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Claridade

A Claridade é uma revist a lit erária e cult ural surgida em 1936 na


cidade do Mindelo, Cabo Verde, e que est á no cent ro de um
moviment o de emancipação cult ural, social e polít ica da
sociedade cabo-verdiana. Os seus responsáveis foram Manuel
Lopes, Balt asar Lopes da Silva (que usou o pseudónimo poét ico
de Osvaldo Alcânt ara) e Jorge Barbosa, respet ivament e
oriundos da ilha de São Vicent e, ilha de São Nicolau e da ilha de
Sant iago. Resolveram seguir as pegadas dos neorrealist as
port ugueses, assumindo no arquipélago a causa do povo cabo-
verdiano na sua lut a pela afirmação de uma ident idade cult ural
aut ónoma baseada na criação da "cabo-verdianidade" e na
análise das preocupant es condições socioeconómicas e polít icas das Ilhas de Cabo Verde.

Do pont o de vist a lit erário, a Claridade veio não só revolucionar de um modo exemplar t oda a
lit erat ura cabo-verdiana com t ambém marcar o início de uma fase de cont emporaneidade
est ét ica e linguíst ica, superando o conflit o ent re o Romant ismo de mat riz port uguesa --
dominant e durant e o século XIX -- e o novo Realismo. Ao nível polít ico e ideológico, a
Claridade t inha como objet ivo procurar afast ar definit ivament e os escrit ores cabo-verdianos
do cânone port uguês, procurando reflect ir a consciência colet iva cabo-verdiana e chamar a
at enção para element os da cult ura cabo-verdiana que há muit o t inham sido sufocados pelo
colonialismo port uguês, como é o exemplo da língua crioula.

Os fundament os dest e moviment o de emancipação cult ural e polít ica podem encont rar-se na
nova burguesia liberal oit ocent ist a que inst it uiu a Escola como element o homogeneizador da
diversidade ét nica das ilhas, no pressupost o de que o processo de alfabet ização e formação
int elect ual da população era indispensável ao desenvolviment o de uma consciência geral
esclarecida. A Escola desencadeou uma fome de leit ura que est á na base do ext raordinário
desenvolviment o cult ural de Cabo Verde no século XX.

At ent os à realidade do quot idiano do povo das ilhas na década de 1930, est es filhos
esclarecidos de Cabo Verde preocuparam-se com a precária sit uação vivenciada pelo povo,
manifest ada pelo sofriment o, miséria, fome e mort e de milhares de cabo-verdianos ao longo
dos anos; uma sit uação com origem na má administ ração do arquipélago pelo governo de
Port ugal, principalment e durant e o regime fascist a do Ant ónio de Oliveira Salazar; não sendo,
no ent ant o, alheios à desast rosa sit uação do povo ilhéu as frequent es est iagens.

Os fundadores da Claridade lançaram as mãos ao t rabalho. Ist o é, "fincaram os pés na t erra,"


de acordo com o seu célebre cont eúdo t emát ico, para a execução do seu plano de t rabalho.
No ent ant o, t eriam que proceder de uma forma muit o discret a, devido ao regime de censura
colonial exist ent e sob a vigilância const ant e e at errorizada da PIDE (Polícia Int ernacional e de
Defesa do Est ado), t emida pelo seu mét odo de t ort ura; nomeadament e at rás das grades do
presídio polít ico do Campo do Tarrafal, na Ilha de Sant iago.

Para poderem dar cont a da penosa sit uação de Cabo Verde, começaram por pensar que um
jornal periódico seria a arma ideal - mais eficient e - para combat er a sit uação. Porém, na
sequência de lhes t erem exigido um depósit o de 50 mil escudos, uma quant ia exorbit ant e na
época, opt aram pelo lançament o de uma revist a. Claridade - o nome at ribuído - result ou como
um t ít ulo bem escolhido, pois const it uiu um ‘farol’ que projet ou uma luz rejuvenescedora,
int ensa e duradoura sobre Cabo Verde, no despert ar de uma lit erat ura realist a e moderna. O
nome de Claridade foi inspirado pelo livro Clarté de Henri Barbusse; depois foi fundado out ra
revist a argent ina Claridad.[1]

Elementos endógenos e exógenos

No t empo ant erior à fundação da Claridade, desenvolveram-se det erminados element os


lit erários e cult urais t ant o no int erior do arquipélago como no ext erior. São aspet os que at é
cert o pont o influenciaram diret a ou indiret ament e est a revist a. Quant o aos element os de
carát er endógeno, dest acam-se:

os t rês vult os das let ras e da cult ura t radicional cabo-verdianas, a saber: Eugénio Tavares
da Ilha Brava, Pedro Cardoso da Ilha do Fogo e José Lopes da Ilha de São Nicolau - a
geração "pré-claridosa", post eriorment e denominada geração românt ico-clássica - que
muit o fizeram para a valorização do homem ilhéu e da sua língua, o crioulo cabo-verdiano;

a publicação do livro de poemas de Ant ónio Pedro, Diário (1929);


o discurso ocult o ent re os fut uros fundadores "claridosos"; e

a publicação do livro de Jorge Barbosa, Arquipélago (1935), que abriu as port as para o
exercício de uma lit erat ura moderna cabo-verdiana, por se impor pela renovação da ret órica
e t emát ica da poesia cabo-verdiana.

No que diz respeit o aos de nat ureza exógena, salient am-se:

a presença de alguns escrit ores port ugueses em Cabo Verde nos fins de 1920 e início da
década seguint e, como August o Casimiro, Ant ónio Pedro e José Osório de Oliveira;

a revist a port uguesa Presença, publicada em 1927 em Coimbra; e

a lit erat ura moderna brasileira e o realismo nordest ino.

