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DE CLARIDADE
EM CLARIDADE
EDIÇÕES RUMO S . A.
RIO DE JANEIRO - 1981
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NIHIL oa!JTAT - RIO DB JANl!l
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A minha eapôaa
Luiz Eurípides
Vienney
Regina Maria
Angela Maria
Cristiano
Jorge
Alvaro
Maria Tereza
Maria CecDie
Marcelo
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PRE FACIO
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/lá hoje um cOftvite para o dldlogo. E todo diá
logo supõe conhecimen&o, rompreenaio, acatamento e
aprloço. Nada mau oportuno para criar em nós êate
din1n deaanuviado do que aeguir ao vivo o itmerdrio
lnlinoo que "' traduziu "" rintese dut4s dwu vldaa.
Também a nós êlle livro letl<lrá, de claridade em cla
ridade, a uma vi.são tolalmente nOllCI de velhaa nali
dades. Como não aennos graloa, eat6licos e protellan
leo, ao auror dellas páginas, por não cleizar perdidas
lanl<U vivências e ezperilneias lnteriorea, linguagem
de Deus no coração dos homens!
t um livro que faz bem. Mau que tudo, fala nêle
a osmoae de nligiiio e vida: ella J17"eoeupação eou
rante de ;fidelidade cl Venlade . . . êate anaeio sincero
de a ela lender até cl ...., plena posse. t uma vida o
que nelte livro ae noo aJ17"esenlCI. Tem êls por U.O a
fôrça do tellemunho: a de ser idéia encorNlda "" ezis
tência. Vida intensamente vivida em dois tempoo, em
dois ritmas, em dwu vidas. Maravilhosa a fisionomia
humana e sobreN1tural de Américo de Menezes. e,._
prichosos e misteriosos os caminhos do Senhor em con
duzir Eurlpides "de claridade em claridade". Há, con
tudo, uma admirdvel unidade e sequência "" ;fidelida
de de pai e filho Aquele que d a Verdade. Bem mais
profunda ainda, porm, M a fidelidade perene daque
le que é a Verdade aos que o Jl7"0CUram "" sincerida
de de um relo coração.
Senrimos aqui, de perto, todo o respeilO deuido
no l1omem em cu;a alma Deus eterno trabalha no ai
l•1nrio do lempo. Quando o homem começou a ae en
rrntl•·r com Deus, mais do que palaoras e criticas, d
n oraçdo "" caridade que fecunda a conoersão. Porque
••ln �. ••mprp e por primeiro, iniciativa de Deus. 1:
u••1·n t: Uru. a concede como e quando lhe apraz.
I"'
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t impoaslvel llQUi queimar etapcu. "Nio ae aln-e um
ccuulo", diria LeOMI F..anca. A graça tnl ba!ll4 no
tempo. E, quem diz tempo 114 escala de Deu.a, pode
8ignific4T espe.-a paciente de uma vida ou de ge.-açõe1.
Mil ª"°' nio aio para tle como o dia de ontem? • • •
.t11e liVTo é m<!7WJllem de Graç11. In!Toduz-noa num
clima de genuíM e11ridade cristã, enquanto e.ta diz
união na CCIS4 do P11i, mútuo Teapeito e gprêço depoil
de conhecimento Teclproco. Revelo a Iodai nÓI, cat6-
lico1 e prote.tante1, um mundo p11..a muito• novo e ig
norado. Aprozima, poia dilata h.orizcnte1, lev11nta bar
TriT41. Enquadr11-1e 411im, plenamente, no elp{rito de
Concílio convocado pelo Sumo Pontífice Joio XXIll.
Bate Concilio não é, aliál, aenão uma rupoata da Cria
tandllde cl CllpiTaçiiO de unidade, que pCITCI elo formulou
CIO Pai o próprio Crialo: "Que todoa aejam um, como
um oomo1 nós" (Jo, 18, 22).
Niio é de 11dmiTllT que um tal 11711eio de unidade e
de ama.. ae;a muito moia lntimamente 1entido por quem
ezperimentou ao vivo a .,... falta, por quem ao/Teu em
peuoa a tortura da diviaiio e cmueguiu aupe.-4-14. "O
converti.do não é, como o CTê por vêu1 umo falaa. in
te,.pretaçio, alguém que ezpre-mente afirma a dolo
Tosa 1epa..açiio confeuiona!. tle é, antea, alguém que
a 1oube domiMT. Sua autêntica ezperiênci4 não é a
de uma out..a fé cl qual êle 1e p11U4, mao lim a d4 uni
dade da fé, que o aubme.-ge. Compreende como nin
guém que a divisão doa criatiloa é, no fundo, menoa ci
aão 714 fé do que ciaão no a.mor. t preciao triunfaT
de1U1, por primeiTo, pa..a que, em aeguida, ae
vmçam 41 clificuldadea doutrinaia". Eia porque
"o convnrido Tepreaenta. em l'Í a viu união
do amOT dividido. .tle é, poia, por 4.aim dizer,
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a pot1le q11e IOCG e liga a• d....., l'IUlrgena" (J. An
relel-Huaraclae, Gertnd von le Fort, Bru:reUea, 1954,
p. 6).
Dc1l4 rnusão d.e amor e de união tem cOMCi.!ncia
Eurlpid., Cardo.o de Menezea. Sua primeira obnz ftea-
14 linha, - "Ao• IrmãDi Separadoa" - e eal4 agora
dão diaio eloqüet1te leatemunho. S6 no1 rea la augurar
lhe que quem tome ""' mãoa o aeu livro 1C1iba lê-lo
com o eaplrito �meftle '"411"4ftimo que o ditou. E
enlão, e1w pdgina1 seriio .emente fecuftda de paz e
de união.
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INTRÓITO
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Lendo trechos do "diário espiritual'', e penetnm
do, melhor do que muitos pastores evangélicos, na psi
cologia de Américo de Menezes, disse-me um dia o meu
saudoso amigo Pe. Leonel Franca: "Entre nós, católl
cos, nio seria de admirar-se que se pensasse na sua
beaülicação... Era uma personalidade realmente extra
ordinilria."
Mostra, com efeito, a sua vida como é passivei um
protestante convicto ser, deveras, como diz Moos. Pe
nido, 11um membro potencial", 11tendencial" ou 11laten
te" da Igreja Verdadelra;U> e por que motivo "admite
o catolicismo que nas comunidades protestantes até
santos e mArtires possa haver." 12>
Oulnl grande figura dos meios cat6llcos, arcebispo
dos de maior prestfgio entre nós, também se manifes
tou vivamente interessado na publicação da biografia
de meu pai. Várlu vêzes tem lmislld o para que o
faça.
Relutei, porém, durante anos, em tirar da pveta
êste lnlbalho, notadamente pelo receio de apresentar
uma caricatura em lugar do retrato; que nio há, tal
vez, mais 6rdua tarefa que a de escrever uma biogra
fia. Se o autor não conheceu o biografado, seri qua
se de lodo imposslvel; se tal se deu, mais diflcil se lhe
aligurari, por certo, e maior angústia h6 de sentir ao
constatar a impossibilidade de lhe reproduzir a fisio
nomia, de faz!-lo mover-se, falar, viver diante do lei
tor. Consegui.ri, sim, vez por outra, com a rememo
ração de (atos históricos, tornA-lo momentaneamente
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redivivo para os que o conheceram, - o que já aerA,
em certos casos, de real proveito; mas . . . e os outros,
que não foram seus contemporlneos?
Há, outrossim, o perigo de pretender o autor inter
pretar o biografado, de o apresentar à sua própria ima
gem e semelhança, como desejaria que l!le tives..e sido
e não como de fato �e foi, o que seria distorcer-lhe
a fisionomia moral, desfigurar-lhe a personalidade, trair
a verdade histórica.
Deploraodo não ter a acuidade psicológica de um
Mons. Pen.ido, que tão maravilhosamente retratou o
grande Newman, recuava sempre pela convicção de
que não poderia dar senão uma idéia muito pálida da
quela alma de escol, tão ardorosamente apaixonada por
Nosso Senhor Jesus Cristo!
Trinta e cinco anos, porém, se passaram desde que
partiu diste mundo, sem que Jamais se houvesse ten
tado captar e transmitir a menaa11em que, a meu ver,
sua vida encerra, tanto para os cristãos evangélicos
como para os católicos, que, allás, sempre se entusias
mam e se comovem ao lhe ouvirem a bela história. Jul
ge>-me, pois, no dever de publicar ao menos alguns dos
documentos, Infelizmente tão escassos, dessa vida que
se findou aos 38 anos; de registrar os relatos orais que
me foram transmitidos; e as mlnh.as próprias reminJs..
cências, para que se não apague de todo o rastro de luz
que deixou, em sua rápida passagem, aquela alma
imantada pelo Divino Sedutor. Mesmo por já estar
euperado o outro motivo pelo qual não me decidira, até
agora, a trazer a público as minhas anotações: o receio
de ainda não haver clima, no Brasil, para um trabalho
como l!ste, a estranheza que poderia causar a publica
ção, por um católico, mesmo à guiza de intróito à nar
rativa de sua conversão, da biografia dum pastor pr<>-
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teslnnle, ainda que a pedido de um prelado e com os
aplausos de muitos outros.
Aliás, católicos e protestantes de mentalidade es
treita os haverá sempre; mas também, e em número
felizmente cada vez maior, esclarecidos e compreensi
vos. A êstes é que me dirijo.
Convocado o Concilio Ecumênico, que terá como
dos seus objetivos primordiais o de criar as necessárias
condições psicol6gicas para que se possibilite, quanto
antes, a unificação da Cristandade, urge fazer cada qual
o que puder no sentido de lançar, s6bre o abi.sino dos
preconceitos e ressentimentos, a ponte da boa vontade
e da compreensão reciproca. De que êste é o pensa·
mento e o desejo do Vigário de Cristo não há dúvida
nenhuma. Ainda recentemente, referindo-se à próxi
ma assembléia geral da Igreja, disse Sua Santidade:
ºNão faremos um processo histórico, não procuraremos
ver quem tinha e quem não tinha razão. As respon·
sabilidades estiio divididas. Diremos apenas: reuna
mo.no.e;!"
11Urge, - ncre�enlou o Papa noutra oportunida
de - superar velhas concepções, preconceitos e expres
sões pouco corteses, a fim de criar-se um clima favorá.
vel no retômo e facilitar-se por t&las as formas a obra
da Graça."
E a sua simpatia pelos cristãos dissidentes e o de
sejo de os ver reintegrados nos seus antigos privilégios
se manifesta nesta auspiciosa declaração: "Se os nos
sos irmãos separados quiserem comparecer ao Concllio
Ecumênico, serão benvindos. A Igreja Católica con
tinua a aua casa, donde êles sairaJn devido a Inciden
tes históricos, desentendimentos passiveis em qualquer
fami!ia" ...
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Das palavras passa Sua Santidade aos aios, rece
bendo paternalmente o pastor anglicano Donald Rea,
presidente da Fraternidade Pró-União com Roma, a
quem encorojou a que prosseguisse na sua obra, lem
brando que "paro o êxito do apostolado da unidade
cristil é ncceiw\rlo: ser manso e humilde; ter pacl�
cia e saber c!lp"rar o horo de Deus; insistir em argu
mentos positivO!I, deixando de lado as divergências e
evitando dillcus.'IÕes contrários à caridade." Foi nessa
ocuião que o Sanlo Podre olereceu ao Rev. Donald
R�a o seu próprio Breviário, ao notar como estava gas.
to o que usava o ministro anglicano . . .
Estamos, sem dúvido, n o limior duma nova éra.
Intensifica-se dia a dia o desejo de união entre os vá
rios ramos do Cristandade, aspiração que se vai de
monstrando de modo concreto e positivo, não .Omente
em meras declarações de simpatia como alé mesmo nos
encontros, cada vez 1nais frequentes e sempre amisto
sos, entre teólogos católicos e protestantes.
Já Pio Xl1 recebera pessoalmente várias delega
ções de pastores evangélicos, como permitira, outros
sim, que observadores católicos não oficiais, mas de
signados pelas autoridades eclesihlicas, assi•tissem a
vários congressos evangélicos mundiais. Sacerdotes ca
tólicos têm tomado parte, ao lado de anglicanos, em
congressos internacionais de Patrística e Arqueologia;
o "Semana Universal de Orações pela Unidade dos
Cristãos", inslitulda por dois pastores protestantes
(Rcvs. Spencer Jones e Paul Wattson), aprovada por
São Pio X e encorajada por seus sucessores, é obser
vada hoje em todo o mundo, tanto pela Igreja Católi
ca como por numerosas "denominações" protestantes:
estudos notabilíssimos sôbre o protestantismo se vêm
publicando ultimamente, como, por exemplo, o do Pe.
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Louis Bouyer, - "Du Prol<!stantbme 11 l'Egliae", o do
Pe. Georges Tavnrd - "A la rencontre du protes!an.
rinne", e oulros como os do Pe. A.-J. Lut:z, O.P. , do
Pe. M.-J. Congar, O.P., do Pe. P. R. Regamey, de
Claude Vignon, de M.-M. Monflard, de W. A. Vissert
lloofl, de Leon E. Halltin, etc.UI
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Aqui no Brasil já se registraram também vários
fat.os swnamente auspiciosos. Ao 36.° Congresso Eu
carlstico Internacional compareceu, acompanhado de
seu pastor, numeroso grupo de luteranos da cidade de
São Paulo, que não .Omcnte assistiram a tôdas as sole
nldades como tomaram parte, através de seu conjunto
orfe8nlco, que foi apreciadfssimo, numa das reunlõe•
plenArias. Nessa mesma ocasião, no salão paroquial
da matriz do Sagrado Coração de Jesus, realizaram
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uma festa lítero-muslcal "em homenagem ao 36.° Con
gresso Eucarístico Internacional". Os ortodoxos tam
bém pediram permissão para comparecer, e compare
ceram, ao grande certame de Fé.
Na "Festa de Confraternização", efetuada em ju
nho de 1959 no Teatro Municipal do Rio de Janeiro,
no "Dia do Papa", estiveram presentes o Arquimandri
ta Ortodoxo e v&rios past6res anglicanos, luteranos e
calvinistas, que haviam sido convidados e para os quais
se reservaram frisas especiais.
Mais recentementl! inauguraram-se, com alegria
redproca e grande sucesso, "DWogos" entre padres
dominicanos de São Paulo e professôres do Seminário
Presbiteriano de Campinas.«>
Aliás, quanto mais se aprofundarem os calvinistas
na alma de Calvino, mais admirados ficarão, como ob
serva o Pe. Louis Bouyer, da semelhança essencial en-
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Ire o seu pensamento a respeito das mais importantes
questões teológicas e a verdadeira doutrina da Igreja.
Pena é que Lutero e Calvino sejam relativamente pou
co conhecidos pelos próprios teólogos luteranos e cal
vinistas do nosso século!
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ção profunda das respectivas atitudes, por melhor oe
conhecerem para mais depressa se abraçarem, na rea
lização do desejo do próprio Cristo N"""" Senhor: "Ut
omn.e1 unum. l'int.''
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ELEMENTOS POSITIVOS
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tra os dissidentes, que aliás de o serem não têm culpa,
na maioria das vêzes.
!!: ass im que se referem os dois ilustres jesu(las ao
movimento protestante e ao seu principal propugnador:
"A separação protestante data dos tempos moder
nos. No inicio do século XVI encontrava-se a Igreja
católica em situação critica: escândalos provocados
por papas, prelado.• e snce1·doles, empobrecimento da
teologia, ignorância religiosa, ele. Eslava em decllnio
o esplrilo religioso e uma refonnn se impunha. Mui
tos cristãos sinceros padeciam com essa situação. Des..
pontava uma renovação. Lidero, monge agostinho,
alma verdadeiramente religiosa mas fogoso de tempe
ramento, ficou profundamente Impressionado com ês
ses problemas religi0905 a que se mesclavam suas pró
prias angústias de consciência. A intuição rundamen
tal de Lutero, que constitui o elemento positivo da Re
forma, era rigorosamente ortodoxa: a idéia de que a
salvação é gratuita, isto é, de que não consiste numa
obra (ou em obras) do homem, mas sim numa graça,
um puro dom de Deus, que só a fé pode receber
(Bouyer).
"Infelizmente, a êste principio fundamental incon
testável logo vieram Juntar-se afirmações que dêle não
decorriam, atribulveis, sobretudo, à filosofia insufici
ente que dominava no tempo de Lutero, e da qual êle
nunca pôde libertar-se."
Por causa dessas afirmações, "que falsearam t.6da
a perspectiva de Lutero, é que a Igreja teve que re
jeitar a Reforma."
Quanto .a Calvino, "queria purificar a Igreja e re
colocar em destaque a idéia da grandeza de Deus. In
felizmente, foi como um lógico que tentou esta restau
ração, chegando, assim, a uma doutrina não destilulda
de grandeza, porém rlgida e inumana."
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Relativamente aos esforços realizados üllimamcn
te em favor da união dos cristãos, assim se expressam
os jâ famosos aulores:
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Diremos, porventura, que unada terl& a lucrar a
Igreja Romana com o contato com as riquezas espiri
tuais das ouIras confissões? De modo nenhum. Pre
mida pelas necessidades da época, principalmente no
tempo da Reforma, acentuou a Igreja Católica, de pre
ferência, tudo o que se refere ao aspecto vis(vel dêsse
Corpo Mlstico, desenvolvendo menos o que os protes
tantes consideravam com exclusividade: a gratuidade
de salvação, a lnOuência do Esplrito Santo, a transcen
dência absoluta de Deus.
A união com Roma não significaria, absolutamen
te, que os valores cristãos autênticos que nossos innãos
separados cultivaram e desenvolveram devessem ser
abandonados. Muito ao contririo, tal união seria para
todos um beneficio: os não católicos se reintegrariam
no meio normal de santificação; e os cat61icos retoma
riam consciência mais clara de certos valares autên
ticamente cristãos que êles haviam considerado me
nos."' O>
Os "elemento• poaitivoa'' do protestantl.!mo, suas
inegáveis "riqueza.a espiritualr'', os "va.lore.s crUtãos
aulênt�•" cultivados e desenvolvidos pelos nossos Ir
mãos separados, - referidos por Buys e Delcuve, e a
que não qul'remos em absoluto que renunciem, - vê
Jos-emos corporificados num de seus mais lldimos re
presentantes, à medida que se nos desdobrar diante dos
olhos, na primeira parte dêste ensaio, sua vida coeren
temente harmoniosa, cheia de amor e de fé.
E não foi, porventura, um protestante o primeiro
biográfo do Padre Damião, o célebre apóstolo dos le
prosos? Não era Joergensen protestante quando em-
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preendeu a tarefa de escrever a vida do Poverello?
Não devemos à iniciativa de um protestante o estudo
científico e mais aprofundado do Santo Sudário? E não
é da lavra de um ministro anglicano, Rev. W. H. Lon
gridge, um dos melhores comentários que se conhecem
dos Exerclcios Espirituais de Santo Inklo?
Insistamos no.o pontoa comu""; conheçamo-nos e
estimemo-nos reciprocamente; rezemos una pelos ou
tros com perseverança e fé. E o Pai de Amor abrir6
caminho no meio das mares.
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LIVRO PRIMEIRO
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NUMA ENCRUZILHADA DA VIDA
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E
E MANHÃ cêdo já eslava o menino a ler
o livro que um senhor simpático e bondoso
lhe dera.
Que presenle maravilhoso!
De lodos os livros que já lhe tinham vindo às mãos,
nquêle era, sem dúvida, o mais empolganle!
E não o largava. Interrompia, por vêzes, a leilu
ro de tanto chorar, tal a emoção que lhe causava a nar
rativa dos sofrimentos do Redentor!
- Que � que est.6 lendo, menino? - perguntou
lhe o pai, surpreendendo-o agarrado ao Novo Testa
mento.
E o gar6to, com a mais ingênua simplicidade, lhe
mostra o seu tesouro.
Transtorna-se, incontinenti, a fisionomia do homem
ao dar com o titulo da obra.
- Que?! Você ... lendo iato?...
Fuz.ilando com um olhar indignado o pequenino
réu de doze anos, continua a catilln4ria:
- Um filho meu a ler um livro ... protestante! ...
Nurn gesto de angúatia e de desespêro, arranca das
mios da criança e atira o livro ao fogo.
Estatelado, o coração oprimido, não consegue ati
nar o pobre menino com o motivo da insólita explosão.
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Afinal, por que aquilo? Não seria, porventura, o
Novo Testamento uma parte da Escritura Sagrada? A
história do Salvador, de Nosso Senhor Jesus Cristo?
do próprio fundador da Religião Católica?
E que vinha a ser is.-;o: "protestante"?
Era a prim1?ira vez que ouvia essa palavra ...
- "Livro protestante"!... Mas . . . aquéle livro é
protestante? Então ... eu também... Sim, eu tam
bém sou protestante! - dlzia consigo mesmo.
Já se declarava protesla11le sem saber ao certo o
que vinha a ser proleatanriamo.
Esta a gênese da conversão ao protestanlismo do
futuro Pastor Américo Cardoso de Menezes.
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Cêdo revelara tambo!m acentuado pendor para as
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doutrinária não passava dos rudimentos de wn cate
cismo apenas decorado e muito mal ass imilado.
Não é de estranhar-se haja penetrado o calvinismo
" criado ralzes em tantas cidades brasileiras. Numas
por falta de padres. Noutras pela carência de sacerd<>
tes intelectualmente preparados. E em muitas pelo
descrédito em que caira o clero, cuja vida moral, em
certos lugares, ao que se dizia, com ou sem razão, fre
qüentemente deixava a desejar.Ili
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Nunca soubc dizer Américo de Menezes se era de
l'dição protestante ou católica o exemplar do Novo Tes
lamento que lhe mudou o rumo da vida.
Em se !ralando, aliâs, do Novo Teslamento, estaria
a diferença essencial nas notas explicalivas. que anti
gamente as edições protestantes não tinham e que ago
ra estão começando a trazer, às vêzes até mais e><len
sas do que as das edições católicas, e que ª" antigas
edições católicas traziam bem desenvolvidas e agora
aparecem cada vez mais sintéticas e breves. 1: de crer
se, todavia, que se !ratasse realmente duma edição pro
testante, pois naquela época não faziam mesmo o empe
nho que hoje fazem as nossas autoridades eclesiâsticas
em divulgar entre a gente simples o texto blbllco. Rea
gindo contra o exagêro dos que, proclamando a Escri
tura Sagrada sua única e suficiente regra de fé e prá
tica, chegavam ao ponto de desprezar, ao menos teõri
camente, t6da tradição patrlstlca e mesmo aposlólica,
calram, por sua vez, os católicos no exagêro oposto, de
sinleressando-se pràticamente pela difusão não só do
Antigo, - deveras nem sempre ao alcance da compre
ensão do povo, - como do próprio Novo Teslamento,
mais acesslvel e com que todos se deveriam fami
liarizar.
Como entre certos protestantes acontece em rela
ção à bem-aventurada Virgem Maria, surgiu também
entre os católicos latinos como que uma estranha aler-
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Kia pe la Bíblia. Desdenhosamente foram apelidados os
proteslantes de "o• blblia•". E, até algum tempo atrás,
<1uem citasse em conversa a Blblia Sagrada, era logo
suspeito de ... heresia.
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Faltam-me dados do perlodo que se sucedeu, d"
quase dois anos. Sabe-se que o menino, bem precoce
na manifestação de seus dotes intelectuais, redigia nes
sa época um jomalzinho literário, de que ainda existe
um exemplar; e que, proclamado "protestante" pelo
próprio pai, acabou por descobrir um verdadeiro pro
testante, com quem travou relações e que lhe deu um
folheto de propaganda evangélica e outro exemplar
do .. . Novo Testamento, que continuou a ler clandes
tinamente.
Estabelecera-se invenclvel incompatibilidade en
tre pai e filho, unicamente por causa de. . . Nosso
Senhor Jesus Cristo!
Atingida a maturidade dos .. . catorze anos, ei-lo
embarcando em Aracaju para o Rio de Janeiro, onde
pretendia preparar-se para fazer o curso jurldico, num
ambiente em que pudesse respirar, em que houvesse
mais "liberdade de consci�cia".
O próprio pai lhe pagou a passagem.
Foi, aliás, o último dinheiro que lhe deu.
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"PtU! PtU! TIRA O CHAPtU!"
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NTEIRAMENTE s6 no mundo, profunda
mente e cada vez mais apaixonado por Nosso
Senhor Jesus Cristo, conhecendo do catoli·
cismo apenas uma caricatura, desembarca o
jovem sergipano no Rio de Janeiro.
Consegue empregar-se de tipógrafo, passando a Ira·
bulhar de dia e a estudar à noite.
Vêm-lhe às mãos vArias publicações esplritas, que
lê e põe de lado: Kardec nii.o lhe satisfaz as aspirações
espirituais.
Um senhor protestante, com quem trava conheci
mento na pensão em que mora, leva� sucessivamente
às igrejas batista, melodista e presbiteriana. Desta
era pastor o Rev. Alvaro Reis, com quem simpatizou
imensamente.
Alvoro Reis estudara com missionArios protestan
tes norte-americanos. Jamais conheceu também o au
têntico catolicismo, tal como a tantos milhões de cren
tes evangélicos acontece.<ll
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Como pregador era de fato fa.'ICinante e persuasi
"º· Arrebatava os auditórios, sempre numerosos, que
rorriam a ouvi-lo todos os domingos ao templo da Rua
Silva Jardim, então Travessa da Barreira.
Entre os ouvintes embevecidos estava o jovem
Américo de Menezes, que também passou a freqüen
tar a Escola Dominical.'lJ
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/\ l•:••·olu Dominical é a instituição a que mais deve
11 proh•,.hmtliunu, que, sem ela, talvez jã estivesse re..
d111 1ilu u ht.•m modestas proporções. Ministram-se as au-
111• l•Mlo• "" domingos antes do culto público da co-
111unld•1le. O. alunos são distribuldos em várias clas
'""· c1� acôrdo com as respectivas idades. As lições,
1••1l•M•IMi<·amente dosadas para as crianças, para os jo
''''""· pum os adultos, dão aos estudantes apreciAvel
o•onheclmento prático do texto da Blblia, que, no de-
1·uno de sete anos, é t&la l"l!Jl"SS8da, do Gênesis ao
/\pocalipse.
Todavia, com a instrução religiosa também se
transmite uma profunda prevenção, às vfzes ódio mes
mo, contra a Igreja Católica, tida por todo protestante
daquele tempo, e ainda hoje pelos mais Iconoclastas,
como urna igreja desviada da pureza primitiva, cheia
de inovações doutrin!rias, idólatra e paganizada.
Contribu[a ainda para prender o "catecúmeno" o
ambiente espiritual e social do evangelismo nascente.
Levava-se a sério a religião, que tinha fortes ressa ibos
do antigo puritanismo escocfs.
Os deslises em matéria de costumes eram punidos
com enérgicas advertências, e, não raro, com penas
maiores, de 5USpensão temporária ou excomunhão.
E, por serem pouco numerosas as comunidades,
todos se conheciam e eram sempre visitados pelo pas
tor, notadamente os que faltassem ao culto. Nesse
caso ia logo o pastor ou um presbltero à casa do irmão
rnfémio. Porque certamente adoecera, do corpo ou
da alma . . .
Qualquer pessoa que pela primeira vez aparecesse
no "culto" era cercada imediatamente das maiores
atenções, e de tal modo envolvida e catequizada que,
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não raro, em pouco tempo fazia também a sua "pro-
fissão de fé."'''
Para os jovens funcionava já a Associação Crist.ã
de Moços, que não era um simples clube desportivo,
como é hoje em muitas cidatles, mas uma aglincia de
proselitismo das mais eficienles. A sua frenle estava
um personagem realmente notável pela sua retidão de
uráter, pela sua piedade, pela simpatia pessoal que ir
radiava, pela sua sinceridade, e, por isso, dotado de
Imenso poder de persuasão: Myron Clark. Foi fie um
daqueles pioneiros do protestantismo no Brasil, que de
veras renunciaram a um padrão de vida muito mais
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elevado do que o que vierwn a ter, ou na "cidade proi...
bida", que era o Rio de antes de Oswaldo Cruz, temida
,
por todos como 11a lerra da febre amarela ., ou no in
terior do Brasil, onde, aMm do desconlôrto material,
tinham de lutar contra a hostilidade do povo e a rea
ção natural do clero, nem sempre multo cortês . . .
No "centro de debates" da Associação Cristã de
Moços desenvolveram-se notàvebnente os dotes orató
rios de Américo de Menezes.
Cada vez mais convicto de haver achado o cami
nho certo, resolve, afinal, ingressar oficialmente na
igreja presbiteriana.
Foi um dia de festa espiritual para o seu coração
juvenil e ardoroso aquêle 12 de outubro de 1902.
Álvaro Reis prega eloqllentlssimo sermão, que ar
ranca li\grimas à entusii\stica assistência.
Ap6s o culto, como de praxe, abraços, paraWns e
votos de perseverança na fé. Tôda a comunidade des
fila para cumprimentar o neoprofesso.
Pode imaginar-se em que estado de espirita vol
tava naquele domingo para casa, lendo, absorto, no
bonde, a sua Bíblia, o piedoso rapaz.
Súbito, vê-se violentamente puxado do veiculo e
esbordoado por um grupo de desalmados que vocife
ram: "Péu! Péu! Tira o chapéu! Péu! Péu! Tira o
chapéu!
t que o bonde fôra envolvido por uma procissão.
E o adolescente, de 16 anos, estava e permanecera com
o chapéu na cabeça . . . De resto, não era para êle uma
"idolatria" aquela procissão, algo semelhante, na apa
rfmcia, à que faziam em honra da deusa Diana os pa
g1ios de tfeso? Lembrando-se de São Paulo, preso por
não cultuar os ldolos, rejubilava-se Intimamente ao se
ver prisioneiro também e levado, como foi, para um
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distrito policial! E logo no dia feliz de sua "profissão
de fé!" Era, sem dúvida, uma graça do céu!<•>
Enquanto, no meio de contraventores e de crimi
nosos da pior espécie, espera o delegado, que viria li
bertá-lo muitas horas depois, abre o Livro, "o Livro
protestante'', e põe-se a lê-lo com amor e reverência.
Folheia o seu Hin'rio e canta, mentalmente, alguns
daqueles hinos, que são verdadeiras imagens auditivas
e que nutrem, h6 quatro centúrias, a piedade evan
gélica.
Medita no inesperado incidente e compadece-se
daquela multidão, mergulhada, a seu ver, na ignorãn
cia religiosa, nas "trevas da idolatria".
