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INFLUÊNCIA DA FARMACOPEIA CHINESA NO TRATAMENTO DA

HIPERTENSÃO ARTERIAL PRIMÁRIA

CARLOS FILIPE AMARAL BAPTISTA

Monografia no âmbito da Pós Graduação em Medicamentos e Produtos de Saúde à Base de Plantas orientada pela Doutora
Mónica da Rocha Zuzarte e apresentada à Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra.

Março de 2020
CONTEÚDO

RESUMO……………………………………………………………………………………………………………………………………………………… 3

1. INTRODUCÃO……………………………………………………………………………………………………………………………………….......4

1.1 OBJECTIVOS……………………………………………………………………………………………………...………....................... 7

2. HIPERTENSÃO ARTERIAL: UMA VISÃO OCIDENTAL……………………………………………………………………………......... 8

2.1 TIPOS DE HIPERTENSÃO ARTERIAL…………………………………………………………………………………………. 9

2.2 FACTORES DE RISCO NA HTA……………………………………………………………………………………….................... 9

2.3 VARIÁVEIS QUE REGULAM A PA………………………………………………………………………………………………… 10

2.3.1 VARIÁVEIS FISIOLÓGICAS:…………………………………………………………………………..............…….. 10

2.4 CONSEQUÊNCIAS DA HTA………………………………………………………………………………………………………..... 11

2.5 TRATAMENTO FARMACOLÓGICO CONVENCIONAL…………………………………………………………………..... 12

3. HIPERTENSÃO ARTERIAL NO ORIENTE……………………………………………………………………………………………………. 14

3.1 TEORIAS BASE DA MTC………………………………………………………………………………………………..................... 14

3.2 ESTUDOS QUE RELACIONAM FARMACOPEIA CHINESA COM A HTA………………………………………….… 16

3.3 FARMACOPEIA CHINESA NO TRATAMENTO DA HTA…………………………………………………….................... 19

3.3.1 FÓRMULAS PARA ASCENSÃO DE YANG DE FÍGADO…………………………………………………… 21

3.3.2 FÓRMULAS PARA DEFICIÊNCIA SIMULTÂNEA DE QI E DE YIN………………………………….… 21

3.3.4 FÓRMULAS PARA DEFICIÊNCIA SIMULTÂNEA DO YIN DE FÍGADO E RIM…………………..... 27

3.3.5 FÓRMULAS PARA ESTAGNAÇÃO DE XUE…………………………………………………………….......... 29

4. REFLEXÃO, CONCLUSÃO E IDEIAS FUTURAS…………………………………………………………………………………………… 29

5. BIBLIOGRAFIA………………………………………………………………………………………………………………………………………..... 32

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RESUMO

Pretende-se com esta monografia dar a conhecer uma nova forma de pensar no tratamento da
Hipertensão Arterial (HTA) tendo como base a farmacopeia chinesa, numa altura em que notamos
uma maior procura dos chamados produtos naturais, não só pela ideia de que são mais baratos e
seguros, mas também porque estamos perante mudanças de legislação importantes no que diz
respeito às terapêuticas não convencionais.

Desta forma procurou-se compreender o que realmente é a HTA, de diferentes pontos de vista, quer
ocidental, quer oriental, quais os seus tipos, que variáveis regulam a pressão arterial, quais as
consequências da doença e que fármacos e diferentes formulações fitoterápicas chinesas estão
associados a esta patologia.

Identificaram-se duas raízes frequentemente prescritas em diferentes formulações chinesas. São elas a
Radix Rehmanie conquitae e a Radix Dioscoreae como duas potenciais plantas a serem estudadas no
âmbito farmacêutico convencional, prescritas dentro da fitoterapia clássica chinesa e que se sabe
terem bons resultados nos sinais e/ou sintomas da HTA. De todos os artigos mencionados acerca deste
assunto, a maioria aponta neste sentido: Uma vez identificado o síndrome energético oriental que está
por detrás desta patologia, a prescrição de fórmulas chinesas apresentam-se como bons coadjuvantes
do tratamento convencional, mas são necessários mais estudos para validar os efeitos, já que muitos
dos existentes não têm significado estatístico.

Dos artigos encontrados, pouco se fala acerca do risco de toxicidade de cada uma das plantas
prescritas e de possíveis interacções. Apesar desta ausência de informação pela farmacopeia da
república popular da China, aprovada pelo ministério da saúde pública, nenhuma das plantas
apresentadas é considerada tóxica.

Parece que existem alguns compostos relativamente recentes, validados farmacologicamente, com
origem na farmacopeia chinesa que têm acção na HTA, sendo eles a berberina, isoliensinina e a
rincofilina, que actuam como vasodilatadores em vasos sanguíneos periféricos pela sua capacidade de
actuação no sistema nervoso simpático.

Palavras-chave: Hipertensão arterial, Farmacopeia chinesa, Fitoterapia, Pressão arterial, Medicina


Tradicional Chinesa.
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1. INTRODUCÃO:

Certamente, a maior parte de nós já ouviu falar de alguém que teve de ser socorrido hospitalarmente
e que um dos primeiros actos terapêuticos foi a simples toma de um pequeno comprimido oro
dispersível. Admirado? Que comprimido é este? Perguntamos nós. Com grande probabilidade a
resposta alcançada é a de que este é um hipotensor, fármaco que diminui a pressão arterial sanguínea
de uma forma rápida, de forma a evitar consequências maiores como Acidentes Vasculares Cerebrais
(AVC), Enfartes Agudos do Miocárdio (EAM), entre outras complicações cardiovasculares. Vejamos
neste momento alguns números acerca do assunto, não só em Portugal, mas também na restante
Europa e a nível mundial.

Em Portugal no ano 2007 surgiram vários estudos acerca da Hipertensão Arterial (HTA), ou Pressão
Arterial (PA) elevada. Num estudo sobre “Prevalência, Conhecimento, Tratamento e Controlo da
Hipertensão em Portugal”, observou-se que a PA elevada em indivíduos do sexo masculino, com idade
inferior a 35 anos, seria de 26,2%; em idades compreendidas entre 25 e 64 anos, seria de 54,7% e em
indivíduos com mais de 64 anos seria de 79%. Para mulheres a prevalência seria de 12,4%, 41,1% e
78,7%, respectivamente. O dado mais alarmante deste estudo é que do grupo estudado apenas 46,1%
sabiam ser hipertensos (Macedo, Lima, & Silva, 2007).

Já Gorjão Clara, et al., 2007 afirmaram que a HTA tem prevalência mais elevada nas mulheres e tende
a aumentar com a idade, diminuindo após os 70 anos, estudo efectuado numa população já em
tratamento. Os autores afirmam também que a HTA na população portuguesa não tratada, com idade
superior a 55 anos, de acordo com os critérios da Organização Mundial de Saúde (OMS) é de 44,92%
(Gorjão Clara, Macedo, & Pego, 2007).

Em 2008, um estudo efectuado em indivíduos com uma idade média de 59 anos mostra que 61,3%
dos indivíduos hipertensos seriam mulheres (Cortes-Diaz, Martins, & Belo, 2009).

A título de exemplo, em 2010, um estudo na cidade do Porto acerca da HTA mostra claramente que
indivíduos não praticantes de exercício físico regular têm prevalência mais elevada do que os que

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praticam exercício e que a prevalência de HTA em ambos os sexos é maior nos indivíduos não
praticantes de exercício físico (Machado, Alves, & Tinoco, 2010).

Em 2011, num outro estudo em que a idade média foi de 53,7 anos a prevalência da HTA foi de 54,8%.
Cerca de 70% dos hipertensos estavam sob tratamento anti-hipertensivo, dos quais, 47,7% estavam
controlados (Oliveira-Martins, Oliveira, Gomes, Caramona, & Cabrita, 2011).

No ano seguinte, em 2012, um estudo da prevalência da HTA em adolescentes portugueses com idade
média de 16 anos, da cidade de Lisboa, revela estados de pré-HTA e HTA, geralmente associados a
factores de risco como a obesidade (Silva, 2012).

Existem ainda estudos que mostram uma tendência para o aumento do número de casos de pessoas
hipertensas nas faixas etárias mais jovens e para um aumento da dependência constante de
hipotensores (Nichols, Townsend, & Scarborough, 2012; Polónia, Mesquita Bastos, & Pessanha, 2010;
Flaws & Sionneau, 2005).

