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Roteiro de
Estudos
Autor: Ma. Joana d’Arc da Penha Batista
Revisor: Luiz Zaghi
Olá, estudante! Bem-vindo(a) à disciplina Ensino de Português para Estrangeiros! Com o estudo
atento deste roteiro e do material indicado para aprofundamento de todos os tópicos, você
entrará em contato com um número de discussões importantes relacionadas ao ensino de
português para estrangeiros.
Caro(a) estudante, ao ler este roteiro, você vai:
criar um novo olhar para o ensino de português para estrangeiros;
conhecer as bases socioculturais para o ensino de línguas estrangeiras;
refletir sobre as relações entre gramática e ensino de línguas;
entender como associar gêneros textuais a práticas de linguagem;
conhecer as relações entre práticas de linguagem e o exame Celpe-Bras;
reavaliar a sua prática docente, no sentido de acompanhar as demandas do século 21.
Introdução
Em comparação com períodos anteriores, em que ser falante nativo era suficiente para se
ensinar português para estrangeiros, no século 21, o aumento na procura por aprendizagem
eficiente e dinâmica tem elevado as exigências para o exercício da profissão e feito com que
muitos professores, especialmente os de português (mas não apenas), procurem dar
continuidade à sua formação.
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A disciplina Ensino de Português para Estrangeiros tem como objetivo justamente acompanhar
você nessa busca por formação contínua, por meio da apresentação de informações,
questionamentos e reflexões que, ampliando aquilo que você já sabe e lhe apresentando novas
possibilidades, irão apontar um universo de possibilidades para o seu trabalho como docente.
Bons estudos!
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da cidadania que deve estar presente quando se elaboram os currículos escolares. E, para
contribuir na construção dessa linguagem, os professores que hoje estão atuando na área de
português para estrangeiros necessitam buscar atualização profissional, dado que não
receberam formação inicial para esse ensino intercultural.
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como a abordagem interdisciplinar no mundo real, propiciando que o aprendiz entenda melhor
os problemas e proponha soluções viáveis para eles.
Pensando apenas no aspecto dos processos de ensino-aprendizagem, precisamos relembrar a
complexidade ao qual estão envoltos - não consistem apenas em aspectos linguísticos, mas
também em fatores socioculturais, tais como pertencimento étnico-racial, poder aquisitivo,
história de vida, identidade de gênero, orientação política e ideológica na busca da restauração
da integralidade dos saberes.
No momento vivido, em que o mundo se movimenta em todas as direções, pode ser até
considerado como ingenuidade se pensar que a prática de imposições de valores linguístico-
culturais possa ser possível, sem que as pessoas se rebelem. Mesmo a língua inglesa, com todo
o seu poder econômico, tecnológico e bélico, está tendo de se misturar com as línguas das
pessoas com quem negocia seus espaços.
Com a língua portuguesa falada no Brasil, respeitadas as devidas proporções, a história não
está sendo muito diferente: a chegada de pessoas cotidianamente, vindas de diversas partes
do mundo, e por diversos motivos, está mudando, para melhor, os nossos ouvidos – com seus
sons; o nosso olhar – com suas cores; e o nosso paladar – com seus sabores. Como imaginar
que a língua portuguesa não esteja participando também dessas mudanças?
Quanto às inter-relações que se estabelecem entre culturas e línguas por meio do diálogo
intercultural, Hexelschneider (1988 apud JANZEN, 1998, p. 12) aponta que a: “Interculturalidade
é sempre conhecimento e reconhecimento do outro para aprofundar o autoconhecimento,
sentir e repensar para entender melhor, ou até encontrar a sua própria identidade”.
O processo de ensino e aprendizagem intercultural de línguas não permite a manutenção de
valores e crenças impositivas, pois ele reformula os seus próprios objetivos, exigindo a
transição de focos restritivos e limitantes de uma competência meramente linguística para uma
competência verdadeiramente comunicativa e intercultural.
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estamos acostumados a chamar de: normas vernáculas ou o português popular; normas cultas
ou o português culto; e norma padrão , que, segundo Mattos e Silva (2006), não representa, de
fato, nenhuma variedade realmente falada no Brasil, mas pode ser encontrada em clássicos da
literatura brasileira.
