfigurar-lhe a personalidade, trair
a verdade histórica.
Deploraodo não ter a acuidade psicológica de um
Mons. Pen.ido, que tão maravilhosamente retratou o
grande Newman, recuava sempre pela convicção de
que não poderia dar senão uma idéia muito pálida da­
quela alma de escol, tão ardorosamente apaixonada por
Nosso Senhor Jesus Cristo!
Trinta e cinco anos, porém, se passaram desde que
partiu diste mundo, sem que Jamais se houvesse ten­
tado captar e transmitir a menaa11em que, a meu ver,
sua vida encerra, tanto para os cristãos evangélicos
como para os católicos, que, allás, sempre se entusias­
mam e se comovem ao lhe ouvirem a bela história. Jul­
ge>-me, pois, no dever de publicar ao menos alguns dos
documentos, Infelizmente tão escassos, dessa vida que
se findou aos 38 anos; de registrar os relatos orais que
me foram transmitidos; e as mlnh.as próprias reminJs..
cências, para que se não apague de todo o rastro de luz
que deixou, em sua rápida passagem, aquela alma
imantada pelo Divino Sedutor. Mesmo por já estar
euperado o outro motivo pelo qual não me decidira, até
agora, a trazer a público as minhas anotações: o receio
de ainda não haver clima, no Brasil, para um trabalho
como l!ste, a estranheza que poderia causar a publica­
ção, por um católico, mesmo à guiza de intróito à nar­
rativa de sua conversão, da biografia dum pastor pr<>-

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teslnnle, ainda que a pedido de um prelado e com os
aplausos de muitos outros.
Aliás, católicos e protestantes de mentalidade es­
treita os haverá sempre; mas também, e em número
felizmente cada vez maior, esclarecidos e compreensi­
vos. A êstes é que me dirijo.
Convocado o Concilio Ecumênico, que terá como
dos seus objetivos primordiais o de criar as necessárias
condições psicol6gicas para que se possibilite, quanto
antes, a unificação da Cristandade, urge fazer cada qual
o que puder no sentido de lançar, s6bre o abi.sino dos
preconceitos e ressentimentos, a ponte da boa vontade
e da compreensão reciproca. De que êste é o pensa·
mento e o desejo do Vigário de Cristo não há dúvida
nenhuma. Ainda recentemente, referindo-se à próxi­
ma assembléia geral da Igreja, disse Sua Santidade:
ºNão faremos um processo histórico, não procuraremos
ver quem tinha e quem não tinha razão. As respon·
sabilidades estiio divididas. Diremos apenas: reuna­
mo.no.e;!"
11Urge, - ncre�enlou o Papa noutra oportunida­
de - superar velhas concepções, preconceitos e expres­
sões pouco corteses, a fim de criar-se um clima favorá.
vel no retômo e facilitar-se por t&las as formas a obra
da Graça."
E a sua simpatia pelos cristãos dissidentes e o de­
sejo de os ver reintegrados nos seus antigos privilégios
se manifesta nesta auspiciosa declaração: "Se os nos­
sos irmãos separados quiserem comparecer ao Concllio
Ecumênico, serão benvindos. A Igreja Católica con­
tinua a aua casa, donde êles sairaJn devido a Inciden­
tes históricos, desentendimentos passiveis em qualquer
fami!ia" ...

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Das palavras passa Sua Santidade aos aios, rece­
bendo paternalmente o pastor anglicano Donald Rea,
presidente da Fraternidade Pró-União com Roma, a
quem encorojou a que prosseguisse na sua obra, lem­
brando que "paro o êxito do apostolado da unidade
cristil é ncceiw\rlo: ser manso e humilde; ter pacl�­
cia e saber c!lp"rar o horo de Deus; insistir em argu­
mentos positivO!I, deixando de lado as divergências e
evitando dillcus.'IÕes contrários à caridade." Foi nessa
ocuião que o Sanlo Podre olereceu ao Rev. Donald
R�a o seu próprio Breviário, ao notar como estava gas.
to o que usava o ministro anglicano . . .
Estamos, sem dúvido, n o limior duma nova éra.
Intensifica-se dia a dia o desejo de união entre os vá­
rios ramos do Cristandade, aspiração que se vai de­
monstrando de modo concreto e positivo, não .Omente
em meras declarações de simpatia como alé mesmo nos
encontros, cada vez 1nais frequentes e sempre amisto­
sos, entre teólogos católicos e protestantes.
Já Pio Xl1 recebera pessoalmente várias delega­
ções de pastores evangélicos, como permitira, outros­
sim, que observadores católicos não oficiais, mas de­
signados pelas autoridades eclesihlicas, assi•tissem a
vários congressos evangélicos mundiais. Sacerdotes ca­
tólicos têm tomado parte, ao lado de anglicanos, em
congressos internacionais de Patrística e Arqueologia;
o "Semana Universal de Orações pela Unidade dos
Cristãos", inslitulda por dois pastores protestantes
(Rcvs. Spencer Jones e Paul Wattson), aprovada por
São Pio X e encorajada por seus sucessores, é obser­
vada hoje em todo o mundo, tanto pela Igreja Católi­
ca como por numerosas "denominações" protestantes:
estudos notabilíssimos sôbre o protestantismo se vêm
publicando ultimamente, como, por exemplo, o do Pe.

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Louis Bouyer, - "Du Prol<!stantbme 11 l'Egliae", o do
Pe. Georges Tavnrd - "A la rencontre du protes!an.­
rinne", e oulros como os do Pe. A.-J. Lut:z, O.P. , do
Pe. M.-J. Congar, O.P., do Pe. P. R. Regamey, de
Claude Vignon, de M.-M. Monflard, de W. A. Vissert
lloofl, de Leon E. Halltin, etc.UI

(3) Na Almw>ha o movimento "Unam Sulclam" reune,


a portas fechadu, uma va. por ano, mi cidade prhlamente d...
lennlnada, 1.61- de .....i valor, cathU- e prolellultes, pua
dl5cuDio &anca e leel de -toe doutrinaia, amna •-era
tnldedual o -lrllwll de ""'-Idade e c:arldode. Outro mavl­
meato, dos �_.;iche" (-.- o&bre rtilglio), Ini­
ciou mi Frankfurt, ern 11158, aa "Somoaa Pr6 Ualáo", de Janeiro,
dWop pú� o&bre prvblftau � Dolo t.o61- ....
c:o1hldoe com IAP anlecedfac:la, up&em, WD ap6o outro, o
poato de vllla cablll<o e o poato de vllla protalaale na apn­
c:iaçio de al8mn lema de fronlelra entre ambu u cornn....
Simpleo ..._içia, sem tom polimleo, e com multa caridade.
A seguir, dlal_. a6bre os pontoe de aprmdmaçio e u razões
de dlocreplnda. Enorme o laleriue que a laldatlva deoper1ou.
Na primeira reunião, em 1858, estiveram pnsmleo 400 pe1-
10a1; aa aeguada, 800; aa lereeln, mall de UOO. O audiblrlo
era -luldo do - que haviam trabalhado o dia lalelre
e Jantado aa cldedo pen Ir à 20 bo. pen wna ala oscular a1'
a mela aolle uma � teol6slca. A reunlio foi lalclaUn
dOI proleltantes, que eaoonlnnm mmpnensio da parte doo
cathllcoo. Qu.. � enua pn>teslen... que pn>OUravam lllnce­
nrnenle a Verdade; a q..- lollllidado dos ouvln.... lft(IOll do
tadu as ca� e prollaõeo, o que demonstn a preoeupaçio
religi- em um pais malerlalmente tio evoluldo. (Notlcili for­
necida polo R. Pe. Marcelo Azevedo, S.J., de Roma)
Em Mlláo, na Itália, tamWm se Iniciaram a 13 do maio do
1960 oo encontros - eatre aacenloteo cabllieoo e put6-
reo prolaslanta. A primeira nualio "'-·se na cua do

Putor Albm1o Rlbol, titular da lp-eja Valdeme de lllllão. Alilln


do Pastor Rlbet atlvmam praaleo o Pator Giovanni Jloao,
....d.,, o putor da Igreja Valden1e; o Pular Neri Glamplc:coll,
putor da Igreja Valdease da Berpmo e Modendor da "Tavola

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Aqui no Brasil já se registraram também vários
fat.os swnamente auspiciosos. Ao 36.° Congresso Eu­
carlstico Internacional compareceu, acompanhado de
seu pastor, numeroso grupo de luteranos da cidade de
São Paulo, que não .Omcnte assistiram a tôdas as sole­
nldades como tomaram parte, através de seu conjunto
orfe8nlco, que foi apreciadfssimo, numa das reunlõe•
plenArias. Nessa mesma ocasião, no salão paroquial
da matriz do Sagrado Coração de Jesus, realizaram

Vold-"; o Pu1or Giovanni Fenerl, ela !&rela W..Jeyana; o


Pulor Cumolo InpanU, da !peja Balista; o Pulor Somuel
lofelchert, da Igreja Relonnada Sul� o o Pulor Al&edo Scor­
_,.,111, ela !&rei• llftodlola Eplampal.
Da parte doo cal<IUcoo cmnpare<:ftlUD Mono. F.nrlco Galblatl,
ela BlbUoi- Ambrmlana; Dan Cario Colombo, do Semlnú!o
de Vm�onoj Don Alberto BelllnJ, proleaor do Seminário de
&rpmo, mombre da Conlerâda C:.tl>Uca para u Q1Mstões
Ecumlnlcu e ela s-io para os Prot.eotanla da c-1ssio ante­
preparal<lrio do ConcllJo Ecumênico; Don Damenlco GuinoUI,
da paróquia de Tuno; Mana. l. O. li. WWebnndl, seaetúio
da Conl.....a. C:.tl>Uca para as QuOlllõm Ecum!nlcaa - do
Warmond (Holanda); Rev. Dr. Fnndlco TblJ....., do Utrecbt
(Holanda) e Sr. FnDco Falchl, seaetúio ela Aaoclação "Uni­
tu" de llilio.
O primeiro ......,Iro, que ...,,_u a 10 e lmmlnou a 18
boru, foi preoidido pelo Pulor Ribet, e comlou do: breves
palavru lntrodul6riaa; apraen� � de ..ela -tid­
pante; ncltação do Credo e do Pai-Noao; leitura e coment.irlo
dm prlmeiroo V'l!l'8fculm do-· Lº do Ev. S. Mara.; alm6ço
em comum na e.a Cardeal Schusterj contlauaçio do comentá­

rio; OllCftT1Ullmto cum a leitura, feita pelo Putor Ribot, do


Salmo 103.
Todo o tempo foi tomado com o oomentárlo e a troca de
opiniões, sem que •ursisse aenbwna dlvergfncia, mu, ao cun­
tnrlo, com Wl&Dlmlclade de pnmuadamoatoo .&bre a nalwaa
de Nosso Senhor.
O aegundo oncontro, para a amllnuaçio do comentário do
cap. 1.0 do Ev. 5. Marcos, foi marcado para o dia 21 de Junho,

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uma festa lítero-muslcal "em homenagem ao 36.° Con­
gresso Eucarístico Internacional". Os ortodoxos tam­
bém pediram permissão para comparecer, e compare­
ceram, ao grande certame de Fé.
Na "Festa de Confraternização", efetuada em ju­
nho de 1959 no Teatro Municipal do Rio de Janeiro,
no "Dia do Papa", estiveram presentes o Arquimandri­
ta Ortodoxo e v&rios past6res anglicanos, luteranos e
calvinistas, que haviam sido convidados e para os quais
se reservaram frisas especiais.
Mais recentementl! inauguraram-se, com alegria
redproca e grande sucesso, "DWogos" entre padres
dominicanos de São Paulo e professôres do Seminário
Presbiteriano de Campinas.«>
Aliás, quanto mais se aprofundarem os calvinistas
na alma de Calvino, mais admirados ficarão, como ob­
serva o Pe. Louis Bouyer, da semelhança essencial en-

no casa dos Padres J..ulLas. na Pnça San Fedele. oob a prmi­


dôncla de Mona. GalblaU.
CCJll\ a aprovação do Nona. Blnaschl, Bispo de Pinerolo.
reallmu-ae lamWm, poranlc seleta aalst!ncl.D., oulro mrdial
onc:oolnl do Mona. Wlllebrunds. do Pe. Ghljssen • do Secretário
do Movimento "Unltaa". tom oito -'6reo vald......, lendo feito
os ...,preoeotanl.. do grupo cnt61loo urna vlalla à T6rre Pelli<e.

sedo da lgn.jo Voldo..... (Noticia lomedda pelo Pe. Favaro,


S.J., do Milão).
(4) 2ssea enc:onln>s !oram marcadoe para o úlUmo sábado
de cada mh, de março a outubro de- 1960, no Convento elos
Dominicanos de S. Paulo, tendo sido escalados pano falar, altar­
nadamenla, um pastor OV1U111élim o um padre domlnlamo. O
periódico evaqéllc:o "Crilltlalsmo", de maio-junho de 1960,
publica extensa nolk:ia a respeito.

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Ire o seu pensamento a respeito das mais importantes
questões teológicas e a verdadeira doutrina da Igreja.
Pena é que Lutero e Calvino sejam relativamente pou­
co conhecidos pelos próprios teólogos luteranos e cal­
vinistas do nosso século!

Mas o meu intuito não é o de polemizar e muito


menos o de preconizar um ºconcordismo" teológico em
detrimento da Verdade revelada. Urge, antes de mais
nada, se me pemútem o neologismo, climatizar. Q;te
o meu objetivo.

E j' que prometera, no prefácio à 2.ª edição de


meu livro 11AOS IRMÃOS SEPARADOS", focalizar, em pu­
bUcações subseqüentes, vários aspectos positivos do
iirotestantismo, venho agora, animado pelo exemplo
e em plena sintonia com o grande Pontlfice da União,
apresentar, na primeira parte dêste ensaio, um protes­
lanlbmo não apenas teórico e livresco, que na prática
nem existe, mas realmente vivido por alguém, encar·
nado no que possui de mais profundam.,nte evangéli­
co e, por conseguinte, de legitimamente católico.

Católico, sim, visto como, mercê de Deus, uns mais,


outros menos, os ramos em que se dividiu o protestan­
tismo ainda conservam algo da seiva do velho tronco
de que se separaram. Há mesmo, no protestantismo
autêntico, via de regra tão desconhecido quanto o au­
têntico catolicismo, "muito mais, - diz o Pe. Bouyer, -
do que um individualismo desenfreado e negativista:
há um conjunto de fa�res positivos, que são o verda­
deiro principio da vida reUgiosa protestante", e que
'"por uma profunda a"'1ise histórica e psicológica, de­
veremos descobrir", máxime agora, quando tanto se es­
forçam ambas os correntes, no exame leal da motiva-

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ção profunda das respectivas atitudes, por melhor oe
conhecerem para mais depressa se abraçarem, na rea­
lização do desejo do próprio Cristo N"""" Senhor: "Ut
omn.e1 unum. l'int.''

Jenualém, 28 de maio de 1960


Et11ÚPJ:DU CA11DOSO DB ll4DrBzBs

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ELEMENTOS POSITIVOS

' MEDIDA que o tempo pusa e que os cristãos ca­


A tólicos e protestantes se vio conhecendo melhor,
vai crescendo, nuns e noutros, o desejo de afastar 8.9
causas da separação, de criar um clima propicio a um
fretemo entendimento.
Paza tal é mister se impregnem todos dum esplri­
to de compreensão reciproca, de humildade e de amor!
E que se comece pela eliminaçio, nos livros de Histó­
ria e de Apologética, de todos os lêrmos descaridosos,
de qualquer expressão que possa alimentar ressenti­
mentos e eonservar dislantes, indiferentes ou hoslis, os
irmãos que o Redentor deseja unidos entre si, "con­
aumati in unum; et cognoaeat mundua qui4 tu me mi­
dsti" (Jo. 18; 23).
Assim o eompreenderam os dois eminentes reno­
vadores da pedagogia catequética na Bélgica, os
Revmos. Padres J. Buys e G. Delcuve , da Companhia
de Jesus, de cujo estilo, que lhes reflete o esplrlto de
caridade e paz, darei, a seguir, uma ligeira amostra.
Espero, deslarte, preparar o leitor desinformado
das venladeirB.9 causas, próximas e remotas, da refor­
ma protestante, e prevenido, quiçá em demasia, eon-

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tra os dissidentes, que aliás de o serem não têm culpa,
na maioria das vêzes.
!!: ass im que se referem os dois ilustres jesu(las ao
movimento protestante e ao seu principal propugnador:
"A separação protestante data dos tempos moder­
nos. No inicio do século XVI encontrava-se a Igreja
católica em situação critica: escândalos provocados
por papas, prelado.• e snce1·doles, empobrecimento da
teologia, ignorância religiosa, ele. Eslava em decllnio
o esplrilo religioso e uma refonnn se impunha. Mui­
tos cristãos sinceros padeciam com essa situação. Des..
pontava uma renovação. Lidero, monge agostinho,
alma verdadeiramente religiosa mas fogoso de tempe­
ramento, ficou profundamente Impressionado com ês­
ses problemas religi0905 a que se mesclavam suas pró­
prias angústias de consciência. A intuição rundamen­
tal de Lutero, que constitui o elemento positivo da Re­
forma, era rigorosamente ortodoxa: a idéia de que a
salvação é gratuita, isto é, de que não consiste numa
obra (ou em obras) do homem, mas sim numa graça,
um puro dom de Deus, que só a fé pode receber
(Bouyer).
"Infelizmente, a êste principio fundamental incon­
testável logo vieram Juntar-se afirmações que dêle não
decorriam, atribulveis, sobretudo, à filosofia insufici­
ente que dominava no tempo de Lutero, e da qual êle
nunca pôde libertar-se."
Por causa dessas afirmações, "que falsearam t.6da
a perspectiva de Lutero, é que a Igreja teve que re­
jeitar a Reforma."
Quanto .a Calvino, "queria purificar a Igreja e re­
colocar em destaque a idéia da grandeza de Deus. In­
felizmente, foi como um lógico que tentou esta restau­
ração, chegando, assim, a uma doutrina não destilulda
de grandeza, porém rlgida e inumana."

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Relativamente aos esforços realizados üllimamcn­
te em favor da união dos cristãos, assim se expressam
os jâ famosos aulores:

"Entre as Igrejas proleslantes e a Igreja Calólica


as relações Coram frequentes e agitadas. Durante três
séculos, tudo contribuiu para firmar as posições, para
cavar cada vez mais o fôsso da separação. Primeiro,
foram a.s fTUen"G.S sangrenta.s rl4! religião: na Alemanha,
entre Carlos V e a linha protestante; na França, du­
rante tôda a metade do século XVI e no comêço do sé­
culo XVD. . . As perseguiçõe•, sangrentas ou não, en­
tretiveram os ressentimentos: na Inglaterra, sob Elisa­
bete; em Genebra, c:om Calvino; na França, sob Lu!s
XIV . . . As contrO\lérsiaa dos teólogos conduziram à
elaboração de sistemas teológicos: caLólicos de um lado,
protestantes de outro, - construidos todos em função
de divergfncias; deu-se à doutrina um aspeclo apolo­
gético; acentuaram-se as oposições; insistiu-se pouco
sôbre os pontos comuns ou particularmente caros ao
adversãrio.
Alguns exemplos: a teologia católica insistia sô­
bre o aspecto visfvel da organização e da hierarquia
mas não sl>bre a doutrina do Corpo Mlstico; sublinha­
va a distinção entre tradição e a Escritura, mas se mos­
trava muito discreta quanto à ação do &pirita Santo
oa Igreja tôda. Enfim, se houve controvérsias, no cor­
rer das quais cada urna se esforçava por vencer o ad­
vers6rio pela dialética, foram muito poucos os encon­
tros amig,veis."
Depois de salientarem a mudança do.. clima, verili­
coda no século XIX, as tentativas das próprias lgre­
jns crislãs não católicas para refazer a unidade, e a
ln•tltulção da "Semana Universal de Orações pela
uniiln dos cristãos", continuam Buys e Delcuve:

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Diremos, porventura, que unada terl& a lucrar a
Igreja Romana com o contato com as riquezas espiri­
tuais das ouIras confissões? De modo nenhum. Pre­
mida pelas necessidades da época, principalmente no
tempo da Reforma, acentuou a Igreja Católica, de pre­
ferência, tudo o que se refere ao aspecto vis(vel dêsse
Corpo Mlstico, desenvolvendo menos o que os protes­
tantes consideravam com exclusividade: a gratuidade
de salvação, a lnOuência do Esplrito Santo, a transcen­
dência absoluta de Deus.
A união com Roma não significaria, absolutamen­
te, que os valores cristãos autênticos que nossos innãos
separados cultivaram e desenvolveram devessem ser
abandonados. Muito ao contririo, tal união seria para
todos um beneficio: os não católicos se reintegrariam
no meio normal de santificação; e os cat61icos retoma­
riam consciência mais clara de certos valares autên­
ticamente cristãos que êles haviam considerado me­
nos."' O>
Os "elemento• poaitivoa'' do protestantl.!mo, suas
inegáveis "riqueza.a espiritualr'', os "va.lore.s crUtãos
aulênt�•" cultivados e desenvolvidos pelos nossos Ir­
mãos separados, - referidos por Buys e Delcuve, e a
que não qul'remos em absoluto que renunciem, - vê­
Jos-emos corporificados num de seus mais lldimos re­
presentantes, à medida que se nos desdobrar diante dos
olhos, na primeira parte dêste ensaio, sua vida coeren­
temente harmoniosa, cheia de amor e de fé.
E não foi, porventura, um protestante o primeiro
biográfo do Padre Damião, o célebre apóstolo dos le­
prosos? Não era Joergensen protestante quando em-

(l) A lgnja - G. Da.cvn, 5.J. e J. Blml, 5.J., l'd.


Flambayant, 5. Paulo - pica. 198 a 200.

28
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preendeu a tarefa de escrever a vida do Poverello?
Não devemos à iniciativa de um protestante o estudo
científico e mais aprofundado do Santo Sudário? E não
é da lavra de um ministro anglicano, Rev. W. H. Lon­
gridge, um dos melhores comentários que se conhecem
dos Exerclcios Espirituais de Santo Inklo?
Insistamos no.o pontoa comu""; conheçamo-nos e
estimemo-nos reciprocamente; rezemos una pelos ou­
tros com perseverança e fé. E o Pai de Amor abrir6
caminho no meio das mares.

Assis (Itália) - Cidadela da Pro Civitale Chria­


tiana, 22 de julho de 1960.

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LIVRO PRIMEIRO

Do CATOLICISMO PARA O CALVINISMO

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NUMA ENCRUZILHADA DA VIDA

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E
E MANHÃ cêdo já eslava o menino a ler
o livro que um senhor simpático e bondoso
lhe dera.
Que presenle maravilhoso!
De lodos os livros que já lhe tinham vindo às mãos,
nquêle era, sem dúvida, o mais empolganle!
E não o largava. Interrompia, por vêzes, a leilu­
ro de tanto chorar, tal a emoção que lhe causava a nar­
rativa dos sofrimentos do Redentor!
- Que � que est.6 lendo, menino? - perguntou­
lhe o pai, surpreendendo-o agarrado ao Novo Testa­
mento.
E o gar6to, com a mais ingênua simplicidade, lhe
mostra o seu tesouro.
Transtorna-se, incontinenti, a fisionomia do homem
ao dar com o titulo da obra.
- Que?! Você ... lendo iato?...
Fuz.ilando com um olhar indignado o pequenino
réu de doze anos, continua a catilln4ria:
- Um filho meu a ler um livro ... protestante! ...
Nurn gesto de angúatia e de desespêro, arranca das
mios da criança e atira o livro ao fogo.
Estatelado, o coração oprimido, não consegue ati­
nar o pobre menino com o motivo da insólita explosão.

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Afinal, por que aquilo? Não seria, porventura, o
Novo Testamento uma parte da Escritura Sagrada? A
história do Salvador, de Nosso Senhor Jesus Cristo?
do próprio fundador da Religião Católica?
E que vinha a ser is.-;o: "protestante"?
Era a prim1?ira vez que ouvia essa palavra ...
- "Livro protestante"!... Mas . . . aquéle livro é
protestante? Então ... eu também... Sim, eu tam­
bém sou protestante! - dlzia consigo mesmo.
Já se declarava protesla11le sem saber ao certo o
que vinha a ser proleatanriamo.
Esta a gênese da conversão ao protestanlismo do
futuro Pastor Américo Cardoso de Menezes.

O ambiente doméstico em que decorrera a sua pri­


meira infAncia era todo impregnado de piedade. Já ho­
mem feito, lembrava-se, enternecido, da vovozinha a
lhe perguntar num dia de Domingo:
- Américo, você não vai à Missa?
- Vou, sim , vovó. Já estou quase pronto. Então
eu vou faltar à Missa?
Batizado na matriz de sua cidade (Capela, Estado
de Sergipe) , tivera como madrinha Nossa Senhora da
Purificação.
Comprazia-se em ficar, às vêzes, bastante tempo
na igreja, a contemplar piedosamente as imagens sa­
gradas.
Desejou mesmo o sacerdócio, chegando seu pai a
pensar em mand6-lo para o seminário da Bahia. De­
veria ter ido para Salvador em companhia de seu ami­
go José da Moita Cabral, que eonbeci em 1954 como
pároco de Capela e que me referiu o fato que eu ig­
norava. Não se sabe por que deixou de ir, contlnuan·
do na sua cidade aquêle que, normalmente, teria sido
um exemplarlssimo sacerdote. Deslgnios de Deus.

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Cêdo revelara tambo!m acentuado pendor para as

lrlr,.., saindo à mãe, que falecera quando o menino ti­


nhu openas sete anos de idade. Chamava-se Maria de
Mcm1.•us. Eram três irmãs. Todos em Capela conhe­
ciam e estimavam aquelas jovens prendadfssimas, que,
embora morando no Interior de Sergipe, tinham ido
fazer o curso normal na Bahia. Terminados os estu­
dos, volt.aram para a cidadezinha natal, ontle se
casaram.

O pai, Leandro Cardoso, filho de Aogelo de Sant'


Ana Cardoso, que de tão bom o povo apelidara de "Pai
Anjo", era neto dum advogado português, Nenê Car­
doso, que tinha a originalidade de s6 defender "em
causa pr6priaº. Costwnava comprar as causes que
julgasse justas. E como s6 aceitasse demandas de ter­
ras, foi aumentando sempre os seus domln!os, que se
tomaram consideráveis. Mas no papel apenas. Por­
que s6 lhe interessava vencer a contenda. "A conquis­
ta é tudo; o resto, quase nada ..." Nunca expulsou
ninguém de suas propriedades. Quem lá estivesse mo­
rando, poderia continuar onde estava, lranqililamente.

Como diz.íamos, o menino Américo afirmara-se,


Jogo nos primeiros anos, um Intelectual, e de estrutura
acentuadamente religiosa. Ensinando-lhe o mestre-es­
cola de Capela tudo o que sabia, incutiu-lhe tambo!m
um grande amor aos livros. Por isso é que o fomos
l'ncontrar, aos doze anos apenas, a perquerir as Sagra­
da• Letras, ansioso por penetrar nos arcanos divinos.

Pela atitude do pai, pode-se imaginar o grau de


cultura religiosa da média da população sarglpana no
úllimo quartel do século XIX. Como em todo o lnte­
l'Íor do Brasil, a religião popular era um sincretismo de
<'r<'nçu< cl'i•IÕs, de lendas e superstições. A instrução

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doutrinária não passava dos rudimentos de wn cate­
cismo apenas decorado e muito mal ass imilado.
Não é de estranhar-se haja penetrado o calvinismo
" criado ralzes em tantas cidades brasileiras. Numas
por falta de padres. Noutras pela carência de sacerd<>­
tes intelectualmente preparados. E em muitas pelo
descrédito em que caira o clero, cuja vida moral, em
certos lugares, ao que se dizia, com ou sem razão, fre­
qüentemente deixava a desejar.Ili

(1) A exata cornpl'ffnSâo de cutos fatos históricos exige


nos traslademos mentalmente à � em que se deram. O emi­
nente Pe. Dr. JÚLJD M.uu. n y.....,. CAm<KDO, C.SS.R .• ""'
seu livro O Catollrio!no"" BNUil, (eJ. Agir, 1950, Pll· 19 e &ep.l.
a que remet.emos o leoilor, focaliza os desaatrolol resultadOI do
regalismo, que determinou o enfraquecimento das ordens reli­
giosas. o desprestigio do clero e a proliferação do racionalismo
l' do cepllclsmo nas classes diria:entes.

A "união" entre os dois poderes escravir.ou a I@:reja e redu­


ziu ao mlnimo • sua inftufncia.
..No completo abandono espiritual em que vivia - observa
lambém o ilustre hlllorlador C6nego Raimundo Trindade -,
longe de seu biapo, de quem o traz.ia apartado, menoa que u
grande& dlstlndu. o regime aafüdanle do padroado, queo conb'o­
lava sistemàticamente todo ato epist'Opal tendmte a corrlglr '111
clérigos pervlcazes na Indisciplina, desajudado e deoomado, é
de surpreender não houvera feito hae clero bancarrolm tolal.
Aürado ao mundo sem formação espiritual que o mantivesse à
altura d e 1et1» compromissos, porque não üvera seminário; R."111
amor ao Ntudo que o enlreliveue, porque aprruu iniciado nu
letras; aem aiUmulos que lhe aoergueaem o moral porventura
abaUdo, porque pouco virtuosa a soei� do seu tempo"• .nio
.se poderia wperar e t>xigir muito do dero de então. (Vide
Arquldlocirae de Jfaria11a - 2.ª ed., Lº vol., pás. SS).
E o resultado foi a degenerescência do culto calóUco, o
11rolanação du cerimônia da ltlnl•, o rebaizammto do púlpito
• o anlqullammto do omlno rellliooo.

A vista das informações que temos cio estado de completo


abandono t'tlplritual em que Jazia mlio o DOllO povo, podnnos

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Nunca soubc dizer Américo de Menezes se era de
l'dição protestante ou católica o exemplar do Novo Tes­
lamento que lhe mudou o rumo da vida.
Em se !ralando, aliâs, do Novo Teslamento, estaria
a diferença essencial nas notas explicalivas. que anti­
gamente as edições protestantes não tinham e que ago­
ra estão começando a trazer, às vêzes até mais e><len­
sas do que as das edições católicas, e que ª" antigas
edições católicas traziam bem desenvolvidas e agora
aparecem cada vez mais sintéticas e breves. 1: de crer­
se, todavia, que se !ratasse realmente duma edição pro­
testante, pois naquela época não faziam mesmo o empe­
nho que hoje fazem as nossas autoridades eclesiâsticas
em divulgar entre a gente simples o texto blbllco. Rea­
gindo contra o exagêro dos que, proclamando a Escri­
tura Sagrada sua única e suficiente regra de fé e prá­
tica, chegavam ao ponto de desprezar, ao menos teõri­
camente, t6da tradição patrlstlca e mesmo aposlólica,
calram, por sua vez, os católicos no exagêro oposto, de­
sinleressando-se pràticamente pela difusão não só do
Antigo, - deveras nem sempre ao alcance da compre­
ensão do povo, - como do próprio Novo Teslamento,
mais acesslvel e com que todos se deveriam fami­
liarizar.
Como entre certos protestantes acontece em rela­
ção à bem-aventurada Virgem Maria, surgiu também
entre os católicos latinos como que uma estranha aler-

lt'r uma id�ia ma1s esatA do ambiente rellglOIO dwna cidadl!Z..l­


nha pt:'rdida no interior de Sergipe; e compreender melhor o que
dl..., o grande teól- Karl Adam: "A prelensio que tem a
lan.-ja dr ser a lnstltulção e.xcluaiva de salnção nio impede, tle
nuanrira nenhwna, a Justa e beMvola apreciação das CODdJçõel
•ubJL•cUvu e das cln:unstinci.u an melo du qu.a.111 pode nucer
uma ht:"rnla" (Eulncio do Cafollclnno. ed. Vozes. pg. 189).

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Kia pe la Bíblia. Desdenhosamente foram apelidados os
proteslantes de "o• blblia•". E, até algum tempo atrás,
<1uem citasse em conversa a Blblia Sagrada, era logo
suspeito de ... heresia.

Hoje, felizmente, jã não é mais assim. Multipli­


cam-se, entre os católicos, semanas blblicas populares,
exposições blblicas, c:oníerfncias e cursos sôbre assun­
tos escriturlsticos, associações para estudos blblicos, es­
colas blblicas dominicais, etc. Instituiu o Episcopado
Nacional o ºDia da Blblia", que passou a ser conveni­
enlemente preparado em muitas dioceses por uma "Se­
mana da Blblia", e depois pelo "Mês da Blblia". Edi­
ções cal61icas do Livro Divino, sobretudo do Novo Tes­
tamento, sucedem-se cada vez mais primorosas e ao al­
cance de todos. Depois da reação exagerada contra
certos exagêros, o bom senso, o equillbrio.

lnegàvelment.e desastrado o zêlo daquele pai católi­


co, apostólico, romano e ... sergipano. Julgando estar o
filho a 11envenenar-se" com algum livro contrário à ver­
dadeira Fé ou aos bons costumes, deveria ter agido dife­
rentemente; por substituição. E se acaso fôsse falsa, in­
completa, ou simplesmente não examinada pela auto­
ridade eclesiástica e por isso não aprovada aquela edi­
ção do Novo Testamento, desse-lhe outra com o compe­
tente "imprimatur". Mas, - coitado! - se êle também
pensava que a Blblia era um "livro protestante" ...

E ser .. protestante" era o mesmo que ser ateu, era


ler parte com o próprio Diabo ... como ser católico, ain­
da hoje, para muitos protestantes zwinglianos mais ex­
tremados e menos esclarecidos, é ser id6lalra, pagão e
ap&.iata...
Incompreensões e preconceitos provenientes de
desconhecimento reciproco.

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Faltam-me dados do perlodo que se sucedeu, d"
quase dois anos. Sabe-se que o menino, bem precoce
na manifestação de seus dotes intelectuais, redigia nes­
sa época um jomalzinho literário, de que ainda existe
um exemplar; e que, proclamado "protestante" pelo
próprio pai, acabou por descobrir um verdadeiro pro­
testante, com quem travou relações e que lhe deu um
folheto de propaganda evangélica e outro exemplar
do .. . Novo Testamento, que continuou a ler clandes­
tinamente.
Estabelecera-se invenclvel incompatibilidade en­
tre pai e filho, unicamente por causa de. . . Nosso
Senhor Jesus Cristo!
Atingida a maturidade dos .. . catorze anos, ei-lo
embarcando em Aracaju para o Rio de Janeiro, onde
pretendia preparar-se para fazer o curso jurldico, num
ambiente em que pudesse respirar, em que houvesse
mais "liberdade de consci�cia".
O próprio pai lhe pagou a passagem.
Foi, aliás, o último dinheiro que lhe deu.

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"PtU! PtU! TIRA O CHAPtU!"

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NTEIRAMENTE s6 no mundo, profunda­
mente e cada vez mais apaixonado por Nosso
Senhor Jesus Cristo, conhecendo do catoli·
cismo apenas uma caricatura, desembarca o
jovem sergipano no Rio de Janeiro.
Consegue empregar-se de tipógrafo, passando a Ira·
bulhar de dia e a estudar à noite.
Vêm-lhe às mãos vArias publicações esplritas, que
lê e põe de lado: Kardec nii.o lhe satisfaz as aspirações
espirituais.
Um senhor protestante, com quem trava conheci­
mento na pensão em que mora, leva� sucessivamente
às igrejas batista, melodista e presbiteriana. Desta
era pastor o Rev. Alvaro Reis, com quem simpatizou
imensamente.
Alvoro Reis estudara com missionArios protestan­
tes norte-americanos. Jamais conheceu também o au­
têntico catolicismo, tal como a tantos milhões de cren­
tes evangélicos acontece.<ll

(1) t das mais curlosu a Pnme da "conversão" de Alvaro


Rei!. ao protestantismo. tle mesmo contou o fato do púlpito da
hi:reja presbiteriana da Rua SUva Jardim.
Pttkncla a wna Iam.Ola ''multo católica" . . . Um d.la seu pai
ndO<'tt. E o aer6to, "devotlssimo de Sanlo Ant&nio", põe-se o

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Como pregador era de fato fa.'ICinante e persuasi­
"º· Arrebatava os auditórios, sempre numerosos, que
rorriam a ouvi-lo todos os domingos ao templo da Rua
Silva Jardim, então Travessa da Barreira.
Entre os ouvintes embevecidos estava o jovem
Américo de Menezes, que também passou a freqüen­
tar a Escola Dominical.'lJ

rezar . . . e fu uma novena . . . e uma treuna ... E o pai pioran­


do aemptt. Por fim, desespera o ••devolo'' e passa para o terrrno
du amnçu: "'Santo Antônio, - H' nio C'W'ardes meu pai, ru
me fa\Q... proteslant«'."
E o pai. . . acaba morftDdo!
Fica profundamente deprimido o jovem Alvoro. ilt que a
ameaça nio era para valer, ..
- Mu... eu me fazer. .. protestante? Que colu fela ser
protestante! Mas, nio posso voltar all'ú:. prometi a Santo Antó­
nio ...
!!??
E foi oalm que o n1pulnho o.cabou por proc:unr contado
com as pro-.ites, que o receberam num das """ oo"slas
e o educaram, tomando-me ile, depois. o mais eloqGente ptt­
pdor proleslaDte do Brmdl nas fim cio Hculo XIX e nos prlnei­
ploo d&de Maalo. Por devoçio o Santo Ant6nlo • . .
(2) Em oeu livro L'O/leulvo de• N<I••, i p6g. 426 e oegs.,
fu o R. Pe. H. Ch. Cháy, O.P. uma oboel"Vllçio multo original:
i! que um oat4lloo, pouoo versado no oatollc:lamo, oo aderir a
uma ..denom.lDllçio" proleltante, nio o faz. via de reara. por se
haV1!1" convencido de que eota ou aquela doutrina sustontada
por - � Rja, de fato, o doutrina verdadeiro. Pri·
meiro lidere; l.Dtepa-1e no pupo; depoU f que aprmderá A
discemlr a daulrina que a sua Jpeja prep da que o ca&oUcis­
mo enalna, ou que lhe dizem que enalna, bem como du que
sustentam u domola "d..,..Jnaçõeo" evan16licu. Aceltari meo­
mo qualquer cloutrilUI, "dado que opreoenr.do num clima favo­
rável." Esta oboerv� fornece -to pua um atudo dm
""'"'ln�--

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/\ l•:••·olu Dominical é a instituição a que mais deve
11 proh•,.hmtliunu, que, sem ela, talvez jã estivesse re..
d111 1ilu u ht.•m modestas proporções. Ministram-se as au-
111• l•Mlo• "" domingos antes do culto público da co-
111unld•1le. O. alunos são distribuldos em várias clas­
'""· c1� acôrdo com as respectivas idades. As lições,
1••1l•M•IMi<·amente dosadas para as crianças, para os jo­
''''""· pum os adultos, dão aos estudantes apreciAvel
o•onheclmento prático do texto da Blblia, que, no de-
1·uno de sete anos, é t&la l"l!Jl"SS8da, do Gênesis ao
/\pocalipse.
Todavia, com a instrução religiosa também se
transmite uma profunda prevenção, às vfzes ódio mes­
mo, contra a Igreja Católica, tida por todo protestante
daquele tempo, e ainda hoje pelos mais Iconoclastas,
como urna igreja desviada da pureza primitiva, cheia
de inovações doutrin!rias, idólatra e paganizada.
Contribu[a ainda para prender o "catecúmeno" o
ambiente espiritual e social do evangelismo nascente.
Levava-se a sério a religião, que tinha fortes ressa ibos
do antigo puritanismo escocfs.
Os deslises em matéria de costumes eram punidos
com enérgicas advertências, e, não raro, com penas
maiores, de 5USpensão temporária ou excomunhão.
E, por serem pouco numerosas as comunidades,
todos se conheciam e eram sempre visitados pelo pas­
tor, notadamente os que faltassem ao culto. Nesse
caso ia logo o pastor ou um presbltero à casa do irmão
rnfémio. Porque certamente adoecera, do corpo ou
da alma . . .
Qualquer pessoa que pela primeira vez aparecesse
no "culto" era cercada imediatamente das maiores
atenções, e de tal modo envolvida e catequizada que,

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não raro, em pouco tempo fazia também a sua "pro-­
fissão de fé."'''
Para os jovens funcionava já a Associação Crist.ã
de Moços, que não era um simples clube desportivo,
como é hoje em muitas cidatles, mas uma aglincia de
proselitismo das mais eficienles. A sua frenle estava
um personagem realmente notável pela sua retidão de
uráter, pela sua piedade, pela simpatia pessoal que ir­
radiava, pela sua sinceridade, e, por isso, dotado de
Imenso poder de persuasão: Myron Clark. Foi fie um
daqueles pioneiros do protestantismo no Brasil, que de­
veras renunciaram a um padrão de vida muito mais

(1) No .Wto do tipo "reformado", ou calvlnlata, o &ennão


é precedldo de leituras da Escritura, enquadrado t!ln hinos e
preces, e vena aenJmenta s6bre as verdades do Cndo, o papd
da oração, ela meditação, da obedifncla, da renúncia, doo 1ran­
dC1 deveres do cristão, e, adma de tudo, da necesaldade do H
viver segundo a ff.
O ato religioso fundamental que ae procura Implantar � •
leitura diária da Blblill, ou ao menos dos Ev1111golhm, leltun
medltada, multo pattclda com a ltttlo dhrlu doa moslelrol me­
dicvnl8, uma lcltur:ii que leva à oração pouoal, geralmente es­
pont.6.nn na fonna. Nio fallaln, enlret.nnto, fonnul.f.riae ande
buacar implraçio para u oraçóet ''l"llpont.lneas", que de tão
rapeUdu lendem • ae Nlwlollpar na mcm6rla. De qualquer ma­
nelra, pottm, o qua buACam na leitura l.Jfbllca e na oração
ó ouvir a voz do Dvua e falar-LJ.e dlretamrntr.
Pelo �nlào dOI prcodos dne começar uma vida santifica­
da, o próprio vida do J..uo Crllto no alma ndlmlda; - esta
a irando preocupação du olmao lntnlores do protestantilmo.
No prtlllco, om que pesem certao afirmações dl>! aeua teólo­
gos, a graça do Daua em Cristo Jesus ê encarada como um
podrr de" 1ron.1Jonn.aÇ'âo cio "°"° •Ir e da nossa vida, e não
como dllpenaa d.... tnuufonNJçio.
Numerwu, pola, e lneiláveia u oobrevlvh>du do catolicis­
mo no protaotantilmo �. (Pe. Lo018 BovYllll - O.. ,.,.._
IHlantlrme d l'Eglile, PI• 5 e -.) .

-48
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elevado do que o que vierwn a ter, ou na "cidade proi...
bida", que era o Rio de antes de Oswaldo Cruz, temida
,
por todos como 11a lerra da febre amarela ., ou no in­
terior do Brasil, onde, aMm do desconlôrto material,
tinham de lutar contra a hostilidade do povo e a rea­
ção natural do clero, nem sempre multo cortês . . .
No "centro de debates" da Associação Cristã de
Moços desenvolveram-se notàvebnente os dotes orató­
rios de Américo de Menezes.
Cada vez mais convicto de haver achado o cami­
nho certo, resolve, afinal, ingressar oficialmente na
igreja presbiteriana.
Foi um dia de festa espiritual para o seu coração
juvenil e ardoroso aquêle 12 de outubro de 1902.
Álvaro Reis prega eloqllentlssimo sermão, que ar­
ranca li\grimas à entusii\stica assistência.
Ap6s o culto, como de praxe, abraços, paraWns e
votos de perseverança na fé. Tôda a comunidade des­
fila para cumprimentar o neoprofesso.
Pode imaginar-se em que estado de espirita vol­
tava naquele domingo para casa, lendo, absorto, no
bonde, a sua Bíblia, o piedoso rapaz.
Súbito, vê-se violentamente puxado do veiculo e
esbordoado por um grupo de desalmados que vocife­
ram: "Péu! Péu! Tira o chapéu! Péu! Péu! Tira o
chapéu!
t que o bonde fôra envolvido por uma procissão.
E o adolescente, de 16 anos, estava e permanecera com
o chapéu na cabeça . . . De resto, não era para êle uma
"idolatria" aquela procissão, algo semelhante, na apa­
rfmcia, à que faziam em honra da deusa Diana os pa­
g1ios de tfeso? Lembrando-se de São Paulo, preso por
não cultuar os ldolos, rejubilava-se Intimamente ao se
ver prisioneiro também e levado, como foi, para um

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distrito policial! E logo no dia feliz de sua "profissão
de fé!" Era, sem dúvida, uma graça do céu!<•>
Enquanto, no meio de contraventores e de crimi­
nosos da pior espécie, espera o delegado, que viria li­
bertá-lo muitas horas depois, abre o Livro, "o Livro
protestante'', e põe-se a lê-lo com amor e reverência.
Folheia o seu Hin'rio e canta, mentalmente, alguns
daqueles hinos, que são verdadeiras imagens auditivas
e que nutrem, h6 quatro centúrias, a piedade evan­
gélica.
Medita no inesperado incidente e compadece-se
daquela multidão, mergulhada, a seu ver, na ignorãn­
cia religiosa, nas "trevas da idolatria".
Sente-se, então, interiormente chamado para "pre­
gador da Palavra de Deus". Era mister libertar oquê­
le povo pela pregaçào do Evangelho puro de Nosso
Senhor Jesus Cristo, a Quem prometera, solenemente,
ser fiel até a morte.
Renuncio ao projeto de "" fonnor cm D irei to e re­
solve lazer-se "Ministro do Evangelho".

(4) AA procluóel rellgiOIBI, que OI judru• (azJAJfl, como


ae lê na Escritura Sqnde, castumam ser, nos pa&.e. lalinM,
uma demcndnção públ.Jca e coJeUva de '"'' um• homanatftn
-1ar a J..... Cn.to, como a que oe fb no Domlnlo de Ramos.
quando mirou o Salvador triunfalmente om Jeruaaüm.
Evidentemente o grupo que cermu o veiculo em que viajava
!""""' protalante Dia era COD!tltuldo de cat6U- piedosos •
o
CDDICienta.
Allú, o pr6prlo ap6otolo S. Joio, quando ainda pouco es­
dueddo, pm-leu fuer descer fOllO do �u ,.,b,.. oo amarita­
,_ que ae --.m lndiferenlel e desrapeitosos para com
Je1U1, que paaav. . . .

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t:, num transbordamento de caridade cristã, reza
�""' " lrrvor habitual pela conversão daqueles cujas
v•ir.r•lho parecer6 ouvir durante 16da a vida: "Plu!
'''"' Tlra o d1aplu!"
F.otova decidida uma vocação.

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POR 200 ru:IS DE BANANAS . . .

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EPOIS do epl.s6dio do dia de sua profissão
de fé, procura o Rev. Álvaro Reis para lhe
comunicar a decisão que tomara de estudar
para o Santo Ministério.

Indaga o venerando pastor das disposições intimas


do jovem paroquiano. E, rejubilando-se com a sua re­
solução, sugere que escreva ao diretor do "Ginásio
de Lavreº, pertencente à Missão norte-americana do
Sul de Minas. Era Reitor do Ginásio um grande pe­
dagogo, o Dr. Samuel Gammon.
Espera pacientemente pela resposta durante . . .
dois anos!
l!: que lhe desejavam experimentar a vocação. . .

Perlodo heroico aquêle!

Membro prolesso que era agora da igreja evangé­


lica, pesar-lhe-la a consci&ncia se trabalhasse no Dia
do Senhor, dia que se deveria santificar pelo descanso,
pelas obras de misericórdia e pelo culto divino. Como
proceder, porém, se t6das as casas comerciais e t&das
as demais emprêsas funcionavam no domingo?

Confiando em Deus, disposto a arrostar com t&las


os •-on.o;eqüências de sua atitude, resolve não mais tra-

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balhar, em hipótese nenhuma, no dia santificado.<11
E passa a procurar um estabelecimento cujo pro­
prietário "respeitasse a Lei Divina ".
Resultado: três meses desempregado!
Vão-se-lhe as pequenas economias, a ponlo de se
ver, em pouco tempo, sem vintém no bolso. Certo dia,
para matar a fome, empenha um seu componedor tipo­
gráfico por duzentos réis (vinte centavos) de bananas,
que vai comer à sombra das árvores do Passeio Públi­
co, perto do largo da Lapa.
Enfraquece-se-lhe o organismo.
Vitimado pela pesle bubônica, que assolava a ci­
dade do Rio, interna-se no hospital-isolamento de Juru­
juba, do outro lado da Guanabara, além de Niterói.
Fica ali por mais três meses em luta contra a mor­
te, que todos os dias levava alguém; aliás, mais do que
a doença, matava a inanição.
Felizes os que podiam atirar algumB!I moed&!I ao
padeiro, que, em troca, arremessava, por cima do
muro, um pão que o diabo 11ma&11Jr11 • • •

(1) Não viRORva ainda a lei, promulpdlo depola por


influência da própria Jcreja e por lnlciallvo de parlamentues
católlcoo, determinando o fechamento do c:omúclo e dao fábri­
cas eos domlngoo.
Para ao luteranos, allú, o U11!11dal é o mmperedmento dos
fHu ao culto; j.i .. calvinlltu, maio lm� do esplrito doo
"pwitanoo" da Nova Inalatern. pardavam. zelOAD>eDle, a lei
mosalca do deacanso 1abiUm, aos dcn.Jnaoa . . .
Apeoar de - farilaillmo em que calam alllUJll e da ln­
tnm11fncia mm que. embora progondo a aalvaçio 1811 obras,
ezlglam a oblervincia estrila da Lo!, ""'• ...,.. dúvida, edlli­
c.nle a maneira pela qual a maioria dos ev11n1élloos daquele
tempo proeurava KUAnlar o "Dia do Senhor".
O nosao jovem, então, sempre coerente e aftrmaUvo, e que
aos 18 anom ji 1ahen. tanto para ser "fiel • Jesus Cristo", pro­
cedeu de lato hen>lcamente.