O estudo mais recente encontrado acerca da epidemiologia da HTA na população portuguesa, data do
ano de 2014. É um estudo de revisão com dados compreendidos entre os anos de 1995 e 2013, cujo
resultado mostra um maior número de estudos sobre populações da região norte do país e a
inexistência de estudos específicos sobre as populações do Alentejo e do Algarve. O estudo critica
fortemente a omissão dos diferentes métodos de medição da HTA nas suas fontes, a rara
desagregação dos resultados por sexo e idade, assim como a assimetria da cobertura geográfica da
população o que dificulta a monitorização das tendências da frequência da HTA em Portugal (Uva,
Vitorino, Roquette, Machado, & Dias, 2014). Os mesmos autores afirmam ainda, que da população
estudada, apenas 70% tinham conhecimento de que que eram hipertensos e que dentro destes 70%,
apenas 48% tinham os valores da PA controlada, mostrando que existe um intervalo de 52% sem
controlo o quenos pode levar à procura de diferentes formas de tratamento incluindo coadjuvantes.

Estamos perante uma questão de saúde pública, onde todas as ferramentas de combate são
necessárias (Flachkampf, Gallasch, & Gefeller, 2007).

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Dados europeus publicados em 2012 de um estudo realizado no ano de 2008 em indivíduos com mais
de 25 anos, mostram que em Portugal 41,9% da população seria hipertensa, dos quais 46,5% seriam
indivíduos do sexo masculino (Nichols, Townsend, & Scarborough, 2012).

A nível mundial estima-se que 1,13 biliões de pessoas sejam hipertensas, dados actuais da OMS à data
da elaboração desta monografia. (https://www.who.int/health-topics/hypertension/, 28.02.2020)

O mais preocupante é que a HTA já é tida como “normal” pelo elevado número de casos
assintomáticos, cuja solução muitas das vezes é dependente de fármacos e pode simplesmente ser
contrariada pela alteração dos estilos de vida prejudiciais, incentivando uma melhor forma de
alimentação, exercício físico moderado e correcto descanso (Polónia, 2006).

Dada a actual conjuntura económica e social onde a maior parte da população vive em dificuldades
acrescidas, por observação e senso comum, notamos uma maior procura dos chamados produtos
naturais, não só pela ideia de que são mais baratos e seguros, mas também porque evitam o tempo de
espera nos serviços de saúde. A ideia do que é natural é bom, aliado à convicção de que se não faz
bem, mal também não faz, parece originar um consumo desenfreado e desregrado de fitoterápicos. Já
em 2012, mostrou-se que à semelhança do resto da Europa, também em Portugal se verifica um
padrão de consumo terapêutico dual, onde o que é natural já assume especial relevo (Lopes,
Clamonte, Raposo, Pegado, & Rodrigues, 2012).

Após o surgimento da Lei nº 71/2013, de 2 de Setembro, DR nº 168, que regulamenta a Lei 45/2003,
de 22 de Agosto, relativa ao exercício profissional das terapêuticas não convencionais, a
responsabilidade de cada terapeuta que prescreve fitoterápicos, quer ocidentais, quer orientais da
farmacopeia chinesa, é cada vez maior e apesar dos seus efeitos terapêuticos comprovados, não
devemos descurar os conhecimentos farmacológicos convencionais. Deste modo surge a necessidade
de levar a um maior número de pessoas da área terapêutica convencional diferentes formas de pensar
em saúde, mas de uma forma consciente e cientificamente validada (Asher, 2010; Izzo, 2005).

De realçar que estudos científicos acerca da influência da farmacopeia chinesa no tratamento de


doenças do tipo “ocidental” como é a hipertensão, não mostram resultados animadores e nenhum
estudo português foi encontrado até à data. De acordo com as pesquisas efectuadas nos principais
portais de divulgação científica como o Research Gate© e a PubMed©, com diferentes palavras-

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chave, referentes ao tema desta monografia, os poucos artigos que surgiram são de revisão, havendo
pouca informação sobre a eficácia, qualidade e segurança do uso da farmacopeia chinesa como forma
de terapia não convencional. Apenas um pequeno exemplo: na PubMed© utilizando palavras-chave
como “Chinese herbs”, “High blood pressure” ou “Hypertension” surgem apenas cerca de 150 artigos
científicos no total, sendo poucos os que relacionam a farmacopeia chinesa com a farmacologia
convencional.

1.1 OBJECTIVOS:

Há então que compreender o que é realmente é a HTA, de diferentes pontos de vista, quer ocidental,
quer oriental, quais os seus tipos, que variáveis regulam a PA, quais as consequências da doença, que
fármacos e diferentes formulações fitoterápicas chinesas estão associados a esta patologia, para que
se possa:

 Conhecer que plantas da farmacopeia chinesa são mais frequentemente encontradas no


tratamento da HTA primária;
 Perceber como funciona a construção de fórmulas chinesas à luz da MTC, fazendo o confronto
com seu potencial farmacológico;
 Procurar a existência de compostos de interesse farmacológico na farmacopeia chinesa com
potencial acção no tratamento da HTA;
 Verificar se existe validade científica destas fórmulas chinesas, sabendo que são baseadas
numa filosofia muito própria e de longa tradição.

E por fim, verificar se existe ou não influência de um dos principais ramos da Medicina Tradicional
Chinesa, no tratamento da HTA que é a Fitoterapia Chinesa.

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2. HIPERTENSÃO ARTERIAL: UMA VISÃO OCIDENTAL

A HTA é uma doença vascular crónica, provavelmente um dos maiores problemas de saúde pública
nos países desenvolvidos, facilmente diagnosticada e tratada. No entanto, dada a ausência de
sintomatologia específica, muitas das vezes surgem outras complicações fisiológicas a nível dos rins e
do cérebro, sendo a HTA considerada pela OMS um dos principais factores de risco para a elevada
mortalidade associada às doenças cardiovasculares. (https://www.who.int/health-topics/hypertension/,
28.02.2020)

Na HTA, algumas manifestações clínicas podem surgir, tais como, tonturas, cefaleias, rubor facial,
fadiga, epistaxes e nervosismo, no entanto nenhum delas é específica desta patologia podendo ser
resultantes de outras complicações. As cefaleias geralmente são localizadas na zona occipital, mais
intensas de madrugada, acompanhadas de zumbidos e sensação de peso na cabeça (Hauser, Longo, &
Jameson, 2005).

A HTA é caracterizada por níveis elevados de pressão sanguínea nas artérias, que obrigam o coração a
exercer um esforço acrescido para fazer circular o sangue. A pressão sanguínea envolve duas medidas:
(1) Pressão sistólica, correspondente à fase de contracção do músculo cardíaco (Sístole) e (2) Pressão
diastólica, correspondente à fase de relaxamento do músculo cardíaco. (Diástole) (Guyton & Hall,
2002; Hauser, Longo, & Jameson, 2005; Mota Pinto, 2013).

Entende-se como Pressão Sistólica (PS) a força exercida pelo sangue numa determinada área das
paredes das artérias aquando o fecho da válvula mitral, a contracção ventricular esquerda e abertura
da válvula aórtica. Esta fase de contracção é designada como a Sístole no ciclo cardíaco; e como
Pressão Diastólica (PD) a força exercida pelo sangue numa determinada área das paredes das artérias,
aquando a abertura da válvula mitral, fecho da válvula aórtica e relaxamento do ventrículo esquerdo.
Corresponde à fase diastólica do ciclo cardíaco. Valores de PS acima de 140 mmHg e PD acima de 90
mmHg, apontam para quadros de hipertensão (Mota Pinto, 2013).

A PA depende de variáveis como o (1) Débito cardíaco definido pelo volume de sangue bombeado pelo
coração por minuto; (2) Resistência periférica entendida como a força de atrito na passagem do
sangue pelos vasos de menor calibre e que em parte depende do sistema nervoso simpático que
regula a vasoconstrição (receptores Alfa) e a vasodilatação (receptores Beta); (3) Elasticidade da
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parede dos vasos sanguíneos; (4) Volemia e (5) Viscosidade sanguínea (Porto, 2001;Guyton & Hall,
2002; Mota Pinto, 2013).

2.1 TIPOS DE HIPERTENSÃO ARTERIAL

Do ponto de vista etiológico pode-se classificar a HTA em dois tipos principais: Primária e Secundária
(Hauser, Longo, & Jameson, 2005).

Entende-se como Hipertensão Arterial Primária, toda a pressão arterial elevada sem uma causa
definida. A grande dificuldade de lhe atribuir uma causa concreta reside na variabilidade de sistemas
que estão envolvidos na regulação da pressão arterial como: Sistema Adrenérgico; Sistema Nervoso
Central ou Periférico; Sistema Renal; Sistema Hormonal; Sistema Vascular. Este é o tipo de HTA a qual
se procura estudar.