Quanto às maneiras como os professores de português devem lidar com o ensino de gramática
em suas aulas, Barbosa e Freire (2020) observam que:
Assim, no ensino do Português Brasileiro [PB], seja como língua materna, seja
como língua adicional [...], acreditamos ser relevante que o professor se
aproprie de conhecimentos que devem ser levados para suas aulas com
questões relacionadas à diversidade linguística, aos fatores sócio-históricos e
culturais externos presentes na formação do PB e à pluralidade de normas que
constituem a língua portuguesa no Brasil (BARBOSA; FREIRE, 2020, p. 658).
Isso quer dizer que os professores devem conhecer e respeitar as muitas possibilidades de se
falar português no Brasil, uma vez que o país, por ter dimensões continentais, abriga em seu
território uma população formada por povos originários de diversas partes do mundo. Assim,
permitir que os alunos de português língua estrangeira tenham contato com a variedade
linguística brasileira só será benéfico.
E, no intuito de conhecer as particularidades das variedades da língua portuguesa que é falada
no Brasil, é necessário que se realizem estudos interdisciplinares, que vão permitir a melhor
compreensão de fatos históricos e da vida cotidiana, fatos esses que se configuram como
sistemas vivos e dinâmicos, os quais se alimentam de trocas culturais entre os que já estão e os
novos povos que continuam chegando ao país.
No próximo tópico, que trata especificamente das práticas de linguagem e gêneros textuais,
nós nos aprofundaremos sobre as relações entre sistema linguístico, aspectos gramaticais e
uso efetivo da língua. Questões relacionadas à semiose (construção de sentidos) serão
aprofundadas no tópico 5, que trata do ensino de português e o exame Celpe-Bras.
Quando o Brasil conseguir, finalmente, entender que ações como apenas memorizar
vocabulário, conjugar listas extensas de verbos e repetir exaustivamente modelos de pronúncia
gravados por atores já não possibilitam aos alunos o domínio de uma língua estrangeira, os
professores terão percorrido meio caminho na direção do enfrentamento das problemáticas
que envolvem estar em sala de aula deste século.
É a partir dessa perspectiva que podemos falar da competência metalinguística (composta por
sistema, regras e normas) e da competência comunicativa (uso efetivo da língua em situações
de interação), que não devem ser tratadas como opostas, mas, sim, utilizadas para comparar as
aprendizagens dos alunos.
Quando se trata de ensino para alunos adultos (maioria dos que procuram os cursos regulares
de português para estrangeiros), os professores perceberão, logo nas primeiras aulas, que as
problemáticas trazidas pelos alunos estarão, na maioria das vezes, relacionadas à formação
escolar e profissional, trabalho, saúde e cultura, entre outras preocupações próprias de
pessoas adultas.
Os materiais didáticos que hoje são encontrados no mercado, por bem elaborados que sejam,
não apresentam mais (se é que um dia apresentaram) condições de contemplar as
necessidades de adultos que têm de conciliar vida familiar, trabalho e muitas outras
responsabilidades.
Nenhum livro didático publicado até o momento, independentemente de seu currículo - por
mais inclusivo que seja -, dá conta de atender às especificidades oriundas de uma turma de
alunos, e isso independe do perfil dos alunos. Os professores sempre precisam realizar
adequações, de modo a ministrarem uma aula que realmente contribua para o
desenvolvimento de seus alunos.
Pense comigo e me diga se faz algum sentido para você ensinar sua aluna a usar verbos de
ligação (SER, ESTAR, PARECER), oferecendo a ela exercícios de repetição de uma unidade do
livro didático que apresenta, digamos, vocabulário e frases feitas relacionadas a condições
climáticas , sendo que o que a motivou a procurar as suas aulas foi a necessidade de se
preparar para uma entrevista de emprego no Brasil?
Não seria mais interessante, e útil, ensinar essa aluna a usar verbos de ligação (SER, ESTAR,
PARECER), oferecendo a ela oportunidades de interagir com um aluno que compartilhe as
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mesmas necessidades e, podendo contar com a mediação do professor, produzir um texto oral
e autêntico, por meio da negociação de significados e sentidos (diálogo), que ambos os alunos
poderão usar (talvez no dia seguinte) em uma situação da vida real?
