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DO
NOVO TESTAMENTO
FILEMOM
Julho de 2004
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 03
1. Autenticidade ...................................................................................................... 03
5. Destinatários da Carta......................................................................................... 04
CONCLUSÃO ........................................................................................................... 42
BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................ 43
EXEGESE DO NOVO TESTAMENTO
FILEMOM
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INTRODUÇÃO
INTRODUÇÃO ESPECÍFICA
1. Autenticidade e Autoria
Quanto à autenticidade e autoria do apóstolo Paulo desta carta, John D. Davis argumenta
que apesar de ser uma pequena carta ela sempre foi reconhecida como legítima produção de Paulo,
sendo encontrada na versão siríaca e na antiga versão latina, nomeada no fragmento de Muratori,
aceita por Marcion, citada por Orígenes e incluída por Euzébio na lista dos livros autênticos e
indisputáveis, servindo ao mesmo tempo de esteio para garantir a autoria das outras epístolas a ela
associadas, a saber, Efésios, Filipenses e Colossenses (cf. DAVIS, 1990, p. 226).
Ainda falando sobre a autenticidade da carta, Baxter cita as palavras do Deão Alford
(BAXTER, 1989, p.268):
“A carta foi preservada na família para a qual foi dirigida e lida primeiro, sem
dúvida, como uma mensagem apostólica de amor e bênção, na igreja que se
reunia na casa de Filemom. A seguir, suas cópias multiplicaram-se e ela espalhou
de Colossos para a igreja universal. Ela foi citada já no segundo século e
permaneceu sempre como uma porção indiscutível dos escritos de Paulo, exceto
com relação a alguns que suspeitam de tudo”.
Com respeito à autoria paulina dessa carta, é importante ressaltar que além de não haver
nenhuma contestação que mereça crédito, há também o fato que a autoria paulina dessa carta é forte
argumento a favor da autoria da carta aos Colossenses ser atribuída a Paulo.
2. Data e Ocasião
Tendo em vista que esta carta compõe o grupo das conhecidas “Cartas da Prisão”,
podemos afirmar que foi escrita entre os anos 60 e 61 A.D.
A ocasião como já foi mencionada, é a da prisão de Paulo em Roma, quando Paulo
conheceu um escravo fugitivo por nome Onésimo (Fm. 10; Cl. 4.9), o qual pertencia a Filemom um
amigo e irmão na fé de Paulo, junto a quem ele intercede a favor de Onésimo.
Filemom também era um “filho na fé” de Paulo que demonstrava um profundo amor por
Deus e pelos irmãos na em Cristo (Fm. 7). Em sua casa na cidade de Colossos se reunia a igreja de
Cristo (Fm. 2), a qual era dirigida por Epafras. Muitos concordam com a idéia de que Arquipo
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ficara como “pastor substituto” de Epafras quando este foi ter com Paulo, e que, além disso, ele
(Arquipo) era filho de Filemom com Afia (Fm. 2). Esta última afirmação, portanto, carece de mais
clareza e base bíblica, apesar de fazer sentido.
A este “filho na fé” Paulo solicita (Fm. 10) o perdão ao escravo que agora deveria ser
visto muito além de escravo, deveria ser visto como irmão em Cristo (Fm. 16). Tão importante era
o assunto para Paulo que ele mesmo redigiu a carta com seu próprio punho não valendo-se de um
escrevente como era de costume (Fm. 19).
Depois de elogiar a Filemom mostrando-lhe o quão importante ele era para si e para os
demais irmãos em Cristo, Paulo relata a conversão de Onésimo. Uma vez feito isso, por meio de
um pedido elaborado, Paulo apelou para o amor cristão e à fé de Filemom, a fim de que ele
perdoasse a Onésimo e o recebesse como “irmão caríssimo” (Fm. 16). Caso Filemom tivesse
alguma dificuldade em assim fazer, Paulo garantiu-lhe restituir tudo quanto Onésimo dele tomara
(Fm. 18), e, além disso, apelou para o fato de que Filemom lhe devia a sua própria vida (Fm. 19).
Diante disso afirmamos que o propósito imediato da carta é mostrar a Filemom que: O
amor cristão vai além de todas as barreiras e concede o perdão a quem dele necessita.
O amor de Filemom pelos crentes era tanto que abria a sua própria casa para nela se
reunirem (Fm. 2); o amor que Paulo tinha por Filemom era tanto que o levava a interceder a seu
favor constantemente (Fm. 4), por que via o amor que Filemom tinha por Cristo e pelos seus irmãos
na fé (Fm. 5). Paulo também era alvo do amor de Filemom e através deste era “reanimado” (Fm.
7). E era com esse amor que Paulo esperava que Filemom recebesse aquele que antes era apenas
um escravo (embora, naquela época os escravos fossem tratados como membros da família, sendo
tratados com distinção), e que agora, era um membro da família da fé. Por isso, Paulo usa toda a
sua força pessoal e consciência cristã para levar Filemom a acolher Onésimo, e quem sabe, enviá-lo
a Paulo para que lhe servisse no ministério (Fm. 13 e 14).
4. O Tema da Carta
Sendo assim, podemos propor como tema principal dessa carta: O Amor Cristão na
Prática.
5. Destinatários da Carta
Não há dúvida alguma que o destinatário primário por assim dizer, é Filemom. Há quem
afirme que Paulo havia escrito a Filemom, mas que, o destinatário principal era Arquipo, a quem
Paulo exorta para tomar cuidado com o ministério (Cl. 4.17). Este ministério, diz Gundry citando
Goodspeed, que Arquipo deveria tomar cuidado não era outro senão acatar o pedido de Paulo e
libertar Onésimo (cf. GUNDRY, 1991, p. 339). Contrariamente, parece que o ministério que
Arquipo havia recebido do Senhor era algo mais ativo e oficial do que a soltura de um simples
escravo (ver número 2 dessa introdução).
Contudo, essa carta apesar de ser a mais “pessoal” de Paulo, teve várias cópias as quais
passaram por inúmeras igrejas levando o parecer apostólico sobre a escravatura em relação ao amor
cristão, o qual é-nos um importante legado do Espírito Santo sobre o assunto.
Com certeza Filemom e os de sua casa, habitavam a cidade de Colossos, de outra forma
não haveria explicação para a ligação que há entre as pessoas mencionadas nas duas cartas; uma
comparação dos seguintes textos comprova tal afirmação: Cl. 1.1 com Fm. 1.1; Cl. 1.7-8 e 4.12-17
com Fm. 23 e 24.
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ESBOÇO EXEGÉTICO
SÍNTESE EXEGÉTICA
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ESBOÇO EXEGÉTICO DE FILEMOM
Paulo inicia a sua carta (v.1-3) como sempre, saudando os irmãos a quem remete a carta,
neste caso, Filemom é o principal destinatário uma vez que assunto diz respeito a ele diretamente.
Rendendo graças a Deus (v.4-7) pela vida de Filemom o qual carinhosamente é considerado pelo
apóstolo como um “reanimador dos santos” (v.7) pelo amor que é visível em seu comportamento.
Tendo em vista este amor na vida de Filemom, Paulo intercede junto a este pelo seu
escravo fugitivo Onésimo (v.8-21), de quem testemunha a conversão a Cristo e ressalta a
importância que este recém-convertido tem para eles (v.8-14). Com isso em vista, de forma muito
gentil e delicada, apelando para o amor cristão que Filemom evidenciava no seu viver, Paulo
intercede por Onésimo, a fim de que recebesse não só o perdão de Filemom por sua transgressão
bem como a liberação para auxiliar a Paulo em seu ministério como já vinha fazendo (v.15-21).
Nem mesmo a prisão detinha o entusiasmo de Paulo para com seu ministério, tanto que
fazia planos de visitar os irmãos em Colossos (v.22-25), para rever seus conhecidos e conhecer aos
demais irmãos, uma vez que não os conhecia a maioria pessoalmente conforme Cl. 2.1. Solicita ao
querido irmão Filemom que lhe prepare alojamento, pois pretendia executar o plano de visitá-los
em breve (v.22). Comunica também as saudações de seus companheiros de prisão (v.23 e 24) e
despede-se de Filemom com a bênção encontrada numa das formas mais sucintas em todas as suas
cartas (v.25).