HTA Secundária é toda a pressão arterial elevada que tem origem bem identificada. Apesar de ocorrer
numa pequena minoria dos doentes, este tipo de hipertensão não deve ser ignorada na medida em
que ao tratar a causa principal da patologia conhecida, estamos de imediato a corrigir a PA.

Quase todas as formas de HTA secundária estão relacionadas com alterações hormonais e/ou das
funções renais. A Hipertensão Renal resulta quer da alteração de secreções renais de materiais
vasoactivos que provocam mudança do tónus arteriolar local ou sistémico, quer de desequilíbrios na
concentração de sódio que alteram a relação renina angiotensina. A Hipertensão Endócrina ou Adrenal
é característica de complicações anormais das supra-renais (Hauser, Longo, & Jameson, 2005).

2.2 FACTORES DE RISCO NA HTA

Embora as causas da HTA primária ainda sejam desconhecidas na medicina alopática, existe um
conjunto de factores que têm influência nesta patologia. A HTA surge muitas vezes associada a
factores de âmbito externo, como por exemplo, o meio onde estamos inseridos, regime alimentar,
hábitos de sedentarismo, vícios como tabaco e álcool (Porto, 2001; Hauser, Longo, & Jameson, 2005;
Flaws & Sionneau, 2005; Braz, 2008).

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Sabendo que os autores acima mencionados referem o nosso meio envolvente como factor de risco,
foram procurados dados que pudessem sustentar esta afirmação, de forma a entender se a
prevalência seria maior no campo ou na cidade. Apenas o estudo de Uva, Vitorino, Roquette,
Machado, & Dias, 2014, refere estudos nas zonas rurais alentejanas e do sul de Portugal, estimando
uma prevalência de cerca 52% e 45% da população.

Em Portugal o perfil do hipertenso relaciona-se com o aumento da idade, género masculino, casado,
portador de índice de massa corporal e nível de colesterol total mais alto, ser diabético, ter doença
cardiovascular, pessoal ou familiar precoce (Polónia, Mesquita Bastos, & Pessanha, 2010) (Oliveira-
Martins, Oliveira, Gomes, Caramona, & Cabrita, 2011).

2.3 VARIÁVEIS QUE REGULAM A PA

A pressão arterial é regulada por variáveis internas ou fisiológicas e externas ou ambientais. Nesta
monografia serão apenas descritas três variáveis fisiológicas por serem as mais conhecidas e
fundamentais como é o caso das funções dos barorreceptores, da hormona antidiuretica (ADH), e do
papel da renina, angiotensina e aldosterona (RAA), detalhados de seguida (Guyton & Hall,
2002;Hauser, Longo, & Jameson, 2005; Mota Pinto, 2013).

2.3.1 VARIÁVEIS FISIOLÓGICAS:


Reflexo dos Barorreceptores: Os barorreceptores ou receptores de pressão são receptores neuronais,
existentes por exemplo nas artérias carótidas e na aorta, que respondem a estímulos de contracção e
distensão das paredes das artérias. Quando se verifica um aumento anormal de PA que pode ser
prejudicial, estes barorreceptores enviam informação neuronal ao cérebro, sendo emitida informação
neuronal inibitória através do sistema nervoso simpático para o coração e para os vasos sanguíneos,
consequentemente o ritmo cardíaco abranda e a pressão arterial desce. (Guyton & Hall, 2002;Hauser,
Longo, & Jameson, 2005; Mota Pinto, 2013).

Concentração da ADH: Um excesso de volume sanguíneo corresponde a um maior débito cardíaco e


aumenta a PA. Quando se verifica um aumento da PA, a pressão glomerular do nefrónio aumenta,
aumentando também a filtração de líquidos pelos túbulos renais e a redução da ADH para diminuir a
reabsorção de água pelos túbulos renais. Assim com o aumento da filtração glomerular e diminuição

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da reabsorção de água, o volume de sangue volta ao normal e a PA é regulada. (Guyton & Hall,
2002;Hauser, Longo, & Jameson, 2005; Mota Pinto, 2013).

Sistema RAA: A renina ou angiotensinogenase é uma enzima sintetizada e armazenada sob a forma de
pró renina em células renais, localizadas nas paredes arteriolares aferentes dos rins. O papel desta
enzima é importante na PA na medida em que quando se verificam situações de queda de pressão, as
moléculas da pró renina quebram-se e libertam renina, que passa em grande parte para o sangue
renal e circula por todo o corpo. A renina actua sobre a globulina, liberta angiotensina tipo I, que
perde dois aminoácidos, convertendo- se em angiotensina II (ao nível dos pulmões). Isto origina uma
poderosa e rápida vasoconstrição das arteríolas, aumentando a resistência periférica total e elevando
assim a PA.
A angiotensina II tem acção directa nos rins, faz diminuir a excreção de sal e água, levando a um
aumento do volume de líquido extracelular, com consequente elevação da PA que pode durar desde
horas até dias.

2.4 CONSEQUÊNCIAS DA HTA

Doentes hipertensos morrem prematuramente, sendo a causa mais frequente e comum de morte as
doenças cardiovasculares, que terminam muitas vezes em enfarte agudo do miocárdio e
frequentemente em insuficiência renal. Genericamente, a HTA pode ter consequências cardiológicas,
neurológicas e renais (Polónia, Carvalho, & Barbosa, 2006; Hauser, Longo, & Jameson, 2005).

Na verdade, indícios de isquémias ou enfartes podem ser observados em fases mais tardias da
doença. A maioria das mortes resultantes da hipertensão resulta de enfartes do miocárdio e de
insuficiência cardíaca.
Quando se verificam aumentos de PA sistémica, ocorre um espessamento da parede da cavidade do
ventrículo esquerdo (miocárdio), resultante dos fenómenos de compensação de esforço, ou seja,
como a pressão já é elevada na cavidade é necessário um esforço adicional de bombeio. Contudo, a
função de bombeio vai ficando comprometida ao longo do tempo e surgem os primeiros sinais e
sintomas de insuficiência cardíaca.

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A angina de peito surge como outra consequência da HTA, devido ao efeito combinado de doença
arterial coronária com a necessidade de aumento de oxigénio para o músculo do miocárdio.
Mudanças electrocardiográficas poderão surgir em casos de hipertrofia ventricular esquerda e são
registadas em electrocardiogramas mas, no entanto, parecem ser subestimadas (Hauser, Longo, &
Jameson, 2005).

A hipertensão a longo prazo mostra-se causadora de efeito neurológicos, que se podem dividir em
efeitos a nível da retina e efeitos a nível do Sistema Nervoso Central (SNC).

Disfunções do SNC são frequentes em hipertensos, sendo comuns as cefaleias occipitais matinais,
vertigens, tinnitus, alterações de visão. Disfunções mais graves como hemorragias e encefalopatias
também podem surgir.

Lesões arterioscleróticas nas arteríolas aferentes e eferentes do nefrónio e glomerulares são as


consequências renais mais frequentes da HTA e resultam numa diminuição da taxa de filtração
glomerular.

2.5 TRATAMENTO FARMACOLÓGICO CONVENCIONAL

O tratamento farmacológico da HTA consiste na toma de fármacos categorizados como anti


hipertensores que incluem diuréticos; depressores (inibidores) do Sistema Nervoso Simpático;
vasodilatadores directos; bloqueadores da entrada de cálcio e modificadores do eixo renina-
angiotensina (Ballinger, 2001; Katzung, 2003; Hauser, Longo, & Jameson, 2005).

Diuréticos: São os fármacos mais prescritos e mais bem tolerados. Provocam uma redução global do
volume plasmático extracelular e do débito cardíaco de forma proporcional á excreção de água e
compostos resultantes da actividade renal. A longo prazo o seu efeito é limitado pois promovem uma
diminuição da resistência periférica das arteríolas. Alguns efeitos secundários vão desde do
desenvolvimento de intolerância à glicose, ao aumento da concentração de insulina circundante, à
elevação da concentração de colesterol e triglicéridos até à acumulação de ácido úrico. Ex.;
Furosemida; Hidroclorotiaziada; Manitol;

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Depressores do sistema nervoso simpático: Actuam ao nível do SNC, estimulam os receptores-
adrenérgicos do cérebro provocando uma inibição do sistema nervoso simpático (SNS) e diminuem a
resistência vascular periférica. Podem ser bloqueadores dos receptores α-adrenérgicos ou
bloqueadores dos receptores β-adrenérgicos;

Bloqueadores dos receptores α-adrenérgicos: Dilatam o músculo liso das artérias periféricas. Ex.:
Fenoxibenzamida; Doxazosina; Terazosina; Fentolamina;

Bloqueadores dos receptores β-adrenérgicos: Diminuem o ritmo cardíaco e a força de contracção do


coração. Ex.: Metopropol; Propanolol; Atenolol;

Vasodilatadores directos: Diminuem a resistência dos vasos periféricos devido a um efeito relaxante
do músculo liso dos vasos sanguíneos. Ex.: Minoxidil; Nitroprussiato de sódio; Hidralazina.

