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Projeto

PERGUNIE
E
RESPONDEREMOS
ON-LlNE

Apostolado Veritatis Splendor


com autorização de
Dom Estêvão Tavares Bettencourt. osb
(in memoriam)
APRESENTAÇÃO
DA EDiÇÃO ON-LlNE
Diz São Pedro que devemos
estar preparados para dar a razão da
nossa esperança a todo aquele que no-Ia
pedir (1 Pedro 3,15).
Esta necessidade de darmos
conta da nossa esperança e da nossa ré
hoje é maIs premente do que outrora.
'. _ • • 0
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrárias à fé católica, Somos
assim Incitados a procurar consolidar
nossa crença católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.
Eis o que neste sita Pergunte e
Responderemos propõe aos seus leitores:
aborda queslOes da atualidade
oontrovertldas, elucidando-as do ponto de
vista cristão a fim de que as dúvIdas se
'--".... . .' dissipem e a vivência católica se fortaleça
- _I no Brasil e no mundo. Queira Deus
A

abençoar este trabalho assim como a


equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo sila.
RiO de Janeiro. 30 de julho de 2003.
Pe. Estevlo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATlS SPLENDOR

Celebramos convênio com do Estevão Bettencourt e


passamos a disponibilizar neata área. o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológIco • filosófica · Pergunte e
Responderemos que conta com maIs de 40 anos de publicaçao.
M
,

A d. Estêvão Bet1encourt agradecemos a confiaça


depositada em nosso trabalho. bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
279

"Mal"lllsmo e Soel,lI,mo R'.' "

o Social li mo Ru i

MA S.nIlOtI Apareckla H

I
" Mlnhas Vid as"

o Testemunho d o " ReI do Aborto "

~ E.co la LIy,. • G ra tuita"

" Or.llçào de Joio XXIII pelos Judel.ll'"

" Meu Irmlo Leourdo

Março-Abril - 1985
PERGUNTE E MSPOHDEREMOS MARÇO-ABRIL - 1985
Plibllcliçlo .,....... 1 N9279

DiNtor·Aeapon-.t.,.l: . SUMARIO
D. EI'<6vlo BeUencourt OSB
Autor e Re4ator de toda I ~"rla
p'ubllcada ne. te periódico QUE OEVO CRER? ............ .. . lO
Da$r-o\dmJn.ndor
s.mpr. .. perg~ :
D. Hlldebrando P. Marlins ose VIDA EM OUTROS PI..iA.NETAS? .• . .
Um Imo documentado. redlhl: "
Aclmlniltnçlo .. dltlrlbulçlo: " MARXISMO E SOCIALISMO REAL· 101
I:dJç6es Lumen Chrl$ti Ainda o livro de Ch8rboune••:
Dom Oetardo, «I - 59 andar, SI501 O SOCIALISMO REAL • . .. 115
Tel.: (021) 291-7122 UmlhTo.~ :
Calq pos'" 2666 "A SENHORA APARECIOA~ •.•....• 123
20001 • Rio da Janeiro • RJ Ao reoneamaçio mais UIh8 wea:;
- MINHAS VIOAS· .. , . ............. 143
AlftcIa a quntlo candente:
Para pagamento da assinatura O TESTEMUNHO 00 " REI
DO AeORTO· . .......... . ..... _ 1S2
de 1985 queira depositar a im-
Enlr. OI dlntilos do homem:
portância no Banco do Brasil " ESCOLA LIVRE E GRATUITA" ..• • 1S8
para crédito na Conta COlTenle
&'-11 real_nle uma
~ 0031 .304·' em nome do Mos- " ORAÇ;\O DE JOAO XXlll PELOS
teiro de SAo Bento do Rio de JUDEUS" ? . .... ... _.. ... .. . ... 166
Janeiro, pagável na Agéncia da Ca11.l eberta • F ... I Leonlnlo Bofl
Pra~ Mauá (n'it 0435) ou VALE A MEU IRMAO LEONARDO _... .. .. 173
POSTAL na Agoência Cenlral do LIVROS EM eSTANTE • .• • . • .•• 177
Rio de Janeiro.

NO PROXlMO NOMERO
RENOVE QUANTO ANTES 280 - M.lo-Junho - 1985
A SUA ASSINATURA

Armas al6mlc:u para impedir a gIMrrd -


Nov.. técnicas de procrlaçlo. - O aonho
COMUNIQUE-NOS QUALQUER da blllulr o man:lsmo. - Mlsalo /UI mulher
MUDANÇA DE ENDEREÇO
e 1108006<:10. - "Quem <6 a aeste \kJ
Apocallpt.e?- - "Igreja: carisma e poder". -
"Próis Crl.tl U·.
Compo.lç.Io a. Impreaio:
-Marq_ Saraiva-
Slinlol Rodrigues, 2-40
Rio de J IlWllro Com apr'ovação eclesiéstica
QUE DEVO CRER?
As «sentenças» na catequese vão sendo disseminadas e m
tanta variedade que muitos fiéis dificilmente sabem o que é de
fé. Eis por que, à guisa de introdução deste fa sc:Culo. vão apre-
sentadas a s grandes verdades da fé. tais como as ensina a
Santa Igreja Católica.
Cremos em Deus. Criador de todas IlS coisas. visiveis c
invisíveis. A vida de Ocus ê tão rica que ela, sem perder a sua
unidade ou sem se repartir. se afirma três vezes, a sabe!': no
Pai, no Filho c no EsplriLo Santo.
Tendo criado o homem. Deus o elevou à filíacão divin.. c o
ornamentou com os dons da santidi\dc original. A pcrsislcncia
desses dons estava condicionada à fidelidade do homem a um
programa de vida divino. O homem, porém. disse Não a Dem
por soberba (pecado originai originante) . Conseqüentemente,
perdeu Os dons gratuitos que possuia; a concupiscêndia desorde-
nada, a morte e seus precursores (o sofrimento) C!nlraram no
mundo. Os primeiros pais, por isto, SÓ puderam transmitir n
seus descendentes a natureza humana destituída dos dons origi-
nais; o fato de que toda criança nasce assim despojada e porta-
dora de desordem Interior, ~ chamado «o pecado originai
originado,.
Deus Pai mandou seu Filho rcito homem para a.»-umir a
sorle do homem mortal e redimir do pecado a criatura que se
perdera. Jesus Cristo na cruz ofereceu um sacrifício expiatório;
a mortt' e a dor, que eram conseqUôncla do pecado, assumiram
valor positivo, pois Jesus, ressuscitando corporalmt'ntco, delas
fez a passagem para a ressurreição c a vida gloriosa em favor de
todos os homens.
A obra de Cristo não foi apenas uma lição, mas ê um sacra-
mento, ou seja, algo que se prolonga através dos sCculos me-
lliante sinais sensíveis. Destes, o primeiro é a Igreja: mai s do
que a soma de sC!us membros, a Igreja e o Corpo de Crl!'lto
prolongado (cf. CI 1,24: lCor 12,12-27 ) ou é o Cristo presente
entre os seus ate a consumacão dos séculos. As fr'aque:zas dos
membros da Igreja nio Impedem a ação santificadora de Cristo;
dentro d a Igreja existe a santidade objetiva de Cristo, mesmo
quando falta a santidade subjetiva dos homens.
" A"Igreja ~xerce a sua missão pregando o Evangelho, apas-
centando o rebanho de Cristo e ministrando os sete sacramentos.
Estes são sinais que aplicam ao homem individualmente as
gra~ da Rede-nção: o Batismo é a porta de e-ntrada (um"'l
autêntica regen(!raçâo, cf. Jo 3,3.5, e não apenas matricula em
uma sociedade humana) : a Eucaristia é o ápice da ordem sacra-
ment.a], "Como perpetuação do sacrificlo da Cruz para que todos
- ·8 9-
os fiéis possam participar do mesmo como oferentcs e orertas.
A Reconciliação ou Penitência é o remédio que o cristão deve
regularmente receber como antídoto dG pecado. - Os sacra·
mentais (água benta, imagens e medalhas bentas, rosãrfos .. . )
são elementos sobre os quais a Igreja coloca a sua oração
valiosa, pedindo a Deus que todos os que os usarem com té e
devocão sejam enriquecidos pelas graças da Reden~ão.
~ através da Igreja e do seu magistério que Cristc continua
a ensinar aos homens. A S. Escritura e a Tra dlcão são autenti-
camente interpretadas e transmitidas aos fiéis mediante 8 pala·
vra da Igreja, a quem Jesus prometeu assistência especial para
anunciar a Boa·Nova e para dirimir dúvidas de fé e de moral
(cf. Jo 14,16S; 16,13,).
Crlsto deixou à frente da Igreja o Apóstolo Pedro e seus
sucessores (cf. Mt 16,16-19; Lc 22,315; Jo 21,15-17), de sorte
que aderir a Cristo jmpllca aderir à Igreja e ao Santo Padre;
este goza de graça particular para desempenhar o seu ministério.
Mesmo cs Papas de vida menos reta nunca ensinaram algo con-
tra a fé e a moral da Igreja.
A Igreja tem seu modelo em Maria SanUsslma, Virgem
e Mãe, que j á 8ftOra na glória celeste possui o que a Igreja
possuirá no fim dos tempos. Maria, como Mãe da I,greja, é a
grande Intercessora em favcr dos fiéis (cf. Jo 19,25~27).
Os sacramentos tornam o cristão filho de Deus, portador
da graça santlficante, que é a semente da glória futura.
, Esta semente desabroch ará na visão fa~a·face do céu; ou,
se for espl!2lnhada, dará lugar à frustraeão mais cabal. que 6 o
inferno. Se o cristão não se purificar dos N'SQufclos do pecado
para POder ver a Deus faCt7a-face IoJto após a morte, terá a
ocasião de o fazer no pu~tórlo póstumo.
O diselpulo de Cristo também crê n:.. comunMo dol'l ~':'"tl)'l :
iodos os fiéis que comungam com o tesouro dos méritoo dI!
Cristo. comunS!;am entre si e podem ser úteis 11ns aos outros palll.
!lua santidade de vida e pe:lu sua.o; DteceS. EstA. comunh ~n n'io
é interromDldA ~Ia morte. de modo ('Jue ()S justas na vida pÓs-
tumll. podem intp.rceder em prol dos sp.us irmii.os. peree:rin~ nH
t erra; o Senhor Deus. fautor rla comunhão, se digna revelar-lhes
e s nossos anseies neste mundo.
O cristão crê outrossim na existência dos anjOlt bons e mA.US
(demônlosl , sendo que este!': sio criaturas originariamente boas
Que se perverteram pela soberba.
São estas as grandes verdades da fé católica, oenhor de
vida em plenitude. Que a Quaresma ~ o tempo paseal. eelebrll.·
dos fielmente por todos os crlsUios, lhes obtenham o aumento
de fé e de amor que vem 8 ser o antegozo, na terra. da bem-
-aventurança sem fim! E . B.
-90 -
cPERGUHTE E RESPONDEREMOS.
Ano XXVI - N9 229 - Março-abril de 1985

Sempre se pergunla:

Vida em Outros Planetas?


Em ,[nt... ; A quallo da elllst'nela de planetas habiladOS nlo pode
Nr resolvida com precislo. ... ceno que as çondiçOes ne08Sllé rlu ~r. o
.urto 11 I conUnuidade da vida alo assaz. compleUlS. Como q ...., que laJa,
pode aer que se realizem em alguns planeias dentre a multldao dos Que
existem - e iSto ma IS provavelmenle lora do nosso sistema solar do que
dentro delta.
NOlomos, aliU, que a vida poder'a lomar formas dllerant .. daquela,
que nó. conhecemos, 'orma' que Alo eklglriam 81:1 condlçOes da vida na
18U8, ma., sim, outras Que Ignoramos. 00 seu 1800, a lê nlo se opõe a
h lpolestl de haveI hallilanta. em OU1fOl planetas: o Senr,or Deul IÓ nos
revelou o que interessa diretamente • •alvaçao dos homens na lerrll.
Por enquanto, • tudo o que se poda Chzar em poucas pila..., .. sobra
-'unlO ainda rnuho pouco llIiplorldo,

• • •
A Via Láctea, galâcia da qual faz parte o planeta Terra,
conta centenas de bilhões de estrelas. As galácias no universo
pel'f82em um total de centenas de milhões. Cada estrela é
comparável ao nosso sol, talvez com alguns planetas a girai'
em torno dela.
Dai a pergunta : em tão grande multidão de planetas. não
haverá alguns ou muitos que sejam habitados por seres inte-
ligentes. com os quais possamos ter relacionamento e inter-
câmbio?' Tais seres não estariam mais adiantados do que nós
em matéria de ciência e tecnologia!
As respostas se dividem : hã fisicos e astrônomos que,
baseados em cálculos de probabilidade, optam pela afirmativa
e já tentaram estabelecer contato com os possiveis habitantes
de outros planetas. Todavia são reticentes os biólogos. Que
estudam as condições necessárias para que haja vida e os
requisitos indispcnsãveis para o surto da mesma.
-91 -
4 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS, 229/1995

As lláglnas seguintes tencionam informar sobre o pro-


blema c algumns pis tas de solu.:iio para o mesmo.

J, O problema
o primeiro ponto a considerar dentro da problemâticn ~m
foco rcfere-se à vida c as condições indispensãvels para que
ela possa surgir c durar_ Antes, pois, de perguntar se exis-
tem planetas habitado&" pêrguntemos se existem astros habitá.-
.els.
A vida é caracteriZada por uma certa espontaneidade de
oJX!l-açõe5 que se deve a uma reserva de energia do ser vivo.
Essa energia decorre do metabolismo ou das reações qulmlcas
que se l'eaJlzam dentro de um organismo vivo para armazenar
ou utilizar enerciaj o metabolismo consta de assimilação e ell-
minacão dê substânelas; ele só é possível mediante a presença
de cnrbono e de seus compostos, pois o carbono tem quatro
valência s desiguais, que tornam possivcl o metabolismo.
Para que o metabolismo possa ocorrer, r equer-se também
um melo ambiente adequado, cujo primeiro componente deve
ser a água. Esta não se deve enrontrar nem em estado gasoso,
nem em fo nna sólida de gelo, mas em estado liquido e, por
conseguint(!, numa temperatura superior a ZCl'O grau centi-
grado e assal inferior a cem graus.
Convém outrossim Q1le exista em torno dessa água uma
ntmosíera cstil.vel, rica em oxigênio, dado que a pl'oducão de
enc l'gia do ser vivo se faz rnedi~nle oxidação. Essa oxld!l('ão
supre a ação da cloro(ila .
Em poucas palavras : deve-se dizer que as condições neccs·
sérias para que haja,. vldo, são la existência de matéria orgâ-
nica, cu jo elemen to essencial é o car bo no, em ambiente rico
em oxigênio e agua.
Por conseguinte, um astro Que careça de um desses ele-
mentos - âgua liquida. carbono ou matéria orgânica, almOS·
fera de oxigêniO - não é apto a ser sede de vida.
Posta. esta premissa, excluem-Sê as estrelas (inctusive o
nru.so sol). que não podem obrigar a vida. Esta só pode exis-
tir em planelas Que girem em torno das l.'Strelns. Ora, como
-92 -
VIDA EM OUTROS PLANITAS? 5

nos C muito diC:cil conhecer os planetas (não estamos certos


de conhecer todos os planetas do nosso sistema solar), são
muito limitadas as nossas possibilidades de aVi,llIa l' a probabi-
Iidnde de vida (ora da TCI'rO,
Detenhamo-nos, porem. sobre as cstrelas que podemos ver.
Escolhamos aquelas que podem ter planetas em torno de si,
e vejamos se tais plnnetas podem reunir ns condições necessá·
rias para ser habitados por seres vivos.

2_ As estrelas interessantes
As estrelas são praticamente inumeráveis. A olho nu. po.
dem-se distinguir, no máximo, 7 .000, esparsas pela abóbada
celeste. Os telescópios mais possantes chegaram a detectar
perto de 6 .000 . 000 de estrelas, ào passo que os câlculos e as
avaliac»cs dos astrônomos chegam a contar vârlas centenas de
bilhões de estrelas em nossa galãeia, c quantidades proporcia.
nais nas outras galácS.1s. As estrelas são muito direrentes entre
si. Muitas delas, à primeira vista, pa~m pouco aeolhedorns
para os planetas.
Entre estas devem ser canlmbs .as cstrclllS múltiplas,
muito numr.ros.a!; poroue represenlam 7/10 do con junto dAS
estrelas múltiplas. Dois l (! r~ das estrelas mültiplas são du-
plas: aO) outras são triplas, quádruplas. Quintuplas. ou mesmo
sêxtuplas. Sii.o, todas elas, estrelas nue ~iram umaS em torno
das outras e, por isto, criam um ambiente multo inóspito para
eventuais planetas.
Existem muitas outras (?!;:trelas dita" «variávC!is • . cujo tama-
nho aumenta e diminui notnvclmcnte. s~ndo ritmo mais ou
menos rápido: sobem a um lotnl de 4 . 600. Também são pouco
propicias à existência de planetas.
e preciso mencionar outrossim a... estretns nu... explodem,
ao; que estão no começo ou no fim da sua e-volu~ão, c, final·
mente. as estrelas dit8.-<; "ordinárias,. Cau~ se encontram numa
fase mais ou menos adiantada da sua vida normal).
--
Se a estrela ê bem maior rio oue o sol. ela evolui rap1rlR-
mentp.: o tempo durAnte o qual ela Queima o seu hldrogr.nio
~rá breve demais O1IrJl quI'! aOA1'e(:a I'! se d~nvolvA a vida
(P.!\tA exl~ 1I1p.:un~ bilhões de Rn~ nara ~e formar) . Em con-
seqtillnchl., não nadem fõt'r a21utlmldoras de planetas habitados
as est!'êlas gigantes uuls: e vermelhas.
-93 -
G "PERGUNTE E nESPONDEREMOS~ 229/ 1!J85

se a estrela e pequena demais, ela logo esgota as suas


reservas de hidrogênio e se tr ansrorma em anã branca cada
vez menos brilhante, até tomar-se anã preta. Também estas
não são favoráveis à existência de planetas habitados.

Restam as estrelas medias, as anãs amarelas, como o nosso


50[ , que evoluem lentamente e são capazes de consumir vaga-
rosamente o seu hidrogê nio durante alguns bilhões de anos
(dez bilhões, no caso do nosso sol). Estas são suscetivels de
ter planetas e de permitir que a vida tenha o tempo necessário
para surgir e evoluir . Todavia parece relativamente exlguo o
número de tais estrelas ; os diagramas de Hertzsprung-Russel,
que distribuem todas as estrelas conhecidas segundo o seu
tamanho e a sua cor, reservam espaço assaz limitado às anãs
amarela s.

3. Os planetas habitáveis
Concentromo-nos, pois, nas únicas estrelas que interessam
ao nosso estudo: as anãs amarelas. Nem todas têm planetas
e todos os planetas não podem ser habitáveis; para isto várias
condições são necessárias, e ntre as quais o tamanho e a dis a

tâncla.

Para que uma estrela possa ter planeta, é preciso que, por
ocasião da sua fonnação, ela tenha arrastado boa quantidade
de matéria consigo e que essa matéria, de um lado, não tenha
sido atralda para o centro da estrela c, de outro lado, não
tenha escapado da força de atração da estrela. :e preciso tam-
bém que essa estrela não seja demasiado antiga ou não se
tenha formado logo depois do blg bang ou da grande explosão
inicial (ocorrida hâ cerca de quinze bilhões de anos).

Quando as galadas se constituiram, eram compostas quase


exclusivamente de hidrogênio com um pouco de hélio, e sem
OS outros átomos, que são todos mais pesados. Estes se for-
maram no rim da combustão de estrelas volumosas para que a
temperatura destas se elevasse a ponto de fundir os ato mos de
carbono, nitrogénio, magnêslo, Cerro... ~tes elementos .se
espalharam no espaço pela explosão das supemovas. Após
-94 -
VIDA EM OUTROS PLANETAS? 1

umas tnntas dessas e.x:plosOOs. as estrelas que se forma m em


lal região. reagrupam os átomos mais ou menos pesados que
então podem produzjr planetas sólidos.

A massa do planeta é importante, pois dela depende a pos-


sibilidade de retel' uma atmosfera. Se for massa pequena de-
ma.ls, não a reterã suficientemente; se for grande demais, rete-
-la-á em excesso,

Mel'CÜ.1'io, cuja massa é dezoito vews maior do que a da


Terra, nâo reteve atmosfera na sua superficie. e Marte, que
é nOVe vezes menor, reteve-a insufklentemente, a saber: uma
atmosfera com pressão 166 vezes menos forte. equivalente não
a 760 mm de mercúrio, mas a 4,5 mm - o (lUe é chamado
_um vécuo grosseiroJ,

Vênus, cUja massa é de 4/5 da m.assa da Terrn, reteve


uma ~tmos{era abundante. Está mais próxima do sol do que
n Terra (lOS em vez de 150 milhões de km), o quO? corresponde
a uma influencia do sol quase duas vezt.-s mais l'ol"le; donde se
segue que tem uma t-emperntura de aproximadamente 500"!
1:."'m eonseqUênela, a itgua se acha em estado de vapor supe-
raquecido e se dissocia em cxig~nlo e hidl"Ogênio (est~ se
perde no espaco). O gâs carbônico. por isto, aum(!nta sempre
mais: deixa passar os raios visiveis ou uIH'a-violetas que aque-
cem os corpos, mas detém OS ralos infra-vennelhos produzidos
pelos corpos quentes. Em conseqüência, o calor se torna cada
vez mais forte, a ponto que o chumbo, o zinco e outros corpos
ai são liquldos.

o planeta Marte, a uma distAncia de 228 milhôcs de «m,


recebe menos calOl' do sol, ou seja. 43% menos do que a
Terra recebe. A ausência de atmosfera faz com que as varia·
ções diárias de temperatura sejam grundes, chegando o. lSOO.
com .uma média de 90" abaixo da zero. Donde se vê que, ape·
sar de todos os sonhos, me) existem marcianos; é mesmo imo
poss;vel detectar o mínimo vestigio de vida ou de matéria
orgânica. Se Marte fosse um planeta maiot', não seria tão
inóspito para a vida,

Por conseguinte. na medida em que os podemos conhecer,


verificamos que, cntre os nove planetns do sistema solar, so-
mente a Terra e habitável. l\fcrcurio e Marte carecem de
-95 -
8 .. PERGUNTE E RESPONDEREMOS. 229/1985

atmosfera; JúpJter e Saturno não têm solo; Mercúrio e Vênus


são quentes demais, ao passo que Marte e os outros planetas
nâo são suficientemente aquecidos. Tem·se assim a impressão
de que a Terra apresenta caracterlsUcas excelentes e raras e
os planetas habitáveis não são talvez tão numerosos no uni-
verso.

4. Os planetas habitados
Todo planeta habitãvel nÃo é necessariamente habitado,
pois é preciso que a vida ai surja, a menos que venha de fora.
Suponhamos que a vida. comece num planeta habitãvel, com
todas as condições favoráveis ; âgua, temperatura, etc. Veja-
mos os elementos que devem ser combinados entre si para
que se possa falar de um ser vivo.

o vivente deve dispor, para agir, de uma reserva de ener-


gia, que ele M de poder utilizar nos momentos oportunos. Em
vista disto, sobre a Terra os organismos vivos utilizam enzi-
mas. Estas são atuantes, mas frágeis; são construidas de acordo
com as necessidades, segundo um programa especial para cada
urna delas. Esse programa se situa no lnterIor do núc1co, entre
milhares de outros programas nos cromossomos e no ADN.
Logo que surja uma necessidade, a célula encontra o ·programa
Interessante: f82. uma cópia do mesmo, que se torna uma men-
sagem. Saindo do núcl~. a mensagem é decifrada pelo ribos-
soma. que reune logo todos os ácidos aminados necessários
(uma centena!) e os arruma, cada qual no seu lugar, em me-
nos de um minuto.
A enzima pode então agir e realiza sua tarefa graças a
uma outra série de operações não menos complexas. Assim
funciona a vida sobre a Terra há mais de um bilhão de anos.
A atividade da clorofila também supõe mecanismos multo
complicados, a tal ponto que não somos capazes de realizar a
fota-slntese. Contudo esta é Indispensável, de modo que ne-
nhum animal poderia subsistir sem ela: já há três bilhões de
anos que ela .se verifica sobre a Terra. O que mais impressiona
nesses mecanismos, é a sua perfeita coordenação e sua efi·
ciente colaboracão, que atestam uma. direção central e uma
unidade maravilhosa, tão duradoura quanto a existência do
ser vivo.
-96-
VIDA EM OUTROS PLANETAS?

Mais do que as: minucias desse maravilhoso aparato, o Q.ue
Importa é a sua unidade ou 8 Intensa solidariedade que faz cada
pormenor depender de todo o resto.

Que probabilidade existe de vermos aparecer esse conjunto


e essa unidade de um organismO vivo num mundo deserto?
- Alguns astrônomos julgam que esse aparedmento é fãcil e
que ele se realiza naturalmente desde que o ambiente não se
lhe oponha. Os biólogos sõo mais hesitantes; J . Monod, por
exemplo, que procura explicar tudo pelo acaso, detém·se diante
da pergunta: «A vida apareceu sobre a Terra ; antes Que isto
se desse, qual era a probabilidade de tal ocorrência? Não cstâ
excluido que o acontecimento decisivo se tenha dado uma SÓ
vez. Isto significa que as suas probabilidades de antcmáo eram
quase nulas~ . Em tal perspectiva, mesmo se existem milhões
de planetas h~bitáveis, que esperança existe de que ha.ja mui-
tos deles habitados?

Para evitar esta dificuldade, ou ao menos removê-la para


mais longe, alguns admitem que a Terra tenha sido semeada
por seres vivos provenientes de (ora. F. Crick, por exemplo,
imagina que seres muito inteligentes terão enviado uma nave
espacial, de velocidade vertiginosa, que terã viajadc milhões
de anos em direção da Terra para aqui depositar gérmens de
vida (o que supõe uma tecnologia muito adiantada!). - Deixe-
mos, porém, de lado a ciência de ficçãO e reconheçamos seria·
mente que a Terra é um planeta altamente aquinhoado no con-
junto do universo. O número de planetas onde a vida tC'loi.
podido aparecer, c inegavelmente muito exíguo.

S. Temos vizinhos?

Entre os planetas habitados, os únicos que nos Intercs·


sam realmente são aqueles em que vivem seres racionais, mais
ou menos semelhantes a nós, com quem tenhamos algUma poso
sibilidade de contato.

Todos reconhecem que a evolução da vida podia não ter


eht!gado até o homem e que o homem pode não chegar a alta
tecnologia. Se esta existe na Terra, f82 parte dos privilégios
do nosso planeta.
-97-
10 .PERGUNTE E RESPONDEREMOS .. 229/1985

A vida sobre a Terra escolheu o ADN como cerne do seu


funcionamento. ~ provãvel que outras escolhas fossem possí-
veis, mas a escolha do ADN foi definitiva e o código gt!nétlco
ê praticamente comum a todos os seres vivos que nós conhe-
cemos.
Hã 700 .000.000 de anos, as células se agruparam para rir-
mar um ser vivo: os viventes se diversificaram, de modo Que
apareceram diferentes espécies de animais; os vertebrados con-
quistaram não só os mares, mas a terra sólida. Alguns mami-
feros recém-oriundos foram exterminados pelos dinossauros,
os quais, por sua vez, foram eliminados por um cataclismo
inédito - o que pemlitiu novo surto e a propagação dos
mamiferos.
Nessa história, há oito mllhócs de anos, apareceram os
pre-humanos erguidos sobre os membros traseiros; um deles
sofreu uma mutacão que o dolou dc um cérebro maior. Surgiu
assim o homo habiUs e, mais tarde, o homem de Neandertal '.
Toda a humanidade abJal descende desse primeiro Indi-
viduo, que, em seus Quarenta e seis cromossomos, reuniu todas
as mutações Que caracterizam hoje cada um dos representantes
da estirpe humana,
A evolução dOS seres vivos, que chegou até o homem, dá
n impfCssão de não ter sido uma caminhada rotineira, mas
parece, antes, uma cadela de acontecImentos imprevisiveis c
surpreendentes: nio tem o aspecto de uma estrada larga, mas
o de um atalho cercado de precipiclos que poderiam facilmente
ter tra~a do o caminheiro.
O surto e a eVOlução da vida são algo de singular demais
paL"B que possam ser considerados acontecimentos normais ou
ordinârios. Especialmente o aparecimento do homem é, do
ponto de visto estatístico, algo de totalmente improvãvel. Se-
riam necessãrios milhões de planetas sobre os quais tivesse
aparecido a vida, para tcrmos um no qual a vida chegasse no
grau , homem ~.

Alguns astrônomos tentaram todavja entrar em contato


com outros planetas. - St!ja mencionado o projeto OZMA
Iniciado em 1960. Escolheram a estrela T Cetl, que se encon-
I Ao doutlinl CIIt611ca aceita I tese de evoluçio epllcada la corpo
humano (elt. pode vir de mlt611a viva preexistente), mll5 afirma que Deus
cria uma aimo e3plrllUIII pera cada slr humano; ter•• pois, criado dlretamenle
e alma dOI! primeiros !lomens logo que OI aeua organismos tenl1am tido
condiçOes de oxaree, • vidl de um ser humano.
-98 -
VIDA EM OlITROS PLANETAS? 11

tra a doze anos-luz I da Terra. Suposta a velocidade de nossos


satélites arUflciai~ seria necessário mais de um milhão de anos
para chegar lá.. Supondo-se que tal estrela tenha planetas e
que esses planetas tenham habitantes, fol-Jhe enviada uma
mensagem sobre uma onda de comprimento de vinte e um cen-
tImetros (onda do hidrogênio, que é a mais comum nas galá-
eias); essa mensagem compreendia 1271 (31 x 41) percussões.
A mensagem pode ter chegado doze anos mais tarde, ou seja,
em 1972. Levantam-se então várias hipõteses concatenadas:
se há algum planeta em tomo da estrela T Ccti, se esse pla-
neta é habitado por seres inteligentes, se tais habitantes esta-
vam naquele dia à escuta do espa,:o, se a intensidade da men-
sagem ainda er a bastante forte. se os matemãtlcos do lugar
contaram as 1271 percussões e compreenderam que são o pro-
duto de 31 e 41. .. , então a mensag:em terá. sido compreendida
talveoz: terão percebido também a di~o donde ela provinha
a fim de poder orientar a resposta... Em conseqüência, p0-
de-se esperar tal resposta em 1985 ou um pouco mais lRrdc,
se houve dificuldades para' decifrar ou se não puderam loca·
liuu' com precisão o ponto de partida. Isto quer dize.. que a
esperança de uma resposta é assaz fraca.
Renlizou-se Alm1R outra tentativa de romunlca"i!io com
hinot~tlr.o... ~~ jnt~Ii""nt~ mcrliantc uma nnv(' esoll.clal ""C.
r!r.nnl:<l 11~ 1"'1' vi·';tRrlo Jupitcr e Slturno. C'ontinl'J\ ~ tr"'lct6ria
JlO esPJ\"'n fot'8 do ,,1!'ItemS\ !mJRr. O astrônomo C. Sa'!'an man-
001.1 color.Il.r n~AA ro~vr. alP.1Jma... J'nf'n!Pl<!P.n!t. pnt.rc R!~ (lUR;!'! 11m"
(''''!'\.~ft'! IVIrh,rlor:l t'le Ilm r11~r.;o de bm,,,_vinrin.o: 110 n~idp.nte
,Timm'\' C... rfpr. N'o MM fie nul'! ()'; p.~ra·t.p.r~tl'f'Ot nlia Mm-
J\r"t!nr1" ..... () in o:l~. ar.~ntarn...,
n dcsenrn, M si"tema solnr.
a ele um homem e o dp. uma mulher.
Tp.ndn rtclx:" oin n !;I!iltr.mn MInI'. p.8."'.'l nav(' v iniaril mi1hón!o:
rlf> bllvez bl1h~ . !!oP.m nJllor1$i1. p.nr.ont.rJ\r. F.'I(i~tp.m ...,..,nrJP.<;
:AY'\O!;.
~r.uoq ".,.~ A!t P'ttl'4'b"" e os Jllqn ... h'lIt AAO ",i1hl\"'~ rlp. Vf"7p.!iI
mp.non>e: rtn nllp. 1\1; pRt~b!l: . _ n 111~n:n (to nresldf>nte Cal'-
ter. nnrtanto. m~ o ri~ rlr. i:tmFlis ~r ouvido,
Em conseqüência de tais raciocínios e experiências, vai
diminuindo 8 esperanca de entrannos em contato com seres
extra-terrestres: parece Inverossimll a perspectiva de lhes fazer-
mos visita . - Mas não ooderfamos esperar a vinda deles, SUo
pondo.os dotados de melhor tecnologia e maior h abilidade do

1 O lno·luz equlvlle .. dl.lAm;:" perconllja pele luz no v6cuo em um


Ino. e Igual a 9 . 461.000.000.000 krn ou. 9.461 X 10 12.