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ANÁLISE DO TEXTO GREGO
E TRADUÇÃO (LIVRE)
DA
EPÍSTOLA DE PAULO
A
FILEMOM
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Filemom 1-3
1 Pau/loj de,smioj Cristou/ VIhsou/ kai. Timo,qeoj o` avdelfo.j Filh,moni tw/| avgaphtw/| kai. sunergw/|
h`mw/n
Paulo, prisioneiro de Cristo Jesus e o irmão Timóteo, ao amado Filemom, também nosso
companheiro de serviço
2 kai. VApfi,a| th/| avdelfh/| kai. VArci,ppw| tw/| sustratiw,th| h`mw/n kai. th/| katV oi=ko,n sou evkklhsi,a|(
e à irmã Áfia, e ao nosso colega de militância Arquipo, e também à igreja em tua casa:
3 ca,rij u`mi/n kai. eivrh,nh avpo. qeou/ patro.j h`mw/n kai. kuri,ou VIhsou/ Cristou/Å
Graça e paz a vós da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo.
(1) Paulo, prisioneiro de Cristo Jesus e o irmão Timóteo, ao amado Filemom, também nosso
companheiro de serviço, (2) e à irmã Áfia, e ao nosso colega de militância Arquipo, e também à
igreja em tua casa: (3) Graça e paz a vós da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo.
Filemom v.4-7
4 Euvcaristw/ tw/| qew/| mou pa,ntote mnei,an sou poiou,menoj evpi. tw/n proseucw/n mou(
Euvcaristw/ presente o indicativo ativo da 1ª pessoa do singular de euvcariste,w sou bem agradecido.
Era um aspecto comum nas catas helenísticas que o remetente louvasse os deuses pela saúde
e bem-estar de seus destinatários, e os assegurasse de suas orações por eles. Paulo dá um
conteúdo distintamente cristão à formula ao dar a razão de seu agradecimento (cf. RR. p.
488).
tw/| artigo definido dativo masculino singular de o´`` ao
qew/| substantivo dativo masculino singular de qeo,j Deus
mou pronome pessoal genitivo da 1ª pessoa do singular de evgw, de mim
pa,ntote advérbio de tempo de pa,ntote a todo o tempo, sempre
mnei,an substantivo acusativo feminino singular de mnei,a lembrança, menção
sou pronome pessoal genitivo da 2ª pessoa do singular de su, de ti
poiou,menoj nominativo masculino da 1ª pessoa do singular do particípio presente médio de fazendo.
A construção significa “mencionar na oração” (cf. RR. p.488).
evpi. Preposição genitiva de evpi, sobre
tw/n artigo definido genitivo feminino plural de o´`` das
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proseucw/n substantivo genitivo feminino plural de proseuch, orações
mou pronome pessoal genitivo da 1ª pessoa do singular de evgw, de mim
Sou bem agradecido ao meu Deus fazendo menção de ti a todo o tempo nas minhas orações,
5 avkou,wn sou th.n avga,phn kai. th.n pi,stin( h]n e;ceij pro.j to.n ku,rion VIhsou/n kai. eivj pa,ntaj tou.j
a`gi,ouj(
ouvindo do teu amor e da fé que tens para com o Senhor Jesus e para com todos os santos,
6 o[pwj h` koinwni,a th/j pi,stew,j sou evnergh.j ge,nhtai evn evpignw,sei panto.j avgaqou/ tou/ evn h`mi/n
eivj Cristo,na
o[pwj adjunto adverbial de relação ou conjunção de o[pwj para que, a fim de que. A conjunção
introduz o objetivo da oração de Paulo, ou, simplesmente, dá o conteúdo da oração (cf. RR.
p.488).
h` artigo definido nominativo feminino singular de o`` a
koinwni,a substantivo nominativo feminino singular de koinwni,a comunhão, participação. A
palavra pode denotar generosidade ou participação e a idéia principal é que a fé de Filemom
deve se mostrar através de serviço amoroso (cf. RR. p. 488).
th/j artigo genitivo feminino singular de o`` da
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pi,stew,j substantivo genitivo feminino singular de pi,stij fé. O genitivo pode ser objetivo (cf. RR.
p.488).
sou pronome pessoal genitivo da 2ª pessoa do singular de su, de ti
evnergh.j adjetivo nominativo feminino singular de evnergh,j operante em, ativa, produtiva, eficaz.
ge,nhtai aoristo do subjuntivo médio da 3ª pessoa do singular de gi,nomai venha a ser
evn preposição dativa de evn em
evpignw,sei substantivo dativo feminino singular de evpi,gnwsij conhecimento sobre, pleno
conhecimento
panto.j adjetivo genitivo feminino singular de pa/j de todo
avgaqou/ adjunto pronominal genitivo neutro singular de avgaqo,j bem. O adjetivo e o adjunto (panto.j
avgaqou), podem se referir àquilo que é da vontade de Deus, e referem-se geralmente a
alguma coisa que deve ser feita ou realizada (cf. RR. p.488)
tou/ artigo definido genitivo neutro singular de o`` do
evn preposição dativa de evn em
h`mi/n pronome pessoal dativo da 1ª pessoa do plural de evgw, nós
eivj preposição acusativa de eivj para com
Cristo,nÅ substantivo acusativo masculino singular de Cristo,j Cristo
Para que a comunhão da tua fé venha a ser operante no pleno conhecimento de todo bem em nós
para com Cristo.
7 cara.n ga.r pollh.n e;scon kai. para,klhsin evpi. th/| avga,ph| sou( o[ti ta. spla,gcna tw/n a`gi,wn
avnape,pautai dia. sou/( avdelfe,Å
Filemom v.8-21
8 Dio,( pollh.n evn Cristw/| parrhsi,an e;cwn evpita,ssein soi to. avnh/kon
Portanto, em Cristo, tendo muita ousadia de falar abertamente para ordenar a ti o que é devido,
9 dia. th.n avga,phn ma/llon parakalw/( toiou/toj w'n w`j Pau/loj presbu,thj nuni. de. kai. de,smioj
Cristou/ VIhsou/\
15
Pau/loj substantivo nominativo masculino singular de Pau/loj Paulo
presbu,thj substantivo nominativo masculino singular de presbu,thj velho, idoso, embaixador.
O sentido requer que Paulo invoque sua autoridade como embaixador (cf. RR. p. 489).
nuni. Adjunto adverbial de tempo nuni, agora
de. Conjunção coordenada de de, porém
kai. Adjunto adverbial de tempo kai, até
de,smioj substantivo nominativo masculino singular de atado, prisioneiro.
Cristou/ substantivo genitivo masculino singular de Cristo,j Cristo
VIhsou/\ substantivo genitivo masculino singular de VIhsou/j Jesus
ao invés disso, em razão do amor suplico, eu Paulo, o velho, agora porém, até como prisioneiro
de Cristo Jesus
10 parakalw/ se peri. tou/ evmou/ te,knou( o]n evge,nnhsa evn toi/j desmoi/j( VOnh,simon(
11 to,n pote, soi a;crhston nuni. de. Îkai.Ð soi. kai. evmoi. eu;crhston(
16
o qual outrora, te era imprestável, agora porém, não somente a ti mas também a mim é bem útil,
13 o]n evgw. evboulo,mhn pro.j evmauto.n kate,cein( i[na u`pe.r sou/ moi diakonh/| evn toi/j desmoi/j tou/
euvaggeli,ou(
17
o qual eu desejava manter comigo para que me servisse em teu lugar nas cadeias por causa do
Evangelho
14 cwri.j de. th/j sh/j gnw,mhj ouvde.n hvqe,lhsa poih/sai( i[na mh. w`j kata. avna,gkhn to. avgaqo,n sou h=|
avlla. kata. e`kou,sionÅ
Nada porém, quis fazer sem o teu consentimento, para que não seja como necessidade o
benefício que provém de ti, mas de livre vontade.
15 ta,ca ga.r dia. tou/to evcwri,sqh pro.j w[ran( i[na aivw,nion auvto.n avpe,ch|j(
Ora, talvez em razão disto, ele foi separado de ti, por breve momento, para que o tivésseis
permanentemente,
16 ouvke,ti w`j dou/lon avlla. u`pe.r dou/lon( avdelfo.n avgaphto,n( ma,lista evmoi,( po,sw| de. ma/llon soi.
kai. evn sarki. kai. evn kuri,w|Å
não mais como um escravo, mas acima de escravo, como irmão amado especialmente de mim,
porém muito mais de ti tanto na carne como no Senhor.