Bloqueadores da entrada de cálcio (BEC): Inibem a entrada de cálcio nas células musculares cardíacas
e lisas vasculares provocando vasodilatação arteriolar e redução da resistência vascular periférica.
Geralmente são bem tolerados, mas podem provocar taquicardia, obstipação, cefaleia, edema,
tonturas, rubor, náuseas e vómitos. Ex.: Verapamil, Nifedipina, Diltiazem.

Modificadores do eixo Renina-Angiotensina: Como modificadores de renina-angiotensina temos os


inibidores da enzima de conversão da Angiotensina I (IECA) e os antagonistas dos receptores da
Angiotensina II (ARA). Os IECA bloqueiam a enzima responsável pela transformação da angiotensina I
em angiotensina II, e pela diminuição da resistência vascular periférica e possuem poucos efeitos
secundários. Ex.: Captopril, Enalapril, Lisinopril, Lamipril. Os ARA inibem os efeitos vasoconstritores, de
retenção de água e sódio e possuem excelente tolerabilidade, comodidade posológica, maior eficácia
do que os diuréticos, bloqueadores β e IECA; Ex.: Losartan, Ibersartan, Candesartan.

Em Portugal, dados de 2009 mostram que as classes de fármacos mais utilizadas no tratamento da
HTA são os diuréticos (47,4%) e os ARA (43,0%). Contudo a forma de tratamento depende do sexo,
idade e região Por exemplo, os diuréticos foram mais utilizados nos idosos, nas mulheres, nos Açores
(61,9%) e Alentejo (58,3%) e os ARA foram utilizados em indivíduos de meia-idade do sexo masculino
e mais prescritos na região Norte (Cortez-Diaz, Martins, & Belo, 2009).
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3. HIPERTENSÃO ARTERIAL NO ORIENTE

Na Medicina Tradicional Chinesa, a HTA pode ser definida como sendo uma patologia pertencente à
categoria de ‘Tonturas e Dor de Cabeça’ de Huang Di Nei Jing, uma das principais fontes ancestrais de
matéria médica oriental. Aqui não se fala em doenças cardiovasculares propriamente do foro físico,
mas sim em disfunções energéticas que causam os sintomas onde na qual podemos categorizar a HTA.

3.1 TEORIAS BASE DA MTC

De uma forma muito simplista a MTC diz-nos que o ser humano faz parte de “algo” maior, que se
define como sendo o TAO ou DAO. Este pode ser encarado como aquilo que designamos por destino,
aliado à ideia de algo maior ou universal, onde na qual existe uma driving force que tudo permeia
designado por Qi, ou energia vital, algo que sustenta a vida e a fisiologia de cada órgão, que
compreende dois aspectos opostos e complementares ao mesmo tempo. São exemplos, o Yin e o
Yang, a noite e o dia, o baixo e o alto, o pesado e o leve, ou se considerarmos o corpo humano, a
anatomia de cada órgão e a sua respectiva fisiologia. Encaremos o Yin como sendo matéria e o Yang a
função do órgão.

Diz-se então que a HTA está relacionada com o aspecto mais “substancial” do rim e do fígado, ou seja,
Yin de rim, Yin de fígado e pela presença massiva de mucosidade e humidade (que de forma muito
grosseira se definem ocidentalmente, como sendo a retenção de líquidos em excesso no corpo,
toxinas etc...), os quais se designam por “Síndromes energéticos”.

É através desta avaliação de síndromes na MTC, que se define qual a melhor metodologia de
tratamento, onde a fitoterapia chinesa, que recorre à sua vastíssima farmacopeia, de facto poderá ser
usada como coadjuvante de tratamento ou parte da solução. De salientar o facto que uma
determinada síndrome energética oriental poderá corresponder a uma ou mais patologias conhecidas
no ocidente (Unschuld, 2003) (Flaws & Sionneau, 2005).

Para se poder efectuar uma correcta diferenciação de síndromes que podem estar na base da HTA,
antes de mais, é necessário conhecer os principais órgãos (zang) envolvidos e suas respectivas

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funções. Na MTC os Zang mais afectados são o fígado e o rim e,por consequência, o coração é
também um dos principais afectados (Flaws & Sionneau, , 2005).

De acordo com a Teoria dos cinco elementos (Fogo, Terra, Metal, Água, Madeira) da MTC
encontramos as chamadas Leis de geração e controlo que relacionam estes cinco zang, cada um
pertencente a um elemento. O coração do elemento fogo, o baço e pâncreas do elemento terra, o
pulmão do elemento metal, os rins do elemento água e o fígado do elemento madeira.

O fogo gera a terra, a terra gera o metal, o metal gera a água e a água nutre a madeira e a madeira
nutre o fogo. O fogo controla o metal, o metal controla a madeira, a madeira controla a terra, a terra
controla a água e a água controla o fogo. Assim facilmente se percebe que uma desarmonia do rim
(água) afecte o fígado (madeira), pela relação mãe filho, e o coração pelo ciclo de controlo. Por outro
lado, o fígado afecte o coração (Ross, 1985).
A HTA surge como desequilíbrio Yin Yang da relação água madeira, ou seja, rim fígado. Quando o Yin
se mostra deficiente este não consegue manter o Yang em equilíbrio podendo originar o Fogo de
fígado, sendo mais difícil este equilíbrio quanto mais vazio é o Yin de rim e fígado. De salientar que
mais difícil será manter equilíbrio se estivermos perante síndromes de Humidade Calor, associados à
cronicidade da HTA (Machado I. , 2012). O mesmo autor afirma que à medida que diminui a
componente Yin do fígado, a via fisiológica de metabolização de lípidos fica comprometida,
observando-se um aumento dos níveis de colesterol e triglicéridos, factores de risco para hipertensos.

Através da relação madeira fogo, mãe filho, a um aumento de Yang de fígado corresponde um
aumento de Yang de coração, que potencia a força de bombeio do coração e consequente variação da
PA (Machado I. , 2012).

Este autor definiu dois tipos de etiologia de HTA. Um tipo será a HTA de excesso, cujos sintomas se
apresentam mais exacerbados, podendo passar de uma situação de Fogo de fígado para uma situação
de vento interno, que se pode traduzir num AVC. O outro tipo será a HTA por deficiência,
acompanhada de poucos sintomas.

15
A mesma publicação de Machado, 2012 alerta para o facto de um rim debilitado ter dificuldade em
excretar os “líquidos impuros” promovendo estados de Humidade, estagnação de Qi e Xue (sangue)
originando um agravamento da HTA.

Ou seja, de acordo com Flaws & Sionneau, 2005 a HTA surge de quadros de Excesso, Deficiência ou
Estagnação. Nos Quadros de excesso encontramos a Ascensão de Yang de fígado; nos quadros de
deficiência encontramos a Deficiência simultânea de Chi e de Yin, a Deficiência de Yin Yang e a
Deficiência de Yin de rim fígado e nos quadros de estagnação encontramos Estase de sangue “Xue” e
Humidade.

3.2 ESTUDOS QUE RELACIONAM A FARMACOPEIA CHINESA COM A HTA

Conhecendo assim cada um dos órgãos e suas funções de acordo com as bases da MTC bem como os
sinais e sintomas decorrentes da HTA no mundo ocidente, mais facilmente é entendida a forma de
actuação da fitoterapia chinesa.

Os princípios terapêuticos base da fitoterapia chinesa serão sempre, tonificar as deficiências, mover
estagnações e eliminar humidades, recorrendo a diferentes formulações de plantas, de diferentes
sabores (amargo, doce, picante, salgado, ácido) e diferentes naturezas (fresco, frio, neutro, morno ou
quente). Muitas das vezes tais formulações surgem sob a forma de decocções (tendo sempre em
conta o maior ou menor grau de toxicidade de cada planta).

Encontramos muitos estudos que apenas relacionam a acupunctura, enquanto ramo da MTC, no
tratamento da HTA, como é o caso de Yang, 2010, que recorreu à electro puntura numa população de
60 indivíduos, 30 dos quais sujeitos a um antihipertensor (Captopril) e restantes 30 a um determinado
protocolo acupuntural. O autor concluiu que as variações dos níveis de PA sistólica e diastólica num
determinado intervalo de tempo, não eram estatisticamente muito diferente da acção do fármaco
(Yang, 2010).

