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Saúde da Comunidade

Manual do curso de Licenciatura em Nutrição


Saúde da Comunidade
Módulo do 2º ano do Curso de Licenciatura em Nutrição
Direitos de autor (copyright)
Este manual é propriedade da Universidade Aberta ISCED (UnISCED), e contém reservados
todos os direitos. É proibida a duplicação ou reprodução parcial ou total deste manual,
sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (electrónicos, mecânico, gravação,
fotocópia ou outros), sem permissão expressa de entidade editora (Instituto Superior
de Ciências e Educação a Distância (ISCED). A não observância do acima estipulado o
infractor é passível a aplicação de processos judiciais em vigor no País.

Universidade Aberta ISCED (UnISCED)


Vice-Reitoria para a Área Académica
Rua Paiva Couceiro, Macuti, Beira, Moçambique

Email: direccao.academica@unisced.edu.mz

Cel (+258) 82 31 09 525 | 87 21 64 943

Website: www.unisced.edu.mz

i
Ficha técnica

Autor Leonel Monteiro


Título Saúde da Comunidade
Coordenação Edgar Manuel Cambaza
Design Universidade Aberta ISCED (UnISCED)
Financiamento e Logística
Revisão Científica e Linguística Ramalho Chau e Jesca Mutowo
Ano de Publicação 2022
Local de Publicação Beira, Moçambique
Vice-Reitoria para a Área Académica

ii
Conteúdo
Visão geral da disciplina de Saúde da Comunidade ......................................................... 1

Quem deve estudar este módulo? ............................................................................... 1

Como está estruturado este módulo?.......................................................................... 1

Auto-avaliação e tarefas de avaliação .......................................................................... 2

Ícones de actividade ..................................................................................................... 3

Habilidades de estudo .................................................................................................. 3

Precisa de apoio? .......................................................................................................... 5

Tarefas (avaliação e auto-avaliação) ............................................................................ 6

Avaliação ....................................................................................................................... 6

Tema 1 Antenção à saúde ........................................................................................... 8

Unidade temática 1.1 Níveis de atenção à saúde ..................................................... 8

Prática ......................................................................................................................... 17

Bibliografia ...................................................................................................................... 19

Tema 2 Diagnóstico de saúde da comunidade ......................................................... 19

Unidade temática 2.1 Fundamentos do diagnóstico comunitário .......................... 19

Unidade temática 2.2 Implementação do diagnóstico comunitário ....................... 25

Prática ......................................................................................................................... 39

Bibliografia ...................................................................................................................... 42

Tema 3 Vigilância em Saúde Pública ......................................................................... 43

Unidade temática 3.1 Objectivos e aplicações da vigilância ................................... 43

Unidade temática 3.2 Fontes de dados em vigilância ............................................. 49

Unidade temática 3.3 Implementação da vigilância ............................................... 54

Prática ......................................................................................................................... 68

Bibliografia ...................................................................................................................... 70

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Saúde da Comunidade

Visão geral da disciplina de Saúde da Comunidade

Objectivo geral do módulo


• Dotar o graduando de conhecimentos para compreender o papel do profissional na
promoção de saúde, e prevenção de problemas de saúde da comunidade.

Objectivos específicos
• Identificar o campo de aplicação de alguns indicadores de saúde utilizados em Saúde
da Comunidade.
• Reconhecer a importância do diagnóstico comunitário de saúde, e sua aplicação na
área de Nutrição.
• Identificar indicadores utilizados no diagnóstico comunitário do estado nutricional.
• Reconhecer a relevância da vigilância em saúde, e sua aplicação na área de Nutrição.
• Descrever os procedimentos da vigilância nutricional.

Quem deve estudar este módulo?


Este Módulo foi concebido para estudantes do II ano do curso de Licenciatura em
Nutrição. Poderá ocorrer, contudo, que haja leitores que queiram se actualizar e
consolidar seus conhecimentos nessa disciplina, esses serão bem-vindos, não sendo
necessário para tal se inscrever. Mas, poderá adquirir o manual.

Como está estruturado este módulo?


Este módulo de Saúde da Comunidade, à semelhança dos restantes da UnISCED, está
estruturado como se segue:

• Páginas introdutórias;
• Um índice completo;
• Uma visão geral detalhada dos conteúdos do módulo, resumindo os aspectos-
chave que você precisa conhecer para melhor estudar. Recomendamos
vivamente que leia esta secção com atenção antes de começar o seu estudo,
como componente de habilidades de estudos;
• O conteúdo da disciplina;
• Outros recursos.

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Saúde da Comunidade

Conteúdo desta disciplina


Este módulo está estruturado em Temas. Cada tema, por sua vez comporta certo
número de unidades temáticas ou simplesmente unidades. Cada unidade temática se
caracteriza por conter uma introdução, objectivos, conteúdos. No final de cada unidade
temática ou do próprio tema, são incorporados antes o sumário, exercícios de auto-
avaliação, só depois é que aparecem os exercícios de avaliação.

Os exercícios de avaliação têm as seguintes características: Puros exercícios


teóricos/práticos, problemas não resolvidos e actividades práticas, incluído estudo de
caso.

Outros recursos
A equipa dos académicos e pedagogos da UnISCED, pensando em si, num cantinho,
recôndito deste nosso vasto Moçambique e cheio de dúvidas e limitações no seu
processo de aprendizagem, apresenta uma lista de recursos didácticos adicionais ao seu
módulo para você explorar. Para tal a UnISCED disponibiliza na biblioteca do seu centro
de recursos mais material de estudos relacionado com o seu curso como: Livros ou
módulos, CD, CD-ROM, DVD. Para além deste material físico ou electrónico disponível
na biblioteca, pode ter acesso a Plataforma digital Moodle para alargar mais ainda as
possibilidades dos seus estudos.

Auto-avaliação e tarefas de avaliação


Tarefas de auto-avaliação para este módulo encontram-se no final de cada unidade
temática e de cada tema. As tarefas dos exercícios de auto-avaliação apresentam duas
características: primeiro apresentam exercícios resolvidos com detalhes. Segundo,
exercícios que mostram apenas respostas.

Tarefas de avaliação devem ser semelhantes às de auto-avaliação, mas sem mostrar os


passos e devem obedecer o grau crescente de dificuldades do processo de
aprendizagem, umas a seguir a outras. Parte das tarefas de avaliação será objecto dos
trabalhos de campo a serem entregues aos tutores/docentes para efeitos de correcção
e subsequentemente nota. Também constará do exame do fim do módulo. Pelo que,
caro estudante, fazer todos os exercícios de avaliação é uma grande vantagem.

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Saúde da Comunidade

Comentários e sugestões

Use este espaço para dar sugestões valiosas, sobre determinados aspectos, quer de
natureza científica, quer de natureza didáctico-pedagógica, etc., sobre como deveriam
ser ou estar apresentadas. Pode ser que graças as suas observações que, em gozo de
confiança, classificamo-las de úteis, o próximo módulo venha a ser melhorado.

Ícones de actividade
Ao longo deste manual irá encontrar uma série de ícones nas margens das folhas. Estes
ícones servem para identificar diferentes partes do processo de aprendizagem. Podem
indicar uma parcela específica de texto, uma nova actividade ou tarefa, uma mudança
de actividade, etc.

Habilidades de estudo
O principal objectivo deste campo é o de ensinar aprender a aprender. Aprender
aprende-se.

Durante a formação e desenvolvimento de competências, para facilitar a aprendizagem


e alcançar melhores resultados, implicará empenho, dedicação e disciplina no estudo.
Isto é, os bons resultados apenas se conseguem com estratégias eficientes e eficazes.
Por isso é importante saber como, onde e quando estudar. Apresentamos algumas
sugestões com as quais esperamos que caro estudante possa rentabilizar o tempo
dedicado aos estudos, procedendo como se segue:

1º Praticar a leitura. Aprender a Distância exige alto domínio de leitura.

2º Fazer leitura diagonal aos conteúdos (leitura corrida).

3º Voltar a fazer leitura, desta vez para a compreensão e assimilação crítica dos
conteúdos (ESTUDAR).

4º Fazer seminário (debate em grupos), para comprovar se a sua aprendizagem confere


ou não com a dos colegas e com o padrão.

5º Fazer TC (Trabalho de Campo), algumas actividades práticas ou as de estudo de caso


se existirem.

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Saúde da Comunidade

IMPORTANTE: Em observância ao triângulo modo-espaço-tempo, respectivamente


como, onde e quando...estudar, como foi referido no início deste item, antes de
organizar os seus momentos de estudo reflicta sobre o ambiente de estudo que seria
ideal para si: Estudo melhor em casa/biblioteca/café/outro lugar? Estudo melhor à
noite/de manhã/de tarde/fins-de-semana/ao longo da semana? Estudo melhor com
música/num sítio sossegado/num sítio barulhento!? Preciso de intervalo em cada 30
minutos, em cada hora, etc.

É impossível estudar numa noite tudo o que devia ter sido estudado durante um
determinado período de tempo; deve estudar cada ponto da matéria em profundidade
e passar só ao seguinte quando achar que já domina bem o anterior.

Privilegia-se saber bem (com profundidade) o pouco que puder ler e estudar, que saber
tudo superficialmente! Mas a melhor opção é juntar o útil ao agradável: Saber com
profundidade todos conteúdos de cada tema, no módulo.

Dica importante: não recomendamos estudar seguidamente por tempo superior a uma
hora. Estudar por tempo de uma hora intercalado por 10 (dez) a 15 (quinze) minutos de
descanso (chamase descanso à mudança de actividades). Ou seja, que durante o
intervalo não se continuar a tratar dos mesmos assuntos das actividades obrigatórias.

Uma longa exposição aos estudos ou ao trabalho intelectual obrigatório pode conduzir
ao efeito contrário: baixar o rendimento da aprendizagem. Por que o estudante acumula
um elevado volume de trabalho, em termos de estudos, em pouco tempo, criando
interferência entre os conhecimentos, perde sequência lógica, por fim ao perceber que
estuda tanto, mas não aprende, cai em insegurança, depressão e desespero, por se
achar injustamente incapaz!

Não estude na última da hora; quando se trate de fazer alguma avaliação. Aprenda a ser
estudante de facto (aquele que estuda sistematicamente), não estudar apenas para
responder a questões de alguma avaliação, mas sim estude para a vida, sobre tudo,
estude pensando na sua utilidade como futuro profissional, na área em que está a se
formar.

Organize na sua agenda um horário onde define a que horas e que matérias deve
estudar durante a semana; Face ao tempo livre que resta, deve decidir como o utilizar

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Saúde da Comunidade

produtivamente, decidindo quanto tempo será dedicado ao estudo e a outras


actividades.

É importante identificar as ideias principais de um texto, pois será uma necessidade para
o estudo das diversas matérias que compõem o curso: A colocação de notas nas margens
pode ajudar a estruturar a matéria de modo que seja mais fácil identificar as partes que
está a estudar e Pode escrever conclusões, exemplos, vantagens, definições, datas,
nomes, pode também utilizar a margem para colocar comentários seus relacionados
com o que está a ler; a melhor altura para sublinhar é imediatamente a seguir à
compreensão do texto e não depois de uma primeira leitura; Utilizar o dicionário sempre
que surja um conceito cujo significado não conhece ou não lhe é familiar.

Precisa de apoio?
Caro estudante, temos a certeza de que por uma ou por outra razão, o material de
estudos impresso, lhe pode suscitar algumas dúvidas como falta de clareza, alguns erros
de concordância, prováveis erros ortográficos, falta de clareza, fraca visibilidade, página
trocada ou invertidas, etc). Nestes casos, contacte os serviços de atendimento e apoio
ao estudante do seu Centro de Recursos (CR), via telefone, sms, E-mail, se tiver tempo,
escreva mesmo uma carta participando a preocupação.

Uma das atribuições dos Gestores dos CR e seus assistentes (Pedagógico e


Administrativo), é a de monitorar e garantir a sua aprendizagem com qualidade e
sucesso. Dai a relevância da comunicação no Ensino a Distância (EAD), onde o recurso
as TIC se tornam incontornável: entre estudantes, estudante – Tutor, estudante – CR,
etc.

As sessões presenciais são um momento em que você caro estudante, tem a


oportunidade de interagir fisicamente com staff do seu CR, com tutores ou com parte
da equipa central da UnISCED indigitada para acompanhar as suas sessões presenciais.
Neste período pode apresentar dúvidas, tratar assuntos de natureza pedagógica ou
administrativa.