Sente-se, então, interiormente chamado para "pre
gador da Palavra de Deus". Era mister libertar oquê
le povo pela pregaçào do Evangelho puro de Nosso
Senhor Jesus Cristo, a Quem prometera, solenemente,
ser fiel até a morte.
Renuncio ao projeto de "" fonnor cm D irei to e re
solve lazer-se "Ministro do Evangelho".
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t:, num transbordamento de caridade cristã, reza
�""' " lrrvor habitual pela conversão daqueles cujas
v•ir.r•lho parecer6 ouvir durante 16da a vida: "Plu!
'''"' Tlra o d1aplu!"
F.otova decidida uma vocação.
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POR 200 ru:IS DE BANANAS . . .
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EPOIS do epl.s6dio do dia de sua profissão
de fé, procura o Rev. Álvaro Reis para lhe
comunicar a decisão que tomara de estudar
para o Santo Ministério.
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balhar, em hipótese nenhuma, no dia santificado.<11
E passa a procurar um estabelecimento cujo pro
prietário "respeitasse a Lei Divina ".
Resultado: três meses desempregado!
Vão-se-lhe as pequenas economias, a ponlo de se
ver, em pouco tempo, sem vintém no bolso. Certo dia,
para matar a fome, empenha um seu componedor tipo
gráfico por duzentos réis (vinte centavos) de bananas,
que vai comer à sombra das árvores do Passeio Públi
co, perto do largo da Lapa.
Enfraquece-se-lhe o organismo.
Vitimado pela pesle bubônica, que assolava a ci
dade do Rio, interna-se no hospital-isolamento de Juru
juba, do outro lado da Guanabara, além de Niterói.
Fica ali por mais três meses em luta contra a mor
te, que todos os dias levava alguém; aliás, mais do que
a doença, matava a inanição.
Felizes os que podiam atirar algumB!I moed&!I ao
padeiro, que, em troca, arremessava, por cima do
muro, um pão que o diabo 11ma&11Jr11 • • •
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Mas o Pai do céu leve misericórdia dêle e o curou.
Volta ao Rio e continua a procurar o tal emprêgo
com que sonhava: em que não fôsse obrigado a infrin
gir a Lei do Senhor, em que pudesse guardar e santi
ficar o domingo.
Acaba por obter um lugar de caixeiro entregador
de compras no armazém de sêcos e molhados do "ir·
mão Perez", que, sendo crente evangélico, cerrava aos
domingos as porlas de sua casa comercial . . .
E eis o jovem orador, filho duma familia abasta
da, que o renegara por causa de suas convicções, a car
regar um caixote à cabeça, com o feijão, o arroz, as
batatas dos fregueses do "seu" Perez.
Exultava, porém, em seu coração.
E continuava a pedir a Deus que lhe abrisse uma
porta para que pudesse realizar o seu ideal: o de es
tudar para o santo ministério.
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NO CABO DA ENXADA
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FINAL, cfrca de dois anos depois de so
haver candidatado a uma vaga no Ginásio
de Lavras, recebe a carta que tão ansiosa
mente esperava.
Seria admitido, na qualidade, porim, de "estudan
te pobre", o que s.ignlficava que teria de pagar os es
tudos com o próprio trabalho.
Não seria essa a dificuldade.
Attuma em duas maletas tudo o que tem e parte
para Lavras, onde regularizar6 e terminará o curso de
bacharel em ciências e letras, exigido para ingresso no
Seminário Presbiteriano.
Era no campo, na horta do Ginásio, que deveria
trabalhar para prover o seu sustento.
Faziam o mesmo v&rios outros "estudantes po
bres".
As vêzes, para estimulá-los, ia também para o la
voura, de enxada na mão, o próprio diretor do Giná
sio, o Pastor Gammon.
Nos primeiros dias sofreu um pouco o novo 11lra
balhador rural". Calejaram-se-lhe, porim, as mãos; e
acabou por afeiçoar-se ao serviço, que fazia por amor
de Deus e com propósitos sobrenaturais.
Em pouco tempo passou a ser o primeiro a termi
nar o tarefa diária. E logo desaparecia.
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Cerln vez, um colega seu, Júlio Nogueira, que vi
ria a se tomar ilustre tribuno, segue-lhe, curioso, os
possos para ver o que ia fazer, sbzlnho, num bosque
próximo.
E estaca, admirado e edificado: numa pequena
clareira da mata, ajoelhado, Américo de Menezes ora
va fervorosamente.
De tal modo se impõe pela aplicação e pela vir
tude que é "promovido" a regente de estudo.
A 2 de junho de 1908, com 22 anos, ant"" de con
cluir o sexto ano do ginásio, casa-se com a sua pro!es
s6ra de ingl@s, terminando o último ano como profes
sor de turmas mais atrasadas e diretor do lntemalo.
Essa professlrl a de ingl@s era a srta. Maria Isabel
Rush O'Grady, muito querida dos missionários america
nos de Lavras, que, admirando o jovem bacharelando, de
certo modo promoveram, e facilitaram mesmo, a rea
lização do casamento.
Um epi.s6dio pitoresco assinalou, no anedotário do
lnstiluto Gammon, aquela festa nupcial.
Celebrava a cerim6nia o Rev. Dr. Horace Allyn,
médico e missionArio.
Descera a noile.
Súbito, um curto-circúito apaga tôclas as luzes.
E, segurando numa dOll mãos uma vela acesa e o
livro na outra, pcrgunla, solenemente, com o seu sota
que carnclerlsticamenle yankee:
- lsabela, nttlla Amt!rico corno seu marido?
- Sim.
- Am�ricn, oceit.A lsabela como sua marlda? . . .
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"APASCENTA AS MINHAS OVELHAS" . . .
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OM DISTINÇÃO em tôdas as matérias,
termina o CUJ'SO de ciências e letras, que,
naquele tempo, inclu!a também o estudo de
alemão, grego, hebraico, lógica, psicologia,
pedagogia, etc.
Eleito orador da turma, pronuncia notável oração
na solenidade de colação de grau.
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fün Campinas, Estado de S. Paulo, funcionava o
Srmiru\rio Presbiteriano, onde deveria fazer, como fêz,
todo o curso filosófico e teol6gico.
Enquanto cursa o seminário, em que reside com
suo esp&a, leciona também num educandário da cidade.
AI lhe nascem dois filhos: Eurlpldes e Américo.
Findo o curso, vai a Caxambu, onde se reúne o
"Presbitério Sul de Minas", que o ordena "ministro
do Evangelho" a 13 de julho de 1912.
Eleilo, a seguir, pastor da Igreja Presbiteriana de
Lavras, transfere-se para aquela cidade e assume o
pôsto.
Desenvolve, então, intensa atividade pastoral, in
terrompida uma vez apenas por uma viagem que faz
a Sergipe para rever o pai. �te, orgulhoso da libra
e dos triunfos Intelectuais do !ilho, com quem se re
conciliara ao ponto de se fazer protestante Lambem ( ! ) ,
ainda entrega aos seus cuidados outro filho seu, Ju
cundino, do segundo matrimônio, que vem para Lavras
em sua companhia, com �le vivendo até se bacharelar.
De volta a Lavras, agindo como zeloso cura d'al
mas, passa a visitar regularmente todos os paroquia
nos, de quem se torna o guia e o conselheiro queri
dl.ssimo.
Empregando grande parle do tempo na oração e
em leituras espirituais, prega com grande unção e efi
cácia. Orador fluente e persuasivo, não se lhe perde
uma silaba. Fala de modo claro e simples. As vêzes
parece um trovão! Outras vêzes, a brisa suave que
murmura docemente. t uma delicia intelectual e um
refrigério espiritual ouvir aquêle homem de fé.
Como pastor de Lavras tem ainda a seu cargo nu
merosas congregações em outras localidades, que visi
ta freqUentemente, viajando de trem, a cavalo e, às
vêzes, a pé.
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v..... vlMll�ll!I a pé começaram após um pequeno
•111·11l•11h• r.om uma veneranda missionhia norte-ame-
1 11·01111, 11111110 piedosa e ilustrada, professara de latim,
N• •N"• lll'hralca, alta matemática e até de português:
Mi... Carlota Kemper, que, se houvesse nascido católica,
h•1 IM •lclo, ..,m
dúvida, exemplarlsslma religiosa.
Cmtmnava, porém, a missionhia ir à igreja, BO!
1lnmln11ot1. num carro puxado a cavalos.
Oh•<rva-lhe delicadamente o pastor, antigo aluno
•••11, r1ue nõo julga 16 muito edificante ir a mission6ria
ti• oarro para a igreja no dia de Domingo. A distAn-
1·10 l• �quena. Todos costumam fazê.la a pé; inclusi
vo• a mission6ria nos dias de semana. Não vê por que
111.•upar o cocheiro e os próprios animais no dia santi
locndo e sem real necessidade.
- Mas, então, por que não vai também a pé, pnra
Ribeirão Vermelho, o Rev. Américo, quando tem de
pregar 16 no dia de Domingo?
Ser6 f6eil retrucar. Prefere, porém, responder de
modo mais expressivo:
- Pois doravante, quando tiver de pregar em Ri
beirão Vermelho no dia de Domingo, o pastor não via
jará mais de \rem: irá. . . a pé.
E dai por diante, embora tenha um cavalo para as
suas freqUenles viagens a localidades vizinhas, fá-las-á,
oos domingos, a pé, 11para não escandalizar os fracos".
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conseguia chegar depois de se atravessar extenso la
maçal.
- Então, como vai, sr. Tibúttio?
- Vou indo, Reverendo; como velho e, agora,
doente.
- E parece que está com frio, pois não?
- Mas Isto não tem importlncia; o principal é es-
tar na graça de Deus, não é verdade?
- Sim, não bai dúvida; mas vou lhe dar um pre
sente. Isto lhe vai servir de cobertor e sobretudo ao
mesmo tempo.
Juntando o gesto às palavras, tira o sobretudo e
cobre com êle o prêto velho.
- Mas . . . Reverendo! . . . O Sr. precisa dêle! E
está chovendo, está fazendo frio. . .
- Não falemos mais nisso. O capote já não me
pertence mais.
E, depois de fazer uma fervoroaa oração pelo en
fêrmo, sai, debaixo de chuva, descendo o morro enla
meado, de volta para casa, feliclssimo por ter dado al
guma cousa a Quem havia dito: "Tudo o que fizestes
a um dhtes mais pequeninos a Mim o fizestes • . . "
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rnolln, tornava-se agitado. E era muito freqilente de-
1umcl11r a witar, a dizer palavras desconexas. Não se
l><Klin muL• donnir naquela casa. E não c:omentia o
moço que algubn o tocasse. Parecia posses.so
Lembrara-se, então o pai aflito de procurar o pas
tor, de pedir que f&se ver o rapaz e rezar por fie.
E lá se foi, depois do culto, o bom pastor, pela noi
te n dentro, em companhia do velho Souza.
Chegam, após uma lonp e penosa jornada.
Alegra-se o moço ao ver o antigo condisclpu]o.
Logo se afasta, porém, gritando desesperadamente:
- Não me toque! Não me toque!
- Mas, João! Eu sou o seu amigo Américo. Vim
de propósito para visitá-lo. Vamos, dê-me cá um abra
ço. Vamos conversar. Tenho muito que conversar
com você.
- Não me toque! Não me toque!
- Fique sossepdo, João. Al6m de amigo, sou
também o seu pastor. Vamos f117.er uma oração.
E ajoelhou-se, derramando a sua alma numa da
quelas orações de que nunca se poder! esquecer quem
uma vez as ouviu. i que êle falava mesmo com Deua.
Imediatamente ficou tranqiülo o moço, completa
mente calmo, cessando para sempre aquelas estranhu
perturbações.
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Contava aos filhos, em linguagem simples, adapla
da à sua mentalidade, as histórias da Blblia.
O "culto doméstico" reunia logo cêdo, anles do
café, em tamo da mesa, a familia tada.
O chefe da casa presidia o culto. Cantava-se, de
inicio, um hino religioso; lia o pai, a seguir, um salmo
e um outro trecho da Blblia, que comentava de modo
ameno e sugestivo. Aliás, lia @le a Escritura com tan
ta alma, com tanta expressão, que era quase desneces
sário comentá-la. Foi com êle que aprendi a fazer a
"composição de lugar" para a oração mental.
Após a pequena palestra, outro hino, a que se se
guia a oração, que cada um fazia, espontlnea, a come
çar do menorrinho e acabando pelo chefe da casa.
E com o "Pai Nosso", rezado coletivamente, aca
bava-se o culto. Todos, então, se abraçavam e se bei
javam. E passava-se ao café.
Era dessa maneira que começavam os dias na casa
do Rev. Américo de Menezes.
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"A CASA DOS ESCORPIÕES"
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ELO HORIZONTE - 1915.
Desenvolvendcrse ràpidamente a nova
capital de Mi.nas, deliberou a Igreja Presbi
teriana fundar ali uma comunidade, a e1<em
plo do que j' tinham feito os evangélicas metodistas.
Renuncia, então, o Rev. Américo ao pastorado da
Igreja de Lavras e aceita o p6sto diflci1 de pioneiro em
Belo Horizonte.
Em se tratando de um campo novo, a Missão nor
te-americana auxiliaria na lllBlU l lençio do pastor, que
receberia . . . 250 mil réis por mês (!), ficando, porém,
a seu cargo o pagamento de metade do aluguel do u
lão de cultos . . .
Era, por todos os motivos, um lllgar de sacriflcio.
Certo, porém, de que e Causa da Verdade estava
em j6go, segue o Rev. Américo para a capital mineira,
onde chega a 1.0 de julho de 1915.
Procura casa durante vmos dias. Não encontra
nenhuma que esteja para alugar, a não ser "a casa dos
escorpiões". Era um prédio em que ninguém tinha
coragem de morar, tantos os escorpiões que nêle havia.
- Mas se Deus quer que eu venha para á e não
há outra senão esta, ser' nesta casa que haveremos de
morar. Quem tapou a boca aos leões nos hã de livrar
dos escorpiões.
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Instala-se, pois, com a familia, na ºeasa dos escor
piões", cuja fama não tarda a confirmar-se. Parece
que todos os escorpiões de Belo Horizonte, - onde
eram numerosos êsses aracnldeos -, se haviam con
centrado alL Quase não se passa um dia sem que apa
reça pelo menos um! Ao fim do primeiro ano tinham
se capturado e posto num grande vidro, cheio de ál
cool, cfrca de trezentos!
Várias vkes quase se dá um desastre. Um dia,
ao calçar um sapato, sente o Rev. Américo qualquer
coisa dentro dêle. Sacode-o, e sai correndo .. . um es
corpião! Doutra feita, sente D. Isabel subir alguma
coisa pelo vestido. Sacode-o energicamente e cal ao
chão . .. outro escorpião!
Também me lembro de se ler dado coisa parecida
comigo mesmo. Descalço, ia descer um degrau que
dava para uma varanda; por poucos eentlmetros deixei
de pisar num dos terríveis inimigos.
Não parece milagre o fato de ninguém ter sido vi
timado, durante quatro anos, na "casa dos escorpiões"?
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"PREFIRO VER O MEU FILHO MORTO"
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r 'l
I I�
IM SABER como vai o seu filhinho Horlkio.
,'· Soube que estava passando mal .
- Muito obrigado, meu caro amigo. Muito
• J me sensibiliza a sua gentileza. Infelizmente,
porém, pelo que me disse o nosso médico, o Dr. Virgl
llo Machado, não h.6 mais esperança nenhuma. EstA
mesmo desenganado o menino. Admira-se até o doutor
de que possa resistir, como tem resistido, uma crian
cinha de um ano! Imagine o senhor! o menino est.6 com
coqueluche, catarro sufocante, bronquite capilar e
pneumonia dupla; e, para completar o quadro, decla
rou-se também a meningite. I!: um caso Inteiramente
perdido.
- Então est.6 desenganado . . .
- I!: o que diz o médico, meu caro amigo. E . . .
embora com o coração em pedaços . . . s6 me resta di
zer, como Job: "O SenJiar o deu/ O SenJiar o tit-ou!
Bendito seja o Name do Senhtw!"
- Então, uma vez que os médicos nada mais �
dem fazer, permita-me, Dr. Américo, que lhe diga uma
coisa. Aliás, para isso é que vim cá. Ontem, na Fe
deração Espirita, um esplrito do astral declarou que o
seu filhinho Iria morrer.
- O nosso médico também . . .
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- Sim; mas acrescentou que se lhe d6semos des
sa agua o menino ficaria curado.
Dizendo isso, tira do bôlso um vidrinho e o apre
i;enta ao pastor.
Delicada mas firmemente responde o Rev. Amé
rico:
- Sr. Inocfncio: agradeço de todo o coração o in
terêsse que manifesta pela saúde de meu filhinho. Mas
não me é passivei aceitar esse presente seu. Prefiro
mesmo ver o meu filho morto sôbre uma mesa a lhe
dar desta água, pois o espiritismo é categoricamente
condenado pela Palavra de Deus.
- Mas . . .
- Não, meu bom amigo, peço que me desculpe,
mas não posso aceitar, de modo nenhum.
E o bom espirita, desapontado, e admirado diante
de tal firmeza:
- Bem que minha mulher me disse que o senhor
não haveria de aceitar . . .
- Ela teve razão. Não posso. :E: uma questão de
consciência, de fidelidade aos meus principias, de coe
rência.
Ficam ambos cm silêncio durante alguns instantes.
Súbito, o Rev. Américo pega o vidrinho que ficara sô
bre a mesa e dirige-se de novo ao seu amigo. que jó fa
zia menção de retirar-se:
- Não me leve a mal, Sr. Inocêncio; permita-me.
entretanto, que lhe coloque no bolso o seu "remédio".
Porque, apesar de j6 desenganado o meu filhinho, re
solvi pedir a Deus que o cure. E Deus vai atender a
minha oração.
- !?!
- Vai, sim, meu amigo. Pedirei a Deus que nos
conceda essa graça como prova de que o espiritismo está
errado. E como sei quP Deus me ouvirá, quero que
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lrv'" o sc-u vidrinho, para que nio suponha que dei des
•• ÂAUR ao menino, às escondidas.
- E.'111 bem . . . se assim deseja . . . sinceramente,
luço votos por que Deus o ouça. Mas . . . os esplritos
cl1J1Lwram que o menino não se salvará . .
Despede-se o visitante.
Com o coração nas mãos, sentindo sabre os om
bros a imensa responsabilidade que assumira com ati
tude tio inesperada, vai o pastor para o seu escritório,
passa a chave na porta e cai de joelhos:
- "Meu Senhor e meu Deus! Vem em socorro do
Teu servo. Cura essa criança; cura-a, Senhor. Se a
quiseres levar, leva-a mais tarde, o que será talvez ain
da mais doloroso para o meu coração de pai. Mas ago
ra, não: para que fique demonstrada, irretorqulvel
mente, a falsidade do espiritismo."
Durante duas horas continua em fervorosa oração.
Sentindo-se, afinal, ouvido e atendido, a fisionomia
transfigurada, vai para o quarto em que agoniza o me
nino. Sua esp&a, profundamente abatida, lá está, cer
cada de amigas e vizinhas solicitas, à espera do instan
te fatal.
A expressão alegre do pai, que entra de repente
no quarto e a todos cumprimenta alàvelmente, espan
ta os circunstantes.
Maior a surpresa ao dizer êle à esp&a, na presen-
ça de todos e em voz alta:
- Isabel, o menino não vai morrer.
- O menino . . . não vai morrer?!!
- Não; não vai.
- Mas . . . se já está com meningite . . . já está com
as mãos . . . os � frios . . . :t verdade que, ao desen
ganá-lo o médico, eu disse que às vêzes a cihlcia cruza
os braços mas Deus continua . . . Mas agora tudo mos-
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lra que DeU!I o quer levar . . . veja, Américo, como est6
o menino. . . está agonizante j6 . . . está morrendo . . .
- Isabel! Ou cremos ou não cremos! - retruca
energicamente o Rev. Am6rico.
E ac:rescenta:
- Eu pedi ao Senhor que o não levasse; para dar
uma demonstração de que estão errados os nossos ami
gos esplritas; e sei que o Pai celestial atendeu a minha
oração.
Dito isto, retira-se para repousar. E dorme pro
fundamente durante virias horas.
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- Nada, doutor. Apenas pedi a Deus que o curasse .
Nada mais • • •
- Então foi a.se . . . o remédio?
- Sim, senhor: a oração.
E, após um longo silêncio, profundamente impres
sionado, diz o médico:
- Agora posso dizer que ji vi um milagre • • • com
os meus próprios olhos . . .
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"Sô EM CASO DE MORTE"
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NTRE OS PAnlS do Rev. Américo de
Menezes encontrou-se êste regulamento de
-
t>i<la (ano de 1916) , que muito se parece
com o de um retiro espiritual:
Terças, Qulnw e Saw
8 m levantar-me, onçio, glnátka, onçio
7-7)llJ culto clammtlco
7,30-8)10 prepon> mplritual (leitura da Blblla, med.1-
taçia • onçio)
8,30-9 - blblle»
9-10 mtudo do Hebraico
10 olm6ço
11-18 tnbelho do dia
18,30 jantar
17-18 mtudo do Gnso
18-19 estado do Portusulo
19-20,!0 ma"rlu proped6utlcu e teolOllla
21-22 preparo aplrltual (oraçlo)
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conselhos prãUcos, o meu primeiro caderno de esboços
de sermões, escreveu êle certa vez:
uSe tiveres cinco minutos para preparar um ser
mão, gasta quatro em oração."
E era assim que êle fazia.
Quando ia recolher-se em oração, antes de se tran
car no seu escrit6rio, virava um cartão que conservava
pendlll1ldo na porta. Dum lado havia uma bela estam
pa do Bom Pastor. Doutro a frase, que, então, ficava
à vista:
llÃO BATAM
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INSTANTANEOS DUMA ALMA
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A 'OLTIMA PAGINA de um livro acha
ram-se alguns pensamentos de Américo de
Menezes com uma nota explicativa: -
"Pe1U11mentos eocntos depois de gra11de1
lu14.1 moreia'' -, e que são, de fato, uma fotografia
moral de seu autor:
"O dever nio se discute."
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"Prefiro suspirar, gemer e chorar aos pés de Jesus
do que rir nos braços de Satanás."
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Quanto à ment ira era radical: nem "1.0 de abril",
nem papai-noel havia em nossa casa. Mesmo porque
um dia saberiam os filhos que o pai tinha faltado à ver
dode. E ainda havia um outro motivo mais forte: ao
descobrirem m filhos que o papai-noel era lenda, po
deriam imaginar que a história do Natal também o
era . . .
Se ia visitar um amigo da familia, perguntava, an
tes de sair, à esp&sa:
- Quer que dê lembranças à mulher de Fulano?
Era incapaz de dizer o que não fôsse a expressão
exata da verdade.
Em matéria de pudor, então, era verdadeiramente
angélico, o que se verificou até mesmo na última doença,
ao necessitar do auxilio dos enfermeiros ou dos médi
cos. Era por isso que tanto amava a oração e tanto al
cançava do Pai Celeste.
Colecionou Américo de Menezes algumas poesias
de sua lavra, que pretendia publicar mais tarde sob o
titulo de "Rimaa d'outrora".
:E: pena terem ficado várias delas inacabadas. Tô
das, porém, repassadas dum sentimento profundamen
te filial, de tenússima pieclade.
A!i que se seguem são do tempo passado em Belo
Horizonte (1915-1918) , em que se lhe intensificou so
bremaneira a vida espiritual. Duma encantadora sin
geleza, bem retratam o que lhe vai nahna.
KA.GUAS lNTDlAS
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t a Ti � J>TOCUro, Smhar,
P'ra eontar-te o que rinto em meu peito;
Nenhum homem ComJ>Temde e&111 d6r,
Como Tu, que em ciência ú perfeito.
MEDITAÇÃO
(Hino)
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O dia se avizinha . . .
Tão grande . . . "entuToso . . .
Em que na Eteniidade
TeTei per-feito gôzo!
ABRINDO A BfBUA
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Dd-me a Jôrça ld doa céu.a
Para a Tua lei cumprir,
E hei de honrar o nome Teu
No presente e no ponrir.
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EXTRATOS DUM DIARIO
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• S ANOS PASSADOS na capital mineira
foram, como já se disse, de notável Pl'Olres·
so espiritual; e de 11randes dificuldades
materiais.
Infelizmente s6 durante pouco tempo escreveu o
Rev. Américo o seu "di6rio", que conl<!m apenas umas
cinqüenta páslnas; que nos revelam, porém, a sua fé
robusta, a sua confiança ilimitada em Deus, que para
êle não era um mito, uma lenda, ou um ser lonsfnquo
e indiferente à sorte dos home113, e sim um Pai amoro
so e acesslvel, sempre atento ao clamor de seus filhos.
Com que simplidade e confiança se dirigia ao Pai
celeste !
Era literalmente que interpretava a promessa de
Nosso Senhor: "Tudo o que pedirdea ao Pai em meu
nome o receberei.a.,,
Por essa época, com o nascimento de Paulo, eram
já quatro os seus filhos vivos. Maiores, pois, as des
pesrui com a manutenção da familia.
Julgando que se deveria dedicar exclusivamente
ao rninisl<!rio, foi com mil dificuldades que viveu du
rante algum tempo, tanto mais que wna congregação
nascente, como a de Belo Horizonte, ao contrário do
que acontece com as comunidades mais numerosas, não
97
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poderia contribuir com o neces.oário para a manutenção
do seu pastor.
Como ficou dito j6, recebia da Missão um auxilio
mensal de apenas 250 mil réis, ficando-lhe ainda a obri
gação de pagar a metade do aluguel do salão de cultos.
Além disto. assumira, quando pastor em Lavras,
um compromisso financeiro de que não se libertara
ainda. E que, pensando na situação precarlssima em
que deixaria a familia no caso de vir a falecer, toma
ra-se sócio remido de uma sociedade de seguros de
vida, "A Univeraal".
Tomou, pan isso, um empréstimo a um amigo.
A sociedade faliu e a divida ficou a lhe pesar nos om
bros durante muito tempo.
O registro dessas dificuldades reflete, entretanto,
a sua fé ilimitada na Providência Divina.
Apreciemos alguns trechos do "di6rio".
Novembro, 2 (1915)
Acabo de somar as minhas contas. Vi que os
S4t600 que tenho de receber não dão para pagar.
Derramei a minha alma em oração. Estou à es
pera de resposta.
Olho para a folhinha e vejo: "Acaso pode Deus
preparar-nos uma mesa no deserto? Eis que feriu a
penha e águas correram dela. . . Poderá também
dar-nos pão?" Sal. 78: 19,20.
NovembTo, 6
Minhas necessidades são grandes. Senhor, socor
re-me!
98
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Leio Mateus, VI e recordo-me da declaração conso
l11dora: "Vosso Pai Celestial bem sabe" de tudo islo.
Novembro, 9
Graças ao Senhor!
O Senhor me ouviu. Livrou-me de todos os mewi
temores. me veio ao meu encontro e me libertou.
Grande é o poder da oração!
Dezembro, 4
Passei uma hora em oração, depois de estudar e
meditar a Blhlia efrca de uma hora. Agradeci e pedi
a Deus muita COU98. Pedi também que mandasse hoje
os 40S de que estou precisando para completar o alu
guel do salão de cultos.
Cêrca de meia hora depois da oração, recebo os
40$. Graças a Deus!
Permanecem minhas dificuldades particulares. "O
Senhor proverá".
Dezembro, 7
Dificuldades enormes. Humanamente insolúveis.
Senhor, socorre.-me!
Estive prostrado aos pés do Senhor a suplicar res
posta.
Dezembro, 8
Senhor, estou necessitado. Socorre-me!
Dezembro, 9
Continuo a esperar pelo meu Libertador.
me me animou hoje pela oração e pela Palavra.
Dezembro, 1 7
Andei imerso numa nuvem d e tristeza por causa
das dificuldades em que me acho.
99
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Fraqueza humana. Leio Mal. 17: 20, Mal. 21: 21-
22, Mar. 11: 23-24. Recordo alguma coisa sabre Jor-
11e Muller.(I) A11ora vou orar.
Estou mais animado.
Leio mais a Escritura.
Pouco depois traz o correio wn vale de 2801200,
obtido s6 pelo poder de Deus! Como Deus é bom! Já
agradeci a Deus, muito comovido. Tudo salvo!
Fe1>ereiro, 27 (1916)
Passaram-se dias de lutas, tentações, regozijo es
piritual.
Acht>me outra vez em dificuldades. A Congre
gação também. Senhor, socorre-nos!
Estive lendo v6rios salmos consoladores (40 a 44) .
Depois orei.
Ainda não estou satisfeito. Vou orar mais.
Levant<Hne da oração. O Senhor põs wn pensa
mento consolador em meu coração: "Se tu visses o teu
filho assim, como eu te vejo, e tivemies poder de aliviá
lo, como eu tenho, não o tirarias das suas dificuldades?
- Sim, Senhor.
- Queres ser mais amoroso do que eu? Por que
não confias em mim?
- Perdoa, 6 Pai, perdoa. Confio, sim; eu confio."
Março, 2
Graças a Deus! Obtive resposta no que diz re5-
peito a minhas dificuldades presentes. Graças a Deus!
100
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Março, 9
Recebi ontem mais uma resposta a minhas orações.
Solveram-se grandes dificuldades. Ainda tenho ou
tras, que submeti à consideração do Senhor.
Senhor, tu que não falhas, segura o teu filhinho
abatido. Socorre-me, Senhor!
A J>Tópria ezperiência noa en.rifla que hd um Deu.s
t>ivo no cfu, que ouve as orações de •CU• filhos, em
nome de Criato.
Julho, 13
Recebi vârias respostas do Senhor; mas ainda te
nho grandes dificuldades financeiras. Senhor, socor
re-me!
Essas düiculdades cresceram devido ao Honlcio
ter estado mwto doente, desenganado pelo nosso mé
dico. Teve catarro sufocante, etc. Estêve às portas
da morte. Sofreu muito! mas eu pedi por êle e o So
1 me ouviu de um modo adminlvel. Graças se
ber1110
jam dadas ao Senhor!
Agora, Senhor, eu peço que, com a tua própria
mão, que bondosamente me feriu, venhas par o bál
samo do teu cons6lo. Não te demores, Senhor!
O Eurlpides também estêve muito doente nos dias
em que Honicio estava passando mal. Pedi ao Senhor
que curasse meu filho e &e me atendeu. O Senhor é
misericordioso!
Julho, 15
Admirável! Como Deus responde às minhas ora
ções! Hoje eu estava pensando como saldaria um
compromisso, e Deus, mw bondosamente, arranjou
tudo.
Tenho outras dificuldades, e grandes; mas o Senhor
proverá.