Não sendo objecto deste tema monográfico, a influência da MTC nos seus diferentes ramos, mas sim a
farmacopeia chinesa, não deixa de ser interessante o facto desta já se dedicar ao tratamento da HTA,
pelo ramo da acupunctura, só muito recentemente, à luz de milénios. Na verdade, a primeira
16
referência à farmacopeia chinesa para tratamento da HTA, data de 2010, numa tentativa de apurar a
eficácia da Acupunctura versus o efeito combinado com plantas medicinais chinesas, prescritas de
acordo com a diferenciação de síndromes (Kim & Zhu, 2010).

De todos os ensaios efectuados conseguiu-se obter resultados promissores e, de facto, baixar a PA,
mostrando maiores quedas e regulação da PA com a toma conjunta de fármacos convencionais.
Também o efeito conjunto da acupunctura com a farmacopeia chinesa se mostrou capaz em regular a
PA. No entanto dada a heterogeneidade de valores perante uma pequena população, conclui-se que
seriam necessários mais estudos.

Dois anos mais tarde em 2013 surge Wang & Xiong, que numa revisão identificou várias síndromes de
base da HTA e diferentes fórmulas herbais para o tratamento da HTA, mostrando que uma fórmula
designada por Tian Ma Gou Tang (composta por Gastrodia elata e Uncaria cum uncis), combinada
com o fármaco Enalapril obtinha melhores resultados na diminuição e regulação da PA, sem efeitos
adversos reportados. Contudo este aponta que o estudo teve um número limitado de ensaios (Dong &
Yao, 2011; Wang & Xiong, 2013).

Nesse mesmo ano de 2013, Xiong et al, vem afirmar que a farmacologia convencional ainda está
muito longe de ser optimizada e faz um confronto com a farmacopeia chinesa, identificando
diferentes fórmulas chinesas capazes de reduzir a variabilidade da PA, que criam margens de
segurança entre os valores da PAS e PAD, existindo fórmulas que agem como inibidoras de receptores
do SNS e fórmulas que têm influência directa no eixo Renina Angiotensina.

No entanto este autor relembra sempre que a prescrição de cada uma delas é efectuada consoante as
diferentes síndromes energéticas orientais como a Ascensão de Yang de fígado e Humidade fleuma, já
apresentadas nos parágrafos anteriores. São exemplos de fórmulas capazes de controlar e reduzir a
variabilidade da PA a Niu Huang Jian, Sang Ling Xue Mai Kang (em cápsulas, para síndromes de fogo) e
a Ban Xia Bai Zhu Tian Ma (em decocção) (Xiong, Yang, & Liu, 2013).

Este artigo de revisão dá a conhecer o fármaco designado por Verticil ® obtido a partir de alcalóides da
Rauwolfia verticallata, nomeadamente berberina, isoliensinina e rincofilina, que bloqueiam os α1

17
receptores do sistema nervoso simpático, por forma a diminuir a PA, cujas estruturas se encontram na
figura 1.

Berberina Isolensinina Rincofilina

Figura 1 Estrutura química de alcalóides bloqueadores dos receptores α1; a) berberina, b) isolensinina e c) rincofilina.
Adaptado de (Xiong, Yang, & Liu, 2013).

Outros alcalóides conhecidos que têm origem na farmacopeia chinesa são a rincofilina e a
isorrincofilina, que actuam como vasodilatadores em vasos sanguíneos periféricos pela sua capacidade
de actuação no sistema nervoso simpático.
Nestes casos moderados ou suaves de HTA é referida que a decocção Qing Xuan Jian pode de facto
baixar a PA de forma segura e eficiente, melhorando a sintomatologia da HTA. Tal mecanismo de
acção desta fórmula pode ser justificado pela capacidade de actuação no eixo renina angiotensina
(Xiong, Yang, & Liu, 2013;Tao & Chen, 2009). Contudo, a apresentação deste estudo na monografia,
justifica-se pela discussão que o autor faz, mostrando que as investigações actuais, mostram que as
fórmulas chinesas, têm a vantagem de regular todo o organismo pela sua acção Multi Target e que a
fitoterapia chinesa não só leva a uma melhoria de sintomas, mas a uma estabilização da PA, o que
diminui o risco para outros órgãos. Ainda assim na sua opinião são poucos os estudos na área e as
amostras de pequenas que são, baixam a sua validade estatística. Para além disso, são tantos os
compostos que podem ser estudados por cada planta incluída em cada uma das fórmulas que a
própria investigação se torna difícil e complexa (Xiong, Yang, & Liu, 2013).

Em 2015, outros investigadores mais uma vez, efectuaram uma revisão sistemática acerca do efeito de
plantas medicinais chinesas para tratamento da hipertensão resistente. Os estudos de tratamento da
HTA recorrendo a fitoterápicos chineses foram agrupados tendo em conta a monoterapia ou a

18
combinação com fármacos convencionais. Em conclusão, a toma conjunta de fórmulas chinesas sob a
forma de comprimidos, ou decocção, com o fármaco antihipertensor permite alcançar uma redução
da PAS com relevância clínica, mas não estatisticamente significativa. Neste caso não se podem tirar
conclusões definitivas acerca da eficácia e segurança da fitoterapia chinesa no tratamento da HTA
resistente sendo necessários mais estudos (Xiong, Li, & Zhang, 2015).

O estudo de revisão mais recente encontrado acerca do tema data de 2016 e refere uso combinado
ou não da fitoterapia chinesa com fármacos convencionais antihipertensores. O estudo mostra que a
toma de fitoterápicos acrescenta valor ao tratamento convencional, com resultados estatisticamente
significativos, o que vem contrariar os estudos de 2015. O principal fármaco estudado foi o Captopril®
mais uma vez combinado com a Tian Ma Gou Tang. A importância deste estudo é que pela primeira
vez se fala acerca do efeito adverso da toma conjunta de fármacos e plantas, afirmando que a toma
conjunta foi segura e não se registaram efeitos adversos, pelo menos em relação à Tian Ma Gou Tang
e Ban Xia Bhai Zhu Tian Ma Tang. Em relação a outras fórmulas estudadas, em termos de efeitos
adversos, os testes da proteína C reactiva, homocisteína e ácido úrico mostraram valores normais.

Chega-se então à conclusão que mais estudos são necessários e que os médicos devem ter precaução
na sua prática clínica e estarem cientes do que é a fitoterapia chinesa e que muitos doentes recorrem
a estas terapias, muitas vezes sem o referirem (Xinke, Yongdong, & Mingxia, 2016).

3.3 FARMACOPEIA CHINESA NO TRATAMENTO DA HTA

Tendo em conta todos os estudos acerca do tratamento da HTA efectuados, foram consultadas as
fontes bibliográficas mais conhecidas no ocidente em termos de prescrição de fórmulas chinesas.
Estas relatam a existência de fórmulas chinesas que tratam as síndromes que podem estar na origem
da HTA base como se pode observar na tabela 1.

19
Síndrome (Flaws & Sionneau, 2005) (Scott, 2005) (Maciocia, 2006)

Ascensão Tian Ma Gou Tang Yin Jia Jian Tian Ma Gou Tang Yin Jia Jian
Yang Fígado Composição: Concha Haliotidis, Concha Ostreae, Os Draconis, Spica prunellae, Herba Taxilli, Ramulus Uncariae cum uncis, Cortex Eucommiae, Rhizoma Ling Jiao Gou Teng Tang
Gastrodiae, Radix Achyranthis bidentatae, Flos Chrysanthemi, Radix Scutellariae
Composição: Cornu Saigae, Cornu Naemorhedis;
Concha Margaritaferae; Ram. Uncariae; Fol
Mori; Flos Chrysanthemi; Rx. Paeoniae Alba; Rx.
Rehmanniae; Bul. Fritillariae Cirrhosae; Rx
Glycyrrhizae

Deficiencia simultânea de Shen Zhe Zhen Qi Tang Er Zhi Wan Jing Qi Pian
Qi e Yin Composição: Os Draconis, Concha Ostreae, Haemititum, Radix Astragali, Composição: Fructus Ligustri lucidi, Herba Ecliptae prostatae, Radix
Fructus Ligustri lucidi, Radix Paeoniae albae, Herba Ecliptae, Radix Dioscoreae oppositae, Radix Codonopsis pilosulae, Sclerotium Poriae
Dioscoreae, Fructus Corni, Fructus Perillae, Radix Codonopsitis cocos, Rizoma Astractylodis macrocephalae, Fructus Lycii, Fructus
Schisandrae chinensis, Radix Glycyrrhizae uralensis, Radix Blupeuri,
Pericarpium Citri reticulatae, Rhizoma Cyperi rotundi, Radix vladimirae,
Rhizoma Zinziberis officinalis, Fructus Amomi kravanh

