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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA

CENTRO DE EDUCAÇÃO FÍSICA E DESPORTOS – CEFD


CURSO DE DANÇA – LICENCIATURA

Livia Marafiga Monteiro

CONDUÇÃO NA DANÇA DE SALÃO:


EM BUSCA DO DIÁLOGO CORPORAL

Santa Maria, RS
2017
Livia Marafiga Monteiro

CONDUÇÃO NA DANÇA DE SALÃO:


EM BUSCA DO DIÁLOGO CORPORAL

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado ao


curso de Dança Licenciatura - Universidade
Federal de Santa Maria, como requisito parcial
para a obtenção do título de Licenciada em
Dança.

Orientadora: Profa. Dra. Neila Cristina Baldi

Santa Maria, RS
2017
Livia Marafiga Monteiro

CONDUÇÃO NA DANÇA DE SALÃO:


EM BUSCA DO DIÁLOGO CORPORAL

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado ao


curso de Dança Licenciatura - Universidade
Federal de Santa Maria, como requisito parcial
para a obtenção do título de Licenciada em
Dança.

Aprovado em 04 de dezembro de 2017:

Dra. Neila Cristina Baldi (UFSM)

Dra. Mara Rubia Alves da Silva (UFSM)

Ma. Flávia Marchi Nascimento (UFPEL)

Santa Maria, RS
2017
AGRADECIMENTOS

Inicialmente gostaria de agradecer à Universidade Federal de Santa Maria (UFSM),


por disponibilizar os recursos necessários para a concretização deste curso.
À minha orientadora, Neila Cristina Baldi, pela dedicação irrestrita em me orientar e
atenção dispensada a mim durante todo processo de elaboração do trabalho.
Aos meus queridos alunos e alunas da Oficina que foram incríveis do início ao fim,
compreensivos e maravilhosos em seus relatos nos diários.
À minha professora Daniela Lopes e meu professor Lucas Pendezza por todos os
ensinamentos, carinho, dedicação e por oportunizarem tantos momentos especiais e
inesquecíveis que tive ao lado de pessoas que se tornaram indispensáveis hoje em minha vida.
Gratidão enorme a vocês!
Aos meus colegas bolsistas da LD Escola de Dança pelos momentos de descontração
nas aulas, ensaios e bailes, que me ajudaram a tornar mais leve o período de escrita do
trabalho.
À minha querida amiga Bibiana Hernandez Gomes de Moraes, pelas conversas
proveitosas, debates e pontos de vista compartilhados referente ao tema deste trabalho.
Por fim, agradeço imensamente a minha família que me apoiou e incentivou que eu
buscasse aquilo que tocaria meu coração e dizer que sem o amor, auxílio e compreensão deles
este trabalho não teria chegado ao seu término. Um agradecimento especial ao meu filho
Nicolas, que teve paciência, compreendendo meus momentos de ausência, sempre com uma
palavra de motivação e carinho. Eu amo vocês!
RESUMO

CONDUÇÃO NA DANÇA DE SALÃO:


EM BUSCA DO DIÁLOGO CORPORAL

AUTORA: Livia Marafiga Monteiro


ORIENTADORA: Profª. Drª. Neila Cristina Baldi

Este trabalho de conclusão de curso tem a intenção de questionar aspectos relacionados à condução nas Danças
de Salão. Para isso, foi realizada pesquisa bibliográfica no sentindo de entender as bases históricas das principais
configurações dessas danças, como as construções sociais dos papéis de mulheres e homens nas sociedades as
quais surgiram estas danças, que resultaram em paradigma dominante, no qual existem papéis distintos a serem
desempenhados por damas e cavalheiros e o corpo acaba sendo compreendido apenas como um executor de
passos. Além disso, essa pesquisa tem como objetivos descrever como acontece o ensino tradicional da Dança de
Salão e repensar novas práticas de ensino-aprendizagem incentivando reformulações nas metodologias
existentes. Para isso, utilizou-se da Etnografia e da Autoetnografia, tendo como base observações e
apontamentos da autora tanto de aulas de Dança de Salão vivenciadas pela mesma, quanto as ministradas por ela
na Oficina de Dança de Salão – condução compartilhada e indução no projeto de extensão 5,6,7 e 8; bem como
as anotações de percepções de alunos e alunas que vivenciaram esta Oficina. A proposta era realizar
experimentações, a partir da sensibilização e do estímulo a uma interação mais equitativa no que diz respeito às
técnicas de comunicação difundidas pelas Danças de Salão, especialmente em relação às de condução e resposta.
Além disso, teve como fundamento reestruturar os papeis de condução, de modo que homens e mulheres não
precisassem se encaixar em funções típicas como as de cavalheiro-condutor e dama-conduzida. O trabalho
conclui que este tipo de abordagem de ensino permite o verdadeiro diálogo corporal.

Palavras-chave: Dança de Salão. Condução. Conexão. Escuta Corporal. Diálogo Corporal.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Apresentação de Samba de Gafieira no Natal do Coração, na Praça Saldanha Marinho. ..... 21
Figura 2: Momento para as damas na aula de Salsa no 6º Porto Alegre Salsa Congress. ..................... 26
Figura 3: Apresentação de Salsa no Corujão......................................................................................... 27
Figura 4: Competição Jack and Jill no 7º Porto Alegre Salsa y Bachata Congress. .............................. 29
Figura 5: Apresentação de Bachata no Festival Santa Maria em Dança 2016. ..................................... 29
Figura 6: Aquecimento na primeira aula prática da Oficina. ................................................................ 52
Figura 7: Noções de ritmo. .................................................................................................................... 53
Figura 8: Dinâmica da mesa de vidro.................................................................................................... 58
Figura 9: Dinâmica da mesa de vidro realizada aos pares..................................................................... 59
Figura 10: Escuta corporal. ................................................................................................................... 61
Figura 11: Escuta corporal. ................................................................................................................... 61
Figura 12: Aula de Kizomba. ................................................................................................................ 63
Figura 13: Contato Improvisação através de contato/apoio de partes do corpo. ................................... 67
Figura 14: Contato Improvisação buscando fluidez e continuidade nas movimentações. .................... 68
Figura 15: Contato Improvisação buscando fluidez e continuidade nas movimentações. ..................... 68
Figura 16: Prática orientada de Forró. ................................................................................................... 71
Figura 17: Prática orientada de Forró. ................................................................................................... 73
Figura 18: Prática orientada de Forró. ................................................................................................... 73
Figura 19: Sentindo a “pequena dança” ou os micromovimentos do colega. ....................................... 76
Figura 20: Sentindo a “pequena dança” ou os micromovimentos do colega. ....................................... 77
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 8
2 DANÇA DE SALÃO: Das origens à condução compartilhada .................................................... 16
2.1 BREVE HISTÓRICO DA DANÇA DE SALÃO...............................................................16
2.2 A CONDUÇÃO NA DANÇA DE SALÃO .................................................................................... 19
2.2.1 A realidade encontrada no ensino tradicional ......................................................................... 21
2.2.1.1 O papel da dama...........................................................................................................25
2.2.1.2 O papel do cavalheiro...................................................................................................27
2.2.2 Problematizações dentro da realidade encontrada ................................................................. 29
3. UM NOVO OLHAR SOBRE A CONDUÇÃO ............................................................................. 39
3.1 A EXPERIÊNCIA DA OFICINA ................................................................................................... 45
3.1.1Noções rítmicas .......................................................................................................................... 501
3.1.2 O Funcionamento do estímulo corporal para a proposição ................................................... 53
3.1.3 Interação espacial e gestual para conexão visual .................................................................. 566
3.1.4 Escuta Corporal ......................................................................................................................... 59
3.1.5 Contato Improvisação – Improviso aberto .............................................................................. 63
3.1.6 Exercício de condução compartilhada pelo espaço ................................................................. 69
3.1.7 Prática orientada ........................................................................................................................ 70
3.3.8 Consciência Corporal ................................................................................................................. 74
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................................... 78
REFERÊNCIAS....................................................................................................................................81
APÊNDICE A..........................................................................................................................85

APÊNDICE B .................................................................................................................................... 877


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1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho discute a condução na Dança de Salão. É sabido que, por uma
convenção histórica e sociocultural estabeleceu-se um modelo, concebido como tradicional
nas danças de salão, no qual os homens é quem conduzem as mulheres no momento da dança,
configurando-se assim um tipo de comunicação que, na minha avaliação, pode ser
considerada um monólogo corporal, sendo este um padrão sustentado massivamente nos
estabelecimentos de ensino de Dança de Salão até hoje. Como declara Míriam Strack (2017,
p.70) “tradicionalmente, a condução se apresenta como um monólogo do Cavalheiro que faz
com que a Dama apenas escute e reproduza os passos”. É também possível compreender
melhor a ideia de monólogo na dança através de um dos conceitos da palavra trazido pelo
dicionário, “monólogo é o discurso que não deixa oportunidade aos outros interlocutores de
intervirem.” (PRIBERAM, 2013, s.n) Monólogo aqui é entendido como algo instituído como
a única alternativa de interação entre pares, o que não está errado, pois como complementa
Strack (2017, p.70), “mesmo o monólogo é válido, quando o mesmo é escolhido como uma
dentre as várias opções.” Entretanto é necessário enfatizar a necessidade de ampliarmos os
horizontes comunicacionais na dança e trazer novas opções de interações corporais.
Outro aspecto relevante quando abordamos particularidades da comunicação é a ideia de
que o dançar a dois pode remeter ao estabelecimento de uma relação colaboracionista, como a
proposta de Jonas Feitoza (2011, p.9), que traz o conceito de Cocondução, que deve ser
“compreendido como uma igualdade de propósitos, ou seja, as ações de ambos os corpos,
mesmo com suas singularidades e distinções, objetivam a realização da dança (a dois).”
Constata-se aqui a ideia de que dançar em cooperação implica na disponibilidade assertiva das
partes envolvidas, onde o princípio dos movimentos propostos, ou o início do dançar, pode ter
origem dos dois agentes entremeados para esse fim.
Este trabalho, portanto, tem como objetivo geral questionar o ato de conduzir nas danças
de salão, preconizando algumas respostas em relação a quais aspectos e relevâncias estão
implícitos no mesmo, além de trazer vivências para o desenvolvimento de uma nova
consciência na dança de pares, desejando assim, principalmente, estabelecer o diálogo
corporal através da ressignificação da condução para uma abordagem compartilhada com
induções de movimentos 1 . Creio ser importante ressaltar que a intenção não é retirar dos
homens a função da condução e transferir para as mulheres, mas sim estabelecer um maior

1
No capítulo 3 os conceitos de abordagem compartilhada e induções de movimento serão melhores explanados.
9

diálogo entre parceiros, sugerindo que o termo condução possa ser reformulado e também
compreendido como proposição2, dentro da concepção de uma possibilidade de escolha para
viabilizar o andamento de uma dança que se supõe ser a dois, almejando assim, torná-la mais
equânime entre os participantes e por consequência mais prazerosa, rica e criativa.
Pesquisar a respeito da condução teve motivações pontuais que brotaram por meio de
percepções advindas da minha prática nessas danças. Tomo como base principal meus quase
quatro anos ininterruptos vivenciando diferentes gêneros de dança de salão, nos quais algumas
sensações foram aos poucos surgindo e tornando-se significativas para que despertasse
algumas percepções sobre a minha dança. Um dos acontecimentos, mais recente, e que foi
talvez o principal ao longo do meu percurso até aqui, foi o fato de eu ter começado a sentir o
que posso chamar de uma monotonia na minha dança, era como se eu estivesse sempre
dançando uma coreografia repetida sendo que isso acontecia em ambientes de baile, onde a
dança acontece de forma improvisada3. Além disso, comecei a reparar nos demais pares que
dançavam ao redor, ou em momentos que eu ficava como espectadora nos bailes, e notei que,
de forma geral, as danças em suas movimentações eram todas muito parecidas na execução de
suas estruturas.
Essas observações trouxeram-me questionamentos - eu me indagava por quais motivos
isso se configurava - e, com o suporte de algumas leituras, foi possível aguçar minha visão
sobre o tema condução, e assim amadurecer o desejo de pesquisar sobre o mesmo, pois
acredito que muitas explicações para o que eu estava sentindo advinham do modelo
tradicional de conduzir e ser ensinado pelas escolas de dança. Em momentos de reflexão pude
vislumbrar que até as marcas deixadas no meu corpo, ao longo do meu tempo de prática, têm
ligação com o tema do trabalho e me afetavam de uma maneira considerável. Foram tensões
corporais recorrentes, marcas roxas, unhas quebradas, dores musculares, entre outros
machucados que aconteceram devido a conduções bruscas e sem percepção alguma de uma
parte expressiva de parceiros na dança, aos quais tive a oportunidade de interagir em aulas,
bailes e ensaios.
Como objetivos específicos, este trabalho busca descrever como acontece o ensino
tradicional na dança de salão, repensar novas práticas de ensino-aprendizagem, incentivando
reformulações nas metodologias existentes; e trazer um novo olhar para a condução. Para isso,

2
O termo proposição é concebido aqui como a substituição da palavra condução, tornando a ação mais empática
como sendo uma sugestão que a outra pessoa acata ou não, podendo inclusive sugerir um novo movimento em
contrapartida. (STRACK, 2017, p.70).
3
O termo improvisação na dança de salão será elucidado no capítulo 3.
10

foi realizada uma Oficina4 prática de experimentação de uma forma de dançar que seja mais
flexível e dialogada, trazendo a ideia de que tanto a proposição/condução quanto a indução de
movimentos possa acontecer, partindo de ambas as pessoas envolvidas na dança. Durante dez
encontros, entre agosto e outubro, com duração de uma hora por semana, em duas turmas, a
experimentação foi realizada e, no período, foram colhidos depoimentos sobre o processo por
meio dos diários das alunas e alunos colaboradores da Oficina. A condução na dança de salão
tem sido alvo de atenção por parte de alguns pesquisadores e pesquisadoras que já chamaram
a atenção para o tema (STRACK, 2017; FEITOZA, 2011; SANTOS, 2016), e também por
alguns profissionais da área da dança de salão.
Acredito que esta pesquisa se justifica devido à ocorrência de grandes mudanças no
comportamento de mulheres e homens na sociedade, nas quais a maneira com que dançamos
consequentemente se altera naturalmente em busca de adaptações a esse cenário, trazendo-nos
reflexões acerca de práticas historicamente desempenhadas nos mesmos moldes, acarretando
o discernimento de levarmos em consideração o conteúdo político reproduzido,
especialmente, nos locais de ensino. Portanto, o tema dessa pesquisa contribui para a área da
dança na medida em que propõe outro entendimento de como as pessoas podem dialogar entre
si, dançando, além de lançar um olhar indagador sobre conceitos arraigados dentro de
paradigmas socioculturais por muito tempo fixados na dança de salão. Compreendendo que
todo ensino é dotado de relevâncias peculiares, no qual professoras e professores, como
formadores de opinião, possuem um papel fundamental na construção do pensamento de
alunas e alunos e a reprodução dos mesmos em sociedade, além de contribuições efetivas no
desenvolvimento da sensibilidade humana em suas relações interpessoais. Sendo assim,
acredito que seja importante que os educadores e educadoras estejam receptivos a repensar
suas práticas de ensino, não somente em aspectos corporais técnicos, mas igualmente em um
nível de formação correspondente ao contexto contemporâneo em que vivemos, o que na
maioria das vezes não acontece, como constata Marcelo Grangeiro (2014, p. 85), quando
afirma que:
Há um forte desinteresse pela maioria dos profissionais e dançarinos de salão em
conhecer qualquer conteúdo que não seja a execução de passos e/ou sequências
coreografadas, onde o desenvolvimento de várias outras questões subjacentes do
ensinar e aprender têm sido, praticamente sempre, marginalizados.

4
Oficina de Dança de Salão – Condução compartilhada e indução, dentro do Projeto de Extensão 5,6,7 e 8 ,que
aconteceu de 22 de agosto a 31 de outubro, às terças-feiras, em dois horários (às 17:30 e às 18:30), no Complexo
Didático Artístico (CDA) da UFSM. Ver plano de curso no Apêndice A.
11

Além da condução, trago inquietações sobre as funções das damas/mulheres na dança


de salão, pois no senso comum do ensino tradicional, elas acabam sendo limitadas em apenas
embelezar a dança, realizando adornos e enfeites5, sendo sensuais, delicadas ou leves, entre
outros adjetivos que as qualificam dentro do estereótipo feminino, igualmente construído pela
sociedade. Porém há mulheres que gostam - ou talvez se fossem incentivadas, gostariam - de
um engajamento mais ativo na dança, como em meu caso, em que não me interessa apenas
parecer atraente e uma boa executora de passos e sim buscar significações mais profundas
através de minhas movimentações, ideia que fui desenvolvendo com o tempo através de uma
autorreflexão sobre o sentido de ser dama na dança de salão. Desta forma, acredito que seja
necessário que, principalmente as professoras, problematizem a função das damas na dança,
incentivando as alunas a despertarem para essas questões, fugindo da postura simplista e
quase sempre com uma visão retrógrada, com que o feminino é vislumbrado nas danças de
pares, inclusive pelos próprios agentes do ensino.
No decorrer deste trabalho, irei mostrar que a visão que considero limitada a que se
destinam as mulheres na dança de salão está também atrelada e sendo influenciada pela
condução, quando partida única e exclusivamente dos cavalheiros, deixando quase sempre as
mulheres com a única opção de terem uma função estética na dança. Além disso, esse trabalho
discute de forma mais específica a formação das professoras de dança de salão, que é
diferente de como os homens professores são formados. Isso ainda diz respeito às aulas e de
como elas são direcionadas, pois como no modelo tradicional de ensino as mulheres não
aprendem a conduzir, por consequência acabam não se tornando diretamente aptas a ensinar e
para que isso aconteça é indispensável um empenho redobrado por parte das que desejam
tornarem-se professoras e serem de fato ativas no processo de ensino e aprendizagem das
danças de salão.
Tendo a mim, juntamente com os participantes da Oficina como personagens
principais, o presente trabalho se caracteriza como uma pesquisa de cunho qualitativo, pois
está interessado na profundidade de compreensão do grupo social envolvido e, para isso,
lança-se da Autoetnografia e da Etnografia como ferramentas para aporte metodológico.
A palavra etnografia advém da junção de duas palavras gregas: ethnos (nação) e
grapho (escrevo) que significa literalmente “descrição dos povos” e constitui-se como um
método com o qual se opera, predominantemente, a pesquisa de campo nas ciências

5
Movimentos realizados quase que exclusivamente pelas damas na dança de salão, principalmente utilizando-se
de mãos, braços e pernas quando estiverem livres, ou seja, em momentos específicos, desde que não atrapalhe a
condução.
12

antropológicas, pois segundo Mônica Dantas (2016, p.171), “é a partir da descrição


etnográfica que se elabora o conhecimento específico da Antropologia.”
No seu surgimento, o método etnográfico era utilizado como um recurso apenas para
coleta de dados, no qual o pesquisador não se envolvia de forma mais expressiva e
aprofundada no campo de atuação, permanecendo apenas como um observador do mesmo.
Porém essa maneira de se pensar a Etnografia foi sendo reavaliada, tornando-se alvo de
críticas, “o que levou os pesquisadores a questionarem suas relações com os sujeitos e grupos
estudados e a propor novos modos reflexivos e autorreflexivos de produção de
conhecimento.” (MARCUS; FISHER apud DANTAS, 2016, p. 171) É interessante considerar
que, neste tipo de metodologia, há um entrecruzamento das realidades e saberes intrínsecos de
cada indivíduo, bem como aspectos culturais e sociais que não podem ser ignorados, pois de
acordo com Amurabi Oliveira (2013, p.179):

Ao contrário de outras metodologias que nos possibilitam tornar a experiência social


um objeto de reflexão, a Etnografia transforma tal experiência em meio para a
delimitação e investigação do objeto, o que se mostra bastante complexo quando
envolve a realidade educacional.

Um dos principais recursos que contribuíram para a elaboração desta pesquisa foi a
Oficina prática de dança de salão, onde a participação ativa dos alunos e alunas participantes
teve importância fundamental para legitimar a abordagem da pesquisa. Portanto, o método
etnográfico veio dar o suporte necessário para que eu pudesse observar a produção dos alunos
e alunas dentro de um campo específico de ação, a Oficina. O artifício principal utilizado para
gerar material de análise e inspiração para escrita foram os diários de campo, tanto meus
quanto dos alunos e alunas, contribuindo para a pesquisa de forma direta e efetiva, pois:

Se o diário é instrumento que o pesquisador se utiliza em campo também é ele que


permite um afastamento do campo, possibilitando tanto uma análise do
desenvolvimento da pesquisa, quanto uma autoanálise do pesquisador e de sua
estada no universo de investigação. (OLIVEIRA, 2013, p. 175)

Neste sentido, utilizo tanto a autoetnografia dos alunos e alunas em relação ao vivido,
quanto a minha etnografia em relação a eles. Como exposto acima, dos diários emergem
informações para além do pesquisado, pois as autoanálises dos alunos e alunas, tanto
corporais quanto de sensibilidades, passam indubitavelmente por abstrações de âmbito
pessoal, envolvendo nuances e um rico terreno do autoconhecimento de cada sujeito, uma vez
que foi incentivado sempre que os mesmos buscassem em si as respostas para indagações de
13

foro mais íntimo e que dialogavam com as propostas das aulas. Se existiam dificuldades nos
exercícios de contato, em caso afirmativo, por que achavam que isso ocorria? Ou então para
atentarem se conseguiam, com alguma facilidade, escutar as propostas corporais de seus
parceiros de dança ou se na maioria das vezes já chegavam executando as proposições sem
aguardar o jogo corporal de perguntas e respostas, como no exercício de contato
improvisação, por exemplo. Assim, na minha avaliação, fica evidente que a Oficina não
serviu somente para uma produção de dados devido à necessidade da minha pesquisa, mas
igualmente buscou afetar alunas e alunos de forma direta e significativa com objetivos
específicos nas aulas, que de uma forma ou de outra, trouxeram consequências diferenciadas
para cada um dos participantes. Aqui vale ressaltar a importância de se levar em consideração
os aspectos sutis da vida dos mesmos, não somente ligadas à dança, até porque a maioria
quase não teve ou têm essa vivência, e também nunca fizeram aulas, mas se deve estar atento,
igualmente, aos registros pessoais ligados à corporeidade de cada indivíduo, pois estes
aspectos influenciam diretamente no andamento das aulas, e naquilo que será construído pelo
grupo.
Sendo assim o método Etnográfico de pesquisa em dança no presente trabalho,
justifica-se não somente pela participação ativa dos indivíduos que vivenciaram a Oficina,
mas também porque o relato escrito de suas experimentações no processo, além de trazer
sensações e impressões individuais subjetivas que enriquecem o campo de análise de forma
significativa aos mesmos, ainda dialoga de forma direta com minha vivência dentro do tema
apresentado. Ao mesmo tempo em que existe um campo de observações, a metodologia
utilizada trouxe de forma direta minhas experiências, entrelaçadas à investigação e às
vivências nos campos de imersão que englobam especialmente as aulas que frequento com
assiduidade, além de cursos, workshops, bailes e ensaios, caracterizando-se assim em uma
Autoetnografia, que também serviu de caminho metodológico, inclusive aos integrantes das
aulas da Oficina. Segundo Sylvie Fortin (2009, p.83):

A Autoetnografia (próxima da autobiografia, dos relatórios sobre si, das histórias de


vida, dos relatos anedóticos) se caracteriza por uma escrita do “eu” que permite o ir
e vir entre a experiência pessoal e as dimensões culturais a fim de colocar em
ressonância a parte interior e mais sensível de si.