101
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Umts obsen1ação: Quando tenho mais dinheiro do
que de costume, não sou tão pacienle como nas ocasiões
em que nio lenho. Benditas sejam as dificuldades que
me aproximam mais de Jesus o humilde coração.
Compreendi agora que estas coisas formam parte
necesúria da minha educação religiosa.
O mundo é uma escola.
Janeiro, 6 (1917)
Nunca principiei o ano com t.anto preparo espm
tual como em 1917. Espero grandes bênçãos do
Senhor. Vejo-me em grandes dificuldades e, ao mes
mo tempo, tendo de assumir grandes responsabilida
des. "O meu socorro vem do Senhor, que fêz o céu
e a terra."
Março, 29
Estou sem dinheiro nenhum. Apelo para Deus,
que me tem ouvido.
Por falar nisso, registro aqui uma resposta maravi
lhosa a minhas orações. Eslava doente de tétano, de
senganado pelos médicos, o filho do Sr. Durval Lima.
Fiz oração e o menino já eslá passeando. Estas coi
sas me animam. ºEu sei em quem tenho crido."
MAIS ORAÇÃO
Do "Di6rio" ainda:
Julho, 17
Passaram-se mais alguns dias d e bênçãos e ten
tações e vitórias.
Tenho tido grandes lutas Intimas. Quantas vêzes
quero tirar umas duas horas para oração e leitura da
Bíblia e se levantam mil obst6culos!
102
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Resolvi, entretanto, dedicar pelo menos uma hora
à oração e outra ao estudo da Palavra de Deu•, bem
como uma hora de noite, aconteça o que acontecer,
apesar dos muitos e complexos trabalhos que tenho.
Quando passivei, dedicarei duas horas à oração.
DilJN"UGrri todo e qualquer lucro material ou in
leleclual que, porventura, tiveue nas duas horaa Tefe
ridaa.
Aa.S.10, 4
Lamento não ter dado outrora o lugar devido à
oração e à leitura e meditação da Escritura.
Desde o dia 17 sinto em mim uma nova animação,
quase que uma nova vida.
Observei os seguintes resultados das duas horas
de oração e de uma hora de leitura da Blblia:
1. Uma santa paz abundante.
2 . Maior confiança em Deus e maior amor.
3. Maior amor pela Escritura Sagrada.
4 . Um poder especial para orar e pregar que eu
nunca tive.
5. Mais ardor evangellslico.
6. Solução das mais urgentes dificuldades finan
ceiras.
7. Ordem, método de vida.
8. Uma fôrça especial para vencer as tentações
mais perigosas.
Tudo isto vem de Deus.
Confundem-se os que pensam que aaslar tempo em
oração é perder oportunidades de aen>iço. A ORAÇÃO i
UM VERDADEIRO TRABALHO.
103
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"Sem Mim, nada podeis fazn."
Graças sejam dadas a Deus!
Novembro, 13
Registro aqui uma experiência: quanto mais oro,
mais trabalho.
Como que cm resposta aos meus cuidados e peri
gos, tive ontem um sonho bem a propósito. Sonhei que
atravessava umas águas fundas por sôbre pontes es
treitas, levando nos braços o meu pequenino Horácio.
Como eu o apertava cuidadosamente nos meus braços!
No sonho lembrei-me de Deus como Pai me segurando
em Seus braços eternas, onlpolenles. "Não temerei,
porque Tu estã. comigo."
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PASTOR E PROFESSOR
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ODE-SE IMAGINAR o que era a atividade
pastoral dum homem que vivia assim mer
gulhado em Deus. Seus sermões eram de
fato um transbordamento de sua intenslssi-
ma vida interior. Perto d�le todos se sentiam bem,
fascinados, conquistados pela irradiação espiritual de
sua personalidade.
De porte nobre, distinto, sua passagem pelas ruas
vizinhas a sua casa era sempre notada. Se acontecia
ver um conhecido qualquer, fôsse rico ou fôsse pobre,
doutor ou simples verdureiro, tirava sempre o chapéu,
cumprimentando-o respeitosamente. Fazia-o como ca
valheiro, instintivamente, e como cristão impregnado
da idéia de que no próximo sempre vemos a Jesus
Cristo. E, como conseqUfncia natural, era por todos
respeitado; pelos que o conheciam s6 de vista e mais
ainda pelos que privavam de sua inlimldade.
Jamais, em hip6tese alguma, ousaria alguém pro
nunciar uma chocarrice, repetir em sua presença um
gracejo irreverente ou descaridoso; e muito menos uma
anedota de moralidade duvidosa.
t que não era apenas um convicto, mas um homem
que privava pessoalmente, e multas horas por dia, com
Jesus Cristo, através da oração. E essa comunhão tão
profunda, diária e ininterrupta com a Fonte de tôda
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santidade, leria de refletir-se no seu semblante, nos seus
atos, em suas atitudes. Sua presença influia automàti
camenle no ambiente em que estava. Santificava-o. Ain
da hoje, tantos anos depois de sua morte, a simples lem
brança de sua pessoa me eleva o pensamento. f: que
bem podio repelir com o Ap6stolo: "Para mim o viver
é Cristo." "Já não sou eu que vivo: é Cristo que vive
em miln."
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"Eis ai uma oportunidade para falar a respeito do
Evangelho", disse consigo mesmo. E no dia e hora
marcados Lá estava êle para provar, na própria sede da
Federação Espirita, a falsidade do espiritismo. Por
três dias consecutivos sustentou memorável polêmica
corn os disclpulos de Kerdec, conseguindo libertar a
vários dêles, que ali estavam, sinceramente, à procura
de Verdade.
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Terminado o ano. resolve o Rev. Américo deixar
o pastorado da igreja de Belo Horizonte, levando a fa
milia para Lavras, onde lecionaria no Ginásio e pasto
rearia algumas igrejas dos arredores da cidade. Era
o meio que se lhe deparava para manter os seus e ron
linuar a saldar as dividas que tanto o preocupavam.
Lamentando ler de dividir o tempo entre o pasto
rado e o magistério, escreve em seu "Diário":
"Firmo hoje um J>llClo, com o aw:flio de Deu•, de
dediair-me inteiramente ao miniatério 111grado, incon
dicionalmente, logo que eatejam nonnalizadas as mi
nhiu finanças.">
Deus me tem abençoado muito. Ainda estou lu
tando em pleno mar, às vêzes no melo de tempestades
horrendas, como agora; mas, por entre os vagalhões do
mar, eu chamo por Jesus.
Senhor, eu te amo, Senhor, eu sofro. Senhor,
misericórdia!
Outra vez me entrego nas luas mãos, a mim, Isa
bel e meus filhinhos, que são teus também.
Senhor, escuta-me!"
110
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rio. As de português, então, eram notáveis, sobretu
do pelo cunho prático que lhes dava.
Mas é unânime o testemunho de seus antigos dis
clpulos: a pessoa do mestre é que mais os atraía e em
polgava. Era uma delicia conviver com aquêle ho
mem, que a urna cultura multilária unia uma piedade
até então nunca vista. Apaixonado por Jesus Cri.•to,
sabia, porém, ser discreto na cátedra. Uma oportuni
dade, entretanto, se lhe oferecesse, e a alma transbor
dava! E era um hino de louvor "ao Redentor amado"!
1ll
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Quando o bom Deiu vos chamar,
Para no1 céua deacamar,
Tal como o eapilho em peda�,
Multiplicando OI semblante•,
Vóa oivereia como dante•
Do no11<> 4nimo nos traço1.
112
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Meu coração moribundo
Não enronlra alh>io alfim?
113
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" a fllrça para preforir a vontade de Deus, ainda mes
mo que à custa de sofrimentos e lutas.
Outro lamento que lhe escapa do coração amar
gurado:
t DEMAIS!
114
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Eram vitórias s6bre si mesmo, era a fôrça quC' o
Poi lhe dava para sobrepôr-se às mesqui nharias dos
que lhe invejavam a crescente popularidade.
Quanto mais sofria, mais para perto de Deus che
gava.
Lembro-me de que um dia demorava a aparecer
para o alm6ço. Sabiamas apenas que deseera ao "quar
to das malas". :tsse quarto, em que se guardavam as
malas dos alunas internos do Ginásio, ficnva no p<>rão
do ºdormitório n.0 211• Curioso, fui ver o que fazia
meu pai. E lá estava êle, de joelhos, em colóquio com
Jesus!
Nunca mais me saiu de lembrança aquêle quadro!
Era o mesmo homem que, nos tempos de estudan
te, na lavoura daquele mesmo Ginásio, terminava o
mais depressa passivei a sua tarefa para se esconder
na mata a firo de orar . . .
115
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seu velho amigo Rev. Alvaro Reis, transfere-se para
n Capital da República, onde chega a 31 de janeiro de
1920.
Vai iniciar, aos trinta e três anos, o último lustro
de sua vida!
Interessado em liquidar as antigas dividas, aceita
também o lugar de professor do Colégio Batista, onde
chega a lecionar doze matérias duma vez! As aulas
do Seminário eram noturnas. A coadjutoria da "Igreja
do Rio" era o pastorado de tadas as congregações pres
biterianas dos subúrbios cariocas, que visitava aos do
mingos e no meio da semana.
Lecionando o dia todo e até tarde da noile, conti
nuava, entretanto, a mesma vida intensa de oração, pre
gava às suas congregações e visitava os paroquianos.
Residindo perto do Hospital Evangélico, ainda era cha
mado freqüentemente, e não raro de madrugada, para
levar o conf6rto espiritual a enfêrmos e agonizanles.
E não deixava de dirigir também o seu "culto do
méstico'', em que reunia t&las as ffianhãs a famUia para
louvar o Senhor.
Durante um ano ainda pasloreou a igreja de Nova
Friburgo, que visitava uma vez por mês.
Foi um perlodo de penosa e sobre-humano alivida
de, a que se entregou por esplrto de aposlolodo e pela
necessidade de suprir o ordenado Insuficiente que re
cebia como pastor e professor. Mas a sua saúde pa
recia de ferro, embora estivesse sendo impercepllvel
menle minada.
Sua fama de pregador se espalhava cada vez mais.
Quando se anunciava que ia pregar em qualquer lugar
o Rev. Prof. Américo de Menezes, acorriam grandes au
ditórios a ouvir aquela alma de fogo, que lhes punha
Jesus vivo, presente ante seus olhos.
116
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Todavia, quase que s6 tinha tempo de ler, escre
ver e preparar os seus sermões nas viagens que fazia
de bonde todos os dias Indo ou vollando da Faculdade
de Teologia. Mesmo ocupado assim, continuavam a bro
lar-lhe d'alma aquelas poesias repassadas de amor e de
fé. Nesse último perlodo eram sobretudo hinoo reli
giosos que escrevia. Vale a pena lranscrever algun•
dêles, em que wna alma delicada descobrir6 por certo
riquezas imensas:
CONFITEOR
(Hi110)
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Ligado sempre agora
Por um tão grande amor,
Serei, aem ma.ia demora.,
Teu franco aeguidor.
(Rio, 20-11-1921)
CONFIANÇA
(Hino)
Naa mãoa entrego o meu destino,
tuaa
Grande e bondoao Deua!
Ainda mesmo quando não atino
O fim dos paaao1 meua.
ESPERANDO NO SENHOR
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Como é bom contar tudo ao Senhor
E a respoata divina esperar;
Inda mesmo chorando de dor,.
Nem de leve jamais duvidar!
Dize, pois, o que queTea de mini,
E farei, meu Senhor, tua vontade;
Eu aou teu para aemyre, •em fim,
Deua de amor, de justiça e oenl.ade!
INVOCAÇÃO
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HINO 00 TRABALHOR CRISTÃO
(Rio, 1 . 6 . 192�)
120
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CONSEUIOS DE PAI
(Rio, 23-9-1924)
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VERSICULOS GRIFADOS
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• ANIFESTOU alguém um dia a sua admi
ração por ser o Rev. Américo Ião moço e
ter uma Biblia tão velha. Não era velh'1,
prõpriamente, mB!I usada, muito usada.
Costumava grifar os verslculos que mais de perto
lhe falavam ao coração. lmposslvel reproduzi-los. Se
ria necessário copiar a Blblia tôda, quase. Alguns,
porém, talvez convenha citar, que êsses grifos geralmen
te refletem a alma de quem os faz.
Escolhamos alguns do livro dos Salmos, que tanto
apreciava e de que lia largos trechos todos os dlB!I: -
"Muilas são as ariiçõeo do justo, mas o Senhor o
livra de !adas." (34 .19)
"Descansa no Senhor e espera nêle" (37. 7)
ºInvoca-me no dia da angústia e eu te livrarei."
(50 . 15)
"De !arde e de manhã e ao meio dia orarei; e cla
marei e êle ouvirá a minha voz." (55 .17)
"Lança a tua carga sõbre o Senhor e êle te sus
tentará; não permiürá que o justo seja abalado."
(!\5.22)
125
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"Quem tenho eu no eéu senão a li? e na te1Ta não
hú quem eu deseje além de ti. (73 . 25)
"De madrugada, Senhor, te esperará a minha ora
ção." (88. 13)
"Bendize, 6 minh'alma, ao Senhor, e tudo o que
há em mim bendiga o seu santo Nome.
Bendize, 6 minh'alma, ao Senhor, e não te esque
ças de nenhum dos seus beneficias." (103: 1 e 2)
Salmos como o 23, o 46, o 86 e outros, estão grifa
dos pràticamente do principio ao fim.
126
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"Tudo é passivei ao que cre." Me. 9: 23
"Em verdade vos digo que qualquer que disser a
êste monte: Ergue-te e lança-te no mar; e não duvidar
em seu coração, mas crer que se fará aquilo que �le
diz, tudo o que disser lhe será feito. Portanto vos digo
que tudo o que pedirdes, orando, crede que o recebe
reis e t�lo-eis." Me. 11: 22-24
121
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"Porque era homem bom, cheio da Espirita Santo
e de fé. E muita genle se uniu ao Senhor." At. 11: 24
"Porque a nossa leve e momentãnea tribulação
produz um pêso eterno de glória mui excelente" . . .
li Cor. 4: 17
128
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DERROTANDO AS "TESTEMUNHAS
DE JEOVA"
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m OM O NOME de "Estudantes da Blblia",
instalaram-se no Rio de Janeiro, iniciando
intensa propaganda, principalmente entre os
evangMi.cos, o• sectários mais conhecidos
hoje como 'Testemunhas de Jeová", que, a julgar pela
literatura dissolvente que difundem, nio passam, na
realidade, de uma fôrça de vanguarda do comunisnv1
internacional.
Consideravam preferlvel penetrar primeiro no
meio protestante, onde certamente deveria haver des
contentes, que, com mais facilidade, poderiam atingir
e agrupar. E chegavam ao ponto de publicar desafios
até para discussões públicas.
Resolveu, então o Rev. Américo de Menezes ir as
sistir, na própria sede dos "Estudantes da Blblia", ou
ruuellita.1, a uma conferência anunciada para o dia 7
de setembro de 1924.
Nio passou, porém, a tal "conferência" de uma
simples preleção com projeções luminosas s6bre o in
ferno de Dante, com demônios de espêto, fogo, enllÔ
lre e mil torturas materiais: uma caricatura das mais
Krosse iras da doutrina das penas eternas.
Pedindo licença para um aparte, declara o Rev.
Am6rico não ser @sse o autêntico ensino cristão a res
pt'llO do B11Sunto. E em vista do desafio geral publi-
131
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cndo pelos "estudantes", propõe-lhes uma discussio i pú
blica sôbre l!sse e outros pontoo controvertidos.
Tergiversa o dirigente, declarando por fim não
aeeitar a discussão visto não ser o Rev. Américo re
presentante de tôdas as denominações evangélicas. Po
deria o Rev. Américo franquear a sua casa e dar am
interessadm as suas explicações em particular . . .
- Mas os principias que vou defender são susten
tados por tôdas as igrejas cristãs. E os senhores publica
ram um desafio. Quero, pois, wna discuasiio pública.
E a respeito do inferno, que os senhores negam.
Constrangidamente, acabam aceitando a proposta.
No domingo, 14 de setembro de 1924, estava reple
to o salão dos "estudantes da Blblla".
Combinara-se que não haveria apartes: o pastor
falaria 40 minutos, o sr. Manley Dlenst, chefe dos "rus
sellitas", outrm 40 minutos; com réplica e tréplica de
20 minutos. O "russellita" encerraria a discussio i . Pe
diu êste, porém, para falar uma hora seguida, perden
do o direito à réplica.
Aceitas as condições, assim falou o Rev. Am6rico:
"Ministro do Evangelho, que sou, havendo lido
wna espécie de desafio geral em um dos diárim do Rio
de Janeiro, procurei a sede desta sociedade a fim de
propor uma clJscussão pública s6bre vários pontm que
separam os evangélicos dm chamados "estudantes da
Blblia".
Depois de hesitações da parte dos "estudantes", foi
aceita a discussão, e aqui estou, contando com a luz do
céu, para falar sôbre a ICCilCIA
lTiN DAS PENAS rrzRNAll.
A base de tôda a controvérsia é a santa, a infall
vel Palavra de Deus.
Tratarei no cornêço dos seguintes pontos prelimi
nares:
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1 " - Qu" é o homem? t simplesmente matéria?
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J Epútola aos Cnrlntioa, cap. XII: 2: "Conheço um
homem em Cristo que hã catorze anos (se no corpo
niio sei, se FORA oo CORPO não sei: Deus o sabe) foi ar
reb.itado até o terceiro céu."
Por aqui se vê que hã alguma coisa que sai do cor
po, e pelos vers!culos seguintes se verifica que essa
parle que sai do corpo tem capacidade de ouvir pala
vras inefáveis.
- Apocalipse VJ: 9-10: "Quando abriu o quinto
sêlo vi debaixo do altar AS ALMAS (tas psychás) daque
les que tinham sido MORTOS por causa da palavra de
Deus e por causa do testemunho que mantinham. CLA
MARAM com uma grande voz: Até quando, Senhor, san
to e verdadeiro, deixas de julgar os que habitam sabre
a terra e dêles vingar o nosso sangue?"
Ainda mais. O homem tem poder de matar o cor
po, mas não de matar a alma.
Disse Jesus Cristo: "Não temais aos que matam o
CORPO, mas não podem malar A ALMA (psychen) . Mat.
X: 28
Então, o homem não é corpo s6, possui um elemen
to independente do corpo. Por isso diz.ia Sto. Estêvão
morrendo: "Senhor Jesus, RECEBE o meu esplrito."
(Atos VD:59).
Moisés morreu e ainda não ressuscitou. (Deutero
nômio XXXIV : � - Joã.o V: 28-29) . Entretanto, mil e
quatroeentos e tantos anos depois da sua morte, apare
ceu a Jesus Cristo no mllilte da transfiguração e con
versou com êle.
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Ser destruido, embora provisôriamenle, oh! que
lri•lc esperança! Mas que diz a Escritura?
- "Temos, portanto, sempre bom Animo e sabemos
<1ue enquanto estamos PRl'.SBNTES NO CORPO, estamos
AUSENTES do Senhor (porque andamos por fé e não por
visão) ; temos bom Animo, digo, e antes queremos estar
ousenles do corpo e presentes com o Senhor." (ll Epís
tola aos Corlntioa, cap. V, vers. 6 a 9) .
- "Para mim o viver é Cristo e o MORRER É LUCRO.
Mas se o viver na carne resultar em fruto do meu tra
balho, não sei então o que hei de escolher. Porém de
ambos os lados estou em apêrto, porque tenho a DESEJO
DE PARTIR e estar com Cristo, pois é muitíssimo me
lhor. . . (Epistola aoa Filipenae1, cap. I, vers. 21 a 23) .
- "Jesus, lembra-te de mim quando entrares no
leu reino" - disse o que rara ladrão e que estava mor
rendo arrependido perto do Salvador. "Em verdade te
digo que hoje estar6s comigo no paraiso." (Euangelho
de S. Luca1, cap. XXIII, vers. 42-43.)
De aclirdo com a Escritura o paralso, no Novo Tes
tamento, é o terceiro céu, lugar onde São Paulo, arre
batado, ouviu palavras inefáveis. (II Epí11ola aos Co
rinlioa, cap. XIl: 1-5) .
Para Jesus Cristo, que é Deus bendito por lodos os
séculos, a morte não é destruição: é, sob o ponto de vis
te físico, a separação entre a alma e o corpo, conti
nuando a alma com t6da a sua consciência. Haja vis
ln n parábola do rico e Lázaro. (Evangelho de S. Lu
caa, cap. XVI: 19-31.) Por ela se vê o gôzo do cristão
10110 ap6s a morte.
t êste pensamento que conforta os crentes, arran
<·nndo dos lábios moribundos serenos hinos de espe
rança:
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"Como hd de aer, conclU14 " IOftOll lida,
FmdA " pele;.. dA P"izüo mortal,
Quando, A11iatanclo AUm dA eacurn oicla
A portA do J>TAZer celenial,
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Neste sentido principahnente foi que Deus disse a
Adiio: "Mas da árvore do conhecimento do bem e do
mal, dela não comerás: porque no dia em que dela co
meres, certamente mol'11!rás." (Gêne.ris D: 17.)
Assim ficam bem claras as palavras do Altlssimo:
"A alma que pecar, essa morrerá" (Ezequiel XVID:
20) .
Tendo visto que o homem não é sàmente pó: pos
sue um elemento superior, - a alma; tendo ficado cla
ro que a morte flslca é a separação entre a alma e o
corpo; havendo nós provado que logo após a morte a
alma permanece cônscia; provado que elliBte uma YJDA
que a Escritura chama de 11oan, apesar de o individuo
vivê-la no pleno g&zo das suas faculdades, - provare
mos agora que ESSA 11oan ESPIJUTIJAL EXIBTll TAKÚll
ALÉM TÚMULO, para sempre, sem fim.
Compreender tada a razão desta doutrina blblica,
é-nos imposslvel por enquanto. Doutrinas b! profun
díssimas que por ora não podemos compreender devi
damente: o pecado dos anjos, a Trindade, a elelçio, as
penas eternas são eJ<emplos dessas doutrinas transcen
dentais. Mas, senhores, estamos cercados de mistérios.
- Que é a eletricidade?
- Que é a matéria?
- Que é a fôrça?
- Que é o movimento?
- Que é o átomo?
- Que é o éter?
- Que é a substincia?
- Que é a célula?
- Que é a vida?
Nndn de arrogAncia. Curvemos a fronte. Aceite
mos a palnvrn de Jesus. !!e não engana. "Eu, disse
137
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um poeta inglês, eu acompanho a Jesus ainda mesmo
pelo meio do inferno."
o RESPONSÁVEL por esta doutrina - as penas eter
nas - ê o próprio Jesus.
No Antigo Testamento já se conhecia esta verdade;
mas nenhum profeta falou sôbre ela de um modo tão
impressionante, tão forte, tão categórico como Jesus.
Dir-se-ia que Deus esperava a manüestação supre
ma do Seu amor, para falar com ênfase sôbre a sua jus
tiça santa e tremenda. Vejamos a Palavra de Deus,
com espirito de humildade e oração.
- Evangelho segundo S. Marcos, capitulo ID: 29:
"hos d'an blasphemese eis to pneuma to hagion ouk
.echeiaphesin eis ton aiona, alla enochos estin aioniou
hamartematos." - Tradução: "Qualquer, porém, que
blasfemar contra o Esplrito Santo, NUNCA ollTBllÁ PER·
DÃO, PARA SEMPRJ:, mas será réu de eterno julzo." (Gre
go: réu de um eterno pecado.)
Todo o pecado merece condenação equivalente.
Ora, há um pecado eterno - segundo disse Jesus
Cristo.
Logo, segundo disse Jesu• Cristo, há uma condena
ção eterna, equivalente a êsse pecado eterno.
- Quando vier o Filho do homem na sua glória, e
todos os anjos com êle, então se assentará no trono da
sua glória. Tôdas as nações serão reunidas diante dêle,
e separará uns dos outros, como o pastor separa as
ovelhas dos cabritos; porá as ovelhas à direita, mas os
cabritos à esquerda . . . Dirá também aos que estive
rem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos,
para o fogo eterno, destinado ao diabo e seus anjos . . .
Irão êstes para o SUPÚCIO ETICllNO, porém os justos para
.a VIDA ETICllNA. (S. Mateua, cap. XXV: 31-33; 41: 46.)
Eia ton aiona - para sempre. Eia to PlfT aianion -
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pnru o Eia kola.ain aionion - para o su·
fogo L"lt-rno.
pHcio eterno. Eia zoen oionion - para a vida eterna.
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Marco• X: 30; Luca.a XX: 35; Mareo1 m:29.)
O que se dá com a palavra aionioa ou holam, .!A
se também com o nosso vocábulo •empre. Exemplo:
&e anda SDIPBB triste. Deus existe llDIPU. li.e ser6
escravo para sempre. Deus existe para sempre.
Resumindo: se o sêr existe neste mundo como Oné
simo (Filemon, 15). então a expressão aem ftm se re
fere a êste mundo; se existe no mundo além, como a
alma e o diabo, então a locução referida está empre
gada no sentido próprio, não tem fim, eomo Deus e o
g67.o futuro dos redimidos não têm fim.
Passemos agora a considerar
O SHEOL E O HADES
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X XX l l : 22; Provérbio• V: S; IX: l8. Da! o solene aviso
11<• lkus. A tradução de inferno nestes casos é bem
�1pl'o1n-iada. Mas inferno, dirá meu adversário, q uer
dizer hlQar inferior.
Adotou-se a palavra inferno, que estava em uso,
•impll'Smente para traduzir a idéia expressa pelo uso
hebráico, não se fazendo caso das idéias pagãs ligadas
b 4!•te vocAbulo. O mesmo se fêz com os t!rmos pinV,
:oe, pneuma e logoo, que, no grego clássico, t!m sig
nificação diversa da que se acha no Novo Testamento.
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Hade•. - l!: a palavra pela qual os setenta tradu
zirwn •heol. Tem no Novo Testamento os mesmos dois
sentidos do Antigo Testwnento: punição e sepultura.
1. A parábola do rico e Lázaro prova que o hades
é lugar de sofrimento, e sofrimento eterno. (Lucas, 16:
19-31.)
Não interpretamos o fogo ao pé da letra, assim
como não entendemos como literal o bicho de que fala
o Evangelho. (Marcos IX: 43-48.) O fogo é o remorso
que será maior ou menor conforme as oportunidades
que houve na vida de cada um. U)
O rico não podia sair: havia um abismo. Que di
reito têm os "estudantes da Blblla" para darem a ab
surda interpretação de o rico representar os judeus e
o pobre os gentios?
Não é claro da passagem que não havia esperan
ça para o rico? Entretanto para Israel há esperança
de redenção. (Epúlola oos Romanos XI: 5,15.)
O laode• é contrário ao céu: ''Tu, Cafamaum, ele
var-te-ás, porventura, até ao céu? descerás até o ha
des . . . (Mateu.1 Xl: 23.)
(Vejam-se ApO<". 1: 18; Ili: 7; XX: 1-3; 12-14.)
Ealá ligado com a morte eterna: Apoc. 1: 18; XX:
10: 13.
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(Mnl. XVIII: 8) , "o fogo que NUNCA se apaga" (Marcos
IX: 45), "o bicho que não morre" (Marco• IX: 46) ,
"chama de fogo" (2 Te••· 1: 8) , "cadeias etemas" (Judas
8) , "fogo eterno" (Judas 7) , "o negrume das trevas
para sempre" (Juda..t 13), "o fumo do seu tormento, su
bindo pelos séculos dos séculos" (Apoc. XIV: 11) , "o
10110 de enxofre" em que o diabo, a besta e o falso pro
feta serão ATORMENTADOS dia e noite, pelos séculos dos
séculos" (Apoc. XX: 10.)
O verbo empregado, atormentar (basanizo) , e isto
pelos séculos dos séculos, bem mostra que não h6 ani
qullamenlo: só quem existe é que pode ser atormentado.
"tsse tormento tem a sue raiz na consciência: é o
remorso.
t uma Injustiça atribuir-se-nos a idéia do inferno
dantesco: fogo, espêto e mil tormentos materiais. Lan
ço aqui o meu protesto veemente. Isto não ensina
mos nós.
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4. O pecado é um mal infinito, a maioT ingrad
diio, o maior iMUllo atirado d face de Deua. I!: uma
falta torturar um animal Torturar um homem é mais
grave ainda. Se a ofensa reca.lsse s&bre um rei que
nos visitasse, assumiria um aspecto de enorme gravi
dade. E se a ofensa magoa o pr6prio coração de Deus
- ah! - então é infinita. Todo pecado é uma ofen
sa a Deus, pois é !alta de conformidade com a lei de
Deus ou qualquer transgressão desta lei - cópia, em
bora parcial, da pr6pria natureza divina.
Ora, sabemos pelo Evangelho que Deus se f& car
ne e habitou entre nós. Feito vario de dores, experi
mentado nos trabalhas, ensinou-nos as sublimidades da
sua religiio divina, suportou uma vida de humilhações
e vexam.,,,, recebeu o pouco C890 dos pecadores, bofe
tadas, o azorrague, a crucificação, o nivelamento com
ladrões, os insultos à hora da morte, a ingratidão, o iso
lamento na sua dor, todos, todos os horrores, a morte
na cruz e tudo em lugar do pecador. A êsse pecador
..le procura, oferecendo de graça o que conquistou pe
las suas angústias, pela sua morte, pela sua resaurrel
ção, e recebe como resposta um: - "Vai-te embora . . .
6 Cristo! Anda! Não quero a tua salvação!"
Se"' injustiça deixar o pecador Impenitente, Inve
terado no mal, no lugar que j!le mesmo escolheu?
Não.
Só vai para o inferno quem quer.
"JW"O por mim mesmo, diz o Senhor Jeori, que
não tenho prazer na morte do lmpio, mas que o lmpio
se converta do seu caminho, e viva: convertei-vos, con
vertei-vos dos vossos maus caminhos; pois por que ra
zão morrereis, 6 casa de Israel?" (Ezequiel XXXID :
11.)
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"Ide por lodo mundo, pregai o Evangelho a tada a
criatura. Aquêle que crer e fôr batizado serA salvo;
o que porém não crer ser6 condenado."
No uso da liberdade que o Altlsimo nos concedeu,
senhores, vamos seguir o caminho de Deus, ainda mes
mo que não compreendamos t&la a sua revelação. Di
gamos sem hesitar, como a criança que confia na pala
vra do seu pai: "Meu pai falou. tle disse que é
assim."
E lá, nos páramos celestes, muita coisa que nio pu
demos entender aqui tle nos dir6 então, quando a nos
sa alma puder compreender melhor.
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Diz fie que escreverá folhetos. Então será folhe
to após folheto. Não os deixaremos mais. Venham
os folhetos.