O estudo em grupo, que está estimado para ocupar cerca de 30% do tempo de estudos
a distância, é muita importância, na medida em que lhe permite situar, em termos do
grau de aprendizagem com relação aos outros colegas. Desta maneira ficará a saber se

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Saúde da Comunidade

precisa de apoio ou precisa de apoiar aos colegas. Desenvolver hábito de debater


assuntos relacionados com os conteúdos programáticos, constantes nos diferentes
temas e unidade.

Tarefas (avaliação e auto-avaliação)


O estudante deve realizar todas as tarefas (exercícios, actividades e autoavaliação),
contudo nem todas deverão ser entregues, mas é importante que sejam realizadas. As
tarefas devem ser entregues duas semanas antes das sessões presenciais seguintes.

Para cada tarefa serão estabelecidos prazos de entrega, e o não cumprimento dos
prazos de entrega, implica a não classificação do estudante. Tenha sempre presente que
a nota dos trabalhos de campo conta e é decisiva para ser admitido ao exame final da
disciplina/módulo.

Os trabalhos devem ser entregues ao Centro de Recursos (CR) e os mesmos devem ser
dirigidos ao tutor/docente.

Podem ser utilizadas diferentes fontes e materiais de pesquisa, contudo os mesmos


devem ser devidamente referenciados, respeitando os direitos do autor.

O plágio1 é uma violação do direito intelectual do(s) autor(es). Uma transcrição à letra
de mais de 8 (oito) palavras do testo de um autor, sem o citar é considerado plágio. A
honestidade, humildade científica e o respeito pelos direitos autorais devem
caracterizar a realização dos trabalhos e seu autor (estudante da UnISCED).

Avaliação
Muitos perguntam: Com é possível avaliar estudantes à distância, estando eles
fisicamente separados e muito distantes do docente/tutor! Nós dissemos: Sim é muito
possível, talvez seja uma avaliação mais fiável e consistente.

Você será avaliado durante os estudos à distância que contam com um mínimo de 90%
do total de tempo que precisa de estudar os conteúdos do seu módulo. Quando o tempo
de contacto presencial conta com um máximo de 10%) do total de tempo do módulo. A
avaliação do estudante consta detalhada do regulamentado de avaliação.

1
Plágio - copiar ou assinar parcial ou totalmente uma obra literária, propriedade intelectual de outras
pessoas, sem prévia autorização.

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Saúde da Comunidade

Os trabalhos de campo por si realizados, durante estudos e aprendizagem no campo,


pesam 25% e servem para a nota de frequência para ir aos exames.

Os exames são realizados no final da cadeira disciplina ou modulo e decorrem durante


as sessões presenciais. Os exames pesam no mínimo 75%, o que adicionado aos 25% da
média de frequência, determinam a nota final com a qual o estudante conclui a cadeira.

A nota de 10 (dez) valores é a nota mínima de conclusão da cadeira.

Nesta cadeira o estudante deverá realizar pelo menos 2 (dois) trabalhos e 1 (um)
(exame).

Algumas actividades práticas, relatórios e reflexões serão utilizados como ferramentas


de avaliação formativa.

Durante a realização das avaliações, os estudantes devem ter em consideração a


apresentação, a coerência textual, o grau de cientificidade, a forma de conclusão dos
assuntos, as recomendações, a identificação das referências bibliográficas utilizadas, o
respeito pelos direitos do autor, entre outros.

Os objectivos e critérios de avaliação constam do Regulamento de Avaliação.

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Saúde da Comunidade

Tema 1 Antenção à saúde

Unidade temática 1.1 Níveis de atenção à saúde

1.1.1 Objectivos da unidade


• Descrever os componentes do Sistema Nacional de Saúde
• Caracterizar os níveis de atenção à saúde em Moçambique

1.1.2 Componentes do sistema nacional de saúde


Entre os componentes de um sistema de saúde, podem ser destacados os recursos
humanos e financeiros, as infraestruturas, a estrutura organizacional, a prestação de
serviços, a acessibilidade, a cobertura e a legislação. Estes componentes devem ser
operacionalizados de forma integrada e articulada para que haja maior eficiência e
eficácia das intervenções por eles levadas a cabo. Nesta unidade serão caracterizados
os seguintes componentes do Sistema Nacional de Saúde: (i) rede dos serviços
assistenciais, (ii) órgão directivos, (iii) pessoal alocado aos serviços de saúde.

(i) Rede de serviços assistenciais: é composta pelas unidades sanitárias, hospitais


(centrais, provinciais, distritais, rurais, e gerais); centros de saúde, e postos de
saúde.
(ii) Órgãos directivos: são órgãos subordinados ao Ministério da Saúde, e incluem as
direcções nacionais, provinciais, secretarias de estado, distritais, e municipais.
Essas direcções desempenham importantes funções para o cumprimento dos
objectivos preconizados, destacando-se a planificação, coordenação e avaliação
de programas de saúde. Os principais órgãos directivos a nível nacional, provincial
e distrital são: Saúde Pública, Planificação e Cooperação, Sistemas de Informação,
Monitoria e Avaliação.
(iii) Pessoal alocado aos serviços de saúde: fazem parte o pessoal de saúde e os
trabalhadores de saúde. A principal diferença entre eles centra-se na área de
formação. O pessoal de saúde são técnicos formados em áreas específicas da

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Saúde da Comunidade

saúde, enquanto os trabalhadores da saúde são técnicos de outras áreas


científicas, mas que trabalham no serviço de saúde.

LEMBRE Nas actividades diárias, os profissionais de saúde deverão seguir as


orientações e as rotinas estabelecidas no sistema de saúde, como as
rotinas para internamento e para a prestação de serviços de
assistência (o que fazer, como fazer, o que atender e o que referir).
Assim, nos sistemas de saúde, os hospitais, Centros e Postos de
Saúde devem estar integrados entre si e também articulados aos
sistemas de planificação, informação, controlo e avaliação.

1.1.3 Níveis de atenção à saúde


A estruturação do Sistema de Saúde implica o estabelecimento de uma rede de serviços
organizada em regiões e hierarquias, com vista a melhor compreensão do perfil
epidemiológico de cada população. Esta organização, facilita a implementação das
medidas de controlo e prevenção dos problemas de saúde da comunidade,
nomeadamente acções de vigilância, controlo de vectores, educação em saúde,
cuidados hospitalares e comunitários. O modelo hierarquizado é o mais difundido, e os
cuidados de saúde estão organizados pela complexidade dos serviços oferecidos.

ATENÇÃO O facto de o modelo de hierarquias ser o mais difundido, e os


cuidados de saúde estarem organizados pela complexidade dos
serviços oferecidos, não significa que o nível mais alto tem mais
importância do que o nível mais baixo.

Todos os níveis são importantes na prestação dos cuidados de saúde,


e por isso torna-se importante uma boa comunicação e interacção
entre eles, e dentro deles.

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Saúde da Comunidade

Em Moçambique, o artigo 3 da lei 25/91 de 31 de Dezembro, que formalizou a existência


do Sistema Nacional de Saúde, estabeleceu quatro níveis hierárquicos e regionalizados
de atenção, primário, secundário, terciário e quaternário, que funcionam de forma
integrada e cobrem os aspectos técnicos e administrativos, possibilitando que a
população beneficie de cuidados de saúde diferenciados conforme a sua necessidade.

LEMBRE
O nível primário é o primeiro ponto de contacto entre a Comunidade
e o Serviço Nacional de Saúde.

(a) Nível primário

Compreende um conjunto de procedimentos básicos, menos complexos, e conhecidos


por aplicar tecnologia de baixa densidade. É caracterizado por acções médicas curativas
e/ou preventivas com vista a resolver os problemas de saúde mais frequentes e comuns
da comunidade. Contudo, a sua aplicação nem sempre é de fácil entendimento, levando
a necessidade de uma profunda compreensão da realidade da população-alvo. Os
cuidados de saúde primários são oferecidos nas áreas de saúde sob responsabilidade
das unidades sanitárias mais periféricas, designadas de centros de saúde. A equipa
responsável por oferecer estes serviços é essencialmente composta por técnicos médios
de saúde, e coordenados por um chefe, que normalmente é Licenciado em Medicina.

ATENÇÃO Os cuidados primários de saúde vão para além das equipas alocadas
aos centros de saúde. A nível das comunidades, é comum o
envolvimento de actores comunitários nas acções da atenção
primária. Estes actores (agentes polivalentes elementares, activistas,
líderes comunitários) são essenciais na ligação entre as autoridades
de saúde e a comunidade, e na provisão dos cuidados de saúde
primários.

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Saúde da Comunidade

No que concerne à componente técnica, os centros de saúde têm a responsabilidade de


criar ambientes que favorecem a saúde, incluindo exames médicos rotineiros para
avaliar a aptidão dos indivíduos da comunidade; oferta de cuidados curativos no
contexto de doenças mais comuns nos diferentes grupos-alvo (crianças, mulheres
grávidas, adultos, etc.); urgências médicas e evacuação em casos de acidentes; cuidados
simplificados de saúde oral. Adjacente aos centros de saúde devem ser estabelecido um
pequeno laboratório, e serviços mínimos de radiologia.

SAIBA MAIS Os principais atributos da atenção primária estão resumidos abaixo.

Atributo Descrição
Primeiro contacto Os serviços deste nível são normalmente
requeridos cada vez que o paciente necessita
de atenção em caso de doença ou consultas
de controlo rotineiro.
Longitudinalidade Implica uma interacção clínico-paciente ao
longo da vida, na presença ou ausência da
doença.
Abrangência ou Reconhecimento de amplo espectro de
integralidade necessidades, tendo em conta o âmbito
orgânico, psíquico e social da saúde, dentro
dos limites de actuação pessoal de saúde.
Coordenação Coordenação das diversas acções e dos
serviços essenciais para resolver necessidades
menos frequentes e mais complexas.
Orientação para a Conhecimento das necessidades de saúde da
comunidade população-alvo, tendo em conta o contexto
económico e social, os problemas de saúde e
recursos existentes na comunidade.
Envolvimento da comunidade na tomada de
decisões sobre a saúde.

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Saúde da Comunidade

Centralidade na Consideração do contexto e da dinámica


família familiar para melhor avaliar e responder às
necessidades de cada membro.
Conhecimento dos membros e de seus
problemas de saúde.
Competência Reconhecimento de diferentes necessidades
cultural dos grupos populacionais, suas características
étnicas, raciais e culturais, compreendendo
suas representações dos processos saúde-
doença.
Fonte: Adaptado de Giovanella e Mendonça (2012, p.505-506)

(b) Nível secundário

Os cuidados de saúde primários são apoiados pelo nível secundário, mais diferenciado
e desenvolvido em termos técnicos e organizacionais. Este nível garante ainda a
possibilidade de resolver alguns casos mais complexos que não foram resolvidos no
primeiro nível por falta de recursos humanos e/ou materiais adequados. Localiza-se nas
capitais distritais, e tem como área de responsabilidade todo o distrito, e não apenas a
sua capital. A equipa de saúde deste nível é coordenada por um médico. Uma das
principais funções do nível secundário é providenciar apoio directo aos centros de saúde
do distrito, especificamente supervisão técnica, apoio organizacional, administrativo e
material.

No concernente às acções médicas curativas, destaca-se a capacidade de resolver os


problemas comuns de medicina interna, cirurgia geral simples, traumatologia, pediatria,
ginecologia-obstetrícia, estomatologia, oftalmologia e otorrinolaringologia.
Correspondem a este nível, os hospitais rurais e os seus equivalentes nas áeras urbanas,
designadamenteos hospitais gerais.

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Saúde da Comunidade

SAIBA MAIS Algumas dessas especialidades contam com o apoio dos especialistas
do nível terciário. Contam ainda com auxílio de um laboratório
diferenciado e serviços de radiologia.

(c) Nível terciário

Este nível tem a sua sede nas capitais provinciais, e é responsável por toda a província.
Para além da sua responsabilidade sob áreas muitos extensas, tem funções de
programação e avaliação das actividades a nível provincial, incluíndo a recolha e análise
de dados epidemiológicos. É caracterizado pela existência de estruturas específicas de
apoio aos diferente programas de saúde, nomedamente: laboratório de análise da
qualidade de água de consumo (contaminação química e bacteriológica), armazéns para
vacinas, laboratórios clínicos, centros de reabilitação nutricional).