A partir da afirmação conceitual acima fica evidente a fusão entre a bagagem pessoal
da pesquisadora no campo de estudo, relativas à dança e a vida, pois “o investigador fica
comprometido como instrumento, objeto e sujeito da investigação, na medida em que
progride sua imersão no campo.” (DANTAS, 2016, p.170).
14

Os subsídios empregados na captação de sentidos e inspiração para esse trabalho


foram provenientes de fontes variadas, através da observação e descrição da realidade
presenciada por mim, e transcritas em diários de campo, da Oficina realizada, bem como de
reflexões mais aprofundadas de aulas, bailes, ensaios, oficinas, workshops, conversa com
colegas e profissionais da área, vídeos, fotos, entre outras paisagens que por ventura
ganharam magnitude e foram significativas no decorrer da elaboração da pesquisa, frutos da
concepção e compreensão do tema pela autora, contando com o suporte de embasamentos
teóricos, mas especialmente pelas significações e consequências da vivência prática
envolvendo os vários aspectos ligados à questão temática. Aqui destaco a relevância de uma
maior importância do exercício da escrita (diários), quando comparado aos demais recursos
para a produção das informações que interessam ao pesquisador, como pode ser enfatizado
por Fortin (2009, p.80), quando afirma que:

Pouco importa o tipo de observação participante que será adotada, o pesquisador


tomará cuidado de consignar sua vivência sobre o campo. Seu relatório de bordo,
crônica da ação ou carnê de prática (diferentes apelações são utilizadas de maneira
quase intercambiável) compreende evidentemente a descrição dos gestos e palavras
dos protagonistas do estudo, mas também as análises espontâneas ou intuições que
poderiam surgir no calor da ação. Além destas notas descritivas e analíticas, ele
registrará as notas metodológicas, quer dizer, as adaptações que não deixam nunca
de espalhar o percurso de um estudo em arte onde o imprevisível surge e deve ser
sempre compreendido. Mesmo a questão da pesquisa pode ser modificada e o
pesquisador terá a vantagem de poder retraçar a gênese graças as suas notas de
campo.

Vale ressaltar que os recursos para geração de dados foram sendo construídos de
forma dinâmica e, muitas vezes, de uma maneira inusitada, pois as mesmas sempre estiveram
em constantes modificações contando com o acréscimo de novos relatos que contribuíram e
serviram como material norteador durante o processo de criação do trabalho. Ou ainda uma
informação complementava a outra, tanto o retorno das alunas e alunos quanto minhas
anotações pessoais no contexto da Oficina e fora da Universidade, provando assim, as
relações existentes entre um universo e outro. Pois como afirma Oliveira (2013, p.163):

Esse processo contínuo de anotação e descrição na pesquisa etnográfica possui uma


finalidade, pois é por meio desses dados que buscaremos relacionar fatos
aparentemente singulares a outros acontecimentos, pois uma das questões
fundamentais para a Etnografia é a dimensão da totalidade.

Ou seja, por mais que os locais de análise tenham abrangido diversidades bem
demarcadas em vivências e experimentações, tanto minhas quanto dos participantes da
15

Oficina, ao final de cada reflexão sempre foi possível um ponto de interseção entre os
mesmos, pois “o método etnográfico pressupõe, no processo contínuo com o outro, um
exercício de alteridade, por meio do qual não apenas esse outro é pensado, mas também nós
mesmos.” (OLIVEIRA, 2013, p. 177).
O presente trabalho foi estruturado da seguinte forma: no primeiro capítulo, apresento
uma introdução ao tema, justificando o objeto de pesquisa, bem como esclarecendo sobre a
metodologia de pesquisa escolhida. No seguinte capítulo inicio com um breve contexto
histórico de como a dança de salão surgiu e da sua chegada ao Brasil, focando em relevâncias
sobre o surgimento do ensino. Na sequência, descrevo a realidade encontrada no ensino
habitual da dança de salão, além de como o conhecimento é transferido aos alunos e alunas,
principalmente em aspectos ligados à condução, também abordando de forma específica a
realidade local, a partir de impressões advindas de relatos narrados por mim, segundo minhas
experiências transcritas no diário; e por fim abordo problematizações que advêm dessa
realidade.
O capítulo 3 disserta sobre o surgimento de novas possibilidades de se dançar a dois,
através de um olhar diferenciado em relação à condução, discorre ainda a respeito da
experiência da Oficina realizada como um laboratório de experimentações para conscientizar
as pessoas no desenvolvimento e na busca pelo diálogo corporal.
16

2. DANÇA DE SALÃO: DAS ORIGENS À CONDUÇÃO COMPARTILHADA

2.1 BREVE HISTÓRICO DA DANÇA DE SALÃO

O advento da Dança de Salão remonta à época do Renascimento, quando eram


chamadas de danças sociais, pois objetivavam o estreitamento das relações de amizade, de
romance, de parentesco em festas, confraternizações, entre outros contextos que envolviam
diversão e lazer. A denominação de salão está ligada ao fato de ser praticada em salas com
espaços amplos e porque quando as danças sociais adentraram os salões da nobreza passaram
a ter uma grande visibilidade, reforçando esse nome, especialmente a partir do reinado do Rei
Luís XIV, na França. Fato é que a dança de salão era praticada, tanto pelas camadas populares
da sociedade, quanto pelos nobres. Por mais que ela tenha sido, por muito tempo, dançada
pela nobreza. “Dentro da classificação das danças, podemos afirmar que a dança de salão está
também inserida na categoria de dança popular por ter suas origens nas causas sociais,
políticas ou outros acontecimentos.” (GRANGEIRO, 2014, p.61). Um bom exemplo de uma
dança que aflorou nas camadas populares com um forte apelo de libertação das opressões do
meio social, advindas de exploração, foi o Tango, além de sofrer uma marginalização pelas
camadas abastadas da sociedade, como constatado abaixo:

Com a alta taxa de imigrantes e as péssimas condições de trabalho, viver em Buenos


Aires passou a ser um grande problema: surgiram os conventillos, conjuntos
habitacionais, nos quais muitas pessoas habitavam nos bairros populares (arrabal).
Esses locais de encontro entre negros, imigrantes, criollos e compadres onde era
permitido dançar o tango. (SILVEIRA, 2012, p.4)

Há indícios que apontam que as Danças de Salão praticadas pela nobreza europeia, a
partir de certo período histórico, tiveram sua inspiração oriunda de modo direto das danças
populares. Como afirma Grangeiro (2014, p. 60), sua evolução obedeceu ao seguinte trajeto:
iniciou-se no templo, foi para a aldeia, em seguida para a igreja, depois para as praças, os
salões e por último os palcos. Algo relevante a ser mencionado é que a dança vivenciada pelas
camadas mais populares da sociedade eram dotadas de maior flexibilidade no que diz respeito
à execução de passos, era um improviso que nascia da espontaneidade dos pares:

Historicamente, as danças de salão tais quais as conhecemos hoje, nasceram sendo


dançadas de forma improvisada, sem figuras pré-estabelecidas. A partir da
desconstrução de passos de danças de salão europeias e improvisações cada vez
mais virtuosas dos dançarinos, os bailes ocorriam com o improviso total de
17

movimentos pelos pares. Não havia ‘passos certos’ e as figuras eram copiadas,
revisitadas e reformuladas a todo instante. (STRACK, 2017, p.33)

No Brasil a Dança de Salão, em seu princípio, chegou trazida pelos colonizadores


portugueses, ainda no século XVI. Como não poderia ser diferente, o modelo de se dançar
pela corte europeia foi transferido para o Brasil e, assim como lá, com peculiaridades
demarcadas em ser social e realizada em grandes salões. Segundo Marco Perna (2001), no
século XIX, com a vinda da Família Real Portuguesa para o Brasil, as danças sociais como a
polca, a quadrilha, a valsa e o xote chegam ao Brasil. Com o tempo, a configuração de pares
dançada no modelo europeu começou a sofrer forte influência da cultura dos povos que já
habitavam as regiões colonizadas, posteriormente com a fusão dos ritmos africanos, com a
música e a dança europeia. Assim foi possível o nascimento dos principais gêneros musicais e
danças brasileiras, como o Lundu, o Maxixe e, mais tarde, o Samba de Gafieira, a Lambada, o
Forró, entre outros. Destaco aqui a importância do Maxixe no panorama inicial da Dança de
Salão no Brasil:

O Maxixe foi o embrião do que hoje dançamos nos salões de todo o Brasil e quão
importante foi para o desenvolvimento da dança de salão brasileira. Não se sabe
exatamente quem foi o criador dessa dança, o que se sabe é que as danças daquela
época seguiam o modelo europeu de dançar. (GRANGEIRO, 2014, p.67)

Sendo assim, quando as Danças de Salão, provenientes da cultura popular, se tornaram


alvo de grande atenção por parte da nobreza, além de começarem a sofrer lapidações no
sentido de se encaixarem aos variados moldes típicos da corte, a figura do professor começa a
aparecer. Nesse contexto, os que ensinavam eram os dançarinos mais habilidosos e que eram
contratados pela elite para essa função, especialmente dançarinos de classe social mais baixa,
assim a nobreza também poderia ter acesso às danças praticadas por esses grupos. Isso pode
ser constatado por Grangeiro (2014, p. 32-33), quando afirma que:

Há algumas décadas, as danças de salão eram ensinadas por dançarinos que se


destacavam no salão. A figura do professor relacionava-se básica e diretamente,
àquele dançarino que sabia fazer mais passos e através de repetições, enfatizavam
aspectos técnicos dos movimentos.

É importante frisar que essa cultura advinda de épocas passadas, no qual os dançarinos
que se destacavam eram convidados para serem professores, persiste até os dias atuais
predominando no ensino não formal, pois conforme Sérgio Santos (2016, p.11), “existe uma
18

ideia errônea de que ensinar Danças de Salão se trata da reprodução de passos existentes e de
que ao saber reproduzir os movimentos de dama e cavalheiro, a pessoa está apta a ensinar
Danças de Salão.” Concordo com o autor nessa afirmação que nos aponta para uma visão
equivocada de ensino, pois como não existe uma formação específica em Dança de Salão
mais aprofundada em estudos do corpo e aspectos cognitivos diversos, a maneira com que
professoras e professores se posicionam diante do cenário educacional acaba sendo quase do
modo como aprenderam, reproduzindo fórmulas e, na minha avaliação, contribuindo para
uma desvalorização na área de conhecimento da dança, especificamente das danças de salão.
Além de que isso pode ter implicações negativas consideráveis, como pode ser especificado
abaixo por Maristela Zamoner (2004, p.9):

Uma das consequências que podem ser apontadas ao se verificar esta situação diz
respeito ao domínio de técnicas didáticas. Outro aspecto refere-se ao conhecimento
sobre educação que todo professor, seja qual for o conteúdo que ministre, deve ter.
Este conhecimento é essencial para compreensão da abrangência das ações dos
professores e no caso da dança de salão, também dos coreógrafos, que detém
funções educativas com o aluno e com o público.

Historicamente, as culturas se encarregam de atribuir as distinções e formar uma


direção de comportamento às mulheres e outra dimensão aos homens. E quando falamos em
gênero, na vastidão e diversidade de seu contexto, logo nos vem à cabeça as divisões que se
fazem para delimitar marcadores nomeados, naturalizados e reforçados desde a infância com
atribuições como sendo próprias para meninos ou para meninas. Sendo assim, pode-se
afirmar, então, que as construções sociais para homens e mulheres, são formadas por uma
cultura e as configurações encontradas nos salões onde a dança de pares acontecia era reflexo
direto de como a sociedade se apresentava naquela época. Papéis distintos de gênero feminino
e masculino ocupavam diferentes atribuições sociais o que foi transferido para a dança:

A dança de salão surgiu em um período da história da humanidade, e em uma


sociedade tal, que uma das regras de convivência familiar era vulgarmente
conhecida como: “o homem é a cabeça do casal”. Naturalmente, esta condição
refletiu-se no produto artístico e de entretenimento da época, a dança de salão.
(ZAMONER, 2011, p.1)

A partir do panorama geral da origem das Danças de Salão, é possível constatar que
em uma perspectiva histórica, elas emergiram dentro de uma conformação na qual o
protagonismo do dançar em relação a atitudes de iniciativas e dominação sempre foi a dos
homens, sendo os mesmos agentes irrestritos da evolução da dança enquanto ela acontecia.
Essa configuração era um reflexo da sociedade em que se vivia, e pode-se afirmar que ainda
19

hoje presenciamos um machismo arraigado e predominante nas relações sociais, algo que se
expressa na dança, especialmente a de pares. Particularmente, no que diz respeito ao ensino
hoje, não vejo os homens como vilões nesse processo e sim indivíduos carregados pela
cultura estabelecida de séculos, onde fazer parte desse universo de papéis bem distintos e
demarcados sempre foi, e ainda é, naturalmente encarado de uma forma praticamente
inalterada.

2.2 A CONDUÇÃO NA DANÇA DE SALÃO

É interessante trazer o conceito do dicionário dos principais significados da palavra


conduzir e que traduzem com bastante clareza, em termos práticos, como a condução nas
danças de salão é realizada nos padrões tradicionais:

Verbo transitivo: 1. Servir de condutor a. 2. Levar. 3.Trazer, transportar.4.


Transmitir. 5. Encaminhar. Verbo transitivo e intransitivo: 6. Estar ou ter capacidade
para estar no comando de um veículo (ex.: conduzir um caminhão; aprendeu a
conduzir). (PRIBERAM, 2013, s.n.)

A condução nas danças de salão é o preceito elementar e considerado imprescindível


para que a dança aconteça e se desenvolva, e para isso temos os papéis e comportamento de
damas e cavalheiros muito bem delimitados, pois segundo Ana Julia Pinto Pacheco (1999, p.
166) “condução significa os procedimentos pelos quais o homem conduz/dirige a mulher
durante a evolução dos passos dancísticos.” Sendo assim, a relação que se estabelece é de que
uma pessoa deve desempenhar uma função ativa (homens) e a outra, consequentemente,
torna-se o agente passivo (mulheres) durante a dança, pois:

Tradicionalmente o Cavalheiro conduz a Dama durante toda a dança, mesmo nos


momentos em que o par se solta. O papel de condutor cabe à pessoa que estiver
desempenhando o Cavalheiro, bem como o de conduzida cabe a quem estiver como
Dama. (STRACK, 2017, p.28)

Porém, conduzir na dança nem sempre foi como conhecemos hoje, em que para cada
passo a ser executado é necessário uma condução específica. Quando do surgimento da Dança
de Salão, via-se mais liberdade nos movimentos de ambos os envolvidos, e a partir daí
surgiam danças improvisadas com inovações nos repertórios corporais que por consequência
tornavam-se mais criativos e inusitados. Com o passar do tempo, a popularização da Dança de
Salão e a grande procura por parte das pessoas, foi necessária a sistematização de
20

metodologias que fossem possíveis de serem aplicadas para que os alunos e alunas
aprendessem a dançar. Assim sendo, como afirma Strack (2017, p.34), “surgiram a
padronização dos passos, figuras e devidas conduções que conhecemos atualmente e que
continuam a ser reproduzidas nas aulas, facilitando a transmissão do conhecimento, e nos
bailes.”
Para fins didáticos, a condução é pensada em quatro tipos: invasão e ausência, gestual,
indicativa e corporal (STRACK, 2017). Segundo Strack, a mais utilizada é a indicativa, na
qual a parte corporal mais requisitada para conduzir são as mãos; a condução gestual se dá,
primordialmente, através do contato visual, enquanto a de invasão e ausência acontece, por
exemplo, quando um abre espaço para o outro passar ou na dinâmica de passo básico frente e
trás que é quando avanço e meu parceiro recua e vice versa. A condução que mais chama
atenção para fins desse estudo é a corporal, pois é que mais consegue ser o agente de
percepções mútuas de escuta corporal, e que, em minha opinião, precisa de uma atenção mais
aprimorada para contribuir no desenvolvimento de sintonia e conexão entre pares. Nessa
condução utilizamos a mobilidade do tronco para transferir informações a respeito dos
movimentos que se deseja que o par execute. Aqui é importante ressaltar que os tipos de
condução e seu ensino são desenvolvidos com aplicabilidades distintas entre os papéis
desempenhados por damas e cavalheiros, enquanto um aprende a técnica que conduz
(cavalheiros), o outro precisa apenas seguir (damas).
Para melhor compreensão da dinâmica de como a Dança de Salão tradicional
funciona, é possível imaginar a condução e resposta de um passo como se fossem códigos ou
peças com um dispositivo de encaixe único, e que o detentor da peça que deve ser encaixada,
e que corresponde a um passo x, seja somente o cavalheiro. Para cada passo, figura e
sequências existem conduções específicas às quais devem obter a resposta adequada da dama,
assim ela só precisa oferecer a peça correta para o encaixe da peça/código que o cavalheiro
deseja fixar. Nesse tipo de interação, apenas os cavalheiros escolhem as peças que querem
utilizar e se, porventura, o código doador do cavalheiro não encaixa no código receptor da
dama, a dança não acontece. Por isso que, na Dança de Salão, entendemos as damas como
sendo passivas e os cavalheiros ativos no processo de ensino/aprendizagem da dança. Pode-se
atestar isso na citação abaixo:

Para que essa harmonia seja encontrada, estabeleceu-se que as duas pessoas do casal
devem ter conhecimento prévio dos passos que serão feitos nos gêneros musicais
correspondentes (ao menos os passos básicos) e que o cavalheiro será quem
escolherá quais desses passos serão feitos, em que momento serão feitos e em qual
21

dinâmica musical serão feitos. Após estas escolhas, o mesmo deve conduzir a dama
para que ela realize os passos junto com ele. (STRACK, 2013, p.12)

Figura 1: Apresentação de Samba de Gafieira no Natal do Coração, na Praça Saldanha


Marinho.

Fonte: Flayane Höehr Silva (dezembro, 2014).

2.2.1. A realidade encontrada no ensino tradicional

Tradicionalmente o ensino das danças de salão tem como ponto de partida ensinar o
público masculino a conduzir o público feminino, sendo esse o norte principal de todas as
aulas, pois como afirma Fernanda Cristina Monte (2015, p.2), “cavalheiros e damas, em sua
maioria aprendem, desde sua primeira aula, qual é o papel que irão desempenhar na prática.”
Então praticamente todo tempo de aula exige concentração redobrada dos homens da turma,
pois a metodologia das aulas é desenvolvida no sentido de transferir formas de condução para
que os cavalheiros possam compreender e assim conseguirem transmitir às suas damas seus
desejos de movimentações que anseiam executar. Assim sendo, é muito comum as mulheres
estarem dispersas, pois como as aulas são praticamente, o todo o tempo, diretivas aos homens,
muitas vezes elas não prestam muita atenção, já que só precisam seguir corporalmente seus
pares no sentido de entender o que está sendo conduzido, tornando a responsabilidade da
dança maior em relação aos cavalheiros. Abaixo temos a comprovação dessa premissa quando
a autora reitera que:
22

Em todas as aulas os primeiros preceitos da dança, passados de forma detalhada, são


dirigidos a eles, como: manter a postura corporal, ter atitudes firmes, saber agir com
precisão, saber conduzir os movimentos, ser responsável pela proteção da dama,
entre outros. Só depois sabemos quais são os procedimentos destinados às damas
que, geralmente, são repassados de forma rápida. (PEREIRA, 2011, p.105)

Em muitos casos até a disposição espacial com que as aulas são organizadas faz com
que somente os homens fiquem em uma posição que os favoreça a enxergar o que está sendo
ministrado e quase sempre as mulheres ficam de costas e não conseguem visualizar o que os
professores estão ensinando. Dentro desse entendimento de condução unilateral que é possível
caracterizar um monólogo na dança, na qual “somente um dos lados fala e o outro somente
compreende.” (DALAZEN, 2013, p.7). Portanto, temos apenas uma viabilidade de
comunicação existente entre pares, o que apresenta algumas consequências pontuais em
termos corporais e inter-relacionais, o que poderá ser compreendido mais adiante quando
serão abordadas as problematizações decorrentes do modelo tradicional de ensino. Mas o que
é possível assegurar é que basicamente “na Dança de Salão espera-se da dama uma atitude
gestual de sedução e sensualidade, enquanto do cavalheiro espera-se uma atitude viril de
liderança.” (QUINTANILHA, 2016, p.117).
Entendendo que muitos profissionais da área das danças de salão não costumam levar
em consideração áreas do conhecimento que podem servir de subsídio para um
aprimoramento e atualização do ensino e aprendizagem da dança, no que tange à área da
educação, ou seja, é possível afirmar que nas formas metodológicas com as quais as danças de
salão são ensinadas existe um descompasso com a evolução social em uma concepção de
mundo contemporâneo, pois como afirma Feitoza (2011, p. 67) “encontramos professores
utilizando metodologias de ensino fundamentadas em conceitos e metáforas linguísticas que
induzem um entendimento defasado de dança, corpo e do corpo na dança.” Fato é que o corpo
na Dança de Salão é, praticamente sempre, interpretado de uma maneira superficial, ainda
levando de forma considerável somente aspectos ligados à construção social dos gêneros, por
exemplo. A configuração padrão homem e mulher é o que predomina e é assimilado como
sendo o normal para que o aprendizado se torne viável. Isso se justifica muito através do
conceito de condução, pois já que é o cavalheiro quem conduz e a dama a quem toca a função
de responder a essa ação, nada mais coerente que tenhamos aqui nesses moldes de ensino a
configuração dama x cavalheiro, com gêneros opostos. Na citação abaixo é possível confirmar
a existência desse paradigma e algumas implicações desse modelo, quando o autor traz a
seguinte compreensão:
23

Assevera-se que a técnica de “condução”, que é muito bem empregada por diversos
profissionais e com êxito no processo de ensino-aprendizagem, pode ser mal
interpretada como uma imposição social, o que descaracteriza a liberdade vigente
entre ambos os indivíduos que compõem o par e a essência em que essas danças se
baseiam. Por isso, não é a técnica da “condução” que faz o problema, mas sim, o
falso entendimento que alguns profissionais fazem dela, como álibi para impor
certas “verdades” que causam essa problemática envolvendo a relação de gênero,
homem e mulher, e as imposições da sociedade. (DALAZEN, 2013, p.4)

Outro ponto que chama a atenção no perfil das aulas tradicionais é que o ensino das
técnicas dos diferentes estilos de Dança de Salão está pautado, basicamente, na transferência
de passos prontos em forma de sequências – o que chamo de “combos”, que são repassados
aos alunos e alunas, no qual os mesmos apenas têm a preocupação de aprender para depois
reproduzir. Isso acontece principalmente em aulas de iniciados e intermediários, nas quais os
alunos e alunas já estão com alguma base estruturada de técnica básica, o que significa que,
quanto mais experientes se tornam (tempo de vivência no gênero de dança), mais complexas
ficam as sequências ensinadas – ou seja, os “combos” – uma vez que nas aulas iniciantes são
ensinados apenas passos básicos e figuras/passos separados para posteriormente combiná-los,
o que virá a se tornar as sequências prontas. Sendo assim, quando senti monotonia em minha
dança, algo mencionado anteriormente por mim como uma das motivações que me levaram
ao tema deste trabalho, uma das justificativas é o fato de que nos bailes há sempre reprodução
de sequências prontas, o que torna a dança repetitiva, inclusive nas trocas de pares, pois
dançamos de forma padronizada, na qual todos realizam as mesmas movimentações
praticamente o tempo todo. Acho importante enfatizar que os passos prontos ou “combos”
não são necessariamente ruins, o que a mim toca em questionar é o fato de as aulas serem
regidas somente nesse modelo, sem outros interesses e preocupações. Esse ponto de vista
encontra confirmação nas palavras de Grangeiro (2014, p.55):

Não há uma proposta de rejeição a ensinar passos, a valorizar técnicas e outros


indicadores básicos da dança. Estes elementos são imprescindíveis. Fica evidente,
no entanto, a supervalorização dada a estas questões em detrimento a outros
indicadores também importantes.