Se estamos falando de vida real, então estamos falando de gêneros textuais, ou melhor, de
construção de textos a partir de um gênero textual, que, no nosso exemplo, pode ser chamado
de entrevista de emprego , ou prática de linguagem entrevista de emprego .
Quanto a isso, Borges (2012, p. 124-125) explica que “os gêneros são a referência intermediária
para esta aprendizagem e, por isso, constituem-se como objetos de ensino e instrumentos de
pesquisa de maior relevância para esta construção”.
Você deve ter percebido que, mesmo tendo substituído o tema condições climáticas por
entrevista de emprego , eu não mexi nos verbos de ligação SER, ESTAR e PARECER? Não foi
aleatoriamente, mas sim para sugerir para você que, por um lado, ainda que os livros didáticos
encontrados no mercado não atendam 100% às necessidades dos alunos, há muitos materiais
que podem ser adaptados, reaproveitados ou mesmo reformulados, no caso de exercícios on-
line . E, por outro lado, para mostrar para você que o trabalho com gêneros não dispensa o
ensino de aspectos formais da língua.
Nesse trabalho com gêneros, podemos fazer o uso dos multimodais: quando falamos ou
escrevemos um texto, estamos usando, no mínimo, dois modos de representação: palavras e
gestos, palavras e entonações, palavras e imagens, palavras e tipográficas, palavras e sorrisos,
palavras e animações etc. (DIONÍSIO, 2011). Como exemplos, podemos citar: hipertexto, vlog,
blog, fanfic, wiki, GIF, jornal impresso e jornal on-line , desenho animado, infográficos, mapas e
HQs - todos digitais e mal explorados.
Se, nos métodos tradicionais de ensino (que costumam utilizar apenas os materiais autênticos),
o ponto de partida é o estudo das partes constituintes do texto (frases e palavras), na
perspectiva dos gêneros textuais, o ponto de partida é o texto, sendo que o estudo dos
aspectos gramaticais é realizado a partir do contexto de uso (prática de linguagem).
Esses materiais autênticos consistem em porções de amostras de língua em uso que foram
produzidas em práticas sociais realizadas em contextos diferentes dos das salas de aula. Como
foram construídos por falantes reais, esses materiais não foram elaborados considerando o
público que os utilizaria.
Uma maneira de auxiliar os estrangeiros a aprender a língua portuguesa é por meio do
compartilhamento de experiências. Essa prática pode ser uma excelente oportunidade para se
construírem saberes interculturais entre os alunos, pois propicia que, além da língua, se
aprenda mais sobre a cultura, fator essencial para aprender a língua. Aqui, podemos utilizar o
método comunicativo, no qual os erros são tolerados - por meio de instruções fornecidas na
língua-alvo, os alunos aprendem a usar a linguagem acima do nível das frases; isso acontece
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pois necessitam das palavras de ligação para entender a coesão e a coerência -, e a função
docente é sempre prover situações comunicativas.
É importante sempre se atentar às variações sociolinguísticas e socioculturais no ensino. A
primeira se refere à pronúncia, ao vocabulário e à estrutura sintática própria de cada região
brasileira; a segunda está relacionada com valores culturais, políticos e identitários, dentre
outros. Ambas se relacionam estreitamente, pois estão se referindo às formações sociais - que
podem ser verificadas tanto pelo uso da língua quanto por costumes e valores culturais.
Alguns pesquisadores defendem que a fluência em uma língua estrangeira pode ser medida
pela capacidade de se comunicar fazendo o uso de metáforas - que consistem em figuras de
linguagem que expandem nossa capacidade comunicativa ao nos permitirem que nos
refiramos a uma coisa, mas mencionando outra. As metáforas penetram o cotidiano em
inúmeras comunidades linguísticas, pois, independentemente de níveis de escolarização,
proporcionam às pessoas expressarem ideias complexas em poucas palavras. Conseguir
trabalhar com sentidos figurados nas aulas é importante, pois isso permite ao aluno conhecer
ditos populares e provérbios que vão auxiliar na redução das reduções das barreiras
idiomáticas.
É válido salientar que todas essas práticas devem visar à promoção do protagonismo do aluno,
que consiste no principal elemento de todo e qualquer processo de ensino-aprendizagem,
consistindo-se em essencial para uma aprendizagem significativa.