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Mas o Pai do céu leve misericórdia dêle e o curou.
Volta ao Rio e continua a procurar o tal emprêgo
com que sonhava: em que não fôsse obrigado a infrin­
gir a Lei do Senhor, em que pudesse guardar e santi­
ficar o domingo.
Acaba por obter um lugar de caixeiro entregador
de compras no armazém de sêcos e molhados do "ir·
mão Perez", que, sendo crente evangélico, cerrava aos
domingos as porlas de sua casa comercial . . .
E eis o jovem orador, filho duma familia abasta­
da, que o renegara por causa de suas convicções, a car­
regar um caixote à cabeça, com o feijão, o arroz, as
batatas dos fregueses do "seu" Perez.
Exultava, porém, em seu coração.
E continuava a pedir a Deus que lhe abrisse uma
porta para que pudesse realizar o seu ideal: o de es­
tudar para o santo ministério.

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NO CABO DA ENXADA

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FINAL, cfrca de dois anos depois de so
haver candidatado a uma vaga no Ginásio
de Lavras, recebe a carta que tão ansiosa­
mente esperava.
Seria admitido, na qualidade, porim, de "estudan­
te pobre", o que s.ignlficava que teria de pagar os es­
tudos com o próprio trabalho.
Não seria essa a dificuldade.
Attuma em duas maletas tudo o que tem e parte
para Lavras, onde regularizar6 e terminará o curso de
bacharel em ciências e letras, exigido para ingresso no
Seminário Presbiteriano.
Era no campo, na horta do Ginásio, que deveria
trabalhar para prover o seu sustento.
Faziam o mesmo v&rios outros "estudantes po­
bres".
As vêzes, para estimulá-los, ia também para o la­
voura, de enxada na mão, o próprio diretor do Giná­
sio, o Pastor Gammon.
Nos primeiros dias sofreu um pouco o novo 11lra­
balhador rural". Calejaram-se-lhe, porim, as mãos; e
acabou por afeiçoar-se ao serviço, que fazia por amor
de Deus e com propósitos sobrenaturais.
Em pouco tempo passou a ser o primeiro a termi­
nar o tarefa diária. E logo desaparecia.

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Cerln vez, um colega seu, Júlio Nogueira, que vi­
ria a se tomar ilustre tribuno, segue-lhe, curioso, os
possos para ver o que ia fazer, sbzlnho, num bosque
próximo.
E estaca, admirado e edificado: numa pequena
clareira da mata, ajoelhado, Américo de Menezes ora­
va fervorosamente.
De tal modo se impõe pela aplicação e pela vir­
tude que é "promovido" a regente de estudo.
A 2 de junho de 1908, com 22 anos, ant"" de con­
cluir o sexto ano do ginásio, casa-se com a sua pro!es­
s6ra de ingl@s, terminando o último ano como profes­
sor de turmas mais atrasadas e diretor do lntemalo.
Essa professlrl a de ingl@s era a srta. Maria Isabel
Rush O'Grady, muito querida dos missionários america­
nos de Lavras, que, admirando o jovem bacharelando, de
certo modo promoveram, e facilitaram mesmo, a rea­
lização do casamento.
Um epi.s6dio pitoresco assinalou, no anedotário do
lnstiluto Gammon, aquela festa nupcial.
Celebrava a cerim6nia o Rev. Dr. Horace Allyn,
médico e missionArio.
Descera a noile.
Súbito, um curto-circúito apaga tôclas as luzes.
E, segurando numa dOll mãos uma vela acesa e o
livro na outra, pcrgunla, solenemente, com o seu sota­
que carnclerlsticamenle yankee:
- lsabela, nttlla Amt!rico corno seu marido?
- Sim.
- Am�ricn, oceit.A lsabela como sua marlda? . . .

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"APASCENTA AS MINHAS OVELHAS" . . .

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OM DISTINÇÃO em tôdas as matérias,
termina o CUJ'SO de ciências e letras, que,
naquele tempo, inclu!a também o estudo de
alemão, grego, hebraico, lógica, psicologia,
pedagogia, etc.
Eleito orador da turma, pronuncia notável oração
na solenidade de colação de grau.

Escreve-lhe do Rio um primo rico, farmacfutico


e industrial. Em vista do hito alcançado pelo jovem
bacharel, oferece-se para custear-lhe o CUJ'SO de medi­
cina. Que fôsse com a esp&a para o Rio e nada lhe
faltaria.
Poderia, de fato, ser médico e pastor. Nada obs-
tava a que, terminado um CUJ'SO, fizesse '?"·
Não seria, porém, essa proposta uma tentação?
Vai resolver o assunto na oração.
Pede as luzes do Alto e depois abre, ao acaso, a
sua velha Blblia, companheira insepar6vel de tantm
anos. E dá com os olhos nas palavras de Nosso Senhor
a S. Pedro: "Apascenta as minhas ovelhas."
Tomando isto como resposta, decide entio: vai
Imediatamente para Campinas; sua vocação é mesmo
a de pastor.

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fün Campinas, Estado de S. Paulo, funcionava o
Srmiru\rio Presbiteriano, onde deveria fazer, como fêz,
todo o curso filosófico e teol6gico.
Enquanto cursa o seminário, em que reside com
suo esp&a, leciona também num educandário da cidade.
AI lhe nascem dois filhos: Eurlpldes e Américo.
Findo o curso, vai a Caxambu, onde se reúne o
"Presbitério Sul de Minas", que o ordena "ministro
do Evangelho" a 13 de julho de 1912.
Eleilo, a seguir, pastor da Igreja Presbiteriana de
Lavras, transfere-se para aquela cidade e assume o
pôsto.
Desenvolve, então, intensa atividade pastoral, in­
terrompida uma vez apenas por uma viagem que faz
a Sergipe para rever o pai. �te, orgulhoso da libra
e dos triunfos Intelectuais do !ilho, com quem se re­
conciliara ao ponto de se fazer protestante Lambem ( ! ) ,
ainda entrega aos seus cuidados outro filho seu, Ju­
cundino, do segundo matrimônio, que vem para Lavras
em sua companhia, com �le vivendo até se bacharelar.
De volta a Lavras, agindo como zeloso cura d'al­
mas, passa a visitar regularmente todos os paroquia­
nos, de quem se torna o guia e o conselheiro queri­
dl.ssimo.
Empregando grande parle do tempo na oração e
em leituras espirituais, prega com grande unção e efi­
cácia. Orador fluente e persuasivo, não se lhe perde
uma silaba. Fala de modo claro e simples. As vêzes
parece um trovão! Outras vêzes, a brisa suave que
murmura docemente. t uma delicia intelectual e um
refrigério espiritual ouvir aquêle homem de fé.
Como pastor de Lavras tem ainda a seu cargo nu­
merosas congregações em outras localidades, que visi­
ta freqUentemente, viajando de trem, a cavalo e, às
vêzes, a pé.

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v..... vlMll�ll!I a pé começaram após um pequeno
•111·11l•11h• r.om uma veneranda missionhia norte-ame-
1 11·01111, 11111110 piedosa e ilustrada, professara de latim,
N• •N"• lll'hralca, alta matemática e até de português:
Mi... Carlota Kemper, que, se houvesse nascido católica,
h•1 IM •lclo, ..,m
dúvida, exemplarlsslma religiosa.
Cmtmnava, porém, a missionhia ir à igreja, BO!
1lnmln11ot1. num carro puxado a cavalos.
Oh•<rva-lhe delicadamente o pastor, antigo aluno
•••11, r1ue nõo julga 16 muito edificante ir a mission6ria
ti• oarro para a igreja no dia de Domingo. A distAn-
1·10 l• �quena. Todos costumam fazê.la a pé; inclusi­
vo• a mission6ria nos dias de semana. Não vê por que
111.•upar o cocheiro e os próprios animais no dia santi­
locndo e sem real necessidade.
- Mas, então, por que não vai também a pé, pnra
Ribeirão Vermelho, o Rev. Américo, quando tem de
pregar 16 no dia de Domingo?
Ser6 f6eil retrucar. Prefere, porém, responder de
modo mais expressivo:
- Pois doravante, quando tiver de pregar em Ri­
beirão Vermelho no dia de Domingo, o pastor não via­
jará mais de \rem: irá. . . a pé.
E dai por diante, embora tenha um cavalo para as
suas freqUenles viagens a localidades vizinhas, fá-las-á,
oos domingos, a pé, 11para não escandalizar os fracos".

Nunca possuira o Rev. Américo um sobretudo, que,


ali6s, lhe fazia bastante falta nas noites frias de inver­
no do sul de Minas.
Regressando dos Estados Unidos o Dr. Benjamin
Hunnicut, mission6rio-diretor da Escola Agrlcola de
Lavras, traz-lhe de presente um excelente capote.
F..treando-o, vai visitar um p�to velho, paroquia­
no M'U, que morava no alto de um morro, onde s6 se

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conseguia chegar depois de se atravessar extenso la­
maçal.
- Então, como vai, sr. Tibúttio?
- Vou indo, Reverendo; como velho e, agora,
doente.
- E parece que está com frio, pois não?
- Mas Isto não tem importlncia; o principal é es-
tar na graça de Deus, não é verdade?
- Sim, não bai dúvida; mas vou lhe dar um pre­
sente. Isto lhe vai servir de cobertor e sobretudo ao
mesmo tempo.
Juntando o gesto às palavras, tira o sobretudo e
cobre com êle o prêto velho.
- Mas . . . Reverendo! . . . O Sr. precisa dêle! E
está chovendo, está fazendo frio. . .
- Não falemos mais nisso. O capote já não me
pertence mais.
E, depois de fazer uma fervoroaa oração pelo en­
fêrmo, sai, debaixo de chuva, descendo o morro enla­
meado, de volta para casa, feliclssimo por ter dado al­
guma cousa a Quem havia dito: "Tudo o que fizestes
a um dhtes mais pequeninos a Mim o fizestes • . . "

Certa vez, regressando de S. Joio Nepumuceno,


chegou a Lavras, depois de andar sete léguas a cavalo.
Vinha jantar e, logo depois, pregar, pois era noite de
culto.
Encontra, porém, na casa pastoral, à sua espera, o
velho soldado Souza, veterano da guerra do Paraguai.
Trouxera, além do seu, mais um cavalo para levar o
pastor até a sua casa, distante de Lavras umas oito
léguas . . .
Sabia que vinha pedir um sacrificio. Não via, en­
tretanto, como resolver doutra forma o seu problema.
f: que o seu filho Joio, antigo colega do Rev. Amm­
co no Giná5io, andava esquisitlssimo. Duma hora para

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rnolln, tornava-se agitado. E era muito freqilente de-
1umcl11r a witar, a dizer palavras desconexas. Não se
l><Klin muL• donnir naquela casa. E não c:omentia o
moço que algubn o tocasse. Parecia posses.so
Lembrara-se, então o pai aflito de procurar o pas­
tor, de pedir que f&se ver o rapaz e rezar por fie.
E lá se foi, depois do culto, o bom pastor, pela noi­
te n dentro, em companhia do velho Souza.
Chegam, após uma lonp e penosa jornada.
Alegra-se o moço ao ver o antigo condisclpu]o.
Logo se afasta, porém, gritando desesperadamente:
- Não me toque! Não me toque!
- Mas, João! Eu sou o seu amigo Américo. Vim
de propósito para visitá-lo. Vamos, dê-me cá um abra­
ço. Vamos conversar. Tenho muito que conversar
com você.
- Não me toque! Não me toque!
- Fique sossepdo, João. Al6m de amigo, sou
também o seu pastor. Vamos f117.er uma oração.
E ajoelhou-se, derramando a sua alma numa da­
quelas orações de que nunca se poder! esquecer quem
uma vez as ouviu. i que êle falava mesmo com Deua.
Imediatamente ficou tranqiülo o moço, completa­
mente calmo, cessando para sempre aquelas estranhu
perturbações.

Am.!rico de Menezes foi sempre, e acima de tudo,


um apaixonado por Nosso Senhor. E, por isso, um
homem de oração.
Sua vida no lar era exemplarlssima. Carinhoao
pnrn com a familia, - acrescida então com o nascimen­
to de uma filhinha, Irene, que faleceu três dias depois,
" de um menino, Honicio, - educava-a cristãmente,
"nu Lei do Senhor".

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Contava aos filhos, em linguagem simples, adapla­
da à sua mentalidade, as histórias da Blblia.
O "culto doméstico" reunia logo cêdo, anles do
café, em tamo da mesa, a familia tada.
O chefe da casa presidia o culto. Cantava-se, de
inicio, um hino religioso; lia o pai, a seguir, um salmo
e um outro trecho da Blblia, que comentava de modo
ameno e sugestivo. Aliás, lia @le a Escritura com tan­
ta alma, com tanta expressão, que era quase desneces­
sário comentá-la. Foi com êle que aprendi a fazer a
"composição de lugar" para a oração mental.
Após a pequena palestra, outro hino, a que se se­
guia a oração, que cada um fazia, espontlnea, a come­
çar do menorrinho e acabando pelo chefe da casa.
E com o "Pai Nosso", rezado coletivamente, aca­
bava-se o culto. Todos, então, se abraçavam e se bei­
javam. E passava-se ao café.
Era dessa maneira que começavam os dias na casa
do Rev. Américo de Menezes.

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"A CASA DOS ESCORPIÕES"

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ELO HORIZONTE - 1915.
Desenvolvendcrse ràpidamente a nova
capital de Mi.nas, deliberou a Igreja Presbi­
teriana fundar ali uma comunidade, a e1<em­
plo do que j' tinham feito os evangélicas metodistas.
Renuncia, então, o Rev. Américo ao pastorado da
Igreja de Lavras e aceita o p6sto diflci1 de pioneiro em
Belo Horizonte.
Em se tratando de um campo novo, a Missão nor­
te-americana auxiliaria na lllBlU l lençio do pastor, que
receberia . . . 250 mil réis por mês (!), ficando, porém,
a seu cargo o pagamento de metade do aluguel do u­
lão de cultos . . .
Era, por todos os motivos, um lllgar de sacriflcio.
Certo, porém, de que e Causa da Verdade estava
em j6go, segue o Rev. Américo para a capital mineira,
onde chega a 1.0 de julho de 1915.
Procura casa durante vmos dias. Não encontra
nenhuma que esteja para alugar, a não ser "a casa dos
escorpiões". Era um prédio em que ninguém tinha
coragem de morar, tantos os escorpiões que nêle havia.
- Mas se Deus quer que eu venha para á e não
há outra senão esta, ser' nesta casa que haveremos de
morar. Quem tapou a boca aos leões nos hã de livrar
dos escorpiões.

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Instala-se, pois, com a familia, na ºeasa dos escor­
piões", cuja fama não tarda a confirmar-se. Parece
que todos os escorpiões de Belo Horizonte, - onde
eram numerosos êsses aracnldeos -, se haviam con­
centrado alL Quase não se passa um dia sem que apa­
reça pelo menos um! Ao fim do primeiro ano tinham­
se capturado e posto num grande vidro, cheio de ál­
cool, cfrca de trezentos!
Várias vkes quase se dá um desastre. Um dia,
ao calçar um sapato, sente o Rev. Américo qualquer
coisa dentro dêle. Sacode-o, e sai correndo .. . um es­
corpião! Doutra feita, sente D. Isabel subir alguma
coisa pelo vestido. Sacode-o energicamente e cal ao
chão . .. outro escorpião!
Também me lembro de se ler dado coisa parecida
comigo mesmo. Descalço, ia descer um degrau que
dava para uma varanda; por poucos eentlmetros deixei
de pisar num dos terríveis inimigos.
Não parece milagre o fato de ninguém ter sido vi­
timado, durante quatro anos, na "casa dos escorpiões"?

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"PREFIRO VER O MEU FILHO MORTO"

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r 'l
I I�
IM SABER como vai o seu filhinho Horlkio.
,'· Soube que estava passando mal .
- Muito obrigado, meu caro amigo. Muito
• J me sensibiliza a sua gentileza. Infelizmente,
porém, pelo que me disse o nosso médico, o Dr. Virgl­
llo Machado, não h.6 mais esperança nenhuma. EstA
mesmo desenganado o menino. Admira-se até o doutor
de que possa resistir, como tem resistido, uma crian­
cinha de um ano! Imagine o senhor! o menino est.6 com
coqueluche, catarro sufocante, bronquite capilar e
pneumonia dupla; e, para completar o quadro, decla­
rou-se também a meningite. I!: um caso Inteiramente
perdido.
- Então est.6 desenganado . . .
- I!: o que diz o médico, meu caro amigo. E . . .
embora com o coração em pedaços . . . s6 me resta di­
zer, como Job: "O SenJiar o deu/ O SenJiar o tit-ou!
Bendito seja o Name do Senhtw!"
- Então, uma vez que os médicos nada mais �
dem fazer, permita-me, Dr. Américo, que lhe diga uma
coisa. Aliás, para isso é que vim cá. Ontem, na Fe­
deração Espirita, um esplrito do astral declarou que o
seu filhinho Iria morrer.
- O nosso médico também . . .

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- Sim; mas acrescentou que se lhe d6semos des­
sa agua o menino ficaria curado.
Dizendo isso, tira do bôlso um vidrinho e o apre­
i;enta ao pastor.
Delicada mas firmemente responde o Rev. Amé­
rico:
- Sr. Inocfncio: agradeço de todo o coração o in­
terêsse que manifesta pela saúde de meu filhinho. Mas
não me é passivei aceitar esse presente seu. Prefiro
mesmo ver o meu filho morto sôbre uma mesa a lhe
dar desta água, pois o espiritismo é categoricamente
condenado pela Palavra de Deus.
- Mas . . .
- Não, meu bom amigo, peço que me desculpe,
mas não posso aceitar, de modo nenhum.
E o bom espirita, desapontado, e admirado diante
de tal firmeza:
- Bem que minha mulher me disse que o senhor
não haveria de aceitar . . .
- Ela teve razão. Não posso. :E: uma questão de
consciência, de fidelidade aos meus principias, de coe­
rência.
Ficam ambos cm silêncio durante alguns instantes.
Súbito, o Rev. Américo pega o vidrinho que ficara sô­
bre a mesa e dirige-se de novo ao seu amigo. que jó fa­
zia menção de retirar-se:
- Não me leve a mal, Sr. Inocêncio; permita-me.
entretanto, que lhe coloque no bolso o seu "remédio".
Porque, apesar de j6 desenganado o meu filhinho, re­
solvi pedir a Deus que o cure. E Deus vai atender a
minha oração.
- !?!
- Vai, sim, meu amigo. Pedirei a Deus que nos
conceda essa graça como prova de que o espiritismo está
errado. E como sei quP Deus me ouvirá, quero que

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lrv'" o sc-u vidrinho, para que nio suponha que dei des­
•• ÂAUR ao menino, às escondidas.
- E.'111 bem . . . se assim deseja . . . sinceramente,
luço votos por que Deus o ouça. Mas . . . os esplritos
cl1J1Lwram que o menino não se salvará . .

Despede-se o visitante.
Com o coração nas mãos, sentindo sabre os om­
bros a imensa responsabilidade que assumira com ati­
tude tio inesperada, vai o pastor para o seu escritório,
passa a chave na porta e cai de joelhos:
- "Meu Senhor e meu Deus! Vem em socorro do
Teu servo. Cura essa criança; cura-a, Senhor. Se a
quiseres levar, leva-a mais tarde, o que será talvez ain­
da mais doloroso para o meu coração de pai. Mas ago­
ra, não: para que fique demonstrada, irretorqulvel­
mente, a falsidade do espiritismo."
Durante duas horas continua em fervorosa oração.
Sentindo-se, afinal, ouvido e atendido, a fisionomia
transfigurada, vai para o quarto em que agoniza o me­
nino. Sua esp&a, profundamente abatida, lá está, cer­
cada de amigas e vizinhas solicitas, à espera do instan­
te fatal.
A expressão alegre do pai, que entra de repente
no quarto e a todos cumprimenta alàvelmente, espan­
ta os circunstantes.
Maior a surpresa ao dizer êle à esp&a, na presen-
ça de todos e em voz alta:
- Isabel, o menino não vai morrer.
- O menino . . . não vai morrer?!!
- Não; não vai.
- Mas . . . se já está com meningite . . . já está com
as mãos . . . os � frios . . . :t verdade que, ao desen­
ganá-lo o médico, eu disse que às vêzes a cihlcia cruza
os braços mas Deus continua . . . Mas agora tudo mos-

79
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lra que DeU!I o quer levar . . . veja, Américo, como est6
o menino. . . está agonizante j6 . . . está morrendo . . .
- Isabel! Ou cremos ou não cremos! - retruca
energicamente o Rev. Am6rico.
E ac:rescenta:
- Eu pedi ao Senhor que o não levasse; para dar
uma demonstração de que estão errados os nossos ami­
gos esplritas; e sei que o Pai celestial atendeu a minha
oração.
Dito isto, retira-se para repousar. E dorme pro­
fundamente durante virias horas.

No dia seguinte, aparece o Dr. Virg{llo Macha­


do.li> &tranhando que o não tivessem chamado para
passar o atestado de óbito, vai expontlneamente ver o
que se passa.
- Então, Dr. Menezes . . . como está o nosso do-
entinho?
- Muito bem, doutor.
- Muito bem??!!
- Sim, senhor. Vai muito bem. Venha vê-lo,
doutor.
- Mas não é posslvel! - diz o médico, entrando
no quarto onde estava o menino, sentado na cama e a
brincar lodo rÍJIOnho. Não é posslvel!
Depois de o examinar, admiradlssirno, pergunta:
- Que remédio lhe deu, Dr. Menezes?
- Por que pergunta Isso, Dr. Virgllio?
- Pois se o menino está fora de perigo. . . Que
lhe deu o senhor?

(1) 1rmio do Dr. Cristiano Machado, Olllto


ldlda l Preol­
dlnda da República a.u elelçõeo de 18li0.

80
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- Nada, doutor. Apenas pedi a Deus que o curasse .
Nada mais • • •
- Então foi a.se . . . o remédio?
- Sim, senhor: a oração.
E, após um longo silêncio, profundamente impres­
sionado, diz o médico:
- Agora posso dizer que ji vi um milagre • • • com
os meus próprios olhos . . .

Inúmeros os casos de curas de doentes ji desen­


ganados obtidas pelas orações do Rev. Amúico. Mul­
to longa seria a lista se registrúsemos aqui todos os
fatos de que temos conhecimento. O do seu filhinho,
porém, é dos mais admiriveis.

81
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"Sô EM CASO DE MORTE"

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NTRE OS PAnlS do Rev. Américo de
Menezes encontrou-se êste regulamento de
-
t>i<la (ano de 1916) , que muito se parece
com o de um retiro espiritual:
Terças, Qulnw e Saw
8 m levantar-me, onçio, glnátka, onçio
7-7)llJ culto clammtlco
7,30-8)10 prepon> mplritual (leitura da Blblla, med.1-
taçia • onçio)
8,30-9 - blblle»
9-10 mtudo do Hebraico
10 olm6ço
11-18 tnbelho do dia
18,30 jantar
17-18 mtudo do Gnso
18-19 estado do Portusulo
19-20,!0 ma"rlu proped6utlcu e teolOllla
21-22 preparo aplrltual (oraçlo)

Dava, como se vê, bastante atenção ao preparo in­


telectual e espiritual, que sempre reputou imprescindl­
vel ao bom desempenho de suas funções pastonüs.
Em todos os momentos vagos aperfeiçoava os seus
conhecimentos de grego e de hebr6ico, preferindo sem­
pre ler a Bíblia nas llnguas originais. Acima de tudo,
porém, colocava a vida de oração. Abrindo, com alguns

85
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conselhos prãUcos, o meu primeiro caderno de esboços
de sermões, escreveu êle certa vez:
uSe tiveres cinco minutos para preparar um ser­
mão, gasta quatro em oração."
E era assim que êle fazia.
Quando ia recolher-se em oração, antes de se tran­
car no seu escrit6rio, virava um cartão que conservava
pendlll1ldo na porta. Dum lado havia uma bela estam­
pa do Bom Pastor. Doutro a frase, que, então, ficava
à vista:

llÃO BATAM

llÓ DI CABO m MOlrft

E todos andavam na ponta dos pés, falando em sur­


dina, para não perturbar o pai, que estava em oração.
E era literalmente que se interpretava a recomenda­
ção. Virado o cartão, não se batia à porta do escri­
tório. Em hipótese nenhuma: só em caso de morte!

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INSTANTANEOS DUMA ALMA

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A 'OLTIMA PAGINA de um livro acha­
ram-se alguns pensamentos de Américo de
Menezes com uma nota explicativa: -
"Pe1U11mentos eocntos depois de gra11de1
lu14.1 moreia'' -, e que são, de fato, uma fotografia
moral de seu autor:
"O dever nio se discute."

"Religião é amizade com Jesus, o Deus-Homem."

"Quando Deus é obedecido, toma-se :f:le o equill­


brio moral da nossa vida."

"Se a minha vontade não fõr a do Pai, a do Pai


é a boa, a preferível"

"A felicidade humana est6 em preferir e seguir a


a vontade de Deus, não como escravos e sim como fi­
lhinhos satisfeitos com o amor, a sabedoria e o poder
infirtitos de Jesus Cristo, o Deus-Homem, nosso Reden­
tor e Advogado."

11Cwnpramos o nosso dever e deixemos o resto nas


mãos de Deus."

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"Prefiro suspirar, gemer e chorar aos pés de Jesus
do que rir nos braços de Satanás."

"Um fim na vida: a glória de Cristo!"

Conservo em meu poder wn exemplar da Escritu­


ra Sagrada que êle me ofereceu a 1.0 de de�embro de
1922 com esta dedicat6ria:
"Ao meu Eurlpides ofereço o meu melhor presen­
te. Nêle encontro conf&rto para a vida.
A leitura piedosa da Blblia e a oração constante
são os segredos da mais alta espiritualidade.
Desprezar êste Livro inspirado é desprezar a pró­
pria felicidade eterna."

Todos os livros de sua biblioteca eram carimbados


com esta frase: "Scientia sine timore Dei quid im­
portat?"

Mais algumas qualidades dignas de regislro: sua ri­


goroslsslma pontualidad" e a fidelidade absoluta à pa­
lavra dada. Se se comprometia a "5lar em algum lu­
gar e em determinada hora, acont� o que acon­
t�. lá estava IHe exatamente na hora marcada.
Pontualidade era, para êle, indicio de bom caráter.
E não tolerava nem a preguiça nem a desordem nem
a mentira.
Dividia o tempo de modo a niío perder um minuto,
fazendo por isso o trabalho de várias pessoas.
Aliás, ao morrer foi substituldo por dou homens.
"Um lugar para cada coisa e cada coisa no seu
lugar", - dizia sempre. Lembro-me da resposta que
dava infallvelmente à minha mãe quando lhe pergun­
tava por êste ou por aquêle objeto:
- No lugar . . .

90
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Quanto à ment ira era radical: nem "1.0 de abril",
nem papai-noel havia em nossa casa. Mesmo porque
um dia saberiam os filhos que o pai tinha faltado à ver­
dode. E ainda havia um outro motivo mais forte: ao
descobrirem m filhos que o papai-noel era lenda, po­
deriam imaginar que a história do Natal também o
era . . .
Se ia visitar um amigo da familia, perguntava, an­
tes de sair, à esp&sa:
- Quer que dê lembranças à mulher de Fulano?
Era incapaz de dizer o que não fôsse a expressão
exata da verdade.
Em matéria de pudor, então, era verdadeiramente
angélico, o que se verificou até mesmo na última doença,
ao necessitar do auxilio dos enfermeiros ou dos médi­
cos. Era por isso que tanto amava a oração e tanto al­
cançava do Pai Celeste.
Colecionou Américo de Menezes algumas poesias
de sua lavra, que pretendia publicar mais tarde sob o
titulo de "Rimaa d'outrora".
:E: pena terem ficado várias delas inacabadas. Tô­
das, porém, repassadas dum sentimento profundamen ­
te filial, de tenússima pieclade.
A!i que se seguem são do tempo passado em Belo
Horizonte (1915-1918) , em que se lhe intensificou so­
bremaneira a vida espiritual. Duma encantadora sin­
geleza, bem retratam o que lhe vai nahna.

KA.GUAS lNTDlAS

Meu SenhM, meu Amigo, meu Pai . . .


Conaidna quem sofre e quem choTa;
Crava oa olho• no pobre que vai
Procurar o refúgio, que implora.

91
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t a Ti � J>TOCUro, Smhar,
P'ra eontar-te o que rinto em meu peito;
Nenhum homem ComJ>Temde e&111 d6r,
Como Tu, que em ciência ú perfeito.

Eu não digo o � rimo, ó A'7Mldo,


Em t>O% alta, que a turba ouvirei;
Eu te �o em lugar ioola.do • . .
Lei emiio a minh'alma direi.

Vem, Senhor, não demores, ó Deus;


Vem out>ir minha J>TeCe doro84 . . .
Eaperanç<i e sOCOTTo doa Teus,
Vem fazer uta t>id4 dito84.

MEDITAÇÃO

(Hino)

Que g6zo, 6 Cristo, dela


No mundo triate aqui!
Pareço estar no c,u,
Pensando, 6 Deus, em Ti!

AI' a dôr amarga


Tranaformaa num aoniao!
Orando a Ti, mcontro
Na terra um paraíao!

Enquanto aqui uit>er,


Gozando o leu amor,
Serei sõmmte Teu,
Meu Cristo, meu Smhar!

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O dia se avizinha . . .
Tão grande . . . "entuToso . . .
Em que na Eteniidade
TeTei per-feito gôzo!

ABRINDO A BfBUA

AbTo o liVTO do SenhoT


PaTa a f6rça TefazeT;
CuT110 a fronte em OTOÇão
Parn bem ComJ>T'eendeT.

Sem o liVTo dos yrofetaa


Não ezi&te santidade;
Criato mesmo suplicou:
"Santifica-os na "enfade".

Com tTemendos escaTCiua,


Aqui no mundo CL lutCLT,
Nosso Meme costumauCL
Na PalCLVTCL meditCLT.

"Eatá eacritoº, - aaim dizia.,


SeTeno, fiTme, inuencluel!
E com isto afugentCLUCL
Nosso inimigo teniuel.

AbTe, SenhOT adoTduel,


A.a poTtlu da inteligêndCL;
E amm Teu liVTO yrofundo
Eu leTei com diligência.

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Dd-me a Jôrça ld doa céu.a
Para a Tua lei cumprir,
E hei de honrar o nome Teu
No presente e no ponrir.

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EXTRATOS DUM DIARIO

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• S ANOS PASSADOS na capital mineira
foram, como já se disse, de notável Pl'Olres·
so espiritual; e de 11randes dificuldades
materiais.
Infelizmente s6 durante pouco tempo escreveu o
Rev. Américo o seu "di6rio", que conl<!m apenas umas
cinqüenta páslnas; que nos revelam, porém, a sua fé
robusta, a sua confiança ilimitada em Deus, que para
êle não era um mito, uma lenda, ou um ser lonsfnquo
e indiferente à sorte dos home113, e sim um Pai amoro­
so e acesslvel, sempre atento ao clamor de seus filhos.
Com que simplidade e confiança se dirigia ao Pai
celeste !
Era literalmente que interpretava a promessa de
Nosso Senhor: "Tudo o que pedirdea ao Pai em meu
nome o receberei.a.,,
Por essa época, com o nascimento de Paulo, eram
já quatro os seus filhos vivos. Maiores, pois, as des­
pesrui com a manutenção da familia.
Julgando que se deveria dedicar exclusivamente
ao rninisl<!rio, foi com mil dificuldades que viveu du­
rante algum tempo, tanto mais que wna congregação
nascente, como a de Belo Horizonte, ao contrário do
que acontece com as comunidades mais numerosas, não

97
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poderia contribuir com o neces.oário para a manutenção
do seu pastor.
Como ficou dito j6, recebia da Missão um auxilio
mensal de apenas 250 mil réis, ficando-lhe ainda a obri­
gação de pagar a metade do aluguel do salão de cultos.
Além disto. assumira, quando pastor em Lavras,
um compromisso financeiro de que não se libertara
ainda. E que, pensando na situação precarlssima em
que deixaria a familia no caso de vir a falecer, toma­
ra-se sócio remido de uma sociedade de seguros de
vida, "A Univeraal".
Tomou, pan isso, um empréstimo a um amigo.
A sociedade faliu e a divida ficou a lhe pesar nos om­
bros durante muito tempo.
O registro dessas dificuldades reflete, entretanto,
a sua fé ilimitada na Providência Divina.
Apreciemos alguns trechos do "di6rio".

Novembro, 2 (1915)
Acabo de somar as minhas contas. Vi que os
S4t600 que tenho de receber não dão para pagar.
Derramei a minha alma em oração. Estou à es­
pera de resposta.
Olho para a folhinha e vejo: "Acaso pode Deus
preparar-nos uma mesa no deserto? Eis que feriu a
penha e águas correram dela. . . Poderá também
dar-nos pão?" Sal. 78: 19,20.

Vieram trazer-me os 84'600 cêrca de meia hora


depois da oração. lsto me facilitou. Est.il bem. O
Senhor mandará mais, pois eu estou precisando.

NovembTo, 6
Minhas necessidades são grandes. Senhor, socor­
re-me!

98
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Leio Mateus, VI e recordo-me da declaração conso­
l11dora: "Vosso Pai Celestial bem sabe" de tudo islo.

Novembro, 9
Graças ao Senhor!
O Senhor me ouviu. Livrou-me de todos os mewi
temores. me veio ao meu encontro e me libertou.
Grande é o poder da oração!

Dezembro, 4
Passei uma hora em oração, depois de estudar e
meditar a Blhlia efrca de uma hora. Agradeci e pedi
a Deus muita COU98. Pedi também que mandasse hoje
os 40S de que estou precisando para completar o alu­
guel do salão de cultos.
Cêrca de meia hora depois da oração, recebo os
40$. Graças a Deus!
Permanecem minhas dificuldades particulares. "O
Senhor proverá".

Dezembro, 7
Dificuldades enormes. Humanamente insolúveis.
Senhor, socorre.-me!
Estive prostrado aos pés do Senhor a suplicar res­
posta.
Dezembro, 8
Senhor, estou necessitado. Socorre-me!

Dezembro, 9
Continuo a esperar pelo meu Libertador.
me me animou hoje pela oração e pela Palavra.

Dezembro, 1 7
Andei imerso numa nuvem d e tristeza por causa
das dificuldades em que me acho.

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Fraqueza humana. Leio Mal. 17: 20, Mal. 21: 21-
22, Mar. 11: 23-24. Recordo alguma coisa sabre Jor-
11e Muller.(I) A11ora vou orar.
Estou mais animado.
Leio mais a Escritura.
Pouco depois traz o correio wn vale de 2801200,
obtido s6 pelo poder de Deus! Como Deus é bom! Já
agradeci a Deus, muito comovido. Tudo salvo!

Fe1>ereiro, 27 (1916)
Passaram-se dias de lutas, tentações, regozijo es­
piritual.
Acht>me outra vez em dificuldades. A Congre­
gação também. Senhor, socorre-nos!
Estive lendo v6rios salmos consoladores (40 a 44) .
Depois orei.
Ainda não estou satisfeito. Vou orar mais.
Levant<Hne da oração. O Senhor põs wn pensa­
mento consolador em meu coração: "Se tu visses o teu
filho assim, como eu te vejo, e tivemies poder de aliviá­
lo, como eu tenho, não o tirarias das suas dificuldades?
- Sim, Senhor.
- Queres ser mais amoroso do que eu? Por que
não confias em mim?
- Perdoa, 6 Pai, perdoa. Confio, sim; eu confio."

Março, 2
Graças a Deus! Obtive resposta no que diz re5-
peito a minhas dificuldades presentes. Graças a Deus!

(1) Que auolmlava m rirloa orfanaloo que fundara lmi­


eamente pela oração, oem llllda pedir ooo homem; à moda de
s. Jo8' Cololonao.

100
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Março, 9
Recebi ontem mais uma resposta a minhas orações.
Solveram-se grandes dificuldades. Ainda tenho ou­
tras, que submeti à consideração do Senhor.
Senhor, tu que não falhas, segura o teu filhinho
abatido. Socorre-me, Senhor!
A J>Tópria ezperiência noa en.rifla que hd um Deu.s
t>ivo no cfu, que ouve as orações de •CU• filhos, em
nome de Criato.

Julho, 13
Recebi vârias respostas do Senhor; mas ainda te­
nho grandes dificuldades financeiras. Senhor, socor­
re-me!
Essas düiculdades cresceram devido ao Honlcio
ter estado mwto doente, desenganado pelo nosso mé­
dico. Teve catarro sufocante, etc. Estêve às portas
da morte. Sofreu muito! mas eu pedi por êle e o So­
1 me ouviu de um modo adminlvel. Graças se­
ber1110
jam dadas ao Senhor!
Agora, Senhor, eu peço que, com a tua própria
mão, que bondosamente me feriu, venhas par o bál­
samo do teu cons6lo. Não te demores, Senhor!
O Eurlpides também estêve muito doente nos dias
em que Honicio estava passando mal. Pedi ao Senhor
que curasse meu filho e &e me atendeu. O Senhor é
misericordioso!

Julho, 15
Admirável! Como Deus responde às minhas ora­
ções! Hoje eu estava pensando como saldaria um
compromisso, e Deus, mw bondosamente, arranjou
tudo.
Tenho outras dificuldades, e grandes; mas o Senhor
proverá.

101
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Umts obsen1ação: Quando tenho mais dinheiro do
que de costume, não sou tão pacienle como nas ocasiões
em que nio lenho. Benditas sejam as dificuldades que
me aproximam mais de Jesus o humilde coração.
Compreendi agora que estas coisas formam parte
necesúria da minha educação religiosa.
O mundo é uma escola.

Janeiro, 6 (1917)
Nunca principiei o ano com t.anto preparo espm­
tual como em 1917. Espero grandes bênçãos do
Senhor. Vejo-me em grandes dificuldades e, ao mes­
mo tempo, tendo de assumir grandes responsabilida­
des. "O meu socorro vem do Senhor, que fêz o céu
e a terra."

Março, 29
Estou sem dinheiro nenhum. Apelo para Deus,
que me tem ouvido.
Por falar nisso, registro aqui uma resposta maravi­
lhosa a minhas orações. Eslava doente de tétano, de­
senganado pelos médicos, o filho do Sr. Durval Lima.
Fiz oração e o menino já eslá passeando. Estas coi­
sas me animam. ºEu sei em quem tenho crido."

MAIS ORAÇÃO

Do "Di6rio" ainda:

Julho, 17
Passaram-se mais alguns dias d e bênçãos e ten­
tações e vitórias.
Tenho tido grandes lutas Intimas. Quantas vêzes
quero tirar umas duas horas para oração e leitura da
Bíblia e se levantam mil obst6culos!

102
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Resolvi, entretanto, dedicar pelo menos uma hora
à oração e outra ao estudo da Palavra de Deu•, bem
como uma hora de noite, aconteça o que acontecer,
apesar dos muitos e complexos trabalhos que tenho.
Quando passivei, dedicarei duas horas à oração.
DilJN"UGrri todo e qualquer lucro material ou in­
leleclual que, porventura, tiveue nas duas horaa Tefe­
ridaa.

Senhor, sem Ti não posso cumprir este desejo ar­


dente. Sou úaco. Sustenta-me nestes Teus braços
eternos. Senhor, lembra-te de mim.

Aa.S.10, 4
Lamento não ter dado outrora o lugar devido à
oração e à leitura e meditação da Escritura.
Desde o dia 17 sinto em mim uma nova animação,
quase que uma nova vida.
Observei os seguintes resultados das duas horas
de oração e de uma hora de leitura da Blblia:
1. Uma santa paz abundante.
2 . Maior confiança em Deus e maior amor.
3. Maior amor pela Escritura Sagrada.
4 . Um poder especial para orar e pregar que eu
nunca tive.
5. Mais ardor evangellslico.
6. Solução das mais urgentes dificuldades finan­
ceiras.
7. Ordem, método de vida.
8. Uma fôrça especial para vencer as tentações
mais perigosas.
Tudo isto vem de Deus.
Confundem-se os que pensam que aaslar tempo em
oração é perder oportunidades de aen>iço. A ORAÇÃO i
UM VERDADEIRO TRABALHO.

103
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"Sem Mim, nada podeis fazn."
Graças sejam dadas a Deus!

Apesar de não ter propriamente de•-pre:r:ado a ora­


ção e a leitura da Escritura Sagrada, conclui que Deus
está me chamando para orar mais.. De fato, quando
gasto uma hora aos pés de Deus, levanto-me como ou­
tro homem! em vez de desanimado, ardoroso.
Resolvi, pois, dedicar DUAS DORAS à oração, por dia,
das 4 às 6 de manhã, e OMA HORA ao estudo e medita­
ção da Escritura.
A noite UMA HORA de oração e uma de estudo da
Blblia, como regra geral, de hoje até o fim da minha
vida neste mundo.
Confiando em Deus, firmo êste propósito.
a) Américo Cardoso de Menezes

Novembro, 13
Registro aqui uma experiência: quanto mais oro,
mais trabalho.
Como que cm resposta aos meus cuidados e peri­
gos, tive ontem um sonho bem a propósito. Sonhei que
atravessava umas águas fundas por sôbre pontes es­
treitas, levando nos braços o meu pequenino Horácio.
Como eu o apertava cuidadosamente nos meus braços!
No sonho lembrei-me de Deus como Pai me segurando
em Seus braços eternas, onlpolenles. "Não temerei,
porque Tu estã. comigo."

104
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PASTOR E PROFESSOR

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ODE-SE IMAGINAR o que era a atividade
pastoral dum homem que vivia assim mer­
gulhado em Deus. Seus sermões eram de
fato um transbordamento de sua intenslssi-
ma vida interior. Perto d�le todos se sentiam bem,
fascinados, conquistados pela irradiação espiritual de
sua personalidade.
De porte nobre, distinto, sua passagem pelas ruas
vizinhas a sua casa era sempre notada. Se acontecia
ver um conhecido qualquer, fôsse rico ou fôsse pobre,
doutor ou simples verdureiro, tirava sempre o chapéu,
cumprimentando-o respeitosamente. Fazia-o como ca­
valheiro, instintivamente, e como cristão impregnado
da idéia de que no próximo sempre vemos a Jesus
Cristo. E, como conseqUfncia natural, era por todos
respeitado; pelos que o conheciam s6 de vista e mais
ainda pelos que privavam de sua inlimldade.
Jamais, em hip6tese alguma, ousaria alguém pro­
nunciar uma chocarrice, repetir em sua presença um
gracejo irreverente ou descaridoso; e muito menos uma
anedota de moralidade duvidosa.
t que não era apenas um convicto, mas um homem
que privava pessoalmente, e multas horas por dia, com
Jesus Cristo, através da oração. E essa comunhão tão
profunda, diária e ininterrupta com a Fonte de tôda

107
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santidade, leria de refletir-se no seu semblante, nos seus
atos, em suas atitudes. Sua presença influia automàti­
camenle no ambiente em que estava. Santificava-o. Ain­
da hoje, tantos anos depois de sua morte, a simples lem­
brança de sua pessoa me eleva o pensamento. f: que
bem podio repelir com o Ap6stolo: "Para mim o viver
é Cristo." "Já não sou eu que vivo: é Cristo que vive
em miln."

Até os fins de 1917 não teve contacto com nenhum


católico que, pela sua cultura religiosa e pela sua vida
interior, lhe pudesse dar do catolicismo uma idéia di­
ferente da que lhe haviam incutido, desde a adolescên­
cia, pregadores e livros protestantes. Ao contrário: al­
guns sacerdotes, que se julgaram no dever de comba­
ter o uherege" que se instalara em Belo Horizonte, o
fizeram de maneira infeliclssima. Nenhum dêles pro­
curou conh�lo pessoalmente. Nenhum dêles !ratou
de indagar do grau de piedade dêsse pastor protestan­
te, de sua oinceridade, de seu• anlecedentes. E, de
mistura com argumentos de extrema fragilidade, mul­
tiplicavam levianas acu9"ções ao "estipendiado do dó­
lar americano", aos h"reges que nada mais desejavam
•enão liberdad" para viver como bem lhes aprouvesse,
sem lei e sem freio moral!
Tais processos não eram. evidentemente, os mais
acertados para trazer ao catolicismo um protestante
convicto, reto e piedoso como o nosso pastor, cuja in·
fluência crescia sempre.

Certa vez, dá com os olhos num impresso lançado


ao chão. Apanha-o e lê com inte�sse um convite da
Federação Espirita Mineira para que os que de lato
procuravam a Verdade comparecessem à sua sede, onde
também lhes seria facultada a palavra.

108
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"Eis ai uma oportunidade para falar a respeito do
Evangelho", disse consigo mesmo. E no dia e hora
marcados Lá estava êle para provar, na própria sede da
Federação Espirita, a falsidade do espiritismo. Por
três dias consecutivos sustentou memorável polêmica
corn os disclpulos de Kerdec, conseguindo libertar a
vários dêles, que ali estavam, sinceramente, à procura
de Verdade.

Todavia, tornara-se-lhe Insustentável a situação fi­


nanceira. lmpo55lvel dedicar todo o tempo exdu•iva­
mente ao ministério, como tanto desejava. Via-se for­
çado, pois, a lançar mão do magistério para fazer fren­
te às despesas de manutenção da familia.
Aceita, então, em caráter provisório e excepcional,
o convite que lhe vem do Instituto Evangélico de La­
vras. E vai lecionar no ginásio daquela cidade, con­
tinuando, todavia, como pastor de Belo Horizonte. Fica
a familia na capital mineira, passando o Rev. Américo
a viajar freqüentemente para atender a ambos 09 com­
promisso9 : o de professor em I.vras e o de pastor em
Belo Horizonte.
Foi nesse ano, 1918, que inompeu a terrlvel "gri­
pe espanhola", o grande flagelo que assolou o mundo
ap6s a primeira guena mundial do século.
Estava o Rev. Américo em IAvras quando a peste
atingiu a sua famflia em Belo Horizonte. Um por um
foram tod09 ràpidamente contaminad09.
O anjo bom que Deus mandou foi uma missioná­
ria metodista, professôra do Colégio Isabela Hendrix,
Mis9 Mathews, que, arriscando a vida, transladou-se
para a casa do Rev. Américo e de lá saiu sõmente ap6s
o perigo passar, o que coincidiu com a chegada do che­
fe da casa, que a "espanhola" não atingiu.

109
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Terminado o ano. resolve o Rev. Américo deixar
o pastorado da igreja de Belo Horizonte, levando a fa­
milia para Lavras, onde lecionaria no Ginásio e pasto­
rearia algumas igrejas dos arredores da cidade. Era
o meio que se lhe deparava para manter os seus e ron­
linuar a saldar as dividas que tanto o preocupavam.
Lamentando ler de dividir o tempo entre o pasto­
rado e o magistério, escreve em seu "Diário":
"Firmo hoje um J>llClo, com o aw:flio de Deu•, de
dediair-me inteiramente ao miniatério 111grado, incon­
dicionalmente, logo que eatejam nonnalizadas as mi­
nhiu finanças.">
Deus me tem abençoado muito. Ainda estou lu­
tando em pleno mar, às vêzes no melo de tempestades
horrendas, como agora; mas, por entre os vagalhões do
mar, eu chamo por Jesus.
Senhor, eu te amo, Senhor, eu sofro. Senhor,
misericórdia!
Outra vez me entrego nas luas mãos, a mim, Isa­
bel e meus filhinhos, que são teus também.
Senhor, escuta-me!"

O ano de 1919 passa-o em Lavras, leeionando e di­


rigindo o internato do Gin6sio. Como professor de
português, francês, latim, grego, llteralura e outras dis­
ciplinas, entusiasma os olunos. Sabe ensinar. Quem
um dia assistiu a uma das suas aulas terfl lido a im­
pressão de que êle não nascera senão para o magislé-

(1) Várias insinuações de amiBGo pen que se candida­


tasse a uma função pUbllca êle u �iu como aut.ênUcas ten­
tações, ils quais "" refere em oeu "Diário"' (27 de Fevereiro de
1918 - pg. 100 dôste volume). Do pnlprto m�rio, por mais
nobre que lhe parece:ae, procurava fugir por nõo Nr uma
"atividade ..pecillcamente pastoro!".

110
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rio. As de português, então, eram notáveis, sobretu­
do pelo cunho prático que lhes dava.
Mas é unânime o testemunho de seus antigos dis­
clpulos: a pessoa do mestre é que mais os atraía e em­
polgava. Era uma delicia conviver com aquêle ho­
mem, que a urna cultura multilária unia uma piedade
até então nunca vista. Apaixonado por Jesus Cri.•to,
sabia, porém, ser discreto na cátedra. Uma oportuni­
dade, entretanto, se lhe oferecesse, e a alma transbor­
dava! E era um hino de louvor "ao Redentor amado"!

•'Ez abundantia cordis os loquitur,,, disse Nosso Se.


nhor. E de tal forma estava cheio de Jesus Cristo o
seu coração ardoroso, que, em qualquer ocasião, mes­
mo em reuniões sociais, s6 sabia falar elevando o seu
e o coração dos ouvintes Aquele que sempre foi a úni­
ca razão de sua vida.
Assim, celebrando o aniversârio de sua querida
mestra, D. Carlota Kemper, empunha a lira para sau­
dá-la num arroubo de admiração e de sincera amizade:

Que vida bela, senhora,


Hoje aqui 1e comemora,
Com profunda 11Tatidão!
E a mocidade que fala.
A ;uuentude se abala
E voa traz o coração.

040 �a.çõ.o!. . . que presente!''


Replicord quem não 1ente . . .
Retorquird: "P'ra que vai'?"
- Poia ' o e•crfnio do amor,
Em aeu conatanle uerdor,
Em seu fulgor perenal.

1ll
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Quando o bom Deiu vos chamar,
Para no1 céua deacamar,
Tal como o eapilho em peda�,
Multiplicando OI semblante•,
Vóa oivereia como dante•
Do no11<> 4nimo nos traço1.

Tanto ardor, tanta tristura,


Tanto amor, tanta ternura,
Tudo terd galardão
Na Pátria além, oenturOICI,
Onde o redimido goza
Ali doç-uras de Sião.

Dêsse perlodo sio também ntes versos,«» encon­


trados ent.re outros que ainda pretendia limar e ter­
minar e que ficaram inacabados:

FIAT VOLtlNTAS TUA. DOMINE!

Senhor, em meio de luta•,


Sofrendo, cafl.ICldo e IÓ . . •
Eu te invoco. Nilo escutas?
Já do pobre não tens d6?

Um vagalhão e outro mais . . .


A rolar por sôbre mim . . .
Eu •afro, sofro, ' demai1!
Tanta dor não terá fim?

Ninguhn me uaie no mundo,


Ninguhn tem Jle7UI de mim!

(2) 30 de Aaôs«o de 1918 - Lavru

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Meu coração moribundo
Não enronlra alh>io alfim?