É importante esclarecer que o foco central que abarca todo o modelo de ensino
tradicional tem a condução como a protagonista das ações didáticas que impulsionam
professoras e professores a criarem suas metodologias, desenvolvendo recursos que sejam
possíveis o ensino de técnicas de condução. As outras diversas características dentro dos
padrões de ensino estão imbricadas dentro de um modelo educacional, no qual cavalheiros são
24

os principais elementos norteadores das aulas, devido ao imperativo de terem que aprender a
conduzir, algo que será explicitado no item que descreverá o papel dos cavalheiros. Vale
relembrar que, tradicionalmente, o que define alguém a realizar a atividade de professor é seu
desempenho na dança, ou seja, é o fato dos sujeitos dançarem bem sob a ótica dos olhos,
principalmente do público, que ao vê-los dançando solicita que os mesmos os ensinem
também a dançar igual, a “dançar bem” segundo eles. Isso perpassa, geralmente, pelo domínio
da quantidade de passos e sequências que os bons dançarinos em questão já têm incorporadas,
para que assim possam repassá-las aos alunos e alunas. A citação abaixo traz essa
confirmação, quando nos diz que:

O ensino da dança de salão não está balizado em nenhuma teoria de aprendizagem,


muito pelo contrário, ele acontece de forma espontânea sem embasamento científico
e metodológico, focado na figura do “professor” enquanto uma pessoa que dança
bem e conhece a maioria dos passos a serem executados e, como detentor do
conhecimento, centraliza as informações e o aprendizado. (AFONSO; ALMEIDA,
2009, p.1).

Outra característica marcante do ensino tradicional é que o aprendizado dos passos se


dá no modelo da cópia, no qual os professores e professoras mostram o movimento e os
alunos e alunas copiam. Modificações nessa estrutura de como ensinar configuram-se em um
desafio para os professores, pois exigem desapego a ideias há muito tempo sistematizadas
como embasamento didático. No entanto:

Repensar o ato de ensinar e aprender as danças de salão, neste momento, torna-se


necessário e urgente, para que possamos construir corpos mais inteligentes e
acessíveis a novos aprendizados, corpos esses livres de vícios de referências
exclusivas do professor, da dependência do espelho e outros indicadores. Assim
sendo, os alunos poderão de alguma forma, desenvolver-se nas danças de salão de
uma maneira mais abrangente e não apenas como um corpo que obedece e procura
imitar os movimentos de outro corpo dançando. (GRANGEIRO, 2014, p.38)

Muitas outras características do ensino tradicional das Danças de Salão poderiam ser
aqui descritas, porém foi priorizado manter-se o foco na condução e em sentidos ligados
diretamente a ela. Também foi optado fazer menção a tópicos que estão igualmente
relacionados à escuta e diálogo corporal, que intencionam a busca pela conexão na dança,
ainda que por ora não detalhados e que será feito posteriormente, trazendo a compreensão de
que todos esses fatores conversam entre si como em uma rede de influências mútuas, que não
podemos mais negligenciar quando queremos compartilhar nossa dança com outros
indivíduos, tornando-a, de fato, como sendo a dois.
25

2.2.1.1 O papel da dama

As damas na Dança de Salão, tal como as conhecemos dentro uma concepção histórica
e social na construção do seu papel, possuem incumbências muito específicas no que diz
respeito a seu desempenho na dança. A principal habilidade a ser desenvolvida pelas damas
com o tempo é sua capacidade de resposta em relação ao estímulo de condução do cavalheiro.
Portanto, é necessário que as mesmas aprimorem sua escuta corporal, para que assim
consigam compreender quais movimentações poderão estar sendo conduzidas, muitas vezes
sendo instruídas em aula a não pensarem e sim a apenas a deixarem-se levar pelo cavalheiro,
ou ainda, no que diz respeito a música, devem escutá-la através do corpo do cavalheiro, ou
seja, através do que o mesmo esteja querendo interpretar. A função principal das damas na
Dança de Salão fica clara na citação abaixo, quando o autor afirma que:

Voltando ao tema condução e boa dama. Volto a afirmar que a boa dama não pensa.
Ela sente a condução e faz determinado passo sem que tivesse pensado em fazer.
Esse é o caso ideal. Boa dama e um cavalheiro com boa condução. (PERNA, 2011,
p.101).

Ou seja, através da afirmação acima fica clara a função restrita das damas, dentro de
ações muito específicas e enquadradas, que as tornam o agente passivo da dança, pois:

Na perspectiva de condução é sempre o cavalheiro que perguntará ativamente e a


dama responderá passivamente, concordando com a pergunta. Não acontecerão
casos de a dama responder de maneira discordante ou de resposta que já seja uma
pergunta. (SILVEIRA, 2012, p.24).

Além disso, às damas também cabem às atribuições estéticas da dança, ou seja, seu
embelezamento por meio de adjetivos que as qualifiquem como sendo sensuais, charmosas,
elegantes, graciosas, delicadas, entre outros. Isso também justifica a criação de metodologias
de ensino voltadas somente para elas, ensinando-as adornos e enfeites prontos, para que
depois possam ser utilizados no momento de se dançar a dois, desde que, obviamente, não
atrapalhe a condução e o andamento da dança. Sobre o posicionamento das professoras em
relação ao ensino destinado às mulheres, o trecho citado abaixo transcreve a ideia de como
essas realidades se dão na prática:

Os ensinamentos são para manterem-se sempre pacientes a espera das primeiras


ações do cavalheiro, deixando seu corpo continuamente em alerta para eventuais
manipulações. Ela também ensina a maneira de exaltar a sensualidade, como por
26

exemplo, demonstrando a forma correta de passar a mão pelos cabelos. (PEREIRA,


2011, p. 78).

Dessa forma, a criatividade das mulheres na dança fica restrita somente a tornar a
dança estética e visualmente agradável, e até nisso pode-se trazer outro ponto de reflexão, que
diz respeito à autonomia das mulheres, pois quase sempre não se estimula à autenticidade e
espontaneidade dos corpos femininos para que elas próprias descubram e até mesmo inventem
formas próprias de autodescobrirem-se e colocarem suas próprias maneiras de enfeitar sua
dança, se assim o desejarem. Como afirma Elisa Quintanilha (2016, p.127), “muito melhor do
que apenas aprender floreios seja a investigação sobre si mesmo ao longo da realização dos
passos e com o tempo permitir que seus próprios enfeites surjam na sua prática
gradativamente”.
Acho interessante comentar que os cavalheiros, considerados como detentores de uma
mente mais flexível no contexto tradicional das danças de salão, são os que permitem algum
espaço às damas para que possam ornamentar a dança. Aqui compreendo como sendo uma
concessão que alguns cavalheiros fazem para que as damas possam ter alguma liberdade em
momentos específicos da dança. Sabe-se que alguns cavalheiros conduzem até os enfeites e
adornos das damas, ou seja, que realmente se incomodam com o fato delas poderem realizar
algo que fuja ao controle dos mesmos.

Figura 2: Momento para as damas na aula de Salsa no 6º Porto Alegre Salsa Congress.

Fonte: Dana Vargas (setembro, 2016).


27

Figura 3: Apresentação de Salsa no Corujão.

Fonte: Silvio Kaufmann (julho, 2015).

2.2.1.2 O papel do cavalheiro

Aos cavalheiros são designadas diversas tarefas e muitas vezes todas de forma
simultânea. É de responsabilidade principal dos homens a condução durante a dança, pois “é o
cavalheiro a quem cabe conduzir e à dama, ser conduzida [...] Cabe a ele decidir formalmente
quais passos e figuras serão executados.” (RIED, 2003, p.37) Porém também fazem parte dos
encargos dos mesmos cuidar da sua dama, além de destacá-la nos bailes, estar atento ao fluxo
do salão, encontrar o tempo forte da música e assim manter o ritmo, aplicar os fundamentos
da Dança de Salão, variar os passos, ser criativo, entre outros. Não é à toa a constatação de
que homens levam mais tempo para aprender a dançar do que as mulheres, devido à
sobrecarga que lhes é exigida. Portanto, o tempo de aprendizado para que um cavalheiro
possa ser considerado como tendo um bom desempenho na dança costuma ser maior em
relação às damas, e “pensando em alunos iniciantes, desempenhar todas as funções citadas ao
mesmo tempo, permanecendo dentro do ritmo da música pode ser um verdadeiro tormento,
levando muitos homens a desistirem de dançar.” (STRACK, 2017, p.33)
O aspecto condução designado aos homens também encontra justificativas em
contextos históricos e sociais na construção de estereótipos demarcados em características
físicas e psicológicas que seriam de caráter masculino, fazendo uma contraposição às
particularidades desempenhadas pelas damas, sendo constatado na fala de Betina Ried (2003,
p.37), pois “o conduzir do cavalheiro exige segurança, determinação, objetividade, habilidade
e domínio técnico, enquanto que o seguir da dama, por sua vez, requer sensibilidade, empatia,
28

criatividade e emotividade.” Permito-me fazer algumas ressalvas na fala da autora, quando


define características, separando-as de acordo com os gêneros. As distinções entre o feminino
e o masculino sempre estiveram presentes na sociedade, reforçados desde a infância com
rótulos sobre o que é de meninas e de meninos, incluindo emoções e sentimentos aos quais
são permitidos a uns e negados aos outros a naturalidade de extravasar. Sendo assim,
considero que seja necessário desfazer essas imposições atribuídas aos gêneros, pois sabemos
que na vida real isso de fato não acontece, em razão de que emoções variadas são
experimentadas por ambos os gêneros de forma natural a partir da condição humana de cada
um, pois “na atualidade, aquele universo masculino repleto de homens viris, poderosos e
dominantes reside muito mais no imaginário social do que na realidade.” (PEREIRA, 2011, p.
112)
Na dança temos consequências pontuais na maneira com que os indivíduos são
classificados como sendo aptos ou não a praticarem determinados estilos. Na Dança de Salão,
especificamente, notamos esses marcadores de gênero bastante explicitados no que diz
respeito à segregação de funções, incluindo até mesmo aspectos subjetivos como capacidade
de realizar algo. A ideia de que cavalheiros não precisam desenvolver aspectos da
sensibilidade os torna, na visão tradicional da Dança de Salão, indivíduos que não precisam
conhecer a fundo e, muito menos, aprimorar a escuta corporal na dança:

Para o Cavalheiro, a escuta corporal não é muito solicitada, muito menos treinada
em aula, pois ele é quem vai decidir os passos, não precisando “escutar” o que o
corpo da Dama tem a dizer. Porém, seu papel vai além de conduzir. Primeiro, o
mesmo precisa decidir qual passo irá fazer. Logo em seguida, conduzir a Dama para
que ela faça o mesmo passo que ele. Por fim, executar o passo junto com a Dama,
dentro do ritmo da música. Todas essas três etapas ocorrem em frações de segundo,
mas devem ser bem realizadas para o bom andamento da dança. (STRACK, 2017, p.
32)

A partir das explanações mencionadas acima, é possível afirmar que, o fato dos
cavalheiros serem os agentes ativos da dança não confere a eles, necessariamente, somente
vantagens e sim os torna alvo de algumas consequências negativas que serão abordadas logo a
seguir.
29

Figura 4: Competição Jack and Jill no 7º Porto Alegre Salsa y Bachata Congress.

Fonte: Mariana Heberle Reis (setembro, 2017).

Figura 5: Apresentação de Bachata no Festival Santa Maria em Dança 2016.

Fonte: Studio N (setembro, 2016).


30

2.2.2 Problematizações dentro da realidade encontrada

Especialmente no que diz respeito ao ensino e aprendizagem é possível elencar alguns


pontos conflitantes acerca do ensino tradicional da Dança de Salão, no qual a condução
quando realizada estritamente nos moldes padrões gera o desencadeamento de algumas
consequências pontuais para ambos os participantes que intencionam compartilhar uma dança.
Começo essa discussão indagando aspectos relacionados aos gêneros feminino e masculino,
em termos arraigado princípios históricos de séculos passados que foram os inspiradores para
o embasamento na formulação da ideia de condução que temos hoje na Dança de Salão:

Os mesmos séculos não foram suficientes para mudar esta regra na dança de salão,
em que o cavalheiro conduz, ou propõe movimentos, e a dama os aceita para que
algo aconteça. Nesta arte, congelou-se um tempo histórico que não existe mais.
(ZAMONER, 2011, s.n.)

O habitual ensino da Dança de Salão deixa brechas incontestáveis, demonstrando o


quanto o contexto de sua prática pode ser machista, pois se faz analogias aos papéis de dama e
cavalheiro, com os papéis de gênero esperados dentro da cultura patriarcal, na qual as
vontades do sexo masculino são as que prevalecem. O ensino das técnicas de condução aos
homens acaba deixando subentendida a ideia de dominação de um gênero sobre o outro, pois
assim cavalheiros “aprendem que o corpo feminino, na Dança de Salão, é um corpo
admissível de ser ‘dominado’ pelas regras de condução.” (PEREIRA, 2011 p.106). Ele
acrescenta que:

Outro discurso fundamental observado nas aulas é de que para as damas restam
apenas à “obediência” dos comandos masculinos e a paciência pela espera desses
movimentos. O papel da mulher de responder a condução masculina na prática é
exercido quando os movimentos femininos são sempre executados logo após os
movimentos masculinos. Não sendo permitida sua execução simultaneamente, muito
menos antecipadamente. Dando a entender que o corpo feminino é ao mesmo tempo
tocado e manipulado, tratado na execução dos passos, giros e rodopios como um
objeto orientado sempre pela administração masculina. (PEREIRA, 2011, p.108).

Neste sentido, há uma restrição na criatividade das damas, que se tornam “livres”
somente no momento de fazer uso de enfeites e adornos, que podem “consistir em uma
elevação de braço, cruzada de perna, movimentações de mãos e dedos, postura de braços,
virada de cabeça” (QUINTANILHA, 2016, p.127), e aqui pode ser feito um adendo na
medida em que nem toda dama gosta de adornar ou enfeitar sua dança, ou seja, não faz
questão nenhuma de utilizar os floreios estéticos tão preconizados para que a dança se torne
31

bonita. É possível pensar em uma dança que para as damas tende a se tornar limitada dentro
de um espaço que as restringem nas possibilidades de aprimoramento individual de suas
corporeidades, quando até mesmo em condições de improviso, as mesmas encontram-se
cerceadas como indivíduos que apenas respondem a estímulos, pois “desde o princípio a
estrutura da dança se encontra fechada, em um tom de monólogo, onde somente o homem fala
e a mulher escuta.” (SILVEIRA, 2012, p.21) Sendo assim, fica claro o quanto falta, ainda,
para que a criatividade das damas esteja de fato sendo considerada de igual para igual em
relação aos homens.
Meu ponto de vista sempre é visando liberdades de escolha, partindo do pressuposto
que devemos ter as opções devidas para isso. Não é errado enfeitar a dança, o questionado
aqui é a imposição para que isso aconteça como uma condição da dança se tornar atrativa aos
olhos das outras pessoas, ou simplesmente, usar adornos por usar, muitas vezes de forma
mecânica e sem um sentido relevante de forma individualizada. Por isso, acredito na
construção de uma dança a partir de cada indivíduo, onde eu como mulher/dama aposto no
autoconhecimento para, assim, descobrir que dança afinal é a minha. Será que acabo
dançando a dança de outras mulheres, como se estivesse sendo uma cópia ou reproduzindo
técnicas corporais que na verdade não me dizem nada de forma significativa? São indagações
para refletir, na medida em que acredito em uma dança agente de transformações íntimas que
extrapolam os limites das técnicas codificadas, na qual é essencial que as mulheres busquem a
sua própria dança, mesmo quando a mesma vier pautada em algum código e mesmo que
tenhamos professoras a nos ensinar ou mostrar um caminho. Presumo ser indispensável que as
mesmas experimentem e desenvolvam o seu próprio jeito de manifestar a técnica, e creio que
isso seja possível apenas quando nos aventuramos de forma intransferível nesse processo de
descobertas que a dança pode ter para cada uma de nós, tendo a consciência de que os corpos
são diferentes e, assim sendo, não há possibilidades de padronizarmos movimentos corporais,
sejam eles passos, adornos ou enfeites.
As percepções acerca de si mesmas passam pelo terreno imprescindível da autonomia,
a qual, na minha avaliação, deve ser sempre estimulada e trabalhada pelos educadores em
suas aulas. Entretanto, algo que acaba acontecendo é que como as mulheres recebem um
ensino que já as tornam passivas no processo de assimilação das técnicas, elas não se sentem
aptas a expressar uma postura mais ativa na dança. Em uma reportagem de Keila Barros
(2014, s.n.) há a fala da professora Sheila Santos que retrata essa realidade, onde a mesma nos
diz que “é preciso que ambos saibam falar e ouvir, só que normalmente a gente só ensina o
rapaz a falar e a menina a ouvir, então, quando ela tem liberdade, não sabe o que fazer com
32

aquilo, e ele não tem sensibilidade pra ouvir.” (SANTOS apud BARROS, 2014, s.n.) Outro
fato a ser mencionado dentro da condição passiva das damas é que devido às mesmas não
estarem despertas a outras possibilidades e recursos corporais, as quais deveriam chegar nelas
através do aprendizado, sobretudo no que diz respeito à condução, a maioria delas não
costuma questionar nada que lhes fuja a compreensão e que poderia ser alvo de indagações
que enriqueceriam consideravelmente a dança de cada uma.
Seguindo essa linha de raciocínio, é também muito comum ouvir falar em um
comportamento feminino esperado delas na dança, baseado em o que um homem espera de
uma mulher/dama para que o cavalheiro queira dançar com ela, ou escolhê-la em um salão de
bailes dentre as muitas opções disponíveis, uma vez que o número de mulheres em bailes é
superior e por consequência, cavalheiros, tornam-se escassos nesses ambientes. Outro ponto a
ser questionado nas danças de pares tradicionais é a configuração mulher/homem. Como não
é visto com bons olhos pessoas do mesmo gênero dançarem entre si, muitas mulheres
esperam bastante até poderem ter uma oportunidade para dançar, já que não devem dançar
entre si. Ainda encontramos dificuldades na aceitação de novas formas de enxergar dois
corpos que se unem com o propósito único de dançar:

As propostas de uma dama mais presente na condução da dança de salão e as novas


possibilidades de formação de pares com dois homens ou duas mulheres sugerem
uma remodelação profunda nas práticas de dança de salão, e consequentemente, nas
formas de conduzir. Essas mudanças ainda encontram uma forte resistência em
nossa sociedade atual, demonstrando grande dificuldade em aceitar diferentes
formas de orientação sexual, além de não admitir uma maior conquista de espaço
das mulheres. (NUNES; FROEHLICH, 2016, p.2)

Na passagem abaixo fica evidenciado mais alguns dos imperativos direcionados às


damas atrelados, dessa vez, à escuta corporal:

A dama deve acompanhar o cavalheiro na direção em que ele conduzir. A dama


nunca deverá começar a dança por si só, devendo ela acompanhar o cavalheiro em
qualquer tipo de condução esteja ele dançando bem ou mal. Por isto, ela deve estar
sempre sensível e atenta ao toque do cavalheiro em suas costas. (GONZAGA, 1996,
p. 20)

Porém é oportuno frisar que quando solicitado às damas que refinem sua sensibilidade
através da escuta corporal, para que assim possam compreender a condução e responder
adequadamente, fica comprovado que, na prática, é algo que não acontece assim de repente
como em um passe de mágica:
33

[...] apenas sentir a condução pode não ser suficiente num primeiro momento.
Inicialmente, a dama precisa entender como essa condução é feita, e quais passos
são pedidos para cada determinada condução, para poder segui-la. Se apenas ‘sentir
a condução’ fosse o suficiente, então um cavalheiro que sabe dançar poderia
conduzir com uma dama que não está acostumada a isso e ela seria capaz de realizar
todos os movimentos que ele pedisse através da condução, somente sentindo-a.
(STRACK, 2017, p.14)

Portanto para que uma dama seja conduzida de forma “relativamente fácil” se faz
necessário que a mesma já tenha alguma vivência dentro do gênero de dança em questão,
onde a condução estará agindo. Essa prerrogativa é confirmada por Strack (2017, p.42),
desfazendo a ideia de que “há um pensamento comum na sociedade de que a mulher não
precisa saber dançar, caso o homem seja um bom condutor.” Sendo assim, fica claro que
cavalheiros serem apenas bons condutores não é garantia para um bom andamento de uma
dança, pois existem outros fatores permeados na aprendizagem que precisam ser alvo de
atenção por parte de todos os agentes envolvidos nesse processo, professoras, professores,
alunas e alunos. Algo que será explanado, de forma mais específica, posteriormente.
Discorrendo ainda sobre as mulheres, dessa vez focando nas que desejam tornarem-se
professoras, é constatado que dentro do modelo unilateral de condução, as mesmas não são
preparadas para esse ofício, pois como só precisam acompanhar os cavalheiros, não há
necessidade de compreender as técnicas e os mecanismos envolvidos na condução. Isso ficou
notório em minhas participações em workshops e congressos, nos quais as mulheres (pares de
professores) passam praticamente a aula toda sem falar nada, e quando falam, é sempre sobre
algum aspecto funcional para as damas não atrapalharem a condução, livrando os braços para
que não obstruam o caminho, ou a adornarem/enfeitarem de forma bonita e eficiente,
mantendo-se a ideia de não interromper o fluxo pré-estabelecido da dança pelo cavalheiro.
Outro fato bastante comum e, pode-se até dizer fixado como um padrão, é a menor
relevância que se dá às mulheres no sentido de conhecer seus nomes por si só, sem que
estejam atreladas a um homem professor, ou ainda muito menos as que seguem uma carreira
independente de terem um parceiro profissional ou não. Essa realidade foi exposta igualmente
na reportagem feita por Keila Barros (2014, s.n.), dessa vez trazendo a fala da professora
Katiusca Dickow, quando nos traz o relato de um diálogo entre professores, descrito abaixo:

Conversando com um grupo de profissionais, comentei que a dança de salão é muita


machista e aí um homem me questionou: “mas será que ela não vai ficar muito
feminista?”. Minha resposta foi que talvez ela precise ficar feminista, por um
período, até que as mulheres se posicionem. Até pouco tempo, os eventos
34

anunciavam ‘professor fulano de tal e partner6, o nome da mulher nem aparecia. Eu


mesma passei por isso. Hoje, conquistei meu espaço, mas muitos ainda são
resistentes a ideia de uma mulher em carreira solo. (DICKOW apud BARROS,
2014, s.n.)