-99-
12 (PERGUNTE E RESPONDEREMOS~ 229/ 1985

que nós! . .. Os mais ardorosos arautos da pluraJidade de muno


d~ habitados julgam que não é possive1 encontrar tais mun-
dO$ a uma distãncia inferior a dez anos-lw:, mas que as pro.
babilidades aumentam se chegarmos à distância de cem anos·
~tuz. Sendo assim, os extraterrestres, para chegar à Terra,
precisariam de dez milhões de anos ao menos, percorridas com
a velocidade das nossas naves espaciais - o que supõe uma
longevidade espantosa.
Para diminuir a duração da viagem, podemos Imaginar
duas hipóteses: ou se aumentaria a velocidade das naves espa-
ciais em virtude de maior adiantamento da tecnologia. ou o
lIOnto de partida estaria mal1J próximo da "Terra.
Quanto ao aumento da velocidade. verüica-se que a vel~
cidade da luz. não bastaria. pois a viagem de Ida e volta levaria
ainda duzentos anos; seria preciso ir mil vezes mais depressa
do que a luz para que a viagem durasse apenas alguns meses ...
Imaginar um ponto de partida menos distante da Terra
equivale a postular a existêncIa de planetas próximos de nós
que ainda nâo descobrimos ...
Em suma, a ciência de ficção vai construindo suas hipó.
teses, nem sempre com grande criatIvldadej tenha-se em vista
o E . T. do famoso filme!

6. Condusáo
A qu~tão da existência de planetas habitados não pode
ser resolvida com precl.sã.o. 1: certo Que as eondicôes necessá-
rias para o surto e a continuidade da vida são assaz complexas.
Como Quer Que seja, pode ser Que se realizem em alguns pIa-
nctns dentre a mulLldão dos que existem.
Notemos, aliás: a vida podetIa tomar fonnas dlfel'(!ntes
daquelas que nós conhecemos. formas que não exigiriam as
eomJlções da vida na Terra, mas, sim, outras que Ignoramos.
Da parte da fé. nada há que opor à. hipótese de haver
outros mundos habitados. A Reve1ação Divina apenas mani-
festou aos homens o que lhes Interessa para a salvação eterna.
Por enquanto. é tudo O que se pode dizer em poucas pala-
vras sobre assunto ainda tio plueo explorado.
Eale artIgo mullo deve ao • • tudo de Juta, Charlas,S.J., De la plur.lh6
clH mond .. t.b"". em Elud.., novembro 1983, pp. 471-.481.
- 100 -
Um livro documenlado e realista:

"Marxismo e Socialismo Real"


por Paul-Eugêna Charbonne.u

Em .lnlHe: Na ",Imelra parte 60 .. u livro sobre Mandl/TlO e Soçla-


Ilsmo Real, o Pe. Paul·Eugene Chlrbonneau expÕe, com precisa0, e. gr8n-
des linhas do pel'1$4lflenlo marxista nos seloras lIIosóllco, aconomlco, huma-
nlsta . . . ; para laolo r&Corre a larta documenlaçAo. A $Igulr, deseovolve uma
crltlCl do pensameAlo ma,.lata, pondo em evktêncla li utopia I as Incoerên·
clu do alslema: na verdade, a cltnel8 do Meulo XIX, pela qual Marx lura..,.,
li nIo 6 a do I'culo XXi a teorl, IH ma.11-valta Implica conlradlçOet; o
materl.IIlmo dl,r6Ueo IUp60 o penaamenlo anto, do turfo do pensamentoi
a dialética h1atÓrlca. nlo .. Ivslonla . ..
A leitura das piglnll de Cherbonneau ê enrlquecedora, pola oferece
eóllda ergumentlçlo fUo,óllca e \/IIrlados dapolmenlos de aulores dO$
a6culos XIX/XX.
No .,1100 .Igulnla, .erlll analisada a segunda pIIIrte do 1Ivro, que aborda
a rellldade do Socialismo vivido nos pal..s comunlstaa .

• • •
o Pc. Paul-Eugene Charbonneau acaba de publicar mais
um livro, desta vez sobre o marxismo 1. Trata-se de interes-
sante estudo sobre a doutrina (filosofia, economia, sociolo·
gia ... ) do marxismo e a rea1lda~ concreta do mesmo (Socla.
limo Real) , O autor apola..se em vasta documentação, que lhe
pennite falar aballzadamentei oferece assim valioso instru-
mento de trabalho a quem reflete sobre os rumos que toma
ou possa tomar o continente latino·americano.
Apresentaremos breve síntese do conteúdo do livro, que
compreende duas partes: 1) O Comunismo; 2} o Socialismo
Real. A primeira parte será objeto deste artigo, ao passo que
a segunda serâ abordada no artigo seguinte.

1 Paul.Eugene Chlftlonn•• u, Marxllmo • Socllllillmo Re.t. - Ed.


loyora 1984, 138 X 208 mm , 223 pp. Ctlldo como MSR.

- 101-
14 .PERGUNTE E RESPONDEREMOS~ 229/1985

1. O Comunismo: exposição e crítico

o aulor expõc o que seja o comunismo em !K!US diversos


aspectos.

1. O C_unlsmo

Karl Marx (t 1883) é discipulo de Friedcrich Hegel


(t 1872).
(I 1831) e Luclwlg Feuerbach

o primeiro ensinava um monismo idealista panteísta: só


existe uma realidade. que é o Espírito; este acha-se sujeito â
lei da dialética; aflnna o Ser (teae). logo depois nega-o (antí.
tese); tal choque se resolve num terceiro momento, que é a
Ifntese. DlaléUca signifioa precisamente este diálogo (ou dis·
cussão) do Esplrito consigo mesmo.
Feuerbach professou . o materialismo, em vez do idealismo:
a Matéria ê tida como' o ser primordial, do qual o esplrlto ê
apenas uma fase evoluida; o pensamento é o produto mais ele-
vado da matéria.
Ora Marx herdou o materialismo de Feuerbach e n expll.
cnção dialética de Hegel, elaborando assim O matcriallsmo
dialético e o materialismo histórico.

I.I . Materialismo d!alftica


Segundo Marx, a única realidade ê a matéria; não inerte,
mas dinâmica, violentamente sacudida por forças Intel'ioI'CS que
a impelem para além de s i mesma; dai a evolução da história,
que é sempre progresso, e não regressão. A evolução da ma-
téria ocorre segundO três leis fundamentais: a lei da unidade
dos contrárlos, a lei da passagem da quantidade à qualidade e
a lei da negação da negação.
A lei da. ~dade elos eoatririos: tudo o que existe (tese).
tem um correspondente antitético; tese e antitese entrecho-
cam-se, produzindo uma sintese, que é um passo adiante na
mesma dil'@Çio.
A lei da. passagem da quantidade para. a qualidade. ba-
seando·1(! no fato da evolução, suscita sempre novas qualida·
des da matéria.
- 102 -
cMARXISMO E SOCIALISMO REAL~ 15

A lei da nega.oão di. negacão admite que tudo o que existe


evolui a partir de uma realidade que fol superada ou negada;
todavia esse ser que superou ou negou, traz em 51 mesmo as
forças de sua própria destruição; «Na histõrJa como na natu-
reza, a podridão é o laboratório da vida. (Karl Marx, Le
Capital, t. m , Paris 1950, p. 181).

Náo samenté a natureza, mas também o homem, se explica


por estas três leis.

1 .2 . MolerialiSMO hi.tórico

Enquanto o materialismo dialético se refere à natureza ou


aos seres .a nteriores à açãO do homem, o materialismo histó-
rico rege a ação do homem ou a história.
Para Marx, o homem é essencialmente um ser de neces-
sidades materiais; esta seria a definição primordial do ser
humano: cO econômico domina toda a vida humana; deie
dependem não somente a estrutura da sociedade, mas ainda
toda a cu1tura espiritual: religião, filosofia, moral e arte. O
econômico é a ba.sej a lc1eologla é apenas a super-estrutura.
Existe um processo sóclo-econômioo inevitável, pelo qual tudo
se define. (Nlcolal Berdiaev, Les sources et Ie sens da com-
muniam.e russe. Paris 1963, p. 187).
As necessidades materiais impõem ao homem a troca,
porque sozinho não dispõe de tudo aqUilo de que necessita.
Ora a troca gera a economia. Diz Marx que, para fazer a his·
tória. é preciso viver; para viver, é necessário comer; para
comer, urge produz1r; para produzir, deve baver divisão do
trabalho; esta suscita as classes e a luta de classes ... (cf.
MSR 35). 1: nis to que consiste a economia. fator determinante
da história do homem. Todos os demais valores constituem
uma superestrutura, que depende exclusivamente dos fenôme·
nos econômicos. Resolver os problemas econômicos é, pois,
resolver os problemas da hlstória ; basta dominar o econômico
para ter em mãos também a história. Esta, segundo Marx,
se desenrola segundo cinco fases principais :
1) Faae do aparecimento do hamem. Aceitando o evolu-
cIonismo mecanicista de Charles Dal"\llin (t 1882), Marx afir-
mava que o homem apareceu por si, sem intervenção de poder
criador divino. O animal slmlesco Impelido pe-Ia urgência de
-103 -
16 cpmGUNTE E RESPONDEREMOS, 229/1985

.satisfazer às suas necessidades naturais, aprendeu a servlr-.se


de seus membros, a fim de produzir () que lhe faltava; assim
o animal jnfra-humano tornou-se homem mediante o trabalho:
cO trabalho criou o próprio homem, (cf. Engels, A origem da
fam1Ua, da propriedade privada e do Estado. São Paulo, s. d.,
p. 171). Na fase inicial da história não havia propriedade pri-
vada; existia, sim, um comunismo primitivo, que, não conhe-
cendo a acumulação, não conhecia tampouco a alienação.

Segundo as leis darwinianas da seleção natural e do triunfo


dos mais fortes, deu-se .u m dia a apropriação e, com ela, a
exproprlacão_ Um homem que se apropria de alguma coisa,
expropria outro homem. Este foi o pecado original da huma-
nidade: a apropriação. Com eia foI consagrada a violência.

2) A segunda fase da história é a da AntlgUlclado. Ex-


pande-se o regime de propriedade privada, Que chega a.té a
escravidão. A economia é de acumulação; as grandes proprie.
dades prIvadas se tornam hereditárias em vIrtude do patrIar-
cado. O desenvolvimento da propriedade particular exige 8
criação do Estado, defensor e promotor da mesma; O Estado
assegura à. classe possuidora o direito de explorar a Que nada
lXISSula.

3) A terceira fase foi 8 Idade nédia. Continuou a explo-


ração no regime dos senhores feudais e dos servos da gleba;
senhores e servos eram duas classes em luta. Esta luta fez
explodir os quadros do feudalismo e substitui-lo pela burgue--
sla, que, vindo de baixo. tomaria o lugar da nobreza.

4) Proleta.rindo. A burguesia devia engc-nd.r ar a sua anti-


tese: o proldariado. A sociedade dividiu-se em duas classes,
mals nitidamente opostas do que no passado: a burguesia e o
proletariado. A propriedade privada hipertrofia-se sem cessar;
capitaliza-se, e, em virtude do fenômeno da expropriação, há
concentra~o sempre maior dos meios de produção nas mios
dos proprietários. sempre menos numerosos_ - Todavia os
prolettrlos vencerão os burgueses, expropriandO-OS; porão fim
à propriedade privada, Instaurando o regime do comunismo.

5) Comonismo. Representa a volta à sociedade primi-


tiva. que era sem classes. O homem começará então A viver
a sua verdadeira h1st6ria, após longa pré-hlst6ria.
-104 -
o rnater1alJsmo de Marx, assim concebido, é totalmente
alheio à fé religiosa. A reUgião seria a mais Corte fonna de
alienação. São palavras de Marx: cA misêria religiosa é, de
um lado, a expressão da miséria real e, de outro, o protesto
contra a misêria real. A religião é o suspiro da criatura aba-
tida peja desgraça, a alma de .wn mundo sem convleção, bem
como o espirlto de uma época. sem espírito. É o ópio do povo.
(COntributlon à 1& crltlgue de ... phIJooophle du drolt de HegoI.
em 00u.,... phiJosopbJq_ t. I, Paris 1952, p. 84).
Comenta Charbonneau:
cComus 141m, pois, inteira raz:ão 00 escrever que o ateismo
mondllo 6 (lbsolulo', E o humanismo que pretende dele nasce" .só
pode ser de leor atebta absoluto. intransigente. Simone do Beauvoir,
reflexo do pensamento de Sartro, deixa iuo bem claro. Diva elo: 'A
primeira das delolieno;ões do homem' não acreditar om Dou,' (La
Úl4monlo de. adleux, Paris 1981, p. 558) .•. Podeo·s. afirmar, e é
precise eliminar toda dúYido o r.speito, quo o atel.mo não é uma
Juper·estruturo do marxismo; 'ebsolutamente euenciol poro ele. Nõo
cabe dúvIda alguma a eUa respeito . '. Marxismo e religião são tão
in,ompoUveis como o dia e a noile. IMSR p. "6).
Digamos ainda uma palavra sobre

1 . 3. A l_ria dkllétlco do economia


A propósito O pensamento marxista se resume em cinco
tópicos:
c I) o trabalho é o única fonte do valor,
21 o capItal é um con,lnuo roubo 00 trabalho,
3) o copitalismo se acha 11m dllSCIgrllgocão. ,onforme o r.i da
negadio dll negoç(io. enoaminhendo·se paro umll falai proJelarb::oçêlo
do humanidade;
'" esta faJoI proletarizacão levaró Õ vitória inevit6vel d o
proletariado;
., I para apressor euo vlt6ria, urge criar nos prolelórios o cons,
dfn,io de dau... (MS. p. "7).
A respeito do primeiro tópico. Marx distingue entre valor
de USO e valor de troca. O valor de uso ~ o que provém da uti·
IIdade; é qualitativo, Independente do trabalho, pois Intrlnseco

-105 -
18 .. PERCUNTE E RESPONOEREMOS~ 229/1985

ao objeto. O valor de troca é o que o objeto tem no mercado;


é essencialmente Quantitativo e extrinseco ao objeto, pois pro·
vém do trabalho que se incorpora nele. Tomem·se como exem·
pios o trigo e o ferro. Cada qual tem seu valor de utilidade,
mas não há entre eles uma medida comWl1 que permita com-
pará-los e trocA-Ias entre sI. Para fazer isto, será necessário
atribuir-lhes um denominador comum; este será o trabalho, que
os tornam cobjetos trabalhados~. Por conseguinte, supondo.se
que sejam necessárias ]( horas de trabalho para produzir uma
tonelada de trigo, 3 x para uma tonelada de ferro, conc1ul-se
que será preciso trocar três toneladas de trigo por uma de
ferro. Desta forma, declara Marx, - o valor de uma merca·
dorla estã para o valor de qualquer outra mercadoria na razão
em que o tempo de trabalho necessário à produção de uma
está para o tempo de trabalho necessário à produção da outra~
(Le Capital, t. I. Paris 1949, p. 46). Tal é o valor de troca.
Destas considerações deduz Marx O seguinte principio: o único
valor verdadeiro (econômico) é O de troca, o qual provém
inteiramente do trabalho. Em conseqüência, o trabalhador tem
o direito incontestável de se aproprIar de todo esse valor; se
lho contestamos, roubamos o trabalhador.
Acrescenta Marx: o capital é um continuo roubo ao tra-
balho, pois é a mais-valia acumulada. E . que é mals-valia? t::
trabaJho não pago, confonne o seguinte raclocinio: o que o
capitalismo aluga, é a força de trabalho, da qual dispõe a seu
bel-prazer. Ora a força de trabalho é alugada em tempo inte·
gral. Dá-se então o fenômeno seguinte: o operârio presta, por
contrato, oito horas de trabalho; destas, quatro lhe bastam
para produzir o valor correspondente ao salário necessário para
sua subsistéllcia. Nesse momento deveria cessar de trabalhar,
mas não o pode fazer, porque cedeu ao capitalista a sua (orça de
trabalho; em conseqüência, o patrão emprega as quatro horas
restantes do operário para seu exclusivo proveito. Esse tempo
suplementar de trabalho nada acarreta para a subsistência
do operário. :e trabalho gratuito que ele presta para compen-
sar o privilégiO (?) de poder alugar-se ao capital pelas qua-
tro primeiras horas (das quaIs tira a sua subsistência). Dite
sobretrabalho não remunerado é a base de todo o lucro capita-
lista e, portanto, do aumento do capital. Donde, dizia Marx, o
processo de aumento do capital repousa sobre a expoliação do
trabalhador.
Voltaremos a este ponto ao propor a avaliação do
marxismo.

-106 -
..MARXISMO E SOCIALISMO REAL. 19

1 .4 . A morol montilla.

o que caracteri2a a moral marxista, é a sua relaUvldade,


pois ela ê concebida sobre as bases da economia e da luta de
classes, o que sJgnlfica: ... sobre os Interesses do Partido. As-
sim instaura-se o maquiavelismo ético, segundo o qual o fim
jusUfica os meios; tornam-se então legítimos o encarceramento
gratuito, a negação dos direitos da pessoa, a destruição psi-
quica e até o assassinato; os campos de concentraçio com
todos os seus horrores são assim justificados. Com oulnls pala-
vras : a ética marxista pode sugerior mesmo o desprezo total
da pessoa humana; um homem só tem direito às dimensões que
a luta de classes e as necessidades revolucionâriaslhe conferem;
é reduzido à ÇOndição de melo que o Partido utiliza num sen-
tido ou noutro, conforme as necessidades da hora.
Na mesma linha de idéias, toda verdade se torna apenas
circunstancial. A verdade é o que serve ao Partido. Em con·
seqüência. o mundo ma rxlsta é o reino das meias-verdades que
se transformam em dogmas. Dogmas em que os cidadãos
devem crer hoje e que amanhã serão negados.
c A maior originolldode de Marli!; estó em ter ele sustentada que
a verdade humana nõa é nem natural, nem melafisica, CI sim polltico,
no sentido mais farte da palavra, isto é, fundida pelo hist6tia :t I Jean
lacroix, Po,içõ... do Ateismo Contempor6nl!Cl. São Paulo 1965, p. 371.

Eis. em sintese, as grandes linhas do sistema marxista.


Int~ressa agora propor-lhes uma avaliação.

2. Críticâ do marxismo
2 . I. Morxi$MO e ,ilnda
No século XIX, em que Marx escreveu, a ciência era valo-
rizada como portadora de certezas absolutas, o que redundava
no ccientismo:t; o mêca.nicismo. o darwinismo afinalist6. o ma·
terlallsmo imperavam.. . Ora Marx ju1gava encontra[' na
ciência a última palavra para tudo, inclusive para cancelar a
"noção de Deus.
"Em nossos dias, porem, os cientistas reconhecem o slgnl-
"ficado relativo da clêncla; quanto mais progride. mais se vê
desafiada por novos problemas, Que a obrigam a rever cons-
·-107 -
20 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS. 229/1985

tantemente posicôes antes tidas como inabaláveis. Este fato


compromete e erúraquece o pensamento marxista, a ponto que
Michel Foucault, filósofo estruturalista, pôde dizer: cO mar-
xismo se encontra no pensamento do século XIX como um
pelxe na Agua; fora desta, ele pãra de respirar. (Les mota et
lu chOMl. Paris 1967, p. Z74). Diz também Raymond Aron:
cÂcellar que- o marxismo, 101 como propagoda pelos comunistas,
'_10 o •• plicao;êlo cientifico da mi16ria op.r6rio, , confundir a fisiço
d_ ArisI61. te. com a de Eln.tein, ou A Origem do. Espieles de Darwin
com (I biologia moderna . (L'Opl"", de.. inkllecfuef .. Paria. 1983,
p . 94) .
Em conseqüência, pode.se dJzer que o recurso, instituido
por certos teólogos, à anAli.se marxista como método cclentl-
fico. para detectar as orlgens da iniqWdade social, é algo de
ultrapassado e Ineficiente.

2 .2 . • •• rfoll .... o e cltolético


Marx assumiu de Hegel o conceito de dialética e de Feuer--
bach o de materialismo; aglutinou.os entre si, sem verificar,
porém, Que materialismo dlalétlco é algo de contraditório. Com
efeito, a dialéUca (o poder de afinnar, négãl' e fazer a sin·
tese) é jogo do pensamento e do espirito, que não pode ser
atribuldo à matéria; esta é mecanicista e cega. Observa muito
bem o fUósoCo russo Nicolau Berdlaev: «Não pode existir uma
dialética da matéria, visto que a dialética supõe o Logos e o
pensamento; só é possive) uma dialética do pensamento e do
esplrito» (Lee SOIU'(leS et 1& &ens du oommunisme ruse. Pa-
ris 1963, p. 193) . Ou ainda Albert Camus: cMarx nega o
esplrlto como substl.ncia última e afinna o materialismo his-
tórico. Pode-se apontar de imediato . .. a Impossibilidade de
conciliar a dialética e o materialismo. Não pode haver d1alé-
Uca senão do pensamento. (citado em MSB p. 67).
Pode-se também dizer que o marxismo cnas obriga a acei-
tar o absurdo de um movimento evolutivo admiravelmente bem
pensado, anterior a todo pensamento. (Fernando Bastos de
Avil., citado em MSR. p. 65).
Em conseqUênda, Raymond Aron não hesita em aflnnar
que cnlnguém - rora das escolas do Partido - ainda leva a
sério o materialismo dialêtico. (PIa1dcQer pour I'Europe d6c&-
denlo. Paris, 1m, p. 143) .

-108 -
cMARXISMO E SOCIALISMO REAL~ 21

2 . 3. Dlalélica e hbt6ria

Segundo Marx, a história procede segundo o ritmo de tese,


antítese e slntese. Logo que a slntese se realize historicamente,
a estnJtura por ela produzida Sé toma, por sua vez, uma posi-
ção ou tese, que engendra a sua antítese, donde procede nova
slntese; esta, conforme o processo evocado, vem a ser nova
tese, que provoca anUtese e, finalmente, síntese, e assim por
diante, ao infinito. Os comentaristas qua]liJcam tal ritmo
como sendo «de telescópio dialético». Este serve a Marx para
interpretar a h1st6I1a da humanidade Inteira até o advento do
comunismo. Neste momento, 'porém, a dialética se delerá .. .
De todas as sinteses realizadas na história, só o comunismo
não estará na posição de tese, e não produzirâ antitese alguma.
Desta. forma aparece no pensamento marxista uma grave con·
tradição. O comunismo, fim da alienação, seria mmbém o fim
da história. cQuando Marx faz parar o processo diaJ~Uco no
triunfo do comunismo, destrói o seu principio e sabota o ma-
terialismo histórico. Ou este vale e tem de aplicar-se até o
fim, ou não se aplica até o fim e perde todo o seu valor.
(1IlSR, p. 74).
Na verdade, o fato de que nos países comunistas existe
_8 nova classe dirlgente~ (chamada cNomenkJaturall na Rús-
sia Soviética) I vem a ser o começo de uma nova luta hlstó·
rica: a dos administrados contra OS burocratas. _Após as lutas
de patrões e escravos, senhores feudais e servos da gleba, bur-
gueses e proletãrios. uma nova fase estaria em andamento:
burocratas e administrados . .. » (.ISR, p . 75) .

Por conseguinte. Marx admite dois postulados que se des-


troem. reciprocamente: O do ritmo dialético da história e o da
gratuita parada da história com a chegada do comunismo.

Ass1m vemos que, no plano filoSÓfico, o marxismo é mi·


nado pelo mal da contradlcão: contradição entre materialismo
e dialética, entre dialética e imobilidade da hl.st6ria. além de
outras . . . Tal fato tem levado muitos critlcos não católicos a
severas censuras ao pensamento marxista. Eis algumas destas:

t Cf. Mle"'el VOIlenelcy. A NOIMnklatun. Camont6rlo em PR 2S5'I1982,


pp. 413-498.

-109 -
22 (PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 229/1985

Albert Camus, por exemplo, fala do «monstro lógico,.


que é o marxismo. Hannah Arendt refere-se a essas _teses ma~
nifestamente contradltórias:J que Marx foi levado a defender
por ter esposado, sem perceber, posições aristotélicas e plat6-
nlcas. A constância da contradição faz que Alexandre Zlnoviev
possa caracterizar o marxismo como cum pensamento primi-
tivo". Jorge Semprun, no seu romance que é uma das mais
Importantes obras criticas 80 marxismo e- a.o socla.lismo rt!aJ,
resume a fraqueza da fIIOS()fia marxista, falando de clrracJo-
naJidade profunda do marxismo) (as fontes se encontram cita.
das em MS& p. 81, nota 161) .

Como dito, Marx distingue valor de uso (o.u utilidade) e


valor de trocai cf. pp. 10Sa. O (mico valor verdadeiro. valor
econômico ou mercante, é o de troca, O qual provém Inteira-
mente do trabalho. Ora há nesta afinnação duas contradições:
- é evi dente que existem valores de troca independenlês
de qualquer trabalho: os produtos naturais;
- em todo valor de trooa há algo que não provém do tra-
balho e. sim. da natureza. Ê o que o próprio Marx reconhece:
(O trabalho _. _ não é a única fonte de vaJores de \lS() produ-
zIdos por ele ou na riqueza material. Ele é o pai; a terra ~ a
mãe" (Le Cap:taJ, t. I, p. 51).
Por consegujnte, o próprio Marx vê--se obrigado a contes-
tar a sua afirmação inicial. Chega, aIlãs, a sustentar que cer-
tos bens que não exigem. trabalho podem ter preço_.. mas
não PM$uem. valOr (cf. Hiatolre de. doctrinO!!il OOoaomlques,
t. IV. Paris 1941, p. 14) I Ora esta afirmacão é contraditória,

lA nagaçlo do 'Ialof e.prnao do dln....lro parmltlu a Ma/"Jl aonha' com


um mundo rIO qual ~ ha.".,r. dinheiro. A realidade se encarregou de
mostrar qulo Ilusória era usa prelenalo. Rudol' BIIhro denunciou • 1I1MI1o:
..... primeira descoberta pollllca pd.-revoluclon6rla na Un"o Sovl6Uca
foi a da que era nacenArIo dinheiro. nam que fossa a IItulIJ ",aramanla
Informaclonal. como alslam. de reter6ncl. peita poder planaJar, dirigir e con-
trola, o conjunto do proCUlo econ6mlco- (L'AJtemllUwe_ Paria 1879. p. 125).
Sobra. 'eorl. de MII/"Jl referente. dinheiro, Phlflppe Solle ....era.".
Jronlcamente qua Marx 6 ·0 6nlco eapecillll.ta brutal do pap.l-moad.~
(feminil. Oalllmarel 1983, p. 271).

-110_
<MARXISMO E SOCIALISMO REAL>

pois que é o preço senão a forma monetária do valor? Lvgo


não pode haver preçO sem valor. Dadas as restrições que ele
mesmo faz, Marx não está autori~ado a ldenUCicar valor de
troca e trabalho. Habitualmente o trabalho será O elemento
principal do valor de troca. mas nunca o elemento únicoi às
vezes, nem seque[" participará dele.
Consideremos, por exemplo, que haja necessidade do
mesmo tempo de trabalho para extrair uma tonelada de car-
vão de tipo x e outra de tipo y. Como se sabe, a qualidade de
carvão é muito variável. Estes dois produtos, portanto, nio
têm o mesmo valor de troca para o industrial; tal valor depen-
derá, sim, da quantidade de trabalho, mas também das quali.
dades flsicas e quimicas desses dois tipos de carvão. Por con-
seguinte, Identificar valor de troca e trabalho, como faz Marx,
é um erro que, desde a raiz, torna falsa a sua teoria econõmica.
A contradição toma-se ainda mais flagrante quando Marx,
após ter limitado o valor de troca ao trabalho sem referência
ao valor de utilidade, recorre contudo a este para defmir o
trabalho que cria o valor de troca. Com efeito; para evitar o
grosseIro erro de atribuir valor a um trabalho feito sem fina-
lidade (como seria o de bater numa pedra o dia inteiro), Marx
faJa do trabalho social útil. A utllldade reaparece, pois, e com
ela o valor da .utilidade. Neste sentido, o valor de troca não
faz abstração do valor de utilidade, do qual depende por inter-
mÉ<Uo do trabalho; Isto destrói n Btitude de Marx, que rejei.
tava o valor de utilidade para SÓ ficar com o valor de trocn.
Em resumo, Marx elimina primeiramente o valor de uti-
lidade, retendo apenas o de troca, mas depois, para justiricar
a este, vê-se forçadO a voltar ao valor de utilidade. Desta ma·
neira, cai em incoerencia e compromete toda tio sua teoria do
valor.
Conseqüentemente. também é invalidada a teoria da mais·
-valia, pilar da economia marxista. AssIm cai todo o edifieio
da economIa socialista. Com efeito; se o valor se deriva não
somente do trabalho, mas também da utilidade, a mals-vaUa
não constitui necessariamente a origem de todo lucro. Supo-
nhamos, por exemplo, que um capitalista forneça êgua a .u m
estabelecimento. Para acionar a bomba que lhe pertence. em·
prega dois homens, cujo trabalho oferece x litros de ãgua ao
estabelecimento. :e claro que há neste caso, eonfonne a teoria
marxista, uma mais-valia, que representa precisamente o lucro
do capitalista. - Se este, porém, substituir os dcHS empregadOS
-111 -
24 ,PERGUNTE E RESPONOEREMOS~ 229Jl985

por dois cavalos que oonsegue~ gratas ao seu vIgor. fornecer


." x litros de água, o lucro obtido pelo capitalista serã mais
elevado; apesar disto. não havendo trabalha humano. não ha-
verá mais--valia no sentido marxJsUl. Contudo o serviço pres-
tado é indubjtaveJmente mais útil e. por isto, adquire valor de
troca superior. embora a mais-valia tenha desaparecido. O
valor de troca não estã, pois, ligado ao trabalho e pode existir
sem que haja qualquer mais-valla.
Ora, se a teoria da maJs.valia é contestável, também a
teoria marxista do lucro o seri. Cai, pois, por terra a teoria
de que todo aumento de capital é um roubo.
A experiência comprova te.Js conclusões. O tato mais-
-valia. é adotado nos paises comunistas. O comunismo russo,
tipiea. encarnacão das teorias marxistas. tomou-se um capita.
lismo de Estado. Escreve Milovan DjUlas:
. E certo que o comunismo GtuGI correspond., em grClnde parte,
à Idéia de um integral copitalilmo d. Estodo» IMSR p. 89.1 .