Deixar-te?! Não, eu não quero:


ta IU da vida o fanai.
Conao1ador, por li espero.
Meu Pai, erlirpa êsle mal.

Abro o teu livro sagrado


E vejo bela doutrina -
Resposta urgente ao meu brado,
Que a vitória logo ensina:

Conflito? Ah! não de11e haver


Entre a minha e a tua vontade:
ts Juatiça, Amor, Poder
E Sapiência e Santidade.

Sim, é êste o teu querer?


Pois aceilo de bom grado.
Dá-me fôrça e hei-de ao/Ter!
Vem, oh! vem, meu doce Amado!

Percebe-se que atravessava um período de lul.Bll


Intimas, e que se nãolibertara ainda das antigas difi­
culdades financeiras.
Oferecimentos de vilrias naturezas se lhe fizeram
então, importando todos, porém, no abandono do pas­
lorndo, o que para êle equivalia a trair a Jesus Crislo:
11Deixar.. te?! Não, eu não quero!"
E, como sempre, refugia-se na oração. Lança-se aos
p(•s daq uele que freqilentemente chama "o doce
Amndo".
Drpois de longa e fervorosa oração, abre o Li11ro
Saurado, onde encontra a respoala urgente ao ae11 brado,

113
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" a fllrça para preforir a vontade de Deus, ainda mes­
mo que à custa de sofrimentos e lutas.
Outro lamento que lhe escapa do coração amar­
gurado:

t DEMAIS!

Mal compreendido e só,


Sem ter nenhum abrigo,
Eu sou um novo Job,
Nã.o tenho um peilo amigo.

Perdão! Perdão, Jerua!


Reala-me o teu amor:
P""6UÚ! em mim na <TUZ
E 11êa a minha dôr.

Ves e aencea 1amblm . . .


Oh! 11em, não pouo mau!
Quero na pdtria além
Depôr meus lmles au.

Eram grandes os seus sofrimenlos morais, causa­


dos, em parte, por admiradores seus, que, vendo-o em
Lavras, não se confonnavam com o rato de não o te­
rem como seu pastor.
Os fins de semana passava-os noutras cidades en­
tregues pelo "Presbitério" aos seus cuidados pastorais.
Escreve êle no seu Didrio, a respeito dêsse perlodo:
"Quantas lutas! Como sofri! Quanta ingratidão
recebi! Como íui desprezado e coberto de humilha­
ções! Entretanto Deus teve penn de mim e deu-me
esplêndidas vitórias!"

114
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Eram vitórias s6bre si mesmo, era a fôrça quC' o
Poi lhe dava para sobrepôr-se às mesqui nharias dos
que lhe invejavam a crescente popularidade.
Quanto mais sofria, mais para perto de Deus che­
gava.
Lembro-me de que um dia demorava a aparecer
para o alm6ço. Sabiamas apenas que deseera ao "quar­
to das malas". :tsse quarto, em que se guardavam as
malas dos alunas internos do Ginásio, ficnva no p<>rão
do ºdormitório n.0 211• Curioso, fui ver o que fazia
meu pai. E lá estava êle, de joelhos, em colóquio com
Jesus!
Nunca mais me saiu de lembrança aquêle quadro!
Era o mesmo homem que, nos tempos de estudan­
te, na lavoura daquele mesmo Ginásio, terminava o
mais depressa passivei a sua tarefa para se esconder
na mata a firo de orar . . .

Nas férias de 1919 para 1920 reune-se o "Supremo


Concilio da Igreja Presbiteriana do Brasil".
Entre outros assuntos, devia-se tratar do chamado
"Seminário Unido": a Faculdade de Teologia das Igre­
jas Evangélicas do Brasil, que seria uma tentativa
de aproximação e um passo para a união das igrejas
protestantes.
O corp<> docente deveria formar-se de representan­
tes das principais "denominações" evangélicas do Bra­
sil. Foi, então, eleito, por unAnimidade, representante
da Igreja Presbiteriana o Rev. Dr. Américo de Mene­
zes, que a Congregação da Faculdade designaria para
reger as cátedras de grego, hebraico e teologia dog­
mática.
Convidado ao mesmo tempo para co-paslor de lgre­
J• Presbiteriana do Rio, de que ainda era ministro o

115
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seu velho amigo Rev. Alvaro Reis, transfere-se para
n Capital da República, onde chega a 31 de janeiro de
1920.
Vai iniciar, aos trinta e três anos, o último lustro
de sua vida!
Interessado em liquidar as antigas dividas, aceita
também o lugar de professor do Colégio Batista, onde
chega a lecionar doze matérias duma vez! As aulas
do Seminário eram noturnas. A coadjutoria da "Igreja
do Rio" era o pastorado de tadas as congregações pres­
biterianas dos subúrbios cariocas, que visitava aos do­
mingos e no meio da semana.
Lecionando o dia todo e até tarde da noile, conti­
nuava, entretanto, a mesma vida intensa de oração, pre­
gava às suas congregações e visitava os paroquianos.
Residindo perto do Hospital Evangélico, ainda era cha­
mado freqüentemente, e não raro de madrugada, para
levar o conf6rto espiritual a enfêrmos e agonizanles.
E não deixava de dirigir também o seu "culto do­
méstico'', em que reunia t&las as ffianhãs a famUia para
louvar o Senhor.
Durante um ano ainda pasloreou a igreja de Nova
Friburgo, que visitava uma vez por mês.
Foi um perlodo de penosa e sobre-humano alivida­
de, a que se entregou por esplrto de aposlolodo e pela
necessidade de suprir o ordenado Insuficiente que re­
cebia como pastor e professor. Mas a sua saúde pa­
recia de ferro, embora estivesse sendo impercepllvel­
menle minada.
Sua fama de pregador se espalhava cada vez mais.
Quando se anunciava que ia pregar em qualquer lugar
o Rev. Prof. Américo de Menezes, acorriam grandes au­
ditórios a ouvir aquela alma de fogo, que lhes punha
Jesus vivo, presente ante seus olhos.

116
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Todavia, quase que s6 tinha tempo de ler, escre­
ver e preparar os seus sermões nas viagens que fazia
de bonde todos os dias Indo ou vollando da Faculdade
de Teologia. Mesmo ocupado assim, continuavam a bro­
lar-lhe d'alma aquelas poesias repassadas de amor e de
fé. Nesse último perlodo eram sobretudo hinoo reli­
giosos que escrevia. Vale a pena lranscrever algun•
dêles, em que wna alma delicada descobrir6 por certo
riquezas imensas:

CONFITEOR

(Hi110)

Senhor! SmhOt', meu Deua!


PM que fui te ofendtt?
PM que o.o preceil<la teua
Pi.sft em me!' t?1uer?

Eu, rfu dlpo do infemo,


Pequei comra o Snthor/
Tão bom, tão ;uaio e cerno,
Pacienle, benfeilor!

Perdão! Perdão, JeB1L1!


Aceil4 o pecador.
Teu g6ui dá-me a flu:r
E IOm4 o meu amor!

Recebe a minha vida


Como h.6ati4 em teu aliar;
Sr 1u minha guarida,
Cunligo quero eatar.

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Ligado sempre agora
Por um tão grande amor,
Serei, aem ma.ia demora.,
Teu franco aeguidor.
(Rio, 20-11-1921)

CONFIANÇA
(Hino)
Naa mãoa entrego o meu destino,
tuaa
Grande e bondoao Deua!
Ainda mesmo quando não atino
O fim dos paaao1 meua.

As 11êzes ermo e duro é o caminho


Por que tenho de andar;
Ma• ainto o paternal, doce carinho
Q"" tu prometei dar.

ts sempre o mesmo Deus mara11ilhoso


Naa tua.a perfeü;õe1;
Amigo, Redentor, Pai dadi11oao,
Vida doa corações!

Vi110 aaaim dia e noite a proclamar


Entre aorriao e dor,
Que é bom e ;uato sempre confiar
No ezeelao Sal11ador!

ESPERANDO NO SENHOR

Como é bom confiar em JellUll,


Sentir perto •eu braço potente!
Seguir sempre o caminho de luz
E ficar dia e noite contente!

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Como é bom contar tudo ao Senhor
E a respoata divina esperar;
Inda mesmo chorando de dor,.
Nem de leve jamais duvidar!
Dize, pois, o que queTea de mini,
E farei, meu Senhor, tua vontade;
Eu aou teu para aemyre, •em fim,
Deua de amor, de justiça e oenl.ade!

(No trem, 30-7-1923)

INVOCAÇÃO

ó Je111U1, vem a al>T...,ar


De teu filho o coração;
Eu deaejo te adorar.
Ouve a minha petição.
Aoa teua pds, Meatre Divino,
QU11To a 111nta lei ouvir;
E também erguer um hino
S81>Te as glóriaa do porvir.

Quero a.,ui neate ttlwo


Minha /(;rça reftuef';
� por ti IÓ qu IUlpiro
Dia e noite em meu viver.
Já aenlindo o teu olhar
Al>Ta111ndo o coraçio,
Vou agora te adorar
Com yrofunda gralidiio.
(No tttm, de Novo Friburgo ao Rio)
17-9-1923

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HINO 00 TRABALHOR CRISTÃO

(li Cor. XI: 23-33)


Oferecido aos Seminaristas do Brasil

Inda mesmo enlre eapinho1 agudo1,


A ao/rer mi! lorlura1 aqui,
Eu deae:jo, ó meu Dew, trabalhar
Dia e noite, a penHr 1empre em ti.

Não recwo o lugar de perigo,


Se /ôr Ll que o Snhor me puut",
Minha vida emn114rel a Jetma,
Sem olhar conaeqüincia qualquer.

Alra�• poderMaa eu ainto


Na pe.- do � Redntor;
Sua uida ' o farol que me guia
E m� anirna e me in.pi.ra valor.

Peloa oulroa, bondoao, 1a/reu


Sem queizu me neRhum neata vida;
RecompetUtJ doa homen1 não teve.
.llf a1 conllanle e /�I /oi na lida.

Dá-me, poia, um !u114r na peleja


Um cantillho qualquer, meu Senhor,
Que de1e;o por ti combater
E P'º"ª' mui lo bem meu amor.

(Rio, 1 . 6 . 192�)

120
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CONSEUIOS DE PAI

(Ao meu filho Eurlpides, por


ocasião do seu 15.0 aniversário)

Ne11e dia de 1eua anOI,


Recebe, meu /ilho amado,
De leu pai uma palavra
Que le digo de bom grado.

Da mm/ia 1'ida é1 um primio


De tão aubido calor,
Que Riio aei agradecer
Como de.,o ao BenJeilor.

Continuo, Jilho meu,


No caminho de Jeaua,
E ,.,. pai que le aconMlltG,
E leu pai que te conduz.

Si jOTte JIClra lutar


Conlra o ciclo &enlador;
Si /orle, diz o leu pai,
Honn bem o Salvador.

Auim, deizando ella 11ida,


Direi contente, a#inal:
"O /ilho que tu me de:rle
E crente, é Jor1e, é leal."

(Rio, 23-9-1924)

121
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VERSICULOS GRIFADOS

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• ANIFESTOU alguém um dia a sua admi­
ração por ser o Rev. Américo Ião moço e
ter uma Biblia tão velha. Não era velh'1,
prõpriamente, mB!I usada, muito usada.
Costumava grifar os verslculos que mais de perto
lhe falavam ao coração. lmposslvel reproduzi-los. Se­
ria necessário copiar a Blblia tôda, quase. Alguns,
porém, talvez convenha citar, que êsses grifos geralmen­
te refletem a alma de quem os faz.
Escolhamos alguns do livro dos Salmos, que tanto
apreciava e de que lia largos trechos todos os dlB!I: -
"Muilas são as ariiçõeo do justo, mas o Senhor o
livra de !adas." (34 .19)
"Descansa no Senhor e espera nêle" (37. 7)
ºInvoca-me no dia da angústia e eu te livrarei."
(50 . 15)
"De !arde e de manhã e ao meio dia orarei; e cla­
marei e êle ouvirá a minha voz." (55 .17)
"Lança a tua carga sõbre o Senhor e êle te sus­
tentará; não permiürá que o justo seja abalado."
(!\5.22)

125
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"Quem tenho eu no eéu senão a li? e na te1Ta não
hú quem eu deseje além de ti. (73 . 25)
"De madrugada, Senhor, te esperará a minha ora­
ção." (88. 13)
"Bendize, 6 minh'alma, ao Senhor, e tudo o que
há em mim bendiga o seu santo Nome.
Bendize, 6 minh'alma, ao Senhor, e não te esque­
ças de nenhum dos seus beneficias." (103: 1 e 2)
Salmos como o 23, o 46, o 86 e outros, estão grifa­
dos pràticamente do principio ao fim.

ALCUNS GRIFOS NO NOVO TESTAMENTO

"Pedi e dar-se-vos-á; buscai e encontrareis; batei


e abrir-se-vos-é; porque o que pede recebe, o que bus­
ca encontra e a quem bate abrir-se-lhe-é". Mal. 7: 7-8
"Tudo o que quereis que os homens vos façam, fa­
zei-lho vós também." Mat. 7: 12
ºQuem não toma a sua cruz e não segue após mim,
não é digno de mim". Mal. 10: 38
"Vinde a mim todos vós que estais cansados e opri­
midos e eu vos aliviarei". Mal. 11: 28
115e alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si
mesmo, tome sôbre si a sua cruz e siga-me." Mar. 16: 24
"Em verdade vos digo que, se tivésseis fé como um
grão de mostarda, dirleis a êste monte: passa daqui
para acolá; e havia de passar, e nada vos seria impos­
slvel." Mat. 17: 20
"Tudo o pedirdes na oração, erendo, o recebereis."
Mat. 21: 22

126
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"Tudo é passivei ao que cre." Me. 9: 23
"Em verdade vos digo que qualquer que disser a
êste monte: Ergue-te e lança-te no mar; e não duvidar
em seu coração, mas crer que se fará aquilo que �le
diz, tudo o que disser lhe será feito. Portanto vos digo
que tudo o que pedirdes, orando, crede que o recebe­
reis e t�lo-eis." Me. 11: 22-24

" . . . e não se afastava do templo, servindo a Deus


em jejuns e orações, de noite e de dia." Luc. 2: 37.
"Porém êle retirava-se para o deserto e ali orava."
Luc. 5: 16
"E aconteceu que naqueles dias subiu ao monte a
êste corpo e habitar com o Senbor." ll Cor. 5: 8

uum novo mandamento vos dou: que vos ameis


uns aos outros como vos amei a v6s. . . Nisto todos co­
nhecerão que sois meus disclpulos, se vos amardes uns
aos outros." Jo. 13: 34-35

.. Estai em mim, e eu em v6s; como a vara de si


mesma não pode dar fruto se não estiver na videira,
assim nem vós se não estiverdes em mim. . . sem mim
nnda podeis fazer." Jo. 15: 4-5
"O meu mandamento é êste: que vos ameb; uns
aos outros assim comoeu voS amei." Jo. 15: 12
"Então êles vendo a ousadia de Pedro e João e in­
í111·m11do� de que eram homens sem letras e indoulos
1w 11111rn\'ilhoram; e conheciam que êles haviam estado
t•om .h•su�." At. 4: 13
"l 'urque eu lhe mostrarei qunnto deve pndecer
JH•lo m1•u 11umc�. 11 AL 9: 16

121
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"Porque era homem bom, cheio da Espirita Santo
e de fé. E muita genle se uniu ao Senhor." At. 11: 24
"Porque a nossa leve e momentãnea tribulação
produz um pêso eterno de glória mui excelente" . . .
li Cor. 4: 17

"Porém temos confiança e desejamos muito deixar


êste corpo e habitar com o Senhor." II Cor. 5: 8
uJá estou crucificado com Cristo; e vivo, não mai!
eu, mas Cristo vive em mlm; e a vida que agora vivo
na carne vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me
amou e se entregou a si mesmo por mim." Gal. 2: 20
"Tu, pois, sofre as aflições como bom soldado de
Jesus Cristo. Ninguém que milita se embaraça com
negócios desta vida, para agradar aquêle que o alistou
para a guerra." D Tim. 2: 3-4

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DERROTANDO AS "TESTEMUNHAS
DE JEOVA"

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m OM O NOME de "Estudantes da Blblia",
instalaram-se no Rio de Janeiro, iniciando
intensa propaganda, principalmente entre os
evangMi.cos, o• sectários mais conhecidos
hoje como 'Testemunhas de Jeová", que, a julgar pela
literatura dissolvente que difundem, nio passam, na
realidade, de uma fôrça de vanguarda do comunisnv1
internacional.
Consideravam preferlvel penetrar primeiro no
meio protestante, onde certamente deveria haver des­
contentes, que, com mais facilidade, poderiam atingir
e agrupar. E chegavam ao ponto de publicar desafios
até para discussões públicas.
Resolveu, então o Rev. Américo de Menezes ir as­
sistir, na própria sede dos "Estudantes da Blblia", ou
ruuellita.1, a uma conferência anunciada para o dia 7
de setembro de 1924.
Nio passou, porém, a tal "conferência" de uma
simples preleção com projeções luminosas s6bre o in­
ferno de Dante, com demônios de espêto, fogo, enllÔ­
lre e mil torturas materiais: uma caricatura das mais
Krosse iras da doutrina das penas eternas.
Pedindo licença para um aparte, declara o Rev.
Am6rico não ser @sse o autêntico ensino cristão a res­
pt'llO do B11Sunto. E em vista do desafio geral publi-

131
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cndo pelos "estudantes", propõe-lhes uma discussio i pú­
blica sôbre l!sse e outros pontoo controvertidos.
Tergiversa o dirigente, declarando por fim não
aeeitar a discussão visto não ser o Rev. Américo re­
presentante de tôdas as denominações evangélicas. Po­
deria o Rev. Américo franquear a sua casa e dar am
interessadm as suas explicações em particular . . .
- Mas os principias que vou defender são susten­
tados por tôdas as igrejas cristãs. E os senhores publica­
ram um desafio. Quero, pois, wna discuasiio pública.
E a respeito do inferno, que os senhores negam.
Constrangidamente, acabam aceitando a proposta.
No domingo, 14 de setembro de 1924, estava reple­
to o salão dos "estudantes da Blblla".
Combinara-se que não haveria apartes: o pastor
falaria 40 minutos, o sr. Manley Dlenst, chefe dos "rus­
sellitas", outrm 40 minutos; com réplica e tréplica de
20 minutos. O "russellita" encerraria a discussio i . Pe­
diu êste, porém, para falar uma hora seguida, perden­
do o direito à réplica.
Aceitas as condições, assim falou o Rev. Am6rico:
"Ministro do Evangelho, que sou, havendo lido
wna espécie de desafio geral em um dos diárim do Rio
de Janeiro, procurei a sede desta sociedade a fim de
propor uma clJscussão pública s6bre vários pontm que
separam os evangélicos dm chamados "estudantes da
Blblia".
Depois de hesitações da parte dos "estudantes", foi
aceita a discussão, e aqui estou, contando com a luz do
céu, para falar sôbre a ICCilCIA
lTiN DAS PENAS rrzRNAll.
A base de tôda a controvérsia é a santa, a infall­
vel Palavra de Deus.
Tratarei no cornêço dos seguintes pontos prelimi­
nares:

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1 " - Qu" é o homem? t simplesmente matéria?

2." - Que é a morte? Será destruição?


1 . O HOMEM. O corpo do homem foi feito do
1ió dn !erro (Gén.eaia cap. II: ver. 27). Mas é sõmen­
tc' 1M1?
- Diz-nos a Blblla que o homem foi feito à iina­
ll•'m de Deus. (Glhtem I: 2.) O homem recebeu um
l'lr men to que os irracionais não tiveram, nem pos-­
•uem: - um s6pro especial dos lábios do Eterno. J!: o
..splrito - principio vital superior, base da personali­
dade, origem da consciência, que no comêço se voltava
para Deus.
Essa imagem divina achamo-la não no corpo -
que é matéria , que é da terra, que é pereclvel, mas no
sópro que veio dos lábios do Criador.
Caldo em pecado, o homem obscureceu a bnagem
divina, mas, assim mesmo, não se transformou em bru­
to. (EpLstola aoa Corlntioa, cap. XI, vers. 7).
Ora cortando as nuvens, ora no seio dos mares
bravios, já penetrando a terra, Já com a sua ciência, ou
então com os seus suspiros, com as Joeubrações tantas
vêzes profundas, nau desarvorada que proeura o p6r­
to em meio à tempestade, é o homem um rei destronado,
que, ainda assim, mostra uns ares da majestade per­
dida.
Não, o homem não é simplesmente p6. Por Isso
diz a Escritura: "o P6 VOLTARÁ À TERRA COMO o lltRA, B
o ESPÍRITO VOLTARÁ A DBOS, QUB o DEU." (Edesüutes, cap.
XII, vers. 7.)
Não, o homem não é simplesmente p6. De ac&rdo
com estn passagem, há um elemento que fica, h4 outra
parte que vai. Vejamos mais a Escritura Sagrada:
Zacarüu, cap. XII, vers. 1.0: • • . "Fala o Senhor . . .
qu" íonno o esplrito do homem DENTRO dêle."

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J Epútola aos Cnrlntioa, cap. XII: 2: "Conheço um
homem em Cristo que hã catorze anos (se no corpo
niio sei, se FORA oo CORPO não sei: Deus o sabe) foi ar­
reb.itado até o terceiro céu."
Por aqui se vê que hã alguma coisa que sai do cor­
po, e pelos vers!culos seguintes se verifica que essa
parle que sai do corpo tem capacidade de ouvir pala­
vras inefáveis.
- Apocalipse VJ: 9-10: "Quando abriu o quinto
sêlo vi debaixo do altar AS ALMAS (tas psychás) daque­
les que tinham sido MORTOS por causa da palavra de
Deus e por causa do testemunho que mantinham. CLA­
MARAM com uma grande voz: Até quando, Senhor, san­
to e verdadeiro, deixas de julgar os que habitam sabre
a terra e dêles vingar o nosso sangue?"
Ainda mais. O homem tem poder de matar o cor­
po, mas não de matar a alma.
Disse Jesus Cristo: "Não temais aos que matam o
CORPO, mas não podem malar A ALMA (psychen) . Mat.
X: 28
Então, o homem não é corpo s6, possui um elemen­
to independente do corpo. Por isso diz.ia Sto. Estêvão
morrendo: "Senhor Jesus, RECEBE o meu esplrito."
(Atos VD:59).
Moisés morreu e ainda não ressuscitou. (Deutero­
nômio XXXIV : � - Joã.o V: 28-29) . Entretanto, mil e
quatroeentos e tantos anos depois da sua morte, apare­
ceu a Jesus Cristo no mllilte da transfiguração e con­
versou com êle.

D. - A MORTL Afirmam os "estudantes da Bí­


blia" que o crente, 110 MORRER, fica destruldo provisõ­
riamente à espera da ressurreição, para depois deslru­
tar a vida eterna.

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Ser destruido, embora provisôriamenle, oh! que
lri•lc esperança! Mas que diz a Escritura?
- "Temos, portanto, sempre bom Animo e sabemos
<1ue enquanto estamos PRl'.SBNTES NO CORPO, estamos
AUSENTES do Senhor (porque andamos por fé e não por
visão) ; temos bom Animo, digo, e antes queremos estar
ousenles do corpo e presentes com o Senhor." (ll Epís­
tola aos Corlntioa, cap. V, vers. 6 a 9) .
- "Para mim o viver é Cristo e o MORRER É LUCRO.
Mas se o viver na carne resultar em fruto do meu tra­
balho, não sei então o que hei de escolher. Porém de
ambos os lados estou em apêrto, porque tenho a DESEJO
DE PARTIR e estar com Cristo, pois é muitíssimo me­
lhor. . . (Epistola aoa Filipenae1, cap. I, vers. 21 a 23) .
- "Jesus, lembra-te de mim quando entrares no
leu reino" - disse o que rara ladrão e que estava mor­
rendo arrependido perto do Salvador. "Em verdade te
digo que hoje estar6s comigo no paraiso." (Euangelho
de S. Luca1, cap. XXIII, vers. 42-43.)
De aclirdo com a Escritura o paralso, no Novo Tes­
tamento, é o terceiro céu, lugar onde São Paulo, arre­
batado, ouviu palavras inefáveis. (II Epí11ola aos Co­
rinlioa, cap. XIl: 1-5) .
Para Jesus Cristo, que é Deus bendito por lodos os
séculos, a morte não é destruição: é, sob o ponto de vis­
te físico, a separação entre a alma e o corpo, conti­
nuando a alma com t6da a sua consciência. Haja vis­
ln n parábola do rico e Lázaro. (Evangelho de S. Lu­
caa, cap. XVI: 19-31.) Por ela se vê o gôzo do cristão
10110 ap6s a morte.
t êste pensamento que conforta os crentes, arran­
<·nndo dos lábios moribundos serenos hinos de espe­
rança:

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"Como hd de aer, conclU14 " IOftOll lida,
FmdA " pele;.. dA P"izüo mortal,
Quando, A11iatanclo AUm dA eacurn oicla
A portA do J>TAZer celenial,

Doa péa ""Trida " últimA poeirn,


Do Toato enzuto ..,,. fi111JI IUOT,
Dei.rannoa ena CeTllJ paa8Cl9ftrn,
EntTAndo ao •nto laT de eterno AmoT?'�'>
Não, graças a Deus, a morte física não é destrui­
ção. (Apoc. XIV: 13.)

t para notar que existe um ESTADO ESPIRITUAL


chamado morle na Escritura. O filho pródigo, enquan­
to estava longe do aeu pai, em rebeldia, em pecado, era
considerado por Jesus Cristo como MORTO. "&te meu
filho era MORTO e reviveu, estava perdido e se achou.n
(Luclll, XV: 24.)
- "Segue-me, disse o Redentor, e deixa que os
mortos enterrem os seus mortos." (MAteua VlD: 22.)
- "Aquela que vive nos prazeres, apesar de viver,
está morta." (1 Eplatola " Timóteo, V: 6.)
Ainda mais:
- "ile vos deu a vida quando estáveis mortos pe­
los vossos delitos e pecados, nos quais noutros tempos
andastes conforme o cuno dêste mundo, segundo o
chefe das potestades do ar, do espirita que agora ope­
ra nos filhos da desobediência, entre os quais todos nós
também outrora andávamos nas cobiças da nossa car­
ne e dos pensamentos, e éramos por natureza filhos da
ira, como também os demais." (E/ésios, cap. II: 1-4.)
Ili, pois, uma morte espiritual, e não é destruição.

(') Trecho de um livro evang�lco.

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Neste sentido principahnente foi que Deus disse a
Adiio: "Mas da árvore do conhecimento do bem e do
mal, dela não comerás: porque no dia em que dela co­
meres, certamente mol'11!rás." (Gêne.ris D: 17.)
Assim ficam bem claras as palavras do Altlssimo:
"A alma que pecar, essa morrerá" (Ezequiel XVID:
20) .
Tendo visto que o homem não é sàmente pó: pos­
sue um elemento superior, - a alma; tendo ficado cla­
ro que a morte flslca é a separação entre a alma e o
corpo; havendo nós provado que logo após a morte a
alma permanece cônscia; provado que elliBte uma YJDA
que a Escritura chama de 11oan, apesar de o individuo
vivê-la no pleno g&zo das suas faculdades, - provare­
mos agora que ESSA 11oan ESPIJUTIJAL EXIBTll TAKÚll
ALÉM TÚMULO, para sempre, sem fim.
Compreender tada a razão desta doutrina blblica,
é-nos imposslvel por enquanto. Doutrinas b! profun­
díssimas que por ora não podemos compreender devi­
damente: o pecado dos anjos, a Trindade, a elelçio, as
penas eternas são eJ<emplos dessas doutrinas transcen­
dentais. Mas, senhores, estamos cercados de mistérios.
- Que é a eletricidade?
- Que é a matéria?
- Que é a fôrça?
- Que é o movimento?
- Que é o átomo?
- Que é o éter?
- Que é a substincia?
- Que é a célula?
- Que é a vida?
Nndn de arrogAncia. Curvemos a fronte. Aceite­
mos a palnvrn de Jesus. !!e não engana. "Eu, disse

137
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um poeta inglês, eu acompanho a Jesus ainda mesmo
pelo meio do inferno."
o RESPONSÁVEL por esta doutrina - as penas eter­
nas - ê o próprio Jesus.
No Antigo Testamento já se conhecia esta verdade;
mas nenhum profeta falou sôbre ela de um modo tão
impressionante, tão forte, tão categórico como Jesus.
Dir-se-ia que Deus esperava a manüestação supre­
ma do Seu amor, para falar com ênfase sôbre a sua jus­
tiça santa e tremenda. Vejamos a Palavra de Deus,
com espirito de humildade e oração.
- Evangelho segundo S. Marcos, capitulo ID: 29:
"hos d'an blasphemese eis to pneuma to hagion ouk
.echeiaphesin eis ton aiona, alla enochos estin aioniou
hamartematos." - Tradução: "Qualquer, porém, que
blasfemar contra o Esplrito Santo, NUNCA ollTBllÁ PER·
DÃO, PARA SEMPRJ:, mas será réu de eterno julzo." (Gre­
go: réu de um eterno pecado.)
Todo o pecado merece condenação equivalente.
Ora, há um pecado eterno - segundo disse Jesus
Cristo.
Logo, segundo disse Jesu• Cristo, há uma condena­
ção eterna, equivalente a êsse pecado eterno.
- Quando vier o Filho do homem na sua glória, e
todos os anjos com êle, então se assentará no trono da
sua glória. Tôdas as nações serão reunidas diante dêle,
e separará uns dos outros, como o pastor separa as
ovelhas dos cabritos; porá as ovelhas à direita, mas os
cabritos à esquerda . . . Dirá também aos que estive­
rem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos,
para o fogo eterno, destinado ao diabo e seus anjos . . .
Irão êstes para o SUPÚCIO ETICllNO, porém os justos para
.a VIDA ETICllNA. (S. Mateua, cap. XXV: 31-33; 41: 46.)
Eia ton aiona - para sempre. Eia to PlfT aianion -

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pnru o Eia kola.ain aionion - para o su·
fogo L"lt-rno.
pHcio eterno. Eia zoen oionion - para a vida eterna.

Vejamos a significação dos termos gregos:


Aionios vem de aion. Aion é uma palavra que in·
dica tempo. Vem, por sua vez, de a.ei, sempre, e oA,
pnrtlclpio presente do verbo eimi, ser. O seu signifi­
cado etimológico é, pois, sendo sempre e a signüicação
de aionio.o é também •em fim. Por isso é que êst.e têr­
mo é empregado no Novo Testamento para descrever
a eterna duração de Deus, o Pai, o Filho e o Espirita
Santo (Romanos XVI: 26; 1 Timóteo, cap. 1: 17; He­
lireu•, IX: 14; Apoc. 1: 18) , a presença eterna do Espí­
rito Santo com todo o verdadeiro crente (João XIV:
17) e a infindável felicidade dos santos (Jlfateua XIX:
29; João VI: 54-58; U Corintios IX: 9.)
Se não há punição eterna, então não hã vida eter­
na, nem o próprio Deus é eterno, pois os mesmíssimos
têrmos são empregados nas p8SSBllens há pouco ciladas
tanto em referência à vida futura dos crentes, como em
referência à vida futura dos impenitentes e à duração
de Deus.
A palavra hebraica holam, com que se descreve a
eternidade de Deus no Velho Testamento, é traduzida
por aion trezentas e oito vêzes na Septuaginta.
Vejamos a sua f6rça: "Desde a eternidade (holam)
até a eternidade (holam) tu és Deus." (Salmo XC: 2.)
Várias pessoas se �m enganado porque existe o
uso relativo ou figurado dêstes vocábulos. (Aion, aio­
nios, holam.) É que êles se empregam para significar
P"rlodo indefinido nesta vida. (trodo XXI: 6; Levítico
XVl:34; Filemon, 15; Mateus XIl:32; Luca.o XVl:8;
XX: 34; Romanos XII: 2; 1 COTintios 1: 20; II: 6; e 1 Ti­
móteo VI: 17.)
Doutro lado temos a eternidade, que é indicada pe­
Jn, mesmas palavras: (Matem XII: 32; Hebreu.. VI: 5;

139
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Marco• X: 30; Luca.a XX: 35; Mareo1 m:29.)
O que se dá com a palavra aionioa ou holam, .!A­
se também com o nosso vocábulo •empre. Exemplo:
&e anda SDIPBB triste. Deus existe llDIPU. li.e ser6
escravo para sempre. Deus existe para sempre.
Resumindo: se o sêr existe neste mundo como Oné­
simo (Filemon, 15). então a expressão aem ftm se re­
fere a êste mundo; se existe no mundo além, como a
alma e o diabo, então a locução referida está empre­
gada no sentido próprio, não tem fim, eomo Deus e o
g67.o futuro dos redimidos não têm fim.
Passemos agora a considerar

O SHEOL E O HADES

O têrmo do Antigo Testamento que descreve o lu­


gar dos maus, na etenúdade, 1 aheo!. Esta palavra á
traduzida como hades na Septuaginta. (Bfblia grega.)
Erram os que a traduzem s6 por sepultura. O têr­
mo possue duDS significações: l.ª - lugar de conde­
nação eterna; 2.ª - sepultura. (Veja-se Shedd - Doc­
trine o( Endless Punishment.) O contexto é que nos
deve guiar.
1 . Primeira significação de aheol: lugar de con­
denação. Para lá vão os maus. - "Os bnpios serão
lançados NO INFERNO (sheol) e t&las as gentes que se
esquecem de Deus." (Salmo 1X: 17.)
Traduzindo eomo sepultura, teriamas: '"Os bnpios
serão lançados na sepultura (sheol) e tôclas as gentes
que se esquecem de Deus." Não daria sentido, pois
que S. Paulo, S. Pedro, S. João e outros santos de Deus
forem também sepultados.
Várias outras passagens têm a idéia de 1heo! eomo
condenação: Provérbios XXW: 14; Deutttonómio

140
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X XX l l : 22; Provérbio• V: S; IX: l8. Da! o solene aviso
11<• lkus. A tradução de inferno nestes casos é bem
�1pl'o1n-iada. Mas inferno, dirá meu adversário, q uer
dizer hlQar inferior.
Adotou-se a palavra inferno, que estava em uso,
•impll'Smente para traduzir a idéia expressa pelo uso
hebráico, não se fazendo caso das idéias pagãs ligadas
b 4!•te vocAbulo. O mesmo se fêz com os t!rmos pinV,
:oe, pneuma e logoo, que, no grego clássico, t!m sig­
nificação diversa da que se acha no Novo Testamento.

Seria uma dific:uldade se quiséssemos deixar de


lado palavras formadas na época do paganismo: a!A
alguns meses teriam os seus nomes mudados, pois re­
velam antigas homenagens pagãs, como j11Miro, que
fala de Jano, e março, que lembra Marte, divindades
do paganismo.
II - Sheol ou luadu, em segundo lugar, significa
sepultura. Isto meu adverúrio reconhece.
- "Tudo quanto te vier à mão para faz.er, faze-o
conforme as tuas fôrças, porque na sepultura (sheol)
para onde tu vais, não há obra, nem indústria, nem d­
�ncia, nem sabedoria alguma." (Ecleaiaate., IX: 10.)
O fato de sheol ter as duas significações - infer­
no e sepultura - se explica pela conexão entre a mor­
te flsica e a morte eterna. A morte do corpo é uma
das conseqil�ncias do pecado. Tal qual com a palavra
morte, que tem as duas slgnificaçõe: morte flsica e mor­
te espiritual.

Os têrmos do Novo Testamento silo luula• e ge­


henna. Além disto, há o verbo rartaroo, usado uma
vez em 2 Pedro II: 4: "Deus não poupou ooi anjooi que
pecaram, mas lançou-os no infemo." Tartaro era um
dos compartimentos do hBdea pagão.

141
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Hade•. - l!: a palavra pela qual os setenta tradu­
zirwn •heol. Tem no Novo Testamento os mesmos dois
sentidos do Antigo Testwnento: punição e sepultura.
1. A parábola do rico e Lázaro prova que o hades
é lugar de sofrimento, e sofrimento eterno. (Lucas, 16:
19-31.)
Não interpretamos o fogo ao pé da letra, assim
como não entendemos como literal o bicho de que fala
o Evangelho. (Marcos IX: 43-48.) O fogo é o remorso
que será maior ou menor conforme as oportunidades
que houve na vida de cada um. U)
O rico não podia sair: havia um abismo. Que di­
reito têm os "estudantes da Blblla" para darem a ab­
surda interpretação de o rico representar os judeus e
o pobre os gentios?
Não é claro da passagem que não havia esperan­
ça para o rico? Entretanto para Israel há esperança
de redenção. (Epúlola oos Romanos XI: 5,15.)
O laode• é contrário ao céu: ''Tu, Cafamaum, ele­
var-te-ás, porventura, até ao céu? descerás até o ha­
des . . . (Mateu.1 Xl: 23.)
(Vejam-se ApO<". 1: 18; Ili: 7; XX: 1-3; 12-14.)
Ealá ligado com a morte eterna: Apoc. 1: 18; XX:
10: 13.

Resumindo: a punição no Novo Testamento é qua­


lificada como eterna (Mal. XXV: 46) , "fogo eierno"

(1) Enalna a Igreja Caióllca a rnlJdade dum auplk:lo a


que o Evangelho clwna de /-. nio ao pnmunc:lando, mtre­
lanlo, a nopello de aua materialidade, de eua natureza e do
modo por que atormenta oo npr"'- (Toolovia de la s..lvadon,
Fr. Arm11110 lloYO MAU!<, 0 . P . - BAC, Madrid, "'8. 331 e -.).

142
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(Mnl. XVIII: 8) , "o fogo que NUNCA se apaga" (Marcos
IX: 45), "o bicho que não morre" (Marco• IX: 46) ,
"chama de fogo" (2 Te••· 1: 8) , "cadeias etemas" (Judas
8) , "fogo eterno" (Judas 7) , "o negrume das trevas
para sempre" (Juda..t 13), "o fumo do seu tormento, su­
bindo pelos séculos dos séculos" (Apoc. XIV: 11) , "o
10110 de enxofre" em que o diabo, a besta e o falso pro­
feta serão ATORMENTADOS dia e noite, pelos séculos dos
séculos" (Apoc. XX: 10.)
O verbo empregado, atormentar (basanizo) , e isto
pelos séculos dos séculos, bem mostra que não h6 ani­
qullamenlo: só quem existe é que pode ser atormentado.
"tsse tormento tem a sue raiz na consciência: é o
remorso.
t uma Injustiça atribuir-se-nos a idéia do inferno
dantesco: fogo, espêto e mil tormentos materiais. Lan­
ço aqui o meu protesto veemente. Isto não ensina­
mos nós.

Misteriosa é e doutrina que acabamos de esboçar;


entretanto, podemos indicar algumas bases dela, tira­
das do racioclnio inspirado na Palavra de Deus:
1 . Deua é jtuto, Deua é aanto. Por isso não pode
dar a mesma recompensa aos assassinos e suas pobres
vllimas. Seria uma triste indiferença moral. "O juiz
de tôda a terra não faria justiça?"
2. O homem é liwe, não é m6quina. O livre ar­
bitrio é um dos seus mais gloriosos atributos. Sem
liberdade não se compreende o inferno.
3 . O pecado é uma ação volunlária. Assim o In­
dividuo vai para onde escolheu. t a sua detenninação
pr6prla. Nem Deus, nem o mundo, nem Satanaz, for­
çam o coração do homem.

14l
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4. O pecado é um mal infinito, a maioT ingrad­
diio, o maior iMUllo atirado d face de Deua. I!: uma
falta torturar um animal Torturar um homem é mais
grave ainda. Se a ofensa reca.lsse s&bre um rei que
nos visitasse, assumiria um aspecto de enorme gravi­
dade. E se a ofensa magoa o pr6prio coração de Deus
- ah! - então é infinita. Todo pecado é uma ofen­
sa a Deus, pois é !alta de conformidade com a lei de
Deus ou qualquer transgressão desta lei - cópia, em­
bora parcial, da pr6pria natureza divina.
Ora, sabemos pelo Evangelho que Deus se f& car­
ne e habitou entre nós. Feito vario de dores, experi­
mentado nos trabalhas, ensinou-nos as sublimidades da
sua religiio divina, suportou uma vida de humilhações
e vexam.,,,, recebeu o pouco C890 dos pecadores, bofe­
tadas, o azorrague, a crucificação, o nivelamento com
ladrões, os insultos à hora da morte, a ingratidão, o iso­
lamento na sua dor, todos, todos os horrores, a morte
na cruz e tudo em lugar do pecador. A êsse pecador
..le procura, oferecendo de graça o que conquistou pe­
las suas angústias, pela sua morte, pela sua resaurrel­
ção, e recebe como resposta um: - "Vai-te embora . . .
6 Cristo! Anda! Não quero a tua salvação!"
Se"' injustiça deixar o pecador Impenitente, Inve­
terado no mal, no lugar que j!le mesmo escolheu?
Não.
Só vai para o inferno quem quer.
"JW"O por mim mesmo, diz o Senhor Jeori, que
não tenho prazer na morte do lmpio, mas que o lmpio
se converta do seu caminho, e viva: convertei-vos, con­
vertei-vos dos vossos maus caminhos; pois por que ra­
zão morrereis, 6 casa de Israel?" (Ezequiel XXXID :
11.)

144
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"Ide por lodo mundo, pregai o Evangelho a tada a
criatura. Aquêle que crer e fôr batizado serA salvo;
o que porém não crer ser6 condenado."
No uso da liberdade que o Altlsimo nos concedeu,
senhores, vamos seguir o caminho de Deus, ainda mes­
mo que não compreendamos t&la a sua revelação. Di­
gamos sem hesitar, como a criança que confia na pala­
vra do seu pai: "Meu pai falou. tle disse que é
assim."
E lá, nos páramos celestes, muita coisa que nio pu­
demos entender aqui tle nos dir6 então, quando a nos­
sa alma puder compreender melhor.

Veremos então como foi bom esperar. Tudo fica­


rá clero junto de Deus, que é luz, que é a fonte inex­
gotável da sabedoria e da ciência evitema."

Entusiàstlcamente aplaudido o discuno do Rev.


Américo, esperava-se uma resposta, que o antagonista,
entretanto, nio deu, alegando que o feria através dum
folheto, que, allAs, nunca saiu. Gastou uma hora com
as suas projeções, truncando passagem da Escritura e
fazendo as mais disparatadas afirmativas, que o Rev.
Américo refutou vitoriosamente, em poucas palavras:

"O que estamos vendo aqui, srs., é o cumprimento


de certas profecias: "Nos últimos dias virão tempos di­
flceis'" (II Tõm. cap. m: 1) - "Mas o Esplrito diz ex­
pres."'11nente que nos últimos tempos alguns apostata­
rão d11 lé, atendendo a esplritos enganadores e a dou­
lrinu de demônios" . . . (I Tim., cap. IV: L)
ApcMr do antagonista nio ter refutado o nosso
discuM10, lemos o privilégio de responder às principais
nfirmações feitos no correr da sua lanterna mágica.

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Diz fie que escreverá folhetos. Então será folhe­
to após folheto. Não os deixaremos mais. Venham
os folhetos.
Surgiu à baila a passagem do ladrão arrependido.
(Lucu XXIlI: 42-43.) - "E disse: Jesus, lembra-te de
mim quando entrares no teu reino. 2le lhe respondeu:
Em verdade te digo, hoje estarás comigo no paraisa."
Querem os "estudantes da Blblia" que se diga:
"Em verdade te digo hoje, estarás comigo no paraisa."
Para fies, a alma do justo fica destrulda provisõria­
mente.
21es põem a virgula em hoje e n6s na palavra digo.
Os textos mais antigos não tinham pontuação. De­
pendemos do contexto e do teor geral do Novo Testa­
Dll!Dto para a pontuação desta passagem. ''Na verda­
de te digo hoje?" Mas quando Jesus havia de dizer,
se estava morrendo naquele dia? "Aquêle que crê em
mim, disse Jesus, tem a vida eterna, PASSOU da morle
para a vida."
A salvação é instantânea. Não há, pois, impossi­
bilidade de Cristo dizer: "Na verdade te digo, hoje es­
tarás comigo no paralso." Assim o entendem filólogos
como Neslle e Weiss, assim o entenderam as principais
versões do mundo.
- Mas Cristo, diz o adver.<ário, não subiu ao céu
naquele dia.
- Quem disse? Não subiu ao céu com o corpo,
que ainda tinha de ressuscitar, mas como Deus, estava
no céu, e, além disto, o seu espirita humano entrou logo
no paraisa.�

(2) •o parai.o ' o limbo cios justos. Ali passou • olrna de


Jel'Ull o tempo que t.ramcorreu mtre o seu úlUmo suspiro e 1118
�. • confortar m jmlol que esperavam a hora ditosa

146
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Ainda mais: e parAbola do rico e Lázaro nos en­
•ina que o crente, logo após e morte, vai estar com
lh-us. Haja vista o que diz S. Paulo: "Para mim o viver
{, cristo e o lllORRllR t LUCRO." Por isso Me tinha dese­
jo de partir e estar com Cristo, pois era "muitlssimo
melhor." (Filip. 1: 21-23.)
S. Paulo não fugia da luta. Queria trabalhar para
Cristo. Se f6sse exato que fie ao morrer seria provi­
.Oriamente destruldo, o apóstolo não diria que era me­
lhor isto do que trabalhar para o Salvador.
- Paralso, dizem os senhores 11estudantes", paraí-
80 é horto.
- Ora muito bem. Diz S. Paulo que foi arreba­
tado até o paraíso. Logo foi arrebatado até o horto . . .
(Hilaridade.) .
- Os mortos nada sabem. (Ecles. IX: 10.)
Cite-se a passagem: ''Tudo quanto te vier à mão
para fazer, faze-o conforme as tuas fôrças, porque na
sepultura para onde tu vais, não há obra, nem indús­
tria, nem ciência, nem sabedoria alguma." (Ec!esiastea
IX: lO.)
- Quem diz que na sepultura há conhecimento?
Sheol aqui significa sepultura. Como vimos, em vá­
rios outras passagens significa inferno: "Os lmpios se-

C11\ que o Salvador m inl.ruduz.lrla comigo no céu, no dia da


Mo:emão. t o que S. Pedro <Nina ao dizer q\lt! Cristo, "morto
n• carne . . . deeceu a prepr aos eçlrltoa que est.avam no cir­
r<1re", na malllio dos mortos (1 Ped. IV; 18-20). E a tradição
crl1t.i (Sta. Júdo, Epist. ad Mapeo., 9; S. Jusüno, Dial. C.
Tryph., 72: Sta lreneu, Adv. haer. m, 22; IV, 38, 42, 55) afirma
o moamo lato, qUt! ' um dOlllnO da " cotólica, mencionado desde

,...,,,_ ....to.a o nos lihnbol.. ; l>elttndit ad h•I..... - desceu ia


n•anaóo doo mortos." - Vida de N.S.J.C. - L. - CL. Flu.mN,
Tomo li, Pll· ll2ll - Verw. eopanhola - Ediciones Fax, Madrid.

147
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rão lançados no inferno, e \adas as gentes que se es­
quecem de Deus." (Salmo JX: l7) Esta ameaça aqui
não pode significar sepultura.
- Todos serão restaurados, diz o sr. Manley.
- Mas como pode ser isto se, falando Jesus sôbre
Judas lscariotcs, disse: " . . . Bom seria ao la) homem
não haver nascido"? (Marcos XIV:21.) Como, se há um
pecado que não tem perdão? A restauração de tadas
as coisas não invalida esw passagens.
- S. Paulo não fala de condenação eterna.
- Ainda mesmo que não falasse. Basta Cristo
falar. Mas vejamos o que diz o ap6stolo S. Paulo:
"tle (Cristo) tomará vingança dos que não conhecem
a Deus e dos que não obedecem ao Evangelho de Nosso
Senhor Jesus, os quais sofrerão a pena, a saber, a Pl:ll­
DIÇÃO ETERNA". • • (II Teu. cap. ) : 8: 9.)
- Deus é aphthano., isto é, imortal, incorruptível.
- Sim. E quem negou?
Terminando: Afirmam os russelltas que a morte '
de9lruição. Então, o filho pr6digo foi destru.ldo: "&.te
meu filho foi de9lruldo . . . " J99us Cristo morreu. En­
tão foi dl.'Struldo.
- Mas foi a6 por três dias, acod" um russelita.

- Ora, muito obrigado pelo apart.,. Cristo, além


de homem, era e é Deus. Deus deslruldo por �
dias! (Hilaridade.)
Senhores, sigamos o Evangelho puro de Nosso
Senhor Jesus Cristo, ainda mesmo que não compreenda­
mos algumas das suas doutrinas extraordinàrlamente
profundas. O finito não abrange o infinito. Tenhamos
corúiança na palavra de Jesus e um dia muitas coisu
ficarão claras quando examinadas à face de Deus, no
pleno gôzo da eternidade.
Tenho dito."

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t:.trondou enorme, prolongada salva de palmas,
vrrulo-so o Rcv. Américo envolvido pelos abraços duma
mullidüo, que o acompanhou pelas ruas do centro da
l"ldudo olé o ponto em que tomaria condução pal1l casa.
F.m conseqüência desapareceram do Brasil por
muitos an05 os pretensos "estudantes da Blblla" pal1l
reoparecerem Ultimamente negando a Imortalidade da
olma, a Santlssima Trindade, o inferno, a redenção por
J�sWI Cristo, o Batismo, a Eucaristia, atacando mais
violentamente do que nunca as "religiões" em geral e
o catolicismo em particular, e gastando e r&lo em pu­
blicidade e propaganda subversiva, agora sob o nome
d., "Testemunhas de Jeová."<»

(1) lnfollzment.e, de 1824 poro c6, MSundo ded.ntçio do


� Mundial cio "c-elbo lnlenuu:lonal du lgreju Crlo­
tü", reunido om Petr6poll•, om 1958, .., alutrou de modo o!ar­

manle, wrdadelramont.e triglco, o modomlmno no meio pro­


leslanle. Nio chepm ..... corlfeuo li vlollncia, e não pregam
08tmalvammte, como • 11tencnunhu de Jeori". a subvenio
do onlem oodal; nepm, porim, t6du u doulrlnu fundunen­
lals do F' Crlsli, ua_.,.jo pela du - etemu, tio con­
victamente defendida - Am&leo de Men-.
PoolUvo e allnU na vo cmno era, e dedandamenle "lundo­
mentallota", ter-..,_la dodo, - dúvlde. mais c:ldo ou mais
tarde, a sua ruptura formal, p6bllcm e deflnlUva com hse "evan­
K•lismo oodal", quo, om cllreçio opalta à do 1e11 eoplrllD crmte,
caminha • - larp poro WDll religião eom � poro
um Cristianismo eem Cristo, poro a dosagnpçio fallll
H6 quem Julll\le que, lavor6vel9 u clreuns!Anclu pdo:o16-
«icas, ainda se tramforme a ração "'fundamenta.lista", tio cora­
josa e salutar, em um novo Movimento de <>mon:I. e, por fim.
num Grande Ret6mo, num mncraçamenl.o geral, na rest.ura­
<ÔO do unidade expmAmente desejado pelo Salvador.