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Você sabia que as maneiras como o povo brasileiro lida com a língua portuguesa, tendo por
influência as contribuições das línguas e costumes linguísticos herdados de povos indígenas e
africanos (só para citar alguns) pode ser avaliada por puristas como desvios das normas e até
mesmo como erros ? Sendo que, para que os falares da maioria da população brasileira sejam
tachados como desviantes, não é necessário nem se atravessar o Oceano Atlântico; basta
mudar de cidade ou até mesmo de bairro, pois, quando se trata de jeito de falar , o povo
brasileiro pode ser bem preconceituoso.
Mas de onde terá vindo essa intolerância com os nossos próprios jeitos de falar? Ainda com
base em Bagno e Rangel (2005), é possível que tenhamos sido linguisticamente educados para
ser preconceituosos com a língua, graças a “crenças, superstições, representações, mitos e
preconceitos que circulam na sociedade em torno da língua/linguagem e que compõem o que
se poderia chamar de imaginário linguístico ou, sob outra ótica, de ideologia linguística ” (BAGNO;
RANGEL, 2005, p. 64). A Sociolinguística, vertente da Linguística que tem, no Brasil, Marcos
Bagno como seu mais fervoroso expoente, se ocupa, principalmente, do que o teórico
denomina preconceito linguístico .
Nos meios acadêmicos, quando se pensa no ensino de português língua estrangeira, é muito
comum que as pessoas se preocupem com a escolha de qual variedade da língua portuguesa
os cursos de idiomas devem ensinar. Essa é uma questão que, embora ainda sem respostas
definitivas, tem mobilizado professores e pesquisadores, pois, diferentemente do ensino de
língua inglesa, que, espalhado praticamente pelo mundo todo, conta com produções maciças
de livros didáticos, o ensino de português língua estrangeira, mesmo tendo se ampliado nas
últimas décadas, ainda carece muito de material de ensino.
Na busca de uma formalização ou sistematização do ensino de português para estrangeiros no
Brasil, muitos professores têm preparado suas aulas com base nas orientações do Celpe-Bras
(Certificado de Proficiência em Língua Portuguesa para Estrangeiros), único exame brasileiro
oficial para a certificação da proficiência em português como língua estrangeira. O exame é
realizado pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira),
autarquia federal vinculada ao Ministério da Educação. Possuir essa certificação é exigência
para que estrangeiros possam estudar em universidades públicas brasileiras.
O Celpe-Bras considera proficiente aquela pessoa que faz uso adequado da língua para realizar
ações, considerando aspectos textuais (no sentido que foi estudado no tópico 4), com especial
atenção para o contexto e a fluência discursiva dos candidatos.
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Conclusão
O trabalho com o ensino de português para estrangeiros, sejam quais forem os motivos que
levam o aluno a procurar essa formação, deve ser sempre permeado pela consideração de que
as linguagens, ao mesmo tempo em que são construídas pelas e nas interações sociais,
constroem essas mesmas interações sociais. O processo de ensino-aprendizagem é um diálogo
constante entre professor-aluno, aluno-aluno e aluno-texto-professor.
O processo de ensino-aprendizagem de uma língua estrangeira não se resume nem à
memorização de regras gramaticais, nem à imitação do jeito de falar de um ator que se
apresenta como modelo de perfeição. Antes disso, esse processo se estende até a casa do
aluno, à sua comunidade e ao mundo. Os exercícios e vivências experimentados em sala de
aula não são uma simulação da vida, mas a própria vida.
Referências Bibliográficas
ALMEIDA FILHO, J. C. P. Fundamentos de abordagem e formação no ensino de PLE e de
outras línguas . 2. ed. Campinas: Pontes, 2017.
AMADO, R. S. O ensino de Português para refugiados: caminho para a cidadania. In : SÁ, R. L.
(org.) PFOL : Português para falantes de outras línguas. Interculturalidade, inclusão social e
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BAGNO, M.; RANGEL, E. O. Tarefas da educação linguística no Brasil. Revista Brasileira de
Linguística Aplicada , Belo Horizonte, v. 5, n. 1, p. 63-81, 2005. Disponível em:
https://www.scielo.br/pdf/rbla/v5n1/04.pdf . Acesso em: 2 jul. 2020.
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