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OSTEOPATIA

no ESPORTE DE ALTO NÍVEL


Eric Robinson

OSTEOPATIA
no ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Tradução:
Juan Alejandro Fernando Gomes

2020
Copyright © 2020 Eric Robinson
1ª edição ∙ França, Agosto/2017
ISBN: 979-10-699-0984-7
www.sport-osteo.com

TÍTULO ORIGINAL
L’ostéopathie, un sport de haut niveau?
TRADUÇÃO
Juan Alejandro Fernando Gomes
REVISÃO
Cândida Gonçalves Dias Moreno
REVISÃO CIENTÍFICA
Bruno Gonçalves Dias Moreno
Thiago Lopes Barbosa de Morais
Ivan Luiz Pavanelli
REVISÃO TÉCNICA
Georges Domingos
DIAGRAMAÇÃO
Cia Das Ideias | @cia.das.ideias
FOTOGRAFIA
Acervo do Autor
1ª EDIÇÃO ∙ Brasil
A meu pai, a minha mãe,
A meus filhos, Yéléna, Andy e Elie
E a todos aqueles que acreditaram em mim
Atletas e profissionais da saúde.
agradecimentos

Gostaria de expressar minha gratidão a todos aqueles que me ajudaram, apoiaram


e acreditaram em mim ao longo do meu percurso:
Meus amigos da escola de osteopatia, Vincent Sorain, osteopata em Genebra,
que me ajudou, apoiou e corrigiu a seção dos fundamentos,
Denis Lemoigne, osteopata em Noyal-sur-Vilaine, que não poupou explicações
quando iniciei minha formação,
Christophe Dugarry, que veio me procurar em 1999 e me apresentou aos
dirigentes da equipe dos Girondins,
Claude Montero, médico dos Girondins, que acreditou em mim na época, quando
a osteopatia ainda estava engatinhando e principalmente quando era praticada pelos
« nem-nem » (nem fisioterapeutas, nem médicos),
Serge Dubeau, seu sucessor, que também acreditou em mim,
Bixente Lizarazu, responsável por eu ter descoberto o Bayern de Munich e
trabalhado num dos maiores clubes da história do futebol. Lembro que nem era fã
de futebol e me achei um dia sentado nos vestiários após o jogo, lendo os nomes
de alguns dos maiores jogadores da época gravados nos armários, saboreando a
chance de frequentar então aquelas pessoas,
Jacques Thébault, fisioterapeuta e osteopata dos Girondins de Bordeaux, e
ex-membro da seleção francesa de futebol, meu colega e amigo, pela releitura
atenta e pertinente do meu manuscrito,
A mãe dos meus filhos, Rosine, quem me permitiu engajar-me na formação,
gerindo nossa família durante minhas ausências,
Sem esquecer de minha amiga Isabelle, cujos conselhos e apoio sempre foram
preciosos, e quem me ensinou a ter uma visão diferente do mundo e das pessoas,
e a ser mais tolerante.
agradecimento ESPECIAL

A Osteopatia brasileira segue em desenvolvimento constante, despertando


a atenção de atletas, pacientes e demais profissionais da saúde, principalmente
pelos seus resultados de tratamento. Apesar de já existirem cursos de formação
no Brasil, desde a década de 90, a primeira regulamentação oficial aconteceu
em 2001, quando o Conselho Federal de Fisioterapia, por meio de resolução,
determinou que a Osteopatia se tornava uma das Especialidades da Graduação
em Fisioterapia.
Sua evolução e desenvolvimento em diferentes lugares do mundo sempre
contou com a participação de profissionais, que não satisfeitos em somente
praticá-la, decidiram ensiná-la a colegas que acreditaram nesta metodologia
de diagnóstico e tratamento.
Especialmente no Brasil, o maior responsável pela oportunidade de se
traduzir este livro, para o idioma português, foi o Osteopata D.O. Georges
Domingos. Natural da França, residente e proprietário de uma Clínica em
Paris, com vasta experiência clínica em Osteopatia no esporte de alto nível,
também trabalha como professor ministrando aulas e cursos em vários países
do mundo, juntamente com Eric Robinson, proporcionando a diferentes
Osteopatas, em diferentes idiomas, a oportunidade de melhorar suas técnicas
de tratamento.
Neste sentido, devido aos seus laços pessoais com o Brasil, ao seu envolvi-
mento direto em várias das etapas da tradução desta obra e a determinação em
contribuir com o crescimento da Osteopatia Brasileira, seria impossível que
este livro não tivesse uma homenagem especial e uma nota de agradecimento
para este grande profissional.
Muito obrigado ao Sr. Georges Domingos, Osteopata D.O.

Dr. Bruno Gonçalves Dias Moreno

Osteopata D.O. Georges Domingos

Presidente da AIOS (Associação Internacional de


Osteopatia no Esporte), experiência de 22 anos no
esporte de alto nível, três Olimpíadas com a equipe
da França de Halterofilismo, trabalhos realizados com
equipes de Hóquei no gelo e Rugby Profissional.
SUMÁRIO

PREFÁCIO À EDIÇÃO BRASILEIRA................................................................17

A OPINIÃO DE UM PROFISSIONAL DA SAÚDE


EM RELAÇÃO À ATENÇÃO DOS ATLETAS..................................................19

TESTEMUNHO DE ALGUNS DESPORTISTAS


QUE ACREDITARAM EM ERIC ROBINSON..................................................21

Um percurso atípico..................................................................................23

UMA VOCAÇÃO INESPERADA ..............................................................23

EVOLUÇÃO DA MINHA TÉCNICA DE MANIPULAÇÃO...............32

visão osteopática da lesão.................................................................35

A LESÃO NO PACIENTE CONVENCIONAL .....................................35

AS MUDANÇAS DA VIDA DE UM JOVEM PREDISPOSTO


A SE TORNAR ATLETA .............................................................................40

PREVENÇÃO E SUPORTE DO JOVEM DESPORTISTA ..................42

AS REAÇÕES PSICOLÓGICAS PERANTE OS


FERIMENTOS NO ESPORTE ..................................................................44

Percepção, palpação e manipulação...........................................47

UMA PERCEPÇÃO PARTICULAR, A PROPRIOCEPÇÃO ................47


NOSSOS CINCO SENTIDOS: FUNCIONAMENTO
E ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES FORNECIDAS
PELOS CAPTORES ......................................................................................50
1. Mecanismo geral da percepção .......................................................50
2. Percepção pela diferença ..................................................................52
3. Percepções enganosas.......................................................................54
4. Não podemos sentir o que os outros sentem ...............................56
5. Pedagogia da percepção osteopática ..............................................57
6. Como se colocar em situação de percepção fina ..........................58
7. Que devemos sentir na manipulação? ............................................60

Alguns princípios fundamentais...................................................65


(Segundo o Colégio Europeu de Etiopatia de Genebra).......................................65

DEFINIÇÕES ................................................................................................66
1. O Potencial Vital Original ...............................................................66
2. O Potencial Vital Atualizado ...........................................................66
3. Lesões irreversíveis e P.V.A. ............................................................67
4. Lesões reversíveis ..............................................................................67
5. Domínio de Funcionamento Fragilizado ou D.F.F. ......................67
6. Domínio de Funcionamento Habitual ou D.F.H. .........................67
7. Domínio de Funcionamento Eventual ou D.F.O. .........................68
8. Variáveis de estado ou Variáveis de Regulação
sistêmicas, ou V.R. .................................................................................68
9. Variáveis de entrada ..........................................................................68
10. Variáveis de saída ............................................................................68
11. Cadeias ascendente e descendente ................................................69

O TECIDO CONJUNTIVO ........................................................................70


1. Estrutura e composição do tecido conjuntivo ..............................70
2. Funções do tecido conjuntivo .........................................................70
3. Noção de articulação sadia ..............................................................71
4. Modificações do tecido conjuntivo ................................................72
5. Modificações à distância: VR ou variáveis de regulação ..............73
6. Estrutura e função ............................................................................73
7. Natureza e estado .............................................................................74

FUNCIONAMENTO DAS CADEIAS


(segundo o modelo etiopático) ......................................................................75
1. A cadeia ascendente ..........................................................................75
2. A cadeia descendente .......................................................................76
3. Complementação constante das duas cadeias ...............................78
4. Análise dos diversos sistemas ..........................................................78
5. Considerações sobre as tendinites...................................................80
6. Aplicações práticas para o terapeuta ..............................................80

Avaliação do estado do paciente..................................................83

OS MEIOS DE AVALIAÇÃO: ANAMNESE E PALPAÇÃO ...............83


1. Objetivos ............................................................................................83
2. Anamnese ..........................................................................................84
3. Detalhar a dor....................................................................................86
4. A palpação .........................................................................................91

5. Avaliação das qualidades dinâmicas ................................................94

O PARTICULAR E O GERAL ...................................................................96


1. Axiomas .............................................................................................96
2. Fenômenos lesionais particulares ...................................................96
3. Fenômenos lesionais gerais .............................................................97
4. Conceitos alopático e osteopático ..................................................98
5. Conduta perante o geral .................................................................100

O SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO OU OS


SISTEMAS SIMPÁTICO E PARASSIMPÁTICO ..................................101
1. Sistema simpático ...........................................................................101
2. Sistema parassimpático ..................................................................101
3. Como atingir o sistema autônomo?...............................................102
4. Distribuição dos centros parassimpáticos ...................................102
5. Regularização da vascularização por região .................................103
6. Aplicação em caso real....................................................................103

NOÇÕES DE AGUDO E CRÔNICO ....................................................105


1. O agudo ...........................................................................................105
2. O crônico .........................................................................................107

As dez etapas da manipulação.........................................................111

O MATERIAL ..............................................................................................111

DEFINIÇÕES: SLACK, KICK, THRUST ..............................................112


1. O slack .............................................................................................112
2. O kick ...............................................................................................113
3. O thrust ............................................................................................116

GENERALIDADES SOBRE A MANIPULAÇÃO ...............................121


1. O princípio ......................................................................................121
2. A técnica ..........................................................................................121
3. Os quatro tipos de manipulação ...................................................122
4. E se nada disso funcionar? ............................................................122

AS DEZ ETAPAS DA MANIPULAÇÃO ................................................124


1. Definição do objetivo .....................................................................124
2. Escolha do plano de deslizamento ...............................................124
3. Escolha da direção e sentido .........................................................124
4. Escolha do plano de trabalho (é a ação do terapeuta) ...............124
5. Organização dos planos e direção ................................................126
6. Fixação de A em 3 pontos e escolha do(s) contato(s) ................126
7. Redução do jogo articular (slack) ..................................................129
8. Fixação da posição adquirida, que se torna a referência (R) .....129
9. Redução dos jogos sobrejacentes e subjacentes
em relação à referência (R)..................................................................130
10. E finalmente a manipulação ........................................................132

Evolução das técnicas de base para


tratamento específico do atleta.............................................137

CONSIDERAÇÕES FUNDAMENTAIS SOBRE


O TRATAMENTO DOS ATLETAS ........................................................137

AS TÉCNICAS .............................................................................................146
1. Sacroilíaca ........................................................................................147
2. Lombares .........................................................................................152
3. Sacro..................................................................................................155
4. Ilíaco..................................................................................................158
5. Dorsais .............................................................................................160
6. Transição cervicodorsal .................................................................165
7. Cervicais ...........................................................................................168
8. Pé ......................................................................................................174
9. Joelho ...............................................................................................177
10. Navicular.........................................................................................179
11. Ombros ..........................................................................................183
12. Cotovelo .........................................................................................185

bibliografia......................................................................................................189
PREFÁCIO À EDIÇÃO BRASILEIRA

A tradução desta obra para a língua portuguesa representa mais uma possibilidade
de evolução nos tratamentos de Osteopatia.
No início deste livro Eric descreve partes de sua trajetória como criança, filho,
adulto, até se tornar Osteopata. Como na maioria das histórias de sucesso, descreve
dificuldades e obstáculos superados, até conseguir uma oportunidade de apresentar
seu trabalho a uma lenda do Surf mundial, Wayne Bartholomew.
Apesar de todo o conhecimento e experiência conquistados em uma longa
carreira atendendo desde pacientes comuns, até atletas de alto nível, consegue
expressar-se de forma simples e direta, permitindo que outros colegas e profissionais
possam aprender e reproduzir uma parte desta trajetória em seu trabalho.
Além disso, é notável sua concentração, humildade e respeito aos pacientes
durante seus atendimentos. Quem o assiste tem a impressão que Eric cria um
tipo de conexão especial neste momento, que lhe permite uma notável precisão e
destreza em suas técnicas.
Os leitores desta obra poderão perceber a riqueza de detalhes em conceitos
e descrições de técnicas de manipulação, dificilmente percebida em trabalhos de
outros autores de Osteopatia. Na prática, esta forma de entendimento permite ao
Osteopata trabalhar com técnicas mais equilibradas, precisas, seguras e de excelentes
resultados para qualquer tipo de paciente.
O trabalho clínico desenvolvido por Eric Robinson, somado ao conteúdo desta
obra, contribuem para o constante crescimento da Osteopatia e Osteopatas, pois
reforça que a sensibilidade e o conhecimento do profissional são instrumentos que
o mantém atento e preparado, para poder ajudar atletas e pacientes a encontrar
conforto, saúde e uma melhor performance.

Dr. Bruno Gonçalves Dias Moreno


Dr. Thiago Lopes Barbosa de Morais
A OPINIÃO DE UM PROFISSIONAL
DA SAÚDE EM RELAÇÃO À ATENÇÃO
DOS ATLETAS

Esporte de alto nível, o futebol profissional, possui atualmente exigências


esportivas, mas também médicas. Nada pode ser deixado ao acaso e tudo depende
dos detalhes. A improvisação não tem mais espaço na gestão médica e paramédica
dos esportistas.
Todavia, antes de ser um técnico com sua bateria de gestos e meios, é preciso
amar o esportista e principalmente o indivíduo. É a única condição para cumprir a
missão de maneira satisfatória. O acompanhamento poderá acontecer, então, com
total confiança entre as partes envolvidas.
Há alguns anos, a assistência aos esportistas vem melhorando de forma
prodigiosa, sendo adaptada e aperfeiçoada. Hoje é inconcebível outorgar uma
licença sem um exame clínico exaustivo, um exame cardiovascular completo,
análises complementares se for necessário, junto com conselhos adaptados à prática.
O acompanhamento dos treinos e das competições requer um acordo permanente
com o resto da equipe técnica.
Na minha carreira de médico do esporte, e especificamente do futebol
profissional, tive a oportunidade de trabalhar e trocar ideias com outros médicos
parceiros, fisioterapeutas, podólogos etc.
É chegada a hora na qual a osteopatia ingressou no entorno do esportista.
Tal especialidade, que no início podia surpreender, só se fez desenvolver e chamar
a atenção.
Tal método de diagnóstico e de terapia manual tem muita importância no
suporte e acompanhamento do esportista. Dedica tempo a escutar, sentir, palpar,
“cuidar” do indivíduo, o que é indispensável na sua vivência.
Portanto é hora de procurar o melhor desempenho sem esquecer do único
objetivo: outorgar ao indivíduo o melhor.

Serge Dubeau, médico dos Girondins de Bordeaux até 2015.


TESTEMUNHO DE ALGUNS
DESPORTISTAS QUE ACREDITARAM
EM ERIC ROBINSON

“Em 1996, após uma “ pubalgia” maltratada, estudei e experimentei diferentes técnicas
médicas à minha disposição. Foi assim que descobri e entendi o interesse pela osteopatia.
Todavia, a colaboração com Eric só começou em 2000, na época em que jogava no Bayern
de Munich. Através de um acompanhamento regular, foi um dos meios que me permitiram
permanecer no topo do meu desempenho evitando lesões e otimizando minha recuperação.
A osteopatia é uma ferramenta médica extraordinária quando é bem aplicada. Eric faz
parte daqueles em quem confio.”
Bixente Lizarazu

“Em formação no Clube dos Girondins de Bordeaux, frequentemente precisei dos


cuidados e massagens de fisioterapeutas, principalmente após lesões. Quando joguei
internacionalmente e me tornei campeão do mundo em 1998, conheci a osteopatia e
experimentei rapidamente a utilidade e benefícios de tal disciplina.
Em 1999, com a aprovação de Elie Baup, fiz entrar o Eric no time médico dos Giron-
dins de Bordeaux, para enriquecer a gama de cuidados necessários a todo atleta.
Ele soube ler e decodificar a linguagem do meu corpo e a dos outros jogadores, e indi-
vidualizar o tratamento para recolocar-nos em pé rapidamente, em estreita colaboração
com o resto da equipe médica: participou assim na volta de vários jogadores ao campo.
Hoje, tendo mudado para o jornalismo esportivo, continuo sendo um adepto da prática e
sempre apelo a Eric para me ajudar a ficar em forma e preservar a saúde, e evitar lesões
no meu corpo castigado por anos de esporte de alto nível.”
Christophe Dugarry
“Conheci o Eric no Tahiti em 1999. Tem o dom de achar bem rápido a origem dos
meus problemas enquanto outros terapeutas costumam demorar muito e, às vezes, nem
acham. Suas técnicas indolores são muito eficazes. Gosto muito de trabalhar com ele.
Com suas mãos mágicas, cuida do meu corpo castigado pelas ondas, principalmente após
as competições, e sabe perfeitamente como me ajudar para me restabelecer rapidamente
e me preparar para novos desafios. De verdade, gostei muito do trabalho do Eric.
Seu método é muito sutil, relaxante e intuitivo. Frequentemente os atletas procuram
massagens fortes e com pressão, e esquecem assim as energias súteis que podem nos afetar
de maneira positiva ou negativa. Eric se conecta, ele o ajuda a relaxar permitindo ao
corpo achar-se.”
Kelly Slater

“Sou Alexandre o Grande liderando seus cavaleiros na planície de Sidônia. Sou astuto
como Rommel dirigindo seus tanques para surpreender o inimigo no deserto. A força e
a glória correm nas minhas veias.
As grandes profecias ressoam no fundo da minha alma.
Sou o herdeiro de todos os antigos guerreiros e reis.
Atravessei os sombrios abismos do medo, sobrevivi aos ataques da dor e farto de
experiência, meu talento está prestes a voar sobre as falésias e derrubar as montanhas
se for.
Namoro com as belas flores do dia. Pego um punhado de areia e sinto cada grão rangen-
do no meu punho como as dunas da civilização.”
Track’s big book of surfing 70
(Wayne Rabbit Bartholomiew descrevendo seu preparo
antes de uma sessão no 2º reef de Pipeline)
Um percurso atípico

O surfe
Chegou uma hora que de tão cansado pensei:
se algum dia consigo beneficiar alguém, ficarei satisfeito.
Aconteceu.

UMA VOCAÇÃO INESPERADA

Nasci em Bordeaux. Meus primeiros anos foram tranquilos: fui para a escola
como deve ser, certo sucesso no início, pois como aluno no primário e no colégio
era muito bom, mesmo se meus professores, às vezes, me cobravam pela falta de
atenção. Tudo corria muito bem então, pelo menos na escola, pois em casa era outra
a questão. Digamos para resumir que o clima era difícil. Meus resultados acabaram
sofrendo por causa disso e se degradaram. Fui admitido no ensino médio, mas
devido a minhas notas baixas e o que vivia em casa, acabei jogando a toalha e parti
para o serviço militar com dezoito anos, na Polinésia, o que não foi desagradável,
para falar a verdade. Gostava de esporte e por lá achei para satisfazer meu gosto
pela atividade física. Praticava surfe, jogava rugby e futebol também, só que menos
frequentemente, e amava a música.
Já de volta na metrópole após o tempo no Pacífico - não sabia ainda que
retornaria em várias oportunidades para cuidar de grandes nomes do surfe e praticar
pessoalmente esse esporte que é minha paixão - precisei achar um trabalho. Nada
fácil para quem não tem diploma, porém, naquela época ainda existiam brechas
para jovens na minha situação. Hoje o quadro seria outro. Consegui uma vaga em
24 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

um ateliê de conserto de aquecimento central, cujo dono considerou que daria


conta do recado, mesmo sem conhecer o trabalho.
Infelizmente, dois anos depois sofri um grave acidente jogando rugby, esporte
que continuava praticando assiduamente: sete fraturas no pulso! Não foi mole...
É claro que meu patrão me dispensou, sendo que já não era de qualquer proveito
para ele, pois era incapaz de parafusar, desparafusar ou transportar o que fosse.
O restabelecimento foi longo e árduo, mas precisava trabalhar, imperativamente.
Comecei a procurar um emprego compatível com meu problema. Um anúncio
chamou minha atenção: uma formação de salva-vidas. A natação serviu como
reeducação, obtive o certificado de salva-vidas. Isso me permitiu trabalhar durante
quatro anos nessa profissão e socorrista nas praias do Atlântico. Comecei como
simples salva-vidas e me tornei chefe local, participava nas operações de resgate
em helicóptero. Meu contrato era de bombeiro voluntário temporário e era esse
o problema, precisava de um trabalho fixo, estável.
O destino me enviou então um primeiro sinal: um primo meu que trabalhava
com um médico muito conhecido no mundo do esporte ficou sabendo de uma
formação de osteopata em Bordeaux. Eu estava razoavelmente disponível, sendo que
só trabalhava no verão. Pensei “Por que não?” Foi assim que começou a aventura.
Lembro-me de que o primeiro curso tratava do pé. Não entendia de nada,
não tinha a menor noção de anatomia. Tive que aprender tudo, teoria e prática.
Levaram anos para conhecer as posições ósseas.
Após o primeiro estágio, vivi a primeira experiência no campo. Um amigo meu
padecia há anos devido às sequelas de uma entorse séria. Era a ocasião de colocar
em prática o que tinha aprendido. Aceitou ser minha cobaia. Apliquei então meus
novíssimos conhecimentos na matéria e mexi o pé dolorido. Ouvi um estalido
espantoso que nos deixou paralisados. Após uns instantes de estupor, meu paciente
se levantou com precaução e arriscou apoiar o pé devagar.... Milagre! Não somente o
pé tinha resistido a minha enérgica manipulação, como também seu dono não sentia
mais nenhuma dor. Senti inicialmente um alívio imenso, e logo tive a certeza de estar
no bom caminho. Acredito que devo a esse amigo o fato de ter me tornado osteopata.
Um percurso atípico | 25

Sabia o que queria fazer e tinha a intenção de achar os meios. Tinha ciência
do tempo e das dificuldades na minha frente até alcançar o objetivo. Não tinha
concluído minha formação e precisava de uma fonte de renda para viver, alimentar
a família e pagar a formação. Durante os quatro anos que duraram essa primeira
formação, arranjei todo tipo de bicos entre os períodos de curso e de estágio.
Quatro anos depois, me instalei. Sou um “nem nem”, isto é, nem médico,
nem fisioterapeuta, e sabe-se o que é começar uma carreira de osteopata como
“nem nem”, sendo que na época era a maior batalha entre médicos/osteopatas/
fisioterapeutas. Não era simples. Era recomendável não chamar muito a atenção.
Contudo, sentia-me seguro de mim mesmo e das minhas competências. Achava
que sabia tudo. Era o melhor do mundo! O número de pacientes aumentava e não
tinha dúvida da minha capacidade.
Como tinha recebido uma boa formação, quando queria saber como intervir
comparava, assim como tinham me ensinado, o lado afetado ou ferido com o
oposto supostamente sadio: se o paciente sentia dor no punho esquerdo, para
saber se existia lesão pegava o pulso direito e comparava. Procurava diferenças.
Todavia, essa técnica apresenta limites: como saber se o pulso direito é uma boa
referência? Existem tantas normalidades quanto indivíduos e numa mesma pessoa
há diferenças entre articulações teoricamente idênticas. Em função do histórico do
sujeito, pode haver deformações associadas a antigas fraturas por exemplo, mas
que nada têm a ver com uma lesão osteopática. Em poucas palavras, achava que
era muito complicado.
Um dia recebo uma ligação.
– O senhor cuida de entorses?
Mas é claro que sabia cuidar de entorses, que pergunta! Humilhante.
Contudo, quando chegou o paciente, que surpresa! A pessoa só tinha uma perna...
Horror!!! Foi muito revelador. Percebi que tudo o que tinham me ensinado não servia
de nada. Fiquei totalmente devastado pela impossibilidade de tratar esse paciente.
Tinha aprendido posições, isto é, a comparação de um osso com seu homólogo,
do lado lesado com o lado sadio... E se não houvesse lado sadio, o que fazer?
26 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Tive a impressão de que o mundo desabava em volta, todas minhas crenças


do tempo da investida na profissão tinham sido reduzidas a pó. Esse paciente
carimbava minha mediocridade e minhas carências, fiquei de um jeito que nunca
teria imaginado.
Com pesar, remeti-o a um amigo etiopata do C.E.E. de Genebra, que cuidou
dele sem demora e satisfatoriamente. Foi então que decidi empreender a segunda
formação. Tinha ouvido falar dela através do meu amigo da escola de etiopatia de
Genebra. Queria muito cursar, mas ficava reservada para fisioterapeutas e médicos.
Precisei de muito tempo para atravessar a barreira que fechava o acesso: um controle
de conhecimentos particularmente intenso. Estudei sem trégua: anatomia, fisiologia
e patologia. As condições eram extenuantes: durante o dia trabalhava dentro de
um camping, à noite cuidava da minha família, só sobravam as madrugadas para
estudar. Ficava lendo até duas horas da manhã. Fora a parte teórica, devia realizar
um estágio de uma semana em Genebra a cada cinco semanas. Não tinha opção:
todas minhas férias eram sacrificadas nesse intuito. Aquilo durou cinco longos
anos. Felizmente tinha um amigo (Didier L.) que às vezes se juntava a mim no
camping para me ajudar com uma parte das tarefas, o que me permitia dedicar
mais um tempo ao estudo.
Não nego que a teoria consumiu muito trabalho e esforço; na prática, pelo
contrário, não tinha dificuldade nenhuma: tinha a impressão de conhecê-la
intuitivamente. Não foi o que me deu mais trabalho, o que foi bom, pois para
repetir os gestos geralmente apela-se a trocas entre estudantes. Todavia, não tinha
estudantes de etiopatia em Gironde. O mais próximo morava em Charente. Essa
ausência de parceiro nunca me incomodou, sendo que dominava intuitivamente
a prática.
Assim, descobri outra forma de trabalhar, sem comparar um lado com o outro.
Apenas concluí os estudos, coincidentemente tive a sorte de trabalhar com
atletas, uma experiência que levou a uma progressão da minha prática. Enquanto
testava as técnicas adquiridas percebi, por exemplo, que palpar não oferece uma
análise aprimorada das lesões dos desportistas. Também verifiquei que as técnicas
Um percurso atípico | 27

estruturais permitem uma recuperação bem mais rápida do que as técnicas funcionais.
Pude comprovar que os “tensionamentos” costumam ser muito importantes.
Por definição o termo é totalmente inadequado, pois tensiona-se uma articulação
lesada, a qual perdeu sua mobilidade. É evidente que na hora de tensionar uma
articulação com pouca mobilidade ou nenhuma, provocaremos rapidamente um
impacto nela e assim teremos um bloco uniforme. Pelo contrário, mediante um
thrust, provocarei um movimento acima e (ou) embaixo da lesão, sem ser no centro
dela. É necessário que o escasso jogo disponível no centro da estrutura sirva para
pressionar o tecido local lesado, com perda de elasticidade. Tomei conhecimento
das noções de energia cinética, massa e velocidade. Tirei as seguintes conclusões:
não se trata um atleta da mesma forma que se trata um paciente comum, também
existem geralmente enormes diferenças físicas, fisiológicas e psicológicas, conforme
atuem nacionalmente ou internacionalmente. Por tal motivo devem ser tratados
concomitantemente por um trio complementar formado por um médico, um
fisioterapeuta e um osteopata, trabalhando em sinergia. Em 1997, o destino me
enviou mais um sinal na pessoa do australiano Wayne Bartholomew, o Pelé do surfe,
várias vezes campeão do mundo. Eu tinha oferecido meus serviços no tour pró
de surfe que acontecia em Lacanau. Mesmo tendo vários quiropratas à disposição,
os organizadores me aceitaram. Tive a sorte de bater de cara com Bartholomew.
Sem vacilar lhe ofereci meus serviços e contra toda expectativa - eu sabia da minha
ousadia e tinha certeza de que recusaria - me deu uma oportunidade no dia seguinte.
– Aí você me mostra o que sabe fazer, ele me disse, em inglês, claro.
Virei a noite sem dormir de tanta ansiedade, sabendo que teria que mostrar
todos meus conhecimentos recentemente adquiridos a esse monstro sagrado que
já tinha passado pelas mãos de pessoas bem mais experientes do que eu ao longo
de sua extensa carreira (ele tinha quarenta e três anos na época). Chegou pontual
na consulta. Dei início ao trabalho. Fiquei suando frio, só de encostar nele. Quando
a sessão encerrou, em lugar de se levantar permaneceu um instante na mesa,
pensativo. O que iria me dizer? Fiquei tremendo de medo. Após um tempo que
pareceu interminável, se pronunciou, sempre em inglês, lógico:
28 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