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ALMA CATÓLICA

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lb:v. AIÓIUco C. DO Man:za

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m

1
A QUEM JULGUE que Américo de Mene­
zes teria sido um Newman brasileiro se
tivesse tido oportunidade de entrar em con­
tacto com certos vultos verdadeiramente
representativos do autfntico catolicismo, se viesse a
conhecer de fato, por dentTo, a Igreja Cat6lica. Se
houvesse morrido com a idade com que faleceu o Rev.
Américo, teria morrido o Cardlal Newman como con­
victo pastor anglicano. O mesmo se poderá dizer do
Pe. Frederick William Faber, o grande escritor cató­
lico, que foi pastor protestante durante 22 anos!
Mistérios de Deus!
Todavia, certas atitudl!ll e pendorl!ll poderiam con­
siderar-se como sinais da progressiva "catolicizaçio"
de seu espirita, a.inda que disso nio tivesse @le cons­
ciincia.
Já vimos em que cireuns!Ancias se deu a sua pas­
sagem para o protestantismo; recordámos o que era a
sua vida de oração, a sua vida domt!stica; o sil@ncio
quase claustral que imperava em sua casa quando o
cartão da porta de seu escrit6rlo avisava que @le .,,,ia.
va em oração: "Não batam; 16 em ca.so de morte!''
Escandalizando-se com a multiplicidade de seitas,
foi um dos fundadores e professor do "Seminário Uni­
do", tentativa de união do evangelismo brasileiro. Aliás,

153
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-dhse Seminário, e por indicação sua, foi nome.odo pro­
fessor o Dr. Vitor Coelho de Almeida, então pastor
presbiteriano, mas antigo sacerdote católico, doutor
pela Gregoriana e ex-reitor do Seminário Arquidioce­
sano do Rio. E eSY nomeação redundou na introdu­
ção do tomismo no curso filosófico do semln6rio pro­
testante, e a adoção da obra do Pe. Tia110 Sinibaldi
como livro-texto de filosofia, bem como da do Pe. Leo­
nel Franca para o CUl'SO de História da Filosofia.
Entusiasta do canto-cli.ão, teria tido possibilidade
também, através da música gre11oriana, de penetrar
mais a fundo no verdadeiro esplrito católico.
Quando de sua formatura no Seminário de Campi­
nas defendeu, em latim, brilhante tese intitulada De
Divinilll te Chriati, cujo original infelizmente parece
perdido. Batia-se pela redação das teses teológicas em
latim, visto ser esta wna lingua mais sinto\tica, mais
precisa e cujo sentido não varia mais.
Tinha um profundo respeito pelo pão, de que não
consentia que se pisasse ou se jo11asse fora um pedaço
sequer; não apenas por se trnt.nr dum alimento pelo
qual se tinha dado 11raças à mesa, mas por ter sido o
escolhido por Nosso Senhor para a Sagrada Eucaristia!
Nunca leu, porem, os grandes autores nústicos da
Igreja Católica, a biografia dos grandes nússionários.
Isto talvez o tivesse ajudado a distinguir os sacerdotes
impregnados do espírito da Igreja dos outros que, in­
felizmente, conheceu.
O que êle tinha por "Igreja Católica" era o sincre­
tismo que, desgraçadamente, caracterizava a reli11iosi­
dade brasileira do seu tempo, notadamente do interior
de Minas, onde. exerceu o pastorado durante a maior
parte da sua vida.
Transferindo-se para o Rio de Janeiro, s6 p6de
conviver com protestantes. Trabalhando excessiva-

154
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mente. como trabalhava, e sempre circunscrito ao 1neio
evangélico, o ºcristianlsmo" para êle era o cristianismo
protestante.
Viveu, pois, durante trinta e oito anos, na 11maior
nação católica do mundo'', ignorando o autêntico cato­
licismo!
O que conheceu, porém, do cristianismo, isso êle
soube pôr em prática, com sinceridade e fidelidade, e
herôicamente até. E pela prática da oração, pelo ma­
nuseio e pela meditação diária do Livro Sagrado, che­
gou a uma altitude espiritual que raramente se cons­
tata, mesmo entre os que tiveram, na Igreja Católica,
o privilégio de !requentar assiduamente os sacra­
mentos.
Foi, certamente, ao se lembrar de homens des.!la
envergaduni, e da de um Paulo Gerhardt, de um Da­
vid Livingstone, que asseverou Karl Adam que "entre
os protestantes até santos e mártll1!s pode haver."

Não declinou jamais: foi sempre em crescendo


constante o seu amor a Jesus Cristo, cujo Nome nun­
ca pronunciou rotineira e indiferentemente. Era de
ver-se com que temuni, varonil e filial, pronunciava,
falando ou cantando, o Nome de .JZBUs! E uma cousa
que o entusiasmava nos costumes da gente simples do
interior do Brasil era o hábito de se tirar o chapéu sem­
pre que pronunciado o Nome Sacrossanto!
E hse amor a Jesus Cristo se concretizava de tô­
da.• as formas, inclusive quando algum "irmão" doutra
ddode lhe batia à porte para pedir hospedagem. Isso,
ollÁll, acontecia freqüentemente. E muitas vêzes vi­
nha o peregrino acompanhado da familia . . . indo o
p8!1tor dormir no chão, para ceder a cama alegremente
u. Nos."° Senhor Jesus Cristo. Tal como nos mos­
tdroo beneditinos, o hóspede era Jesus Cristo.

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Nos últimos anos de sua vida cantava freqüente­
mente, quase todos os dias,U> ou então tocava na flau­
ta a melodia dêsse hino por que tinha especiallssima
predileção, traduzido, se me não engano, do latim e
atribuldo a São Bernardo:

EXPIROU

E:rpirou! Na.o maia pcadece


De Deua Pai o Filho amado;
POTém o aolo ememece
De aeu aangue inda banhado/
No momento e.:rtTemo, Cristo
Implorou ao Criador
(Oh! J>Tódigo nunca triato!)
Pelo povo fTDfLSIJTeasor!

Se o Coração jci gelado,


Coração que 14nto amou . . .
Se, eal4ndo despedaçado,
Ama ao que o despedaçou . . .
Enqw1nlo ainda ealTemece
A cniz cOTTo, em oração.
Pelo Sangue que a enrubece
Só dou pranlo e gralidão . . .

A "Associação Cristã de Moços", que nos tempos


da juventude de Américo de Menezes era um núcleo
de evangélicos convictos e animados de espirita apostó­
lico, uma verdadeira agência de "evangelização", fôra
sendo dominada, aos poucos, por um grupo fr&11caml!ll-

(1) "Ca•taN cun.a•tb e•t.• - S. Apdnho.

156
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te racionalista, a ponto de editar e divulgar panfletos e
livros em que se impugnava até mesmo a divindade de
Jesus!
Notoriamente "fundamentalista", admirou-se o
Rev. Américo de ser convidado, um dia, para fazer uma
conlen!ncia no salão nobre da Associaçio Cristã de
Moços.
Regorgitava o auditorium, como costumava acon­
tecer ao se anunciar que seria êle o orador.
Como lhe não haviam determinado o tema, resol­
veu fazer um breve, mas eloqüentlssimo cliscuno sll­
bre "O Poder da Oração".
Depois de v6rias considerações, narra o sucedido,
tempos atrás, com seu filho Hor6cio, em Belo Horizon­
te. E termina mandando que o menino se levante para
que todos vejam com os seus próprios olhos a prova
mais concreta que êle podia apresentar de que Deus
de fato ouve e realmente responde aos que O invocam
de todo o coração.
Voltando para casa, diz ao seu filho mala velho,
que o acompanhara:
"Garanto que essa diretoria nunca mais me h6 de
convidar para falar na Associação Cristã de Moços . • . "
Efetivamente foi o que aconteceu.
Paraninfando a primeira turma de diplomandos
do "Semin6rio Unido", depois de v6rias considerações
sôbre a lmportAncia de cada uma das matérias do
11curriculum" do curso teol6gico, passa ao que constitui,
para um pregador do Evangelho, o "unum neceuc­
rium'J.
"Eu teria remordimentos de consciência se vos não
repetisse aqui, com tôda a solenidade, o que vos dizia
freqüentemente no Semin6rio:
A grande tentação moderna é o trabalho sem ora­
çõo; é o corre-corre neste século agit.ado; é a lmpres-

157
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sio do número, da quantidade, do que dá na vista; -
é o esquecimento de uma comunhão Intima, demorada,
aos pés de Deus, que o ministro deve ter.
Apostolado sem oração! Que temeridade! Dai
tanto trabalho desmantelado, tanto fracasso e desalento!
"Sem Mim, - disse o Mestre Divino, - nada po­
dereis fazer. Podeis passar noites e noites sem dor­
mir, a trabalhar. . . a trabalhar com &nsia, tendo zero
como resultado!
Se não quiserdes gastar tempo aos pés de Deus,
nio entreis no minist.lrio."
Admirável a sintonia espiritual de Américo de Me­
nezes com D. Chautard, o autor do precioso livro "A
alma de todo o Apostolado", que êle nunca lera . . .
AliAs, instituindo o diaconato, outro objetivo não
tiveram os Apóstolos senão o de se dedicarem "aem ces­
.007' 4 07'�0 e ao ministério da Palat1ra" (AI. 6: 4) .m

(2) Enlre vúlos po�ia seus. mcontrou-se esta relação de


..,._ a fazer naa lftlu leUvu de 1824.
"1. - Maia oreção - inlenslllcar o preporo e1plrltual. 2 -
P&r em dia o meu DIArio. 3 - X..vnr u at.u do Prnbilérlo e
da igreja de NU6polia. 4 - Fazer o rel•tórlo du aUvldados
•vllll8filcu do ano. 5 - Lavrar u ataa da Con-ação da
F•culdade de Teolotila. 8 - lleorpoizar • Blbllol<!<a do Semi­
nário. 7 - Propapnda do Semlnhio. 8 - Aulas particulares.
9 - Redigir lolheloo populares. 10 - &ocrever mala •lllUft.9 hlnoa
e t..rmlnar os Iniciados. 11 - Música. 12 - Zltudo de matérias

do Seminário. 13 - Estudo de matérlu do p.jalo. 14 - Tre­


balho das �. 15 - Arrumar O osc:rltório. 18 - Re­
- fora. 17 - Com!SpOfldfncia. 18 - Serm6a. 19 - Viallu.
20 - Viageno. Z1 - Tratar do cabelo (que eslav• caindo).
22 - Mdio. 23 - FiDU1çu. 24 - Plono do dUusio doo Evan­
gelhos. 25 - Folheto e&btt o Somlnário. 28 - ArUgos. 27 -
Puselm eam a famlJIL 28 - Propopnda do Hospital."
Assim 6 que pre-ero aprvveilar as úlllmu férias que
teve, e que não cheeou a tennlnar. . .

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"MISERICôRDIA, SENHOR!"

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g AVIAM NASCIDO no Rio de Janeiro duas
filhos - Guiomar e Irene -, e um filho,
Cícero.
Tendo-se ausentado D. Isabel para ir
amamentar, perto de sua casa, a filhinha de uma amiga,
com o que, aliás, a salvou de morrer de inanição, uma
empregada, imprudentemente, dá um banho de chu­
veiro, frio, na pequenina Irene, que, atacada de saram­
po, ardia em febre. O resultado não se fl!z esperar.
Poucos dias depois agonizava.
Irene, que contava então dois anos e quatro meses,
era uma menina de excepcional doçura e de grande
precocidade nas suas manifestações de piedade. Que­
ria ir além da lua para ver Jesus . . .
Durante a doença cantarolava hinos que costu­
mava ouvir em casa.
Como sempre, apela o Rev. Américo para o Pai
do céu. Em dado momento, porém, percebendo ser
mesmo da vontade de Deus levar-lhe a filhinha, diz,
com o coração estraçalhado mas com voz firme e fini-
1110 forte:
"Se é da tua vontade, leva-a, Senhor, para junto
•le tl."
Mal acaba de fazer o seu ofertório, expira em seus
l1rnç0ft a doce !reninha.

161
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Naquele instante teve êle a impressão de liaver
percebido como que um rufiar de asas . . .
Foi um golpe terrlvel para o seu coração de pai,
e que provàvelmente lhe terá afetado a saúde. Condu­
ziu..se, porém, como cristão exemplar que era.
A noite, em determinado momento, estavam na
sala em que jazia o corpinho imóvel e frio, o Rev.
Américo e seu filho mais velho, que, com quinze anos
de idade, já era, desde o ano anterior, pregador leigo
e ºcandidato ao minisl�rio".
Estavam ambos sectados, curtindo em silêncio a
grande dor.
A certa altura diz o Rev. Américo:
"A nós, que pregamos aos outros, pennite Deu•
que soframos às vêze• tristezas como essa ; para que
falemos de nossa própria experiência . . . "
No dia seguinte, pela manhã, é êle mesmo quem ofi­
cia a cerim8nia fúnebre. E, com a sua bela voz de ba­
rltono, ainda canta, junto do corpo da filhinha morta,
o hino que nessas ocasiões era costume cantar-se.
Dá mais um eloqüente testemunho de sua fé, su­
focando, porém, a dor imensa que sei pela graça divina
suportava.
E no próprio dia do enlêrro deixa escapar, nestes
versos singelos, o que lhe vai n'alma:

QIU! bela mi.&scio tiveste,


Minha filhinha adorada!
Atraiste para Deua
A nossa alma atribulado!

Tua meiguice tão tua


Acompanha a no!SCI oida;
"Meu papaizinho" - diziu,
Sorrindo, minha querida . . .

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Eu te 11i lUl/rendo tallto,
Sem te poder socorrer . . •
Amor não faltava, filha;
Só me faltat>a o pod<tr.

Foi Je.,.. que te chamou


Dê•te mundo de amargura;
Foi JeSU11, aim, que te quia
Dar o céu, dar a 11et1lura!

O leu pai eopera um dia


Vit>er COllligo "º" céua,
Ao terminar a miNio
Que recebeu de aeu Deua.

Dá-me, ó Deua, o leu conaôlo:


Tu éa Pai . . . e eu também;
Millha dor aó tu et1tet1dea . . •
S6 em ti alivio tem.

Olha também para a m<ie


Que ficou triate e choru.a,
Que não t>ê jullto de ai
Sua filhmha mimu.a.

Em cada CGlllO ef4 t>ê


Moli1100 p'ra aua dor;
A ca.sa ficou de•erta!
Muencórdia, Setihor!

E º" mniiozinho1 também


Pedem lua compaiziio.
Vem a 1odo1 confortar
Nestes dias de aflição/
(21 . 1 . 1925)

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Pesaroslssimo também com a morte da lnnãzinha
predilela, vai o filho mais velho, em companhia de um
irmão, dois anos mais moço, e a instincias do pai, pas­
sar wna temporada na fazenda de um amigo, no inte­
rior do Estado do Rio.
Dali é chamado, porém, no dia 12 de fevereiro. por
um telegrama de sua mãe: "Venha urgente. Seu pai
grav(ssimo."

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PARA OS BRAÇOS DO PAI

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ROFUNDAMENTE abalado pela morte da
filhinha e com o organismo certamente en­
fraquecido pelo excesso de trabalho, conti­
nuou o Rev. Américo, sem interrupção, as
suas atividades pastorais.
Estava no perlodo de férias letivas. Foram, pois,
de natureza inteiramente espiritual os trabalhos a que
se entregou de 21 de janeiro a 11 de fevereiro. In­
tensificou ainda mais a sua vida de oração, como se es·
tivesse adivinhando o que eslava para suceder.
Indo pregar, certa noite, na Igreja presbiteriana de
Nova Iguaçu, pronuncia belíssimo e comovente sermão
sôbre o céu.
Na volta para casa, sente-se muito mal no trem.
Tendo a impressão de que ia morrer, escreve às pres­
sas o seu nome e enderfço num papel.
No dia seguinte, um tanto febril, não pôde levan­
tar-se. Pensa o médico tratar-se dum resfriado e re­
comenda repouso.
Na tarde do dia 11, já sem febre, aparentemente
quase restabelecido, chama a esp&a e diz que lhe pre­
cisa falar em particular.
Retiram-se do quarto v6rias pessoas que ali se
uchavam. E com imensa e doloroslssima surpresa para
da, lhe diz que pedira muito ao Pai Celeste um aviso

167
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qualquer a respeito do seu estado. E estava conviclo
de que Deus o chamava!
'Ignoro, - diz êle -, porque é que o meu Senhor
me chama agora. Sei apenas que os planos de Deus
não se discutem.
Como São Paulo, quer vivendo, quer morrendo,
sou de Cristo.
Tanto trabalho ainda tinha a fazer! Mas Nosso
Senhor me chama para trabalhar além . . .
Desejava tanto criar os meus filhinhos! Uma cou­
sa te peço, Isabel: não deixe que se desviem de Nosso
Senhor!
Até a !reninha morreu amando a Jesus; cantava
hinos pouco antes de ir para o céu!"
Beija a espôsa, tira do dedo a aliança e continua:
"Esta aliança agora te pertence. No céu não se
entra com jóias . . . nem h6 casamento.
Agradeço de todo o coração tudo que fizeste por
mim. Não rara o auxilio de Deus e a tua dedicação,
não alcançaria o que alcancei.
E não le preocupes com o futuro dos nossos filhi­
nhos. Jesus é o Pai dos 6rlõos, como também o Pro­
tetor das viúva..11."
Pede li espliso que traga os lilhos que estão em
casa.
Reunida a familia, faz uma oraçiio comoventlssima
enlregando a Deus a cspôsa e os filhos.
Despede-se, a seguir, dos seus filhos (dois se acha­
vam ausentes) , exortando cada um e seguir sempre a
Jesus.
A sua lilhinha Guiomar (de quatro anos) diz esta.•
palavras:
"Filhinha, papai vai dizer-te uma cousa muito bo­
nita. Papai vai para o Céu, 16 onde está Jesus . . . e a
!reninha também . . .

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Um dia irás ver Papai no Céu. Por isso, não cho­
res . . . nem deixes Mamãe chorar.
Papai vai ser muito feliz. Sê boazinha.
Pede que tragam o seu filhinho Clcero, de seis
meses apenas.
Vendo-o tão gordinho, tão forte, tão risonho, abrin­
do '!'" braços para o pai, lhe diz:
"Que gracinha do meu filhinho! Deus é teu pai
agora! Deus te crie para o bem."
E à espôsa:
"Dou graças a Deus pela familia que me deu. Dou­
lhe graças por se ter servido de mim para fazer algu­
ma coisa em prol do Seu Reino. Dou graças a Deus
pelas �nçãos extraordinárias que me tem concedido.
:t verdade que o meu ministério foi cheio de espi-
nhos e amarguras.
Mas nio é o discípulo maior do que o seu Mestre".
Determina como quer que o vistam.
"Vistam-me como se eu f&se pregar o meu último
sermão. E com todo o respeito; pois êste corpo é tem­
plo de Deus."
Entram no quarto vários vizinhos e amigos, dos
quais fie se despede, falando a cada um da necessida­
de de crer em Jesus Cristo.
"Desejava despedir-me de todos os meus amigos. ..
Mas não chegarão a tempo!
Digam-lhes, porém, que os espero ver a todos no
céu ... e que não levo mágua DE NINGUÉM, DE NINCUÍ:M.'r
Lamenta a ausência de seu• filhos Eurlpides e
Américo, aos quais deixa conselhos e exortações.
"Meu filho Eurlpides me substituirá em tudo; e
isso me consola. Tenho confiança nêle. &e tomará e>
meu lugar e te ajudará, Isabel, a guiar os seus irmão­
zinhos no temor de Deus.

16�
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Dize-lhe também que as minhas dlvidaa precisam
ser pagas, como pagas estão as minha.. dividas para
.,om Deus: Jesus pagou-as em meu lugar . . . "
"Dize a meu Pai e a meus irmãos que creiam em
Jesus Cristo."
Percebe que mandavam chamar
- o mfdico, Dr. Fe-
linto Coimbra:
"Não, nio chamem o Coimbra. 2le é muito meu
amigo. E por saber que eu ia morrer, não quis ílcar
aqui.n
Após extralrem o sangue para exame: "Senti uma
dor horrlvel, um suor frio . . . uma agonia de morte . . .
Naquele momento me lembrei de Nosso Senhor pade­
ttndo muitlssbn o mais, derramando todo o Seu Sangue
na cruz, em meu lugar!u
�rda o salmo que diz: - "Quando eu passar
pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum."
"Os que estio viajando no deserto, sob um sol caus­
ticante e abrazador, gostam de refugiar-se a uma som­
bra qualquer.
Pois a sombra da morte é a sombra de Jesus.
Eu estou nessa sombra . . . "
"Oh! como é agradável estar li sombra de Jesus!
Quem ama a Jesus não leme a morte! Para quem
ama a Jesus, a morte nada mais é do que a passagem
desta vida para o Céu!
Pediu que cantassem o hino que diz:

"Com Jesus l1á mOTada feliz,


Prometida e segura 1101 Céus!
Avistamos o santo pala
Pela fé na Pala,,,.a de Deus!"

S6 êle cantou, pois todos choravam!

170
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Fêz outra belisima oração pela familia e pelos ami­
gos. (Chega nesse momento o Dr. Bretas, um dos três
médicos assistentes) .
Tenninada a oração, continuando de olhos fechados,
diz que muitas vêzes falara s6bre o céu, mas nunca o
imaginara como estava VDiDO naquele momento.
E. sorrindo:
"Como Jesus é bonito!
Mas é tão lindo, tão lindo, tão lindo . . .
Palavras humanas não podem descrever as belezas
que estou vendo!"
E, de olhos fechados:
"Assim vejo melhor o meu Jesus.
Falarei com Jesus enquanto puder . . . "
"Oh! estou tendo visões da cidade santa!"

"Não sei se �sus me vai levar, ou os anjos. Sei
.
que vou subir . . .
"Quem a1na a Jesus não teme a morte!"
"Estou entrando na Cidade Santa!"
"Jesus não quer que conte o que estou vendo!"
O Dr. Bretas, que estivera a preparar uma injeção
e a ouvir tudo aquilo, chega perto da cama e pergunta:
- Dr. Menezes, que sente o sr.?
- Ora, doutor, eu estava entrando no céu e o se-
nhor me fêz voltar . . .
- Mas que sente o sr.?

- Sinto visões do céu. Estou vendo Jesus a me


chamar!
- Deixe disso, Dr. Menezes. Vou dar-lhe uma
injeção.
- Ora, que ingenuidade, doutor! Jesus Cristo está
me chamando e o senhor me quer deter!
Contra Deus não há resistincia!
- Mas, Dr. Menezes, o senhor está fraco . . .

171
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- Fraco está o senhor na fé. Escute, doutor, o se­
nhor é muito meu amigo. Vou pedir-lhe uma coisa:
creia em Jesus Cristo.
- Mas eu creio nêle.

- Mas o sr. precisa converter-se. Quero encon-


trá-lo no Céu. Eu já vou partir.

Despedindo-se de todos os presentes, fala-lhes de


Nosso Senhor.
O advogado Dr. Ant6nio Honório, que testemunhou
a despedida do Rev. Américo, comentou a cena: "Como
é posslvel wn espôso tão carinhoso e um pai tio amo­
roso despedir-se da família assim ? Não há dúvida de
que estivesse vendo mesmo algo de extraordinário!"
Outras pessoas que o visitaram para confortá-lo
declararam que elas é que salram confortadas, suma­
mente edificadas.
Ao tomar um banho para fazer descer a febre, que
já principiara a subir, diz estar passando o Rio Jordão.
Noutra ocasião, vendo-o com os olhos parados, fi­
xos no Céu, e julgando-o desmaiado, pergunta-lhe o
Dr. João Wollmer o que tem.
- Nio me interrompa, doutor. Estou pedindo a
Deus pela minha Isabel e pelos meus filhinhos.

No último banho, não aguentando o pêso do corpo,


cai de joelhos P d..- mãos pasla.111, diz.endo: "Morre, ser­
vo de Deus! De joelhos e orondo! Assim é que um
cristio deve morrer!"
Ainda não ero chegada, porém, a sua hora. Um
dos médicos, afim de verificar se estava em seu julzo
perfeito, diz cm voz alta:
- Parece que êle não tem fé!
Ferido em cheio no seu coração profundamente
crente, brada, excitado, de modo que de longe se ouvia:

172
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- Não me d;gam que eu não tenho fé!
Não me digam que eu não tenho fé!
Eu nunca neguei o 1neu Jesus!
Nunca! Nunca! Nunca!"
Sua esp3sa procura acalmá-lo:
- Américo, diseram que você não tem fé . . .
medicina . . .
- Não, Isabel, não foi isso : eu compreendi muito
bem. Disseram que eu não tenho fé em Jesus Cristo!
Isto é demais! :S: demais! I!: demais! Eu amo tanto e
Jesus ! Nunca o neguei! Como dizem que eu não
tenho fé?! Eu tenho fé, eu tenho fé! Eu creio no meu
bendito Salvador!

Dai em diante não teve f6rças para falar muito.


No dia seguinte, quinta-feira, 12, já não pade fa­
lar mais.
As 11 da noite chegam os dois filhos que estavam
fora e se dirigem para o Hospital Evangélico, para onde
o pai f&ra levado na tarde daquele dia.
Lá chegados, um dêles chama:
- Papai! . . .
Mas já não reconhecia ninguém. Insiste, porém:
- Papal . . . quem está aqui . . . é o Eurlpides . . .
Os seus olhos brilham, e, num último esfôrço, se
dirigem para o lado em que estava o filho.
Reconhece-o!
Sorri!
E tenta pronunciar o seu nome . . .

Minutos depois, parte para a Eternidade!

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LIVRO SEGUNDO

Do CALVINISMO, VIA LUTERO,

AO CATOLICISMO

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rtJo:MINISC�NCIAS DA INFANCIA E DA

ADOLESCtNCIA

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r�
� "1
EUS PRIMEIROS anos transcorreram no
ambiente doméstico que já descrevi ao falar
de meu paL
Nascido em Campinas a 23 de setembro
de 1909, no SeminArio Presbiteriano, que funcionava
então à Rua Dr. Quirino, e onde meus pais residiam,
fui batizado na Igreja Presbiteriana daquela cidade
pelo Pastor Zacarias de Miranda.
Alguns meses antes de eu vir ao mundo, viajando
mem1 pais a cavalo, no Estado de Minas, esliveram,
11urna noite fechada, à beira dum enorme preciplcio,
do que só no dia seguinte tiveram conhecimento. Na­
quela noite, junto do despenhadeiro, tinham feito uma
oração consagrando ao serviço de Deus a criança que
eslava para nascer.
E foi ao som de salmos e hinos religiosos, ouvindo
lnlnr dos heróis da fé, e sobretudo de JESUS, que des­
pertei para a vida.
Jesus não era para mim uma figura lendária, nem
npenos um personagem histórico mas distante: cro Al­
�ui•m, era uma Pessoa Viva, que morava conosco, que
c•tova sempre ao nosso lado; era tão real e tão próxi­
mo quontu meu pai, cuja fé robusta e nrdente conta-
1-:invn 11 quantos dêle se aproximavam.

179
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Ao dar ac6rdo de mim, estava já matriculado na
Escola Dominical, tendo ganho de presente, aos 5 anos
de idade, um exemplar da Escritura Sagrada como
prêntlo por não haver faltado às aulas nenhuma vez,
durante o ano."
E nio me satisfazia com as aulas da minha classe.
Metia-me também freqilentemente, no meio dos adul­
,
tos para ouvir as explicações que dava à "Classe dos
Homens" o seu professor, o Dr. Samuel Gammon.
Um dos brinquedos prediletos de alguns dos meus
filhos menores, como é comum acontecer nas familias
católicas, - era o de "celebrar a Santa Missa". Quando
garotinho gostava de fazer, muiatis mutandis, a mesma
cousa. Num dos quartos da casa pastoral de Lavras
instalei a minha capela. Nas cadeiras, pequeninas, sen­
tavam-se algumas bonecas, às quais, querendo imitar
meu pai, eu 11pregava,, do alto de meu 11púlpilo11 sôbre
1
o qual se via um volumoso dicionário, que faz.ia as vê­
zes de Blblia.
E discursava com entusiasmo: ºEu sou Jesus! Eu
salvo a todos: pobres e ricos, ignorantes e sábios, pe­
quenos e grandes! A todos eu salvo. Vinde a mim!"
E como era só isso o que sabia dizer, repetia du­
rante v6rios minutos as mesmas palavras, para não fi­
car resumido demais o "sennio".
A um dos meus companheiros de inlAncia, Jairo
Morais, que veio a se tomar depois ilustre médico, ex­
pulsei um dia, en�rgicamente, da ntlnha "igreja". l!:
que se pusera a rir, e . . . em pleno sermão!
- "Isto aqui não é lugar de brincadeira! l!: a casa
de Deus! Faça o favor de se retirar!"
Certa vez, surpreendi a assistirem ao meu 11culto",
encostados à porta entreaberta . . . meu pai e minha
mãe. Nesse dia, tão encabulado ficou o pregador que
o culto acabou mais cêdo do que de costume.

180
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Os heróis que povoaram a minha imaginação in­
lanlil foram os da Blblia Sagrada: Moisés, Josué, Sa­
murl, David, Sidrac, Misac, Abdêncgo, Daniel, José do
�;&:ilo . . .
Como gostava de ouvir a história de José!
Sentado ao colo de meu pai, ouvia, atento e emo­
cionado, o drama do grande patriarca.
Mal terminava o último episódio, pedia-lhe, sem a
menor cerim6nia:
- Conte de novo, Papai . . .
De vez em quando, nalgumas de suas viagens a
cavalo, nas proximidades de Lavras, meu pai me leva­
va consigo. Era tão pequeno que viajava montado no
l selim e s6bre uma almofada.
ml'llJlO

Ainda me vejo numa casa muito pobre, dum pie­


doso 11crenten, num lugar chamado ºCarrancas". a
aquecer as mãos, ao lado de meu pai, junto a um fogão
de tijolos.
l!: dessa época também a recordação indelével que
me ficou dum livro Intitulado "A Beautiful Li/e": era
uma "vida de Jesus" fartamente ilustrada com expres­
•lvas representações pictóricas de Nosso Senhor, da
Virgem Maria, de S. José, do Anjo da Guarda. O pre­
conceito protestante contra as imagens não ia em nos­
sa casa ao ponto de impedir que se utilizassem aquelas
"'lições objetivas", muito usadas também em quadros
murais, em cartões coloridos e em revistas da "Escola
Dominical".

A religião que bebi com o leite matemo, que se


\'lvla no nosso lar, que se aprendia na Escola Domini­
cul, era Jl!!SUS. Tudo girava em Ulmo de Jl!!SUS!

181
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Conseqüentemente era uma religião de alegria, de
confiança, de felicidade, que se nos incutia na alma
e se refletia nos hinos que aos dois anos de idade eu
jA cantava:

"Jeawt sendo meu, sou muUo feliz!


Eu t>OU para o céu, meu lindo pala!
ou então:

"Nem na teTTa, nem no céu,


Um n ome h4 como JESUS!
tle sôbre tudo reina,
tle é 111inha ete"'4 Luzi"
Poderei, mesmo, repetir as palavras do Padre Fa­
ber, que, aliás, foi ministro anglicano 22 anos, toman­
do-se depois uma das figuras mais eminentes da espi­
ritualidade católica do século passado:
"Quando foi que chegamos a amar a Jesus com
amor tio ardente, tão entuslãstlco, como o que nos ani­
ma agora? quando brotou em nós esta piedade? em
que lugares, em que circunslàncias e quais as lembran­
ças que se as.saciam ao meu pensamento?
Vejo como que fios de ouro, que se entrecruzam
nn lrnma da minha vida passada; v�m-se aqui e ali, em
qualquer dobra do tecido; em nenhuma delas deixam
êles de brilhar! Aqui e acolá, estA o divino padrão
apagado, ou obscurecido. . . e os fios desbotados; mas
não estão quebrados: unem ainda as divenas partes
enlre si, e conservam a unidade do todo. Talvez não
o veja eu bem claramente, com ktes olhos marejados
de IAgrimas. . . parece-me, todavia, que desde o meu
bêrço . . . até a idade madura, entrecruzando-se, com­
põem os fios de ouro o doce nome de .naros; e em qual­
quer lado para o qual lance as vistas, e de qualquer

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lugur que o leia,
virando e revirando o tecido, leio:
Jt:sus ! .JESUS sempre! nada senão .Jz.sus! ''t1J
Vem a propósito aqui a judiciosa observação do
Pe. Georges Tavard: "Antes de ser um negador dos
principias católicos, um protestante é um homem nas­
cido numa tradição religiosa diferente da nossa. Antes
de ter convicções raciocinadas em lavor da Reforma
do século XVI e das sociedades religiosas que dela se
nriginnrnm, é êle influenciado por um mundo de im­
pressões recebidas na in!Ancia, que formarão mais tar­
de, em grande parte, a estrutura do seu pensamento.'�»
Aos sete anos de idade, em Belo Horizonte, depois
de ter feito o curso do "Jardim de lnfAncia Bueno
Brandão'', fui matriculado no "Grupo Escolar Barão do
Rio Branco."
Minha professôra, com quem, aliás, me correspon­
di sempre, enquanto viveu, foi a afamada educadora
D. Benvinda de Carvalho Azevedo.
Foi o meu primeiro encontro com uma alma cató­
lica, e que me fêz um bem imenso! I!: que ela sabia
de fato viuer a sua fé! Suave no trato pessoal, delica­
d b;sima, era a própria caridade personificada.
Sabendo-me filho de pastor protestante, respeita­
va a minha consciência e a posição da minha familio.
Jamais tentou catequizar-me diretamente.
Tôda bondade para comigo, manifestando mesmo
por mim especial predileção, anulava qualquer cons­
trangimento que eu pudesse ter como único "proles­
lnnte" da classe. Lembro-me de que, num dia em que

(1) O Sonllalmo s....,...m.,.lo - F. W. F.ua - F.dllora


v..... 11139, ""· lZl-128.
(2) A la NRcon.tn du prottatanlinn.e - GIOICIB TAYMD,
,••. 8.

183
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fôra fazer uma palestra em nosso Grupo o poeta Olavo
Bilac, além do Hino Nacional e do Hino à Bandeira,
iriam cantar também os alunos um hino religioso, cató­
lico naturalmente.
D. Benvinda aproxima-se discretamente de mim e,
com aquela suavidade que punha em todos os seus ges­
tos e palavras, procura pôr-me à vontade:
- "Não fique constrangido. Se Você não quiser, não
precisa cantar esse bino."
E não era D. Benvinda uma católica "folcl6rica".
Ao contr6rio; bem convicta e afirmativa. Mais tarde
Deus lhe mandou um filho, a quem soube dar uma edu­
cação cat6llca modelar. Hoje é o diretor geral dos estu­
dos e professor no Pontlflcio Colégio Pio Brasileiro de
Roma; o R Pe. Dr. Marcelo de Carvalho Azevedo, meu
diletlssimo amigo.
Era, porém, inteligente; e sabia que às vêzes é me­
lhor falar com Deus a respeito de certas pessoas do
que com certas pessoas a respeito de Deus.
E marcou-me a alma indelêvebnente. Foi ATRA­
ris DI: SUA BONDADE que tive o primeiro contacto indi­
reto com a Igreja Católica.

Certa vez estranhou minha mãe o pêso da


mala que eu levava para o Grupo. Abre-a e descobre,
junto com os livro.• escolares, um volumoso exemplar
da Blblia . . .
- Paro que vai levar a Blblia para o Grupo?
t que me impressionara bastante um sermão que
ouvira sôbre a triplice tentação com que Satan6s qui­
sera derrubar a NDS90 Senhor; e também com llll vi­
tórillll de Jesus, que, a cada Investida do Inimigo, res­
pondia: "Estd escrito!" Expliquei, então, a minha mãe
que levava comigo a ºPalavra de Deus,, para "espan­
tar Satan6s" se porventura me aparecesse no caminho...

184
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Tão logo aprendi a ler, entrei em con tacto direto
com a Escritura Sagrada. Havendo, no quintal da
nossa case, aquela célebre "casa dos escorpiões", para
mais de uma dúzia de altas e frondosas mangueiras, re­
íugiava-me, freqüentemente, num ºescritório" que eu
mesmo construira no alto duma das árvores, a fim de,
isolado e em sil�ncio, ler o Livro de Deus.
Certo dia, como estranhasse minha mãe a minha
ausência, um tanto prolongada, procurou-me e deu co­
migo lá em cima da 6rvore. Duvidando da estabilida­
de do "apartamento", construido entre galhos que bem
poderiam ceder, decretou sumàriamente o meu des­
�jo!
E acabou-se o meu primeiro eremitério . . .

Minha prbneira redação escolar, cujo original mi­


nha mãe guardou e me deu de presente há alguns anos
atrás, tinha como tltulo: "O meu ldeal":
"Meu ideal '· quando creacer, sair pregando a tôda
gen� o Et>Gngelho de Je11WJ.
Del<Li muito pequenino, eu acompanhaoa meu pai
nu viagena que éle fazia, para pre11ar a Palavra de
Deus, e aentia o desejo de fazer um dia a meama coiaa .
Jesu disae: "lde por todo o mundo e prelJGi o
Et>Gngelho a t8da criatura."
Alguém � de ir. Ma.a deoe ser chamado. E eu
sinto que sou chamado para um trabalho como êue, pois
não tenho maior alegria do que ao pen.aar niaao: em ir
por IÕ<la paTte, prelJGndo a todoa o Et>Gngelho do Rei­
no de Deus. tste o meu ldeal. Que Deus me ajude
a realizá-lo.
Eurípides de Menezes
Grupo Escolar Barão cio Rio Branco"

185
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J' falei do nosso "culto doméstico", que se fazia
diàriameote pela manhã, com a presença de tôda a
familia.
Quando acontecia, porém, estar meu pai ausente
de Belo Horizonte, era eu que, na qualidade de primo­
ghito e, portanto, "substituto legal do chefe da fami­
lia", dirigia o culto, fazendo a leitura da Blblia e to­
cando no harmonium alguns hinos que eu tirara de

de ouvido e que todos cantavam.

No "taboleiro de areia" da Escola Dominical re­


-coostitula, em relêvo, a topografia da Palestina, fami­
liarizaodo-me de taf forma com as cidades, com os aci­
dentes geogrificos da Terra Santa, que, em 1957, quan­
do_realizei o meu sonho de criança, visitando, pela pri­
meira vez, 'a P'tria de Jesus, tive a impressão de que
1'evia os Lugares Sagrados.

No principio de 1919 muda-se a familia para La­


vras, onde estudei, por um ano, no Colégio Kemper.
Em janeiro de 1920 transferimo-nos para o Rio, onde•
vinha meu pai exercer o pastorado e lecionor no "5"­
minirio Unido".
Estovo cu com dez onos de idade. Recordo-me
de que, nesse ano, tive um dia forte dor de eabeça de
tanto pensar no mistério da predeslirlação . . . I!: que
eslivero a ler um-as páginas de Calvino . . . Meu pai
procurou sossegar-me dizendo que êste é um dos mui­
tos mist.!rios que só no céu compreenderemos; e que os
mais eminentes teólogos não haviam chegado a uma
solução satisfatória; que eu confiasse, sobretudo, na
misericórdia de Deus.
Continuando os meus estudos no Colégio Batista,
onde meu pai lecionava também, freqüentava, aos do-

186
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mingos, n Escola Dominical e o cuho na Igreja Pres­
biteriana da Rua Silva Jardim, de que era pa•lor o
Ht·v. Alvaro Reis.

O ano de 1921 assinalou-se de. modo particular na


minha vida espirilual. Foi nesse ano que ouvi memo.
d1vel sermão dum pastor que havia sido colega de meu
pai em Lavras e em Campinas: o Rev. Pascoal Pitta.
Falou sôbre aquelas palavras de S. Paulo: . . . "e subi
n Jer11saUm para ver a Pedro; e fiquei com êle quinze
(fias."
Imaginava o pregador, usando um método que de­
pois vim a saber que era de S. ln!cio de Loyola, como
teria Lranscorrido aquela quinzena que passaram
juntos os dois ·apóstolos; S. Pedro a levar o converqdo
de Damasco a todos aquêles lugares hist6ricós nos quais
se deram os acontecimentos principais da vida e sob..,_
tudo da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Numa intenslssima vivência de tôdas aquelas ce­
nas, que me abrasaram o coração, lembrando.me de
que, aos 12 anos, dera Jesus, perante os Doutores da
Lei, o seu "testemunho" no Templo de Jerusalém, ...,_
solvi fazer a "profissão de fé", que é, entre os evangé­
licos, a confirmação do batismo recebido na infância.">
Com permissão de meu pai, apresentei-me, para o
exame de praxe, ao conselho de presblteros, presidido
pelo pastor Alváro Reis.
Aprovado, marcou-se o dia da profissão solene,
que foi para mim um grande dia: 2 de outubro de
1921; tanto mais que a cerim&nia se realizava no mes­
mo lugar e perante o mesmo pastor que recebera, vin­
te anos antes, a profissão de meu pai.

(3) O. ovangmc.. baliram u criança, eaceção feita dGo


batlslal e congrepclonaliotas

187
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Afervorei-me mais ainda.
Além das aulas da Escola Dominical, de cuja "clas­
se de juvenis" eu era diretor, pertencia ainda a outra
sociedade da par6quia: a "Sociedade Juvenil de Es­
fôrço Cristão."
Efetuandcrse na cidade de S. Paulo um "Congres­
so Nacional das Sociedades de Esfôrço Cristão", fui
eleito delegado da minha sociedade, fazendo então, com
doze anos, o meu primeiro discurso.
Aos treze, após o culto, ia freqüentemente com doi.�
outros amigos à Quinta da Boa Vista, onde, na "Ilha
dos Amores", que fica no lago que ainda ali existe,
llamos juntos um trecho da Blblia, reuivamos, e nos . . .
confessávamos entre n6s, a fim de verificar o progresso
feito naquela semana. Já sentlamos a necessidade da
confissão . . .

Meu pai, poNm, continuava a ser o meu amigo por


excelência, e o meu companheiro de todos os dias, quan­
do !amos e vinhamas do colégio, de que ile era prcr
fessor e eu aluno. Deixava de bom grado fôsse o que
fôsse para ter o prazer de palestrar com êle, ainda qu"
por alguns minutos. Adlvlnbava-lhe os pensamentos e
desejos. Quanto mais o tempo passava, mais amigos e
inseparáveis.
Certa vez, numa grande sessão em homenagem a
Álvaro Reis, presente meu pai, fui eu o orador repre­
sentante da mocidade evangélica; meu pai o do clero
presbiteriano.
Já nos antevfamos colegas: êle pastor e eu o seu
coadjutor.

Chamara a mim a incumbincia de zelar pela lim­


peza e pela ordem de sua biblioteca, onde, muitas vê­
zes, interrompia o trabalho e me deixava levar pela

188
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ll'nlação de folhear os seus livros, nos quais o que mais
me interessava eram os grifos com que êle marcava os
pensamentos que mais sintonizavam com os seus. :tste,
nliós, um modo excelente de se pene trar na alma de
alguém.
Sonhávamos ambos também com a organização de
uma orquestra em casa. :tle tocava flauta; eu, que já
dedilhava alguma cousa no órgão, estudava violino,
juntamente com meu mano Américo, um pouco mais
moço do que eu; os outros irmãos entrariam oportuna·
mente para a nossa 11Sin(6nica11• E então seriam mais
solenes os nossos cultos domésticos, e mais alegres as
festas de lamllia. Pensamentos, projetos, aspirações,
era tudo impregnado do desejo de servir melhor a Deus,
de honrar de modo mais perfeito a Nossn Senhor Jesu•
Cristo, que era, de fato, o rei dos nossos corações, para
Quem convergiam nossos afetos e aspirações.

Desnecessário dizer que em Carnaval nem se fala­


va em nossa casa. Não se podia imaginar a menor par­
ticipação de um verdadeiro disclpulo de Cristo nas fes­
tas do "deus" Momo, que nada mais são do que a re­
petição das bacanais e saturnals da Rama pagã, das
orgias que se realizavam ao clarão macabro daquelas
tochas vivas que eram os nossos antepassados na fé,
amarrados aos poste., untados de pk e queimados lm­
piedosamen te.
Como é que os cristãos de hoje tomarão parte na
fosta execrando? - perguntava o pastor coerente.
- Mas, Reverendo, o Carnaval nas cidades do 1.n­
terior não é como o do Rio de Janeiro, como o dos gran­
des centros, - ponderou certa vez uma senhora.
- Sim, minha senhora, respondeu-lhe o pastor.
Nas cidades menores não é o Carnaval tão aboml.nável

189
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quanto nas capitais. O punhal não atravessa o Cora­
ção de Jesus; mas sempre fere, sempre dói.
Era intransigente quanto à festa pagã. E alé os
serpentinas coloridas, em si inofensivas, os confeles e
lança-perfumes, eram radicalmente banidos pel11 rela­
ção que linham com a festa em que se adorava um
"deus" pagão e que constitui Inclassificável afronta a
Nosso Senhor Jesus Cristo. 141
All!m de professor do Colégio Batista e do Seminá­
rio Unido, era meu pai co-pastor da t.• Igreja Presbi­
teriana e pastor de numerosas congregações presbite­
rianas nos subúrbios do Rio de Janeiro.
Certo dia, preparava-se para ir pregar na pequena
igreja de Nil6polis, no Estado do Rio, quando o chamam
para atender a um enfênno em estado desesperador.
Por sugestão de um amigo, presente em nossa casa
no momento, deliberou-se que se solucionaria a difi­
culdade indo eu pregar em lugar de meu pai! Por que
não? Já não tinha leito tantos discursos na Escola
Dominical?
Um garôto de 14 anos! . . . que mal comcçnva o u':tr
carças compridas: as do uniforme do colégio!
Era o di11 24 de mnrço de 1924.
Feito o primeiro ..sermão",t!1J npesor de criança
como c.-ra e nodo mais do que simples esludunte, passei

(4) AI� nisso seu coração sentia com a Igreja CatúliCõl,


que.o inatitulu oficialmente, em 1539, por lnJciaüva de S. Antô­
nio Maria Zacaria, a Adoração solene do Sanll!lsimo Sacnunenlo
denominada ..Adoração du Quarenta Horas", em repe.ração o
desagravo pelas orenas que durante o tríduo carnavalesco nottbe
o C.Oraçio de NOSIO Senhor.
(5) O aaunto foi: "Gnnd.. peraonagens blbllcos que d.. -
de criança stTYiram ao Sshor." Aaim. de ' certo modo, jU!tl-
flcava a minha p,_..;a no p61 pi to.. .

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11 receber, tOOas as semanas, convile9 paro prcgnr nes
111,.,Jas presbilerianas do Rio; e, nas férias, fora do Rio
lumbém. Em pouco tempo já estava sendo também
r.,qulaitado p<!lll!I ig,.,jas metodistas, congregacionalis­
lüs, eplscopai_., balistas, etc. Foi-me, ali'5, de grande
ulllldnde Hpirltual ler p&."5ado, como passei, a adoles­
l'tlnclu tõda no púlpito.
Cornplalados os 15 anos, apresentei-me ao "Pres­
bi"rlo do Rio de Janeiro" para prestar, peranle os pas­
tõn>s e pl't'•blleros daquele concilio, de que meu pai
�r11 Mreret.Arloapermanente, o exame a que se deve sub­
rnoter todo aspirante ao pastorado e fim de ser arrolado
c·omo .. cnndidato oficial ao santo ministério", tllulo ne­
"''"""rlo pare admissão no Seminário.
Após minucioso interrogatório sôbre os motivos
11or que desejava abraçar o pastorado, retirei-me do
lumplo para que, na ausência do candidato, se dis­
l'Uliase "a sua idoneidade moral e as suas qualidades
1mra Ião importante função."
Aprovado, fui introduzido no recinto da sessão e
r.nluncmcnte recebido, na presença de meu pai, que se
r<'jubilava em ver o seu primogênito a seguir-lhe os
pa•sos.
Era algo semelhante à tonsura clerical na Igreja
Cotóllcn.

A morte de minha irmã Irene, de dois anos e meio,


nlingiu-nos a ambos, em cheio, o coração. Sofri pro­
lundamente.
Vinte e três dias depois, outra dor, maior e mais
ncabrunhante ainda: a morte inesperada de meu pai!
Foi como se o mundo se acabasse ! Durante uma
,;emana estive de cama, atordoado com a catástrofe que
se abatera sôbre ritlm!

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Aos 38 anos de idade! Exatamente quando estava
preparado para principiar de fato a sua vida! E quan­
do eu mais necessitava dêle, do meu Amigo, do meu
Alttt Ego!
Foi a fé que me sustentou naquele transe; e me
deu f6rças para suportar o golpe crudellssimo!
Niio podendo ser o companheiro de meu pai, quis
ser, então, o seu continuador. E prossegui os meus es­
tudos no Colégio Batista, passando interno o ano de
1925 e pagando as minhas despesas com o trabalho de
instrutor do Grupo de Escoteiros do Colégio . <6>
Aos domingos, e às vêzes no meio da semana tam­
bém, pregava nas várias igrejas evangélicas do Rio. E
é bom registrar que nenhum provento material tirava
daa minhas pregações.
Para estar mais à vontade e poder preparar-me es­
pirituabnente de modo a ter o que dar aos meus ou­
vintes, resolvi um dia fazer uma incursão pelas matas
do Trapicheiro, limltrofes com os terrenos do colégio,
em busca de um lugar silencioso em que pudesse fa­
zer uma espécie de eremitério.
Qual niio foi a minha surprêsa ao encontrar um
<!ompanheiro de /uua, que j6 construira antes de mim,
em plena mata, uma cabana, onde ia ler e meditar a
Escritura Sagrada, e orar sem o perigo de ser inter­
rompido. Era o meu colega Luiz de Assis, que, trin­
ta e quat.ro anos depois, fui encont.rar como pastor ba­
tista em Alagoas, sempre metódico e piedoso. Foi uma
lesta para nós ambos. Ao revê-lo referi-me ao seu
modo peculiar de grilar, a côres, com uns retingulos

(6) Deixara meu pai ....ia .. mil nlls (Crt I0,00) na sua
car1elra; e alllWDU dlvidal que, aos pouaB, .., liquidaram i.ate­
iiralmente. Minha mie fU:ou com mod- pemio.