Neste nível, são incluídas especialidades médicas mais complexas: medicina interna,
cirurgia geral, traumatologia, pediatria, ginecologia-obstetrícia, estomatologia,
oftalmologia, otorrinolaringologia, infecciologia, cuidados intensivos, psiquiatria,
dermatologia, medicina física e reabilitação.

LEMBRE Os meios de diagnóstico neste nível são mais complexos do que os


dos níveis anteriores. A este nível correspondem os hospitais
provinciais.

(d) Nível quaternário

Representa o nível mais diferenciado dos cuidados de saúde, e as suas medidas de


carácter preventivo centram-se em planificação, programação, administração,
normalização, e avaliação dos programas de saúde. Isso implica a agregação de dados
epidemiológicos, demográficos e sanitários. Este nível conta com a colaboração de
outras instituições de investigação e ensino, em acções mais específicas como legislação,

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Saúde da Comunidade

controlo da qualidade de medicamentos, vigilância epidemiológica transfronteiriça, e


investigações.

EXEMPLO O Instituto Nacional de Saúde (INS) possui uma rede de laboratórios


de saúde pública que apoiam as actividades de investigação.

O Laboratório de Microbiologia da Faculdade de Medicina da


Universidade Eduardo Mondlane apoia nas actividades de vigilância-
laboratorial de poliomielite.

No que concerne aos cuidados curativos, é composto por quatro hospitais centrais que
que respondem as demandas das três regiões do país. Na região norte, encontra-se o
Hospital Central de Nampula; A região Centro conta com dois hospitais, um na Cidade
de Quelimane, província da Zambézia (Hospital Central de Quelimane) e outro na Cidade
da Beira, província de Sofala (Hospital Central da Beira); e por fim o Hospital Central de
Maputo, localizado na região sul do país. Estes hospitais oferecem serviços de
especialiades ainda mais complexas, como neurocirurgia, ortopedia, cirurgia plástica e
reconstrutiva, cirurgia cardio-vascular, cirurgia maxilo-facial, entre outras. São também
incluidos hospitais psiquiátricos, e serviços individualizados de reabilitação e
radioterapia. Os meios de diagnóstico neste nível são mais complexos e diferenciados
do que os dos níveis anteriores.

SAIBA MAIS Para mais detalhes sobre a caracterização técnica, enunciado de


funções específicas, critérios e mecanismos para a classificação das
unidades sanitárias nos diferentes níveis, consulte o Diploma
Ministerial 127/2002 de 31 de Julho.

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Saúde da Comunidade

1.1.4 Sumário
A atenção em saúde é estruturada em função da sua capacidade e complexidade
tecnológica. De acordo com o MISAU, o modelo em vigor em Moçambique é o de
hierarquias, apresentando quatro níveis de atenção às comunidades, nomeadamente
nível primário, que é o primeiro ponto de contacto entre a comunidade e as autoridades
de saúde, e apresenta menor densidade tecnológica; nível secundário, que apoia o nível
primário, e atende casos comuns de algumas especialidades médicas; nível terciário,
que é caracterizado pela existência de estruturas específicas de apoio aos diferentes
programas de saúde, e pela inclusão de especialidades médicas complexas; e nível
quaternário, que apresenta alta densidade tecnológica, e oferece serviços de
especialiades ainda mais complexas.

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Saúde da Comunidade

1.1.5 Exercícios de auto-avaliação


1. Quais as possíveis vantagens da articulação das unidades sanitárias entre si, e com
os sistemas de planificação, informação, controlo e avaliação?
2. Por suas palavras explique por que é que o sistema de saúde é estruturado em
níveis de antenção?
3. No contexto de Moçambique, descreva os níveis de atenção em saúde quanto ao
pessoal de saúde neles alocados.
4. Liste e descreva os atributos da atenção primária à saúde.
5. Porque é importante envolver os membros da comunidade na tomada de decisões
sobre a saúde?
6. Caracterize o nível quaternário de atenção em termos de cuidados médicos
curativos.
7. Liste e localize os hospitais incluidos nível quaternário de atenção em Moçambique.
8. Indique duas instituições que apoiam o nível quaternário nas actividades de
vigilância e investigação, e mencione as suas funções.
9. Dos quatro níveis de atenção, qual é o mais importante? Justifique a sua resposta.
10. Em que nível se enquadra o nutricionista? Faça uma reflexão com base na matéria
estudada, e apresente elementos justificativos.

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Saúde da Comunidade

Prática
Caracterização das unidades sanitárias no contexto de Moçambique.

Introdução da prática
Dada a necessidade de se estabelecer a caracterização técnica das diversas instituições
do Serviço Nacional de Saúde (SNS), o Ministério da Saúde (MISAU) definiu normas
orientadoras para a caracterização e classificação das instituições do SNS. Nesta
actividade prática irá rever as normas orientadoras do MISAU, e caracterizar as unidades
sanitárias no contexto de Moçambique.

Resultado esperado
• Todas as unidades sanitárias do país caracterizadas em termos de aspectos
técnicos e funções.
• Quadro resumo da capacidade técnica e das funções das unidades sanitárias do
país, por tipo e nível.

Material
• Computador, conexão à internet, documento de referência (ver procedimento).

Procedimento
• Pesquisa bibliográfica. Documento de referência: Diploma Ministerial 127/2002
de 31 de Julho.

Demonstração
• Não aplicável.

Acompanhamento
• Serão realizadas sessões tutoriais para esclarecer as dúvidas, e orientar os
estudantes na execução da prática.

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Saúde da Comunidade

Registo dos resultados


Tipo de unidade Nível Capacidade Função
sanitária técnica

Questões
1. Quais são os critérios e mecanismos para a classificação das unidades sanitárias
nos diferentes níveis?
2. Quais são as funções das unidades sanitárias do nível primário? Agrupar a
resposta pelos diferentes tipos existentes.
3. Caracterize as unidades sanitárias do nível terciário em termos de capacidade
técnica.
4. Quais são as funções dos hospitais psiquiátricos?
5. Quais são as capacidades técnicas dos hospitais centrais?

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Saúde da Comunidade

Bibliografia
1. Ministério da Saúde. Cuidados de Saúde Primários em Moçambique. Maputo.
2. Ministério da Saúde. Diploma Ministerial 127/2002, de 31 de Julho (Regulamento
que define a caracterização técnica e enunciado das funções do Serviço Nacional de
Saúde), BR n. 14, Suplemento. Ministério da Saúde Maputo (Mozambique); 2002.
3. Morais CMGJAS. Saúde como política colonial: os Serviços de Saúde da colônia de
Moçambique entre 1933 e 1975. 2020(21).
4. Giovanella L, Escorel S, Lobato LdVC, de Carvalho Noronha J, de Carvalho AI. Políticas
e sistema de saúde no Brasil: SciELO-Editora FIOCRUZ; 2012.

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Saúde da Comunidade

Tema 2 Diagnóstico de saúde da comunidade

Unidade temática 2.1 Fundamentos do diagnóstico comunitário

2.1.1 Objectivos da unidade


• Descrever os tipos de diagnóstico comunitário.
• Listar os propósitos do diagnóstico comunitário.
• Explicar a relevância do diagnóstico comunitário.
• Descrever as características de um bom indicador.

2.1.2 Tipos de diagnóstico comunitário de saúde


Antes de discutir os tipos de diagnóstico comunitário torna-se importante rever o
conceito de comunidade. As comunidades são principalmente definidas por áreas
geográfica, pela população que nela reside, e pelo sistema social existente. ÁREA
GEOGRÁFICA, refere-se à localização geográfica específica, que as suas características
afectam o estado de saúde da comunidade. POPULAÇÃO, refere-se às pessoas (com
diferentes características, hábitos e costumes, culturas e valores), que vivem nos limites
administrativos da comunidade. SISTEMA SOCIAL, refere-se às diversas entidades
(económicas, educacionais, culturais, entre outras) que interagem para formar o
sistema. Portanto, pode-se resumir que uma comunidade é uma unidade social de várias
dimensões que partilha valores comuns.

ATENÇÃO Antes da realização do diagnóstico comunitário é crucial ter um


entendimento claro sobre os diferentes grupos culturais dentro da
comunidade, e como trabalhar com estes para resolver os problemas
existentes.

19
Saúde da Comunidade

O diagnóstico comunitário é um processo que analisa a situação económica, social,


física, biológica e ambiental de uma comunidade, com vista a determinar as suas
necessidades. Este processo, analisa as tendências e os padrões dos problemas
prevalentes numa comunidade, e os descreve em termos de sua magnitude e seus
determinantes. No contexto da saúde, analisa os padrões e as tendências das
doenças/condções de saúde a nível da comunidade, descrevendo-as em termos de
morbilidade, mortalidade, e factores de risco para a sua ocorrência e/ou exarcebação.
Pode ser um processo completo, visando obter informação sobre o estado geral de
saúde da comunidade; ou direccionado para um problema específico dentro da
comunidade (ex: desnutrição em crianças menores de 5 anos).

LEMBRE O diagnóstico comunitário é ao mesmo tempo um processo


(completo ou orientado), e um produto.

Processo que visa recolher, analisar e interpretar os dados de saúde


da comunidade para informar decisões sobre a priorização das
necessidades, e estabelecimento de planos de acção para
implementar e/ou melhorar as intervenções mais adequadas para os
problemas existentes.

Produto refere-se ao relatório que apresenta os resultados do


diagnóstico comunitário, e aos planos futuros de intervenção.

2.1.3 Propósitos do diagnóstico comunitário de saúde


O diagnóstico comunitário de saúde visa identificar problemas, necessidades e recursos
existentes na comunidade, e definir prioridades para planificação, implementação e
avaliação das intervenções de saúde. Visa ainda, a contínua análise da situação de saúde
da populção assistida pelo nível de atenção primária, a organização e implementação de
medidas apropriadas de resposta aos problemas de saúde da comunidade.

20
Saúde da Comunidade

2.1.4 Relevância do diagnóstico comunitário de saúde


O conhecimento sobre os problemas de saúde da comunidade, sua manitude e seus
determinantes, bem como os recursos existentes, perimite elaborar um plano de
resposta priorizando as reais necessidades da comunidade alvo. O diagnóstico
comunitário é uma ferramenta crucial para a planificação e avaliação das intervenções
de saúde na comunidade, e os seus servem de base para as acções de promoção de
saúde, prevenção e controlo de doenças, com ênfase na comunidade em geral, e em
grupos específicos de alto risco.

LEMBRE Os resultados do diagnóstico comunitário servem para informar as


intervenções da assistência sanitária através dos programas de
saúde. Por isso, é fundamental garantir dados com qualidade para
que decisões adequadas sejam tomadas.

2.1.5 Indicadores de saúde da comunidade


Para um diagnóstico comunitário ser realizado é necessário obter dados, que irão indicar
a situação de saúde da comunidade. Indicadores de saúde são variáveis (quantitativas
ou qualitativas) usadas para medir diferentes aspectos de saúde da comunidade, e
contribuem para uma visão geral do fenómeno a ser caracterizado. Existem dois grandes
grupos de indicadores: (1) ESTADO DE SAÚDE que medem os diferentes aspectos de
saúde, incluindo esperança de vida, mortalidade infantil, incapacidades, baixo peso à
nascença; (2) DETERMINANTES DE SAÚDE medem os factores que afectam a saúde, tais
como dieta, qualidade da água e do ar, rendimento e acesso aos serviços de saúde, bem
como as questões culturais, étnicas, e espirituais.

Os indicadores de saúde passam a ser utilizados na prática, quando se mostram


relevantes, ou seja, quando são capazes de retratar com confiabilidade e praticidade,
seguidos os preceitos éticos, os aspectos de saúde para os quais foram propostos. Assim,
um indicador de saúde deve possuir as seguintes características:

21
Saúde da Comunidade

➔ Validade: O indicador deve ser capaz de descriminar correctamente um dado


evento de outros, assim como detectar as mudanças ocorridas com o passar do
tempo.
➔ Reproducibilidade (Confiabilidade): Alto grau de confiabilidade significa a
obtenção de resultados semelhantes, quando a mensuração é repetida.
➔ Cobertura (represantividade): Um indicador sanitário será tanto mais
apropriado quanto maior cobertura populacional alcançar. Ex. estatísticas vitais
➔ Obediência a preceitos éticos: É imperativo ético que a colecta de dados não
acarrete malefícios ou prejuízos às pessoas investigadas. Também se impõe sigilo
dos dados individuais na divulgação da informação.
➔ Ângulo técnico administrativo (oportunidade, simplicidade, facilidade de
obtenção e custo compatível): Nas condições habituais de funcionamento dos
serviços, a obtenção dos dados não deve causar perturbações ou incovenientes,
sob pena de limitar a colaboração dos profissionais de saúde, o que pode resultar
em baixa cobertura e confiabilidade dos dados obtidos.