– Quero que você faça parte do tour profissional de surfe o quanto antes....
Fiquei pasmo, pasmo para valer. Persuadido de ter entendido errado, fui procurar
um amigo que falava inglês melhor do que eu. Era isso mesmo, não tinha me
enganado: confirmou a proposta.
Dois meses depois me achava no Havaí e as competições começaram a
suceder-se na Europa e na Polinésia. A grande aventura só estava começando.
Alguns meses depois, em setembro de 1999, recebi uma ligação de um jogador de
futebol internacional, de Bordeaux:
– Estou ligando para você porque sofro demais do joelho. Um membro da
família que você tratou com êxito me deu seu número.
Dois dias depois encontrei com ele. Fiquei muito impressionado pela sua
qualidade mediática. Contudo, minha satisfação pelo fato de ter sido convocado
por esse craque do futebol durou pouco, quando descobri três ou quatro dias
depois no jornal do Sul Oeste que o jogador tinha sido operado, afinal de contas.
Foi um balde de água fria. Passei uma semana abominável e então, mega surpresa!
Uma semana depois, o telefone toca. Reconheço imediatamente a voz do meu
paciente. Engasguei.
– Acabei de perceber que você deve ter ficado muito desapontado quando soube
que tinha sido operado. Queria te tranquilizar: a intervenção não teve nada a ver
com o problema do joelho pelo qual te consultei. Por sinal, a sessão me ajudou
muito e gostaria de te apresentar à equipe médica e técnica dos Girondins.
Respirei aliviado.
– Ainda bem. Você não imagina tudo o que passou pela minha mente...
Talvez você fique surpreso pelo trato familiar com tal celebridade do esporte
que tinha acabado de conhecer. Era tão espontâneo quanto a minha prática: esses
jogadores faziam parte do meu cotidiano desde a Copa do Mundo, durante a qual
tinham sido onipresentes nas telas, a tal ponto que só podia me dirigir a eles como
se fossem amigos ou membros da família.
A proposta foi confirmada pouco tempo depois, fui oficialmente contratado
para acompanhar o time de primeira divisão dos Girondins. E como o sucesso
Um percurso atípico | 29

chama o sucesso, em julho/agosto desse mesmo ano de 1998, fui procurado quase
simultaneamente por outro famoso jogador francês de futebol, que atuava então no
Bayern de Munique e queria que o tratasse. Tudo aconteceu muito rápido: ele me
pediu que fosse uma vez por mês a Munique para tratá-lo, e isto sem eu ter sequer
o diploma, que só obtive em 1999. Afortunadamente, como estava concluindo o
curso devia passar menos tempo estudando e conseguia gerir minha agenda bem
preenchida e na qual pesavam os deslocamentos.
Aos poucos ia conhecendo cada vez mais desportistas de todas as áreas: aos
surfistas, jogadores de rugby e futebol se juntavam os boxeadores, dançarinos,
tenistas.... As recomendações funcionavam bem e era melhor assim, pois não
podíamos fazer publicidade, além do mais a especialidade ainda não era muito
conhecida.
Apesar do sucesso crescente, não deixei de ser prudente e fiquei com o emprego
de dia no camping até 2000, porém reservando o horário da noite para as consultas
no meu consultório, agora oficial.
Todavia, estava cedo para cantar vitória. Nunca tinha sido respaldado
verdadeiramente no meu roteiro, se não fosse pelos encontros acontecidos e pela
mãe dos meus filhos, que acreditou em mim e me ajudou muito cuidando das
crianças para que pudesse efetuar a formação.
A especialidade não era conhecida e alguns a reputavam como seita até, o que
posso entender, porém era totalmente falso. É humano duvidar daquilo que a gente
desconhece. No meu entorno muitos acreditavam que estava sendo manipulado
(o cúmulo, pois como osteopata, o manipulador era eu!) Assim sendo, quis aprender
mais e efetuei outras formações para tentar entender o que passava pela mente das
pessoas, de forma que pudesse oferecer respostas. Fui atrás de abundante literatura,
descobri a radiestesia, a bioenergética, as vibrações, os corpos sutis, coisas que
naquela época para mim eram charlatanismo, até bruxaria. Eu queria “saber” a
qualquer custo, porque temia errar quando ouvia o que me diziam.
Minha vida mudou no dia que pratiquei radiestesia médica, mas reconheço
que não é minha praia. Acho muito subjetivo, é um domínio onde errar é fácil
30 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

demais. Quando a gente utiliza uma ferramenta para experimentar microvibrações à


distância, é muito fácil influenciar essa ferramenta. Pessoalmente, gosto de precisão
e a radiestesia não me permitia ser categórico em relação ao que percebia. Sobravam
incertezas. Portanto não ficava tranquilo, pois temia estar no erro. Contudo adorei
a experiência: foi reveladora, abriu meu coração e meu espírito.
Convencido por essa descoberta, por ter experimentado todas essas sensações,
pensei que devia ser possível sentir aquelas vibrações todas sem a ajuda dos
instrumentos utilizados na radiestesia. Prefiro a percepção corporal direta antes
do que passar por uma ferramenta que pode dar um viés com facilidade. Isso não
me impede aceitar as diferenças, até quando não são objetivas. Sempre carrego essa
dualidade: não recuso o esoterismo, porém conservo no fundo meu ceticismo, até
surgir a prova. Afinal, não está inscrito na genética e na história da humanidade? Por
acaso não pensaram e ensinaram durante séculos que a Terra era plana, até o dia
em que foi provado que era uma esfera? Existem coisas que desconhecemos hoje,
porque os meios de pesquisa não são suficientes. O que é considerado esotérico hoje,
amanhã pode não sê-lo mais. Conservo, portanto meu espírito cartesiano, porém
aberto, querendo navegar, mas com uma base sólida, para aceitar as diferenças de
outrem. É a minha âncora.
2001, nova etapa. Propõem-me ensinar na escola em Genebra, a mesma onde
me custou tanto ingressar e onde sofri tanto.
Sentia-me muito dividido. Certamente a proposta era gratificante e valiosa para
mim, era o reconhecimento das minhas competências, todavia, conservava muitas
lembranças bem dolorosas. Lembrava que ia sempre com medo, angústia, vontade
de vomitar. Retornar a essa escola equivalia a voltar para um lugar do qual não
tinha apenas lembranças boas. Vai ou racha, esse era o lema do estabelecimento.
Só esperavam de mim uma coisa: “que errasse para me darem o fora”. Na minha
promoção começamos treze, apenas dois concluíram.
Contudo, aceitei a proposta. Tinha que admitir que como professor me tornaria
uma referência. Como não suporto ser medíocre, coloquei em questão tudo em
mim. Lembrei-me do que o pai de uma das minhas melhores amigas de infância
Um percurso atípico | 31

tinha me dito um dia que me viu desenhando. Eu tinha por costume fazer tudo
rápido, o mais rápido possível.
– Toma teu tempo: quando se faz alguma coisa, não é proibido fazê-la bem....
É engraçado como algumas frases voltam com toda força, inclusive muitos
anos depois. Era uma pessoa extremamente brilhante e que me impressionava
demais por isso. Contava muito para mim. No dia que falou aquilo, entendi outra
coisa. Quando estou fazendo reparos, penso frequentemente nele, e pensei de
novo quando decidi aceitar a proposta da escola. Talvez seja isso a imortalidade....
Eu me tornaria docente, porém um docente digno dessa apelação. E assim sendo,
recomecei os estudos.
Ia para Genebra dois ou três dias no mês. Já não ia com medo. Conheci pessoas
extraordinárias. Passei do outro lado da barreira. Desde então recebi outras propostas
de várias escolas francesas e estrangeiras, até o dia em que cansei de ver estruturas
privadas lucrando com a experiência que tinha adquirido através do tratamento de
atletas. Falei: “Acabou!” Decidi ir além na reflexão, otimizando o que fazia para
venda. Percebi que dispunha de algo novo para oferecer, conhecimentos e uma
prática que não dominava ainda completamente, mas que podia aperfeiçoar. Criei
então meu próprio organismo de formação com uma secretária que tinha conhecido
nos estágios. Durante dois anos trabalhei muito com ela e um sócio para criar os
suportes de aula de uma formação específica Esporte-Osteo.
Em pouquíssimo tempo tinha uma carteira de pacientes fisioterapeutas,
osteopatas e outros não especialistas, que queriam aprender as bases da terapia
manual para trabalhar com esportistas. Foram dois anos de trabalho árduo com
meu sócio e minha secretária para criar o material do curso: era necessário tirar
fotos, efetuar pesquisas. Não imaginei que seria tão difícil. Acontecia, às vezes,
que só concluíamos o material dois ou três dias antes do início do estágio, o que
era muito estressante.
Hoje, o que me outorga mais satisfação é ajudar as pessoas, não tratá-las, pois
tratar é subjetivo. Ensinar é agradável também. Não é motivo de orgulho, de forma
alguma, apenas sou feliz compartilhando técnicas que permitem aliviar as pessoas.
32 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

EVOLUÇÃO DA MINHA TÉCNICA DE MANIPULAÇÃO

Até 1999, tinha pouca noção de peso e velocidade. Quando se fala em peso
entende-se o peso do corpo do terapeuta. Inicialmente manobrava com macas
bastante altas, assim como tinham me ensinado, até o dia que precisei tratar
dançarinos do Grande Teatro de Bordeaux. Como são pessoas hiperflexíveis,
percebi que as manobras que tinha aprendido eram impraticáveis neles.
Na escola você aprende que na hora de manipular duas peças ósseas, antes
de aplicar energia na peça a manipular, é necessário reduzir o jogo articular ou a
barreira motriz. Porém, reduzir o jogo em pessoas hiperflexíveis era impossível.
Quando aplicava a técnica lumbaroll na L3, por exemplo, com o paciente deitado
sobre o lado direito, na parte alta o ombro esquerdo que empurrava encostava na
maca e, na parte baixa, o joelho esquerdo também encostava. Impossível atingir
a famosa barreira motriz, exceto compensando mediante uso de força, o que é
incompatível com a osteopatia.
Para mim é inaceitável mexer nos pacientes com uso de força. Tentei, portanto,
compensar mediante o uso de velocidade. Pude observar que ao aplicar peso, as
pessoas se levantavam fazendo caretas e massageando as lombares; porém, aplicando
velocidade, o resultado era melhor e menos agressivo. Mais à frente descobri que
os dançarinos sofriam bastante menos efeitos indesejáveis e curvaturas induzidas
pela manipulação, em comparação com outros desportistas que tratava aplicando
as técnicas antigas. Foi a terceira etapa.
Na época também trabalhava com jogadores de futebol, de rugby e alguns
surfistas, pessoas bem menos flexíveis e que, portanto, sentiam menos a diferença
na manipulação. Isso mudou progressivamente há uns quinze anos: alongam muito
mais e caminham para a hiper flexibilidade também. Afinal, simplesmente apliquei
a famosa equação Ec =1/2 mv2, ou seja, a energia cinética é igual à metade do
produto da massa pela velocidade elevada ao quadrado. Foi uma revelação. Dessa
hora em diante considerei que devia adaptar todas minhas técnicas privilegiando
a velocidade por sobre a massa.
Um percurso atípico | 33

Para se obter uma modificação tissular local, não é o movimento gerado pelo
osso, mas a energia conservada no seio da articulação, ou seja, do tecido conjuntivo,
que vai modificar a densidade tissular. Deve se entender por densidade tissular
a capacidade de deformação do tecido conjuntivo. Em caso de lesão osteopática
(também designada como lesão tissular reversível), o líquido intersticial do tecido
conjuntivo, que no tecido sadio se acha em forma livre, se torna localmente viscoso.
A partir daí, modifiquei meus gestos e senti a necessidade de entender por
que uma manobra era eficiente ou não, por que alguns pacientes padeciam efeitos
colaterais e outros não. Tive a possibilidade de conhecer um médico que me abriu
as portas das salas de dissecção. Aquilo não foi fácil, sendo que não pertencia à
categoria, mas finalmente pude observar o que manipulava: os planos articulares
e de deslizamento, no seio dos tecidos. Isso me permitiu comprovar que faltava
precisão no que tinham me ensinado nas formações prévias: os planos articulares
não se situavam perfeitamente.
Primeiro, que devemos entender por normalidade? Só se é “normal” em relação
à própria pessoa. Uma articulação é normal ou anômala em relação a ela mesma.
Existem tantas diferenças entre os indivíduos! Por isso não é possível tratar todos
os pacientes da mesma forma: o que serve para um pode não servir para outro.
A palpação é o único meio eficaz para determinar se existe uma lesão. Permite
“sentir” os limites objetivos dos planos de deslizamento, a qualidade do tecido
conjuntivo, a mobilidade do fluído intersticial… A articulação dói, mas se mexe?
Dói e está bloqueada? São situações bem diferentes.
Finalmente, mesmo quando conhecemos bem a técnica teórica, o sucesso não
está garantido. Fazer estralar uma cervical é teoricamente muito simples. Trata-se de
um gesto de alta tecnicidade e não há margem para o erro, principalmente quando
o paciente é um atleta, pois percebe instantaneamente o alívio.
34 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL
visão osteopática da lesão

A LESÃO NO PACIENTE CONVENCIONAL

A disfunção é a espada de Dâmocles do desportista. Ela faz parte do seu


cotidiano.
Antes de focar nas diferentes técnicas de tratamento dos ferimentos, considero
indispensável analisar sua natureza e o contexto no qual surgem, especificamente
em atletas. Iremos ver juntos, segundo diferentes casos concretos, que não é
possível limitar-se a um diagnóstico, o qual é apenas uma constatação, mas que
é necessário apelar a uma anamnese detalhada para tratar eficientemente e de
maneira duradoura as causas de um ferimento, pois existem ferimentos onde a
palpação revela eficientemente uma disfunção, porém tem outros onde a palpação é
insuficiente: nesse caso, a anamnese1 e a experiência do terapeuta poderão orientá-lo
para detectar a lesão osteopática.
Vou citar o exemplo de um sujeito de uns quarenta anos de idade, desportista,
sem ser atleta, que me consultou devido a uma dor recorrente no joelho. Seis meses
antes da consulta tinha participado da maratona de Médoc e, segundo ele, as dores
tinham começado uma semana após a prova. É claro que ele achava que a origem
do problema estava lá e a causa teria sido falta de treinamento antes da maratona.
O paciente já tinha consultado, porém no exame médico nenhuma anomalia
concreta tinha sido detectada, exceto um problema de postura. Após algumas

1
A anamnese, do grego “lembrança”, é a história antecedente. Em medicina, a anamnese, sinônimo de
história da doença, retrata os antecedentes médicos e o histórico da queixa presente do paciente, junto com
os resultados de diversas análises efetuadas previamente e os tratamentos aplicados.
36 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

sessões de fisioterapia e um tratamento anti-inflamatório, sentia as mesmas


dores.
Quando o indaguei sobre a localização precisa da dor, respondeu: “Por aí…”,
designando uma área bem difusa. Na palpação, não achei nada concreto. O paciente
me explicou que a dor era particularmente intensa em repouso, portanto à noite,
evidentemente, ou quando estava sentado, e passava com o movimento, com
episódios dolorosos na hora de relaxar. Chegou ao ponto que precisava se levantar
a cada duas horas para caminhar até a dor passar. Quando dirigia o carro durante
longos trajetos, devia parar a cada meia hora praticamente.
Em osteopatia, sabe-se que uma dor localizada em um ponto específico não
é necessariamente a consequência de uma lesão nesse local preciso. A lesão ou
anomalia podem estar distantes. No caso desse paciente, os sintomas que me
descrevia evocaram imediatamente uma congestão da pequena pelve. O fato de
que a posição vertical e o movimento aliviavam a dor confirmavam a hipótese.
Ao acaso, perguntei:
– Você tem problemas urinários?
O paciente refletiu alguns instantes.
– Sim e não. É verdade que me levanto pelo menos duas vezes durante a noite
para urinar. Meu irmão que é médico e a quem falei do assunto me disse que
deveria consultar, pois era totalmente incomum na minha idade.
Pareceu-me plausível que a dor no joelho não fosse o elemento principal, mas
a consequência de uma má vascularização do membro inferior, por conta de uma
congestão da pequena bacia.
Em lugar de propor ao paciente um trabalho no joelho, propus uma palpação
e manipulação interna da pequena bacia. Este é o exemplo típico do que expliquei
no início do capítulo: no caso deste paciente, não é a palpação que permitirá
determinar a causa real do transtorno, é o histórico do paciente e a experiência
do terapeuta que permitirão achar os sinais de aviso de uma perturbação mecânica
ou neurovascular podendo conduzir à lesão. No presente caso pude achar sinais
objetivos, mas nem sempre é assim, e o terapeuta deverá então apelar ao que
visão osteopática da lesão | 37

chamo de “palpite” para achar seu caminho: irá perceber que as circunstâncias
de surgimento da dor conforme seu ponto de vista são incoerentes, enquanto do
ponto de vista do paciente a dor é bem real.
Quais os riscos e as consequências para o paciente caso nada seja feito? Como
sofre essencialmente em repouso, sem dúvida continuará correndo e sentindo
uma dor leve, talvez consultará um fisioterapeuta que o aliviará um pouco após
uma dezena de sessões. Nesse caso, podemos até nos perguntarmos se a melhora
dever-se-á à intervenção do fisioterapeuta ou a uma simples questão de tempo.
No longo prazo, o transtorno poderá levar a um problema real de postura
e, na primeira falta de atenção, poderá atingir um ligamento no local da dor,
provocando uma tendinite, ou um músculo, provocando um rompimento. Assim
sendo, com o tempo, tal congestão da pequena bacia, indolor e, portanto não
evidente a priori, poderá conduzir a uma lesão osteopática. Para efeitos de
otimizar o restabelecimento do paciente e não deixar esse tipo de lesão passar
despercebida, claramente também será necessário analisar o joelho para verificar
se não existe uma lesão osteopática resultante de um trabalho fora do eixo
devido à dor. Afinal foram as más variáveis de regulação visceral que criaram
o problema do joelho! Se formos compará-lo com um problema mecânico,
diríamos que o motor aqueceu por conta de um sistema de resfriamento com
defeito.
O leque de causas (chamo de “plots”) por trás de uma lesão constituem uma
legião: podem ser mecânicas, emotivas, psicológicas, neurológicas, vasculares,
energéticas, e podem inclusive estar ligadas ao entorno ou aos costumes do paciente.
Além disso, segundo os indivíduos, o limiar da dor muda em função da experiência
de vida, da idade, do estado de saúde geral. O limiar pode ser ultrapassado se
um plot chega à saturação. A saturação pode inclusive depender de vários plots
diferentes, se cada um estiver mais ou menos saturado segundo a experiência de
vida do paciente. Nesse caso acontece então um fenômeno de acúmulo. Se a pessoa
estiver cansada, com um entorno momentaneamente desfavorável e hábitos de vida
que não forem dos melhores, o menor inconveniente pode revelar um problema
38 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

nas costas, enquanto nada aconteceria se a mesma pessoa estivesse passando por
um período favorável.
Falei previamente do paciente que reclamava de dor no joelho associada a um
problema de congestão da pequena pelve. Tive outro paciente que apresentava o
mesmo tipo de dor, muito intensa, porém sem elemento disparador. A palpação
revelou alguns problemas mecânicos locais menores, que não poderiam justificar
a intensidade da dor. Pequena causa, grande dor: era totalmente incoerente. Em
compensação, o paciente sinalizou durante a consulta que tinha acabado de se separar
do parceiro. Na verdade, a causa essencial radicava nessa importante perturbação
emotiva, que se expressava através de uma dor insuportável no joelho.
Vimos assim dois casos aparentemente idênticos, porém apenas em aparência: a
expressão pode ter sido a mesma, todavia, as causas foram radicalmente diferentes.
O sucesso de um tratamento fica estreitamente atrelado à rapidez de sua
aplicação. Enquanto o paciente tem boa saúde, os sinais de disfunção podem ser
triviais e uma pequena lesão osteopática pode passar despercebida2.
Isso é particularmente verdadeiro no caso das pessoas sedentárias. Porém, o
atleta acha a menor lesão insuportável, pois conhece perfeitamente seu corpo e
percebe imediatamente qualquer anomalia, a qual irá reduzir logo o desempenho
do membro ou articulação atingidos. Por tal motivo, na minha opinião, a osteopatia
é indispensável para o atleta. Costumo dizer que é a mesma coisa que consertar
um carro sem recorrer a um mecânico. Imagine um motor que esteja funcionando
sem óleo: com pouco tempo irá bater, porém um mecânico competente pode
detectar o problema pelo ouvido antes que se torne irreparável. Assim acontece
com o trabalho do osteopata: ele detecta a lesão antes que se manifeste através de
sinais objetivos.
Uma lesão osteopática será inevitavelmente irreversível? É difícil prevê-lo,
todavia, é provável. Eu penso que sim. Quando um paciente reclama de uma dor
que evoca um rompimento muscular, procuro uma lesão que coincida - sendo perto

2
Lembrete: a lesão osteopática é espontaneamente silenciosa.
visão osteopática da lesão | 39

ou longe - com o local e que possa explicar a dor, e talvez a encontre, pois quando
se tem certeza de achar uma lesão, as chances de achar são grandes. Contudo, jamais
poderei saber se tal lesão tem relação com o sintoma. Vi casos de pacientes que
apresentavam uma ciatalgia e queixavam-se concomitantemente de uma dor no
pé, sem que ambos estivessem ligados.
Após o tratamento osteopático, normalmente o paciente irá se sentir melhor
e se restabelecer, mas serei eu o responsável disso indiscutivelmente? Não tem
como saber. Ainda não existe uma ferramenta de pesquisa que permita medi-lo,
permanecemos no campo empírico.

Estes exemplos deveriam nos ajudar a compreender melhor o tratamento dos atletas.
40 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

AS MUDANÇAS DA VIDA DE UM JOVEM PREDISPOSTO


A SE TORNAR ATLETA

Que jovem desportista nunca pensou em se tornar atleta? Como não ficar
admirado perante a imagem desses homens fora do comum que aparecem na mídia:
Zinedine Zidane, Serge Blanco, David Douillet, Kelly Slater, e atualmente Teddy
Riner, Johnny Wilkinson e outros tantos…
Muitos são os que sonham com sucesso, medalhas, glória e… dinheiro. Contudo,
pouquíssimos terão direito às honrarias e louvores.
Os atletas profissionais costumam ser pagos por clubes, marcas de roupas,
calçados e acessórios diversos. É o que a gente vê na televisão e na Internet: belos
carros, belas mulheres, mansões, tudo aquilo que faz sonhar o público ávido de
sucesso. Mas qual o preço disso tudo?
O lado B costuma ser sombrio e penoso. Para tentar se tornar atleta, é necessário
começar bem jovem, entre onze e treze anos, e aceitar viver uma adolescência difícil.
Os jovens desportistas geralmente perdem o entorno familiar e ficam totalmente
isolados na paixão deles. Seu treinamento é uma sequência de sacrifícios: zero
saídas, zero tolerância alimentar, zero almoços em família, zero chance de curtir um
McDonald’s, o que constitui a Meca da gastronomia para os adolescentes,
geralmente.
No programa: treinamentos cotidianos longos, difíceis, cansativos, sofridos
para o corpo e o ânimo. Nesses períodos a dúvida toma posse, claro, e o apoio
familiar faz falta.
A perseverança, a obstinação, a abnegação, a dor, fazem parte do cotidiano,
pois só depois de muitos anos os esforços começam a render frutos.
O desempenho é o resultado de vários fatores, principalmente genéticos, mas
também psicológicos, fisiológicos e técnico-táticos.
Nem todos se tornam atletas destacados. As qualidades individuais são testadas
e somente os mais fortes, fisicamente, tecnicamente e mentalmente, têm futuro
no esporte.
visão osteopática da lesão | 41

É o preço que pagam os profissionais novatos, à mercê de lesões toda


hora, principalmente nos períodos de estresse onde podem surgir conflitos de
relacionamento com os diversos indivíduos que os enquadram e que os obrigam
a ultrapassar seus limites incessantemente, impondo opiniões e objetivos que tais
profissionais não entendem ou compartilham.
Sem margem para relaxar: os finais de semana costumam ser dedicados às
competições e estágios, o que inclui as horas sacrificadas nos transportes e as noites
de sono ruim em hotéis baratos.
Todavia, por esse preço dispõem dos conselhos, ou melhor, das consignas de
expert que avaliam todas suas necessidades, quer sejam sociais, emocionais ou
físicas. Nesse painel de experts, a função do coach é primordial: na dupla formada
com o jogador é imperativo que a confiança mútua seja perfeita.
Vale lembrar, que a carreira de um desportista é curta. As lesões ficam à espreita
o tempo todo e podem encerrar a carreira de forma brutal.
42 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

PREVENÇÃO E SUPORTE DO JOVEM DESPORTISTA

Em caso de acidente, a equipe médica deve dar apoio ao desportista lesionado


imediatamente, no plano médico e psicológico, porém esse suporte difere conforme
se trate de um jovem ou de um adulto.
Segundo a importância e a magnitude da lesão, junto com a fase na qual
acontece (em período de seleção? de transferência?), pode existir nos jovens
em centros de formação a vontade de dissimular a lesão, o que os expõe em
primeira instância a um agravamento da condição, podendo levar a um risco de
incapacidade definitiva.
Para evitar isso, alguns clubes têm implementado uma bateria de recursos
instrumentados por uma equipe médica formada, supervisionada por um médico.
A função do mesmo é primordial: o médico deve garantir que a prática seja
«agradável » para a criança e promova o desenvolvimento do jovem desportista.
Quais são esses recursos?
• um exame clínico no início da temporada, reiterado durante o ano:
balanço clínico com medições antropométricas, exame cardiovascular;
• um exame articular com teste de resistência, teste proprioceptivo,
teste de campo (preparo físico) e teste de flexibilidade. Desses testes
decorrerá o trabalho preventivo;
• balanços biológicos, sanguíneos e urinários;
• um balanço radiográfico orientado;
• um balanço psicológico e um acompanhamento se for necessário;
• um acompanhamento terapêutico pela equipe médica e a equipe
técnica, se for necessário;
• o desenvolvimento das capacidades psicológicas: motivação, auto-
confiança, domínio das emoções e concentração;
• a implementação de técnicas cognitivas e comportamentais…
Esses são apenas alguns elementos, dentre outros. A lista não é exaustiva e
pode ser ampliada em função das expectativas dos clubes.
visão osteopática da lesão | 43

É bom notar que o entorno próximo do jovem desportista pode também ter
efeitos nefastos sobre seu estado mental e expô-lo a um desempenho fraco, a lesão
e inclusive ao desgosto puro e simples pelo esporte.
Todos os pais de crianças desportistas já ouviram outros pais berrando para
os filhos: “Vai! Para cima dele! Machuca ele!...” e por aí vai.
Nos vestiários, os conceitos dos treinadores e educadores podem levar a
criança a se ultrapassar além da conta. Ao colocá-la em xeque na frente dos
outros, sem medir sua moral, podem obrigá-la a agir para salvar o time (o que
não deixa de ser legítimo no esporte, evidentemente), até mesmo quando a
criança não está em condições de agir... (ROTELLA e HEYMAN, 1986).
De fato a quantidade e frequência dos treinamentos e jogos expõem os
jovens desportistas a riscos de lesão devido ao crescimento (discordância
entre o crescimento ósseo e o crescimento dos tecidos moles), treinamento
excessivo ou “síndrome de esgotamento”. Tais lesões são comuns nos centros
de formação esportiva.
44 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

AS REAÇÕES PSICOLÓGICAS PERANTE OS


FERIMENTOS NO ESPORTE

Quando o organismo é submetido a um traumatismo importante, o indivíduo


passa necessariamente por várias etapas que são as mesmas do processo de luto.
Na hora do acidente, primeiro é a dor que domina, logo o desportista assume sua
situação e o que o destino lhe reserva. Isso irá provocar uma profunda ansiedade,
daí a necessidade, sem dúvida para mitigar essa angústia, de minimizar a lesão e
suas consequências.
Em segundo lugar surge a raiva, raiva do adversário tido eventualmente por
responsável do incidente, e então o ferido passa a se culpar pelo acontecido. Terá ao
mesmo tempo ódio de si e do mundo inteiro. Não acreditará no ocorrido e recusará
o diagnóstico do médico. É nesse ponto que muitos desportistas ficam vulneráveis,
pois sucumbem à tentação de consultar a primeira pessoa que prometerá tirá-los
o mais rápido possível do impasse e ajudá-los a voltar a seu melhor nível. Alguns
terapeutas ávidos de glória e de clientes, se aproveitam, às vezes, para oferecer aos
coitados curas milagrosas que impactarão na saúde por não respeitarem os períodos
de recuperação fisiológica indispensáveis e cuja duração não pode ser abreviada.
Em terceiro lugar, o lesionado questiona toda sua prática e seu modo de vida:
decide mentalmente melhorar seus treinos, fazer academia, adotar um regime,
melhores costumes…
Quando finalmente profissionais dignos de serem chamados assim estabelecem
o diagnóstico, avaliam o estado do desportista, a gravidade da lesão e suas eventuais
consequências, a depressão fica na espreita caso haja probabilidade de lesão
irreversível podendo comprometer a carreira do indivíduo.
A aceitação é a última etapa desse doloroso roteiro. Mesmo sendo geralmente
muito difícil, principalmente para os apaixonados, os guerreiros, essa fase é
indispensável para que a esperança retorne e o desportista comece a se recuperar.
Tudo isso na teoria, logicamente. Na realidade, esse roteiro não é tão linear.
No estágio da aceitação inclusive, o desportista conhecerá longos e difíceis períodos
visão osteopática da lesão | 45

de dúvida, nos quais uma ajuda psicológica será imprescindível para acelerar a
recuperação.
Finalmente, não devemos esquecer que o ferimento pode levar a outra
consequência psicológica, ao lançar certas pessoas dentro de um círculo viciado
de queda de motivação, perda de autoconfiança, o que levará por sua vez a uma
queda do desempenho, certamente inaceitável. É chegada a hora do balanço geral, o
destino torna-se repentinamente incerto. Fica difícil sair dessa engrenagem infernal,
daí a necessidade de treinar a parte mental e não somente a física.

Treinar a mente para reagir melhor perante o estresse da lesão.

Um atleta deve possuir uma mente altamente treinada. A parte mental é trabalhada
como um músculo, deve ser mantida e treinada, permitindo assim dissipar o medo
e as dúvidas, expulsar tudo o que for negativo e focar nos objetivos definidos.
Algumas técnicas comportamentais e cognitivas, como a sofrologia, a ioga, a
respiração e outras, podem ajudar o indivíduo a reforçar sua mente de forma que
adquira uma convicção e vontade quase impermeáveis às emoções, pelo menos na
prática esportiva. Aumentar o poder de concentração equivale a reforçar a mente.
Assim fazendo, o desportista estará em condições de limitar os ferimentos e
colocar todas as chances do seu lado para projetar uma longa carreira.

A lesão é uma expressão do corpo, uma mensagem que convém escutar, decodificar e entender.
46 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL
Percepção, palpação e manipulação

Palpar um tecido é a melhor forma de entender a lesão tissular reversível

UMA PERCEPÇÃO PARTICULAR, A PROPRIOCEPÇÃO

Antes de começar, gostaria de especificar que as reflexões a seguir são o fruto


do trabalho realizado junto com Edouard Toto, um ex-aluno com um dom especial,
cuja história pessoal barrou seu caminho, infelizmente.
Questões importantes, para começar: não se palpa? todo mundo da mesma
forma, em função da idade, do gênero e do estado de saúde. Assim, palpar não se
limita meramente a encostar a ponta dos dedos: trata-se de captar o corpo na sua
totalidade, mediante todos os sentidos que a natureza nos oferece, sem esquecer do
sexto sentido. Isto se aplica concretamente no caso de um atleta, mas voltaremos
para o assunto dessa palpação específica mais na frente. Primeiramente analisaremos
o funcionamento da percepção, mecanismo complexo que devemos conhecer bem
pois apresenta algumas armadilhas.
Para que haja percepção, deve existir um receptor. O organismo humano dispõe
de vários tipos deles, independentemente dos que pertencem aos cinco sentidos que
todos conhecem: a visão, a audição, o gosto, o olfato e o tato. Adiante trataremos
das percepções próprias desses cinco sentidos, seu funcionamento e a forma de
captá-las e analisá-las. Antes disso, gostaria de focar em receptores menos conhecidos
geralmente, porém capitais em matéria de osteopatia: os proprioceptores3.