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transicional. Seu significado varia de acordo com o contexto, e, algumas vezes pode ser
deixada sem tradução.
me pronome pessoal acusativo da 1ª pessoa do singular de evgw, me
e;ceij presente do indicativo ativo da 2ª pessoa do singular de e;cw, tens
koinwno,n(substantivo acusativo masculino singular de koinwno,j companheiro, comparsa, parceiro.
proslabou/ aoristo do imperativo médio da 2ª pessoa do singular de proslamba,nw toma para,
recebe para, aceite em sociedade ou no seu círculo de amizades (cf. RR. p. 490).
auvto.n pronome acusativo masculino da 3ª pessoa do singular de ele (o)
w`j conjunção subordinada de w`j como
evme,Å pronome pessoal acusativo da 1ª pessoa do singular de evgw, a mim
Se, porém, nalguma coisa ele agiu injustamente ou está te devendo, isto lança em minha conta:
19 evgw. Pau/loj e;graya th/| evmh/| ceiri,( evgw. avpoti,sw\ i[na mh. le,gw soi o[ti kai. seauto,n moi
prosofei,leijÅ
Eu, Paulo, escrevi com a minha própria mão. Eu pagarei de volta, para que eu não te faleque até
a ti mesmo me deves em acréscimo.
20 nai,( avdelfe,( evgw, sou ovnai,mhn evn kuri,w|\ avna,pauso,n mou ta. spla,gcna evn Cristw/|Å
Sim, irmão, que eu de ti receba este benefício no Senhor e seja refrigerado em Cristo o meu
coração.
21 Pepoiqw.j th/| u`pakoh/| sou e;graya, soi( eivdw.j o[ti kai. u`pe.r a] le,gw poih,seijÅ
Tendo-me assegurado da tua obediência, escrevi a ti sabendo que também farás além do que
estou dizendo.
(8) Portanto, em Cristo, tendo muita ousadia de falar abertamente para ordenar a ti o que é
devido, (9) ao invés disso, em razão do amor suplico, eu, Paulo, o velho, agora porém, até como
prisioneiro de Cristo Jesus (10) Suplico-te a respeito de meu filho que gerei entre cadeias,
Onésimo (11) o qual outrora, te era imprestável, agora porém, não somente a ti mas também a
mim é bem útil, (12) o qual mando de volta a ti, como se fosse o meu coração (13) o qual eu
deseja manter comigo para que me servisse em teu lugar nas cadeias por causa do Evangelho
(14) Nada porém, quis fazer sem o teu consentimento, para que não seja como necessidade o
benefício que provém de ti, mas de livre vontade. (15) Ora, talvez em razão disto, ele foi separado
de ti, por breve momento, para que o tivésseis permanentemente, (16) não mais como um escravo,
mas acima de escravo, como irmão amado especialmente de mim, porém muito mais de ti tanto
na carne como no Senhor. (17) Se, portanto, me tens como companheiro, receba-o como a mim
mesmo. (18) Se, porém, nalguma coisa ele agiu injustamente ou está te devendo, isto lança em
minha conta: (19) Eu, Paulo, escrevi com a minha própria mão. Eu pagarei de volta, para que eu
não te fale que até a ti mesmo me deves em acréscimo. (20) Sim, irmão, que eu de ti receba este
benefício no Senhor e seja refrigerado em Cristo o meu coração. (21) Tendo-me assegurado da
tua obediência, escrevi a ti sabendo que também farás além do que estou dizendo.
Filemom v.22-25
22 a[ma de. kai. e`toi,maze, moi xeni,an\ evlpi,zw ga.r o[ti dia. tw/n proseucw/n u`mw/n carisqh,somai
u`mi/nÅ
22
dia. Preposição genitiva de meio dia, através de
tw/n artigo definido genitivo feminino plural de o`` das
proseucw/n substantivo genitivo feminino plural de proseuch, orações
u`mw/n pronome pessoal genitivo da 2ª pessoa do plural de su, de vós, vossas
carisqh,somai futuro do indicativo passivo da 1ª pessoa do singular de cari,zomai haverei de ser por
graça dado. A voz passiva sugere que somente Deus pode assegurar a libertação de Paulo,
embora ele confie nas orações da comunidade para pedir a Deus tal favor (cf. RR. p.490).
u`mi/nÅ pronome pessoal dativo da 2ª pessoa do plural de o`` a vós, vos.
Ao mesmo tempo, porém, também apronta-me hospedagem, pois espero que através das vossas
orações haverei de ser por graça restituído a vós
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COMENTÁRIO EXEGÉTICO
DE
FILEMOM
25
1 – A Saudação Familiar de Paulo (v.1-3)
Logo no início dessa carta, encontramos dados importantes sobre a mesma, tais como:
(1) o autor: Paulo; (2) os destinatários: Filemom, em primeiro lugar, e Áfia, Arquipo e a Igreja que
se reunia na casa de Filemom em segundo lugar; (3) a ocasião em que a carta foi escrita: na prisão,
durante a qual também escreveu, Efésios, Filipenses e Colossenses; (4) o companheiro de sempre:
Timóteo; (5) em nome de quem Paulo se apresentava: de Cristo.
Dessa forma, Paulo fazendo uso do estilo da época para escrever cartas, enriquece esse
estilo colocando em sua correspondência, detalhes importantes, dos quais destaca-se a saudação do
v.3: “Graça e paz a vós da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo”. Veremos a riqueza
dessa saudação quando comentarmos este verso.
v.1
“Paulo, prisioneiro de Cristo Jesus...”
No v.9, em Ef. 3.1; 4.1 e 2Tm.1.8, encontramos esse adjetivo que Paulo dá a si mesmo,
a saber, “prisioneiro” (de,smioj). Com tal adjetivo ele está mostrando a natureza do seu ministério,
ou seja, ele é prisioneiro por causa de Cristo. Sua fidelidade a Cristo estava acima de qualquer
ameaça real, por isso, se entregava a Ele pela fé, pois sabia perfeitamente que tudo e todos estão em
Suas mãos benditas (Cl. 1.15-17) que um dia foram transpassadas na cruz por amor a este pecador,
que agora é um prisioneiro por causa do amor e devoção a Esse Senhor que tanto o amou. Paulo vê
em seu sofrimento, quer seja estes em açoites, escárnios, fome, perseguição, escassez, prisão ou
qualquer outra forma de privação, algo honroso, pois como disse aos Filipenses: “Porque vos foi
concedida a graça de padecerdes por Cristo e não somente de crerdes nele...”.
Willian Hendriksen sugere que nessas palavras Paulo está insinuando o pedido que irá
fazer a Filemom, nas seguintes palavras: “Tendo em vista o sofrimento que estou passando,o que
estou lhe pedindo, querido Filemom, não é tão difícil, a saber, o perdão e a libertação de
Onésimo” (cf. HENDRIKSEN, 1993, p. 255).
O amor fraternal com que Paulo tratava os seus companheiros de ministério pode ser
visto não só com respeito a Timóteo, mas nesta carta também pode ser visto no que diz respeito a
Filemom (v.7 e 20), e à Áfia (v.2). Quanto a Onésimo, ele muda o tratamento para “filho” (v.10).
Paulo reconhecia a importância de se ver naqueles que Cristo colocara em sua vida para colaborar
com ele no mistério, uma relação fraternal – eram filhos do mesmo Pai.
Sobre Timóteo, é importante ressaltar que ele foi um dos companheiros de Paulo que
demonstrou grande firmeza e fidelidade a Cristo e ao apóstolo, pois enquanto alguns o
abandonaram posteriormente (2Tm. 4. 9-18), Timóteo sempre foi motivo de alegria para o coração
do velho apóstolo. Pode-se dizer que Timóteo foi discipulado por Paulo nas suas cadeias. Um servo
de Cristo frutifica até mesmo nas piores circunstâncias. Paulo nas suas prisões discipulou a
Timóteo e também gerou a Onésimo (v.10).
v.2
“ e à irmã Áfia, e ao nosso colega de militância Arquipo...”
Seria Áfia esposa de Filemom, e Arquipo, seu filho? Pode ser que sim, pode ser que não,
pois nos faltam provas mais concretas sobre o assunto. O que importa saber é que Áfia era “irmã”
em Cristo e Arquipo era sustratiw,thj “colega de militância, co-soldado”, uma pessoa engajada
nas mesmas lutas e conflitos, que enfrentava os mesmos perigos e buscava os mesmos objetivos (cf.
RR. p. 488). Este tratamento dado a Arquipo só aparece mais uma vez no Novo Testamento em
referência a Epafrodito (Fp. 2.25).