LEMBRE Durante o diagnóstico comunitário são recolhidos indicadores de


saúde da comunidade, e estes podem ser agregados em diferentes
catergorias, nomeadamente: indicadores demoráficos, indicadores
de morbilidade, indicadores de mortalidade, indicadores do estado
nutricional, indicadores de cuidados de saúde, indicadores
ambientais, indicadores sócio-económicos, entre outros.

Nota: para saber mais sobre indicadores de saúde, consulte o manual


de Epidemiologia e outras disciplinas relevantes.

22
Saúde da Comunidade

2.1.6 Sumário
Antes da realização do diagnóstico comunitário é crucial analisar o perfil da comunidade,
e avaliar como trabalhar com os diferentes culturais para resolver os problemas
existentes. O diagnóstico comunitário de saúde é um processo de análise contínua da
situação de Saúde da população assistida no nível primário. Este processo implica a
recolha de indicadores, que são variáveis quantitativas ou qualitativas utilizadas para
medir a situação de saúde da comunidade. Os indicadores apenas são utilizados quando
se mostram relevantes, e podem ser agrupados em diferentes categorias,
nomeadamente: indicadores demoráficos, indicadores de morbilidade, indicadores de
mortalidade, indicadores do estado nutricional, indicadores de cuidados de saúde,
indicadores ambientais, indicadores sócio-económicos, entre outros. Os resultados do
diagnóstico comunitário servem para informar as intervenções da assistência sanitária
através dos programas de saúde. Por isso, é fundamental garantir dados com qualidade
para que decisões adequadas sejam tomadas.

23
Saúde da Comunidade

2.1.7 Exercícios de auto-avaliação


1. Quais são os critérios utilizados para definir uma comunidade?
2. Explique qual é a relevância de compreender o perfil da comunidade antes da
realização do diagnóstico comunitário.
3. Porque é que o diagnóstico comunitário é simultaneamente um processo e um
produto?
4. Qual é a utilidade dos resultados do diagnóstico comunitário?
5. Defina indicadores de saúde.
6. Qual é diferença entre indicadores do estado de saúde e indicadores de
determinantes de saúde?
7. Liste as características de um bom indicador.
8. O que entende por um indicador relevante?
9. Descreva por suas próprias palavras um indicador válido.
10. Explique por suas próprias palavras o ângulo técnico e administrativo de um
indicador.

24
Saúde da Comunidade

Unidade temática 2.2 Implementação do diagnóstico comunitário

2.2.1 Objectivos da unidade


• Descrever as fases da implementação do diagnóstico comunitário.

2.2.2 Estabelecer a equipa


Para que o diagnóstico comunitário seja levado a cabo, é crucial a representação de
todos os grupos interessados na melhoria da situação de saúde da comunidade, sendo
por isso, importante envolver membros da comunidade em todas as fases do processo,
ou seja, da planificação, discussão dos resultados, e definição das intervenções
prioritárias. A estrutura da equipa de diagnóstico deve, idealmente, ter três níveis de
participação: (1) Grupo Consultivo; (2) Grupo Técnico; e (3) Coordenador do
Diagnóstico. O grupo consultivo alberga o maior número possível de membros que
aceitem servir de fonte de consulta para o diagnóstico comunitário. O grupo técnico é
um sub-grupo dos membros do primerio grupo, e tem entre outras responsabilidades,
desenvolver o plano, recolher, analisar e interpretar dados, e apresentar os resultados
ao grupo consultivo para validação e aprovação. Por fim, o coordenador tem a
responsabilidade de liderar a execução das actividades no terreno.

ATENÇÃO Ao constituir a equipa de diagnóstico, tenha em atenção os seguintes


aspectos: Assegurar coesão e compromisso; Formar um grupo
técnico; Envolver membros da comunidade; Criar estrutura para a
planificação; Identificar barreiras e facilitadores para o sucesso;
Identificar necessidades técnicas dos membros da equipa.

2.2.3 Definir os objectivos do diagnóstico comunitário


Refere-se a estabelecer o que se busca caracterizar na comunidade, podendo ser
aspectos globais ou específicos. De forma geral, o objectivo pode ser descrever os
problemas, as necessidades, e os recursos disponíveis na comunidade, ou de forma

25
Saúde da Comunidade

específica direccionado para identificar indicadores de saúde de determinados


programas de saúde.

EXEMPLO Uma equipa pode estar mais interessada em identificar os problemas


e as necessidades dos jovens e adolescentes duma comunidade para
orientar a sua assistência.

Outra equipa pode estar mais focada em avaliar a viabilidade da


implementação de um sistema de vigilância nutricional na sua
comunidade.

Outra equipa poderia estar mais interessada em avaliar o impacto da


implementação da estratégia de vigilância integrada de doenças e
resposta na sua comunidade.

2.2.4 Estabelecer os indicadores a serem recolhidos


Para cada programa ou problema, a equipa deve seleccionar os indicadores mais
apropriados. Os passos a seguir, podem ser aplicados para identificar os indicadores
relevantes a incluir no diagnóstico comunitário.

i. Estabelecer uma estrutura para seleccionar os indicadores relevantes. Neste


passo, responde-se a uma pergunta-chave: quais temas, perguntas ou objectivos
são mais importantes para medir as condições actuais e futuras de saúde?
Lembre-se de envolver todos os membros dos três grupos anteriormente
descritos.
ii. Seleccionar indicadores tendo em consideração as áreas de interesse/foco, e
os objectivos definidos. Este passo envolve um processo técnico para garantir a
identificação de medidas válidas e confiáveis para avaliar a saúde da
comunidade.
a. Identificar os potenciais indicadores (rever os indicadores de outros
diagnósticos anterioremente realizados; solicitar assessoria e subsídios

26
Saúde da Comunidade

de especialistas das áreas de interesse; formar grupos de trabalho por


áreas de interesse);
b. Seleccionar indicadores entre os potenciais (pode ser pela indicação de
especialistas da área, consulta pública, votação, ou discussão em
pequenos grupos).

Nos casos em que se pretende caracterizar a comunidade em termos gerais, poderia


considerar a recolha dos dados, conforme descrito na Tabela 2.1.

Tabela 2.1. Possíveis indicadores a recolher para caracterização geral da comunidade

Domínio Dados/indicadores
Características gerais Contexto histórico; Clima; Vegetação; Meio ambiente;
Habitação; Escolas; Meios de comunicação; Transporte; Vias
de circulação.
Situação demográfica Tamanho da população; Taxa líquida de migração; Índice de
masculinidade; Razão de dependência; Taxa de crescimento;
Taxa bruta de natalidade; Taxa geral de fecundidade; Taxa
específica de fecundidade; Taxa de fecundidade total; Taxa
global de reprodução; Taxa bruta de mortalidade; Taxa
específica de mortalidade; Proporção de mortes por causa
específica; Taxa de mortalidade infantil; Taxa de mortalidade
neonatal; Taxa de mortalidade em menores de 5 anos; Taxa
de mortalidade materna.
Situação Taxa de pobreza; Taxa de desemprego; Rendimento familiar
socioeconómica médio; Percentagem de adultos de mais de 24 anos com
menos do que o ensino médio; Segregação racial; Densidade
de organizações voluntárias de base comunitária; Material
de construção da habitação; Percentagem de agregados
familiares com acesso óptimo de água, saneamento e
higiene; Tipos de religião.
Situação nutricional Alimentos disponíveis; Hábitos alimentares; Desnutrição em
crianças; Fontes de rendimento na comunidade;
Aleitamento materno exclusivo; Suplementação de rotina
com Vitamina A; Peso à nascença; Índice de massa corporal.
Situação sanitária Legislação sanitária; Prioridades de saúde; Níveis de
atenção; Actividades de saúde; Acesso aos serviços de saúde
(distância da unidade sanitária mais próxima); Rácio de
profissionais de saúde e população (desagregado pela
categoria profissional); Praticantes de medicina tradicional.

27
Saúde da Comunidade

SAIBA MAIS Para cada indicador seleccionado, deve-se elaborar uma folha de
referência contendo a seguinte informação: definição, objectivo,
linha de base, dados necessários e respectivas fontes, cálculo e
interpretação, e os níveis de desagregação quando necessário. Para
mais detalhes sobre a folha de referência, consulte bibliografia
relevante da área de monitoria e avaliação.

2.2.5 Identificar as fontes dos indicadores e as ferramentas de recolha


Os indicadores podem ser recolhidos de fontes primárias e/ou secundárias, e podem ser
encontradas em diferentes níveis: clientes, programas, serviços, população,
espacial/geográfico. Em termos de como os dados são recolhidos, organizados e
disponibilizados, podem ser classificados como rotineiros e não-rotineiros (Tabela 2.2).

➔ Rotineiros: recolhidos, organizados, e disponibilizados regularmente de acordo


com protocolos e padrões pré-definidos. Geralmente fazem parte de um sistema
no qual a informação é disponibilizada em intervalos regulares, usada para
avaliar tendências, codificada de acordo com padrões nacionais e internacionais.
➔ Não rotineiros (especiais): para um propósito definido, sem necessariamente
existir a intenção de repetir ou aderir a padrões diferentes dos necessários para
a realização da tarefa. Geralmente centram-se numa tarefa ou num estudo.

Tabela 2.2. Exemplos de fontes rotineiras e não-rotineiras de dados

Domínio Dados rotineiros Dados não rotineiros


Demografia Censo (contagens) Inquérito sobre desalojados
(sem abrigo)
Registo de nascimentos
Factores de risco Censo (detalhes como condições Pesquisa sobre hábitos
da habitação) tabágicos
Morbilidade Inquérito Nacional de saúde Busca activa de casos
Sistemas de notificação e registo Estudos para determinação
de doenças da prevalência de doenças
específicas

28
Saúde da Comunidade

Domínio Dados rotineiros Dados não rotineiros


Mortalidade Registo de óbitos Alguns estudos de coorte
relacionados com
Registo de exames médicos mortalidade
Serviços de saúde Camas ocupadas nas Estudo observacional sobre
enfermarias uso dos serviços
hospitalares
Consultas ambulatórias nos
diferentes sectores
Economia de Tabela de custos e preços Custos de um serviço
saúde específico

Como visto anteriormente, os indicadores de saúde da comunidade podem ser obtidos


de cinco níves. Depois de identificados os níveis de medição e as fontes disponíveis em
cada um deles, a equipa deve desenvolver instrumentos/ferramentas para recolher os
dados das referidas fontes. A Tabela 2.3 resume a informação sobre as fontes e
ferramentas de recolha de dados em cada nível.

Tabela 2.3. Fontes e ferramentas de recolha de dados nos diferentes níveis.


Nível Fontes de dados Ferramentas
Clientes Registos de clientes Questionários
Vigilância de casos Observação directa
Relatórios de casos Inquéritos
Entrevistas (Interacção provedor-
cliente)
Programa Documentos legais e administrativos Questionários
Orçamento nacional “Indexing”
Normas e políticas Estudos de avaliação
Classificações de reputação
(reconhecimento)
Serviços Auditorias/ inventários Observação
Revisão de desempenho Questionários
Competências Estudos de avaliação
Registo de treinos
População Censo populacional Certidão de
Vigilância sentinela nascimento/ óbito
Estatísticas vitais Grupos focais
Grupos específicos (ex: ocupação) Inquéritos
Geográfico Cadastros (Mapas) GPS
Departamento de demarcação de Programas específicos
terra • Arcview; ArcMap;
• Imagem de satélite e fotografias MapInfo
• Gráficos digitais e modelos de
elevação

29
Saúde da Comunidade

2.2.6 Recolher os dados


Vários métodos (quantitativos e/ou qualitativos) podem ser aplicados para recolher os
dados, cabendo a equipa decidir pelos mais adequados tendo em consideração o nível
em análise. Recomenda-se a combinação de 2 ou mais métodos de recolha de dados,
com vista a assegurar a complementaridade dos indicadores, e melhor compreender os
factos observados. A Tabela 2.4., lista as vantagens e desvantagens de alguns métodos
de recolha de dados.