Surgiu à baila a passagem do ladrão arrependido.
(Lucu XXIlI: 42-43.) - "E disse: Jesus, lembra-te de
mim quando entrares no teu reino. 2le lhe respondeu:
Em verdade te digo, hoje estarás comigo no paraisa."
Querem os "estudantes da Blblia" que se diga:
"Em verdade te digo hoje, estarás comigo no paraisa."
Para fies, a alma do justo fica destrulda provisõria
mente.
21es põem a virgula em hoje e n6s na palavra digo.
Os textos mais antigos não tinham pontuação. De
pendemos do contexto e do teor geral do Novo Testa
Dll!Dto para a pontuação desta passagem. ''Na verda
de te digo hoje?" Mas quando Jesus havia de dizer,
se estava morrendo naquele dia? "Aquêle que crê em
mim, disse Jesus, tem a vida eterna, PASSOU da morle
para a vida."
A salvação é instantânea. Não há, pois, impossi
bilidade de Cristo dizer: "Na verdade te digo, hoje es
tarás comigo no paralso." Assim o entendem filólogos
como Neslle e Weiss, assim o entenderam as principais
versões do mundo.
- Mas Cristo, diz o adver.<ário, não subiu ao céu
naquele dia.
- Quem disse? Não subiu ao céu com o corpo,
que ainda tinha de ressuscitar, mas como Deus, estava
no céu, e, além disto, o seu espirita humano entrou logo
no paraisa.�
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Ainda mais: e parAbola do rico e Lázaro nos en
•ina que o crente, logo após e morte, vai estar com
lh-us. Haja vista o que diz S. Paulo: "Para mim o viver
{, cristo e o lllORRllR t LUCRO." Por isso Me tinha dese
jo de partir e estar com Cristo, pois era "muitlssimo
melhor." (Filip. 1: 21-23.)
S. Paulo não fugia da luta. Queria trabalhar para
Cristo. Se f6sse exato que fie ao morrer seria provi
.Oriamente destruldo, o apóstolo não diria que era me
lhor isto do que trabalhar para o Salvador.
- Paralso, dizem os senhores 11estudantes", paraí-
80 é horto.
- Ora muito bem. Diz S. Paulo que foi arreba
tado até o paraíso. Logo foi arrebatado até o horto . . .
(Hilaridade.) .
- Os mortos nada sabem. (Ecles. IX: 10.)
Cite-se a passagem: ''Tudo quanto te vier à mão
para fazer, faze-o conforme as tuas fôrças, porque na
sepultura para onde tu vais, não há obra, nem indús
tria, nem ciência, nem sabedoria alguma." (Ec!esiastea
IX: lO.)
- Quem diz que na sepultura há conhecimento?
Sheol aqui significa sepultura. Como vimos, em vá
rios outras passagens significa inferno: "Os lmpios se-
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rão lançados no inferno, e \adas as gentes que se es
quecem de Deus." (Salmo JX: l7) Esta ameaça aqui
não pode significar sepultura.
- Todos serão restaurados, diz o sr. Manley.
- Mas como pode ser isto se, falando Jesus sôbre
Judas lscariotcs, disse: " . . . Bom seria ao la) homem
não haver nascido"? (Marcos XIV:21.) Como, se há um
pecado que não tem perdão? A restauração de tadas
as coisas não invalida esw passagens.
- S. Paulo não fala de condenação eterna.
- Ainda mesmo que não falasse. Basta Cristo
falar. Mas vejamos o que diz o ap6stolo S. Paulo:
"tle (Cristo) tomará vingança dos que não conhecem
a Deus e dos que não obedecem ao Evangelho de Nosso
Senhor Jesus, os quais sofrerão a pena, a saber, a Pl:ll
DIÇÃO ETERNA". • • (II Teu. cap. ) : 8: 9.)
- Deus é aphthano., isto é, imortal, incorruptível.
- Sim. E quem negou?
Terminando: Afirmam os russelltas que a morte '
de9lruição. Então, o filho pr6digo foi destru.ldo: "&.te
meu filho foi de9lruldo . . . " J99us Cristo morreu. En
tão foi dl.'Struldo.
- Mas foi a6 por três dias, acod" um russelita.
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t:.trondou enorme, prolongada salva de palmas,
vrrulo-so o Rcv. Américo envolvido pelos abraços duma
mullidüo, que o acompanhou pelas ruas do centro da
l"ldudo olé o ponto em que tomaria condução pal1l casa.
F.m conseqüência desapareceram do Brasil por
muitos an05 os pretensos "estudantes da Blblla" pal1l
reoparecerem Ultimamente negando a Imortalidade da
olma, a Santlssima Trindade, o inferno, a redenção por
J�sWI Cristo, o Batismo, a Eucaristia, atacando mais
violentamente do que nunca as "religiões" em geral e
o catolicismo em particular, e gastando e r&lo em pu
blicidade e propaganda subversiva, agora sob o nome
d., "Testemunhas de Jeová."<»
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ALMA CATÓLICA
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lb:v. AIÓIUco C. DO Man:za
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�
m
.·
1
A QUEM JULGUE que Américo de Mene
zes teria sido um Newman brasileiro se
tivesse tido oportunidade de entrar em con
tacto com certos vultos verdadeiramente
representativos do autfntico catolicismo, se viesse a
conhecer de fato, por dentTo, a Igreja Cat6lica. Se
houvesse morrido com a idade com que faleceu o Rev.
Américo, teria morrido o Cardlal Newman como con
victo pastor anglicano. O mesmo se poderá dizer do
Pe. Frederick William Faber, o grande escritor cató
lico, que foi pastor protestante durante 22 anos!
Mistérios de Deus!
Todavia, certas atitudl!ll e pendorl!ll poderiam con
siderar-se como sinais da progressiva "catolicizaçio"
de seu espirita, a.inda que disso nio tivesse @le cons
ciincia.
Já vimos em que cireuns!Ancias se deu a sua pas
sagem para o protestantismo; recordámos o que era a
sua vida de oração, a sua vida domt!stica; o sil@ncio
quase claustral que imperava em sua casa quando o
cartão da porta de seu escrit6rlo avisava que @le .,,,ia.
va em oração: "Não batam; 16 em ca.so de morte!''
Escandalizando-se com a multiplicidade de seitas,
foi um dos fundadores e professor do "Seminário Uni
do", tentativa de união do evangelismo brasileiro. Aliás,
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-dhse Seminário, e por indicação sua, foi nome.odo pro
fessor o Dr. Vitor Coelho de Almeida, então pastor
presbiteriano, mas antigo sacerdote católico, doutor
pela Gregoriana e ex-reitor do Seminário Arquidioce
sano do Rio. E eSY nomeação redundou na introdu
ção do tomismo no curso filosófico do semln6rio pro
testante, e a adoção da obra do Pe. Tia110 Sinibaldi
como livro-texto de filosofia, bem como da do Pe. Leo
nel Franca para o CUl'SO de História da Filosofia.
Entusiasta do canto-cli.ão, teria tido possibilidade
também, através da música gre11oriana, de penetrar
mais a fundo no verdadeiro esplrito católico.
Quando de sua formatura no Seminário de Campi
nas defendeu, em latim, brilhante tese intitulada De
Divinilll te Chriati, cujo original infelizmente parece
perdido. Batia-se pela redação das teses teológicas em
latim, visto ser esta wna lingua mais sinto\tica, mais
precisa e cujo sentido não varia mais.
Tinha um profundo respeito pelo pão, de que não
consentia que se pisasse ou se jo11asse fora um pedaço
sequer; não apenas por se trnt.nr dum alimento pelo
qual se tinha dado 11raças à mesa, mas por ter sido o
escolhido por Nosso Senhor para a Sagrada Eucaristia!
Nunca leu, porem, os grandes autores nústicos da
Igreja Católica, a biografia dos grandes nússionários.
Isto talvez o tivesse ajudado a distinguir os sacerdotes
impregnados do espírito da Igreja dos outros que, in
felizmente, conheceu.
O que êle tinha por "Igreja Católica" era o sincre
tismo que, desgraçadamente, caracterizava a reli11iosi
dade brasileira do seu tempo, notadamente do interior
de Minas, onde. exerceu o pastorado durante a maior
parte da sua vida.
Transferindo-se para o Rio de Janeiro, s6 p6de
conviver com protestantes. Trabalhando excessiva-
154
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mente. como trabalhava, e sempre circunscrito ao 1neio
evangélico, o ºcristianlsmo" para êle era o cristianismo
protestante.
Viveu, pois, durante trinta e oito anos, na 11maior
nação católica do mundo'', ignorando o autêntico cato
licismo!
O que conheceu, porém, do cristianismo, isso êle
soube pôr em prática, com sinceridade e fidelidade, e
herôicamente até. E pela prática da oração, pelo ma
nuseio e pela meditação diária do Livro Sagrado, che
gou a uma altitude espiritual que raramente se cons
tata, mesmo entre os que tiveram, na Igreja Católica,
o privilégio de !requentar assiduamente os sacra
mentos.
Foi, certamente, ao se lembrar de homens des.!la
envergaduni, e da de um Paulo Gerhardt, de um Da
vid Livingstone, que asseverou Karl Adam que "entre
os protestantes até santos e mártll1!s pode haver."
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Nos últimos anos de sua vida cantava freqüente
mente, quase todos os dias,U> ou então tocava na flau
ta a melodia dêsse hino por que tinha especiallssima
predileção, traduzido, se me não engano, do latim e
atribuldo a São Bernardo:
EXPIROU
156
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te racionalista, a ponto de editar e divulgar panfletos e
livros em que se impugnava até mesmo a divindade de
Jesus!
Notoriamente "fundamentalista", admirou-se o
Rev. Américo de ser convidado, um dia, para fazer uma
conlen!ncia no salão nobre da Associaçio Cristã de
Moços.
Regorgitava o auditorium, como costumava acon
tecer ao se anunciar que seria êle o orador.
Como lhe não haviam determinado o tema, resol
veu fazer um breve, mas eloqüentlssimo cliscuno sll
bre "O Poder da Oração".
Depois de v6rias considerações, narra o sucedido,
tempos atrás, com seu filho Hor6cio, em Belo Horizon
te. E termina mandando que o menino se levante para
que todos vejam com os seus próprios olhos a prova
mais concreta que êle podia apresentar de que Deus
de fato ouve e realmente responde aos que O invocam
de todo o coração.
Voltando para casa, diz ao seu filho mala velho,
que o acompanhara:
"Garanto que essa diretoria nunca mais me h6 de
convidar para falar na Associação Cristã de Moços . • . "
Efetivamente foi o que aconteceu.
Paraninfando a primeira turma de diplomandos
do "Semin6rio Unido", depois de v6rias considerações
sôbre a lmportAncia de cada uma das matérias do
11curriculum" do curso teol6gico, passa ao que constitui,
para um pregador do Evangelho, o "unum neceuc
rium'J.
"Eu teria remordimentos de consciência se vos não
repetisse aqui, com tôda a solenidade, o que vos dizia
freqüentemente no Semin6rio:
A grande tentação moderna é o trabalho sem ora
çõo; é o corre-corre neste século agit.ado; é a lmpres-
157
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sio do número, da quantidade, do que dá na vista; -
é o esquecimento de uma comunhão Intima, demorada,
aos pés de Deus, que o ministro deve ter.
Apostolado sem oração! Que temeridade! Dai
tanto trabalho desmantelado, tanto fracasso e desalento!
"Sem Mim, - disse o Mestre Divino, - nada po
dereis fazer. Podeis passar noites e noites sem dor
mir, a trabalhar. . . a trabalhar com &nsia, tendo zero
como resultado!
Se não quiserdes gastar tempo aos pés de Deus,
nio entreis no minist.lrio."
Admirável a sintonia espiritual de Américo de Me
nezes com D. Chautard, o autor do precioso livro "A
alma de todo o Apostolado", que êle nunca lera . . .
AliAs, instituindo o diaconato, outro objetivo não
tiveram os Apóstolos senão o de se dedicarem "aem ces
.007' 4 07'�0 e ao ministério da Palat1ra" (AI. 6: 4) .m
158
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"MISERICôRDIA, SENHOR!"
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g AVIAM NASCIDO no Rio de Janeiro duas
filhos - Guiomar e Irene -, e um filho,
Cícero.
Tendo-se ausentado D. Isabel para ir
amamentar, perto de sua casa, a filhinha de uma amiga,
com o que, aliás, a salvou de morrer de inanição, uma
empregada, imprudentemente, dá um banho de chu
veiro, frio, na pequenina Irene, que, atacada de saram
po, ardia em febre. O resultado não se fl!z esperar.
Poucos dias depois agonizava.
Irene, que contava então dois anos e quatro meses,
era uma menina de excepcional doçura e de grande
precocidade nas suas manifestações de piedade. Que
ria ir além da lua para ver Jesus . . .
Durante a doença cantarolava hinos que costu
mava ouvir em casa.
Como sempre, apela o Rev. Américo para o Pai
do céu. Em dado momento, porém, percebendo ser
mesmo da vontade de Deus levar-lhe a filhinha, diz,
com o coração estraçalhado mas com voz firme e fini-
1110 forte:
"Se é da tua vontade, leva-a, Senhor, para junto
•le tl."
Mal acaba de fazer o seu ofertório, expira em seus
l1rnç0ft a doce !reninha.
161
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Naquele instante teve êle a impressão de liaver
percebido como que um rufiar de asas . . .
Foi um golpe terrlvel para o seu coração de pai,
e que provàvelmente lhe terá afetado a saúde. Condu
ziu..se, porém, como cristão exemplar que era.
A noite, em determinado momento, estavam na
sala em que jazia o corpinho imóvel e frio, o Rev.
Américo e seu filho mais velho, que, com quinze anos
de idade, já era, desde o ano anterior, pregador leigo
e ºcandidato ao minisl�rio".
Estavam ambos sectados, curtindo em silêncio a
grande dor.
A certa altura diz o Rev. Américo:
"A nós, que pregamos aos outros, pennite Deu•
que soframos às vêze• tristezas como essa ; para que
falemos de nossa própria experiência . . . "
No dia seguinte, pela manhã, é êle mesmo quem ofi
cia a cerim8nia fúnebre. E, com a sua bela voz de ba
rltono, ainda canta, junto do corpo da filhinha morta,
o hino que nessas ocasiões era costume cantar-se.
Dá mais um eloqüente testemunho de sua fé, su
focando, porém, a dor imensa que sei pela graça divina
suportava.
E no próprio dia do enlêrro deixa escapar, nestes
versos singelos, o que lhe vai n'alma:
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Eu te 11i lUl/rendo tallto,
Sem te poder socorrer . . •
Amor não faltava, filha;
Só me faltat>a o pod<tr.
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Pesaroslssimo também com a morte da lnnãzinha
predilela, vai o filho mais velho, em companhia de um
irmão, dois anos mais moço, e a instincias do pai, pas
sar wna temporada na fazenda de um amigo, no inte
rior do Estado do Rio.
Dali é chamado, porém, no dia 12 de fevereiro. por
um telegrama de sua mãe: "Venha urgente. Seu pai
grav(ssimo."
164
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PARA OS BRAÇOS DO PAI
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ROFUNDAMENTE abalado pela morte da
filhinha e com o organismo certamente en
fraquecido pelo excesso de trabalho, conti
nuou o Rev. Américo, sem interrupção, as
suas atividades pastorais.
Estava no perlodo de férias letivas. Foram, pois,
de natureza inteiramente espiritual os trabalhos a que
se entregou de 21 de janeiro a 11 de fevereiro. In
tensificou ainda mais a sua vida de oração, como se es·
tivesse adivinhando o que eslava para suceder.
Indo pregar, certa noite, na Igreja presbiteriana de
Nova Iguaçu, pronuncia belíssimo e comovente sermão
sôbre o céu.
Na volta para casa, sente-se muito mal no trem.
Tendo a impressão de que ia morrer, escreve às pres
sas o seu nome e enderfço num papel.
No dia seguinte, um tanto febril, não pôde levan
tar-se. Pensa o médico tratar-se dum resfriado e re
comenda repouso.
Na tarde do dia 11, já sem febre, aparentemente
quase restabelecido, chama a esp&a e diz que lhe pre
cisa falar em particular.
Retiram-se do quarto v6rias pessoas que ali se
uchavam. E com imensa e doloroslssima surpresa para
da, lhe diz que pedira muito ao Pai Celeste um aviso
167
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qualquer a respeito do seu estado. E estava conviclo
de que Deus o chamava!
'Ignoro, - diz êle -, porque é que o meu Senhor
me chama agora. Sei apenas que os planos de Deus
não se discutem.
Como São Paulo, quer vivendo, quer morrendo,
sou de Cristo.
Tanto trabalho ainda tinha a fazer! Mas Nosso
Senhor me chama para trabalhar além . . .
Desejava tanto criar os meus filhinhos! Uma cou
sa te peço, Isabel: não deixe que se desviem de Nosso
Senhor!
Até a !reninha morreu amando a Jesus; cantava
hinos pouco antes de ir para o céu!"
Beija a espôsa, tira do dedo a aliança e continua:
"Esta aliança agora te pertence. No céu não se
entra com jóias . . . nem h6 casamento.
Agradeço de todo o coração tudo que fizeste por
mim. Não rara o auxilio de Deus e a tua dedicação,
não alcançaria o que alcancei.
E não le preocupes com o futuro dos nossos filhi
nhos. Jesus é o Pai dos 6rlõos, como também o Pro
tetor das viúva..11."
Pede li espliso que traga os lilhos que estão em
casa.
Reunida a familia, faz uma oraçiio comoventlssima
enlregando a Deus a cspôsa e os filhos.
Despede-se, a seguir, dos seus filhos (dois se acha
vam ausentes) , exortando cada um e seguir sempre a
Jesus.
A sua lilhinha Guiomar (de quatro anos) diz esta.•
palavras:
"Filhinha, papai vai dizer-te uma cousa muito bo
nita. Papai vai para o Céu, 16 onde está Jesus . . . e a
!reninha também . . .
168
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Um dia irás ver Papai no Céu. Por isso, não cho
res . . . nem deixes Mamãe chorar.
Papai vai ser muito feliz. Sê boazinha.
Pede que tragam o seu filhinho Clcero, de seis
meses apenas.
Vendo-o tão gordinho, tão forte, tão risonho, abrin
do '!'" braços para o pai, lhe diz:
"Que gracinha do meu filhinho! Deus é teu pai
agora! Deus te crie para o bem."
E à espôsa:
"Dou graças a Deus pela familia que me deu. Dou
lhe graças por se ter servido de mim para fazer algu
ma coisa em prol do Seu Reino. Dou graças a Deus
pelas �nçãos extraordinárias que me tem concedido.
:t verdade que o meu ministério foi cheio de espi-
nhos e amarguras.
Mas nio é o discípulo maior do que o seu Mestre".
Determina como quer que o vistam.
"Vistam-me como se eu f&se pregar o meu último
sermão. E com todo o respeito; pois êste corpo é tem
plo de Deus."
Entram no quarto vários vizinhos e amigos, dos
quais fie se despede, falando a cada um da necessida
de de crer em Jesus Cristo.
"Desejava despedir-me de todos os meus amigos. ..
Mas não chegarão a tempo!
Digam-lhes, porém, que os espero ver a todos no
céu ... e que não levo mágua DE NINGUÉM, DE NINCUÍ:M.'r
Lamenta a ausência de seu• filhos Eurlpides e
Américo, aos quais deixa conselhos e exortações.
"Meu filho Eurlpides me substituirá em tudo; e
isso me consola. Tenho confiança nêle. &e tomará e>
meu lugar e te ajudará, Isabel, a guiar os seus irmão
zinhos no temor de Deus.
16�
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Dize-lhe também que as minhas dlvidaa precisam
ser pagas, como pagas estão as minha.. dividas para
.,om Deus: Jesus pagou-as em meu lugar . . . "
"Dize a meu Pai e a meus irmãos que creiam em
Jesus Cristo."
Percebe que mandavam chamar
- o mfdico, Dr. Fe-
linto Coimbra:
"Não, nio chamem o Coimbra. 2le é muito meu
amigo. E por saber que eu ia morrer, não quis ílcar
aqui.n
Após extralrem o sangue para exame: "Senti uma
dor horrlvel, um suor frio . . . uma agonia de morte . . .
Naquele momento me lembrei de Nosso Senhor pade
ttndo muitlssbn o mais, derramando todo o Seu Sangue
na cruz, em meu lugar!u
�rda o salmo que diz: - "Quando eu passar
pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum."
"Os que estio viajando no deserto, sob um sol caus
ticante e abrazador, gostam de refugiar-se a uma som
bra qualquer.
Pois a sombra da morte é a sombra de Jesus.
Eu estou nessa sombra . . . "
"Oh! como é agradável estar li sombra de Jesus!
Quem ama a Jesus não leme a morte! Para quem
ama a Jesus, a morte nada mais é do que a passagem
desta vida para o Céu!
Pediu que cantassem o hino que diz:
170
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Fêz outra belisima oração pela familia e pelos ami
gos. (Chega nesse momento o Dr. Bretas, um dos três
médicos assistentes) .
Tenninada a oração, continuando de olhos fechados,
diz que muitas vêzes falara s6bre o céu, mas nunca o
imaginara como estava VDiDO naquele momento.
E. sorrindo:
"Como Jesus é bonito!
Mas é tão lindo, tão lindo, tão lindo . . .
Palavras humanas não podem descrever as belezas
que estou vendo!"
E, de olhos fechados:
"Assim vejo melhor o meu Jesus.
Falarei com Jesus enquanto puder . . . "
"Oh! estou tendo visões da cidade santa!"
�
"Não sei se �sus me vai levar, ou os anjos. Sei
.
que vou subir . . .
"Quem a1na a Jesus não teme a morte!"
"Estou entrando na Cidade Santa!"
"Jesus não quer que conte o que estou vendo!"
O Dr. Bretas, que estivera a preparar uma injeção
e a ouvir tudo aquilo, chega perto da cama e pergunta:
- Dr. Menezes, que sente o sr.?
- Ora, doutor, eu estava entrando no céu e o se-
nhor me fêz voltar . . .
- Mas que sente o sr.?
171
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- Fraco está o senhor na fé. Escute, doutor, o se
nhor é muito meu amigo. Vou pedir-lhe uma coisa:
creia em Jesus Cristo.
- Mas eu creio nêle.
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- Não me d;gam que eu não tenho fé!
Não me digam que eu não tenho fé!
Eu nunca neguei o 1neu Jesus!
Nunca! Nunca! Nunca!"
Sua esp3sa procura acalmá-lo:
- Américo, diseram que você não tem fé . . .
medicina . . .
- Não, Isabel, não foi isso : eu compreendi muito
bem. Disseram que eu não tenho fé em Jesus Cristo!
Isto é demais! :S: demais! I!: demais! Eu amo tanto e
Jesus ! Nunca o neguei! Como dizem que eu não
tenho fé?! Eu tenho fé, eu tenho fé! Eu creio no meu
bendito Salvador!
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LIVRO SEGUNDO
AO CATOLICISMO
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rtJo:MINISC�NCIAS DA INFANCIA E DA
ADOLESCtNCIA
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r�
� "1
EUS PRIMEIROS anos transcorreram no
ambiente doméstico que já descrevi ao falar
de meu paL
Nascido em Campinas a 23 de setembro
de 1909, no SeminArio Presbiteriano, que funcionava
então à Rua Dr. Quirino, e onde meus pais residiam,
fui batizado na Igreja Presbiteriana daquela cidade
pelo Pastor Zacarias de Miranda.
Alguns meses antes de eu vir ao mundo, viajando
mem1 pais a cavalo, no Estado de Minas, esliveram,
11urna noite fechada, à beira dum enorme preciplcio,
do que só no dia seguinte tiveram conhecimento. Na
quela noite, junto do despenhadeiro, tinham feito uma
oração consagrando ao serviço de Deus a criança que
eslava para nascer.
E foi ao som de salmos e hinos religiosos, ouvindo
lnlnr dos heróis da fé, e sobretudo de JESUS, que des
pertei para a vida.
Jesus não era para mim uma figura lendária, nem
npenos um personagem histórico mas distante: cro Al
�ui•m, era uma Pessoa Viva, que morava conosco, que
c•tova sempre ao nosso lado; era tão real e tão próxi
mo quontu meu pai, cuja fé robusta e nrdente conta-
1-:invn 11 quantos dêle se aproximavam.
179
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Ao dar ac6rdo de mim, estava já matriculado na
Escola Dominical, tendo ganho de presente, aos 5 anos
de idade, um exemplar da Escritura Sagrada como
prêntlo por não haver faltado às aulas nenhuma vez,
durante o ano."
E nio me satisfazia com as aulas da minha classe.
Metia-me também freqilentemente, no meio dos adul
,
tos para ouvir as explicações que dava à "Classe dos
Homens" o seu professor, o Dr. Samuel Gammon.
Um dos brinquedos prediletos de alguns dos meus
filhos menores, como é comum acontecer nas familias
católicas, - era o de "celebrar a Santa Missa". Quando
garotinho gostava de fazer, muiatis mutandis, a mesma
cousa. Num dos quartos da casa pastoral de Lavras
instalei a minha capela. Nas cadeiras, pequeninas, sen
tavam-se algumas bonecas, às quais, querendo imitar
meu pai, eu 11pregava,, do alto de meu 11púlpilo11 sôbre
1
o qual se via um volumoso dicionário, que faz.ia as vê
zes de Blblia.
E discursava com entusiasmo: ºEu sou Jesus! Eu
salvo a todos: pobres e ricos, ignorantes e sábios, pe
quenos e grandes! A todos eu salvo. Vinde a mim!"
E como era só isso o que sabia dizer, repetia du
rante v6rios minutos as mesmas palavras, para não fi
car resumido demais o "sennio".
A um dos meus companheiros de inlAncia, Jairo
Morais, que veio a se tomar depois ilustre médico, ex
pulsei um dia, en�rgicamente, da ntlnha "igreja". l!:
que se pusera a rir, e . . . em pleno sermão!
- "Isto aqui não é lugar de brincadeira! l!: a casa
de Deus! Faça o favor de se retirar!"
Certa vez, surpreendi a assistirem ao meu 11culto",
encostados à porta entreaberta . . . meu pai e minha
mãe. Nesse dia, tão encabulado ficou o pregador que
o culto acabou mais cêdo do que de costume.
180
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Os heróis que povoaram a minha imaginação in
lanlil foram os da Blblia Sagrada: Moisés, Josué, Sa
murl, David, Sidrac, Misac, Abdêncgo, Daniel, José do
�;&:ilo . . .
Como gostava de ouvir a história de José!
Sentado ao colo de meu pai, ouvia, atento e emo
cionado, o drama do grande patriarca.
Mal terminava o último episódio, pedia-lhe, sem a
menor cerim6nia:
- Conte de novo, Papai . . .
De vez em quando, nalgumas de suas viagens a
cavalo, nas proximidades de Lavras, meu pai me leva
va consigo. Era tão pequeno que viajava montado no
l selim e s6bre uma almofada.
ml'llJlO
181
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Conseqüentemente era uma religião de alegria, de
confiança, de felicidade, que se nos incutia na alma
e se refletia nos hinos que aos dois anos de idade eu
jA cantava:
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lugur que o leia,
virando e revirando o tecido, leio:
Jt:sus ! .JESUS sempre! nada senão .Jz.sus! ''t1J
Vem a propósito aqui a judiciosa observação do
Pe. Georges Tavard: "Antes de ser um negador dos
principias católicos, um protestante é um homem nas
cido numa tradição religiosa diferente da nossa. Antes
de ter convicções raciocinadas em lavor da Reforma
do século XVI e das sociedades religiosas que dela se
nriginnrnm, é êle influenciado por um mundo de im
pressões recebidas na in!Ancia, que formarão mais tar
de, em grande parte, a estrutura do seu pensamento.'�»
Aos sete anos de idade, em Belo Horizonte, depois
de ter feito o curso do "Jardim de lnfAncia Bueno
Brandão'', fui matriculado no "Grupo Escolar Barão do
Rio Branco."
Minha professôra, com quem, aliás, me correspon
di sempre, enquanto viveu, foi a afamada educadora
D. Benvinda de Carvalho Azevedo.
Foi o meu primeiro encontro com uma alma cató
lica, e que me fêz um bem imenso! I!: que ela sabia
de fato viuer a sua fé! Suave no trato pessoal, delica
d b;sima, era a própria caridade personificada.
Sabendo-me filho de pastor protestante, respeita
va a minha consciência e a posição da minha familio.
Jamais tentou catequizar-me diretamente.
Tôda bondade para comigo, manifestando mesmo
por mim especial predileção, anulava qualquer cons
trangimento que eu pudesse ter como único "proles
lnnte" da classe. Lembro-me de que, num dia em que
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fôra fazer uma palestra em nosso Grupo o poeta Olavo
Bilac, além do Hino Nacional e do Hino à Bandeira,
iriam cantar também os alunos um hino religioso, cató
lico naturalmente.
D. Benvinda aproxima-se discretamente de mim e,
com aquela suavidade que punha em todos os seus ges
tos e palavras, procura pôr-me à vontade:
- "Não fique constrangido. Se Você não quiser, não
precisa cantar esse bino."
E não era D. Benvinda uma católica "folcl6rica".
Ao contr6rio; bem convicta e afirmativa. Mais tarde
Deus lhe mandou um filho, a quem soube dar uma edu
cação cat6llca modelar. Hoje é o diretor geral dos estu
dos e professor no Pontlflcio Colégio Pio Brasileiro de
Roma; o R Pe. Dr. Marcelo de Carvalho Azevedo, meu
diletlssimo amigo.
Era, porém, inteligente; e sabia que às vêzes é me
lhor falar com Deus a respeito de certas pessoas do
que com certas pessoas a respeito de Deus.
E marcou-me a alma indelêvebnente. Foi ATRA
ris DI: SUA BONDADE que tive o primeiro contacto indi
reto com a Igreja Católica.
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Tão logo aprendi a ler, entrei em con tacto direto
com a Escritura Sagrada. Havendo, no quintal da
nossa case, aquela célebre "casa dos escorpiões", para
mais de uma dúzia de altas e frondosas mangueiras, re
íugiava-me, freqüentemente, num ºescritório" que eu
mesmo construira no alto duma das árvores, a fim de,
isolado e em sil�ncio, ler o Livro de Deus.
Certo dia, como estranhasse minha mãe a minha
ausência, um tanto prolongada, procurou-me e deu co
migo lá em cima da 6rvore. Duvidando da estabilida
de do "apartamento", construido entre galhos que bem
poderiam ceder, decretou sumàriamente o meu des
�jo!
E acabou-se o meu primeiro eremitério . . .
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J' falei do nosso "culto doméstico", que se fazia
diàriameote pela manhã, com a presença de tôda a
familia.