Deficiência simultânea de Shen Qi Wan Liu Wei Di Huang Wan


Yin e Yang Composição: Plastrum testudinis, Herba Taxilli, Cortex Eucommiae, Herba Composição: Radix Rehmanie conquitae, Radix Dioscoreae, Radix Polygoni multiflori, Fructus Corni, Sclerotium poriae coc
Epimedii, Fructus Corni,Radix Rehmanniae, Cortex Cinnamomi, Radix Lateralis,Fructus Rubi, Semen cuscutae, Fructus Lycii chinensis, Cortex Mountain radices, Fructus Shisandrae, Herba cistanches, Rhizo
Praeparatus Aconiti carmichaeli Alimastis, Herba Cynomorii songaricii

Deficiência simultânea Qi Ju Di Huang Wan Jia Wei Zuo Gui Jia Er Zhi Wan Liu Liu Wei Di Huang Wan
do Yin de Fígado e Rim Composição: Plastrum Testudinis, Concha Ostreae, Radix Rehmanniae, Radix Composição: Radix Rehmanie conquitae, Fructus Ligustri lucidi, Composição: Radix Rehmanie, Radix Dioscoreae
Dioscoreae, Fructus Corni, Rhizoma Alismatis, Cortex Moutan, Poria, Fructus Lycii, Herba Ecliptae prostatae, Radix Dioscoreae, Fructus Lycii, Poria, Radix polygoni multiflori, Fructus Corni, Sclerotiu
Flos Chrysanthemi Fructus Schisandrae chinensis, Radix Glycyrrhizae, Fructus Corni poriae cocos, Fructus Rubi, Semen cuscutae, Fruct

Wei Di Huang Wan Lycii chinensis,Cortex Mountain radices, Fructus


Shisandrae, Herba cistanches, Rhizoma Alimasti

Estagnação de Xue Fu Zhu Yu Tang Xue Fu Zhu Yu Tang Xue Fu Zhu Yu Tang
Xue Composição: Semen Persicae, Flos carthamis tinctorii, Radix Angelicae sinensis, Shu Jing Huo Xue Tang
Radix Cyathulae officinalis, Radix Paeoniae rubra, Radix Rehmannie glutinosae,
Fructus Citri Auranti, Tuber Curcumae, Radix Ligustici chuanxiong, Radix Platycodi

Tabela 1 Fórmulas recomendadas para síndromes que podem estar na base da HTA por cada autor e respectiva composição
3.3.1 FÓRMULAS PARA ASCENSÃO DE YANG DE FÍGADO

Flaws & Sionneau, 2005, Scott, 2005 e Maciocia, 2006 são unânimes em prescrever a fórmula Tian Ma
Gou Tang Yin Jia Jian (Gastrodia & Uncaria Formula ®Golden Flowers) para quadros de excesso, ou
seja, ascensão de Yang de Fígado, pela sua capacidade de drenar o calor deste órgão, fazer mover o
sangue e tonificar o Fígado e Yin dos Rins. Scott, 2005 e Maciocia, 2006 prescrevem também a fórmula
anterior para resolução de quadros de estagnação, pela sua capacidade de fazer mover.

A sua acção consiste em acalmar o Fígado, eliminar vento interno, drenar calor, fazer mover o Xue e
tonificar o Yin de Fígado e de Rins. Esta fórmula é constituída pelos seguintes elementos:

Shi Jue Ming (Concha Haliotidis)


Mu Li (Concha Ostreae)
Long Gu (Os Draconis)
Xia Ku Cao (Spica Prunellae)
Sang Ji Sheng (Herba Taxilli)
Gou Teng (Ramulus Uncariae cum uncis)
Du Zhong (Cortex Eucommiae)
Tian Ma (Rhizoma Gastrodiae)
Niu Xi (Radix Achyranthis bidentatae)
Ju Hua (Flos Chrysanthemi)
Huang Qin (Radix Scutellariae)

Gou Teng (Uncariae cum uncis) possui natureza levemente fria, sabor doce, age no fígado, coração,
elimina vento interno, pacifíca o fogo de fígado. Pode representar desde 8.4 a 15% da composição da
fórmula. Tian Ma possui natureza neutra, sabor doce, age no fígado, elimina vento externo e controla
o Yang.

3.3.2 FÓRMULAS PARA DEFICIÊNCIA SIMULTÂNEA DE QI E DE YIN

Para a síndrome de deficiência simultânea de Qi e de Yin, Flaws & Sionneau, 2005 propõe a toma de
Shen Zhe Zhen Qi Tang cuja composição é a seguinte, numa base de 100 gramas de produto:

Long Gu (Os Draconis) 15g

21
Mu Li (Concha Ostreae) 15g
Dai Zhe Shi (Haemititum) 15g
Huang Qi (Radix Astragali) 15g
Nu Zhen Zi (Fructus Ligustri Lucidi) 15g
Bai Shao (Radix Paeoniae albae) 12g
Han Lian Cao (Herba Ecliptae) 12g
Shan Yao (Radix Dioscoreae) 12g
Shan Zhu Yu (Fructus Corni) 12g
Zi Su Zi (Fructus Perillae) 9g
Dang Shen (Radix Codonopsitis) 9g

De acordo com (Scott, 2005) este propõe Jing Qi Pian (Jing Qi Formula ®Golden Flowers) pois esta tem
a capacidade de nutrir o Jing, tonificar e regular o Qi, mover o Qi constrangido do Fígado e nutrir o Yin
dos Rins e do Fígado.

Esta fórmula é constituída por (base de 100g de produto):

Nu Zhen Zhi (Fructus Ligustri lucidi) 11.6g


Han Lian Cao (Herba Ecliptae prostatae) 11.6g
Shan Yao (Radix Dioscoreae oppositae) 11.6g
Dang Shen (Radix Codonopsis pilosulae) 11.6g
Fu Ling (Sclerotium Poriae cocos) 9.3g
Bai Zhu (Rizoma Astractylodis macrocephalae) 6.9g
Gou Qi Zhi (Fructus Lycii) 6.9g
Wu Wei Zi (Fructus Schisandrae chinensis) 5.4g
Gan Cao (Radix Glycyrrhizae uralensis) 5.4g
Chai Hu (Radix Blupeuri) 4.6g
Chen Pi (Pericarpium Citri reticulatae) 4.6g
Xiang Fu (Rhizoma Cyperi rotundi) 3.6g
Chuan Mu Xiang (Radix vladimirae) 2.3g
Gan Jiang (Rhizoma Zinziberis officinalis) 2.3g
Bai Dou Kou (Fructus Amomi kravanh) 2.3g

Note-se no entanto que parte das fórmulas anteriores destinadas à deficiência de Qi e de Yin tem
composição similar no que respeita aos componentes:
22
Nu Zhen Zhi (Fructus Ligustri lucidi)
Han Lian Cao (Herba Ecliptae prostatae)
Shan Yao (Radix Dioscoreae oppositae)
Dang Shen (Radix Codonopsis pilosulae)

Nu Zhen Zhi (Fructus Ligustri lucidi) possui uma natureza fria, sabor doce e amargo, age no fígado, no
rim, nutre o Yin e clareia o calor. De acordo com a matéria médica chinesa é o fruto da Ligustrum
lucidum é indicado para vertigem, tinnitus e fraqueza articular. A sua forma é mostrada na Imagem 1.

Imagem 1 Fructus Ligustri lucidi. Adaptado do Atlas colorido da matéria médica chinesa especifico da farmacopeia da república popular
da China, aprovada pelo ministério da saúde pública, edição de 1995. À esquerda fruto ainda fresco e á direita fruto após colheita e
secagem.

Han Lian Cao (Herba Ecliptae) tem natureza fresca, sabor doce, age no fígado e no rim, nutre o Yin e
arrefece o Xue (leia-se sangue). São utilizadas as partes aéreas após secagem, esta erva pertence à
família Asteraceae e de acordo com a matéria médica chinesa a planta Eclipta prostatae também está
indicada para tonturas, tinnitus, epistaxes e pequenas hemorragias. Vejamos a Imagem 2.