3
A propriocepção designa o conjunto de receptores, vias e centros nervosos involucrados na somestesia
(sensibilidade profunda).
48 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Os proprioceptores são receptores sensíveis a estímulos provocados por


movimentos. Eles transmitem informações sobre a posição relativa das partes
do corpo entre si, e sobre a posição do corpo no espaço. Os proprioceptores se
encontram nos músculos, tendões, articulações, no labirinto do ouvido interno
e em alguns casos na pele. A somestesia reúne as sensações procedentes desses
diferentes receptores: inclui assim as sensações cutâneas táteis (o tato, a pressão,
as vibrações), térmicas, nociceptivas (ou dolorosas) e proprioceptivas (musculares,
articulares, tendinosas e vestibulares).
Cada um desses receptores reage a um estímulo específico (fótons, vibrações,
pressão, temperatura, compostos químicos…), produzindo potenciais geradores
sob forma de influxos nervosos, e transmitindo-os a uma parte precisa do
encéfalo.
Podem ser agrupados como mecanorreceptores que captam o movimento:
• a pele, sensível à pressão,
• os músculos, os tendões e as articulações, sensíveis ao alongamento e
aos movimentos;
• o labirinto do ouvido interno, que oferece indicações sobre a posição;
• e o ouvido, que reage às vibrações.
Mas existem também termorreceptores sensíveis à temperatura, nociceptores
que reagem às dores de todo tipo, quimiorreceptores (localizados no nariz e na
boca) que reagem aos compostos químicos, e finalmente os fotorreceptores, no
olho, que reagem aos fótons.
A qualidade sensorial depende do tipo de receptor estimulado. A percepção dos
pequenos detalhes depende do número de fibras nervosas sensitivas por unidade
de superfície. As áreas da pele que têm uma densidade de fibras elevada, como a
polpa dos dedos, permitem uma melhor detecção das características de tamanho,
detalhes, amplitude e localização do estímulo.
Percepção, palpação e manipulação | 49

Neurorreceptores do tecido conjuntivo periarticular

Fibras nervosas Localização Tipo de estímulo Informações


associadas fornecidas
pressão e
Corpúsculos de fibras mielínicas cápsulas, frequência dos
vibrações de forte
Vater Paccini de grosso calibre ligamentos, pele estímulos
intensidade
tecido conjuntivo pressão e
Corpúsculos de fibras mielínicas frequência dos
periarticular, vibrações de forte
Golgi Mazzoni de grosso calibre estímulos
tendões intensidade
pressão e
Corpúsculos de fibras mielínicas membrana frequência dos
vibrações de forte
Krause de grosso calibre sinovial estímulos
intensidade
tração e
cápsulas, amplitude e
fibras mielínicas deformação com
Órgãos de Ruffini ligamentos, velocidade dos
de médio calibre amplitude de 15°
periósteo movimentos, dor
a 30°
tração e
fibras mielínicas deformação posição e direção
Órgãos de Golgi ligamentos
de grosso calibre com amplitude dos movimentos
superior a 30°
cápsulas, tecido
fibras amielínicas
conjuntivo estímulos
Expansões libres e mielínicas de dor
sinovial mole, dolorosos
pequeno calibre
pericartilagem
50 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

NOSSOS CINCO SENTIDOS: FUNCIONAMENTO E


ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES FORNECIDAS PELOS
CAPTORES

1. Mecanismo geral da percepção

Todo conhecimento do meio externo ou interno procede da interpretação das


mensagens dos diversos receptores sensoriais distribuídos pelo corpo humano.
As percepções são elaboradas a partir dos dados sensoriais.
Como na maioria dos domínios, nossos desempenhos perceptivos melhoram
com o treinamento. Então é possível detectar a presença de indícios visuais
aparentemente invisíveis, ou discriminar segmentos praticamente idênticos, perceber
sons de intensidade muito baixa, e distinguir mediante o tato elementos cada vez
menores.
Um cego consegue discriminar minúsculos relevos para ler com os dedos,
enquanto um indivíduo qualquer só detectará uma superfície rugosa. Um usuário
de lentes de contato, após algumas semanas de manipulação cotidiana, consegue
discernir o contato sutil, infinitesimal, da lente na ponta do dedo, sem necessidade
de uma confirmação visual; pelo contrário, o envelhecimento modifica os receptores
e age sobre a precisão de nossas percepções, mesmo sendo em parte compensado
por uma experiência maior.
De forma geral, a motivação, a tensão, a emotividade, a cultura e a experiência
prévia agem sobre essas percepções. De fato, o reconhecimento de um estímulo
apela à memória mediante a comparação sucessiva com a lembrança dos estímulos
experimentados previamente. Assim, as características de uma forma são
conservadas na memória. Perante um novo estímulo, a memória compara as
características dessa nova forma com as que reteve das experiências passadas.
Podemos assim compreender melhor a importância de um treinamento regular
para o osteopata, cuja percepção é a ferramenta indissociável de sua ação
terapêutica.
Percepção, palpação e manipulação | 51

Antes de tratarmos diretamente de explicações teóricas complexas sobre


os sentidos e a percepção nos planos fisiológico e psicofísic, eis uma colocação
concreta.
Diversas expressões populares evocam uma localização corporal em relação
às inquietudes e às emoções. Por acaso não se fala:
“É uma dor de cabeça”, quando se trata de uma preocupação recorrente
em fase de análise e não resolvida?
“Não desce”, no caso de uma contrariedade não aceita?
“Dói no coração”, no caso de um problema que provocou tristeza?
“Pesa no estômago”, tratando-se de uma preocupação mal digerida?
“Vou fazer na calça”, perante uma situação de medo intenso?
“Estou suando frio”, perante uma sensação de estresse geral?
A lista não é exaustiva e as expressões às vezes são fortes. Podemos evocar,
por exemplo, “Estou de saco cheio” quando se quer expressar um sentimento de
aborrecimento…
Seja o que for, podemos verificar que o conflito parte de cima para baixo, da
cabeça desce para a garganta, vai para o estômago, logo para o intestino, e vai
descendo até a expulsão, exatamente como a matéria fecal. O problema parece
seguir o percurso digestivo.
Tais centros de percepção correspondem a emoções e também a centros
vertebrais: OAA, C7/D1, D4, D12, pelve, junto com grandes centros hormonais:
a tireóide para o C7, o timo para o D4, os rins e as suprarrenais para o D12, as
gônadas para a pelve. Podem ser relacionados da mesma forma com os chakra.
52 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Posi vo / equilibrado Nega vo / Desequilibrado


/ aberto Eu"/Ego / Fechado

Intuição, Separação da fonte,


conexão, do sagrado,
plena consciência, Conhecimento
apego
espiritualidade

Intuição, telepa a, Falta de visão pessoal,


meditação, Visão/imagem dúvida,
clareza, confiança ilusão

Expressão libre, Problemas de comunicação


cria vidade, verdade, (falta/excesso, men ras),
posi vidade, Expressão inibição, falta de fundamento,
escuta, comunicação nega vidade

Compaixão, Autodesprezo, falta de afeto,


amor, tristeza, dificuldade para
respeito Aceitação dar/receber amor,
sensibilidade excessiva

Força interior, Arrogância/orgulho,


"senso do eu", Definição ira, falta de limites,
ego sadio, limites vergonha

Aberto à sensualidade, Inibição,


sexualidade, Gra ficação culpabilidade,
cria vidade bulimia

Conforto, segurança, Medo, insegurança,


conexão à terra, Preservação falta de raízes,
família, tribo problemas de segurança † sica

2. Percepção pela diferença

Analisemos as percepções que nos proporcionam nossos diversos sentidos.

A visão

Se estivermos no meio de uma paisagem ou cenário fixo, nosso olhar se


acostumará com o contexto e tudo decorrerá como se não o víssemos mais.
Em compensação, esse olhar será automaticamente chamado por um elemento
que entre em movimento, tipo uma árvore sacudida pelo vento, uma aranha
caminhando pela parede. Na natureza acontece da mesma forma: perante um
rebanho, o predador atacará o animal diferente, o mais claro se os outros forem
pretos, o menor, aquele que se mexe menos…

A audição

Se estivermos dentro de um restaurante lotado não distinguiremos nenhuma


conversa em particular no meio do barulho geral, contudo, todo mundo ouve
Percepção, palpação e manipulação | 53

o garçom quando chega anunciando o prato, porque o tom da voz dele difere,
é mais forte e mais clara, pois ele quer ser ouvido por todos.

O tato

Se deslizarmos o dedo sobre uma folha de papel sob a qual foi colocado um
cabelo, perceberemos uma diferença de relevo, mesmo que a espessura do
cabelo seja ínfima.

O olfato

Havendo vários indivíduos reunidos dentro de um quarto, se uma pessoa for


sair e voltar pouco tempo depois, o cheiro forte da transpiração acumulada da
turma irá agredir o olfato dessa pessoa, sendo que a mesma não tinha consciência
desse cheiro quando estava no meio do pessoal previamente. Em certa forma,
os sentidos ficam acostumados e anestesiados.

O paladar

Na cozinha, a associação entre doce e salgado exacerba o gosto, pois são dois
sabores radicalmente diferentes.

A sensação de movimento

Dentro de um elevador, de um carro ou de um avião, se eu não estiver observando


o exterior não terei percepção da velocidade. Eventualmente poderei perceber
a aceleração e desaceleração, mas não terei noção do movimento sem dispor
de um ponto de referência externo ao veículo.
Quando tem dois trens na estação, um ao lado do outro, se um deles dá partida
não tem como saber se é aquele onde você está ou se é o outro. Para sabê-lo, é
necessário observar um elemento fixo do contexto, tipo uma parede, um cartaz.
O movimento só pode ser percebido em relação a um ponto fixo.

Podemos deduzir destes exemplos que os sentidos são


essencialmente sensíveis às diferenças.
54 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

3. Percepções enganosas

Entre...
O que eu penso,
O que eu quero dizer,
O que eu acho que digo,
O que eu digo,
O que você quer ouvir,
O que você acha que ouve,
O que você ouve,
O que você quer entender,
O que você crê entender,
O que você entende,
Há dez chances de termos dificuldade em dialogar.
Porém tentemos mesmo assim...
(Bernard Werber - A enciclopedia do saber relativo e absoluto)

As percepções que nos enviam nossos sentidos são úteis e até indispensáveis.
Contudo, é necessário aprender a duvidar delas, pois podem ser enganosas.

A visão

Diante de uma ilusão de óptica, a imagem pode mudar conforme a personalidade


dos observadores. Um exemplo disso é a piada do famoso Jaiminho, aquele
rapaz brincalhão: sendo entrevistado por um psicólogo a quem apelou sua
professora, desprovida diante das pegadinhas desse aluno impossível, Jaiminho
deve dizer o que ele vê nas diversas imagens apresentadas pelo terapeuta.
A resposta é sempre tendenciosa: “Vejo seios” ou “um pinto” ou “uma mulher
pelada”… O psicólogo pergunta surpreso: “Você não vê um animal?” ou “uma
árvore?” Diante do desespero do psicólogo, Jaiminho acaba dizendo: “Deixe
para lá, Doutor, de qualquer jeito só penso nisso!”
Percepção, palpação e manipulação | 55

A audição

Da mesma forma que existem ilusões de óptica, também existem ilusões


acústicas, isto é, frases que custam compreender e que dão a impressão de estar
em língua estrangeira ou de ter outro significado. É o caso da seguinte frase, a
qual sendo ouvida, pode ser interpretada e escrita de duas formas: “Criou-lo
só” ou então: “Crioulo sou”.

O tato

Semelhantemente à visão e à audição, o tato pode nos levar ao erro. Vou


ilustrar o ponto com uma situação que vivo cotidianamente no consultório.
Se eu colocar uma mão sobre o forro da maca de tratamento e a outra mão
sobre a pé metálico, sinto claramente que a pé metálico é fria enquanto o forro
é quente. Porém, faz vários dias que a maca se encontra no mesmo quarto.
Portanto, todos os elementos têm exatamente a mesma temperatura. Acontece
que o metal é termocondutor, o calor da minha mão passa para o pé da maca
e essa perda de calorias me dá a impressão de frio, enquanto o forro, por ser
isolante, conserva o calor ao contato e parece ser mais quente.
Como explicá-lo? O frio que sinto na mão quando encosto no metal não
corresponde à “realidade”, mas à “minha realidade”. Sou iludido por meus
captores, que parecem indicar que o metal é frio e o forro é quente, porém não
é assim. Só posso perceber meu entorno através dos meus filtros sensoriais e de
forma mais ampla em função da minha experiência e personalidade. Portanto,
jamais poderei ser imparcial ou objetivo.
Haja vista então que as percepções dos nossos sentidos podem ser enganosas,
daí a importância para nós, terapeutas, de filtrar as percepções de nossos diversos
sentidos e multiplicar os pontos de vista para não nos afastar da realidade. Devemos
pesquisar em diferentes planos do espaço para confirmar nossas percepções e
consequentemente nossa interpretação. Ou seja:
Vamos supor que observamos um círculo. Quem me diz que se trata de um
cilindro ou de um cone, segundo o ângulo de observação? Da mesma forma, um
56 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

quadrado pode ser uma pirâmide conforme o ângulo de visão.


Se eu não me obrigo a mudar meu ponto de vista, só terei uma visão restrita
e parcial, aumentando assim o risco de errar.

Para determinar com precisão qual é o problema do


paciente, preciso primeiramente ter uma visão global,
a qual irei polindo mediante o agrupamento das
informações oriundas dos meus diversos sentidos.
Dessa forma, tenho mais chances de evitar interpretações
apressadas e inadequadas.

4. Não podemos sentir o que os outros sentem

Nenhum indivíduo, mesmo sendo terapeuta, pode sentir o que o outro sente .
Não possuímos receptores na pessoa que temos em frente. Na melhor das hipóteses,
só podemos sentir nosso corpo.
O certo é que estamos sozinhos em nosso mundo sensorial. O exterior, o
entorno, os outros, entram em colisão com nosso universo, o que nos permite
sentir e assim ter uma ideia do que nos rodeia, a partir de fenômenos químicos e
energéticos que recebemos de nosso contexto e de outrem.
Partindo dessa base, falo com frequência que inclusive o que o paciente fala,
pouco interessa: as palavras que utiliza não designam obrigatoriamente as mesmas
coisas que representam para mim. Se alguém me fala: “Minhas costas doem, lá
embaixo”, isso pode significar que tem um problema de mobilidade ou, talvez,
um câncer, porém não estou no lugar dessa pessoa e não posso sentir o que ela
sente. Existe uma barreira intransponível entre nós. Quando encosto em alguém,
não o sinto, apenas percebo as mudanças que agem sobre a minha pele. Por esse
motivo devo me abster de qualquer interpretação de seus dizeres e permanecer o
mais neutro e presente possível, pois a única referência na qual posso confiar sou
eu mesmo. Sou eu quem deve determinar se o paciente apresenta as condições
necessárias e suficientes para expressar uma dor que eu poderei tratar, ou se seu
Percepção, palpação e manipulação | 57

caso é da competência da medicina tradicional.


Se acordo pensando: “Eita! Hoje estou me sentindo esplendidamente bem!”,
isso quer dizer que sinto mais do que de costume todas as manifestações ao meu
redor, que meus captores encontram-se exacerbados, que meu equilíbrio interno,
meus intercâmbios líquidos e energéticos estão 100%. Todavia, até nesse caso ideal
só posso sentir uma coisa, isto é, as deformações que o entorno gera em mim e
sobre mim. A percepção é apenas uma série de interações entre o contexto e nós
mesmos, e essa percepção difere segundo os indivíduos.
Vejo, sinto, escuto as diferenças em função da minha experiência de vida, do
meu passado, do meu humor, das minhas intenções. Meus sentidos me permitem
reconhecer uma situação específica, já memorizada, e assim me posicionar em relação
a uma referência construída progressivamente através da análise dos elementos
percebidos previamente. Um paciente acabou de torcer o joelho. Vou examiná-lo
mediante palpação. A presença de receptores térmicos epidérmicos me fornece
sua temperatura. Através dos meus olhos, mas também mediante meus receptores
proprioceptivos periarticulares, perceberei a magnitude e se há infiltração. A síntese
que meu cérebro irá fazer de todas minhas percepções em relação a outros casos
guardados na memória me conduzirá à inflamação.
Por esse motivo, quando vários osteopatas experientes efetuam um teste às
escuras, existem diferenças nos resultados, sendo que cada um deles utiliza seus
próprios filtros para o diagnóstico. A minha verdade não é necessariamente a dos
outros, porém isso não quer dizer que é a melhor. Sou muito humilde nesse ponto,
pois podemos observar em inúmeros casos que, mesmo se as interpretações e
manobras divergem, os resultados são semelhantes.

5. Pedagogia da percepção osteopática

Uma percepção fina permitirá ao osteopata detectar uma lesão osteopática


(se houver), não evidenciada pelos testes clássicos, e reduzi-la mediante um gesto
eficiente. Melhor ainda: diria até que tal percepção fina permitirá detectar um
estado pré-lesão? Vou explicar: imagine um queijo que começa a apodrecer. Aquilo
58 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

não acontece da noite para o dia. Há todo um período de transição durante o


qual as bactérias responsáveis pelo apodrecimento iniciam seu trabalho sem que
isso seja percebido por fora. Apenas algumas pessoas com um olfato delicado
poderão detectar uma mudança imperceptível para a maioria dos mortais. O mesmo
acontece com a percepção fina do osteopata: ela lhe permite detectar mudanças de
estado que anunciam um problema posterior, imperceptíveis em testes clássicos.
O terapeuta pode então proceder à prevenção e evitar que o problema se desenvolva,
mediante um tratamento adequado. Todavia, isso é duplamente frustrante para
o profissional: primeiramente, ele não tem como saber se teria existido lesão na
ausência de tratamento e se foi sua ação que resolveu o problema. Em segundo
lugar, será julgado por pessoas que não entendem de nada e em função de resultados
que não tem como ser objetivos.
Voltemos à pesquisa. As lesões que procuramos podem se achar em qualquer
lugar do corpo. Por tal motivo e segundo a localização da área pesquisada, seremos
conduzidos a mudar o modo de percepção e, portanto, a utilizar ferramentas diferentes.
A estrutura não é manipulada, mas utilizada para manipular a lesão. Por isso,
aconselho colocar primeiro a mão, sem pressão, para estabelecer um contato
superficial. O terapeuta deve então memorizar a sensação. Tal forma de proceder
não oferece as mesmas informações que uma simples palpação, mas uma sensação
diferente, difusa diria, e que uma vez memorizada nos servirá de referência para
manipular o tecido no qual teremos focado nossa atenção.

6. Como se colocar em situação de percepção fina

Durante a manobra, devemos ocupar fisicamente o espaço, cada polegar do


local de trabalho. Nesse intuito, é necessário fincar os pés no chão, rigorosamente
colados nele, como sendo aspirados por ele, enquanto mantemos a cabeça erguida,
aspirada para cima pelo contrário, “orgulhosamente” no sentido de “dignidade”.
Em primeira instância, devemos nos colocar em sintonia com o paciente. Para tal
efeito, devemos ser perfeitamente neutros: não termos sentimentos, nem vontade.
A gente se deixa levar, não pensa mais, nem reflete, cede. Bernard Werber – ele
Percepção, palpação e manipulação | 59

mais uma vez – expressou muito bem o que acontece nessa hora: quando não
queremos mais uma coisa, é bem nessa hora que a coisa se produz. Só no instante
presente tudo pode acontecer…
Para comunicar sutilmente com o outro e ser capaz de analisar as reações que o
paciente provoca nele, o terapeuta deve eliminar toda empatia e toda perturbação
do meio externo, e medir seus gestos.
Pessoalmente, foco minha atenção na área a manipular e não desgrudo até que
essa parte do corpo do paciente faça parte de mim, sem perder um ápice da minha
própria identidade. Autorizo essa parte a coabitar comigo apenas durante a manobra.
O que entendemos por “focar nossa atenção”? É isolar a área sob análise e
concentrar nossa percepção absoluta nela, se abstraindo de todos os estímulos
externos (acompanhantes, fone, música, barulhos…).

Devemos estar totalmente e exclusivamente presentes,


em tempo e espaço.

Somente nessa condição poderemos perceber em determinado segmento,


em função da nossa intenção, a textura da pele ou a temperatura, os batimentos
cardíacos, os movimentos respiratórios, os MRP4, os planos de deslizamento das
fáscias… Logo, da nossa experiência e conhecimento do corpo humano dependerá
a interpretação que estabeleceremos.
Se focarmos nossa atenção mais profundamente, os pacientes não sentirão mais
nossas mãos, nem os dedos, mas uma densidade, uma presença. Manobrar assim
aumenta nossa eficácia e transmite confiança ao paciente, o que é importante para
que ele possa relaxar. Esse exercício é longo, difícil, sutil. Exacerba os sentidos
e coloca as emoções do terapeuta à flor de pele. Vejo isso como partir à deriva,
o que me proíbo complementar. Longe de mim baixar as defesas e entrar em
empatia com o paciente. Devo me preservar. Na minha opinião, é necessário se
4
O movimento respiratório primário ou MRP é uma pulsação que move os ossos do corpo em sincronia.
Evidenciado pelo Dr. Sutherland, fundador da osteopatia “craniana” nos anos 30, é utilizado pelos osteopatas
para diagnóstico e correção das disfunções osteopáticas.
60 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

sentir bem para trabalhar corretamente: um osteopata doente não poderá tratar
adequadamente. Mas essa é a minha opinião e entendo perfeitamente que outros
terapeutas possam opinar o contrário.
É muito difícil achar as palavras para explicar essa percepção osteopática.
Por isso, quando devo transmitir aos alunos o que sinto, peço que descrevam o
cheiro de uma rosa e a diferença entre esse cheiro e o de outra flor. Imaginem a
surpresa deles! Costumo outorgar alguns minutos de reflexão, porém os alunos se
sentem totalmente impossibilitados de ultrapassar o patamar de: « cheiro bom...»
No melhor dos casos consigo algumas comparações com outras fragrâncias, e
podem até opinar que o cheiro de determinada flor é superior ao da maioria.
Declaro então:
– Vocês estão vendo a dificuldade para frasear o problema que levantei? Pois
é, acontece a mesma coisa comigo quando devo explicar-lhes o que sinto na
percepção osteopática.

7. Que devemos sentir na manipulação?

Uso da propriocepção

Partindo do princípio de que não posso sentir pelos outros, devo me limitar
às percepções da minha mão. Todavia, o contato do pisiforme ou indicador,
frequentemente utilizados, é inconveniente pois o movimento de preensão utiliza
músculos e saturará totalmente meus captores, sendo que são precisamente
poucos nesse ponto. Assim sendo, se for o número de receptores o que definirá
minha escolha da ferramenta de percepção, deveríamos então ir ao extremo de
passar a língua na área a explorar, devido à sua inervação superior. Evidentemente
não dá para fazer isso.
Instintivamente, quando desejamos tocar alguma coisa utilizamos a polpa
dos dedos, mas na osteopatia existe outra forma de agir. Para detectar lesões,
podemos utilizar todo nosso corpo como receptor. O mesmo se torna
assim um tipo de amplificador neurológico. Para tal efeito, vou utilizar toda
minha propriocepção, todos os captores do meu corpo como amplificador
Percepção, palpação e manipulação | 61

neurológico, de forma que possa perceber os micromovimentos. É o que


chamo de “deixar as mãos para trás”. Quanto mais eu for me distanciar das
percepções oferecidas pelas mãos, mais perspectiva irei ter para enxergar
direito as coisas e assim poder analisá-las com mais detalhe, comparando com
outras situações semelhantes experimentadas previamente. Devemos tomar
cuidado com os julgamentos precipitados, pois nossa percepção sensorial do
mundo exterior é fragmentada.
Geralmente, o terapeuta não dispõe da sensibilidade necessária para esse tipo
de percepção. Quando questionado sobre o que sente, a resposta costuma ser
muito imprecisa e sua reação, quando pensa que irá sentir uma lesão e quer
aumentar sua percepção, é apoiar com força. Acha que ao apoiar, principalmente
no caso de um exame profundo, sentirá mais e colherá mais informações. Ledo
engano, até porque os pacientes não gostam muito de ser palpados dessa maneira.
Na verdade, quanto mais forte for o apoio, mais haverá saturação de informação
dos captores táteis, e menor será a percepção fina.
A propriocepção permite conhecer a posição dos segmentos no espaço.
É um sistema muito fino que integra as posições de cada segmento para que o
centro de gravidade se projete sempre na nossa base de sustentação. Quando
estou parado sobre um pé e mobilizo a pelve, todo meu organismo reage de
forma muito precisa para manter o equilíbrio. Devo ficar “na escuta” desses
movimentos com a ajuda de todas as articulações do meu corpo.

Quando o terapeuta analisa a lesão, deve escutar as reações de


seu próprio corpo para poder estabelecer a comunicação.

Mas cuidado! Essa relação singular do terapeuta com o paciente produz


modificações de sua própria percepção. É por isso, sem dúvida, que fica difícil
tratar pessoas “próximas”. Pessoalmente, verifiquei que quando me engajo
mais do que costuma ser, o resultado não é o que espero. Nesse caso, o inimigo
parece ser a parte afetiva, a intenção, a emoção.
62 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Percepção fina

É necessário diferenciar a superfície de contato - a área da pele que a gente


toca - do contato real. Eu não manipulo o osso, mas o utilizo para modificar
o tecido conjuntivo do qual depende. Como não posso tocar o osso, a única
região de contato possível é, portanto, a pele.
Para obter uma percepção fina, devo entrar em contato com meu paciente. Para
tal efeito, vou colocar a área metacarpofalangeana do indicador sobre sua pele.
Vou tocá-lo, palpá-lo. Combino com o tecido para vibrar em harmonia junto
com ele5, me torno cada vez mais denso expirando, reduzindo meu volume,
até me tornar ele, até estabelecer uma continuidade óssea rígida e indeformável
com ele, mas cuidado, só no instante do thrust. Por que? Normalmente nosso
paciente vibra pior do que nós, pois sua saúde encontra-se comprometida (senão
não estaria em nosso consultório). Portanto o acordo perfeito deve ser breve,
para não corrermos o risco de compartilhar a energia ruim.

Como estabelecer concretamente essa continuidade rígida com o paciente?

Vou alinhar meus ossos desde o ponto de contato, subindo para o punho e
logo para o cotovelo. Afasto o cotovelo do meu corpo para impactar a cabeça
umeral na glenóide e fixar os ombros em posição baixa contra minha caixa
torácica, de maneira a obter um contato permanente, sem nenhuma ruptura
da cadeia óssea e rígida, desde a área metacarpofalangeana até minha coluna.
Logo após, realizo uma rotação partindo da pelve, ao redor da coluna vertebral,
conservando rigorosamente essa rigidez óssea para permanecer indeformável.
Dessa forma posso sentir a compressão óssea se manifestando no local onde
vou focar (antebraço, braço, segunda ou terceira costela, coluna…).
Podemos trabalhar exatamente da mesma maneira com o crânio. Em lugar
de colocar as mãos no crânio e aguardar que os movimentos venham a nós,
é melhor ir na direção deles, efetuando uma continuidade óssea da mesma

5
Chamamos isso de sintonia.
Percepção, palpação e manipulação | 63

ordem que a anteriormente citada, entre o crânio e nossa pessoa, mediante


compressão óssea. Será possível perceber assim o aumento da qualidade da
percepção.

Percebo o osso mediante o osso. Para sentir os ossos alheios,


devo utilizar e escutar meu próprio esqueleto.

Sempre conservar o livre arbítrio

Em função do próprio ponto de vista, da educação, do passado, só vemos e


percebemos o que queremos perceber. Ou seja: como terapeutas, como nossa
função é cuidar das pessoas, procuramos achar a causa do mal ou do sofrimento.
Procuramos uma estrutura relacionada com a queixa para justificar a consulta e o
gesto terapêutico. É confortante para o paciente e para o terapeuta.
Durante meus estudos, tomei conhecimento das sequelas de uma torção externa
do tornozelo: o calcâneo efetua uma rotação externa, o tálus vai para cima, para
dentro e para trás, o maléolo fica para trás, o joelho parte em adução com a fíbula
em posição anterior e a coxa em rotação interna, até um occipucio e uma clavícula
em posição anterior… Breve, tem gente muito experiente que analisa aquilo,
mas a patologia não pode ser resumida à fisiologia apenas. Acho absurdas essas
descrições de sequelas de lesões, sendo que todos esses movimentos, deslizamentos
e rotações são observados em pessoas sadias, em pé, operacionais, conforme as
leis da fisiologia.
O que responder à pergunta: segundo as leis de Fryette, o que faz a enésima
vértebra dorsal após uma colisão de três quartos anterior direita e descendente,
em ângulo de 30° no plano anteroposterior, ou o que faz a L3 no sacro?
Em verdade digo a vocês que faz o que ela pode!!!
Sou contra aqueles protocolos que nos levam a achar lesões… e que
acharemos se não prestarmos atenção! Se eu quero achar um ilíacoanterior à
direita, com certeza vou achar. Nas minhas aulas, quando pergunto a algum
aluno se sente um ilíaco anterior sendo este posterior, o aluno tem certeza de
64 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

estar sentindo um ilíaco anterior. É muito fácil influenciar alguém e falsear


sua percepção.

ALGUNS PRINCÍPIOS QUE DEVEMOS LEMBRAR SEMPRE

• Os sentidos nos permitem perceber as diferenças, não a realidade.


• Antes de qualquer contato físico, o terapeuta percebe o paciente como
um todo e efetua sua primeira análise, a qual polirá e definirá mediante a
anamnese e a palpação.
• No caso do tratamento é o oposto: o terapeuta partirá da queixa local
para se afastar mais e mais em direção ao geral.
• Quanto mais nos afastarmos da mão, mais fina será a análise.
• Só podemos sentir - ou perceber - o próprio corpo.
• Só podemos perceber as coisas que nos rodeiam através de nosso
próprio filtro.
• Não podemos sentir o que os outros sentem.
• Percebemos o que é duro com o que é duro, o osso com o osso.
Para sentir os ossos alheios, devemos utilizar e escutar nosso próprio
esqueleto.
• O contato se localiza minimamente nos ossos do antebraço.
Essa percepção aplicada modificará nossa percepção terapêutica. De fato,
poderemos sentir as lesões, nos maravilharmos com as posições surpreendentes
no espaço de certas peças ósseas, afinar nossa percepção e descobrir todas as
possibilidades de lesão que existem nos três planos espaciais.
Veremos que podemos achar lesões sem Testes de Flexão em pé ou sentado
positivos.
Poderemos passar de uma análise intelectual e de posição de uma lesão, a uma
análise sensorial, a condição de não perdermos de vista que quanto mais agimos,
menos sentimos e menos percebemos.
Apenas um longo aprendizado e uma vasta experimentação nos permitirão
sentir os movimentos sutis nos pacientes e construir referências sensitivas.
Alguns princípios fundamentais
(Segundo o Colégio Europeu de Etiopatia de Genebra)

Os conteúdos a seguir não pretendem constituir uma lista exaustiva de todas


as técnicas e manobras possíveis, mas ilustram mediante exemplos importantes
como e quando essas técnicas podem ser aplicadas.
Iremos nos focar em tudo aquilo que pode permitir ao terapeuta passar
progressivamente de uma visão puramente analítica a uma abordagem que integre
as sensações.
Apresentaremos paralelamente:
• as técnicas que podem ser aplicadas em qualquer indivíduo, ou seja,
em pessoas com capacidades normais, que treinem ou não;
• e técnicas específicas e mais complexas que desenvolvi em função da
minha experiência com atletas. Já evoquei nos capítulos prévios o porquê
e como desenvolvi as práticas com esportistas de alto nível e detalharei
mais a questão antes de apresentar as fichas técnicas específicas.
Todavia, antes de focar nessas fichas técnicas, alguns pontos devem ficar
perfeitamente claros:
• as definições de base;
• as noções fundamentais sobre o tecido conjuntivo;
• o funcionamento das cadeias ascendentes.
66 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

DEFINIÇÕES

1. O Potencial Vital Original

∙ Para simplificar, o designaremos em diante como P.V.O.


O P.V.O. representa as capacidades máximas que um indivíduo poderia atingir
se estivesse o tempo todo dentro de um ambiente ótimo, o que é evidentemente
utópico.
Esse potencial vital original é característico de cada indivíduo. Depende do
programa genético que recebe no ato da criação. Pode- se dizer que é hereditário.

2. O Potencial Vital Atualizado

∙ Para simplificar, o designaremos em diante como P.V.A.


Partindo do princípio de que um indivíduo, e portanto suas diferentes estruturas,
estão submetidos ao envelhecimento, a acidentes e a doenças que provocam lesões
irreversíveis e diminuem o P.V.O., o P.V.A. representa as possibilidades desse
indivíduo, de suas estruturas, atualizadas no momento T. Também não devemos
esquecer de considerarmos as condições mais ou menos desfavoráveis do meio
exterior: o entorno, o estresse, os vínculos sociais e afetivos… que podem modificar
a estrutura e contribuirão assim para reduzir o P.V.A.
É importante avaliar o P.V.A. de uma estrutura (articulação, víscera ou músculo)
para adaptar o tratamento. De fato, quanto mais baixo for o P.V.A. de um indivíduo,
menor será sua capacidade de aguentar uma manipulação osteopática. Da mesma
forma que não se trata de modo semelhante um indivíduo com um P.V.O. elevado
(por exemplo um atleta de alto nível) e um indivíduo de constituição frágil. Será
necessário aplicar um tratamento mais suave ou reduzir a sessão se o P.V.A. for
baixo.
Enquanto o indivíduo estiver utilizando seu corpo sem ir além do P.V.A.
e a exigência do meio externo estiver dentro dos limites fisiológicos, não tem
problema.
Alguns princípios fundamentais | 67

3. Lesões irreversíveis e P.V.A.

Em contraposição, se exigirmos do organismo além do P.V.A. e se o limite de


resistência for ultrapassado, a natureza da estrutura mudará de forma definitiva.
Haverá uma lesão irreversível em relação ao P.V.A., independentemente do
tipo de ruptura (episódio único de excesso) ou do tipo de desgaste (episódios
reiterados).
As lesões irreversíveis, resultado de uma demanda excessiva, não são da
competência do osteopata.