Segundo Cl. 4.17, onde encontramos uma ordem explícita a Arquipo de que ele deveria
prestar atenção ao ministério que recebera no Senhor ao qual deveria cumprir, o que longe de ser
uma repreensão era mais uma exortação à firmeza e à sabedoria em se colocar como líder da Igreja
de Cristo que se reunia na casa de Filemom da qual possivelmente ele (Arquipo) era o pastor
“interino”, pois o líder daquela Igreja era Epafras, e que naqueles tempos estava preso com Paulo
em Roma.
Temos aqui não apenas uma saudação afetuosa, mas também, uma informação histórica
sobre a Igreja de Cristo. Nos primórdios do Evangelho, a Igreja não dispunha de templos como os
que concebemos hoje. Os cristãos se reuniam nas casas. Os cultos eram freqüentados pelos
membros da família: pai, mãe, filhos e empregados. Se a casa fosse espaçosa para acomodar outras
pessoas, assim acontecia. Podemos constatar isso em At. 12.12, onde vemos que muitos se reuniam
e oravam na casa de Maria mãe de João Marcos; em At. 16. 15 e 40, na casa de Lídia a qual foi
oferecida a Paulo, Silas, Timóteo e Lucas para usarem-na como sede para as reuniões; 1Co. 16.19 e
Rm. 16. 3-5, Éfeso e Roma, lugares por onde passaram o casal Priscila e Áquila, a casa deles era
um local oferecido para as reuniões dos crentes. E outros textos mais comprovam esse fato. Pode-se
dizer que Filemom seguiu a “regra”.
v.3
“Graça e paz a vós da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo”
Após mencionar os que deveriam receber a carta – é claro que o destinatário principal
da carta era Filemom – Paulo faz a sua saudação predileta: “Graça e Paz”.
A graça que é o favor ativo de Deus que é espontânea e imerecida por nossa parte, é o
que promove ao coração do pecador a paz reconciliando-o com Deus. A graça e a paz com que ele
saúda àqueles irmãos era “da parte de Deus (...) e do Senhor Jesus Cristo”, portanto, era muito
especial.
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É importante atentarmos para a construção gramatical dessa frase, pois Paulo não está
dizendo que a graça e a paz era apenas da parte de Deus o qual é o nosso Pai e também Pai do
Senhor Jesus Cristo; Paulo está dizendo que a graça e a paz era da parte de Deus e da parte do
Senhor Jesus Cristo. Com isso Paulo está mostrando a Divindade de Cristo tal como fez claramente
na carta aos Colossenses, O qual é tão Divino como o Pai, na mesma forma e substância.
Nessa Saudação pessoal de Paulo, podemos destacar algumas verdades preciosas para
nós:
1) A glória do crente (v.1): Definitivamente, a glória do crente está no nome de Cristo. Longe de
Paulo o pensar que o seu sofrimento por causa de Cristo lhe era algo vergonhoso e repugnante. Para
Paulo, sofrer por causa de Cristo e do Seu Evangelho era motivo de profunda alegria. Nestes
sofrimentos podia contar sempre com a graça de Deus que o fortalecia, a qual era a “força motriz”
do seu ministério, e também com o auxílio e companheirismo de outros que tinham o mesmo
propósito, a saber, tornar Cristo conhecido e glorificado entre os homens.
2) O vínculo entre os crentes (v.2): A forma como Paulo tratava os crentes (irmãos, cooperadores,
companheiros de lutas, etc), mostra o vínculo que há entre os crentes. Em Cristo, os crentes
desfrutam de uma íntima comunhão. Comungam da mesma fé e têm o mesmo Pai, por isso são
“irmãos”. Em Cristo comungam da mesma luta pelo Evangelho, por isso são “companheiro de
serviço e colegas de militância”. Isso faz dos crentes “um só corpo”, o corpo de Cristo.
3) A maior bênção que o crente tem (v.3): Sem dúvida alguma, a maior bênção que temos como
crentes em Cristo é a Graça de Deus. Algo que jamais merecemos, mas com certeza, sempre
carecemos. O fruto imediato dessa Graça, é a paz com Deus. Cessou-se a guerra com Deus e os
homens; Cristo nos trouxe a paz por meio do Seu sacrifício. Dessa bênção provém todas as outras.
Tê-la é o maior consolo que o homem recebe para o seu coração.
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2. Ação de Graças Pela Vida de Filemom (v.4-7)
Como sempre, a saudação de Paulo é seguida por ações de graça e oração.
v.4
“Sou bem agradecido ao meu Deus fazendo menção de ti a todo o tempo nas minhas
orações”
Com muita sinceridade e honestidade podia afirmar que constantemente agradecia a Deus de
forma intensa pela vida de Filemom. Se Paulo tinha muito o que agradecer a Deus por Filemom,
certamente, era porque Filemom lhe dava motivos para ser muito agradecido a Deus. E os motivos
de gratidão eram:
v.5
“ouvindo do teu amor e da fé que tens, para com o Senhor Jesus e para com todos os
santos”
O amor pelos santos (irmãos na fé) e a fé que Filemom tinha no Senhor Jesus traziam ao
coração de Paulo essa forte gratidão. Aqui temos o que pode ser considerado um bom testemunho.
O bom testemunho não é aquele que falamos acerca de nosso comportamento, mas sim, aquele do
qual outros falam sobre o nosso comportamento. É o que acontecia a respeito de Filemom, pois
Paulo “ouvindo” falar do seu amor e fé, rendia graças ao Senhor. O particípio (avkou,wn) pode ser
causal “por que ouvi” e indica a razão da gratidão de Paulo (cf. RR. p. 488).
Certamente, foi de Epafras que Paulo ouvira sobre Filemom. Talvez, até mesmo do próprio
escravo fugitivo, Onésimo, Paulo recebera essas informações sobre Filemom, é claro que se isso
aconteceu mesmo, foi depois da conversão de Onésimo, pois antes dela ter acontecido, dificilmente
este falaria do seu senhor.
Outro fato importante na construção gramatical dessa frase é a sua forma quiástica, ou seja,
cruzada: o amor para com os santos e a fé no Senhor Jesus Cristo. Ao mencionar o amor que
Filemom tinha para com todos os santos, Paulo já estava preparando o terreno para pedir-lhe que
em nome do amor desse mais um passo, a saber, perdoar Onésimo e recebê-lo como irmão em
Cristo. Esse amor não era um sentimento qualquer, mas sim, fruto da fé em Cristo. A verdadeira fé
se expressa em atos e demonstrações concretas de amor. A preposição (pro,j) indica direção. Aqui é
usada em relação a fé que aspira a Cristo (cf. RR. p. 488).
v.6
“para que a comunhão da tua fé venha a ser operante no pleno conhecimento de todo
bem em nós para com Cristo”
Paulo ainda orava ao Senhor em favor de Filemom “para que a comunhão” da fé que ele
tinha viesse a ser “operante no pleno conhecimento de todo bem”, tanto nele como em Paulo
“para com Cristo”. A palavra comunhão (koinwni,a) pode denotar generosidade ou participação e a
idéia principal é que a fé de Filemom deveria se mostrar através de serviço amoroso (cf. RR. p.
488). Sendo assim, Paulo está a referir-se aqui a um compartilhar da fé de Filemom, o qual
resultaria numa ação efetiva, produtiva e eficaz, levando ao “pleno conhecimento de todo bem que
nós temos em Cristo”, ou seja, o que Paulo está querendo dizer aqui é que Filemom deveria
compartilhar a sua fé (a qual produzira um amor pelos crentes de forma tão visível e concreta)
também com Onésimo, e para que tivesse forças para fazer isso, deveria atentar para o bem que
alcançou todos os crentes, a saber, a graça de Cristo. Se Filemom tivesse alguma dificuldade e
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resistência em perdoar Onésimo, deveria ver o que Cristo um dia fez por ele e por todos os crentes,
a saber, perdoou-lhes os pecados.
Paulo ainda não diz explicitamente o que ele tem em mente, mas vai deixando algumas
“pistas” no decorrer da carta. Mais uma vez lança mão de uma palavra estimuladora e positiva:
v.7
“Pois, tive muita alegria e consolação por teu amor, porque os corações dos santos têm
sido refrigerados por meio de ti, irmão”.
Filemom já havia feito por outras pessoas o que Paulo está pedindo em favor de Onésimo.
Talvez fosse a primeira vez que Filemom estivesse sendo solicitado a fazer tal coisa em favor de
um escravo. Contudo não deveria vê-lo como um escravo, mas, muito mais do que isso: como um
irmão (v.16).