Tabela 2.4. Métodos de recolha de dados

Método Definição Instrumento Vantagens Desvantagens


Observação Método que Ficha de Relativamente Providencia apenas
permite a observacão/ barato; uma visão geral da
utilização verficação Eficiente. comunidade;
dos eventos Requer observação
à sua volta detalhada/ próxima
para colher para identificar
dados e problemas não
gerar reconhecidos antes.
conclusões.
Entrevista Conversa Guião de Entrevistador Demorado;
individual entre duas entrevista pode Deve transcrever
pessoas, esclarecer o notas após a
presencial ou que ele quer entrevista;
por telefone. saber; e A pessoa
assegurar que entrevistada pode
as perguntas ser tendenciosa.
sejam
respondidas;
Respondentes
podem indicar
o que não irão
responder.
Inquérito Recolha de Questionário Minimiza as Pode ser difícil evitar
por dados de não-resposta; a consulta com/ ou
telefone uma amostra Pode usar interferência de
da populção, perguntas outras pessoas;
usando um fechadas/ Necessidade de
questionário abertas; perguntas curtas, e
administrado Pode registar em número
por telefone. motivos e reduzido;
características Impossível de fazer
de pessoas que perguntas que
recusaram exijam dicas visuais;
participar;

30
Saúde da Comunidade

Método Definição Instrumento Vantagens Desvantagens


Rápido e Risco de respostas
barato; socialmente
Não necessita desejáveis.
alto nível de
literacia.
Inquérito Ver acima. Questionário Permite Alta chance de
cara-a-cara Neste caso, o flexibilidade no respostas
inquiridor número e tipo socialmente
está de perguntas; desejáveis;
presente Minimiza as Pode ser difícil evitar
fisicamente. não-resposta; a consulta com/ou
Permite interferência de
medições outras pessoas;
físicas, e Muito caros.
observações
directas;
Minimiza os
problemas
com os níveis
de literacia.
Grupos Envolve Guião/roteir Pode avaliar Participantes
focais recolha de o dos temas linguagem perdem o
informação e as serem corporal; anonimato;
opiniões de discutidos Observadores/ Altos custos de
um pequeno Gravadores moderadores viagem quando
grupo Blocos de podem estar múltiplos locais são
(idealmente, notas presentes sem visitados/ usados;
um máximo distrair os Dificuldades
de 8 pessoas participantes; logísticas em áreas
por grupo). As gravações rurais.
(quando
feitas), podem
ser partilhadas
com as
pessoas
autorizadas
que estavam
ausentes;
Atenção total
dos
participantes.

LEMBRE Dados completos permitem a elaboração eficaz de planos de acção


para melhoria das condições de saúde da comunidade. Por isso,
assegure a disponibilidade dos dados necessários para tomada de
decisões apropriadas. Por outro lado, caso existam dados recolhidos
noutro âmbito, considere a possibilidade de utilizá-los. Para decidir

31
Saúde da Comunidade

sobre a utilidade dos dados existentes, use os seguintes critérios:


Tempo dos dados (Se for menos de 6 meses, estes podem ser usados.
De contrário, novos dados devem ser recolhidos); Completude dos
dados; Relevância dos dados; Adequabilidade dos dados;
Necessidade de dados adicionais; Experiência de membros da
equipa em análise de dados.

2.2.7 Analisar e interpretar os indicadores


O procedimento de análise é determinado pelo tipo de dado recolhido. No caso de
indicadores quantitativos (ex: indicadores de morbilidade e mortalidade), a base do seu
cálculo segue a fórmula:

𝑵𝒖𝒎𝒆𝒓𝒂𝒅𝒐𝒓
𝑰𝒏𝒅𝒊𝒄𝒂𝒅𝒐𝒓 = 𝑫𝒆𝒏𝒐𝒎𝒊𝒏𝒂𝒅𝒐𝒓 ∗ 𝒌, numerador podem ser actividades, intervenções ou

eventos; e denominador representa a população-alvo.

SAIBA MAIS É importante conhecer alguns denominadores de acordo com o


grupo-alvo.
– 0-11 meses = 4%, crianças para vacinação BCG.
– 0-11 meses = 3,9%, crianças para vacinação outros antigenos.
– 1-4 anos =13,3% (13-16%).
– 0-4 anos =17,3% (17-20%), consulta da criança sadia.
– 5-14 anos =27% (25-30%), criança em idade escolar.
– 0-14 anos =44,3% (42-50%).
– 15-49 anos =19,9%, mulheres em idade fértil.
– Grávidas previstas(GP) = 5%.
– Partos previstos(PP) = 4,5%.

Os indicadores são apresentados de duas formas: (1) FREQUÊNCIAS ABSOLUTAS –


para populações pequenas, eventos raros e gestão de serviços de saúde; (2)
FREQUÊNCIAS RELATIVAS – para populações grandes e em situações específicas
(relacionar populações). As frequências relativas são compostas de um numerador e um
denominador que fornecem informações relevantes sobre atributos relacionados com a

32
Saúde da Comunidade

condição de saúde da comunidade, e o desempenho do serviço de saúde. Podem ser


medidas do tipo razão, proporção ou taxa.

➔ RAZÃO SIMPLES: o numerador e o denominador não têm a mesma natureza, mas


existe uma relação logica entre eles.
➔ PROPORÇÃO: o numerador está incluído no denominador.
➔ TAXA: relação entre o número de vezes em que se observa um evento indesejado e
a população que teoricamente esteve sujeita a sofrer esse evento.
➔ ÍNDICE: Índices não expressam uma probabilidade (ou risco) como as taxas, pois o
que está contido no denominador não está sujeito ao risco de sofrer o evento
descrito no numerador. Geralmente são apresentados em categorias tendo como
base estudos prévios.

LEMBRE Etapas no cálculo de indicadores


– Identificar o indicador, mencionar a sua finalidade.
– Definir o numerador.
– Definir o denominador.

Verificar a qualidade dos dados brutos a incluir no cálculo


– Definir unidades do cálculo e níveis de desagregação.
– Determinar se o indicador calculado é bom, mau ou razoável.

Os determinantes de saúde podem ser agrupados em diversas categorias,


nomeadamente: comportamentos pessoais e estilos de vida, factores sociais, condições
de vida e de trabalho, acesso e procura de serviços de saúde, condições
socioeconómicas, culturais e ambientais, bem como características individuais (idade,
sexo, raça, genética, etc.). O procedimento de análise destas variáveis é determinado
pelo seus níveis de medição (nominal, ordinal, ou numérico). As variáveis nominais e
ordinais são resumidas pela frequência (frequência relativa) da ocorrência de cada uma
das categorias. Adicionalmente, para as variáveis ordinais às vezes é apropriado tratá-
las como variáveis numéricas (quantitativas). As variáveis numéricas podem ser
resumidas em termos descritivos através de medidas de tendência central (média,

33
Saúde da Comunidade

moda, mediana) e de dispersão (amplitude, desvio padrão, variância, intervalo


interquartílico). Em algumas situações torna-se importante realizar algumas
comparações entre as variáveis. Um dos procedimentos comumente usados é a análise
bivariada, que visa determinar as relações entre duas variáveis. As possibilidades destas
comparações estão resumidas na Tabela 2.5.

Tabela 2.5. Algumas possibilidades de comparações entre as variáveis

Grupos/variáveis Apresentação gráfica/ Testes estatísticos


não-gráfica
Duas variáveis nominais Tabela cruzada Qui-quadrado
Gráfico de barras Correlação [Phi (ɸ),
agrupadas (clustered bar Contingência (C) e
chart). Cramer’s (V)]
Uma variável numérica; e Caixa de bigodes paralela test-t independente
uma variável nominal (side-by-side boxplot)
(binária)
Uma variável numérica; e Caixa de bigodes paralela ANOVA – one way
uma variável nominal (3 (side-by-side boxplot)
ou mais categorias)
Duas variáveis numéricas Pontos de dispersão Correlação de Pearson
(scatter plot) Regressão linear

*Estes aspectos podem ser aprofundados em bibliografia relevante da disciplina de Estatística.

Os dados baseados em texto, ou seja, aqueles resultantes de entrevistas, grupos focais,


estudos de caso, e/ou outros métodos qualitativos, são analisados através de métodos
de análise qualitativa. Na primeira fase os dados são convertidos em texto, através de
transcrições. A segunda fase, consiste na redução da quantidade de texto, através da
identificação e codificação dos temas mais relevantes, que podem ser agrupados em
diferentes categorias, para a sua análise.

2.2.8 Estabelecer as prioridades


Finalizada a análise dos dados, a equipa deve identificar e priorizar os problemas
existentes. A priorização dará base à planificação das intervenções a serem
implementadas para melhorar a condição de saúde da comunidade. Para melhor

34
Saúde da Comunidade

decisão sobre quais problemas necessitam intervenção urgente, considere os seguintes


critérios: (1) magnitude do problema, (2) gravidade do problema, (3) disponibilidade de
intervenções correntes, (4) impacto social e económico, (5) risco de saúde pública, e (6)
disponibilidade de recursos.

2.2.9 Preparar planos de acção


Estabelecidas as prioridades, a equipa deve elaborar um plano de acção para cada
estratégia definida. O plano de acção deve responder as seguintes perguntas: (1) o que
a comunidade quer melhorar?; (2) que actividades devem ser realizadas, por quem,
como, e até quando?; (3) que recursos são necessarios para garantir o sucesso?; (4)
quem são os beneficiários? A elaboração do plano de acção é um processo participativo,
e obedece os seguintes passos:

i. Escolher um grupo responsável pela elaboração do plano. A redacção do plano


pode ser limitada a uma ou duas pessoas, mas o processo deve ser colaborativo.
ii. Identificar os resultados esperados. Os resultados estão focados em gerar
mudanças positivas na comunidade. Depois de identificados os resultados,
estabelecer as metas de cada um, e definir os objectivos e as actividades
correspondentes.
a. Estabelecer metas que suportam os resultados e as áreas prioritárias;
b. Determinar objectivos de curto, médio, e longo-prazo para cada meta (as
metas e os objectivos devem ser Específicos, Mensuráveis, Alcançáveis,
Realísticos, e Oportunos).
c. Decidir que actividades são necessárias para responder aos objectivos;
d. Identificar os sectores da comunidade que serão beneficiados;
e. Estabelecer as responsabilidades para cada meta.
iii. Identificar desafios, ameaças, e potenciais barreiras para o sucesso das
intervenções a serem implementadas.
iv. Identificar recursos necessários, e as fontes de aquisição. Uma das tarefas, é
identificar as habilidades, capacidades, tarefas, e responsabilidades de todas as
pessoas que irão implementar o plano.
v. Estabelecer prazos claros e realísticos das actividades.

35
Saúde da Comunidade

vi. Integrar actividades de monitoria e avaliação, para verificar o cumprimento das


normas e dos padrões durante a execução das actividades, e avaliar os
progressos na implementação do plano.
vii. Rever o plano elaborado, de forma a assegurar que está completo em termos
dos elementos necessários para alcançar os resultados desejados.

LEMBRE O plano de acção deve conter detalhes suficientes para que a


implementação das intervenções seja monitorada e avaliada. Este
oferece as seguintes vantagens:

– Mostra aos diferentes interessados que a sua instituição é


organizada e focada nos resultados.
– Evita a possibilidade de ignorar os detalhes.
– Permite compreender o que é possível ou impossível de ser
realizado pela instituição.
– Auxilia a comunidade a ser mais eficiente, poupando tempo,
energias, e recursos.
– Aumenta as chances de as pessoas realizarem as tarefas
atribuídas, tornando-as mais responsáveis.

36
Saúde da Comunidade

2.2.10 Sumário
Oito fases de diagnóstico comunitário foram descritas neste manual, sendo a primeira
delas a constituição da equipa de diagnóstico. Nesta fase, é crucial o envolvimento de
todas as pessoas interessadas na melhoria da situação de saúde da comunidade,
incluindo os membros desta. Depois de criada a equipa, seguem-se as outras fases,
nomeadamente: definição dos objectivos, estabelecimento dos indicadores,
identificação das fontes de dados e ferramentas de recolha dos dados, recolha dos
dados, análise e interpretação dos indicadores, estabelecimento das prioridades, e
preparação de planos de acção.