Segundo DjiIJas. a revolucão comunista criou uma nova


ordem, que de comunista só tem o nome e a opressão.
Erlch Fromm, por sua vez, observa:
. 0 sidemo slolini,lo d. hoje " a despeito de conservar OI meiol
de produção como propriedade do Estado, eslé. possivelment. mois
próxima dai formas primilivas e puramenle exploradas da c:apitolismo
ocidental do que ,q ualquer idéia conceb!vel de uma sociedade soda-
lista. Uma lutG obcecado pelo avonço industrial, a impiedosa deli-
consideracao do individuo e o sede d. poder pessoal constituem 11,101
molol m.strol» C'siccm6U., doa soeiedaer. cOAlempor6n-. Rio de
Joneiro 1961 , p. 2421.

Em conseqüência, o ~dD é o grande capitalista nos pai.


ses comunistas, o qual exerce sobre os cidadãos a mesma tira-
nia que as empresas capitalistas Uberals. l!: ainda DJillas quem
escreve:
.A esaavidõo da mão-de-obra no regime comunida é o fruto
natural do monop61io que .e exerce sobre a maior porte da proprie.
dode nacional, e em virtllde dG qvol o trabalhador le vi forçado a

~b ..t. upeelo. a 6poea p6s.stallnlsta nla difere da ltallnlsla.

-112 -
cMARXISMO E SOCIALISMO REA~ 25

vender .eu. braçOl e leu dt~bto lob condicã,el que não pode dilcutlr,
pOÍl 16 Ih. , dodo aceitó ·la. tois corno lhe são apre.entadas.
IMSR pp. 90.' .

Em suma, pode-se dize[' que o p['oletário muda de patrã o,


mas nunca delxa de ser proletário QUo de esta[' à mercê daquele
para Quem trabalha. Assim a alienaçã-o capitalista tomou-se
alienação mat'XÍsta. O capitalismo privado foi substituído pelo
capitalismo do Estado, mas pennanece o regime capitalista.
A ditadura econômica não desapareceu, nem tampouco a dita·
dure. polltlca.

Também no plano internacional o marxismo de nossos


dias faz reviver o imperia.llsmo e o coloniallsmo que Marx
fustigava. O imperlallsmo russo não fica atrás daquele que
as grandes potêncIas ocidentais praticaram. Os palses csaté·
mes_ gravitam em torno da RÚS$la na órbita do mais puro
colonla1ismo econômico.

Note-se, porém, que a incoerência do socialismo real levou


'8.0m-enos a .um resultado positivo: o direito à propdedade pri·
vada vai sendo, aos poucos, reconhecido nos palses comWllstas;
para cada cidadão toma·se legitima a propriedade pessoal das
rend8$ e economias do trabalho, a propriedade da casa de
residência e de economia doméstica auxiliar, a dos objetos
domésticos e de uso diário, assim como o direito à herança da
propriedade pessoal. Afinna Henri Chambre:

c Eaisle na URSS .• . uma prOpriedade pessoal, limitada aos bens


de consuma I e alé de produo;ão I para o UIO pessoal, que nóo difefe
da propriedade p,ivodc:o bCidenfal _ (l. . .rxlime en Unton Sovlé fique.
Idéologl. etlmtltvtiom. Paris 1955. p. ISS) .

Passemos agora a mais um aspecto do marxismo:

12 . 5 . O hYrnQnl-a mondtto

No panorama marxista, que lugar toca ao homem ?


_ A teoria marxista dá primazia ao Estado sobre a pes-
soa. Em conseqüência., o s.er humano, COmo pessoa, desapa·
rece como se tosse uma quantidade desprezivel: é um animal
trabalhador, um melo de producão em escala aperfeiçoada; é
-113 -
.26 ",PERGUNTE E RESPONDEREMOS. 229/1985

um individuo da espécie, esmagado pelas exigências dialéticas


de uma revolução jamais termlnadaj a pessoa é meio, não
tendo outros direitos senão os que lhe são concedidos pelo
Estado.

Nlio hâ dóvida, Marx se interessou profundamente pelo


homem. Todavia trata-se do homem coletivo, ao qual devem
ser sacrificados os Individuos. Uma das expressões mais tipi·
cas deste sacriflclo é a recusa das liberdades fundamentais do
homem. i; posslvel que Marx, com base na lei da negação da
negação e na lei da unlc1ade dos contrárIos, tenha acred.1tado
que o processo dialético nonnal para chegar à Uberdade era
preclsamente a negação da liberdade; neste caso a ditadunl
prepararia a liberdade. Deve-se notar, porém, que não se salva
a espécie senão salvando a pessoa; não se respeita o Homem.
senão respeitando 00 homens; nio se liberta o ser hwnano
agrllhoando-o.
De quanto foi dito, depreende-se com clareza que há
jncompatibilidade radicai entre comunismo e Cristianismo. No
plano da colaboração em vista de objetivos bem precisos, per.
guntam os autores se comunistas e cristãos podem mutuamente
da....se as mãos. Emmanuel Mounier responde afirmativamente
desde que se cumpram certas condições. Todavia a experiência
desabona qualquer tipo de conluio entre cristãos e comunistas,
como bem observa Alain Besançon:
cOa minha parte, nunca ...i provir do (onciliacõo algum bem ou
progresso ; por este meio mais le ajunta <CI tolice comum do que o sotM·
daria comum. Eipero melhor resultado dos oposicOes, sobretudo dO$
fort.mente .estabelecidos. Esta é a razóo pola qual rej.eilo (I misturo
sem sobor. em que teltlo C) lociolilma como o Cri$tionh",o pefd~,,1'I lua
virtude próprio » (U. origineslntelleduelle. du Unln1sme. Pari. 19n,
p.86 •.
Acompanhando ainda o livro de Charbonneau. passamos,
no artigo seguinte, ã anãlise de alguns tópleos do Socialismo
Real ou do marxlsmo W como na prática é vivido pelos povos
que lhe foram submetidos. A realidade concreta confirma a
lnvlabUlc1ade dos princlplos e das proposições lonnuladas pela
teoria marxista.

-114-
AJnda o livro da Ch.rbonnoau:

o Socialismo Real
Em alm... : A segunda parta do lI"ro "Manelamo e Soclallamo Real",
do Pe. P'ul-e:ug~e Chllrbonnelu, considera a realidade do Soclall-mo aplI-
cado aos PlI.aa marxktas. As obNrvaç&lt do lutor lto IncllloJal , apontando
nOl paiM' da Corlltu. de Feno a exll16ncla de um t:.lltdo CIIpllall.ta •
planlpolanclArlo, qUI suprimi' llberdada de seus aúdltos : ai condl,&es do
proJetarlldo ar nJo, tio m.lho.... do que .. que lhe proporclon..... o reglm.
ela ri"., O mUltarlsmo podare»o, a forte r.presslo policiei sufocam o pensa-
mento e I ati"ldade doe povo • • 0vleUu.dOl: Ilém do qut, o I(acuao agrlcola
a lcon6mlco d' mlrgem lO mercldo negro I As longas 111.. que OI
cldadtos devem anlrentar Plra .dqulrlr allmlnlos, veslu 8 p.f1enc.. de
prlmelrl neC8SS Idlde.
O autor, com Islo, nlo lenclona leglUmar os abusos do e.plttal/amo
liberai, ..tvagem, mu preconll:a a Jormuleçto de uma terceira vii qUI
garanta .lmultaneamente pio e liberdade I todol OI hom.nl .

• • •
o Pe. Paul-Eugêne Charbonncau, depois de haver exposto
a teoria marxista, volta-se, em seu livro cMarxismo e SOclaJismo
Reab I , para a verificação do Que é o marxismo hoje na rea-
lidade concreta (= Socialismo Real) i cfr. pp. 109-223 da obra,
Desta secção destacaremos os tópicos mais característicos, que
Ilustram a seguinte verificação: cEntre Marxismo e Socia-
lismo Real Soviético 2 há um fosso . (MSB p. 144).

1. Socialismo Real: S6V conteúdo


o Pe. Charbonneau enumera diversos elementos constan·
tes do Socialismo Real:
1) A permanência de um capltaJlsmo de Estado.

I Ed. loyola, SIo Paulo 1N4, 130)( 208 mm, 223 pp. Citado como MIR.
s O autor, ."Ih, mOltta q'" nlo IÓ o SocIalism.o 8CWléllc:o 18 distancia
do Ideal apregoado por Marx, m.. qualquer lorma da Socialismo Real.

-115 -
28 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS,. 229/ 1985

2) Um golpe brutal a todos os direitos do homem. com o


controle rigoroso de todos OS aspectos da existência das pessoas.

3) Um sistema de Poder único e impenetrável. que tem


a si próprio como uma finalidade.
4) Um dogmatismo intolerante.
5) A estrutura da Igreja do Partido '.
G) Uma ideologia única de1lnlda pelo Estado e cuja im-
portlncla é enorme.
7) O arbitrio e a infalibilidade do dirigente supremo.
8) Condições de vida e de atividade uniIonnizadas e des-
vinculadas de qualquer iniciativa pessoal.
9) Denegação de justiça devida à Indeflnlção do Direito.
10) Um sistema econômico único, o qual define a. prlorl.
em todos os escalões, um plano que ignora a concorrência e
O mercado livre e que só se baseia nos preços determinados
pejo Poder.
11) A fraqueza relativa, mas constante, da produüvl-
dade.
12) A manutentão da allenacão em conseqüência da esta-
tização universal.
13) Um sistema unificado de educação.
cO EslGdo 'ex-Ie lodo ·podafOIO contra a peuoo; rtlonopolixo
tode, os meios de produção e se fox senhor inconlestável d. umo eco·
rlomlo cuia produtÕo , de 101 notur.!:a .q ue leva à penúria cr~nict.l.
Os campos de prisioneiros eslõo superpovoados a 101 ponlo que se fala,
com razõo, de um universo concantroclon6rio. O proletariado continva
aando condenodo Õ oli.naçõo. a IIberdode é quase reduxido a nada,
o homem é aubjugodo como iomoil o 'orG delde OI te,..pol 10nglnqUOl
em que a ascrovidõo era parte inlegronle da civilização. (MS. p. 16Q).

'A estrutura da Igreja Católica 6 sacramental, ala conl6m e transmite


a vIda do próprio Crlslo; por lalo merace respeito religiOSo. Ora o m.. mo
nlo la elA çom o Ealado comunl,lII; 1'110 obstente. 8llte arroga ••1 o raapeltq
que , 6 lO deve • Deus . . . lua ob.....
•. ...... Jli\'!;l '-y .... ~ ., .... ..

-116 -
o SOClAUSMO REAL 29

Por conseguinte. no Socialismo Real não se vê despontar o


advento ele uma socledacle livre e sem classes como havia Ima-
ginado Marx. Em todas as formas do Socialismo Real dA-se a
negação do marxismo - o que faz que Marx tenha perdido
a sua. credibilidade entre os estudiosos mais criticos. «Aliás, o
pr6prio Marx: teve a ver com a preparação desse malogro. Pois
4se existe .um principio fundamental de Marx, ele ensina que
não se deve ldentifle.ar o ser li palavra, o que é dito ao que é
vivido' (Edgar Morin. Pour .sortir du vingtiême siecle. Paris
p. 212), 1;. partir deste princIpio que o Socialismo Real con·
serva as palavras, mas dispensa o vivido. .. Segue a sugestão
de Marx, e, mesmo dlzendo-se marxista, deixa de o ser» (MSR
p. 159).

2. A Mentira
«O que nOI confunde no momento de exomi.ulr mais de perto a
Uniõo Soy{~tica. é Clue ela te cobriu com um 'léu Clue dissimula habil-
nlente lua nudez. Dal seu poder de fascinaçõa, que permite .que ela
possa enganar até as mais vivas inteligênciol (como Romoin RoUond,
Gide, o Scrrtre dos anos 50 e lantos outros até hoje I . .. Sem dúvida,
é luo qlole levava Zinoviev ti di:r.e, sem dissimulação: 'Vivemos no
mentira' (I.es hauteu", béontes, Paris 19n, p. 298 J. Não em uma
menlira acidental, mas, como reconhecia Sertre, v~lho e d~5e!ncantado,
em uma 'menlirv inslilucionoli:r.ado'. Trota-se, pois, de uma mentira
pennonente, estruturado, tornado inlrinseca à formo $oviéticlll de Socio·
lilmo Real. IMSR p. 1541.
°
«Quando se tenlo medir eklelUGO deua menlira, fica· se 016nila
diante de suo amplitude. .. Com .feilo, sabemos que o Socialilmo
Real" o lugar de enganos, de lodos OI opressõos, de! fados ai ignomí-
niol, de lodo$ 0$ torturas, do lololito!i$mo mais Inobalóvcl Ivi,la que
duro de.de OI comecos) , do 'democtocio' do Partido, que dô fo'olmente
etll candidatos únicol que se sucedem em um boI' cujos passos s60
todol obfeto de rigorolo coreografia» (p. 1541.

3. Liberdade rompida
Dando ao ~tado totlo poder e ao Partido toda autoridade,
o marxismo conferia-lhes ao mesmo tempo o poder de reduzir
a liberdade de cada individuo. Desde os albores do Socialismo
Real. Isto se tomou bém claro: Lenin explicitou essa concep-
ção em um diálogo significativo reproduzido por Richard Kohn:
-117_
30 cPERCUNTE E RESPONDEREMOS. 229/1985

«A liberdodel Que liberdade? Onde você leu que o povo pede


liberdade?

- MOI enteio <lue pede o seu povo?

_ O poder, di.z lenin. O povo nõo tem necenidade de liberdode,


e sta é ueno das formo! do ditadura bur.gueso. I La lé_lulion RVSM.
Poris 1963, p. 315).

AltAs, toda a história russa é regida por governos auton·


tArJas. O czar Pedro o Grande dizia que o bem-estar e a liber-
dade só podla.m amolecer as almas, e que um povo feliz é sem-
pre barrigudo e tem o espírito rebelde: donde concluia que s6
com uma nação de escravos se pode fa2er alta politlcs_ Esta
tese parece compartilhada pelos chefes do Socialismo Real, a
ponto que Soljenit!(yne póde observar: a única liberdade ver-
dadeiramente respeitada é a de proibir (ci. MSR, p. 170).

De modo especial, a liberdade de pensar é reprimida. Bahro


descreve a situação que decorre desse abuso: ~o comunista
pensante que encontra dois outros comunistas pensantes para
trocar idéhlS. deve-se considerar como que atirado na Ilega-
lIdad~ com relação ao Partido_ (L'Alternative. Paris 1979,
p. 326) . Por esse motivo é suscetivcl de ser enquadrado no
universo conecntraelonárlo. Prisão, tortura. trabalhos Corça-
dos são o prêmio da liberdade. Cf. MSR p. 171.

Como a expressão é a conseqUõncia natural do pensamento.


a liberdade de expressáo também é tolhida no Socialismo Real .
.Aos trabalhadores o Estado assegura que o Aparelho CQmu-
nista é o único órgi\'o capaz de conhecer e exprimir suas aspi-
ral:ÕCS- Aos tecnocratas explica Que só podem operar com a
aprovação dos burocratas. E a estes prega a submissão silen-
ciosa e absoluta sob ~nl\ de perder se-us privilégios e seu lugar
na esca1a social (cf. MSE p. In).
o «mooopOllo da verdade. pennite ao Partido intervir em
todos os setores da cultura e da ciência. cA filosofia, é claro,
é um joI/:O de cartas marcadas. Como também a pedaRQEtia. a
critica literária, a produ"'ão artística. a economia. a teoria social
e. até mesmo. por Incrivel que possa parecer. a bloloAÍa e as
outras ciências. A literatura é visada de modo particular. Os
detentores do Poder sabem que o escritor (e. em nossos dias.
o cineasta), se tem valor verdadeiro, é a únIca. consciência
-118 -
o SOCIALISMO REAL 31

que cobre toda a sociedade. Ap1ica...se-Ihe então uma ceruura


que .. . em determinados momentos se torna alucinantc •. Cf.
Ams p. 171.

4. O 'error

Para mante r·se no poder, o Estado tolalitârio deve apoiar-se


num militarismo sem escrúpulo e num sistema policial que se
exerça dentro da mais audaC!iosa arbitrariedade. Por isto a
experiência ensInou aos cidadãos dos paises comunistas que a
rebelião contra a mAquina polldal ê um suicldio. Como na
antiga Russia, o Estado tece uma imensa teia de aranha, cujo
centro ê Moscou e que se estende pelos diversos socialismos
existentes fora da pãtria russa.

Conseqüentemente o terror e o terrorismo do Estado são


um fato nos palses da Cortina de Ferro, que assim apresentam
uma «democracia goulaguiana». O teITOr é aí tanto mais neces·
sário quanto mais se debilita a fé dos cidadãos na ideologia
marxista. Alh\s, pertence à essência do comunismo edificar-se
sobre o terror. Este deixa a pessoa humana insegura, sujeita
à destruição, sem que esta precise de ser justificada. Em nos-
sos dias é grande o número de depoimentos de cidadãos dos
países da Cortina de Ferro e da China maoísta que reterem os
maus tratos e o pavor infligidos pelos regimes corrrunistas; e m
conseqüência. pode-se falar de cdespudor do terl'Or, .
.e na lolalidade de 1110 ..ida, mesmo no que ela tem de moi,
Intimo e peuool, que o cidadão do comunidade sociatido , posto em
caUiO e omeocodo. E vigiado por todo a pade : em seu domicilio. no
seu Trabalho, e m .eu. IOKeres, no ocupação do seu Tempo, nO i $l,IOS
amizades, nos .eus Olllaren (MSR, p . 1851 .

As vitimas do terror do Estado são tantas qu~ cVost~nsky


fala de 110 milhões de pessoas, e nada nos autoriza a duvidar
de sua afinnação. Muito ao contrârio, ela pOderia estar aquém
da realidade... Roy Medvedev, que fez minucioso levantamento
hIstórlco.lembra, a respeito das origens da revolucãó leninlsta.
que cas numerosas prisões construídas sob os czares não bas·
tavam para conter os milhões de pessoas que haviam sido pre-
sas, embora se tivessem colocado mais detentos em celas pre·
vistas para um prisioneiro apenas e que eram amontoados até
cem em telas de vinte.. (Le StaJinlsme: origine, histolre, 0011-

-119 -
32 cPERCUNTE E RESPONDEREMOS. 229/ 1995

5Íqwmces. Paris 1972, p. 238) . c:Absurdo espantoso: o terror


marxista-Ienlnista - com todos os seus propósitos de liberta-
ção - u1trapassava de longe o terror czarista. . . Estranho
retomo das coisas:. (1\ISR, p. 186).
E eram comunistas que a repressão comunista destrula.
Foi o caso de Stalin, do qual se sabe qu~ ele próprio pratica-
mente esvaziou os quadros do Partido e liquidou as grandes
figuras das primeiras horas da 'Revolução: Bakunin, Nazare-
tian, Orjonikldze, Kinoviev, Saltanov, Chekov, ete. Sabe-se que
num penado de dois anos a NKVD executou mais comunistas
do que os que haviam morrido durante todos os anos da luta
clandestina, das três revoluções e da guerra civil . .. Tal Ioi o
reino do terror que Varga avalia em um décimo aproximada-
mente o número de cidadãos russos que foram acusados de
todos OS crimes imagin.1vels, desde a cumplicidade com forças
inimigas internas até a traição por conluio com forcas exter-
nas. Os 9/10 que haviam sldo poupados, vlv1am num clima
de medo e sentiam um perigo constante e onipresente a b!o-
quei-Ios. A vantagem que o Aparelho tirava desse estado de
espírito, é que os cidadãos, coagidos pelo medo, se tornavam
de uma docllldade servil e faziam-se cada vez ma is dedicados
ao Poder.
Para completar o triste quadro. seria pr'ei:lso falar ainda
do terror ideológico, do terror pslqulãtrico e de outras múlti-
plas fonnas de que ele se possa revestir. Cf. MSR pp. 186ss.
c:Eue lerror ... nCio destrói o homem dmplesmente em seu corpo.
Ele olinge ti ntlçõo em seu espírito, em lua fecundidade artistica, que
ele Cltrofia, em leu crescimento cientifico, lobre o qual exerCI! tutelo.
Umoa vez: que o Poarlido se outorgo lodos os direlloas, outor.9o-H lomb6",
os cilnones do beleU!. Retornamos Clqui õ se ..... idõo p'ogromado, con-
.ontido po r muilos arti.tas, que preferem ti mediocridade com vida, e
recusoda por tonlOI outros, qu e .&0. por illo condenados, pOlque o
cúpula decidiu que lua arte era conlra-revolucion6rl0. O resullado
disso é, por um lodo, uma arle acodlmlca, comunlsla e dirigido, que,
como na ChiAlJ, é de um rldlculo lotai e, por outro lado, umo orte
pro.sCJ"ilo, de smoral/roda e censurado pela ideo1ogiQ oslabelecidCl. A
me.mo coisa ocorro com o ciindCl I a linho de pesquilo , pré-eslobele.
odo em ",,,"o e.pi eie de plano qüinqüenal e, quando a tirania li levado
00 e/l;I'emo, os relultados • o. leoriol que exprimem as conclusõel
cienllficos sôo Q" melmo predeterminodol . . _ A ditadura OI en'VOlve.
° lerror' o guordióo r e loso que revQ a umo esterilidade oen.(tlli:r:oda:.
(MSR p. 1881 .
-120-
o SOCIALISMO REAL 33

5. Outras aspedos
Charbonncau ainda se detém na considemção de outras
facctas do Socialismo Real.
Marx apontava para um futuro no qual o Estado pcrdclia
a razão de ser. DizJa que seria p1'eciso conSCl'vá·io apenas por
algum tempo alnda, por ser um intermediário entre a Revolu·
ção, que derrubava a antiga ordem, e o Futuro Socialista, que
começava a exisdr.
Ora só um sonhador podia dizer isto. Nunca se viu, em
toda a história da humanidade, um Estado solidamente assen·
tado e todo-poderoso admitir a sua extinção. Menos ainda pra.
parã.la. Pois tal Estado atribui aos que governam, um poder
tal que os habilita a eliminar, a seu bel· prazer, todos os cida·
dãos que tencionem contestá·lo. Um Estado forte se defende
implacavelmente.
c.Em lodos os paises onde ,eing o Socialismo Real, e)(isle um
Estgda.mon.lro, que alribul a si mesmo g caricatura das prerrogativas
di'linos. é um Estado.deus. que lomg gS cores do Clbsoluto. Ele dispõe
dg lua 19 ....io. qUe é o Partido; do SUei rev.Ja~õo. que'; o inlerpretgcão
que el. dá 00 mar.itmol de seus profetas, que formam o apparatchidr:
1iell de sua Inqulsisão, que onume os IrO(os modernos do GoulQ9
Icampo de concentração) . Neue impulso, que se alimenta cuidadosa·
mente, a ellado nunca acaba de cre!cer. A praxiJ do Socialismo Real
torno· H! cínico e apa'laranlu (MSR, pp. 19ls' .
c Produlo normel de uma ideologia, o Par.ido anulo·se em uma
Revoluçõo que 10 .,deroso, e $O: lorna Reação. O comunismo mctvulho
então nOJ moldes de um Estodo fascista. Tal regime ouume natural·
menle OI formos de no'lo cClpilolismo = o copilolis".o do Estado. O
pr6pria l enrn reconhecia corajosamente essa "atidode, confes~gndo'o
sem móscores : 'O SocíoU. ",o é impensóvel sem o técnico capitalista,
que é orgonilada segundo a ciinda mais ",aderna; é impens6vel sem
um plonelomento "Iotol quê foço que milhares do pessoas r.speitem
a mesmo norma no fobri(oc;6o e distribuic;ão dos produtos' (cilada por
Rudolf Bahro, L'Altemativ• • PClril 1979, p. 93):1· (MSR, p. 19.).
Mas. por ser um capitalismo bastardo, o capitalismo do
Socialismo Real tem fracassada. Nunca acaba de contar seus
revezes de um plano qüinqücnal para outro. Eis o que se rlá.
por exemplo, no setor da agricultura: outrora a Ucrânia. fE'r.
tlllssima era um celeiro proverbial da Europa. Hoje a União
Soviética vê-se cOndenada a. Importar constantemente o trigo
que lhe falta, porque ela própria sabotou a sua fertilidade.
-121 -
34 .PERGUNTE E RE:SPONDEREMOS ~ 229/ 1985

Se a produção é precaria. a distribuição também é muito


deficiente nos paSses socialistas; caracteriza-se por mercado
negro e filas. Aquele se realiza com a conivência da policia ;
o mercado negro dos países capitalistas ê o da especulação de
divisas; o mercado negro de Moscou e dos seus satélites é a
corrida aos gêneros de primeira necessidade. Quanto às fllas.
são Intenninãvels filas de espera ... . Posso testemunbâ·lo
pE!SSOalmente, lã que me defront.:!1 com intermináveis filas em
Moscou, na China, em CUba. na Iugoslávia e na Polônia. Em
cada lugar O povo era condenado a fazer fila para tudo o Que
se pretendia adquirir em matéria de alimentos, vestuârio, etc.»
(MSR, p. 2(2).
Após todas estas observações. extraidas do livro de Char-
llonneau, podemos passar a uma

6. Conclusão
Observa o Butor:
. Sobreludo nôo se olribua este juloamento amargo a uma visiio
uític:a tendencioso. 80110 observar lodos OI farmas do Socialismo Real
que existem, poro se 'er con"iincia de que o exploração do homem
pelo homem, que o lIIarxblllO pretendia suprimir . _. , Longe de desa-
parecer, experime ntou um brutal re .... igoromento . . . A lubordinoção
dos mossas trobolhgdorgs prossegue num Estado que exploro o homem
mais do que qualquer outro capitalismo.

Tão plohJnda. lôo podo8rosa é 081:0 dominação que o slalul do


Irobolhodor do Soc:iolismo leal se aproxima c:ons;deravelmenle do
status do e"rovo antigo .. IMSR. pp. 204s) .
• Serio bom ler ido selllpre presente o fim de nõo fomentar uma
ingenuidade que nOI levaria . . . o (o" l',uir uma "0 ....0 lociedade de
opressão, o luprimir as liberdade, ,em dor o põo. Que o exame alenlo
do praxi5 do Socialismo Real sirva de antídolo o todos os que padecem
deno tentoçaol
A Humanidade não pode mais ser oprimido em nome de quem
quer que seio , Elo atinge o úllimo limite, no qual ,unCl novo opreStôo
leria tCllyez leu último desastre. TenteMOS oferecer. lhe simultaneamente
o pao e a liberdade poro que possa enfim conhecer o paz, que seró
o expressa0 do f.tic:idade~ (MSR, p . 2231.
Sem ulteriores comentários . . .

- 122-
Um livro vlo~to:

"A Senhora Aparecida"


por Anlbal Pereira Ral.

Em alnl... : O paslo, Anlb.1 Parell' Reis pretende Impu gner o ...n-


11,16'10 do Aparecida e a dayoçao 6 Padroeira do Bras il recorranelo I alegaçOac
1.11.. : dl:l que a des<:ober1. da Imagem de Maria SS. nada tem de extra·
ordln'r!o, pois 101 o 1Ilg'rIo de GuaraUnguet', Pe. J os16 AI ..... Vllella , quem
lançou a Imaoem ao rio Paralbll pouco al'ltes que os peseadorea .. pusesum
a lançar a. redes: ela nalural que. colhessem nas lua. ra des em lals c:lr·
CURlünclu. - Ora Anlbal Peral" Reli parece Ignorar que o milagre de
Aparaekia SI de u am 1717, lO pano qUI o Pe. Vilella s6 se lornou \/Ig'rlo
do IU98' em 1725; MI época era VIO'rlo dê Aparecida provawtlmenle FreI
Joio di Coata e Almeida. "'dema l. oPa. Vllalla leria cometido 61 ocultlil
eMm qUI nlngu'm o so ubesse) • Ir.ude de lançar a Imagem ao rio para
qua fona pescada num .parente mllagra. Pergul'lla-se entlo: como é que
A. P .R . • aOO desse lato fraudule nto e oculto? Até 1967 nlo h. uma lÓ
noticie da fraude atllbulela lO padre, nem A. P . A. cita um documento sequer
pari com provar o (lua diz , mu tudo afirma gralullamanl8. Ser. qua A. P.R.
leve uma ,ev.laçio? Ou 1'1 '0 .er' qUI Inventou desonestafTltlnle ,. allõrla da
frauda pala eUmlnar um 'ato de gr.ndau Insollsmaval, qU8 , Ap.recld. do
Norte e.ua h istória? De reslo, ... . P . R. 11' conhecido por falsificar documen-
tos e lorjar Inverdades a fim de Impugnar a 5 . Igreja de Cristo: cl. PR
182/ 1915, pp. 537-542.

Um .utor que auim proeade, perda as suas credenciar, junto 1ll0i


lellor.. , ela modo que todo o op<.culo, carregado ele IIC;UsaÇOe50 grosseiras,
preconcebIdas 11 maloo..s , carece de valor.

• • •
A nossa revista não costuma alimentar polêmicas, pole;
estas são freqüentemente estéreis. Todavia os leitores tém-nos
solicitado uma tomada de posição diante do livro do pastcr Ani-
bal Pereira Reis: //lA Senhora Aparecida. Outro 'conto do Vi-
garlo'" do qual temos a segunda edição publicada em 1968.
Visto Que tal livro dissemina Inverdades como se Cossem a
mais cristalina expressão da realidade, julgamos Importan te
desmascarar as imposturas da obra. A fid elidade à verdade c
obrigação de todo cristão; a autentica atitude religiosa hã de
se basear sobre a vel'dade. e nlo precisa de in verdades para
se sustentar.
Passamos, pois, à análise do opúsculo em foco.
-123 -
3G , PER GU NTE E RESPONDEREMOS. 229/1985

1. ObservaSóes gerais

o que mais chama a atenção do leitor do livro, é o seu


tom pol6mlco e agressivo, que afirma suas proposições com
sarcasmo, sem aduzir as provas do que diz. Referind~se às
origens da d~ão a Nossa Senhora Aparecida, o autor expõe
uma explicação nova, dlferent~ da versão habitual, sem Indi-
car uma fonte histórica e sem citar um único documento que
justifique a sua teoria. Anibal Pereira Reis impressiona pelo
seu estilo mordaz, e não pela concatenação de seus argumen·
tos (que, aliás, em seu escrito não existem). A paixão e os
afetos do autor ralam em lugar do raciocínio; o seu texto está
impregnado de preconceitos pessoais.

Ora tal procedimento em matéria historiogrãfica é anti·


cientifico; a rigor, não deveria merecer a atenção dos estu-
diosos, Que costumam basear suas afirmacÕes sobre documen·
tos cuidadosamente citados, Se. não obstante. respondemos a
A . P.R., razemo·lo porque, embora não apresente credenciais
paro. encontrar audiência. o livro em pauta tem seduzido mui-
tos leitores. O amor à verdade exige, portanto, a1gumas expli-
cações e ponderações, que proporemos em tom sereno.