Muitos outros haviam sido “refrigerados” pelo amor de Filemom. Preferimos o termo
“refrigerados” a “reanimados” como tradução para avnape,pautai, pois é a tradução literal e a
palavra implica em “relaxamento, descanso”, como uma preparação para a renovação do trabalho
ou sofrimento (cf. RR. p. 488).
Não somente os santos, mas também, Paulo experimentara desse amor renovador da parte
de Filemom. Talvez o próprio Filemom foi um dos que ajudaram diretamente no sustento de Paulo
em seu ministério apostólico.
Paulo agradecia a Deus pela vida de Filemom pelo o que ele era. E nestes versos podemos
destacar algumas características do verdadeiro cristão:
1) Ele dá um bom testemunho (v.5): Filemom dava um bom testemunho, pois a respeito dele
Paulo ficou sabendo do seu amor pelos santos e da sua fé em Cristo. Pode-se dizer que nesses dois
elementos temos o resumo do Evangelho. A Fé em Cristo quando vivida plenamente, leva o crente
a amar o seu próximo e a ter atos de compaixão e amor para com ele. Agindo assim, o que fica em
evidência é o bom testemunho dado por ele. O bom testemunho não é uma propaganda que
fazemos acerca de nós mesmos, mas sim, o que outros dizem de nós, como aconteceu com
Filemom.
2) Ele tem uma boa memória (v.6): por “boa memória” nos referimos aqui ao fato do crente ter
sempre em mente o que Cristo fez por ele. Que lhe for pedido o perdão deve lembrar-se do que
Cristo fez por ele perdoando-o lá na cruz, e assim deve então perdoar. Quando lhe pedirem ajuda
deve sempre lembrar que Cristo não somente o ajudou como também o capacitou a ajudar outras
pessoas. Dessa forma, o crente sempre saberá como agir e encontrará forças para agir mesmo
quando as circunstâncias exigirem dele algo que lhe seja difícil.
3) Ele é uma bênção para outras pessoas (v.7): “Sê tu uma bênção” (Gn. 12.2) foi a ordem de
Deus a Abraão. Filemom era uma bênção de Deus na vida de outras pessoas, e Paulo louvava a
Deus por isso. Em nossos tempos enquanto a ênfase está no ter uma bênção cada qual deveria
atentar para o fato de que ser uma bênção é a vontade de Deus para nossa vida. É lamentável essa
inversão de valores! A ênfase do Evangelho é o dar em vez de receber, é o ser em vez de ter.
30
3. A Intercessão de Paulo Junto a Filemom a Favor de Onésimo (v.8-21)
Tendo em vista o pedido que fará a Filemom (v.15-21), Paulo, primeiramente, relata a
conversão de Onésimo e a importância que este tem para o seu (de Paulo) ministério.
v.8
“Portanto...”
Tendo em vista que Filemom era um que refrigerava os corações cansados, Paulo
prossegue:
“... em Cristo, tendo muita ousadia de falar abertamente para ordenar a ti o que é devido”
Paulo tinha ousadia em Cristo para falar abertamente aquilo que Filemom deveria fazer;
poderia usar sua autoridade apostólica a favor do que queria que Filemom fizesse. Paulo faria
assim, se a ousadia que tinha fosse um atrevimento. Contudo, não deve ser vista como um
atrevimento essa ousadia, mas sim, como liberdade para falar com confiança na sua própria
autoridade. Em vez disso, Paulo apela para o caminho do coração (veja-se v.9). Ainda sobre essa
ousadia (parrhsi,a), Paulo faz questão de dizer que ela era “em Cristo”, ou seja, ele nunca trazia
para si ou para qualquer outra pessoa ou coisa a sua autoridade apostólica, mas sim, apontava para
Cristo. Houve vezes em que ele enfatizou sua autoridade apostólica em conduzir a Igreja (Rm. 1.1;
1Co. 5.3, 4; 9.1; 2Co. 10.13, 14; 12.12; Gl. 1.1; 2Tm. 1.1-11; 4.1; Tt. 1.1). Aqui, porém, prefere
apelar para o amor, como podemos ver no próximo versículo.
v.9
“ao invés disso, em razão do amor suplico...”
Bem que poderia usar sua autoridade apostólica para exigir de Filemom o que lhe era devido
fazer. “Ao invés disso”, apela para algo muito maior, a saber, o amor cristão que era uma
característica de Filemom. É certo que Paulo aqui, não descartara a sua autoridade apostólica,
mesmo porque ele até mesmo fez questão de mencioná-la não como uma ameaça, mas como uma
lembrança de que ele poderia ter escolhido este caminho, contudo, preferiu apelar para o amor
cristão. A “via” do amor sempre é a melhor.
Num tom de profunda afeição e gentil persuasão, Paulo continua seu apelo:
“.. eu, Paulo, o velho, agora porém, até como prisioneiro de Cristo Jesus”
Além de “velho” (presbu,thj), agora era até mesmo como um “prisioneiro de Cristo Jesus”.
Qual a idade de Paulo nesta ocasião, não sabemos. A julgar pelo fato de que ele era um jovem na
ocasião da morte de Estevão (At. 7.58), e a data em que esta carta foi escrita (ver o item “Data e
Ocasião” na introdução deste trabalho), podemos pensar algo em torno dos 60 anos. Se para nós tal
idade parece não ser tão avançada assim, vale lembrar que para aquela época a expectativa de vida
era muito mais curta, e quem chegasse a essa idade poderia muito bem ser considerado um velho ou
ancião.
Contudo, o peso maior nesta sentença recai na no segundo adjetivo que Paulo dá a si
mesmo, a saber, “prisioneiro de Cristo Jesus”. Paulo não se considerava um prisioneiro do Império
Romano, mas, sim, de Cristo Jesus. Sabia muito bem que a razão de estar naquela prisão era a
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pregação do Evangelho, a qual ele cumpria com todas as forças do seu ser. Por conta dessa forma de
ver as coisas Paulo podia dizer que ele sentia “prazer” nessas situações (2Co. 12.10).
v.10
“Suplico-te a respeito de meu filho que gerei entre cadeias, Onésimo”
A forma como está construída esta sentença no grego é como está apresentada acima, o que
não é o caso da ARA, NVI, BJ, ARC e ACF. Não é por acaso que Paulo coloca o nome de Onésimo
por último nesta sentença. Ele planejou cuidadosamente esta sentença. Antes de mencionar por
quem está intercedendo, Paulo procura mostrar a Filemom quem era e o que acontecera a essa
pessoa por quem intercede (cf. HENDRIKSEN, 1993, p. 265).
Colaborando com essa idéia, está todo o afeto de Paulo demonstrado por Onésimo: “...meu
filho que gerei entre cadeias...”. Se começasse como as versões citadas acima há pouco, Filemom
antes de ler o pedido de Paulo, ao ler o nome de Onésimo lembraria do prejuízo que este lhe
causara, e com certeza alguma barreira poderia surgir em seu coração.
v.11
“o qual outrora, te era imprestável, agora porém, não somente a ti mas também a mim é
bem útil”
Como quem não faz vistas grossas ao pecado, Paulo agora diz que este por quem intercede,
um dia foi um “imprestável, inútil” (a;crhstoj), mas que, depois de seu encontro pessoal com
Cristo, se tornara em uma pessoa “bem útil” (eu;crhstoj), tanto para Filemom a quem dera tantos
desgostos, quanto para Paulo que testemunhara seu “novo nascimento” na prisão.
Paulo já havia apelado para a personalidade amorosa de Filemom, havia apelado para a sua
própria idade, também para a sua prisão, para a conversão de Onésimo e agora, apela para a
conveniência a Filemom em acolher Onésimo, o qual antes era um inútil contrariando o significado
do seu próprio nome, sendo agora, útil a Filemom por o serviria “no Senhor Jesus”, e com isso
traria para Paulo grande alegria, e dessa forma “serviria” tanto a Filemom como a Paulo.
v.12
“o qual mando de volta a ti, como se fosse o meu coração”
Quanto afeto Paulo demonstrou até mesmo por um escravo! Temos aqui um resultado muito
forte e maravilhoso do Evangelho. Ele restaura vidas a ponto de dar total credibilidade até mesmo
àqueles que um dia fizeram de tudo para não merecê-la. Paulo tinha tanta certeza da conversão de
Onésimo que o recomendou a Filemom como se fosse a si próprio (é o que ele estava querendo
dizer com “como se fosse o meu coração”).
