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No texto da relação é possível perceber também que o contato prolongado dos portugueses
com os povos africanos já tinha deixado marcas na língua e que a heterogeneidade
linguística era a característica principal. Havia uma preocupação em registrar as línguas em
circulação mas ao mesmo tempo eles já achavam que tinham um saber sobre essas
línguas.

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Essa citação deixa claro que os portugueses estavam aplicando o seu conhecimento das
relações entre as línguas e as nações europeias às línguas e nações africanas. Eles
buscavam reconhecer o modelo de organização social deles, baseado em um poder central
com línguas vinculadas a esse poder, nas estruturas sociais africanas. As descrições das
línguas e nações da África seguiam esse paradigma. Nessas descrições ocorre uma
oscilação no uso de “linguagem”, “idioma” e “língua”.

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As diferentes maneiras de nomear as coisas da terra, com nomes de origem portuguesa e


africana, indica a construção e a transmissão de um saber
linguístico-geográfico-antropológico. Algumas vezes eles explicitavam que língua era usada
na nomeação, de qual povo, e outras vezes não. Isso produz um apagamento, uma
indiferenciação linguística que tem repercussões no modo como a memória do colonizador
português se impõe sobre o colonizado. Esse processo discursivo ocorre tanto na África,
com os povos africanos, quanto no Brasil, com os povos indígenas.

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Quando se fala de nome próprio racional e conveniente, é preciso se perguntar, racional e


conveniente para quem? Essa fala demonstra bem o ponto de vista eurocêntrico adotado
nessa descrição. O nome próprio ligado a um nome de família, ao batismo cristão, é um ato
de linguagem tipicamente europeu que tem como objetivo atribuir uma identidade unívoca
ou conter uma individuação ligada a uma linhagem. Esse ato permite que a pessoa
nomeada seja inserida em um determinado contexto, nesse caso o contexto europeu.

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O ato de nomear, pras sociedades ocidentais, materializa a língua e traços


histórico-culturais, como linhagem, inserção na fé católica e nacionalidade. Então a ausência
de um nome próprio conveniente e racional impede que o europeu reconheça uma linhagem
ou um imaginário de língua e nação. Nesse sentido, a ausência daquilo que pode ser
reconhecido passa a ser visto como um déficit. Essa visão corrobora o discurso que diz que
povos não-europeus não têm racionalidade. No caso da África, a adesão à fé cristã seria
uma forma de atingir a racionalidade.

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Em Dom Francisco Manipango, o nome católico Francisco e o pronome de tratamento Dom


atribuem racionalidade ao nome africano Manipango, e indicam um processo de absorção
das formas sociais africanas pelas formas sociais portuguesas. Essa absorção também
pode ser vista no contexto da transposição do sistema jurídico português pra África. Além de
civilizar as línguas e além de civilizar pela religião, os portugueses, com a inserção dos seus
nomes próprios nas sociedades africanas, civilizam pela forma se deve dar a sua inserção
nas formas jurídicas.

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Nem sempre as relações entre colonizador e colonizado são tão nítidas na língua, por isso é
importante retomar os tratados que tentam descrever como esse contato se realizou
inicialmente. A partir deles é possível perceber como uma memória vai sendo construída a
partir das tensões entre lembrar e esquecer, entre a visibilidade e o apagamento.
As descrições de Azurara e de Lopes e Pigafetta marcam um modo de ver e atribuir
significado ao outro. A questão mais importante que surge então é se esses modos de
significação vão influenciar a constituição de uma identidade e de uma língua nacional nos
países africanos de língua portuguesa, e se vão fazer parte direta ou indiretamente da
história e da memória desses países.

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Já no contexto dos tratados acerca da colonização do Brasil, é recorrente a menção aos


línguas.
Os línguas atuavam como intermediários, principalmente para os padres no processo de
evangelização dos indígenas. O papel atribuído aos línguas nesses tratados está sempre
relacionado à importância de “haver língua da terra”, de saber a língua da terra.

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Os línguas eram portugueses, ou franceses, no período da Invasão Francesa, que eram


trazidos pra cá para aprender a língua indígena e ensinar a língua do colonizador. Muitas
vezes os línguas eram meninos órfãos que vinham de Lisboa.
O que se verifica então é a transposição do corpo civilizado dos europeus como meio de se
“tomar língua do gentio”.