Examinemos agora alguns tópicos do seu conteúdo,

2. A origem da devoção
1. Conforme A .P ,R., a apariçã.o de Ma ria 5S. nas águas
do rio Paraíba do Sul - fundamento da devoção à Senhora
Aparecida _ nada teve de milagroso. Haverá sido rroto de
um embuste do Pe. José Alves Vilella, vlgrârlo de GuaraUn-
guetã: este, para se exaltar aos olhos da Coroa Real e dos fiéis,
terá: lançado ao rio uma estátua de Nossa Senhora, depois de
soUcltar aos pescadores Domingos Martins Garcia, João Alves
e Felipe Pedroso que capturassem peixe para um banquete a
ser ofe~cido ao Conde de Assumar. Governador da Provincia,
que passaria em breve por Guaratlnguetã. Ora foi essa estA·
tua que, conronne A .P .rt., os três homens pescaram cmllegrD-
samentea no rio, aereditando tratar-se de um sinal do céu!
Haveria, pois, na origem da devocão 8 Nossa Senhora Apare-
cida uma autêntica fraude, devida à ambição do Pe. VllelIa.
Eis o texto de A.P .R.:
-124 _
cA SENHORA APAREClDA~ 37

COI pescadores admirados receberam no dia do banquete 113 de


outubro do 17171. monhã c.edo, (IS ordens do vigário no sentido de
que lançastem $UCI$ rede. no porto de lIo,9UO$'U, pr6ximo do morro
dOI Coqueiros_ Como olival peu:adares, sabIa", que OI peixel per-
manecem moil nas partes calmol da ,ia e nao é poulvol pesca o'guma
junto de u'" porlo, onde hó 101'110 movimenloção ...

Em "visto do suo próprIo proliuõo. enlenderam 0$ pelcodores o


ineficócio do ordem extravaganle do vig6rio. Mas, ingênuos e sub·
minas, obedeceram. Não lhes con..,in"o delo«ltor o socerdole
ameaçador" capaz de praguejó.lal e amaldiçoá-lol.

lancoram a rede na COI'I..,.ccao de nada "apanhar. Surpresos,


porém, retiraram dos 6g\los \lma imogenzinho, de 0,30 de allu(CI,
ta[hada, em terra cola e.cura, nos moldes da Modonno d. Muri[o,
que o clero ... utilizo como s[mbolo do 'Imaculado Conceiçilo' de
Mario.

Decidiram guardar o imagem aparecido nOI águas denlro do


embornal e prosseguir alóm lua lore'o.

Obtido a quoftlidode do pescado exigido pelo clérigo onfilrião,


foram à lua resldincia fozor·lho a entrego.

E, jubilosol no lUa crenco ingênuo, mostraram 00 padre, mÍllurodo


fiO comitivo do Governod()f. a imo,gem aparecido,

Enternocido o vigôrio pelo sucesso de leu empreendimento. poil


ningué m soubora e nem desconfiara de suo ido durante o madrugada
00 porto de [taguouu para deixar na. õgua. aquela imagem, deseiova
,1,10$ eapreu6es religiosos e des[amb,das acentuando o fator 'milogre'

doqvelo de,coberlo .

Todo O pctyO daquelo regiao, presente em Guaralingue lá paro


conhecer o Govarnodor, Conde de Assumor, ludibriado em sua Cfe·
dulidode, exv[tou com o 'milagre' sucedido, vinculando_o à lonlidode
do SIU vigório I diyulg()u 11 noticio õ disléincia» (op. citado, pp. 22 .. ,.

A seguir. diz o mesmo A .P . R., o Pe. Vilella mandou


esconder a estátua «apra.recldu no alto do morro dos Coquei-
ros; enviou entã() os néls à procura da estátua, que era reen-
contrada cmilagrosamente» após misterioso desaparecimento;
cf. pp. 25·27.
- l.25-
J8 .. PERCUNTE E RESPONDEREMOS., 229/1985

Isto tudo C afirmado, como já notamos, sem a mlmma


referência a algum documcnto-rontc. Ora diz o sâbio adágio :
cO que gratuitamente é afirmado. gratuitamente há de ser
negado.. Como quer que seja, passamos a consultar as lon·
tes históricas mais a ntigas e dignas de crédito atinentes ao
episódio em foco.

2 . Eis o pri~iro relato do fato. contido no Livro do


Tombo da Matriz de Guaratinguetá, Colhas 97-98, com a data
de 1745:

. No (.no de 1719, pouco moi, ou menos, passando por Cito Vilo


para a i Minol o Governador dela, e de Sõo Paula, o conde de Assumor
Dom Pedro do Almeida , forom no tificados pelo Câmara OI pucodor.,
poro opresonlorl'''' lodo o peixe que pudessem ho ...er pora o dito
Governador.

Entr e muitos, foram (I pescor Domingolo M. GOleio, JOgO Alves


• Felipe Pedroso, em luas can&OI; e principiando a lancar lual redes
no pô rto de Jos6 Corteio Leite, continuaram até o pôrto de Itoguassú,
di,'ândo bostante, sem firor peillle algum, e lançando neste pôrto
João AI .... I a I UO rede de roslro, tirou o corpo do Senhora, le", cobeco·;
loncond& mais obobo outra vu o rede tirou a cabeto do melmo
Senhora, não :lobendo nunca quom o!i o !ancone .

Guardou o Inventor osto Imagem em um 101 ou qual pano, e,


continuondo o p,H(otio, nae tendo até e nlão tomado peixe algum,
dali por ditlRto foi tõo copioto (I pescaria em pOUCOI !onÇOI, que,
re<:eioso, e 01 cOflponhoiros de naufragarem pelo mui,o poOi)lo que
tinham nos conool, 10 retiraram o suos vivendos, admirados des'e
lucessa·

Felipe Pedroso conservou ello Imagem seis onOI pouco mais ou


menos e m suo COlO, junto o loure nco do Sá; • p05Sondo paro o Ponte
Alta, ali o conservou e .... suo casa neve anos pouco mais ou menos.
Daqui se polSOU G morar em Itaguouu, onde deu o Imagem o seu filho
Atanó sio Pe droso, o qual lhe fez: um oratório 101 e qual, e em um
aliar d. p6uI colocou o Senho ra, onde lodol OI sábados se ajuntava
o ... iJ.inhanco o contar o têrco e mais devoções,

Em umo deitai oco,iõe l s. opogarom duos luzes de cera do lerra,


repentlnamonle, que cllumiovom o Sen"o/o, estando o noite lerena,
e, querendo logo 511 ....ana da Rac:ha ac:ender as IU:l:8$ apagadcn, também
" viram logo de repente ocesos, sem Intervir diligência alguma : foi

- 126 -
____________~.A~S~E~N~H~O~R~A>2A~P~A~R~E~C~I~D~A~.__________~M

esle o primeiro prodígio, e depois em oulra semelhante oCClsião viram


muilOI Ir.mores no nicha e Clllor do Senhora, que parecia cair o
SenhorCl. li! os luzes trêmulos C$lando o noite $ereno.

Ern oulra lemelhonle occuiõo. em uma lexta·feira poro o lábodo


lo que sucedeu vórios \lezes' juntandO-H olgu",ol peSSOOI poro
canlorem O lêro;o, ellondo a Senhora em poder de 5ilvo"0 do Rocha,
,. guordado em uma caiJto ou boú velho, ouviram dentro da caillO muito
.s'rando. muitas peuoos, dos .quais se foi dilatando o f CImo olé que,
patenleando',e muitos prodigios, que o Senhora fazio, foi creKendo
a fé e dilatando-.e o nOlicio, e chegando 00 R. Vigário José Àlvel
Vilella, elle e oulros devotol lhe ed ificaram uma <:ope:linho e depoil.
demolida e,lo, edificorom no lugor em que hoje esló com grandeza
e fervor dOI devolos, com cujos esmolos lem chegado 00 estado em
que de presonte e116.

Os prodígios desta IMCloem foram autenticadol por testemunhal


que se acham no Sumário sem Senlenca. e aInda continua a Senhora
com seu, prodígios, acudindo à sua sonla cosa fomeiros de porles
fIIVitO distantes (I gratificar OI beneficio, recebidos desta Senhora p.

Os comenlodores observam que a imajitem mede 0.39 em,


e não 0,30 cm, como diz A . P . R. Além disto, deve·se notar
Que, conforme o relato oficial, é a Câmara da vila de Guara-
tinguetá Que tem a iniciativa de ofcrecer ao Govemador Dom
Pedro de Almeida uma refeição na base de peixe; foI a O-
rnara quem convocou os três pescadores à captura do peixe,
e não o Pe. JDSé Alves VileUa, do Qual o relato oficial só faz
discreta menção no fim da história narrada. - Esta verifica-
ção tira toda a base ao relato da A . P. R.
Mais: o relato aliciai indica quc os pc!SCadores comecaram
a lançar as redes no porto de José Correia Leite; dai prosse-
guiram até o de ltaguassu... Com Que fundamento então
afirma A . P . R. que os pescadores Inlcjuam a sua tarefa ime·
diatamente no porto de ltaguassu? O pastor forja esta ver·
são porque deseja absolutamente envolver o Pc. ViJella na his·
tória da descoberta da imagem.
Seria preciso Que Anlbal Pereira lWis contrapusesse ao
relato oficial atrás transcrito outro relato autêntico (e não
forjado) que fundamentasse a versão proposta por A.P.R.
- Ora tal não ocorreu nem ocorrerá, de modo que não me-
rece atenção a explicação dada pelo pastor. O caráter falso

- 127 -
40 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS:> 229/1985

da versão de A.P .R. pode--se comprovar, entre outras coisas,


ainda pelo fato de que o Pe. José Alves Vilella só a partir de
1725 foi vigário de Guaratinguetá, ao pas$O que a descoberta
da imagem ocorreu em 1717! Devia ser vigário de Guaratln-
guetá por ocasião da aparição Frei João da Costa de Almeida,
conforme noticia colhida no livro de Pe. Machado, História ...
(citado na bibliografia deste artigo), p. 184:
«Houve em Guaralinguelêa pároco (cvra de almas) desde ont ••
d. 1690 .. . Frei Jo6o do Cosia • Almeida. frede mercedária, eM
1115 . . . supomos que no oparecinenlo da imagem ele ainda Ió e.la\lla,
pols na elenco exil'enl. figura en"e OI ouxili.ares de 1720 . . . :.
(cf. A Igrefa na Hlatória d. São Paulo, tomo ~, p6gl. 201, 216 e 3911 .

O absurdo da versão de A.P.R. se patenteia ainda me-


diante a seguinte reflexão: se foi o Pe. Vllella (que, aliás. não
era vlgãrio de Guari. em 1717) quem ocultamente lançou a
estátua da Virgem S5. ao rio para que os pes<:adores a cap-
turassem .mllagrosamente:., quem é que pôde saber dessa
fraude? Foi cometida sorrateira e disfarcadamente! - Se o
101 o Pe. Vilella mesmo quem revelou ter cedido a tal fraqueza,
estaria desfeIto o mito de Aparecida; não teria tido contlnul·
dade. Se foi outra pessoa, testemunha do fato oculto, o mesmo
teria ocorrido e o culto à Aparecida não teria prosseguido.
Ademais quem teria sido esse denunciador, que nenhum do·
cumento aponta e que não teve nenhuma repercussão na hls·
tórla posterior a náo ser, 250 anos mais tarde, na cabeça de
Anibal Pereira Reis?
A mentira e a desonestidade estão mais do que evidentes
na versão forjada peJo pastor batista.
3 . Ademais, os historiadores notam característicos insó-
litas, que parecem supor especial Intervenção de Deus na des·
coberta da estátua de Nossa Senhora Aparecida:
a) O peso da imagem milagrosa, feita de barro poroso
queimado, é de 4 .350 gramas; submersa na água, desloca 2 .240
gramas. Logo a imagem pesa quase duas vezes mais do que
a égua. Ora. a fislea ensina que s6 pode flutuar na água um
oorpo msJs leve do Que a própria água; por isto, em vez de
flutuar, a estAtua devia ter afundado e aos poucos, no Cunclo
do rio, se teria coberto de lodo.
b) Ademais. pergunta-se: sendo de barro poroso a Ima-
gem, como não se dissolveu nas águas?
-128 -
cA SENHORA APARECIDA~ 41

c) Primeiramente descobriu.se o corpo da imagem sem


a cabeça ; depois encontraram os pescadores a cabeça da está-
tua. Ora observa-se o seguinte:

Corpos de peso e tamanho direrentes são arrastados peJa


água com diversa velocidade. A cabeça, sendo mais leve (pesa
ISO gr apenas), devia ser arrastada mais depressa do que o
corpo, que pesa 4.200 gramas. Por conseguinte, primeiramente
devia ser encontrada a cabeça e só depois o corpo. Mas foi
precisamente o contrário que se deu.

d) O local da descoberta era inadequado tanto para a


descoberta da imagem como para a captura de peixes, pois
ficava na foz do rio P.araiba, nas proximidades da Pedra
Grande (Itaguassu), em melo a aguas agitadas.

o) O fato do se ter dado copiosa pesca após a descoberta


da imagem também carece de explicação natuml; não terâ
sido um sinal do céu que confirmava o da estátua milagrosa? I

4 . Os estudiosos indagam: donde veio a imagem encon-


trada nas águas do rio Paraiba?

Não há resposta unânime para este quesito, mas apenas


hipóteses, das quais sejam citadas as seguintes:
al Segundo os antigos moradores de Aparecida, ~m Ro-
seira Velha, antes do encontro da imagem, numa das fazendas
à margem do rio Paralba, havia uma capela dotada de uma
imagem de Nossa Senhora para satlsfuer à delJ~o dos
escravos do lugar. Tal capela ficava na ribanceira do rio. Ora
as águas do rio Paralba por ocaslão das chuvas avolumam-se,
tornando-se caudal agitada; esta arrasta barrancos e outros
obstáculos que encontre. - Pois bem; a capelinha em foco nunca
mais foi vista após uma estação de chuvas torrenciais; desa-
pareceu assim a Imagem de Nossa Senhora que ela encerrava.
Hã, portanto, a possibilidade de ter sido ~ta pequena cstãtua
levada pela corrente do rio c achada na prodigiosa façanha
dos três pescadores.

I ObIervaç&e. colhida. na obrai de Padre Maçhado, Hiat6rJco, ..


pp. 1411-1-48.

-129 -
42 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS~ 229/1985

b) No livro das Atas da Irmandade da Capela de Nossa


Senhora Aparecida. aberto em 1756. existe o relato histórico
da descoberta d a imagem, ao qual f oi acrescentada a seguinte
interpolação:

c Há cerlo ttodi<60 que, tomando urno mulher uma l anla imogem


Ipor elo encontrada e com o sinol de ce ro com que elo ligoro os pOfles
queb rod cu ao pe$coço) e levando-a Q capela d e Nossa Se nharo da
ROlório dos Correios paIo um levenndo ali então e"istente ou' que ali
se achava, a benzer, poro ela o ve neror, o dito reverendo Padre,
vendo-a no formato e e$lado em qlle venturosamente a vemos, nõo
o qu is b en~er, e, d ividindo o cobeça do corpo, o lonçoro ou fi:r.eto
loncor neste rio Paraibo, a que é be m pravóvel acontecesse».

Este relato, que não passa de hipótese, se explica pelo


fato de que os antigos. costumavam jogar nas águas dos rios
ou do mar imagens quebradas ou restos de imagens. Não as
Queriam destruir nem jogar no lixo. Ocorria também Que
enterrassem esses resqulclos de objetos sagrados sempre com
a mesma finalidade de não os equiparar ao lixo.
Contam-se também duas lendas a propósito da descoberta:

c) A Imagem da Senhora Aparecida era de Jacarei. Em


virtude de grande enchente do rio Paralba, apareceram dois
monstros; faziam terriveis estragos, derrubando barrancos e
agitando o rio. Amedrontada, uma velhinha que morava perto
deste, tirou a Imagem de Nossa Senhora que tinha em seu
oratório, coJocou-a numa vasilha e soltou nâgua, acreditando
Que a imagem da Santa faria desaparecer os mtJnstros. - Na
verdade, estes rolaram água. abaixo e a Imagem ficou no leito
do rio!
Hã uma segunda lenda.:

d) Em Jacareí havia grande fazenda, onde os escravos


eram tratados sem piedade. Um das escravos, tomando barro
escuro, modelou grotescamente uma imagem; era escura como
ele. De seus lábios sala dolorosamente o segredo divino da
oração. Segredo daquela alma onde sentimentos desencadea·
dos eram .respostas às chibatadas. A oração era uma queixa
arrancada da dor e da revolta. Um dia o feitor encontrou o
escravo com a Imagem nas mãos. Falou para o «sl nh6 ~. E
velo o castigo: teve que jogá·la ao rio com as propnas mãos
-130 -
'lA SENHORA APARECIDA~ 43

e depois ser algemado.... O rio guardou a santa para um


dia mostrá-Ia a todo o mundo. ' " E estas lendas correram
de boca em boca. (Lendas encontradas no livro de ç. Borges
Ribeiro, Folclore. São Paulo 1952, n 9 1, p. 8).

Estudos recentes asseguram ser a imagem de Aparecida


genuinamente paulista, obra artistica de Frei Agostinho de
Jesus, confeeelonada em meados do sóculo XVII.

Persiste, porém, sem resposta a obse1VB.ção feita pelo pri-


meiro relato da aparição: ..... não se sabendo nUflca Quem
ali a lançasse! ...•

5 . Quanto à data precisa da descoberta da imagem, os


estudiosos tentam detenninâ-la coordenando o episódio com os
dados concernentes à viagem do Conde de Assumal'. E con·
cluem que a aparição deve ter ocorrido de sexta-feira 15 para
sãbado 16 de outubro de 1717 (o que põe em xeque mais uma
vez a versão de A . P .R.). COm efeito; o Governador Dom Pe-
dro de Almeida era esperado em Gual'Btinguetá na sexta~tejra
15 à tarde ou no sâbado de manhã i como os antigos não CQS·
tumavam ofereceI' banquetes à noite, ficou estipulado que a
grande refeição presidida pelo mandatário de EI-Rel se reali-
zaria no sábado 16 ao mcio.dia. Nessa refeição, porém, se
observaria o regime de sexta-feira, que era o de abstinência
de carne; Dom Pedro de Almeida era fiel aos preceitos da
Igreja que, na época, prescreviam a abstinência de carne todas
as sextas·feiras (cf. Constituições do Arcebispo da Bahia, por
Dom Sebastião Monteiro da Piedade, cãnones 373. 406 e 408.
Ano de 1707) . Tal foi a razão pela qual a CâmaI'B. de Guara·
tinguetá pediu farta captura de peixes aos pescadores da região.
Tal foi também o motivo pelo qual os pescadores, premidos
pelas ordens superiores, se afligiam por nada capturar; terão
recorrido à Santa Mãe de Deus, que, em sinal de sua prot~ão,
lhes teri <lutorgado o simbolo de sua assistência materna e o
almejado prêmio de seus esforços noturnos.

2. O desenvolvimento da devoção
Eis a versão que dos fatos transmite o pastor A. P . Reis:
cOs anas se pensaram e (I name dD padre Alves Vilella. ,em ser
sugerido nas eleições dOI blt.posl

-131_
44 ",PERGUNTE E RESPONr>EREMOS. 229/ 1985

o vig6rlo de Guoralin~uelá, agara já encanecido, porêm


esperançoso, montinho-se 00 par de lodos os noticias vindas de AlclII
Atlântico.

Conhecedor da carolice de EI Rei e sua magnanimidade em pro-


veito dos clérigos, urdiu outro investida com o objetivo do olralr os
atenções 'majeslólico,' sobre si.
..
Cetlo sábado, em 17"3, quando os devotos chegaram li- capela,
surpresos, deram pelo folia da lonlo opore<ido. AI6nllol ficaram
quando Silvona Rocha deu:onhecio lombém o leu paradeiro me,,,"o
depois de se informar com Atanásio. Desesperados, corr.rom falo"
com o v~ário que se fingiu surpreendido. Aconselhou·os. porém, o
que deuem uma batido nos redondezas. que nôo se esqu.cessem de
ir até ~ 0110 dt. mt.rro dt.s Coqueiros. Dóceis à orientoçõo do padre,
vasculharam fodos os recantos, e, por fim, subiram OI rapazel 00 m~r,o,
onde, pota alivio geral, encont,aram o imagem enCOltoda em umo
pedro. Nessa nolla. o rosário foi recado com mais fervar, os hinas
moil vibron'e, e o baile mais animado com pingo dislribuldo abundante
na algazarra do reenconlra do Senhora Aparecido.

Noutras sábados. o fala mist. rioso $e repetiu sem que os pobres


devotai percebessem o mão do yigária al,á$ de ludo » lopúscula
cilado, pp. 255 J.

Como se vê, nenhum documento é citado como Conte da


estória narrada. Observa*, porem, que o relato é vasado em
estilo pungente e ferino. A essa narrativa gratuita ou sem
fundamento (Que, antes do mais, peca por supor Que o Pe.
Alves Vllella era vigário da região quando não o era), slga.se
aquela que resulta do exame objetivo e sereno dos arquivos
históricos atinentes ao assunto:

«1717 - 1726 - Filipe Ped,olo conservo a ima,gem em 11,10


Cala, situado junto do Ribeirõo do Sá. Ap6s colar com 'Cere do Terra'
a cabeça 00 tronco, lUa família li! OI vixinh05 iniciam a culto famUio,
diante do imagem.

17~l& a 1732 _ Filipe Ped,aso Ironlfere-se poro a poragam do


Ponl. Alto, levando eoluiOa o pequena imagem. Junto d ela, IUtl
familia e o villnhon,a cumprem lUO' devações, principalmente 001
sábados. cantClndo o terço e ai ladainhas.

-132-
cA SENHORA APARECIDA. 45

1733 - Filipe PedtOSO vai residir fiO Porto lIoguac:u e 16 entrega


a imallem o seu filha Atan6sio. Este lhe constrói Q primeiro orat6rio,
qve pono o ~er beqiienlodo por todo a yizinhonc:o. Os devotos
comeÇam o chamá· ta de 'Senhora do Canceic:ôo AparecIda'.

°
1733 o 17~O - Nene perlada cutto se torna mais inten$o e o
oratório passa a ser freqiienlodo por muilas pessoos. Numa noite de
sábado, duran'. o conlo do terco e das kJdolnhCll, aconteceu o
'milagre das velas'. Duol velas que ardiam no altar da imagell'l
opogcnom-~e inesperadamenle. emboro a noile estivesse colmo e
Mreno, e acenderam-", sozinhas, quando a dona do 4;aso, Silvano do
Rocho, procurava acendi-Ias. O falo cauou profundo imprelSi:io no.
prelenle. e o noflcia do milagre se espolhou pela redondeza. E.po _
Iho.l. o devoção e muitos sôo as que invocam o inlercessão do Senhora
do ConceleSo Aparecido. A 'orno do pequeno imagem, venerodo no
copelinho I\lnto do estrado do I'oguoc;u, chego olé 05 reviões fIKIi.
afostadol de Mlnol. Goills, Cuiobá, Cc:unpos de (urilibCl e de Viamão
do Sul do poh.

APROVAÇAO DO CULTO E CONSTRUÇ.lO DA PRIMEIRA IGREJA

A Paróquia d. SlOnto Antônio de Guaralinguelâ, como lodo Q


região lul do POli, pertencia à Diocese do Rio de Janeiro, lufrogâneo
da Arcebispo da Bahia. Desde 1725, ocupava o cargo de vigário o
Pe. José Alvef Vilella. Como p6roco, acompanhou o desenvolvimento
da dev04;60 a NOllo Senhora Aparecido e aprovou a construção duma
capelinha paro lubs.lluir o primitivo oratório. Anos depoil, tornando ••e
insufidenle 10 capelinha poro acolher OI peregrinos. o Pe . Vilel1a resol-
veu conllruir umo igreja e poro isso escolheu o lerreno do 'Morro do,
Coqueiros'. Pelo ano de 1741, iniciou com a ajudo dos devotos a
canllrução do te...,plo.
17.3 _ O Pe. JOlé Alves Vilello elabora ",m relolório sobre OI
fOlol elllroordinÓria. oconlecidos lunto do Imogem; redigiu o pedida
de aprovoçCio do culto da Imagem lob o novo litulo de Aparecido e da
con"",cêio do Igrela e o enviou à Vila de Ribeirão do Carmo - hoje
cidade de Mariana, em Minas Gerais. Na ouuião, o bispo do Rio de
Janeiro le encontrava naquela cidade em Visita POllaral.
1743 _ A 5 de maio, Dom Frei João do CrUI:, bispo do Rio de
Jon.iro, concede a Provi.ão oprovando o c",lta e (I conllr""õo do
igrela.
1743 - A 22 de moia, Dom Frei Joõo da Cruz, concede 00 Vigório
do Varo. Pe. JOI\\ Alve. Vilel1o. o Provisão poro benzer a nova Igreja.
- 133 -
46 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS~ 229/ 1985

17404 - A 6 de maio, a viUvo 0 1 Margarida Nun es Rangel passou


a eluilur.a de doação do terreno do 'Morro do Cruzeiro', onde eslavo
sendo construido a Igreja, Esta gleba e (lulros duas adjocenfes, doadas
na mesma época, respectiyomente por Fabiano femClf'lde, TeUe$ e
lourento de SiI, formaram o pa.rima nio do novo Capela e d era",
origem 00 povoado de Aparecido.

17045 - A 18 d e julho, o Pc. Vilella lama poss e judicial dos lerras


doados pora c patrimônio par lenlento prof.rida pe lo Juiz Ordinário
da Vikl de Guarotingueló, Salvador do Molla Paes.

17045 - A 26 de julho, feslo da Senhora Santana, o Pe. José


Alves Vilella benze e inauguro solone mente a novo Igrelo e o povoado
que nasce u ao seu redor.

A 'mogem que foi coloceda n(l nicho daquela igre ja, era a mesmo
que linho lido enconlreda pelos pescodores no no 'eroíba em 171 7,
tonforme tonsto do in.... n.ilrio do Capela de 1750, e é o mesma que
se venero hoje na BaslliGO. Troto·se duma pequl!!no e orlistica imagem
de Nona Senhora do Conteitão (mede 36 em. de altural, moldado
em borro paulista pelo monge corioco Frei Agostinho de Jesus, pe lo
ono de 1650, quando I".,idio em São 'Gula. Era polictomoda, coroc·
teríSlica eslo que p erdeu 0 0 pennonecer por longos onos sob OI 69UO"
do rio. Posleriormenle, pelo falo de ficar elllposlo 00 lume dOJ cano
dieiros e yela$, adquiriu o cor castanho britllonle. que con$erva 016
hoio,

Desde 05 primeiros tempos do deyocão a tmogem fa.i ornado com


mania e coroa pe los seus devotol.

_ No dia 26 de julho O poyoodo recebeu o nome do 'Capela


do Aparecido'.

- A prill1Ín.... o igreio foi construIdo do taipa d . pilõa (borro


locodo e modeiro). 'o~,ui nave ~...,t rot e duos lolerois CQm tribunos,
sacristia, quartol dOI milagr., e uma torre~.

Como se vê, o segundo relato direre prorundamente do de


A . P .R. Aliás, convém observar que infe lizmente o pastor
Anibal tem sido Inescrupuloso e desonesto em suas publicacõcs.
Já em PR 192/1975. p p. 537-542 foi comprovada a falsifica·
cão de uma earta atribuída ao Cardeal D. Agnelo Rossi por
A .P .R. Com efeito; o cJornal Batista, de 19 a 23 de janeiro
de 1972 publicou, a ped.ldo do pastor Anibal, uma missiva dita

-134 -
cA SENHORA APAREClDA~

«do Cardeal Rossi" então Prefeito da S. Congregação para


a Evangelização dos Povos em Roma, ao Cardeal Paulo Eva·
risto Arnso arcebispo de São Paulo: nesse texto aquele prelado
admoesta o arcebispo de São Paulo a que se acautele contra a
ação emlssionârlu do pastor Anlbal Pereira Reis; este seria
«um dos sacerdotes mais cultos do Braslb, dotado de ..enonne
capacidade de trabalho». Diz mais o texto dessa pscudo-carta:
cOs seus livros, além de suas pregocões. vêm eaus(lndo -enormes
dificuldades paro 05 nonos planos aí no Breuil ... Se nós o perdemos.
o que foi eno,me prejulzo, agora é nec;euõrio bGrrar-lhc G impeluOli-
doele . . . O podre Anibol 6 o $Gcerdole que atuolmente ....ois causo
preocupoCÕCI o Paulo VI. Monde-me lempre noticiai, bem como re-
cortei inle'8nanle. de jornoi. e rO'liltal , .

Essa pretensa carta, em última análise, constitui uma


clouvacãoJ à pessoa do pastor Anlbal Reis e uma recomenda-
ção publldtária e comercial dos livros do mesmo; o pastor
quis fazer sua promoçio própria e angariar novos lucros para
si, alem de desfigurar a S. Igreja Católica. Aliás, o Sr. Anl-
bal não perde ocasião de fazer -elogios e publicidade de suas
obras em capas de livros, roda·pós, cantos de página dos escri-
tos que ele possa atingir. Como se vê, em janeiro de 1972
chegou mesmo a forjar um documento ameaçador, de lingua-
gem vulgar, atribuindo-o a uma figura eminente da Igreja Ca-
tólica, ou seja, ao Cardeal Rossi.
E como se prova que forjou?
o Cardeal D. Agnelo Rossi, em Roma, sabedor da fraude,
escreveu para o .. Jornal Batista _ um artigo acompanhado de
missiva datada de 05/02/1972, em que denunciava a falsl·
dade do dito documento e pedia fosse essa denúncia publicada
com o mesmo destaque e no mesmo local do .. Jornal Batista »
confonne a ética profissional. Eis como o Cardeal Agnelo
Rossi descreve 8 obra do falsário:
«Afirmei qUtl o fahificacõo do documento é grosseiro. Foriaram
um papel oficio I, que nunca poderio existi, em no.~o Congr-egoç60.
Poil o e.cudo ~ do Papa Pauto VI e nCio do nono Congregação. O
título ~ anac,ônico, de antes do Voticona 11 . O documento publicado
não é "rotocolodo, o que ê obs.olutamente necenório poro indicor
lUa oute"licidode e validade. Não observa ( I praXe do Cúric quanlo
ao modo d. indiGOr a d.,tínGlério e q\Jonlo à co.!clusêio. Reproduz'
uma assinolura minha, anterior ao meu cardinClICllo e à minha índicac;ão

-135 -
48 ..PERGUNTE E RESPONDEREMOS .. 229/1985

<omo Prefeito do S. Congregaçõo para a Evongeliz(lCõo dos Povos.


Fotogra'ou·.sc umCl minha ossinatura I sic t Agnelo Rossi I. quando hoie,
nos doc:umenfOi oficio i" assino, grocas à I,Iniveualidade de minha
miuão na '9reja, sem a CTUZ antecedendo meu nome, com estes dizerel;
Agnelo Cord. loui, Pref. Colocaram o 101 a ssinalura abobo de uma
corto que, pe lo edilo e conleüdo, nunca poderia escte\lor. Infeliz
mgnobto~1

o artJgo e a carta de D. AgnelQ Rossi foram realmente


publicados pelo «Jornal Batista. aos 5/03/1972. p. 1. com o
titulo «Grosseira ralslflcação de documento da CUria Romana. ,
Quem examina atentamente a pretensa carta de D. Ag-
nelo Rossi ao Cardeal Arns. verifica que A. P . R. fez monto-
gem artificial de papel de cartas com seu timbre e com a assi-
natura do Cardeal Rossi. Este fato bem demonstra o maquia-
velismo de A .P .R .• para quem a mentira e a fraude são usuais
desde que sirvam para denegrir a S. Igreja de Jesus Cristo.
Pergunta-se: são o zelo do Reino de Deus e o amor a Jesus
Cristo que inspiram a A .P .R. a desonestidade e a calúnia?
Procura A.P.R. servir ao Evangelho ou extravasar seus sen-
timentos de ódio e ingratidão sob o verniz de pregar o Evan-
gelho?
Passemos agora a outra consideracão sugerida pela lei-
tura do livro de A . P .R. sobre Aparecida.