4. Lesões reversíveis

Pelo contrário, a demanda reduzida ou ausência de demanda podem também ser


fonte de lesões, só que reversíveis (em relação ao P.V.A.). Imaginemos um indivíduo
sedentário que utiliza pouco seus músculos e articulações, portanto seu corpo de
forma geral, pois uma demanda reduzida dos músculos e articulações decorrerá
em demanda reduzida das vísceras: pouco a pouco suas qualidades dinâmicas
diminuirão, as fibras de colágeno do seu tecido conjuntivo perderão a elasticidade, os
intercâmbios líquidos decairão; a água, em lugar de ser livre, se transformará em gel.
Essas lesões são da competência do osteopata. Elas se caracterizam por serem
mudas: quando a pessoa não se mexe, não há dor.

5. Domínio de Funcionamento Fragilizado ou D.F.F.

Corresponde a uma lesão reversível. Surge após uma baixa demanda primária
em relação ao P.V.A., como foi evocado no parágrafo prévio, ou a uma baixa
demanda após uma demanda excessiva em relação ao P.V.A. (traumatismo ou uso
excessivo). Nesse caso, é o estado da estrutura que muda, não sua natureza (como
no caso de uma lesão irreversível).

6. Domínio de Funcionamento Habitual ou D.F.H.

Trata-se do setor (área de conflito) onde a estrutura evolui rotineiramente


(o que não implica uma ausência de lesão). Enquanto o indivíduo utiliza essa
68 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

área, não sente incômodo e se adapta às necessidades do cotidiano. Todavia,


uma demanda excessiva, única e brutal (por exemplo um falso movimento) ou
uma demanda excessiva reiterada (por exemplo uma partida de tênis) colocarão
em evidência o D.F.F.
Essa zona representa as capacidades imediatas da estrutura, enquanto o P.V.A.
representa suas capacidades máximas em determinado momento T.

7. Domínio de Funcionamento Eventual ou D.F.O.

Não é uma lesão, pois não é estável no tempo e espaço. É redutível se a função
for relançada, em cujo caso volta a ser D.F.H.

8. Variáveis de estado ou Variáveis de Regulação sistêmicas, ou V.R.

São de três tipos: mecânicas, neurológicas e neurovasculares.

9. Variáveis de entrada

Podem ser de origem física, química, alimentar, mecânica, microbiana, emotiva,


elétrica ou cósmica.

10. Variáveis de saída

São todos os fenômenos fisiológicos ou patológicos mediante os quais o


organismo responde a uma lesão. Dentre eles, podemos distinguir:
• os fenômenos gerais (febre, astenia, emagrecimento, anorexia, insônia,
transtornos do comportamento...), que podem acontecer com um
conjunto de lesões ou patologias, junto com um eventual desenvolvimento
bacteriológico ou viral.
• um fenômeno diretor, com características suficientes que permitam
descobrir mediante palpação e teste de resistência a estrutura da qual
depende.
Esses fenômenos somem com a lesão.
Alguns princípios fundamentais | 69

11. Cadeias ascendente e descendente

É um modelo teórico e fisiológico que explica as interações mecânicas no


interior do organismo: os dois pés recebem, através dos calcanhares e das cabeças
dos primeiros e quintos metatarsos, exigências e deformações que transmitem
como única exigência vertical à tíbia, que por sua vez retransmite à pelvecomo
nova exigência única ascendente para a coluna.
O empilhamento do esqueleto portador é o modelo de base da cadeia ascendente,
onde as forças são transmitidas de baixo para cima, em resposta à gravidade, de
ponto em ponto de apoio sucessivamente.
Quando o corpo, sob o efeito da gravidade, se apoia no chão para se locomover,
deve restabelecer o equilíbrio em permanência, após as mudanças de apoio,
momentos intermediários ou na ausência de certos apoios, e isto independentemente
dos eventos externos.
Para gerir esse equilíbrio, vários tipos de receptores captam as informações
e as transmite aos centros nervosos (medula óssea, tronco cerebral e cerebelo),
que colocam em ação um determinado número de mecanismos de correção e de
restabelecimento do equilíbrio.
O equilíbrio depende da sinergia entre todos esses mecanismos, mesmo sendo
evidente que a ação da visão e do sistema vestibular é preponderante.
Se considerarmos que a horizontalidade do olhar é uma prioridade, podemos
entender a importância dos receptores vestibulares, visuais e mioarticulares das
primeiras vértebras.
Se uma lesão se encontra no caminho dos vetores, a informação mecânica é
perturbada, desviada no “esforço” de restabelecimento do equilíbrio, para que a
linha de gravidade coincida com a superfície de apoio. Segue uma deformação do
sistema, com áreas de demanda excessiva e outras de demanda reduzida, que criam
outras lesões em cadeia.
Mais adiante trataremos novamente dessas noções de cadeia.
70 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

O TECIDO CONJUNTIVO

Constitui a malha de todos os órgãos. Confina, envolve, reúne e amarra ao


esqueleto.
Adota várias denominações:
• peritônio, pericárdio, pleura, meninges;
• fáscias;
• cartilagens e fibrocartilagens: meniscos e discos intervertebrais;
• cápsulas articulares, tendões e ligamentos.

1. Estrutura e composição do tecido conjuntivo

• Células do tecido conjuntivo: fibrócitos e fibroblastos;


• Células do sangue, especialmente linfócitos;
• Fluido livre e substância fundamental;
• Fibras de colágeno. Não elásticas, ficam distribuídas em malhas
extensíveis.
∙ Têm uma estrutura em tricô nas fáscias.
∙ Seu comprimento pode variar de forma inversamente proporcional
à sua largura.
∙ Têm, portanto, uma estrutura elástica.
∙ Têm uma estrutura em arco nas cartilagens.
∙ Têm uma estrutura de fibras concêntricas nos discos intervertebrais.
• Fibras de elastina: contrariamente às fibras de colágeno, são elásticas.

2. Funções do tecido conjuntivo

• Mecânica: liga e sustenta os elementos do corpo, como uma armação


leve. Absorve e transmite as exigências mecânicas.
• Elasticidade: sua malha elástica contínua permite o ajuste da forma à
função.
• Metabólica: as trocas celulares passam pelo tecido conjuntivo e seus
espaços intermediários.
Alguns princípios fundamentais | 71

• Reserva d’água: a maior parte do fluido intersticial enche as malhas do


tecido conjuntivo.
• Imunitária: constitui a sede da inflamação, a qual é uma reação de defesa.
• Informativa: constitui a sede de uma boa parte da sensibilidade.
Contém de fato, dentre outros:
∙ os receptores de Ruffini e de Vater-Pacini, no nível capsular e
dérmico,
∙ os receptores de Golgi, no nível ligamentar e tendinoso,
∙ os fusos neuromusculares se encontram dentro de uma cápsula
desse tecido.
Quanto maior for a quantidade de tecido conjuntivo de uma estrutura
articular, maior será sua inervação.

Primeiras conclusões

• Não é a posição de um osso que interessa, mas sua capacidade de se


mexer em relação a seu vizinho.
• Cada parcela de tecido dispõe de memória, conhece o todo. Cada peça
conhece sua posição ideal e acha o meio de mantê-la mediante a boa
saúde de seu tecido conjuntivo.
• Utilizam-se os ossos para manipular as lesões do tecido conjuntivo e não
os ossos por si. Todavia, procura-se um alavancamento curto para estar o
mais perto possível da lesão e em contato direto.

3. Noção de articulação sadia

• A boa saúde de uma articulação se manifesta pela sua capacidade:


∙ de movimento,
∙ deslizamento, rolamento e distensão (DRD),
∙ e pela boa capacidade de deformação do tecido conjuntivo.
Toda perturbação que contribua a reduzir a capacidade de DRD deve ser
desmascarada nas articulações.
72 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

• Tecido conjuntivo sadio e flexível:


∙ as fibras de colágeno e elastina são suficientes em quantidade e
qualidade,
∙ as fibras de reticulina são reduzidas,
∙ o líquido se encontra em forma livre.
• Tecido conjuntivo envelhecido e rígido:
∙ as fibras de colágeno e elastina são insuficientes em quantidade e qualidade,
∙ as fibras de reticulina são numerosas,
∙ o líquido se encontra em forma ligada ou viscosa.

4. Modificações do tecido conjuntivo

• Microscópicas:
∙ redução das necessidades energéticas,
∙ redução das trocas intersticiais,
∙ redução dos fluidos livres,
∙ aumento da viscosidade,
∙ redução do estímulo dos receptores neurológicos, logo acúmulo
de neurotransmissores nos elementos pós-sinápticos,
∙ redução da vascularização,
∙ perda dos radicais hidroxilo no tropocolágeno, logo perda de
elastina.
• Macroscópicas:
∙ O tecido se torna grosso: sua densidade aumenta, por redução da
hidratação, junto com sua viscosidade.
∙ O tecido se torna duro: sua capacidade elástica e de deformação
diminuem, junto com sua capacidade de mobilidade e motilidade.
A forma não se adapta mais à função.
∙ O tecido torna-se sensível: a sensibilidade aumenta pelo acúmulo
de neurotransmissores pós-sinápticos e o influxo com o menor
dos estímulos.
Alguns princípios fundamentais | 73

∙ O ponto de equilíbrio muda devido à modificação do tônus


muscular de base.

5. Modificações à distância: VR ou variáveis de regulação

• Mecânicas:
∙ Estáticas: as estruturas subjacentes e sobrejacentes se compensam
atrás do equilíbrio
∙ Dinâmicas: uma demanda excessiva acarreta no longo prazo uma
demanda reduzida
• Neurológicas: a modificação do influxo nervoso na área intermédio
lateral traz repercussões no conjunto do metâmero.
• Neurovasculares: a redução do influxo na cadeia simpática acarreta
uma redução:
∙ do influxo simpático,
∙ das capacidades vasomotoras,
∙ da vascularização.

6. Estrutura e função

• Agiremos sobre a função através da estrutura. Portanto esse será o


objeto de nossa observação e de nossas intervenções.
• A estrutura gere a função: não existe, portanto, função espontânea.
• A função mantém a estrutura que a geriu.
• Como a doença é uma disfunção, possui portanto um suporte
estrutural específico.
• Se a estrutura encontra-se mal montada, envelhecida, desgastada, e
com mais motivo quebrada, haverá disfunção.
• A estrutura pode ser considerada como uma organização espacial, já
sua expressão, ou seja, a função, constitui uma organização temporal.
• Os elementos representam a estrutura, enquanto as relações entre
esses elementos constituem a função.
74 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

7. Natureza e estado

A estrutura pode ser alterada no seu estado sem por isso sê-lo em sua natureza.
Vejamos o caso da água, por exemplo: por natureza, sempre será água. Todavia,
poderemos achá-la em diferentes estados: líquido, sólido quando estiver congelada,
ou sob forma de gás após ebulição.
• A natureza de uma estrutura é definitiva, porém seu estado pode
mudar.
Alguns princípios fundamentais | 75

FUNCIONAMENTO DAS CADEIAS (segundo o modelo etiopático)

1. A cadeia ascendente

A cadeia ascendente se constrói em reação ao chão e faz intervir de baixo para


cima:
• o calcâneo;
• o tálus. É um distribuidor passivo do peso do corpo sobre a parte
anterior e posterior do pé, pois não possui nenhuma inserção muscular.
A articulação subtalar é, sem dúvida, a mais portadora e, portanto, a mais
importante do corpo humano;
• a tíbia, principalmente a parte interna do côndilo (que gere o apoio,
enquanto a parte externa gere o movimento);
• as coxofemorais, que recebem as exigências dos membros inferiores e
as transmitem ao sacro através dos Ilíacos;
• o sacro6. Encaixotado entre os Ilíacos, é um distribuidor de pressão.
Recebe todas as exigências mecânicas dos membros inferiores através
dos Ilíacos e sustenta também a coluna integralmente;
• a região D10-L1, com a dobradiça D12, pouco móvel, a qual apresenta
a fisiologia de uma lombar na sua parte inferior (com articulações no
plano sagital) e de uma dorsal na parte superior (com articulações no
plano frontal). Recebe as exigências mecânicas da bacia e se apoia no
sacro para gerir a mobilidade do resto da coluna.
• a região dorsal alta (D1-D4), que sustenta o peso da cabeça e do
pescoço;
• a C2;
• o occipúcio, simplesmente apoiado na C1.
Essas áreas podem travar sozinhas, de forma quase passiva, praticamente sem
ação muscular.

6
Atenção! Para algumas escolas, o sacro pode fazer parte da cadeia descendente.
76 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Observação: costuma ser muito difícil manipular essas áreas.


Como a função da cadeia ascendente é manter a verticalidade, a associaremos
à cor verde.
O conjunto dessa cadeia funciona por empilhamento e a rigidez dos ossos
transmite as forças e as exigências mecânicas, de forma que, no final das contas,
a horizontalidade do olhar e dos canais semicirculares seja mantida no espaço, o
que constitui a condição ótima de conforto. De fato, nessas condições o corpo
não precisa fazer esforço nem exigir a cadeia descendente para manter o equilíbrio.

2. A cadeia descendente

Contrariamente à cadeia ascendente, é ativa e móvel. Portanto utiliza músculos.


A associaremos à cor vermelha. Seu propósito é manter o equilíbrio do corpo.
No menor desequilíbrio, é utilizada para recuperar o apoio. Corresponde a tudo
o que fica suspenso, junto ao eixo central.
Começa no ouvido interno, para permitir os movimentos de restabelecimento
do equilíbrio.
Está composta, de cima para baixo:
• pelos canais semicirculares e temporais
• pelas articulações temporomandibulares (ATM)
• C1
• zona cervical média
• os membros superiores
• as escápulas
• as costelas
• a C7, que liga a coluna cervical móvel à coluna dorsal fixa. Nesse
sentido, distribui pressão e exigências.
• as dorsais médias
• as lombares médias
• os Ilíacos7
7
Atenção! Para algumas escolas, faz parte da cadeia ascendente.
Alguns princípios fundamentais | 77

• as patelas
• as fíbulas
• todas as fáscias e músculos
Todos os elementos ósseos desse sistema procuram perpetuamente apoio na
cadeia descendente, portanto se movimentam constantemente.
Como as emoções são integradas pelo cérebro e se expressam descendo pelos
músculos, podem gerar tensões musculares ou viscerais.
Quando são utilizados fórceps ou espátulas no parto, podem impactar os
temporais, estrutura que aloja o ouvido interno, sede do equilíbrio. Uma restrição
de mobilidade dos temporais pode consequentemente incidir no equilíbrio da
criança.
Haja vista que os músculos constituem o principal elemento da cadeia descendente
e ficam em exercício, podem sediar inflamações do tipo tendinite, por excesso de
trabalho ou falta de repouso. Na fábrica, se duas pessoas na cadeia de montagem
participarem de uma mesma operação e uma delas vier a diminuir o ritmo pois está
doente, a segunda pessoa, sadia, deverá aumentar seu desempenho para compensar.
Essa pessoa por sua vez sentirá dores associadas à exigência excessiva de sua
estrutura e a impossibilidade de obter o repouso necessário. As lesões da cadeia
descendente provocam dores muito intensas e todas as patologias finalizadas em
“ite” (inflamatórias) ficam sediadas nela (a epicondilite, por exemplo).
Aparentemente as lesões da cadeia descendente podem decorrer de lesões da
cadeia ascendente, mas existe instalação direta na cadeia descendente nos seguintes
casos:
• traumatismo direto de um dos elementos da cadeia descendente
• lesão dos temporais se forem utilizados fórceps no parto (exemplo
acima)
Em compensação, nos recém-nascidos sem apoio concreto só ocorrem lesões
na cadeia descendente (dores estomacais, problemas otorrinolaringológicos,
regurgitação…)
78 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

3. Complementação constante das duas cadeias

Como vários sistemas na vida, as duas cadeias são indissociáveis e complementares.


A cadeia ascendente “verde” existe porque a cadeia descendente “vermelha” existe,
da mesma forma que o yin existe em relação ao yang, o feminino em relação ao
masculino, o sistema simpático em relação ao sistema parassimpático…
Não existe nada que seja completamente vermelho, nada que seja completamente
verde. Todas as articulações se mexem junto com a cadeia descendente para achar
um melhor apoio na cadeia ascendente. Portanto têm vermelho e verde ao mesmo
tempo. Não é bom que seja tudo vermelho, da mesma forma que também não é
bom que seja tudo verde.

4. Análise dos diversos sistemas

Ombro

No sistema do “ombro”, podemos afirmar que o esterno representa para os


ombros o que o sacro representa para a pelve. Isto é, a articulação esternoclavicular
é mais verde (ascendente), enquanto a articulação glenoumeral é mais vermelha
(descendente).
Exemplo: quando lançamos um dardo, para adquirir mais velocidade a parte
distal do braço deve ser levantada minimamente acima da horizontal que
atravessa os ombros. Isso só é possível porque os ombros vêm se apoiar na
esternoclavicular: um bom apoio é indispensável para conseguir aceleração.

O Ilíaco

Na caminhada, o íleo às vezes é portador (verde), quando o pé apoia no


chão, e vermelho (portado), quando o pé está no ar. Os jogadores de futebol
costumam ter problemas de íleo, que podem levar a pubalgias, imputáveis aos
chutes reiterados da bola. Nesse caso, o íleo da perna de apoio pertence à
cadeia ascendente, e o íleo da perna que chuta pertence à cadeia descendente.
A sínfise púbica se encontra na junção desses dois sistemas.
Alguns princípios fundamentais | 79

As vértebras

Compõem-se do corpo vertebral, o disco e as articular posteriores. O corpo


se apoia no disco (verde), mas se movimenta sobre as articulares posteriores
(vermelho). Em caso de lesão osteopática, uma articular posterior torna-se
verde e assim o disco pertinente poderá tornar-se vermelho.
No tocante às regras da manipulação (que veremos adiante), os tempos de 1 a
6 serão predominantemente vermelhos, o tempo 7 (redução do jogo articular
ou slack) será verde, e os tempos 8 a 10 vermelhos.
De modo geral, a partir da cadeia ascendente iremos nos interessar na cadeia
descendente. Manipularemos principalmente as áreas verdes, por serem
hipomóveis, portanto sede da lesão tissular reversível. Por definição, as vermelhas
já são móveis. Geralmente as dores mais importantes, consequentemente as mais
incapacitantes, se manifestam frequentemente nas zonas hipermóveis que fazem
parte da cadeia descendente (é o caso das lombalgias, dorsalgias, cervicalgias…).
Podemos pensar que essas zonas hipermóveis procuram apoio para poder parar,
descansar. Berram de dor não por serem fixas, mas por serem muito móveis em
relação à sua função. Nesse caso temos zonas doloridas e móveis em lugar de
doloridas e bloqueadas. Será necessário determinar o problema na anamnese,
da qual falaremos adiante, pois o tratamento será totalmente diferente.
Geralmente, o terapeuta manipulará uma zona pertencendo à cadeia ascendente,
portanto predominantemente fixa e verde, aplicando peso mediante o uso de
sua própria cadeia ascendente. Fará a mesma coisa em caso de dor crônica.
Pelo contrário, manipulará uma zona da cadeia descendente, que será
predominantemente móvel e vermelha, com músculo, aplicando velocidade
para manipular em movimento de aceleração. Fará a mesma coisa em caso de
dores agudas.
Seja qual for o caso, antes de aplicar qualquer tratamento é essencial verificar
que a cadeia ascendente ou a seção dessa cadeia em relação com a queixa
estejam livres.
80 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

5. Considerações sobre as tendinites

O tendão transmite as tensões vindas do músculo. Ambos por natureza são


alongáveis e nenhum deles pode se deslocar, exceto em caso de traumatismo. Quando
o tendão sofre, é porque o músculo pertinente trabalha demais ou não descansa o
suficiente. O tendão esquenta. É necessário verificar então se não existe um problema
nas variáveis de regulação, sejam mecânicas, neurológicas ou vasculares. Inclusive
quando o terapeuta está convencido da ausência de lesão, deve verificar o local da
queixa do paciente, para garantir a inexistência de um problema in situ. Logo após,
explorará e tratará as articulações sobrejacentes e subjacentes. Não existe agressão
sobre o músculo, pois sua elasticidade lhe permite gerir facilmente os movimentos
cotidianos. A pessoa deveria poder tocar piano sem sofrer, exceto se as teclas
forem muito duras, ou caminhar sem sentir dor, exceto se for uma caminhada na
montanha quando não se tem costume. Se o músculo não se encontra alongado,
isso não depende de uma má posição articular, mas da má informação que recebe
devido a uma mudança do tônus de base (ligada às variáveis de regulação).
Os sinais clínicos de uma tendinite costumam ser dores no repouso. O músculo
é uma massa de carne (a imagem é pouco atraente) e para reagir precisa de um
estímulo.
Atenção: no caso de uma dor aguda persistente, é difícil ter 100% de certeza
da existência de uma lesão. A dor é uma mensagem que o corpo envia para
sua proteção, um aviso da necessidade de repouso. Essa mensagem não
deveria ser desatendida.

6. Aplicações práticas para o terapeuta

Manipula-se o verde com o verde e o vermelho com o vermelho.


Procuramos achar o verde com o vermelho, isto é, nos mexemos com os
músculos para encontrar apoio.
Em apoio, se alinharmos os ossos não faremos nenhum esforço.
Quanto mais ativos formos, mais excesso de informação enviaremos a nossos
captores e menos iremos sentir.
Alguns princípios fundamentais | 81

Quanto mais passivos formos, mais sentiremos os ossos se comprimindo.


Sem os músculos, o esqueleto não consegue se manter em posição vertical, da
mesma forma que os músculos não podem se sustentar sem o esqueleto.
O terapeuta contrai os músculos para obter um melhor apoio e ficar sobre sua
cadeia ascendente.
A parte anterior da perna do terapeuta gere o peso do corpo (verde, cadeia
ascendente), a parte posterior gere a subida (vermelho, cadeia descendente) e o
avanço gere a propulsão.
Para viver em pé existe a cadeia descendente, o músculo está presente para
segurar os ossos.
Existem duas funções: o movimento e a procura de apoio.
O osso não pode ser alongado, mas os músculos podem diminuir; não se
aumenta a força, mas a resistência pode ser reduzida.
A cadeia verde aparece quando os músculos eretores relaxam.
O vermelho serve nos movimentos de grande amplitude e o verde serve nos
movimentos de pouca amplitude.
82 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL
Avaliação do estado do paciente

OS MEIOS DE AVALIAÇÃO: ANAMNESE E PALPAÇÃO

1. Objetivos

Trata-se de achar a causa dos fenômenos patológicos, ou seja, trata-se de localizar


e definir a lesão. É da competência do osteopata ou da medicina tradicional?
Trata-se também de avaliar o mais precisamente possível o estado de saúde do
paciente (o que pertence ao P.V.O. e ao P.V.A.), pois adaptaremos os cuidados em
função do potencial.
Portanto, não esqueceremos de avaliar o que não pertence ao organismo: estado
psicológico, ambiente, energética, costumes… para determinar se as condições
são favoráveis ou não.
O osteopata pode se basear, logicamente, nos exames médicos em posse do
paciente (análises, imagens…) mas é preciso lembrar que esses exames não facilitam
necessariamente uma visão objetiva da lesão osteopática. Por quê? Porque sempre
é exigido do paciente que se submete a uma radiografia que não se mexa. Todavia,
uma estrutura imóvel carece de sua dimensão vital: o movimento. Quando a lesão
é irreversível não é um problema, pois a mudança de natureza ou a fratura podem
ser evidenciadas facilmente mediante os exames clássicos: radiografia, endoscopia…
Pelo contrário, em caso de torcicolo uma radiografia não serve de nada, exceto se
houver traumatismo. Da mesma forma, se as trocas líquidas forem defeituosas,
isso não será necessariamente visível na radiografia ou tomografia.
A especificidade da osteopatia é que trabalha sobre a função e pode associar
84 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

uma dor localizada em determinado lugar a uma disfunção que poderia parecer
totalmente desligada do problema a priori, pois muito distante, independentemente
do nível de complexidade: uma dor no tornozelo pode ter origem óssea como
também circulatória, neurológica e até emotiva, psicossomática etc.
No caso dos transtornos funcionais, como acontece frequentemente com a
lesão tissular reversível (lesão osteopática), a mudança de estado é tão sutil que
costuma ser imperceptível ao olho nu. No tocante aos atletas, isso é particularmente
evidente: eles conhecem tão bem seus corpos e sentem de tal forma que percebem
a menor disfunção. Ciclistas, corredores e outros não deixam de pedalar, correr,
dançar ou nadar, e globalmente isso funciona bastante bem. Porém, sentem que há
alguma coisa que não bate, e essa pequena coisa é tão ínfima que resulta impossível
diagnosticá-la através de meios tradicionais. Apenas a consideração do problema
desde uma perspectiva totalmente diferente permitirá torná-lo objetivo.
O terapeuta limitar-se-á assim a uma aproximação no tocante à estrutura, no
caso de uma dor aguda que impeça a mobilidade do paciente e nem permita efetuar
testes da mesma. Aprimorará seu exame:
• pela análise da elasticidade e mobilidade, qualidades dinâmicas fundamentais;
• pela exploração da função.
Se não puder explicar a disfunção, explorará sua expressão: dores, limitação de
movimentos, vermelhidão…

2. Anamnese

A mesma permitirá ao terapeuta saber se a queixa é a expressão de uma lesão


osteopática ou se é do domínio médico, e se for concretamente uma lesão osteopática,
determinar qual é a estrutura manifesta e onde o terapeuta deve impor as mãos.
A anamnese proposta a seguir é só um exemplo e deverá ser ponderada em
função do paciente.

Estado civil e profissão

O ofício exercido é físico, repetitivo, intelectual…? O tratamento dependerá


Avaliação do estado do paciente | 85

disso (também o veremos nos atletas): não iremos tratar da mesma forma um
pedreiro e uma dançarina, mesmo se ambos exercerem ofícios físicos.
Qual é a queixa principal na hora de receber o paciente? Devemos tentar lembrar
sempre disso pois os pacientes costumam voltar para a era do gelo e se afastar
do tema. A pergunta que devemos formular é: “Onde está doendo hoje?
O que lhe incomoda mais no seu cotidiano?”
Depois é preciso deixar o paciente falar, permitir que conte sua história com
suas palavras (evitando na medida do possível, quando se tem um casal na
frente, que o homem fale no lugar da mulher quando é a vez dela), e sempre
canalizando o discurso para evitar, mais uma vez, falar indiscriminadamente.
Nunca devemos esquecer que os pacientes costumam ignorar o sentido exato
dos termos médicos, podendo utilizá-los de forma errada: ciática no lugar
de ciatalgia ou claudicação intermitente, úlcera gástrica com dor na cavidade
epigástrica no lugar de cólica hepática, hérnia de hiato no lugar de úlcera…
Quando um paciente utiliza um termo médico, devemos perguntar de onde
ele procede: foi seu médico que falou? outra pessoa?
Havendo múltiplas queixas, é necessário:
• Hierarquizar os problemas: deve-se canalizar o paciente com tato e
pertinência, e analisar seu histórico, o que levará à estrutura que deve
ser pesquisada e/ou manipulada. O paciente pode estar com lesões
irreversíveis múltiplas, que não são da competência do osteopata, e
apresentar ao mesmo tempo uma lesão osteopática no meio dessas
lesões irreversíveis. O terapeuta poderá cuidar dessa lesão, para tornar a
vida do paciente bem mais confortável, independentemente das outras
lesões (irreversíveis), o que acontece muito.
• Estabelecer a cronologia dos problemas. Perguntaremos: há quanto
tempo você sente essa dor? Apareceu em que circunstâncias? Uma lesão
recente diferirá de uma lesão antiga, a qual provavelmente apresentará
um caráter irreversível em parte.
86 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

• Se as queixas forem difusas, devemos tentar achar um denominador


comum entre as lesões, por exemplo, um sintoma: dor, vermelhidão,
temperatura, limitação de movimentos…

Os antecedentes

É necessário se informar dos antecedentes locais médicos e cirúrgicos: como


foram tratados? Foram ignorados? Alopatia? Medicinas alternativas? Colegas?
Com sucesso? Fracasso?
Não devemos esquecer que os pacientes podem omitir lesões ou transtornos,
especialmente os funcionais, que o osteopata deve conhecer, pois é importante.
Às vezes são questões tão antigas que acabaram esquecendo-as, ou então o
subconsciente as sepultou por serem traumáticas (um câncer por exemplo).
Um paciente com dor no estômago pode omitir falar do assunto pois sempre
conviveu com essa dor e para ele é normal. Uma mulher que sente dor durante
o sexo também pode considerar isso normal sabendo que acontecia a mesma
coisa com a mãe dela. Também pode ocorrer que tenha consultado sendo jovem,
pois sentia dor no estômago durante a menstruação, e o médico prescreveu
anticoncepcionais: esse tratamento modificou então artificialmente o sistema
tissular mediante aporte hormonal e a paciente findou esquecendo do problema
que teve na juventude. Contudo, evidentemente, não deve existir dor se o
funcionamento for normal.

3. Detalhar a dor

Quando tivermos deixado o paciente contar sua história com suas próprias
palavras, deveremos formular algumas perguntas para detalhar vários pontos:

Sobre as circunstâncias de início da dor

• Foi uma demanda espacial excessiva em relação ao D.F.H.8 (torção,


entorse simples)? Surgiu após um evento único? Nesse caso a dor
8
Não devemos esquecer que se trata de uma demanda espacial excessiva em relação ao P.V.A., existe uma
modificação definitiva da estrutura, a qual não é da competência do osteopata (ruptura).
Avaliação do estado do paciente | 87

surge subitamente e acontece um bloqueio: o pescoço gira e bloqueia, a


amplitude do movimento é limitada.
• Ou foi uma demanda temporal excessiva em relação ao D.F.H.9, isto
é, em relação ao normal? O pescoço gira várias vezes mais longe do que
o normal e a dor surge, só que o terapeuta não tem como saber se havia
uma lesão preexistente ou não. A dor se instala progressivamente sem
que haja necessariamente noção de bloqueio. Se não for o caso, só o
repouso será suficiente.
• Trata-se de uma demanda excessiva espacial e temporal (longe demais
e longo demais?)
O ideal é pedir para o paciente que represente, na medida do possível, o
fenômeno que desencadeou o problema. Deve ser requerido que tente mostrar
o que aconteceu. Foi por exemplo um acidente de skate? O joelho estava em
adução? Ou em rotação externa?... Isso fornecerá pistas biomecânicas a serem
pesquisadas.

Sobre o modo de expressão da lesão

Qual é o ritmo da dor e o tipo? Perguntar: que posição traz alívio? Que posição
agrava a dor? O paciente sente-se melhor sentado, em pé, deitado? Sofre durante
o dia principalmente? Ou à noite? Pela manhã?
Há uma irradiação nervosa, radicular (relatada) ou músculo-tendinosa (projetada)?
Qual o sentido de propagação da dor? Do aparelho locomotor em direção às
vísceras ou o contrário?
Qual é o fenômeno gerador (o qual não deve ser confundido com o fenômeno
disparador)?
O fenômeno disparador é uma informação procedente do meio exterior que
se torna insuportável para a estrutura no instante T. Ocorre uma demanda
excessiva espacial ou temporal em relação ao P.V.A.

9
Como no caso anterior, não devemos esquecer que se trata de uma demanda excessiva temporal (desgaste)
em relação ao P.V.A., há uma modificação definitiva da estrutura que não é da competência do osteopata.
88 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Caso particular dos pacientes que procuram o terapeuta quando a dor está
sumindo

São pacientes que não se apresentaram antes pois não dava para encostar neles,
ou porque alegam que em casos prévios idênticos melhoraram espontaneamente.
O terapeuta deve então se perguntar se é pertinente intervir ou não, e
“acessoriamente” se deve cobrar a consulta sem haver necessidade. Não deve
esquecer a máxima: o ótimo é inimigo do bom, principalmente quando se lida
com um paciente difícil, desses que voltam para reclamar do terapeuta por ter
acordado uma dor antiga que não sentiam mais antes da consulta, tornando-o
assim responsável dela.