Importante saber que o início da profissionalização da Dança de Salão no Brasil teve


uma mulher como protagonista. Seu nome era Maria Antonieta Guaycurús de Souza, porém
sua figura tornou-se esquecida, provavelmente pelo fato de ela ser uma mulher, além de estar
inserida em um contexto de época que não a favorecia - devido à existência de um machismo
mais generalizado, quando comparado aos dias atuais. Maria Antonieta chegou ao Rio de
Janeiro, vindo do Amazonas, aos 14 anos, com os pais. Em 1945 passou a ser instrutora de
dança na Academia Moraes, tendo formado nomes como Jaime Arôxa e Carlinhos de Jesus
(DRUMMOND, 2004).
Em relação ao gênero masculino também é possível detectar desconfortos existentes
no universo considerável de exigências que tangem às diversas incumbências desempenhadas
por eles. O homem que chega para aprender a dançar se torna o cavalheiro que vai incorporar
características próprias para essa função Muitas vezes a aprendizagem pode se tornar
opressora, uma vez que impõe a eles praticamente todo o ônus em tornar a dança prazerosa e
funcional para o casal, onde:

Os homens devem ser autoritários, enquanto os Cavalheiros fazem prevalecer sua


vontade através da condução. A eles também há uma série de exigências, que nas
danças de salão foram elencadas ao falarmos sobre as várias responsabilidades que
recaem sobre os Cavalheiros ao dançar. Às mulheres, espera-se que sejam
submissas, da mesma forma que das Damas espera-se que se submetam à condução
do Cavalheiro com o qual se está dançando. (STRACK, 2017, p. 44)

Não é de hoje que a figura masculina, e o seu papel designado pela sociedade, traz
obrigatoriedades no comportamento de homens: devem apresentar características de
provedores, másculos e viris, enquanto aquele que demonstra suas emoções e vivencia
abertamente sua afetividade torna-se alvo de preconceitos. Isso acaba sendo transferido para a
Dança de Salão na simbologia da condução, quando tradicionalmente apenas o homem é
considerado o ser pensante no processo de aprendizagem. Quase sempre ele deixa de lado o
sentir, pois sua entrega na dança fica comprometida pelo excesso de atribuições que lhe cabe:
“conduzir bem” acaba se sobrepondo às sensações diversas que a dança pode oferecer. Isso,

6
“Partner: parceiro, parceira, par, sócio, associado, sócia, namorada.” (BLA.BA, s.d.) “Na dança de salão é
chamado partner, “duas pessoas com o interesse comum de dançarem harmonicamente juntos e, no caso dos
parceiros de dança e que são profissionais, não deixa de haver também uma espécie de sociedade.”
(QUINTANILHA, 2016, p.125).
35

muitas vezes, acarreta frustrações nos mesmos, pois quando não conduzem “direito” sentem-
se chateados de forma considerável, com uma sensação de incapacidade e muitos desistem até
mesmo de aprender a dançar. Dentro da ideia de que somente homens devem conduzir há a
geração da ideia da culpa, logicamente que a mesma recai sobre os ombros do público
masculino, afinal de contas foram eles que não conduziram de maneira correta. Aqui vale
abrir um parêntese para falar sobre outro aspecto comumente encontrado na configuração
tradicional da Dança de Salão, que é a ocorrência do erro e o acerto, pois:

se há uma condução para o passo X e a pessoa realiza o passo Y, houve um erro.


Quem foi conduzido percebe que errou o passo conduzido e quem conduz pensa que
pode não ter conduzido ‘direito’, caso contrário o par teria acertado o movimento.
(STRACK, 2017, p. 39)

Não obstante culpar somente os homens pelos equívocos da dança, além de fortalecer
a ideia de que o homem deve sempre ser o provedor, também tira da mulher a possibilidade
de refletir sobre sua própria dança. O fato de ter uma pessoa que erra, seja na condução ou na
resposta, pode gerar desentendimentos entre as partes envolvidas na forma de acusações.
Algumas contestações por parte de damas e cavalheiros, um em relação ao outro, são
exemplificadas abaixo:

Acusações como “você não está me conduzindo”, “você está fora da música” ou
“você não está cuidando do espaço” costumam ser ditas pelas Damas. Ao mesmo
tempo, os Cavalheiros as acusam com “você não está seguindo minha condução”,
“você está realizando o passo antes de eu conduzir” ou “você está se conduzindo”.
(STRACK, 2017, p 40)

Vale salientar que para que a condução aconteça, em uma perspectiva tradicional de
ensino, é necessário que os cavalheiros estejam o tempo todo pensando e decidindo quais
figuras ou sequências desejam realizar, o que significa que dançar com uma dama que não
tenha a resposta esperada torna-se algo não desejado, de modo que “o planejamento do
cavalheiro seja quebrado, fazendo com que toda a linha de raciocínio se perca e o mesmo
tenha que recomeçar sua sequência (ou alterá-la de alguma forma).” (STRACK, 2017, p.33)
Apesar dos cavalheiros serem estimulados a serem criativos, pois devem buscar
variações nos passos e combinações executadas, considero que o modelo tradicional de ensino
em forma de “combos” e sequências prontas também acaba limitando a originalidade dos
mesmos, pois se para cada condução há apenas um passo possível, a criatividade sempre fica
restrita a um repertório pré-estabelecido. O que significa que os cavalheiros irão conduzir as
damas para que realizem as mesmas movimentações sempre, pois “as figuras e passos que são
36

aprendidos em aula, são reproduzidos nos bailes, de acordo com o repertório que os
Cavalheiros possuem.” (STRACK, 2017, p.32).
Outro fator elencado aqui como algo desconexo à época atual em que vivemos diz
respeito à orientação sexual das pessoas que dançam, principalmente dos homens. Muitas
vezes a orientação sexual dos homens é questionada ou colocada em evidência pela sociedade
por optarem pela prática da dança. Diante disso, o corpo masculino que dança apresenta
algumas características que podem não atender aos padrões de beleza e de movimentos
popularmente esperados de um homem. A raiz desse tipo de mentalidade varia de cultura para
cultura e, em minha opinião, tem como um dos incentivadores principais a iniciação das
crianças nas escolas. Segundo Isabel Marques (1997, p. 21) “não são poucos os pais e alunos
que ainda consideram dança coisa de mulher.” Diante disso, resulta a dificuldade de aceitação
por parte dos meninos em realizar atividades de dança na escola, o que hoje ainda é uma
realidade bastante presente. Na Dança de Salão, a questão da possibilidade de dúvidas em
relação à orientação sexual dos homens também pode justificar a falta de interesse em tornar
as mulheres mais ativas e participativas na relação que se estabelece ao dançar, pois:

A aceitação de uma dama com maior relação de força nessa relação poderia
significar um cavalheiro “não homem o bastante”, efeminado e até ser rotulado de
homossexual pelo fato de não impor à dama seu devido papel passivo durante a
dança. (STRACK, 2013, p. 18)

Atrelado ainda a condições dos papéis delimitados de damas/passivas e


cavalheiros/ativos está o reforço da heteronormatividade vigente, pois:

Apenas por esta configuração inicial da necessidade prévia de um cavalheiro que


conduz e de uma dama que é conduzida para que este tipo de dança aconteça, já é
possível perceber um reforço de heteronormatividade de gênero presente nestes tipos
de dança, à qual se fortalece ainda mais nos contextos de manifestação social dos
bailes. (QUINTANILHA, 2016, p.7)

Sabe-se que a Dança de Salão, na época em que surgiu, estava também relacionada a
aspectos que envolviam questões afetivas, em que no contexto dos bailes mulheres e homens
tinham a oportunidade de, além de dançar, flertarem, e onde elas tinham a oportunidade de
selecionar um par através da análise de aspectos que elas buscavam - que se expressasse na
dança desses homens, como segurança, respeito, atenção, criatividade, atitude, sensibilidade e
gentileza, para então assim, escolherem parceiros em potencial, para um futuro casamento. Os
homens, por sua vez, deveriam agradar as mulheres, sendo os legítimos “cavalheiros” no
sentido galanteador da palavra. Essa mentalidade de atrelar a Dança de Salão a
37

relacionamentos íntimos ainda é bastante presente nos dias atuais, mostrando mais um
equívoco existente no modelo tradicional de abordagem das danças de pares, pois essas ideias
acabam sendo reforçadas nos locais de ensino não formal, onde os próprios termos dama e
cavalheiro, ou ainda menina e menino, carrega uma carga “muito grande de estereótipos de
gênero, sendo importante ressaltar a ideia de que a Dança de Salão não é um ritual de
acasalamento e, portanto, não necessita ser dançado por um par heterossexual.” (STRACK,
2017, p.48) Nesse cenário, acho importante que os profissionais da área repensem as formas
de manifestar suas metodologias no sentido de modificar essa mentalidade, desvinculando a
prática da Dança de Salão a questões imperativas ligadas à sexualidade, pois:

A liberdade de uma mulher dançar no papel do cavalheiro, seja com um homem,


seja com uma mulher e vice-versa, deveria ter seu espaço, uma vez que a dança de
salão, hoje, é uma arte e não um ritual de acasalamento para cópula. Mesmo se
fosse, a questão mereceria ser revista, considerando que estamos em busca de
reduzir oportunidades para o preconceito. [...] Como a sociedade resiste para aceitar
e respeitar toda e qualquer opção e/ou preferência sexual, também tem dificuldade
em quebrar o tabu de que a heterossexualidade dos personagens da dança de salão
deva ser obrigatoriamente estendida a seus atores. (ZAMONER, 2007, p. 86-87)

Além disso, outra questão a ser mencionada é que essa condução unilateral muitas
vezes se dá de forma pesada e brusca. Acredito que a ansiedade dos cavalheiros em conduzir
faz com que, seguidamente, utilizem força e pressão em algumas partes do corpo das damas -
muitas vezes justificada como sendo necessária, pois como mencionado por Silvio Rodrigues
(2013, s.n.), “a condução depende de cada dama, tem dama que é mais difícil de conduzir,
então temos que colocar mais firmeza, e tem damas que são umas plumas, onde a condução é
quase nula, pela prática que a mesma alcançou.” Grande parte dos professores não enfatiza
em suas aulas, quando ensinam as conduções aos cavalheiros, os cuidados indispensáveis que
os mesmos devem ter no momento de colocar em prática as técnicas aprendidas. Também não
se ensina às damas que verbalizem possíveis incômodos que possam estar sentindo, o que faz
com que na maioria das vezes elas permaneçam caladas por acharem que a situação é normal,
afinal como os cavalheiros precisam aprender a conduzir, elas pensam que devem estar
disponíveis para que eles, não raras vezes, manipulem seus corpos na intenção de se fazerem
entender. Trago abaixo, como exemplo, a passagem de um dos relatos de Luciana Lua (2014,
s.n.), sobre sua experiência com uma condução inapropriada:

O cara com quem eu estava dançando não era um grande condutor e, enquanto eu
dançava, estava apenas esperando que a música acabasse. De repente ele apertou
minha perna entre as dele e puxou-a para frente, o que me forçava para a fazer um
cambré e, logo de imediato, trouxe meu tronco para cima de volta. Despreparada
38

para a novidade e com o meu peso meio deslocado, foi meu pescoço que sofreu a
consequência do movimento mal conduzido. Eu senti uma dor aguda no pescoço e
logo abaixo dele, no lado direito das minhas costas, especialmente quando tentava
virar a cabeça para frente. Fiquei irritada. Que diabos havia sido aquele movimento?
“Que idiota!” eu pensei. A música terminou logo depois e eu fui embora sem dizer
nada para o rapaz que havia dançado comigo.

Outro relato é o de Maristela Zamoner (2014, s.n.):

Tudo estava maravilhoso, até que o cavalheiro me colocou em um chicote e... antes
que eu o finalizasse, me puxou pelo braço com tal força que não consegui segurar a
cabeça...ouvi o som do disco intervertebral rompendo e veio a dor, que seria minha
nova companheira de vida. Este cavalheiro não desejava de forma alguma ferir uma
dama, não era meu parceiro nem professor. Mas, seja como for, a partir desta dança,
eu carregaria todos os dias, só para começar, a dor de uma hérnia de disco cervical.

Já ouvi a fala de professores argumentando que é como se no “diálogo” o cavalheiro


tivesse que em certos momentos falar mais alto (entendo aqui como gritar), pois a dama não
entendeu de forma instantânea o que ele intencionava conduzir. Porém acredito que nada
justifica conduções violentas, o que acontece principalmente na do tipo indicativa, pois não
deixa opção alguma para dama que não seja a de realizar a movimentação imposta, mesmo
que seja de qualquer jeito, pois “caso a pessoa utilize muita força na comunicação,
empurrando ou puxando o parceiro, ou mantenha um abraço muito apertado para as
comunicações corporais, o par não terá escolha a não ser realizar o passo.” (STRACK, 2017,
p. 111) No entanto, fica o questionamento, e quando os cavalheiros conduzem de forma
brusca sem a necessidade alegada anteriormente, por que então o fazem? Pois, como afirma
Zamoner (2014, s.n.), “uma condução pesada e bruta, muitas vezes, é sentença de lesão”.
Dessa forma, acredito que conduções inadequadas realizadas pelos homens aconteçam
devido à falta de visão crítica ou comodismo, por parte dos profissionais da área, em não
reciclarem suas ideias sobre condução, por acharem que sempre foi assim e por isso não há
necessidade de mudar ou rever as maneiras de execução da mesma. Aqui mais uma vez cabe
salientar que há muito ainda por ser repensado sobre as formas de comunicação entre pares,
pois nada adianta aparatos técnicos diversos ensinando a conduzir para se chegar à realização
de passos e sequências, se essa condução é realizada de maneira nada perceptiva, sem diálogo
e escuta corporal mútua. Para mim, esses quesitos são alguns dos aspectos mais importantes a
serem considerados.
39

3. UM NOVO OLHAR SOBRE A CONDUÇÃO

Mediante ao explanado até agora, fica claro que existem discrepâncias no que diz
respeito à visão comunicacional estabelecida entre os pares quando dançam. Na condução
padrão, somente uma pessoa comunica o que deseja, o que segundo Strack (2017, p. 22),
“leva a uma metáfora dualista de alguém que comanda e alguém que é comandado (ativo-
passivo; sujeito-objeto; dominador-dominado; condutor-conduzido).”
Há variadas formas de ocorrer comunicação na Dança de Salão, podendo ser visual,
sensorial, intuitiva e corporal; sendo a última é a que se destaca para gerar conexão, sobretudo
no que diz respeito ao desenvolvimento do diálogo corporal, um dos focos principais que o
presente trabalho busca investigar. Como nos traz Luiz Dalazen (2013, p.6), a comunicação
corporal “é a chave de toda inter-relação e após sua experimentação comprova-se que o
‘corpo fala’, nem a necessidade de verbalização”. Sendo assim, é fundamental uma atenção
especial para o desenvolvimento da sensibilidade de ambos os agentes propulsores dos
movimentos, em razão de que, “ao invés de uma relação linear de transmissão de mensagem,
é reconhecido que os corpos se afetam mutuamente pelas suas ações.” (STRACK, 2017,
p.23).
Em uma visão relacional de comunicação (FEITOZA, 2011), os corpos se afetam
mutuamente por suas ações, pois há compartilhamento nas movimentações, e, assim, é
desconstruída a noção do corpo como um recipiente, mero depósito de estímulos e sensações.
Quando pensamos na dança sendo dividida entre duas pessoas através do contato -
algo que acontece praticamente o tempo todo nas danças de salão – deve-se entrar em sintonia
para produção de movimentos com o mesmo propósito, pois:

Mesmo que cada um no par se expresse segundo a sua personalidade, colocando


elementos expressivos próprios, devem sempre lembrar que ainda estão dançando
juntos, e que tem um objetivo em comum de cooperação para que a dança aconteça.
(STRACK, 2017, p. 41)

Aspectos como intencionalidade e cooperação também são pressupostos existentes que


geralmente não são notados a olho nu quando observamos os pares dançando, mesmo assim
estão ocorrendo o tempo todo. Segundo Feitoza (2011, p. 9), tem-se uma cocondução, na qual
existe “uma igualdade de propósitos, ou seja, as ações de ambos os corpos, mesmo com suas
singularidades e distinções, objetivam a realização da dança (a dois).” Sendo assim, é possível
afirmar que para o andamento da dança é necessário que as duas pessoas estejam dispostas e
40

que queiram estar juntas dançando, por meio de uma postura de empatia e respeito. E, desta
forma, é possível:

Despertar mais atenção na dança que ali se realiza bem como a ampliação da
disponibilidade corporal, e para, também, proporcionar fluídas dinâmicas as quais
preveem uma constante expectativa por ações dançantes. E não mais a regência do
mero passo, como se observa no formato tradicional, e sim, a relação entre os corpos
que ali se fazem presentes. (SANTOS, 2016, p. 6)

Dentro dessa concepção, surge a ideia de parceria que, segundo compreende Elisa
Quintanilha (2016, p.125), é “uma reunião entre duas pessoas com o interesse comum de
dançarem harmoniosamente juntos e, no caso dos parceiros de dança e que são profissionais,
não deixa de haver também uma espécie de sociedade.” Sendo assim, entendo a ideia de
parceria como algo que deve abranger colaborações mútuas e equitativas:

Uma parceria de dançarinos de salão poderia envolver quaisquer pessoas em ambos


os papéis desempenhados na dança — condutor e conduzido, independente de sexo,
gênero e performatividade, tanto de maneira didática, quanto artística, ou
socialmente. Viável isto é, porém acredita-se que, de acordo com o pensamento
deste universo, seja um ideal mais futuro do que presente, em si. (QUINTANILHA,
2016, p.125)

A partir da fala da autora é possível concordar que flexibilizações nas configurações


rígidas de condução ainda sofrem resistências nos tempos atuais, pois segundo Dalazen (2013,
p.5), “durante muito tempo ao se discutir essa posição da ‘condução’ na Dança de Salão, e até
hoje ao se questionar esse papel do homem e da mulher, a resposta de muitos profissionais
sempre foi ‘na Dança de Salão é assim’ e pronto”. No entanto pesquisadores e, até mesmo
profissionais da área, têm trazido em voga discussões a respeito de novas propostas em torno
de aspectos substanciais que envolvem a condução e o ensino da mesma, “[...] alguns
profissionais têm apresentado em suas aulas, oficinas e mesmo através de sua forma de dançar
alternativas para este rígido padrão.” (MONTE, 2015, p. 8).
Neste trabalho, um dos objetivos é trazer uma reelaboração do termo condução, pois
na palavra em si já temos uma ideia carregada de metáforas que levam ao entendimento de
dualidades na dança, uma vez que segundo Feitoza (2011, p.72):

As metáforas dicotômicas habitualmente usadas na prática da dança dois, tais como


corpo ativo e corpo passivo, impregnam a informação de um corpo que exerce a
ação e outro que é objeto ou ausente de ação. Outro exemplo é a utilização de corpo
dominador e corpo dominado, bem como corpo condutor e corpo conduzido.
41

Sendo assim, uma das sugestões apresentadas aqui é a de interpretar a condução na


Dança de Salão como algo compartilhado e que deve ser manifestado em forma de uma
proposição, no qual temos como elemento principal uma indução de movimentos, trazendo
não somente uma simples troca de uma palavra pela outra, mas também a substituição de
intenções a que se quer chegar dançando juntos. De acordo com o dicionário, é possível
elencar, dentro do interesse temático aqui abordado, os seguintes conceitos para a palavra
induzir: “verbo transitivo. 1. Aconselhar e levar (alguém) a um ato. 2. Instigar; incutir. 3.
Deduzir. 4. Inferir.” (PRIBERAM, 2013, s.n.)
Dentro da perspectiva mencionada anteriormente, na qual para que a dança entre pares
se desenvolva é necessária a existência de ações cooperativas mútuas, a partir da ideia de
indução encontramos essa possibilidade de forma mais coerente, pois “estamos
comprometidos em pensar apenas na ação do ‘guia’, que perdemos aspectos que dizem
respeito à cooperação do suposto guiado para que a Dança de Salão aconteça.” (FEITOZA,
2011, p. 70) Deste modo, quando um dos parceiros de dança propõe um movimento, tenho a
alternativa de aceitar e executar o passo junto com ele, mas dentro dessa mesma ideia, posso
também devolver minha resposta em forma de um novo estímulo corporal que irá induzir meu
parceiro a realizar outra movimentação. E assim sucessivamente manteremos o diálogo
corporal em andamento com a existência de uma dependência mútua e não individualizada:

Este momento de comunicar com o outro não está atrelado necessariamente ao fato
de um parceiro – o cavalheiro – informar algo com eficácia e ser seguido pela dama,
mas talvez, esteja atrelado a um acordo entre ambos para se recomeçar a dançar.
(SILVEIRA, 2012, p. 24)

Outro aspecto importante que se torna elucidado, quando utilizamos induções na


dança, é a noção do diálogo corporal, como forma de uma comunicação de fato, bilateral, no
qual passaremos a constituir uma dança/diálogo, em que ambos terão espaço para “falar” e
“responder” igualmente, produzindo juntos um dançar mais criativo e menos enquadrado
dentro das limitações técnicas de condução habitual. O conceito de diálogo é trazido por
Dalazen (2013, p.5):

Aceita-se que diálogo é uma forma de fazer circular sentidos e significados através
de uma relação. Todo diálogo é uma forma de se relacionar com alguém, ou com
mais pessoas, utilizando o uso da palavra. De uma forma mais abrangente define-se
o diálogo como uma maneira de se relacionar com alguém e manter ligações e
vínculos em prol de um entendimento comum. Ele visa unir, ao invés de separar, o
que o diferencia das definições de discussões de ideias e debates, por exemplo.
42

Na Dança de Salão é imprescindível trabalharmos no sentido de desenvolver esse


diálogo, para isso necessitamos reformulações no ensino e que atentemos para os aspectos
correlacionados, algo que será abordado mais adiante. Quando ensinamos, devemos ter o
entendimento de que tudo que utilizamos como metodologia para se chegar a um determinado
objetivo traz a fixação de ideias e comportamentos que ultrapassam o aprendizado motor.
Portanto, acredito que seja preciso desconstruir em aula conceitos pré-estabelecidos de como
se deve dançar e incorporar uma mentalidade que torne o aprendizado a partir do
entendimento de que:

Os pares possam atuar de forma conjunta, com instruções dadas um ao outro sem
um condutor pro tempore. Vislumbramos as possibilidades da troca contínua de
instruções, quando o condutor assume o papel de conduzido. No entanto, lembramos
que a efetivação desse cenário requer alterações na formulação do modo que se
ensina e que se aprende. Por isso, propomos efetivar a alternância dos papéis entre
quem conduz e quem é conduzido, quando o conduzido passa a conduzir e quem
conduz passa a ser conduzido. (SANTOS, 2016, p. 5)

Pode-se afirmar que assim haverá equilíbrio expressado na equidade de movimentos,


no qual os dançarinos se apoiam mutuamente, em uma dança onde os papeis se revertem ou
simplesmente não existem. Quando as trocas de proposições são realmente exercidas,
podemos atingir uma evolução no nível da comunhão na dança, em que se compreende que
ambos induzem a realização dos movimentos, em um diálogo real, com a alternância de
papeis ou até mesmo, como sugere Strack (2017, p. 108), uma dissolução da condução:

O diálogo corporal torna-se cada vez mais fluido, chegando a um ponto em que as
“trocas de papéis” não conseguem mais ser definidas. O par influencia-se
mutuamente e a dança surge através dos corpos dos dois, sem passar pelo patamar
de “um falar e outro responder”.