4. Santuários: que sentido tim?


1. A realidade dos santuarios tem seu fundamento na
própria S. Escritura : são templos ou monumentos construidos
para recordar aos fiéis uma especial intervenção da ProvIdên-
cia ou da Misericórdia de Deus na história dos homens. O
santuário é como que um. ponto de encontro marcado. em que
Deus se quer fazer presente de maneira mais sensivel para
atender às ne<:ef!Sldades dos homens.
Assim o Antigo Testamento relata as aparições do Se-
nhor Deus ou as teofanlas a Abraão em Slquêm (cf. Cn 12.6s),
em Mambré (cf. Cn 18.1); a Isaque. em Bersabéia (cf. Cn
26,24): a Jacó em Betel (d. Gn 28.12; 35.9), em Peniel (cf.
32,31). Notemos também os lugares santos de Oira (cf, Jz
6,24), Sarna (cr. Jz 13,19s), SUo (cf. Jz 21,19); GAlgaIs (cl.
-136 -
cA SENHORA APARECIDA' 49

1Sm 11,151, DA (el. lRs 12,29), Jerusalém (cf. 25m 6; 1Rs


5-8). .. Em conseqüência, foram em tais lugares erigidos san-
tuários, com seus a ltares (d. Gn 12,7s; 13.4; 26,25; 33,20).
seus r itos sagrados (cf. Gn 12,8; 13,4; 21,33; 33,201. com unções
de óleo (d. Gn 28.18; 35,14l. com purificações (cf. Gn 35,2-4l.
com o dizimo (cf. Gn 14,20: 28,22).

Os santuários suscitaram peregrinações, sendo a mais im-


portante a que se dirigia a Jerusalém. cidade santa por exce-
lência (cf. lRs 12,Z7). Jesus subiu a Jerusalém com Maria e
Jose aos doze anos de idade (cf, Lc 2,41s) e em ocasiões pos-
teriores (cf. Jo 2,13j 5,1; 7,14: 10.22s; 12,12). O próprio São
Paulo, vinte e cinco anos depois da Ascensão do Senhor, quis
peregrinar a Jerusalém para a festa de Pentecostes (cf.
A! 20,16; 24,111.
A Tradicão crlstã continuou a cultuar os santuários.
Escolheu para tanto OS lugares santos em que o Senhor Jesus
ou o. Providência Divina se tivessem manifestado mais sensivel-
mente : assim desde remota antigüidade a Terra Santa. Roma.
as cidades da Grécia. da ÁSia Menor, a de CompostelJa (na
Espanha), a de Tours (na GAUa) ... foram términos de peregri-
nações de fiéis que procuravam com fervor especial a . Face de
Deus» e um sina) do. suo. misericórdia.

Nos últimos tempos têm sido venerados com grande ênfase


os santuArios marianos: existem em Lourdes, Fátima, La Salctte,
Aparecida. Lujan, Guadalupe... Pode-se dizer que cada pais
católico possui um ou mais santuários dedicados a · Nossa
Senhora. ~ teologicamente legitima a devoção dos (Jéls que se
exprime em oração e penitCncia nesses lugares sagrados. A fé
é ai corroborada, especialmente quando graças de maior vuUo
são ai obtidas: Deus quer que os homens tenham a ocasião de
se revigorar espiritualmente (e também fisicamente) mediante
tais sinais. O episcopado latino-americano, reunido em Puebla
(México) no ano de 1980, reafirmou o significado teológico e o
valor dos santuários:
. Em nOIlOI povos, o EvonOelho tem sido onunciodo, apresentando
lO Virgem MarIo c:omo lUa reolizoçêio moi, oho. Desde 0$ prim6rdiol -
Clm lUa opariçõo e invoc:ocão de Guadolupo - MorilO lor"ou·{o o
grande sinal, de roslo malerno e mile,icordioso, do proximidade do
Pai e de Cristo com que elo nos canvido o entrar em c;omunhõo. Mario'
foi tombltm o voz quo deu Impulso õ união dOI homens e dos pOV01.

-137-
50 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS. 229/ 1985

Como ~m Guodolupe, os outros sontuórios marianos do conlinente são


sinais do enconlro do fé da Igreja com a história lalino.cmericono:»
IOP n' 2821.

2 . Compreende-se que, junto aos santuários, se tenha


estabelecido um certo comercio : de um lado, é preciso que haja
Quem provld@ncieasubsistênciatíslca dos peregrinos. oferecendo
pousada, aUmentatão, medicamentos . . . Doutro lado, os pere-
grinos são geralmente desejosos de levar para casa uma lemo
branca do santuário visitado (terço, crucifixo, medalha. outros
'Objetos . . . ). Este atendimento, l~ítlmo e necessArio, pode dar
ocasião a abusos e a Indébita comercialização. Esta, em parte,
é inevitável, pois a autoridade eclesiástica não pode controlar
nem coibir o que se faca de menos reto nas proximidades dos
6al1tuários. Na medida, porém, em que a responsabilidade de
tais abusos possa recair sobre membros da Igreja, os prelados
têm procurado extinguir estes males, abolindo dos santuãrlos
toda forma de comércio explorador. t: o qUe recomendavam
ainda em Puebla os bispos Jatino-amerkanos:
COI "r andes desafiol que a piedode populor leyonta pora o fim
do millnio nc América Latino, configuram as seguintes tarefas
pallorois.

cJ Adiantar uma crescente e planificado transformação de


nouo, fonluórios para que possam IItr 'lugares privilegiados' (João
Paulo li, Homilio Zopopan 5} de eYongeli~açõo. lua requer purificá-los
de todo tipo de manipuloçõa e de ot jYidodes comerciais. Umo tar.'o
especial <obe 001 santuários nacionois. limbolO$ da interoçõa do fá
com o hI.IÓrio de nossol pOYOI:. (OP n' 460.A63} .
A. p , R. refere episódios de comercialização por parte de
clérigos nos santuãrios católicos. - Não podemos negar de
antemão a ocorrência de tais dados; mas devemos Igualmente
realçar o fatt) de que A. P. R. perdeu sua crediblUdade junto aos
leitores por ser comprovadamente um falsário e rOrjador de
mentiras.
Diz o adágio: cAbusus nOR tolllt uswn, O abuso não extin-
gue o uso.. Coibam-se, pois, os abusos ocorridos nos santuãrios,
mas não se extinga na Igreja a prática biblica e cristã de pere-
grinar aos lugares santos em testemunho de fé e devoção; o
Senhor Deus mesmo parece ter a iniciativa de romentar tal tipo
de piedade.
-138 _
4.A SENHORA APARECIDA~

3. As revelações atribuídas ao Senhor Jesus ou aos seus


santos em aparições particulares não se impõem aos fiéis cató-
licos como artigos de tê. O que quer dizer: se alguém não Jtles
quer dar crédito, não estil, em consciência, obrigado a faze-Io.
Aliás. o teor de tais revelações nunca acrescenta algo de novo
aos doze artigos do Credo Apostólico; gemlmente consiste em
exortação à oração e à penitência; trata-se de apelos à conversão.
O Concilio do Vaticano o reafirmou explicitamente:

cA dispensa(ão ,rillií do or(l(a. como aliança nova e definitivo,


jamais passaró. Nõo há .q ue espetar alguma revelação público antes
do glorio$CI manife5taçõa de Nosso Senhor Jesus Cristo (d. ITm 6, 14;
TI 2,131 » (Constituição Dei Verbvm nt "I.

De passagem seja dito: revelação pública é aquela que se


impõe a todos os fiéis; revelação particular, a que só obriga a
quem tenha a evidência de que Deus falou em tal caso.

Sendo assim, não hã que perguntar se os Papas aprovaram


os fatos e as mensagens relacionados com GuaraUnguetá ou
Aparecida do Norte. Nunca haverá uma Bula Pontificia que
insinue, da parte da Igreja, a oficialização de alguma revelação
particular. Dai a Inoportunidade das palavras de A. P. R.:
cDesafio a qualquer padre de Aparecida a que me apresente
um documento <lo pontifice romano pelo qual haja se pronun-
ciado sobre a autenticKlade dos acontecimentos prodigiosos que
divulgam entre o povo_ (op. cit., p. 32).

Nessa mesma pãgina. o pastor AnibaJ cita o autor destas


linhas, dizendo: ",Católico! ... Use sua cabeça para raciocinar
e não vá no conto do vigário! O próprio monge Estêvão
Bettencourt declara em PR 71/1963. quo 5, que aquilo tudo
não é maMrla de fé. Ele não crê! Nem o papa nem os padres
prestam fê aos seus relatos sobre 8 Senhora Aparecida ,;! (p.32).

Eis uma nova faceta do pastor Aníbal: parece que pretende


ter o dom da cardiognosia ou do conhecimento dos coraçóes.
Ele sabe o que os outros créem ou não crêem no intimo dos seus
corações!? _:E:: certo que, ao dizer que as revelações particula-
res não constituem matêrla de fê, eu não queria em ab90luto
negar a hlstoricidade dos falos ocorridos em Aparecida, Lourdes
ou Fátima; creio nas intervenCôes de Deus (que fola por seu:;
santos), ordinârias e extraordinárias, na história dos homens.

-139 -
52 cPERCUN'l'E E RESPONDEREMOSt 229/ 1985

Realmente, ao nos defrontarmos com A. P. R., estamos


diante de um inte rlocutor que ou não entende da matéria de
que trata, ou, se ent-ende, usa de muita má f é,

Ainda convem realcar muIto enfaticamente que a aparição


da SS. Virgem ao indio Juan Diego em Guadalupe (México) no
ano de 1531 parece fato comprovado por milagre. Com eleito,
a imagem do Virgem revela, em seus olhos, pormenores que
nenhum pintor terá jamais efetuado, por mais fina e esmerada
que fosse a sua arte; trata-se de fato totalmente inexplicável à
luz da ciência. A propósito d. PR 262/1982, pp. 208-212.

S, Jesus Cristo, o Único Mediador

Uma das objeções levantadas por A. P. R., como também


outros escritores protestantes 1, contra a devQCão mariana supõe
que o culto dedicado a Maria S5. derrogue à unicidade da me-
diação de J esus Cristo: haveria, no lado de Cristo Sacerdote,
uma Mediadora -oque se opõcã doutrina bíblica (cf. lTrn 2,5).

Tal dificuldade é de pronta soluCão. O catolicismo professa


a singularidade do sacerdócio de Jesus Cristo. Por Isto consi-
dera que Maria foi remida pelo único Salvador Jesus; assim
resgatada, ela pôde I'I8s~r sem a mancha original; oS mêritos
de Cristo lhe Coram aplicados antecipadamente, de modo que
ela Col concebida sem o pecado de Adão; ela é imaculada em
sua conceição.

Dito isto, ainda observamos que Maria faz parte da comu-


nhão dos santos ; é o membro ma is exrolente e digno dessa
comunhão; por Isto, ela tem um poder de inte~são que é
especialmente gracioso junto a Deus; Maria não salva; SÓ Jesus
Cristo nos salva, mns, como Mãe de Deus Ceito homem e Mãe
de todos OS homens (cf. Jo 19,25-27', ela está particularmente
vinculada à salvação da humanidade mediante as suas preces
no céu.

1 Refellmo-nos equl especialmente eo jornal Utllmalo n.. 156-15&


(julho, agOll0, M1embro de 1984) , que b pp. 16011 traz um Inlellz 1lr1lgo
do Augusto Gotaldelo Intltlllado "Mallanlsmo". Tais p6glnas vêm a 8er 11111
ate.tado de tgnolancla do al.llOI em lot8 ..lo !li teologia cal611ca, que ele
Impugna 18m a conhecer.

-140-
cA SENHORA APARECIDA» 53
------~~~~====-------
A consciência de que os amigos de Deus intercedem na
outra vida por seus Irmãos militantes na terra, existia lá no
povo judeu anterior a Cristo; está na Unha do desabrochamento
da Revelação feita a Israel. Com efeito i em 2Mc 15,13-16
aparece a Judas Macabeu o falecido profeta Jeremias, que lhe
É apresentado por Onlas, Sumo Sacerdole também falecido,
como cO amigo dos seus lnnãos, aquele que muito reza pelo povo
e pat· toda a Cidade :santa, J eremias, o pt'Ofetu. de Deus». - Na
veroade, a morte não interrompe a comunhão ou a solidariedade
existente entre os membros do povo de Deus; o Senhor revela
aos fiêis, na vida pOsluma, as necessidades e as preces de seus
irmãos na terra, de modo que aqueles participam dos nossos
t'ertames mediante a sua intercessão.
Eis por que é licito e oportuno invocar a santa Mãe de
Deus, especialmente nos santuãrios em que ela, por vontade de
Deus, tenha assinalado sensivelmente a sua bondade materna.
Quanto aos milagres obtidos em Aparecida ou alhures. a
Igreja não faz questão de os definll" como tais. As autoridades
eclesiásticas só reconhecem a existência de um milagl'e depois
de rigorosos exames científicos e leolõgicos, durante oS quais
intel'Vém um cadvogado do diabo, (para dissuadir da realidade
do mUagre) .

6. O celibato socerdotal
No final do seu opúsculo, A. P. R. impugna o celibato sacer-
dotal, recorrendo a sofismas e razões po.uco persuasivas, para
as quais se encontra. resposta num dos últimos númel'OS de
PR; cf. fi' Z76f 1984. pp. 368-386.
Todavia o autor menciona o texto de 1Tm 3,2, em que o
Apóstolo exorta: clt preciso que o eplscop> seja irreproensivel,
eSpOSO de uma única mulher.. Seria este um argumento em
prol do easamento obrigatório dos clérigos? _ Não; pelo
contr-ãrlo. O Apóstolo, em 66, se dirige a uma comunidade
chamada à fé em Idade adulta; Os cristãos aí abracaram o Evan-
gelho geralmente depois de casados. Diz então São Paulo Q.ue
o epíscopo 1 deve ser escolhido entre os homens que só tenham

I Epllcopo • o membfC de um colegiado que, sob o pastoreio supremo


do Apóslclo. governe e comunidade. Tat ere • orgenlzeçio d.. Igrel"
locais enquanto viviam OI ApóslolOI.

-141-
54 cPERGUIDE E RESPONDEREMOS. 229/1985

um casamento, ficando excluídos os que tivessem duas uniões


conjugais simultâneas ou sucessivas, Vê-se, pois, que, longe de
incitar ao casamento, São Paulo tenciona assim restringir a
a liança matrimonial dos clérigos; dir·se·ia que se tem a1 uma
primeira manifestação da tendência ao celi.bato sacerdotal que
mais e mais se patentearia no decorrer dos tempos.
A. P. R. cita outrossim lTm 4,1-3: .0 Espírito diz expres-
snmente que nos últimos tempos alguns renegarão a fé ...
Proibirão o casamento, exigirão a abstinência de certos alimen-
tos. . .• Também este texto estA longe de contradizer à prática
do celibato e à legislação do. Igreja. Na verdade, o Apóstolo tem
em vista certos pregadores dualistas, arautos da pré-gnose, que
julgavam a matéria como algo de mau e, por Isto, repudiavam
o consórcio marital. Ora o exercido do celibato nada tem que
ver cem dualismo; ele se deriva, antes, das premissas estabele-
cidas pejo Apóstolo em lCor 7, onde está dito que .casar-se é
santo, mas não se casar ainda é mais santo e recomendáveb
(cf. lCor 7, 25-35), pois o cristão tende já na vida presente a
usufruir, ao máximo, dos bens definitivos que Irromperam no
mundo por ocasião da vinda de Cristo; ora tal fruição é grande.
mente favorecida pela vida una ou indivisa que é o celibato.
Multas outras observaÇÕCS; poderiam ser feitas a respeito
do opúsculo do pastor Aníbal. Todavia as que até aqui foram
propostas. evidenciam mais uma vez que o autor é desonesto e
fraudulento em seus dizeres, não hesitando em deturpar a ver-
dade e a realidade para favorecer a sua causa. Ora tal autor
perde crédito junto ao públiCO c se desclassifica por si mesmo.
Resta pedir ao Senhor Jesus que o ilumine para que reveja a
sua vida e se reconcilie com O Salvador e sua Santa Igreja!
Á guislI de bibUoorallll, dl.mos

o Sa,,''''rlo NaclClnllI cfe Nona senhora Aparecida: Co"'e!l1lO. "'enNgem,


pralls pastoral. Aparecida 1977.
Pe. Julio Joio Bruslolinl, Aparecida: aUII Imagem, nu ..ntulrto.
Aparedda 1980.

Pe. Mechado. Aparecida na "16rI• • na m.,.I.ra. U"'o I: H.l4f!a da


Padra. .... do Bra"!. A imagem •• N cullo a ..u .. "tu'rlo. Ed. do Aulor 1983,
campinas SP.

- 142-
A reencamaç.to mil. uma 'feZ:

"Minhas Vidas"
por Shlrl.y Macl.alne

Em .In.... : o livro em loco narra ai etapas da vida di atriz norta·


-Im,ulcena Shlrley MacLalne, qLle, após os qu"enta anos do Idade, passou
• 'reqQonlar famosos madlLlns. IInalmante aderiLl à doulrln. da raal\Cl.rnaç8o:
leria vivido duas existências terrestres como homem e "ma como mLllher ..•
A lese da reencarnaçl0, lottemente ILlg4lrida paio anredo do Wvro, •
mel lundamantada pela aulora. Esta I aceitou sem Mp/rllo critico li lI8nI
discernimento, porque est.va unsada do maler.llsme hedonllla e fUI!! am
que vivia. Impresslonaram·na anllo as mensagens de medluns, qua prete,...·
mente falavam em fM)me de espirllos desencafnados. Na vardade, nAo hâ
provas de reanea,naçAo; todos os enredOI da vida preg,e... que alo men·
clonados como argLlmentos pro-foencarnaçao, nlo passam de comblnaÇl)a.
da dados hi&tórleos colhidos paio próprio individuo na 'l/lda presente. A
desigualdade de sorles nAo SI9""1co qLle eslejamos alualmenle pagando
pecados de exlsllllelu .nlerlores; a deslgLlllldade é assaz ralallva: ademal.
nIo " podtrn alerlr o' valores da vida da uma pessoa conlando os bens
malerlals (dinheiro, .aude ,.,k;.,
alg .... m 1116 no lar. e nlo no tar.
vida longa . .. ) que lem; oi!. grandeza de

O livro pode impressionar por seu estilo vivaz, mas • pobre ern .rgu·
manlos a nIo reslsla a um a!lama clenl/nco pslcológlco e parapsicológico.

• • •
A atriz norte· americana Shlrlcy Mnc Lalnc, célcbre no
cinema, no teatro, e na televisão, (! também autora de alguns
livros, entre os quais se tomou famoso no Brasil Out. 00 8- 11mb,
traduzido para o português com o titulo «Minhas vidas:. I. Esta
obra parece ser um testemunho muito eloqüente em favor da
doutrina da reencarnação, pelo que tem impressionado os lei-
tores. Em vista disto, apresentaremos. a. seguir, breve comen·
tário do livro e de suas teses.

1 Editora Rec:ord, Rio de Janeiro. 14() X 210 mm. 317 pp.

- 143-
56 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS. 229/1985

1. O conteúdo da obra
Shirley MacLaine nasceu e foi criada no Estndo de Vlr-
clnio. (E . U .A.). Iniciou 8 carreira como dan;:arina c cantora
na Broadway; fez a transicão para o cinema. ondc se celcbri-
20U por diversos filmes.

Levava vida leviana e despreocupada de assuntos religio-


sos, quando, aos quarenta e poucos anos, foi influenciada por
um amigo, David. que era adepto de crencas hinduistas e
reencarnac:ionistas. Viajou por diversos paises à procura de
médiuns famosos, que a Induziram a admitir que estava reencar-
nada após série de encarnações anteriores; era certo que jã
vivera duas vezes em corpo de homem e uma em corpo de
mulher (p. 175) ... Em encarnação anterior conhecera Gerry,
bomem casado com Que se divertia na vida presente, . .. esse
GerI')' que numa existência passada promovia intercâmbio cul-
tural com seres extraterrenos! Assim Shirley julga ter desco·
berto outros aspectos do seu cu e tomou-se convicta do reen·
camaclontsmo, que ela professa através das páginas do seu
livro.
Ao descrever suas peripécias, a autora se relere a fenô-
menos mediúnicos, pnntelsmo, a Igreja c reencarnaçlo . .. , pon-
tos estes que merecem atenção da parte do leitor.

2. Refletindo .. .

Abordaremos cinco pontos doutrinários.

2 .1. Espiritvgliwno pan,.rSla

Shlrley MacLaine passou do materialismo ao espiritua-


lismo panteísta. que não é senfio outra forma de materialismo,
pois identifica a Divindade com a alma humana e o mundo
materiaL O que ela descobriu de novo, é que a vida não ter-
mina com a dissolução do composto humano pela morte, mas
se prolonga no além.
Eis, porém, que o v~rdadelro espiritualismo não pode ser
pantelsta. 1: monotelsta, ou seja, professa que Deus é espírito
puro, transcendente em relação ao mundo e ao homem; não
- 144._
..MINHAS VIDAS. 57

se identifica com a alma humana nem com a matéria, nem estã


em evolução na história. mas é o Criador da alma humana
(a qual é espiritual) e do mundo material.
o panteísmo i.mplica foMe contradição ou incoerência, pois,
identi.ficando a Divindade e os seres materiais, identífica oAb·
soluto e o relativo, o Necess..i.rio e o contingente, o Eterno e o
temporal, o Infinito e o finito.
o panteismo no livro aparece clarnmcnle ou frases como
«Vo cê! Deus. voc=~ lab. que é Di.,irlo. Mas df:ve conlinllClmenle
lembrer lua Divindade. Ip. 1821.

f:. alma e De ul sao eternos e vnos .. . Svo olmo é umo metáfo ra


de Deuu- (p. 1651.
«Ao olmo é uma fOfCo subalômi«I, a energia inteligenhl' que
orgoniz:a a vida. E porle de cada célula, porle do OHA, est6 em n61,
, nós. tudo o que QIII.to, •• 6 (I quo chamamos Deus,. CP. 2831.
~ tão pouco lógico o panteísmo que. de vez em quando, os
panteístas proressnm proposicôcs monoteistas, como no caSo da
afirmar,ão: .0 homem é o Co·criador com Deus do cosmos'
(p. 165).
Se Deus e a alma humana são o próprio mundo. como
podem ser criadores do mundo em sentido próprio? Somente
no monotelsmo se salva o conceito de criação.

2 .2 . Reencamosáo
Pontelsmo e reencarna('ão acham-se geralmente ligados
entre sJ. Com efeito; se não há Deus distinto do homem. capaz
de dar ao homem a resposta a que este aspira, é o próprio
homem quem se salva ou se liberta das impurezas do pecado;
e, se nfio o consegue numa vida. tem que dispor de outras
vidas ou encarnações para tanto. Segundo a doutrina da reen·
carnação, é o homem quem se salva, e não Deus que salva o
homem.
1. Em favor da reencarnação. foram apresentados a
Shirley MacLnlnc 8TW1mentos como a desigualdade das sortes
humanas CP. 58) e o déJà. vu ou a Impressão de já tennos visto
lugares onde nunca estivemos (p. 97) . Ora tais argumentos
não resistem a uma critica serena.
- 145 -
58 «PERCUNTE E RESPONDEREMOS~ 229/l9&')

Com eCeito; a desigualdade de sortes se explica pelo Cato


mesmo de que toda criatura difere de qualqu.er outra; nem
se deve aferir o valor de uma vida humana ~)D. posse dOs bens
materiais (saúde fislc.a, dinheiro, carreira profissional . .. );
quem de alitUm modo é privado de tais bens, pode possuir valo-
res espirituais (grandeza de alma , generosidade, coragem . . _)
que as pessoas materialmente aquinhoad<ls nem sempre possuem .
De resto, o critério da grandeza de uma personalidade não
é o ~r (o que ela temL mas o ser (o que ela é) . Em últiml\
instância, só Deus pode avaliar o grau de felicidade c os valo-
res que tocam a cada ser humano. Além disto, numa pcrsPZC'-
tiva cristã o sofrer com Cristo é penhor de ressurreição c gló.
ria com Cristo (cf. 2Tm 2,11.13).
Pode-se ainda lembrar o seguinte: um fato comprovado
pela história é que muitos dos grandes homens do passado c
do presente nasceram de faroilias pobres e lutardrn contra a
falta de saúde; foi precisamente a luta que os engrandeceu.
Quanto ao argumento do «jã vJsto:., não prova a reali-
dade de existências ant eriores: ainda que nunca lenha estado
em algum lugar, pode alguém tl!r conhecido tal lugar por Coto-
grafias, pelo cinema, por descrições orais ou escritas . . _; pode
também ter conhecido lugar semelhante.
2 . Nem a S. Escritura nem a Tradição da Igreja admi-
tem a tese da reencarnação, apesar do que aCiona o livro em
pauta. O 51mbolo da fê professa ~a ressurreic:ão dos mortos:.:
vejam-se também os dizeres de São Paulo em lCor 15.20.24.
Houve, porém, nos séculos IVIV uma corrente de m ono
ges ditos corlgenlslns:. (dlsclpulos de Orígencs de Alexandria,
t 250), no Egito, na Palcsllna e na Si ria. que se inclinaram
para a tese da r~ncarnação Influenciados pelo platonismo.
Tal corrente foi condenada pelo Concilio de Constantinopla UI
(553), e não pelo de Nicéia, como aflnna o livro em pauta à
p. 160; cf. p. 205. Os monges orlgenistas não l"Cpresentam a
Tradição central da Igreja; levando vida muito retirada, entre-
gue ao trabalho manua l e à oração, eram pouco versados no
estudo e na teologia; admiravam Origenes principalmente por
causa dos seus escritos de aseética e mistica, disciplinas e m
Que o mestre mostrou realmente ter autoridade. Niio tendo.
porém, cabedal para distinguir entre proposições categóricas e
meras hipóteses do mestre, os orlgenistas professavam cega-
- 146 -
«AlINHAS VIOAS ~ 59

mente como dogma tudo o que liam nos escritos de Origenes;


pode-se mesmo diZer que eram tanto mais fanãUcos e buliçosos
quanto mais simples e ignorantes.
De rosto, a propósito d~ re«!ncarna(;ão c Cristianismo encon-
lram-se ulteriores considern(.'ÓeS em PR V15j1972, pp. 25-36;
210{1977, pp, 244-247,

2 .3 . Fenômenos d. ,"ediunidade
Shirley Ma.cLalnc foi induzida a consultar grandcl médiuns
nos E . V.A., na Suécia, na Peru, e ficou lmpl"eSSionada por
quanto lhe diziam ou cl"evelavam " em nome de pcl"Sonagens do
aJéom ou (espíritos-guias des:enearnados»_ Esses mMiuns assu-
miam feições estranhas e passavam a Calar em tom de voz dife-
rente, transmitindo 8 Shirley noticias de pretensns exlstênclllS
anteriores . . , Imprc.-ssionada pela fenomenologia, a atriz acre-
ditou Que se tratava realmente de mestres invisíveis que lhe
desvendavam o seu passado mais remoto.
O que se deu com Shirley dá-se com mui las pcsosas ainda
hoje: pouco preparadus do ponlo de vista religioso e psicológico,
eapituiam diante das sUI'plwndentes munireslações mediúnicas
e aceitam as respectivas mensagens. Aliás, há no ser humano
uma tendência espontãllea a recorrer a explicações religiosas,
mlslicas, csobl'Cnalurais" . , . todas as vezes que lhe ocorra um
fato insôlito, incxplieilvel â primeira vista ou misterioso; a falta
de entendimento leva a admitir a intervenção de um ser do
além, postulado para explicar o fato. Todavia o estudo da psi-
cologja e da parapsicologia em nossos dias demonstra sobeja·
mente que tais renômenos impressionanb!s c maravilhosos nada
têm que ver com mensagens do alêm, mas são s implesmente
manireslacõcs do psiqui!>mo dos respectivos m~ iuns. Com
(!feito, na mediunidade alguns fenômenos parapsicalôgicos se
exercem simultaneamente ou isoladamente:
_ pcrcel);i.'o. extr.I.~nsorlaJ, O ser humano é capaz de
apl'CC'ndcr a realidade por a lgum canal difcr~nte dos sentidos
(visão, audicão, tato ., . ) ; Isto é fato documentado por nume-
rosas experiências e estatistieas. Essa realidade pode estar
muito distante, de modo a se produzirem os fenômenos de Lele-
putia, telec:ogniÇlio, c1aI1vidência.
Não raro acontece que o inconsei~nte de uma pessoa lê o
que estA no inconsciente de outra pessoa; em conseqiiêneia, o
médium - sem saber como - diz no seu consulentc certas
-147 -
00 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS~ 229/1985

verdades que este não lhe reveJou Of'm tinha a intenção dc


revelar; o médium acerta de maneira espantosa não por comu-
niçação do al~m, mas porquc o seu inconsciente funciona sobre
o inconsciente do respectivo cliente.

o inconsclcnte também é capaz de guardar em seu depó-


sito noções captadas por alguém na infância ou em época dís·
tnnte. Nunca mais la pessoa se recorda do que assim adquiriu;
mas um belo dia pode faur uso de tais conhecimentos de modo
a surpreender aqueles que a acompanham; dizem então que
está sendo numlnada por um espírito do além. - e à luz desta
explicação que se deve entender a alegação, no livro, de q\le
uma médium n09 Andes, em estado de transe, escrevia em
lingua sânscrita CP. 294). Diante desta afirmação, é preciso:
1) averiguar se, de falo. tal pessoa usava o sânscrito ou sim·
plesmente uma escrita estranha que passava por sânscrito.
Havia, aO lado. quem soub~ sânscrito para controlar o que
a médium escrevia? 2) Caso realmente escrevesse sânscrito,
pode-se crer que tenha visto ou ouvido outrora algo de sãns·
cri to, que ela reprodUZia 8 partir do fundo do seu inconsdente.
A ciência parapsicológica explica o falar em llnguas estranhas
atribuído DOS médiuns, recorrendo ao potencial do Inconsciente.
Este é extremamente rico em dados e conhecimentos, como
também é poderoso para mover o comportamento do Individuo;
_ a psieogralia. ou escrita automática, citada à p. 294 do
livro. tambêm é enquadrada pela parapsicologia dentro das
faculdades do psiquismo humano. Resulta de: 1) associação
de idéias contidas no Inconscie nte do sujeito e trnzldas à
baIla pelo mesmo em estado de traflS(!-; 2} essa função pslf)uica
de evocar, associar e combinar idéias provoca a fun('âo física
da grafia ; com ercito, os nossos ntos psíquicos ma is Intlmos c
ocultos têm sempre rt!peN!ussão sobre o nosso físico, pois somos
pslcossomAtlcos. Em conSC!Qüência. o médium em estado de
transe traz l tona do seu psiquismo reminiscências de leituras.
com-crsas, Imagens, Que ele percebeu no passado; essas remi-
niscências suscUam o movimento da escrita automática corres-
pondente . . . Quem o vê. pode julgar que se trata de inspiracão
do além: todavia não está senão em presença de fenômeno psi-
cossomAtlco ocorrente na pessoa do mêdium;

_ teJe~ é outro fenômeno parapsicológico que costuma


suscitar explicacÕes cmisticas2I: os corpos se movem sem que
sejam Impulsionados por uma torça fisica visíveli não haveria
-148 -
..MINHAS VIDAS,. .,
então entidades do alêm movendo tais corpos? - Na verdade,
tais movimentos se explicam pela energia do psiquismo de
determinada pessoa envolvida no respectivo caso.