Trata-se de uma dor crônica, aguda ou subaguda?

Trata-se de uma dor


• inflamatória (caracterizada por vermelhidão, temperatura, dor, que
acorda na segunda metade da noite e que é aliviada pelos anti-infla-
matórios)?
• mecânica, disparada pelo movimento e acalmada pelo repouso?
• nervosa: paroxística, como uma facada, em local preciso?
• vascular: mal definida, nunca insuportável, traduzida por temperatura,
sensação de inchaço, agravada pela imobilização e aliviada pelo movi-
mento, que se instala progressivamente? Ou é do tipo arterial, pulsátil?
• que poderia ter origem psíquica? São dores dificilmente objetivas,
sem suporte anatômico específico, cuja descrição é difícil, tanto para o
paciente como para o terapeuta
• imputável aos costumes, às emoções, à energética?

Avaliar as repercussões funcionais

Tem a osteopatia metropolitana e a osteopatia rural: “desde que meu joelho


dói, não consigo mais colher batatinhas”, ouvi de um paciente uma vez. Para
ele era fundamental e, portanto, muito incapacitante, sendo que se tratava de
Avaliação do estado do paciente | 89

um burocrata que passava a maior parte do dia sentado e não precisava usar
o joelho além demais, o que teria tido uma repercussão totalmente diferente.

Coerência entre o fenômeno disparador e a expressão da lesão

Trata-se de uma informação que evidencia uma lesão reversível pré-instalada


no tecido e muda (lembrando que a lesão é espontaneamente muda). Tratar-
se-á, portanto de uma exigência espacial ou temporal excessiva em relação ao
D.F.H. O fenômeno disparador não cria a lesão, ela já existe.
Quando há uma exigência espacial excessiva, sempre se trata de um evento
único. De outro modo, no caso da exigência excessiva temporal, trata-se de
exigências múltiplas sem respeito aos períodos de trabalho / repouso. É o caso
do burocrata que realiza sempre os mesmos gestos e que subitamente decide
pintar o teto. Como já não tem costume de levantar os braços, o gesto revela
a hipoexigência.
Se a variável de entrada e a variável de saída forem fortes, estaremos perante
uma exigência espacial excessiva em relação ao P.V.A. (ruptura). É imperativo,
nesse caso, consultar primeiramente um médico para verificar a inexistência
de uma lesão irreversível. Imaginemos o caso de uma pessoa que despenca de
um segundo andar e que reclama de dor no tornozelo: é necessário verificar
que não exista uma fratura (comprometimento da estrutura) no lugar de uma
entorse (reversível).
Se a variável de entrada e a variável de saída forem ambas fracas, existe coerência:
piso numa pedra e torço levemente o tornozelo, algo normal.
Se a variável de entrada for forte com uma variável de saída fraca, estaremos em
presença de uma incoerência positiva: o paciente despenca do segundo andar,
torce o pé, deduzimos que apresenta uma estrutura forte, mas por desencargo
é necessário consultar para verificar que não haja fratura, pois pode se tratar
de uma pessoa insensível à dor.
Se a variável de entrada for fraca com uma variável de saída forte, poderemos
inferir que a estrutura já tinha sido perturbada. Exemplo: me inclino para
90 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

pegar um copo d’água e sinto uma dor insuportável. A inclinação colocou em


evidência uma lesão já instalada, a qual pode justificar essa incoerência. Só resta
estabelecer se a lesão é reversível, ou seja, do domínio do osteopata, ou não.

Avaliação do contexto

• Estado geral
Mediante perguntas a respeito do apetite, uma eventual perda de peso, fadiga,
transtornos do sono, estresse, um desequilíbrio psicoafetivo. É a intuição do
terapeuta a que lhe permitirá descobrir o pequeno detalhe que fará a diferença
e que (talvez) o coloque na trilha.
• Costumes presentes e passados que permitem avaliar o estado de
saúde em relação ao P.V.A.
Alguns indivíduos funcionam no limite de seu P.V.A. É o caso típico do
desportista de 40 anos que se recusa a envelhecer e faz de tudo para se manter
jovem. Funciona no limite de seu P.V.A., portanto tem poucas lesões mas seu
potencial é frequentemente colocado em xeque e apresenta mais risco de lesão.
Pelo contrário, tem aqueles que fizeram muito esporte, que cansaram e
subitamente não fazem mais nada. Apresentam diversas lesões osteo-páticas
associadas a essa demanda reduzida. Devem ser enquadrados e reformular
seus costumes.
E também, assim como já foi dito, não devemos esquecer de considerar todos os
elementos afetivos, emotivos e ambientais que podem ter provocado uma lesão.
• Não esquecer de procurar eventuais lesões “extra somáticas”.
Avaliação do estado do paciente | 91

QUESTIONÁRIO RESUMIDO

• Onde o paciente sente dor?


• Quando começou?
• O que aconteceu? (conhecimento do fenômeno disparador)
• Como a dor se manifesta? Ritmo? Tipo? (modo de expressão
da lesão)
• Existe coerência entre o fenômeno disparador e a expressão
da lesão?
• P.V.O., P.V.A. e costumes de vida
• Antecedentes?
• Avaliação do estado geral
• Procura de uma eventual lesão extra somática
• Diagnóstico de exclusão

4. A palpação

A palpação permitirá sentir a eventual existência da lesão, localizá-la e medir


sua importância.
Os sentidos do terapeuta lhe outorgarão todas as informações, todavia, mesmo
prestando imensos serviços, os sentidos às vezes também podem enganar. Por isso:
• o terapeuta deve zerar seu sistema antes da palpação para tentar ser o
mais neutro possível.
• não deve haver empatia com o paciente.
Quando essas condições se cumprem, diferentes testes permitem confirmar
a existência de uma lesão, avaliá-la com precisão, e em função disso, adaptar a
manipulação.
92 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

O teste de resistência

O terapeuta sentirá uma resistência ao apoio pelo relaxamento dos músculos


eretores. Tornará então seu membro superior suspenso em membro portador,
o qual comunicará com o solo mediante apoio no paciente.
Concretamente, vai alinhar seus ossos colocando peso. Deverá se apoiar ora à
direita, ora à esquerda, girando no eixo de sua coluna.
É importante lembrar que se o terapeuta não tem certeza na palpação, vai
reproduzir várias vezes o gesto e assim repetir o movimento sobre um tecido
com perda de vascularização, modificando o estado tissular local, o que vai
falsear o teste. Conclusão: quanto mais duvidar, menos irá sentir o tecido lesado.

O teste de penetração

Permite sentir alternadamente a pele, a gordura, o músculo e o osso.


Utiliza o princípio da dureza: para penetrar o corpo alheio, é necessário que o
corpo penetrante seja mais duro.
Avaliação do estado do paciente | 93

Simultaneamente, devemos respeitar a lei do menor esforço.


Durante o teste, existe continuidade entre o corpo do terapeuta e a lesão.
Lembrete: o terapeuta não deve deformar seu corpo, para transmitir a
compressão óssea focada nos seus antebraços, e deve ter consciência da
amplitude do jogo articular disponível.

O teste do gelo

Imagine um gelo dentro de um copo d’água. Tente afundá-lo com o dedo e


retirar o mesmo sem perder contato com o gelo. Acontece exatamente a mesma
coisa com uma articulação. Também poderíamos afundar o indicador numa
bexiga semicheia: ao retirar o dedo, sentiríamos a pressão da bexiga empurrando
o dedo, sem perda de contato.
Antes de efetuarmos o teste de resistência, entramos em contato através da pele,
do tecido adiposo, do músculo e do osso, isto é, testamos o tecido conjuntivo
articular.
Se a articulação for sadia, a peça óssea agirá como o gelo.
Pelo contrário, em caso de lesão acharemos:
• um tecido conjuntivo pouco deformável.
• uma peça óssea que resistirá à movimentação.
Havendo na palpação uma sensação de volume e dureza, e se o paciente estiver
com sensibilidade local, poderemos ter certeza da existência de uma lesão.
O teste de resistência é primordial, pois o gesto terapêutico decorrerá do seu
resultado:
• O teste completa a análise intelectual e traz informações essenciais e
indispensáveis para a manipulação.
• A palpação é a que fornece as informações decisivas sobre o estado da
estrutura e da lesão, antes da intervenção (ou não intervenção).
Podemos perceber, neste procedimento, a importância da qualidade da palpação
e a predominância do aspecto sensitivo sobre o aspecto intelectual na exploração
da mobilidade de uma estrutura anatômica.
94 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

5. Avaliação das qualidades dinâmicas

A mobilização do paciente é passiva: o paciente deve relaxar e é o terapeuta


quem o mobiliza.
Os contatos devem ser precisos: o terapeuta deve para tal efeito ficar o mais
perto possível da área testada. De fato, para testar a articulação, o ponto de apoio
deve ser duro, não pode ser mole.
A avaliação é ao mesmo tempo quantitativa e qualitativa. O terapeuta avalia a
amplitude do movimento dentro dos limites de funcionamento habitual da articulação
(D.F.H.), e avalia também o fato de que o movimento seja livre ou restrito.
Pode ser estabelecida uma comparação com as articulações contralaterais de
forma periférica, mesmo não sendo o ideal. É necessário aprender como testar
cada articulação em relação a ela mesma, pois todas têm sua própria história e, às
vezes, algumas envelhecem mais do que outras.

Teste dos polegares erguidos:

• Teste de flexão10 em pé (ou TFP): em caso de lesão osteopática


sacroilíaca ou na sínfise púbica, quando a pessoa se inclina para frente,
um polegar sobe mais do que o outro, do lado onde existe um problema.
• Teste de flexão em sentado (ou TFS): ele informa da existência de
uma lesão osteopática onde o sacro reveste mais importância do que o
ilíaco.

As leis de Fryette

• FRS (Flexão, Rotação, Inclinação lateral) e ERS (Extensão, Rotação,


Inclinação lateral) em rotação homolateral.
• NSR (Rotação Lateral Neutra): a inclinação lateral acarreta uma
rotação contralateral em posição neutra.
10
A flexão será estabelecida mediante inclinação do sujeito para frente: teremos então uma divergência das
superfícies articulares, um alongamento do ligamento interespinhoso, portanto uma compressão anterior
do disco vertebral. É importante destacá-lo, pois para uma determinada corrente osteopática a flexão é a
acentuação das curvaturas naturais, ou seja, para trás.
Avaliação do estado do paciente | 95

• O problema de tais leis é que elas explicam o funcionamento quando


tudo corre bem, mas não o contrário. Quando existe traumatismo, não
tem lei que explique e o segmento analisado faz o que puder.

Existem diversos outros testes dinâmicos

• Por exemplo, os testes de Downing e Gillet. Todavia, é melhor se


limitar a dois ou três testes e escolher um que seja do nosso agrado, antes
do que multiplicar os testes.
O diagnóstico osteopático não leva em consideração a nosologia,
independentemente dos conhecimentos do terapeuta. Geralmente o diagnóstico
acontece a posteriori, conforme o resultado da sessão. Na melhor das hipóteses,
o paciente não sente mais dor. Pelo contrário, se o terapeuta tiver errado o
percurso, é indispensável que o tratamento, mesmo não tendo sido eficaz em
relação à queixa do paciente, não tenha provocado um aumento da dor.

CONCLUSÃO

Tendo analisado a questão plenamente, o terapeuta deve se perguntar se a


queixa é da sua competência.
Mesmo que a anamnese e a palpação costumem ser suficientes para avaliar o
sistema locomotor, a situação muda quando se deve avaliar um organismo como
um todo. Se o reflexo, a visualização, auscultação, percussão, palpação e testes
dinâmicos resultam insuficientes, em caso de dúvida devem requerer-se exames
complementares ou então encaminhar o paciente a outro terapeuta. Jamais o
osteopata será cobrado por ter requerido um exame complementar, porém a
recíproca não é verdadeira.
96 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

O PARTICULAR E O GERAL

1. Axiomas

O terapeuta vai partir de um sintoma, isto é, de um fenômeno lesional (dor,


rigidez…) para procurar uma eventual lesão osteopática.
Essa procura será orientada do particular ao geral, ou seja, de uma lesão local
em direção a uma lesão distante, contrariamente ao que preconizam as escolas de
osteopatia que não associam a etiopatia, do geral ao particular.
Exemplo: uma paciente consulta por um problema de joelho e reclama da
dificuldade que sente por isso no cotidiano.
“Há quanto tempo você está com essa dor?
– A dor aumentou após uma discussão pesada com meu marido…”
Deveríamos então sugerir à paciente que a solução seria uma separação?
Impossível, obviamente. Trata-se primeiramente de um problema de joelho. Pensando
na eficácia e para não cair dentro de um labirinto de considerações que não resolverão
a questão do joelho, utilizaremos a queixa e trataremos o problema particular nos
afastando progressivamente dele, isto é, indo do particular em direção ao geral.

2. Fenômenos lesionais particulares

• Como resultado de uma lesão são solidários e dependentes. Aparecem


e somem junto com ela.
• Constituem uma resposta lógica do organismo e específica da estrutura
da qual dependem: tosse no caso dos brônquios, diarreia no caso dos
intestinos, vômito no caso do estômago…
• Perduram após a cessação dos fenômenos disparadores. Por exemplo,
um ciclista pode ficar com dor no joelho mesmo tendo deixado de
pedalar.
• A dor é precisa, o edema, a inflamação ou a temperatura são localizados,
pode haver secreção glandular excessiva ou hipossecreção (transpiração),
ou transtornos circulatórios concomitantes.
Avaliação do estado do paciente | 97

• Podem ser a expressão de variáveis de regulação deficientes. Trata-se


então de mensagens internas ruins.
Observação: Existem fenômenos lesionais agudos diferentes, por exemplo,
os poli traumas!

3. Fenômenos lesionais gerais

Representam as reações gerais que várias lesões têm em comum. Podem também
decorrer de um conjunto de lesões com um eventual desenvolvimento microbiano,
ou de uma única lesão que atinja uma estrutura com repercussão geral. Podem
envolver febre, emagrecimento, fadiga, insônia, transtornos psíquicos, digestivos
ou circulatórios…
• O particular pode levar ao geral ou revelá-lo
Exemplo: uma entorse pode provocar dor na coluna e (ou) revelar
uma depressão latente.
• O geral pode levar ao particular ou revelá-lo
Exemplo: o cansaço pode revelar um problema na coluna.
Exemplo: Vou correr na praia: é uma atividade geral que faz intervir quase todo
o organismo. Essa atividade pode gerar várias situações:
• Dói por toda parte, estou cansado, sem fôlego, meu coração está
acelerado, transpiro: ainda estamos no domínio do geral (o geral
acarretou o geral).
• Não estou particularmente ofegante nem cansado, mas sinto
repentinamente uma dor no joelho direito: é uma dor peculiar. O fato de
correr (do domínio geral) revelou uma fraqueza particular no joelho.
• Não estou nem cansado nem ofegante, mas começo a sentir dor no
joelho. Na verdade, acontece que não estou pisando bem pois estou sem
calçado adequado. Nesse caso, o particular (uma questão de calçado)
gerou uma dor particular no joelho, o qual de outra forma não teria dado
qualquer problema.
98 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

No primeiro caso a dor foi revelada, no segundo caso a dor foi gerada.

• Por conta da dor persistente no joelho, entro em depressão: nesse caso,


o particular acarretou (ou revelou) uma expressão geral: a depressão.

4. Conceitos alopático e osteopático

Na medicina alopática, o corpo é dividido em “partes”: se o paciente reclama da


articulação do cotovelo, considerar-se-á geralmente que o cotovelo deve ser tratado,
sem procurar saber se a dor tem outra origem. Porém, o paradoxo é que com exceção
de alguns tratamentos locais, a medicina alopática trata a maioria dos problemas
particulares (inflamação, ciática, colite…) com medicamentos administrados por
via geral (oral, retal, injetável…), e tais medicamentos, sejam anti-inflamatórios,
anti-infecciosos ou antálgicos… terão necessariamente uma repercussão global.

Nesse conceito, a noção de geral ou particular é pouco levada em conta.

Inversamente, a osteopatia utiliza técnicas particulares que terão uma repercussão


sobre o particular e também sobre o geral quando forem aplicadas a estruturas
com uma repercussão geral.
O diagnóstico alopático terá, portanto um interesse bastante limitado para o
osteopata que estabelecerá o seu com uma visão muito mais geral do paciente,
porém procurando restrições de elasticidade e mobilidade, que por sua vez serão
particulares.

Enxaquecas catameniais

A menstruação é um fenômeno fisiológico e não uma doença. Normalmente


deveria ser quase indolor.
Quando é patológica, costuma ser dolorosa e até muito dolorosa, associada a
transtornos do caráter e fenômenos congestivos, e às vezes enxaquecas, que podem
se estender no tempo, ao ponto que algumas mulheres só vivem em função de suas
regras. É uma manifestação geral.
Avaliação do estado do paciente | 99

No caso das enxaquecas menstruais, existe ao mesmo tempo um DFF da cabeça


e uma leve congestão da pelve. Assim sendo, trata-se primeiramente a enxaqueca
e logo após analisa-se o sistema ginecológico:
• localmente
• se quisermos ser mais precisos, pesquisando as variáveis de regulação
dos ovários (D10/L1) para o sistema simpático e S2/S4 para o sistema
parassimpático) e do útero (D9/L2 para o sistema simpático e S2/S4
para o sistema parassimpático)

Eczema

O desequilíbrio ácido-base se expressa na pele. Se estiver involucrando:


• a mão toda: devemos agir na 1 costela (gânglio estrelado, plexo solar)
do mesmo lado da mão
• as duas mãos: devemos agir nas duas mãos no geral, ou seja, nas
dorsais
• as mãos e os pés: trata-se de um problema circulatório puro (geral,
pois envolve a circulação). Deveremos cuidar do geral, ou seja, da cadeia
ascendente
• se for disseminado: trata-se de um problema geral que requer pesquisar
as variáveis de entrada (alimentação, água, leite, açúcar), o estresse,
o ambiente, o funcionamento emunctorial e as variáveis sistêmicas
(intestino, mucosas genitais, pulmões, lágrimas).

Quando nenhuma lâmpada funciona na casa, é bom conferir o quadro geral!

• Sinusite alérgica/Sinusite maxilar: Qual diferença entre as duas?


A sinusite alérgica é uma manifestação geral, enquanto a sinusite maxilar é uma
manifestação geral que se expressa em local fragilizado, particular.
Nesse caso, manipularemos no intuito de agir sobre as córtico-suprarrenais (D10/
D12), as mucosas do nariz (C3/C5) e do duodeno (D7/D9), para a assimilação.
Também eliminaremos obviamente os eventuais agentes alérgenos (açúcares e leite
100 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

de vaca, geralmente). Em primeiro lugar, efetuaremos um tratamento craniano,


partindo do particular, e logo analisaremos as dorsais altas, a charneira cervicodorsal
e o pescoço.

5. Conduta perante o geral

Devemos aplicar as técnicas em relação à cadeia ascendente, isto é, cuidar das


estruturas particulares que têm incidência geral: a pelve, a charneira dorsolombar,
OAA, a subtalar, o fígado… Assim, poderemos efetuar a grande manobra cardio-
dinamogênica de Stapfer e Brandt, para problemas viscerais gerais.
O cruzamento entre o particular e o geral corresponde ao fator disparador. Por
exemplo, o frio (geral) pode revelar um problema do maxilar (particular), da mesma
forma que uma dor na coluna (particular) pode evidenciar um estado depressivo
latente (geral) e vice-versa.
Nós faremos, portanto, as seguintes perguntas retomando os casos prévios:
• É melhor tratar a mão ou o eczema? As preocupações ou a mão? Ou
ambos?
• É melhor tratar a depressão ou a coluna?
É necessário ponderar a pertinência das estratégias terapêuticas e ter consciência
da globalidade, sempre lembrando do fato de que as interações são complexas e
que só podemos controlá-las parcialmente.
Avaliação do estado do paciente | 101

O SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO OU OS SISTEMAS


SIMPÁTICO E PARASSIMPÁTICO

1. Sistema simpático

É responsável pela regulação das funções automáticas internas do organismo.


Prepara o organismo para a ação. Perante um estresse importante, organiza a
resposta de combate ou de fuga. Para tal efeito, dilata os brônquios e acelera
a atividade cardíaca e respiratória, aumenta a pressão arterial, dilata as pupilas,
aumenta a transpiração: coloca o organismo em condições de ver bem e respirar
bem para fugir ou combater. Está associado à atividade de dois neurotransmissores:
a noradrenalina e a adrenalina.

2. Sistema parassimpático

Pelo contrário, corresponde a uma resposta de relaxamento. Provoca uma


reduzida geral das funções do organismo. Diminui o ritmo cardíaco, a respiração
e a pressão arterial. Favorece a digestão e o apetite sexual. Está associado ao
neurotransmissor acetilcolina.

É a história da cigarra e da formiga: uma gasta (simpático), a outra poupa (parassimpático)

Não devemos teimar em opor sistematicamente e funcionalmente o Simpático


e o parassimpático, pois este último deve ser considerado não como o antagonista,
mas como o regulador do simpático. São indissociáveis e complementares. É
como o céu e a terra, o yin e o yang… Um não existe sem o outro. As diferentes
manifestações do esquema de manutenção jamais devem ser consideradas de
forma isolada, pois todos os elementos nervosos não param de agir e reagir uns
com os outros.
De um ponto de vista osteopático, o sistema Simpático é o particular, é a
regulação arterial in situ, local.
O parassimpático é o geral.
102 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Exemplo: Coordena o sistema. Quando me alimento, para que o bolo alimentar


avance, os esfíncteres sucessivos precisam se abrir e se fechar em função da
mensagem recebida. A vesícula biliar se contrai quando a comida chega no
duodeno.
Não se trata o Simpático ou o parassimpático, tratam-se as lesões.

3. Como atingir o sistema autônomo?

No caso do parassimpático, pela mecânica do tecido conjuntivo in situ (gânglios


localizados dentro dos órgãos) e também pela C0/C1 (no tocante à parte que vai
do ceco até o ângulo cólico esquerdo) e o sacro (a parte baixa).
No caso do simpático, pelo tecido conjuntivo das articulações vertebrais,
para agir sobre a cadeia látero-vertebral e a zona intermédia-lateral (ZIL), por
via hormonal: sobre a hipófise (crânio, C0), sobre a tireoide (C5/C7), sobre as
suprarrenais (D10/D12) e as gônadas (pelve e zona D9/L2).
Como não é possível estimular diretamente o parassimpático, utilizaremos o
simpático para regular o equilíbrio orto/para. No caso do forame jugular, utilizaremos
o simpático para melhorar as condições locais, mas não teremos ação direta.

4. Distribuição dos centros parassimpáticos

• Os centros parassimpáticos intraneurais


Estão localizados na zona intermédia-lateral (Z.I.L.), de C8 a L2. São
os centros reguladores da vascularização somática e visceral, e da
motricidade visceral.
• Os centros parassimpáticos extra neurais
São os centros reguladores principais da vascularização somática: cadeia
látero-vertebral, indo da C1 até o cóccix.
São os centros da motricidade e da vascularização visceral: cadeia
pré-vertebral ou plexo indo da D5 até a L2.
Em osteopatia, não podemos ter ação direta sobre a zona intermédia-lateral,
mas é bom saber que ela existe. Em compensação, podemos agir sobre o simpático
Avaliação do estado do paciente | 103

de forma razoavelmente direta, através do tecido conjuntivo da coluna vertebral,


e assim agir sobre o esclerótomo da seção vertebral manipulada.

5. Regularização da vascularização por região

• Na cabeça: ZIL da D8 à C4, ou através dos gânglios simpáticos


cervicais (gânglios cervicais superior, médio e inferior), que fazem parte
da cadeia extra neural.
• Nos membros superiores: ZIL da D8 à C8 (ou D1 à D6, segundo
alguns autores) e na cadeia de gânglios simpáticos cervicais médio e
inferior, da C4 à D8, junto com as raízes pertinentes.
• Nos membros inferiores: Z.I.L., da D8 à L2 (ou D11 à L2, segundo
alguns autores) e gânglios simpáticos, da D12 ao cóccix
• Nos órgãos (vascularização e função): Z.I.L., da C8 à L2, e gânglios
simpáticos e plexo pré-aórtico (ou pré-vertebral).

6. Aplicação em caso real

No passado precisei tratar um jogador de rugby profissional que tinha me


consultado devido a problemas recorrentes de dor nas costas. Ele consultava
o osteopata de seu clube toda semana sem que seu estado melhorasse. Pedi
que me contasse o que tinha acontecido previamente no âmbito médico.
Explicou-me que tinha operado o joelho seis meses antes, sem que isso trouxesse
um verdadeiro alívio. Ele já tinha operado o outro joelho anteriormente, mas
isso também não tinha dado resultado. Após essas duas intervenções, padecia
diversas contraturas e rupturas na coxa. Tentei, portanto, enxergar que zona
comum a ambos joelhos podia estar involucrada. Pensei que fosse, sem dúvida,
um problema geral de ambos joelhos, em lugar de dois problemas particulares.
Todavia, a L3, área onde o paciente sentia dor, correspondia ao dermátomo dos
joelhos. Como a L3 está ligada ao quadríceps femoral e uma parte do sistema
prostático, perguntei ao paciente se não tinha observado disfunções por esse
lado. Ele falou que estava tudo bem, porém a esposa retificou e disse que no
104 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

quesito sexual rendia “menos”. Efetuei então um trabalho interno (autorizado


nessa época), o qual resolveu o problema muito rápido e de vez.

CONCLUSÃO

Este exemplo coloca em evidência a importância da anamnese: ela nos conduzirá


ao específico ou ao geral.
É preciso sempre começar pelo alvo para não se perder, pelo local e foco regional
antes de pesquisar as variáveis de regulação do sistema mecânico, neurológico e
neurovascular, sem esquecer os outros sistemas (a cadeia ascendente, descendente,
visceral) e os diferentes níveis de complexidade: alimentação, psicológico, costumes…

Trataremos o específico sem perder de vista o geral.


Avaliação do estado do paciente | 105

NOÇÕES DE AGUDO E CRÔNICO

1. O agudo

O agudo é inacessível nos testes de resistência, devido à dor. Se o paciente


sente muita dor, não por isso se trata de agudo segundo nossa definição, pois
a taxa de sensibilidade varia muito entre os indivíduos. Como o terapeuta não
pode tocar o paciente, refere-se às perguntas e ao exame visual (sob reserva do
diagnóstico de exclusão). A maioria dos testes funcionais previamente citados
definitivamente não são adaptados a esse tipo de lesão: como o paciente sente
muita dor, não pode inclinar-se nem girar. Além disso, a postura antálgica modifica
as leis da biomecânica.
A postura antálgica é a que coloca a zona dolorida em posição de menor atrito.
Espontaneamente as peças ósseas fogem da dor. Se um nervo fica “preso” entre
duas vértebras, o paciente adotará naturalmente uma posição que afastará tais
vértebras. Se o paciente estiver em flexão e rotação direita, isso significa que uma
peça óssea na proximidade se encontra em rotação e extensão esquerda.
No absoluto, o tratamento consiste em ir na direção oposta à postura antálgica.
Envia-se uma informação ao tecido conjuntivo necessária e suficiente para acarretar
um reflexo e permitir uma modificação tissular local. A vértebra é “recolocada”
no lugar.
Duas situações diferentes, conforme o paciente aponte para a dor com o dedo
(podemos então pensar que a estrutura designada encontra-se em causa diretamente)
ou com a mão toda: nesse caso, todas as áreas subjacentes estarão involucradas ou
então a causa encontra-se distante.
Exemplo: segundo as leis de Fryette (N.S.R.) a respeito das cervicais, quando
inclinamos a cabeça à direita, isto é, quando a orelha se aproxima dos ombros, a
articular direita desce e recua, a articular esquerda sobe e avança. Se o paciente
inclina a cabeça levemente à direita e reclama da articular direita, podemos pensar
que a mesma não quer recuar. Estaremos perante uma anterioridade ou uma flexão
106 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

à direita. Se em contraposição o paciente tiver indicado que doía à esquerda no


início da inclinação à direita, podemos pensar que se trata da articular esquerda que
não quer avançar. Nesse caso, temos uma posterioridade ou extensão à esquerda.
Como aconteceu tudo (fenômeno disparador)? O tipo de dor deve confirmar
a postura antálgica para determinar se o problema é mecânico ou não (vide o
capítulo da anamnese). Se o paciente estiver flexionando o troco, mas reclama de
dor na região mais alta da coluna, há incoerência.
Há quanto tempo a dor surgiu? Existe uma proximidade direta no tempo entre
a dor e o fenômeno disparador? Se o paciente afirma ter transportado uma carga
pesada três dias atrás, mas a dor apareceu recentemente, há incoerência. Para que
exista uma verdadeira lesão mecânica, a dor e o bloqueio devem se localizar no
mesmo ponto.
No caso agudo, existem duas configurações:

Fenômeno hiper espacial em relação ao D.F.H.

Repentinamente, o paciente foi muito longe em relação ao D.F.H.: é o que as


pessoas chamam no cotidiano de movimento “em falso”. Já tem uma lesão e
o movimento, mesmo sendo limitado, vai evidenciar restrições mecânicas que
já estavam perturbadas. No caso desse evento único, o paciente sente uma
punhalada e não consegue mais se mexer. Assim sendo, o teste de resistência
é impossível, mas a anamnese e a observação visual mostram que há dor e
bloqueio: o paciente aponta para a área dolorida com o dedo.

Fenômeno hiper temporal em relação ao D.F.H.

É um gesto reiterado no tempo sobre uma estrutura já fragilizada. Por exemplo:


Jacqueline, caixa no supermercado, já tem uma lesão muda na região lombar.
Durante o dia inteiro ela mobiliza objetos mais ou menos pesados de um lado
a outro do caixa. No final da jornada, sente dores intoleráveis. Nesse caso, a
anamnese e a observação visual mostram que há dor mas há mobilidade.
Quando Jacqueline deve responder onde sente dor, utiliza a mão toda para
Avaliação do estado do paciente | 107

designar a zona dolorida. Duas hipóteses: uma hiper demanda após uma demanda
reduzida à proximidade ou à distância, ou esforço demais para uma estrutura
que não está acostumada ou que não teve suficiente tempo de repouso. Nesse
caso, recomendaremos repouso em primeiro lugar e na frente uma reorganização
do cotidiano no retorno à normalidade.
Outro exemplo: alguns anos atrás, um vizinho bem idoso me deu seu carro.
Por fora o veículo estava novo, mesmo tendo quarenta anos de uso, conforme
o documento. O dono sempre o tinha utilizado uma única vez por semana
para rodar menos de um quilômetro. Até aí tudo bem. Agradeci e fui embora.
Porém, a dois quilômetros de distância, o motor pegou fogo. Na verdade, mesmo
a lataria estando impecável, a mecânica que não tinha costume de percorrer
mais do que um quilômetro por vez não aguentou o tranco. Enquanto não
exigissem dela que fosse além de uma certa distância, ainda iludia no tocante
à sua capacidade real. Ao ir além da exigência habitual do motor, coloquei em
evidência que a mecânica, apesar das aparências, já não estava em condições.
Quer seja uma hiper exigência espacial ou temporal, o terapeuta deve enviar
uma única informação: chegar perto da área onde existe supostamente uma
lesão e realizar um thrust muito curto com uma tensão bem leve, muita rapidez
e principalmente sem peso. O contato será ao mesmo tempo denso e leve,
reduzindo o crédito da pele. É necessário, se for possível, efetuar um trabalho
funcional próximo e (ou) à distância (craniano ou visceral suave), breve (quanto
maior for a dor, menor o trabalho). Também recomendaremos repouso e
aconselharemos o paciente em relação a seus costumes diários: beber mais
(água…), alongar, praticar uma atividade física…

2. O crônico

É o contrário do agudo! Portanto podem ser aplicados os testes de resistência.