Imagem 2 Herba Ecliptae. Adaptado do Atlas colorido da matéria médica chinesa especifico da farmacopeia da república popular da
China, aprovada pelo ministério da saúde pública, edição de 1995. À esquerda partes aéreas já secas, à direita vista microscópica.

23
Shan Yao (Radix Dioscoreae) é de natureza neutra, sabor amargo, age no baço, pulmão e rim. Tonifica
baço, que se lembre, na MTC este órgão controla a ‘humidade’ do organismo. A Dioscorea opposita
pertence à família Dioscoreaceae. Vejamos a imagem 3.

Imagem 3 Radix Dioscoreae. Adaptado do Atlas colorido da matéria médica chinesa especifico da farmacopeia da república popular da
China, aprovada pelo ministério da saúde pública, edição de 1995. A raíz é colhida no inverno enquanto os caules e as folhas ainda estão
murchos, sofre uma lavagem de forma a retirar a casca fibrosa exterior, fumigada com enxofre e posteriormente seca é lhe conferida a
forma cilíndrica por raspagem, seca novamente e polida. De acordo com a matéria médica esta tem a capacidade de regular o sistema
excretor.

Dang Shen (Radix Codonopsis pilosulae) é de natureza quente, amargo, age no baço e pulmão,
beneficia o Qi e nutre Xue. Todos estes componentes agem no rim, protegendo-o de desgastes
energéticos. Está indicada para diabetes, palpitações cardíacas e problemas respiratórios de acordo
com matéria médica. Vejamos a imagem 4.

Imagem 4 Radix Codonopsis pilosulae. Adaptado do Atlas colorido da matéria médica chinesa especifico da farmacopeia da república
popular da China, aprovada pelo ministério da saúde pública, edição de 1995.

24
3.3.3 FÓRMULAS PARA DEFICIÊNCIA SIMULTÂNEA DE YIN E YANG

Flaws & Sionneau, 2005 recomenda a toma de Shen Qi Wan pela diversidade de seus componentes,
onde Shu Di, Shan Zhu Yu, Gui Ban e Sang Ji Sheng têm a capacidade de nutrir o Yin de Rim ao mesmo
tempo que fixa o estado Yang e Rou Gui, Du Zhong, Xian Ling Pi, Shan Zhu Yu, e Fu Zi que apesar de
serem de natureza quente respectivamente mostram-se eficazes na queda da pressão sanguínea.

As dosagens de Shen Qi Wan são as seguintes (por cada 100g de produto):

Gui Ban (Plastrum Testudinis) 18g


Sang Ji Sheng (Herba Taxilli) 15g
Du Zhong (Cortex Eucommiae) 12g
Xian Ling Pi (Herba Epimedii) 9g
Shan Zhu Yu (Fructus Corni) 9g
Shu Di Huang (cooked Radix Rehmanniae) 9g
Rou Gui (Cortex Cinnamomi) 9g
Zhi Fu Zi (Radix Lateralis praeparatus) 6g

Scott, 2005, Maciocia, 2006 apresentam a fórmula Liu Wei Di Huang Wan (Nourish Essence Formula
®Golden Flowers) no tratamento da deficiência de Yin e de Yang, fórmula esta também utilizada para o
tratamento de Deficiência simultânea do Yin de fígado e rim.

Esta fórmula é destinada a tonificar o Yin e Yang dos rins, tonificar o Yin de fígado, formar Qi e Xue e
reter a essência. A sua composição é a seguinte (por cada 100g de produto):

Shu Di Huang (Radix Rehmanie) 14.7g


Shan Yao (Radix Dioscoreae) 8.9g
He Shou Wu (Radix Polygoni multiflori) 8.9g
Shan Zhu Yu (Fructus Corni) 7.05g
Fu Ling (Sclerotium poriae cocos) 7.05g
Fu Pen Zi (Fructus Rubi) 7.0g
Tu Si Zi (Semen Cuscutae) 7.0g
Gou Qi Zi (Fructus Lycii chinensis) 7.0g
Mu Dan Pi (Cortex Mountain radicis) 5.9g

25
Wu Wei Zi (Fructus Shisandrae) 5.9g
Rou Cong Rong (Herba Cistanches) 5.9g
Ze Xie (Rhizoma Alimastis) 5.3g
Suo Yang (Herba Cynomorii songaricii) 4.7g
Feng Mi (Mel) 4.7g

De notar que Shu Di Huang está presente em Liu Wei Di Huang Wan e Shen Qi Wan. Shu Di Huang
(Radix Rehmanie) é importante na medida em que tem uma natureza ligeiramente morna, sabor
doce, agindo no fígado e no rim, tonificando a parte Yin. Tonifica também a essência e beneficia o Xue.
Está indicada para diabetes, anemia, palpitações cardíacas, desordens menstruais, tonturas e tinnitus,
de acordo com a matéria médica chinesa. Na Imagem 5 podemos observar a flor, a raíz fresca e seca.

Imagem 5 Radix Rehmaniae. Adaptado do Atlas colorido da matéria médica chinesa especifico da farmacopeia da república popular da
China, aprovada pelo ministério da saúde pública, edição de 1995.

Também Shan Zhu Yu (Fructus Corni), fruto proveniente de Cornus officinalis, foi referenciado como
elemento comum. Este elemento é ligeiramente quente, de sabor amargo permitindo revigorar o rim
e o fígado. Está indicado para zumbido, surdez, perda auditiva, vómitos, tonturas, visão turva, urina
frequente e sangramento uterino.Este fruto é mostrado na imagem 5.

Imagem 6 Fructus Corni. Adaptado do Atlas colorido da matéria médica chinesa especifico da farmacopeia da república popular da China,
aprovada pelo ministério da saúde pública, edição de 1995. À direita baga desidratada.

26
3.3.4 FÓRMULAS PARA DEFICIÊNCIA SIMULTÂNEA DO YIN DE
FÍGADO E RIM

Flaws & Sionneau, 2005 indica para os casos de deficiência de yin de fígado e rim, Qi Ju Di Huang Wan
Jia Wei cuja composição é:

Gui Ban (Plastrum Testudinis) 30g


Mu Li (Concha Ostreae) 30g
Shu Di (cooked Radix Rehmanniae) 24g
Shan Yao (Radix Dioscoreae) 12g
Shan Zhu Yu (Fructus Corni) 12g
Ze Xie (Rhizoma Alismatis) 9g
Dan Pi (Cortex Moutan) 9g
Fu Ling (Poria) 9g
Gou Qi Zi (Fructus Lycii) 9g
Ju Hua (Flos Chrysanthemi) 9g

Shu Di, Shan Yao, Shan Zhu Yu, Ze Xie, Dan Pi e Fu Ling em conjunto formam os seis sabores de Liu Wei
Di Huang Wan que suplementam o yin de Rim e drena o calor tóxico. Gui Ban e Gou Qi Zi ajudam os
seis sabores a nutrir o yin fígado e o rim, Ju Hua, Gui Ban e Mu Li dominam o yang.

Scott, 2005 recomenda a junção de duas fórmulas clássicas, a Zuo Gui Wan e Er Zhi Wan que resultam
na Zuo Gui Jia Er Zhi Wan (True Yin Formula ®Golden Flowers) que tonifica o rim esquerdo, enquanto
responsável de todo o Yin do corpo e nutre o yin de fígado. Esta fórmula contém (100g):

Shu Di Huang (Radix Rehmanie conquitae) 20.2g


Nu Zhen Zi (Fructus Ligustri lucidi) 12.7g
Han Lian Cao (Herba Ecliptae prostatae) 12.7g
Shan Yao (Radix Dioscoreae) 10.1g
Gou Qi Zi (Fructus Lycii) 10.1g
Fu Ling (Poria) 10.1g
Wu Wei Zi (Fructus Schisandrae chinensis) 8.9g
Zhi Gan Cao (Radix Glycyrrhizae) 5.1g
Shang Zu Yu (Fructus Corni officinalis) 10.1g
27
Também Qi Ju Di Huang Wan Jia Wei e Zuo Gui Jia Er Zhi Wan têm semelhanças na suas composição,
são elas:

Gou Qi Zi (Fructus Lycii)


Shu Di Huang (Radix Rehmanie conquitae)
Shan Yao (Radix Dioscoreae)
Fu Ling (Poria)

Gou Qi Zi (Fructus Lycii) ou fruto da Lycium barbarum, família das solanáceas, ou facilmente
reconhecido no ocidente como bagas de Goji, é de natureza neutral, sabor doce, age no Rim, Pulmão
e Fígado, tonifica o, nutre o Fígado, beneficia os olhos, humedece os Pulmões e trata deficiência de yin
de Fígado e de Rim. De acordo com a matéria médica chinesa está indicado para tonturas tinnitus e
diabetes. Vejamos a imagem 7.