- Muito importante também é o poder da sugestão ou


do condicionamento de detcrmlnada pessoa. Se alguém acre·
dita que foi rainha ou cavaleiro ou escudeiro em outl'8. vida,
~ntlrá em si aquilo que uma ex-rainha, um ex-<:ava\eiro ou
um ex-escudeiro sentiria. Associarã idóias e imagens e experi-
mentará em si todas as conseqüências daquilo que Idealiza ou
imagina. JUlgará então que tem duas, três ou mais personali-
dades em si ou que estâ sendo clncorporado,. por uma entidade
do além _ expllcacÕCS estas sratultas OU mesmo alheias ao
esplrlto cientifico.

2 . .. . Igreja e Ciência

Mais de uma vez o livro em foco atribui i Igreja atitudes


contrérlas ao progresso da clêncla_ O desejo de dominar os
homens teria levado as autoridades ecleslilStiC8'S a imp'-'dlr o
desenvolvimento dos cstudos:

c A ciência sô 'ecentemente ... sente que se livrou dos grilhões


da superstkão religioso e esrá agora dedrutondo suo liberdode e era
6ur.a. A atilude é compreensivel. P~squisar eues dominiOI da Igreja,
a antiga carcereira da ciêncio, seria fl!conllituir a base de pode, da
algor. ontiga I! Iradicionol . Ip. 171; cf. p. 175).

A propósito convém observar:

1) Foi a [grc ja quem, nos séculos V[-X, atrav6s dos mos·


teiros e dos escolas episcopais, salvou das ruínas a cultura
cltu;slca e n tl'ansmitiu aos séculos posteriores.
2) Foi a Igreja Quem na Idade Média fundou as pli-
melras lJniversidades (Bolonha, Nâpoles, Paris, Ox(ol'd, , , ) e
as lomentou com todo o esmero.
3) Muitos homens da Igreja - clérigos c leigos - se
tomaram altamente beneméritos da ciencia: tenham-se em
vista Francis Bacon, Gregório Mendel. Ampôrc, Willhelm
SChmldt, Marlin Gusinde, Paul Schebesta, entre outros quase
incontável!.
-149 -
62 'PERGUNTE E RESPONDEREMOS, 229/1985

4) Em nossos dias a Igreja, entre outras pesquisas, Incen·


tiva o estudo do psiquismo humano, procurando a autêntica
explicação para fenômenos que, por serem insólitos ou miste-
riosos, durante séculos foram atribuidos ao a lém. A ré cotô-
lica aceita, sem duvida, a possibilidade de milagres; todavia sã
admite milagres desde que nenhuma explicação natural possa
.ser dada aos fenômenos extraordinários; sempre que a «:!iência,
devidamente fundamentada, elucide o mistério, a Igreja aceita
a explicação cJentifica.

Estas ponderações mostram que a Igreja está longe de ser


infensa à ciência, nem pretende sufocar os estudos em vista
de interesses mesquinhos..

Por isto também a Igreja se opõe 80 curandeirismo, ou


seja, ao processo de curas por recursos mágicos ou por pre-
tensa Intervenção dt) além provocada mediante ritos ou recei-
tas d nfallvels:t. Infelizmente o livro de Shlrley MacLalne su-
gere e favorece o curandeirismo (cf. pp. 121 .141) : esta posi-
ção não habilita a autora a defender a ciência prcteos8mentc
sufoc8da pela Igreja!

Uma aplicação concreta do espirito científico ocorre nos


casos de regressão hipnótica, tidos como argumentos em ravor
da reencarnação. Com eCelto; uma pessoa hipnotizada, diri-
gida por um perito, pode descrever C) enredo de sua vida . pre-
gressa., dizem os reencarnaclonlstas. O mais ra moso episódio
deste gênero foi o de Virginia Tighe, hipnotizada na década
de 1950 pelo banqueiro Morey Bernstcin nos Estados Unidos;
em transe hipnótico, Virginia contou o enredo de pretensa exis·
têncla no sêeulo passado vivida por ela na Irlanda, 'COm o nome
de Bridey Murphy ... Esse enredo impressionou vivamente a
quantos dele tomaram conhecimento, pelas múltiplas minúcias
de suas descri(,'Ões e pejo sotaque irlandês com que foi narrado.
Todavia sindicAnclas feitas a propósito mostraram que Virgf-
nla, quando jovem, namorava um rapaz cuja mãe era irlandesa:
indo à ctlS"a desta, ouvira da mesma, narrados com sotaque
irlandês, muitos epiSÓdios d a vida irlandesa dessa velha senhora;
assimilara essas narrações com particular atenção, visto que
uma certa carga afetiva a prendia à senhora Irlandesa e a
seu filho. Esquecera tais narrações até o momento em que,
posta em transe hipnótico e sujeIta às sugestões do hipnotiza-
dor, associou tais histórias em um enredo pessoal muito pró-
ximo à realidade da senhora Irlandesa, , " enredo este Que Vlr-
-150 -
. MINHAS VIDAS. 63

ginia apresentou como sendo o de sua prôpria vida pregressa,


visto que recebera o comando de narrar a sua pretensa exis-
têm:ia anterior. Uma v~ explicado racionalmente o caso de
cBridey Murphy. ou Virginia Tighe, desfez-se o mais impres-
sionante argumento em prol da reencarnação derivado das
regressões em idade.
Os casos de reg~ssão da memória que têm levado certas
pessoas a descrever sua vida cpregressa.., têm sido estudados
pela parapsicologia ; esta mostra que qualquer enredo de vida
anterJor a~ hoje apresentado se explica pela lIvre assoda~ão
de Impressões e Imagens colhidas pelo sujeito na própria vida
presente.

2 .:Ii . Habitantes de OIltrOl planetas

A fé católica nada tem a opor à hipâtese de que haja


outros planetas habitados por criaturas Inteligentes. Deus pode
muito bem ter feito diversos seres racionais que exprimam, a
seu modo, o louvor do Criador no vasto cosmos.
Todavia a Igreja é sóbria diante desta perspectiva, como
sóbria é a ciência. Até hoje não se descobriram, de maneira
comprovada, habitantes de outros planetas. Também se sabe
que não há no nosso sistema solar condições propicias ao surto
e à manutenção da vida. Cf. pp. 90-99 deste fascículo.

Os adeptos da reencarnação costumam professar eom


#grande ênfaSé a existência de habitantes em outros planetas;
seriam esplritos desencarnados, Que se comunicariam com os
terrenos mediante processos mediúnicos. Tal tese e gratuita.
ou seja, destltulda de qualquer fundamento cientifico, baseada
antes em premissas cmlsticab. Não se diga que as pâglnas
biblleas, especialmente as do profeta Ezequiel, atestam a pre·
sença de extraterrenos em nosso mundo (cf. pp. 183. 208) . A
Bíblia. sendo um livro artalco, há de ser lida dentro do con-
texto do pensamento e da lingülstlca dos antigos orientais;
recolocadas nesse ambiente, verlflca..se que as páginas sagradas
em absoluto não Insinuam nem a reencarnação nem a exis·
tência de seres extraterrenos.

-151_
Ainda • qUMtlo çandenle:

o Testemunho do "Rei do Aborto"


Em .:I,.....: o DI'. Bemarel Natltan.on dlltlngulu-u, no Estado ele
Nova Iorque, por lua cempanha e .sua prillce abortlstal. Após reallur cerça
de 5.000 abortos, foi, por c1rcunstlnclal \/Arlas, levado. estudar mais de
perto a Embrlofollla e I ~,rnatologll: tomou enllo conhecimento preciso da
v\cU; do feto no 1010 matemo e verlllcou que I ocrlio de lal .e, é homlcldla
eomaUclo contra criatura Indefesa. Re.olveu onllo abandon., I lua prAtica
abon1tta, nlo por motivos rellg~1 (pois Nelhanson nlo profe.... crenças
religiosas), mas unicamente por ruGes clantlllcu. O. pormenotOl dessa
ptripkll do rel.t.dos pelo próprio m6dlco no segmento d. conf.rénc"
que vai InlnacrUo noslas !)tglnas, Tlm O valor de um depoimento objetivo
o experimentai, iIldaptlnlJenle dO poe.lçOea rerlgloaes,

•••
o tema «aborto. «Intinua candente. Após ter publicado
artigos de ordem médica e fllosófico--religiosa sobre o assunto
<cf., entre os ültimos, PR 274/1984, pp. 205·218), PR publica
hoje parte do texto de uma conferêncJa do Dr. Bernard Nathan·
5On, que em Nova Iorque se celebrizou como líder de campanha
e de prática abortistas, merecendo a alcunha de «Rei do aborto •.
Este médico, após ter realizado cerca de 5 ,000 abortos, resolveu
abandonar tal prática par razões de ordem cientlfica. O seu tes·
temunho e reprodU1ido nas páginas que se seguem. com o peso
dI! provir de um dentista não religioso, que se deixou mover
ulÚcamente por conclusões de ordem biológica e médica.

COM A PALAVRA. o MIEDICO . •.


. -- ~

Meu int.resse pelo oborto começou no início de ... inho pouogem


pala Foculdade da Medicino, por oCQilõo da experiência de ter uma
ClIII190 que ficou arávida. NOCfU.'a ipooa era quole impassível con·
.egui, realiJ:or um aborto. Finalmente alcançamol o objetivo, porém
o individuo que o reaUzoLl era um charlatão, que por pouco não o
molou. Depoi,. legulrom ose a~gun. anos de prática em obileltldo e
glnocoloalo _ oito ano" pera ler e!loto. Foi, anlõo qu~. ~e,p_er.tou
." _.,.,.~.....~
-152-
TESTEMUNHO 00 (REI 00 ABORTO~

em mim uma grande sensibilidade para com a siluae;õo peno!l.o daquelas


mulheres que 10 expunham a lesõel gravei, e mesmo à martle, nos
aborlol praticados dondestinomente, No periodo sc-guinle, de 1957
a 1967, exercondo jó o Medic;ina, me perluadi ainda mais de que era
rllIQuória mudor as leil que proibia", o abofla, por conside,ó. las
restritivo. e inlllllla•.

foi assim que, em 1968, orgoniu; um grupo chamado cAss()(ioçõo


NacIonal paro o Revogoçãa dai leis contra o Aborlo». Surpreendemos
nouol adversários dormindo. Nosso orilanlxação, que uniu lodol Of
forcas que havia enllio o fClvo, do aborto, elaboramos uma lérie de
tótica. poro nouo componha. Afirmamos 00 público que, devido 001
oborlos clandestino., morriam cada ano de 10 o 15 mil mulheres. Mas,
de falo, sobramos por noua. investigaç6e, que o número não era mais
do que 200 o 300. Inventamo. lamb6m lemas de grande persuaslío
• agressividade, como .A mulher lem direito 00 domlnio do seu pr6prio
corpo», .Ub.rdade d. e$Colha», cA conspiração coI61i"1:t e outros
.emelhontes.

Tivemos extroordinório Ixilo. Trobolhondo com recunos de 7 mil


o 8 mil dólores anuois, em dois anal I(lnçamos por terra a lei contra
(I aborto, no Estado de Novtt Iorque. Gracas a uma tramo de mentire;s

e a uma maquinoe;õa calculodo, conl~uimos ter, pela primeira vez


nos Estados Unidos, uma lei que permiti0 incondicionalmente a aborto.
Fizemos de Novo 10,quCl a capital do aborto no poli. enquan lo mCl,lS
colegas me apelidavam de crei do aborto».

Cloro que não nOI jul,gamos .atisfeitos simplesmente por ter


akancoda o de",iminação do aborta. Ambicionamos impulsionar IodO'
uma odio modça que permilinCl a qualquer mulher - tamb'm às
pobres _ conleguir um aborto baralo, rópido e $eguro. Fundemos "mo
clínico denominadtt «C."lro de Soúde Sexual e do Reproducão», um
eufemismo de grande efeito, e que, no fim de contai, se conyerleu nu",
molodOllro. Duronle o perlodo em qUe fui diretor da CUnica pratico.
ram-H: 60 mil oborlos, aproximadamente 120 por dia. Eu mesmo,
pessoolmente, reolixei cerca de 5 mil oborlOl, 00 longo de minha vida.

A Cllnic;o proporcionava uma '6<:ella de .5 mllhãe. de dólares


onuoil. o. foto, ero, então, a unico in.lituicão delse tipo. De 1970
o 1972 Gtralmos mulhere, da melode do. &tOldo. UnidOl, e jamais
voltaró o SU(;IIdor umo eJlperiinoll têio concentrada em um 16 pOfllo.
pais que, em 1973, a 'enlenco da Suprema Corte levantou os r.stricõ.s
ao aborla em todo. os filados.

-153
.. «PERGUNTE E RESPONDEREMOS. 229/ 1985

1 - Os progr4lUOs clentlficos me obriram os olho.

Em fins de 1972, renunciei ao coroo de diretor da Clinico, nóer


porque estiveue desenganado com o abono ou porque tive". sérios
duvldos. TInha f;ompromeuo s em demasia, estovo minando minhos
forcas e me sentia cansado. Quatro meses depois, p4ldirOM-me que
organizasse e dirigiue (I S.rvi('o d. Embriologia 41 Perinotologla do
Hospital d. SI. luke. um dos mall Importontes dI! Novo Iorque. perlen-
cenle à Universidade de Columblo, A unidade englobo OI disdplinol
",é dicos que estudam o dclo da vido, os hóbitos, (I psicologia, a
.ensibllidade4I (I fisiologia do feio. Esle novo tClmo do Medicina .urgia
,groço, à obtenção de certos 'ecnologias como o ullro-solll . o l111u"o-
qui mica, o marcador de carClcóa do feia e oulna técnicCls muito
complexas.

Tive, en150, OCOSIClO de enlror e m contato com euel pragreuCls,


Clue vierClm lIuminClr G campG elcurCl da vidCl do feio . Quando tira
estudanto de Medicina, na Universidade McGill do Canadó, c:ompuls6-
vamos um livro de texto conhecido como Willloms, hoie, um texto
cl6ulco em Medicina. A ediç60 de 19.47 que .. u u, .. i, era a oitavo,
.. tinha 22 p6gina$ dedicada, CIO feio, do lotai de 750 CI 800 páginal
que perfa:d am o livro. Atuolmenle se encontro em sua décimo sexto
edicõo, publicada em 1980, Apresenta 137 páginas sabre fisiologia
do feIo e outras 1~7 sobre diClgnóslico de enfermidCIdes embrlon6rios,
(I que constitui, aproximCldClmente, uma lerço parte do liwo, luo revelo

o Indiee de importância que odCluiriu o estudo do feto nOI úlll",ol oilo


oU de:z: anos, desde que se constituiu o ciência da Embriologia.

Quando comprovei com absolvlQ clQfeZQ, gracQI (I anos novas


técnicas, que o feio respiro, que dorme em ciclos de sono perfeitamente
definidos, que é $onslvel 001 lons - comprovoU'se que reo;e de dife-
rentes mGneiros ante diforonlos tipos de música - , li dor o a quaisquer
outros eSllmulOI que voc's e eu possamo, perceber, ficou comprovodo
poro mi", de meneira irtoculável que o foto é um de n61, de noua
comunidade, que é uma vida, umo vida que deve ler protegida ,

E melmo mulheres gr6",idel, deçididOI a abortar, submetendo-se


CI' pravos como o do ultra-som, ficarão comovidos, pois é impresslonClnte
CI abalo que se sente ao ver o feio lão de perto, no monilor, moven-
do-.., respirando, dlupanda o dedo ou coçando a noriz, j6 ae, dois
ou h&s mesel e meTo de vldCl. e uma revelooÇão comovedora, e edou
convencido de que paUar per eua experiAnda 'e c=o"v,rter6 "O argu-
mente mais paderoso paro deler a matança.

-154-
TESTEMUNHO 00 cREI 00 ABORTO.

2 - A falsldad. dos lemas obortistos

Que r.,to, pois_ dOI "ogal'" oborti,to,? Tomemos o do «liberdade


de e,colho • . Todol edomo, o favor do livre elcolho. Sempr. quando,
é claro, hojo uma .scolho "i«l. Se umCl do, allernotiva s nôo li .tica.
m....t. oceitóvel, o .scolho nóo admite o escrutínio: de falo, nóo é
umo escolha, e, portanto, a «liberdade de escolho . é um lelnG vOl.io.
Suponhamos que eslou folido. Pan o escolhe r Irobolhar poro ganhar
dinheiro, aLI roubar UIII bOMa, ou a n oltar a yocê e tirar. lhe a carteira :
mos os duas últimos não sôo escolhos éticas.

cO direito 00 domínio do corpo. i outro lema de grande alraliyo.


Hoje, Mroçgs li Imunologia, lobe·se com absolulo certeza que o feio
nóo é uma pente do corpo do mãe. Os glóbulos brancos do sangue
lóa capaze, d. reconhecer qualquer corpo eslronho 00 organilma e
de acionar os mecanismo, de d efe,a poro destrui-lo, Quando o tetd
se implanto no pared. do útero, o sistema imunológico materno reage
poro expulsar o intrusa, mal, naturalmente, o feto e.'6 dotado de um
delicado método d. d.f.sa em face dena reação. Em algun, calos
(I defeso nôo é 160 eficaz como deyio, e o feto é expulsa e aborta.

Isto moslra que o feio nôo é uma porle do corpo da mãe. Simplesmente
lá est6 de possogem como hóspede, e elo nóo pode dispor de le.

Outro tótico muito important@ foi 0fHes@ntaro oposi(ão ao aborto


como \,Ima ingerincio do Igre10 Católico. Nôo se Irolovo de atacor o
Papa, por.q ue cenlralizor CI a'en(õo em UIII IÓ homem poderia despertar
uma reo(óo de limpotiCl. EvitamOI lamb6m condenar todos o s cot6licol,
porque isso enfraque<:eria muito o temo. E mesmo íamos ne<:e"irar de
olgulnas mulhe res cat61icos poro levá· 101 g fre n'e como escud os, paro
q\le afirmal u m que eslav.:"n a lavOl" do aborlo. E assim fizemo • . Por
illo concentramos o aloque nOI bispos e 01101 hierarquiol, um grupo
suficienleme nte reduzido poro que sofressem lodos os ataques e bOI-
lanle amplo poro que fou e mQnifesto.

Agora penso que no propagando daquel es anos, em que nOi


jogóvamos contra o Igreja Católico, 'e tivlinemOI sl,lbstÍluida o pCllavra
cc:aIÓlico . pelo palavrCl «negro ., a opiniõo público nos teria rejeitado.
Naquele tempo era modo atacar o Igrelo Calólica, e nos aproveitamol
disso. Poro que um lemo , ejo eficaz, deve e.grimir.se um argumenlo.
Nene coso, o de que o Igrela nôo le deve imiscuir em OliSunto. do
Ellado. No enlanlO, lodos sabemos qUe o Rev. Marli" Lulher King
era um mini lira prote.lonle e levou o cabo uma das reYCIlu(ões saci oi.

- 155-
68 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS. 229/ 1985

maÍl profunda. nos Eslados Unidos, Também recordamos que alguns


dOI p.rJ<lnagen. mais olivos na abolição da es,ravCI!uro em Boston
tl!fOm membros do dero,

Tomb'm voe" ouviram d izer que o aborlo é um problema médico.


q ue deve ler deiJtodo na. môo. dos doulores. Mos o falo de o aborto
I.r umo técnica nCio I. converte em um problema m&dica, do melmo
modo que a pena de morle "ao é 101m OSlunlo dOI engenhe iros elelri.
cistol pelo folo de usar a cadeira .Iétrico.

Cada ano s. praticam nOI Estados Unidos 1 . 300 . 000 aborlos. A


uma média de 3.50 dólare, por aborto, samClm· •• 500 milhão. de
d6Iar." que vão poror fiOS bolsos dOI m'dicos e dos unpons6yeil pela.
cllnh;o.. Oeixar uma ,que.lgo como a do aborto em mgo. dOI moi.
lnlereuod01 economlcom.nte, , loucura .. irr.sponsabilidade.

3 - A NI'ICI do aborto leraplutico

Também ti.... mos experiência, em No ...a Iorque, com as comiuões


do coborto '.rapiutTco:., pois antes de 1970 o aborlo só era pOIlI.... 1
por .xig'ndo médica. Euas comissões, formadas por Irós doutores em
cada hospital, opinavam .abr. a validade d. cada pedido de aborto.
B.m c~o se converleram em uma fana. 05 pedidos de aborlo iam,
Invariavclmente, ocampanhados de dois certificados redigidos por
psiquiatras, manlf.stando que o mulher em questão linho 'endhcias
suicidcu por causa da gravidez. Naturalmente, sempre que tinha uma
paci.nt. que d.seiava Clbortar, eu Q enviava CI dois psiquiatras amigai
m.us. Estes davam os atestados coslu",eiras - uma 'ar.fo rotineiro
que n(io lhes tirova mois de cinco minutos - e cobravam OI 100
dólares de costume. Eu enviova a s informes ô c:omillÕO .q ue os revi,ovo,
colocava seu CClrlmbo, e a paci.nte obtinha rapidamente o aborlo
.aliotado. A. comiuõ.s .,4m algo absolutamente va~io, I.va ...am DO
descrédito e 00 obl,lJO do lei, e, quando esta foi Clbotido em 1970,
se desfize ram.

Outro folo qve ilustro o chamado coborto terapêutico., , Q alte-


ro06o ocorrida em 1976, quundo o Congresso aprovou umo eme nda,
em virtude do qual s6 podiam ur financlodos com fundol públicos os
aborto. motivados por estupro, incesto ou par CO\l$O do perlgo do vida
da mãe. Em poucos meses, a porcenta,gem dos abortos custeadas pela
Eslodo caiu a uni 21.. Era cloro que a Imensa maioria dos oborlos
não corr.spondlQ o nenhuma cnece.sidade mé dica".

-156 -
TESTEMUNHO 00 f REI 00 ABORTO. 69

Hõo sou um homem religioso. O. fato, nõo entro em um templo


desde os Ire:r:e anal. M.OI quero, sim. assegurar-lhes que lemos de deter
eUe processo ineficol. e destrUlivo, cuio único rel'lllodo • umo moior
diuolu~ão do fomllio. Devemos reafirmar o amor entre n6s, e special-
mente paro com o ser mais fr6gile Indefeso. Agora considero o aborlo
como um mal, indefensável eticamente, o IIn dos nouos atuais conhe·
cimentos sobre a crionc;o ainda Aao ncudda.

Este testemunho, eloqüente como é, dispensa qualquer


comentário.
• ••

IMPORTANTE!
ClJRSO DE INIClAç.l.O TEOLóGICA
POR CORRJIlSPOMl2NCIA
A &cola. de Fé e Catequese «Mater EccIeslae" da Arquldlo-
ocse de São Sebastião do Rio de Jaueiro está para Jaaçar um
CURSO DE rEOLOGIA POR COBRESPOND:tN"CIA ,(além do
CUl'llQ Bíblico já bUlçado em fDWII'ÜrO de 19M e em fnnea
expa.osio até hoje), da. autoria do Pe. Edêvio BetteJLcourt,
O.S .B.
Não &cri nem. um Curso de CatI'lcIsrno rudimeDtar nem
uma. ~rIe de npões de IÚWlI multo espeeiD'imdo, 111M um,lD:stnL-
menro de estudo para .. sólida. fonnaçãlo dos fiéis catóUcos. Em
trinta. módulos aproximadamente, serão abordados todos OI
tratados da teologia, desde a. Teodogla. Fundamental até lOS
NoVÍSàimos. O ritmo do Cuno será o do ant.erior: envio, ao
cuntsta., de lloóes .acompanhadas de perguntas; as protVU mJUl-
dadas à sede da Escola..selio oorrlglclas e devolvidas 80 eurslda
com novu liçÕe8 . . . . qQCI coattauo & estudar. A d~ do
Cura0 eetari. & cr:Jtério do interessado, que poderi. apUca.r 80
estudo todo o tempo que julgar necessário.
Os pedidos de lnform~ tanto pan. o Curso Bibliecl 06mo
para o de Teologia sejam dlrtgldos à F.iioola. «Ma.ter Ecekslae _ .
Rua BM,jamht Constaut 2S, 3' aaclar, Ca1x& postal 1 S62 -
20241 - RIo de Janeiro (M).
AmIgo. procure conhecer melhor o oonteúdo da sua fé. para
quo você mais a possa estimar e testemunhar!

-157 -
Entre OI direitos cio homem:

"Es(ola livre e Gratuita"


por Miguel NaccaraHo. S .J.

Em ,im. .: o Pe. Miguel NacearaUo, 5 . J . lembn a neceSlldade de


que o ensino, além de obl'IIP16rio pita IS cri.neu, seja 9ralullo, para que
as lamll'a. ponlm a colher Ilvremenle a escola de seus fllh03. Dlvere.aa
declaraç6el de Organismos Internacional. tlm Irlsado a liberdade de ensino
• o direito que toca b femUla., de optar pelo tipo de eduea~o • de
escola doI seus filhOs .
Ore ••1. dllello , burlado se, como no BrllSlI , hâ dlscrlmlneç'o, por
parte do Estado, enlre escole. pe.ttlcular e escola publlCII. Esta , mantidl
por ,ubsfdlOl do Governo, de modo que se torne gratuita para OI "UI
\IIu611os; ao contrlllo, a ascola particular vinha sendo at' 19&3 protegida
por bolsa. de estudo r•• ullantas do aal'rlo-educaçjo; maa, a partir de
07106/1983, se v6 privada de tel apolo governamental. Em conseqOi8ncla,
es famll lu Clrenta. do obrigada. a lecorrer .. escola p(Jbllca, ainda que
esla nllo corresponda a08 seUl anseios; quanlo ia lamll1as nlo C8r&nI8l, ..
querem opta' pela ..coll particula r, dlMlm pagar duu vezes li educaçAo
de MU'S OIhol: uma, medlanle OI Impostos; e outra, mediante ai menaall-
dada etColare.. .
Tal sllua910 de inJusllça deve ceder a nova aislem611ca q ue re'pello
os dlrel108 de 'amll" bra.Ualra; lato poderia ler oblldo mediante a e mlalo,
por e:.emplo. d. cheque., bonus 011 "(nas educacionais, por parte do
&11100, que deverIa, u m duvida, dar ma1B a\8flçlo B a plicar mais vertias •
nobre causa da adllcaçlo no Blasll.

• • •
o Pe. Miguel Naccaratlo, S .J . vem·se dedicando, há muitos
anos, ao problema da escola; estudou o assunto em oito paises
do Ocidente europeu. Dado que 1) todo ser humano tem direito
à educação e 2) a famill a (berço onde a educação começa) é
insuficie nte para atende r por s i à plena educação e ã adequada
instrução de seus tilhos, pode-se dizer que todo individuo tem
direito à escola. independentemente das condições sócio-econÕo-
mlcas em Que verse a sua famUla.
Dai a reivindicação de escola gratuita. Esta, porém, não
deve ser monopolizada pelo Estado, visto que os pais têm o
direito de escolher para seus tuhos o tipo de ~ucação e de los-
- 158 -
4ESCOLA LIVRE E GRATUITA :. 71

trução que oorresponda à sua filosofia de vida. Por Isto há de


ser gratuita nâo somente a escola oficiai. mas também 8 escola
particuJar, criada pela livre iniciativa de cidadãos capacitados
e honestos. E, para que isto OCOITa. loma-se indispensável que
o Estado subvencione não somenle a escola oficiai, mas também
a particular. Não basta que o Estado não se oponha à escola
particular, mas é preciso que lhe possibilite ser gratuita ; se não
o fizer. os cidadãos que optarem pela Instituição partlcula-r. terão
que pagar duas vezes o custo da escola; uma vez, sob forma de
Impostos; outra vez, sob forma de mensalidades devidas ao
estabelecimento particular.
:€ esta, em sintese, a sâhia tese do livro que o referido edu-
cador acaba de publicar sob O título _Escola Livre e Gra.tulta ~ I .
- O problema é cada vez mais atual no Brasil e, de modo espe-
cial, em alguns Estados da Federação. Eis a razão pela qual,
nas pâginas seguintes, abordaremos de mais perto o conteúdo
do livro em foco.

1.. Declarações Intemocionais


O a utor começa por evidenciar os fundamentos da sua tese
como propostos por documentos de reconhecido valor inler.
nacional.
A Assembléia Geral das Nações Unidas. em 10/12/1948.
aprovou a Declaração Geral dos Direitos Humanos, que inclui
Importantes itens referentes aos direitos de educação.
Esse texto tomou-se modelo para outros documentos de
Organismos Internacionais. Além do quê, existem declaracões
da Igreja que enfatizam a liberdade. dos pais. d e educar 05 filhos
segundo os ditames da sua consciência. Tal direito exige o apolo
do Estado para que possa ser devidamente exercido.
A seguir, transcreveremos algumas dessas declaraç6es :
I.I . A Declcuaçãa Universal dos Direitos Humanos

cMigll 16:
3 . A família é o elem.ento natural e fundamentol da soci.dade
• t.", direita à proteção da codedad. o do E$tado:..

1 &I. Loyotl 19M, 137 X 208 mm. 79 pp.

-159 -
72 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS, 229/ 1985

«ArtIgo 26:

1. Toda pessoo lem direito ô educação. A educação deve 'leI


Grotullo, ao menos no qUe so refe'e 00 el'lsln.o elemenlar ., funda-
menlal. O ensino elementar é obrigat6rio. O e1Isino técnic:o e profis-
sional deve s.r generalizado; o aoeuo oos estudos superiores deve ser
18uehnenle eberto o lodos em função do merilo_

3. OI pais: Iam prioridade de direito na escolha do 8&nero de


odu~Cão o .er ministrada a seu. fiiho ...

I .2. Paçto Tntemadonot de Direitos Civis • Po1111cos

Aprovado pela Assembléia Geral das Na!:ÕeS Unidas, ONU,


mediante a Resolução tl' 2 . 2()O.A (XXI) de 16 de dezembro
de 1966. Entrou em vigor a part.1r- de 23 de março de 1976. ao
se atingir o mínimo de trinta e cinco paises raUlicantes.

«ArtIgo li:

.. . Os Estado. Portes no presenle Paelo se (Ompromelem ares·


peitar a liberdade dos pais, e, quando for o caso, dOI lutare. legais,
poro garantir ,q ue OI filhos r«aba", CI educ:aeão reltgiosa e moral que
esleja de acordo com suas pr6prias convic,ões:t.

«Artigo 23:

1. A famllio i o elemenlo naturol • fundamental da sociedade


e lem o direito à proleção da sociedade e do Estado"

cArtlgo 26:
Todos .as pes$Oos sõo iguais perante o lei e tim direito sem
dlscriminoçiio o iguol profetãQ do lei. A elle fespeito, a lei proibir6
qualquer dilwmlnaçao e GOrCIntir6 o tQdQI os peJ50at proletãQ iguol
• efetivo contra qualquer dls.crlmlnoçllo PQr mQtivos de fOÇCI, cor, 50";0,
idioma', religlõo, oplniõ.s PQlItical OU d. lIuo1qu.r tndola, origem no-
dQnal ou social, pOlte60 eCQnômica, naldmenlo QU qualquer outra
condlcão soel"I».