Ao enviar Onésimo de volta a Filemom, Paulo não o deixou sozinho a suplicar o perdão de
seu senhor; pelo contrário, amparou-lhe através de: (1) Tíquico (Cl. 4.7-9); (2) uma carta de Paulo
endereçada a toda a congregação de Colossos na qual são enfatizados o amor e o espírito de perdão;
(3) uma carta a Filemom tratando especificamente do caso de Onésimo. Como disse Willian
Hendriksen: “Seguramente, nunca um fugitivo retornou ao seu senhor em melhor companhia!”
(HENDRIKSEN, 1993, P.266). Como poderia Filemom rejeitar o próprio “coração de Paulo”?
Paulo voltará a lançar mão desse argumento novamente no v.17.
v.13
“o qual eu desejava manter comigo para que me servisse em teu lugar nas cadeias por
causa do Evangelho”
32
Paulo não está como quem desejava se livrar de um problema fazendo de tudo para que o
mesmo fosse resolvido. Pelo contrário, já o vemos agora, preparando o coração de Filemom, para
quem sabe, permitisse que Onésimo voltasse para a companhia de Paulo e o ajudasse na pregação
do Evangelho.
Ele manifesta o desejo de manter Onésimo junto a si, como sendo o substituto de Filemom
auxiliando Paulo. É interessante o trocadilho que Paulo faz com as palavras. Primeiro diz que
Filemom deveria receber Onésimo em lugar de sua própria pessoa (Paulo); agora, afirma que
Onésimo está em lugar de Filemom auxiliando-o na Obra do Senhor.
Paulo, impedido pelo bom senso, não quis ficar com Onésimo sem antes pedir ao seu senhor
Filemom que o liberasse. Conhecendo a Filemom, Paulo presume que este gostaria de estar com ele
na prisão para ajudá-lo neste momento difícil. Havendo esse desejo no coração de Filemom, Paulo
sugeriu que Onésimo o servisse em seu lugar.
v.14
“Nada porém, quis fazer sem o teu consentimento, para que não seja como necessidade o
benefício que provém de ti, mas de livre vontade”
Paulo apresenta agora, um argumento ainda mais forte para ter agido com bom senso em
relação a Onésimo e a Filemom. O espírito voluntário da contribuição de Filemom deveria ser
preservado. Paulo, se quisesse poderia ter exigido de Filemom que deixasse Onésimo consigo;
contudo, não é este o objetivo de Paulo nas palavras desse parágrafo. Seu objetivo é mostrar a
Filemom em que homem tão valoroso e útil Onésimo fora transformado. Se Filemom permitisse (e
isso de forma voluntária), Onésimo poderia ficar ajudando Paulo no ministério.
O benefício que provinha de Filemom, isto é, o perdão a Onésimo e a permissão para que ele
servisse a Paulo, deveria ser uma expressão da voluntariedade de Filemom, e não algo que soasse
como uma obrigação, uma necessidade que ele (Filemom) deveria suprir, mesmo não querendo.
Embora esta perícope trate da conversão de Onésimo, as lições destacadas aqui dizem
respeito a Paulo. Como o assunto principal aqui é a conversão a Cristo, podemos afirmar que um
coração convertido a Cristo:
1) Age sempre com gentileza (v.8): mesmo tendo toda a autoridade em Cristo, Paulo dirige-se a
Filemom com gentileza. Uma das características do amor cristão é a gentileza para com o próximo.
A Bíblia para falar de gentileza no tratamento entre as pessoas, fala de cordialidade (Rm. 12.10). A
gentileza não é só uma ferramenta excelente para se conseguir o que está sendo solicitado, mas, é
uma forma de tratar as pessoas com dignidade e honra. A gentileza é um freio para o nosso ego
inflamado de orgulho e vaidade.
2) Age sempre com amor (v.9 e 10): nestes versos vemos o amor de Paulo por Onésimo.
Intercedia a favor deste porque o amava como a um filho. Mas, o que nos chama a atenção aqui, é a
expressão “em razão do amor”. O crente deve sempre agir com amor. Suas palavras e ações devem
ser embebidas no amor de Cristo. Paulo suplicava a favor de Onésimo em nome do amor de Cristo.
É o amor de Cristo que transforma o pecador imprestável, num filho da Luz e útil. Se tivermos que
tomar alguma atitude, alguma decisão, que seja em nome do amor de Cristo.
3) Age sempre com confiança (v.11 e 12): Paulo confiava tanto no poder de Deus em transformar
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um pecador, que deu o seu próprio nome como garantia a Filemom em favor de Onésimo. Não
somente isso, mas também cria piamente, na transformação ocorrida na vida de Onésimo pelo poder
de Deus. A única esperança para esse mundo decaído é a Graça de Deus. Somente ela pode
promover tamanha confiança a ser depositada sobre uma pessoa que antes dera todas as provas de
ser merecedora de desconfiança e rejeição.
4) Age sempre com humildade (v.13): podemos dizer que aqui Paulo agiu com humildade, pois ao
reconhecer que precisava de Onésimo (e também de Filemom) para servi-lo, estava sendo humilde
em reconhecer suas limitações pessoais. Um coração convertido a Cristo aprende logo no princípio
que não é auto-suficiente e que precisa dos outros para vencer as lutas e dificuldades na vida.
5) Age sempre com respeito (v.14): aqui nos referimos ao respeito para com a liberdade que cada
pessoa tem de tomar ou não uma decisão, mesmo que esta seja muito conveniente, como é o caso de
Filemom para com o pedido que lhe foi feito pelo o apóstolo. Todos os argumentos que Paulo usara
até aqui foram suficientemente fortes para fazerem com que Filemom o acatasse sem nenhum
questionamento. Contudo, Paulo respeita a decisão de Filemom. Se este fosse coagido a atender
Paulo, não estaria agindo conforme os padrões do Evangelho. Se Paulo o obrigasse a atendê-lo
também não estaria se portando conforme a orientação da Palavra. Um coração convertido a Cristo
entende a importância que se tem em respeitar a liberdade alheia. O espírito voluntário do crente em
fazer o bem e obedecer a Palavra sempre agrada a Deus.
Uma vez narrada com tanta veemência a conversão de Onésimo, Paulo agora, faz o pedido a
Filemom.
v.15
“Ora, talvez em razão disto, ele foi separado de ti, por breve momento, para que o tivésseis
permanentemente”
Como quem nunca vê os fatos da vida como obras do acaso, mas, como propósitos de Deus
direcionados pela Sua santa mão, Paulo presume (e não afirmando categoricamente) que Onésimo
fora afastado de Filemom para que tivesse um encontro real com Cristo e fosse convertido à Fé
Evangélica. Com certeza Paulo está muito cauteloso aqui com suas palavras, pois, se afirmasse
categoricamente, que o motivo pelo qual Onésimo fora afastado de Filemom fora para ser
convertido, estaria “abafando” o pecado de Onésimo. Contudo, o que Paulo está mostrando aqui é
que Deus é tão maravilhoso que tem os Seus métodos infalíveis para transformar os corações. Deus
não aproveita a circunstâncias como se fosse um oportunista, pois isso é o mesmo que afirmar que
Ele não tem domínio sobre os fatos. Deus tem tudo sobre controle, e estava nos Seus planos que a
conversão de Onésimo acontecesse nessas circunstâncias, o que não O torna culpado pelo pecado de
Onésimo, haja visto que foi por causa do seu pecado que ele foi parar na prisão onde Paulo estava.
De fato estamos aqui diante de um assunto muito complicado: a Soberania de Deus e a
responsabilidade humana. A dificuldade desse assunto está no fato pensarmos que ambas as
verdades são opostas entre si, quando na verdade, ambas são totalmente ligadas e em nada uma
anula a outra. Certa vez, perguntaram a Charles Spurgeon como ele conciliava essas duas verdades,
e ele respondeu: “Simplesmente, não faço. Não reconcilio amigas”.
O que seria desse mundo caído, não fosse a misericórdia de Deus que reverte o mal em
bem? De fato, a esperança para esse mundo está somente na graça e amor de Deus revelados em
Cristo Jesus.
34
Paulo mostra para Filemom que o elo senhor-escravo fora quebrado por um breve tempo
com a fuga de Onésimo, para que o elo irmão-irmão fosse estabelecido por toda a eternidade, é o
que ele passa a dizer no próximo verso.
v.16
“não mais como um escravo, mas acima de escravo, como irmão amado especialmente de
mim, porém muito mais de ti tanto na carne como no Senhor.”
Paulo não propõe imediatamente, a abolição da escravatura. Antes, Trabalha a relação entre
Filemom e Onésimo num aspecto muito mais elevado. Onésimo ainda que recebido como irmão em
Cristo, permaneceria um servo de Filemom. Não mudaria a posição social, mas o tratamento
dispensado a ele. Filemom deveria receber Onésimo como um irmão amado.