Quando acontecia, porém, estar meu pai ausente
de Belo Horizonte, era eu que, na qualidade de primo
ghito e, portanto, "substituto legal do chefe da fami
lia", dirigia o culto, fazendo a leitura da Blblia e to
cando no harmonium alguns hinos que eu tirara de
•
de ouvido e que todos cantavam.
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mingos, n Escola Dominical e o cuho na Igreja Pres
biteriana da Rua Silva Jardim, de que era pa•lor o
Ht·v. Alvaro Reis.
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Afervorei-me mais ainda.
Além das aulas da Escola Dominical, de cuja "clas
se de juvenis" eu era diretor, pertencia ainda a outra
sociedade da par6quia: a "Sociedade Juvenil de Es
fôrço Cristão."
Efetuandcrse na cidade de S. Paulo um "Congres
so Nacional das Sociedades de Esfôrço Cristão", fui
eleito delegado da minha sociedade, fazendo então, com
doze anos, o meu primeiro discurso.
Aos treze, após o culto, ia freqüentemente com doi.�
outros amigos à Quinta da Boa Vista, onde, na "Ilha
dos Amores", que fica no lago que ainda ali existe,
llamos juntos um trecho da Blblia, reuivamos, e nos . . .
confessávamos entre n6s, a fim de verificar o progresso
feito naquela semana. Já sentlamos a necessidade da
confissão . . .
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ll'nlação de folhear os seus livros, nos quais o que mais
me interessava eram os grifos com que êle marcava os
pensamentos que mais sintonizavam com os seus. :tste,
nliós, um modo excelente de se pene trar na alma de
alguém.
Sonhávamos ambos também com a organização de
uma orquestra em casa. :tle tocava flauta; eu, que já
dedilhava alguma cousa no órgão, estudava violino,
juntamente com meu mano Américo, um pouco mais
moço do que eu; os outros irmãos entrariam oportuna·
mente para a nossa 11Sin(6nica11• E então seriam mais
solenes os nossos cultos domésticos, e mais alegres as
festas de lamllia. Pensamentos, projetos, aspirações,
era tudo impregnado do desejo de servir melhor a Deus,
de honrar de modo mais perfeito a Nossn Senhor Jesu•
Cristo, que era, de fato, o rei dos nossos corações, para
Quem convergiam nossos afetos e aspirações.
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quanto nas capitais. O punhal não atravessa o Cora
ção de Jesus; mas sempre fere, sempre dói.
Era intransigente quanto à festa pagã. E alé os
serpentinas coloridas, em si inofensivas, os confeles e
lança-perfumes, eram radicalmente banidos pel11 rela
ção que linham com a festa em que se adorava um
"deus" pagão e que constitui Inclassificável afronta a
Nosso Senhor Jesus Cristo. 141
All!m de professor do Colégio Batista e do Seminá
rio Unido, era meu pai co-pastor da t.• Igreja Presbi
teriana e pastor de numerosas congregações presbite
rianas nos subúrbios do Rio de Janeiro.
Certo dia, preparava-se para ir pregar na pequena
igreja de Nil6polis, no Estado do Rio, quando o chamam
para atender a um enfênno em estado desesperador.
Por sugestão de um amigo, presente em nossa casa
no momento, deliberou-se que se solucionaria a difi
culdade indo eu pregar em lugar de meu pai! Por que
não? Já não tinha leito tantos discursos na Escola
Dominical?
Um garôto de 14 anos! . . . que mal comcçnva o u':tr
carças compridas: as do uniforme do colégio!
Era o di11 24 de mnrço de 1924.
Feito o primeiro ..sermão",t!1J npesor de criança
como c.-ra e nodo mais do que simples esludunte, passei
190
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11 receber, tOOas as semanas, convile9 paro prcgnr nes
111,.,Jas presbilerianas do Rio; e, nas férias, fora do Rio
lumbém. Em pouco tempo já estava sendo também
r.,qulaitado p<!lll!I ig,.,jas metodistas, congregacionalis
lüs, eplscopai_., balistas, etc. Foi-me, ali'5, de grande
ulllldnde Hpirltual ler p&."5ado, como passei, a adoles
l'tlnclu tõda no púlpito.
Cornplalados os 15 anos, apresentei-me ao "Pres
bi"rlo do Rio de Janeiro" para prestar, peranle os pas
tõn>s e pl't'•blleros daquele concilio, de que meu pai
�r11 Mreret.Arloapermanente, o exame a que se deve sub
rnoter todo aspirante ao pastorado e fim de ser arrolado
c·omo .. cnndidato oficial ao santo ministério", tllulo ne
"''"""rlo pare admissão no Seminário.
Após minucioso interrogatório sôbre os motivos
11or que desejava abraçar o pastorado, retirei-me do
lumplo para que, na ausência do candidato, se dis
l'Uliase "a sua idoneidade moral e as suas qualidades
1mra Ião importante função."
Aprovado, fui introduzido no recinto da sessão e
r.nluncmcnte recebido, na presença de meu pai, que se
r<'jubilava em ver o seu primogênito a seguir-lhe os
pa•sos.
Era algo semelhante à tonsura clerical na Igreja
Cotóllcn.
191
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Aos 38 anos de idade! Exatamente quando estava
preparado para principiar de fato a sua vida! E quan
do eu mais necessitava dêle, do meu Amigo, do meu
Alttt Ego!
Foi a fé que me sustentou naquele transe; e me
deu f6rças para suportar o golpe crudellssimo!
Niio podendo ser o companheiro de meu pai, quis
ser, então, o seu continuador. E prossegui os meus es
tudos no Colégio Batista, passando interno o ano de
1925 e pagando as minhas despesas com o trabalho de
instrutor do Grupo de Escoteiros do Colégio . <6>
Aos domingos, e às vêzes no meio da semana tam
bém, pregava nas várias igrejas evangélicas do Rio. E
é bom registrar que nenhum provento material tirava
daa minhas pregações.
Para estar mais à vontade e poder preparar-me es
pirituabnente de modo a ter o que dar aos meus ou
vintes, resolvi um dia fazer uma incursão pelas matas
do Trapicheiro, limltrofes com os terrenos do colégio,
em busca de um lugar silencioso em que pudesse fa
zer uma espécie de eremitério.
Qual niio foi a minha surprêsa ao encontrar um
<!ompanheiro de /uua, que j6 construira antes de mim,
em plena mata, uma cabana, onde ia ler e meditar a
Escritura Sagrada, e orar sem o perigo de ser inter
rompido. Era o meu colega Luiz de Assis, que, trin
ta e quat.ro anos depois, fui encont.rar como pastor ba
tista em Alagoas, sempre metódico e piedoso. Foi uma
lesta para nós ambos. Ao revê-lo referi-me ao seu
modo peculiar de grilar, a côres, com uns retingulos
(6) Deixara meu pai ....ia .. mil nlls (Crt I0,00) na sua
car1elra; e alllWDU dlvidal que, aos pouaB, .., liquidaram i.ate
iiralmente. Minha mie fU:ou com mod- pemio.
192
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que pareciam impres!IOS, os verslculos blbllcos que mais
lhe falassem ao coração.
- Ainda faz assim ?
Tirou, então, da estante e passou-me às mãos a
sua Blblia, marcadlssima, muito lida portanto, e muito
medilada.
l!:ramos, nas melas do Trapicheiro, dois eremitas,
cada qual na sua respectiva cabana.
Não B11bla eu que estava a fazer o mesmo que fa
zia meu f>Bi, quando, em Lavras, se apressava a termi..
ner a sua larefa para ir rezar sõzinho num bosque. E
nem cu, nem meu pai, nem o meu amigo Assis sab(a..
'"°" que aquilo era muito mais comum na Igreja Ca
tólica do que no meio protestante. Nunca )iramos
coisa alguma sabre o Poverello e suas idas frequentes
às malas do Alveme; nada lêramos sabre os Padres do
dcM'rto, os eremitas antigos. Asfam09 instlntlvamen
ll'. Muito antes de ler D. Chautard, j! me havia con
vencido por mim mesmo de que a oração era "a alma
d., todo apoalolado." AIJ!s, tivera bem perto de mim,
unos seguidos, o melhor dos exemplos, aquêle c:ristio
admirabillso sim , que sempre foi, e acima de tudo, "um
homem de oração", e que aconselhava: ''Se tiveres
cinco minutos para preparar um sermão, gasta quatro
em oração."
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a fim de não interromper os meus estudos para o pao
torado; e fui ao Estado do Esplrito Santo agradecer
pessoalmente ao meu amigo e explicar-lhe de viva voz
os motivos da recusa.
Durante um ano fui, todos os domingos, à cidade
de Marquês de Valença, em substituição ao Pastor Ly
sllnias de Cerqueira Leite, que, Vice-Diretor da Central,
professor do Semin6rio e pastor doutras congregações,
s6 podia ir de vez em quando ministrar a "Santa Ceia"
àquela sua paróquia. Pràtlcamente o ''pastor'' era eu;
aos dezessete anos de idade! Aliás no dia do meu 17.0
aniversário, naquele ano, pregara, e não pela primeira
vez, do púlpito de Alvaro Reis, na Igreja Presbiteriana
da Rua Silva Jardim. Estava bem integrado na ativi
dade pastoral, embora não passasse ainda de simples
ginasiano.
194
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"SEMENTES"
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O ANO SEGUINTE, eslava eu na direção
do Instituto Mont'Alverne, que era um
curso de preparação de candidatos aos exa
mes vestibulares das Faculdades de Mediei ·
na, Engenharia e Direito. Matriculei-me então na
"Faculdade de Teologia das Igrejas Evangélicas do
Brasil", comumente chamada "Seminário Unido", de
que meu pai tinha sido professor.
Aquela instituição original, pois que reunia alu
nos de vúias udenominações,, evangélicas, era, como
ficou dito já, uma tentativa de unificação do protestan
tismo brasileiro. Não é de hoje que os evangélicos,
sedentos de unidade, procuram uma fórmula de extin
guir o que êles mesmos consideram "o esclndalo das
divisões."
Naquele Seminário, estudando juntos alunos de
várias "denominações,., se estabeleceria, com o conhe
cimento reciproco, a amizade pessoal entre os futurao
pastôres, o que haveria de facilitar, mais tarde, uma
aproximação maior e, por fim, a desejada unidade. <1>
197
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Ta.las as aulas eram dadas em conjunto, exceto
uma, no último ano: a de upontos denominacionais".
Então, para cada grupo, havia um professor, represen
tante da respectiva "denominação" integrante da Fa
culdade.
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positivo do sermão, dando sempre um jeito de se r<!le
rir ao grande pastor franc& Monod, de que era admi
rador entusiasta.
Foi por sua influência que entrei em contato com
a literatura e o pensamento da igreja reformada de
França, sensivelmente superiores às produções teoló
gicas norte-americanas, até então predominantes nas
bibliotecas evangélicas do Brasil.
Não tardariam a manifestar-se as conseqüências
dessa latinização da nossa mentalidade.
199
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o alicerce fundamental do Crisüanismo, e do próprio
movimento protestante!•»
Indo certa vez a Lavras, onde preguei no púlpito
da Igreja Presbiteriana, cuja Escola Dominical eu fre
qüentara nos tempos felizes e saudosos da minha infln
cia, fui visitar a veneranda profess6ra Carlota Kemper,
j6 quase centenária, e por quem meu pai nutrira sem
pre profunda e justa admiração.
Inolvid6vel entrevista! Miss Kemper era um dos
últimos elos que prendiam a nossa geração àqueloutra,
200
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drm pioneiros, dos missionmí.os verdadeiramente con
vidos e abnegados, que seguiam, de certo modo, a le
Hhima tradição protestante, representada no século
XIX, na França, por Adolphe Monod entre os calvinis
IWI, e por Louis Meyer entre os luteranos.
Carlota Kemper, que sempre se conservara celi
bntária, missionária impregnada de espirita de fé, j6
constituía, no meio protestante, uma exceção. Como
ficnria encantado meu pai, - e surprêso! - se pudes
se descobrir, como eu mais tarde descobri, no meio ca
tólico, tantas almas da mesma têmpera, tantas religi<>
Sllli com a mesma cultura, tantas almas santas!
201
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Estava profundamente magoado o coração crente
daquela missionária, que os nossos irmãos separadoa,
"" costumassem canonizar os seus heróis, chamariam,
por certo, de Santa Carlota Kemper. Não queria mor-
202
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rer na sua pátria, tão horrorizada estava com n apos·
lasia generalizada entre seus patrícios!
Voltando ao Rio, vejo de novo na cátedra do Semi·
nário, preparando os novos ºministros do Evangelho'\
203
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um pastor que, a nosso ver, nem acreditava no Evm
gelho, j6 que negava tudo o que constitu!a para nós
o Ev11ngelho.
V6rios seminaristas j6 nem aceitavam mais con
vites para pregar. Um dêles, hoje pastor, havia três
204
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meses que não se sentia com lnlmo de subir ao pUlpi ..
to, tal a crise espiritual em que se debatia.
Deflagrou-se, então, no Seminário, um movimen
to "grevista"!
Não iríamos mais às aulas do Rev. Terrell, que nos
estava minando e destruindo a fé! No próprio jornal
205
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dos estudantes, "O Lábaro", se refletia a reação conlra
os '1professôres racionalistas."
Por felicidade nossa , acabara de chegar do Oriente
e da Europa o Rev. Erasmo Braga . <•1
Era êle, realmente, um homem nolável! Grande
professor, com extraordinária capacidade de slnlese,
dominando vários idiomas, figura de proa em todos os
congressos internacionais a que freqüentemente com
parecia, leria sido um dos nossos maiores lideres catG
licos se lhe f&se dado o privilégio, que mais tarde eu
tive, de entrar em contato com alguns dos vultos mais
representativos do autêntico catolicismo. Todavia, como
outros, nascera e crescera no mejo protestante. Na
quele tempo, pormn, eram talvez insuperáveis mesmo
as barreiras de ordem psicológica que lhe dificultavam
uma visão de conjunto, uma apreciação mais objetiva,
um estudo mais sereno da doutrina católica. Mesmo
assim. não tivesse morrido tão prematuramente, creio
que teria chegado a conclusões diferentes no tocante à
Igreja Romana, da qual estava talvez mais perto do que
poderia imaginar. :tle também, inconscientemente,
lançou em meu coração mais algumas outras "semen
tes", "1eeda of contemplation11•
206
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Substituindo o pastor Te1Tel1, salvou-nos a fé, na
quela ocasião.
Conhecendo bem arqueologia, emérito didata, in
teressou-se vivamente pela matéria de que f6ra nomea
do professor.
Apenas chegado do Egito, da Palestina, da Gré
cia e de Roma, eram as suas aulas verdadeiramente de
liciosas.
Despertou nos alunos o amor pelo estudo da His
tória, dos documentos antigos, abrindo-nos os horizon
tes para uma visão mais ampla do cristiiutlsmo, que
transcendia de muito os limites acanhados das peque
nas igrejas nacionais em que vivíamos confinados e es
tiolados.
Tal a autoridade de Erasmo Braga, - pela sua cul
tura, pela sua fé, robusta e esclarecida, pela sua menta
lidade arejada e universal, - que nos dispúnhamos
sempre a ouvir com acatamento e interêsse quanto nos
dissesse.
Coniidenciou-nos, em aula, certa vez, que muitas
vêzes tinha vontade de entrar numa Igreja silenciosa,
recolhida, onde pudesse estar a s6s com Deus, em me
ditação e oração, para refazer as fôrças e carregar as
baterias d'alma. Mas, "nossas ca.raa "'1 oração''> s6 se
ahrcm aos domingos; e não pràpriamente para a ora
�iio. mas para a pregação . . . Nem um genuflexório
l�m os nossas igrejas evangélicas(•> do Brasil, para que,
li >1Cmdhança do que fazia Jesus, nos possamos ajoelhar
""' ornçüu . . . Por Isso, frequentemente acabo entran
do nu•.•mo numa dessas igrejas católicas do centro da
20T
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cidade, que, além de serem umas ilhas de silêncio e de
paz, verdadeiras "cuas de oração", ainda têm a van
tagem, que as nossas não têm, de estarem sempre aber-
las . . . "
Um protestante, conhecedor da mentalidade Ico
noclasta enlão dominante no meio calvinista, poderá
avaliar melhor o que significou para nós aquela decla
ração do eminente mestre, que era, na época, a figura
de maior projeção nacional e internacional do evange
lismo brasileiro. Erasmo Braga ajoelhado numa Igre
ja católica! "a igreja do anti-Cristo"! onde havia tantos
11(dolos"! . . .
Outra "semente" me plantou no coração o Rev.
Erasmo Braga ao contar-nos o seguinte fato.
Visitando a Biblioteca do Vaticano, mostrou-se de
sejoso de examinar um processo qualquer de canoni
zação.
Foi-lhe fornecido o texto dwn dêsses processos; e
durante várias horas se deixou ficar absorvido na lei
tura. Devolvendo-o, depois de o ler da primeira à úl
tima página, pergunta ao funcionário da Biblioteca:
- Quando foi canonizado êsse santo?
- Não foi canonizado.
- Não foi canonizado?!
- Não, sr. A Igreja não se deu por satisfeita . . .
Pouco a pouco começava eu a olhar de maneira
diferente a Igreja Romana. Enlão devia ser uma coi
sa séria wn processo de canonização . . .
E com o pastor Erasmo Braga, que, aliás, tinha sido
também professor de meu pai no Seminário de Campi
nas, aprendi ainda o verdadeiro significado da canoni
zação. Canonizando um servo de Deus, após os mab
meticulosos estudos a respeito da heroicidade de suas
virtudes, confirmadas por fatos irretorqulvelmente mi-
208
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lagrosos, a Igreja Católica linho em vista propô-lo como
MODÊLO para os cristãos, toi.s como são tidos S. Paulo,
S. Pedro, S. Inácio de An l i óqu ia, S. Agostinho e ou
tros mais.
209
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doutor, adaptou-se melhor ao meio o antigo reitor do
Seminário Arquidiocesano.
As mutações que sofrera a sua vida, resullantes
tão sbmente de um problema sentimental, em nada lhe
alteraram as convicções filos6ficas. Tanto assim que
introduziu, com aquiescência da Congregação da Fa
culdade, como livro-texto, o compêndio de Filosofia do
Padre Tiago Sinibaldi, adotado nos Seminários católi
cos; e para as aulas de História da Filosofia, a obra do
Padre Leonel Franca, da Companhia de Jesus!
Tomaram-se, destarte, os seminaristas evangélicos,
através do Prof. Victor Coelho de Almeida, disclpulas
de Sinibaldi e de Leonel Franca! . . .
Ao fün do cul'llO filosófico deu-se a crise inevitá
vel. Como coDStruir, s6bre alicerces tomistas, paredes
teológicas calvinistas ou luteranas?
Comprometera-se a solidez do ediflcio.
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l111au·••.•1tio11uvu·me o relnção! Tanto mais que não
1•rn111 U I H'lln� s.ábio.1:1 e doutores da Igreja: eram san tos
l111nlM'•111, r!rnm homens que haviam atingido as maiores
..,,1111111n11l'ln• dn espiritualidade, ao mais alto grau de
1111160 com Deus, de idenUficação com Jesus Cristo, que
Mrn lrradlnvnrn através duma vida de abnegação t olnl ,
ilr u rde nte caridade! E representavam o escol da Cris
lumladr, eram mesmo os plncaros mais altos da cordi
lhrlra da fé, os mais abalizados representantes do pen
•nmrnto cristiio através de todos os séculos: um S.
ln6l'lo de Anlióqula, um S. Ireneu, urn Tertuliano,
11111 S. Atanásio, um S. Arnbl"Ó!lio, um S. João Cris6sto
mn, um S. Jer3nlmo, um S. Agostinho, um S. Ci
rilo d" Alexandria, um S. Bento, um S. Tomás de Aqui
no, urn S. Boaventura, um S. Domingos, um S. Francis
c•o de Assis, etc:., etc.. . . Por que preferir uma
Interpretação diferente, incontestàvelmente proposta 16
néculos depois de Cristo? E, no caso de o fazer, por
que preferir Zwinglio a Calvino, ou êste a Lutero?
211
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cionalistas então divulgados pela Associação Cristã de
Moços do Rio de Janeiro e pela Imprensa Metodista de
S. Paulo. Especiallssimo registro merece, outrossim, o
notável livro, que também li em castelhano: "Con
Cristo en la Escuela de la Oracion". Como diz o titu
lo, é um tratado sôbre a vida de união com Deus pela
oração. E além de preconizar todos os meios para que
nos habilitemos a receber as graças e as respostas de
Deus, aconselha o que até então nu.aca ouvira de ne
nhum pregador evangélico: a prática do jejum. A des
peito de ter Jesus jejuado, bem como os seus disclpu
los, não o costumam fazer os evangélicos, que tanto se
batem pelo retômo aos costumes da igreja primitiva;
ao passo que nenhum costume tem sido praticado tio
seguida e generalizadamente na Igreja Católica... Eram
outras tantas "sementes" . . .
212
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1le·11íruldnndo não mais a bandeira do livre exame mu
11 <ln li herdade de consciência.
213
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mo para êles de 11cristianismo puro" -, e muilo mal!i
perfeitamente do que os "idólatras romanista.a."
Jli repelia também a grosseira identificação que
muitos protestantes faziam da Igreja Católica com a
"Prostituta" do Apocalipse, do Papa com o Anti-Cris
to. Alilis, os pedidos que, já naquela época, os dirigen
tes do movimento ecumênico evangélico encaminha
vam à Santa � para que se fizesse representar nos
seus congressos mundiais, provavam estar havendo sen
slvel evolução do pensamento protestante no modo de
julgar o Papa e a Igreja de Roma.
Lamentava não ter mais meu pai comigo para com
êle trocar idéias sôbre essas e outras questões, que con
siderava, como de fato eram, de suma importincia para
a minha vida espiritual. Felizmente a leitura de Evi
dência.t Cristiall48 e do livro Con Cristo en 14 escuela
de 14 oracion me haviam fortalecido a fé NA PESSOA DE
JE81JS e salientado a super-excelência da vida de co
munhão pessoal com &e através da oração fervorosa e
constante.
Era em Jesus Cristo que se baseava a minha reli
gião e não nos homens e em suas opiniões teológicas.
E se, dia a dia, mais se acentuavam as minhas diver
gências com certas prliticas, opiniões e doutrinas sus
tentadas pelos lideres evangélicos de então, crescia sem
pre a minha veneração pela memória de meu pai. Mes
mo porque não foi @le o cristão que foi pelo fato de ha
ver pertencido a determinada igreja evangélica; sê-lo
ia de qualquer modo. Ademais, se em função duma
Igreja divina, que se perpetua através dos tempos, re
novando-se sempre no conhecimento cada vez mais per
feito da verdade revelada, é que se desenvolve, para
um católico, a história religiosa, - para um protestan
te esclarecido isso se dá na sucessão de fortes persona-
214
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lidndcs proféticas, semelhantes às do Antigo T<!slamcn
to, que transmitem aos pósteros o facho do entusiasmo
e da fé. Não importa a "denominação." E além de
considerar meu pai como dos mais iluslres dentre &ses
homens de Deus, já evoluira também no sentido de co
locar entre as ºdenominações cristãs", e em pé de igual
<ladc com elas, como, aliás, o fizera John Mott, a Igre
ja Católica Romana . . .
A despeito da boa vontade e do esfôrço dos seus
prolessôres e dirigentes, não durou muitos anos mais
o "Seminário Unido". Em parte pelo baque sofrido
pelo protestantismo no Brasil com o desaparecimento
de uma plêiade de lideres que não tiveram sucessores
nas gerações que se seguiram: a Igreja Presbiteriana
perdeu Alvaro Reis, Américo Cardoso de Menezes,
Erasmo Braga, e, algum tempo depois, Mata.tias Gomes
dos Santos e Jerônimo Gueiros; a Igreja Presbiteriana
Independente os pastores Eduardo Carlos Pereira e
Otoniel Mota; a Igreja Congregacionalista o pastor
Francisco Antônio de Souza; a Igreja Batista os pas
tôres F. F. Soren e Salomão Ginsburg; a Igreja Epis
copal o Bispo Kinsolving e o Dr. John Meem.
Com o falecimento quase simultâneo dêsses
homens, que constituíam inegàvelmente wna elite es
piritual e intelectual, perdeu o protestantismo brasi
leiro mwto do seu vigor primitivo e do seu ardor evan
gellstico; e o "movimento unionista" os seus principais
propugnadores. E voltaram à tona, predominando sô
hre o espfrito ecumênico, u velhas diferenças, que pa
recem, às vêzes, dar razão aos que consideram utopia
o união entre u corporações protestantes, cada vez
mais subdivididas.
Tendo deixado de viver confinado tão sõmente às
puretlcs da "denominação" em que f3ra criado, entra-
215
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rn em contato amistoso com irmãos doutras co?Tentes,
naquela convivência cordial dum Semirul.rio "Unido".
Cêdo, porém, escandalizado com o desentendimento
que eu pessoalmente constatara entre os teólogos, e at.
bre ponto• fundamentais, e não apenas secundários,
como se fazia crer ao povo simples, cheguei também a
julgar uma quimera aquela idéia, já que não via con
cordar o protestantismo todo num ponto que fôsse. A
extinção do "Seminário Unido" veio aumentar o pessi
mismo com que eu já começara a encarar o futuro du
igrejas protestantes e do ecumenismo evangélico. Che
guei mesmo a fazer uma lista de dou trinas professada
pelo cristianismo tradicional, anotando as "denomina
ções" que se incumbiam de negar esta ou aquela dou
trina. Cada uma negava ao menos uma. Logo, con
cluía eu, como alhures já escrevi, o protestantismo uni
do, em conjunto, nega o cristianismo todo.
Na Igreja Católica, cujos maiores teólogos, a co
meçar pelo Papa, encaram hoje o protestantismo e os
protestantes não sàmente com benevolência mas com
verdadeiro interêsse e simpatia; ajudado, outrossim,
pela dislAncia, que facilita uma visão de conjunto, uma
apreciação mais equilibrada, resultante também do
constante cultivo daquele esplrito que nos leva a "sen
tir com a Igreja'', que vê mnte"'41mente o pródigo que
volta ou que ainda se mantém afastado, - pude enca
rar mais caridosamente não s6 o protestante como tam
bém o protestantismo, não s6 a alma dêste protestante
individualmente como também o conjunto dêsses mi
lhões de batizados, de crentes sinceros, que, bem ori
entados, poderão atingir e.inda as maiores alturas e dar
tanta gl6ria a Deus!
!!: que perduram, apesar dos pesares, e até mesmo
nos que parecem mais afastados, o que chamamos oe•
llgia Eccletriac. Todos os cristãos, diz o Pe. Georges
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Tavard, "estão unid"" à Igreja pelo laço d85 virtud""
leologais, pela Palavra de Deus consignada na Biblla,
que êles recebem da Igreja Católica; por elementos da
Tradição Católica que êles perpetuam, e pela catolici
dade de alguns sacramentos de que vivem e que é a
Igreja que confere, mesmo nas comunidades protestan
tes. Há a! 1'eallgio. da Igreja, pelos quais se manifes..
ta, entre os cristãos reformados, uma presença viva e
snntilicante que é a da Igreja Católica, Corpo Mlstico
de Cristo." Donde 110 DDNSO RESPEITO QUE, APESAR oos
PESARES, DEVICllIA SENTIR TODO CATÓLICO PltLAS CRISTAN·
DADES SEPARADAS, não por causa da separação mas DI
vurnJDE DA DIANiNCIA, NBLAS, DS NOSSA 11.ÃZ, A BAJfTA
IGRE.JA.U('7)
217
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rio Presbiteriano Independente, onde recebi a benéfi
ca influência de dois professõres notáveis: os Revs.
Epaminondas do Amaral e Alfredo Borges Teixeira.
&te último, teólogo prestigioso, lecionava História do
Dogma e Teologia Dogm6tica. Dêle me vieram outras
"sementes."
"A medida que surgiam heresias, via-se a Igreja na
necessidade de definir certas doutrinas que, de impll
citas, passavam a ser explicitas. Muito tempo depois da
morte dos apóstolos, como na questão do Filioque. a
Igreja ainda se sentia obrigada a definir, sem, propria
mente, Inovar cousa nenhuma."
Quem dizia isto não era um padre católico: era um
pastor presbiteriano, um teólogo protestante dos mais
.acatados, e do alto da c6tedra de um seminário cvan
gélico!<ll
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Então não eram dogmas invcnlodo• pela Jgrejo os
que foram promulgados no decorrer dos séculos!? Eram
meras explicitações, verdades em crisálidas, que, l'm
face dos ataques da heresia, ou, como conseqll�ncia de
um amadurecimento Intelectual, de um progresso no
estudo e no reconhecimento de suas implicações, "de
impllcitas se tomaram explicitas", e apenas se de
finiam!
Mas, afinal - perguntava-me a mim mesmo, - por
que parar no século décimo? Por que não ir um pou
co mais além?
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Com entusiasmo se referia também o Rev. Prof.
Allredo Borges Teixeira à Igreja Romana dos primei·
ros séculos, "sempre fiel à verdadeira f�". - nos dl·
zia êle.
E eu me lembrava das palavras de Jesus a Pedro:
"Eu roguei por ti, Pedro, parca que ca tua /é ..ao
des/caleçca; e tu, uma vez convertido, confirma teua
innãoa".
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Não desfaleceu jamais, durante tantos séculos, a
despeito das mais assombrosas torturas, das mnis cruéi.•
perseguições, a fé que professavam e defendiam herài-
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cernente aquêles Bispos de Roma, que marchavam, can
tando, para as fogueiras, ou em direção ao circo, em
que iam ser triturados pelos dentes das feras faminlas
e enraivecidas! Nem durante as perseguições, nem no
século IV, a época das grandes controvérsias, da luta
contra o arianismo e outras heresias perigosas!
Não podia ouvir tais coisas do meu professai· de
Hislória do Dogma sem me lembrar do hino 63.'" que
desde a mais tenra infAncia aprendera a cantar, que era
mesmo um dos prediletos de meu pai, e que, no fim
de cada estrofe, repete: "PD1'que Jesu.s faz tudo bem!"