Imagem 7 Bagas de Goji, Fructus Lycii. Adaptado do Atlas colorido da matéria médica chinesa especifico da farmacopeia da república
popular da China, aprovada pelo ministério da saúde pública, edição de 1995. À direita baga desidratada.

Shu Di Huang (Radix Rehmanie conquitae) é ligeiramente morno, doce, também tonifica yin de Fígado
e Rim, a essência e enriquece o Xue, Shan Yao é neutral, doce, fortalece Yin e Yang de Rim. Fu Ling é
neutro, doce, age no coração, baço e rim, elimina humidade, tonifica baço, acalma o coração e o Shen,
atenua palpitações, insónias e edemas.

28
3.3.5 FÓRMULAS PARA ESTAGNAÇÃO DE XUE

Flaws & Sionneau, 2005 Scott, 2005 e Maciocia, 2006 são unânimes em prescrever a fórmula Xue Fu
Zhu Yu Tang Jia Jian (Blood Palace formula ®Golden Flowers). Esta fórmula é utilizada para dispersar o
sangue estagnado, acelerar o Qi do Fígado, desbloquear os canais. Desta fórmula destaca-se a Tao
Ren, de natureza neutra, de sabor amargo com capacidade de agir no coração, Fígado, Pulmão e
Intestino Grosso, revigora o sangue e remove estases.

A Xue Fu Zhu Yu Tang Jia Jian é constituída por (100g):

Tao Ren (Semen Persicae) 14.8g


Hong Hua (Flos Carthamis tinctorii) 11.1g
Dang Gui (Radix Angelicae sinensis) 11.1g
Chuan Niu Xi (Radix Cyathulae officinalis) 11.1g
Chi Shao (Radix Paeoniae rubra) 7.4g
Sheng Di Huang (Radix Rehmannie glutinosae) 7.4g
Zhi Ke (Fructus Citri auranti) 7.4g
Yu Jin (Tuber Curcumae)
Chuan Xiong (Radix Ligustici chuanxiong) 5.6g
Jie Geng (Radix Platycodi grandiflori) 5.6g
Chai Hu (Radix Bupleuri) 3.7g
Gan Cao (Radix Glycyrrhizae) 3.7g

4. REFLEXÃO, CONCLUSÃO E IDEIAS FUTURAS

Ao olhar para cada uma das diferentes formulações orientais, talvez a maior dificuldade com a qual
nos deparamos, é o entendimento da teoria base de MTC e a forma de construção de cada uma das
fórmulas (conjugação de sabores, natureza, métodos de cozedura etc…), que exige uma forma de
pensar completamente diferente da farmacologia convencional, embora se consigam fazer alguns
paralelismos. Pense-se no caso da relação água fogo em MTC e a própria fisiopatologia entre o rim e o
coração. Também a barreira linguística por vezes se mostra um entrave nos estudos ocidentais.

29
Por vezes, encontramos algumas dificuldades taxonómicas na descrição de cada uma das fórmulas
chinesas, pois a nomenclatura oriental no ocidente, não se rege necessariamente pela ‘latina’.
Estamos perante traduções de ideogramas chineses e geralmente são escritas em maiúsculas. Ex. Shu
Di Huang, Chi Chao (não sendo regra).

Portanto para facilitar o entendimento linguístico, é referida sempre a taxonomia latina, após a
chinesa, ou seja, na nomenclatura da farmacopeia chinesa mais actual, é frequente a indicação latina
da parte da planta utilizada, se raíz, rizoma, tubérculo, folha, caule etc… seguido do género ou espécie
da planta. Ex. Gan Cao (Radix Glycyrrhizae); Dang Gui (Radix Angelicae sinensis).

Ultrapassadas estas dificuldades, verificamos que sim, vão existindo alguns estudos científicos na área
da fitoterapia chinesa, embora muitos deles apontem sempre no mesmo sentido:

São necessários mais estudos pois na maioria os resultados obtidos não têm significância estatística,
mesmo que apontem a farmacopeia chinesa como benéfica quando usada como coadjuvante de
tratamento.
São muitas as plantas chinesas prescritas para o tratamento da HTA, algumas delas comuns a
diferentes síndromes pela sua acção em termos de MTC, no entanto sem garantia que tenham os
mesmos compostos activos, pois não se encontra muita informação acerca do assunto.

As partes das plantas mais frequentemente utilizadas para a Deficiência simultânea de Qi e de Yin são
o Fructus Ligustri lucidi, Herba Ecliptae, Radix Dioscoreae, Radix Codonopsis pilosulae. Para a
Deficiência simultânea de Yin e Yang apresenta-se a Radix Rehmanie conquitae e o Fructus Corni. Para
a Deficiência simultânea do Yin de Fígado e Rim apresenta-se o Fructus Lycii, Radix Rehmanie
conquitae, Radix Dioscoreae, e o cogumelo Poria.

Um olhar mais atento, mostra que para os síndromes de deficiência é frequentemente prescrita a
Rehmaniae conquitae e a Dioscoreae opposita como duas potenciais plantas no tratamento da HTA.

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De todas as buscas efectuadas ao longo da realização desta monografia apenas se encontrou um
artigo datado de 2002, que mostra o potencial efeito de hidrolisados da Dioscoreae no controlo da
HTA em humanos (Hsu, Lin, & Lee, 2002).

Já em relação à Rehmanie conquitae surgem também poucos estudos. Pode-se citar um estudo de
2012, que mostra mais a importância da fórmula Liu Wei Di Huang Wan (Pill of Rehmannia) no
tratamento da HTA o que vai de acordo com as fontes bibliográficas da Tabela 1 (Wang & Xiong,
2012).

De uma forma geral, se tivermos em conta as indicações de uso dadas pela matéria médica chinesa,
quase todas elas agem nos principais sintomas da HTA, como por exemplo as tonturas e os zumbidos.
Tendo também em conta que a HTA depende do débito e frequência cardíaca e que muitas destas
plantas atenuam palpitações, conseguimos justificar a sua prescrição.

Por estes exemplos acima, arriscar-me-ia mesmo a afirmar que a forma de pensar em fitoterapia
chinesa consegue estabelecer um paralelismo fundamentado com as ciências farmacológicas, a partir
do qual podemos estabelecer novos pontos de partida para uma nova forma de tratar a HTA.
Dos poucos estudos existentes, pouco se fala acerca do risco de toxicidade de cada uma das plantas
prescritas em MTC ou dos seus potenciais problemas de interacção, pelo que considero caber aos
terapeutas não convencionais a maior consciência na prescrição dos mesmos. De extrema importância
também criar mecanismos que dêem a conhecer esta problemática à população em geral. Mais
formação para todos é necessária e mais informação cientificamente fundamentada é essencial.

Apesar desta ausência de informação nos estudos encontrados, pela consulta do atlas colorido da
matéria médica chinesa especifica da farmacopeia da república popular da China, aprovada pelo
ministério da saúde pública, edição de 1995, cuja listagem de plantas tóxicas é muito reduzida,
nenhuma das plantas estudadas foi considerada tóxica.

Concluo então que são muitas as plantas medicinais que podem ter influência no tratamento da HTA e
que cada formulação não tem em conta a fisiopatologia convencional, mas sim uma forma de pensar
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muito própria. Para um determinado síndrome, existirá uma ou mais fórmulas medicinais chinesas e a
mesma síndrome pode-se traduzir por diferentes doenças. Para além disso, a cada fórmula
corresponde um conjunto de plantas de diferentes qualidades e propriedades dentro da MTC.

Parece que existem alguns compostos relativamente recentes, validados farmacologicamente, com
origem na farmacopeia chinesa que têm acção na HTA, são eles os alcalóides berberina, isoliensinina e
a rincofilina (Xiong, Yang, & Liu, 2013).

Não foram tidas em conta nesta monografia as dosagens e frequências de toma de cada uma das
formulações, nem explicado pormenorizadamente os fundamentos teóricos na base da construção
das mesmas. Sabe-se no entanto que de uma forma geral, a dosagem diária ronda 9g para cada
planta, sem esta ter sofrido qualquer alteração.

Como sugestão para trabalhos futuros seria interessante encontrar aprofundar a pesquisa em Radix
Rehmanie conquitae e a Radix Dioscoreae, estudar todo o seu ciclo de vida, identificar os seus
diferentes metabolitos secundários e verificar o seu potencial farmacológico.

Estamos neste momento em condições de afirmar que sim, a farmacopeia chinesa pode ter influência
no tratamento da HTA primária.

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