192
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que pareciam impres!IOS, os verslculos blbllcos que mais
lhe falassem ao coração.
- Ainda faz assim ?
Tirou, então, da estante e passou-me às mãos a
sua Blblia, marcadlssima, muito lida portanto, e muito
medilada.
l!:ramos, nas melas do Trapicheiro, dois eremitas,
cada qual na sua respectiva cabana.
Não B11bla eu que estava a fazer o mesmo que fa­
zia meu f>Bi, quando, em Lavras, se apressava a termi..
ner a sua larefa para ir rezar sõzinho num bosque. E
nem cu, nem meu pai, nem o meu amigo Assis sab(a..
'"°" que aquilo era muito mais comum na Igreja Ca­
tólica do que no meio protestante. Nunca )iramos
coisa alguma sabre o Poverello e suas idas frequentes
às malas do Alveme; nada lêramos sabre os Padres do
dcM'rto, os eremitas antigos. Asfam09 instlntlvamen­
ll'. Muito antes de ler D. Chautard, j! me havia con­
vencido por mim mesmo de que a oração era "a alma
d., todo apoalolado." AIJ!s, tivera bem perto de mim,
unos seguidos, o melhor dos exemplos, aquêle c:ristio
admirabillso sim , que sempre foi, e acima de tudo, "um
homem de oração", e que aconselhava: ''Se tiveres
cinco minutos para preparar um sermão, gasta quatro
em oração."

Necessitando minha mãe e meus irmãos menores


da minha ajuda financeira, tive de fazer, em 1928, um
grande esfôrço para prosseguir os estudos no Curso
Superior de Preparatórios, trabalhando ao mesmo tem­
po no gabinete do Vice-Diretor da Estrada de Ferro
Central do Brasil.
Convidado, então, pelo antigo Presidente Nestor
Gomes pare seu secret!rio particular, rejeitei o convite

193
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a fim de não interromper os meus estudos para o pao­
torado; e fui ao Estado do Esplrito Santo agradecer
pessoalmente ao meu amigo e explicar-lhe de viva voz
os motivos da recusa.
Durante um ano fui, todos os domingos, à cidade
de Marquês de Valença, em substituição ao Pastor Ly­
sllnias de Cerqueira Leite, que, Vice-Diretor da Central,
professor do Semin6rio e pastor doutras congregações,
s6 podia ir de vez em quando ministrar a "Santa Ceia"
àquela sua paróquia. Pràtlcamente o ''pastor'' era eu;
aos dezessete anos de idade! Aliás no dia do meu 17.0
aniversário, naquele ano, pregara, e não pela primeira
vez, do púlpito de Alvaro Reis, na Igreja Presbiteriana
da Rua Silva Jardim. Estava bem integrado na ativi­
dade pastoral, embora não passasse ainda de simples
ginasiano.

194
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"SEMENTES"

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O ANO SEGUINTE, eslava eu na direção
do Instituto Mont'Alverne, que era um
curso de preparação de candidatos aos exa­
mes vestibulares das Faculdades de Mediei ·
na, Engenharia e Direito. Matriculei-me então na
"Faculdade de Teologia das Igrejas Evangélicas do
Brasil", comumente chamada "Seminário Unido", de
que meu pai tinha sido professor.
Aquela instituição original, pois que reunia alu­
nos de vúias udenominações,, evangélicas, era, como
ficou dito já, uma tentativa de unificação do protestan­
tismo brasileiro. Não é de hoje que os evangélicos,
sedentos de unidade, procuram uma fórmula de extin­
guir o que êles mesmos consideram "o esclndalo das
divisões."
Naquele Seminário, estudando juntos alunos de
várias "denominações,., se estabeleceria, com o conhe­
cimento reciproco, a amizade pessoal entre os futurao
pastôres, o que haveria de facilitar, mais tarde, uma
aproximação maior e, por fim, a desejada unidade. <1>

(1) Era multo comum, como também noulrol t.empoa suce­


di• miro os reliciosm du várlu Ordena da própria '8rela

197
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Ta.las as aulas eram dadas em conjunto, exceto
uma, no último ano: a de upontos denominacionais".
Então, para cada grupo, havia um professor, represen­
tante da respectiva "denominação" integrante da Fa­
culdade.

O curriculum do "Seminário Unido" era, em linhu•


gerais, o dos nossos seminários cat6licos. Primeiro a
Filosofia, com as suas clássicas divisões, que se cursa­
va juntamente com o Grego, o Hebrtico, Introdução
ao Novo Testamento, Mqueologia, Patrlstlca, etc.; de­
pois a Teologia Dogmática, a Teologia Pastoral, Her­
menêutica, Exêgese nos textos originais, etc.
As aulas de Hornilética, ou de Eloqüência Sagrada,
eram das mais interessantes.
Ao lado do Seminário estava a Igreja de S. João,
melodista, onde, às quartas-feiras de noile, pregavam
os seminaristas. Era a aula prática de Homilética.
De lápis em punho assistiam também ao culto, e à
pregação, todos os professôres e alunos, que depois
se reuniam numa sala da Faculdade para fazer, com o
réu presente, a critica do sermão.
Os colegas eram terrivelmente rigorosos, mais do
que os professôres.
Por fün se pronunciava o catedrático, o suavissimo
Pastor Odilon Morais. Salientava o lado negativo e o

Católica, viverem OI evana:élicos dentro de IUU "denominações",


sem nenhum contato com u demala, desconhecendo-se e até
.., hostilizando mul\wnenle.
Nio odmlna tenha vivido algum evU11llco l oem conh..,.,r
também • !peja C.tóllca, suaa doulrlnu e lleWI pro-homens,
principalmente nm tempos cio lm"'rio e nm prlmelrm - da
República . . .

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positivo do sermão, dando sempre um jeito de se r<!le­
rir ao grande pastor franc& Monod, de que era admi­
rador entusiasta.
Foi por sua influência que entrei em contato com
a literatura e o pensamento da igreja reformada de
França, sensivelmente superiores às produções teoló­
gicas norte-americanas, até então predominantes nas
bibliotecas evangélicas do Brasil.
Não tardariam a manifestar-se as conseqüências
dessa latinização da nossa mentalidade.

No meu tempo de aluno dessa Faculdade duas cri­


ses afetaram profundamente a vida espiritual dos se­
minaristas, influindo, outrossim , de modo decisivo no
rumo que seguiram vários dêles.

A primeira resultou de orientação que devam às


aulas os dois professôres representantes da igreja me­
todista: Revs. Godinho e J. M. Terrell. Aquêle vier;i
dos Estados Unidos, onde acabara de fazer os estudos
teológicos, inteiramente impregnado das teorias moder­
nistas mais avançadas, que, aliás, estavam sendo Iam·
bém intensamente divulgadas pela Associação Cristã
de Moços do Rio de Janeiro e de Montevidéu; o Rc\•.
J . M . Terrell, norte-americano, professor de Teologia
Blblica, da corrente racionalista também, quase que se
limitava, nas aulas, a apontar "contradições" no texto
da Blblia, sem jamais apresentar para tais dificuldades
nenhuma solução satisfatória. Minava-se assim, pouco
a pouco, o ediflcio da nossa fé!

l!: de notar-se que a Igreja Metodista do Norte dos


Estados Unidos eliminara, pouco antes, de seus biná­
rios todos os hinos que se referiam ao "Sangue de
Jesus"! Era e supressão do que sempre fôra tido como

199
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o alicerce fundamental do Crisüanismo, e do próprio
movimento protestante!•»
Indo certa vez a Lavras, onde preguei no púlpito
da Igreja Presbiteriana, cuja Escola Dominical eu fre­
qüentara nos tempos felizes e saudosos da minha infln­
cia, fui visitar a veneranda profess6ra Carlota Kemper,
j6 quase centenária, e por quem meu pai nutrira sem­
pre profunda e justa admiração.
Inolvid6vel entrevista! Miss Kemper era um dos
últimos elos que prendiam a nossa geração àqueloutra,

(2) O "Seminúlo Unido", que DllSCl!ra sob o signo da fra­


ternidade e da uplnçio pnenllzada peta willlcação das lgr<>­
ju evangBicas, la-oe tomando ràpklamenle ma loco de lnadla­
çio de llberallano relliP-. A dlvenldade de doutrinas pn>­
leaadu pelm vários grupoa "donamin.oclonall", "• dentro dõs­
les, por ou- oub-grupoo, contribula para a negação de ver­
eia.d.• posUivu em matftia de ftligiio. O dogma degenerava em
opinião teológica; a revelação divina om mero 1eDtimenlo. Podia­
_.., freqüentar e ª" mtlBlllD pnpr em IMu u Igrejas, na

Igreja metodbta ou na preablteriana, na congregaclonalista ou


na igreja bat151e, sem ae pertoncer a nenhwna delu. Caminha­
va-• • paao1 ia....., para maa rellglio aem �. "pseudo­
-rnlsllclmno 8e'llilm4!D.tal .., em que a �ca se desligava da crença.
DaJ ao lndlferenUamo, nada mai. que um pu.so.
!'ase "crbUanl.Rno'', que pretendla wr o do tcimpo dos Após­
tolos, dos Santos Padreo, pereda-me cada vez mais discordante
do que naa aulas de Patrfsti.ca. K' nos apresentava como a Jgreja
Crl'itii primitiva, que sustentava dogma e niio apena.a opiniões.
Aliás, como Newman observou, "ntnpim. aojre o martírio por
uma. opinião•.
Vlngassmi os ideais de um smtlnárlo mlido, pn:iimovendo-se,
porém, uma wiiõo ecleelBsüca em detrimento ela doutrina, sur­
giria, certamente, alBO pereddo com • "Igreja Unitária" doo
Faladas Unidos, onde cada qual pode Cftr o que quiser, meomo
a """""'" da pessoa de Jaua, da Soma. Trindade, da Virgindade
� Maria, �� SaeramenlOI, etc. Ou então se teria mais uma
denomlnaçao . . .

200
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drm pioneiros, dos missionmí.os verdadeiramente con­
vidos e abnegados, que seguiam, de certo modo, a le­
Hhima tradição protestante, representada no século
XIX, na França, por Adolphe Monod entre os calvinis­
IWI, e por Louis Meyer entre os luteranos.
Carlota Kemper, que sempre se conservara celi­
bntária, missionária impregnada de espirita de fé, j6
constituía, no meio protestante, uma exceção. Como
ficnria encantado meu pai, - e surprêso! - se pudes­
se descobrir, como eu mais tarde descobri, no meio ca­
tólico, tantas almas da mesma têmpera, tantas religi<>­
Sllli com a mesma cultura, tantas almas santas!

Não sabia a anUga mestra de meu pai que naque­


le derradeiro encontro comigo depositaria em minh'
alma uma 11semente" que germinaria a seu tempo e
de modo inimagin6vel. Rea!m-<:hegada dos Estados
Unidos, disse-me que estava satisfeita por ter podido
voltar, pois no Brasil é que desejava passar os seus
últimos dias.
Atribui tal desejo ao grande amor que nutria pela
nossa terra, a que dera o melhor dos seus esforços, onde
tanto trabalhara por Nosso Senhor. Mas não era por
isso apenas. "Não desejo morrer nos Estados Uni­
dos, - explicou-me - porque 16, atualmente, quase
não há mais fé! As igrejas evangélicas, cada vez mais
divididas e sub-divididas, foram completamente invadi­
das pelo racionalismo. As verdades fwidamentais do
cristianismo são hoje abertamente negadas e do púlpi­
to das nossas igrejas!"O>

(3) O virus do ncionallsao <anUnua lnfecdonando mor­


lalmmte wna parte consldenlvel do evangelismo moderno. &n
og&to de 1858, por oc:aoiio do 4.0 Coasr- Plenário do "Con­
selho Internacional daa lgn!jas Cristãs" (protestantes), que

201
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Estava profundamente magoado o coração crente
daquela missionária, que os nossos irmãos separadoa,
"" costumassem canonizar os seus heróis, chamariam,
por certo, de Santa Carlota Kemper. Não queria mor-

llllNP8 62 "donomlnaçõa" de 30 paiaa, e que 6 uma reação


organizada contra o "Comelbo Mundial do lgreju" (também
prolelltanteo ), que repraenla 148 "deoomlnaçõeo" de 43 poises,
verberou onirgicamente o Pulor brael Guolroo, de Redle, u
Igrejas ewngéllcu "que nio ac:ellam mols a Ssma. Trindade,
que mantém pastora que negam o mbrenatural na Bíblia. que
não aceitam a divindade de Cristo e laum de blbllolalrla a
aceitação da Blbll.o cumo Palavra de Deua.•
"O que - RIJWldo o nferldo Congrasm, - domina entre o
maioria dos pul6reo, ditos evanaéllcos, é o vã filosofia humana,
o ecletismo. o mod.ernimno. a canvlcção de goma. a rellglão 11nn
firmeza, • monü flutuante. Deixaram de ser put6res; são qora
"os filhos p� da reforma protntante." Um dêlos diz: "O
Evangelismo de hoje ..U muito diotante do Evanaelimno doo dias
do Smhor • Salvador.• (Citado pelo Pe. Aal.Dnlo Vmu, 5.J. em
aeu livro Que peuar do Prote•lantt.mo de hoje? - pp. 5,
6 . 7).
O PMSlor Dr. Hedgard lêz, no mesmo Conpesso de Petró ­
polis, eota dolol'Ollll conlboio:
"A maioria du l1reJaa Prolntant.. de hoje est4 dominada
pelo movlmmto chamado "modemlsmo", que � uma terrlv..•l
rcbeUio contra Criai.O Rl!Cuaando-.r a crer em Cristo conlonne
t.le nos � ftV•llKlo na Bl'blla, nõo aceitam Oll modemist.M aqul1o
que 2le mesmo ensina a6bre Sua Pessoa e Sua Obra: põem em
dúvida ou rejrltarn o mal.no de Cri.to a6bre o pecado, a aalva­
.çio, o �u e o lníomo. Hoje lfm OB modemiltu uma inOu!n.cia
decisiva oôbre a maioria das orpnluções edeslútlcu proteo­
tantes. O. lndlvlduoe, .. lpeju locais e u oorporaçõel eclesiú­
Ucaa que ainda crfem na Blbll.o e proclunam o Evanselho da
Bíblia Ião apftla um resto; em muitos paism: apena um peque­
no grupo remanescente."
"Outro -tor, o Rev. J. W. Deenlk, declaro que, prltlca­
monte, tadu as lpeju do "Conselho Mundl.ol de lerei•" rejei­
tem o lnlabllidade das Eoc:rltwu (@.e Conselho - 141
�dmcnn1na9ico'�).

202
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rer na sua pátria, tão horrorizada estava com n apos·
lasia generalizada entre seus patrícios!
Voltando ao Rio, vejo de novo na cátedra do Semi·
nário, preparando os novos ºministros do Evangelho'\

Numa das conclUIÕel oficiais do Congresso do Conselho


lntftnacional das lgreju CrisW ee declan textualmente: "O
Conselho Jlllundial de Isrelu Inclui, enln oo oe11.1 mal.o inDuen­
ta corpos eclesiútlcao, vultos Inteiramente domlnadoo • conlro­
ladoa pelOI modemlstu em teoloP•, que discutem ou m�gnm a.5
doutrinas bolsicu da Sibilo, como • divindade do Crt.lo, seu
nascimento vtrclnal, BUA. morte vtcária e rxplatória, .ua l"eS'SUr­
reição corporal e aua gloriosa vinda. Por isso o Conselho Inter­
nacional da isftju Crietis podo encan!Cidamente • lodoo os
crentes em Cristo que rompam auu Upções cmn o Conselhl)
Mundial de Iareju e permaneçam conosco no amor do Senhor
Jesus Crll'to e na fKlelldade ao a.eu puro Evmq:elho."
Foi ainda maia olén aquêle noclonallmio Incipiente contra
o qual já se rebelavam os esludanla do "Somlnúio Unido" do
Rio de Janeirv em 1827. t o que se Infere desta outra conclw.ão
do citado Conlll'"880:
"t com grande tristeza que o Conselho Internacional das
llll"ias Crillia, reunido em Petrópolil, acha n-...lrlo chamar
a atenção dos crlaláos para o fato de que as Socledad.. Blblicu
Unida em geral, e a Soc::ledade Bfbllca da fndia e Ceilão em
particular, estão &e afastando do 811.1 honrosa tradição de lazer
circular apenas traduçóel exalai da Palavra de Deua. Particular·
mente é denunciada • "Revised Standard Venlon" pela sua tm­
dução lruncada de certas passagens, sacrlfica.nd.o l.Wlu de su­
premacia absoluta da Pessoa do Senhor Jesua, chegando mesmo
• despol'·lo do sua divindade e de seu nuc:lmento virginal."
Diz alndo o Comelho que várias Socledadoo Blblicu eotio
usando est.a versão t'ID edições biglóticas, como a versão anglo­
·•opanhoia, difundida na América LaUna; que, em nome da
erudição e da modernização do Idioma, u 5qndu Escrlluns
estão sendo corrompldaa a oapensu das v'rtaa Socledadee Bl­
bllca1 em todo o mwldo! E dão o nemplo de uma venio ..que
se desviou do texto ftll ma1s de 200 lupres nos prtmetra1 aele

capitulae do Ev. de S. Marcos''!

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um pastor que, a nosso ver, nem acreditava no Evm­
gelho, j6 que negava tudo o que constitu!a para nós
o Ev11ngelho.
V6rios seminaristas j6 nem aceitavam mais con­
vites para pregar. Um dêles, hoje pastor, havia três

Pena ' que • nio dlvulguem lntemam81'1te mtre oa evan­


gélicos de boa f' em nosso pala ..... conclusões do Congremo
proi..tante de Petr6poll.o, que faz aincbi miai gravluimu pon­
derações: "A penbt6nda obltlnada, - Individual e coletiva -,
destas Sociedades em aeu êrro, aeu rep{idlo e a ....,.,.. de man­
ter oo padróeo eoc:rlturirtlcoo das traduções, sua divulgação cor­
rompida e • c:olocaçio de liberais em poolçôetl de comando no
seio delu, - tudo Isto é uma du maloros tnii&liu da omsa
tta. pola m orlslios dependem Inteiramente das Sodedad..
Blblicu para obter u Eaerituru Sogndu em """ própria
llngua".
"Se a única recn de fé se corrompe. oommta o Pe. Arlindo
Vieira, a que fica reduzida a maama fé?" (op. dtado, PP, 18
e 17)
Razio Unha de oobni, pois, o Rev. Américo de Menezes,
que proferta ler a F.ocrllura Sagrado nas llnguas originais. e
&e apro(unch1va o mala que podia no Hebroloo r no Grego pora
luer urna nova venio brui.leln da Blblla, por lsao que nõo le
atls.l.ula com u edltadu polaa Sodedados Blbllcu, ainda quua
bnuneo, em aeu ltompo, du lnlluindu modomlalaL
O proo<dlmcnto d..... Sociedades, mhrgioamenle condenado
agon pelo "Conselho lnlemaciooal du Igrejas Criotiu;" (ZOJ
allirraçõesam apenas 8 capltulO!!!!) tem le-vado muilOS pasL&res

a dar inteira razio à !peja Cal<llloa, que não permite a im­


pressão, por qualquer WD. de qualquer tradução do texto A·
grado. E nio aio pouoos as progadoros ev1111éli
11 c:os que ji usam
atunlmente, por medlcla de segurança, o texto bibllco de •uten­
Ucldade ganntlda pelo "bnprlm.ntur" da larei• Cal<lllca. ·

Teodo eu locall:rado neste livro de prel� um protes­


tantim:no que, aperllll' doa pesarei, met"e'Ce ser levado a sério e
tratado com o mAximo nspeito. �ugna-me &0bremanelra men-

204
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meses que não se sentia com lnlmo de subir ao pUlpi ..
to, tal a crise espiritual em que se debatia.
Deflagrou-se, então, no Seminário, um movimen­
to "grevista"!
Não iríamos mais às aulas do Rev. Terrell, que nos
estava minando e destruindo a fé! No próprio jornal

clonar certu abernções que, conluio lndubltàvelmente, com o


repúcllo formal ela maioria abooluta dOI ,_ lrmios-..,parados.
Todavia, para que M veja até que ponto pode levar a falta de
vigl)Anda por parte dum ouperlor hierárquico que fale e aja
com autoridade divina, tnlnlcre9erel a leSuir o tato-legendo
d'O Globo, do Rio de Janeiro, de 23.3. 1980, que e:apllca o alg­
nllicado ela mal5 sacrílega lotoiirafla que .., pado Imaginar:
"Tudo 6 poalvel o6bre a terra . . . Se nio, vejam como vai
ser representado o drama da Pa1xio no Clube da Juventude
Prebllerlana, em Bristol, Jnglatmn. Ra- de calças aperta­
du e apatoa de crepe-mia vio encarnar OI papül de Cri5to e
"""" dlscipul09, como nunca oe fiz no mundo. r.tio ileo """'
numel'OI09 companhel.rul e companhelraa. ensaiando a peça 1!111 •
erlta pelo Reverendo Emat Marv1n, - "Um Homem Mone",
ela maneiro mala singular e lncoru:eblvelmente n:tnvoganle.
Basta dizer que tudo se fd com música de "rock.-n.'roll", "jazz•
e "calypoo". Quando Cristo, _.iflcado pelo jovem Lm Mau­
lhan. de 21 anos, carnpr a cruz para o Calvúio, Irá Cl!n:ad.O
de moças e npazeo dançando "rock'n'roll", o que subotltulii os
gritos e grac:ejm doo oolcladoo romanas. Na �....la .., ção vio
ser uUUzadoo vlrlm dlscoa e treo:hoo de filmao.
Aalm, por ezemplo, quando Crllto uclamar: "Meu Deue,
meu Deue. por que me abandanute?", oeii projetada uma pell­
eula mostrando tngédlu doo lempoo inod�. - eampoo de
concentração, explosões de bambu H, etc. - Na p-avura, um
llqrante de um enoalo ela -. (Foto lteywtone - hclualvo
para O Globo).
Nio lenho dúvida nenhuma de que Am6rlco de Monueo
dlaoolvorla o grupo a chicote . . . como N- Senhor a oxpuloor
m vondllhõeo do Templo.

205
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dos estudantes, "O Lábaro", se refletia a reação conlra
os '1professôres racionalistas."
Por felicidade nossa , acabara de chegar do Oriente
e da Europa o Rev. Erasmo Braga . <•1
Era êle, realmente, um homem nolável! Grande
professor, com extraordinária capacidade de slnlese,
dominando vários idiomas, figura de proa em todos os
congressos internacionais a que freqüentemente com­
parecia, leria sido um dos nossos maiores lideres catG­
licos se lhe f&se dado o privilégio, que mais tarde eu
tive, de entrar em contato com alguns dos vultos mais
representativos do autêntico catolicismo. Todavia, como
outros, nascera e crescera no mejo protestante. Na­
quele tempo, pormn, eram talvez insuperáveis mesmo
as barreiras de ordem psicológica que lhe dificultavam
uma visão de conjunto, uma apreciação mais objetiva,
um estudo mais sereno da doutrina católica. Mesmo
assim. não tivesse morrido tão prematuramente, creio
que teria chegado a conclusões diferentes no tocante à
Igreja Romana, da qual estava talvez mais perto do que
poderia imaginar. :tle também, inconscientemente,
lançou em meu coração mais algumas outras "semen­
tes", "1eeda of contemplation11•

(4) Vem a prop6slto transcrever aquilo que disse a D dr­


dozombro de lJl54 o Santo Podre Pio IX: "& incontestável que
o que nio eonh..., a verdadeinl religlio não 1 culpado aos
oll- de Deu&, enquanto a sua i..,.rin. cla permanece lnveo­
clvel. Quem leria a pretensão de poder dellrlarú r u frooleinao
doaa lgnorlnd.o em melo de tantas diferenças de povos, paU..,
menlalidadeo e outna mail cin:unadociu! Quondo um dia. li­
bertos dm la900 do corpo, vlrmoo a Deu9 tal qual '· reeonhece­
remoo eolão quio admiràvelmenle se -.dilam a mlseri<:ónlla e
a justiço divina." (A ealncia do ...iolicimio, K. Aa.ur, ed.
v-. Pl. 188).

206
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Substituindo o pastor Te1Tel1, salvou-nos a fé, na­
quela ocasião.
Conhecendo bem arqueologia, emérito didata, in­
teressou-se vivamente pela matéria de que f6ra nomea­
do professor.
Apenas chegado do Egito, da Palestina, da Gré­
cia e de Roma, eram as suas aulas verdadeiramente de­
liciosas.
Despertou nos alunos o amor pelo estudo da His­
tória, dos documentos antigos, abrindo-nos os horizon­
tes para uma visão mais ampla do cristiiutlsmo, que
transcendia de muito os limites acanhados das peque­
nas igrejas nacionais em que vivíamos confinados e es­
tiolados.
Tal a autoridade de Erasmo Braga, - pela sua cul­
tura, pela sua fé, robusta e esclarecida, pela sua menta­
lidade arejada e universal, - que nos dispúnhamos
sempre a ouvir com acatamento e interêsse quanto nos
dissesse.
Coniidenciou-nos, em aula, certa vez, que muitas
vêzes tinha vontade de entrar numa Igreja silenciosa,
recolhida, onde pudesse estar a s6s com Deus, em me­
ditação e oração, para refazer as fôrças e carregar as
baterias d'alma. Mas, "nossas ca.raa "'1 oração''> s6 se
ahrcm aos domingos; e não pràpriamente para a ora­
�iio. mas para a pregação . . . Nem um genuflexório
l�m os nossas igrejas evangélicas(•> do Brasil, para que,
li >1Cmdhança do que fazia Jesus, nos possamos ajoelhar
""' ornçüu . . . Por Isso, frequentemente acabo entran­
do nu•.•mo numa dessas igrejas católicas do centro da

(5) Aoolm <0alwnam OI proleoWI... dmomlnar OI oeua


h'•npto..
(1) ,.. nMnlslaa.

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cidade, que, além de serem umas ilhas de silêncio e de
paz, verdadeiras "cuas de oração", ainda têm a van­
tagem, que as nossas não têm, de estarem sempre aber-
las . . . "
Um protestante, conhecedor da mentalidade Ico­
noclasta enlão dominante no meio calvinista, poderá
avaliar melhor o que significou para nós aquela decla­
ração do eminente mestre, que era, na época, a figura
de maior projeção nacional e internacional do evange­
lismo brasileiro. Erasmo Braga ajoelhado numa Igre­
ja católica! "a igreja do anti-Cristo"! onde havia tantos
11(dolos"! . . .
Outra "semente" me plantou no coração o Rev.
Erasmo Braga ao contar-nos o seguinte fato.
Visitando a Biblioteca do Vaticano, mostrou-se de­
sejoso de examinar um processo qualquer de canoni­
zação.
Foi-lhe fornecido o texto dwn dêsses processos; e
durante várias horas se deixou ficar absorvido na lei­
tura. Devolvendo-o, depois de o ler da primeira à úl­
tima página, pergunta ao funcionário da Biblioteca:
- Quando foi canonizado êsse santo?
- Não foi canonizado.
- Não foi canonizado?!
- Não, sr. A Igreja não se deu por satisfeita . . .
Pouco a pouco começava eu a olhar de maneira
diferente a Igreja Romana. Enlão devia ser uma coi­
sa séria wn processo de canonização . . .
E com o pastor Erasmo Braga, que, aliás, tinha sido
também professor de meu pai no Seminário de Campi­
nas, aprendi ainda o verdadeiro significado da canoni­
zação. Canonizando um servo de Deus, após os mab
meticulosos estudos a respeito da heroicidade de suas
virtudes, confirmadas por fatos irretorqulvelmente mi-

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lagrosos, a Igreja Católica linho em vista propô-lo como
MODÊLO para os cristãos, toi.s como são tidos S. Paulo,
S. Pedro, S. Inácio de An l i óqu ia, S. Agostinho e ou­
tros mais.

A crise superada pela substituição do professor


Terrell, sobreveio outra , um pouco mais tarde; e de
conseqüências mai.s profundas.
Era, então, pastor presbiteriano o Dr. Victor Coelho
de Almeida, antigo saeerdole da arquidiocese do Rio
de Junei ro, doutor pela Universidade Gregoriana, ex­
reitor do Seminário do Rio Comprido e ex-pt\roco de
Ban gu e S. Rita, na Capital Federal. Cultl.ssimo, de
palavra fácil e brilhante, cometera, entretanto, como a
outros tem sueedido, a fraqueza de deixar a batina para
se casar civilmenle com uma jovem por quem se ena­
morara. Andou seca e meca pelo interior do Brasil,
ale\ que, tangido pela necessidade material, bateu às
poria• do protestantismo. AIYlll'O Reis, que nio conse-
11u la !iOpltar o seu temperamento de polemista fogoso,
<1uis tirar partido da "conversão" do C6nego Victor e
abri u - lhe as portas da Igreja Presbiteriana. Contra a
op inião doutros membros do "Presbitério", que tinham
por i ncon veniente, ou pelo menos prematura a "orde-­
nnç1i o" do ex-cônego, conseguiu Alvaro Reis fazer dêle
niin sàmenle pastor presbiteriano como seu coadjutor
tambc!m.
,Yerilico��':"
logo, "?rim, que não tinha qualida­
des pastorais o Rev. Victor . . .
Foi Américo de Menezes quem lembrou, então, a
conve niência de nomear-se o Dr. Victor professor do
St.'minário.
Ali desempenhou admiràvehnente as suas funções.
Lecionando, estava no seu elemento. E como lhe f6ra
e11trc11ue a cátedra de Filosofia, matéria em que era

209
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doutor, adaptou-se melhor ao meio o antigo reitor do
Seminário Arquidiocesano.
As mutações que sofrera a sua vida, resullantes
tão sbmente de um problema sentimental, em nada lhe
alteraram as convicções filos6ficas. Tanto assim que
introduziu, com aquiescência da Congregação da Fa­
culdade, como livro-texto, o compêndio de Filosofia do
Padre Tiago Sinibaldi, adotado nos Seminários católi­
cos; e para as aulas de História da Filosofia, a obra do
Padre Leonel Franca, da Companhia de Jesus!
Tomaram-se, destarte, os seminaristas evangélicos,
através do Prof. Victor Coelho de Almeida, disclpulas
de Sinibaldi e de Leonel Franca! . . .
Ao fün do cul'llO filosófico deu-se a crise inevitá­
vel. Como coDStruir, s6bre alicerces tomistas, paredes
teológicas calvinistas ou luteranas?
Comprometera-se a solidez do ediflcio.

Outra "semente" me lançou no coração o ilustre


Dr. John Mott, um dos mais famosos lideres protestan­
tes dos Estados Unidos, através de seu lnteressantlssl­
mo livro The goqel o/ St. Joh11. Ao comentar um pas­
"º do Evangelho, s6bre o qu nl houvesse discordflncias,
como, por exemplo, o cnpltulo que fala da promessa da
Eucaristia, John Molt, coerente, aliAs, com o prindpio
do livre-exame, fazi.o., em colunas paralelas, honesta e
corretamente, a exposição das várias doutrinas: a lute­
rana, a calvinista, a zwing]iana; e, na 4.8 coluna, e
doutrina católica, exposta em p' de igu11f<u1de com os
demais interpretações das corrente• principais em que
se fraccionara o protestantismo!
Parecia óbvio que, no entender do autor, poderia
eu aceitar qualquer uma das quatro interpretações di­
ferentes: inclusive a católica!
E que teólogos sustentavam esta interpretação?

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l111au·••.•1tio11uvu·me o relnção! Tanto mais que não
1•rn111 U I H'lln� s.ábio.1:1 e doutores da Igreja: eram san tos
l111nlM'•111, r!rnm homens que haviam atingido as maiores
..,,1111111n11l'ln• dn espiritualidade, ao mais alto grau de
1111160 com Deus, de idenUficação com Jesus Cristo, que
Mrn lrradlnvnrn através duma vida de abnegação t olnl ,
ilr u rde nte caridade! E representavam o escol da Cris­
lumladr, eram mesmo os plncaros mais altos da cordi­
lhrlra da fé, os mais abalizados representantes do pen­
•nmrnto cristiio através de todos os séculos: um S.
ln6l'lo de Anlióqula, um S. Ireneu, urn Tertuliano,
11111 S. Atanásio, um S. Arnbl"Ó!lio, um S. João Cris6sto­
mn, um S. Jer3nlmo, um S. Agostinho, um S. Ci­
rilo d" Alexandria, um S. Bento, um S. Tomás de Aqui­
no, urn S. Boaventura, um S. Domingos, um S. Francis­
c•o de Assis, etc:., etc.. . . Por que preferir uma
Interpretação diferente, incontestàvelmente proposta 16
néculos depois de Cristo? E, no caso de o fazer, por
que preferir Zwinglio a Calvino, ou êste a Lutero?

Vem a propósito assinalar ainda a salutar iníluên­


l'lo que exerceram em meu espirita alguns outros livros
que li quando estudante do "Seminário Unido": um
drles !oi "Christinnity ia Chri&t", de W. H. Griffilh
Thomas, obra Interessantíssima que mostrava como é
t•Slll!ncial no Cristianismo 11 peaaoa de Jesua, ao contrá­
rio do que acontece noutros sistemas que nada sofre­
riam se se fizesse abstração da pessoa de seus respecti­
vos fundadores. Outro livro, "Evidências Cristianas",
rsc ri to pelo Rev. Row, que li em espanhol, também me
fortaleceu grandemente a fé EM JESUS, tão admirável a
11r11umentaçiio do autor a respeito dos motivos de credi­
lldode e do que êle chamava "os evidências cristãs".
Anulava êst" livro qualquer influência perniciosa que
1�>rv<•ntura tivesse recebido de certos livros ultra-ra-

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cionalistas então divulgados pela Associação Cristã de
Moços do Rio de Janeiro e pela Imprensa Metodista de
S. Paulo. Especiallssimo registro merece, outrossim, o
notável livro, que também li em castelhano: "Con
Cristo en la Escuela de la Oracion". Como diz o titu­
lo, é um tratado sôbre a vida de união com Deus pela
oração. E além de preconizar todos os meios para que
nos habilitemos a receber as graças e as respostas de
Deus, aconselha o que até então nu.aca ouvira de ne­
nhum pregador evangélico: a prática do jejum. A des­
peito de ter Jesus jejuado, bem como os seus disclpu­
los, não o costumam fazer os evangélicos, que tanto se
batem pelo retômo aos costumes da igreja primitiva;
ao passo que nenhum costume tem sido praticado tio
seguida e generalizadamente na Igreja Católica... Eram
outras tantas "sementes" . . .

Nessa altura eu já me libertara de v6rlos precon­


ceitos que sempre nutrira contra o catolicismo. Apren­
dera que a infabilidade do Papa não é oni.'ICiência ou
impecabilidade; que não ensinam os cat611cos que ..
sacramentos dão a salvação aos fiéis sem que êles te­
nham necessidade de fé e arrependimento; que não atri­
bui a Igreja às preces litúrgicas uma eficácia Indepen­
dente do esplrito com que se recitam; que não ensinam
os católicos que a salvação se consegue pelas obras sem
a fé, como não passa igualmente de uma frase a que
repetem os protestantes quando falam em salvação pela
fé sem obras, visto exigirem tanto quanto 09 cat61icos
a guarda dos mandamenl09, a fé obedlente, as obras
portanto.
Dissipara-se-me Igualmente a idéia de ser a Igre­
ja Católica uma !OCiedade em que se permite ser reli­
gioso por procuração, e contra a qual tanl09 investem

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1le·11íruldnndo não mais a bandeira do livre exame mu
11 <ln li herdade de consciência.

Os fotos me haviam convencido também de que


mio Herie em nome da restauração dos costumes e da
pu rr1.a primitiva que haverlamos de combater o catoll­
"""'°' em primeiro lugar porque basta ler a Bíblia com
11tençõo para se concluir que a igreja primitiva não era
h\ esse modêlo de perfeição, - nem no tempo de Nosso
S.·nhor, a quem um apóstolo traiu, outro negou, de
qm•n1 outro duvidou, e que de todos se viu abandonado
no Get.sêmani; nem na era apost61ica, conforme nos nar­
ram as epistolas, pelas quais sabemos de tantas e tão
lamentáveis fraquezas, escAndalos e apostasias; nem
ltio pouco nos tempos posteriores, quando, entre heróis
e snntos, não faltaram infelizmente perjuros e deserto­
re•; nem mesmo após o término das perseguições, pelo
que se li! nas linhas e nas entrelinhas dos escritos d""
&mtos Padres. E quanto às organizações que SW'giram
do movimento que pretendeu reformar a Igreja, ou das
que tentaram reformar as próprias igrejas reformadas,
HUbia eu, por experiência pessoal, que multo deixavam
a desejar em matéria de fidelidade aos principias c:ris­
ltios. No dia em que se tomassem grandes como a
l11reja Romana, ou pelo menos onde viessem a predo­
minar, mais escândalos e pecados ainda haveria. O
exemplo das "nações protestantes" saltava à vista.
Não era, pois, de estranhar houvesse joio no cato­
licismo,se tanto eu via entre os nossos ºpuritanos" e
1'n•form3dos".
A.• imputações injustas que faziam certos católieos
nos protestantes me levaram a urna atitude de reserva
em lace do que ouvia dos protestantes contra os cat611-
l'OS, mesmo porque, 11refonnadores" tinham obrigação
1
mor oi de viver o tal "cristianismo primitivo'', s:ln&nl-

213
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mo para êles de 11cristianismo puro" -, e muilo mal!i
perfeitamente do que os "idólatras romanista.a."
Jli repelia também a grosseira identificação que
muitos protestantes faziam da Igreja Católica com a
"Prostituta" do Apocalipse, do Papa com o Anti-Cris­
to. Alilis, os pedidos que, já naquela época, os dirigen­
tes do movimento ecumênico evangélico encaminha­
vam à Santa � para que se fizesse representar nos
seus congressos mundiais, provavam estar havendo sen­
slvel evolução do pensamento protestante no modo de
julgar o Papa e a Igreja de Roma.
Lamentava não ter mais meu pai comigo para com
êle trocar idéias sôbre essas e outras questões, que con­
siderava, como de fato eram, de suma importincia para
a minha vida espiritual. Felizmente a leitura de Evi­
dência.t Cristiall48 e do livro Con Cristo en 14 escuela
de 14 oracion me haviam fortalecido a fé NA PESSOA DE
JE81JS e salientado a super-excelência da vida de co­
munhão pessoal com &e através da oração fervorosa e
constante.
Era em Jesus Cristo que se baseava a minha reli­
gião e não nos homens e em suas opiniões teológicas.
E se, dia a dia, mais se acentuavam as minhas diver­
gências com certas prliticas, opiniões e doutrinas sus­
tentadas pelos lideres evangélicos de então, crescia sem­
pre a minha veneração pela memória de meu pai. Mes­
mo porque não foi @le o cristão que foi pelo fato de ha­
ver pertencido a determinada igreja evangélica; sê-lo­
ia de qualquer modo. Ademais, se em função duma
Igreja divina, que se perpetua através dos tempos, re­
novando-se sempre no conhecimento cada vez mais per­
feito da verdade revelada, é que se desenvolve, para
um católico, a história religiosa, - para um protestan­
te esclarecido isso se dá na sucessão de fortes persona-

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lidndcs proféticas, semelhantes às do Antigo T<!slamcn­
to, que transmitem aos pósteros o facho do entusiasmo
e da fé. Não importa a "denominação." E além de
considerar meu pai como dos mais iluslres dentre &ses
homens de Deus, já evoluira também no sentido de co­
locar entre as ºdenominações cristãs", e em pé de igual­
<ladc com elas, como, aliás, o fizera John Mott, a Igre­
ja Católica Romana . . .
A despeito da boa vontade e do esfôrço dos seus
prolessôres e dirigentes, não durou muitos anos mais
o "Seminário Unido". Em parte pelo baque sofrido
pelo protestantismo no Brasil com o desaparecimento
de uma plêiade de lideres que não tiveram sucessores
nas gerações que se seguiram: a Igreja Presbiteriana
perdeu Alvaro Reis, Américo Cardoso de Menezes,
Erasmo Braga, e, algum tempo depois, Mata.tias Gomes
dos Santos e Jerônimo Gueiros; a Igreja Presbiteriana
Independente os pastores Eduardo Carlos Pereira e
Otoniel Mota; a Igreja Congregacionalista o pastor
Francisco Antônio de Souza; a Igreja Batista os pas­
tôres F. F. Soren e Salomão Ginsburg; a Igreja Epis­
copal o Bispo Kinsolving e o Dr. John Meem.
Com o falecimento quase simultâneo dêsses
homens, que constituíam inegàvelmente wna elite es­
piritual e intelectual, perdeu o protestantismo brasi­
leiro mwto do seu vigor primitivo e do seu ardor evan­
gellstico; e o "movimento unionista" os seus principais
propugnadores. E voltaram à tona, predominando sô­
hre o espfrito ecumênico, u velhas diferenças, que pa­
recem, às vêzes, dar razão aos que consideram utopia
o união entre u corporações protestantes, cada vez
mais subdivididas.
Tendo deixado de viver confinado tão sõmente às
puretlcs da "denominação" em que f3ra criado, entra-

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rn em contato amistoso com irmãos doutras co?Tentes,
naquela convivência cordial dum Semirul.rio "Unido".
Cêdo, porém, escandalizado com o desentendimento
que eu pessoalmente constatara entre os teólogos, e at.­
bre ponto• fundamentais, e não apenas secundários,
como se fazia crer ao povo simples, cheguei também a
julgar uma quimera aquela idéia, já que não via con­
cordar o protestantismo todo num ponto que fôsse. A
extinção do "Seminário Unido" veio aumentar o pessi­
mismo com que eu já começara a encarar o futuro du
igrejas protestantes e do ecumenismo evangélico. Che­
guei mesmo a fazer uma lista de dou trinas professada
pelo cristianismo tradicional, anotando as "denomina­
ções" que se incumbiam de negar esta ou aquela dou­
trina. Cada uma negava ao menos uma. Logo, con­
cluía eu, como alhures já escrevi, o protestantismo uni­
do, em conjunto, nega o cristianismo todo.
Na Igreja Católica, cujos maiores teólogos, a co­
meçar pelo Papa, encaram hoje o protestantismo e os
protestantes não sàmente com benevolência mas com
verdadeiro interêsse e simpatia; ajudado, outrossim,
pela dislAncia, que facilita uma visão de conjunto, uma
apreciação mais equilibrada, resultante também do
constante cultivo daquele esplrito que nos leva a "sen­
tir com a Igreja'', que vê mnte"'41mente o pródigo que
volta ou que ainda se mantém afastado, - pude enca­
rar mais caridosamente não s6 o protestante como tam­
bém o protestantismo, não s6 a alma dêste protestante
individualmente como também o conjunto dêsses mi­
lhões de batizados, de crentes sinceros, que, bem ori­
entados, poderão atingir e.inda as maiores alturas e dar
tanta gl6ria a Deus!
!!: que perduram, apesar dos pesares, e até mesmo
nos que parecem mais afastados, o que chamamos oe•
llgia Eccletriac. Todos os cristãos, diz o Pe. Georges

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Tavard, "estão unid"" à Igreja pelo laço d85 virtud""
leologais, pela Palavra de Deus consignada na Biblla,
que êles recebem da Igreja Católica; por elementos da
Tradição Católica que êles perpetuam, e pela catolici­
dade de alguns sacramentos de que vivem e que é a
Igreja que confere, mesmo nas comunidades protestan­
tes. Há a! 1'eallgio. da Igreja, pelos quais se manifes..
ta, entre os cristãos reformados, uma presença viva e
snntilicante que é a da Igreja Católica, Corpo Mlstico
de Cristo." Donde 110 DDNSO RESPEITO QUE, APESAR oos
PESARES, DEVICllIA SENTIR TODO CATÓLICO PltLAS CRISTAN·
DADES SEPARADAS, não por causa da separação mas DI
vurnJDE DA DIANiNCIA, NBLAS, DS NOSSA 11.ÃZ, A BAJfTA
IGRE.JA.U('7)

Tantos anos de vida sacramental na Igreja Católi­


ca me ensinaram a sentir e a pen.sar assim. Aos deze..
nove anos de idade, pon!m, tendo tirado sempre nota
máxima no CUJ'SO de lógica, escandalizava-me com as
gritantes contradições que aos poucos descobria no pro­
testantismo, e me impressionava vivamente ao deparar
com tantas maravilhas no catolicismo, de que até enlão
só me haviam mostrado o lado negativo! S6 o que vi­
veu um drama semelhante pode avaliar o que no meu
lnümo se passava.

Dificuldades financeiras levaram-me a aceitar o


convite que recebi para ocupar o cargo de Diretor do
Departamento de Educação Intelectual da Associação
Crislii de Moços de S. Paulo, que eu poderia exercer
s<·m prejulzo dos meus estudos teológicos. Transferi­
""" assim, para S. Paulo, matriculando-me no Seminá-

(7) A la reftroontre dti proteftaftti.nn.e - Pe. GIOltGl:B T.t.­


UH, 1'11· llU.

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rio Presbiteriano Independente, onde recebi a benéfi­
ca influência de dois professõres notáveis: os Revs.
Epaminondas do Amaral e Alfredo Borges Teixeira.
&te último, teólogo prestigioso, lecionava História do
Dogma e Teologia Dogm6tica. Dêle me vieram outras
"sementes."
"A medida que surgiam heresias, via-se a Igreja na
necessidade de definir certas doutrinas que, de impll­
citas, passavam a ser explicitas. Muito tempo depois da
morte dos apóstolos, como na questão do Filioque. a
Igreja ainda se sentia obrigada a definir, sem, propria­
mente, Inovar cousa nenhuma."
Quem dizia isto não era um padre católico: era um
pastor presbiteriano, um teólogo protestante dos mais
.acatados, e do alto da c6tedra de um seminário cvan­
gélico!<ll

(8) &dava em provu êsle Ji\'ro quando soube, com multa


satlafaçio, que ainda vive. beirando m 90 anos, ei que etiereveu
,...,.tem
... onle uma "Dotlln'Uca Evangélica", o Rev. Prof. Al­
fredo Bol1!H Teixeira. Pracunl adquirir lmedlalalnenle a obra,
na qual ful encontrar, ncritm lrlnta anoa drpois, e até ampli.l·
doa, os mDlmOI penummtoa • qua acima me rrfiro. Ela alguru
dêlea (m piloo são mous):
..O que R deu, parece, foi que a. fómaula do battrmo em
name do Pai, do Filho a do F.spírtto Santo •.rpandiu-•• n.alu •
nlmritle até aUnglr m doze arügos do conhecido Credo fre­
qilentemenle rezado nu lgnju." (pg. S.�)

"A persistência da htteliG do Aria deu em resultado a reu­


nião de outro concillo em Constantinopla, em 381 , convocado
pelo Imperador Teodósio, no qual o credo do Nleéia, foi, RllUD­
do a tndlçio, nedtrado ..,. fonnG "'4la de..,nvolvldo no tocante
à doutrina do Eoplrtto Santo e à últlmu cláWIUlu do Credo
dos Ap6stolos.• (pe. 58)

218
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Então não eram dogmas invcnlodo• pela Jgrejo os
que foram promulgados no decorrer dos séculos!? Eram
meras explicitações, verdades em crisálidas, que, l'm
face dos ataques da heresia, ou, como conseqll�ncia de
um amadurecimento Intelectual, de um progresso no
estudo e no reconhecimento de suas implicações, "de
impllcitas se tomaram explicitas", e apenas se de­
finiam!
Mas, afinal - perguntava-me a mim mesmo, - por
que parar no século décimo? Por que não ir um pou­
co mais além?

04A Igreja apoet6Uca wão p6de, nem n-a poulvel, aUn.glr a


roncepçcio da Triaclade nandal, ftl.tafúlca. que l@ou dcuLDB
a wr coueguido, mu � cheia de en\ualumo e gralidio ne
Trindade eama.nlca (em que cada uma du _.. tem função
<'>J)<Clal, ainda que não achmva, na obra da Rodmção) ."

"O Batismo em nome do Pai, do Fiiho o do l!lsplrtto Santo,


qu.- foi o credo slmpla da '8nl• Apostólica e o g......, de fu­
ruroe cndot . . .

Nio qitarom oqu&leo crlatioo primJUvos da eterna geração


do Filho o eterna P.- do l'.lplrtto; mm. � à crença
noo foloo da rodençio e manlldoo na 16 paio l!lsplrito Santo,

pouulcm no coração a doulriu da Triadode."