- 160 -
(ESCOLA UVRE E GRATUrrA~ 73

1 .3 . ConvenSão contra os Discriminasões no Domínio do En$lno

Adotada pela Conferência Geral das Nações Unidas para


a Educação e Cultura. UNESCO. em sua undécima reuniio
realizada em Paris de 14 de novembro a 15 de dezembro de
1960, com a participação de não menos de cinqüenta e três
Nações. Foi aprovada com a data de 14 de dezembro de 1960
e entrou em vigor a partir de 22 de maio de 1962.

O, fstados Parles no presente Convenção u! comprometem,


ademais, a formulor, deMnvolver e aplicar uma polfliaa nacional ten-
dente o promover, por mftodos adequados cu circunstôndal e aOI
UIO. nadonals, o Igualdade de oportunidades e de traIo no letor do
00$11'10 o, em especial, O I

a) tornar ob,!gat6rio o grolulto o ensino primório~ Sleneraliror


e lor ...ar aceulvel a todos o ensino se.::und6rio em suas diversas formal;
tornar igualm8nlo acessível a todos, se.gundo a capacidade de cada
um, o e",lno superiorj velar pela cumprimento, por todos, do obrigação
eKolor presaita polo loi;

bl

cl estimular e i,,'ensHicar, por métodos adequados, a educo·


ção das penoos <lue nCio lenhom re<llbido in$lrUlOiio prim6rio ou q\le
nào o lenham completada, ti permitir. lhes que confinuem seus eltudos
em função de SUOI aptidótl:t.

lutlgo 5:

c1. Os Estados Portei na ptesenle Convencão concordam :

ai
bl quo se deve respoitar a liberdade dos pai. ou, quando for
o COlO, dos lutares legai_,

1', de eJCOlher, paro , eul filhol, eslobclKintell'ltol de enlino que;


não .ejom mantidos pelos poderes público., porém que respeilem ai
normal mrnimos prescri'os ou optovados pelos autoridades competente.;

-161-
74 _PERGUNTE E RESPONDEREMOS) 229/1985

2t , de dor o leul filhol, de a cordo COI'II as sual l1Iodalidadel de


<lplicoCão determina dos pela legi51oção de c<ld<l Ellado, a educacõo
religioso e moral conformo OI IUOI próprios convkçóes; Cf adernais, de
não so obrigar n.nhum indivíduo ou grupo o receber insbuc60 roligioso
incompot!vol COIII suos conviCCÕUj

c) .q ue se deve reconhecer aos membros das. minorias nocionai.


a direita de exercer OI atividades educacionais qtJe lhe s sejam pr6prlas,
enlre elas a de estabelecer e monter escolol ... :..
Outros vários docwnentos se poderiam citar, que reafir·
mam as grandes linhas dos Que até aqui foram transcritos.

2. A situoçõo no Brasil
No Brasil a educação e o ensino de base (ensino de pri·
meiro grau) são obrigatórios na faixa etâria dos sete aos qua·
torze anos. Esta nonna não é posta em discussão hoje em dia;
verlflCa-5e que a farnilla, para exercer sua missão educadora,
precisa do auxilio da sociedade.
E xiste também no Brasil liberdade de ensino, ao menos
em tese. Isto quer dizer que, em principio, é deixada aos par.
ticuJares a iniciativa de promover o ensino privado segundo
sua filosofia de vida, contanto que atendam às injuncôes legais
do Estado.
Outra questão relacionada com o ensino - e este muito
delicada - é a da gratuidade. Com efeito; onde existe abri·
gatoriedade escolar. deve haver também gratuidade escolar,
para que a obrigatoriedade possa ser assumida. Onde há deve-
res, hã também direitos.
Neste particular, a situação brasileira tem passado por
viclssitudes, a saber:
A Lei n' 4.440, de 27/10/64 criou o sistema de bolsas
de estudo do salário-educaCão. Assim rezava o respectivo
artigo 1':
. 1: instituído o sol6rio·educoc:õo devido pelai empresos vinculados
\!I Previdência $cdal. repnuentodo pela lmpartêlMcia correspondente tlb
custo do ensino primório das filhlls dos IeUI -empregados em idade de
elcolarl:r.a(ãa. obrigatório e destinada a suplementor as desposas
públicas com a educacáa elemenlor».
-162_
cESCOLA UVRE E GRATUITA , '15

Segundo o teor deste artigo, seria licito aplicar os recursos


provenientes do salãrio-educaçãa nas escolas particulares em
favor de quaisquer alunos da comunidade. Tal disposição foi
confirmada pelo Decreto fl' 76 .923, de 26/12./75, que tornou
evidente a possibilidade de se aplicarem as bolsas de estudo
do salário-'f:ducaçáo "pelo sistema de compensação. para quais-
quer adultos e crianl:8S' (artigo 11, b).
Conseqüentemente, a partir ele 1975 começaram a surgir
contratos de empresas com escolas particulares. que visavam a
aplicar, no todo ou em parte, os recursos do salário-educaçio
em bolsas no ensino do primeiro grau. O número de bolsistas
foi crescendo e em 1983 atingia aproximadamente a cota de
1 .600 .000 ,e studantes em todo o BrasiL O valor da bolsa, a
prindpio quase irrisório, (oj-se elevando, de modo que em 1983
já era suficiente para praticamente cobrir os gastos do ensJno
ao menos em escolas do interior do pais.
Todavia, sob o pretexto de cortar abusos e desvios na
aplicacão dos recursos do salárlo-educaCão, criou-se em 1982,
através do Decreto n~ 81 .043, de 22/03/82, nova burocracia
para a distribuição de bolsas de estudo. Ainda sob a alegaeã,o
de que tais abusos se verificavam por parte de pessoas e insti.
tulç6es inescrupulosas, (oi emitido o Decreto n· 88 .374, de
f17 /06/83, Que aboliu a clAusula de distrIbuição de bolsas de
estudo do saIãrio-educacão " pelo sistema de compensação, para
quaisquer adultos e cl'lanças,. Este decreto acanetou uma
ruptura na caminhada do país em direção à democratJzação
do ensino. A escola particular tt'm. deixado de ser procurada
por (amUias carentes, de modo que não poucos estabelecimen-
tos têm vagas ociosas. enquanto outros "se vão fechando.
A c:anali:zacão exclusiva ou quase exclusiva dos recursos
pUblicas para as escolas oficiais viola um direito da faroilla
brasileira, pois a priva da liberdade de opção pela escola par-
tIculBl', confessional ou leiga. Com efeito, as familias caren-
tes são obrigadas a matricular sew filhos na escola onelal,
mesmo que não lhes agrade a orientação ou a qualidade de
ensino dos estabelecimentos públicos. Quanto às ramllias não
carentes, se querem optar (como lhes é de direito) pela escola
particular, -são coagidas a pagar duas vezes a educação de seus
filhos, pois, além de contribuir com os Impostos, cont ribuem
com as mensalidades pagas à escola partIcular.
Eis O grave problema com quI! a popula~ão brasileira. se
defronta neste momento.
-163 _
76 ,PERGUNTE E RESPONDEREMOS. 229/1585

3. Reflexõo finol

.J:: inadmissível a gratuidade unilateral e exc1us1va da


escola oficial mantida com recursos que são de todos, En-
quanto subsistir este sistema, persistirá a coação, direta ou
indireta, sobre as fanúllas brasileiras em favor da escola pú-
blica. Assim o pais cammhará, talvez inconscientemente, para
a estatlzacão do ênSino.

Sem os subsidlos do Estado A Escola particular, a fam1l1a


não goza de liberdade quanto â. escolha da escola para seus
filhos. Uberdade sem meios é Ube:rdade teórica.

Para pOr tennG à situacão de JnjusUca assim criada no


Brasil, com perspectiva de se agravar sempre mais, o Pe. MI-
guel Nacca.ratto propOe um processo que de certo modo subs-
titui o das bolsas de estudo provenientes do salárlo-educaÇi.o;

cSeria fácil excogltor um sistema simple. e objetiva, um cheque


ou um b6nuI ou mesmo um carna educacional de valor equivalente a
uma anuidade regionol padrão pgra cgda crignço ou jovem na foixa
elária da elcolarizGção obrigot6ria. Se são 25 mllhi5e. de pessoas
.K<lJari:r.á....il, leiam emitidos 25 milhões de c;),~uel ou banu. au
carnls educacionail, e .slel pOderiam ter da:r.e ~uponl de valor luntel
com a clóusula de automático reojulte, de Dcordo com OI Indicel infla-
cion6rlas. Haie temos os facilidades do censo e dos computadores e
Inclu$lve umo ampla reda bancá,ig em lodo o país como suporto de
apoio paro o execução deua tarefa. De poue do cheque ou b6nus
ou cornê educacionol, a fomllia procu,arlg o escola d, I~O preferindo,
oficial ou pculicular, confeuionol ou leiga, É naturol que 10&10 venha
à mente a pergunto: e OI recursos pgra cobrir eSlie ovultodo montante
de despesas? Respondemos que, quando há umo opcão polllic:a pela
edvcacão, sobretudo pela educocão de base, redimen.ionomo.e OI
orçamenlos, quer federal, .quer eltoduals, quer municipgil, bus«lm-..
e .-;riom·.e ncvos fcntes d. receito,

S'la olrové. do sistema d. bolsas de estudo _ sem cláusulas


restritIvos d. haver au não vogol .m escolas oficiais _ .ela Cllravis-
d. ehequ., bÓt'lu. 011 (:orl1ê .dueacio..al. lejg ainda através d. OutrCl
formo, o que fico é o desofio 00 esptrito aillco e à coragem dOI bra-
sileiros para encontra' , p&r em prática uma lolução brasileiro com
perfeita adequação oos prindplas de IIl>erdgde de ensino» Cp, 73).

-164 -
cESCOLA LIVRE E GRATUITA' TI

I:.: de frisar que não hâ intenção de esvaziar a escola ofi-


dal, mas, sim, procura-se propiciar aos pais os meios de pode-
rem escolher a escola de seus filhos. Os estabelecimentos ofi-
ciais só teriam a ganhar, porque receberiam o estimulo do
desario para oferecer- qualidade à livre opção da fanúlia.

Sabiamente conclui o autor- do livro:


cÁ lur delSoeS princlpios e normas, entendemos que Educação é
direito e dever de lodos, mas que 00 poder público cabe especial res-
ponsabJtrdCllde no .enlido d .., além d. oferecer efCOlos de boa quali-
dade, proplc:lar 00' pClIil condil;ões e meios paro efetivamente poderem
escolher o elcola de suo preferfncia, quer oficial, quer de InidotiYa
particular, Ip. 75) •

• ESCOlA. LIVRE E GRATUITA, de boa qualidade poro lodo,.


I•• 751.
Muito oport1.UlU do as ponderações do Pe. Naccaratto
numa hom em que 8 educação aparece como o problema n' 1
do Brasil. O cidadão brasileiro devidamente escolar-izado tor--
nar-se-â. um construtor da sociedade tr-abalhadorn. e próspera
que se pode almejar. Um cidadão devidamente educado e I~
truldo sabe cuidar dê sUa higiene e saúde, sabe instituir digno
sistema de habitacio, sabe planejar a sua família, sabe exer·
cer uma profissão OtH ao país e condizente com as exigências
da técnica moderna, sabe também fazer livres e lúcidas opções
poUtlcas. .. Por- conseguinte, ao Governo só pode interessar-
a promoção da escola e da educação, que deveriam ser- a pupila
dos olhos dos estadistas brasileiros. Ao fomentá-las, evIte o
Governo sufocar os direitos da familia brasileira ; ao contrário,
respeite os direitos dos cidadãos. e, por isto, a livre iniciativa
dos educadores particulares, desde Que se sujeitem a normas
estatais concebidas em vista do bem comwn.
E o Brasil estará a caminho de resolver o seu problema
.fundamental . . .

-165-
Exiaae re.lmente uma

"Ora<ão de João XXIII pelos Judeus"?


Em el"'MO: Tem circulado uma "Ofeçlo pelos Judeus· atrlbulda ao
Para Joio XXIII, I8gundo a qual os eatólicos pediriam perdAo a Deu. pelo.
males Inlllgidos .os Judeus durante a6eulos de antHemlUsmo.
A. origem deste te)tlo é obtcura; quem o publicou pela prlmelr. vez,
atrlbulndo-o a Joio XXIII, foi um Judeu do. &18do. UnJc!o., que UIOU o
pllud6nlmo de F. E. CArlus, .am citar fonle alguma nem comprovante di
aultntlclOlde. Na bIH <fOlia primeira dlvulgaçlo, foi-se eapalhando cacSa
VOz ma" o teKlo na Europa a nu Am6rlclIs.

Um aKame da linguagem. do conteúdo de tal texto e"ldencle que nlo


alo da kI"rll da Joio XXIII. Ademais, quando este compunha ore.Ij;Oes,
costuma"a enlraoi·lu lt S. penrtenclirla Apoetóllca para serem dllundlda'l .
Em conaeq06ncla, OI estudiosos nlo reconhecem • pretensa autoria papal
do tal prece.

lato nlo quer dilar 'lua Joio XXIII nlo 10ue realment. aberto ao
<f16l0go ludeo-crlatlo. Sabe·.a que em 1959 mandou rallrar da Ululgla da
SeKIa·hllra Sinta .. expra.lM, que pudessem larlr a senSibilidade do.
Judeu •• Adamala 101 esse Pipa que InStituiu a Combsio Pontltlcla para o
0"1000 Jud8O-Crlsllo no ano da 1980 a qub que o Concilio do Vatleano 11
abo'duIe a questlo ludalca am documento próprio. Joio XXIII qult a..lm
aproximar c.tóllcos o Judeus após séculm de Incompr8enslo. A sua atitude
aberla nlo prec isa do retorço da uma espúria ~Oraçio pelos Judeus·.

• • •

Tem circulado em jamais e revistas uma .Oração pelos


Judeus_ atrlbuida ao Papa João XXllI. Teria sido redigida
pouco antes da sua morte (1963). Os órgãos da imprensa que
a têm publicado, apresentam-na como autêntica produção do
citado PonUfice. Todavia estudos apurados revelam que é
espúria, como a seguir se podem perceber.

Eis o texto em questão:


-166
ORAÇAO DE JOAO XXIII PELOS JUDEUS? 79

cEstamos hoje conscientes de que, durante muitos e muitos


séwlos, nonOi olhos eJtiverom tão ~egos que niío éramos capazes de
ver a bele:r.o do leu pov(I eleito nem de re~onhecer na sua foee os
trOCai dos nOHOS irmõol privilegiados. Compreendamos que o marca
de Caim eSlõ gravada sob'e a nOlSa fronte .

No decorrer dos I&:ulol, o nos:o irmõo Abel io:r.io ensangüen:odo


e em lágrimas por culpo nosso, porque línhamol elquecido o leu
amor. Peréoo4nos por I.rmos injultomente atribuido a maldição 00
nome de hebrous. Perdoa ·nos por termos de novo aueiticodo o TI no
corne delol. porqve n50 soblomos o que fodornou.

1. A camirlhada t!e uma noticio

Pela primeira vez o texto dessa oração veio à luz em


janeiro de 1965 na revista Amerlca.n Commentary. órgão do
Amcrlcan Jowi".h Oommittec. Quem o publicava. usou o pseU 4

dõnlmo F. E. Cartus, sem indlear a fonte do texto, atribuldo


então a João XXIII, e sem apresentar alguma garantia de
autenticidade. Na verdade. F. E. Cartus não era senão o
Sr. Malacl'r)' MarUn, que durante o Concilio do Vaticano II ia
multas vezes ao Secretariado para a União dos Cristãos no
Vaticano. Ora Mons. John S. Quinn, perito do Concilio do
Vaticano lI, julgando que Malachy Marlin recebem do próprio
Vaticano o texto em questão, divulgOu-o em Chicago no dccor 4

rer de uma reunião intrrcQnfesslonal de judeus e cristãos. Isto


deu ao texto maior for~a de penetração nos meios católicos c
não católicos. de modo que agências judaicas de noticias e ccn 4

tros de ecumenismo diversos se encnrregaram de divulgar ultc·


rionnenle a oração.
A os 18/03/1965, a prece foi publicada pelo jornal De Tijd,
da Holanda. e 80s 6/06/1965 pelo PQSIUler Bistumsbla.tt (B0-
letim Diocesano da diocese de Passau, na Alemanha) .
Na Itália, a primeira publicação se deve à revista Questi 4

talla, de Veneza, em seu número de maio-junho 1966. p. 103.


Esta transcreveu do citado jornal holandês o texto da prece,
fazendo-o acompanhar de palavras de Mans. Qulnn. A im 4

prensa italiana encarregou-se de difundir. em mais ampla


escala, o famoso texto; especialmente o órgão publlcltãrlo
ANSA, aos 26/09/66, deu a noticia aos seus leitores. Todavia
já aos 27/09/66 alguns jornais lançaram um desmentido :
-167 -
8) .. PERCUNTE E RESPONDEREMOS. 229/ 1985

.. Falsa oração pelos judeus atribulda ao Papa João. (L'A,ven.


n1re d'lbl.... cotidiano católico) e «Não ê de João xxm a
oração pelos judeus. Não era necessário um texto apócrifo
para demonstrar o amor do pranteado Pontitice para com os
lsraelitas~ (O Resto de1 CarUnOt de Bolonha).

Não obstante, aos 30/09/1966, Quatro dias após o desmen-


tido, o jornal PaIt5e Se.... publicou o texto da oração. acompa-
nhado de comentário que assegurava a autoria papal do mesmo.
Isto se dava, embora o vaticanista de tal periódico estivesse
multo bem inConnado a respeito da realldade dos fatos.

Na Sulca, aos 9/09/1966 o cotidiano católico IA IJberté,


de Frlburgo, julgava poder lançar um verdadeiro «furo, jarna·
lIstico, escrevendo (sem Indicar as fontes da noticia) :

cOs ambhmles do Vali cano e:onfirmaram, a 7 de ,etembro, a


exÍlt6nc;ia e autenlicldade de uma orac;iia, redigida par João XXIII
pouc;os dku onles de morrer, na quol o Papo pede perdõo a DeVI por
lodo, OI s.ofrimenlo, que o Igreio Colólic;o Infligiu aos judeus. A exillin·
cio deno oraçõo, que, segundo OI intenc;ões do seu autor, deveria ler
redlodo em todos os igrejas, foro ree:entemenle anundodo no dec;uno
de umo conferindo em Chicago por MO"I. John S. Quinn, que foi um
do, peritos do Concllio •.

A firmeza de tom de tal notícia suiça levou os redatores


(geralmente muito sagazes) do periódico La DocumeJltatlon
CaUtoUque. de Paris (n· 1479, 1966. rol. 1728) a reproduzirem
as inrormaçõe5 ao pé da letra, sem emitirem alguma palavra
de comentArlo ou de dúvida. Poder·se-Ia realmente perguntar
quais eram os camblentes do Vaticano. aos quais se referia
La IJberté; é provlivel que fossem mera projeção da fantasia
do redator. Com efeito, Mons. Capovllla, que Cora íntimo cola-
borador de João xxm, tinha fornecido sucessivos desmentidos
à. autenticidade papal da prece em Coco; também o Secreta-
nado para a União dos Cristãos manifestava sérias dúvidas
sobre c:a autenticidade da presumida oracão do Papa João
pejos judeus ~, como se depreende de uma carta escrita 80S
12/10/1965 pela secretaria do Cardeal Agostinho Bea 80
mesmo Mons. Capovilla.
-168 -
ORAÇA.O DE JOÃO XXIlI PELOS JUDEUS? 81

2. Por que não autêntica?

Hã dois tipos de argumentes contrários à autenticidade


da referida oração.

2 .1. ConlC'Údo. eJtilo

Registram-se no texto em questão algumas expressões que


ficam distantes do estilo e da mentalidade do Papa João XXlII;
«a cegueira fechou os nossos olhos~, «a maldicão que injusta-
mente ])roferimos~, «perdoa-nos por ter-te crucificado pela
segunda vez», oCa marca de Caim cstá gravada sobre a nossa
fronte:.. Na verdade, não teria sido do estilo de João XXUI
incriminar Indistintamente a Igreja inteira e Impor a todos os
cristãos o titulo de Calm para mostrar simpatia ou solidarie-
dade aos judeus.

2 .2 . Os hábhos do Papo João XXIII

Nos escritos de João XXIII - ciosamente colecionados e,


em parte, jã publicados por Mons. D. F. Capovil1a - não se
encontra vestigio nem eco da rererida oração. O Pontifice,
além do mais, quando redigia oraCôes, costumava entregá-Ias
à Sagrada Penitenciaria Apostólica para difundi-Ias ; ora este
órgáo do Vaticano não possui tal prece em seus arquivos nem
jamais a divulgou.
A recusa da autenticidade da oração em foco, fundamen-
tada e Objetiva como é , não Implica rechamento da Igreja Ca·
tóllca em relação aos judeus. Deve-se mesmo reconhecer a
atitude aberta do Papa João XXm frente a todos os aspectos
do diálogo religioso de sua éJ)OCa - o que, aliás, se eviden-
ciará muito c1aram~nte sob o titulo 3 deste artigo. O Que im-
porta, é apenas restabelecer a hlstorlcidade dos fatos.
Poder-se·á explicar a origem do fenômeno por várias ma-
neiras; entre outras, há quem julgue Que talvez numa audiên·
cla particular alguém tenha submetido o texto da prece ao
S. Padre, que a terá aprovado em termos sumários, sem se
poder entregar a minucioso exame dos dizeres em pauta. Quem
hipoteticamente obteve tal aprovação genérica. terA procedidO
à divulgaçAo do texto. sem mâ fé. mas, ao contrário, tencio-
-169 -
82 cPERGUNTg E nESPONDEREMOS~ 229/1985

nando secundar as inten~ ões do Papa João XXlTI. Todavia, no


caso mesmo de tal hipótese ser verídica, nem por isto se pode--
ria atribuir a João XXIII a autoria da prece em foco.
Ainda é de notar: a recusa da autenticidade da prece em
Questão não quer dizer que os cristãos não devam reconhecer
OS males outrora cometidos contra. os judeus; cabe-lhes peni-
tenciar·se pela animosidade antl-semita que muitos nutriram
durante séculos; foram, nâo raro, vítimas da fragilidade hu-
mana no seu relacionamento com os judeus e disto devem
pedir perdão ao povo hebreu. Em nossos dias há diálogo vivo
e sincero entre judeus e cristãos em vários países do mundo.

3. João XXIII e os ludeus


O respeito e a deferência do Papa João XXIlI para com
os judeus se manifestaram em mais de uma ocasião do seu
pontificado.
Seja salientado o falo de que o S. Padre quis fosse revista
8 liturgia da Sexta·feira Santa, de morlo a se eliminarem da
mesma expfCSSÕes que podiam ferir o povo judeu. Em conse-
qüência, a partir da sexta-feira Z7 /03/1959 já não ocorrem,
entre as ornçóes da Sexta-feira Santa os dizeres .pro perfldis
iudaeis:. e . iudaicam pcrfidiam:.. Se bem que perfidI e per-
fitlin. no caso, não signifiquem pérfidos e perfídia., mas, sim,
. 8 condição de não estar na fé (católica) :., João xxm man-
dou retirar tais expressões da liturgia; alias, o própriO Papa
Pio XII já tencionava fazê·lo, de acordo com a s ugestão que
lhe fora levada pejo Dr. Jules Isaac aos 16/10/1949.
Mais : João xxrn multo se Interessou pelo dlãlogo judco-
-cristão, a fim de dissipar preconceitos e banir qualquer res-
quício de anti-semitismo dentre os eristãos.
Recebeu. pois, em audiência particular, a 13/06/1960, o
Or. Jules lsaac. fundador da Associação Amitté Jud~-ehré­
Uenno õ o visitante propôs então a S. Santidade a criacão de
uma comissão destinada a fomentar o relacionamento entre
judeus e católicos. Narra o próprio Dr. [saae:
cO Papa teClviu imediatamente à propasta, diunda : 'Eu também
penlei nisso, desde o inicio do nOllo colóquio'. Repelidamente,
enquanto eu Ih'!! expunha as minhas idéias, o Papa mostrou com·
preensõo e simpatia ».
-170_
ORA CÃO DE JOAO XXUl PELOS J UD~US? 83

Ao despedir-se, o Dr. lsaac perguntou ao Pontífice se


podia alimentar esperanças. Respondeu-lhe o Papa: cO Sr.
tem direito a muito mais do que cspe.'anças". E acrescentou
sorridente: _Eu sou o chefe, mas ê preciSo que consulte as
autoridades competentes i! pe,;a aos respectivos Depa rtamentos
esludem o assunto; aqui não estamos numa monarquia abso-
luta_ (Noticias extrai das do livro de G. Caprile, li Co.ncllio
Vatieano n. vol. In, Roma 1966. p. 416).

Após a audiência, o Dr. !saae telefonou ao Secretariado


do 'vaticano para a União dos Cristãos, dizcndc haver ra.lado
com o Papa e que este o tinha encaminhado ao Cardeal Agosti-
nho Bea, responsãvel por tal secretariado.

Esta famosa audiência foi descrita de m aneira ma is sis-


temática por Mons. CapovilJa, a pedido do mencionado Secre-
tariado, que desejava colher mais precisas informações sobl'e
as ocorrências. São estas as nolas de Mons. Capovilla:

c ll O Papa João XXIII recebeu em oudiõncio o Dr. JureI hoac


aOI 13 de junho de 1960. A audi&t1cio fOro reC"omendoda pelo
Emboixodo do Franca iunto à Santa Sé. O protocolo quil dar .ti tal
audlincia o caráter d e ',ped01e', mos o Sonlo Podre desejou que fone
privativo, como bem .e compreende •• .

21 lembro-me lII'Iuito bem de que o Papa ficou profundamente


impre uio nado por eue enconlro e dele me folou longamente.
Oiue· me que tombém folora do encontro 00 Cardeal Tordini e, espe'
ciolmente, D Mons. DeU·Acqua. Também me comun icou que "ovio
encom inhado o Dr. hooc 00 Cardeal Rea, 'em .q uem el. ca nflo va' ...

31 Pode ser que ai anotacôes do Cardeal Tordini COnservem


'roco:; do oudiêndo ou do rdolo do Popa João XXIII.

'" E verdade que a i! aquele dia não ocorrero â mente de


Joao XXIII a idéia de que o Concilio se deveria ocupar com a quoeSlõo
judaica e o onU_semitismo. Doque le dio em diante, porém, vollou· se
decididamente paro ene prop6sito. Era preci$O livrar o Igreio do
a cusaçóo de hover feito diK riminocão e sõ ler defend:do os judeus
batizados lcomo porecio insinuor o Dr. 'saoel; era mistor proclamar,
uma VIU pat:,lodas, que os cristãos nóo tém o direilo de inte-rprelor em
10m condenatório OI palovrol ~ 'Recoia o leu longue sobro n6sl' E dis to
que me lembro ».

-171 -
!L.. ,PERCUNTE E RESPONDEREMOS~ 229/1985

A proposta do Dr. Jules lsaac foi amadurecendo até que,


aos 18 de setembro de 1960, o Cardeal Bea, em audiência
ponUficia, fonnalizou a ldêia e recebeu O encargo de criar a
Comissão de Diálogo Judeo-Crlstão no Vaticano. Em conse-
qllência, pOde o Cardeal Bea escrever:
«I:, e fjcaró ,endo, grande mérito d. João XXIII fe, tomado cons·
ciênda desse probl."'lI de skulos e d. haver compreendido lodo a
importôncia do mesmo. Foi ele que, numa iniciativa muilo pessoal,
mandou retirar dCl lil ur.gia da Sexla·felra SantCl o expreuão pro perfldil
luclaeh. fonte de tonlos mal·entendldos. Alfm disto, Jotio XXIII con·
fiou pessoolm.nlo ao Concilia o encargo de preparar um projeto de
declaração lobre o assunlo . .. :t ela Clvllll:l Ca"olic(I 19.46, li, 21911.

Estes dados históricos bem mostram o interesse de João


xxm pelo bom relacionamento entre católicos e judêus e a
aversão do mesmo a qualquer tipo de anti-semitismo. Esta
posição do Papa não precisava nem precisa de ser c:eormbo-
rada:D pela difusão do texto de falsa oração de João XXIU.
Este artigo multo deve ao de G. CaPI"i1e publicado em
La Civilltà CattoUca. e abaixo indicado.
A propósito:

OAPRILE. O., Glavannl XXIII • UNI 'pres:h1era per ,li ebrllr em La


ChlltA Callollea. n9 3 .192, 18108183, pp. 585-589.

CAPRILE, G., 11 Concilio Vatleano 11, 3 vols. 1968.

Revtsta L'ArnIU6 JlJd6o..dritllnnl, da sociedade homônima.

LAPIOe, P . E., Aom. el IH JUUI. Pari, 1961.


&tlYlo Belteru:our1 O. S . B.