Como poderia esse Jesus, que prometera eslar
com a Sua Igreja não apenas durante alguns anos, du
rante uma geração, não intermitentemente, mas todos
os dias, nio apenas até o 3.0 ou o 4.0 século, mas até
a consumação dos séculos, êsse Jesus onisciente e oni
potente, êsse Jesus - "que faz tudo bem", - e que
notõriamente protegera, abençoara, dirigira. inspirara,
que assistira da maneira mais evidente aquela Igreja,
que tinha por Chefe o sucessor de Pedro (a quem tle
mesmo dissera - roguei por ti paro que a tua fé não
desfaleça") , - como seria passivei se esquecesse dela,
permitindo, conlra o que vaticinara, CJUC' prevaleccssC?111
allnal as portas do inferno?
la cu para casa com a alma em ebulição e o cora
ção dilacerado por estas perguntas, suscitadas em meu
esplrilo pelas afirmativas do meu profossor, e pela
lembrança de meu pai, de meu santo e inesqueclvel
pai, que morrera protestante . . . a cuja memória eu
queria ser fiel, cujo exemplo ansiava por imitar, cuja
vida queria reproduzir!
222
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S6 Deus sabe das minhas angústias naqucl�s dias
de lulas Intimas, em que a Verdade, qual um arrebol
de uurora, começava a despontar com a fôrça do sol
nascente!
Fazia, outrossim, o Rev. Alfredo Teixeira calorosa
apologia dos primeiros concllios da Igreja, o que me le
vou a concluir, como sucedeu a Newman, que a defesa
do Concilio de Calcedônia implicava na do de Trento;
que era de todo imposslvel taxar de hereges os euti
quianOH, os monofisilas, considerando 11ortodoxos" os
prot.,slnnle•; condenar os Papas do século XVI e aplau
dir º" do século V . UOJ
Vêm-me às mãos a Filotéia, de S. Francisco de Sa
les e os EzeTclcios Eopirituals de Santo ln'cio de Loyo
Ja, que me dão uma idéia muito diferente da que eu
sempre tivera a respeito da espiritualidade católica.
Relendo o comentário do Evangelho de S. João,
de John Molt, observei ainda um curioso pormenor:
no fim de cada capitulo, havia, freqUentemente, uma
t••tro!e, um pensamento de Santa Teresa, de S. João
du Cruz . . . Verdadeiras jóias! E preciosas setas a lndi
ror o Rumo . . .
Aquêles pensamentos tão sublimes me aguçaram a
�uriosidade, me serviram de "aperitivo" e me levaram
a procurar o próprio original. Deliciando-me com aquê
les autores, punha-me a imaginar como não haveria
meu pai de os apreciar também! Tentava lê-los com
os seus olhos, com o seu coração ardoroso e apaixona-
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do por Nosso Senhor! E em pouco tempo, eis-me trans
formado em admirador entusiasta de Santa Teresa e
de S. João da Cruz! Mas, apesar de tudo, protestante
ainda; seminarista presbiteriano; diretor da Associação
Cristã de Moços; e pregando todos os domingos naa
igrejas evangélicas de S. Paulo.
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NOVAS EXPERitNCIAS
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A QUASE em condições de comparecer
perante o Presbi�rio para o "exame canô
nico'', que ordlnàriamente precede a orde
nação, mas multo moço ainda, fui convidad >
pelo Rev. Alberto Maxwell para ser "evangelista" em
Lambari, no Estado de Minas Gerais, cidade "jurisdi
cionada" à Missão uEast Brasil'', da Igreja Presbiteria
na do Sul dos Estados Unidos. Ficaria como "coadjutor"'
leigo do Rev. A. L. Davis, que era o pastor encarregado
daquela região, uma espécie de "bispo mission!rio."
Segundo o sistema em vigor, os missionários eram.
geralmente, pioneiros. Logo que estabelecidas e con
solidadas, com vida própria, proclamavam-se indepen
dentes as igrejas por êles fundadas, que eram, então,
(•ntregues aos pastôres nacionais; e avançavam mais
pura o interior a abrir novos "campos".
Em Lambari existia tão sõmente uma pequena con
gregação duns vinte e poucos adeptos. Cabia-me a ta
r.,fa de fazer progredir ali o "trabalho evangélico".
Lera bastante a respeito dos movimentos evange
Ji,ticos de Moody e Wesley;"> assimilara bem o espi-
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rito dos livros de Torrey, que tanto insistia na neces
sidade de intensificação da vida interior, e cujos ser
mões eram deveras inspiradores e persuasivos. Mais
tarde descobriria eu que o que me parecia novo e revo
lucionário na técnica do púlpito evangêlico, era o ve
lho lema de S. Domingos: "Contempla14 aliia tradeTe".
O lamentável é que, geralmente, tanto os pregadores
católicos quanto os protestantes, em sua maioria, não
punham em prática tais principios: ou falavam tão sO
menle ao intelecto, ou, então, Unicamente ao sentimen
to. Algo lhes faltava para atingirem simultineamente
a inteligência e o coração do povo, como fazia Clemente
Hoffbauer, Francisco de Sales, Francisco Xavier, João
Maria Vianney. O sistema de Torrey não era outro
que o dêsses grandes pregadores católicos.
Na medida dos meus parcos recursos, procurei ser
ao menos um disclpulo dessa escola. E passei a pregar
tôd.as as noites nas casas particulares dos poucos "cren..
tes" de Lambari, e aos domingos no "salão de cultos",
que, de semana em semana, se tornava menor, conten·
do com dificuldade os auditórios sempre maiores.
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Inebriavam-me aquelas páginas em que despelal11-
va o coração liquefeito de amor aquêle sublime "pos
sesso de Deus"! E não me conformava com o fato de
meu pai nunca lhe ter lido as obras. S. Joio da Cruz
era bem o tipo do reformador que êle admiraria sem
restrições. E imagino hoje com que entusiasmo colo
caria la porta de seu escritório o aviso - "NÃO BATAM; só
"
EM CASO DE MORTE , e se fecharia para ler, meditar, re
ler e assimilar o "Itinerário Mlstico de S. João da
Cruz", de autoria do eminente Mons. Penido!<Jl
Como se incendiaria o coração de meu pai ao ler
"IA liam.a. de amor"!
E sendo S. João da Cruz um dos mais ilustres e
fiéis intérpretes do verdadeiro pensamento católico,
proclamado pelos Papas Doutor por excelência da Teo
logia Ascética e Mística, tirou-me do espirita o resto
de prevenção que eu ainda tinha contra a tão falada
"ido]atria romanista" . • .
Eis aqui, diz o Santo,Ul - e não um iconoclasta
zwingliano, - eis aqui 110 devoto de estátuas: preo
cupa-se com a matéria de que são feitas, a forma, a di
mensão, o valor, a colocação que mais agrada; ai.avia
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algumas delas com vestes de boneca; confia mais numa
que noulra; toca as raias da idolatria; e se porventura
lhe tiram a imagem, perturba-se-lhe tôda a devoção."
Com muito mais severidade do que o fazem os pre
gadores protestantes mais "anti-papistas", - e isto psi..
colàgicamente me ajudou muito -, profliga os exagê
ros dos que parecem centralizar a sua religião em ob
jetos, rosários, medalhas, bentinhos, festas, romarias,
cerimónias, etc. As imagens sagradas, êle as quer ar
tísticas, retratando os santos "ao vivo e ao naturalº e
de modo a despertar a verdadeira devoção (tal como eu
também achava que se podiam fazer.) Desejava mes
mo que fôssem proibidos de fabricá-las quantos não
16ssem peritos na arte. E ao fiel que se visse diante
duma imagem, recomendava que se não detivesse nos
acidentes, que levantasse o espírito para Deus.
Não se limitando a condenar a idolatria grosseira
dos que colocam objetas e pessoas no lugar de Deus,
alerta freqilentemente os fiéis contra a idolatria sutil,
di.slerçada, dos que entronizam o próprio Eu no lugar
que sõmente deveria ocupar Sua Divina Majestade.
Procura precaver-nos, outrossim, do perigo de amar a
Deus usentimentalmente", de nos determos nas conso
lações e deleites que o própria oração nos dá; e preco
niza o desapêgo absoluto, pela purilicação passive, pelo
enoitecer dos sentidos e da afetividade, pela "noite do
esplrilo", durante a qual se exercita a lé pura, que pos
sibilita aquela abnegação total, que leva, enfun, ao
Amor transformante, no Amor unitivo, à identificação
com Jesus Crlsto.
E S. Joio da Cruz não inovou como, então, me pa
receu: apenas exprimiu com maior rigor o autêntico
pensamento católico, o mesmo que inspirou o grande
movimento ascético de Ci&ter e que constitui, a bem
dizer, a quintessência do catolicismo.
230
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Evidenlcmente não é responsável e Igreja pdo•
abusos nem pelo atraso espiritual de muilos que �n
traram no catolicismo, mas nos quais o catolicismo ain
da não entrou salisfatoriamente. Mas o curioso é que,
durante certo lempo, graças a S. João da Cruz, conse
gui achar menos frio o templo calvinista, menos árida
a sua liturgia, que, na verdade, reflele o esplrito de
João Calvino, o qual, no fundo, como observa o Padre
Bouyer, e apesar de ludo, vários traços tem de seme
lhança com o do reformador do Carmelo . . .
Demonstrou-me logo, porém, a experiência "pas
toral" que, como nem todas os católicos l�m um psi
quismo que se adapte às paredes brancas do Carmelo,
ao "vazio" da alUssilna espiritualidade de S. João da
Cruz, a que, via de regra, só se alinge gradativamente,
também os cristãos evangélicos, que não são puros es
p[ritos, mas almas encarnadas, necessitarão, ordinària
mente, de ºmuletas" e ºtrampollns11 espirituais, que fi
carão no caminho, mas de que, a principio, seria teme
rário abrir mão. Dai a necessidade psicológica de se
dar a máxima atenção à disposição interna e à cons
trução artística dos templos; e a importincia da músi
ca sacra, recurso de que lançam mão os calvinistas mo
dernos, e às vhes com técnica admirável, para atingir,
peloa aenlidaa, o esplrito dos fiéis.
231
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varam Lulero e seus primeiros discípulos a romper com
as formas concretas de peDS811lenlo e devoção que lhes
ofereciam os costumes e as Instituições de sua época",
recorda que o que se intentava, de inicio, nada mais
era do que "uma reação, ditada por um aenlimeRlo re
ligioao mdiacutivel, contra uma teologia efetivamente
pelagianizante e uma piedade em que o acessório ten
dia mesmo a abalar o essencialº.
Estava longe o pároco de Lambari de interpretar
com tal benevolência o movimento protestante do sé
culo XVI; como não podia, em absoluto, admitir boa
fé, sinceridade de propósitos e espirita cristão naque
les hereges que lhe invadiam a seara.
Tentei um dia visitA-lo. Mas não quis saber de
conversa comigo . . .
Tão infelizes e contraproducentes os métodos por
êle usados para exterminar de sua cidade a heresia
avassaladora, que em pouco tempo tinha passad o de 20
para 200 o número de protestantes; sem falar dos sim
patizantes, que não eram poucos.
Tendo eu fundado também um ginásio leigo, com
ensino facultativo de religião, e onde os catequistas ca
tólicos poderiam, se quisessem, lecionar também, criou
o pároco tris ou quatro colégios, que, juntos, não ti
nham o número de alunos que Unha o meu. A popu
lação eslava decididamente ao meu lado e o vigário
cada vez mais desprestigiado.
232
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o em estabelecimento declaradamente confessional, pro
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INCURSõES EM TERRA IGNOTA
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ll1 EFLAGRADA 11 revolução de 1930, julguei
propício o momento para me afastar daquele
pôsto, em que servira por um ano e meio.
Não me sentia animado a continuar na
Igreja Presbiteriana; muito menos a me tornar minis
tro daquela "denominação".
Lera a formosa "Oração da Pedra", pronunciada no
lançamento da pedra fundamental da Igreja (episcopa
liene) de S. Paulo Apóstolo, em Senta Teresa, no Rio
de Janeiro, pelo Revmo. Salomão Ferraz. Foi um dos
toques mais fortes que recebi no rumo do catolicismo...
Outro ministro da Igreja Episcopal, que é o ramo
brasileiro da Igreja Anglicana, me emprestou um livro
interessanllssimo escrito por um colega seu: "The Ca
tholic Church", que me alargou aind11 mllis os horizon
tes . <l l O autor, piedoso ministro da corrente anglo
cat61ica, discorria sôbre a sucessão apost61ica, sóbre os
sacramentos, sôbre os usos e costumes da Igreja Cató
lica. Pràticamente aceitava tudo o que ensina a lgre-
237
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j:i de Ro1na; quanto ao Papa é que lhe reconhecia tão
siimente o primado de honra, não o de jurisdição. Mas
as nova" "sementes" iam ficando . . .
Após a morte de Alvaro Reis registraram-se várias
cenas muito pouco edificantes na I.ª Igreja Presbiteria
na do Rio. Por ocasião dwna das várias assembléias
gerltis, convocadas para a escolha do sucesor do pran
teado ministro, houve mesmo quem sacasse do revól
ver para fazer valer o seu direito de falar. . . O resul
tado foi uma cisão que deu origem à "Igreja Presbite
riana Livre", de mais efêmera duração do que a "Igre
ja Presbiteriana do Calix Comum", fundada em Bela
Horizonte pelo Sr. Francisco Augu9to Deslandes. Era
pastor da "Igreja Livre" o Rev. Victor Coelho de Al
meida, que, eleito sucessor de Alvaro Reis, renunciara,
aceitando depois a direção da nova igreja, que acabou
desaparecendo coin a conventão ao catolicismo do seu
principal esteio, o presbltero Crimilde Leite de Aguiar.
Crimilde Aguiar linha sido o superintendente da
Escola Dominical da Igreja Presbiteriana ao tempo em
que eu era seu aluno.
238
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Várias vhes fui almoçar no "Restaurante Vegeta
riano", de propriedade do Sr. CrimUde de Aguiar, a
convite do meu amigo Tibyriçá Nogueira Reys.
Impressionou-me sobremaneira a alegria em que
andava o meu antigo professor da Escola Dominical, o
entusiasmo com que se referia à Igreja Cat61ica.
- Você já leu êste livro? - indaga-me êle um dia
mostrando-me a obra de Leonel Franca: "A loreja, n
Re/onna e a Civilização".
- Ainda não. Li apenas um artigo do Pastor Oto
niel Molla, que, surpreendentemente, o declara "il"rcs
pondíve]".
Levei para casa o livro emprestado com o compro
misso de anotar tudo aquUo de que discordasse ou que
não compreendesse.
Apreciei bastante a obra, que me abalou bastante,
ernbora não me convencesse de todo: #! que o autor,
com esplrito polêmico, natural num moço de 29 anos,
a escrevera na Europa, focalizando o proteslantismu
hi•tórico, do século XVI; não tratava propriamente do
nouo protestantismo, nem tio pouco penetrara, como
fêz o Pe. Louis Bouyer no seu admirável trabalho "Ou
protesl411ti.sme a l'Eglise", na alma protestante, na vida
duma paróquia protestante. t curioso, aliás, observar
que o reconhecimento feito, lealmente, por um católi
co, dos elementos positivos do protestantismo, produz
no espirita dum protestante sincero uma impressão mais
favorável do que o exame dos elementos porventura
negativos.
"A largueza do remo de Deua", do Pe. Alves Cor
reia, me foi, por exemplo, muito mais útil do que cer
tos livros de ataques violentos ao protestantismo, cujos
autores nem sempre distinguiam teologia de psicologia ,
e, não raro, se mostram bem superficiais em conheci..
mentas hist6ricos.
239
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Tendo feito, como prometera, as anotações à mar
gem do livro do Pe. Franca, levei-o ao meu amigo ex
protestante, que logo se prontificou a me apresent.ar ao
autor.
Dois dias depois encontrava-me, pela primeira vez,
com um Jesulta, em came e osso! E logo o grande
Leonel Franca!
Que surprêsa agradãvel!
Inesqueclvel o meu encontro com o admirável pes
cador de almas! Impressionou-me muito mais a sua pes
soa do que o livro!
Com que segurança, com que mt!todo, com que cla
reza e elegAncia expunha o seu pensamento! E que
encantadora suavidade!
Repeti várias vêzes a visita. Ocupadissimo sem
pre, parecia, entretanto, o Pe. Franca, ao receber uma
visita, que outra coisa não tinha a fazer senão ouvi
la; e com que atenção e fidalguia!
Leonel Franca atingira o "planalto da serenidade".
Via tudo sub apecie aeternitatis. Nada o perturbava!
Para se ter uma idt!la do grau de perfeição a que
chegara em matéria de auto-domlnio, basta lembrar a
sua ct!lebre "conferência da mõsca'', pronunciada nwna
pequena cidade do interior de Minas.
Não era o Pe. Franca um pregador popular: fala
va de preferência a intelectuais. Não estava, pois,
aquela assistência culturalmente à allura do conferen
cista.
Discursou por mais de uma hora o eminente sa
cerdote. E . . . durante todo êsse tempo, uma môsca
passeava na sua calva, de um lado para o outro . . .
Os ouvintes o! que se impacientavam com o falo;
o conferencista, porem, impasslvel, parecia nem perce
ber a existência da môsca!
E que espetáculo a Missa celebrada por êle!
2-40
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Certo dia, vendo-me fatigado, necessitado dum r<"
pouso, perguntou-me se não gostaria de passar nlgun•
dias no "Colégio Anchieta", de Nova Friburgo. Fun
cionava lá, naquela ocasião, o noviciado da Companhia
de Jesus.
Naquela mesma semana chegava eu a Friburgo, em
cuja Igreja Presbiteriana pregara várias vêzes.
Criado num ambiente impregnado de profunda pie
dade, mas também de arraigados preconceitos contra o
catolicismo em geral e os jesultas em particular, entrei
ali um tanto prevenido. Quanta cousa ouvira e lera
contra "os famigerados jesultas" . . .
Recebe-me amàvebnente o reitor da casa, R. Pe.
Paulo Bannwarth, que me leva a visitar o histórico edi
fício em que Rui Barbosa fizera o famoso discurso re
tificando afirmativas infelizes e infundadas dos tempos
da mocidade, no prefácio de "O Papo e o Concilio".
Aquêle passe io pelo grande edillcio me deixou
agradàvebnente impressionado. A ordem, o silêncio, a
ntmosfera carregada de espiritualidade, - tudo me en
cantava!
Fiquei sabendo de certas particularidades sabre a
vida do noviciado e a respeito da formação intelectual
" espiritual dos "disclpulos de Loyola". Entram no
noviciado os jovens candidatos à vida religiosa após
concluirem o curso de humanidades. Durante dois
nnos se isolam do mundo. Não lêm jamais. A não
ser em casos excepcionais, não recebem visitas nem
corr<!spondêncie, senão da famllia, e muito espaçada
menll'.
Entregam-se, durante equêle perlodo, a intenso
trabalho esei!tico, fazendo, inclusive, "o grande retiro
espiritual", de trinta dias, segundo o método de Santo
Inácio. Foram êsses "exerdcios" que deram ao mundo
241
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um S. Francisco Xavier e numeroslssimos outros após
tol"" e santos.
Findo o noviciado, segue-se o curso filosófico, lei
to com o máximo rigor e seriedade, após o que se in
terrompem os estudos para um perlodo que dura no1·
malmente uns três anos, durante o qual, como ºmes
tres" nos colégios da Companhia, amadurecem, adqui
rem valiosas experiências pedagógicas, examinam-se
bem e são igualmente examinados quanto à vocação.
Depois do magistério faz o estudante o seu curso de
teologia, ao fim do qual é ordenado sacerdote, tendo já
30 anos, pelo menos. Vem a seguir mais um ano de
"provação", que é como que outro "noviciado", duran..
te o qual deixa de lado o néo-sacerdote os seus altos
estudos intelectuais; ai, numa recapitulação geral de
sua vida, exercendo variados ministérios apostólicos e
entregando-se, de novo, tão sômenle a leituras e exer
clcios espiriluais, sob a direção dum 11instrutor" ex
perimentado, recebe "a última demão", coroada por
mais um retiro completo, de trinta dias. Após essa long-.1
preparação é que S(!lgue para o 11front", a combater o
bom combate.
Os que manilesl.am pendor pora alguma especia
)ização, fazem, então, novos estudos; os que desej am,
por exemplo, doutorar-se em Escritura Sagrada, estu
dam ainda mais 7 anos no Ponliíicio lnstilulo Bíblico
de Roma e no de Jerusalém.
:t verdade que não fiquei sabendo de ludo isto na
quela ocasião. Não tive, infelizmente, um guia como
lenho sido para tantos amigos meus. Tive de procurar
por mim mesmo, de "quebrar a cabeça" por conta pró
pria nas minhas incursões de reconhecimento e pesqui
sa através dos muitos e variadlssimos arrabaldes dessa
imensa e maravilhosa cidade que é a Santa Igreja Ca
tólica.
242
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Leonel Franca foi, realmente, um farol; ulillssimo,
M'ln dúvida. Um "c::icerone", porém, sempre faz falta.
Seja como f&r, a semana que passei , em 1931, no
nnviciado dos jesultas, exerceu decisiva influl!ncia na
minha evolução espiritual.
Conheci, naquela ocasião, o grande Bispo de Ni
t�rói, Dom José Pereira Alves, enlão em visita pasto
ro) à cidade de Nova Friburgo. Foi a primeira vez que
c•ntrei em contato com um Bispo católico, e logo um
Bispo como D. José, todo bondade, todo simpatia, ver
dadeiro "homem de Deus"! Encantou-me sua simpli
ridode!
Impressionou-me, outrossim, o ambiente do unovi
t·iado". Nobres europeus pe11ando a vassoura e var
rl'ndo os corredores com a mesma naturalidade com
que antes pegavam os seus talheres de prata! E que
t•xpres.'ião de alegria em tôdas as fisionomias! Uma
nlegria celeste, de quem deveras se toma criança. como
rrcomendou Jesus que fizessem os que desejassm se
i:ul-lo.
O bibliotec6rio da casa era o R. Pe. Cesar Dainese,
um dos maiores valôres culturais da Companhia de
Jesus, que também me cativou sobremaneira entregan
do-me as chaves das qualro bibliotecas do Colégio An
t•hieta! Poderia ler e levar o que quisesse para o meu
'luarto, a cuja porta um Im1ão, destacado para meu
"unjo de guarda", vinha de vez em quando bater para
perguntar se precisava de alguma cousa . . .
Só precisava e realmente desejava poder ficar em
•il�ncio a ler aquelas maravilhas, que eram absoluta
novidade paro mim.
Entrei ali em contato com o grande Monsabré, atrn
vrs de seus sermões admiráveis, como, por exemplo, o
<111r trato da Eucaristia. De todos os livros, porém, o
243
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que mais me prendeu e interessou foi, sem dúvida, o
Compêndio de Teologi4 Am!tica e Mí•lico, de Adolphe
Tanquerey. t que do curriculum dos seminários pro
testantes não constam duas matérias que se estudam
nos seminários católicos: Teologia Moral e Teologia
Ascélica e Mlstlca; como também não consta do curri
culum dos seminários católicos a cadeira de "Teologia
Blblica", que os evangélicos possuem.<>1
Já tivera a felicidade de receber aquêles alicerces
tomistas no início do meu curso de filosofia. Agora
descobria êsse livro precioso pelo qual acabei deixan
do todos os outros. Desaparecia no bosque situado por
detrás do 11Chateau", e ali ficava, horas inleiras, mer
gulhado na leitura.
Transcorreu ràpidamente a semana. Receiando,
porém, estar a Importunar os meus caridosos hospedei
ros, julguei de bom aviso vali.ar para o Rio. Mal sa
bia que poderia ter ficado lá não sõmente algumas se
manas, mas a vida t&:la . . .
Dizendo ao Pe. Bannwarth que precisava regres
sar, perguntei-lhe se niio seria posslvel emprestar-me
aquêle volume, cuja leitura ainda não pudera terminar
e que tanto bem estava Cozendo e minha alma.
Eslavo, porém, o livro cntalogado numn estante em
que se lia: 11Ne auferontur" . . .
Eu, em seu lugnr, emprestaria ou daria logo o li
vro ao proteslante tiio interessado no sua leitura; ou
providenciaria, já que naquele tempo não se achava
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1·01n lurilitlndc
nas livrarias, a fim de que outro l"Xem�
11lur lhe chegasse logo às mãos.
Nc15So bonlssimo Pe. Bannwarth, entretanto, ha
hllundo a obedecer às mais pequeninas determinações
110 Hc11ra e dos Regulamentos, e mal supondo até onde
"'" poderia ter levado o livro, não viu como resolver
" cll!IO a meu contento. De fato, o Compêndio de Teo
logia Ascétka e Múlica, de Tanquerey, foi, como cos
tumo dizer, uma espécie de chave de trilho de bonde:
111 eu numa direção e, de repente, já estava noutra,
bem diferente.
Deus tem, porém, os seus caminhos. Newman tam
bém levou cêrca de cinco anos naquele perlodo, em que
cu me achava, de dolorosa e dramática transição espi
ri tu ai.
Todavia, era mister passar ainda por outras expe
riências para que, dado o passo que acabaria dando,
nunca mais retrocedesse nem liv.,,,,;e dúvidas. Mesmo
"porque o homem não é um silogismo; s6 a pouco e
pouco descobre - vivendo - as Implicações reais dos
principias que esposa."<»
Descendo a Serra dos órgãos, dizia comigo mesmo:
"Ou êsses homens são muito, mas muito hipócritas . . .
(mas, se é posslvel ser hipócrita um, dois ou três dias,
sê-lo-á muito dificil durante tantos anos seguidos, du
rante a vida tôda . . . ) ou, então, essa instituição, con
tra a qual tanta cousa já li e ouvi, é a mais caluniada
de !&las as instituições."
E repelia, em surdina, a última estrofe do hino
que, naquele mesmo trem, doze anos antes, meu Pai
escrevera:
245
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''Diu, pois, o que queres de mim,
E farei, meu Senhor, tua l>Olltade;
Eu sou teu . . . par11 sempre . . . sem fim . . .
Deus de amor, de ;ustiç11 e veTdaàe!"
246
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Senão vejamos: as vestes talares, que tanto me
DKradavam, e a meu pai também, sempre foram usada.
pclos antigos pa.tôres "reformadores" durante o culto
e as cerimônia. religiosas.
Os salmos, que se recitavam todos os dias em mi
nha casa, no culto doméstico, e que na Igreja episcopa
liana eu ouvia cantar de preferência a certos hinoo in
dividualistas e sentimentais adotados pelos calvinislas
modernos, eram os únicos cintlcos admitidos pelos cal
vinistas ortodoxos, para os quais, como nota o Pe.
Bouyer, s6 os hinos inspirados poderiam corresponder
condignamente à Palavra inspirada.
A doutrina calvinista da Eucaristia, a da presença
dinâmica de Nosso Senhor no Sacramento, foi preteri
da e definitivamente substitulda pela do sr. Ulrich
Zwinglio, que afirmava ser a Santa Ceia simples come
moração, e a. sagradas espécies meros slmbolos ou fi
guras.
Queria Calvino, coerente com a alta idéia que ti
nha da Eucaristia, que em todo culto se celebrasse a
Santa Ceia, o que não fazem os calvinistas, que não
comungam mais do que uma vez por mês.
Calvino acreditava na virgindade perpétua de
Maria Santlssima, o que não acontece com os nossos
calvinistas.
E se nos adentrarmos bem no campo teológico, che
garemos a uma curiosa conclusão, aparentemente para�
doxal até: a de que o protestante que retomar ao pri
mitivo pensamento de Calvino e de Lutero estará mais
perto do dogma católico do que das opiniões esposadas
pelos mais credenciados representantes do protestan-
247
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tismo hodierno. Eis um tema que merece detidamen
te examinado. l4>
24!1
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NA IGREJA LUTERANA
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ERTO DIA, vejo num matutino a noticia d3
inauguração da Igreja Luterana no Rio de
Janeiro. Era a única igreja protestant.e que
eu não conhecia; e Jogo "a le9ilim11 igre;a
da Reforma"!
Curioso, fui ver de perto a Igreja Lut.erana.
Uma surpr&a! No lugar de honra, um altar, com
velas acesas e um belo crucifixo! O pastor de vestes
talares. A liturgia, tôda cantada, solene, Impressionou-me
muito bem. Depois é que verifiquei que era, na reali
dade, a da Missa romana traduzida para o vernáculo,
com pequenas alterações. A comunhão, de que s6 po
diam participar os membros da Igreja Lutem&, se fazia
com parllculas iguais às que se usam na Igreja Católica.
Após o culto vem o pastor cumprimentar o viMi
tante, convidando-me a voltar no domingo seguint.e.
Antes disse domingo, porém, já me fazia uma visita
de cortesia o Rev. Rodolio Hasse, estabelecendo-se logo.
entre nós, relações de cordialidade, que perduram até
o dia de hoje.
Abaladíssimo nas minhas convicções religiosas, má
xime por haver constatado que não passavam de len
dRs pueris muitas de.s acusações que sempre linha ou
vic!o contra a Igreja, que de perto e por dentro, como
251
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eu estava começando a conhecer, era bem diferenle do
que julgam os evangélicos, ia descobrindo uma face
desconhecida, que Karl Adam asseverava e ludo es
tava me fazendo crer que era de falo "le 11rai vi.sage du
Catholiciame". Embaraçavam-me os passos, porém,
certas amarras de ordem senlimental, já que foi no
proteslanlismo que meu pai subira a tão grandes al
luras espirituais e a êle estava ligado quando partiu
diste mundo; certos preconceitos que me intoxicavam
ainda e de que só me libertaria paulatinamente; a mio
pia mental que me não permitira distinguir, como de
pois conseguiria, o essencial do acidental, a doutrina
definida de certos costumes regionais, o tronco das pa
rasitas e larvas, o autêntico catolicismo de suas gros
seiras contrafacções, - tudo devido, pslcolõgicamente
falando, em grande parte, à falta de quem me tomasse
pela mão e me orientasse. Carecia, igualmente, de
mais unidade mental, por isso que, do ponto em que
ainda olhava para a Igreja, não lograra ter a visão de
conjunto que me levaria àquela opção definitiva, que
importaria nas mais dolorosas rupturas, no sacriflcio
de me ver incompreendido e desprezado pelos que ama
va com tôdas as veras d'alma.
Indubilàvclmente fazia-se nece!ISÍlria, outrossim, a
ação do tempo; ademais eu não via, no Brasil, um ca
tolicismo como o que me haveria de entusiasmar em
1957 na Alemanha e na Inglaterra, e em 1959 nos Es
tados Unidos e no Canadá, mas, freqüentemente, um
sincretismo verdadeiramente desconcertante.
Não era, pois, de estrnnhar-se a desesperada e der
radeira tentativa que fiz para ficar do lado de lá; que,
como no circo de Jerusalém, derrubadas as delesas
externas, ainda me entrincheirasse por detrás de uma
segunda, de uma terceira muralha, até a rendição de-
252
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finitiva, quando conquistado, afinal, o "Sancta Sanc
torum" da consciência.