C.orno já ficou dJto, a Trindade econ6mica foi • aença da
Jgrl'ja apostólica e 11111>-apostóUca, • !nau tlculoe a ..,olulr para
a <010._.;a da Trtlldade ...-1, ,,...floica. . " (PS- 74)
"A doulrina lfttc1rral .am ht.e ponto eslava, sem dúvid:i.
111cuuna. llO BVK'OlnlCllClft DA mm.rA, mas lwou multo tempo
JlllTll sair do lem!no da 16 pua a razio.
"O credo doo opóotolm. . . brolalldo da eoutiênclo an6nlma
r colt1Uva da Igreja" . . .
O. ló almplea, neotestamenlárla, o respeito da Trindade,
l'•prl"tlla noCredn. c& lgre:ja loi •mp1Uda. a dar um pia.ao para

219
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Com entusiasmo se referia também o Rev. Prof.
Allredo Borges Teixeira à Igreja Romana dos primei·
ros séculos, "sempre fiel à verdadeira f�". - nos dl·
zia êle.
E eu me lembrava das palavras de Jesus a Pedro:
"Eu roguei por ti, Pedro, parca que ca tua /é ..ao
des/caleçca; e tu, uma vez convertido, confirma teua
innãoa".

o mmpo da Trindade eumdal. llOft'D'-A in:aa: smrrmo o UA.­


BCllDJl'IO DI: BIDSIAll A D8PBllQ DA l'IBSJA - c:mno." (pt. 75)
"O coD<:llio ecumênico reunido em Nicila. . • teve por 8m
NFIKD auioriudameUe CI crnça DA IGllU&.
"A ,..,.,.i.t&da porim, dlau broa (de Ario • de Sabo!lio)
IZml11 que fõaHm de """° emadenadoo, sendo para iuo reunido
o concilio ecumfnlco de ConalanUnopla, em 381." (pg. 78).
"A controffrsia lttminou com a trU'!e' riaão das duas partel
da Cristandade, OCll\ltUuindo a Igreja Or1odou. de um lado e a
lsrela Ca161ica Romana do outro.• (pg. 78) .
Ai.! aqui o RPYmo. Prof. Tel:oelra eol.l do lado da Igreja �.
Roma, A qual chama almplesmente, e por antonomásia, A. IGDJA:
"bto elmbolo ó o polo""' flnal do IGUIA a r...,.11o da dou­
trina da Trlndnde. Almi de 1er êlr a mala plma ezpo.tçcio deo.uca
doutrina, � RoCclvel ,,ria maftl!'ira e.rou.1Uua romo fecho Côdu ai
_..., d.e poorio.t. dHt>loo." ( pg. 79)
Dopolo do calOl'OOll apololia do concDlo (pp. 79. 80 e 81),
declara o lluslre ieólogo preabllerlano: "A IM>l.'llçÃo da Trindade
e<on&nlca para a oaencW ,,.;., fol d""""ccadriA. Alhn de ll<T
tmJllOdcl �lo te.r�uwho do Nno Tltltamnto, como vlmos, e
pela consciência da Igreja, o pl"Ópria ,,...;,o o ulglu. Se DeWI o.e
manileslou na história como Ir& peaoa. - Pai, Fiiho o F.spirlto
Santo, - DA U.CIONAL COKCLum quo tle é trino tambén em
1W1 eDÕncla."
..A crença., pois, na abloluta veracidade de Deus detenn.i­
narla a lranlferência para a otemldade do que tle onslnou a
respeito de 5i mesmo. DO tempo, AINDA QO& NÃO TIVISD IU.nllO
PAU DIO A ....... llAll llll" lDIM . (pg. 81)

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Não desfaleceu jamais, durante tantos séculos, a
despeito das mais assombrosas torturas, das mnis cruéi.•
perseguições, a fé que professavam e defendiam herài-

""Candenando GI hereaia.r do KU tempo e ttaflrm.ando u de­


dlõu d., "°""""" cmtmor.,., o "°"""º de Calttd6nla ""'"'"
o mala lmporl•RU erodo anligo s<llrre Criatologio.•
"t.le Cr<do, apaar de en • maia compl.,. declaração da
doutri'M sôbre a pe850ll de CrlstD, lne d.e rccebn um acr'•ci­
"'° na 8.0 ConcDio Ecmnfn.lco, reunido nn Cons\anllnopla no
""" 6ll0. c--o • ,_.;.rlnda da ...... . .. de hlloo. • qual
rC'él� e agitou a Içejn oriental dunmte um aéculo aob o
nome de ManollalUsmo e Monolelismo. (pg. 183)
"Tunbém depoür dêle (de D........,...,) , dunnle IAda a
Idade Mid.ia, o Cndo ftl'l apriço não leve aenão comentadores,
mesmo quando nu mãos de T.....i. de AQ11 ho,o o molor ..dloflo
do pniodo." (111. 185)
" . . . Anselmo, lllftblspo de Contu.6rte, no eeu alle� opús­
culo Cur D.... Homo, deu forma ltltll<a l doutrina da uplaçio,
DIPÚcn& "° <Nino doa prilnelroo Padre1.• (J>I. 212)
"Neste ponto .,. eimlJoloo de Wemnhuter (da lgrcjli pna­
bll.eriaJW) ......._ nforma, porque, embono não nesuem dl­
rotemente a unlvenalldade da Expiação, luom-no lndlnta­
mente, oubordinando-o oo decreto da Eleição.• (PI- 222)
"A Igreja CaláUoo -.., que cada peaoa !em um anjo da
..,.ro.. que a prolep, """'ça - multo conlortadoro e poética.
AI /greju prol••ton..• rejeltoro"'-114 pelo perigo do culto Inde­
vido BOI anjoa. Paroec--, porim, '111• •lo tem nwHiool tw.•­
da"""'to bfbli<o. . . alm> dleto, - que a .,,._.. católica a
- rupelto tem ""'° h'adlção Q111 a.llngo .. diOI doa apóoto­
lo.." (pK. 118)
Apesar de um tanto 1- ..W notas, quil imerl-lu oq•d
como hommqem oo querido e eaudoso mntre, que tanto eon­
tribuiu. para que se me dilatassem os horbontn lntelectuals. e
pua que poa11 ler o leitor, no eltaçio de frue• rutuals do v""
n....o ...t teólogo calvinista, unuo Idéia maio ....,.
. dea sementeo
que enlão me iam caindo n'alma.

221
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cernente aquêles Bispos de Roma, que marchavam, can­
tando, para as fogueiras, ou em direção ao circo, em
que iam ser triturados pelos dentes das feras faminlas
e enraivecidas! Nem durante as perseguições, nem no
século IV, a época das grandes controvérsias, da luta
contra o arianismo e outras heresias perigosas!
Não podia ouvir tais coisas do meu professai· de
Hislória do Dogma sem me lembrar do hino 63.'" que
desde a mais tenra infAncia aprendera a cantar, que era
mesmo um dos prediletos de meu pai, e que, no fim
de cada estrofe, repete: "PD1'que Jesu.s faz tudo bem!"
Como poderia esse Jesus, que prometera eslar
com a Sua Igreja não apenas durante alguns anos, du­
rante uma geração, não intermitentemente, mas todos
os dias, nio apenas até o 3.0 ou o 4.0 século, mas até
a consumação dos séculos, êsse Jesus onisciente e oni­
potente, êsse Jesus - "que faz tudo bem", - e que
notõriamente protegera, abençoara, dirigira. inspirara,
que assistira da maneira mais evidente aquela Igreja,
que tinha por Chefe o sucessor de Pedro (a quem tle
mesmo dissera - roguei por ti paro que a tua fé não
desfaleça") , - como seria passivei se esquecesse dela,
permitindo, conlra o que vaticinara, CJUC' prevaleccssC?111
allnal as portas do inferno?
la cu para casa com a alma em ebulição e o cora­
ção dilacerado por estas perguntas, suscitadas em meu
esplrilo pelas afirmativas do meu profossor, e pela
lembrança de meu pai, de meu santo e inesqueclvel
pai, que morrera protestante . . . a cuja memória eu
queria ser fiel, cujo exemplo ansiava por imitar, cuja
vida queria reproduzir!

(9) Do livro "Salmu.1 � Htnw".

222
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S6 Deus sabe das minhas angústias naqucl�s dias
de lulas Intimas, em que a Verdade, qual um arrebol
de uurora, começava a despontar com a fôrça do sol
nascente!
Fazia, outrossim, o Rev. Alfredo Teixeira calorosa
apologia dos primeiros concllios da Igreja, o que me le­
vou a concluir, como sucedeu a Newman, que a defesa
do Concilio de Calcedônia implicava na do de Trento;
que era de todo imposslvel taxar de hereges os euti­
quianOH, os monofisilas, considerando 11ortodoxos" os
prot.,slnnle•; condenar os Papas do século XVI e aplau­
dir º" do século V . UOJ
Vêm-me às mãos a Filotéia, de S. Francisco de Sa­
les e os EzeTclcios Eopirituals de Santo ln'cio de Loyo­
Ja, que me dão uma idéia muito diferente da que eu
sempre tivera a respeito da espiritualidade católica.
Relendo o comentário do Evangelho de S. João,
de John Molt, observei ainda um curioso pormenor:
no fim de cada capitulo, havia, freqUentemente, uma
t••tro!e, um pensamento de Santa Teresa, de S. João
du Cruz . . . Verdadeiras jóias! E preciosas setas a lndi­
ror o Rumo . . .
Aquêles pensamentos tão sublimes me aguçaram a
�uriosidade, me serviram de "aperitivo" e me levaram
a procurar o próprio original. Deliciando-me com aquê­
les autores, punha-me a imaginar como não haveria
meu pai de os apreciar também! Tentava lê-los com
os seus olhos, com o seu coração ardoroso e apaixona-

()0) O Card�nl Newman - M. T-L PE:Nmo. Ed. Vozes.


1940, pg. 69.

223
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do por Nosso Senhor! E em pouco tempo, eis-me trans­
formado em admirador entusiasta de Santa Teresa e
de S. João da Cruz! Mas, apesar de tudo, protestante
ainda; seminarista presbiteriano; diretor da Associação
Cristã de Moços; e pregando todos os domingos naa
igrejas evangélicas de S. Paulo.

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NOVAS EXPERitNCIAS

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A QUASE em condições de comparecer
perante o Presbi�rio para o "exame canô­
nico'', que ordlnàriamente precede a orde­
nação, mas multo moço ainda, fui convidad >
pelo Rev. Alberto Maxwell para ser "evangelista" em
Lambari, no Estado de Minas Gerais, cidade "jurisdi­
cionada" à Missão uEast Brasil'', da Igreja Presbiteria­
na do Sul dos Estados Unidos. Ficaria como "coadjutor"'
leigo do Rev. A. L. Davis, que era o pastor encarregado
daquela região, uma espécie de "bispo mission!rio."
Segundo o sistema em vigor, os missionários eram.
geralmente, pioneiros. Logo que estabelecidas e con­
solidadas, com vida própria, proclamavam-se indepen­
dentes as igrejas por êles fundadas, que eram, então,
(•ntregues aos pastôres nacionais; e avançavam mais
pura o interior a abrir novos "campos".
Em Lambari existia tão sõmente uma pequena con­
gregação duns vinte e poucos adeptos. Cabia-me a ta­
r.,fa de fazer progredir ali o "trabalho evangélico".
Lera bastante a respeito dos movimentos evange­
Ji,ticos de Moody e Wesley;"> assimilara bem o espi-

(1) Depola de prodiplizar .. maiores elogios a Wesley.


rundador do metodlsmo, e que canhecl• • lerei• Cat6llca tio

227
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rito dos livros de Torrey, que tanto insistia na neces­
sidade de intensificação da vida interior, e cujos ser­
mões eram deveras inspiradores e persuasivos. Mais
tarde descobriria eu que o que me parecia novo e revo­
lucionário na técnica do púlpito evangêlico, era o ve­
lho lema de S. Domingos: "Contempla14 aliia tradeTe".
O lamentável é que, geralmente, tanto os pregadores
católicos quanto os protestantes, em sua maioria, não
punham em prática tais principios: ou falavam tão sO­
menle ao intelecto, ou, então, Unicamente ao sentimen­
to. Algo lhes faltava para atingirem simultineamente
a inteligência e o coração do povo, como fazia Clemente
Hoffbauer, Francisco de Sales, Francisco Xavier, João
Maria Vianney. O sistema de Torrey não era outro
que o dêsses grandes pregadores católicos.
Na medida dos meus parcos recursos, procurei ser
ao menos um disclpulo dessa escola. E passei a pregar
tôd.as as noites nas casas particulares dos poucos "cren..
tes" de Lambari, e aos domingos no "salão de cultos",
que, de semana em semana, se tornava menor, conten·
do com dificuldade os auditórios sempre maiores.

Desejando falar cada vez mais persuasivamente


àquele povo, que, bem ou mal, herdara wna tradição
católica; e por necessitar também de alimento sólido,
tanto para a minha própria vida espiritual como para
ter o que dar aos meus ouvintes, pus-me a ler com
mais atenção e redobrado interesse e encanto crescente
as obres de S. João da Cruz.

sõmenlo atravm dos p<econceltao prul.eslant.ea, diz o Padre Rum­


ble, grande autoridade em prutestanUsmo: "Hoje om dia. o m.e­
todl.ta que ao toma oalÓlioo toma-"' o que John Woaloy gos­
laria de ler sido.''

228
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Inebriavam-me aquelas páginas em que despelal11-
va o coração liquefeito de amor aquêle sublime "pos­
sesso de Deus"! E não me conformava com o fato de
meu pai nunca lhe ter lido as obras. S. Joio da Cruz
era bem o tipo do reformador que êle admiraria sem
restrições. E imagino hoje com que entusiasmo colo­
caria la porta de seu escritório o aviso - "NÃO BATAM; só
"
EM CASO DE MORTE , e se fecharia para ler, meditar, re­
ler e assimilar o "Itinerário Mlstico de S. João da
Cruz", de autoria do eminente Mons. Penido!<Jl
Como se incendiaria o coração de meu pai ao ler
"IA liam.a. de amor"!
E sendo S. João da Cruz um dos mais ilustres e
fiéis intérpretes do verdadeiro pensamento católico,
proclamado pelos Papas Doutor por excelência da Teo­
logia Ascética e Mística, tirou-me do espirita o resto
de prevenção que eu ainda tinha contra a tão falada
"ido]atria romanista" . • .
Eis aqui, diz o Santo,Ul - e não um iconoclasta
zwingliano, - eis aqui 110 devoto de estátuas: preo­
cupa-se com a matéria de que são feitas, a forma, a di­
mensão, o valor, a colocação que mais agrada; ai.avia

(2) ..Tudo o que n.ão I� àa •lluru, tudo o � 1 wpb­


jluo, ou dUtrai, 1 tempo perdido, amuo lrremediáoel".
''Gronde ra/Ô'rço lhe C'UsC.ava o lratar du colaa.I tt"TTl"nu."
. . annpre hunulde e pnldmte, Hmpre etn eelntial naoldod•
• rompodura. umpre af4NI, modulo, tnauo, gn11ut, pacl/lco . . .

•rmpre iguGJ em r6du cu oculõa... . . Na hor1a ''ajoelltao�H


11Jh as d"'°"'ª · . . ª' outaua 14rocu horu em oroçdo • . • orar /oi
U"mpre a aua gnsnde preocu.poç:ão . . . • orar "'"°' lu9arcr1 maa.
r.ure•ff'I a fim de qwe • nt.e'fllf', não •l"Ad.o ?'elida. pela.t nmu
11lrir.�'•· nba. em v6o upro e dJrcrlo pera Deu&." '"Ama�a muito
Htar aó • bu.Kooa a 80Uüo" " . . . amor que te aflige de não
muar boatanfe o Amado."

(3) "llin•nlrio MlsUco de São Joio da Cruz", Mons. Ponldo.

229
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algumas delas com vestes de boneca; confia mais numa
que noulra; toca as raias da idolatria; e se porventura
lhe tiram a imagem, perturba-se-lhe tôda a devoção."
Com muito mais severidade do que o fazem os pre­
gadores protestantes mais "anti-papistas", - e isto psi..
colàgicamente me ajudou muito -, profliga os exagê­
ros dos que parecem centralizar a sua religião em ob­
jetos, rosários, medalhas, bentinhos, festas, romarias,
cerimónias, etc. As imagens sagradas, êle as quer ar­
tísticas, retratando os santos "ao vivo e ao naturalº e
de modo a despertar a verdadeira devoção (tal como eu
também achava que se podiam fazer.) Desejava mes­
mo que fôssem proibidos de fabricá-las quantos não
16ssem peritos na arte. E ao fiel que se visse diante
duma imagem, recomendava que se não detivesse nos
acidentes, que levantasse o espírito para Deus.
Não se limitando a condenar a idolatria grosseira
dos que colocam objetas e pessoas no lugar de Deus,
alerta freqilentemente os fiéis contra a idolatria sutil,
di.slerçada, dos que entronizam o próprio Eu no lugar
que sõmente deveria ocupar Sua Divina Majestade.
Procura precaver-nos, outrossim, do perigo de amar a
Deus usentimentalmente", de nos determos nas conso­
lações e deleites que o própria oração nos dá; e preco­
niza o desapêgo absoluto, pela purilicação passive, pelo
enoitecer dos sentidos e da afetividade, pela "noite do
esplrilo", durante a qual se exercita a lé pura, que pos­
sibilita aquela abnegação total, que leva, enfun, ao
Amor transformante, no Amor unitivo, à identificação
com Jesus Crlsto.
E S. Joio da Cruz não inovou como, então, me pa­
receu: apenas exprimiu com maior rigor o autêntico
pensamento católico, o mesmo que inspirou o grande
movimento ascético de Ci&ter e que constitui, a bem
dizer, a quintessência do catolicismo.

230
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Evidenlcmente não é responsável e Igreja pdo•
abusos nem pelo atraso espiritual de muilos que �n­
traram no catolicismo, mas nos quais o catolicismo ain­
da não entrou salisfatoriamente. Mas o curioso é que,
durante certo lempo, graças a S. João da Cruz, conse­
gui achar menos frio o templo calvinista, menos árida
a sua liturgia, que, na verdade, reflele o esplrito de
João Calvino, o qual, no fundo, como observa o Padre
Bouyer, e apesar de ludo, vários traços tem de seme­
lhança com o do reformador do Carmelo . . .
Demonstrou-me logo, porém, a experiência "pas­
toral" que, como nem todas os católicos l�m um psi­
quismo que se adapte às paredes brancas do Carmelo,
ao "vazio" da alUssilna espiritualidade de S. João da
Cruz, a que, via de regra, só se alinge gradativamente,
também os cristãos evangélicos, que não são puros es­
p[ritos, mas almas encarnadas, necessitarão, ordinària­
mente, de ºmuletas" e ºtrampollns11 espirituais, que fi­
carão no caminho, mas de que, a principio, seria teme­
rário abrir mão. Dai a necessidade psicológica de se
dar a máxima atenção à disposição interna e à cons­
trução artística dos templos; e a importincia da músi­
ca sacra, recurso de que lançam mão os calvinistas mo­
dernos, e às vhes com técnica admirável, para atingir,
peloa aenlidaa, o esplrito dos fiéis.

Poucos meses eram passados e já havismos com­


prado uma casa anUga numa das ruas principais de
Lambari, para onde, feitas as necessárias adaptações,
transferimos a sede da congregação.
De vez em quando misteriosa atração levava o
constante leitor de S. João da Cruz à igreja matriz, a
ou vir os sermões do pároco, cujo estilo, porém, era dia­
metralmente oposto ao do ilustre jesulta Pe. Guy de
Broglie, que, estudando "os motivos profundos que Je-

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varam Lulero e seus primeiros discípulos a romper com
as formas concretas de peDS811lenlo e devoção que lhes
ofereciam os costumes e as Instituições de sua época",
recorda que o que se intentava, de inicio, nada mais
era do que "uma reação, ditada por um aenlimeRlo re­
ligioao mdiacutivel, contra uma teologia efetivamente
pelagianizante e uma piedade em que o acessório ten­
dia mesmo a abalar o essencialº.
Estava longe o pároco de Lambari de interpretar
com tal benevolência o movimento protestante do sé­
culo XVI; como não podia, em absoluto, admitir boa
fé, sinceridade de propósitos e espirita cristão naque­
les hereges que lhe invadiam a seara.
Tentei um dia visitA-lo. Mas não quis saber de
conversa comigo . . .
Tão infelizes e contraproducentes os métodos por
êle usados para exterminar de sua cidade a heresia
avassaladora, que em pouco tempo tinha passad o de 20
para 200 o número de protestantes; sem falar dos sim­
patizantes, que não eram poucos.
Tendo eu fundado também um ginásio leigo, com
ensino facultativo de religião, e onde os catequistas ca­
tólicos poderiam, se quisessem, lecionar também, criou
o pároco tris ou quatro colégios, que, juntos, não ti­
nham o número de alunos que Unha o meu. A popu­
lação eslava decididamente ao meu lado e o vigário
cada vez mais desprestigiado.

Todavia, se por um lado contava com a oposição


do padre, por outro passei a sofrer maior oposição ain­
da do pastor Davis, que não admitia pensasse eu em
permitir o ensino da religião católica aos alunos cató­
licos do meu colégio. Tentou, então, Incorporá-lo, como
filial, ao Instituto Gammon, de Lavras, transformando-

232
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o em estabelecimento declaradamente confessional, pro­

jeto êste a que me opunha.


Não digo que, segundo o seu ponto de vista, an­
d....., errado o pastor, e que não tivesse o padre os seus
motivos para me detestar. De ambos discordei apenas
quanto aos métodos empregados para se desfazerem de
mim.
Enquanto conspiravam o pastor e o padre, cada um
no seu setor, entregava-me eu à leitura da "Subida do
Carmelo'', de S. João da Cruz, e do "Castelo Interior'',
de Santa Teresa. Cheguei a pregar uma série de ser­
mões baseados na grande obra da Reformadora do
Carmelo.
tntimamente sentia-me cada vez mais divorciado do
calvinismo brasileiro, muito diferente do europeu, em­
bora bem longe estivesse ainda de me tomar católico.
Aliás, ali como noutros lugares do interior do Brasil,
seria mister uma graça especlallsslma para que alguém,
que se criara no meio protestante, e que tivera um pai
como o que tive, lograsse ver no Catolicismo, - como
o ladrão da cruz viu em Jesus, - através de tanta
poeira, de tantas chagas, de uma fisionomia tão desfi­
gurada, a pr6pria Divindade! Mesmo em se tratando
dum leitor e admirador dos dois grandes mlsticos car­
melitas . . .
Entretanto, a despeito de tudo, a Igreja Católica,
que não era certamente o que eu via naquela e noutras
cidades mineiras, me atraia uda vez mais.

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INCURSõES EM TERRA IGNOTA

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ll1 EFLAGRADA 11 revolução de 1930, julguei
propício o momento para me afastar daquele
pôsto, em que servira por um ano e meio.
Não me sentia animado a continuar na
Igreja Presbiteriana; muito menos a me tornar minis­
tro daquela "denominação".
Lera a formosa "Oração da Pedra", pronunciada no
lançamento da pedra fundamental da Igreja (episcopa­
liene) de S. Paulo Apóstolo, em Senta Teresa, no Rio
de Janeiro, pelo Revmo. Salomão Ferraz. Foi um dos
toques mais fortes que recebi no rumo do catolicismo...
Outro ministro da Igreja Episcopal, que é o ramo
brasileiro da Igreja Anglicana, me emprestou um livro
interessanllssimo escrito por um colega seu: "The Ca­
tholic Church", que me alargou aind11 mllis os horizon­
tes . <l l O autor, piedoso ministro da corrente anglo­
cat61ica, discorria sôbre a sucessão apost61ica, sóbre os
sacramentos, sôbre os usos e costumes da Igreja Cató­
lica. Pràticamente aceitava tudo o que ensina a lgre-

(1) O. llllll! lcanoo possuem conventos, ordONI terceiru,


mosteiros bonodlUnos, llllçõeslOcia de odoniçio perpétua do Somo.
Satramento e outns organlzaçóel de espirita prooundadamenle
católJco como, por exemplo, a Amniea" C� o/ Frcm­
cllraiu of lhe Epilcopol Church.

237
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j:i de Ro1na; quanto ao Papa é que lhe reconhecia tão
siimente o primado de honra, não o de jurisdição. Mas
as nova" "sementes" iam ficando . . .
Após a morte de Alvaro Reis registraram-se várias
cenas muito pouco edificantes na I.ª Igreja Presbiteria­
na do Rio. Por ocasião dwna das várias assembléias
gerltis, convocadas para a escolha do sucesor do pran­
teado ministro, houve mesmo quem sacasse do revól­
ver para fazer valer o seu direito de falar. . . O resul­
tado foi uma cisão que deu origem à "Igreja Presbite­
riana Livre", de mais efêmera duração do que a "Igre­
ja Presbiteriana do Calix Comum", fundada em Bela
Horizonte pelo Sr. Francisco Augu9to Deslandes. Era
pastor da "Igreja Livre" o Rev. Victor Coelho de Al­
meida, que, eleito sucessor de Alvaro Reis, renunciara,
aceitando depois a direção da nova igreja, que acabou
desaparecendo coin a conventão ao catolicismo do seu
principal esteio, o presbltero Crimilde Leite de Aguiar.
Crimilde Aguiar linha sido o superintendente da
Escola Dominical da Igreja Presbiteriana ao tempo em
que eu era seu aluno.

Nessa ocasião veio à luz o seu livro "Protestantismo


indesejável", em que calal<>1ou uma série de irregula­
ridades, de verdadeiros escAndalos, de deslises morais
de muitos pastôres evangélicos, com o que ficavam sem
nenhuma autoridade os protestantes que costwnavam
argumentar contra o catolicismo citando o procedimen­
to irregular - e, pois, anti-.:atlilico - dêste ou daquele
padre esquecido da sublimidade de sua missão. Não era
só na seara católica: entre os proteslanle9 havia tam­
bém muito joio . . .
Aliás, desde o tempo de Jesus e dos Apóstolos sem­
pre foi assim.

238
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Várias vhes fui almoçar no "Restaurante Vegeta­
riano", de propriedade do Sr. CrimUde de Aguiar, a
convite do meu amigo Tibyriçá Nogueira Reys.
Impressionou-me sobremaneira a alegria em que
andava o meu antigo professor da Escola Dominical, o
entusiasmo com que se referia à Igreja Cat61ica.
- Você já leu êste livro? - indaga-me êle um dia
mostrando-me a obra de Leonel Franca: "A loreja, n
Re/onna e a Civilização".
- Ainda não. Li apenas um artigo do Pastor Oto­
niel Molla, que, surpreendentemente, o declara "il"rcs­
pondíve]".
Levei para casa o livro emprestado com o compro­
misso de anotar tudo aquUo de que discordasse ou que
não compreendesse.
Apreciei bastante a obra, que me abalou bastante,
ernbora não me convencesse de todo: #! que o autor,
com esplrito polêmico, natural num moço de 29 anos,
a escrevera na Europa, focalizando o proteslantismu
hi•tórico, do século XVI; não tratava propriamente do
nouo protestantismo, nem tio pouco penetrara, como
fêz o Pe. Louis Bouyer no seu admirável trabalho "Ou
protesl411ti.sme a l'Eglise", na alma protestante, na vida
duma paróquia protestante. t curioso, aliás, observar
que o reconhecimento feito, lealmente, por um católi­
co, dos elementos positivos do protestantismo, produz
no espirita dum protestante sincero uma impressão mais
favorável do que o exame dos elementos porventura
negativos.
"A largueza do remo de Deua", do Pe. Alves Cor­
reia, me foi, por exemplo, muito mais útil do que cer­
tos livros de ataques violentos ao protestantismo, cujos
autores nem sempre distinguiam teologia de psicologia ,
e, não raro, se mostram bem superficiais em conheci..
mentas hist6ricos.

239
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Tendo feito, como prometera, as anotações à mar­
gem do livro do Pe. Franca, levei-o ao meu amigo ex­
protestante, que logo se prontificou a me apresent.ar ao
autor.
Dois dias depois encontrava-me, pela primeira vez,
com um Jesulta, em came e osso! E logo o grande
Leonel Franca!
Que surprêsa agradãvel!
Inesqueclvel o meu encontro com o admirável pes­
cador de almas! Impressionou-me muito mais a sua pes­
soa do que o livro!
Com que segurança, com que mt!todo, com que cla­
reza e elegAncia expunha o seu pensamento! E que
encantadora suavidade!
Repeti várias vêzes a visita. Ocupadissimo sem­
pre, parecia, entretanto, o Pe. Franca, ao receber uma
visita, que outra coisa não tinha a fazer senão ouvi­
la; e com que atenção e fidalguia!
Leonel Franca atingira o "planalto da serenidade".
Via tudo sub apecie aeternitatis. Nada o perturbava!
Para se ter uma idt!la do grau de perfeição a que
chegara em matéria de auto-domlnio, basta lembrar a
sua ct!lebre "conferência da mõsca'', pronunciada nwna
pequena cidade do interior de Minas.
Não era o Pe. Franca um pregador popular: fala­
va de preferência a intelectuais. Não estava, pois,
aquela assistência culturalmente à allura do conferen­
cista.
Discursou por mais de uma hora o eminente sa­
cerdote. E . . . durante todo êsse tempo, uma môsca
passeava na sua calva, de um lado para o outro . . .
Os ouvintes o! que se impacientavam com o falo;
o conferencista, porem, impasslvel, parecia nem perce­
ber a existência da môsca!
E que espetáculo a Missa celebrada por êle!

2-40
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Certo dia, vendo-me fatigado, necessitado dum r<"­
pouso, perguntou-me se não gostaria de passar nlgun•
dias no "Colégio Anchieta", de Nova Friburgo. Fun­
cionava lá, naquela ocasião, o noviciado da Companhia
de Jesus.
Naquela mesma semana chegava eu a Friburgo, em
cuja Igreja Presbiteriana pregara várias vêzes.
Criado num ambiente impregnado de profunda pie­
dade, mas também de arraigados preconceitos contra o
catolicismo em geral e os jesultas em particular, entrei
ali um tanto prevenido. Quanta cousa ouvira e lera
contra "os famigerados jesultas" . . .
Recebe-me amàvebnente o reitor da casa, R. Pe.
Paulo Bannwarth, que me leva a visitar o histórico edi­
fício em que Rui Barbosa fizera o famoso discurso re­
tificando afirmativas infelizes e infundadas dos tempos
da mocidade, no prefácio de "O Papo e o Concilio".
Aquêle passe io pelo grande edillcio me deixou
agradàvebnente impressionado. A ordem, o silêncio, a
ntmosfera carregada de espiritualidade, - tudo me en­
cantava!
Fiquei sabendo de certas particularidades sabre a
vida do noviciado e a respeito da formação intelectual
" espiritual dos "disclpulos de Loyola". Entram no
noviciado os jovens candidatos à vida religiosa após
concluirem o curso de humanidades. Durante dois
nnos se isolam do mundo. Não lêm jamais. A não
ser em casos excepcionais, não recebem visitas nem
corr<!spondêncie, senão da famllia, e muito espaçada­
menll'.
Entregam-se, durante equêle perlodo, a intenso
trabalho esei!tico, fazendo, inclusive, "o grande retiro
espiritual", de trinta dias, segundo o método de Santo
Inácio. Foram êsses "exerdcios" que deram ao mundo

241

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um S. Francisco Xavier e numeroslssimos outros após­
tol"" e santos.
Findo o noviciado, segue-se o curso filosófico, lei­
to com o máximo rigor e seriedade, após o que se in­
terrompem os estudos para um perlodo que dura no1·­
malmente uns três anos, durante o qual, como ºmes­
tres" nos colégios da Companhia, amadurecem, adqui­
rem valiosas experiências pedagógicas, examinam-se
bem e são igualmente examinados quanto à vocação.
Depois do magistério faz o estudante o seu curso de
teologia, ao fim do qual é ordenado sacerdote, tendo já
30 anos, pelo menos. Vem a seguir mais um ano de
"provação", que é como que outro "noviciado", duran..
te o qual deixa de lado o néo-sacerdote os seus altos
estudos intelectuais; ai, numa recapitulação geral de
sua vida, exercendo variados ministérios apostólicos e
entregando-se, de novo, tão sômenle a leituras e exer­
clcios espiriluais, sob a direção dum 11instrutor" ex­
perimentado, recebe "a última demão", coroada por
mais um retiro completo, de trinta dias. Após essa long-.1
preparação é que S(!lgue para o 11front", a combater o
bom combate.
Os que manilesl.am pendor pora alguma especia­
)ização, fazem, então, novos estudos; os que desej am,
por exemplo, doutorar-se em Escritura Sagrada, estu­
dam ainda mais 7 anos no Ponliíicio lnstilulo Bíblico
de Roma e no de Jerusalém.
:t verdade que não fiquei sabendo de ludo isto na­
quela ocasião. Não tive, infelizmente, um guia como
lenho sido para tantos amigos meus. Tive de procurar
por mim mesmo, de "quebrar a cabeça" por conta pró­
pria nas minhas incursões de reconhecimento e pesqui­
sa através dos muitos e variadlssimos arrabaldes dessa
imensa e maravilhosa cidade que é a Santa Igreja Ca­
tólica.

242
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Leonel Franca foi, realmente, um farol; ulillssimo,
M'ln dúvida. Um "c::icerone", porém, sempre faz falta.
Seja como f&r, a semana que passei , em 1931, no
nnviciado dos jesultas, exerceu decisiva influl!ncia na
minha evolução espiritual.
Conheci, naquela ocasião, o grande Bispo de Ni­
t�rói, Dom José Pereira Alves, enlão em visita pasto­
ro) à cidade de Nova Friburgo. Foi a primeira vez que
c•ntrei em contato com um Bispo católico, e logo um
Bispo como D. José, todo bondade, todo simpatia, ver­
dadeiro "homem de Deus"! Encantou-me sua simpli­
ridode!
Impressionou-me, outrossim, o ambiente do unovi­
t·iado". Nobres europeus pe11ando a vassoura e var­
rl'ndo os corredores com a mesma naturalidade com
que antes pegavam os seus talheres de prata! E que
t•xpres.'ião de alegria em tôdas as fisionomias! Uma
nlegria celeste, de quem deveras se toma criança. como
rrcomendou Jesus que fizessem os que desejassm se­
i:ul-lo.
O bibliotec6rio da casa era o R. Pe. Cesar Dainese,
um dos maiores valôres culturais da Companhia de
Jesus, que também me cativou sobremaneira entregan­
do-me as chaves das qualro bibliotecas do Colégio An­
t•hieta! Poderia ler e levar o que quisesse para o meu
'luarto, a cuja porta um Im1ão, destacado para meu
"unjo de guarda", vinha de vez em quando bater para
perguntar se precisava de alguma cousa . . .
Só precisava e realmente desejava poder ficar em
•il�ncio a ler aquelas maravilhas, que eram absoluta
novidade paro mim.
Entrei ali em contato com o grande Monsabré, atrn­
vrs de seus sermões admiráveis, como, por exemplo, o
<111r trato da Eucaristia. De todos os livros, porém, o

243
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que mais me prendeu e interessou foi, sem dúvida, o
Compêndio de Teologi4 Am!tica e Mí•lico, de Adolphe
Tanquerey. t que do curriculum dos seminários pro­
testantes não constam duas matérias que se estudam
nos seminários católicos: Teologia Moral e Teologia
Ascélica e Mlstlca; como também não consta do curri­
culum dos seminários católicos a cadeira de "Teologia
Blblica", que os evangélicos possuem.<>1
Já tivera a felicidade de receber aquêles alicerces
tomistas no início do meu curso de filosofia. Agora
descobria êsse livro precioso pelo qual acabei deixan­
do todos os outros. Desaparecia no bosque situado por
detrás do 11Chateau", e ali ficava, horas inleiras, mer­
gulhado na leitura.
Transcorreu ràpidamente a semana. Receiando,
porém, estar a Importunar os meus caridosos hospedei­
ros, julguei de bom aviso vali.ar para o Rio. Mal sa­
bia que poderia ter ficado lá não sõmente algumas se­
manas, mas a vida t&:la . . .
Dizendo ao Pe. Bannwarth que precisava regres­
sar, perguntei-lhe se niio seria posslvel emprestar-me
aquêle volume, cuja leitura ainda não pudera terminar
e que tanto bem estava Cozendo e minha alma.
Eslavo, porém, o livro cntalogado numn estante em
que se lia: 11Ne auferontur" . . .
Eu, em seu lugnr, emprestaria ou daria logo o li­
vro ao proteslante tiio interessado no sua leitura; ou
providenciaria, já que naquele tempo não se achava

(2) t verdade que, sem haver csped.llcamrnt.e a cátedra


do Toologia Bfbllca, é o que vêm estudando, com lnl.orésse cada
vez maior, emlnent.lalmos teólogo1 católl.coe, que procuram, como
Karl Rahnl'I', S . J . , Alfredo Wlckenhauser, Ol:lo KU!3 • outros,
repmsor C"n\ l�rmos bfbllcos o conteúdo d08'11ático.

244
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1·01n lurilitlndc
nas livrarias, a fim de que outro l"Xem�
11lur lhe chegasse logo às mãos.
Nc15So bonlssimo Pe. Bannwarth, entretanto, ha­
hllundo a obedecer às mais pequeninas determinações
110 Hc11ra e dos Regulamentos, e mal supondo até onde
"'" poderia ter levado o livro, não viu como resolver
" cll!IO a meu contento. De fato, o Compêndio de Teo­
logia Ascétka e Múlica, de Tanquerey, foi, como cos­
tumo dizer, uma espécie de chave de trilho de bonde:
111 eu numa direção e, de repente, já estava noutra,
bem diferente.
Deus tem, porém, os seus caminhos. Newman tam­
bém levou cêrca de cinco anos naquele perlodo, em que
cu me achava, de dolorosa e dramática transição espi­
ri tu ai.
Todavia, era mister passar ainda por outras expe­
riências para que, dado o passo que acabaria dando,
nunca mais retrocedesse nem liv.,,,,;e dúvidas. Mesmo
"porque o homem não é um silogismo; s6 a pouco e
pouco descobre - vivendo - as Implicações reais dos
principias que esposa."<»
Descendo a Serra dos órgãos, dizia comigo mesmo:
"Ou êsses homens são muito, mas muito hipócritas . . .
(mas, se é posslvel ser hipócrita um, dois ou três dias,
sê-lo-á muito dificil durante tantos anos seguidos, du­
rante a vida tôda . . . ) ou, então, essa instituição, con­
tra a qual tanta cousa já li e ouvi, é a mais caluniada
de !&las as instituições."
E repelia, em surdina, a última estrofe do hino
que, naquele mesmo trem, doze anos antes, meu Pai
escrevera:

(3 O Card•d N•unnan, M. T-L. Pl:lm>o, Pi· 85.

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''Diu, pois, o que queres de mim,
E farei, meu Senhor, tua l>Olltade;
Eu sou teu . . . par11 sempre . . . sem fim . . .
Deus de amor, de ;ustiç11 e veTdaàe!"

Tive ainda alguns encontros com o Pe. Leonel


Franca, que me recebia em seu pr6prio quarto, onde,
às vêzes, por horas seguidas, me ouvia com infinita pa­
ciência, respondendo-me sempre do modo mais satis­
fatório. Pareciam adrede preparadas as respostas que
me dava.
Obrigado a estudar desde cêdo até altas horas da
noite para prestar exame, duma só vez, de tôdas as ma­
térias do curso jurldlco, perante uma banca especial de
desembargadores da Côrte de Apelação; e tendo depois
adoecido seriamente o Pe. Franca, em conseqUência do
cansaço que lhe sobreviera após um retiro que, apesar
da sua crônica lesão cardlaca, pregara a um grupo de
intelectuais na Casa da Gávea, - perdi o contato com
o meu grande amigo e mestre.

Faltava-me, como disse, um ''cicerone". Nüo me


sentia mais à vontade no presbiterianismo, principal­
mente após oquêlc estágio em Nova Friburgo; mas não
e•tava ainda psicologicamente em condições de me fa­
zer católico. Integrei-me, então, na comunhão cpis­
copaliana, já que não me sentiria bem entre os .. fran­
co-atiradores" ou os no church goeTs. Assistia aos
"serviços divinos" na igreja do Redentor, onde tam­
bém pregava, freqüentemente, de batina e sobrepellz.
Sentia-me bem naqueles hAbitos eclesii\sticos. O am­
biente anglicano me agradava muito mais do que o da
igreja presbiteriana. Aliás, a bem dizer, - e s6 recen­
temente o percebi - se aos poucos me separava do cal­
vinismo institucional era, em parte, por êle ae h'lt.• C'r
a/a•tado de suas origem, do calvinismo teológico.

246
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Senão vejamos: as vestes talares, que tanto me
DKradavam, e a meu pai também, sempre foram usada.
pclos antigos pa.tôres "reformadores" durante o culto
e as cerimônia. religiosas.
Os salmos, que se recitavam todos os dias em mi­
nha casa, no culto doméstico, e que na Igreja episcopa­
liana eu ouvia cantar de preferência a certos hinoo in­
dividualistas e sentimentais adotados pelos calvinislas
modernos, eram os únicos cintlcos admitidos pelos cal­
vinistas ortodoxos, para os quais, como nota o Pe.
Bouyer, s6 os hinos inspirados poderiam corresponder
condignamente à Palavra inspirada.
A doutrina calvinista da Eucaristia, a da presença
dinâmica de Nosso Senhor no Sacramento, foi preteri­
da e definitivamente substitulda pela do sr. Ulrich
Zwinglio, que afirmava ser a Santa Ceia simples come­
moração, e a. sagradas espécies meros slmbolos ou fi­
guras.
Queria Calvino, coerente com a alta idéia que ti­
nha da Eucaristia, que em todo culto se celebrasse a
Santa Ceia, o que não fazem os calvinistas, que não
comungam mais do que uma vez por mês.
Calvino acreditava na virgindade perpétua de
Maria Santlssima, o que não acontece com os nossos
calvinistas.
E se nos adentrarmos bem no campo teológico, che­
garemos a uma curiosa conclusão, aparentemente para�
doxal até: a de que o protestante que retomar ao pri­
mitivo pensamento de Calvino e de Lutero estará mais
perto do dogma católico do que das opiniões esposadas
pelos mais credenciados representantes do protestan-

247
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tismo hodierno. Eis um tema que merece detidamen­
te examinado. l4>

Por isso, há mais de um quarto de século de dis­


tância dos fatos que aqui recordo, é que constato, e
com certa surprêsa, que, ao me afastar da igreja pres­
biteriana, que se tem por herdeira direta de Calvino, na
realidade retomava ao que havia de mais substancial
no pensamento teológico de Calvino, mesmo quanto à
questão da justificação, que para êle implicava também
em santificação (fé obediente) . De Calvino, que dis­
sentira de Lutero, deveria eu, seguindo um rumo natu­
ral, numa atitude mental em que havia wna rigorosa
lógica interna, - que eu mesmo então não discernia
bem, da qual não tinha plena consciência, - retroceder
ao Patriarca da Reforma, cuja intuição fundamental,
devidamente estudada, está, segundo o Pe. Bouyer, de
pleno ac6rdo com a legítima tradição católica, com a
doutrina tomista e as definições conéillares. E assim
se deu: dum calvinismo institucional e desvirtuado para
um calvinismo mais autêntico, ainda que de tal não me
apercebesse ; "para, finalmente, via Lutero, chegar a
Roma. Um ret6mo lógico.

(4) Estabeleeendo, nesta linha de pensamento, curlooo pa­


ralelo enlre a ucese de Calvlno e • de S. Joio da Cruz.. vai
alndo mais IOD1e o Pe. Bouyer ao 1alientar, no ternno "'mora­
liota" e "poUUca", u analogiu enln! u duu "cldodes de Ikoua",
erguidu por lnnãos d-vindos, e em oposição uma à oulra: o
Estado j....Wca do Puagual, oob o lema Ad Majorem Dei Glo­
riam, e a teocracia ealvlnilt.a de Genebra, a wstenlar o SoH
D•o Gloria! (Ou protHtonliame a l'l!:gliu, pp. 81 a 102).

24!1
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NA IGREJA LUTERANA

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ERTO DIA, vejo num matutino a noticia d3
inauguração da Igreja Luterana no Rio de
Janeiro. Era a única igreja protestant.e que
eu não conhecia; e Jogo "a le9ilim11 igre;a
da Reforma"!
Curioso, fui ver de perto a Igreja Lut.erana.
Uma surpr&a! No lugar de honra, um altar, com
velas acesas e um belo crucifixo! O pastor de vestes
talares. A liturgia, tôda cantada, solene, Impressionou-me
muito bem. Depois é que verifiquei que era, na reali­
dade, a da Missa romana traduzida para o vernáculo,
com pequenas alterações. A comunhão, de que s6 po­
diam participar os membros da Igreja Lutem&, se fazia
com parllculas iguais às que se usam na Igreja Católica.
Após o culto vem o pastor cumprimentar o viMi­
tante, convidando-me a voltar no domingo seguint.e.
Antes disse domingo, porém, já me fazia uma visita
de cortesia o Rev. Rodolio Hasse, estabelecendo-se logo.
entre nós, relações de cordialidade, que perduram até
o dia de hoje.
Abaladíssimo nas minhas convicções religiosas, má­
xime por haver constatado que não passavam de len­
dRs pueris muitas de.s acusações que sempre linha ou­
vic!o contra a Igreja, que de perto e por dentro, como

251
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eu estava começando a conhecer, era bem diferenle do
que julgam os evangélicos, ia descobrindo uma face
desconhecida, que Karl Adam asseverava e ludo es­
tava me fazendo crer que era de falo "le 11rai vi.sage du
Catholiciame". Embaraçavam-me os passos, porém,
certas amarras de ordem senlimental, já que foi no
proteslanlismo que meu pai subira a tão grandes al­
luras espirituais e a êle estava ligado quando partiu
diste mundo; certos preconceitos que me intoxicavam
ainda e de que só me libertaria paulatinamente; a mio­
pia mental que me não permitira distinguir, como de­
pois conseguiria, o essencial do acidental, a doutrina
definida de certos costumes regionais, o tronco das pa­
rasitas e larvas, o autêntico catolicismo de suas gros­
seiras contrafacções, - tudo devido, pslcolõgicamente
falando, em grande parte, à falta de quem me tomasse
pela mão e me orientasse. Carecia, igualmente, de
mais unidade mental, por isso que, do ponto em que
ainda olhava para a Igreja, não lograra ter a visão de
conjunto que me levaria àquela opção definitiva, que
importaria nas mais dolorosas rupturas, no sacriflcio
de me ver incompreendido e desprezado pelos que ama­
va com tôdas as veras d'alma.
Indubilàvclmente fazia-se nece!ISÍlria, outrossim, a
ação do tempo; ademais eu não via, no Brasil, um ca­
tolicismo como o que me haveria de entusiasmar em
1957 na Alemanha e na Inglaterra, e em 1959 nos Es­
tados Unidos e no Canadá, mas, freqüentemente, um
sincretismo verdadeiramente desconcertante.
Não era, pois, de estrnnhar-se a desesperada e der­
radeira tentativa que fiz para ficar do lado de lá; que,
como no circo de Jerusalém, derrubadas as delesas
externas, ainda me entrincheirasse por detrás de uma
segunda, de uma terceira muralha, até a rendição de-

252
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finitiva, quando conquistado, afinal, o "Sancta Sanc­
torum" da consciência.
E foi assim que, durante um ano, com o Pastor
Rodolfo Hasse, fiz um curso de revisão teológica para
me esvaziar inteiramente de qualquer resqulcio que
pudesse ter do calvinismo . . . "
Hoje reconheço a utilidade dessa minha passagem
pela Igreja Luterana: muitos preconceitos que ainda
nutria em relação à Igreja Católica, e de que começara
a me desfazer com Erasmo Braga, Alfredo Teixeira e
John Mott, acabei de perder no convlvio com os lute­
rano• e nas tertúlias teológicas com o Pastor Hasse,
inegàvelmente um grande cristão, auotero, reto e con­
victo.
:t que, em matéria de liturgia, por exemplo, mui­
to tem um calvinista que aprender com 09 luteranos,
que, mais conservadores, observam, como os anglica­
nos também, as principais estações e datas tradicionais
do ano cristão. m Estranhamente alérgicos a tudo que

(1) O "Calendário Anato-Franci.ocano de Festas e Jejuns"


(Feosts & Fulo) da "Amerloan Con1regallon oi Franciscons oi
lhe Episcopal Chun:h" awinala não llÕmenle os oanlos e mirti­
r<S doa prlmelroo 5éculas, como S. Fablano, S. Policarpo, S. João
Crisóstomo, S. Inácio de Anllóquie, S. Cirilo de Alexandria,
ele, mas lambém t6du aa lestas de N. Senhora e de Sanlol bom
nmtGnOI. muitos dêlee canonizados ap&s a sepan.ção do sec.
XVI: S. Francisco de Sal... S. Tomú de Aquino, S. Cotulna
de Bolonha, S. Boaventura, S. Vicente de Paulo, S. lnáclo de
Loyola, S. João Vianney, S. Bernardo, S. Lula de França, S.
Pedro Clover, S. Joio da Cruz, S. Francisco Xavier, ele.
O proepecto "My Ruie oi Llfe", da Church Unlon (8, Hyde
Park Gale, London, S. W. 7 ) , ...., que o Dei asaina, na presença
de uma testemunha, o compromls!io de obedecer a um "regulil­
mento de vida", et"tabelece o oíft'ft'lmento diário do dla. o exa­
me diârio de consciêncl.I, a oração d16rla, a confissão, a comu­
nhão, a contrtbulção financeira para • Jareja, a leitura da Escri­
luro Sagrada "' a renovação periódica dhsto compromisso.

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vem de Roma, rejeitaram os calvinistas a seleção de
textos blblicos feita pela autoridade eclesiástica para a
leitura no culto público, como também a ordem litúr­
gica, que remonta, em suas linhas gerais, à mais alta
antiguidade, ao próprio tempo dos apóstolos. A esco­
lha das lições blblicas, dos hinos que a assembléia deve
cantar, e, muitas vêzes, a própria ordem do culto é
transferida ao arbltrio do pastor, que improvisa as ora­
ções e todo o programa da reunião no sentido das idéias
e sentimentos que pretende inculcar nos ouvintes. Até
a oração, que geralmente se segue à prática, nada mais
é, como acentua o Pe. Bouyer, do que uma slntese do
que dissera, um segundo sermão indireto.
A ordem do culto calvinista, sobretudo no Bra•il,
mantém, pois, o povo submisso ao gôsto e às opiniões
particulares dum pastor ou dum grupo de pastôrcs.
Vivem, assim, os fiéis sob o influxo de personalidades
marcante.s, a quem se atribui t6d.a a autoridade em ma­
téria de interpretação da Escritura, e, não raro, a in­
falibilidade doutrinal negada ao magistério oficial da
Igreja. Suprindo a Igreja, impede, entretanto, a uulo­
ridade dou trinal do pregador-«"lebrante a desagrega­
ção total que fatalmente rl'Sulturia d:i prúlica cfc•tiv.1
e rodicaJ do 11llvre-exame''. . exercido, quando muito,
por um grupo, e niio pelos fiéis individualmente. Já a
Igreja Luterana, em relação à liturgia, all"S"r das mu­
tilações havidas na sua "Formula Missae", procura
manter-se conservadora; e teologicamente pode dizer­
se que seja, talvez, 80% católica.
Na verdade, não sei se a rigor se pode falar assim,
determinando 11porcentagens de catolicismo". Mas o
(ato é que a Cristologia sustentada pelo Slnodo Evan­
gélico Luterano do Brasil é correta. Dai, conseqlien­
temente, como se lê na Fonnula Concordiae, conside­
rarem os luteranos llARIA SAKTiSSDIA llATD DIU.