A zona dói e é menos móvel. Não há verdadeiramente uma postura antálgica, mas
os movimentos extremos provocam dor. Quando a pessoa aponta para a área
dolorida com o dedo ou a mão, é possível testar a qualidade do tecido conjuntivo
108 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

mediante teste de resistência, sendo que quanto mais testes houver, maior será a
modificação da qualidade tissular local por conta do movimento. Por isso os testes
não devem se multiplicar. Idealmente a palpação e a manipulação serão simultâneas.
No caso crônico, não estaremos perante uma única lesão, mas perante uma
somatória de lesões: uma lesão ou DFF vertebral + uma lesão ou DFF craniana
+ uma lesão ou DFF visceral + … que descompensam. Uma patologia sempre é
multifatorial, com uma parte mecânica, neurológica, vascular, psíquica, energética,
ambiental e rotineira. Em função do momento, o patamar da dor sobe: é a gota
que revela que a garrafa d’água está cheia.
Na figura, dois ossos, A (ou A1, A2, segundo o estado do paciente) e B, B
sendo fixo.
No caso crônico (em vermelho na figura), A pode se mexer em relação a B
desde o D.F.H. e até o limite D.F.O./DFF (lesão).
Em subagudo (em azul na figura), a mobilidade será reduzida: A1 se encontra
bloqueada no D.F.O., o movimento será direcionado ao D.F.H., menos doloroso,
e não ao DFF, muito doloroso.
A = Crônico
A1= Subagudo
A2= Agudo
Avaliação do estado do paciente | 109

No caso agudo, a A2 fica bloqueada no DFF (nos três planos do espaço).


Recentemente, Jean-Pierre chegou no meu consultório: “As minhas costas estão
doendo um pouco há algum tempo…” Ao interrogá-lo, descubro que também padece
problemas conjugais, que acabou de se mudar para o campo sendo que prefere
a cidade, que não gosta da nova casa, e que acabou de saber que seus impostos
subiram. A conjunção de todos esses problemas foi o que desencadeou as dores.
Segundo a importância dos compartimentos, o tratamento varia. Se o compartimento
mecânico for mais importante, mas os hábitos forem bons, a consulta ao osteopata
justifica-se; porém, se o compartimento ambiental for desfavorável em relação ao
compartimento mecânico, o osteopata não poderá fazer grande coisa. Para uma
mesma patologia, o paciente fala: “fui consultar o osteopata, não mudou nada.
Mas quando apelei ao magnetismo, foi maravilhoso”. O que o paciente não sabe
é que o osteopata talvez tenha modificado suas capacidades de adaptação, e que
sem isso o trabalho energético não teria sido eficaz.
O bom osteopata deve poder decodificar a importância relativa dos
compartimentos, para encaminhar o paciente ao terapeuta pertinente, seja médico,
acupunturista, psiquiatra...

Teoria dos plots

M = mecânico M
............limiar da dor

N = neurológico N

V = vascular V

Amb = ambiente Amb

Psi = psicológico Psi

Ener = energéca Ener


Cos = costumes Cos
PVA = Potencial Vital Atualizado PVA
110 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

O terapeuta explorará o DFF, o contato será feito em função da lesão, e aplicará


mais peso no thrust.

CONCLUSÃO

• No caso agudo, podemos afirmar que se mexe um osso em relação a outro osso
• No caso crônico, efetua-se a manipulação em todas as direções ao redor
da lesão para modificar a qualidade do tecido conjuntivo local e recuperar as
capacidades de deslizamento, giro e rolamento.

As regras do jogo, portanto, são totalmente diferentes

AGUDA SUBAGUDA / CRÔNICA MUDA / CRÔNICA

Dolorido e bloqueado Dolorido e móvel Indolor e móvel

DFO: mobilidade quase


DFH: mobilidade possível
DFF: mobilidade nula ou quase (1) nula a moderada, possível
até o DFF (3)
do DFH até o balanço (2)

Diagnóstico oral e Diagnóstico mediante


Diagnóstico oral e visual
palpação palpação

Diagnóstico fácil, tratamento difícil Costuma ter acúmulo de Diagnóstico difícil,


(manipulação) lesões a distância tratamento fácil

(1) DFF: o balanço se encontra praticamente bloqueado no DFF.


(2) DFO: o balanço se encontra entre o DFF e o DFO.
(3) DFH: o balanço se encontra bloqueado no DFH.
As dez etapas da manipulação

O MATERIAL

Antes de falar da prática em questão, devemos tratar do material que


permitirá ao terapeuta ter os bons gestos e ao paciente estar nas condições
ótimas de aplicação. É frequente vermos nos consultórios macas inadequadas,
tradicionalmente utilizadas por fisioterapeutas, altas demais, largas demais ou
frágeis demais. Um terapeuta que trabalha com uma maca alta vai aplicar força
nas manipulações, inclusive velocidade, mas não poderá aplicar peso, sem ter
como empilhar os ossos e transferir o peso do corpo sobre a área a ser tratada.
Portanto, preconizo o uso de uma maca sólida, com o plano horizontal à
altura da patela do terapeuta, relativamente estreita (da largura dos ombros), com
encaixes na altura dos ombros para que o paciente possa deixar recair os braços
em decúbito ventral e relaxar os ombros. A maca deve apresentar também um
afundamento longo e suficientemente largo (eventualmente duas aberturas) para
receber o rosto do paciente totalmente e permitir flexões, extensões e rotações
da cabeça.
112 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

DEFINIÇÕES: SLACK, KICK, THRUST

1. O slack

Segundo as escolas é a redução do jogo articular ou da barreira motriz, e


representa inclusive a barreira de focalização.
O slack corresponde a um percurso linear nos três planos espaciais, percurso
que pode ser curto ou longo conforme a importância do D.F.H.
O terapeuta deve controlar sua força muscular e o relaxamento de seus
músculos eretores, para se manter passivo ao máximo, pois quanto mais passivo
for, mais precisas serão as sensações.
Em compensação, o terapeuta deve se tornar denso e travar bem a escápula
sobre o arco costal costal, empilhar seus ossos e constituir uma continuidade
óssea indeformável.
Logo após irá transferir seu centro de gravidade em direção à lesão, sempre
em perfeito equilíbrio, daí a necessidade de se manter perfeitamente estável
durante toda a transferência de apoio11.
A respiração desempenha uma função capital no slack. Tudo é questão de
leveza: o slack deve ser fácil, nada deve ser forçado. Para tal efeito, o terapeuta deve
utilizar sua própria respiração e a do paciente: a duração total da manipulação é a
duração de uma expiração. Geralmente há duas ou três previamente, o tempo que
leva para o terapeuta se colocar no ritmo com o paciente. O final do slack deve
coincidir com o final da expiração de ambos e com o início da lesão, no tempo
e no espaço. A dificuldade consiste em não ir longe demais para não provocar
dor, daí a necessidade para o terapeuta de ficar na escuta de suas sensações.
Frequentemente apela-se à imagem de um gelo na água. Se quisermos afundar
o gelo na água, devemos apertar levemente com o dedo, mas se continuarmos

11
A transferência de apoio consiste em transferir mediante as cadeias ósseas a expressão do corpo do
terapeuta através da lesão. É um exercício realizado abundantemente em sala de aula e que permite trabalhar
praticamente sem ação muscular, de forma que a lesão possa ser sentida o máximo possível. Vide o que foi
dito acima: “Quanto mais agirmos, menos sentiremos”.
As dez etapas da manipulação | 113

apertando, poderemos afundar o dedo indefinidamente. No caso do paciente, é


necessário que o terapeuta suspenda quando achar uma zona de maior densidade,
para não suscitar informações não receptivas. Isso supõe que apoie sem apertar
(há uma diferença sutil), com suficiente leveza para suspender no momento certo, porém
mantendo o elo com o paciente.

2. O kick

O kick consiste no contato do joelho do terapeuta com a face interna da


coxa do paciente deitado na maca. A crista tibial entra em contato com a face
externa do joelho do paciente. O pé do terapeuta fica de fora, não deve entrar
em contato com o joelho do paciente.
O kick serve para:
• estabilizar o paciente deitado sobre a mesa em decúbito lateral
• organizar o segmento subjacente que deve ser manipulado, variando
os movimentos de flexão-extensão, adução-abdução e rotação da
coxofemoral
• favorecer a abertura das sacroilíacas
• orientar as lombares nos três planos espaciais
• amplificar o thrust, sendo que tal posição aumenta o alavancamento
do terapeuta
Com a técnica de decúbito lateral ou lumbaroll, o kick pode permitir um
trabalho em três planos:

ao redor do eixo da coluna:

quando o pé do terapeuta desce verticalmente em direção ao chão, o terapeuta


trabalha ao redor do eixo da coluna: o sacro permanece no plano vertical e a
continuidade da perna do terapeuta abre e afasta o ilíaco da sacroilíaca, enquanto
mantém o sacro na vertical. Nesse caso gira ao redor da coluna, seu eixo não
é modificado e a articulação superior, seja lombar ou sacroilíaca, não se mexe.
Apenas os isquiotibiais do terapeuta trabalham.
114 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

É importante que o terapeuta segure a perna do paciente entre seus joelhos


para imobilizá-la.
É uma técnica principalmente muscular para o terapeuta, portanto excelente
para trabalhar em casos subagudos (falaremos do assunto adiante).
As dez etapas da manipulação | 115

Primeira opção:

a partir da mesma posição, o terapeuta alivia seu apoio patelar na face interna
da coxa do paciente, transfere seu peso à peça que será manipulada (lombar
ou sacroilíaca), fixando-a na maca e efetuando um retrocesso da coxofemoral
com uma leve descida do joelho, podendo decoaptar as apófises articulares
subjacentes (zigoapofisárias) mediante a utilização de um pouco de peso.
Excelente técnica para trabalhar nos casos crônicos, pois podem ser aplicados
peso e verticalidade.

Segunda opção:

o início sempre é o mesmo, porém o terapeuta alivia depois seu apoio patelar
na face interna da coxa do paciente e avança seu joelho paralelamente à mesa.
Essa ação vai levar o sacro em direção à borda da maca, mediante deslizamento
e abertura da sacroilíaca. Essa técnica também permite trabalhar nos casos
crônicos.
Observação: Veremos mais na frente que a utilização do kick, o qual
mobiliza um elemento distante da lesão, deve ser utilizado nos casos
crônicos e banido nos casos agudos, tais como uma artrose pronunciada,
ou em presença de prótese. Nos casos subagudos, o uso dependerá da
intensidade da dor.
Nunca devemos esquecer que:
• quanto mais indireto o terapeuta for, maior será o uso do seu braço de
alavancamento e menor sua precisão (e evidentemente será mais global),
o que implicará uma resposta neurovegetativa nem sempre adaptada ao
efeito desejado.
• quanto mais forte descer o pé, mais tensão colocará na sacroilíaca.
Todavia, sempre é necessário deixar um pouco de jogo para poder
manobrar.
116 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

3. O thrust

Mecanismo

Não é um movimento nem um deslocamento, mas uma variação brusca e curta


de tensão do terapeuta, iniciada na contração violenta do abdome (atenção:
do abdome e não dos abdominais). Podemos comparar isso - pois é difícil
descrevê-lo com palavras - à forma de soprar numa zarabatana para propulsar
um projétil: para tal efeito, é necessário comprimir o ar no fundo dos pulmões
e expirá-lo de vez, brutalmente, o que vai proporcionar velocidade e força,
enquanto a pessoa se mantém perfeitamente estável no espaço, com um bom
apoio, estável na cadeia ascendente.
Acontece então uma mudança de densidade do corpo do terapeuta, a qual
vai permitir transmitir no local da lesão uma energia vibratória através do seu
esqueleto. O thrust pode ser superficial ou profundo, conforme a importância
do DFF.
Para que isso funcione,
• o terapeuta deve constituir uma unidade rígida, deve ser indeformável,
de outro modo a energia do thrust vai fugir pelo ponto de seu corpo que
não esteja firme e alinhado, constituindo portanto um ponto fraco. É a
rigidez óssea do terapeuta que segura o elo entre sua mão e sua pelve.
Assim sendo, deve cuidar de travar perfeitamente sua coluna vertebral,
sua escápula e as costas na totalidade, na hora do thrust.
• o terapeuta deve saber aguardar o momento preciso para efetuar o thrust.
A manipulação é como uma dança na qual, em determinado momento, os
corpos estão soltos e em perfeita harmonia. O terapeuta não deve impor
a manipulação de forma brutal, o que poderia assemelhar-se a uma forma
de violação, pois se a pessoa não estiver pronta para o thrust, impô-lo
pode ser considerado como uma violação. O terapeuta deve aguardar,
comprimir sua respiração em função do paciente (não o oposto), ser ao
mesmo tempo rígido e relaxado, perfeitamente estável em seus apoios, e
As dez etapas da manipulação | 117

aguardar o momento no qual o corpo do paciente, perfeitamente relaxado,


lhe comunicará inconscientemente o seguinte: “Tudo ok, pode proceder
agora, eu cedo, estou pronto/a, confio em você”.12
Observação: Quanto mais formos nos afastar da lesão, mais longo será
o thrust devido ao comprimento do braço alavancador. Por isso é uma
técnica boa para trabalhar em casos crônicos (com peso). Em compensação,
quanto mais perto estivermos da lesão, mais curto serão o alavancamento
e o thrust. Por esse motivo, a técnica é utilizada essencialmente no caso de
dores agudas (aplicando velocidade).

A técnica do thrust

O terapeuta efetua o thrust em relação a seu centro, materializado no esterno.


Sua mão ativa nunca deve ultrapassar esse limite.
Nas técnicas para casos crônicos (lesões antigas), se for possível verticalizaremos
o plano articular para que o thrust seja dirigido em direção à maca, não esticando
os braços, mas aproximando os cotovelos, para distender os membros superiores
e obter uma aceleração muito mais rápida. Estabilizaremos com a cadeia
ascendente (sistema portador) e efetuaremos o thrust com a cadeia descendente.
O thrust segue o modelo do slack, a diferença reside na densidade e velocidade,
as quais são muito maiores no thrust. Existem técnicas muito mais complexas
que permitem combinar os dois. Falaremos do assunto adiante.

Algumas pistas para sentir mais e praticar o thrust

• O thrust deve ser aplicado no final da expiração passiva, seja do


terapeuta ou do paciente, para que tanto um como o outro aumentem
sua densidade e que o terapeuta seja indeformável.
• A respiração ocorre para ventilar, mas utilizaremos a compressão dos
gases no final da expiração para realizar o thrust. É necessário conservar

Não pode haver qualquer equívoco nesses termos. Trata-se apenas de imagens para colocar em palavras
12

uma sensação.
118 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

uma leve quantia de ar que servirá de amortecedor e impedirá que o


terapeuta se deforme totalmente.
• Durante o thrust, é preciso ficar firme nos apoios, de outro modo o
movimento achará expressão no ponto mais fraco do corpo do terapeuta.
O thrust é aplicado globalmente, dissociando o sistema fixo (a cadeia
ascendente), do sistema móvel (a cadeia descendente).
• Se entrarmos na lesão e permanecermos nela, não deixaremos viver
a energia transmitida (se quisermos ter um lindo som de campainha, o
pêndulo não deve ficar em contato com o corpo da campainha após
bater nele: a onda irá se propagar se não houver obstáculo).
• Não devemos solicitar ao paciente que assopre: se já tiver uma
experiência com manipulação, irá lembrar que no final da expiração vai
acontecer o thrust e, portanto, vai se contrair, e esse não é o objetivo.
A manipulação deve acontecer naturalmente e integrar-se à respiração do
paciente. Como já foi dito, devemos nos colocar na mesma frequência
respiratória do paciente, durante dois ou três ciclos, antes de realizar o
thrust.
• Existem pessoas com as quais os intercâmbios são difíceis. Cuidado
com essas pessoas: costumam ser uma fonte de problemas.
• O thrust é mecânico, energético e vibratório. O corpo inteiro vibra.
Todavia, se o paciente chegou é porque a vibração dele está ruim. Por
isso só devemos nos misturar na hora do thrust e sempre ficando acima,
dominando. Devemos constituir um corpo só com o paciente na hora do
thrust, mas apenas nessa hora.
• O resto reside no movimento: efetuar o thrust é ir mais rápido.
• Devemos fixar bem a próprias coluna para sermos ósseos, indefor-
máveis e densos.
• Devemos deixar as vertebras alinhadas, uma acima da outra.
• O thrust é realizado no ponto neutro inferior. O ombro do terapeuta
As dez etapas da manipulação | 119

deve estar totalmente apoiado e fixo no gradil costal.


• É necessário se colocar na mesma frequência da lesão, deve haver
continuidade óssea entre o corpo do terapeuta e a mesma, de modo que
no thrust a energia gerada pela contração do abdome seja transmitida até
a lesão através da continuidade óssea, para modificar o estado tissular
local. Podemos afirmar que o terapeuta efetua o thrust nele mesmo, não
na articulação.
• O empilhamento ósseo permite achar as sensações. Em caso de
fracasso, nunca devemos esticar os braços; devemos refazer o mesmo
gesto avançando e realizando o thrust da mesma forma.
• Para obtermos mais potência, não devemos aumentar a força, devemos,
pelo contrário, reduzir as resistências, relaxando as tensões musculares,
seja do paciente como as próprias.
• Devemos nos tornar mais leves inspirando, e aumentar a densidade
expirando.
• Durante a ação, não devemos pensar nem duvidar, apenas deixar as
sensações se manifestarem.

Diversos thrusts: exemplos nas lombares (paciente em decúbito lateral)

• Em caso de dor aguda


Apenas com a mão. Permite avançar a L3 em relação à L2. Técnica
utilizada em caso de dor aguda, enquanto todas as técnicas seguintes
aplicam-se em caso de dor crônica. Geralmente este thrust é único.
Ocorre pouquíssimo tensionamento sobrejacente e subjacente, pois a
dor é limitante, mas o thrust será breve, preciso, intenso, isolado, com a
mão de contato.
• Em caso de dor crônica
Geralmente devemos constituir dois blocos: bloco superior e bloco
inferior. A peça óssea deve pertencer ao bloco superior ou ao inferior,
para trabalhar nas articulações inferiores ou superiores. Assim, mesmo
120 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

se o terapeuta for ruim, a energia que enviará irá automaticamente


para a articulação, e então poderá ter certeza de obter uma resposta
neurovegetativa e tissular adequada.
∙ Com a parte superior do corpo (do paciente) e o kick. Nesse caso,
o terapeuta organiza a parte superior e a inferior, e a ação simultânea
de ambos alavancamentos converge na articulação. Essa técnica
permite decoaptar as superfícies articulares superiores e inferiores. É
uma técnica indireta pura. O inconveniente é que o reflexo é difuso
e a precisão é aproximativa, haja vista a presença de dois grandes
braços de alavancamento.
∙ Com a parte superior. A mão da região superior permanece fixa.
Não há kick. Esta técnica permite decoaptar as superfícies superiores
de L3 (lembrete: o plano articular das lombares fica orientado
aproximadamente em direção aos olhos do paciente).
∙ Com a mão superior, a mão de contato e o kick: efetua-se uma
decoaptação das superfícies articulares inferiores e superiores de L3,
em relação à L2.
∙ Com a parte inferior do corpo (do paciente): a mão permanece
fixa e a mão superior não intervém no thrust. É um thrust de kick
puro, é, portanto, a L4 que mexe.
∙ Com o kick e a mão de contato: é a mesma técnica aplicada na
parte superior, só que apenas com a mão e mais potência. Isso
permite decoaptar as superfícies articulares superiores da L3.
∙ Com a mão superior e a mão de contato, e principalmente com o
kick. Para efetuar o thrust, primeiro é realizado o kick, de forma a
acumular velocidade antes de utilizar a mão de contato para acelerar,
e logo a mão superior. Decoaptam-se assim as superfícies articulares
superiores e inferiores.
As dez etapas da manipulação | 121

GENERALIDADES SOBRE A MANIPULAÇÃO

O objetivo da manipulação é eliminar o domínio de funcionamento fragilizado


mediante a exploração do potencial vital atualizado.
Partimos do princípio que o terapeuta avaliou o estado do paciente dentro
do possível, mas não podemos esquecer que a avaliação verdadeira só ocorre
posteriormente. O terapeuta pode ter ciência dos problemas, sem conhecê-los.
Quando coloca as mãos no paciente, sempre deve lembrar que pode existir uma
lesão irreversível não diagnosticada (alguma fratura ou elemento tão fragilizado
que pode quebrar sob o efeito de uma manobra inadequada ou descontrolada).

1. O princípio

Conduzir a estrutura entre o DFO e o DFF, para evitar o bloqueio no limite


do DFF. De fato, para poder manobrar devemos deixar jogo, de modo a propiciar
a aceleração com margem articular. Como a lesão articular caracteriza-se por uma
perda de mobilidade, se não houver jogo teremos um bloco onde será impossível
mexer a peça óssea pertinente.

2. A técnica

• primeiro um slack, curto ou longo segundo o DFH, para reduzir o


jogo articular.
• logo após, um thrust superficial ou profundo, conforme a importância
do DFF. Aí reside a dificuldade, pois é impossível determinar a
profundidade antes da manobra. Apenas a qualidade da resistência
ajudará o terapeuta a estimar a densidade do DFF.
Para que isso funcione, a manipulação deve ser rápida o suficiente para que o
paciente não tenha o tempo de ficar alerta. As fibras de grosso calibre transmitem
a mensagem terapêutica antes que as fibras de calibre menor transmitam a
informação nociceptiva.
122 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

3. Os quatro tipos de manipulação

• Mecânica: pela consideração da forma e dos planos de deslizamento, e pela


gestão do peso que o terapeuta aplica para « recolocar no lugar a peça óssea ».
• Informativa: através da velocidade, a manobra dispara no tecido reações
neurovasculares necessárias para sua mudança de estado. É o que explica, na
maioria dos casos, o fato de que o tecido volte imediatamente à sua qualidade
normal. O terapeuta deve poder testar isso logo. Por exemplo, em caso de
entorse do tornozelo, pode ser manipulada a L5/S1, a qual está diretamente
ligada ao nível metamérico do tornozelo, para disparar um reflexo simpático
mediante o esclerótomo, dentre outras possibilidades.
• Energética: é difícil colocá-la em palavras. O que pode ser dito é que o terapeuta
envia uma mensagem, a qual é uma mistura hábil de peso em pouca quantidade
e muita velocidade, para transmitir energia no seio do tecido e disparar um
reflexo (sem que haja necessariamente lesão).
• Psicológica: não devemos esquecer que o « estralo » costuma ser associado pelo
paciente à volta da vértebra a seu lugar, por exemplo. Podemos comunicar ao
paciente: “Estralou bem!”, o que será interpretado como: “fizemos um bom
trabalho”.

IMPORTANTE
Não devemos esquecer que os gestos são importantes, mas
agem diferentemente conforme a intenção aplicada, de
forma que um gesto técnico pode não ser necessariamente
terapêutico.

4. E se nada disso funcionar?

Acontece que alguns pacientes não conseguem relaxar. Devemos então mudar
as ferramentas, procurar outras técnicas que levem a uma resposta neurovegetativa
equivalente. Para tal efeito, será suficiente estimular um dos elementos do metâmero,
As dez etapas da manipulação | 123

ou seja, o dermátomo, angiótomo, neurótomo, esclerótomo, viscerótomo ou


miótomo, mediante técnicas reflexivas.
Citemos para o dermátomo a manipulação do tecido conjuntivo (MTC) em
traços, técnica um pouco dolorosa, porém, e cuja aplicação não é evidente. Utiliza-se
a pele como retransmissor para enviar uma mensagem no nível metamérico.
No caso do angiótomo, existe a técnica da drenagem linfática, que de fato
aplica um thrust no gânglio linfático e age sobre o retorno venoso.
No esclerótomo, utilizaremos as técnicas do tipo Moneyron, isto é, os
ligamentos, para estimular o sistema simpático, ou as técnicas de Voggler, para
estimular a remodelação óssea. Citemos também as técnicas de Knapp, Chapman…
No viscerótomo, utilizaremos a osteopatia visceral,
e no miótomo a massagem muscular, a massagem transversa profunda, sem
esquecer os Trigger-points.
124 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

AS DEZ ETAPAS DA MANIPULAÇÃO

1. Definir o objetivo
2. Ajustar o objetivo ao plano articular
3. Escolher uma direção
4. Escolher a ferramenta de trabalho
5. A ferramenta de trabalho e o plano articular devem combinar
6. Pegar A em três pontos fixos
7. Mobilizar A (ou seja, redução do slack)
8. Fixar a nova posição obtida, a qual torna-se a referência
9. Organizar os segmentos sobrejacentes e subjacentes em relação à
referência
10. Efetuar a manobra

1. Definição do objetivo

Antes de mais nada, devemos lembrar que podemos manipular o que for,
mas não de qualquer jeito. Tenho dois ossos, A e B. Em primeiro lugar, devemos
definir qual é A e qual é B.
Se quisermos mexer o osso A em relação ao osso B, devemos começar fixando
o B em três pontos invariáveis entre eles.

2. Escolha do plano de deslizamento

Trata-se de um plano articular que pertence ao paciente, próprio de cada


articulação.

3. Escolha da direção e sentido

A escolha será feita em função do plano articular, em relação ao plano de


deslizamento (anterior/posterior, direita/esquerda)

4. Escolha do plano de trabalho (é a ação do terapeuta)

Trata-se de um plano rígido e ósseo que pertence ao terapeuta dessa vez,


As dez etapas da manipulação | 125

e não ao paciente. Só deve sobrar um grau de folga para aumentar a eficácia e


minimizar os riscos de erro de manipulação.

A posição do terapeuta

Deve ficar:
• em pé,
• com o quadril em leve rotação interna,
• o queixo para dentro,
• as coluna reta,
• o vértex alto, como querendo crescer,
• as cinturas pélvica e escapular bem paralelas entre elas,
• as escápulas devem ficar baixas e travadas sobre o gradil costal de
forma isométrica.
Na manipulação, o terapeuta não deverá se limitar a inclinar-se para a frente,
pois deslocaria seu centro de gravidade, podendo perder o equilíbrio. Deverá
cuidar de recuar simultaneamente os glúteos de forma que possa conservar o
equilíbrio no polígono de sustentação.

Escolha de um braço só na manipulação

O terapeuta colocará o ombro acima da lesão, de forma que fique projetado


sobre a mesma. Os apoios serão paralelos entre eles e paralelos ao plano de
trabalho.

Uso de ambos braços na manipulação

O terapeuta colocará os braços acima da lesão. Os apoios serão paralelos


entre eles, assim como os cotovelos e as costelas, de forma que a gravata fique
projetada sobre a lesão seguindo a linha de maior declive e tentando verticalizar
ao máximo sua ação. O plano de trabalho passa pelos ombros, os cotovelos
e as mãos.
126 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

5. Organização dos planos e direção

Devem permanecer paralelos entre eles para que não haja resistência e para
garantir uma ótima eficácia.

6. Fixação de A em 3 pontos e escolha do(s) contato(s)

O terapeuta pode utilizar um braço só ou ambos, mas antes de cuidar da


patologia alheia deve estar bem posicionado.
Para tal efeito, o terapeuta deve estar perfeitamente estável.
• Deve ter pelo menos três pontos de apoio
• Quanto mais afastados forem os apoios, maior será a estabilidade
• Quanto mais pontos de apoio houver, maior será a estabilidade
• Quanto mais baixo for o centro de gravidade, maior será a estabilidade
• Quanto mais centrado estiver o centro de gravidade em relação ao
polígono de sustentação, maior será a estabilidade. A escolha do(s)
contato(s)13 dependerá da zona que será manipulada.
No contato, o osteopata exercerá uma pressão igual à relação entre a força
e a superfície sobre a qual é aplicada. Tal superfície ativa deve ser homogênea,
indeformável e a maior possível, para não provocar dor.
Existem quatro tipos de contatos:
• Com o indicador
• Com o pisiforme
• Com a metacarpofalangiana
• Com o polegar

Contato com o indicador

É obtido mediante uma inclinação cotovelo e uma leve extensão do punho. O


punho poe estar fechado ou semiaberto.
• Vantagens:
∙ Permite ter três pontos de apoio
13
Contato procede do latim e significa literalmente “tocado com”.
As dez etapas da manipulação | 127

∙ Oferece uma grande adaptação no espaço


∙ Permite aplicar peso
É utilizado principalmente quando o paciente se encontra em posição vertical,
a 45° aproximadamente. É próprio para as cervicais, por exemplo.

Contato com o pisiforme

O pisiforme é um osso do pulso, na continuidade do cúbito, tendo forma de


ervilha.
O contato do pisiforme é obtido mediante extensão e inclinação radial do
punho. Coloca-se a mão em concha sobre a lesão, avançando o pisiforme com
o cotovelo flexionado, o punho alinhado e a 5ª articulação metacarpofalangeana
flexionada naturalmente.
Existem variantes que fazem intervir a borda do cotovelo, a palma ou o dorso
da mão
• Vantagens:
∙ É simples e direto
∙ Privilegia a velocidade
∙ Contato restrito, portanto preciso, implica uma perfeita localização
sobre a peça óssea
∙ É um dos raros contatos que permite trabalhar de forma ascendente
(para a manipulação do ilíaco, por exemplo).
• Inconveniente:
∙ Oferece um único ponto de apoio, que apresente menos estabilidade.
Contrariamente ao contato com o indicador, condiciona o trabalho na horizontal
(com velocidade) em lugar da vertical (com peso).
É próprio para o trabalho nas lombares. O contato se estabelece então entre
a articular e a lâmina.

Contato com o antebraço

É estável e aderente devido às partes moles, com uma adaptabilidade morfológica


128 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

média. Condiciona um trabalho baixo e privilegia a velocidade. Permite transferir


peso para fixar o paciente na maca e efetuar o thrust na horizontalidade.
É evolutivo:
• pelo deslocamento do contato seguindo ao longo do antebraço
• pela largura do contato
É próprio para a global da pelve.

Contato com o polegar

Trabalha na continuidade do rádio, o apoio deve comprometer o polegar todo


e nunca apenas a extremidade distal. O ideal é que o contato seja o mais amplo
possível, podendo ser associada a mão.
• Vantagens:
∙ o contato é preciso
∙ permite o contato de zonas de difícil acesso
• Inconvenientes:
∙ a prática tátil é importante
∙ a falta de estabilidade por conta da quantidade de articulações
interpostas
∙ a dificuldade de aplicar peso. Este contato privilegia a velocidade e
a balística. É próprio, por exemplo, para um trabalho sobre a C7/D1.

A mão

• Vantagem:
Sua grande adaptabilidade morfológica que permite contatos bem
diferenciados, independentemente dos que acabamos de ver (indi-
cador, pisiforme, metacarpofalangiana, polegares):
∙ contato da interfalangeana proximal
∙ contato da interfalangeana distal
∙ contato da polpa digital
∙ contato tenar
As dez etapas da manipulação | 129

∙ contato hipotenar
Seja qual for o contato escolhido, deve ser preciso, ósseo e indolor. A fixação
do segmento deve ser a mais ampla possível e os pontos de fixação devem ser
invariáveis entre eles.