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Os indígenas também eram treinados para exercer a função de intérprete. Conforme o grau
de resistência que os indígenas apresentavam aos portugueses, eles e as suas línguas
eram classificados de forma mais ou menos favorável. Por exemplo, os tapuias, que eram
inimigos dos portugueses, são descritos como falantes de “muitas e diferentes línguas
dificultosas”. Quando o indígena é um aliado, e por aliado eles queriam dizer evangelizado,
a relação estabelecida era bem mais positiva.

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Nesse relato, a gente pode ver que o português que sabia a língua conseguiu escapar.
Saber a língua também era uma questão de proteção preventiva e segurança pessoal. Além
da evangelização, o conhecimento da língua trazia uma espécie de salvo-conduto.

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Nos tratados e crônicas, um conhecimento anterior organiza, mesmo que implicitamente, o


modo como os portugueses lidam com o desconhecido na nova terra e o transformam em
algo transparente a partir desse imaginário preexistente.
Até que ponto a experiência africana está presente, como memória, no modo de organizar
um conhecimento linguístico sobre a Terra de Santa Cruz? Pode-se supor uma circulação de
idéias linguísticas e de modos de formulação de conhecimento das línguas desconhecidas.
No caso do Brasil, existe um esforço de se trabalhar com a língua geral e de facilitar seu
aprendizado. Apesar disso, assim como na Relação do reino do Congo, ocorre também um
esforço de nomear as coisas da terra, as populações indígenas, animais, plantas, acidentes
geográficos e povoados que vão surgindo.

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As relações materiais estabelecidas pela colonização no Novo Mundo não se dão apenas a
partir de um pensamento previamente construído. O novo Mundo apresenta resistências que
podem ressignificar o imaginário utilizado para significá-lo e categorizá-lo.
Não é possível afirmar que o processo de tornar conhecido o desconhecido seja desprovido
de algum domínio prévio de modos de constituição do saber, mas, ao mesmo tempo,
também não é possível ignorar a influência desse Novo Mundo desconhecido sobre o velho
mundo europeu.

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Colonizar implica a tentativa linguística de desfazer a opacidade da nova terra. O espaço


selvagem e opaco vai se transformando em um espaço administrado e transparente. Esse
espaço é domesticado linguisticamente de modo a absorver o outro, a alteridade, o
heterogêneo. No Brasil isso ocorre por meio do aprendizado da língua geral, e por meio do
trabalho de nomeação das coisas.
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O trabalho de ensino e aprendizado das línguas fica por conta dos intérpretes, as descrições
gramaticais ficam por conta dos missionários, e a transmissão de informação sobre o nome
das coisas fica por conta dos textos históricos.
Tudo isso se resume em um esforço de absorção e homogeneização linguística do território
de modo a melhor administrá-lo. Esse processo se materializa em uma escrita que assinala
a necessidade e a presença dos línguas e emerge como uma forma de dar visibilidade à
terra desconhecida.
Nos séculos seguintes, em outros tratados Históricos e em narrativas de viajantes
não-portugueses esse processo se mantém.

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Em síntese, o que se percebe a partir desse percurso de leituras é o modo como a


colonização linguística atua de forma a absorver as diferenças nesses momentos de
imposição da língua do colonizador.
Os linguas são necessários como intérpretes, mas o colonizador deseja descartar a
presença dos linguas negros ou indígenas no menor tempo possível, já que eles não são
confiáveis.
Nos textos, as línguas são significadas como dificultosas, sem racionalidade, deficitárias.
As línguas e os línguas só não são descritos como pouco confiáveis quando já estão
cristianizados.
As crônicas e os tratados, portanto, funcionam como lugares de circulação de gestos de
interpretação/legitimação de ideias sobre os povos desconhecidos, além de fazerem circular
idéias e saberes linguísticos como forma de dar transparência à opacidade das línguas e da
terra.

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O encontro entre língua e história materializa processos de significação que regem a forma
como se percebe e se administra a alteridade conforme o pensamento dos séculos XV e
XVI.
Paralelamente foi se construindo um aparato jurídico-administrativo português de modo a
legislar formas de se tomar posse da terra e de seus habitantes.
No século XVI, a legislação passa também a incidir sobre as línguas, sobre seu ensino na
pedagogia religiosa, e sobre a necessidade de se redigirem gramáticas e vocabulários.

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O progressivo silenciamento das línguas e dos línguas indígenas e africanos se produz de


diferentes maneiras, mas isso não significa um apagamento absoluto do outro. Povos
indígenas e povos africanos resistem e suas próprias línguas permanecem significando,
muitas vezes pelo deslizamento de processos de significação que se realizam sobre a língua
do colonizador. Além disso, as línguas, mesmo silenciadas, continuam funcionando como
lugar de memória.

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