A dissolução da condução tradicional aparece como sendo interessante em uma


perspectiva de colocar por terra na dança a ideia da existência de um corpo dominador (o que
conduz/proponente/ativo) e corpo submisso (conduzido/passivo), pois se invertermos a
condução, ou seja, se ensinarmos somente as mulheres a propor conduzindo movimentações,
a suposta relação de dominação de um corpo sobre o outro ainda seguirá existindo, e a relação
de diálogo se tornará igualmente inexiste. Explorar juntos a criatividade, realizando trocas, se
converterá em uma comunhão na medida em que ambos conseguem expressar suas
individualidades de forma perceptiva em relação ao outro, pois:

O ato da comunhão dos corpos onde os dois precisam estar de acordo só poderá
acontecer quando cavalheiro e dama estiverem na mesma sintonia sem que haja um
43

poder de quem manda e outro de quem obedece, pois a dança de par sempre esteve
atrelada a um contexto histórico e cultural relacionada a mando e obediências.
(GRANGEIRO 2014, p.106)

Na minha avaliação, o principal recurso que deve existir para que possamos comunicar
aos nossos parceiros de dança as movimentações propostas é através do desenvolvimento da
escuta corporal, que dentro da perspectiva de indução, deve ser uma escuta mútua, em que
ambos os intervenientes devem desenvolver a sensibilidade corporal. A escuta corporal passa
pelo ouvir, interpretar e responder e está também relacionada ao estabelecimento da conexão,
pois a mesma é “o aspecto fundamental para o desenvolvimento da dança a dois, uma vez que
para propor ou seguir, é preciso estar ao máximo em estado de atenção para com o outro e,
por consequência, sensibilizado ao que ele produz quando aos pares.” (SANTOS, 2016, p.14).
Quando em conexão, cada um apresenta movimentos sutis antes da movimentação
propriamente dita acontecer, sendo necessário um estado de presença por parte dos
envolvidos, já que o “desenvolvimento dessa escuta corporal na Dança de Salão faz com que
ambos estejam atentos aos mais variados sinais corporais: respiração, troca de peso, tensão e
relaxamento muscular, torções corporais, dentre outros.” (STRACK, 2013, p. 43)
Na ótica da condução compartilhada, a escuta corporal de condutor e conduzido
assume características diferentes em suas exigências no que diz respeito à criatividade, como
explicita Quintanilha (2016, p. 128):

A criatividade do condutor está diretamente relacionada à sua decisão de


encadeamento de passos, normalmente conhecidos, à maneira como encaixará cada
passo na música que está tocando, à intensidade do impulso inicial que iniciará cada
passo, à decisão de propor pausas durante o desenrolar dos passos, à atenção
espacial ao espaço dos dois corpos dançantes e aos corpos dançantes que
ocasionalmente ocupem o espaço em comum de dança, como o salão, ao peso dos
corpos envolvidos, ao desenho das formas dos movimentos buscando precisão e às
variações dinâmicas, como por exemplo, a fluência livre ou controlada da
movimentação. A criatividade do conduzido começa, primeiramente, com o tornar
harmoniosa sua escuta perceptiva sobre todas as possibilidades criativas acima
descritas a respeito do condutor. A partir desta boa percepção que o conduzido se
tornará capaz de desvelar na própria prática os momentos mais adequados para
propor suas variações nos movimentos de resposta ao condutor, assim como os
espaços livres, as formas como preencherá estes espaços, como acompanhar ou
mesmo variar a dinâmica proposta pelo condutor.

Pode-se constatar na fala da autora que para que o diálogo na dança se estabeleça, a
partir de escutas mútuas, na intenção de propor e induzir movimentos é necessário treino dos
dois indivíduos que compõem a dança. Tanto o propositor quanto quem recebe o estímulo
deverão saber os momentos oportunos para realizar interferências recíprocas e agregar na
evolução da dança, pois:
44

Respeitar o que o condutor propõe faz parte da “escuta”, compreender que ele quer
passear pelo salão enquanto você só queria girar faz parte da “escuta”, e até para
induzir o condutor a uma movimentação, o conduzido precisa dominar muito bem
esta “escuta perceptiva” do corpo do condutor, percebendo o modo de aquele corpo
proceder no tempo e no ritmo das músicas, a forma que seu corpo se coloca na
realização dos passos, o espaço que o corpo do condutor ocupa no espaço global em
que a dança se realiza, se seus movimentos são expansivos, ou volumetricamente
limitados, os tipos de acentos (enfoque) e impulsos que o condutor costuma
enfatizar em sua movimentação. Tudo isto faz parte da “escuta perceptiva” do
conduzido. (QUINTANILHA, 2016, p. 128)

No que diz respeito às mulheres na Dança de Salão, há uma proposta interessante de


Strack (2013, p.39) para que as mesmas saiam da condição de serem componentes apenas
passivos na dança para transformarem-se em damas ativas - aquela “[...] que recebe o
estímulo do cavalheiro no seu corpo, aceita-o, realiza o movimento proposto e devolve ao
cavalheiro como um novo estímulo.” Ainda segundo a autora, para que se estabeleça uma
comunicação relacional, é necessário que tanto dama quanto cavalheiro sejam ativos. Aqui
vale a observação de que, para que isso aconteça, é preciso a receptividade consciente de
ambas as partes.
Na minha avaliação, ser uma dama na Dança de Salão implica em um “estado de
espírito” momentâneo, onde não preciso manifestar minha dança sempre da mesma maneira.
Posso variar as formas de expressão corporal de acordo com minhas sensações de momento,
variando minha maneira de dançar, posso escolher entre um jeito ou outro como sendo parte
da minha essência. Para mim, o mais importante é que a mulher participe ativamente da
composição e criação da dança, uma vez que ela também se torna propositora e condutora de
movimentos. Outro enfoque interessante diz respeito ao fato de ser possível que damas
proponham como damas, ou seja, não sendo necessário que elas se transformem em
cavalheiros invertendo o abraço, para que as mesmas induzam movimentações.
Acredito que, como docentes, devemos incentivar as mulheres/damas a verbalizarem
mais nas aulas para que comuniquem quando a condução está sendo brusca ou pesada, até
mesmo quando o abraço se torna desconfortável. Muitos meninos quase sempre também não
indagam as meninas se o que estão fazendo está ruim, se está machucando ou não. Acredito
que isso se deva ao fato de que o ensino não preconiza essas questões em suas didáticas e
metodologias de ensino. São nuances que estão subentendidas nos conteúdos ensinados e é
necessário atenção e sensibilização de professoras e professores para que levem em
consideração essas questões no momento das aulas. Considero que é papel dos mesmos
tornarem alunas e alunos críticos, no sentido de torná-los agentes pensantes de suas práticas
corporais dançantes.
45

Com os homens, um dos principais trabalhos a ser desenvolvido fica por conta de
desfazer preconceitos, embasando as aulas no sentido de desfazer aspectos do machismo
enraizado pela cultura, e em termos de dança, no momento de vivenciá-la, o saber esperar,
aguçando sua sensibilidade, do mesmo modo que se estimula para que as damas o façam.
Porém, “um dos pontos mais importantes a ser trabalhado, principalmente com os cavalheiros
que já dançam, é o desapego ao seu ‘planejamento’.” (STRACK, 2013, p.40). Ou seja, a ideia
de que é necessário previamente estabelecer, de forma mental, os passos que os mesmos
desejam executar com as damas, suprimindo assim as possibilidades de diálogo, pois:

[...] em determinados momentos pode ser somente com propostas do homem, outros,
somente com propostas das mulheres, às vezes, ambos falando em um pequeno
intervalo de tempo, com muito intervalo de tempo, e tantas outras possibilidades que
mais uma vez se remetem diretamente à “liberdade” de escolha, a qual é o símbolo
verbal que melhor representa essa expressão de dança. (DALAZEN, 2013, p.9).

3.1 A EXPERIÊNCIA DA OFICINA

Inicio este tópico trazendo o entendimento de Grangeiro (2014, p. 26) a respeito de


método e de como tem se desenvolvido o ensino da Dança de Salão:

Método é o caminho. Os professores de dança de salão hoje, em sua maioria, estão


muito mais preocupados em ensinar passos predeterminados por eles do que
realmente ensinar a dança para as pessoas dentro de seus interesses, necessidades,
possibilidades e expectativas. Dessa forma, podemos dizer que o método de ensino
quando focados apenas em passos poderá pular momentos e etapas importantes de
amadurecimento dos aprendizados. Respeitar as condições básicas deste processo
levará o praticante ao encontro de si mesmo, ao encontro com o outro e com o que
está em sua volta: a música, o salão, sua liberdade de ação e expressão, o ambiente
de aprendizagem, as pessoas, a cultura implícita em cada estilo de dança, o contexto
e a comunidade da dança de salão, dentro outros aspectos. (GRANGEIRO 2014,
p.26)

Acho importante expor o fato de que alterar as relações comunicacionais na Dança de


Salão configuram-se um desafio para mim. A Oficina além de ter objetivos metodológicos
específicos em relação ao aprendizado de alunas e alunos, trouxe-me a oportunidade de
experimentar e até mesmo testar possibilidades, nas quais muitas vezes nem mesmo eu tinha
certeza se funcionariam, pois foram procedimentos que, em muitos casos, nem eu mesma
nunca havia realizado. Portanto, desde o primeiro dia de aula, quando fiz elucidações do foco
da Oficina aos alunos e alunas, deixei claro a eles que também estaria, em muitos momentos,
entrando em contato com perspectivas muito diferentes das quais eu, como bailarina/dama de
Dança de Salão convencional, estou habituada. Outro exemplo marcante, nesse percurso de
46

iniciação até o término da pesquisa, foi eu ter me deparado com a oportunidade de dançar com
meninas, algo que jamais havia feito em um baile de Dança de Salão no tempo de prática que
tenho, pois para mim ainda causa algum estranhamento essa configuração de dança. Sobre
esta questão, Zamoner (2013, p. 14) aponta que:

Precisamos nos aprofundar em estudos e vivências reais sobre o significado


histórico da condução, transmitindo-o a cada indivíduo que inicia nesta arte. E
recriá-lo sempre é uma possibilidade válida. Assim, estaremos mais preparados para
abalar, ou não, os pilares da Dança de Salão que de fato são conhecidos, agregando
experiências diferentes e ampliando as formas de se viver a dança a dois sem deixar
de explorar as compatibilidades de nossos desejos, como damas, como cavalheiros
ou como nenhum deles.

O campo de estudo contou com a realização de um laboratório de experimentações


tendo como protagonistas pessoas que praticamente nunca dançaram em suas vidas, ou seja,
nunca fizeram aulas de dança. Isso se fez importante na medida em que essas pessoas não
estavam habituadas às formas tradicionais de como a Dança de Salão é abordada nos locais
não formais de ensino, então praticamente tudo que era levado para as aulas configurou-se em
novidades para alunas e alunos, e assim foi possível vivenciar um jeito diferente de
compreender a dança, seus corpos e movimentos. Caso os exercícios fossem realizados com
alunos e alunas detentores de alguma vivência já na dança, a percepção seria outra, se
apresentando também como algo de bastante relevância para ser experimentado, quem sabe
em outra oportunidade.
A Oficina ocorreu na Sala dos Espelhos do Centro Didático da Dança (CDA), da
Universidade Federal de Santa Maria, dentro do projeto de extensão 5,6,7 e 8, do Curso de
Dança-Licenciatura. Durante 10 encontros, do ponto de vista dos gêneros de Dança de Salão,
foram trabalhados o Forró7, principalmente, e a Kizomba8.
Houve uma grande procura pelas aulas, sendo que no primeiro dia compareceram mais
de 70 pessoas, muito mais do que a sala de aula comportava. No segundo encontro foram em
torno de 50 alunas e alunos, o que também é um número elevado para o espaço disponível,
mas principalmente complicado para desenvolver a proposta da Oficina. Portanto, no sentido
de poder atender a todas as pessoas, dividi os mesmos em duas turmas, com duração de uma
hora cada aula, às 17:30 uma turma e a outra as 18:30, uma vez por semana. O projeto inicial

7
O forró é um estilo de dança e gênero musical influenciado por africanos e europeus, fruto de ritmos musicais
tais como baião, xote e xaxado. É uma das danças típicas mais populares do Brasil, relacionada à região nordeste
com um ritmo ora lento, ora rápido, recheado de instrumentos como o triângulo, a sanfona e a zabumba.
(DANÇAS TÍPICAS, S.D.).
8
Kizomba é um gênero musical e de dança originário de Angola. O termo "kizomba" provém da expressão
linguística Kimbundo, que significa "festa". (MAIS KIZOMBA, 2017)
47

contemplava uma aula de uma hora e meia, também uma vez por semana (às terças-feiras).
Importante ressaltar que, como é comum em diversos cursos, durante o desenvolvimento do
processo houveram algumas desistências e, ao final da Oficina, as turmas seguiram separadas
em dois horários, porém com um menor número de participantes, especialmente no primeiro
horário. Em média eram aproximadamente 20 alunos em cada horário, mas o número variava
bastante, pois muitos faltavam algumas aulas e reapareciam nas posteriores, não abandonando
a Oficina totalmente. Por aula se faziam presentes, de fato, em torno de dez alunos.
A primeira aula, que estava lotada, foi para apresentar a Oficina com esclarecimentos
gerais de como iria funcionar, especialmente no que diz respeito à condução, de que teríamos
liberdade de escolher quem iria tomar a iniciativa de propor as movimentações, etc. Na
ocasião, os participantes foram informados de que a Oficina fazia parte do projeto de pesquisa
de Trabalho de Conclusão de Curso de Dança-Licenciatura e de que, portanto, para participar
da atividade, era necessário assinar um termo de consentimento 9 . Também foi solicitado,
neste dia, que todos os participantes tivessem um diário de bordo do processo, em que
anotariam sensações, percepções, dúvidas etc. Apareceram nos diários, diversas interpretações
sobre a proposta, muitas delas ligadas à questões de gênero:

O seu Projeto, Lívia, é muito importante ao nosso tempo, pois não está fixo no modelo tradicional,
apresenta esta possibilidade de um novo olhar. Trabalhar com a inversão de papéis, ou melhor, o espaço
de troca na condução, em que não só o homem pode conduzir a mulher, mas sim ambos podem, nos ajuda
cada vez mais a refletir sobre as questões de gênero que está posta em nossa sociedade. Assim também
como o modelo de casal que não é necessariamente, um homem e uma mulher, reconhecer que temos
casais gays, ou simplesmente uma mulher pode preferir dançar com outra mulher independente se ela se
relaciona afetivamente com mulheres ou homens, mas na dança sente-se melhor tendo como par uma
mulher. Simples assim, sem problematizar ou querer enquadrar, mas dar o espaço de liberdade em que o
participante possa escolher. (ALUNA I) 1011

Por sua vez, o Aluno K afirma que:

A proposta inverteria a "condução da dança", ou seja, não haveria uma distinção entre condutor e
conduzida por sexo, fundamentada nas questões contemporâneas de gênero. Eu particularmente achei isso
bastante divertido e interessante. Há tempos tenho acompanhado as discussões sobre gênero, e
convivendo muito com feministas e transgêneros entre outros acho isso importante de ser levado às
práticas artísticas. E por que não a Dança de Salão?

Também nesta ótica relativa à questão de gênero está a fala da Aluna D:

9
Ver Apêndice B.
10
Conforme termo de consentimento (ver apêndice B), os nomes dos (as) alunos (as) não seriam transcritos.
11
As citações dos alunos e alunas, quando maiores de três linhas, sempre aparecerão com endentamento de 1 cm
para diferenciar das citações longas.
48

A proposta de uma condução compartilhada ou da mútua atuação na dança é mais um dos aspectos de
implementação de ações feministas, ainda mais no ambiente onde as mulheres têm tantas exigências e por
vezes pouca decisão imediata como na dança, que é o caso deste relato. O contato com esta modalidade
de ensino está sendo bastante produtivo mesmo porque quando iniciei minha jornada com o dançar em
muitos momentos meninas dançavam com meninas (meninos não sabiam em boa parte dançar) e uma das
duas deveria conduzir e eu muitas vezes o fiz, o que difere em muito do que estamos desenvolvendo nas
aulas que é realmente desenvolver um entendimento conjunto, a corporalidade da dança, dos movimentos.
Talvez algumas pessoas não tenham se encaixado na proposta e acabaram desistindo, pois não
conseguiram romper ainda barreira do machismo na condução "tradicional", e penso que isso venha
principalmente dos homens.

Algumas colocações diziam respeito especificamente à questão da mulher na


condução, como a da Aluna C: “É interessante, como mulher, poder aprender o papel do
condutor e conduzido. Fazendo com que o conhecimento seja ampliado e abram-se novas
possibilidades.” Por sua vez, o Aluno B, que fazia a Oficina com sua namorada, fez a seguinte
colocação: “A proposta para essa Dança de Salão é colocar a condução por ambos no par
dançante e não apenas por uma das partes, geralmente, a masculina. [...] Sem dúvida, será um
aprendizado muito interessante para minha namorada e eu”.
Outras colocações diziam respeito ao modo de ver a metodologia de ensino. “Gostei
da proposta da professora em ensinar um método que não é tradicional.” (ALUNA N). Já a
Aluna H escreveu que:

A proposta das aulas é de que não são apenas os homens que conduzem e é muito interessante e talvez um
grande desafio para a professora, já que as mulheres em sua maioria sempre foram conduzidas e talvez
tenham dificuldade em fazer o papel de condutoras como eu senti.

Enquanto o Aluno O trouxe o seguinte apontamento:

O objetivo das aulas é desconstruir um pouco algumas características da dança de salão. Casais não
precisam ser formados por homem e mulher, o homem quem conduz. Sinto que essa proposta de mudar
um pouco algumas coisas só tem a ganhar mais força, e a crescer, pois quando apenas um conduz se perde
a criatividade do outro, se perde o diferente.

O objetivo principal da Oficina foi trazer uma nova visão aos alunos com a intenção
de lançar sementes para que os mesmos tenham consciência de que podemos aprender a
dançar a dois de outras maneiras, que não sejam somente com uma condução unilateral que já
chega pronta na maneira de “combos” e sequências, e que quase na totalidade dos casos
somente os homens aprendem como fazer. Para mim, todo ensino implica em sugerir e
problematizar algumas situações para que estimule os alunos a expandirem seus horizontes,
nas quais cada indivíduo fará brotar uma ideia de forma diferenciada, quando sentir que
aquilo o toca de uma maneira significativa. Concordo com Paulo Freire (1997, p.47) quando
49

nos diz que “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua
própria produção ou a sua construção.”. Sendo assim, a Oficina buscou incentivar a
autonomia dos alunos, especialmente nos exercícios propostos para desenvolver o diálogo
corporal.
Além do que já foi explanado anteriormente, é válido ressaltar a compreensão de que a
dança traz em si uma neutralidade no que diz respeito a gênero e sexualidade, portanto a
Oficina contemplou e viabilizou a interatividade entre mulheres e homens, sem necessidade
de estabelecer pares definidos por diferenças de gênero, até porque o ato de propor e induzir
movimentações nas Danças de Salão é visto aqui como algo que pode partir dos dois corpos
que interagem, em que ambos os indivíduos são protagonistas ao dançarem. Desta forma, a
necessidade do padrão mulher/homem não é algo relevante nesse contexto.
A Oficina também esteve centrada em aspectos ligados à busca da libertação corporal
de alunas e alunos. A ideia é que, pelo menos momentaneamente, os códigos rígidos inseridos
na técnica sejam deixados em segundo plano, pois os mesmos quando levados ao extremo em
sua interpretação podem gerar tensões, sobrecarregando os corpos de atribuições e nublando a
autopercepção de quem dança. Além disso, a visão meramente utilitária da técnica limita a
sensibilidade que deveria brotar naturalmente, proporcionando uma defasagem na interação
genuína que tanto ansiamos por ver e sentir acontecer entre aqueles que compartilham uma
dança. Isso pode provocar um cerceamento na dimensão autêntica dos indivíduos, muitas
vezes inibindo a essência de cada pessoa. A relevância da Oficina se deu ao sentir a expressão
corporal como algo que não esteve escravizado pela técnica rigidamente exposta e cobrada.
Antes de descrever os temas trabalhados na Oficina, faz-se necessário apontar alguns
aspectos que permearam todas as aulas, configurando-se em diretrizes metodológicas, no que
diz respeito aos termos utilizados em sala, como por exemplo:

Entendo que podemos também alterar algumas formas de utilização do vocabulário


no ensino, aos poucos podemos substituir alguns termos que são utilizados
tradicionalmente no ensino das danças de salão por profissionais da área. Por
exemplo, no lugar do termo condução podemos utilizar o termo proposição,
trazendo assim a ideia de que uma pessoa propõe o movimento, porém a outra terá o
direito de escolher se quer ou não realizá-lo e poderá na sequência propor algum
outro, estabelecendo assim e, de fato, o diálogo corporal e até mesmo a criação de
novas movimentações. (STRACK, 2017, p. 108)

Nos momentos de realizar os exercícios e aprender as figuras, os alunas e alunos eram


instruídos a formarem duplas, deixando-os (as) livres para escolher se essa dupla seria entre
gêneros opostos (mulher/homem) ou iguais (mulher/mulher ou homem/homem). Na hora de
50

aprender a proposição/condução era pedido aos alunos que conversassem entre si para
escolherem quem iria aprender na primeira vez. Após isso, eram incentivados (as) a trocar o
papel, para que as duas pessoas tivessem a oportunidade de experimentar os dois lados do
mecanismo que aciona a dança, ou seja, a proposição e a resposta para a mesma. Sobre isso
segue o comentário da Aluna F:

Outra atividade proposta pela acadêmica Livia, que é de grande valia, é a questão da troca de posições,
ora como condutor, ora como conduzido, pois assim podemos ter noção de ambos os lados, quais os
movimentos que podemos executar e o que não podemos fazer em cada posição.