• • •

-172 -
Carta aberta a Frei Leonardo 80ft

A Meu Irmão Leonardo


Caro Boff,
paz. e Bem!
Há tempos m[nha consciência. franciscana vem-me cobrando
uma tomada de posição diante de sua doutrina e de suas atitudes.
Todos OS dias, praticamente, os meios de comunicação me pro-
vocam ainda mais nesse sentido. E o pior é que sou constran-
gido a fazê..lo publicamente e com o penoso risco de ferir um
dos irmãos que eu maJs amo, não de hoje, e sinceramente
admiro, como você nâo ignora. PubJicamente, porque de
minha parte nunca lhe escondi minhas posicões. E mais de uma
vez já manifestei por escrito aos Superiores minhas preocupa-
ções a respeito. Além disso, a publicidade estA pesadamente a
seu lado, nem sempre por amor à Igreja e seu magistério.
Quantos escritores e comentaristas publicam seus pareceres
achando que você tem o apoio unissono da Província e da
Ordem! Acho, pois, que chegou a hora de publicar que não
é bem assim . Não vou coletar assinaturas ... Mesmo porque
não estou abrindo guerra, mas sobretudo tentando esclarecer
ao lnnâo Leonardo o que está acontecendo com muitos de seus
confrades, com sacerdotes, religiosos e leigos, dia nte de suas
pUblicaçõcs bem como de seus gestos.
Não tenho autoridade cientifica para defrontar-me com
você. Comparando, ocorre-me a imagem de uma propaganda
da 'IV: a diferença entre o tocador de piano e o pianista ... Eu
sou um tocador.. . Não vou, pois, meter-me nos meandros
enganosos da disputa. Confesso que gosto de sua !"ennada arte
teológica, sobroludo quandO embelemda pela poesia e ungida
.pelo seu profundo amor 80 homem. Mas isso não me imped~
de continuar 'locando' para mim mesmo e para quem quiser
ouvlr--me.
Mas vamos ao âmago da questão: outra dificuldade
enorme ... Apelo de novo para o auxilio de nossos maravilhosos
publicitários da TV. Olhe, Irmão Leonardo, o que aconteCt~
comigo e, acredito, com muitos outros, e semelhante àquela
propaganda que mostra a moça, trabalhando tranqüilamente
em sua mesa, c, de repente, aquele rolo compressor lhe invade
a casa, destrói a mesa, todo o material e a encosta na parede,
entre apavorada e indignada... ~ isso mesmo, meu caro.
Vamos aos detalhes;
-173-
A MoçA TRABAUlANDO: cu, boa pat'te da Igreja, tra-
I.Ialhauuo l:UIU o JOi.llcnal ron )L'CK1o VCIO (;OlõCIIIO, por M.L'Ucmu,
PucUJa, elc.
U HULO COMPRESSOR: Sl.!U grande í" crescente tesouro de
saber, que a SlK! prIVilegiada IntellgencJa COlhe aVIdamente, sua
melRurta pludlglOSll retem, sua vouLaae, premida pt.!la Ul~~ncla
U<J!:i pl'oo't=mas flurnaIlO:i, I::I.Clomt. rejO que OlJSoel'Yu.
V~ SOIlOU
a milquina c naO saoc ou nao quer rrcâ-1a ... MwtO::i tentardJll
tentam subir a seu lado para lrear, se possiveJ ... e você não
t!
deixa. Mas você acolhe outros a seu lado, que o estimUlam, e a
mAquina se lama ainda mais pesada, arrasadora ...
A MOÇA NA PAREDE, apavorada e indignada: sou eu
mesmo e muitos outros. O pavor vai passando, a indlgna~-ão vai
crescendo ...
Como todo o mundo sabe, o rolo compI'eSior desandou para
além-fronteiras, o.meacando, de modo consciente e dirigido, as
«estruturas» da Igreja dnstituclcnab. o magistério, o propl'io
Papa. .. A meu ver, ê o que nosso PaI São Francisco temia da.
leitura de muitos livros: daí nascem «glosas» sem tim, as inter-
llretações, as hermeneuticas, a prcocupa~ão de se manter «atua-
lizado. , coisas Que funcionam como óleo na máquina. E a má-
quina acaba disparando mesmo. Quanto mais peso, quanto mais
declive, mais dlficil é controlá-la.
Conheço, frei Leonardo, suas declarações de amor e fideli-
dade ao magistério. Não me cabe negar a sim.'eridade delas. O
que estou achando, como observador, contrade e amigo, embora
c na parede., é que cstã na hora da te!ltar frear o 1'010, e jã! Se
o Papa tiver Que cnCrcntâ-lo pessoalmente, pressinto um desastre
terrivel para toda a Igreja. E por causa de um filho de S.:i.o
Francisco! ...
Meu Irmão, o meu apelo é o seguinte: - Deixe Francisco
mesmo frear o rolo! !! :e s6 ler «slne glosa», sem Interpreta-;-ão,
com Simplicidade de pobre, interiormente pobre, despojado de
suas bagagens de livros, O que Francisco lhe diz na Regra que
você livremente abraçou:
cEm nome do Senhor. I ... ) Frei Francisco promele obediência
firoverénc:ia ao Senhor Popa Hanó.ia e seus legitimos sueena,e,. e à
Igreja Romano. I ... 1 OI irmão. não preguem no diocese dum bi~po
que lho tiver proibido. E nenhum irmão le atreva a pregar ~ra"te
O povo ~om ler sido examinado, aprovado e investido no afie:o de
pregador { .. . ,. Oul/onim, imponho sob obl!diênc:ia aIOs minidros o
-174 -
CARTA ABERTA A L. BOFF

obrigetõo de pedirem 00 Senhor Popa um dOl Cardeei, do Santo


'"
Igreja Romana pl\HQ govornor, proleger e corrigir estoa Fraternidade o
fim de que, sempre submissos e subordinados aos pés desta mesmo
Santa Ignja e firmes na fé cOlôlico, 9uordemo ~ a pobreza e o humil.
dode e o Sonlo Evangelho do Nono Senhor Jelius Cristo, que firme .
mente promelemol •.

E mais. No seu Testame nto, l'...""'Comcnda o Pai ScráCico:


cE o Senhor me deve ainda me dó lonlo ré nOI $oocordole. que
vive", segundo a formo do SontQ Igreja RomonQ, por cou so d. lUas
orden s, que, ..,elmo que me per$4!-guistem, quero recorrer o elel. E, le
tivesse IQnlQ sabedoriQ quanto o leve Salomão e ~ e encontrou e
miseros pad:es deite mundo, nOI paróquias em que eles moram nôo
quero pregar contrQ Q vontade deles. E hei de res~ilot, amor e
honrar a ere, e o todo ~ os oulros como O meus senhores". Nem quero
olhar parQ o pecado dele$ porque neles reconheço o Filho de DeuI
e elt, lão OI meu, sonhores, E procedo assim, porque do mesmo Filho
de Oeul nado enltergo corporalmente "este mundo leilÔO o leU lanti,.
limo Corpo o Sangue. que clcs consagram e lamente eles administram
001 oulra •• . I . .. I E aindQ: cE ord{:no severamente lob obediência
o todos os irmôol, d6r;go ~ e 'ei~ol, quc não foçom 910l<lS à Regro
nem a .,tol pO!<lVrOI dizendo: 'Allim é qUe de .... m ser entendida,'.
Mo., (orno o Senhor me (on(edeu diter e escrever de modo simplel
e claro a Regra e eslas palavras, assim as entendeis, com $impli~idade
e sem comentário, observa"do·o~ com $onlo feNor <lI' o fim». E o
Sonlo PolriarC:1I fecho o scu Testamento com riquissima b&ncão.

Meu Irmão Leonardo, deixe Francisco frear, e já! ~!

Sett Inniíb
Frei Cannelo SlIrian. OF!I

Frei Carmelo Surian, OFM


Rua Vigário Martiniano, 288
12 .500 • Gnaratln~etá - SP
Telefone: (0125) 32-3348

-175 -
CARTAS DOS LEITORES
Em PR 278/1980. pp. 86s, Coi publicado um comentário do
livro cCiéncia c Fé Face li FaCi!D de D. Estêvão Pierantoni.
A esse comentárlo o autor. em carla de 17/01 pp. , fez as seguin-
tes observações, que a pedido do mesmo, vão abaixo transcritas:
· PraUcamente, na a ...a''-çlo do Sr., nlo há menç'o .Iguma d..
IInhu-meatra. do livro. do m610d0 de anjllse • do recrulamenlo po. itl'lO
<SI cltncla no lõ&mpo l1IolÓllco-teológlco, , aI que eu esperava a crJUca
• 010 em detalhes Insignificantes do livro.
O 9r. piaria de que cada uma elas .ete parte. do livro t .....sse o
desenvol..,jmenlo de um Illtado; eu também, e as mall!rllll. merecem. Mas,
par•• Editora, er. voIumOlo dema l. o manuscrito que ApresenteI •.. IlI"Iaglne
••Ia 11.1&110.1
A Ironia • • egreulvldlda de .Iguma. p4glnas nlo me parecem
...g.rada. Irenle iII trucuNl ncl. de ",6,los 86blos modernos. A s inceridade
li li le>aldado par. com li nossa 16 e li nossa 19rela 010 admitem mel•• -
-PI'lvn•.
O Ilvlo "Imlna lulor8S malarlallstac, (lue (lu&llIIcam a Rellgllo de
nauro.. e • Tra dlçlo dI' nalclslsmo, elc:, Ela axam lna um ellegala c:at6lko
plogrenlsla, que acu •• • Iglilja de megalllmane a 'anaUcarnenla ag.nada
a Itadlç6es atradU,
Pois bem. Se eu consegull demonstrar que nauróllco é o mal8llalilla,
narcisista 6 o cientista 'posltlvo', megal6mane pode ser o elegela 'clenUsta',
ai um lanlo de Ironia e de agrasslvldade nlo 110 ,"oportuno•.
A mlnl\a deseontlança para com os 'sAbias por pronnao' .merge v',I ..
VIZes no meu modesto Irabalho, ma. estA bem fundamentada na In1roduçlo.
~ claro qua nlO se pode generalizar, poré", a ed\lertêncla • villda. Pena
que o Sr. tenha lido O meu livro, impressionado dama ls pela minha Irlem
para com o. '.lIIblo. por prollsslo'.
A fraM 'comer gato por labre', o Sr. ecl\a que nlo • linguagem de
um cientista. Oual clenll.la? Eu? Eu sou um caipira qualquer, e essa' a
minha vantagem.
~ que todos Podemos comer galo por lebre; Inclusiva o SI., quando
aUr ma qua eu 'admito a Intellgancla 11 o I.cloclnlo no gorila', nas pp. 210..
NII verdade, na.... pf.glna., ou sela, no cap. 2 da Par1e VI, é Rlchald
l ..kaV quem axpOe a cua teoria conforme estA nolado no Inicio do capitulo.
Eu analllo o que ela diz. no eepllulo 3. Allu, na p. 232 e ,obl'".tudo na
p. 262, a 'Inteligência' do chimpanzé 11116 claramente 'demltizada'. 56 1.,.
Uma palf;Vllnha sobre as minhaS 'allrmaçOBs lneulat'. Em v6rl.. delas
.u concordo na falia d. eKIIUdio; ma. do insignificante. enio "alla a peNl
Ir • procura dll'" RI aVIII.çlo lum'rla do 11"'0 lella pelo Sr., Inclu'MI
.lIl.IIndo-as fOI. do cont•• lo .m que teriam um. raz04\/111 compreenelo.
S8be--H, por ...mplo, (lua • palavra 'r_laçlo' nlo e unlvoca. Entre li
Re\l1llaçlo çonlliSa n. Sibila. a ' r......I.;lo· de um IIIme corre mulla égua.
Portanlo nlo • a••gereda a 'Ievelaçlo' apllcada à mOtou. Ioml.Ia, como
laz no contuto (p. t7".5).
Um d•• taqu. . .,*clal m.,acem os kllomas aslrengelroe dentro do
h.braico bibllco, qUa o Sr. dafenda.

-176-
CARTAS OOS LEITORES 89
- - _. ~=<!=-"""'-"==="--------""
Para quam oonllece veria, IIngvas modernas e antigas, a 'eslrangelr~
dade' da um idioma' dlllcll de ser delermlnada MS IInguas modernos, tanto
mab nas IInguas arcaicas. Eu acho que, mais do que 'Idiomas (melhor
'Idiomfsmo', polI idioma = IIngua) Clslrangalros dentro da elblla', deverll-
mos dlzsr que na Sibila se enconlram lermos, !rHeS " Ilg uras, e lambém -
por que nlo? - noç6n 'endirlas, comuns aas paIOS do anllgo Orlenls.
Ma 1550 nio loca n. autonomia da l'ngUl! hebraica em relaçio à Tor',
demonllreda no livro.

Tori • da l'ngVl 'ratle em releçlo .0


A lutonomla li a aulo.au!leilnela da IIngua hebralea em r.l&çlo à
AlcOflo nIo etilO na .ua or~.m
e lormaçlo, e sim quando ,Ias foram fixada. 80 livro sagr.do e li um.
determinadl nl,lo. A IIngUII hebraica, antes d6 sar usada na redaçlo di.
Tori, era '1Iada, e ra um dialeto antre oulros dialetos, e, mais ou manos,
misturado com ai.. , com termo., Irases, "guras comun•.
·Idloma. 81lrangelros na Blblla' que quer dlar?
Se na IlnOua por1ugUMl dissermos Que 'a lua 6 uma grande piua',
vaarlamoa um Idiotismo llanano pelo 'alo dO que a plna " de ollgom
italiana e a Irase <I u.ada tam b6m na itill.? Há tanlss flguris Ilradus da
natureza, comuna a QuaM tod •• •• lingua, do mundo. se bem que expressas
null'l4 orando variedade a8l1'1lnllea.
00 qualquer forma, o Sr. rep.are que tudo Isso nlo tam nada a ver com
CI obleUvo da Par1e V da minha moGesta obra J que exclui os mitos pagAos,
propriamente ditos, da Blblf....
Queira D. Estevão Pieranton i desculpai' ca falia de objeti-

..,
vidade. que -ele aponta no 'COmenté.rlo mencionado!

livros em estante
I.et: Ewantlles de "Enl.anc:. du Cluisl, por Aen~ Laurenlln. - Desc:loo
oi Dasclée de 8roU'Wer. Parls,?f ediçlo. 1982, 235 x 210 II'Im. 630 pp.
EIIle livro se dev. e um dos m.1s .b.llzados estudiosos dos ev. ngo·
lhos da Inl!ncla de Jesus IMt 1·2; Lc 1·2J. prolessor nas Universidades
Católicas de Ang8ft e P.ris e .utor da \'6'1 •• publlcaçoas SODre o tema e
sobra Marlologla.
A obra .upa. trll\la anos de meUculO$O estudo do ....unto. QUI el.
eonsidarl alt8usUvam91'11e .ob os aspectos da 8KegMa 8 di. seminUa, da
tlistorlcldada a ali leologl.. e plalaelada paio Cardeal Joaeph Ratzlnger,
DO. Pr.felto da S. Congr.gaçlo par. a Doutrin. da FI. A conclus60 d.
laurenlln prof.... : - Os E.,.ngelhoa da Infi nda per16ncem lO glnero " li-
tO,lco" (p, ~Z4) . Para çhegar .. lanlo, o aulor consklorou o texlo blbllco o
o perscrutou .egundo o mélodo da exegese mai. recenle lo da hlstóri.
d., formasl, com todo. os s.us requintes; na bibliografia &lo citadas 640
unidades. Onlra livros e arllgosl '" tese do Pe. lauranlln é enunciada cons-
cientemente numa Ilse di hl,tórl. e da piedade em que multas duvidam
da .utlntlcldada dOI Evanglllhos da tnllncla ou mesmo. negam: o lulor
mostra que tal. atitudes 10 devem a um axamo preconcebido ou superll·
-177 _
90 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS, 229/1985

elal dos ' (1.10' sagrados: ninguém 81é hoje 101 tAo a fundo li de maneira
tio objetlya CI .6rla no estudo de tais see~es; por i.to ninguém asl' mal,
abalizado pa,.. dla.rlar lobre Ial temática do que LaurenUn.
AgJ8c1ecemOl lO autor o valioso trabalh o o fazemos votos par. que,
um demor., teJa lr.du~ldo par. o português.
Not Bulido'.. do VatleaM, pór Gordon ThoMas • MIfIIx MOfglln Wills.
Traduçlo de Aulyde SoarH Rodrlçuos. - Ec!. Reçord, RIo cre Janeiro 1983,
140 lt 210 mm. -422 pp.
Gordon l homaa li Max MOlgan Witts 8Ao jornalistas Inglese. qUI
pesqul$anm durante Ilh anos no Vaticano li fora. respeito <los trh Papas
Paulo VI, Joio Paulo I • Joio Paulo 11, procurando reconstllulr a hlst()rla
mlnucioH dos 8) di.. de 1978, em que trés Pontlflcos sucessivamente
governaram • Igreja CatOUca; o livro se refere oullosslm lO alentado
lot.'idg pelo alUI' Pipa em '3/05/1981.
Os dois aulores ditem ter ouvido conlid'nclas e revelaçi5es de pes-
IOU gradUldu n. 111")1 CalÓllca, de modo a poder revelar "sell'edos" do
VatIcano. O tom que perp.asu o IllvIO, 6 mordaz e sarc"Uco, tendendo
mesmo a carlcatulal. Todal/la nlo se trata de uma obra IlIio matdosa Quanto
• da Olvld Yallop ("Em Nome de Deus"); os três Papas alo considerados
com certo respeito - o que nlo aCOn18C8, porém, com mul10s doa seus
aultlllares.
A propósito do tIpo de morte d, Joio Paulo I, os doia Jornallatas dio
e entender Qua .. tralou de uma trama da KGB (I(omltel Qosuda,.tvenno)'
6er.opatlOnl) ou da policie s.cra .. rvssa; se o Papa 101 .n.... nenlldo. o mortl·
clnlo daverla ur atrlbuldo a agenlas da Aussl, Inliltrados no VaUcano (cl.
pp. 2451. 261. 27:2) . - Ali", o livro todo relere minúcias relativas a Mahmel
Ali Agca, cu" IIldela nalal e vida parllcula, os dois jornalistas investigaram
atentamanta; por con.egulnta, Gordon Tl"Iomas e Max Morgan Wltts nio
concordam com David Vattop no loea.nte li. causa do falecimento do PaPl
Joio Paulo I. Anas, 010 s ..... por que procurar tal causa em alguma trama
auasslna.
O qua chama • a'ençlo no livro em paula e lhe lira mullo da aua
credibilidade, • o alllo de romance ou de novela que os autores adotem.
Quem li a obre, tem a ImJ)ra.!Ib de estar diante de uma obra de licÇlo
policiai com lodo o MMaclonaUsmo q..,. desperla. Com elello. os avlor"
alo ·capaz..~ de penetrar denlro do pensamenlo dos perlon.geM li dll.lr
OI sentimentos que cacla quat trazia em l8u (nUmo; '''iam-l tI, por el\81'l'lplo,
a5 seguInte, passagens : "Noê conllnua petrificado. fata cerlo de que
JalRals houve uma cana Igual a esta na capela Slxlina- (p. 2114) . " Hurna
aenl.... "","per'damenle trlsle por aquela ~.omam" ( p. 295) . MKoe nlg
seole-se aliviadO" (p. 29Sl. -Koenlg imagina &8 a agua MS larras .. . 101
IIoc.d. desde o unimo Interregno" t p. 245) . -O Camertango to...• (p.295'.
·0 arceb"po d. FlladO"1ti plg.rrelti" (p. 303). " Wojtyla pisca os olho,"
(p. 296) . " Tom. IWIho d. chuveiro com agua gelada no lim"
Ip.310) ••• Em luma, alo ptes toplcoa que dAo vivacIdade ao l!vro, mas
que o. certo modo o desacreditam; uma obre dentrllca costuma •• r 'óbrla
e clrcunlpecta em lua, allrmaç6e •.
Saba...., porém, qua obras .oble o Vatleano sa tornam lacllmenle
bnt-HIlar a lonle de grlllnde, rendimento,"; multas vezes Intolesse••enll-
.aclonaU.'as e tendenciosos a. Inspiram, como se pod-e depreender do artigo
publicado em PR :218/1G85, pp. 51-60. Até que ponlo .. poderia aplicar
esta verlllcaçlo a obra am pauta?
- 178
LIVROS EM EST ANTF. 91

A Arte ele Mo~r, I)Or J. Vasconcelos Sobrinho. Ed. VOlel, Petr6po-


lia 1984, 140 x 210 mm, ID2 pp.
O PIai. J. Vasçoncelos Sobrinho 6 Ulular da diSCiplina de Ecologia da
unfver.klade Federal Rural de "'rnllmbuc:o, fundador e s..,pervlsor da &1.1 •
.çAo EcolOglca de Tupacuru. NAó professa determinada çfença reUgiosa,
m.. mOltrl'" claramontesoguloordo panttlsmo hindu lata (cl. pp. 12.18.,. I,
que ele apresentl denlro de t6rmule. crlsth Uradas do Novo Test.mento
ou de "crllol de fII estres crlstlos.
Par. o autor, -a morte 6 um len6meno da tranl:lfer6ncla de conscltn·
ela. ~ tranlferêncla da eOMc"neia da sua expressA0 limitada como cons·
cltncla obJ.tlva, depend.nte dO c6reb€o, pera unia Iorma do conl-Cltncll
Inde~ndente de qUl lquer luporle melerla' · {p. 291 .

Essa lransl.ranela d. conscl6ncla t justillcada pele alegaçlo de que


·0 hom.m • um ser extraordln.rlarnenle complexo, possuindo, al4!im da
um corpo blo16glco, drto! pllnos di consclêncll que se condicionam e
se . uperp&em· (p , 21) .
ConUnue o aulor; · Por tr" de lodos esses pianOS de. çonsd6ncll,
como sua I.1l • origem, tl"llnlcendendo do coleUvo humano, alcançando
toda a vida nl Terra. al6m da Terra, tudo qUinto exlsl. no uniWIr.o •
do (,tnlwrfO, ha um prano lundllmenlal da consci6ncla que tudo abrang .. CI'
tudo .ncerrl, origem pllmlrra de ludo quanto ....m 6 .xlstêncla" (p. 571 .
Ess.e r.alldade primeira ••, .. I Divindade mesma, pois .somenll como dMne
poder...la quallllolHa {cf. p. 571.
Em oulru palavras : a morte seria a lomada de consclêncll de que o
hom.m tem em 1i um. parcela da CNlndade; .. corporeldade .. ria empe·
cllho plra I.Into. Pai 1"0 a Irt. de morrer consiste em que cada um IJud.
a si mesmo a toma, conlclanela do seu lundo dtvlno e proporcione aO'
oul,OI I oportunidade de reconhecer o 18U "'mpessoal divino· h:I, p. 621.
No "SO de uma pessoa menos .",Isadl, que nlo conheça .utamenl.
o processo da morle. o autor aconselha ajuda ao morllM,lI'Ido a tlm d. mano
ter I SUl mente. canalizada para aquilo ql,l8 ocorre no momento di morte.
pois disto depend .. r' a SUA salYaçlo. Se o Individuo na morte perder I
oporlunldade de lO unir li ClIra luz Divina., ele 8S$umlrll um estado ,"lar-
mediaria (purgal6t1o ou Infernol comandado por sua consciência sub}etlY8.
O autor quer Justlflcl\'" SUl lese panlelala com 181\101 óo E....,..gltho;
-et»1o mlsmo ravtla: V6s sois Musasl E mullos mllllcos de todos ot-
Cridos ..nlern-4e kltntlces • DI'Ilne Eaa6ncIa'" (p. 75) .
OI• •vtdenlemenle tais concepç60s nlo l i conclUam com • " cllstl.
&Ie ensina que o homem .. um composto de corpo e alma, .mbol d istintos
cta OIUI, porque crlldos por Ele. Corpo • alma se complelam durante a
vida presente; lodavla. quando o corpo ae daterlora • ponto de nAo mllS
podflr Nr sed. da vida humlna, ...'ma esplllllJ8l (que li lubsllncla .Im-
pie. e ImOTt.n •• per.... d.1e e uaulrut da aua sorte Cannltlv8, .am o corpo,
at6 o dia da conaumlçJo dos tempos, quando 18 dar' I ressurrelçlo de
carn. ou a racompoalçlo do homem (COlpo e alma)
Nlo pOdemos deitar de registrar uma vez mel, a nossa profunda
estrannelll pelo lato de que uml Editora lida COfllO cat6llea, qual li VOZ",
publlq~ livros que .nllnam o pantel.mo, ,., e o enolnam de modo a Inll-
nuar qUI corre.ponde exatamente • Doutrina blbllca • l Tradiçlo crl.lI.
Seria heneslo di parti da Editora d ..cllrar-se econf.aaional, de tal IIOl1e

-179 -
.. PERGUNTE E RESPONDEREMOS,. 229/198.;
"
qUft o publico nlo ae Iludisse a respeito das suas pUblicaçOes: os lellores
InadY(Jrtldos podorlo r.almenle cr.r que o panlelsmo e a int.rpretaçlo
genulna da mensagem crlsll. A. propOsllo das ediçoes ."UcatÓlica. de
Vozes, veja PR 211/1983 pp. 485s.

sentido • atUIIlldada cio Cn.lo , por HeI! de Alm eida Sampaio.


Ed. prÓpria, 1982 (21'), Salvador, 135 X 205 mm, 197 pp. .
O lutor 6 esplflta (I Inlerpreta a figura li 8 doutrina de J es.us ... 1w:
dos princlplol kardeclsta, - o que desllgura totalmente O Divino Mestr•.
Os "111 dlz'fU pode", impressionar ,.Ivez o lellor pelo 'ala de te revallre",
da clrlo aparato do .rudlçlo: O autor conhece um pouço de hls16ril do
judallmO • do Crl,nanlsmo, que ale (:Onsldara sempre a patllr da pl.mlaNa
nlo crl,Ia.. Na verdade, o livro carece de valor clenllllco, pois 6 obra
preconceituosa; li p. 107 parece querer avocar alé mesmo o PIo Oscar
Ouevedo em JaVOl'" d. lUIS teses esplritul O Dr. Hell Sampaio pod.rll
propugnu o "plrlUamo se o quisesse, sem, porém, lazer de J.sus um
Grande médium da história.

A. r•• p.Uo di ".nearnaçflo, 110 . nfalluda pelos .splrllos, ver IS


pp. 143-151 d68te '.selculo, onde também do apresentada. '1áriat conslde·
flÇCeI &obre o esPllllllmo.
a que '1amOI Ilur no c6u?, pelo Pe. AntOnio Klein, SVO. - Ed.
loyola. 510 Paulo 1984, 138 x 210 mm, gS pp.

o Pe. AntOnio Klein é um ardoroso missionário Que, lê em Id.de


..... nçad•• publica e Irulo de I UI experlênc::la pasloral e de suas mediteç3e• •
Ten ciona responder suma pergunla multo freq(lanle, r.lall'la ti bem-
-a\/enlufln~ celeste, alSe\/erando que no cáu amaramos a DeUI • crllre-
mOI .. , Expllcande melhor, o Pe. Klein allrma que a felicidade deflnlU'1I
'afá IUl1ar am céus noVOl a larra nova. ou sela. n9&le mundo transllgurado.
• quo .ql,l! 'orClmos o ~casllo do trabalhar: "'JO.\IS n80 pro~leu uma
morada pronllnha. 00 masmo modo que nos 101 d.da a terra InaCllbada.
assim nos . erá dad • • morada do futuro. Inacabada. ~ra que o hemem
glorioso po$5a exercer a sua '1ocaçtlo de amar e crior" Cp. <48). ·Sa 6
.ardada que teremos uma morada no mundo novo que há do 'Itr. osta
mofada 'am do aer: InOlvlduat, pr/'1.tI.... . lndeYassáwlll e Imen.sa- (p . 47). -
a que a propósllo podamos dizer. é que tais conce~es carecem de
fundamanto na ' ,ad!çlo da IgreJ. : derlvam-se de de'lanelos tla 'anlula. A
propc)lllo da bem-aYflnturança c:elltsle cOlTd:m ao cr/stao manter sobriedade
de dlseurwo. po" . a Irata de Indlzlwtl Ccl. lCof 2,.9); o m6todo mais
eflclante para podermos ter rwy&o da meama •• a experf6ncla de De",
quo cada um de nt. '1al flzendo na lerra pela 11delklade l i lI'I096es do
Espira0 &&nlo.
M_agalre do Sagrado Coraçlo de ",,111.
Eis uma ravlsta de es plrl-
tualidade sólida. 6rglo mansal do Apostolado da Oraçlo, a08 cuidados do.
PP. Roque Schneldtr • GaMal Galache S.J. O eslilo da revl.1a 6 multo
agradflYel, ao mlSmo tempo que portador da profunda. rOUa)(688. que ultra,
passam o tmblto do Apostolado da araçlo e aervem de modo ge'al aos
fiéis calOl1col. ASSIn.alura anual: crS 8.DOO. Pedidos • EdlçGes Loyola-
-Men.agelro, Caixa postal 42 .335, 001218 510 Paulo (SP).
E.a.
-180 -
E DI ÇC ES "LU M EN C H RI5TI"
MOSTEIRO DE SÃO BENTO
Rua Dom Gerardo 40. - 51? andar - Sala 501
Caixa Postat 2666 - Te!.: (021) 291-7122
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1. FtlQUElAS DA MENSAGEM CRISTA (2. ad.I , por Dom Cirilo Folch


GomltS 0 .5 .8 . (lalecldo il 2/1:2 /83) . Teólogo conceituado, lulor de
um I,a,ado completo de Teologia Dogmática, comentando o Credo do
Povo dê Deus, promulgado pelo Papa Paulo VI, Um alentado volume da
700 p., best Hller de nossas Edlç6es, eul_ "ad""l o etpanhola ..'i
sendo preparada pele Universidade de VaKtnc ia - Cr$ 2" .000

2. A DOUTRINA OI. TRINDADE ETERNA, do mesmo AulOr. O significado csa


ellpreul o -T,,, Penou-, Ul1IiI. 410 p. - CtS 20 .000

3. O MISTIlRIO DO DEUS VIVO, P. PaUlon, O. P. O Autor 101 eumlnador


de D. Cirilo para a conqul$UI da 16urea de Ooulor em Teologill no
InsUlulo Ponllrlelo Sanlo Tomo de Aqulno em Roma. Para Prolenore.
fi Alunos de TOQlogltI, • um trilado de ~ Deus Uno e Trlno- . de orlen&&-
çllo Iom ls la a de 1r40'- dldAllu, 23D p. - CrS 12 . 000

.. . UTUROIA PARA O POVO DE DEUS (3" fld .• 19IW1, pêlo Sale.leno Dom
Carla Fiora, Irad~ de O. Hlldebrando P. Marl1ns. OS6. Ed~
ampliada a alualluda, apresenla 8m lIo0l.l80em simples lodll a doutrina
da eonslJlulolo Ulôrolea do Vaticano 11. ~ um breve manual para uso
em 5lmln6rlo., Novlcla!kll, Colégios, Grupos de 'e!!exlo, Rellros ele.,
218 p. - CrS 4 .000.

ATENDE-$E PELO REEMBOLSO POSTAL


NOVIDADE - '" ..Ir brevemenle

1. Vot. VI da Coleçlo A PALAVRA DO PAPA: CONSTITU1ÇAO " SACA0-


SANCTUM CONCIUUM" lobre a Sagrada LiturSia.
Edlçlo em lalim· pottugu6e, 152 p6gs, O I" documenlo aprovado paio
Concilio VaUea.no 11 em ~ de dezembro de 19&3. Reed itado pela grande
procura do documenlo, esOOlado hé. drtos an05.

2. ANTROPOLOGIA E PRAXIS no pensamenl0 de Joio Paulo 11.


Toda. . . conferênc ias pronunciadas no Congresso Inle,naclonal r••li,
lado no Alo de Janeiro sob o palroclnlo da ArquidioU $8 e do Ponlillcio
Conselho pai' • Cultura (V.tlcano) , além da cooper.çlo da Sociedade
Br"'''',,, de FII~Joa C.tóllcos e do " '5IiluI0 di Sludl per ta Transi.
lione~ de ""1110, da PUC do Rio, do Centro Cultural CAndido Mendes,
da Faculdade Eel"", tlea de Fllosrolla João Paulo 11 do Rio, Centro
Dom Vital. C'ELAM,

o Congresso reallzou4e no ludit6rio do Edillcio Joio Paula 11 com


uma IreqQêncla constante e maciça de mais de Irezentas pessoas.

3. O BARROCO NO MOSTEIRO DE SAD BENTO

1. Moalllro de S.lo B,nle : Grande Album de luxo em esloJo,


lormato 38,S li ::lI.

Telllo em pOlluguts e Ing lês por Dom Marcos Barbosa. 18 IrUsUcas


folografl •• (prelo--Drancol por Hugo l eal, o mesmo que letogrlfou
Ouro Preto e Salvador.

Como nem lodos podem vir ao Rio de Janeiro 011 pene irar no re-
cln'o da clausura, poderio, contudo, admirar a beleza arquil8l6nlcl
desse monumento colonial do inicio do século XVII.

Novidade da. Ediç6es "Lumen Chrisli- - CrS 120 .000.

2. Album com 30 dh.n.hos leitos a blcooode·pena por IrmAo Bruno


Pedrot.a. A."esenlaçlo de Rachei da Ouelroz, telllo de Clamaldo
do Prado Vallada"s,

Formato 3D x 24 .. ..... . , ..... . C<$ 10 . 000

J. Album menor: com 6 de5enhos a blcO+de-penl , de aUlo,1a de Irmlo


Brllno Pedrola, com lelllo de o , Marcos Barbosa.

Formale 22,5 li 16 . _ .. . C<$ ' .000

" ATENOE-SE
. , .' PELO REEMBOLSO POSTAL
,. ; ..

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