37
Saúde da Comunidade

2.2.11 Exercícios de auto-avaliação


1. Quais são os níveis de participação de uma equipa de diagnóstico comunitário?
2. Que elementos deve ter em conta ao constituir uma equipa de diagnóstico
comunitário?
3. Qual é a relevância de preparar uma folha de referência de indicadores?
4. Diferencie dados rotineiros de não-rotineiros, e dê dois exemplos de cada
categoria.
5. Quais são os critérios usados para decidir sobre a utilidade de dados
existentes/disponíveis?
6. Qual é a diferença entre o índice e a taxa?
7. Quais são os parâmetros usados para melhor decisão sobre quais problemas
necessitam intervenção urgente?
8. Quais são as perguntas respondidas pelo plano de acção?
9. Qual é a importância de um plano de acção?
10. Por suas próprias palavras, explique a relevância do diagnóstico comunitária na
área de nutrição.

38
Saúde da Comunidade

Prática
Indicadores recolhidos durante o diagnóstico comunitário do estado nutricional.

Introdução das prática


O diagnóstico comunitário do estado nutricional é realizado com vista na obtenção de
informações sobre a prevalência e distribuição geográfica de problemas nutricionais na
comunidade, ou em grupos populacionais específicos. Este pode também ser usado para
identificar grupos de alto-risco e avaliar o papel dos diferentes factores epidemiológicos
nos problemas nutricionais. O objectivo desta prática é descrever os indicadores
recolhidos durante o diagnóstico comunitário do estado nutricional.

Resultados esperados
• Relatório de revisão bibliográfica sobre os indicadores recolhidos durante o
diagnóstico comunitário do estado nutricional.
• Folha de referência dos indicadoresrecolhidos durante o diagnóstico
comunitário do estado nutricional.

Material
• Computador; conexão à internet; bibliografia relevante.

Procedimento
• Revisão bibliográfica.

Demonstração
• Saiba mais sobre indicadores, e folhas de referências dos mesmos em:
https://www.measureevaluation.org/rbf/indicator-references.html

39
Saúde da Comunidade

Acompanhamento
• Serão realizadas sessões tutoriais para esclarecer as dúvidas, e orientar os
estudantes na execução da prática.

Registo dos resultados


Estrutura de relatório resumido

• Capa
• Objectivo do diagnóstico comunitário do estado nutricional
• Indicadores-chave do diagnóstico comunitário do estado nutricional
• Fontes de dados dos indicadores
• Instrumentos de recolha dos indicadores
• Análise e interpretação dos indicadores
• Anexo: Folha resumida de referência do indicador (ver estrutura abaixo)

Indicador
Definição
Propósito
Linha de base N/A para esta actividade.
Alvo
Colheita de dados
Ferramenta
Frequência
Responsável
Reporte
Controlo da qualidade

Questões
1. Qual é o objectivo do diagnóstico comunitário do estado nutricional? Explique
por suas próprias palavras.

40
Saúde da Comunidade

2. Qual é a importância do uso de indicadores durante o diagnóstico comunitário


do estado nutricional?
3. Caracterize dois indicadores recolhidos durante o diagnóstico comunitário do
estado nutricional, em termos de definição, objectivo, fonte de dados, e
interpretação.
4. Quais são as principais fontes de obtenção dos indicadores do estado nutricional
da comunidade?
5. Quais são os principais instrumentos de recolha dos indicadores do estado
nutricional da comunidade?

41
Saúde da Comunidade

Bibliografia
1. Ahmad I. ABCDE of Community Nutritional Assessment. Gomal Journal of Medical
Sciences. 2019;17.
2. Boothe VL, Sinha D, Bohm M, Yoon PW. Community health assessment for
population health improvement; resource of most frequently recommended health
outcomes and determinants. 2013.
3. Jeffery B, Abonyi S, Hamilton C, Lidguerre T, Michayluk F, Throassie E, et al.
Community Health Indicators Toolkit, 2nd edition2010.
4. Saúde OP-Ad. Indicadores de Saúde: Elementos conceituais e práticos. OPAS
Santiago; 2018.
5. Muecke MA. Community health diagnosis in nursing. Public health nursing (Boston,
Mass). 1984;1(1):23-35.
6. Pereira MG. Epidemiologia: teoria e prática. Epidemiologia: teoria e prática2001. p.
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Diagnosis: Analysis and Synthesis of Data and Information. New York: Springer
Publishing Company; 2018. p. 181-200.
8. Normando D, Tjäderhane L, Quintão CCAJDPJoO. A escolha do teste estatístico-um
tutorial em forma de apresentação em PowerPoint. 2010;15:101-6.

42
Saúde da Comunidade

Tema 3 Vigilância em Saúde Pública

Unidade temática 3.1 Objectivos e aplicações da vigilância

3.1.1 Objectivos da unidade


• Definir vigilância em saúde pública
• Listar as principais aplicações da vigilância

3.1.2 Conceito e objectivos da vigilância


Vigilância é um processo contínuo e sistemático de recolha, análise, interpretação, e
disseminação de dados de saúde. As instituições de saúde utilizam os dados de vigilância
para descrever e monitorar os problemas de saúde nas suas comunidades/áreas de
saúde, definir prioridades, e auxiliar na planificação, implementação, e avaliação de
intervenções e programas de saúde. Os sistemas de vigilância são considerados fluxos
de informação envolvendo diferentes níveis e actores (comunidade, unidade sanitária,
distrito, província, ministéiro, e parceiros). O fluxo começa quando casos de uma doença
são identificados na comunidade e dão entrada na unidade sanitária, que por sua vez
notifica ao nível superior (distrito, no contexto de Moçambique).

ATENÇÃO O fluxo só se completa quando a informação sobre os casos é


retransmitida para as equipas responsáveis na prevenção e no
controlo, em todos os níveis comunidade, distrito, província,
ministério, parceiros, e outros interessados.

43
Saúde da Comunidade

3.1.3 Monitorar os problemas de saúde


Os problemas de saúde são monitorados com vista a:

➔ Detectar alterações bruscas na ocorrência e distribuição da doença. Os dados


vigilância, principalmente no nível das unidades sanitárias, são utilizados para
detectar aumentos inesperados na ocorrência de doença, por exemplo surtos.
Nestes casos, as equipas de saúde a nível local devem investigar e instituir
medidas de prevenção e controlo.
➔ Analisar tendências e padrões das doenças. Autoridades de saúde a todos os
níveis, devem estar atentas às tendências seculares e aos padrões das doenças
nas comunidades, e explicar qualquer alteração nesses padrões. O
conhecimento dos padrões das doenças, auxilia na identificação das
necessidades e no estabelecimento de estratégias informadas de controlo e
prevenção. Estes dados, servem igualmente para previsões de padrões e
necessidades futuras.
➔ Identificar mudanças nos agentes e factores do hospedeiro. As alterações nas
características dos agentes e hospedeiros são usadas para avaliar o risco de
ocorrência da doença, e preparar um plano de resposta em função do nível de
risco. Os agentes podem ser monitorados para analisar seu padrão antigénico,
ou sua habilidade de resistência aos antimicrobianos; os hospedeiros podem ser
monitorados para analisar seus comportamentos, tais como consumo de álcool,
hábitos tabágicos, hábitos alimentares, uso de preservativo.
➔ Detectar alterações nas práticas de cuidados de saúde. Acções podem ser
estabelecidas como resultado da monitoria nas alterações das práticas de
cuidados de saúde. O número aumentado de infecções nosocomiais (do
ambiente hospitalar), levou ao estabelecimento de protocolos de lavagem das
mãos nas unidades sanitárias.

3.1.4 Investigar e controlar os problemas de saúde


Quando são notificados casos acima do esperado de uma doença, as autoridades locais
de saúde (com auxílio dos níveis superiores e dos parceiros), devem tomar medidas de
contenção. Uma das medidas é procurar a(s) fonte(s), que ao ser identificada, devem

44
Saúde da Comunidade

ser tomadas acções apropriadas, por exemplo: interromper o abastecimento de água, e


tratar as fontes; aconselhar o público sobre o uso de máscaras faciais; educar as pessoas
sobre consumo de alimentos diversificados. Outra medida importante, é intensificar as
actividades de vigilância, através da busca activa de casos e identificação dos contactos.
Quando identificadas as pessoas, podem ser submetidas a exames clínicos e
laboratoriais, aconselhamento, tratamento, vacinação, ou profilaxia dependendo da
situação específica.

LEMBRE É importante estar atento aos riscos de ocorrência da doença no


ambiente de trabalho. Os dados de vigilância servem igualmente
para monitorar os riscos no ambiente hospitalar, e informar medidas
que visam minimizar ou eliminar tais riscos.

3.1.5 Planificar e avaliar as intervenções de saúde


Como mencionado antes, a vigilância visa facilitar o processo de tomada de decisões
informadas. Ao monitorar as tendências de ocorrência de uma doença ao longo do
tempo e espaço, as autoridades de saúde podem identificar onde e quando os recursos
são necessários, e planificar de forma eficaz a sua alocação. Dados de vigilância são
utilizados para medir o impacto das intervenções.

3.1.6 Gerar hipóteses e estimular a pesquisa em saúde


Como os dados são recolhidos e analisados continuamente, os resultados obtidos geram
perguntas e hipóteses que providenciam direcção para pesquisas em saúde. Tais
pesquisas visam testar hipóteses sobre o impacto dos factores de risco na ocorrência
das doenças.

45
Saúde da Comunidade

3.1.7 Servir de arquivo das actividades sobre doenças


Embora a recolha de dados simplesmente para arquivar actividades da doença não seja
um dos principais objectivos da vigilância, é um subproduto do processo. Esses dados
são regularmente reportados pelos departamentos de vigilância epidemiológica,
através de boletins epidemiológicos.

46
Saúde da Comunidade

3.1.8 Sumário
Vigilância é um processo contínuo e sistemático de recolha, análise, interpretação, e
disseminação de dados de saúde. Este proceso visa descrever e monitorar os problemas
de saúde nas comunidades/áreas de saúde, para informar acções de planificação,
implementação, e avaliação de intervenções e programas de saúde. Entre as principais
aplicações da vigilância destacam-se: monitorar, investigar e controlar os problemas de
saúde; planificar e avaliar as intervenções de prevenção e controlo; gerar hipóteses e
estimular pesquisa em saúde.

47
Saúde da Comunidade

3.1.9 Exercícios de auto-avaliação


1. O que é vigilância?
2. No contexto de Moçambique, quais são os níveis envolvidos nas actividades de
vigilância?
3. Quando é que o fluxo de vigilância se considera completo?
4. Qual é a relevância de monitorar a ocorrência de doenças numa comunidade?
5. Qual é a importância de descrever os padrões das doenças numa comunidade?
6. Explique por suas palvras o termo “intensificação da vigilância”.
7. Como é que os dados de vigilância podem ser utilizados para planificar as
intervenções de saúde?
8. Qual é o objectivo dos testes de hipóteses?
9. Qual é o formato de disseminação dos dados de vigilância pelos departamentos
de vigilância epidemiológica.
10. Faça uma reflexão individual sobre a aplicação das actividades de vigilância na
área de nutrição.

48
Saúde da Comunidade

Unidade temática 3.2 Fontes de dados em vigilância

3.2.1 Objectivos da unidade


• Descrever as fontes de dados em vigilância.

3.2.2 Dados de mortalidade


Estatísticas vitais. Estatísticas vitais incluem dados sobre nascimento, morte,
casamento, e divórcio. Os registros de estatísicas vitais devem ser feitos em formulários
oficiais específicos para cada tipo de evento, e devem ser anotados em livros nos
cartórios. Cada registro deve ser feito pelos interessados, às suas custas (quando não
houver lei que isenta pagamento), nos locais e prazos estabelecidos por lei. Apenas os
factos assim registrados é que são contados oficialmente.

Dados de medicina legal. Médicos legistas, e outros clínicos podem fornecer


informações sobre mortes súbitas ou inesperadas. Seus relatórios estão disponíveis a
nível provincial ou nacional, e incluem detalhes sobre a causa e natureza da morte que
não são mencionados na certidão de óbito. Estes relatórios são valiosos,
particularmente para vigilância de lesões intencionais e não intencionais, e mortes
súbitas de causa desconhecida.