E foi assim que, durante um ano, com o Pastor
Rodolfo Hasse, fiz um curso de revisão teológica para
me esvaziar inteiramente de qualquer resqulcio que
pudesse ter do calvinismo . . . "
Hoje reconheço a utilidade dessa minha passagem
pela Igreja Luterana: muitos preconceitos que ainda
nutria em relação à Igreja Católica, e de que começara
a me desfazer com Erasmo Braga, Alfredo Teixeira e
John Mott, acabei de perder no convlvio com os lute
rano• e nas tertúlias teológicas com o Pastor Hasse,
inegàvelmente um grande cristão, auotero, reto e con
victo.
:t que, em matéria de liturgia, por exemplo, mui
to tem um calvinista que aprender com 09 luteranos,
que, mais conservadores, observam, como os anglica
nos também, as principais estações e datas tradicionais
do ano cristão. m Estranhamente alérgicos a tudo que
253
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vem de Roma, rejeitaram os calvinistas a seleção de
textos blblicos feita pela autoridade eclesiástica para a
leitura no culto público, como também a ordem litúr
gica, que remonta, em suas linhas gerais, à mais alta
antiguidade, ao próprio tempo dos apóstolos. A esco
lha das lições blblicas, dos hinos que a assembléia deve
cantar, e, muitas vêzes, a própria ordem do culto é
transferida ao arbltrio do pastor, que improvisa as ora
ções e todo o programa da reunião no sentido das idéias
e sentimentos que pretende inculcar nos ouvintes. Até
a oração, que geralmente se segue à prática, nada mais
é, como acentua o Pe. Bouyer, do que uma slntese do
que dissera, um segundo sermão indireto.
A ordem do culto calvinista, sobretudo no Bra•il,
mantém, pois, o povo submisso ao gôsto e às opiniões
particulares dum pastor ou dum grupo de pastôrcs.
Vivem, assim, os fiéis sob o influxo de personalidades
marcante.s, a quem se atribui t6d.a a autoridade em ma
téria de interpretação da Escritura, e, não raro, a in
falibilidade doutrinal negada ao magistério oficial da
Igreja. Suprindo a Igreja, impede, entretanto, a uulo
ridade dou trinal do pregador-«"lebrante a desagrega
ção total que fatalmente rl'Sulturia d:i prúlica cfc•tiv.1
e rodicaJ do 11llvre-exame''. . exercido, quando muito,
por um grupo, e niio pelos fiéis individualmente. Já a
Igreja Luterana, em relação à liturgia, all"S"r das mu
tilações havidas na sua "Formula Missae", procura
manter-se conservadora; e teologicamente pode dizer
se que seja, talvez, 80% católica.
Na verdade, não sei se a rigor se pode falar assim,
determinando 11porcentagens de catolicismo". Mas o
(ato é que a Cristologia sustentada pelo Slnodo Evan
gélico Luterano do Brasil é correta. Dai, conseqlien
temente, como se lê na Fonnula Concordiae, conside
rarem os luteranos llARIA SAKTiSSDIA llATD DIU.
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O hatihmo e a Eucaristia, como sacramentos, sàO'
pera os luteranos MEIOS DE CRAÇA, de santificação, ca
nai• pelos quais, ordinàriamente, o Espirita Santo nos
otinJle o ahna, e não apenas mera figura, sinais ou slm
boloo. Por isso, o Batismo, também administrado às
t•riam;as, lava a mancha do pecado original.
Adotando os credos apostólico, niceno e alanlll!ia
no, querem êles filiar-se à mais antiga tradição cristã,
reconhecendo, outrossim, de certo modo, o progresso
dogm4tico, vislo ser o credo atanasiano desenvolvimen
to e explicitação do niceno e éste do apostólico.
A doutrina da Eucaristia é a que mais se aproxi
ma da que sempre sustentou a Igreja Católica. Da con
•ubstanciação para a transubstanciação há apenas um
passo. Afirmando estar o Corpo de Nosso Senhor
Jesus Cristo ..em, com e sob o pão e o vinho", admi
tem os luteranos a presença simultAnea de quatro subs
tâncias na Hóstia consagrada, ao receber o fiel a Santa
Comunhão: o pão e o corpo de Nosso Senhor Jesus
Cristo, o vinho e o Seu Sangue Preciosissimo. Houve, ao
que parece, uma precipitação, uma certa falta de ama
durecimento filosófico e teológico da parte dos que as
!'lim definiram o ºmysterium fidei".
Não costumam os lutei-anos cultuar, corno os ca
tólicos, a Divina Eucaristia visto crerem na presença
real de Cristo tão sbmente no momento da comu
nhão . "' Não refletem no fato de Nosso Senhor ter
255
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dito "lato é o meu Co'l'º · . . isto é o meu Sangue", llll·
tes mesmo de os Ap6stolos comungarem: a Presença an
tecede o uso. (Mons. Penido)
Contudo, prudentemente, consome o celebrante,
como fazem Uimbém os anglicanos, qualquer partlcula
e o que sobrar do vinho consagrado . . . "'
A defesa que fazem os luteranos do uso das ima
gens sagradas, que também possuem, é das mais con
vincentes para o protestante habituado a argumen
tar apenas blblicamente ."'
Outra surprêsa para o calvinista que entra em con
tato com a Igreja Luterana é o fato de se conservar
ali a confissão particular. Nunca se aproxima da mesa
da comunhão um luterano que tenha na consciência
um pecado grave (nós dizemos mortal) : confessa-se,
256
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primeiro, particularmente ao seu pastor. E os pasta
res uns aos outros, ao menos por ocasião do slnodo
anual, cuja primeira sessão costuma ser "de confis
sões": comparecem os pastares, todos com as suas ve�
tes talares, ouvindo-se mutuamente em confissão. :f:
comum levantar-se da cadeira o pastor que ouvira a
confissão do seu colega e, por sua vez, ajoelhar-se di
ante dêle para lhe fazer a sua confissão! I!: uma cena
das mais edificantes, e que tive oportunidade de pre
senciar.
Dizem-se ainda os luteranos com a Igreja Cat6lica
até. . . o Fi!ioque. Poderiam ter ficado um pouco
mais . . . o>
257
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Aprovado também, foi decidida a minha ordenarão,
que se realizaria no Rio de Janeiro, com a tradicional
cerimônia da imposição das mãos, logo que regressase s
dessa viagem.
De acôrdo com um antigo costume, o "candidalo
ao ministério" deve passar uma noite t&la acordado,
em oração.
Se depois disto se mantiver disposto a aceitar o
"chamado", então receberá as "sagradas ordens".
Obedeci ao rito da "vigllia de armas", tendo sido,
a seguir, ordenado pastor.
Nos primeiros tempos fui coadjutor do Pastor Has
se na parÓquia da Paz, tendo depois acumulado essas
funções com a de pastor da comunidade do Redentor.
O Pastor Hasse, brasileiro de origem germAnica,
falando perfeitamente o português e o alemão, percebe
ra, logo no inicio do seu ministério, a necessidade de se
nacionalizar a Igreja Luterana, sob pena de acabar de
saparecendo. Até pouco tempo antes, o culto e a pre
gação se faziam na Ungua alemã; os jornais e livros re
ligiosos eram editados em alemão; as aulas do Seminá
rio dadas, igualmente, em alemão. Era, pois, a Igreja
Luterana uma igreja alemã para a colônia alemã. Coin
258
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n &utracrução dos descendentes dos a1emães na comuni-
1lad<' nacional se daria fetalmente a dispersão; os fi
ll1u• dos luteranos ou se tomariam católicos ou - o
•1u� :wrin mais prováve1, - acabariam sem religião ne
nhumn, como aconteceu a tantos milhões de descenden
h'N dOll peregrinos da 11May Flower", arro1ados hoje nos
"
•:•todos Unidos entre os "no church goers .
Meu ingresso na Igreja Luterana deu ao Pastor
lllL'-"" mais Animo para prosseguir na sua campanha
"" integração. Além da minha designação para seu
'·oodjutor, conseguiu criar, outrossim, uma "comissão
•inodal de censura literária", de que êle fazia parte
juntamente comigo e o Dr. Afonso Freire, antigo mcm
t.ro da Igreja Episcopal e que comigo tamWm se pas
"""' para a Igreja Luterana.
Dai por diante tôdas as publicações da Igreja, in
dusive os artigos do órgão oficial, o "Mensageiro Lu
terano'', teriam de passar pelo crivo não apenas da co
mis.o;ão de censura doutrinária, que já existia, como
tnmbém da de censura literária, então constitulda. Esla
rrn, a bem dizer, uma comissão mista, pois que em dou
trina ninguém havia mais firme do que o Pastor Hasse.
Só depois da aprovação e do competente "imprimatur"
� que se poderia publicar qualquer trabalho doutriná
rio, fôs...., o autor pastor ou leigo.
Onde, então, o livre-exame? Onde a liberdade
de cada um pensar como quisesse?
Isso poderia existir em qualquer parte;
licrcja Luterana.
Com efeito, desde cêdo enrolara o protestantismo
u bandeira do livre-exame promulgando os slmbolos,
confissões de fé e catecismos. :tsse repúdio à tese ini
l'inl {, que evitou, aliás, a pulverização imediata das or
�;.111iz.açües oriundas da Teforma.
259
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Quanto à Igreja Luterana, adotou como slmbolos
de Cê a Fonnula ConCOTdiae, a ConfiMão de Augsburg,
os Artigos de Smolcold e os catecismos menor e maior
de Lutero. Tencionando Frederico Guilherme Ili unir
por decreto o protestantismo alemão, fazendo uma
am61gama de luteranismo e calvinismo, protestaram
muitos luteranos, não se conformando com essa unifi
cação imposta pela fôrça e em detrimento dos princl
pios. Eram minoria, porim, o• irredentistas . flJ
Foram depostos de seus cargos e até presos os pas
tôres "rebeldes". Algumas dezenas conseguiram, po
rém, emigrar, estabelecendo-se nos Estados Unidos, no
Estado de Missouri, onde criaram o "Slnodo Evangéli
co Luterano de Missourl, Ohio e outros Estados". Dai
se chamarem êsses luteranos de "missourianos".
Consolidados nos Estados Unidos, passaram a en
viar missionários para os palses em que havia colônias
alemãs, inclusive o Brasil Até para a própria Alema
nha, onde sobreviviam muito poueos dos chamados "ve
lhos luteranos'', foram mandados misslon6rlos de Mis
souri.
Depois de um perlodo reletivamente longo de "hi
bernação" nas colônias alemãs, durante o qual se ia pro-
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l't'HPtando uma identificação da religião com n raçn, e
tiunbtlm, por conseguinte, com a língua alemã, da qual
l.ukro, lôra, aliás, um dos plasmadores, é que, pelo
•••lúrço de alguns ministros menos racistas, mais "uni
vt•rMllstas", como, no Brasil, o Pastor Hasse, e em par�
I<• tom�m pelo fracasso do nazismo, se foi procurando
ndaptar o luteranismo à lndole, à llngua, e à psicolo-
11ia dos povos entre os quais apenas bruxoleava.
Deixando o alemão de ser a llngua oficial do lute
rnnismo, - o que certos teólogos missourianoa deplo
ravam,"' menos pelo seu germanismo do que pelo
receio de se infiltrar pouco a pouco na Igreja, por tra
duções apressadas e imprecisas, pela adoção de novos
ténnos, o vfrus da 11heresia", - impunha-se absoluto
rigor no trabalho de que eslava incumbida a nossa
"comissão de censura".
Foi assim que, além de rever com o máximo cui
dado e vernaculizar centenas de artigos de pastôres que
escreviam em portugufs mas pensavam em alemão, ain
da tivemos de "passar a limpo" tada a literatura dou
lrin6ria, tada a liturgia e todos os hinos que vieram a
constituir o hin6rio brasileiro da Igreja Luterana. Têm,
ali6s, os luteranos duas espécies de hinos: os hinos "Ji.
túrgicos", que se podem cantar no culto, e "" hinos po
pulares, para reuniões sociais, familiares, estudantis,
etc. etc.
Difere bastante a hinologia luterana da "reforma
da". Reformada é sinônimo, entre os evangélicos, de
cal.,iniata. O bino litúrgico luterano não é sentimen-
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tal: é maciçamente doutrinário; é um comentário da
doutrina memorizado com facilidade e em belíssimas
melodias sacras de João Sebastião Bach, que era lute
rano, e doutros mestres da arte coral, que, no domlnio
da piedade, diz Bouyer, foi "uma das maiores senão a
maior das criações do luteranismo".
Não me canso de repelir que me !oi utilíssimo o
estágio feito na Igreja Luterana, onde acabei de perder
o resto dos preconceitos e da prevenção que tinha con
tra certas práticas da Igreja Católica, inclusive no que
se relaciona com a censura eclesiástica.
262
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h• <JllL' o ministro de Deus tem poder e ordem para ab
:w lver os pecadores arrependidos, em nome de Jesus
Cristo. E, como tantos anglicanos também o fazem,••• e
cm número cada vez maior, praticam os lutemaos a
confissão auricular, que, de resto, Lutero praticou du
rante t6da a sua vida. Como alhures Já di�. não co
mungam na Missa (é êste o nome que dão ao culto
em que se celebra a "Santa Ceia") se lhes pesa a
consciência pela transgressão da lei divina. Procuram
em particular o paslor e "se reconciliam", como fazem
também os pastôres, que se confessam uns aos outros.
263
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Mais do que a "Santa Ceia" das igrejas 1"eformadas,
a "Missa" luterana é celebrada com uma seriedade de
veras exemplar. Não é no cullo comum, de adoração
e pregação, mas de manhã cêdo que se reünem os que
vão participar da comunhão. Não é uma reunião pú
blica, mas apenas da comunidade, precedida de rigoroso
exame de consciência, de uma medilação destinada a
excitar a contrição e a preparar a alma para o encon
tro pes.soal com Jesus Cristo .ºº'
Em matéria de Eucaristia, como ji\ noti\mos, os
calvinistas modernos são . . . zwinglianos! A maioria ab
soluta dos presbiterianos, batistas e congregacionalis-
Suada11
ai 12.45 2.30 4.30 ond 5.30 p . m . '
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11111, que ""·' consideram teolàgicamente calvinistas, nem
1•11ulwec 11 doutrina da ºpresença dinlmica" de Nosso
S1•11hur n a Eucaristia, pregada por João Calvino; proles
r1u111 pu ra e simplesmente a teoria de Zwinglio, segundo
11 quul o pio e o vinho são apenas súnbolos, e nada mais.
JA "" luleranos, apesar dos t@rmos da sua defini
�iio dogmãtica, segundo a qual recebe o comungante o
Corpo e o Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, ver
dadeiramente presentes "em, com e sob o pão e o vi
nho'', acreditam, na prática, quase o mesmo que os
fiéis católicos ao se aproximarem da mesa eucarlsti·
ca. A abnosfera, pois, é diferente da de uma igreja
reformada. Aliãs, até mesmo a disposição interna dos
templos lembra muito mais a das igrejas católicas: o
altar no lugar de honra, centralizando a atenção; o
púlpito ao lado, indicando que o principal é o culto,
enquanto a finalidade da pregação é instruir os fiéis,
conduzi-los e prepará-los para menos imperfeitamente
adorarem ao Senhor; o ministro convenientemente pa
ramentado, para significar a sublimidade de suas fun
çõesões; o crucifixo sôbre o altar recordando o misté
rio central do Cristianismo, - a Encarnação e a Re
denção; os quadros representativos da Virgem Santls
sima, ou dos santos apóstolos, levando o pensamento
dos fiéis para as páginas da Escri tura. I!: um ambiente
de recolhimPnto e de oração, que de lato ajuda a de
voção.
Pouco antes do Inicio do culto, tocam os sinos, -
o que é mais um traço material de ligação com a igre
já histórica.
Entram os fiéis e esperam, em silêncio, rezando ou
lendo algum salmo, a hora do culto. Em surdina, toca
o órgão um prelúdio sacro, de preparação espiritual.
Paramentado, às vêzes precedido pelo cõro, entra
processionalmente o pastor. Todos se põem de pé em
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honra de Nosso Senhor represcntado pelo seu Ministro,
que, Jogo a seguir, cantando, saúda o povo: "O Senhor
•eia convoaco!'', ao que todos, cantando também, respon
dem: "E com o voaso espirita." E prossegue a litur
gia, que ê, pràlicamente, a da Missa católica em ver
náculo, sempre cantada, porém, e por t6da a assembléia.
Já ficou dilo que a doutrina luterana do batismo é
absolutamente a mesma da Igreja Católica: o batismo
não ê, como querem os reformados, um simples rilo
de ingresso na Igreja; o batismo, aplicando à alma os
méritos do Sangue de Cristo, realmente a purifica da
mancha do pecado original, produz a fé e integra o ba
tizado no Corpo Mlstico de Crislo. Por is9o procuram
os luteranos batizar o mais cêdo passivei os recém-nas
cidos. E a oferta que dão ao pastor, nesse dia, em ação
de graças a Deus, é geralmente bem maior do que as
espórtulas usuais que os católicos dão por ocasião do
batismo de seus afilhados. E, como os calólicos, lêm
êles o costume de apresentar também os padrinhos, que,
no caso de falta ou negligência dos pais, passam a ser
os responSllveis, perante a comunidade, pela educação
cristã do afilhado.
Essa educação se processa no lar e na escola. E,
como fazem os católicos do• Eslados Unidos, da Ale
manha e doutros paiscs cm que conserva e Igreja, com
mais rigor, os seus velhos costumes, têm sempre as
congregações luteranas a sua escola paroquial. A se
gunda pessoa duma paróquia é o Professor, que ainda
há poucos anos era uma espécie de mestre-escola, o
que, evidentemente, só seria passivei quando pequenas
as comunidades. Crescendo o número de alunos, pas
sa o mestre a ser o orientador geral e professor de re
ligião de iadas as classes. Em vez de uma "escola do
minical", como a que foi institulda nas igrejas reforma.
das, preferiram os luteranos o ensino diário da religião
266
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nas suas escolas paroquiais, que mantêm sob rigorw..1
fiscalização do pastar.
Para a juventude duma par6quia luterana n f..,;ta
má><ima é a da Confinnação, para a qual se faz uma
longa e rigoroslssima preparação. O exame de doulri·
na é feito publicamente, perante a comunidade, deven
do cada um dos candidatos responder de cor às 375 per
guntas da Catecismo Menor de Lutero, dizendo ainda
nlguns dos verslculos da Blblia em que se baseia cada
uma dessas respostas. E não é simples trabalho de
memorização: pode o examinador, como qualquer um
dos presentes, perguntar o que quiser para se certifi
car de que o candidato está deveras preparado. Se
fôr aprovado, e senda boa.• as referências sôbre sua
conduta cristã, é, então, admitido à Confirmação, e,
conseqüentemenle, à Comunhão Eucarística. Do con
trária, deverá esperar a Páscoa do ano seguinte!
Por falar em Páscoa, registre-se ainda que os lu
teranos observam o ano litúrgico tal como instituldo
pela Igreja Católica. A divisão da Dec!logo é também
a mesma divisão tradicional adotada pela Igreja Ca
tólica. Conservam igualmente, os luteranos, em suas
Blblias, os chamados livros deuterocanônicos, que os
refonnados eliminaram ."'> E têm um profundo respei-
267
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to por Maria Santlssima, que é, para j!les, MÃZ DE DEUS
e sempre Virgem. E, como recomenda o Catecismo Me
llOr de Lutero, fazem também o sinal da cruz "de ma
nhã, ao se levantarem, à noite, antes de se deitarem,
antes e depois das refeições, nas tentações e nos pe
rigos".
Tão diferentes dos demais evangélicos, consideram
"" êles os legltimos protestantes, os herdeiros de Lute
ro, que foi, no seu entender, o grande Profeta, o ver
dadeiro Reformador da Igreja Cristã. Para os lutera
nos, Calvino, Zwinglio e outros "reformadores.. do sé
culo XVI foram simplesmente uns "apóstatas", defor
madores da Verdade. Não fazem, por conseguinte, ne
nhuma liga com as aeit411, como classificam, com des
dém, as demais igrejas evangélicas. Por isso é que tive
de me submeter a rigoroslssimo curso de revisão teo
lógica, para me 11desintoxicar" da 61heresia calvinisla"...
Não participam dos movimentos ou lestas de confrater
nização, cada vez mais comuns entre as outras con!is
sões protestantes, e não recebem na sua mesa euca1·ís
tica senão os luteranos em pleno gôzo de seus privilé
gios e de cuja ortodoria não tenham dúvida.
Nenhuma condescendência, igualmente, em relação
à Igreja Católica. Apesar de tão próximos da Igreja
em tantas doutrinas, tradições e costumes, na liturgia
e na disciplina eclesiéstica,1 1 !> nutrem, entretanto, os
268
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m iuou.riano.s, lamentàvelmente, um ódio profundo no
c11tolicismo em geral e ao Papa em particular.
Se houve uma salutar evolução entre os prol<'slun·
le.s alemães em sua atitude para com a Igreja Católico,
nenhuma alteração se verüica até agora na mentalidade
dos n1isaouria71os, aos quais é de se reconhecer o dlrei..
to de reivindicarem com exclusividade o titulo de "lu
teranos", de que tanto se ufanam, por serem os que
de fato se mantêm mais fiéis à doutrina e ao espírito
de Lutero. Deu-se, todavia, um fenómeno de inconse
qüente cristalização. Aceitando, como dizem, os cre
dos apostólico, niceno e atanasiano, admitindo, portan
to, um progresso dogmático, fazem-no parar artibrà
riamente, petrificando-se no mais rígido imobilismo .<"•
Nenhum progresso teológico teria feito mais a Igreja
Cristã desde o Filioque . . . nenhuma heresia nova re
clamaria da Igreja novas definições, que, como salien
tava o meu saudoso professor Alfredo Teixeira, nada
mais eram do que meras explicitações de verdades im
pllcitas. E se, prussianamente, fizeram alto no ponto
em que estavam no momento em que o seu general
tombou, tão pouco progrediram no modo de apreciar
os valôres sustentados por outros ramos do próprio
evanseli.smo, nem se abrandou a cólera que lhes trans
mitiu Lutero ao gritar aos seus discípulos: "Deus vos
encha de ódio ao Papa!"
Não rebatizam, em absoluto, um cat61ico que se
torne luterano, reconhecendo como válido o batismo
da Igreja "do Anil-Cristo", - ao contrário do que fa
zem as outras 11denominações" protestantes, exceto a
Igreja Anglicana, que, aliás, não se considera mais pro
testante. No entanto, isolada dos outros protestantes,
269
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com os quais, ao menos por certas afinidades, por pa
rentesco espiritual, por identidade de sentimentos, de
veria confraternizar; e investindo violentamente coatra
a Igreja Católica, com a qual tanto tem doutrinária e
liturgicamente em comum, - pretende ser a Igreja
Evangélica Luterana 110 resto fiel", "A VERDADEIRA JCRE
JA VISÍVEL DE CRISTO NO MUMDO! "ll 4)
Esta afirmação feita, certa vez, do púlpito, pelo
Pastor Hasse, despertou-me da espécie de sono lelár
gico em que, insensivehnente, ia começando a cair, tão
"católica" me parecia a Igreja Luterana. Algumas ve
leidades que tivera, de promover um encontro entre
teólogos luteranos e católicos, que, a meu ver, bem po
deriam 11acertar os relógios", numa comunicação reci
proca de experiências religiosas e numa revisão hisl6rica
e doutrinária em que se desfizessem preconceitos e
malentendidos, se dissiparam como nuvem que o ven
to leva.
Insatisfeito com a escassa literatura lulerana exis
tente em vernáculo, geralmente muito árida e replela
de chavões; verificando que o escrupuloso receio de
ucair em heresia" levava os pregadores a se limitarem
a repetir os sermões de Walter e doutros reólogos se
guro.o, a ponto de nos poucos se ter criado um DIALETO
ESPECIAL para os pregadores, e com um "vocabulário
básico" reduzldlssimo, procurei arejar-me um pouco
em matéria de foitura.
270
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Muito mais 11católico" do que antes, J!rn�a�1. mui
grado seu, à Igreja Luterana, dispondo de mais tempo
porque dedicado agora tão sõmente ao pastorado, nwr
gulhei nos livros mais a fundo.
A despeito da minha formação filosófica tomista,
pois fôra Sinibaldi o autor adotado no meu tempo de
estudante no "Seminário Unido", nunca lera o próprio
Santo Tomaz. Andava desejoso de conseguir um
exemplar da "Summa Theol6gica" quando me vem às
mãos exatamente o que queria, e de maneira aparen
temente casual. Entrando numa loja, à Rua Bueno:;
Aires, nem sei mais porque nem para que, dou com
alguns volumes do Aquinense. Começo a folhear um
dêles, interessado. O dono da loja, João Luiz Anesi, an
tigo seminarista, piedoso e apostólico, sabendo quem eu
era, pergunta-me se já lêra a Summa Theológica..
- Ainda nio; mas tenho muita vontade de ler.
- Pois leve emprestada essa coleção. Pode ler
com calma. Não tenha pressa em devolver.
O leitor que conhece Santo Tomás pode imaginar
o que aconteceu. Durante dias e dias, de manhã, de
tarde, de noite, à distincia de tantos séculos, através
daquele "tratado elementar" destinado a principiantes,
como considerava a sua obra "o mais santo dos sábios
e o mais sábio dos santos", atuava o Doutor Angélico
no M'ntido de pôr ordem nos meus pensamentos, de con
•olldar os alicerces íilos6ficos tomistas de minha pri
meira formação superior, e de joeirar, separando o joio
do trigo, 1111 noções que assimilara de uma teologia meio
inconseqllcnle.
Da doutrina escrita, da teoria exposta com tanta
clattza e lógica pelo Doutor Comum, passei depois a
um gênero de leitura que teve, para mim, muito mais
valor apologético do que todos os livros de apologética,
271
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por isso que me apresentava a doutrina vivida, os prin
clpios transpostos para a prática de cada dia: a biogra
fia dos Santos!
Nada foi mais convincente para mim do que o ca
tolicismo traduzido em atos, do que o heroismo na vir
tude, do que a impressionante unânimidade na fé, a
unidade na variedade, que sobrexcele na vida dum S.
João da Cruz, duma Santa Teresa, dum S. Francisco
Xavier, para s6 citar três gigantes, tão diferentes e tão
parecidos, e que, como todos os outros, santamente se
ufanaram de pertencer à velha Igreja consolidada pelo
sangue dos mãrtires, de terem como Pastor Supremo e
Pai espiritual o Bispo de Roma, de se acharem sempre
em casa quando, em qualquer latitude, se acolhessem à
sombra do Sacrário!
A vida dos santos, lida com atenção e meditada
<:om seriedade, e os esc:ritos espirituais dos grandes
mlsticos contribuiram mais decisivamente do que qual
quer outro gênero de leitura para fazer jorrar, em
borbotões, a luz que, aqui e ali, entrevia, intermitente,
<:omo a de um longlnquo farol dentro da noite.
E como, 11ez abuntanria. cordla 01 loquitur"1 trans
parecia, inevit.àvelmenle, nas palestras e nas minhas
pregações o que me crepitava nalma. Cada vez mais
impossibilitado de afinar com o do diapasão o!icial de
minha igreja o estilo dos meus sermões; não podendo
mais, em consciência, ocupando o púlpito luterano, re
vestido das vestes talares lutemas, pregar luterana
mente, - pensei em renunciar ao pastorado, mesmo
porque era cada vez mais forte e irresistlvel a atração
que sentia pela Igreja Católica!
Com os meus antecedentes, porém; prêso por la
.c;os de amizade a tanta gente que não poderia compre
·ender as razões de minha atitude; benquisto e tratado
272
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com a mAx.ima consideração pelos pastôres e membros
da Igreja Luterana, - resolvi, então, agir por partes,
pedindo licença, por tempo indeterminado, das minhas
funções, para depois então me denútir definitivamente.
Inconformados os meus amigos luteranos, procura
ram-me, em comissão, receosos de me haverem magoa
do involuntàriamente. Fiz-lhes ver que que nenhu
ma queixa tinha contra ninguém; sempre foram todos
para conúgo duma gentileza deveras eativante. Eram
tão sõmente de ordem doutrinária, motivos de consci
i!ncia os que me levavam a me afastar do pastorado.
Escreveu-me também o Presidente do Sínodo, Rev.
Pastor Augusto Heine, desejoso de remover qualquer
dificuldade que porventura houvesse e reiterando a
expressão do seu apriço e confiança.
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Também era mister, quiçil, ampliar ainda o meu
patrimônio doutrinário com aquisições outras que de
veriam fazer-se não sõmente no silêncio de uma biblio
teca mas no contato pessoal com alguns católicos qu>
vivessem intensa e coerentemente a sua F�.
E foi o que se deu quando da excUJ"5áo que fiz a
Pernambuco em julho daquele ano de 1935.
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CAEM AS ÚLTIMAS MURALHAS
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AQUELA �A perigavam seriamente as
in.•tlluições democráticas, e a própria exis
tência do Brasil como nação independente
e soberana. De tal modo se infiltrara o co-
munL�mo, e tão incapacitado se mostrava o regime
l ibrral para evitar o golpe de estado já articulado pelos
IKikhevlstas, que a maioria absoluta dos jovens patrio
ha da minha idade se alistara no movimento que, era,
na realidade, apesar de certas falhas e contradições, o
mau poderoso dique que at� então se erguera contra a
onda vermelha: a Ação Integralista.
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A conslalação dêsses fatos me aproximou ainda mais
da Igreja."'
A tribuna polllica, na qual continuava, na verdade,
a pregar os meus sermões de sempre, foi para mim,
como que um sucedAneo do púlpito. Ali6s o tema cons
tante dos meus discursos era "a revolução interior",
convencido que eslava de que sem a cristianização do
povo, e conseqüentemente dos pollticos, nada de eficaz
e perdurável se lograria realizar pelo bem do BrasU.
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O progresso do integralismo levou, talvez, os co
muni�ta!I a ativar os preparativos para o seu golpe, que
Í<Ji marcado para julho de 1935. Rebentaria o movi
mento cm Recife e Natal; convergindo para o nordes
te as fôrças do govêrno, estouraria noutros pontos e se
11lastreria a Revolução.
Convidado e ir, com mais quatro companheiros,
para o Recife, onde, mesmo com risco de vide, deveria
tudo fazer pera evitar ou, pelo menos, adiar a irnap
c;ão do movimento subversivo, parti no mesmo dia e
pelo primeiro navio.