Outras nomenclaturas reformuladas para utilização nas aulas foi trocar as palavras:
casal por par, condução de movimento por proposição, técnicas de condução por técnicas de
comunicação, cavalheiro e dama por parceiros ou duplas, a partir das discussões apresentadas
anteriormente por Feitoza (2011), Strack (2017) e Quintanilha (2016), no início deste
capítulo.
Abaixo seguem os principais temas abordados nas aulas (ver Apêndice A, plano de
curso). As proposições aqui elencadas foram baseadas, principalmente, em leituras prévias
que realizei antes de amadurecer o tema do trabalho. Além das aulas que faço quase que
diariamente há alguns anos, os workshops que participei em outros locais, contribuíram para a
formulação de algumas ideias, especialmente uma das dinâmicas realizadas em uma das aulas
da Oficina. Também o conhecimento que adquiri durante os anos de graduação somaram de
maneira significativa em minha percepção sobre a Dança de Salão, e consequentemente, na
temática apresentada neste trabalho. Muitas linhas de pensamento coincidiram em mais de um
autor consultado, além de algumas ideias práticas como a da técnica do Contato Improvisação
(CI), bem como a “pequena dança” proposta, igualmente, por de Steve Paxton. (Strack, 2017,
p.112).

3.1.1Noções rítmicas

O objetivo principal dessa aula foi o de introduzir noções básicas de ritmo, já focando
no compasso binário do Forró. Foi explicado o que é o tempo na dança, sendo imprescindível
e atrelado a questões rítmicas - que considero fundamental para um bom entendimento das
possibilidades de como as movimentações podem acontecer. Aqui a ênfase foi dada na
importância da identificação do tempo forte das músicas, que seria o seu acento, de modo a
51

auxiliar para, como se diz, se dançar no ritmo ou no dentro do tempo. Em muitas músicas a
entonação/acento da voz dos cantores também nos aponta o tempo forte da música.
Foi solicitado aos alunos e alunas que batessem uma palma quando sentissem o acento
da música, com a utilização de músicas diferentes em velocidade - foi explicado que o tempo
na dança pode variar em rápido, moderado ou lento (velocidade, intensidade e duração –
fundamentos da Dança de Salão). Após o entendimento geral desses pontos, a atenção
musical foi destinada ao Forró, pois seria a primeira dança ensinada. O Forró possui
compasso binário (tum, tá), ou seja, é dividido em dois tempos (um fraco e um forte). Nessa
aula as alunas e alunos também aprenderam o contratempo (tum, tum, tá), muito utilizado em
todas as danças. Aqui é importante ressaltar uma estratégia de ensino de ritmo, que está ligado
à prosódia:

No ensino da dança, Laguna (2011) considera que as informações auditivas estão


apoiadas da prosódia, a qual relaciona o caráter expressivo do movimento à voz
falada. O autor chama de informação auditiva “não linguística” o uso de
onomatopeias para dar uma estrutura temporal às ações que aludem à informação
musical (WILLADINO, 2012, p. 11)

O que mais chamou a atenção nessa aula foi a dificuldade, em grande parte das alunas
e alunos, em relação à marcação dos tempos, especialmente no sentido de entrar no ritmo,
como alguns compartilharam em seus diários:

Eu, como sou iniciante, mesmo, desconheço ritmo e não conseguia encaixar os movimentos do som no
corpo e nesta primeira aula foi muito produtiva para meu desenvolvimento corporal. A música era o Forró
passo-a-passo e nos foi colocado a base da desta dança. Tivemos um aquecimento e relaxamento antes da
aula que nos serviu não só para descontração como integração do grupo que são aproximadamente 50
colegas. Nesta primeira aula o (im) possível aconteceu eu consegui entender a batida do som, do grave,
que faz a marcação para desenrolar da dança. Apesar de ser algo muito simplório, eu não havia entendido
até então. Após a explicação da prof.ª para identificação do som grave consegui me ambientar e deslocar
o corpo junto a música. [...] A aula teve importante ensino com a audição de tempo e contratempo.
Fazendo com os passos sejam direcionados pela música. Achei a tarefa um tanto quanto difícil porque
tenho certa dificuldade de assimilação do que foi pedido. Haja vista que não tenho iniciação musical na
prática com instrumentos. (ALUNO B)

A colocação dele é importante, pois alguns estudos, como o de Martins e Rosa


(2008), mostram que há diferença na percepção rítmica dos (as) estudantes, e que a
prática de aulas de dança ajuda na melhora desta percepção. Eles também indicam que é
mais fácil para os (as) estudantes começar com uma música mais lenta e depois acelerar.
Além disso, é importante ressaltar a importância dessa aprendizagem musical com a do
código da dança:
52

Um dos primeiros aspectos a merecer atenção para que a dança seja musical é que os
alunos sejam capazes de perceber os tempos ou pulsos musicais e, dependendo do
método de ensino de dança de salão, também o tempo forte, que é o primeiro tempo
do compasso musical, cuja percepção auxilia, em muito, a situar conscientemente o
passo básico a partir de uma dada relação com este tempo. (FILADELFI, 2016, s.n.)

Sobre essa relação, trago a fala da Aluna C: “Tive um pouco de dificuldade em


realmente sentir que estava dançando, pois meu parceiro estava ainda entendendo o ritmo da
dança” e a colocação do Aluno A:

Os passos do forró são bastante simples, mas o que sempre me atrapalho é no ritmo: tentar pegar o ritmo,
por vezes me concentrando demais no ritmo e ficando tenso, ou perder o ritmo e me atrapalhar. Mas isso
acho que se desenvolve com o tempo e esforço.

Figura 6: Aquecimento na primeira aula prática da Oficina.

Fonte: Beth Rocha (agosto, 2017).


53

Figura 7: Noções de ritmo.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (agosto, 2017).

3.1.2 O Funcionamento do estímulo corporal para a proposição

Inicialmente foi falado sobre a importância do abraço na Dança de Salão e que pode
ser uma relação de abraço fechada ou aberta, sendo diferentes as localizações de pontos de
conexão como as costas (abraço), mão com mão (relação fechada ou aberta), parte frontal dos
corpos em contato/linha de conexão de abdômen/tórax (tronco). Pode-se inverter o abraço
conforme a troca de proponente, porém pode-se manter o abraço convencional, mas estar
receptivo à ideia da outra pessoa iniciar a dança (ter calma). Foi enfatizado que o mais
importante é não sair querendo realizar passos de cara e, sim, esperar um pouco antes para
sentir o contato com a outra pessoa, sentindo a respiração, por exemplo. Foi falado
brevemente sobre a variedade de abraços, e que também podemos inventar novos tipos,
buscar algum novo ponto de conexão, pois:

Ao observar como as conexões se estabelecem no “abraço” das danças de salão, fica


evidente como o diálogo do contato, assume papel principal, e ao fazer uma analogia
ao próprio diálogo, erguemos a questão sobre a possibilidade da inversão de papeis
nessa comunicação. (SANTOS, 2016, p.5).

Na sequência foram explanados os tipos de proposição, compreendidos aqui como


técnicas de comunicação, o que seriam as formas de se conduzir. Podem variar de escola para
escola, mas basicamente são:
54

 Indicativa: mais utilizada, normalmente com uma parte isolada do corpo -


geralmente mãos - sendo a condução que mais pode empurrar e puxar o par,
“gerando uma condução manipulativa.” (STRACK, 2017, p. 45);
 Gestual (visual - sem escuta corporal);
 Invasão e ausência: abrir espaço para deixar passar ou também em passos básicos
de frente e trás, um avança e o outro se ausenta para gerar espaço;
 Corporal: através do corpo todo, geralmente tronco. Sendo a Corporal mais
enfatizada aos alunos e alunas no sentido de que seria a mais utilizada para fins de
comunicação e desenvolvimento de escuta corporal mútua.
Foi solicitado que as alunas e alunos fizessem duplas da preferência de cada um, então
lhes foi ensinado a estabelecer o contato, que é por onde passam as proposições com suas
intenções de movimento e consequentemente a resposta do outro corpo a esse estímulo. O
primeiro ponto a ser exaltado foi a importância primordial das transferências de peso. Na
Dança de Salão chamamos de perna de ação aquela que estará livre do peso, sendo ela que irá
poder realizar alguma movimentação, seja deslocar espacialmente ou realizar enfeites e
adornos, tanto de mulheres quanto de homens. Quando dividimos a dança com outra pessoa é
fundamental mapearmos onde está o nosso peso (qual perna), para assim compreender onde
estará o peso do (a) parceiro (a), pois, deve-se cuidar a perna livre do par, especialmente se
desejo propor alguma movimentação. Como os estilos de dança têm seus tempos de marcação
típicos definidos, normalmente chega-se automaticamente com a perna de ação pronta de
forma espelhada, desde que marcados corretamente, ou seja, a perna já livre para realizar as
próximas movimentações de forma sucessiva. Porém muitas vezes isso não acontece, além de
que cuidados com a transferência de peso sempre devem ser alvo de muita atenção e
percepção, sobretudo ao iniciarmos uma dança. Segue abaixo o relato do Aluno J:

Foi bastante interessante o teu ensinamento sobre transferência de peso (ou de movimento) entre os
parceiros. Eu acreditava que não conseguiria ter um certo balanço no momento em que fazia os passos de
dança, já que geralmente são ensinados somente o que se deve fazer e eu aprendi isso de uma maneira
mais mecânica. Porém, quando a senhora ensinou sobre a transferência de peso nas pernas, trabalhando o
flexionamento do joelho, de repente tudo ficou mais claro. Essa seria uma das essências de se ter mais
ginga quando se dança, acredito eu. (ALUNO J)

Maia e Pereira (2014, s.n.) dizem que as transferências de peso devem ser executadas
com precisão e equilíbrio, “[...] uma vez que, pelo fato de haver proximidade entre os pares, o
desequilíbrio de um, também afeta o de outro, tornando-se difícil harmonizar os passos.”
Sobre esta questão do peso com o outro, a Aluna C relatou que:
55

A primeira aula prática foi o momento de inteiração rítmica e o entendimento sobre a troca de peso entre
os pares e a conexão que é importante ser estabelecida por quem dança junto um com o outro. É aí que se
descobre o quão difícil é dançar junto com o outro, fazendo e mantendo esta conexão. É um desafio.

Após, foi trabalhado o contato com as mãos (relação aberta), como funciona o
estímulo de proposição/condução (pressão e resistência, laterais e de cima para baixo), que
são forças contrárias de um em relação ao outro para gerar o movimento das pernas, o
deslocamento do par pelo espaço, ou simplesmente que irá manifestar em figuras. Abaixo
segue a citação da Aluna E:

A primeira dinâmica foi em duplas: exercitar ação e reação do toque dos polegares na palma das mãos o
que tornou mais fácil a percepção de quem conduz e é conduzido, oportunizando o entendimento que
mesmo aquele que é conduzido deve exercer ação em sentido contrário a fim de possibilitar a
comunicação entre os corpos.

Como, durante o exercício, os pares trocavam as funções – uma vez um gerava o


movimento, em outro momento, o outro, houve quem se sentisse desconfortável:

Particularmente tive certo desconforto com o par que dancei nesse dia. Talvez por ele estar tão
acostumado a conduzir e não a ser conduzido, foi um pouco difícil o entrosamento na dança. Mas foi boa
a experiência para ter uma ideia de como certos conceitos estão tão arraigados em nossa sociedade
patriarcal que ficou um pouco difícil para ele ceder durante as conduções. Me senti muito presa na dança,
não me senti muito confortável. Quem sabe também por ser a nossa segunda aula, meu par (que dançou
comigo dessa vez) talvez também não tivesse muita ideia de que deveríamos estar em harmonia, e que ele
não podia simplesmente me "dominar" e sim me conduzir com mais delicadeza. Apesar da professora
Lívia já ter nos ensinado essa questão da harmonia nas conduções, penso que precisamos vivenciar isso
na prática. Pois muitos escutam, mas não praticam. (ALUNA M)

Por sua vez, o Aluno O trouxe o seguinte apontamento: “Notei que as mulheres não se
importam muito em e conectar com outras mulheres, porém os homens evitam se conectar
com outros homens. ”
Durante as aulas sempre foram ressaltadas as diferenças entre realizar pressão no
contato e apertar ou empurrar, pois na ânsia de conduzir, às vezes, se confunde o estar firme
(não tenso) com uma força desnecessária. Após esses conceitos fundamentais, foi pedido aos
alunos e alunas para que se deslocassem no espaço usando diferentes direções, um guiando o
outro, um com os olhos fechados e o outro com olhos abertos atentando para a relação de
pressão/resistência através das mãos. Foi impelido as alunas e alunos que não perdessem o
contato um com o outro, desenvolvendo a capacidade do toque, sem receios. Sobre isso, segue
o relato do Aluno K:

No segundo dia já cheguei disposto a passar a condução para minha esposa no máximo que pudesse. Do
ponto de vista de um artista, penso que isso pode flexibilizar a sensibilidade, perceber as nuances do jogo
56

de corpo que um oferece ao outro. Deste modo, ser deslocado por minha esposa que só tem 46 e eu que
tenho quase 80 se torna um exercício de sensibilidade. É preciso uma escuta e uma disposição. Porém
como já dançava intuitivamente forró, desde a década de 90 sem ficar preocupado com técnicas, já havia
notado que os comandos podem ser trocados.

Lembrando que a experimentação da sensação de conhecer como age a


pressão/resistência corporalmente, foi realizado por ambos os participantes da dupla, de forma
alternada, sendo que aos alunos e alunas sempre foi buscado explicar as diferenças entre o que
estava sendo feito e o a realidade do ensino tradicional, onde o exercício em questão é
realizado muitas vezes de forma unilateral, sendo que somente os homens conduzem as
mulheres, de olhos fechados pelo espaço.

3.1.3 Interação espacial e gestual para conexão visual

O objetivo era explorar a dança que surge através de jogos e dinâmicas especialmente
desenvolvidos para estimular o diálogo e a escuta corporal e, consequentemente, a conexão e
a sintonia na dança a dois, pois:

no momento em que voltamos nossa percepção para os diversos campos de relação


com que nos deparamos ao dançar a dois, estamos necessariamente em sintonia com
nosso corpo, com o do parceiro, com a música dançada e ainda com o espaço.
(SILVEIRA, 2012, p.4).

A dinâmica se dava por uma mesa imaginária de vidro, onde existia um centro que
precisava estar equilibrado para que a mesa não pendesse de um lado para outro, virasse ou
quebrasse. As pessoas deviam caminhar em torno da mesa (fora dela). Devido à ausência se
um tablado ou linóleo, foi necessário demarcar os limites da “mesa”, para visualizar o fora e o
dentro. Foram utilizadas várias tiras de TNT, na cor azul, amarradas entre si para
configuração de um grande retângulo no chão. Nessa caminhada em volta da mesa, era
necessário que as pessoas mantivessem atenção àquelas do lado oposto e, através de alguma
indicação, deveriam se entender mutuamente, e em duplas ir entrando na mesa e fazendo um
jogo de movimentações onde o equilíbrio da mesa devia ser mantido para que a mesma não
quebrasse, ou seja, não pendesse para um dos lados. Primeiro foi feito sem música, de forma
simples, só testando as direções possíveis. Depois foi colocada música e pedido às pessoas
que explorassem mais os movimentos, os níveis, e que os movimentos tivessem algum tipo de
ligação ou que estivessem contextualizados entre si em relação à sua dupla. Na terceira vez as
pessoas entraram na mesa dançando entre pares e o jogo foi na mesma ideia, porém em
57

relação a uma dupla oposta. Podia também entrar sozinho, desde que se encaminhasse até o
centro da mesa, onde se encontra o ponto de equilíbrio da mesma. Foi solicitado aos alunos e
alunas que em momento algum conversassem durante o exercício.
Sobre esta dinâmica, a Aluna F escreveu em seu diário: “Estou aprendendo a
importância da conexão, tanto no contato físico quanto na conexão de olhares, para identificar
qual o movimento a outra pessoa irá propor. ” Por sua vez, a Aluna A apontou o seguinte:

Nessa aula, de novo dancei com outro par. E apesar dele estar um pouco tenso, tivemos uma dinâmica
muito boa que a professora Lívia trouxe para nós: uma noção do espaço entre casais e do equilíbrio entre
os pares. Achei bem importante a noção de se comunicar com o par através do olhar e dos gestos de
espelhamento com o nosso parceiro de dança. Cuidando também o movimento dos outros casais na pista.
Isso nos ajuda a fluir melhor na dança, mostrando o respeito que devemos ter também com os outros
casais dançantes. Trazendo uma noção maior sobre a importância da harmonia e do equilíbrio, não só a
que deve ser refletida no próprio casal, assim como a que deve haver numa visão geral entre casais que
estejam na pista de dança. (ALUNA A)

Isabel Willadino (2012) aponta a noção de espaço como uma das questões importantes
para a aprendizagem da Dança de Salão, pois a pessoa precisa se localizar em relação ao outro
e ao espaço geral, sobre esta questão, o Aluno K fez a seguinte observação:

Fizemos um jogo de deslocamento no espaço de um tabuleiro: um tipo de "plateau", como conheço no


teatro, tínhamos que manter o equilíbrio entre as duplas e as entradas em uma mesa de vidro imaginário.
Daí aconteceu uma coisa interessante que pela primeira vez não fiz dupla com a Evelyn, o que é muito
difícil. Foi bastante legal, pois primeiro a própria Livia propôs o jogo e na sequência uma colega que
estava perdida sem par acabou propondo e fizemos o jogo do equilíbrio, em que realmente a condução se
dilui, pois ambos devem estar "ligados no espaço", não se determina quem começa. Assim a dinâmica foi
se desenvolvendo. Neste dia a experiência mais marcante foi essa, até porque estávamos precisando dar
uma arejada em nossa dupla.

Já a Aluna D trouxe a seguinte observação:

Achei a dinâmica bem instrutiva. De equilibrar o espaço, não ficarem todos em um lado do Tablado,
cuidar o movimento do outro, ter noção da espacialidade. O que atrapalhou um pouco foi a timidez do
pessoal. Que não ficava com o olhar livre pra gente captá-los à brincadeira.

Alguns alunos e alunas visualizaram a dinâmica como mais uma forma de


comunicação não-verbal: “Tal atividade de cunho lúdico e teatral demonstrou a estimulação
corporal na dança sem o contato corporal. Denotando uma faceta da dança que direciona para
o intercâmbio de sinais e gestos corporais muito mais visuais.” (ALUNO B) Por sua vez, a
Aluna C escreveu o seguinte em seu diário: “O objetivo desta atividade, no meu
entendimento, era o olhar, exercitar o olhar com o parceiro. Para termos uma noção maior de
58

como é este trabalho que dançar com o outro e estar em contato mesmo que à distância.”
Sobre este tema, a Aluna E ressaltou que:

As dinâmicas seguintes continuaram buscando possibilitar aos sujeitos a comunicação não-verbal, foram
feitos experimentos como espelhos em que em um primeiro momento as duplas andavam em volta de um
tablado e através do olhar deveriam decidir subir ao mesmo e deveriam executar movimentos iguais e
simétricos em relação ao centro, no segundo momento as duplas dançavam e deveriam escolher outra
enquanto andavam em volta do tablado e posteriormente subir ao mesmo executando movimentos iguais
e simétricos em relação ao centro. Nessa experiência verifiquei maior dificuldade na comunicação e
execução dos movimentos quando em duas duplas mesmo que nessa fase estivéssemos dançando com um
par; também tive dificuldade no espelhamento quando em dupla simples, pela minha dificuldade de
localização espacial, pois na primeira etapa os corpos não se tocavam.

Paola da Vasconcelos Silveira (2012) lembra que os dançarinos precisam ter


consciência do espaço e do tempo, de modo a buscar equilíbrio com o (a) parceiro. Esta
consciência se dá de diversas formas. Para a Aluna H: “[...] a brincadeira nos faz prender a
atenção no nosso parceiro, o que é muito importante, uma vez que precisamos nos concentrar
e perceber seus movimentos e esquecer todas as outras pessoas.” Enquanto a Aluna N faz a
seguinte anotação:

Hoje a aula foi um pouco diferente, a professora fez um exercício de percepção e ligação com o outro. No
começo não achei ninguém para entrar comigo no círculo, mas depois fui achando e foi bem divertido,
estabelecer ligação com outra pessoa apenas com o olhar é muito diferente de conversar com ela, gostei
bastante. Em seguida tivemos que fazer a mesma coisa só que aos pares, achei alguns parceiros e nos
divertimos muito, isso também ajudou na concentração.

Figura 8: Dinâmica da mesa de vidro.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (setembro, 2017).


59

Figura 9: Dinâmica da mesa de vidro realizada aos pares.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (setembro, 2017).

3.1.4 Escuta Corporal

Como mencionado anteriormente, em todas as aulas foi enfatizado a importância


fundamental de cuidar a própria transferência de peso, para assim ter consciência das trocas
de peso do parceiro. A transferência de peso também é algo que se comunica ao par,
geralmente através do contato entre troncos. Transferências de peso são bastante sutis na
dança a dois, é necessário apurar a escuta corporal e na Oficina essa percepção foi incentivada
de forma recorrente. No ensino tradicional o condutor/cavalheiro é quem transfere o peso da
dama, pois é a ele quem compete a função de conduzir, portanto é ele que precisa realizar as
trocas de peso da dama, para assim executar os passos desejados. Porém, na presente Oficina
foram realizados exercícios onde ambos exercitavam a iniciativa de transferir o peso do
parceiro. Ora um experimentava, ora outro. Foi realizado exercícios de contato através do
tronco, pois é uma das melhores conexões corporais para compreender o estímulo da
transferência de peso. Segue abaixo relato de um aluno:

Nessa aula foram dados exercícios sobre a transferência de peso na dança. Foi um exercício de certa
forma interessante, pois mostrou um aspecto bastante básico e simples da dança que eu jamais havia
pensado. Permitiu que eu pudesse relaxar um tanto, antes de tentar dançar - quase como limpar a mente
antes de fazer qualquer coisa - e como você sempre ressalta, a questão de sentir o corpo da pessoa com
quem se está dançando. (ALUNO A)
60

Para potencializar o sentido corporal, foi utilizado vendas nos olhos, pois suprimindo a
visão obrigava-os a estarem mais atentos aos sinais corporais, como atesta a Aluna M,
dizendo que o exercício ajudou a ter mais concentração e percepção do que o parceiro estava
fazendo, “[...] pois de olhos vendados tentamos sentir mais os movimentos do outro para
estarmos em harmonia e equilíbrio durante os movimentos da dança.” Além disso, muitas
vezes a visão nubla os sentidos mais subjetivos da dança: “a impressão é que com os olhos
abertos a gente tenta adivinhar o movimento que o outro está querendo executar e assim a
chance de errar o movimento é maior.”(ALUNA F) Para Strack (2017, p. 112), os exercícios
de escuta corporal permitem refinamento nesta percepção, de modo que: “[...] cada vez mais o
par será capaz de entender a comunicação do outro com o mínimo de energia e esforço
gastos”.
Para a escuta corporal, foram experimentadas as transferências de peso e, após, nas
marcações básicas, sentindo somente pelo contato entre os troncos, sem conexão de mãos pelo
abraço. Primeiro foi experimentado sem vendas, após apenas um ficava vendado e depois os
dois. Foi mais uma vez reforçada a ideia de alternância em quem começa a transferir o peso
do outro. A ideia era estimular a escuta corporal simultânea entre pares, pois:

Sem a conexão não existe movimento dançado em danças de salão atestada pelo
“abraço” presente, aliás, na postura tradicional de algumas dessas danças. O
“abraço” mostra que mesmo submetidos ao regramento do que constitui cada uma
das danças a dois podem se moverem e se comunicarem por meio do contato com o
outro, no jogo combinado de ação e reação. (SANTOS, 2016, p.12)
61

Figura 10: Escuta corporal.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (outubro, 2017).