3.2.3 Dados de morbilidade


Relatórios de notificação de doenças. Os provedores de saúde devem notificar a
ocorrência das doenças prioritárias segundo as normas e recomendações de cada país.
Estes dados são usados pelas autoridades de saúde para as actividades de vigilância.
Mais adiante (Unidade 3.3), é aprsentada a lista das doenças de notificação obrigatória
em Moçambique.

Dados de laboratório. Os relatórios do laboratório formam a base de vigilância de certas


doença, incluindo muitas doenças virais e outras causadas por patógenos entéricos,

49
Saúde da Comunidade

como Salmonella e Shigella. Estes podem ou não fazer parte do sistema de notificação
obrigatória. Os laboratórios são órgãos de confirmação do diagnóstico, sendo por isso
cruciais para detectar casos de doenças de notificação obrigatória. A correcta solicitação
de exames, bem como a colheita, conservação e o envio de amostras biológicas
relevantes para as suspeitas clínicas, são elementos chave para assegurar a qualidade e
o bom desempenho deste sector. Dados laboratoriais, quando de boa qualidade, têm
um papel fundamental nas actividades de vigilância, manejo clínico dos doentes, e
investigações epidemiológicas. Contudo, os demorados tempos de resposta aos órgãos
solicitantes, muitas vezes tornam estes dados não oportunos para a tomada de decisões
informadas sobre o controlo e prevenção das doenças.

SAIBA MAIS Os laboratórios de microbiologia contribuem nas actividades de


vigilância, fornecendo dados detalhados sobre agentes infecciosos
isolados das amostras recebidas de diferentes sectores clínicos, e das
actividades de investigação. Os laboratórios de saúde pública e de
referência, normalmente com mais capacidade técnica e tecnológia,
realizam exames mais complexos, que servem para monitorar a
evolução do problema nas comunidades, e identificar agentes
microbianos implicados com epidemias.

Dados hospitalares. Registos hospitalares geralmente incluem dados demográficos,


diagnósticos, procedimentos cirúrgicos, tratamentos, tempo de internamento, e custos.
Para além dos hospitais serem fontes de dados de vigilância, o seu próprio
funcionamento tem sido associado a alguns problemas, que podem ser monitorados
através de sistemas de vigilância, como é o caso das infecções nosocomiais.

3.2.4 Inquéritos de saúde


São pesquisas destinas a caracterizar a situação de uma comunidade, com o propósito
obter dados de uma amostra representativa da população ou mesmo de toda
população, sobre a distribuição e os factores de risco de um determinado evento. Estão

50
Saúde da Comunidade

focados em uma variedade de aspectos, por exemplo: Avaliação Nutricional;


Comportamentos de Risco; Utilização de Serviços de Saúde. Em função do foco do
inquérito podem ser aplicados diferentes procedimentos, tais como entrevistas, exames
clínicos ou laboratoriais, entre outros. As principais características dos inquéritos são:
amostra representativa da população, e possibilidade de recolher informações mais
detalhadas que podem ser generalizadas.

3.2.5 Sistemas de vigilância de outros programas (Programas específicos)


Outros sistemas de vigilância recolhem indicadores de doença ou de potencial para
causar doença. Estes enquadram-se em diferentes categorias, e aqui serão destacadas
duas: populações animais, dados ambientais. Estas actuam como sistemas de alerta
precoce do potencial da doença.

Populações animais. A monitoria dos animais é uma componente importante da


vigilância de certas doenças, e pode incluir a detecção e medição da: morbibilidade e
mortalidade animal, causada por doenças que podem afectar o homem (raiva); presença
de agentes etiológicos em animais selvagens e domésticos (peste/roedores); alterações
em tamanho e distribuição de resevatórios animais e vectores de doenças.

Dados ambientais. Autoridades de saúde recolhem de forma contínua, dados


ambientais a nível da comunidade para detectar a contaminação de fontes de água, e
alimentos. A vigilância ambiental pode igualmente focar-se em condições relacionadas
com populações animais, como reservatórios ou vectores.

LEMBRE As informações provenientes da comunidade, através da imprensa e


da população, devem ser tomadas em conta, desde que seja
confirmada a sua veracidade. É importante lembrar que muitas vezes,
essas fontes são o primeiro alerta da ocorrência de doenças e mortes
estranhas na comunidade, constituindo assim, um importante auxílio
as actividades de vigilância.

51
Saúde da Comunidade

3.2.6 Sumário
Os dados de vigilância são obtidos de diferentes fontes, incluindo sistemas de
informação em saúde, estatísticas vitais, relatórios de medicina legal, relatórios de
notificação de doenças, dados hospitalares e laboratoriais, inquéritos de saúde,
programas especícificos (saúde animal e ambiental), mídia e população, sendo a
notificação obrigatória a principal fonte de dados.

52
Saúde da Comunidade

3.2.7 Exercícios de auto-avaliação


1. Indique as as principais fontes de dados de morbilidade.
2. Descreva as principais fontes de dados de mortalidade.
3. Discuta a importância dos dados laboratoriais nas actividades de vigilância.
4. Sobre os dados laboratoriais, mencione o (s) principal (is) constrangimentos que
estes apresentam para as actividades de vigilância.
5. Como é que os relatórios do médico legista contribuem para actividades de
vigilância?
6. Quais são as características dos inquéritos de saúde?
7. Como é que os inquéritos contribuem para as actividades de vigilância?
8. Qual é o foco da monitoria de populações animais?
9. Para que servem os dados ambientais?
10. Como é que a informação dos mídia auxilia as actividades de vigilância
epidemiológica?

53
Saúde da Comunidade

Unidade temática 3.3 Implementação da vigilância

3.3.1 Objectivos da unidade


• Descrever as funções básicas da vigilância.

3.3.2 Tipos e funções de vigilância


A nível dos programas nacionais, são implementados diferentes tipos de vigilância tendo
em conta os seus objectivos. O método de vigilância descreve:

➔ Um local-alvo (podendo ser uma unidade sanitária ou uma área de saúde).


➔ Uma unidade sanitária indicada para o alerta precoce de alterações que
ultrapassam os limites esperados (vigilância sentinela).
➔ Um laboratório para detectar ocorrências ou tendências não necessariamente
evidentes em outros locais (vigilância laboratorial/ baseada no laboratório).

DEFINIÇÃO Vigilância passiva: cada nível de saúde envia informação de forma


rotineira e periódica sobre os eventos de notificação obrigatória ao
nível imediatamente acima.

Vigilância activa: a equipa de saúde recorre à fonte de informação para


realizar uma busca intencional de casos do evento de interesse. Esta
busca directamente os dados sujeitos à vigilância, verificando até
mesmo os livros e fichas do registo rotineiro dos serviços de saúde.

Vigilância sentinela: baseia-se na informação providenciada por um


grupo seleccionado como fonte de notificação do sistema ("unidades
sentinelas") que se compromete a estudar uma amostra pré-definida
("amostra sentinela") de indivíduos de um grupo populacional
específico, no qual é avaliada a presença de um evento de interesse
("condição sentinela").

54
Saúde da Comunidade

As principais funções da vigilância (detecção, notificação, análise e interpretação,


retro-informação e resposta) são partilhadas pelos diferentes programas em todos os
níveis. A seguir, são discutidas as funções básicas de vigilância.

3.3.3 Recolha de dados de vigilância (detectar e notificar)


As doenças de notificação obrigatória variam entre países, e estas são definidas com
base em critérios nacionais e internacionais. De acordo com o escritório da Organização
Munidial da Saúde para a Região Africana (OMS-AFRO), os critérios são: doenças
internacionalmente exigidas pelo Regulamento Sanitário Internacional (RSI, 2005);
doenças de elevado potencial epidémico; principais causas de morbilidade e
mortalidade; doenças não transmissíveis prioritárias; doenças que constituem
problemas de saúde pública, e doenças sujeitas à prevenção e controlo, erradicação ou
eliminação. Com base nestes critérios, o Ministério de Saúde (MISAU), estabeleceu a
lista das doenças/condições de notificação obrigatória agrupadas em três categorias
(Tabela 3.1).

Tabela 3.1. Doenças/eventos de notificacão obrigatória em Moçambique

Doenças de potencial Doenças sujeitas à Outras doenças ou


epidémico erradicação ou eventos de importância
eliminação para saúde pública
1. Cólera 1. Poliomielite 1. Mortes maternas
2. Meningite 2. Sarampo e rubéola 2. Desnutrição aguda
meningocócica 3. Tétano neonatal grave
3. Disenteria (Shigella) 3. Malária
4. Peste 4. Raiva
5. Febre tifóide 5. Rotavirus
6. Influenza pandémica 6. Outras doenças de
7. Febres hemorrágicas importância para
(Marburgo, Ébola, Vale Saúde Publica
do Rift, Chikungunya,
Dengue).
Fonte: Ministério da Saúde, Moçambique, Organização Mundial da Saúde, (2019). Manual de Vigilância
Integrada de Doenças e Resposta em Moçambique. Maputo, República de Moçambique.

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Saúde da Comunidade

As actividades de recolha de dados são: detectar, notificar e confirmar a condição de


sáude sob vigilância. Para a detectar os casos é necessário aplicar uma definição de caso
padronizada, que é um conjunto de critérios (clínicos, limitações de tempo, lugar e
pessoa) usados para decidir se uma pessoa tem uma certa doença ou condição de
interesse. A sua utilização assegura a harmonização no diagnóstico dos casos, facilitando
a comparação dos resultados em diferentes comunidades (ou locais) e momentos, bem
como a definição de limiares (ver detalhes mais adiante nesta unidade) para a tomada
de decisões.

SAIBA MAIS Os atributos chave de uma definição de caso são a clareza e


simplicidade. Para além destes, outros dois atributos são a estabilidade
e a validação no campo real. A estabilidade refere-se a consistência
temporal, ou seja, poucas mudanças ao longo do tempo, com a vista a
permitir comparações válidas na análise de tendências. Toda a
definição de caso deve ser testada no terreno para assegurar que
funciona conforme desejado. No contexto epidemiológico os casos
podem ser classificados em três tipos: caso suspeito, caso provável, e
caso confirmado.

– Caso suspeito: sinais e sintomas compatíveis com a doença,


sem evidência alguma de laboratório (ausente, pendente ou
negativa).
– Caso provável: sinais e sintomas compatíveis com a doença,
sem evidência definitiva de laboratório (ex: realização de
exames inespecíficos).
– Caso confirmado: evidência definitiva de laboratório, com ou
sem sinais e/ou sintomas compatíveis com a doença.

56
Saúde da Comunidade

Para notificar os casos é necessário identificar a rede local de unidades e pessoal


responsáveis pela notificação, bem como desenvolver e distribuir os procedimentos de
notificação, incluindo as fichas de resumo e de investigação, o período de notificação, e
o tipo de vigilância em causa. A notificação dos casos confirmados ou suspeitos das
doenças de notificação obrigatória, é da responsabilidade de todos os níveis,
principalmente dos seguintes actores: médicos, dentistas, enfermeiros, nutricionistas,
médicos legistas, e outros profissionais de saúde; gestores hospitalares; gestores de
escolas; laboratórios; membros da comunidade, e qualquer pessoa que souber ou
suspeitar da existência de um problema de saúde.

SAIBA MAIS As recomendações sobre o período de notificação dependem dos


objectivos de vigilância das doenças específicas no país. Em
Moçambique, a notificação imediata é recomendada sempre que há
suspeitas de doenças de potencial epidémico ou de qualquer outro
evento de saúde pública de preocupação nacional ou internacional.
Abaixo é apresentada a lista das doenças, condições e dos eventos que
requerem notificação imediata ao nível acima, segundo o MISAU.

Doenças de notificação imediata Doenças de notificação semanal


Poliomielite (PFA) Meningite meningocócica
Sarampo e Rubeola Disenteria (Shigella)
Tétano neonatal Peste
Cólera Febre tifóide
Febres hemorrágicas (marburgo, Desnutrição aguda grave
ébola, vale do rift, chikungunya, Raiva
dengue) Malária
Mortes maternas
Rotavirus
Influenza pandémica
Uma ocorrência de saúde pública de preocupação internacional (infecciosa,
zoonótica, de origem alimentar, química, radionuclear ou devida a
condição desconhecida).