O que foi aquele memorável campanha de três
meses, em que, debaixo de balas e alvejados por bom
bas, realizámos intensa propaganda anti-comunista, tan
to nos bairros operários e nas fábricas minadas pelos
bolchevistas, como nas praças, nos cinemas e pelo rá-
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dio. - em Recife, na zona agreste e no sertão, - da
ria para um volume dos mais inleressantes; ou pelo
menos para um capitulo que o leitor haveria, certa
mente, de apreciar. Fugiria, porém, à finalidade dêstc
trabalho, que jã se vai alongando bastante. Basta di
zer que a Revolução comunista marcada para julho só
estourou em novembro, tendo havido tempo, pois, para
se preparar a resistência e abafar o golpe.
O que, porém, importa focalizar de modo parti
cular, é a experiência que viria completar e acelerar
o meu progresso evolutivo no rumo da Igreja Católica.
Tive oportunidade de conhecer pessoalmente, na
minha viagem a Pernambuco, numerosos sacerdotes
pernambucanos fonnados no histórico Seminário de
Olinda, que tantos apóstolos preparou para a Seara do
Mestre. Fêz-me um grande bem a convivência com
aquêle clero admirável.
Na cidade de Caruaru, em cuja feira semanal as que
mais negócio faziam eram as barracas de livros, conhe
ci Bellsio Córdula, chefe integralista e católico piedo
so, que me fêz presente de um livro chamado "Jornal
e Penaamenlos de cada dia". Nunca pensou aquela
grande cristã, que foi Elizabeth Leseur, que um dia
aquêle seu diário espiritual seria publicado em portu
guês e lido no interior do nordeste brasileiro por um
antigo pastor luterano, sedento de luz e de uma vida es
piritual mais elevada, e que constituiria para êle uma
verdadeira Revelação!
E foi, para mim, com efeito, uma novidade a dou
trina da sobrenaturalização da dor, do aproveitamento
e da transformação do sofrimento e do trabalho sobre
naturalizado em oração. Porque se os protestantes mais
piedosos sofrem muitas vêzes edificantemente, com pa
ciência, com verdadeira resignação cristã, não conhe
cem, entretanto, o segrêdo, que eu ali descobriria, a di-
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vina alquimia que levava S. Paulo a di<.,r: ""Cum ln
/innor, tunc potens'', - ''quando en/énno, f"nl do 10 1 1
forte, poderoao."
Identificando freqüentemente o sucesso temporal
com a bênção divina'" não entendem os nossos imtios
separados o que o Apóstolo quis dizer quando asseve
rou: "Completo na minha come o que falta d paizão
de Cristo pelo "'" Corpo, IJU" é a Igreja."
Se é completo, se é de valor infinito o sacrillcio de
Cristo no Gólgota, como São Paulo diz que contemplavn
na sua carne o que FALTAVA à paixão de Nosso Senhor?
Uma meditação mais cuidadosa da doutrina do
Corpo Mistico nos leva, naturalmente, à sua conse
qüência: a reversibilidade dos méritos. O Cristo com
pleto não é só Jesus de Nazaré. :Ele é o Cabeça dêsse
Corpo Mlstico de que todos fazemos parte. O Cristo
total, o "Christw plenariua", - no dizer de S. Agos
tinho, - é !le e nós. Se estivermos em estado de gra
ça, poderemos dizer: "niio aou eu que oioo; é Cristo
oive em mim.." E os nossos atos, palavras, e sofrimen
tos serão d'!le; em nós !le agirá, falará e sofrer'- Nos
sos atos serão d'!le em nós; portanto meritórios. Somos
ramos dwna árvore cujo tronco é Cristo; por todos nós
281
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circula a seiva divina. Não é possível imaginar-se mnis
Intima união, mais perfeita unidade.
Pertencendo a uma só Família, a um só Corpo, à
Comunhão dos Santos, não vivemos em compartimen
tos estanques: somos vasos comunicantes. Por isso é
que Elizabeth Leseur dizia que "a alm11 que ae eleua,
elfta o mundo." Todos lucramos com os méritos de
cada um; todos perdemos com os deméritos de al
guém . <•>
Qualquer trabalho, pois, ou sofrimento, moral ou
físico, pode ser unido aos de Jesus em Nazaré, aos de
Jeous crucificado, aos méritos da Virgem Santíssima e
de todos os Santos; todos oomos unun1 Corpu.o in
Claristo, como dW& o lema do meu velho "Seminário
Unido". Nada haverá, pois, de prosaico, de banal em
n0998 vida; tudo foi valorizado, sobrenaturalizado, di
vinizado por Jesus Crioto! Os menores oofrimentos,
°" trabalhos monólonos de todo dia, as cruzes, enfim,
de cada instante poderemos unir à de Jesus Cristo; tudo
podemos oferecer, "com :2le, por :tle e n�e", nesta ou
naquela intenção. !!: como poderemoo ser também co
redentores de nossos irmãos.
Era agora à luz de doutrina tão consoladora que eu
compreendia porque pode ser chamada co-redentora a
Virgem Santlsslma, que, em Belém, e na fuga para o
Egito, em tantas circunstlnclas dramáticas de sua vida,
e, principalmente, no momento cruciante do Sacriflcio
de Seu Divino Filho, repetia o seu Fiat, unindo mlsU-
282
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camente o seu sofrimento Inimaginável ao. do Cordclrn
de Deus, oferecendo-o em união de intenções com '"
do Coração de Jesus.
E, à sua semelhança, como hóstias pequenina.. cm
redor da Hóstia grande, bem podemos, apesar de nos
sas fraquezas e misérias, ofertar todo. os contratem
pos, tôdas as decepções, tôdas as enfermidades em união
com as dares do Crucificado.
Diz D. Colwnba Marnúon, lembrando que Nosso
Senhor, que podia de sua Divindade tirar as fôrças ne
cessúias para levar a cruz até o Calvário, condescen
deu em ser ajudado pelo Cireneu. "A parte do Cire
neu é a nossa. " Temos de levar cada dia a nossa cruz,
como "hwnanidades de acréscimo de Nosso Senhor",
"completando em nossa carne o que {alta à Paixão de
Cristo pelo Seu Corpo, que é a Igreja."
Esta a doutrina que viveu Eliz.abeth Leseur, a da
sobrenaturallzaçio da vida, da transformação do sofri
mento em oração. Sempre sorridente, sempre pacien
te, irradiando o Cristo que nela vivia, foi bem uma luz
nas trevas, o fermento de Deus no meio em que atuou.
E, do mesmo modo, todos os santos que fulguram como
estrêlas de primeira grandeza no firmamento da Igreja!
Era, efetivamente, a quinta-essência da delicadeza
moral, o grau mais elevado de identificação com Cristo.
Que abnosfera nessas culmlnlnclas! Que ar puro nes
se altiplano a que tantas almas chegaram! E chega
ram como? Tôdas elas pela freqlientação dos Sacra
mentos; pela penitfncia, pela sobrenaturalização de to
dos os atos, "pela caridade, que é o vínculo da per
feiçãoº.
:t odiosa tôda comparação; mas, no intimo, não po
dia deixar de comparar fsses plncaros a certas planl
des que eu conhecia . . .
283
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Ficaram-me indelevelmente gravados na memoria
tos nomes que naquele ano de 1935 serviram como que
de setas luminosas na estrada, longa e pedregosa, que
eu estava acabando de percorrer, do Calvinismo, via
Lutero, a Roma! Um d&ses nomes é o do Padre João
Barbalho Uchôa Cavalcanti, eom quem, nesse tempo
fiz uma inesqueclvel viagem de automóvel, na qual o
únieo assunto era precisamente êste: o do oferecimen
to dos sofrimentos.
Ilustrava, com o seu próximo exemplo, a doutrina
que Elizabeth Leseur me ensinara, e que constituiu,
como disse, uma Revelação para mim.
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A letra dêsses hinos, na maioria traduzidos do in
glês e pelos primeiros missionários norte-americanos
que vieram para cá, não dá, a quem lhes não conhece
" música, uma idéia do que sio e representam para
n alma de um evangélico. A melodia disfarça o lnfimo
valor llterirlo de muitos dHes. Aliás, analisássemos
também a letra das nossas canções populares. . . ou
mesmo dos hinos religiosos cat6liC09 que o nosso povo
canta . . · ''>
Mas, como dizia, ouvi nitidamente, naquele dia, o
hino de Salomão Ginsburg:
A quarta estrofe:
2115
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São tão católicas certas doutrinas que os nos..os
irmãos separados, em razão dum curioso daltoni!lmo
mental, delendem como suas e em oposição, como erra
damente pe1198111, ao que ensina a Igreja, que os hinos,
que as expressam e fixam na sua retentiva, podem ser
cantados até mesmo nos templos católicos, e sem a me
nor alteração, como, por ellemplo, &se 564.
Uma dessas doutrinas, a que se apresenta mesmo
como o divisor das éguas, que estabelece o ANTAGONIS
MO FUNDAMENTAL entre o protestantismo e a Igreja é
a que se refere à "salvação gratuita, pela fé."
1: incompreensível que se distinga oposição essen
cial entre o que a tal respeito ensina a Igreja e o que
de fato crêem e praticam os evan1élicos. Seria quase
o mesmo que deixar um individuo a l1Veja Católica
por acreditar na divindade de Jesus! . . .
Quem quiser saber o que foi oficialmente e para
sempre detmido sôbre tal assunto, leia os decretos do
Concilio de Orange, reunido em 529 e confirmados pelo
Papa Bonlf6clo ll em 25 de janeiro de 531. São defi
nições conciliares, solenes, confirmadas, nos têrmos
mais expressos, pela autoridade papal.
Curioso que as proposições protestantes sôbre êsse
assunto parecem simples transcrições dos canones 3, 5,
6, 7, 13, 18 e 25 daquele Concílio!C6>
Analisando, com sua admirável percuciência, as de
cisões doutro concllio, o de Trento, reunido mil anos
depois, conclui o Pe. Louis Bouyer que "o católico não
sàmente pode, em nome de sua própria fé, como deve
aderir sem reticência ao sola gratia." E, depois de co
tejar exaustivamente as af,irmações dum e doutro lado,
pergunta o eminente teólogo: "Que mais falta para pr<>
var "que o sola gratia, como o entendem ordinàriamea-
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h• os protestantes, está perfeltaniente de acôrdo coin a
lradiçõo católica?"
E eletivamente:
Diz o art. 4.0 da Confissão de Fé dos Batistas de
N<•w Hampshire, que sintetiza a crença oficial de tô
dns us 11denominações" evangélicas "fundamentalistas":
"Cremos que a salvação é concedida GRATOJTA·
MENTE a todos, segundo o Evangelho; que é dever ime
tliato de todos AClllTÃ-u. por meio de uma fé sincera,
nrdente e OBBDIDITB".
Que é i.• to senão o que sempre ensinou a Igreja
Cntóllca? A fé, que não se manifesta pelas obras, como
di• S. Tiago, é morta, não é a fé salvUica; a que salva
l• a FÉ oamIENTB".
O verdadeiro cristão, como cantam os evangélicos,
('on!ia no Senhor, e observa a Sua Lei, guarda os Seus
preceitos, cumpre com g&to a Sua Vontade:
"Crtt e obsen>ar tudo quanto cmlenar!
O fiel OBEDECE ao que Cristo mandar!"
n; OBEDlSNTE, POIS.
281
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Já que me referi a vanas pessoas que, naquele
ano decisivo de 1935, cooperaram, como instrumentos
de Deus, no acabamento da obra encetada tantos anos
antes, devo registrar também o nome do Revmo. Cône
go Manoel Marques, que conheci como cura da Cate
dral de Pesqueira.
Disseram-lhe que eu era paslor luterano. E.<tava
licenciado do pastorado, mas, afinal, não anunciara o
meu afastamenlo da Igreja Luterana, que não se con
sumara mesmo oficialmente ainda. Ignorava êle a
ação da graça na minha alma, e quão perto estava o dia
da minha completa integração na Igreja. Apesar dis
so, e por isso mesmo, recebeu-me com tal carinho, com
tanto amor cristão, que desde aquêle dia nos tomámos
amigos para sempre.
Mostzou-me a sua catedral, falou-me como a um
colega, visitámos juntos a capela do Santlssimo, onde
nos ajoelhámos, rezando êle por mim (como mais lar-
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de me disse) e eu por êle. . . Sei que celebrou várias
\'êzes a Santa Missa pedindo a Deus que me Uurninasse,
que pediu orações em meu favor a umas religiosas, cujo
colégio visitámos juntos, as quais se admiraram de que
oquêle moço que genuflectia ao passar diante do San
ti"-•imo fôsse . . . pastor protestante!
Sabia o Cônego Manoel Marques que, como digo
sempre, muitas vêzes é melhor falar com Deus a res
peito de certas pessoas do que com cel'W pessoas a
respeito de Deus; que a melhor apologética é a do exem
plo duma vida coerente, a da caridade, a da paciência,
da mansidão. Lera, certamente, a biografia de São
Fruncisco de Sales, que os meus leitores conhecerão
lnmbém, mas de que vem a propósito recordar um epi
Mldio cm que deveriam refletir todos os que se interes
''""' pelo retômo dos nossos irmãos-separados. O pa
•I rr Francisco de Sales, enviado para a região do Cha
Mnis, onde havia 15 católicos e 70.000 protes!antes, pôs
••' u pregar com aquela doçura que lhe era tão carac
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O Cônego Manoel Marques assimilara a lição de S.
Francisco de Sales.
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M••ll1u para inatruçcio do povo; acolá, os assi•1enles in
h•lramentc alheios ao que se passava no altar, a ler,
"''" ... us devocionários, fórmulas de atos de piedade
l u lvr.• bem escritas até, mas na realidade sem nenhuma
n•luçilo com as que fazia o celebrante e a que todos os
litlU. "" deveriam unir. Era o Individualismo religioso,
1111•• 111nlo condenam os católicos no protestantismo, in
vadindo o culto católico da maneira mais completa!
l':m1uanto isso, timbravam os paslôres luteranos, e mes
mo º·"' anglicanos, em fai.er com que todos os seus fiéis
tmnA!'sem parte, ativa e conscientemente, no culto pú
blico . . .
'l'ive, felizmente, a oportunidade de descobrir o
'" lc•souro escondido", que f6ra, até então, para mim. a
l o l urgia católica; de penetrar um pouco no significado
1iro!undo da Santa Missa !llJ
Graças a Deus, a restauração litúrgica, que é, de
IMlo, o grande Reforma religiosa do século XX, Já se
vol !azendo sentir atualmente em quase t&las as nos
""' dioceses; e com os maia auspiciosos resultados, tan
to no afervoramento dos católicos como na sua imuni-
1.oção contra a heterodoxia. Nada, alJAs, impressiona-
291
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rá mais favoràvelmente os nossos innãos separados do
que a Missa celebrada como o quer a Santa Igreja, com
a participação plena de todos os fiéis. Por isso é que
tão eficazmente tem contribuido o contato com os mon
ges de S. Bento para que tantos protestantes inteligen
tes e sinceros venham a conhecer e, em conseqüência,
a abraçar a Fé Católica.
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ftl"vivido o tempo necessário para lazer a gra.mh• d r"·
rc111erto.
A medida que caminhava não propriamente "'"
tr�vas para a luz, mas da madrugada para o esplendor
do 110I, de claridade em claridade, maior aprêço e d�
\'OÇão eu tinha por meu pai, e mais fraterna simpatin
1><•1°" meus irmãos protestantes, que não eompreendc
rlam o meu afastamento e se eonservavam protestantes
por sêde de . . . catolici111110!">
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Todavia, se Deus misericordioso, onisciente e oni
potente, permitiu os malentendidos que resultaram na
rebelião protestante, que arrebatou à Igreja qwase me
tade da Europa; se pennitiu também as progressiva.•
sub-divisões, a verdadeira desagregação do movimento
protestante, a pulverização das igrejas oriundas daque
la Revolução, que, separadas do tronco, vão perdendo,
pouco a pouco, a seiva da vida, - é porque tem, cer·
tamente. algo a ensinar a uns e a oulros.
Por impossjvel mesmo que, humanamente, nos pa
�a, teremos de rezar para que o Espirita Santo ilu
mine os responsáveis pelo destino eterno de tantos mi
lhões de cristãos, que, umo vez, reunidos, fortalecidos
pela permuta de bens espirituais, pela absorção recí
proca de autênticos valôres, chegarão, enfim, pela uni
dade da fé, ao pleno desenvolvimento espiritual, "se
gundo a medida do varão perfeito em Cristo Jesus",
Creio que os antigos lideres evangélicos, integra
dos agora no catolicismo. com o valiosíssimo conheci
mento pessoal que têm da alma protestante; espiritual
mente enriquecidos com a incomparável experi�ncia re
ligiosa adquirida por longos anos de vida euearlstica
ininterrupta, de consolidação da fé e aperfeiçoamento
de sua vida interior através da oração, de leituras e
retiros; com os horizontes mais dilatados pelo estudo
da História, e pelo trato, dentro da grande Igreja Uni
versal, com personalidades de tôdas as raças e línguas
e temperamentos, de mentalidades tão diversificadas,
que realizam, respeitadas as suas peculiaridades psico
lógicas e regionais, e "a santa liberdade dos filhos de
Deus", essa portentosa unidade católiea, - poderão co
laborar eficientemente, com suas luzes e valiosas su
gestões, para desfazer equivocas, pàra diminuir malen
tendidos e pi:econceilos, para destruir, de vez, as pre
venções e os ressentimentos que ainda separam os que
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l>«•us quer irmanados "num só rebanho e sob um só
J•o�tor".
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tava-me ainda uma vi.são mais clara do privilégio da
Conceição Imaculada!
Falaste pelos lábios do Teu ministro!
Como ficaria, um minuto que fôsse, sob o poder
do Inimigo, Aquela que deveria ser o tabernáculo vivo
da p�ria Divindade? Se deste a Adão, que sem má
cula criaste, uma espôsa igualmente imaculada, por que
não imaculada também, e em sentido mais alto e per
feito, a conceição daquela que seria em breve a Espôsa
virginal do Esplrito Divino?
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" uralia 11rali1 dala'', da salvação como dom graluilo de
li""" do que a Imaculada Conceição?"º'
Imaculada, por uma antecipada aplicação dos mé
rllUll de Cristo, - e de1l4rte 14mbéin 1al11a, por preser-
1•nfão1U l l - teve oulros&m antecipada a assunção com
11110 um dia nos glorificarás a nós. Não é verdade que
11111 copo d'água fresca dado em Teu nome não ficará
""'" recompensa? Como deixarias, pois, de galardoar
Aquela que, por Teu amor, em tamanho mar de dôres
mergulhou?
E por que não? Desde pequenino ouvi dizer que
levaste Enoc e arrebataste Elias, que foram, destarte,
llll!luntos ao céu, segundo crêem os protestantes.
Seriam êles, entretanto, superiores a Ela? E nós,
"" cristãos que estivermos vivos no último dia, não se
remos, num abriT e fechar d'olhoa, como diz S. Paulo.
arrebacadoa, indo, aem sofrer a corTUpção do lúmulo,
"ao encontro do Senhor, nos area"? Não crêem os
evangélicos na possibilidade da nossa própria assunção?
E se a Tua misericórdia permitiu, para fortaleci
mento de nossa fé, permanecessem incorruptos os cor
pos de tantos santos, - e alguns como que vivos, qual
o de Santa Catarina Labouré, - irias consentir, Se-
29'i
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nhor, que apodrecessem e servisse de pasto aos vermes
o corpo sacratlssimo da Rainha dos santos, dos mârti
l't:'S e dos anjos?
E se nós seremos coroados por Ti na glória, nós
pecadores, tão cheios de misérias e de imperfeições,
tão miseráveis e tão ingratos, por que não Leria antes
de nós tal privilégio a Mãe do Rei Divino?
Tudo isto vi claramente com os olhos de minh'alma
naquela viagem de automóvel que !iz para o Recife em
companhia daquêle humilde religioso, que deveria
mesmo ser o escolhido por Ti para me falar dêsses pri
vilégios, que sempre proclamaram, mesmo antes de
oficialmente definidos, os disclpulos do Poverello!
E com o último mistério do Sacratlssimo Rosârio
me fizeste chegar ao término dessa minha longa pere
grinação.
Não me restavam mais dúvidas de ordem doutri
ni\ria. Só me faltava aquêle toque final da graça, que
algumas outras almas deveriam suplicar�Te, com �uas
orações e sacriflcios.
Por tudo louvado sejas, agora e sempre!
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E para quem durante muito tempo pensarn que só
os e\'engélicos é que sabiam morrer em paz, e enfren
tar com espirita cristão a morte de um ente querido,
foi também sumamente edificante o quadro que presen
ciei quando da morte inesperada do chefe duma nd
rnirável familia calólica pernambucana, a familia Mou
'inho. O testemunho que dera de sua fé aquêle ver
dadeiro cristão, o esplrito sobrenatural que sua espô
sa, os filhos, parentes e amigos revelaram no doloroso
tran5e, as orações que se faziam pelo descanso eterno
dnquele alma querida, o ambiente de real serenidade.
de lranqilila e filial confiança na misericórdia do Pai
cclcsle, - tudo isto me causou indelével e salutar im
pressão. Era um catolicismo vivido, que lembrava o
das catacumbas romenas. Nenhwna pregação mais
eloquente do que aquela cena que ainda lenho dinnle
dos olhos.
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Pode-se ler aceito, teoricamente, tôda a doutrina
católica; pode-se estar, como eu estava, no limiar da
Igreja, julgando-me católko mesmo, por pensar que
pensava e sentia catõlicamente. Todavia, enquanto
não passanos n a viver a vida sacramental, algo de e•
aencial nos faltará, e que s6 experimentalmente se nos
lu\ de revelar naquela "vila abscondi!a t"Um Chrialo in
Deo", na dulclssima e consoladora realidade da Comu
nhão dos Santos.
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se de uma vez, disposto que estava a ouvir a Su" Vu1.,
fôssem quais f&s.sem as conseqüências.
Rezei, e deixei-me ficar ali, aos pés do Mestre, ex
posto aos raios do Sol Divino.
Naquela coite dormi quase católico; quaae, já que
algo me faltava ainda. :tsse algo era o toque final
da Graça, que não depende de nós: e que me veio de
modo singular. Nem percebi o momento em que tal se
deu, pois, ao despertar, eu me sentia envolvido e pe
netrado por uma luz espiritual que me fazia ver com
muito mais clareza, que me tomava como que trans
parentes certos pontos doutrinários, que, aceitos embo
ra implicitamente, não faziam parte, até a véspera, do
patrim6nio das verdades bem assimiladas.
Não havia mais por que retardar então o meu in
gresso oficial e definitivo na Santa Igreja. Se, à se
melhança do que sucedeu a Newman, não aniquilei
num minuto as léguas que minha alma deveria ven
cer desde que, de longe, vislumbrara o campanário,
não hesitei um segundo mais, tão logo se dissiparam as
derradeiras nuvens, refulgindo-me no esplrito, suave
mas tão intensamente, a Luz do céu!
Impedido o Pe. Franca, que adoecera, recebeu-me
na Santa Igreja o saudoso e inolvidável Frei Pedro
Sinzig, O . F. M . , a quem fiz a minha primeira confis
são, naquele confessionário que fica do lado esquerdo
de quem entra na Igreja do Convento de Santo Antônio,
no Rio de Janeiro .ct2l
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Eram 8 horas da manhã do dia 19 de outubro de
1935, festa de S. Pedro d'Alcintara, quando lambém
subi, espiritualmente, com o celebrante da Santa Missa,
que então se iniciava, os degraus do altar de Deus, do
Deus que encheu e alegrou a minha juventude, que
leve misericórdia de mim e me fêz ancorar, para sem
pre, no pôrto seguro da Verdade e da Paz!
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DEO GRATIAS !
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• AGORA, SENHOR, prostrado diante de Vós,
venho render-Vos publicamente as minhas
ações de graças!
11Bendize, ó minh'alma, ao Senhor, e não
te esqueças de nenhum dos seus benefícios!"
"Miaericordia.a Domini in aeiemum cantabo" . . .
"quia fecit mihi magna qul potens eel . . . "
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amor lotalilário que meu pai Vos devotava e que Ih"
incendiava o coração;
agradeço-Vos os quinze anos de convivência com
aquêle cristão inteiriço, que queria viver, e deveras
vivia, 16 para Vós; que nada quis fazer senão Vos ado
rar e bendizer e servir; que perlranaic bmefaciendo;
para quem o matrim6nio era, efetivamente, na mais
completa acepção do tfnno, o "magnum sacramentum";
que viveu plenamente, na medida das lu•es recebidas,
aquela ri obedienl.e, que salva e santifica, " que rea
firmava em altas v.,.es, pouco antes de partir para a
Eternidade: ''Não me digam . . . não me digam que não
tenho Fé!"; que irradiava em tômo de si aquela ESPE
RANÇA que lhe iluminava o semblante, e lhe permitia
como que antever o céu e antegoú-lo ao di•er que a
Vossos pés queria ouvir a Vossa Santa Lei
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mingos, quando estivesse a {alar de Vós ou convosco;
e qur, amando ao próximo por amor de V6s, se dava
inteiramente, sem reservas, consumindo-se no aposto
lodo, repetindo a cada instante, por palavras e por atos:
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agradeço-Vos o ler podido distinguir na Igreja Ca
tólica não sõmenle um dos ramos do Cristianismo, mas
a Vossa Santa Igreja, a Espôsa do Cordeiro, o Corpo
Mlstico do Redentor, e no Santo Padre o Papa o Vos
so Representante, o Pastor Supremo, a quem quises
tes confiar tôdas as vossas ovelhas e cordeiros, Vosso
ministro plenipotenciário, cujos atos ratificarleis, ligan
do ou desligando no céu o que na terra em Vosso Nome
ligasse e desligasse;
agradeço-Vos, outrossim, o ter aprendido a discer
nir na Vossa Santa Igreja o que é divino e pennanente
do que é humano e transitório; o essencial do secun
dário; o dogma explicitamente de!inido e as verdades
implícitas, em crisálida; a doutrina revelada e o que
não passa de opinião generalizada de teólogas; o que é
litúrgico e o que é costume popular, ou tradição local;
agradeço-Vos o haver conhecido o autêntico cato
licismo, corporificado na vida dos que, pela canoniza
ção, se nos apresentam como paradigmas a imitar; de
ler tido a graça de descobrir o catolicismo sem dislor
ções deformadoras, de ler podido ver, examinar e ad
mirar a Santa Igreja por dentro, como de fato é;
agradeço-Vos a Luz que me destes, e a Fôrça de
que necessitava para dar o passo decisivo e definitivo
de 19 de outubro de 1935, que me fêz "feliz no indizí
vel do superlatlvo", que me trasladou da dúvida para
a certeza, da planlcie para a montanha, duma visão par
cial para a Visão Total, duma comunidade nacional
para a Igreja Universal, duma pequena sociedade sem
raizes no passado pera a grande Família Espiritual que
pode exibir, com santa ufania, e sua árvore genealógi
ca, que, de ramo em ramo, de século em século, de
Bispo em Bispo, vai de João XXID, subindo por Pio
XII, Pio XI, 'Bento XV, Pio X, Leão XIII, até aquele
cujo nome tão significativamente mudastes para Ke-
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phas <" a quem prometestes: "Sôbre esta I1edra r•lifin1-
rci a MINHA IGREJA e as port<u do Inferno não 11r1• 1•n
(f'cttão contra ela";
agradeço-Vos o privilégio, que os de fora niio po
dem avaliar, de pertencer a esla Igreja mil vêze• ben
dita, onde tudo lemos em comum, onde nos sentimos
membros uns dos outros, onde me parece ouvir, a cu.dn
instante, o Convite de que, nos meus tempos de 11pre
gador de bonecas", me fazia porta-voz: "Eu sou. Jesu.s;
vinde todos a Mim! A todos eu sal,,o: a pobres e ri
'*• brancos e pretos, aábioa e ignorantes! Vinde a
Mim!", - pois que, deveras, todos aqui se i rman am na
sanla mesa eucarlstica, consliluindo uma só familia,
nquela que os crentes evangélicos sinceros tanto dese
javam formar quando criaram o antigo ºSeminário
Unido", e pela qual suspiram ao cantarem aquêle hino,
que, com centenas de outros mais, também se me este
riotipou na memória:
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agradeço-Vos o perdão que sempre me concedeis
quando, contrito e cheio de bons propósitos, repilo o
meu ºConfiteorº; e o Banquete Celeste que instituístes
para nos alimentar a alma, iluminar a mente e aquecer
o coração;
agradeço-Vos o terdes consentido que vivesse tan
Los anos após a minha integração na Santa Igreja,
porque, de ciência própria, com real conhecimento, (alo
agora da minha experi�ncia. e, pois, com muito mais
autoridade;
agradeço-Vos a reallzação do meu sonho de criança,
- o de correr o Brasil a pregar o Evangelho, - o que
de há muito venho íazendo, todos os dias, pessoalmente
ou através do rádio;
agradeço-Vos a oportwúdade que me concedestes e
o ânimo que me destes para escrever estas memórias,
com que desejei captar e transmitir a Mensagem de
Fé, Esperança e Caridade, que a vida de meu pai en·
cerra, mostrando, concretamente, que o Vosso Esplrilo
"•OJ>Tll onde quer'' e que ainda hoje tendes "minha•
ourra1 ovelha.a que não aão dlare aprisco";
agradeço-Vos hte ensejo de renovar o testemunho
da minha Fé Católica, Apostólica, Romana; da minha
inteira, total e completa submissão à Santa Igreja, que
é o Cristo continuado através dos séculos; e do meu
amor, cada vez mais profundo e fraterno, aos cristãos
dissidentes, que só por um equivoco, por um tremendo
malentendido se mantêm afastados, entre os quais há
tantas almas retas e sinceras, que, reenxertadas no
tronco, cujas ralzes mergulham nas próprias Fontes do
Salvador, poderão vir a dar, ainda, muito mais glória
ao Vosso Nome Sacrossanto;
e suplico, 'Senhor, em união com todos os que Vos
amem e Vos querem ceda vez mais amado e glorificado,
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que o próximo Concilio Ecumênico atinja plenam<>nt<>
todos os seus objetivos, e, de modo especial, o de criar
as necessirias condições psicológicas para que os qui
nhentos milhões de ortodoxos e protestantes, vendo a
Luz que há de refulgir então, retomem, - irresistivel
mente alraldos, - à Casa do Pai, cumprindo-se destar
te aquela Oração, que tem de ser eficaz, pois que bro
tou do Coração do próprio Redentor Onipotente:
perfeitos na unidade;
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1ND1CE
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Póg1.
Pro/i<lo 11
/ftlróilo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .... . . . . . . . . . . . .. . . . . . . • . . • • 15
EI""'"'"" Po.1Ulvoa . . . . . . . . . . . . ... .. . . . . . . . . . . . ..•. . ..... 25
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Alma cat61lca . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 151
"Mberic:OrdU., Senhor!" 159
P11n1 os bniços do Pai 105
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