Figura 11: Escuta corporal.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (outubro, 2017).


62

Para esta aula, foi utilizado o gênero de dança Kizomba, por entender que a mesma
promove uma relação mais intimista, pois é dançada boa parte do tempo com conexão de
abraço fechado, e com bastante contato de troncos:

Sentindo o ritmo da Kizomba não é complicado, só que o segredo no quadril e vai mexer com os
hormônios... Na execução com os olhos vendados - foi sereno - estranho que já estava preparado,
presente, conectado e no clima. Estou incorporando em imediato o sentimento da música com o ritmo.
(ALUNO L)

Por sua vez, o Aluno B trouxe as seguintes observações:

Nos foi introduzido a Dança da Kizomba. Proposta executada na mesma metodologia anterior, permitindo
ambos os dançantes conduzirem a dança sem necessidade de prevalência de direção. Havendo um
contagiar dos corpos pelo som e troca de pesos para iniciar a dança. Com os passos simples, mas com um
teor de movimentação nos quadris a Kizomba insinua que a dança parte da cintura para contagiar o resto
do corpo. Neste caso, requer mais aulas e desenvoltura corporal.

Inicialmente, em círculo, foram ensinados os tempos utilizados na Kizomba (tempo,


dois tempos e contratempo) e um dos passos básicos (base em três tempos). Depois, mostrei
como se dá a relação corporal dos troncos aproximados e quadris livres e como se dá a
conexão de mãos no abraço fechado, que pode ser um pouco diferente das demais Danças de
Salão.
Primeiro sem música, depois com música, para que os alunos e alunas se
familiarizassem com a dança, além de exercitar a audição para buscar o ritmo. Importante
mencionar que na Kizomba realizam-se variadas movimentações de quadris, pois conectam-se
om troncos e deixa-se um pouco de distância entre os quadris dos parceiros para que assim
possam movimentá-los. Na aula, o foco foi mais o código – passos – tempo musical e relação
com o tronco - os quadris não foram muito explorados devido à escassez de tempo hábil para
um aprimoramento dessa dança, o que foi explicado aos alunos e alunas. Na segunda aula, foi
mostrada uma dinâmica de quadril, somente para inserir no passo que foi conhecido no dia,
mas sem obrigatoriedades de realizar, pois de início pode ser difícil sincronizar o passo, ou
seja sua pisada no solo, junto com o movimento de quadril.
63

Figura 12: Aula de Kizomba.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (outubro, 2017).

3.1.5 Contato Improvisação – Improviso aberto

Para as técnicas de Dança de Salão o Contato Improvisação (CI) contribui de forma


significativa na medida em que busca propor um jogo de ação e reação entre parceiros, no
sentido de se obter uma maior amplitude de expressão e unir dois corpos para uma mesma
finalidade. Diversos são os pesquisadores e pesquisadoras que têm utilizado o CI em seus
estudos de Dança de Salão, como Santos (2016) e Silveira (2012), entre outros. O Contato
Improvisação é uma:

dança desenvolvida pelo dançarino e coreógrafo estadunidense Steve Paxton


juntamente com outros profissionais nos idos anos 1970, também se realiza aos
pares, os quais improvisam sem, no entanto, um impedir a ação do outro. Isso requer
desenvolver a acuidade e atenção em um jogo de troca de peso e de fluência das
ações. (SANTOS, 2016, p. 12)

Interessante saber que as intenções de Paxton para a criação do método do CI estavam


também atreladas a motivações que englobava aspectos subjetivos, além dos físicos
relacionados ao movimento, pois como afirma Lais Moura Ferreira (2012, p. 19):

Interessava-lhe também a participação igualitária das pessoas em um mesmo grupo


sem hierarquias sociais (como professor – aluno, por exemplo). Buscava com isso
64

um novo tipo de organização social para a dança, não ditatorial, não excludente,
onde todos poderiam participar da mesma forma, sem o isolamento de nenhum
participante. Partindo desse interesse o CI passou a ser praticado por, além de
duplas, grupos de três ou mais pessoas, onde todos os corpos que estivessem
participando da improvisação estabeleciam um diálogo entre si.

No caso da Dança de Salão, a interação, neste contexto, se dá em duplas, mas o


princípio da existência de participações equilibradas e colaborativas acontece da mesma
forma. Quanto a isso, resgato o conceito de cocondução, trazido por Feitoza (2011, p.35):

O diálogo entre os corpos necessita que ambos atentem para as minúcias, detalhe,
qualidades que se processam, seja em, por exemplo, relações de peso, fluência,
ritmo e espaço. Esse entendimento de diálogo que coopera para que o movimento
aconteça quebra a questão paradigmática do conduzir e do deixar-se levar. À
intenção mútua e à troca relacional de informações atuando nos corpos corresponde
uma ação de cocondução. Essa compreensão é uma possibilidade para redefinir
corpo nesta prática a dois, e dizer que nessa ação o homem por si só não conduz,
pois quando se produzem os gestos e/ou passos nesta dança isso aconteceu por toda
relação feita a partir das condições propostas, através de processos corporais, que
ocasionaram uma instância compartilhada. Não existe relação corporal nessa prática
a dois que não seja formada pela troca de informações.

Uma das principais implicações no estudo e prática do CI tem a ver com a


possibilidade de enriquecer o improviso na dança, além de estabelecer percepção, conexão,
sintonia, e consequentemente, o diálogo. É relevante saber que o improviso na Dança de Salão
pode partir de bases simples de cada tipo de dança e, “para os iniciantes é necessário ter
cautela e prepará-los dando a eles repertório para que improvisem”. (FERREIRA, 2012, p.31).
Por isso, a Oficina buscou além de propor exercícios e dinâmicas com objetivos específicos,
ensinar algumas bases do Forró e algumas figuras para que então os alunos e alunas pudessem
aplicar as novas ideias, bem como ter uma noção de como podem improvisar futuramente,
tendo no exercício do CI uma inspiração para isso. Sobre isso, os Alunos B e P,
respectivamente, escreveram os seguintes comentários:

A aula teve como foco dar continuidade a anterior como uma complementação através da transmissão da
dança não necessariamente pelo som, mas pelo corpo. Sim, exatamente, a música literalmente
corporificada. A dupla “dançava com o corpo” no toque sentindo o estimulo corpóreo ao som de uma
música de ritmo mais ambiente. A atividade consistiu em oferecer ao aprendiz que a dança independe da
música, mas dependa da companhia para se autorealizar como dança!

Foi o melhor dia para mim porque houve movimentos com a parceira na grande maioria do tempo. Gostei
também de fazer os movimentos de não deixar o toque sair do corpo da parceira tendo em vista que é uma
forma de ficar mais tranquilo na hora da dança, para ter maior sincronismo com a parceira. Me senti
muito bem nesse dia.
65

A técnica do CI contribui para novas formas de como se mover, de como criar novos
códigos, estabelecidos através de parcerias equilibradas de ações, na qual uma condução
quando não obtém a resposta esperada traz oportunidades valiosas de improvisar, acionando a
criatividade dos pares. A citação abaixo nos traz uma ideia da ampliação de sentidos que o
diálogo pode proporcionar através de:

uma dança aberta baseada no improviso, na qual o repertório de movimentos e


estímulos propulsores de movimentos de um dos participantes se encontrará com o
repertório do outro. A partir disso, é possível que se descubram signos comuns para
ambos. E quando um dos estímulos é desconhecido para algum dos participantes,
essa surpresa pode fomentar novas possibilidades de movimentos e estímulos,
podendo se transformar em um signo privado desses dois corpos. Portanto, nessa
proposta, os papéis dos dançarinos terão maior dinamismo, e dessa forma irão
transitar entre o influenciador e o influenciado para permitir que a perspectiva de
diálogo aconteça. (SILVEIRA 2014 p. 3-4)

Na Oficina, o CI não foi aprofundado como técnica, a ideia era uma experimentação,
para que os alunos e alunas tomassem conhecimento sobre os conceitos de um improviso em
Dança de Salão. Em um primeiro momento o exercício propôs contato com partes do corpo,
como braços, costas, cabeça, pernas, pés, em diferentes pontos sem perder a conexão corporal,
um evoluindo com o outro através de uma leve pressão de um sobre o outro. Os alunos e
alunas foram instruídos a utilizarem o peso e as áreas de contato/apoio de todas as partes do
corpo, devendo ser realizado com calma para explorar as diversas possibilidades existentes.
Foi solicitado também que utilizassem várias partes do corpo e não somente mãos como em
uma conexão padrão de Dança de Salão, que não falassem durante os exercícios e que
buscassem flexão de joelhos e pés paralelos quando centrados ao eixo. Sobre o exercício de
CI, o Aluno L fez a seguinte anotação:

Com você Lívia foi instantâneo e estou muito surpreso. Parecia que a gente já tinha feito isso em “outra
vida”... Era uma troca honesta - um contribuindo com o outro - me deixei levar (livre!). Sem amarras -
incrível - foi único. Uma experiência delineada na memória (mirabolante). E o extraordinário é a nossa
sintonia, um contribuindo com o outro (me arrepiei).

Em um segundo momento, as duas pessoas ao mesmo tempo deveriam buscar fluidez


e continuidade nas movimentações. Podia-se utilizar a conexão corporal direta de salão, das
mãos e do abraço, mas procurar novas formas de deslocamento, com outras configurações
corporais de conexão, uma vez que: “O Contato Improvisação proporciona a amplitude da
aproximação dos corpos que se movem em dupla, mas preserva a individualidade em um jogo
contínuo de troca de peso e de alteração de posição, de perguntas e respostas.” (SANTOS,
2016, p.13) Sobre isso, a Aluna M fez as seguintes observações:
66

Dancei com o mesmo par que tive na terceira aula, então a capacidade de criação entre nós foi boa, pois
em meio aos improvisos, conseguimos um equilíbrio. Aprendemos a fazer improvisações através do
'contato' com partes do corpo e transformar esse contato em 'estímulo/resposta' dentro da dança. Pois
ambos fazíamos um passo e um toque, e nos adaptávamos um ao outro. Conduzíamos e éramos
conduzidos ao mesmo tempo. (grifo nosso)

Para um terceiro, e último momento, foi pedido que uma das pessoas do par parasse de
dançar em algum ponto da música, e a outra pessoa deveria então criar algo para continuar a
dança, mesmo com a primeira pessoa parada. Em algum momento seguinte, a pessoa que
tinha parado deveria retomar a dança de acordo com o movimento que havia sido criado pelo
primeiro, no sentido de dar uma continuidade ao mesmo. Aqui também a intenção foi a de
trabalhar a percepção em relação ao parceiro, a partir de pausas na movimentação, em que um
deveria ceder por um instante para que o companheiro/a de dança pudesse também ter a
oportunidade de criar, buscando uma fluência no que diz respeito à comunicação através da
conexão que vai além do corporal, pois:

Faz-se necessário o entendimento de que ao se estabelecer a “conexão” com corpo


do outro, inicia-se ali um trabalho de desenvolvimento da sensibilidade que se
divide entre os corpos por meio da ação e reação. Simplificamos os processos ao nos
concentrar na ideia do jogo de perguntas e respostas, sem determinar qualquer
estrutura de movimento; o desenvolvimento desse jogo é amplificador do objetivo
de se gerar consciência corpórea de si e do outro para que o deslocamento no espaço
seja incisivamente mais “orgânico” e consciente. (SANTOS, 2016, p.15).

Do mesmo modo, esse jogo permitia o improviso. Segundo Miriam Strack (2017), um
improviso na Dança de Salão é considerado aquele em que não existe uma sequência
previamente ensaiada pelos pares, sendo nos moldes tradicionais. Segundo ela, há o
improviso fechado e o aberto. O primeiro:

[...] ocorre dentro das danças de salão: a partir de um determinado número de


“passos”, improvisa-se a ordem dos mesmos, a sequência de movimentos que se irá
realizar. Foi visto também que esse tipo de improviso faz sentido dentro de um
sistema onde apenas uma das pessoas do par decide a ordem dos movimentos a
serem feitos e comunica a outra pessoa através da condução. (STRACK, 2017,
p.68).

Em alternativa ao improviso fechado, tem-se o que a autora nomeia de improviso


aberto, ampliando assim as possibilidades criativas, sem movimentações pré-estabelecidas,
mantendo-se uma interação mútua de influências. Sobre isso, a autora nos diz que:

A limitação criativa se extingue no momento em que é permitido improvisar para


além dos passos e leva a criação de movimentos a lugares de efemeridade mais
profundos, ou até mesmo, no sentido oposto, a criação de novos passos a serem
67

incorporados no repertório das danças de salão. Em relação às Damas, que antes só


tinham a permissão para realizar enfeites, em um lugar de diálogo, seu papel se
iguala a de seu par e a elas também é permitido criar. (STRACK, 2017, p.76).

Um dos aspectos interessantes do CI, sob a perspectiva da Dança de Salão, é o fato de


existir uma neutralidade no que diz respeito a alguém conduzir algo, pois o deslocamento
espacial acontece na intencionalidade de um fluxo, que pode ser contínuo ou não. Portanto, a
técnica do CI configura-se em uma ferramenta bastante útil quando pensamos em despertar
para possibilidades corporais inovadoras, pois:

Nada impede que na DS um homem seja conduzido por uma mulher, mas é
importante entender que eles devem entrar em um acordo de quem faria o papel do
cavalheiro (propositor) e quem faria o papel da dama (receptor). Diferente do que
acontece no Contato Improvisação, por exemplo, onde não existe um condutor
apenas, mas ambos seriam propositores e receptores ao mesmo tempo. (VIEIRA,
2013 p. 14).

Figura 13: Contato Improvisação através de contato/apoio de partes do corpo.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (outubro, 2017).


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Figura 14: Contato Improvisação buscando fluidez e continuidade nas movimentações.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (outubro, 2017).

Figura 15: Contato Improvisação buscando fluidez e continuidade nas movimentações.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (outubro, 2017).


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3.1.6 Exercício de condução compartilhada pelo espaço

Para Quintanilha (2016, p. 126):

Por mais que muitos movimentos sejam de fato impulsionados pela pessoa do
condutor, o conduzido tenha também o espaço e liberdade de interferir neste
processo, seja dobrando o tempo de resposta a um passo, seja incluindo detalhes nas
movimentações propostas, ou mesmo propondo variações coerentes para as
respostas prontas aos movimentos propostos. Desta maneira, o elemento surpresa
com que o conduzido sempre conta, já que não sabe previamente o que o condutor
proporá, poderá fazer também parte da vida do condutor. E, como dois indivíduos
pensantes são capazes de propor, surpreender e responder a estímulos de
movimentos durante o ato da dança.

Neste sentido, propus um trabalho de deslocamento visando desenvolver o diálogo.


Foi enfatizado que primeiro devemos cuidar do nosso corpo, ter consciência das próprias
possibilidades e ter certeza do que se quer na movimentação para poder passar a intenção para
a outra pessoa através de uma sensação. Também foi ressaltada que é preciso uma disposição
das partes para que os movimentos aconteçam, o querer estar junto confirma a existência de
uma colaboração mútua, ou de cocondução com explanado anteriormente.
O exercício consistia em experimentar trocas de peso e, após, realizar deslocamentos
pelo espaço por meio de uma conexão de mãos, em forma de pinça, nos ombros do parceiro.
O exercício, como sempre, era para ser alternado entre proponente e receptor, onde os alunos
e alunas puderam experimentar torções de tronco, giros, estar sempre na posição frente a
frente, um tronco buscando o outro, balancinhos etc. A intenção não era atentar-se
primeiramente a ideia de conduzir o colega, mas sim o autoperceber-se primeiro para
compreender o corpo do parceiro:

A aula teve um exercício bem interessante sobre a questão de transferência de energia/peso, e sintonia e
sincronia entre as pessoas dançando. Foi muito bom fazer tal exercício porque parece ter me ajudado a me
“soltar” um pouco, pois exigia que me desprende-se da ideia de tentar prever o que o “condutor” vai
fazer, e também de coordenar melhor meus passos, com mais leveza (o que você falou sobre deslizar os
pés, e ter um ritmo melhor). Nessa aula também foi o primeiro momento que dancei com homens desde o
início da oficina. Não sei se tive grandes dificuldades, ou se teve alguma diferença com relação a dançar
com uma mulher - apenas notei diferenças individuais mesmo, com algumas pessoas mais “soltas” e
outras nem tanto. (ALUNO A)

Para a Aluna D, o exercício deixou-a nervosa. “Quando trocamos os pares foi um


pouco mais difícil, mas curti mesmo assim, desafia nossa percepção. Além de estimular a
atenção ao longo da dança.” Enquanto o Aluno D escreveu o seguinte: “Foi demais a ideia de
70

ser conduzido por uma mulher, pois eu tive a possibilidade de experimentar a dança pelo
outro ângulo, e a minha parceira fez isso muito bem.”

Mais especificamente sobre a alternância de condução, os relatos variam. O aluno K,


por exemplo, afirma: “Acho importante a experiência de inversão dos comandos, para que
ambos possam perceber as possibilidades facilidades e significados de cada situação em que
ambos são responsáveis.” Mas há aqueles que se sentem incomodados:

Senti-me tímido, com vergonha e com refugo porque estava dançando também com guris. Foi uma
experiência interessante, pois nunca na vida pensei em dançar com homens. Não fico entusiasmado em
dançar com homens, e me dificulta mais parece, apesar de as vezes eu pensar em ficar com a guria com
quem danço, dançar com homens é esquisito e não me sinto confortável, prefiro mulheres mesmo os
pensamentos de relações mais íntimas influenciarem. Dançar com homens não gostei. Contudo, os guris
tentaram me ensinar e isso foi legal, foi interessante e gostei da parte de tentar aprender alguma coisa com
eles. Mas prefiro gurias. (ALUNO P)

Strack (2017) lembra que pedir para que um homem, acostumado com o papel de
condutor, aceite a troca, é uma tarefa complexa. E, neste caso, ainda fazer parte com uma
pessoa do mesmo gênero deixa a questão ainda mais incômoda. Mas há aqueles e aquelas que
veem a troca como uma grande aprendizagem. A aluna C diz que se sentiu confortável em
“[...] poder desempenhar o papel de condutor na dança, pois tinha muita dificuldade em ser
conduzida. E ironicamente executar este papel me possibilitou compreender melhor e a me
propor a ser conduzida também.” Já o Aluno L trouxe a seguinte colocação:

É fascinante e ao mesmo tempo estranho que cada um que nos conduz ou conduzimos passa uma fração
do que está vivenciando. Alguns nem entendem o do porque estão fazendo ou nem querem. Outros
assimilam fácil, são mais receptivos e o exercício acontece mais fluido. Não sei se é apenas comigo, pois
fico um pouco preso no começo (para pegar o jeito), depois acontece espontaneamente. No começo é uma
sensação de inquietação até mesmo com pessoas que já pratiquei outras dinâmicas. Sair do estado lógico e
localizar e/ou atingir o estado lírico (enternecido) pra mim é gradativo (eu tenho que me acostumar a esse
encadeamento/passagem). E quando vem é só - alegria diii viver - místico. (ALUNO L)

3.1.7 Prática orientada

Nessa aula aconteceu uma prática orientada de Forró, na qual os alunos e alunas
puderam dançar livremente utilizando os aspectos enfatizados na Oficina até aquele momento,
ou seja, inverter as proposições de movimentos, autopercepção, atentar para a escuta corporal
(marcar básicos pra ajudar), cuidar as transferências de peso, manter contato visual, não sair
realizando figuras logo de cara (esperar a conexão), trocar de pares, usar a escuta auditiva,
ouvir e sentir a música, atentando para o tempo forte, prestar atenção aos mecanismos de
proposição e resposta. Sobre esta aula, o comentário do Aluno L foi:
71

Dia de prática! Aplicando tudo o que foi aprendido nas aulas anteriores. Condução, presença, contato,
empatia, entrega entre outras facetas… Vou acostumando-me aos poucos pra entrar no clima e trocando
de pares é um novo sentimento que no decorrer da aula fica mais e mais simples de se conectar. No forró
mais rápido é que o bicho pegou nas figuras... Fazer as formas é só pros ninjas... Fiz um experimento na
sexta passada no CE (06.10): das 23 menininhas abordadas (explicava toda uma condição que estava
fazendo uma pesquisa...), elas fazendo o papel de homem na condução, duas gostaram e se sentiram bem
com a atividade. O restando não gostou ou não conseguiu guiar… Notei que as gurias estão tencionando
fazer só o papel de mulher, pois com todas dei a opção de escolherem ser o homem ou a mulher e logo
optaram por ser a mulher...

É comum em aulas de Dança de Salão estes momentos de prática orientada, em que os


alunos e alunas “simulam” o estar em um baile dançando, trata-se de um momento importante
de sistematização de conhecimento, bem como de experimentar – inclusive a dançar com
pessoas com quem não se está acostumado:

Figura 16: Prática orientada de Forró.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (outubro, 2017).

Daniel Araújo (2014, p. 2) diz que “[...] é preciso que a escola crie situações,
oportunize meios para que os alunos vivenciem ainda mais a Dança de Salão também fora da
sala de aula [...]”. Segundo ele, nesta perspectiva, é importante que as escolas promovam
72

bailes dançantes, mostras de dança, sessões de filme, entre outras ações que propiciem o
encontro dos alunos para “[...] ampliar a apropriação do conhecimento e criar outras formas
de estar e dançar com o outro. “ (OLIVEIRA, 2014, p. 27) O baile é, segundo ele, o momento
de o aluno colocar em prática o que aprendeu. Sobre esse momento, o Aluno B escreveu:

Aula com o objetivo de prática dos passos do forró com aperfeiçoamento, montagem de todas as etapas
apreendidas. Estimulou-se a execução dos dançarinos ao som do forró. Uma aula de sensações e sentir o
levar do corpo após algumas semanas de aprendizagem do ritmo nordestino. O qual nos conferiu não a
certeza de saber dançar, mas de como dançar com o básico de conhecimento, isto é, uma incursão a
experiência da tal dança.