O advérbio “especialmente” tem um sentido muito forte neste verso. A palavra ma,lista
pode ser traduzida também por “excessivamente, imensamente” e ainda por “intensamente”. A
ligação com Paulo era apenas uma: pai e filho na fé. Com Filemom, porém, era dupla: “tanto na
carne como no Senhor”. Era tanto nos assuntos desse mundo como nos da vida mais elevada.
Tanto no trabalho como na igreja se sustentará este relacionamento santificado entre senhor e servo,
irmão e irmão (cf. HENDRIKSEN, 1993, p.270).
v.17
“Se, portanto, me tens como companheiro, receba-o como a mim mesmo”
Eis o pedido de forma explícita. Paulo pede a Filemom que receba a Onésimo como se
recebesse a ele mesmo, Paulo. Ele ainda usa um outro argumento muito forte: “Se, portanto, me
tens como companheiro...”. O substantivo koinwno,j que foi traduzido por “companheiro” quer
dizer muito mais do que um amigo; aponta para “aquele que participa da mesma comunhão
espiritual”. Essa comunhão sugere sempre um repartir. Sendo Filemom um companheiro de Paulo
que participava com ele das mesmas lutas por causa da mesma fé, deveria entender que para Paulo,
Onésimo tinha a mesma posição e status – era-lhe um koinwno,j no ministério.
v.18
“ Se, porém, nalguma coisa ele agiu injustamente ou está te devendo, isto lança em minha
conta:”
Desde o princípio dessa carta, estava sempre claro na mente de Paulo um argumento que
Filemom poderia usar e se tornar um obstáculo para atender o pedido do apóstolo. Paulo sabia que
Onésimo dera algum prejuízo para Filemom, quer por meio de um roubo como muitos sugerem o
que não está muito explícito no texto, quer pela sua ausência quando fugira de Filemom acarretando
assim, em algum prejuízo para este.
Havendo algum prejuízo causado por Onésimo, Paulo está disposto a pagar a Filemom. O
que poderia ser usado como argumento para não receber Onésimo de volta, foi anulado com esse
contra-argumento de Paulo.
Paulo não estava fazendo aqui uma promessa vazia. Tomando por base os textos de At.
24.26, no qual Félix o detivera a fim de receber dele algum dinheiro, At. 28.30 que nos mostra que
Paulo alugara uma casa para si com seus próprios recursos, e este verso da carta a Filemom, pode-se
afirmar que Paulo tinha algum dinheiro ou pelo menos sabia de onde consegui-lo. Vale lembrar que
Paulo tinha a profissão de fazer tendas, à qual sempre recorria quando tinha necessidade, At. 18.1-4.
Dando ainda um peso maior a essa “proposta”, Paulo empenha a sua palavra:
35
v.19
“Eu, Paulo, escrevi com a minha própria mão.”
Eis aqui a “nota promissória” assinada por Paulo. Sempre ele se valia de um escrevente para
suas cartas, as quais ele algumas vezes fez questão de assinar no final de cada uma. Como Paulo
tinha um problema que o impossibilitava de escrever as cartas com suas próprias mãos precisando
assim de um escrevente (muitos concordam que o “espinho na carne” referido em 2Co. 12.7-10, era
um deficiência visual que o impedia de realizar algumas coisas como por exemplo, escrever cartas),
Filemom poderia pensar que Onésimo tivesse escrito uma carta falsa em nome de Paulo. Se tal
hipótese fosse levantada, estava ali a assinatura de Paulo para confirmar a veracidade de tudo aquilo
que estava escrito.
Contudo, tal conjectura cai por terra, pois mesmo que Onésimo escrito uma carta em nome
de Paulo e falsificado sua assinatura, teria falsificado o pensamento de Paulo que é tão claro nesta
carta, o qual nem mesmo grandes escritores (coisa que Onésimo não era) conseguem fazer?
A assinatura de Paulo aqui é mais uma garantia que Filemom recebia do apóstolo, de que ele
(Filemom) poderia acolher a Onésimo sem temer sofrer outros danos.
“Eu pagarei de volta, para que eu não te fale que até a ti mesmo me deves em acréscimo”
Paulo além de empenhar sua palavra quanto ao pagamento de qualquer prejuízo causado por
Onésimo, lembra a Filemom que há uma dívida: só que esta dívida é entre Filemom e Paulo. Não
era uma dívida em dinheiro, mas sim, da própria vida. Filemom fora convertido a Cristo por
instrumentalidade direta ou indireta de Paulo; era fruto do trabalho do apóstolo. A reciprocidade
deveria ser praticada aqui. Filemom não deveria levar em conta a dívida de Onésimo porque Paulo
não levou em conta a dívida de Filemom. Esse é o princípio que norteia o perdão na vida do crente,
e encontra a sua expressão literal na oração do “Pai nosso”: “...perdoa-nos as nossas dívidas, assim
como nós temos perdoado ao nossos devedores...” (Mt. 6.12). Paulo cancelara a dívida de
Filemom, por que Deus, em Cristo, havia cancelado a sua dívida.
O complemento “em acréscimo” conota a dimensão da dívida de Filemom. Se Onésimo lhe
devia alguma coisa, a dívida de Filemom para com Paulo era muito maior, era a sua própria vida.
v.20
“Sim, irmão, que eu de ti receba este benefício no Senhor e seja refrigerado em Cristo o
meu coração”
Apesar das afirmações no verso anterior soarem um tanto quanto pesadas Paulo retoma a
forma delicada e singela na sua petição.
Tratando Filemom mais uma vez de “irmão”, também menciona a posição em que este se
encontra: alguém em condições de beneficiar outras pessoas, refrigerando corações. Paulo entende
que se Onésimo for agraciado com o perdão de Filemom, o benefício também seria para si próprio,
pois diz: “...que eu de ti receba este benefício...”, e mostra que o “elo” que os une e sela este
benefício está “...no Senhor (...) em Cristo...”. Com isso mostra que toda a esfera de
relacionamentos dos crentes tem como base a pessoa de Cristo.
O verbo avnapau,w aqui está no aoristo do imperativo ativo da segunda pessoa do singular e
pode ser traduzido como “pausa acima, refrigerado, reanimado”. A palavra implica em
“relaxamento, descanso”, como uma preparação para a renovação do trabalho ou sofrimento (cf.
RR. p. 488). Agindo assim, Filemom estaria reanimando Paulo para continuar na sua luta e
sofrimento. Como precisamos ter ao nosso lado pessoas que nos refrigeram e reanimam o coração.
Paulo deve ter aprendido essa lição com um outro companheiro que era chamado de “filho da
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exortação”, a saber, Barnabé. Este lhe estendera a mão quando todos em Jerusalém se recusavam a
crer na sua conversão (At. 9.26-30). Também tivera a mesma atitude para com João Marcos quando
este quisera fazer parte da equipe missionária na segunda viagem, ao qual Paulo não quisera levar
consigo, pois havia desertado na primeira viagem (At. 13.13-15; 15. 36-41).
O crente deve ser sempre uma pessoa pronta a trazer refrigério para os corações cansados e
sofridos. No Evangelho aprendemos que Cristo fez isso por nós, dando-Se a Si próprio para que
tivéssemos a Sua vida em nós.
v.21
“Tendo-me assegurado da tua obediência, escrevi a ti sabendo que também farás além do
que estou dizendo (pedindo)”
1) Que tem tudo sob controle (v.15): Paulo ao levantar a questão da fuga de Onésimo ter servido
como ocasião para sua conversão, embora tenha feito hipoteticamente, fica claro que para ele as
coisas não acontecem por acaso ou por conta própria. Ele cria no Deus que tem tudo sob controle,
que é capaz de transformar uma situação desfavorável em favorável, que pode reverter o mal em
bem. O que tinha parecido um prejuízo (e foi) para Filemom, a saber, a fuga de Onésimo, Deus
transformara em benefício a todos, inclusive para Filemom, pois agora ele recebia um servo de
Deus como seu empregado.
2) Que transforma os relacionamentos (v.16 e 17): Filemom receberia não um escravo fujão, mas
um irmão arrependido que buscava o seu perdão. Deus pode transformar os relacionamentos,
inclusive aqueles que são marcados por diferenças e contratempos. A ferramenta que o Senhor usa
para curar as feridas causadas por diferenças nos relacionamentos é o perdão que deve ser uma
expressão do perdão de Deus concedido a nós na pessoa de Jesus.