Publicação e conteúdo da Claridade

Ent re 1936 e 1966 saíram nove números da revist a Claridade. Podemos dist inguir essas
publicações por dois períodos dist int os, com um int ervalo de uma década; o que se ficou a
dever às dificuldades financeiras e à dispersão dos element os do grupo pelas ilhas. Nos anos
de 1936 e 1937, os t rês primeiros números result aram da aut oria quase exclusiva dos seus
fundadores, enquant o que os t rabalhos dos rest ant es set e números saídos ent re 1947 e
1966 est iveram a cargo de Balt azar Lopes da Silva. Nesse período Jorge Barbosa t inha sido
dest errado para a Ilha do Sal e Manuel Lopes encont rava-se na Ilha do Faial, Açores, para
onde t inha sido t ransferido por mot ivos profissionais, como t elegrafist a na West ern
Telegraph.

O primeiro número apresent ou t rês t ext os poét icos da t radição oral em língua crioula -
"lant una & 2 mot ivos de finaçom (bat uques da Ilha de Sant iago)". O segundo cont ou com a
morna "Vénus" do são vicent ino Francisco Xavier da Cruz, mais conhecido por B.Léza; para
além de out ros aspet os cult urais e lit erários t ambém em port uguês. Os rest ant es números,
sempre privilegiando a língua cabo-verdiana, dest acaram o folclore poét ico da Ilha de
Sant iago - a "finaçom" e o "bat ucu" - e as cant igas de Ana Procópio, da Ilha do Fogo, ou o
folclore novelíst ico da Ilha de São Nicolau e da Ilha de Sant o Ant ão. Foram t ambém
divulgados est udos et nográficos sobre a "Tabanca", da Ilha de Sant iago e as "Bandeiras" da
Ilha do Fogo, para além de est udos sociológicos sobre a est rut ura social do Fogo e as
especificidades da população das out ras ilhas.

Colaboradores da Claridade

Para além dos seus fundadores, convém mencionar duas out ras personalidades que
part iciparam na Claridade; o pint or e crít ico Jaime de Figueiredo e o escrit or João Lopes
deram o seu import ant e cont ribut o desde a fase inicial. Adicionalment e, colaboraram out ros
escrit ores ao longo da exist ência da Claridade, dando um valioso cont ribut o bilingue não só
para o desenvolviment o do projet o como t ambém para o enriqueciment o da lit erat ura
moderna cabo-verdiana, em geral. Foram eles, Pedro Corsino de Azevedo e José Osório de
Oliveira, nos primeiros números; Henrique Teixeira de Sousa, Félix Mont eiro, Nuno de Miranda,
Abílio Duart e, Arnaldo França, Luís Romano de Madeira Melo, Tomás Mart ins, Virgílio Pires,
Onésimo Silveira, Francisco Xavier da Cruz, Corsino Fort es, Art ur August o, Sérgio Frusoni e
Virgílio de Melo, ent re out ros, nos rest ant es números publicados.

Formação intelectual e soberania nacional

A fundação do Liceu-Seminário eclesiást ico e laico da Ribeira Brava, na Ilha de São Nicolau, foi
uma das pedras fundament ais para o alicerce da edificação da lit erat ura moderna cabo-
verdiana. Anos mais t arde, t eve lugar a criação dos liceus da Praia e do Mindelo. Foram
escolas que, para além de formarem os quadros dirigent es da administ ração crioula,
const it uíram os cadinhos donde saíram sucessivas gerações de int elect uais que est ão na
origem da reacção cont ra a mão fort e do processo colonialist a. Tal processo abriria as port as
à reivindicação polít ica, de forma a que a Hist ória de Cabo Verde at ingisse o seu apogeu com
a Independência Nacional no dia 5 de Julho de 1975, e com a afirmação da Democracia e do
desenvolviment o socioeconómico de que desfrut am os cabo-verdianos at ualment e.

Publicações literárias

A Claridade despert ou e iluminou ainda mais a int elect ualidade cabo-verdiana. Os vest ígios
dessa repercussão podem ser verificados nas obras primas lançadas pelos escrit ores
"claridosos", que marcaram a lit erat ura cabo-verdiana, como: Arquipélago,[2] Chiquinho,[3]
Chuva Braba[4] e Os Flagelados do Vento Leste.[5] Do mesmo modo, a revist a lançou sement es
lit erárias que germinariam em out ras import ant es publicações cabo-verdianas, t ais como,
Certeza (1944), Suplemento Cultural (1958), Raízes (1977) e Ponto & Vírgula (1983), em que se
se dest acaram os escrit ores Gabriel Mariano, Ovídio Mart ins, Aguinaldo Fonseca, Terêncio
Anahory, Yolanda Morazzo, Leão Lopes e Germano de Almeida.

Referências

1. Alfama, Jorge Miranda (1996). postface à Récits et nouvelles du Cap-Vert. Paris: Éditions
Chandeigne. pp. 193–200

2. Barbosa, Jorge. Arquipélago. Mindelo: ICL, 1935.


3. Silva, Baltazar Lopes da. Chiquinho. Lisboa: ALAC, 1982 (1.ª ed. 1947).

4. Lopes, Manuel. Chuva Braba. Lisboa: Edições 70, 1982 (1.ª ed. 1956).

5. Lopes, Manuel. Os Flagelados do Vento Leste. Lisboa: Edições 70, 1984 (1.ª ed. 1959).

Ligações externas

Do Classicismo ao Realismo na Claridade (ht t ps://web.archive.org/web/20060426085129/h


t t p://www.inst it ut o-camoes.pt /revist a/claridade.ht m)

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