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O hatihmo e a Eucaristia, como sacramentos, sàO'
pera os luteranos MEIOS DE CRAÇA, de santificação, ca­
nai• pelos quais, ordinàriamente, o Espirita Santo nos
otinJle o ahna, e não apenas mera figura, sinais ou slm­
boloo. Por isso, o Batismo, também administrado às
t•riam;as, lava a mancha do pecado original.
Adotando os credos apostólico, niceno e alanlll!ia­
no, querem êles filiar-se à mais antiga tradição cristã,
reconhecendo, outrossim, de certo modo, o progresso­
dogm4tico, vislo ser o credo atanasiano desenvolvimen­
to e explicitação do niceno e éste do apostólico.
A doutrina da Eucaristia é a que mais se aproxi­
ma da que sempre sustentou a Igreja Católica. Da con­
•ubstanciação para a transubstanciação há apenas um
passo. Afirmando estar o Corpo de Nosso Senhor
Jesus Cristo ..em, com e sob o pão e o vinho", admi­
tem os luteranos a presença simultAnea de quatro subs­
tâncias na Hóstia consagrada, ao receber o fiel a Santa
Comunhão: o pão e o corpo de Nosso Senhor Jesus
Cristo, o vinho e o Seu Sangue Preciosissimo. Houve, ao
que parece, uma precipitação, uma certa falta de ama­
durecimento filosófico e teológico da parte dos que as­
!'lim definiram o ºmysterium fidei".
Não costumam os lutei-anos cultuar, corno os ca­
tólicos, a Divina Eucaristia visto crerem na presença
real de Cristo tão sbmente no momento da comu­
nhão . "' Não refletem no fato de Nosso Senhor ter

(2) "'Lulero nio rmin• que o pão mnagrado deve ser


adorado, mas que a presença do corpo de Criato é tio real que
um incrldulo que comunga a recebe, embora pant1 seu mal, aendo­
que s6 o craile pode recebê-la para seu bem. Dogmd;tice Emin ­
plli<a - Rev. Prol. ALn- -.. 'I'mDlllA, pg. 288.
Visitando um paroquiano enfihmo, ouve-o o pastor ftn oon­
fisio, d'-lhc.- a •blolvição e, nn sesWda, shbre um peque:o.

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dito "lato é o meu Co'l'º · . . isto é o meu Sangue", llll·
tes mesmo de os Ap6stolos comungarem: a Presença an­
tecede o uso. (Mons. Penido)
Contudo, prudentemente, consome o celebrante,
como fazem Uimbém os anglicanos, qualquer partlcula
e o que sobrar do vinho consagrado . . . "'
A defesa que fazem os luteranos do uso das ima­
gens sagradas, que também possuem, é das mais con­
vincentes para o protestante habituado a argumen­
tar apenas blblicamente ."'
Outra surprêsa para o calvinista que entra em con­
tato com a Igreja Luterana é o fato de se conservar
ali a confissão particular. Nunca se aproxima da mesa
da comunhão um luterano que tenha na consciência
um pecado grave (nós dizemos mortal) : confessa-se,

altar adttde preparado no próprio quarto. @ de acôrdo eom uma


liturgia rHUmida. adaptada ao cuo, consagra o pio e o vlnho
para administrar-lhe a sanla comunhão. (Puloral Th•olouv -
Joe" H. e. Fllnz, pg. 194) .
(3) Em meu livro ""' /nnãoo S•paradDO, publicado pelo
Livraria Agir &:Utora (C•. Pmlal 3291, Rlo de Janl'lro), fiz.
umn C!'Xposlção doulrlnárla acêrca da Eucaristia, du Imagem
sagradas, da vqlndade �rpétu.a de Ma.ria Sanllalma, da con­
flaão, do purpt6rio, das oraçõr11 pela1 mortos, do primado de
Pftlro, de v•rlas oulru crmças e costumes catól1C01.
(4) Conheci uma Igreja lulrrana cm que, nlóm do cruci­
fixo de praxe, que l.ôdu tem. alnda havia um quadro de gran­
des dimensões, com bela moldura. A sravura não era, po"1n, o
ml'sma semptt: variava conforme e sanlo do dia ou a lição da
liturgia de cada domingo. No dla 24 de junho, por ex.. co10C':ll ­
va-se no moldura um quadro represent.ondo S. João Batista; no
dja 25 de janeiro, um que se relacionasse com • conversão de
S. Paulo no cambl.ho de Damasco; ao DominlO da Páscoa. Jesus
reuuacllado; no dia da Alcençio. JMUS subindo ao cfu, - e
aalm por dlanle. lndubltàvelmftlte um alstema pedagógloo inl�
reaantíolmo e que tinha a vantagrm de concmtrar no fato
comemorado pela liturgia a atenção dos fiéis.

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primeiro, particularmente ao seu pastor. E os pasta­
res uns aos outros, ao menos por ocasião do slnodo
anual, cuja primeira sessão costuma ser "de confis­
sões": comparecem os pastares, todos com as suas ve�
tes talares, ouvindo-se mutuamente em confissão. :f:
comum levantar-se da cadeira o pastor que ouvira a
confissão do seu colega e, por sua vez, ajoelhar-se di­
ante dêle para lhe fazer a sua confissão! I!: uma cena
das mais edificantes, e que tive oportunidade de pre­
senciar.
Dizem-se ainda os luteranos com a Igreja Cat6lica
até. . . o Fi!ioque. Poderiam ter ficado um pouco
mais . . . o>

Terminado o meu "curso de revisão", fui a P6rlo


Alegre prestar, durante vúios dias, no "SeminÚ'io
Concórdia", os exames de tadas as principais matérias
teológicas, perante uma comissão constitulda de v6rios
examinadores. Aprovado plenamente, rumei para a
cidade de Santa Cruz, no interior do Estado do Rio
Grande do Sul, onde se reuniria o Sínodo, diante do
<1ual faria o exame de teologia pastoral."'

(�) Vom, ali'8, o propóallo lembrar que o Papo, mnvocan­


do o ConcDio de Trento, por cuja realização oo "refonnodora"
lanlo .... batC!'ram e que IOIJ"'U'8lll mesmo •preaar, convidou-os •
n:rmpar«'Tr a fim de discuUrern IUU lelel e mla.bonrem na
vrinhw.llt'in R...torma, de que 8elll. dúvida nece:ssltava mmmo a
IRlt"jo. E m l"t'formlatu se recuaram a comparecer. . .
(6) O com�ndlo de Teologlo P.-.1 enliio adotado no
'"S.mln.4rlo Concórdia" de P6rto Alegre era o de John IL C.
Yrll•, D. D . , quo, onslnando de modo priUco o oemlmuilla lu­
lrr•no • bnn eu,rcer o BeU '""""" ministerial, focallr.a OI deve­
rl"I do putor p.1n. com • sua comunidade e vk:e-vena, a necm­
.tidAdo do culUvo da vida interior. • lmportlnda da prepçio, da
e1cola cri.Ili dl6rla, o modo como admlnlatnr o Batlsmo, a Can·

257
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Aprovado também, foi decidida a minha ordenarão,
que se realizaria no Rio de Janeiro, com a tradicional
cerimônia da imposição das mãos, logo que regressase s
dessa viagem.
De acôrdo com um antigo costume, o "candidalo
ao ministério" deve passar uma noite t&la acordado,
em oração.
Se depois disto se mantiver disposto a aceitar o
"chamado", então receberá as "sagradas ordens".
Obedeci ao rito da "vigllia de armas", tendo sido,
a seguir, ordenado pastor.
Nos primeiros tempos fui coadjutor do Pastor Has­
se na parÓquia da Paz, tendo depois acumulado essas
funções com a de pastor da comunidade do Redentor.
O Pastor Hasse, brasileiro de origem germAnica,
falando perfeitamente o português e o alemão, percebe­
ra, logo no inicio do seu ministério, a necessidade de se
nacionalizar a Igreja Luterana, sob pena de acabar de­
saparecendo. Até pouco tempo antes, o culto e a pre­
gação se faziam na Ungua alemã; os jornais e livros re­
ligiosos eram editados em alemão; as aulas do Seminá­
rio dadas, igualmente, em alemão. Era, pois, a Igreja
Luterana uma igreja alemã para a colônia alemã. Coin

firmação, o �mto do Altar", os cuidados especiais de que


carece a juventude, a cura d'�. 1 disclpllna ecleslútica, 11
excomunhão maior e menor, a reabilitação de penitentes, a con­
flaio partkular, o ligilo oaoramental, os funerais, as relaçát>•
com outras �� e com o Sinodo, m problemas de juris­
dição, as viallu regulares - paroquianos, • 0111onhação do
fichário, o "reaistn> pmlo" dm pert.iciponta da Santa Comu­
nhão, • 0111onlzaçio das várlaa usociaçõos paroqulala, o cuidado
no preparo dos aennões, a aaslslfn.cla npiritual U prisões e 109
hospitais, o culUvo da múaica acra. o procedimento do pulor
em face de certas pslcmes. problemas de adminUtn.ção, de
construção de igrejas, de ncolu e- casas paroquabi, etc., etc.

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n &utracrução dos descendentes dos a1emães na comuni-
1lad<' nacional se daria fetalmente a dispersão; os fi­
ll1u• dos luteranos ou se tomariam católicos ou - o
•1u� :wrin mais prováve1, - acabariam sem religião ne­
nhumn, como aconteceu a tantos milhões de descenden­
h'N dOll peregrinos da 11May Flower", arro1ados hoje nos
"
•:•todos Unidos entre os "no church goers .
Meu ingresso na Igreja Luterana deu ao Pastor
lllL'-"" mais Animo para prosseguir na sua campanha
"" integração. Além da minha designação para seu
'·oodjutor, conseguiu criar, outrossim, uma "comissão
•inodal de censura literária", de que êle fazia parte
juntamente comigo e o Dr. Afonso Freire, antigo mcm­
t.ro da Igreja Episcopal e que comigo tamWm se pas­
"""' para a Igreja Luterana.
Dai por diante tôdas as publicações da Igreja, in­
dusive os artigos do órgão oficial, o "Mensageiro Lu­
terano'', teriam de passar pelo crivo não apenas da co­
mis.o;ão de censura doutrinária, que já existia, como
tnmbém da de censura literária, então constitulda. Esla
rrn, a bem dizer, uma comissão mista, pois que em dou­
trina ninguém havia mais firme do que o Pastor Hasse.
Só depois da aprovação e do competente "imprimatur"
� que se poderia publicar qualquer trabalho doutriná­
rio, fôs...., o autor pastor ou leigo.
Onde, então, o livre-exame? Onde a liberdade
de cada um pensar como quisesse?
Isso poderia existir em qualquer parte;
licrcja Luterana.
Com efeito, desde cêdo enrolara o protestantismo
u bandeira do livre-exame promulgando os slmbolos,
confissões de fé e catecismos. :tsse repúdio à tese ini­
l'inl {, que evitou, aliás, a pulverização imediata das or­
�;.111iz.açües oriundas da Teforma.

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Quanto à Igreja Luterana, adotou como slmbolos
de Cê a Fonnula ConCOTdiae, a ConfiMão de Augsburg,
os Artigos de Smolcold e os catecismos menor e maior
de Lutero. Tencionando Frederico Guilherme Ili unir
por decreto o protestantismo alemão, fazendo uma
am61gama de luteranismo e calvinismo, protestaram
muitos luteranos, não se conformando com essa unifi­
cação imposta pela fôrça e em detrimento dos princl­
pios. Eram minoria, porim, o• irredentistas . flJ
Foram depostos de seus cargos e até presos os pas­
tôres "rebeldes". Algumas dezenas conseguiram, po­
rém, emigrar, estabelecendo-se nos Estados Unidos, no
Estado de Missouri, onde criaram o "Slnodo Evangéli­
co Luterano de Missourl, Ohio e outros Estados". Dai
se chamarem êsses luteranos de "missourianos".
Consolidados nos Estados Unidos, passaram a en­
viar missionários para os palses em que havia colônias
alemãs, inclusive o Brasil Até para a própria Alema­
nha, onde sobreviviam muito poueos dos chamados "ve­
lhos luteranos'', foram mandados misslon6rlos de Mis­
souri.
Depois de um perlodo reletivamente longo de "hi­
bernação" nas colônias alemãs, durante o qual se ia pro-

(7) E comtiluiam lncontcstà.velmmte uma elile espiritual.


8asla citar o nome do paotor Paulo Gtthardl (1607-1877), aulor
de numenisos e belúalmos hinos saCl"QS, tão PoPulan!IS a.inda
boje, o a cuja eocola pertenceu Tersteesen (1897-1769), outro
nol.i\•el místico que lanto enrlquece11 tamb6m a hinografia lute­
rana. Doutro pastor lulerano, Luiz Meyer, hte ji do século
XIX, diz o eminente Padre Bouyer que "poucos autores esplrl­
luals paftClam tão constantemente pr<OC:Upados com a perfeição,
quer se tratasse de extirpar os menores pecados por um _,6rço
de oração e de mortl.6.caçio conslaote ou de deenvulver inlati-
1àvelmenle uma caridade ardente, bebida no próprlo coração d�
Jesua Crblo."

260
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l't'HPtando uma identificação da religião com n raçn, e
tiunbtlm, por conseguinte, com a língua alemã, da qual
l.ukro, lôra, aliás, um dos plasmadores, é que, pelo
•••lúrço de alguns ministros menos racistas, mais "uni­
vt•rMllstas", como, no Brasil, o Pastor Hasse, e em par�
I<• tom�m pelo fracasso do nazismo, se foi procurando
ndaptar o luteranismo à lndole, à llngua, e à psicolo-
11ia dos povos entre os quais apenas bruxoleava.
Deixando o alemão de ser a llngua oficial do lute­
rnnismo, - o que certos teólogos missourianoa deplo­
ravam,"' menos pelo seu germanismo do que pelo
receio de se infiltrar pouco a pouco na Igreja, por tra­
duções apressadas e imprecisas, pela adoção de novos
ténnos, o vfrus da 11heresia", - impunha-se absoluto
rigor no trabalho de que eslava incumbida a nossa
"comissão de censura".
Foi assim que, além de rever com o máximo cui­
dado e vernaculizar centenas de artigos de pastôres que
escreviam em portugufs mas pensavam em alemão, ain­
da tivemos de "passar a limpo" tada a literatura dou­
lrin6ria, tada a liturgia e todos os hinos que vieram a
constituir o hin6rio brasileiro da Igreja Luterana. Têm,
ali6s, os luteranos duas espécies de hinos: os hinos "Ji.
túrgicos", que se podem cantar no culto, e "" hinos po­
pulares, para reuniões sociais, familiares, estudantis,
etc. etc.
Difere bastante a hinologia luterana da "reforma­
da". Reformada é sinônimo, entre os evangélicos, de
cal.,iniata. O bino litúrgico luterano não é sentimen-

(8) A T•oloQI& PIUCOral de F111n, adolada oficialmente na


Igreja Luterana, prttQnlza v!vamenle, alhn do mudo do grego,
do hebraico e do latbn, o da lfngua alemã, tklo pràllcamente comG
Jndiopenaivel à perfeita aulmilação do pensamento de Lutero.

261
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tal: é maciçamente doutrinário; é um comentário da
doutrina memorizado com facilidade e em belíssimas
melodias sacras de João Sebastião Bach, que era lute­
rano, e doutros mestres da arte coral, que, no domlnio
da piedade, diz Bouyer, foi "uma das maiores senão a
maior das criações do luteranismo".
Não me canso de repelir que me !oi utilíssimo o
estágio feito na Igreja Luterana, onde acabei de perder
o resto dos preconceitos e da prevenção que tinha con­
tra certas práticas da Igreja Católica, inclusive no que
se relaciona com a censura eclesiástica.

t bem diferente o ministério pastoral enlre refor­


mados e luteranos. Se meu pai foi quem foi, e com
êle tantas almas se abriam filial e confiadamente, é que
êle constitula, de fato, uma exceção. Via de regra, po­
rém, não exercem os ministros calvinistas a influência
espiritual que poderiam exercer se se não houvesse eli­
minado tão irrefletidamente, como se fêz, a confissão
sacramental. :t bem verdade que houve nisso uma
certa lógica, já que se eliminara o sacerdócio e se ne­
gara a necessidade da sucessão apostólica, com o que
se desfigurou a doutrina dos sacramentos. Os lutera­
nos, porém, que sustentam ser o sacramento um sinal
vislvel e eficaz de uma graça invislvel, que crêem na
presença de Jesus Cristo no "Sacramento do Altar",
conservaram também a confissão. que é feita particular­
mente ao ministro, que, à vista do arrependimento de­
clarado do penitente, pronuncia, traçando sôbre êle o
sinal da cruz, a absolvição sacramental: "Eu te absol­
vo dos teus pecados, cm nome do Pai, do Filho e do
Esplrlto Santo".
Não discutamos aqui a validade dessa absolvição.
O que importa assinalar, em contraste com o que acei·
Iam os calvinistas, é que os luteranos crêem firmemen-

262
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h• <JllL' o ministro de Deus tem poder e ordem para ab­
:w lver os pecadores arrependidos, em nome de Jesus
Cristo. E, como tantos anglicanos também o fazem,••• e
cm número cada vez maior, praticam os lutemaos a
confissão auricular, que, de resto, Lutero praticou du­
rante t6da a sua vida. Como alhures Já di�. não co­
mungam na Missa (é êste o nome que dão ao culto
em que se celebra a "Santa Ceia") se lhes pesa a
consciência pela transgressão da lei divina. Procuram
em particular o paslor e "se reconciliam", como fazem
também os pastôres, que se confessam uns aos outros.

Ouvi, como pastor, muitas conflSSÕes. E - diga­


se de passagem - também se guarda na Igreja Lute­
rana o sigilo da confissão.

t uma experiência profundamente emocionante, e


incomunicável, a de quem vê dianle de si uma alma
aflita, angustiada por se ler desviado do caminho do
dever, por haver ofendido a Jesus Cristo; e, resolvida a
se erguer, esperar confiadamente a palavra do perdão
que alguém lhe dá "em nome, por ordem, pela autori­
dade" de Jesus Cristo: "Vai em pa>!; teus pecados não
existem mais!" E que sensação agradável a de ver
recompôr-se a fisionomia minutos antes transtornada,
de ver correr ainda algumas lágrimas, mas agora de
alegria pela certeza do perdão de Deus!

(9) Na Catedral de S. Paulo, ancJlana, que visitei quando


estive em Londres, em 1957, cxlste, à esquerda de quem mlra,
uma ..capela de S. Dumtano", para orações parUculares. Vi, nos
�nufln.órios, vários folhetos sabre • confissão auricu.larj e,
bem visível, wn Aviao dlzendo que, ap6s o '"divioe service", um
padre, que ficari• à disposição dos fiéis que necessilassem d.,
auxilio espiritual, estava lambém habllltado a ouvir conflllllÕes.

263
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Mais do que a "Santa Ceia" das igrejas 1"eformadas,
a "Missa" luterana é celebrada com uma seriedade de­
veras exemplar. Não é no cullo comum, de adoração
e pregação, mas de manhã cêdo que se reünem os que
vão participar da comunhão. Não é uma reunião pú­
blica, mas apenas da comunidade, precedida de rigoroso
exame de consciência, de uma medilação destinada a
excitar a contrição e a preparar a alma para o encon­
tro pes.soal com Jesus Cristo .ºº'
Em matéria de Eucaristia, como ji\ noti\mos, os
calvinistas modernos são . . . zwinglianos! A maioria ab­
soluta dos presbiterianos, batistas e congregacionalis-

Eis a comunicação lpria l'erbU:

Sr. p411.J'• COl!Wdrol


London
A Print li socdlable ajtft' Ih« tnokea to Me GRJIOlle in
d•ed o/ l)llrilual help. He b ,._,...i lo hear cmr,_..,•
,. .

Suada11
ai 12.45 2.30 4.30 ond 5.30 p . m . '

Rttftltemente a 111"!1• EvanJ1.!llca Alemã reotabeleeeu tam­


bém o conl...tonário em llWlll llV'!lo&.
(10) t costume em multas comunidades realizar-se na vfs­
pera da comunhão um ..confealonal service'' de preparaçio para
a EuCDl'lslla. De qualquer modo ' de lel o registro pmlo (lho
registraUon) dos que vão comwqpu pan que possa o pastor con­
Vular a ndmlnistraçio do Sacnunmto, de que aó podem partici­
par os paroquianm em plmo g&zo de 6\lAB prerrogaUvu.

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11111, que ""·' consideram teolàgicamente calvinistas, nem
1•11ulwec 11 doutrina da ºpresença dinlmica" de Nosso
S1•11hur n a Eucaristia, pregada por João Calvino; proles­
r1u111 pu ra e simplesmente a teoria de Zwinglio, segundo
11 quul o pio e o vinho são apenas súnbolos, e nada mais.
JA "" luleranos, apesar dos t@rmos da sua defini­
�iio dogmãtica, segundo a qual recebe o comungante o
Corpo e o Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, ver­
dadeiramente presentes "em, com e sob o pão e o vi­
nho'', acreditam, na prática, quase o mesmo que os
fiéis católicos ao se aproximarem da mesa eucarlsti·
ca. A abnosfera, pois, é diferente da de uma igreja
reformada. Aliãs, até mesmo a disposição interna dos
templos lembra muito mais a das igrejas católicas: o
altar no lugar de honra, centralizando a atenção; o
púlpito ao lado, indicando que o principal é o culto,
enquanto a finalidade da pregação é instruir os fiéis,
conduzi-los e prepará-los para menos imperfeitamente
adorarem ao Senhor; o ministro convenientemente pa­
ramentado, para significar a sublimidade de suas fun­
çõesões; o crucifixo sôbre o altar recordando o misté­
rio central do Cristianismo, - a Encarnação e a Re­
denção; os quadros representativos da Virgem Santls­
sima, ou dos santos apóstolos, levando o pensamento
dos fiéis para as páginas da Escri tura. I!: um ambiente
de recolhimPnto e de oração, que de lato ajuda a de­
voção.
Pouco antes do Inicio do culto, tocam os sinos, -
o que é mais um traço material de ligação com a igre­
já histórica.
Entram os fiéis e esperam, em silêncio, rezando ou
lendo algum salmo, a hora do culto. Em surdina, toca
o órgão um prelúdio sacro, de preparação espiritual.
Paramentado, às vêzes precedido pelo cõro, entra
processionalmente o pastor. Todos se põem de pé em

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honra de Nosso Senhor represcntado pelo seu Ministro,
que, Jogo a seguir, cantando, saúda o povo: "O Senhor
•eia convoaco!'', ao que todos, cantando também, respon­
dem: "E com o voaso espirita." E prossegue a litur­
gia, que ê, pràlicamente, a da Missa católica em ver­
náculo, sempre cantada, porém, e por t6da a assembléia.
Já ficou dilo que a doutrina luterana do batismo é
absolutamente a mesma da Igreja Católica: o batismo
não ê, como querem os reformados, um simples rilo
de ingresso na Igreja; o batismo, aplicando à alma os
méritos do Sangue de Cristo, realmente a purifica da
mancha do pecado original, produz a fé e integra o ba­
tizado no Corpo Mlstico de Crislo. Por is9o procuram
os luteranos batizar o mais cêdo passivei os recém-nas­
cidos. E a oferta que dão ao pastor, nesse dia, em ação
de graças a Deus, é geralmente bem maior do que as
espórtulas usuais que os católicos dão por ocasião do
batismo de seus afilhados. E, como os calólicos, lêm
êles o costume de apresentar também os padrinhos, que,
no caso de falta ou negligência dos pais, passam a ser
os responSllveis, perante a comunidade, pela educação
cristã do afilhado.
Essa educação se processa no lar e na escola. E,
como fazem os católicos do• Eslados Unidos, da Ale­
manha e doutros paiscs cm que conserva e Igreja, com
mais rigor, os seus velhos costumes, têm sempre as
congregações luteranas a sua escola paroquial. A se­
gunda pessoa duma paróquia é o Professor, que ainda
há poucos anos era uma espécie de mestre-escola, o
que, evidentemente, só seria passivei quando pequenas
as comunidades. Crescendo o número de alunos, pas­
sa o mestre a ser o orientador geral e professor de re­
ligião de iadas as classes. Em vez de uma "escola do­
minical", como a que foi institulda nas igrejas reforma.
das, preferiram os luteranos o ensino diário da religião

266
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nas suas escolas paroquiais, que mantêm sob rigorw..1
fiscalização do pastar.
Para a juventude duma par6quia luterana n f..,;ta
má><ima é a da Confinnação, para a qual se faz uma
longa e rigoroslssima preparação. O exame de doulri·
na é feito publicamente, perante a comunidade, deven­
do cada um dos candidatos responder de cor às 375 per­
guntas da Catecismo Menor de Lutero, dizendo ainda
nlguns dos verslculos da Blblia em que se baseia cada
uma dessas respostas. E não é simples trabalho de
memorização: pode o examinador, como qualquer um
dos presentes, perguntar o que quiser para se certifi­
car de que o candidato está deveras preparado. Se
fôr aprovado, e senda boa.• as referências sôbre sua
conduta cristã, é, então, admitido à Confirmação, e,
conseqüentemenle, à Comunhão Eucarística. Do con ­
trária, deverá esperar a Páscoa do ano seguinte!
Por falar em Páscoa, registre-se ainda que os lu­
teranos observam o ano litúrgico tal como instituldo
pela Igreja Católica. A divisão da Dec!logo é também
a mesma divisão tradicional adotada pela Igreja Ca­
tólica. Conservam igualmente, os luteranos, em suas
Blblias, os chamados livros deuterocanônicos, que os
refonnados eliminaram ."'> E têm um profundo respei-

( l i ) Sixlo de Siena (Blbllotheca Sancta, Veneza, 1.586, lib. 1,


secl. ]) íoi quem primeiro usou as expressões protocanún.ira.s r
deuteroranóni(U para disti.naulr duu classes de livros da F.scri­
tura Sagrada, a primeira, a respeiLo de que nWlca houve dúvida
ou di..!Cussão na Igreja Católica, � íonnada pelos chamados pro­
tocanônicos; a segunda consl!1te nos livros outrora desl.gnados
como "ttlnlásUCO!I" e agora chamados deuterocan&nlcos: Tobias,
Judite, Sabedoria, Eclesiástico, Baruc, 1.0 e 2.0 Macabeus, bem
como os sete últimos capftulOI de F.st.er • trfs paaagens Je
Daniel (3:24-90; 13;14). A diotlnçio entre prolo e deuteroeanani­
COI, que lembra certu cantrov'rsias ou dúvidas su.scltada c.>m

•�mpos Idos quanto à canonicidade de alguns livros, io le-g{Uma

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to por Maria Santlssima, que é, para j!les, MÃZ DE DEUS
e sempre Virgem. E, como recomenda o Catecismo Me­
llOr de Lutero, fazem também o sinal da cruz "de ma­
nhã, ao se levantarem, à noite, antes de se deitarem,
antes e depois das refeições, nas tentações e nos pe­
rigos".
Tão diferentes dos demais evangélicos, consideram­
"" êles os legltimos protestantes, os herdeiros de Lute­
ro, que foi, no seu entender, o grande Profeta, o ver­
dadeiro Reformador da Igreja Cristã. Para os lutera­
nos, Calvino, Zwinglio e outros "reformadores.. do sé­
culo XVI foram simplesmente uns "apóstatas", defor­
madores da Verdade. Não fazem, por conseguinte, ne­
nhuma liga com as aeit411, como classificam, com des­
dém, as demais igrejas evangélicas. Por isso é que tive
de me submeter a rigoroslssimo curso de revisão teo­
lógica, para me 11desintoxicar" da 61heresia calvinisla"...
Não participam dos movimentos ou lestas de confrater­
nização, cada vez mais comuns entre as outras con!is­
sões protestantes, e não recebem na sua mesa euca1·ís­
tica senão os luteranos em pleno gôzo de seus privilé­
gios e de cuja ortodoria não tenham dúvida.
Nenhuma condescendência, igualmente, em relação
à Igreja Católica. Apesar de tão próximos da Igreja
em tantas doutrinas, tradições e costumes, na liturgia
e na disciplina eclesiéstica,1 1 !> nutrem, entretanto, os

do ponto de vlsla hllt6rJco; não se podr concluir. po� que não


tmham m dtrult-J'OC'an6nlcm o mesmo valor nonnativo ou quo
sejam, pelo eontrUdo, lnlrrlorftl ao11 protocan6nlcos.
Os prolm..ntft calvlnilll.u, que os denominam ap6crl/ot, não
os considerara impindm ou can6nh:os.
(12) O Slnodo Evanplico Lulerano do Bruil, bem como o
do Mlaourl, Ohio e ouln>s Eot.adol oio lalnWm lntnnsilenle­
menle contrúlOI l rnlrlção artificial da natalidade; conside­
ram, outroulm, lncompallveis o criltlanlano e • maçonarla.

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m iuou.riano.s, lamentàvelmente, um ódio profundo no
c11tolicismo em geral e ao Papa em particular.
Se houve uma salutar evolução entre os prol<'slun·
le.s alemães em sua atitude para com a Igreja Católico,
nenhuma alteração se verüica até agora na mentalidade
dos n1isaouria71os, aos quais é de se reconhecer o dlrei..
to de reivindicarem com exclusividade o titulo de "lu­
teranos", de que tanto se ufanam, por serem os que
de fato se mantêm mais fiéis à doutrina e ao espírito
de Lutero. Deu-se, todavia, um fenómeno de inconse­
qüente cristalização. Aceitando, como dizem, os cre­
dos apostólico, niceno e atanasiano, admitindo, portan­
to, um progresso dogmático, fazem-no parar artibrà­
riamente, petrificando-se no mais rígido imobilismo .<"•
Nenhum progresso teológico teria feito mais a Igreja
Cristã desde o Filioque . . . nenhuma heresia nova re­
clamaria da Igreja novas definições, que, como salien­
tava o meu saudoso professor Alfredo Teixeira, nada
mais eram do que meras explicitações de verdades im­
pllcitas. E se, prussianamente, fizeram alto no ponto
em que estavam no momento em que o seu general
tombou, tão pouco progrediram no modo de apreciar
os valôres sustentados por outros ramos do próprio
evanseli.smo, nem se abrandou a cólera que lhes trans­
mitiu Lutero ao gritar aos seus discípulos: "Deus vos
encha de ódio ao Papa!"
Não rebatizam, em absoluto, um cat61ico que se
torne luterano, reconhecendo como válido o batismo
da Igreja "do Anil-Cristo", - ao contrário do que fa­
zem as outras 11denominações" protestantes, exceto a
Igreja Anglicana, que, aliás, não se considera mais pro­
testante. No entanto, isolada dos outros protestantes,

113) Mows. Pl>rmo - O Canlffl N.,.,,,..n - F.d. Vozes,


pg. 88.

269
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com os quais, ao menos por certas afinidades, por pa­
rentesco espiritual, por identidade de sentimentos, de­
veria confraternizar; e investindo violentamente coatra
a Igreja Católica, com a qual tanto tem doutrinária e
liturgicamente em comum, - pretende ser a Igreja
Evangélica Luterana 110 resto fiel", "A VERDADEIRA JCRE­
JA VISÍVEL DE CRISTO NO MUMDO! "ll 4)
Esta afirmação feita, certa vez, do púlpito, pelo
Pastor Hasse, despertou-me da espécie de sono lelár­
gico em que, insensivehnente, ia começando a cair, tão
"católica" me parecia a Igreja Luterana. Algumas ve­
leidades que tivera, de promover um encontro entre
teólogos luteranos e católicos, que, a meu ver, bem po­
deriam 11acertar os relógios", numa comunicação reci­
proca de experiências religiosas e numa revisão hisl6rica
e doutrinária em que se desfizessem preconceitos e
malentendidos, se dissiparam como nuvem que o ven­
to leva.
Insatisfeito com a escassa literatura lulerana exis­
tente em vernáculo, geralmente muito árida e replela
de chavões; verificando que o escrupuloso receio de
ucair em heresia" levava os pregadores a se limitarem
a repetir os sermões de Walter e doutros reólogos se­
guro.o, a ponto de nos poucos se ter criado um DIALETO
ESPECIAL para os pregadores, e com um "vocabulário
básico" reduzldlssimo, procurei arejar-me um pouco
em matéria de foitura.

(14) Para os luteranos é Lutero o ..anjo" a que se refere


5. João no Apocallpoe (1';6-7) : "E vi em seguida oulro anjo
que voava prlo melo do �- Tnaz.l.a um evangelho elMDo. para
anuoc:lj-lo aoa babltanles da tem: a tôdu as nações, tribos.
llnguu e povos. E dlzla com voz possante: "Temei • Deus e
dai-lhe 116rla. pois 6 cbegad.a a hora do seu julzo. Adorai aquêle
que fêz o � e a lura e o mar e as fontes das 'cuas"'.

270
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Muito mais 11católico" do que antes, J!rn�a�1. mui
grado seu, à Igreja Luterana, dispondo de mais tempo
porque dedicado agora tão sõmente ao pastorado, nwr­
gulhei nos livros mais a fundo.
A despeito da minha formação filosófica tomista,
pois fôra Sinibaldi o autor adotado no meu tempo de
estudante no "Seminário Unido", nunca lera o próprio
Santo Tomaz. Andava desejoso de conseguir um
exemplar da "Summa Theol6gica" quando me vem às
mãos exatamente o que queria, e de maneira aparen­
temente casual. Entrando numa loja, à Rua Bueno:;
Aires, nem sei mais porque nem para que, dou com
alguns volumes do Aquinense. Começo a folhear um
dêles, interessado. O dono da loja, João Luiz Anesi, an­
tigo seminarista, piedoso e apostólico, sabendo quem eu
era, pergunta-me se já lêra a Summa Theológica..
- Ainda nio; mas tenho muita vontade de ler.
- Pois leve emprestada essa coleção. Pode ler
com calma. Não tenha pressa em devolver.
O leitor que conhece Santo Tomás pode imaginar
o que aconteceu. Durante dias e dias, de manhã, de
tarde, de noite, à distincia de tantos séculos, através
daquele "tratado elementar" destinado a principiantes,
como considerava a sua obra "o mais santo dos sábios
e o mais sábio dos santos", atuava o Doutor Angélico
no M'ntido de pôr ordem nos meus pensamentos, de con­
•olldar os alicerces íilos6ficos tomistas de minha pri­
meira formação superior, e de joeirar, separando o joio
do trigo, 1111 noções que assimilara de uma teologia meio
inconseqllcnle.
Da doutrina escrita, da teoria exposta com tanta
clattza e lógica pelo Doutor Comum, passei depois a
um gênero de leitura que teve, para mim, muito mais
valor apologético do que todos os livros de apologética,

271
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por isso que me apresentava a doutrina vivida, os prin­
clpios transpostos para a prática de cada dia: a biogra­
fia dos Santos!
Nada foi mais convincente para mim do que o ca­
tolicismo traduzido em atos, do que o heroismo na vir­
tude, do que a impressionante unânimidade na fé, a
unidade na variedade, que sobrexcele na vida dum S.
João da Cruz, duma Santa Teresa, dum S. Francisco
Xavier, para s6 citar três gigantes, tão diferentes e tão
parecidos, e que, como todos os outros, santamente se
ufanaram de pertencer à velha Igreja consolidada pelo
sangue dos mãrtires, de terem como Pastor Supremo e
Pai espiritual o Bispo de Roma, de se acharem sempre
em casa quando, em qualquer latitude, se acolhessem à
sombra do Sacrário!
A vida dos santos, lida com atenção e meditada
<:om seriedade, e os esc:ritos espirituais dos grandes
mlsticos contribuiram mais decisivamente do que qual­
quer outro gênero de leitura para fazer jorrar, em
borbotões, a luz que, aqui e ali, entrevia, intermitente,
<:omo a de um longlnquo farol dentro da noite.
E como, 11ez abuntanria. cordla 01 loquitur"1 trans­
parecia, inevit.àvelmenle, nas palestras e nas minhas
pregações o que me crepitava nalma. Cada vez mais
impossibilitado de afinar com o do diapasão o!icial de
minha igreja o estilo dos meus sermões; não podendo
mais, em consciência, ocupando o púlpito luterano, re­
vestido das vestes talares lutemas, pregar luterana­
mente, - pensei em renunciar ao pastorado, mesmo
porque era cada vez mais forte e irresistlvel a atração
que sentia pela Igreja Católica!
Com os meus antecedentes, porém; prêso por la­
.c;os de amizade a tanta gente que não poderia compre­
·ender as razões de minha atitude; benquisto e tratado

272
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com a mAx.ima consideração pelos pastôres e membros
da Igreja Luterana, - resolvi, então, agir por partes,
pedindo licença, por tempo indeterminado, das minhas
funções, para depois então me denútir definitivamente.
Inconformados os meus amigos luteranos, procura­
ram-me, em comissão, receosos de me haverem magoa­
do involuntàriamente. Fiz-lhes ver que que nenhu­
ma queixa tinha contra ninguém; sempre foram todos
para conúgo duma gentileza deveras eativante. Eram
tão sõmente de ordem doutrinária, motivos de consci­
i!ncia os que me levavam a me afastar do pastorado.
Escreveu-me também o Presidente do Sínodo, Rev.
Pastor Augusto Heine, desejoso de remover qualquer
dificuldade que porventura houvesse e reiterando a
expressão do seu apriço e confiança.

Era irrevog6vel, porém, a minha decisão. Mas ha­


via ainda uma distAncia considerável entre tal atitude
e a aceitação completa da doutrina cat6liea! Quem
não estivesse acostumado ao trato das questões teológi­
cas e não pressentisse as conseqüências lógicas do meu
ingresso na Igreja Cat6liea, e bem assim a profunda
repercussão que teria em todo o meu ser a ruptura
sentimental que daquele passo decorreria, talvez tives­
se por mais razoi\vel um ato de fé impllcita em tudo o
que ensinasse a Igreja; tanto mais que não me restava
dúvida quanto à autoridade magisterial e ao poder de
jurisdição do PontUice Romano.
Não havia chegado, porém, o momento da graça;
não estava ainda maduro para a opção definitiva. Tal­
vez ainda influísse um pouco, naquela encruzilhada da
vida, alguma herança psicológica dos meus antepagsa­
dos matemos, geralmente mol'OS09 em tomar uma de­
cisão; mas também, depois de tomada, estava tomada.

273
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Também era mister, quiçil, ampliar ainda o meu
patrimônio doutrinário com aquisições outras que de­
veriam fazer-se não sõmente no silêncio de uma biblio­
teca mas no contato pessoal com alguns católicos qu>
vivessem intensa e coerentemente a sua F�.
E foi o que se deu quando da excUJ"5áo que fiz a
Pernambuco em julho daquele ano de 1935.

274
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CAEM AS ÚLTIMAS MURALHAS

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AQUELA �A perigavam seriamente as
in.•tlluições democráticas, e a própria exis­
tência do Brasil como nação independente
e soberana. De tal modo se infiltrara o co-
munL�mo, e tão incapacitado se mostrava o regime
l ibrral para evitar o golpe de estado já articulado pelos
IKikhevlstas, que a maioria absoluta dos jovens patrio­
ha da minha idade se alistara no movimento que, era,
na realidade, apesar de certas falhas e contradições, o
mau poderoso dique que at� então se erguera contra a
onda vermelha: a Ação Integralista.

Omitir-me naquelas circunstincias afigurava-se­


me autêntica deserção em pleno campo de batalha.
Tanto mais que aquêle movimento não surgira como
um partido igual aos outros, mas também, e principal­
mente, como ação cultural e de inspiração cristã, pre­
Knndo, acima de tudo, a "revolução interior", sem a
<1 ual sc tomaria inócua t&la mudança de quadros. O
ulD.!ltramento do comunismo era mesmo a conseqüência
do falta de uma filosofia de vida espitualista e cristã,
do desconhecimento da doutrina social católica, do pre-
1lomfnio do liberalismo agnóstico e laicista, que tivera
''"ª' ralzes filosóficas na Revolução Francesa, a qual foi
1·on,cqU�ncia da Revolução Religiosa do skulo XVI.

277
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A conslalação dêsses fatos me aproximou ainda mais
da Igreja."'
A tribuna polllica, na qual continuava, na verdade,
a pregar os meus sermões de sempre, foi para mim,
como que um sucedAneo do púlpito. Ali6s o tema cons­
tante dos meus discursos era "a revolução interior",
convencido que eslava de que sem a cristianização do
povo, e conseqüentemente dos pollticos, nada de eficaz
e perdurável se lograria realizar pelo bem do BrasU.

(1) Ao ostudar m11b • lundo • lipçio hialÓrica e filooó­


lica da Revolução Bolebevislll do ..,lo XX """' • Revolução
Relillma do 8'c:ulo XVI, comp.-.dl melhor a limpalla de
cerlao '"'""" •v..,plicoo paio �olbmo e polos movlmentoo
do esquerdo. Vinte e clDco ....... depois Ji .. patenteava e che­
gava a lol ponlo • converPncia id<0l6sica de repreieatmtes du
du111 Revoluções que o uConselho lnlemacional das lareiu
Cristãs'", reunido em Peripolia, em 1958, protestou solene e
enê:rsJcamente "contra a atitude desorientada e confusa do Con­
selho MundW de lgttjao (qua repreoento 149 '"donornlnaçãeo"
evangélicas) . • qual se recuu a tomar uma posição decidida
CO.Dlr• o Comunismo...
Neae mcmno C.onpaao mundial de PelrôpolU. revelou o
pulor J. B. Mathews, para e1pnnto c!e muitos ouvlnt.es, que nm
Estadoe Unklm "cêrca de 30. 000 membros do clero protest.an�.
diretores intelectuall e esplrUuais de &eis milhões e meio de
almu, se recuaram a afirmar a completa incompaUbUidade
entre Cristianismo e Comunismo.'"
Aueverou alnd.a o Rev. Mathews que ..cêrca de 7. 000 pu­
tôreo de dlve,.... "denominações" eatio lnscriloo no Parüdo
Comuni.ta". 'Todos os movlmentoo paoõ/lalu dirigidos pelol
eomunlstu têm à sua !rente -lôreo evang�licos."
!'àgar Hoover, grande autoridade em matéria de comunis­
mo, baseado nu conclusões da Comlssio ii Parlamentar de lnqué­
rilo do Conareao norte-americano a&bre atlvldade1 subvant ...
vu, no lellemunho dos lldora comunistas d09 Eotadoo Unldos
e do Diretor do Bureau Federal de Inveatipçõel, escreve iia
revista ..lunnican Men:ury.. que ''o malar grupo de classe que

278
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O progresso do integralismo levou, talvez, os co­
muni�ta!I a ativar os preparativos para o seu golpe, que
Í<Ji marcado para julho de 1935. Rebentaria o movi­
mento cm Recife e Natal; convergindo para o nordes­
te as fôrças do govêrno, estouraria noutros pontos e se
11lastreria a Revolução.
Convidado e ir, com mais quatro companheiros,
para o Recife, onde, mesmo com risco de vide, deveria
tudo fazer pera evitar ou, pelo menos, adiar a irnap­
c;ão do movimento subversivo, parti no mesmo dia e
pelo primeiro navio.
O que foi aquele memorável campanha de três
meses, em que, debaixo de balas e alvejados por bom­
bas, realizámos intensa propaganda anti-comunista, tan­
to nos bairros operários e nas fábricas minadas pelos
bolchevistas, como nas praças, nos cinemas e pelo rá-

hoje defende • pro_...ia comunista noo E.lados Unidos é


composto de clhtam prot..tantes".
"O. dnm qltado,... comunl&laa maia inll uent.eo hoje noo
Eeladoo Unldoo oio todoo clértpo proteatantea", diz o Putor
J, B. Mathews, que nio avança um. afirmação 1e1n a respectiva
prova, e que relaciona naminalmente OI seus colegas que exer­
cem m mala altoo cargoo edeslúUcoo (21 oio blspoe proteotan-
1 ..J o, concomltantemonte, postes do comando ao movimento
comunilta no aeu pala. (Po. A.ILanlo VmaA, op. dL pp. 12, 13,
14 • 59 • 74).
Em 1934 já canclula eu que no repúdio ao Comunlmno só
S<rla lnt.elnurumte coerente aas nletru do Catolldomo, que era,
como f, d• fato, o únLca tarça capoz de mfre:ntar e deter ••

hoot.eo do and-Crt9to mmcovllL


Ainda bom que OI nooam · irmãos oeporados náo chepm
.empro à úlümall -iifndu lóglcao do lodoo ao pr!ncipioo
que defendem; dai o -i.don decluaçio do Comelho lnt.er­
naeional du Igreja Cristão (evanaélJaa) contra • aUtwlo pu>i­
linlme e de venladelra cumpllcl.dado do Conselho Mundial de
Igrejas (também ev....llcao)
. com a lntemaeional Comunlala.

279
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dio. - em Recife, na zona agreste e no sertão, - da­
ria para um volume dos mais inleressantes; ou pelo
menos para um capitulo que o leitor haveria, certa­
mente, de apreciar. Fugiria, porém, à finalidade dêstc
trabalho, que jã se vai alongando bastante. Basta di­
zer que a Revolução comunista marcada para julho só
estourou em novembro, tendo havido tempo, pois, para
se preparar a resistência e abafar o golpe.
O que, porém, importa focalizar de modo parti­
cular, é a experiência que viria completar e acelerar
o meu progresso evolutivo no rumo da Igreja Católica.
Tive oportunidade de conhecer pessoalmente, na
minha viagem a Pernambuco, numerosos sacerdotes
pernambucanos fonnados no histórico Seminário de
Olinda, que tantos apóstolos preparou para a Seara do
Mestre. Fêz-me um grande bem a convivência com
aquêle clero admirável.
Na cidade de Caruaru, em cuja feira semanal as que
mais negócio faziam eram as barracas de livros, conhe­
ci Bellsio Córdula, chefe integralista e católico piedo­
so, que me fêz presente de um livro chamado "Jornal
e Penaamenlos de cada dia". Nunca pensou aquela
grande cristã, que foi Elizabeth Leseur, que um dia
aquêle seu diário espiritual seria publicado em portu­
guês e lido no interior do nordeste brasileiro por um
antigo pastor luterano, sedento de luz e de uma vida es­
piritual mais elevada, e que constituiria para êle uma
verdadeira Revelação!
E foi, para mim, com efeito, uma novidade a dou­
trina da sobrenaturalização da dor, do aproveitamento
e da transformação do sofrimento e do trabalho sobre­
naturalizado em oração. Porque se os protestantes mais
piedosos sofrem muitas vêzes edificantemente, com pa­
ciência, com verdadeira resignação cristã, não conhe­
cem, entretanto, o segrêdo, que eu ali descobriria, a di-

280
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vina alquimia que levava S. Paulo a di<.,r: ""Cum ln­
/innor, tunc potens'', - ''quando en/énno, f"nl do 10 1 1
forte, poderoao."
Identificando freqüentemente o sucesso temporal
com a bênção divina'" não entendem os nossos imtios
separados o que o Apóstolo quis dizer quando asseve­
rou: "Completo na minha come o que falta d paizão
de Cristo pelo "'" Corpo, IJU" é a Igreja."
Se é completo, se é de valor infinito o sacrillcio de
Cristo no Gólgota, como São Paulo diz que contemplavn
na sua carne o que FALTAVA à paixão de Nosso Senhor?
Uma meditação mais cuidadosa da doutrina do
Corpo Mistico nos leva, naturalmente, à sua conse­
qüência: a reversibilidade dos méritos. O Cristo com­
pleto não é só Jesus de Nazaré. :Ele é o Cabeça dêsse
Corpo Mlstico de que todos fazemos parte. O Cristo
total, o "Christw plenariua", - no dizer de S. Agos­
tinho, - é !le e nós. Se estivermos em estado de gra­
ça, poderemos dizer: "niio aou eu que oioo; é Cristo
oive em mim.." E os nossos atos, palavras, e sofrimen­
tos serão d'!le; em nós !le agirá, falará e sofrer'- Nos­
sos atos serão d'!le em nós; portanto meritórios. Somos
ramos dwna árvore cujo tronco é Cristo; por todos nós

(2) li: de oainalar-R, • prop6oilo, que geralmente ldenll­


llcmn os prvlestanteo o favor divino com o hlto mat.erlal. llemi­
nidDclu da mentalidade Judaica: vida longa, saúde, riquezas
materiais, - sio bençioa de Dewo e prvva de P"dlleção dlvlnL
Ad�e ltamm foi aceção no meio ..angélico. onde, aliás, ..,
!oi noitada • ma piedade, !oi lmplqNlda • eua "teologia".
Não c:ompremdem e não viverô os evangBlcoa, em sua maior
parte, o doutrina da oruz, da cnu: de cada dl•. Dol ter estado
tanto lempo em vop. entre �1.._ Emllio de Lavelloy, que pre­
tendeu provar a superioridade do prvlfttantlsmo pelo progreao
molerial d09 povos prvlestanlel. . . tele hoje relutada polca pró­
prias fatos e tolalmenlA> supondo.

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circula a seiva divina. Não é possível imaginar-se mnis
Intima união, mais perfeita unidade.
Pertencendo a uma só Família, a um só Corpo, à
Comunhão dos Santos, não vivemos em compartimen­
tos estanques: somos vasos comunicantes. Por isso é
que Elizabeth Leseur dizia que "a alm11 que ae eleua,
elfta o mundo." Todos lucramos com os méritos de
cada um; todos perdemos com os deméritos de al­
guém . <•>
Qualquer trabalho, pois, ou sofrimento, moral ou
físico, pode ser unido aos de Jesus em Nazaré, aos de
Jeous crucificado, aos méritos da Virgem Santíssima e
de todos os Santos; todos oomos unun1 Corpu.o in
Claristo, como dW& o lema do meu velho "Seminário
Unido". Nada haverá, pois, de prosaico, de banal em
n0998 vida; tudo foi valorizado, sobrenaturalizado, di­
vinizado por Jesus Crioto! Os menores oofrimentos,
°" trabalhos monólonos de todo dia, as cruzes, enfim,
de cada instante poderemos unir à de Jesus Cristo; tudo
podemos oferecer, "com :2le, por :tle e n�e", nesta ou
naquela intenção. !!: como poderemoo ser também co­
redentores de nossos irmãos.
Era agora à luz de doutrina tão consoladora que eu
compreendia porque pode ser chamada co-redentora a
Virgem Santlsslma, que, em Belém, e na fuga para o
Egito, em tantas circunstlnclas dramáticas de sua vida,
e, principalmente, no momento cruciante do Sacriflcio
de Seu Divino Filho, repetia o seu Fiat, unindo mlsU-

(3) Pn!i!GDdo o prlmelró retini eoplritual coleUvo realiza­


do no monte Tabor, e por um llJ'Upo de brullelroo (de 2 a 5 de
Junho do JJl60), deu o R. Pe. Orlando Mochado belboima expll­
c:açio do moUvo por que, no conf-.6ria, d6 o ...,.o1e .,i dlUU
absolvições: porque o penltenle pecou contra Deus e contra o
Corpo lllotlco.