7. Redução do jogo articular (slack)

• É a translação de A em 3 pontos invariáveis, é ultrapassar ou quebrar


a linha de repouso fisiológico em primeira instância (aplicando força
suficiente para ultrapassar o conjuntivo) para reduzir depois a barreira
motriz ou a barreira desejada, e assim aproximar-se do limite do jogo
articular.
• É a localização da ação terapêutica, com uma tensão mínima, para
evitar a transmissão da dor pelos nociceptores.
• O objetivo é que a informação neurológica seja mínima.
A redução é obtida, facilmente, pelo relaxamento progressivo e controlado dos
músculos eretores localizados sob o centro de gravidade, mediante empilhamento
dos ossos orientados à lesão. As expirações (do paciente e do terapeuta) são
utilizadas para aperfeiçoar a ação.
Não deve ser aplicada força muscular de forma alguma, o terapeuta deve ser
passivo.
A expressão da translação ocorre na lesão quando o corpo do terapeuta não se
deforma, como o temos indicado incessantemente (trabalho isométrico).
Para que a técnica seja ótima, o slack, o contra-apoio (organização sobrejacente
e subjacente) e o aumento da densidade devem coincidir no tempo e no espaço,
no final da expiração do paciente e do terapeuta. Assim, o início da lesão será a
parte mais densa.

8. Fixação da posição adquirida, que se torna a referência (R)

Essa referência é fixa em relação ao sobrejacente e subjacente, e não pode


ser deslocada no espaço.
130 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Em hipótese alguma deve ser modificado esse ponto R no espaço, inclusive


pela ação à distância da organização dos segmentos sobrejacentes e subjacentes.
Se for o caso, será necessário recomeçar tudo, de outro modo a técnica estaria
sendo montada sem referência confiável.

9. Redução dos jogos sobrejacentes e subjacentes em relação à referência (R)

Essa etapa requer especificamente a escuta da reação de nossa referência R.


Escolha dos contra-apoios:
O contra-apoio deve ser o mais amplo possível e próximo do contato.
• No caso do segmento sobrejacente, o terapeuta utilizará o máximo
possível seu próprio membro superior (mão, cotovelo, antebraço…).
• Para a organização do segmento subjacente (no caso de um roll por
exemplo), será utilizado, preferivelmente, o membro inferior, o qual
permitirá movimentos de adução, flexão, rotação interna e externa da
coxofemoral, e descida do pé mediante extensão do joelho.
É necessária uma interação direta com o contato e a organização dos segmentos
subjacentes e sobrejacentes.
• Deve ser verificada a direção dos antebraços (apoio e contra-apoio),
os quais devem permanecer paralelos ao plano articular.
• Quebra-se a linha pelo relaxamento dos músculos eretores, ou seja,
com verde.
• Tal ação pode ser aperfeiçoada acrescentando um pouco de vermelho,
isto é, com músculo, para afinar os últimos milímetros mediante uma
ação muscular eventual.
• Densificação mediante expiração: o terapeuta deve reduzir seu volume
para aumentar sua densidade e assim ficar indeformável, para percorrer
os últimos milímetros.
As dez etapas da manipulação | 131

Organização da manipulação

No esquema acima vemos o que acontece na técnica lombar (L3 no caso), no


paciente em decúbito lateral direito. Baseado no princípio das cadeias ascendente
(verde) e descendente (vermelho), estabeleceremos um contato com o indicador
ou pisiforme sobre a articular esquerda da L3. Quebraremos a linha de repouso
fisiológico aplicando suficiente força (vide etapa 7). O terapeuta deve deixar o peso
empilhar seus ossos até a lombar do paciente, mas permanecendo indeformável. É
a referência R (etapa 8). Permanecendo na escuta da reação do contato (L3), com a
mão esternal o terapeuta empilha sua caixa torácica desde o esterno até a L3, para
efeitos de consolidar um bloco indeformável e indolor da parte alta (etapa 9, parte
alta). Sem deslocar a referência no espaço, efetuaremos movimentos de flexão e
extensão do alavancamento baixo, sempre na escuta da reação da referência, para
consolidar um bloco indeformável da parte baixa (etapa 9, parte baixa). A menor
variação de tensão, vinda de cima ou de baixo, deve ser perceptível no local de
referência. No final das expirações do terapeuta e do paciente, será efetuado o
132 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

thrust. Como veremos adiante, o ideal é efetuar todo o preparo no tempo expiratório
(vide parágrafo sobre a respiração).
Regra imperativa: o gesto de manipulação deve ser efetuado rápido o
suficiente para que o paciente não esteja em alerta, de forma que as fibras
de grosso calibre transmitam a mensagem terapêutica antes da intervenção
das fibras de calibre menor, as quais transmitem a informação nociceptiva.
Se não for o caso, o tratamento deve ser adaptado…

10. E finalmente a manipulação

Objetivo da manipulação

• Eliminar o DFF (Domínio de Funcionamento Fragilizado ou lesão


osteopática) mediante o P.V.A. (Potencial Vital Atualizado)
• Princípio: levar a estrutura até o limite do DFF (na verdade D.F.O.:
Domínio de Funcionamento Eventual), para evitar o travamento no
limite do DFF).

Técnicas

• Slack curto ou longo, segundo o D.F.H. (Domínio de Funcionamento


Habitual)
• Thrust superficial ou profundo, segundo a importância do D.F.O./
DFF. É impossível determinar a profundeza do thrust antes da
manipulação, pois depende do teste de resistência, mas também da dor
do paciente e do jeito que a técnica for organizada. Quanto mais nos
aproximarmos da lesão, menos margem de manobra teremos nos três
planos espaciais. O objetivo, portanto, é trabalhar no limite exato, para
sermos eficientes e precisos, sem provocar dor. Quanto menor for a
tensão na organização da técnica, maior será o grau de liberdade da
operação. Assim sendo, é melhor começar com pouquíssima tensão.
Sempre teremos a possibilidade, durante o preparo, de acrescentar
tensão para entrar em contato com a lesão.
As dez etapas da manipulação | 133

Abordaremos a questão do thrust no próximo capítulo, pois trata-se de um


gesto complexo.

Exemplo de manipulação.

• primeiramente, o terapeuta procurará o tipo de movimento requerido


(flexão, extensão, lateralidade…)
• analisará a amplitude de movimento disponível
• e a qualidade de deformação do tecido mediante o teste do gelo,
procurando não relaxar a posição adquirida, através da escuta das reações
na altura do seu antebraço/braço/esterno, no contato com indicador ou
pisiforme
• quebrará a linha (exemplo no esquema a seguir: L3) para obter uma
referência confiável, mediante a escuta das reações nos antebraços
minimamente (e braço, e coluna)
• efetuará a organização sobrejacente e subjacente, na escuta da reação
da referência
• escolherá eventualmente a parte superior ou inferior de uma faceta
articular, se for uma dorsal
• se colocará em fase respiratória com o paciente
• aumentará sua densidade
• relaxará em parte o conjunto de forma controlada e recomeçará várias
vezes, para memorizar o “percurso”
• manipular não é oprimir de forma ativa, mas apoiar de forma passiva.
134 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Situação do thrust com peso

FINAL DO THRUST /
INÍCIO DA LESÃO

Este esquema apresenta as três áreas que abrangem o P.V.A. de uma articulação
(D.F.H., D.F.O., D.F.F.). O thrust ocorrerá no fim da redução do jogo articular,
isto é, no fim do D.F.O. e início do D.F.F.
Observação: Geralmente, os estudantes lidam com a zona média do D.F.F.

Dois princípios essenciais que devem ser


lembrados o tempo todo:
• Podemos estar cientes dos problemas sem conhecê-los.
Por tal motivo é necessário lembrar sempre que pode haver
uma lesão irreversível.
• Portanto, na hora de colocar as mãos na área a ser tratada,
devemos ter em mente que pode existir uma fratura
(ou que a mesma pode acontecer durante a manobra).
As dez etapas da manipulação | 135

Organização final de uma manipulação

CENTRO SENSÓRIO

PONTO NEUTRO SUPERIOR

PONTO NEUTRO INFERIOR

VOLUME DE AR
RESIDUAL

REDUÇÃO DO VOLUME CORPÓREO


ORGANIZAÇÃO SOBREJACENTE E SUBJACENTE
SLACK
RESPIRAÇÃO DO PACIENTE
RESPIRAÇÃODO TERAPEUTA

(Adaptado da obra de J-F Terramorsi: Osteopatia estrutural)


Neste esquema constam os cinco elementos da manipulação, isto é:
• a respiração do terapeuta,
• a respiração do paciente,
• a redução do jogo articular ou slack
• a organização sobrejacente e subjacente
• e a densidade do terapeuta.
A manipulação será organizada em vários ciclos respiratórios. Já no início, o
terapeuta deve observar a respiração do paciente e imitá-la. Na fase expiratória,
deve reduzir o jogo da articulação lesada, organizar os segmentos sobrejacentes e
subjacentes, e reduzir seu volume corporal. Isso tudo deve coincidir em tempo e
espaço com o termo do D.F.O. e o início do D.F.F. (Pode ser necessário aguardar
vários ciclos antes do instante do thrust). Quando já se tem experiência, um
único tempo expiratório é suficiente.
136 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL
Evolução das técnicas de base para
tratamento específico do atleta

CONSIDERAÇÕES FUNDAMENTAIS SOBRE O


TRATAMENTO DOS ATLETAS

O leitor atento poderá ficar surpreso por achar neste capítulo algumas
definições que já constavam no capítulo prévio. Achei importante relembrá-
las rapidamente, para que sejam totalmente assimiladas.

Lesão (definição geral): alteração ou desorganização da estrutura, provocado


por um fenômeno gerador. Fica dentro da estrutura.
Domínio de funcionamento fragilizado (DFF): “zona” submetida a informações
desfavoráveis e não submetida a informações favoráveis. Esta zona corresponde
de fato à lesão tissular reversível. Pode ser reduzida mediante uma intervenção
externa adequada: a manipulação.
Existe mudança do estado e não da natureza da estrutura.
Noção de D.F.O.: Domínio de funcionamento eventual
É uma zona amortecimento entre o D.F.H. (domínio de funcionamento habitual)
e o DFF.
Não é uma lesão: o D.F.O. pode ser reduzido, mediante relançamento da função.
Não é estável no tempo nem espaço. Após estimulação, volta a ser D.F.H.
Em todo indivíduo, podemos achar as seguintes zonas: o D.F.H., uma zona pouco solicitada
(o D.F.O.) e a lesão DFF.
Lesão irreversível: O limiar de resistência da fisiologia da estrutura (ou seja,
P.V.A.) foi ultrapassado. Há mudança definitiva (total ou parcial) da natureza
138 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

da estrutura.
Tecido conjuntivo: constitui a malha de todos os órgãos: os abrange, aglomera,
reúne e amarra ao esqueleto. Fora os fibrócitos, fibroblastos, as fibras de colágeno
e elastina, e as substâncias fundamentais, está formado principalmente por água
no estado livre, que tem a particularidade de se transformar em gel em caso de
lesão osteopática.

Após este preâmbulo, podemos finalmente focar na essência do assunto


e tratar daqueles que tento ajudar a manter suas capacidades físicas no
prumo: os atletas.

O atleta precisa dispor, em determinado momento, de suas qualidades físicas,


mentais e energéticas em ótimas condições.
Toda restrição de mobilidade que surge dentro de uma estrutura reduz as
capacidades esportivas. Perante uma lesão tissular reversível, as capacidades físicas do
desportista ficam, portanto reduzidas, e a forma mais eficiente e rápida de restabelecê-las é, na
minha opinião, a manipulação estrutural.
No caso dos atletas, as capacidades mentais e emotivas são o reflexo de suas
capacidades físicas. Se as últimas forem ótimas, as outras acompanham (a recíproca
é verdadeira).
A manipulação estrutural direta irá repor mobilidade e energia no seio do tecido
que tiver perdido suas qualidades dinâmicas e energéticas, ativando os fenômenos
fisiológicos necessários. Como?
Para termos energia, são necessários peso e velocidade14.
• A utilização do peso é mais ou menos constante. De fato, na manipulação,
o uso do peso (isto é, o peso do terapeuta) é limitado pelos riscos de
quebra: se o terapeuta ficar acima do paciente com todo seu peso, vai
esmagá-lo e fraturar suas costelas, sem organizar o tecido conjuntivo.

14
Para usarmos peso, trabalharemos na vertical, e para usarmos velocidade, na horizontal.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 139

• A velocidade parece ser mais adequada. Haja vista que Ec =1/2 mv2 (onde
“E” designa a energia, “m” a massa e “v” a velocidade), sendo que “v” é
elevada ao quadrado, sua incidência é primordial na produção de energia.
É, portanto a informação gerada pela velocidade a que vai modificar o
tecido conjuntivo.
Quando a manipulação parte do D.F.H. e para no D.F.O., os diferentes captores
não são solicitados além do normal, ou então só um pouco. A solicitação permanece
dentro da margem aceitável para a estrutura, pois limita-se à zona de uso imediato,
habitual e cotidiano.
Durante o tratamento com técnicas estruturais, utiliza-se o thrust, o qual é uma
mistura de velocidade e peso. O peso serve para normalizar o tecido conjuntivo
muito congestionado, uma lesão antiga ou uma lesão articular da cadeia ascendente,
envolvida no empilhamento ósseo passivo.
Começar no final do D.F.O. e parar no início do DFF, é fácil só na teoria.
O mais delicado é avaliar a zona e trabalhar antes da lesão (DFF), para que a
energia acumulada dentro do tecido “mexa” com a mesma ao afetar o estado tissular
local, devolvendo a mobilidade e transformando a água intersticial bloqueada sob
forma de gel em água livre.
A vantagem de trabalhar dentro do D.F.O. é que os tecidos são solicitados, no
lugar dos captores nociceptivos, e assim sendo não dispara a inflamação. De fato,
quando a manipulação é realizada com muita rapidez, as fibras rápidas são solicitadas
sem a confirmação da mensagem pelas fibras lentas. A resposta é instantânea e não
implica penalidades em termos de curvaturas; pois não há como dizer a um atleta:
“Descanse. Em dois ou três dias você vai se sentir melhor”! O atleta não pode
“parar”, sob pena de se atrapalhar com uma redução de seu nível de treinamento.
De modo geral, cede ao terapeuta cinco a dez minutos, quinze no máximo, pois
não pode diminuir sua atividade. Sua agenda fica definida nos menores detalhes e
não há qualquer vaga para fantasias ou improvisações: deve respeitar os horários
de treinamento, de almoço, até de descanso obrigatório! Um descanso reparador
necessário para recomeçar à tarde ou compensar as noites sem dormir por conta
140 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

do estresse dos jogos, as viagens frequentes, as dificuldades familiares…


Como são acompanhados em permanência, os atletas dispõem de pouquíssimo
DFF e praticamente zero D.F.O., o que significa que o D.F.O. e o DFF são quase
a mesma coisa e ambos ficam bem próximos do P.V.A.
Assim sendo, no tratamento preconizo o uso e avaliação de todas as estruturas
diretamente ligadas ao metâmero, isto é, os D.A.N.E.V.M15.
Para se obter a maior eficácia, será necessário fazer pouco e brevemente, porém
de forma intensa e isolada, com pouca amplitude, o que implica um conhecimento
perfeito dos D.A.N.E.V.M. e das variáveis de regulação sistêmica (nunca esquecer
que quanto mais fizermos, menor será a eficácia: procuraremos uma lesão em
função da queixa; uma vez que a acharmos, a trataremos e deixaremos a natureza
fazer o resto).
Enviaremos uma reação ortossimpática e a regulação acontecerá naturalmente.
Outra dificuldade reside na avaliação do estado da estrutura (P.V.A.16), e da
coerência dos fenômenos disparadores em relação aos fenômenos lesionais. Seja
o que for, o “faro” do terapeuta, seu sexto sentido, é capital.
O mais complicado nisso tudo é saber onde começar e onde parar. O terapeuta
deve, portanto, ficar na escuta de seu corpo, praticar sempre o mesmo gesto, da
mesma forma, e permanecer indeformável (é a única constante). Em hipótese
alguma deve esticar a ferramenta utilizada no thrust (seja o braço ou a perna). Só
precisará, caso a manipulação não dê resultado, modificar quase imperceptivelmente
seu apoio no chão.
Alguns milímetros bastam. Sua propriocepção fornecerá as informações
necessárias sobre essa barreira motriz, sobre essa área intransponível e o jogo
residual que servirá para acelerar17. Se não der certo, devemos resistir à tentação de
forçar a “intenção”, ou seja, forçar o gesto, querer mexer o osso. É a tentação da

15
Dermátomo, angiótomo, neurótomo, esclerotómo, viscerótomo e miótomo.
16
Potencial vital atualizado.
17
Lembrete: se não houver jogo será impossível acelerar, principalmente com um tecido congestionado, porém
deve ser um jogo controlado, sentido.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 141

coisa fácil: o osso do paciente no qual o terapeuta se apoia é concreto, enquanto


na manipulação estrutural ele trabalha com o tecido conjuntivo, muito mais sutil,
pois requer ficar na escuta do que se sente do paciente no próprio corpo. Não
é forçando o gesto que atingiremos o objetivo, mas permanecendo leves. Se o
terapeuta não tem sucesso com o gesto, isso é sinal de que está muito longe da
estrutura, ou então seus contatos não são adequados, ou não está na escuta do que
faz. Existe uma continuidade de matéria densa demais no paciente, incompatível
com o jogo necessário para a aceleração.
São gestos adaptados aos atletas. Devemos sentir a lesão desde o início
até o termo de cada manipulação. Fora de cogitação manipular sem sentir a
perda de mobilidade, minimamente no antebraço. Na prática, minha referência
sensorial se localiza perto da 3ª ou 4ª costela, sob minha escápula. Foco-me nela
e só organizo minha manobra em função do que sinto nesse local, acima ou
embaixo. Sinto o empilhamento dos meus ossos em direção à lesão, enquanto
estabilizo o paciente, que deve ficar livre e estável o tempo todo. Pessoalmente,
quando viajo e passo dois ou três dias sem atender, perco muita sensibilidade.
O mesmo ocorre na maioria das técnicas e artes: até os maiores mestres devem
se exercitar. É o preço a pagar pela satisfação. Manobrar equivale a criar
energia. Quanto mais manipularmos, melhor nos sentiremos, maiores serão os
resultados, junto com a satisfação de aliviar as pessoas ao máximo do que se
espera. Não cedemos energia: a geramos. A mesma se renova incessantemente
para que possamos transmiti-la.
O terapeuta começa com liberdade (D.F.H.) e deve ficar atento quando encontrar
a menor resistência, daí a importância de conhecer perfeitamente o plano articular
para determinar se essa menor resistência não decorre de um trabalho fora do
plano articular. Temos dois ossos, A e B. Fixaremos o osso B e utilizaremos
o osso A, suspendendo apenas sentirmos a parada, a freada articular dentro da
estrutura; daí a importância de saber tomar posição e manter sempre a mesma
referência corporal, a mesma posição. Efetuaremos a manipulação em dois ou três
tempos expiratórios, registrando no próprio corpo a posição de cada um de seus
142 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

segmentos. Se houver deformação, estaremos saindo do jogo articular e do plano


de deslizamento.
Em sala de aula há um trabalho intensivo com exercícios de posição, de sensação,
de empilhamento passivo e ativo, de transferência de apoio, começando do solo
até diversos segmentos corporais: braço, antebraço, direita, esquerda, ambos pés,
um pé só, joelhos, punho, escutam-se os tornozelos, as plantas e dedos dos pés, a
compressão óssea dos braços, antebraços… descobrem-se os centros sensoriais, os
chakras, os quais são desenvolvidos; trabalham-se as cores, emoções e transferência
de emoções. Realizam-se manipulações justas, falsas, aprendendo a compará-las,
descobre-se a intenção, o gesto acompanhado, a liberação de energia.

DFO, DFF e PVA


pracamente equivalentes
POTENCIAL

POTENCIAL VITAL

TEMPO
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 143

Esquema A Esquema B

O esquema A acima indica a posição do thrust com peso e (ou) rapidez,


o esquema B indica que o D.F.O., o D.F.F. e o limite do P.V.A. encontram-se
praticamente no mesmo nível em atletas, o que significa que o thrust deve ser
muito preciso e curto.

Organização final da manobra


144 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Este esquema é semelhante ao da página 132, exceto que definiremos a procura


de uma eventual lesão seguindo outras direções: A/B/C, x/y/z ou 1/2/3 (enquanto
no esquema prévio limitava-se a B, y e 2).

Situação do thrust em velocidade

FINAL DO THRUST /
INÍCIO DA LESÃO

Este esquema, muito semelhante ao da página 136, só difere na situação do


thrust, o qual situa-se desta vez no final do D.F.H. e no início do D.F.O., o que
resulta na seguinte organização da manobra:
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 145

Organização final de uma manobra espaço-tempo / thrust velocidade

CENTRO SENSÓRIO

PONTO NEUTRO SUPERIOR

PONTO NEUTRO INFERIOR

VOLUME DE AR
RESIDUAL

REDUÇÃO DO VOLUME CORPÓREO


ORGANIZAÇÃO SOBREJACENTE E SUBJACENTE
SLACK
RESPIRAÇÃO DO PACIENTE
RESPIRAÇÃODO TERAPEUTA

(Representação inspirada na obra de J-F Terramorsi: Osteopatia estrutural)


146 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

AS TÉCNICAS

Trataremos agora das técnicas em questão. Partindo dos princípios que já


estudamos, ou seja, resumindo, que privilegiaremos o peso nos casos crônicos
(vale dizer também que é muito mais fácil!) e a velocidade no lugar do peso nos
casos subagudos (exceto nos casos particulares que examinaremos no momento
pertinente), iremos analisar cada técnica da seguinte forma:
• primeiro a técnica de base, com peso, que utilizaremos nos casos
crônicos;
• e a técnica que utilizaremos nos casos agudos, com muita velocidade
e pouco peso, o que aconselho para os desportistas.
Todavia, antes de avançar, devemos definir dois pontos importantes que surgirão
toda vez: as disposições sobrejacente e subjacente em relação à referência que será
manipulada:
• a organização sobrejacente compete o que vai da articular superior da
peça a tratar até a parte alta do corpo;
• a organização subjacente vai da articular inferior até a parte baixa do
corpo.
O objetivo é ter dois blocos, parte alta e parte baixa. Cada bloco deve ser
indeformável. Segundo as técnicas, a peça manipulada pertencerá ao bloco superior
ou inferior, ou será independente.
Se a lesão for por flexão ou anterioridade, faremos recuar o bloco superior;
se a lesão for por extensão ou posterioridade, faremos avançar o bloco inferior; e
finalmente, poderemos trabalhar na peça livre para obter uma reação neurovegetativa
ótima e isolada.
Vejamos por exemplo a técnica do ilíaco, sacro, lumbar roll.
Já com a linha quebrada e, portanto, com a referência definida, no tocante à
organização sobrejacente, a mão esternal desce em direção ao púbis paralelamente
à maca. Apenas o terapeuta sente uma reação na mão de contato, aproxima as
duas mãos para otimizar essa reação, trabalhando em ambos planos. Em relação à
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 147

organização subjacente, será feita mediante o alavancamento inferior, isto é, o terapeuta


orientará sua ação à vértebra a manipular, mediante flexão ou extensão da perna
superior do paciente. Quanto maior for a flexão, maior será a retração do ilíaco
e do sacro, e mais trabalharemos nas lombares baixas. Pelo contrário, mediante
extensão, avançaremos o ilíaco e trabalharemos nas lombares altas (segundo a
amplitude da extensão).
Outro ponto importante: o slack nos atletas. Tendo quebrado a linha, obtendo-se
assim a referência como foi detalhado, o thrust deve partir do final do DFF e
parar no início do D.F.O., o que significa que o slack será praticamente inexistente.
Haverá margem, mas por se tratar de pessoas agudizadas sentem perfeitamente a
falta de mobilidade (o D.F.O.). A dificuldade para o terapeuta residirá, portanto,
em efetuar no mesmo gesto de manipulação D.F.H./D.F.O. (= área livre/área
menos livre), slack e thrust. Isso complica muito a técnica e exige do terapeuta
mais concentração ainda, mais escuta, sensibilidade, percepção e precisão, pois
há mobilidade, nada está bloqueado, tudo se mexe e o menor erro pode acarretar
uma reação inflamatória, o oposto do que se pretende obter.

1. Sacroilíaca

1.1 Global da sacroilíaca: técnica de base com peso


É uma boa técnica de base para a sacroilíaca. Aponta ao encontro do ilíaco,
L5 e sacro, sem focar especificamente em um desses três. Pode substituir no caso
crônico as que focam em um desses três elementos em particular. Costumo dizer
que é um curinga.
Todavia, é uma das técnicas mais difíceis por conta dos diversos parâmetros
que devem ser geridos. Quando ela é bem aplicada, produz estralo, mas isso não é
uma finalidade por si só. Mesmo se não houver o estralo salvador (principalmente
para o paciente), é necessário insistir pois tal técnica tem certamente seu efeito. O
retorno do paciente é frequentemente muito positivo: o indivíduo comunica que
se sente bem.
148 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Posição do sujeito (exemplo à esquerda)

• o paciente é colocado em decúbito lateral na borda da maca


• a líaco fica na vertical
• o pé esquerdo é colocado por trás da fossa poplítea direita
• enquanto segura a pelve do paciente, o terapeuta deve puxar em
primeiro lugar seu antebraço direito no plano da maca, para liberar o
ombro e produzir uma deslordose, e assim abrir os forames de conjugação
e proteger a estrutura
• as mãos do paciente são colocadas sobre seu tórax
• em segunda instância, puxar levemente o braço em direção ao teto,
para enrolar a coluna e reduzir o jogo articular.

Posição do terapeuta
• o terapeuta se posiciona frente à pelve
• o joelho do paciente fica entre as coxas do terapeuta
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 149

• coloca o joelho direito sobre a face interna da coxa direita do paciente


• seu pé esquerdo no chão fica orientado na direção da cabeça do
paciente

A manipulação
• descer em direção à maca, paralelamente ao plano dos ombros, com
apoio por trás do trocânter maior - avançar o antebraço no plano da L5
• sem relaxar a avançada, efetuar uma adução do antebraço (o interior
do antebraço se aproxima da gradil costal do terapeuta)
• organização sobrejacente: descer com a mão torácica em direção ao
púbis do paciente, para que o conjunto retroceda, na escuta da reação do
antebraço
• organização do segmento subjacente: utilizar os movimentos de
extensão e flexão da coxofemoral do paciente, para definir a ação
terapêutica na sacroilíaca. Para tal efeito, o pé do terapeuta deve descer
levemente para obter apoio à distância na sínfise púbica
• efetuar o thrust para baixo com apoio e adução, para atingir a asa ilíaca
(contraindo os abdominais simultaneamente para amplificar o gesto). É
como se o joelho do terapeuta escorregasse e este descesse com todo o
peso sobre o corpo do paciente.
Como foi dito, deve ser feito no tempo de expiração do paciente e do terapeuta
simultaneamente. O thrust no término do slack deve coincidir com o início da
lesão, ou seja, o final do DFO.
Observação: Nesta técnica, o kick é realizado descendo o pé em direção
ao chão na reta, ou avançando o joelho paralelamente à maca.

Por que uma global?


Para todos os problemas crônicos: ciatalgia, lombalgia, entorses do joelho, do
tornozelo, no tratamento geral da coluna, toda patologia do abdome e transtornos
circulatórios do membro inferior.
É claro que todas as globais são realizadas bilateralmente.
150 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Atenção!
Proibida a aplicação em problemas agudos e ciáticas
confirmadas!

1.2 Evolução da técnica em casos subagudos e desportistas: abertura


geral da sacroilíaca

A global da sacroilíaca, é uma técnica difícil, que utiliza pouco peso mas pode
se aplicar com muita rapidez. Em compensação, seu contato não é direto, de forma
que não é a primeira escolha em atletas ou dores agudas, sendo mais utilizada em
dores subagudas devido à questão de massa e globalidade.
O que a distingue da global da sacroilíac é o contato do antebraço, que na técnica
prévia obriga o terapeuta a se deitar demais, com pouca amplitude e margem de
manobra.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 151

Pelo contrário, o contato com a tenar e a palma da mão outorga mais amplitude
de movimento. Esse contato pode ser feito na face lateral dos processos espinhosos
da crista sacral (em indivíduos com processos espinhosos protuberantes que
facilitem o apoio) ou na região dos glúteos, por trás do trocânter maior, antes
de atingir a face lateral do sacro. O terapeuta coloca menos peso mas pode
movimentar, aplicando velocidade, e procurar lesões no âmbito de amplitudes
articulares mais extremas e muito mais complexas do que aquelas que caracterizam
os pacientes convencionais.
A posição do terapeuta é praticamente a mesma que na global da sacroilíaca,
porém a do paciente puxa levemente mais para a lordose, para que o terapeuta
disponha de mais amplitude; o joelho do terapeuta fica bem mais elevado em
comparação com a global, para permitir o uso do kick e principalmente para abrir
a sacroilíaca (ao descer o joelho e adiantando-o). Nesse caso, o joelho avança
descendo em direção à maca, o que permite uma abertura mais importante da
sacroilíaca.

Posição do paciente
• o paciente se coloca em decúbito lateral direito
• mesma posição que na global da sacroilíaca em leve deslordose
• a região posterior que será manipulada aponta ao teto.

Posição do terapeuta
• o pé direito no chão aponta à cabeça do paciente, perpendicular à pelve
• o joelho fica apoiado na face interna da coxa direita do paciente
• o joelho esquerdo do paciente deve ficar abaixo do nível da maca
• a tíbia do terapeuta não encosta no joelho esquerdo do paciente

Manipulação
Durante toda a manipulação, o paciente e o terapeuta devem estar sempre em
equilíbrio. Esta técnica serve de base para as lesões por anterioridade e lateralidade.
• o joelho cefálico recua
• estabelecer o contato com o pisiforme logo atrás e levemente acima
152 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

do ísquio posterior superior esquerdo do paciente


• o cotovelo deve ser afastado levemente mediante uma rotação interna
do úmero, empurrando o paciente para verticalizar a sacroilíaca esquerda
• a mão cefálica fica apoiada no peitoral esquerdo do paciente, sobre o
esterno, não sobre o ombro
• organização sobrejacente: a mão cefálica leva o gradil costal em
direção ao púbis e a mão de contato, cujo efeito é o empilhamento dos
corpos vertebrais e a rigidez da parte superior da coluna
• disposição subjacente: o terapeuta desce levemente o pé em direção
ao chão, na escuta da reação do contato. Lembrete: em hipótese alguma
a disposição sobrejacente e subjacente devem modificar a posição de
referência do terapeuta.
• efetuar o thrust com a mão de contato avançando o joelho. Soltar o
peso na mesa sem deformação, como se o joelho escapasse, só que de
forma controlada. Particularidade desta técnica: será utilizado o avanço
do joelho (kick) para empurrar a perna do paciente e assim abrir a
sacroilíaca lesada. Se não for suficiente, recorrer à descida do pé.

Esta técnica é proibida em casos agudos e suspeita


de hérnia de disco.

2. Lombares

2.1 Técnica lombar de base ou técnica lumbaroll


Com a técnica lumbaroll deve-se tomar cuidado para não forçar, principalmente
nos sujeitos mais flexíveis. A possibilidade de aplicar tensão sempre estará lá.
Poderemos aplicá-la aos poucos, se for necessário.
O que conta nesta técnica é definir bem o plano articular. Colocar o paciente
de decúbito lateral, sem a definição clara sobre o que deve ser manipulado e o que
deve permanecer fixo é se expor ao risco de um acidente durante a manipulação,
principalmente se não houver um conhecimento prévio do estado da estrutura.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 153

É uma técnica direta, portanto em relação direta com a vértebra que será
manipulada. Pode ser utilizada da L1 à L5. A única diferença reside no plano articular,
que será levemente diferente entre a região inferior e a região superior: no caso
da L5, o plano é semissagital, semifrontal, e no caso da L1, praticamente sagital.
Como em todas as técnicas, o antebraço do terapeuta deve ficar paralelo ao
plano articular.

Posição do paciente
• em decúbito lateral direito
• mesma posição que na global sacroilíaca, em leve deslordose
• a região posterior que será manipulada aponta ao teto

Posição do terapeuta
• o pé direito no chão aponta à cabeça do paciente, perpendicular à L3
• o joelho fica apoiado na face interna da coxa direita do paciente
• o joelho esquerdo do paciente deve ficar abaixo do nível da maca
• a tíbia do terapeuta não encosta no joelho esquerdo do paciente

Por que manipular a L3?