37
3) Que nos ensina a sermos responsáveis com o discipulado (v.18 e 19): Para Paulo a
responsabilidade com o discipulado se estendia a todas as áreas do discipulado. Entendia que
Onésimo era de sua responsabilidade e por isso, endossou a situação com seu próprio nome. Ele cria
na transformação ocorrida na vida de Onésimo e por isso assumia a responsabilidade sobre ele. É
muito importante para os que estão começando a caminhar na fé receberem o apoio e o cuidado de
alguém mais experiente. Isso lhe dará o respaldo para poder se firmar cada vez mais e amadurecer
na fé.
4) Que nos capacita a andarmos a “segunda milha” (v.20 e 21): Paulo esperava que Filemom
perdoasse a Onésimo e o recebesse como irmão; além disso, esperava algo mais, e como vimos,
esse algo mais podia ser várias coisas. Contudo, deve ser ressaltada aqui a questão do perdão mais
uma vez. Andar a “segunda milha” não é fácil, mas, como é importante para quem errou receber
essa oportunidade. O perdão é o amor em ação; perdoa-se quando se sabe o quanto é maravilhoso
ser perdoado!
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4. Planos Futuros, Saudações Finais e Bênção (v.22-25)
Nesta última seção da carta a Filemom, encontramos os planos futuros de Paulo (v.22),
e a saudação dos seus companheiros de prisão (v.23-25).
Apesar de muitos verem este verso como parte do parágrafo anterior, é importante
separá-lo por se tratar de planos pessoais do apóstolo, e caso viesse a concretizá-los, precisaria da
ajuda de Filemom, concedendo-lhe outro favor.
v.22
“Ao mesmo tempo, porém, também apronta-me hospedagem...”
“Ao mesmo tempo...” em que haveria de receber a Onésimo em casa, Filemom deveria
preparar um quarto de hóspedes para Paulo “pois”:
“... espero que através das vossas orações haverei de ser por graça restituído a vós”
Paulo tinha esperança em seu coração de ser liberto daquela prisão. Para isso, contava
com as orações não só de Filemom, mas de Áfia, Arquipo, bem como de todos os crentes da Igreja
de Colossos. Ele não somente ora por Filemom (v.4) e por todos os santos, como também quer que
todos estejam orando por ele e engajados na intercessão. Veja-se também 1Ts. 5.25.
Willian Hendriksen (cf. HENDRIKSEN, 1993, p. 274) chama a atenção para a ordem
dessas palavras. Paulo não disse: “Por meio das vossas orações espero ser solto da prisão”, mas:
“espero que através das vossas orações haverei de ser por graça restituído a vós”, o que nos
mostra a convicção que Paulo tina de que Deus ouve as orações dos Seus filhos e as responde como
lhe apraz. Notem que ele crê que isso haveria de acontecer, a saber, a sua liberdade, “por graça” e
não por obrigação. Deus responde as nossas orações por graça e misericórdia e não por obrigação.
Ao que parece, levando em consideração outras cartas de Paulo, é certo que ele tenha
sido livrado dessa prisão e veio a fazer uso desse quarto preparado por Filemom.
Analisando 2Tm. 4.9-18, vemos Paulo com uma outra perspectiva, a saber, o fim já
estava muito próximo e ele pouco tinha esperança de ser solto. Contudo, nem assim deixou se
abater e de continuar sua tarefa em escrever outros documentos.
Lições Importantes da Perícope (v.22)
2) A dependência que Temos de Deus para estabelecer metas: tão pior quanto não estabelecer
metas para nossa vida, é estabelecê-las sem reconhecermos a nossa dependência de Deus. Paulo
sabia perfeitamente o que ele queria fazer depois de sair, contudo, sabia também que só o faria se
Deus o abençoasse ouvindo as orações da Igreja. Mostrar a nossa dependência da pessoa de Deus é
um bom testemunho. Uma das principais maneiras de expressarmos a nossa dependência de Deus é
através da oração e da intercessão.
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4.2 - Saudações de Seus Companheiros e Bênção (v.23-25)
v.23
“Saúda-te Epafras, meu co-prisioneiro em Cristo Jesus”
O responsável pela igreja de Colossos e portador das notícias a respeito desta igreja,
Epafras, estava ali com Paulo na prisão. Em Colossenses vemos que Epafras foi até Paulo levando
informações sobre problemas que rondavam aquela igreja, a saber, o Gnosticismo que com suas
sutilezas estava enredando os crentes mais fracos, afirmando que Jesus não era Deus, mas apenas
uma manifestação (inferior) do deus Pleroma. Que o sacrifício de Cristo não foi real e por isso,
ineficaz.
Epafras enviava saudações a Filemom o qual com certeza era um membro da igreja de
Colossos pastoreado por Epafras. Podemos pensar que pelo fato de Epafras estar enviando
saudações a Filemom, ele pretendia ficar mais algum tempo com Paulo. Isso é apenas uma
conjectura, pois não sabemos exatamente qual seria o motivo de sua permanência uma vez que a
igreja de Colossos era de sua responsabilidade.
O que deve ser ressaltado aqui é o substantivo co-prisioneiro (sunaicma,lwto,j) e o seu
complemento “em Cristo”. Epafras foi identificado como alguém que participava das mesmas
lutas, enfrentava as mesmas ameaças que Paulo tinha e enfrentava “em Cristo”.
v.24
“(assim como) Marcos, Aristarco, Demas e Lucas, meus companheiros de trabalho”
Marcos é o mesmo João Marcos sobrinho de Barnabé, o mesmo que havia desertado na
primeira viagem missionária de Paulo e Barnabé (At. 13.13-15), e que na segunda viagem ao querer
voltar a fazer parte do grupo foi o pivô da separação de Paulo e Barnabé (At. 15.36-41). Em Cl.
4.10, Paulo faz recomendações aos crentes de Colossos para que recebam a Marcos; em 2Tm. 4.11,
Paulo pede a Timóteo que traga com ele a Marcos por que este lhe é útil para o ministério. Marcos
é para nós um caso típico de alguém que recebeu uma segunda chance aproveitou-a para se tornar
um melhor servo de Deus.
Quanto a Aristarco, em Cl. 4.10, vemos que ele também recebe o título de “co-
prisioneiro” de Paulo, indicando que ele era um “prisioneiro de guerra”, alguém que havia sido
capturado na batalha.
Ele aparece pela primeira vez no relato bíblico estando com Paulo na cidade de
Tessalônica. Acompanhou-o na terceira viagem missionária, estando com ele durante o longo
tempo em que passara na cidade de Éfeso.
Quanto Demas, Paulo ainda nem sequer imaginava o que estava por acontecer. Em
2Tm. 4.10, Paulo desabafa com Timóteo sobre Demas e diz: “Demas, tendo amado o presente
século, me abandonou e se foi para Tessalônica...”. Contudo, o que nos importa aqui é o presente
momento em que esta carta foi escrita. Nesta ocasião, Demas lutava ao lado de Paulo sendo-lhe um
companheiro no ministério.
Lucas é o “médico amado”. É maravilhoso ver como Deus cuida dos Seus. Numa
prisão, com certeza Paulo precisaria de cuidados médicos. Embora precárias as condições, mas
Lucas poderia oferecer algum cuidado médico a Paulo e seus companheiros. Lucas era um gentio, e
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além da medicina dedicava-se à História, e por isso mesmo, escreveu o terceiro Evangelho que leva
o seu nome, que de todos os quatro Evangelhos é o mais detalhado.
v.25
“A graça do Senhor Jesus Cristo [seja] com o vosso espírito”
Podemos destacar como tema dessa perícope, o companheirismo como principal lição.
2) Companheirismo de Cristo (v.25): Cristo é o Divino companheiro dos crentes. A Sua graça é a
prova mais concreta e real da Sua presença e companhia. Ele revigora o nosso espírito, fortalece-
nos para a batalha. Dele provém o alento para o nosso coração e o vínculo que mantém os irmãos
em perfeita união e companheirismo.
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CONCLUSÃO
Temos aqui uma carta em nome do amor. Como disse Willian Hendriksen: “Aqui está
uma real demonstração e ilustração de fé através do amor” (HENDRIKSEN, 1993, P.275). Foi
por amor ao Senhor Jesus que Paulo recebeu Onésimo como filho na fé e por amor a Onésimo que
Paulo o recomendou a Filemom. Se Filemom atendeu ao pedido de Paulo quanto a Onésimo não
sabemos, pois aparentemente, não há nenhum escrito posterior a essa carta que confirme essa
resposta.
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