O momento da prática, para a Aluna M, foi também o de discutir a questão da


condução:

[...] hoje pudemos rever alguns passos e praticar o que já havíamos aprendido. Também realizamos troca
de pares. O que foi bom também. Pois, penso que nós, 'damas', por estarmos acostumadas sempre a
sermos conduzidas, esse é um dos desafios também: aprender a conduzir. No entanto, descobri que
muitos 'cavalheiros' também têm essa mesma dificuldade em saber conduzir corretamente a dama. Pois
enquanto uns não sabem ao certo o que fazer, outros querem dominar, pensando que a dança deve ser
conduzida na 'marra', do jeito deles, sem que haja uma harmonia. Mas creio que a dança deve ser
harmônica. Inclusive a dança de salão também, onde deve haver uma cumplicidade e uma troca entre o
casal. Algo equilibrado, que te dê prazer em fazer, em consonância como se fôssemos as notas de uma
sinfonia e que precisássemos nos encaixar de modo que saia uma linda melodia! O bom é que estamos
todos aprendendo...

Por sua vez, o Aluno A trouxe as seguintes observações sobre a prática:

Praticamos tudo o que já havíamos aprendido até o momento, desde o ritmo até o “chuveirinho”. De
início estava com uma certa dificuldade para realizar quase tudo: não pegava muito bem o ritmo, dava
mais passos que o necessário nos “giros”, tinha dificuldade para realizar o momento de “abertura” ou
“giro”. Mas, gradativamente fui melhorando, peguei o ritmo com mais facilidade - mesmo quando ficou
mais ligeiro - treinei o número de passos corretos, bem como os momentos para aberturas.
73

Figura 17: Prática orientada de Forró.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (outubro, 2017).

Figura 18: Prática orientada de Forró.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (outubro, 2017).


74

3.1.8. Consciência Corporal

Para a última aula, o trabalho esteve focado em exercícios de conexão individual, pois
durante as aulas sempre foi enfatizada a importância de se estar bem consigo mesmo para
estar preparado qualitativamente no momento em que for conectar-se com outra pessoa para
dançar. Na medida em que compreendemos melhor nosso corpo, damos respostas corporais
mais facilmente e de forma natural a uma determinada movimentação que desejamos
executar, seja ela uma atividade do cotidiano como sentar, levantar, deitar, caminhar ou em
atividades específicas como dançar. O caminho da consciência corporal parte da observação
de si mesmo, da respiração, e de como reagimos, nos trazendo uma reflexão acerca de cada
movimento. Também se há dor e onde a mesma se localiza, aprendendo assim, a detectar
tensões desproporcionais.
Na Oficina foram utilizado subsídios da Educação Somática, a partir de exercícios
presentes na Eutonia 12 , com bolinhas de tênis para o relaxamento de tensões, buscando
centramento e autopercepção corporal.
Os alunos tiveram o conhecimento de que mesmo que tenhamos a mesma constituição
física, como pernas, braços, músculos, ossos, e suas respectivas nomenclaturas, existe
diferença de um indivíduo para o outro. Também foi discutido o tônus corporal - estado
natural de tensão dos músculos do corpo – e a necessidade de se buscar um equilíbrio para
mantermos nossas atividades cotidianas e de dança de forma saudável, pois se o tônus estiver
sempre alto, sentiremos dores, e se for baixo demais, estaremos entrando em um estado de
torpor.
Na aula deu-se atenção a duas partes do corpo que foram os pés e a região das costas,
mais especificamente onde se localizam as escápulas. Em relação às escápulas, as mesmas são
amplamente utilizadas no abraço durante a dança e estão diretamente relacionadas à conexão
com o par desempenhando uma importância significativa na escuta corporal, pois:

na DS o propositor deve sentir o corpo da outra pessoa antes de iniciar qualquer


movimento, perceber onde está seu peso, qual o estado em que a pessoa se encontra,
como está sua respiração. E o mesmo com o receptor, e este deve principalmente
observar a movimentação do tronco do propositor desde sua menor manifestação,

12
A eutonia é um método de abordagem corporal com aplicações pedagógicas e terapêuticas que orientam e
educam os hábitos corporais, como o movimento e a postura cotidiana, visando à promoção da saúde
compreendida como equilíbrio psicofísico. O aluno é incentivado a pesquisar a anatomia corporal e a perceber e
refletir sobra as relações constantes ente as sensações do corpo, as emoções, os sentimentos e os pensamentos,
interagindo com o ambiente nas ações cotidianas. (GANDOLFO, 2013, p. 3)
75

pois “no corpo do bailarino ressoam os movimentos do corpo do seu par”, e isso só é
possível se existir uma escuta entre os dois. (VIEIRA, 2013, p.25)

Para um primeiro momento da aula, os pés foram o foco do exercício. Sabemos que as
maneiras de pisar o chão variam muito de uma pessoa para outra, e na Dança de Salão
utilizamos muito os membros inferiores, com contato direto no solo praticamente todo tempo,
portanto necessitamos de uma boa base de apoio dos pés para nos proporcionar a devida
sustentação, especialmente no que diz respeito ao equilíbrio. Além disso, todo movimento
sentido no próprio corpo é passado como uma informação para o corpo do parceiro. Sendo
assim, se me desequilibro, automaticamente estarei desequilibrando quem estiver dançando
comigo, o que torna necessário o desenvolvimento de pontos de apoio com o solo que nos
tragam segurança. Dessa forma os alunos foram convidados a pressionar a planta dos pés
mediante uma massagem utilizando uma bolinha de tênis, para além de relaxar, sensibilizar
essa região trabalhando para melhorar o equilíbrio devido ao aumento com a superfície de
contato do pé com o chão. Os alunos foram instruídos a começar pelos calcâneos, evoluindo
para o meio do pé e por fim chegar onde se localizam os metatarsos e as falanges. Foi
solicitado que os alunos percebessem como estavam antes e depois de realizar a massagem,
caminhar pela sala e perceber se mudou algo. Sendo assim, trago a fala do Aluno A que nos
diz que, “o trabalho com as bolas de tênis foi bastante interessante: relaxou um tanto os pés,
talvez praticando mais sinta uma diferença maior a longo prazo – como tu havia dito.”
No segundo momento da aula foi realizado um exercício para escuta atenta do corpo,
individualmente e em duplas, levando em consideração outra proposta de Steve Paxton, a qual
se chamava a “pequena dança”. Primeiro os alunos deveriam experimentar sozinhos a
percepção de seus micromovimentos corporais posicionados em pé, com os olhos fechados,
pois:

Quando os alunos entendem no seu corpo como se dão os micromovimentos, as


transferências de peso, as pausas, os desequilíbrios, conseguem entender com maior
precisão quando essas coisas acontecem com o par. Há pares em que a conexão
estabelecida é tão grande que há a sensação de que um está lendo a mente do outro,
ou que ambos dançam como se fossem um corpo só. Nesses momentos, é provável
que o par atinja uma experiência de fluxo. (STRACK, 2017, p.113).

Nesse momento foi chamada a atenção para a respiração de cada um, que deveriam
buscar profundidade na inspiração, ou seja, a partir do diafragma, pois a respiração exerce
grande influência sobre nossa integridade e potencial físico e quase sempre a utilizamos de
76

forma errada e sem o aproveitamento que deveria. Sobre isso, a Aluna M fez o seguinte
comentário:

Aprendemos nessa aula que o movimento das nossas respirações também faz parte
da dança, como uma 'micro-dança', e de igual maneira a respiração está
profundamente relacionada com os nossos movimentos corporais. Podendo inclusive
influenciar na qualidade e expressão da dança”.

Após esse momento individual, foi solicitado que fizessem duplas para sentir através do
toque nas costas, na altura das escápulas até a região torácica, a “pequena dança” do colega,
novamente com os olhos fechados, e após deveriam inverter as posições. Abaixo trago o
relato do Aluno A:

O exercício de sentir o corpo do colega e dos “micromovimentos” realizados quando


estamos parados foi interessante também, tentando notar as sutilezas do corpo
parado. Não sei se o colega que realizou comigo estava muito tenso (na atividade
seguinte, do exercício das costas, ele parecia um tanto), mas ele não se mexeu muito.
Quando tentei permanecer parado, notei que me movi em alguns momentos - relaxei
o corpo ao máximo, mas dos joelhos para baixo foi uma região que fiquei bastante
tenso nesse momento.

Figura 19: Sentindo a “pequena dança” ou os micromovimentos do colega.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (outubro, 2017).

Ao final da aula as bolinhas de tênis foram retomadas, dessa vez para trabalhar pontos
de tensões estagnadas localizadas nos músculos das costas, com atenção especial à região das
escápulas, um dos focos principais da aula. Sentados em colchonetes, primeiro um aluno
deveria somente sentir a anatomia das escápulas do colega, mapeando-as com os dedos, por
77

fim, um deitava de bruços e outro fazia massagem deslizando e pressionando a bolinha nas
costas do colega, e logo depois, como sempre, invertendo as posições de quem faz e de quem
recebe. Sobre esse momento o Aluno L fez a seguinte observação: “com os olhos fechados
(relaxando) fiquei plácido e imerso numa serenidade, muito bom. Com a bolinha recebendo a
massagem foi o ápice do dia, mais um pouco e tinha dormido. Tirou muito da tensão do dia”.
Acredito que ainda temos muito para evoluirmos no que diz respeito à complexidade e a
aspectos que nos fogem a compreensão em relação ao nosso corpo. É um trabalho constante, e
nisso a consciência corporal nos ajuda imensamente para o despertamento de muitas outras
possibilidades, nos tirando daquilo que é apenas óbvio, além de nos ajudar a desenvolver um
estado de presença, pois “ao estarem focados nos seus movimentos no presente foi possível
que, em um momento posterior, focassem também nos movimentos do parceiro, fazendo com
que dançassem de uma forma mais fluida e conectada.” (STRACK, 2017, p.113)

Por fim trago o relato da Aluna M sobre sua percepção geral da aula:

essa aula nos proporcionou a estimular e pensar vários aspectos presentes na dança, como a construção de
uma relação consigo mesmo(eutonia), uma percepção de bem-estar durante a massagem e refletir como a
nossa própria respiração pode também ser uma 'micro-dança', influenciando também em nosso
desempenho e nos movimentos durante a dança.

Figura 20: Sentindo a “pequena dança” ou os micromovimentos do colega.

Fonte: Livia Marafiga Monteiro (outubro, 2017).


78

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nos últimos anos, novas configurações de como se dançar a dois têm sido discutidas,
sobretudo a partir da ideia de construir uma dança com diálogo, em que ambos os integrantes
desse par – independente do gênero – possam ter espaço para “falar” e “responder”
igualmente, produzindo juntos um dançar mais rico, envolvente, criativo e menos
estereotipado. Neste sentido, o foco do presente trabalho esteve na relevância do sentir,
partindo do modelo de comunicação a que estamos acostumados no senso comum, ou seja, a
condução nas Danças de Salão. No entanto, propondo um outro modo de “conduzir”.
Não é errado ensinar passos, figuras, sequências e combinações nas aulas de Dança de
Salão. No entanto, acredito que, como docentes, precisamos estar atentos ao algo a mais que é
necessário ensinar e desenvolver nas aulas, aquilo que está implícito nos conteúdos. Assim
não cairemos no discurso vazio de falarmos que a Dança de Salão é um diálogo que permite
um sentir da música e do par, quando na vida real de sua prática isso não acontece, gerando
uma incoerência entre discurso e prática. Portanto, creio que sejam necessárias pesquisas para
se elaborar metodologias de ensino que realmente tragam o desenvolvimento de uma efetiva
sensibilidade dos corpos na dança. Desta forma, o presente trabalho se propõe a testar
procedimentos de ensino que caminhem neste sentido.
Ao propor novas formas de condução, este trabalho não quis necessariamente discutir
gênero, nem “alimentar uma guerra dos sexos”, mas sim discutir uma nova visão do que pode
ser e dos significados que a Dança de Salão pode manifestar na vida de mulheres e homens,
fazendo uma ressignificação dos seus papeis. Para isso, uma das intenções foi a de buscar e
incentivar a dissociação entre os papeis de mulheres e homens com as respectivas funções de
damas e cavalheiros, pois: “Isto liberta todas as pessoas para vivenciarem ambas as funções
ao longo de uma dança inteira ou alternando-as em seu decorrer.” (ZAMONER, 2013, p.5)
Gostaria de enfatizar, novamente, um ponto importante no que diz respeito ao ensino
da Dança de Salão como o conhecemos hoje, pois acredito que existe por parte dos
profissionais da área, quase que de forma generalizada, uma falta considerável de
planejamento e pesquisa de novas perspectivas no ensinar, oriundos da falta de um preparo
adequado dos professores. Assim sendo, percebe-se a importância da formação de um
professor reflexivo/pesquisador, que esteja apto para contribuir na construção de indivíduos
capazes de refletir sobre suas ações. Neste sentido, a graduação em Dança foi fundamental no
meu processo formativo, pois me permitiu questionar o ensino da Dança de Salão e pesquisar
79

novas formas de ensiná-la. Sobre esta questão, trago os apontamentos de Elizabeth Wencik e
Elizete Rocha (s.d., s.n.):

Será sempre fundamental para os professores de dança de salão, estarem constantemente em busca de
conhecimentos produzidos academicamente bem como os adquiridos na prática de muitos de seus
saberes.O crescimento deste profissional dependerá em muito de curiosidades para avanços nas práticas
pedagógicas afinal , ele trabalha com corpos de sujeitos em movimentos, que dançam, em realidades
contextuais diferenciadas e assim, pessoas diferentes em suas salas de aula que deverão ser orientadas
para conquistas que ultrapassem a execução de passos.

Através das informações trazidas neste trabalho foi possível a constatação de que o
homem sempre teve a iniciativa da condução, sendo o precursor das intenções de movimento,
cabendo à mulher deixar-se conduzir, respondendo ao estímulo oferecido. Essa condução,
totalmente masculina na Dança de Salão, está associada a aspectos sociais e culturais,
portanto é algo que pode ser mudado. Creio ser necessário que nos tornemos flexíveis diante
dos avanços e mudanças do mundo contemporâneo e de todo contexto que envolve
concepções acerca da dança, saindo do automatismo das ações didáticas, especialmente se
queremos contribuir socialmente em amplos sentidos.
Para mim, como professora e dançarina, a elaboração deste trabalho foi uma
proposição nova, além de também configurar-se em um desafio. Em muitos momentos da
Oficina me vi surpresa com os exercícios que acabaram sendo novidades, inclusive para mim.
E para minha grata surpresa, com resultados bastante positivos, pois concluo este trabalho
com a sensação de ter dado meu recado de forma satisfatória aos alunos - o que pude constatar
através dos feedbacks que recebi dos mesmos em seus relatos nos diários. Como mencionado
anteriormente, acredito que a partir dessa vivência, os alunos estarão aptos a refletirem de
forma crítica quando buscarem aulas de Dança de Salão em outras oportunidades, pois
concluíram as aulas detendo conhecimentos diferenciados sobre as danças de pares, o que
certamente, fará uma enorme diferença em suas práticas de dança pela vida.
Posso afirmar que chego ao fim da graduação com muitos conceitos alterados do que a
dança significava para mim e de como ela se apresenta hoje. Todos os conteúdos das práticas,
das teorias, debates, explanações de professores e colegas, e até mesmo os dissabores que
estiveram presentes no meu percurso de graduação, fizeram sentido agora que chego ao fim
desta etapa. Como se uma “ficha caísse” e muitas ideias se encaixassem, somente agora, nesse
período final com a escrita do Trabalho de Conclusão de Curso e a elaboração das aulas para a
Oficina. Como docente, desenvolvi a certeza da importância fundamental das relações entre
80

teoria e prática no processo de ensino aprendizagem para melhor compreensão das propostas
das aulas, além de incorporar inovações com inúmeras linguagens e possibilidades.
Em relação à Dança de Salão, acho importante ressaltar que esse tipo de abordagem e
questionamento devem ser alvo de reflexões, para que possamos dar opções aos indivíduos e a
oportunidade de vivenciarem a dança de acordo com seus interesses e limitações. E o
processo de escrita desse trabalho, juntamente com a realização da Oficina, trouxe-me a
clareza desse entendimento, contribuindo para que o meu fazer docente como graduada em
uma Licenciatura em Dança seja e esteja permeado por ampliações nas percepções de corpo e
de dança.
81

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http://dancamage.blogspot.com.br/2013/06/22-busca-pela-conducao-do-cavalheiro-na.html.
Acesso em 14 out. 2017.

SANTOS, Sérgio Maria Pereira dos. A conexão dançante: ampliação das possibilidades de
condução em danças a dois. 2016. 24f. Trabalho de conclusão de curso (Licenciatura em
Dança) - Departamento de Artes, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2016.

SILVEIRA, Paola de Vasconcelos. Diálogos de um ser a dois: Uma perspectiva para


dançar tango. 2012. 40 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Dança).
Departamento da Escola de Educação Física, Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Porto Alegre, 2012.

STRACK, Míriam Medeiros. Dama ativa e comunicação entre o casal na dança de salão:
uma abordagem prática. 2013. 77 f. Monografia (Especialização em Teoria e Movimento da
Dança, com Ênfase em Danças de Salão). Faculdade Metropolitana de Curitiba, São José dos
Pinhais, 2013.

______. Dança de Salão: Cartografia de uma abordagem feminista. 2017. 125 f.


Dissertação (Mestrado em Artes da Cena) . Universidade Federal de Minas Gerais, Belo
Horizonte, 2017.
84

VIEIRA, Júlia Palma Gunesch. Aplicação dos Princípios da Dança de Salão ao processo
criativo de uma cena. 2013. 55 p. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Artes
Cênicas). Universidade de Brasília, Brasília, 2013.

ZAMONER, Maristela. Zouk e o peso nocivo da condução. Studio Saberes Dança de Salão.
Julho de 2014. Disponível em: <http://danca-de-salao-maristela-
zamoner.blogspot.com.br/2014/07/zouk-e-o-peso nocivo-da-conducao.html.> Acesso em 16
out. 2017.

______. Formação de professores de Dança de Salão, uma discussão necessária. In:


EDUCERE – CONGRESSO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 4, 2004, Curitiba. Anais.
Curitiba, 2004.

______. Sexo e dança de salão. Curitiba: Protexto, 2007. 208 p.

______. E se as damas conduzissem? Dança em Pauta. Curitiba, 14 mar. 2011. Disponível


em: http://www.dancaempauta.com.br/site/artigo/e-se-as-damasconduzissem/ Acesso em 01
out. 2017.

WENCIK, Elizabeth. ROCHA, Elizete. In: Marcelo Grangeiro. S.D. Disponível em: <
http://www.marcelograngeiro.com.br/media/True/Plano_de_aula_para_dan%C3%A7a_de_sal
ao.pdf > Acesso em: 30 out. 2017.

WILLADINO, Isabel Costa. Dança zouk: trajetórias do aprendiz. In: CONGRESSO


NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA – ANDA, 2, 2012, São Paulo. Anais. São
Paulo: Unesp, 2012.
85

APÊNDICE A

PLANO DE CURSO

1) IDENTIFICAÇÃO

Curso: Oficina de Dança de Salão/ Projeto de Extensão 5,6,7 e 8


Horários: Terça-feira as 17:30 e as 18:30
Professora: Livia Marafiga Monteiro

2) OBJETIVO GERAL

Trazer a vivência e o desenvolvimento de uma nova consciência na dança de pares focando na


condução compartilhada e na indução de movimentos.

3) OBJETIVOS ESPECÍFICOS

- Focar na consciência corporal individual e quando na interação com outra pessoa;


- Quebrar a condução e propiciar novos movimentos através de proposições;
- Aguçar o pensamento criativo, incentivando o improviso aberto;
- Desenvolver a escuta corporal mútua no momento da dança;
- Estimular a conexão mental e corporal;
- Fortalecer o autoconhecimento e a cooperação entre pares;
- Buscar a autonomia dos participantes da Oficina.

4) METODOLOGIA

Os procedimentos envolverão aulas participativas, sempre buscando o componente reflexivo e


interativo entre alunos e professoras. A metodologia desenvolvida enfatiza a participação efetiva e o
interesse dos alunos.
86

5) CRONOGRAMA DE ATIVIDADES

Data Conteúdo

22/08 Apresentação da Oficina.

29/08 Noções rítmicas, tipos de condução e estímulo corporal para


a proposição.
05/09 Bases do Forró.

12/09 Forró: Passada simples.

19/09 Conexão visual (dinâmica da mesa de vidro).

26/09 Contato Improvisação.

03/10 Condução compartilhada pelo espaço.

10/10 Prática orientada de Forró.

17/10 Bases da Kizomba.

24/10 Escuta Corporal (Kizomba).

31/10 Consciência corporal (Eutonia).

6) RECURSOS DIDÁTICOS

Aparelho de som, bolinhas de tênis, TNT azul para confecção dos limites da mesa imaginária de vidro
e TNT preto para confecção das vendas para aula de escuta corporal.

7) REFERÊNCIAS

GIL, José. A comunicação dos corpos: Steve Paxton, São Paulo, 2005.
LABAN, Rudolf. Domínio do movimento. São Paulo: Summus, 1978.
FILADELFI, Ana Maria Caliman. O diálogo entre música e dança de salão. Dança em Pauta. 06
out. 2017. Disponível em: http://site.dancaempauta.com.br/o-dialogo-entre-musica-e-danca-de-
salao/.
Kizomba: cumplicidade na pista de dança. Passo base. 24 out. 2017. Disponível em:
http://passobase.com/artigos/kizomba-cumplicidade-pista-danca.
87

APÊNDICE B

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA


TERMO DE CONSENTIMENTO

Esta pesquisa tem por objetivo trazer a vivência e o desenvolvimento de uma nova
consciência na Dança de Salão, focando na condução compartilhada e indução de
movimentos, buscando o diálogo corporal entre os (as) participantes. Para tanto, os exercícios
propostos ocorrerão na Oficina Dança de Salão - Condução Compartilhada e Indução, dentro
do Projeto de Extensão 5,6,7 e 8, no período entre agosto e novembro de 2017. O material
levantado servirá de subsídios para a realização do Trabalho de Conclusão de Curso de
Licenciatura em Dança da Universidade Federal de Santa Maria, da acadêmica Livia Marafiga
Monteiro, com a orientação da Professora Doutora Neila Baldi.

Os resultados desta pesquisa serão publicados, mas com os nomes dos(as) participantes
mantidos em sigilo – exceto se, depois de redigida a versão final, houver consentimento
individual, de cada participante.

Durante as Oficinas serão capturadas imagens (fotográficas e fílmicas) que poderão ser usadas
no TCC. Para isso, os (as) participantes que consentirem em participar do processo estão
automaticamente autorizando o uso das mesmas.

Santa Maria, 22 de agosto de 2017.

Livia Marafiga Monteiro (Idealizadora da Oficina)

Consinto em participar da pesquisa:

_________________________________________________________
(Aluna ou aluno)

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