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CARTAS DE AMÍLCAR CABRAL A MARIA HELENA:


A OUTRA FACE DO HOMEM

Ele de pasta de couro na mão, fato e gravata, uma


gabardine branca debaixo do braço. Ela de saia
comprida preta, um casaco da mesma cor e um
ramo de flores. Os dois sorriem, como em algumas
das (poucas) fotografias do casal que aparecem
em Cartas de Amílcar Cabral a Maria Helena /A
Outra Face do Homem – organizado pela filha e
historiadora Iva Cabral, e pelos também editores
Márcia Souto e Filinto Elísio. Porque este livro de
capa dura e maior do que o habitual tem mais
reprodução de cartas do que imagens do homem
que marcou a História de libertação nacional da
Guiné-Bissau e de Cabo Verde, do homem que foi
e continua a ser um dos grandes ícones da luta
contra o colonialismo português.
Amílcar Cabral pode dizer a Helena que
tem saudades da amada, mas usa a escrita
sobretudo como um contador de histórias do seu
quotidiano. Por isso às vezes parece que estamos
a ler diários, onde descreve a vida da Lisboa
daquele tempo, ou o impacto que uma cidade como Luanda teve em si.
São, é verdade, cartas que revelam as diversas fases da vida do casal, que se conheceu
no Instituto Superior de Agronomia. Entre o namoro, que começou em 1946, e o casamento
que durou até meados dos anos 1960 (a própria filha não se lembra exatamente da data da
separação): os dois estiveram juntos uns vinte anos. O Cabral que primeiro aparece é o jovem
de vinte e dois anos, nascido na Guiné-Bissau, mas criado em Cabo Verde, ainda estudante em
Lisboa, a escrever a uma Maria Helena, portuguesa, natural de Chaves.
Em outubro de 1946, começa por tratar “Maria Helena” por você. Eram então colegas
no curso de Agronomia em Lisboa. Deseja-lhe boa sorte para os exames. Fala-lhe em saudades
uns meses depois. E em março de 1948 confessa-lhe, a partir da Casa dos Estudantes do
Império, em Lisboa, e já depois de passar em revista o seu dia: “Sabes que já não sei estudar
sozinho? Sabes que eu já não sei estar sem a tua presença? Vem depressa Lena, que te espera
ansiosamente o muito dedicado, Amílcar”. E assim sucessivamente, com cartas diárias e
longas, enviadas de Lisboa, mas também de Angola (Luanda e Benguela) ou de Paris, até ao dia
em que planearam a fuga de Helena e a filha Iva para França em 1960.
A correspondência está dividida em duas décadas, 1946-1950 e 1950-1960. Assim se
vai revelando a personalidade amorosa e intelectual do Cabral fundador do Partido Africano
para a Independência de Cabo Verde e Guiné-Bissau (PAIGC, em 1959), do guerrilheiro contra
o exército português (assassinado, porém, em Conacri por membros do PAIGC, em 1973), do
herói de muitos hoje pela ideologia antirracista que proclamou, pelo ícone da negritude em
que se tornou.
A historiadora Iva Cabral releu as cartas para as organizar em livro e, como filha,
garantiu que não ia “revelar intimidades”. Estas cartas revelam o amor entre os pais, sim.
Porém, uma das grandes preocupações da historiadora foi mostrar aos jovens que “um líder se
constrói a si mesmo: estudando, namorando, tendo amizades, amando a cidade em que vive.
Ninguém nasce líder”. Quis revelar a outra face do mito, do herói. “Há muita juventude que o
conhece só como o rebelde. Queria que conhecessem o humano, a pessoa que ama e que diz
‘vamos estudar’, que ama os amigos, que tem objetivos na vida. Há muito jovem que é
cabralista e tem que saber que ser cabralista não é só ser rebelde. Tem que haver ética,
moral.”

in Jornal Público, 27/3/2016 (adaptado).

Exercício de Compreensão

1. Qual o assunto central das cartas que Amílcar Cabral escreveu a Maria Helena? Justifique a
resposta com passagens do texto.
2. Relacione, a partir de exemplos do texto, os registos linguísticos e formas de tratamento
das cartas de Amílcar Cabral com a evolução da sua relação com Maria Helena.
3. Qual(is) o(s) objetivo(s) de Iva Cabral ao publicar este livro?

Exercício de Escrita
Acervos de Amílcar Cabral na Fundação Mário Soares

A prestigiada Fundação Mário Soares, que guarda um vasto espólio documental sobre a história dos
países africanos de língua portuguesa, atravessa atualmente um período financeiro bastante crítico,
depois da morte do seu fundador a 7 de janeiro de 2017.
Desde que faleceu o ex-presidente português Mário Soares, presidente da instituição, os subsídios de que
beneficiava a fundação caíram para metade, estando, hoje, o saldo negativo na ordem dos 388 mil euros.
Em causa está o destino do espólio existente na fundação, caso esta venha a fechar portas.
A saúde financeira da instituição portuguesa inquieta o diretor da Fundação Amílcar Cabral, sediada na
cidade da Praia, Pedro Pires, que manifestou publicamente a sua preocupação face ao destino a dar aos
escritos originais do "pai" da independência de Cabo Verde e da Guiné-Bissau. Pires já apresentou a
sua inquietação ao atual chefe de estado cabo-verdiano, Jorge Carlos Fonseca.
O Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, acredita na continuidade da Fundação Mário Soares,
mas propõe a transferência, por doação, do acervo documental de Amílcar Cabral para Cabo Verde:
“tudo o que é património de um povo deve estar entregue a esse Estado", disse.
in DW, 17/12/2018 (adaptado)

Neste texto é referido que o Presidente da República Portuguesa propõe a transferência do acervo de
Amílcar Cabral para Cabo Verde, por entender que cada povo deve ter direito a estudar os instrumentos
da sua História. Todavia, Amílcar Cabral é um herói partilhado, pois é também uma figura maior da
História da Guiné-Bissau. Partindo desta problemática, componha uma carta dirigida ao Presidente da
República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa, referindo alguns dos temas abaixo propostos e
chamando a sua atenção para a importância que o acervo de Amílcar Cabral pode ter para o povo
guineense.

 Importância de cada povo poder estudar a sua história;


 Amílcar Cabral: herói de Cabo Verde, mas também da Guiné-Bissau;
 Importância passada, presente e futura do acevo para a Guiné-Bissau;
 Acessibilidade do acervo de um herói nacional partilhado por dois Estados;
 Possibilidade de o acervo ser partilhado pelos dois Estados, Guiné-Bissau e Cabo Verde.

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