• Para problemas mecânicos locais: lombalgias
• Para problemas mecânicos à distância, involucrando a cadeia descen-
dente: dor no joelhos, cruralgia, ciatalgia
• Para problemas neurovasculares a distância, essencialmente patologias
das vísceras: próstata, glândulas genitais, patologias ginecológicas, intes-
tino, vascularização dos membros inferiores.
154 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

2.2 Evolução da técnica em casos subagudos e desportistas, no pisiforme:


Esta técnica (ideal em casos subagudos) guia a evolução da técnica lombar em
atletas que requerem técnicas diretas. Utilizaremos o pisiforme sobre a articulação L3.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 155

Posição do terapeuta
• coloca-se o antebraço paralelo ao plano da maca, orientado para cima
e para a frente do sujeito, em ângulo de aproximadamente 45 graus.
• a “gravata” do terapeuta fica perpendicular à lesão.

Manobra
• Fase 1: quebra-se a linha como previamente, isto é, transpondo a
posição de repouso.
• Fase 2: organização sobrejacente e subjacente em função da dor.
• O thrust somente com a mão de contato em primeiro lugar. Se o
resultado não for satisfatório, aplicar então um leve kick com descida
vertical do pé do terapeuta.
• É um thrust rápido.

3. Sacro

3.1 Técnica de base: Sacro por trás do indicador ou pisiforme


156 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

A disposição é a mesma que nas lombares, porém a direção do plano articular


(ou seja, da pequena extremidade sacral) é diferente: entre a horizontal e os pés
do paciente.
Tal disposição depende da semibase a manipular, a qual será colocada olhando
para o teto. Como o sacro é um elemento que não se move, ou então pouco,
será necessário forçar bem de leve para conseguir movimentá-lo, pois quanto
mais tensão ocorre, mais haverá continuidade e menos movimento. Deve ser
trabalhado localmente pois frequentemente a ação afeta as lombares por conta
de uma tensão excessiva ou má consideração do plano articular.
O thrust efetua-se verticalmente, considerando bem o plano articular, ou melhor
ainda, sentindo-o. Para tal efeito, os sentidos do terapeuta deverão estar aguçados,
a densidade deve ser boa e não pode haver deformação.

Por que manipular o sacro?


• Devido a problemas mecânicos locais (lombalgia, sacralgia, ciatalgia):
é grande, duro, sensível ao tato. O paciente sente dor ao carregar peso
• Devido a problemas mecânicos a distância, comprometendo a cadeia
ascendente
• Devido a problemas neurovasculares a distância
∙ associados ao dermátomo: órgãos genitais externos, cóccix
∙ associados ao esclerótomo: o pé
∙ associados ao miótomo: TFL, piriforme, glúteos, perônios
∙ associados ao viscerótomo: útero, bexiga, órgãos genitais, ânus,
reto, enurese
∙ associados ao angiótomo: veias hemorroidais
∙ outros: patologias da pelve menor
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 157

3.2 Técnica em casos agudos e desportistas: sacro por trás do pisiforme

A posição é a mesma. O contato estabelece-se através do pisiforme. A única


diferença reside no plano de deslizamento. Em se tratando de uma lombar, o
antebraço aponta na direção dos olhos aproximadamente. Já para manipular a
semibase sacral superior (à esquerda na foto), o antebraço deve estar paralelo à
pequena extremidade sacral, isto é, mais ou menos perpendicular à pelve. A direção
pode ser modificada mediante flexões extensas do membro inferior do paciente:
sem kick inicialmente, só adiante e de forma leve. Se isso não funcionar, descer
diretamente o pé para o chão.
158 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

4. Ilíaco

4.1 Ilíaco anterior: técnica de base com peso e velocidade

Posição do paciente
Em decúbito dorsal, com as pernas cruzadas para abrir a sacroilíaca, pelve em
contato com a perna do terapeuta para fixá-la, e mãos entrecruzadas por trás da
cabeça.

Posição do terapeuta
De lado, contralateralmente em relação ao ilíaco a tratar. Inicialmente colocar
o antebraço cefálico no espaço do cotovelo do paciente. A mão caudal deve ser
colocada sobre a EIAS (espinha ilíaca ântero superior), que fixará na maca.

Manobra
A técnica frequentemente ensinada preconiza que o paciente seja inclinado do
lado oposto ao ilíaco, sendo efetuado o thrust na maca ao termo do tensionamento.
O problema é que nada fica fixo, tudo se mexe e a imprecisão é total. Para evitar
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 159

tal situação, o terapeuta procurará, portanto, constituir dois blocos: parte alta e
parte baixa. O bloco superior cobrirá dos braços até o sacro e o bloco inferior
do ilíaco até os membros inferiores. Em lugar de levar o bloco superior em
rotação oposta ao ilíaco que será manipulado, o terapeuta inclinará primeiro o
bloco superior do mesmo lado (no exemplo da foto, à direita), para obter um
bloco totalmente indeformável (vide leis de Fryette). Somente após ter inclinado
o bloco superior poderá, sem relaxar a inclinação e o empilhamento, efetuar uma
rotação do conjunto em oposição ao ilíaco. A eficácia dessa organização pode ser
sentida a partir do início da inclinação, na mão de contato. Muito frequentemente,
o estralo será audível nos primeiros graus de rotação. Se o thrust for necessário,
será feito na maca, no plano articular do braço menor, ou seja, na verticalidade
e com peso.

4.2 Ilíaco anterior: técnica em casos subagudos e desportistas


É uma técnica difícil. Como o ilíaco fica apoiada no sacro, quando houver apoio
vertical trabalharemos mais sobre o sacro do que o ilíaco. Devemos, portanto,
procurar « desgrudar » praticamente o ilíaco. Poderemos trabalhar com o kick ou
sem ele (será necessário moderar em função da dor), sendo que a descida do kick
contribui a abrir mais ou menos a sacroilíaca, mediante apoio na sínfise púbica.

Posição do paciente
Contrariamente à técnica prévia, trabalharemos na horizontal. O paciente é
colocado em decúbito lateral, como no lumbaroll, em leve deslordose.

Posição do terapeuta
O contato da mão caudal é estabelecido no ísquio (no plano do braço maior),
com os dedos apontando para o teto. O cotovelo deve ficar abaixo do nível da
mão de contato, para respeitar a angulação da sacroilíaca.
A mão cefálica fica apoiada no esterno ou sobre as mãos do paciente, superpostas
sobre a caixa torácica.
O terapeuta cuida de estabelecer dois blocos: parte alta e parte baixa.
160 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Manobra
Primeira instância: o terapeuta quebra a linha no plano do braço maior.
Segunda instância: em relação à parte alta, o terapeuta vai baixar a caixa
torácica do paciente em direção ao púbis e empurrar levemente, o que confirmará
o empilhamento no contato.
Terceira instância: como o ilíaco é anterior, será utilizada a flexão da coxofemoral
para levá-lo para trás. Apenas o terapeuta sente a tensão, tal posição deve representar
o final do thrust. Renovará então a operação só que mais rápido.
Observação: O thrust é realizado essencialmente com a mão de contato
(e na fase expiratória, claro), jamais com o kick de primeira. Tudo reside
na rapidez, nada de peso nesta técnica.

Por que manipular o ilíaco?


Para dores de descarga na sacroilíaca, uma pubalgia, dores profundas na fossa
ilíaca, dores no quadril, cruralgias, no joelho, dores à distância na décima segunda
costela, o quadrado lombar, as costas, uma congestão pelve menor, um retorno
venoso deficiente dos membros inferiores, dores inguinais, testiculares, da sínfise,
coxofemorais… A lista não é exaustiva.

5. Dorsais

5.1 Dorsais e pisiformes cruzados: técnica de base com peso e rapidez em


casos crônicos
Esta técnica pode ser aplicada da D4 à D10.

Posição do paciente
Em decúbito ventral, com os braços pendurados, para afastar as escápulas. Se
for possível, a maca deve dispor de um leve declive na altura dos ombros para que
a borda da maca não impeça o afastamento dos ombros.

Posição do terapeuta
O terapeuta se posiciona homolateralmente, do mesmo lado da lesão, seja
anterior ou posterior, isto é, em “flexão ou extensão”. As articulares dorsais ficam
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 161

no plano frontal, o terapeuta pode, portanto, apoiar seu pisiforme sob uma articular
para subi-la (no caso de uma lesão de extensão) ou colocar-se acima da articular
para abaixá-la (no caso de uma lesão de flexão).

Manobra
No caso de uma lesão de extensão, o terapeuta apoia os joelhos na maca.
Coloca o pisiforme da mão caudal sob a vértebra que deve manipular (D5 na
foto). Estabelece a gravata acima da lesão, com a borda tenar da mão cefálica
sobre a articular (ou as articulares), oposta segurando a vértebra. O terapeuta se
inclinará para frente levemente, para destravar os cotovelos e ter uma inclinação
dos antebraços de aproximadamente 30° (isto pode variar obviamente conforme
a vértebra que for manipulada). Em primeira instância define a vértebra, se coloca
em fase expiratória com o paciente e no final da expiração efetua um thrust
levemente para baixo, mas principalmente em direção à cabeça, com inclinação
de aproximadamente 30°.
É uma técnica que permite aplicar muito peso, porém, haja vista que as dorsais
médias fazem parte da cadeia descendente, será necessário aplicar muita mais
velocidade e muito menos peso. Todavia, nos vídeos que circulam por toda parte
na Internet, na maioria das vezes vemos os terapeutas praticando tal técnica com
os braços estendidos, ou seja, aplicando peso sobre a maca. Isso é uma abominação
para quem conhece a anatomia da coluna vertebral: as superfícies articulares das
vértebras localizam-se no plano frontal, portanto tal prática impactará os planos
articulares, o que evidentemente não é o objetivo.
162 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

5.2 Dorsais em compressão, opção “braço acima”: técnica para casos agudos
e subagudos
Esta técnica relativamente complexa permite tratar as dorsais, junto com as
costelas, em todos os planos. Pode ser aplicada da D1 à D12 e da K218 à K10.

Posição do paciente
Em decúbito dorsal, com os antebraços pregados sobre o tórax, os cotovelos
superpostos e as pernas recolhidas também.

Posição do terapeuta
Sua posição inicial é muito importante. O terapeuta ficará sempre do mesmo
lado, seja qual for o lado da lesão, com o joelho cefálico apontando para a zona
a manipular. O joelho cefálico, os cotovelos e as dorsais estarão, portanto, no
18
Da mesma forma que a letra D designa as dorsais ou L as lombares, a letra K designa as costelas, e assim
a 2ª costela recebe o código K2.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 163

mesmo plano. O terapeuta abaixará com a mão cefálica os cotovelos em direção


ao púbis do paciente, no eixo da coluna, para colocá-la em leve cifose (vide foto).
Logo após, colocará sua mão caudal nas dorsais (ou lombares inferiores), para se
posicionar acima, de forma equilibrada. Enquanto mantém a posição dos cotovelos
do paciente, apoia seu epigástrio sobre os mesmos.
Seguidamente, solicita ao paciente que fique sentado, e durante esse movimento
coloca sua mão cefálica ao longo da coluna vertebral, acima da zona a manipular,
com a cabeça do paciente descansando sobre seu próprio antebraço. Enquanto
isso, o paciente fica apoiado no cotovelo caudal do terapeuta, cuja mão mole
encontra-se fechada sobre a vértebra a manipular.
Observação: Nesta técnica, há também peso e velocidade, mas principalmente
verticalidade e horizontalidade. Quanto mais baixas forem as dorsais em
questão (D9-D12), mais verticalidade será necessária na ação terapêutica.
Inversamente, quanto mais altas forem (D3-D1), mais horizontalidade
será necessária (devido à posição sentada ou semi sentada do paciente
nessa técnica). Paralelamente, quanto mais baixas forem as dorsais, mais o
terapeuta ficará sentado, e quanto mais altas forem, mais deitado.
164 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Finalmente, no caso das dorsais médias, faremos intervir a verticalidade e


a horizontalidade. Mais uma vez, em diversos vídeos os terapeutas aplicam a
técnica mediante um movimento de esmagamento sobre a mesa, o que impacta as
superfícies articulares. É totalmente o contrário do que deve ser feito para decoaptar.
Portanto separaremos a área da manipulação sobre a qual o paciente está deitado
sobre a maca, da parte aérea onde fica sentado. Tal transição da verticalidade à
horizontalidade é operada mediante o ado do terapeuta.

A manipulação em questão
A mão caudal é colocada cobrindo a vértebra a manipular (a D6 por exemplo,
vide foto) para maior conforto, com o dedo maior do terapeuta coincidindo com a
espinha da D6. Se o thrust for feito em direção do anular do terapeuta, a vértebra
se mexe em “flexão”. Em compensação, se o terapeuta passa acima da vértebra
que deve ser manipulada, sua ação vai na direção do indicador e a vértebra se mexe
em extensão. Podem aplicar-se simultaneamente movimentos laterais e de rotação.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 165

6. Transição cervicodorsal

6.1 Técnica de base com peso e velocidade para a charneira C7/ D1


É uma técnica que pode ser utilizada para trabalhar da C5 até a D2-D3.

Posição do paciente
O paciente fica em decúbito ventral, com os braços suspensos e a cabeça na
cabeceira.

Posição do terapeuta
Se colocará acima do paciente, sem se deitar, o olhar na altura do topo do
crânio do paciente. Os ombros do terapeuta e do paciente devem se sobrepor,
e o terapeuta prenderá totalmente o ombro do paciente, com o polegar apoiado
na fossa infraespinhal. O polegar e o antebraço do terapeuta devem permanecer
alinhados, com a mão cefálica apoiada na lateral do rosto do paciente.
166 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Manipulação
• Primeira instância: o terapeuta quebra a linha, não de forma muscular,
mas girando ao redor do eixo de sua coluna. Dessa forma, o ingresso do
polegar caudal no contato acontece naturalmente e passivamente. Assim,
não há tensão no antebraço, o que otimiza as sensações. Este exercício
é difícil inicialmente e o ingresso do polegar de contato costuma ser
muscular, o que apresenta o inconveniente de saturar as informações do
terapeuta nesse nível.
• Segunda instância: a organização sobrejacente (a organização subja-
cente já está feita, pois o terapeuta se encontra deitado sobre o paciente).
O terapeuta abaixa o queixo do paciente e lateraliza com a palma da mão,
não com os dedos, o que inclinaria a cabeça sobre o contato e fecharia
o Forame de conjugação. Logo após, gira a cabeça do lado oposto ao
contato, até sentir o processo espinhoso se apoiar junto ao polegar.
• Finalmente o thrust é realizado no final da expiração (como sempre
trata-se da expiração do paciente e do terapeuta).
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 167

6.2 Em casos agudos e desportistas: C7/D1 sentado com apoio no ísquio

Esta técnica prefere-se a todas as outras pois permite uma busca refinada
das lesões em todos os planos. É válida da C5 à D3, com a primeira costela, em
inspiração ou expiração. Em tal caso, o contato será modificado na porção anterior
do arco, no caso de uma 1ª costela bloqueada em expiração, ou porção posterior,
com a 1ª costela bloqueada em inspiração.
168 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Por sinal, as informações neurológicas são muito melhores quando o paciente


fica sentado, pois se encontram em situação de função (olhar e canais semicirculares
horizontais).
Dificuldade desta técnica: gerir a manobra nos três planos do espaço. Tudo se
mexe. O terapeuta deve ficar especialmente atento a seu corpo, para empilhar-se
até o chão passando pela lesão e se apoiar no ísquio oposto do paciente. É uma das
técnicas mais difíceis de colocar em prática, pois é muito fácil efetuar um movimento
de tesoura, cujo efeito é fechar o forame de conjugação da vértebra manipulada,
e até comprimir os nervos cervicais ou a artéria vertebral. Nos diversos vídeos
que circulam na Internet, podemos ver o terapeuta manobrar sentado e efetuar o
thrust com a mão de contato (na melhor das hipóteses!) enquanto segura a cabeça
do paciente. Essa prática perigosa deve ser evitada sem dúvida alguma.

Posição do paciente
O paciente fica sentado na borda da maca, o terapeuta fica em pé atrás dele,
com o joelho oposto à vértebra apoiado na maca como contra apoio. O terapeuta
começa levando o paciente para trás, deixando que se incline, e então empilha a
vértebra, à direita, em direção ao ísquio do paciente. A organização sobrejacente
é feita segurando a cabeça do paciente, com uma mão apoiada na face lateral.
O thrust é realizado com a mão de contato unicamente, com um movimento
de rotação e de inclinação do mesmo lado.
Observação: O terapeuta não deve, em hipótese alguma, colocar o queixo do
paciente na prega do antebraço, pois na rotação seu cotovelo vai bater no ombro
oposto (aqui à esquerda) do paciente, o que o obrigará a elevar o cotovelo, fechando,
portanto, a coluna cervical sobre a mão de contato.

7. Cervicais

Generalidades sobre as cervicais


A coluna cervical é relativamente frágil e é fácil organizar alavancamentos que
podem ser perigosos para as estruturas anatômicas, especialmente no tocante aos
discos e estruturas vasculares e nervosas vizinhas.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 169

Portanto é necessário respeitar alguns imperativos, principalmente um, inevitável:


quando se estabelece um contato para manipular as cervicais (contato com o
indicador, por exemplo), jamais se deve rebater a coluna cervical sobre o contato.
Jamais devemos fechar as cervicais que desejamos manipular.
Os planos do queixo e dos ombros devem, imperativamente, permanecer
paralelos. Essa é a condição inicial.
Quando se manipula um segmento vertebral e procura-se liberar uma raiz,
arbitrariamente faremos como se a vértebra sobrejacente fosse posterior e inferior.
De fato, a manobra consiste em levar de volta a vértebra para cima e para frente,
para abrir assim o forame de conjugação.
No nível cervical, os corpos vertebrais são menores, os discos são mais finos,
móveis e frágeis. Além disso, nos corpos vertebrais tem as apófises unciformes, o
que aumenta o risco de lesões discais ou ligamentosos.
A artrose intervertebral se desenvolve a partir das bigornas cervicais, e é sempre
às expensas dessas bigornas que os bicos de papagaio evoluem. Assim sendo, tudo
o que for fricção, tensão e hiperpressão nesse nível, induzirá imediatamente um
processo de evolução de osteófitos.
Por todos esses motivos, para proteger o disco, a raiz e os ligamentos, o terapeuta
deve procurar “abrir” e “afastar” as duas vértebras.
Sempre devemos lembrar que não conhecemos jamais o estado prévio da
estrutura, principalmente a parte cervical. Em caso de dúvida, é melhor se abster
e solicitar exames complementares com parte médica.
Observação: para girar à esquerda, existem três possibilidades:
• avançar o pé direito
• recuar o pé esquerdo
• fazer ambas coisas simultaneamente. Essas três possibilidades serão
utilizadas sistematicamente nas técnicas vertebrais.

7.1 C2 posterior à esquerda: técnica de base com peso e velocidade


A seguinte técnica é válida para todas as cervicais, da C7 à C2. Lembrando
170 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

que o plano articular das cervicais fica orientado na direção dos olhos, da mesma
forma deve ficar o antebraço do terapeuta. O indicador, polegar e antebraço do
terapeuta, junto com as cinturas escapular e pélvica, devem estar no plano da C2.
Nessas condições, até quando o terapeuta achar que poderia não ter sido eficiente,
pelo menos estará no plano articular e também terá a certeza de obter uma boa
resposta neurovegetativa ortossimpática.

Como sempre, o sucesso da técnica depende da boa posição do terapeuta.

Exemplo com segunda cervical (C2) posterior à esquerda

Posição do paciente
O paciente fica em decúbito dorsal, relaxado.

Posição do terapeuta
O terapeuta fica do lado da cabeça do paciente. Calça a face interna do joelho
caudal contra a maca e apoia o antebraço cefálico sobre o joelho, paralelo à coluna do
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 171

paciente. O terapeuta se apoia na perna anterior em 70% e 30% na perna posterior.


O ombro esquerdo deve estar acima da vértebra que será tratada. O fato de estar
apoiado na perna anterior mediante o cotovelo faz com que o profissional não
possa mexer o antebraço cefálico (mantido no eixo da coluna), evitando assim, na
movimentação, que a cabeça do paciente retroceda em direção à mão de contato,
fechando de tal forma o forame de conjugação.

Até se posicionar corretamente, o terapeuta não mexe a cabeça do paciente.


172 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

O terapeuta pode então segurar a cabeça do paciente e girá-la levemente, de


forma que a articular a tratar fique orientada em direção ao teto.
A mão de contato adota uma inclinação máxima do cotovelo, com o polegar,
indicador e antebraço orientados em direção aos olhos do paciente. O cotovelo
fica para baixo, para passar por trás da apófise articular da vértebra a manipular,
pois o trabalho ocorre em rotação. Com o polegar da mão inferior colocado entre
os maxilares, o terapeuta deve manter o queixo do paciente abaixado.
O contato é feito com o indicador: o polegar fica apoiado frente ao trago, com
os dedos espalhados sobre o crânio (três pontos fixos e invariáveis entre eles).
A escápula fica em nível baixo, mantida sobre o gradil costal.
Observação: A distância entre o ombro do terapeuta e o paciente deve
permanecer constante durante a manobra.

Manobra
O trabalho seguinte é feito com as pernas. Não há qualquer ação das mãos.
A vértebra vai ao terapeuta, não o contrário. É evidente que o terapeuta deve dispor
de um bom contato ósseo com o indicador. Parece evidente, mas, na prática, em
nove de cada dez casos, os alunos estabelecem contatos ruins. Frequentemente
pensam estar posicionados na C2, mas na verdade é a C1. Não é muito grave,
só que o plano da C1 é bem diferente do plano da C2, pois fica orientado ao
nariz, à boca.
O terapeuta segura a cabeça, se eleva com o corpo e as pernas, e avança no
plano da C2. Esse movimento das pernas deve levar a articular da C2 a entrar em
contato com o indicador, enquanto as mãos permanecem passivas, condição sine
qua non para poder sentir o que acontece.
Essa posição é a referência (a articular fica acima). É a partir dessa referência
que o terapeuta deve otimizar sua técnica. Com a mão cefálica, deixa cair levemente
a cabeça para baixo para abrir o forame de conjugação, e então leva a mão caudal
em direção à mão de contato, mediante um movimento de recuo e uma leve
supinação. Durante a ação, deve sentir uma densidade no contato da C2. Essa
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 173

posição marcará o fim do thrust: o terapeuta voltará então para trás com ambas
mãos ao redor do odontóide e efetuará um thrust rápido com os antebraços, até
o limite alvo definido previamente.

7.2 Em casos subagudos e desportistas: C2


O que muda em relação à técnica prévia? O terapeuta não ficará tão baixo
pois o cotovelo cefálico não estará apoiado no joelho. Certamente isso tira a
segurança do cotovelo apoiado no joelho, mas evita limitar-se a trabalhar com
os antebraços apenas pois, para se ter velocidade nesse caso, seria necessário
procurar uma rotação quase extrema, o que levaria a um movimento de
verticalidade, portanto com peso (próximo ao DFF). Já se trabalharmos com
os punhos, o movimento aéreo é muito rápido e leve, permitindo começar e
parar muito antes (no D.F.O.).
174 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Advertência
Nunca esquecer que o trabalho se efetua sempre ao
redor do odontóide, com todos os perigos que isso
representa em caso de má manipulação, sendo necessária
muitíssima prática antes de utilizar essa técnica.

8. Pé

8.1 Tálus anterior: técnica de base com peso e velocidade


É uma técnica que permite utilizar muito peso, ou seja, é excelente para entorses
antigos. O contato pode ser feito através do pisiforme e indicador, ou apenas o
indicador, sobre a face anterior do tálus.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 175

Posição do paciente
O pé do paciente descansa sobre a coxa do terapeuta, o tendão patelar encosta
na mesa.

Posição do terapeuta
Não são as mãos que avançam, mas duas ou três contrações seguidas por
descontrações do quadríceps do terapeuta são necessárias para organizar a técnica.
Neste caso, não há qualquer ação voluntária dos braços.

Manobra
Quando fica estabelecido o contato com as partes internas e externas do colo
do tálus, o relaxamento do quadríceps do terapeuta reduz o jogo articular do tálus
176 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

na articulação abaixo deste e o thrust segue de praxe com uma contração violenta
de toda a parte superior do corpo, com os antebraços soltos.

8.2 Tálus anterior: técnica para casos subagudos e desportistas

Posição do paciente
Em decúbito ventral, com as pernas dobradas em ângulo de 90°.

Posição do terapeuta
A mão posterior do terapeuta fixa o calcâneo. A cintura do terapeuta fica
paralela ao plano do pé. Um ponto de contato ou dois na maca. Coloca-se a mão
de contato na face anterior do tálus. Os antebraços ficam na horizontal, paralelos
ao pé e à maca.

Manobra
A redução do slack e o thrust só serão efetuados com a mão de contato. É um
procedimento extremamente rápido.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 177

Observação: Observe-se mediante comparação das duas fotos a diferença


entre o trabalho vertical no primeiro caso, ou seja, com muito peso, e o
trabalho horizontal no segundo caso, onde se privilegia a velocidade.

9. Joelho

9.1 Tíbia posterior: técnica de base com peso e velocidade


Esta técnica é interessante, pois permite por um lado aplicar bastante verticalidade
e decoaptação com a mão caudal, e por outro lado permite simultaneamente o thrust.
178 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Posição do paciente
O paciente é colocado em decúbito dorsal, com as pernas flexionadas.

Posição do terapeuta
O terapeuta posiciona-se homolateralmente. A mão cefálica é colocada por trás
do joelho, na altura da fossa poplítea, o que permite fixá-lo, e o terapeuta encosta
o corpo na perna.

Manobra
A redução do jogo articular acontece pelo avanço do terapeuta e a descida de
seu braço caudal. O thrust efetua-se na fase expiratória evidentemente, para baixo,
mediante a descida dos joelhos do terapeuta, o que provocará uma decoaptação
no joelho e (ou) o avanço do platô tibial.

9.2 Tíbia posterior: técnica em casos subagudos e desportistas

Posição do paciente
O paciente é colocado em decúbito ventral.

Posição do terapeuta
O terapeuta posiciona-se homolateralmente e coloca a mão na face posterior
da tíbia, com o antebraço paralelo à coxa, apoiado nela.

Manobra
O terapeuta coloca o pé na cavidade do antebraço cefálico e pega seu punho
caudal. Nessa posição, pode variar o ângulo da perna. O thrust efetua-se somente
com a mão de contato e rapidamente. Nessa posição, também se pode apoiar acima
ou abaixo do menisco.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 179

10. Navicular

10.1 Navicular em rotação interna (com tubérculo baixo): técnica de base


com peso e velocidade
A técnica que veremos aqui é do tipo “chicotada”. As técnicas desse tipo são
interessantes porque permitem agir com extrema rapidez, porém não são muito
precisas, portanto não constituem a primeira escolha para desportistas. Podem ser
aplicadas no conjunto de pequenos ossos do pé.
180 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Posição do paciente
O paciente é colocado em decúbito ventral.

Posição do terapeuta
O terapeuta segura o pé do paciente e estabelece pelo menos um ponto de
apoio na maca. Para ganhar velocidade, não deve projetar-se muito acima do pé.
O terapeuta superpõe os polegares sob o tubérculo do navicular.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 181

Manobra
O terapeuta não deve mexer o corpo em absoluto, apenas os braços trabalham.
Abaixa o pé na direção da maca para reduzir o jogo articular. O terapeuta mantém
a posição dos polegares, dobra os antebraços subindo e então efetua o thrust no
final da descida do pé, como se desse uma chicotada.

10.2 Navicular em rotação interna: duas técnicas para desportistas


• Primeira técnica rápida
Para uma ação mais precisa (não seria o caso da técnica da chicotada).
Esta primeira técnica é adequada para todos os desportistas, exceto
aqueles que praticam esportes chutando bola (futebol, rugby etc.), pois
nesses indivíduos os ossos do pé praticamente não se mexem devido a
traumatismos reiterados.

Posição do paciente
O paciente é colocado em decúbito dorsal.
182 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Posição do terapeuta
O terapeuta fica no extremo da maca. Coloca o indicador de sua mão cefálica
sob o tubérculo do navicular e seu antebraço no prolongamento do plano articular.
Coloca sua mão caudal no primeiro cuneiforme ou no osso cuneiforme medial.

Manobra
O terapeuta executa um movimento de supinação do pé, fixando assim o calcâneo,
e logo após um movimento de pronação do antepé, para reduzir o jogo articular.
Efetua o thrust apenas com a mão de contato, com os antebraços paralelos entre
si e paralelos ao plano articular.
• Segunda técnica com peso

Posição do paciente
Em decúbito lateral, com o navicular em direção ao teto.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 183

Posição do terapeuta
O terapeuta fica no extremo da mesa, apoiado nela. Coloca o pisiforme da mão
cefálica sob o tubérculo do navicular. O cotovelo do terapeuta deve ficar paralelo
ao plano articular, em nível baixo.

Manobra
A mão caudal segura o antepé. Mediante um movimento de supinação do pé
inteiro, o terapeuta fixa o navicular, reduz o jogo articular do antepé através de
uma pronação, e efetua um thrust com a mão de contato.

11. Ombros

11.1 Cabeça umeral anterior em decúbito dorsal: técnica de base com peso e
velocidade

Posição do paciente
Em decúbito dorsal.
184 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

Posição do terapeuta
O terapeuta se posiciona homolateralmente, com a perna cefálica na cavidade
axilar do paciente. O ombro deita na maca, com a cabeça umeral de fora. O contato
estabelece-se mediante a mão cefálica sobre a cabeça umeral.

Manobra
A mão caudal toma o braço e efetua uma leve decoaptação e adução do mesmo.
O terapeuta realiza o thrust na mesa, levemente para fora.

11.2 Cabeça umeral anterior: técnica para casos subagudos e desportistas

Posição do paciente
O paciente fica sentado ou em pé.

Posição do terapeuta
O terapeuta se posiciona homolateralmente.
Evolução das técnicas de base para tratamento específico do atleta | 185

Manobra
O terapeuta coloca sua mão anterior na face anterior da cabeça umeral. Sua mão
posterior fica na parte posterior da escápula. Com a borda do cotovelo se dirige à
apófise coracóide, pega a cabeça umeral e efetua uma leve decoaptação no plano
articular, e logo após realiza o thrust somente com a mão de contato, mantendo
os antebraços paralelos entre eles.

12. Cotovelo

12.1 Cabeça radial anterior: técnica de base com peso e muita velocidade

Posição do paciente
Em decúbito dorsal, com o braço a ser tratado apoiado na maca, paralelo ao
corpo.

Posição do terapeuta
O terapeuta se posiciona contralateralmente. Coloca o indicador da mão cefálica
na face anterior da cabeça radial.

Manobra
O antebraço do terapeuta segura o antebraço do paciente na maca. Os antebraços
ficam paralelos. Com a mão caudal, o terapeuta toma o antebraço do paciente, o
verticaliza, efetua uma pronação para colocá-lo em tensão e efetua o thrust com
a mão de contato.
186 | OSTEOPATIA NO ESPORTE DE ALTO NÍVEL

12.2 Cabeça radial anterior: técnica em casos subagudos e desportistas

Técnica com peso de escolha para os desportistas musculosos que utilizam


muito os braços na prática (tênis, vôlei, golfe).

Posição do paciente
Em decúbito, com o antebraço paralelo ao corpo e a cabeça radial no bordo
da maca.

Posição do terapeuta
O terapeuta coloca seu joelho contra a face lateral. Estabelece contato com a
face anterior da cabeça radial com sua mão cefálica.
Manobra
O terapeuta efetua uma adução contra seu joelho para abrir levemente a
articulação úmeroradial. Realiza uma pronação com a mão cefálica para tensionar
e logo efetua o thrust verticalmente, apenas mediante a mão de contato.
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