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camente o seu sofrimento Inimaginável ao. do Cordclrn
de Deus, oferecendo-o em união de intenções com '"
do Coração de Jesus.
E, à sua semelhança, como hóstias pequenina.. cm
redor da Hóstia grande, bem podemos, apesar de nos­
sas fraquezas e misérias, ofertar todo. os contratem­
pos, tôdas as decepções, tôdas as enfermidades em união
com as dares do Crucificado.
Diz D. Colwnba Marnúon, lembrando que Nosso
Senhor, que podia de sua Divindade tirar as fôrças ne­
cessúias para levar a cruz até o Calvário, condescen­
deu em ser ajudado pelo Cireneu. "A parte do Cire­
neu é a nossa. " Temos de levar cada dia a nossa cruz,
como "hwnanidades de acréscimo de Nosso Senhor",
"completando em nossa carne o que {alta à Paixão de
Cristo pelo Seu Corpo, que é a Igreja."
Esta a doutrina que viveu Eliz.abeth Leseur, a da
sobrenaturallzaçio da vida, da transformação do sofri­
mento em oração. Sempre sorridente, sempre pacien­
te, irradiando o Cristo que nela vivia, foi bem uma luz
nas trevas, o fermento de Deus no meio em que atuou.
E, do mesmo modo, todos os santos que fulguram como
estrêlas de primeira grandeza no firmamento da Igreja!
Era, efetivamente, a quinta-essência da delicadeza
moral, o grau mais elevado de identificação com Cristo.
Que abnosfera nessas culmlnlnclas! Que ar puro nes­
se altiplano a que tantas almas chegaram! E chega­
ram como? Tôdas elas pela freqlientação dos Sacra­
mentos; pela penitfncia, pela sobrenaturalização de to­
dos os atos, "pela caridade, que é o vínculo da per­
feiçãoº.
:t odiosa tôda comparação; mas, no intimo, não po­
dia deixar de comparar fsses plncaros a certas planl­
des que eu conhecia . . .

283
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Ficaram-me indelevelmente gravados na memoria
tos nomes que naquele ano de 1935 serviram como que
de setas luminosas na estrada, longa e pedregosa, que
eu estava acabando de percorrer, do Calvinismo, via
Lutero, a Roma! Um d&ses nomes é o do Padre João
Barbalho Uchôa Cavalcanti, eom quem, nesse tempo
fiz uma inesqueclvel viagem de automóvel, na qual o
únieo assunto era precisamente êste: o do oferecimen­
to dos sofrimentos.
Ilustrava, com o seu próximo exemplo, a doutrina
que Elizabeth Leseur me ensinara, e que constituiu,
como disse, uma Revelação para mim.

Passava eu, um dia, em frente a uma igreja católi­


ca, numa cidade do interior de Pemambueo, quando
me chamou a atenção um fato insólito: o c6ro cantava
um hino . . . protestante! Não um dêsses hinos que se
tomaram eomuns a uns e outros, como o "Noite Feliz",
o"Adeate fidele1'', ambos, aliú, de autores católicos;
mas um hino legitimamente protestante, a que estavam
aeostumados os meus ouvidos desde a mais tenra in­
fância: o de n.0 564 do livro "S4lmo1 e Hinos", das igre­
jas calvinistas. '4>

(4) ta.. hinos, aliás, exercem, quase lnlenslvelmmte,


o6bre o c:oo,íunto doa fi&, Inec'vel inDuincla formadora, tra­
duz.indo, em canto ritmado e numa 1inaJua8em acesúvel ao povo,
os verdades da 16, nutrindo dOl)arte a piedade lndlvlchw o con­
oolldando, na wWio du voza e de aenUmentos, a unidade espi­
rit.W da <amunldade. O Hinário, entre ao relonnadoo, 6 COOlO
que um Uvro de Utursia e wn manual de devoção particular. e,
pràUcamenle, o prindpal <amenthio pelo qual a Fa:rll\lra � in­
terpretada e oeu ensino alntetlzado. (BOUYIR, Du Prol. li l'll:gliu,
pp. 25 . 1op.)

284
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A letra dêsses hinos, na maioria traduzidos do in­
glês e pelos primeiros missionários norte-americanos
que vieram para cá, não dá, a quem lhes não conhece
" música, uma idéia do que sio e representam para
n alma de um evangélico. A melodia disfarça o lnfimo
valor llterirlo de muitos dHes. Aliás, analisássemos
também a letra das nossas canções populares. . . ou
mesmo dos hinos religiosos cat6liC09 que o nosso povo
canta . . · ''>
Mas, como dizia, ouvi nitidamente, naquele dia, o
hino de Salomão Ginsburg:

Em Jeaua confiar, Sws Lei obaen>nr!


Oh! que g6zo, que bênção, que paz!
Satt.feito guardar tudo quanto ordenar
Alegria perene noa traz!

A quarta estrofe:

Re1olutoa, Senhor, e com zelo e ardor,


01 teua J1C11108 queremo• seguir;
Teu. precritoa gwsrdar, o Teu Nome honrar,
Tuo Vontade com góato cumprir.

E o estribilho, que sublinha o pensamento principal:

Crer e obae,.,,.r. tudo quanto ordenar!


O fiel obedece ao que Criato mandar!

15) Vem a prop6silo Jm1bcar aqui a riquáaima tradição


clr conlo1 e hinos da Igreja C.IÓllca na Alemanha. Na França
lnmbbn se eslã operando mqnlflco renascimento do hino reli­
�- gnçu ª"" esforços do R. Pe. Joseph Gelln•au, S. J" cujos
t1nlmos são cantados hoje em quase t.ôdu u par6quias e col�­
RIOll do França e da Bélgica.

2115
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São tão católicas certas doutrinas que os nos..os
irmãos separados, em razão dum curioso daltoni!lmo
mental, delendem como suas e em oposição, como erra­
damente pe1198111, ao que ensina a Igreja, que os hinos,
que as expressam e fixam na sua retentiva, podem ser
cantados até mesmo nos templos católicos, e sem a me­
nor alteração, como, por ellemplo, &se 564.
Uma dessas doutrinas, a que se apresenta mesmo
como o divisor das éguas, que estabelece o ANTAGONIS­
MO FUNDAMENTAL entre o protestantismo e a Igreja é
a que se refere à "salvação gratuita, pela fé."
1: incompreensível que se distinga oposição essen­
cial entre o que a tal respeito ensina a Igreja e o que
de fato crêem e praticam os evan1élicos. Seria quase
o mesmo que deixar um individuo a l1Veja Católica
por acreditar na divindade de Jesus! . . .
Quem quiser saber o que foi oficialmente e para
sempre detmido sôbre tal assunto, leia os decretos do
Concilio de Orange, reunido em 529 e confirmados pelo
Papa Bonlf6clo ll em 25 de janeiro de 531. São defi­
nições conciliares, solenes, confirmadas, nos têrmos
mais expressos, pela autoridade papal.
Curioso que as proposições protestantes sôbre êsse
assunto parecem simples transcrições dos canones 3, 5,
6, 7, 13, 18 e 25 daquele Concílio!C6>
Analisando, com sua admirável percuciência, as de­
cisões doutro concllio, o de Trento, reunido mil anos
depois, conclui o Pe. Louis Bouyer que "o católico não
sàmente pode, em nome de sua própria fé, como deve
aderir sem reticência ao sola gratia." E, depois de co­
tejar exaustivamente as af,irmações dum e doutro lado,
pergunta o eminente teólogo: "Que mais falta para pr<>­
var "que o sola gratia, como o entendem ordinàriamea-

(8) L BotlYD - Du prolH14n.tlnne à l'Egll.ae, pg. 53.

286
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h• os protestantes, está perfeltaniente de acôrdo coin a
lradiçõo católica?"
E eletivamente:
Diz o art. 4.0 da Confissão de Fé dos Batistas de
N<•w Hampshire, que sintetiza a crença oficial de tô­
dns us 11denominações" evangélicas "fundamentalistas":
"Cremos que a salvação é concedida GRATOJTA·
MENTE a todos, segundo o Evangelho; que é dever ime­
tliato de todos AClllTÃ-u. por meio de uma fé sincera,
nrdente e OBBDIDITB".
Que é i.• to senão o que sempre ensinou a Igreja
Cntóllca? A fé, que não se manifesta pelas obras, como
di• S. Tiago, é morta, não é a fé salvUica; a que salva
l• a FÉ oamIENTB".
O verdadeiro cristão, como cantam os evangélicos,
('on!ia no Senhor, e observa a Sua Lei, guarda os Seus
preceitos, cumpre com g&to a Sua Vontade:
"Crtt e obsen>ar tudo quanto cmlenar!
O fiel OBEDECE ao que Cristo mandar!"
n; OBEDlSNTE, POIS.

Felizes os que, como aconteceu comigo naquela


monhõ, no interior de Pernambuco, ouvindo o clntico
dum hino protestante numa igreja católica, têm a gra­
�a de perceber que não há motivo para se digladiarem
•Õbre êste e outros pontos em que pensam que discor­
clorn, quando, em essência, estão de pleno acôrdo . (TJ

( 7) QuanLas vizcs, HCreve o emi.nenle Pe. George1 Ta­


\•onl, os teól- da Relonna "rejelt.onm uma posição que,
l'rntdammle, acttdit.av1m cat.Ollet. elabonndo, contn ela, em
ti-muas novos, wna doutrina esaencialmenle católlca!"
Se deveras queremos contribuir para tornar � pontos
d• "'•la mluammt.e translúcJdoa. Ul'le uma revlaio conjunta do
•mlldo que uns e outros damos a wnu tamt.u .expressões.. Ea­
trh:lr, por cxrmplo, o ralóllco Por "llvre-H:ame" a anarqW.

281
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Já que me referi a vanas pessoas que, naquele
ano decisivo de 1935, cooperaram, como instrumentos
de Deus, no acabamento da obra encetada tantos anos
antes, devo registrar também o nome do Revmo. Cône­
go Manoel Marques, que conheci como cura da Cate­
dral de Pesqueira.
Disseram-lhe que eu era paslor luterano. E.<tava
licenciado do pastorado, mas, afinal, não anunciara o
meu afastamenlo da Igreja Luterana, que não se con­
sumara mesmo oficialmente ainda. Ignorava êle a
ação da graça na minha alma, e quão perto estava o dia
da minha completa integração na Igreja. Apesar dis­
so, e por isso mesmo, recebeu-me com tal carinho, com
tanto amor cristão, que desde aquêle dia nos tomámos
amigos para sempre.
Mostzou-me a sua catedral, falou-me como a um
colega, visitámos juntos a capela do Santlssimo, onde
nos ajoelhámos, rezando êle por mim (como mais lar-

doutrinária raullante da lnterprelaçio da Blblla que cada um


pode tn.r a oeu bel prazer, Rm que tenha qualquer autoridade
o dlrelto de o ftscal.izar ou de contrariar a sua exegese. Para o
protestante, poRln, a mama expnmio augere a reoponS8bili­
dade de cada homem que, lendo a Bíblia, prvcura ser d6cll ao
teotemunho inlerior do �lrllo Santo, leotemunho que é para o
católico a "luz da ff.., a "luz interior", fruto natural da a:ab·
têncla que Deuo cü a lodo cristão que I• com fé a SatJnda
F.ocrltura . . .
All.ú, já ficou patenle aqui nio acellarem no práUca o
�'livre-n:ame", tal como m católicos o entendem, nem OI lute­
ranos, que t.f.m a sua Conllaio de Aupburg, OI sew Artips

do Smalcald, a Fórmula Concordlae, nem os anglicanos, que têm


-os MUI ArtilOI de F�. nll!m ÔS presbHerianos, que adotaram os
Súnbolos de Wmtmlnsler, nem oulra "denominação" qualquer.
que t8du de certo modo se "catolicizaram" ao consubstanciarem
em f6rmu1u u doulrlruu que aceitam. O que 6 mlstH é eu­
minar a eipostolicldade de l&ll doulrlnas.

288
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de me disse) e eu por êle. . . Sei que celebrou várias
\'êzes a Santa Missa pedindo a Deus que me Uurninasse,
que pediu orações em meu favor a umas religiosas, cujo
colégio visitámos juntos, as quais se admiraram de que
oquêle moço que genuflectia ao passar diante do San­
ti"-•imo fôsse . . . pastor protestante!
Sabia o Cônego Manoel Marques que, como digo
sempre, muitas vêzes é melhor falar com Deus a res­
peito de certas pessoas do que com cel'W pessoas a
respeito de Deus; que a melhor apologética é a do exem­
plo duma vida coerente, a da caridade, a da paciência,
da mansidão. Lera, certamente, a biografia de São
Fruncisco de Sales, que os meus leitores conhecerão
lnmbém, mas de que vem a propósito recordar um epi­
Mldio cm que deveriam refletir todos os que se interes­
''""' pelo retômo dos nossos irmãos-separados. O pa­
•I rr Francisco de Sales, enviado para a região do Cha­
Mnis, onde havia 15 católicos e 70.000 protes!antes, pôs­
••' u pregar com aquela doçura que lhe era tão carac­

lo·rl•llro, o ponto dalguns católicos pouco pacfficos es­


t runharem e se queixarem ao Bispo de que o padre
l''1·uncl•co mais parecia um ministro calvinis!a do que
11111 OllCC"rdote católico! Onde j6 se vira um padre cha-
11101· 110,. protestantes de ºmeus irm.ios"?! O Bispo,
purl·m, sabia bem quem era o padre Francisco; e não
ol•·u ouvidos às queixas. Dois anos apenas eram de­
l'flrrido• " no Chablais restavam sõmente 15 prolestan­
h••! &•tcnlu mil almas retomaram à Casa paterna
Mrnçn• 11 doçura, à caridade di! S. Francisco de Sales,
11111• ll11•J1 r�, ver n sem razão de se manterem afasta­
""' d11 lKreju e lhes soube mostrar a superexcelência
1 lo l't1lulich11no, não tanlo por argumentos lógicos e teo­
l611icus, 11111• p<'lo mnls persuasivo de todos os argwoen­
'"" •W• rclulgt•ntc santidade e inexgot6vel caridade!

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O Cônego Manoel Marques assimilara a lição de S.
Francisco de Sales.

Durante lodo o lempo que durou minha peregrina­


ção pelo interior de Pernambuco ia lendo Elizabeth Le­
seur e um outro livro traduzido do francês com um tí­
tulo muito pitoresco: "O Homem como de11ia sê-lo" .
Comprara também um Missal Quolidiano, que deveria
ter sido um dos primeiros e foi, talvez, o úllimo livro
católico que me veio às mãos naquela fase de transição
do protestantismo à Igreja.
Que revelação a liturgia! o culto católico! a sanla
Missa!
Era um mundo novo que se abria diante dos olhos
maravilhados de minha alma.
Tivesi;e recebido uma iniciação litúrgica logo ao
primeiro contato com o catolicismo, teria sido, de cer­
to, menos longo o caminho que percorri até a minha
integração na Igreja.
Foi, pois, imensa a minha alegria ao descobrir como
é que a Igreja quer que se realize o culto; que o modo
por que tantos o faziam não correspondia, em absoluto,
aos seus desejos e nem mesmo às suas prescrições ofi­
ciais.
Acostumado com a ordem da ºmissa" luterana, que
é sempre cantada, e em que tôda a comunidade toma
parte ativa; habituado a centralizar tudo no altar e na
pessoa de Jesus, Sacerdote e Vitima, - não me pode­
ria sentir inteiramente à vontade na maioria das igre­
jas católicas em que várias vêzes procurara assistir à
Santa Missa. Nalgumas o relaxamento em matéria de
liturgia era por demais chocante: aqui, a recitação, em
voz alta, de orações estranhas à liturgia e no mesmo
momento em que o sacerdote lia a epistola ou o evan-

290
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M••ll1u para inatruçcio do povo; acolá, os assi•1enles in­
h•lramentc alheios ao que se passava no altar, a ler,
"''" ... us devocionários, fórmulas de atos de piedade
l u lvr.• bem escritas até, mas na realidade sem nenhuma
n•luçilo com as que fazia o celebrante e a que todos os
litlU. "" deveriam unir. Era o Individualismo religioso,
1111•• 111nlo condenam os católicos no protestantismo, in­
vadindo o culto católico da maneira mais completa!
l':m1uanto isso, timbravam os paslôres luteranos, e mes­
mo º·"' anglicanos, em fai.er com que todos os seus fiéis
tmnA!'sem parte, ativa e conscientemente, no culto pú­
blico . . .
'l'ive, felizmente, a oportunidade de descobrir o
'" lc•souro escondido", que f6ra, até então, para mim. a
l o l urgia católica; de penetrar um pouco no significado
1iro!undo da Santa Missa !llJ
Graças a Deus, a restauração litúrgica, que é, de
IMlo, o grande Reforma religiosa do século XX, Já se
vol !azendo sentir atualmente em quase t&las as nos­
""' dioceses; e com os maia auspiciosos resultados, tan­
to no afervoramento dos católicos como na sua imuni-
1.oção contra a heterodoxia. Nada, alJAs, impressiona-

(8) Sio palavras toluaio do iirand• Papa S. Pio X em


'"' Molo proprio, de 22 ele novembro de 1903, s6b� a mú.9ica
__..,
"Sondo de lato do nosso vlvlaimo dosejo que o nplrito
<"rlllL&o reofloreaça mi tudo e 1ir mantenha em todos 08 ft,11, li
nl"t."l"AÚrto prover, antm de mais nada, • santidade e • dianldade
do lcrmplo, onde os fiéls se recolhem preclaamente para haurir
"- nplrlto na sua fonte primeira e indlçendvel, que 1 A
JtGrlh�pa(Go ativa nos maouantol milrério.s • u ora.ç4o p•&u ...
1·n ,. 1olntt da Igreja.."'

Ali"'. diz multo bem o grande renovador da pedagogia


o rllstou no Brasil, Mono. Alvaro N-te: •"Quner apren-
1lrr tl'tJIOllia sem lltu.rai• f querer aprender aeografia wm
fllDJ>D.''

291
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rá mais favoràvelmente os nossos innãos separados do
que a Missa celebrada como o quer a Santa Igreja, com
a participação plena de todos os fiéis. Por isso é que
tão eficazmente tem contribuido o contato com os mon­
ges de S. Bento para que tantos protestantes inteligen­
tes e sinceros venham a conhecer e, em conseqüência,
a abraçar a Fé Católica.

Aquêle ambiente de silêncio e de paz, tão impreg­


nado de espiritualidade, comum a todo mosteiro bene­
ditino, é mesmo dos mais propícios à descoberta da ver­
dadeira face do catolicismo, tão fiel tem sido sempre
a multissecular e benemérita Ordem às mais puras e
antigas tradições cristãs.

Atraia-me cada vez mais o grande lman. E quan­


to mais penetrava eu no catolicismo, e o catolicismo
cm mim, quanto mais e melhor conhecia por dentro a
Igreja, mais unido me sentia espiritualmente a meu pai.
Lamentava que êle não estivesse comigo, para ver tam­
bém o que eu estava vendo, para sentir comigo o que eu
sentia, pois estava certo de que se êle conhecesse o ver­
dadeiro catolicismo, como eu estava conhecendo, se en­
trasse em contato com alguns dkses cathlicos que de
feto encarnam o verdadeiro pensamento da Igreja, -
que, como éle, tão apaixonadamente amam a NOS!IO
Senhor Jesus Cristo, - lhe sucederia o mesmo que a
Newman, a Faber, a Wallace, a Martindale, a Hugb
Benson e a tantos outros pastares piedosos que acaba­
ram se realizando integralmente na Igreja dos Santos.

Newman, que se tomou cathlico aos 45, teria mor­


rido ministro anglicano se morresse, como meu pai. aos
38 anos! Frederick WUllam Faber, que foi pastor 22
anos, também teria morrido como pastor :;e não tives-

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ftl"vivido o tempo necessário para lazer a gra.mh• d r"·
rc111erto.
A medida que caminhava não propriamente "'"
tr�vas para a luz, mas da madrugada para o esplendor
do 110I, de claridade em claridade, maior aprêço e d�­
\'OÇão eu tinha por meu pai, e mais fraterna simpatin
1><•1°" meus irmãos protestantes, que não eompreendc­
rlam o meu afastamento e se eonservavam protestantes
por sêde de . . . catolici111110!">

Sim; protenamea por aêde de caloliciamo. Há


<1uem não eompreenda essa expressão, que, aparente­
mente paradoxal, diz o que deveras se passa eom a
moioria dos católicos que se têm feito protestantes. Não
conheeendo a verdadeira doutrina cat6liea, mas ansio­
"º-' por uma vida cristã mais perfeita , ouvem um dia
os hinos evangélicos, tio melodiosos e atraentes, e a
pregação dum pastor piedoso, que de fato prega, muitas
vêzes, nada mais do que a doutrina católica, que o "ca­
t{ilico" desconhecia . . . E o católieo ignorante do cato­
licismo adere ao catolicismo rotulado de. . . proteston­
ti111110! Toma-se leitor e estudante aplicado do "Livro
dn• livros'', que já existia quinze séculos antes de Lu­
tero, zelosamente conservado e, mesmo antes da des­
coberta da imprensa, traduzido e divulgado pela Igre­
ja Católica!

(9) ''Há wna prova notável deu.a larguna de e1pMto e

cll" coração dos cat6Ucos na frase dU.a sem rodeios ao editor


lut..nno Fred•rico Penha pelo a!lebre Redentoriota Sio Cle­
mmtC! Hofbauer a respeito da or:lgem da Reíonna protastante:
''A lf'paração a.e produziu 'f»"l'Ue• OI afem.ãu sntiam - e 1m­
frm attt.da - ""ttaicla.d. de vida Nliof.om•.
O meomo o Julzo doutro pande unto, S. Pedro Canlaio,
M.bn- 01 protestanta de eeu tempo. (A eaftl.cla do Catolicbmo,
KAIL ADAll, ed. VQ:lel!I, PI- 189).

293
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Todavia, se Deus misericordioso, onisciente e oni­
potente, permitiu os malentendidos que resultaram na
rebelião protestante, que arrebatou à Igreja qwase me­
tade da Europa; se pennitiu também as progressiva.•
sub-divisões, a verdadeira desagregação do movimento
protestante, a pulverização das igrejas oriundas daque­
la Revolução, que, separadas do tronco, vão perdendo,
pouco a pouco, a seiva da vida, - é porque tem, cer·
tamente. algo a ensinar a uns e a oulros.
Por impossjvel mesmo que, humanamente, nos pa­
�a, teremos de rezar para que o Espirita Santo ilu­
mine os responsáveis pelo destino eterno de tantos mi­
lhões de cristãos, que, umo vez, reunidos, fortalecidos
pela permuta de bens espirituais, pela absorção recí­
proca de autênticos valôres, chegarão, enfim, pela uni­
dade da fé, ao pleno desenvolvimento espiritual, "se­
gundo a medida do varão perfeito em Cristo Jesus",
Creio que os antigos lideres evangélicos, integra­
dos agora no catolicismo. com o valiosíssimo conheci­
mento pessoal que têm da alma protestante; espiritual­
mente enriquecidos com a incomparável experi�ncia re­
ligiosa adquirida por longos anos de vida euearlstica
ininterrupta, de consolidação da fé e aperfeiçoamento
de sua vida interior através da oração, de leituras e
retiros; com os horizontes mais dilatados pelo estudo
da História, e pelo trato, dentro da grande Igreja Uni­
versal, com personalidades de tôdas as raças e línguas
e temperamentos, de mentalidades tão diversificadas,
que realizam, respeitadas as suas peculiaridades psico­
lógicas e regionais, e "a santa liberdade dos filhos de
Deus", essa portentosa unidade católiea, - poderão co­
laborar eficientemente, com suas luzes e valiosas su­
gestões, para desfazer equivocas, pàra diminuir malen­
tendidos e pi:econceilos, para destruir, de vez, as pre­
venções e os ressentimentos que ainda separam os que

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l>«•us quer irmanados "num só rebanho e sob um só
J•o�tor".

Recordando, vinte e cinco anos depois, os passos


l111ais do minha dramática peregrinação espiritual no
rumo da Verdade Integral, não o posso fazer sem di­
l(rcssões e comeot!rios à margem de certos fatos, que
ugora, com a perspectiva que a distância me dá, e à
luz da experiência, mais fàcilmente se coordenam e in­
ll'rpretam.
Sobrevoando mentalmente, neste retrospecto cro­
nológico, o território outrora percorrido a pé, através de
t•stradas empedradas, picadas perigosas, pântanos trai­
�<1eiros e preciplcios insuspeitados, - lamento e justi­
lico, vez por outra, perante mim mesmo, alguns atra­
"" resultantes de haver tomado, à falta de um guia in­
teligente, caridoso e experiente, em duas ou três en­
cruz.ilhadas, um trilho divergente pela estrada certa.
Se não me deste, porém, 6 Deus, um ºcicerone" per­
manente, mandaste sempre os Teus arautos, que por
orciem Tua, se postavam, aqui e acolá, nas esquinas,
'"'" caminhos, indicando-me o rumo. Se permitiste que
"-• vhes entrasse em descaminhos, logo me advertias
luzendo-me retomar e retificar a direção.
Um dêsses mensageiros foi aqu�le humilde frade
lronciscano que, numa viagem de carro, de S. Caetano
no Recife, qual Filipe com o tesoureiro de Candace,
ocabou de desenrolar ante meus olhos o divino perga­
minho, diicorrendo sôbre os privilégios que outorgaste
ll<1ucla que desde tôda a eternidade predestinaste para
M·r o principal associada dl!' teu Filho na redenção dos
homens! Como a tantos teólogos e até santos dos tem­
i"" nntigos também acontecera, por isso que imaturos
<•ntão para penetrar a fundo no inefével mistério, fal-

295
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tava-me ainda uma vi.são mais clara do privilégio da
Conceição Imaculada!
Falaste pelos lábios do Teu ministro!
Como ficaria, um minuto que fôsse, sob o poder
do Inimigo, Aquela que deveria ser o tabernáculo vivo
da p�ria Divindade? Se deste a Adão, que sem má­
cula criaste, uma espôsa igualmente imaculada, por que
não imaculada também, e em sentido mais alto e per­
feito, a conceição daquela que seria em breve a Espôsa
virginal do Esplrito Divino?

Por que motivo, purificado desde o ventre mater­


no, receberia maior favor o futuro Profeta e Precursor
do que a que daria de sua própria carne e do seu san­
gue para formar a Carne e o Sangue com que na cruz
nos remirias . .., a Carne Sacratissirna e o Sangue pre­
cioslssimo com que no Sacramento nos iluminas e for­
taleces?

Por que julgar, como sempre julguei, naturallss i­


mo, antecipares, 6 Onipotente, a aplicação dos méritos
do Sangue Divino aos patriarcas e crentes da Antiga
Lei, que destarte se salvaram, - e não ter como ra­
zoabillssirna a aplicação, também antecipada, dos mes­
mos méritos, para preservar da mácula do pecado de
Adão, a nova Eva, que t.ôdas as gerações haveriam de
chamar bem-aventurada e a quem o Teu celeste assis­
tente, por ordem Tua, como que a lhe dar um novo
nome, saudou.1 tão significativamente, como Gratia­
plena? e a quem o Esplrito Santo proclamou, pelos lá­
bios de Isabel, a Mãe de Deus!. . . de Deus e minha
também; de todos n6s! "Filho, e� aí tua Mãe!"

E que co11cepção mais alta do "aola gratia", da

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" uralia 11rali1 dala'', da salvação como dom graluilo de
li""" do que a Imaculada Conceição?"º'
Imaculada, por uma antecipada aplicação dos mé­
rllUll de Cristo, - e de1l4rte 14mbéin 1al11a, por preser-
1•nfão1U l l - teve oulros&m antecipada a assunção com
11110 um dia nos glorificarás a nós. Não é verdade que
11111 copo d'água fresca dado em Teu nome não ficará
""'" recompensa? Como deixarias, pois, de galardoar
Aquela que, por Teu amor, em tamanho mar de dôres
mergulhou?
E por que não? Desde pequenino ouvi dizer que
levaste Enoc e arrebataste Elias, que foram, destarte,
llll!luntos ao céu, segundo crêem os protestantes.
Seriam êles, entretanto, superiores a Ela? E nós,
"" cristãos que estivermos vivos no último dia, não se­
remos, num abriT e fechar d'olhoa, como diz S. Paulo.
arrebacadoa, indo, aem sofrer a corTUpção do lúmulo,
"ao encontro do Senhor, nos area"? Não crêem os
evangélicos na possibilidade da nossa própria assunção?
E se a Tua misericórdia permitiu, para fortaleci­
mento de nossa fé, permanecessem incorruptos os cor­
pos de tantos santos, - e alguns como que vivos, qual
o de Santa Catarina Labouré, - irias consentir, Se-

(10) l!: de notu-•e, a tal respcllo, que c:erlo!I controvenblas


ortodoam, ao contrúio dos protestantes. censuram OI católicos
do admiUr. neue cuo, pan a Virgem, qualquer cousa de an6-
I01Jo ao que OI CALVUfllTAS estrilai ..tmitem para TODOI OI elel­
tOA: um. craça que nos salva ablolutamente sem nós, sem ne­
nhum mlrito prOpria de nossa .-ne e sem nenhuma cooperação
lmaginivel . . . (Bona, op. clL pg. 4!21 ) .
E • que n epm o pecado original, admitindo, polo . a con­
..tpo imoeulada de lodoo nól, nio poderão lmpu11Mr, ilual­
mmte, sem • contradlzeorem, a Coaceiçio lmaculada da Virgem.
( l i ) Primo ttdnnpto, - diz S. Tomú.
'

29'i
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nhor, que apodrecessem e servisse de pasto aos vermes
o corpo sacratlssimo da Rainha dos santos, dos mârti­
l't:'S e dos anjos?
E se nós seremos coroados por Ti na glória, nós
pecadores, tão cheios de misérias e de imperfeições,
tão miseráveis e tão ingratos, por que não Leria antes
de nós tal privilégio a Mãe do Rei Divino?
Tudo isto vi claramente com os olhos de minh'alma
naquela viagem de automóvel que !iz para o Recife em
companhia daquêle humilde religioso, que deveria
mesmo ser o escolhido por Ti para me falar dêsses pri­
vilégios, que sempre proclamaram, mesmo antes de
oficialmente definidos, os disclpulos do Poverello!
E com o último mistério do Sacratlssimo Rosârio
me fizeste chegar ao término dessa minha longa pere­
grinação.
Não me restavam mais dúvidas de ordem doutri­
ni\ria. Só me faltava aquêle toque final da graça, que
algumas outras almas deveriam suplicar�Te, com �uas
orações e sacriflcios.
Por tudo louvado sejas, agora e sempre!

Como era diferente o catolicismo autêntico, o ca­


toliciamo vivido pelos católicos realmente coerentes, do
sincretismo religioso que por muito tempo tomara como
sendo a religião católica!
Nos últimos dias de minha permanência em Per­
nambuco tive oportunidade de conviver com outra alma
de escol, e das que mais contribulram para acelerar a
minha chegada: D. Adalgiza Miranda.
O que Elizabeth Leseur ensinava, eu vi de certo
modo praticado por aquela nobre senhora, que não
perdia oportunidade de oferecer, em união com os do
Crucificado, os seus grandes e contínuos sofrimentos
morais e físic!os.

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E para quem durante muito tempo pensarn que só
os e\'engélicos é que sabiam morrer em paz, e enfren­
tar com espirita cristão a morte de um ente querido,
foi também sumamente edificante o quadro que presen­
ciei quando da morte inesperada do chefe duma nd­
rnirável familia calólica pernambucana, a familia Mou­
'inho. O testemunho que dera de sua fé aquêle ver­
dadeiro cristão, o esplrito sobrenatural que sua espô­
sa, os filhos, parentes e amigos revelaram no doloroso
tran5e, as orações que se faziam pelo descanso eterno
dnquele alma querida, o ambiente de real serenidade.
de lranqilila e filial confiança na misericórdia do Pai
cclcsle, - tudo isto me causou indelével e salutar im­
pressão. Era um catolicismo vivido, que lembrava o
das catacumbas romenas. Nenhwna pregação mais
eloquente do que aquela cena que ainda lenho dinnle
dos olhos.

Volto ao Rio, passando pela Bahia, onde visitei e


famosa igreja de S. Francisco num domingo em que
uma multidão acompanhava, com fé contagiante, e
Santa Missa. Dissipados tantos preconceitos, que até
desnacionalizam e colocam o protestante como que em
choque permanente com a sue nação e a sua raça, de
modo e se considerar mais americano às vêzes do que
brasileiro, eu já me senlia, como nunca att! então, in·
legrado na familia nacional, na comunhão da "Fé Na­
cional", de que lera algures beln apologia da lavra de
Salomão Ferraz.
Não era ainda, evidentemente, a comunhão plena.
aquela que s6 se consuma ría participação da Santlssi­
ma Eucaristia, o Sacramento da Unidade no Amor que
a todos reúne e de todos faz um s6 Corpo,' uma s6 Ahna,
uma coisa só!

299
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Pode-se ler aceito, teoricamente, tôda a doutrina
católica; pode-se estar, como eu estava, no limiar da
Igreja, julgando-me católko mesmo, por pensar que
pensava e sentia catõlicamente. Todavia, enquanto
não passanos n a viver a vida sacramental, algo de e•­
aencial nos faltará, e que s6 experimentalmente se nos
lu\ de revelar naquela "vila abscondi!a t"Um Chrialo in
Deo", na dulclssima e consoladora realidade da Comu­
nhão dos Santos.

Chegando ao Rio, procuro no Colégio Santo lnécio


o Pe. Leonel Franca, a quem da Bahia escrevera dando
conta do que em mim se passava.
- Então, meu caro, que é que agora ainda lhe
falta . . . ?
- Pràticamente nada, Padre Franca. J6 me con­
sidero católico; mas . . .
- Ainda há um "ma.o", não é verdade? Alguma
cousa está faltando, não? Quer que lhe dê um con­
selho?
- Foi o que vim buscar.
- Pois, de vez em quando, entre numa igreja.
Deixe, porém, 16 fora todos os livros. Você já leu
muito; leu tudo o que lhe aconselhei. J6 fêz uma re­
visão completa na teologia, ajustada agora à sua filo­
sofia. Mas . . . Você ainda tem um restinho de protes­
tantismo. . . Tenho a impressão de que deseja enten­
der perfeitamente tudo . . .
Deixe os livros do lado de fora da igreja, como lhe
disse. Ajoelhe-se; peça ao Esplrito Santo que o guie,
que o ilumine.
"
Vou celebrar a Missa nessa intenção.
Não resista, porém, à ação da Graça . . .
Pus em pr6Uca o conselho do grande pescador de
almas. Pedi lirdentemente a Deus que me iluminas-

300
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se de uma vez, disposto que estava a ouvir a Su" Vu1.,
fôssem quais f&s.sem as conseqüências.
Rezei, e deixei-me ficar ali, aos pés do Mestre, ex­
posto aos raios do Sol Divino.
Naquela coite dormi quase católico; quaae, já que
algo me faltava ainda. :tsse algo era o toque final
da Graça, que não depende de nós: e que me veio de
modo singular. Nem percebi o momento em que tal se
deu, pois, ao despertar, eu me sentia envolvido e pe­
netrado por uma luz espiritual que me fazia ver com
muito mais clareza, que me tomava como que trans­
parentes certos pontos doutrinários, que, aceitos embo­
ra implicitamente, não faziam parte, até a véspera, do
patrim6nio das verdades bem assimiladas.
Não havia mais por que retardar então o meu in­
gresso oficial e definitivo na Santa Igreja. Se, à se­
melhança do que sucedeu a Newman, não aniquilei
num minuto as léguas que minha alma deveria ven­
cer desde que, de longe, vislumbrara o campanário,
não hesitei um segundo mais, tão logo se dissiparam as
derradeiras nuvens, refulgindo-me no esplrito, suave
mas tão intensamente, a Luz do céu!
Impedido o Pe. Franca, que adoecera, recebeu-me
na Santa Igreja o saudoso e inolvidável Frei Pedro
Sinzig, O . F. M . , a quem fiz a minha primeira confis­
são, naquele confessionário que fica do lado esquerdo
de quem entra na Igreja do Convento de Santo Antônio,
no Rio de Janeiro .ct2l

(12) Certo dia. convenando com o Padre Franca. "quei­


xri-men dêle. . . a êle mesmo . . .
- Ah! Pad� Franca! Se o sr. me ti.veae d.to, há tempos
JMUndos, um empurrãoúoho . . . de há multo eU J' teria vindo
pun cã . . .
- Sim? Mu . . . não 5C!' deve abrir casulo . . .

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Eram 8 horas da manhã do dia 19 de outubro de
1935, festa de S. Pedro d'Alcintara, quando lambém
subi, espiritualmente, com o celebrante da Santa Missa,
que então se iniciava, os degraus do altar de Deus, do
Deus que encheu e alegrou a minha juventude, que
leve misericórdia de mim e me fêz ancorar, para sem­
pre, no pôrto seguro da Verdade e da Paz!

Começou nesse dia uma nova fase na minha vida.


A medida que o tempo corria e quanto rnais me
aproximava da Sagrada Missa , mais claras, mais con­
catenadas e interdependentes e interpenetradas uinas
nas outras, e umas às outras mais inseparàvelmente li­
gadas me pareciam as Verdades da Fé!
I!; que a Santlssima Eucaristia, além de fortalecer
contra os assaltos do Inimigo, ilumina também; e nos
dá aquêle conhecimento experimental e inefável que
nenhum livro nos pode transmitir.

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DEO GRATIAS !

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• AGORA, SENHOR, prostrado diante de Vós,
venho render-Vos publicamente as minhas
ações de graças!
11Bendize, ó minh'alma, ao Senhor, e não
te esqueças de nenhum dos seus benefícios!"
"Miaericordia.a Domini in aeiemum cantabo" . . .
"quia fecit mihi magna qul potens eel . . . "

Agradeço-Vos a vida de meu pai, que soube ser


o cristão que tão ardentemente desejo ser, e cuja me­
mória sempre constituiu para mim a maior fonte de
inspiração, o mais forte incentivo para perseverar no
11bom combate";

agradeço-Vos a mãe que me destes e que desde


untes do meu nascimento me consagrou ao Vosso
�crviço;

agradeço-Vos haver passado a minha infAncia em


ambiente tão tranqüilo, tão puro, naquele lar feliz, em
•1ue éreis de fato adorado "em espirita e em verdade'',
<"lll que Vosso Nome s6 se pronunciava com suma re­
vr.r.!ncia, e o mais ardente amorj

agradeço-Vos o g&to que me incutistes, desde a


muis tenra infância, pelas coisas santas, pela Vossa Pa­
lovro, e o terdes feito com que me contagiasse aquêle

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amor lotalilário que meu pai Vos devotava e que Ih"
incendiava o coração;
agradeço-Vos os quinze anos de convivência com
aquêle cristão inteiriço, que queria viver, e deveras
vivia, 16 para Vós; que nada quis fazer senão Vos ado­
rar e bendizer e servir; que perlranaic bmefaciendo;
para quem o matrim6nio era, efetivamente, na mais
completa acepção do tfnno, o "magnum sacramentum";
que viveu plenamente, na medida das lu•es recebidas,
aquela ri obedienl.e, que salva e santifica, " que rea­
firmava em altas v.,.es, pouco antes de partir para a
Eternidade: ''Não me digam . . . não me digam que não
tenho Fé!"; que irradiava em tômo de si aquela ESPE­
RANÇA que lhe iluminava o semblante, e lhe permitia
como que antever o céu e antegoú-lo ao di•er que a
Vossos pés queria ouvir a Vossa Santa Lei

"e também erguer um hino


aôbre a• glórias do Porvir";

Esperança que o levava a exclamar, por entre lu­


tas e tristeU1.S:

"Como é bom contar tudo ao Senhor,


E a resposta divina esperar!
Inda mermo chorando de dor,
Nem de leve jamais dutddar!";

e cuja cAJtIDADE, cujo Amor a Vós o levava a preferir.


como a contemplativa de Betânia, estar aos Vossos pés
enquanto os outros dormiam, perdiam tempo, junta­
vam riquezas ou Vos ofendiam; e que no Vosso Cora­
ção, ..re.r ec cerUTUm omnium cordium", liquefazia e
derramava o !;eu, esquecendo-se das horas, que s6 jul­
gava totalmente aproveitada.., à semelhança de S. Do-

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mingos, quando estivesse a {alar de Vós ou convosco;
e qur, amando ao próximo por amor de V6s, se dava
inteiramente, sem reservas, consumindo-se no aposto­
lodo, repetindo a cada instante, por palavras e por atos:

"Recebe a minha oida


Como hóstia em Teu altar!";

agradeço-Vos, Senhor, entre soluços de saudade e


graüclão, que não posso mais conter, o pai admirável,
o amigo insubstitulvel, o mestre de espiritualidade que
me destes, e tão cfdo levastes para Vos ver "face a
loce", no g6zo inefl\vel da bem-aventurança eterna, da
qual lhe destes, antes de sua partida, como que uma
ontevisão maravilhosa;
agradeço-Vos a experiência preciosa adquirida em
contato com os cristãos presbiterianos, anglicanos e lu­
teranos, cujas "riquezas espirituais", cujos "valares au·
tt!nticos" jamais neguei nem renegarei, mesmo porque
foi no meio dfles e com um dêles - o melhor dentre
l'les - que aprendi a Vos amar, e a ler diàriamente,
de joelhos, com os olhos do coração, a Sagrada Blblia,
da qual também se dirá, como que de wna "outra Eu­
caristia", o "omne delectamenutum in se ha.bentem'':
agradeço-Vos as lutas, as incompreensões, os so­
lrimcntos morais, as dificuldades desta ou daquela na­
tureza, lôd.as as cruzes, - que nada mais foram do que
"bênçãos disfarçada•", manifestações posilivas de Vos­
Nu amor infinito;

agradeço-Vos a feliclssirna oportunidade que tive


clr conhece r de perto tantos êat61icos pio:dosos, coeren­
lr•, verdadeiramente santos, que fizeram do sobrena­
tural o seu "habitat" natural, vivendo plenamente,
rxf'm plormente, aque1a "vita abicondita.' cum Chrisco
111 D<•o'', de que fala o Vosso Apóstolo;

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agradeço-Vos o ler podido distinguir na Igreja Ca­
tólica não sõmenle um dos ramos do Cristianismo, mas
a Vossa Santa Igreja, a Espôsa do Cordeiro, o Corpo
Mlstico do Redentor, e no Santo Padre o Papa o Vos­
so Representante, o Pastor Supremo, a quem quises­
tes confiar tôdas as vossas ovelhas e cordeiros, Vosso
ministro plenipotenciário, cujos atos ratificarleis, ligan­
do ou desligando no céu o que na terra em Vosso Nome
ligasse e desligasse;
agradeço-Vos, outrossim, o ter aprendido a discer­
nir na Vossa Santa Igreja o que é divino e pennanente
do que é humano e transitório; o essencial do secun­
dário; o dogma explicitamente de!inido e as verdades
implícitas, em crisálida; a doutrina revelada e o que
não passa de opinião generalizada de teólogas; o que é
litúrgico e o que é costume popular, ou tradição local;
agradeço-Vos o haver conhecido o autêntico cato­
licismo, corporificado na vida dos que, pela canoniza­
ção, se nos apresentam como paradigmas a imitar; de
ler tido a graça de descobrir o catolicismo sem dislor­
ções deformadoras, de ler podido ver, examinar e ad­
mirar a Santa Igreja por dentro, como de fato é;
agradeço-Vos a Luz que me destes, e a Fôrça de
que necessitava para dar o passo decisivo e definitivo
de 19 de outubro de 1935, que me fêz "feliz no indizí­
vel do superlatlvo", que me trasladou da dúvida para
a certeza, da planlcie para a montanha, duma visão par­
cial para a Visão Total, duma comunidade nacional
para a Igreja Universal, duma pequena sociedade sem
raizes no passado pera a grande Família Espiritual que
pode exibir, com santa ufania, e sua árvore genealógi­
ca, que, de ramo em ramo, de século em século, de
Bispo em Bispo, vai de João XXID, subindo por Pio
XII, Pio XI, 'Bento XV, Pio X, Leão XIII, até aquele
cujo nome tão significativamente mudastes para Ke-

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phas <" a quem prometestes: "Sôbre esta I1edra r•lifin1-
rci a MINHA IGREJA e as port<u do Inferno não 11r1• 1•n­
(f'cttão contra ela";
agradeço-Vos o privilégio, que os de fora niio po­
dem avaliar, de pertencer a esla Igreja mil vêze• ben­
dita, onde tudo lemos em comum, onde nos sentimos
membros uns dos outros, onde me parece ouvir, a cu.dn
instante, o Convite de que, nos meus tempos de 11pre­
gador de bonecas", me fazia porta-voz: "Eu sou. Jesu.s;
vinde todos a Mim! A todos eu sal,,o: a pobres e ri­
'*• brancos e pretos, aábioa e ignorantes! Vinde a
Mim!", - pois que, deveras, todos aqui se i rman am na
sanla mesa eucarlstica, consliluindo uma só familia,
nquela que os crentes evangélicos sinceros tanto dese­
javam formar quando criaram o antigo ºSeminário
Unido", e pela qual suspiram ao cantarem aquêle hino,
que, com centenas de outros mais, também se me este­
riotipou na memória:

"Uma a6 familia somos,


Família de JeBWJ!";

agradeço-Vos o remédio do Sacramento da Peni­


tência, em que freqilentemente Vos procuro na pes;;oa
do sucessor daqueles a quem dissestes: "A..im como
o Pai me enviou Eu vos envio a vós. . . aos que perdo­
ardes os pecados, os pecados serão perdoados" . . . para
vos confessar minh8" misérias, fraquezas e pecados, re­
sultantes de Vos não amar, como devia, de todo o co­
ração, de tôda a alma, de todo o entendimento, com
lôd8" ... minhas fôrças, aci!na de tõdas as coisas . . .
º
de não ser como meu pai . . . de não me valer de todos
os recursos sobrenaturais que a Sanla Igreja põe ao
meu dispôr . . _ de ser Ião pouco genetoso e Ião in­
grato . . .

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agradeço-Vos o perdão que sempre me concedeis
quando, contrito e cheio de bons propósitos, repilo o
meu ºConfiteorº; e o Banquete Celeste que instituístes
para nos alimentar a alma, iluminar a mente e aquecer
o coração;
agradeço-Vos o terdes consentido que vivesse tan­
Los anos após a minha integração na Santa Igreja,
porque, de ciência própria, com real conhecimento, (alo
agora da minha experi�ncia. e, pois, com muito mais
autoridade;
agradeço-Vos a reallzação do meu sonho de criança,
- o de correr o Brasil a pregar o Evangelho, - o que
de há muito venho íazendo, todos os dias, pessoalmente
ou através do rádio;
agradeço-Vos a oportwúdade que me concedestes e
o ânimo que me destes para escrever estas memórias,
com que desejei captar e transmitir a Mensagem de
Fé, Esperança e Caridade, que a vida de meu pai en·
cerra, mostrando, concretamente, que o Vosso Esplrilo
"•OJ>Tll onde quer'' e que ainda hoje tendes "minha•
ourra1 ovelha.a que não aão dlare aprisco";
agradeço-Vos hte ensejo de renovar o testemunho
da minha Fé Católica, Apostólica, Romana; da minha
inteira, total e completa submissão à Santa Igreja, que
é o Cristo continuado através dos séculos; e do meu
amor, cada vez mais profundo e fraterno, aos cristãos
dissidentes, que só por um equivoco, por um tremendo
malentendido se mantêm afastados, entre os quais há
tantas almas retas e sinceras, que, reenxertadas no
tronco, cujas ralzes mergulham nas próprias Fontes do
Salvador, poderão vir a dar, ainda, muito mais glória
ao Vosso Nome Sacrossanto;
e suplico, 'Senhor, em união com todos os que Vos
amem e Vos querem ceda vez mais amado e glorificado,

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que o próximo Concilio Ecumênico atinja plenam<>nt<>
todos os seus objetivos, e, de modo especial, o de criar
as necessirias condições psicológicas para que os qui­
nhentos milhões de ortodoxos e protestantes, vendo a
Luz que há de refulgir então, retomem, - irresistivel­
mente alraldos, - à Casa do Pai, cumprindo-se destar­
te aquela Oração, que tem de ser eficaz, pois que bro­
tou do Coração do próprio Redentor Onipotente:

"Que todos sejam u11;

perfeitos na unidade;

UM COMO NÓS, Ó PAI;

PARA QVE O MUNDO CREIA QUE ME ENVIASTE!"

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1ND1CE

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Póg1.
Pro/i<lo 11
/ftlróilo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .... . . . . . . . . . . . .. . . . . . . • . . • • 15
EI""'"'"" Po.1Ulvoa . . . . . . . . . . . . ... .. . . . . . . . . . . . ..•. . ..... 25

DO CATOLICISMO PARA O CALVINISMO

Numa encruzilhada da vida .. . .• . ....................... 33


..Péu! P� Tira o chapéu!" . ............ ...... .. .. ..... 43
Por 200 réis de biuuuias . . . . . . • . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
No cabo da anxad.1 . .. ... ................... ........... 58
"Apasttnla as minhas ovelhas" . ......... .............. 63
..A .,,.... dOI ....rplõea"
., . ............. .•................ n
''Prrflro ver o meu fUho morto" . ............ .......... 75
"56 Em caao de inorte" . ............................... 83
ln1lanl5neoo dwna alma . . . . . . :........................ 87
ExIraios dum dlirlo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . •. . ......... 85
Putor e profesoor . .... .. . ....................... ....... 105
Vcnfculoo arlf..io. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . -� . . . . . . . . . . 123
Dcrrolando u "Testemunhu de Jmvá" . ...... ... .. . .... l29

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Alma cat61lca . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 151
"Mberic:OrdU., Senhor!" 159
P11n1 os bniços do Pai 105

DO CALVINISMO, VIA LUTERO, AO CATOUCISMO

Romlnis<êncios da lnlinda e da odolescfncU. . .......... 117


"Sftnenlff" . ............................................ 19S
Novo l!X)M!'rlênciu . . .. .... ..... .. ..... ................. 223
lncunôes em lemi ignola . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . • 235
Na igreja luterano . ........... . .. ..... ........... . .. . . . . . 249
Caem u úlllmu mwalhas . .............................. 27S
Deo GraUAS! • . ........................................... S03

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