57
Saúde da Comunidade

3.3.4 Análise de dados de vigilância


O conhecimento dos padrões específicos de ocorrência de doenças numa área de saúde
é crucial para identificar mudanças e o risco ao longo do tempo, que por seu turno
informam as intervenções de saúde pública. Esse conhecimento só pode ser obtido por
meio da contínua análise e interpretação dos dados de vigilância disponíveis. O processo
de análise inicia com uma descrição do padrão de distribuição dos eventos, em termos
de tempo, lugar, e pessoa (Tabela 3.2). São usadas técnicas simples, incluíndo tabelas e
gráficos, para apresentar os resumos. Ao analisar os dados, faz-se uma comparação das
estimativas observadas/calculadas com um valor de referência (“valor esperado”), e
avalia-se a importância das diferenças. O valor esperado, é estimado com base em dados
recentes ou de períodos correspondentes dos anos passados. Por outro lado, pode-se
comparar os indicadores de uma área com as suas áreas vizinhas, ou com os da área
maior a que ela pertence.

Tabela 3.2. Análise descritiva, propósito, ferramentas e procedimentos.

Tipo de Propósito Ferramenta Procedimentos


análise
Tempo Detectar Registar os Comparar o número de
mudanças bruscas totais notificações de casos
ou prolongadas resumidos recebidos no período actual
dos eventos, sua numa tabela, com o número recebido no
frequência, seu num gráfico período anterior (semana
período de linear ou actual com as últimas 4
incubação. histograma. semanas; mês actual com o
mesmo mês nos ultimos 3
anos). Este método funciona
bem quando os dados são
submetidos a tempo, as
normas de vigilância locais.
Lugar Determinar onde Apresentar os Assinalar os casos num mapa
estão a ocorrer casos numa e procurar agregados ou uma
casos (identificar tabela, ou num relação entre a localização dos
áreas de alto risco mapa do casos e o evento sob
ou locais de distrito ou área investigação.
populações em afectada
risco para certas durante um
doenças). surto.
Pessoa Descrever as Extrair dados Tendo em conta a doença em
razões das específicos causa, caracterizar os casos
mudanças na sobre a segundo os dados notificados
ocorrência de população para vigilância baseada no

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Saúde da Comunidade

Tipo de Propósito Ferramenta Procedimentos


análise
doenças, e afectada e caso, por exemplo: idade,
identificar grupos resumi-los sexo, local de
de alto risco, e as numa tabela, trabalho,hospitalização,
características ou em gráficos. estado vacinal, viagem
destes grupos. recente, e outros factores de
risco conhecidos para tal
doença específica.
Fonte: Adaptado de Ministério da Saúde, Moçambique, Organização Mundial da Saúde, (2019). Manual
de Vigilância Integrada de Doenças e Resposta em Moçambique. Maputo, República de Moçambique.

ATENÇÃO A análise apropriada de dados de vigilância inclui o cálculo de


frequências absolutas e de taxas. Lembre que, um dos primeiros
passos para o cálculo das taxas é a identificação do denominador
adequado.

Tempo

Os dados para este tipo de análise são, normalmente, apresentados num gráfico. O
número ou a taxa de casos ou óbitos é colocado na vertical , e o período de tempo a
avaliar é colocado na horizontal. Os eventos ocorridos que podem afectar
particularmente as doenças que estão a ser analisadas podem também ser registados
no gráfico. Os gráficos são formados por linhas (linha de tendências) ou por barras
(gráfico de barras ou histograma), para calcular o número de casos ao longo do tempo.
O histograma é construído através dos dados dos livros de registo (fichas de notificação)
e da listagem de casos. Os casos são distribuídos segundo a data do início de sintomas.
A medida que o histograma evolui vai apresentando uma curva epidémica.

59
Saúde da Comunidade

SAIBA MAIS Curva epidémica


É uma representação gráfica do número de casos pela data de início de
sintomas (algumas vezes é usada a data de notificação), durante um
surto. A curva epidémica pode auxiliar na identificação de informação
relevante sobre o surto, e consequentemente no estabelecimento de
medidas de controlo e prevenção. Estas informações incluem: Padrão
de propagação/dispersão; Magnitude; Casos raros/extremos;
Tendência temporal; Período de exposição e/ou de incubação.

Algumas situações são apresentadas abaixo:

14
12
10
# de casos

8
6
4
2
0
1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29 31
Semana epidemiológica

Fonte comum de infecção (fonte comum pontual): subida e descida


brusca do número de casos, indicando curto período de exposição.

10
8
# de casos

6
4
2
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16
Semana epidemiológica

Fonte comum e exposição contínua: quando a exposição à fonte durar


mais tempo. Nestes casos, a forma da curva epidémica se assemelha a
um planalto, e não se evidencia um pico acentuado.

60
Saúde da Comunidade

12
10

# de casos
8
6
4
2
0
1 4 7 10 13 16 19 22 25 28 31 34 37 40 43 46 49 52
Semana epidemiológica

Propagação de pessoa-a-pessoa: a curva apresenta uma série de picos


progressivamente mais altos, separados por períodos de incubação.

Cada uma destas situações pode ser aprofundada consultando o


Manual de Epidemiologia e/ou outras bibliografias relevantes.

Lugar

Esta análise fornece informação sobre a ocorrência geográfica da doença, e auxilia a


identificar os focos de exposição e propagação da doença. A análise de dados por lugar,
implica o uso da informação sobre o local de residência que consta do livro de
registo/listagem de casos, para detectar e descrever: conjuntos de casos numa
determinada área geográfica; padrões de disseminação assocociados com o modo de
transmissão dessas doenças; fontes comuns de infecção entre os casos. Usar métodos
manuais ou pacotes de análise espacial para criar um mapa como parte da análise de
rotina da vigilância de doenças. No mapa da área onde os casos ocorreram, destacar os
seguintes elementos: estradas, fontes de água, localização de grupos específicos, e
outros factores de risco para a transmissão das doenças ou dos eventos de interesse;
localização das habitações dos doentes, ou das características geográficas mais
relevantes para a doença ou o evento de interesse.

61
Saúde da Comunidade

Pessoa

Esta análise descreve a população afectada pela doença específica, bem como as
pessoas em risco de contraírem essa condição ou de serem expostas aos factores de
risco associados. Usar os livros de registo/listagem de casos para captar as variáveis
relevantes para a doença, relacionadas com a pessoa, e fazer a distribuição dos casos.

EXEMPLO Comparar o número total e a percentagem de casos suspeitos e


confirmados, por: grupo etário, sexo, profissão/ocupação, habitação
(urbana ou rural), situação vacinal.

A análise por pessoa é normalmente recomendada para descrever a população em risco,


e compreender o impacto da doença na comunidade. Porque uma simples contagem
dos casos não fornece toda a informação necessária para compreender o impacto da
doença, devem ser calculadas taxas. O cálculo das taxas, implica a identificação de
numeradores e denominadores:
➔ Numerador: é o número de eventos específicos a medir (como o número real
de casos ou óbitos de uma determinada doença).
➔ Denominador: é o número de todas as ocorrências a medir (como o tamanho
da população em que ocorreram os casos ou óbitos de uma determinada
doença, ou a população em risco).

SAIBA MAIS TAXA DE ATAQUE: é uma razão (normalmente expressa como


percentagem) que reflecte o impacto da doença numa população
num intervalo de tempo. Este indicador reserva-se para surtos de
doenças infecciosas ou tóxicas, e pode ser usado para explicar a
exposição e susceptibilidade da população ao evento.

Passos para calcular a taxa de ataque:


1. Calcular o número total de casos novos devido a uma
doença/condição.

62
Saúde da Comunidade

2. Dividir o número total de casos novos pela população em risco no


início do surto.
3. Multiplicar o resultado por 10n. (n varia, podendo ser 2, 3, 4,5).

Supondo que foram notificados 50 casos de uma doença, numa


população de 200,000 habitantes, a taxa de ataque seria calculada
da seguinte forma:
– Numerador: # de casos da doença (50)
– Denominador: # população em risco (200,000)
# 𝐶𝑎𝑠𝑜𝑠 𝑛𝑜𝑣𝑜𝑠 𝑑𝑎 𝑑𝑜𝑒𝑛ç𝑎
𝑇𝑎𝑥𝑎 𝑑𝑒 𝑎𝑡𝑎𝑞𝑢𝑒 = ∗ 10𝑛
𝑃𝑜𝑝𝑢𝑙𝑎çã𝑜 𝑒𝑚 𝑟𝑖𝑠𝑐𝑜
50
= ∗ 10𝑛 = 0,00025 ∗ 105
200,000
= 0,00025 ∗ 100,000
= 25 𝑐𝑎𝑠𝑜𝑠 𝑝𝑜𝑟 100,000 ℎ𝑎𝑏𝑖𝑡𝑎𝑛𝑡𝑒𝑠.

TAXA DE LETALIDADE: é geralmente usada para indicar a gravidade


de uma determinada doença. Este indicador representa a
característica biológica da doença, mas deve ser definido por local e
intervalo de tempo, pois pode variar em função destes dois
parámetros.

Passos para calcular a taxa de letalidade:


1. Calcular o número total de óbitos devido a uma
doença/condição.
2. Dividir o número total de óbitos pelo número total de casos
notificados da mesma doença.
3. Multiplicar o resultado por 100.

Supondo que dos 50 casos acima, foram notificados 8 óbitos, a taxa


de letalidade seria calculada da seguinte forma:
– Numerador: # de óbitos (8)

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Saúde da Comunidade

– Denominador: # de casos (50)


# ó𝑏𝑖𝑡𝑜𝑠 8
𝑇𝑎𝑥𝑎 𝑑𝑒 𝑙𝑒𝑡𝑎𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 = ∗ 100 = ∗ 100 = 16%.
# 𝑑𝑒 𝑐𝑎𝑠𝑜𝑠 50

3.3.5 Interpretação de dados de vigilância


Quando um sistema de vigilância mostra que o padrão de uma doença é diferente do
esperado para uma população, num determinado momento, levanta-se a necessidade
de investigação adicional. Geralmente, as autoridades de saúde local determinam os
limiares (limites) de acção com base nas prioridades atribuídas às várias doenças. Os
limiares baseiam-se na informação proveniente de duas fontes diferentes: (1) uma
análise da situação que descreve quem está em risco de doença, quais são os riscos,
quando se deverá actuar para evitar a disseminação do surto, e onde ocorem essas
doenças; (2) as recomendações internacionais dos peritos técnicos e dos programas de
controlo e prevenção das doenças. No contexto de Moçambique, são destacados dois
tipos de limares:

➔ Um limiar de alerta sugere ao pessoal de saúde e às equipas de vigilância que é


necessário realizar mais investigação. Em função das doenças ou condições,
atinge-se um limiar de alerta quando há um caso suspeito (como é o caso das
doenças de potencial epidémico ou das doenças sujeitas à eliminação ou
erradicação), ou quando há um aumento inexplicado de qualquer doença, ou um
padrão invulgar observado ao longo de um período de tempo, na notificação
semanal ou mensal resumida.
➔ Um limiar de epidemia desencadeia uma resposta definida. Marca o resultado
de dados específicos ou de uma investigação que assinala uma acção, para além
da confirmação ou da clarificação do problema. As posíveis acções incluem a
comunicação da confirmação laboratorial aos centros de saúde afectados, a
implementação de uma resposta de emergência, como uma actividade de
vacinação, uma campanha de sensibilização da comunidade ou melhores
práticas de controlo da infecção ao nível das unidades sanitárias.

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Saúde da Comunidade

3.3.6 Disseminação de dados de vigilância


A disseminação dos dados de vigilância para os diferentes níveis, incluindo a retro-
informação, é uma função fundamental de vigilância, mas, infelizmente,
frequentemente negligenciada. O público-alvo da informação de vigilância deve incluir
todos os profissionais dos níveis mais baixos, ou seja, os níveis que notificam os casos,
bem como os de sectores administrativos, de planificacão e tomada de decisões. Os
relatórios de vigilância visam informar e motivar. Um relatório de vigilância que inculi a
distribuição da doença por tempo, lugar e pessoa, informa aos clínicos de uma área de
saúde sobre a probabilidade deles encontrarem tais condições na sua comunidade.

LEMBRE Gráficos claros tendem a ser mais atraentes e facilmente


compreendidos do que tabelas detalhadas. Outras informações úteis
podem ser: relatórios de padrões de resistência aos antibióticos,
recomendações actualizadas sobre vacinação, recomendações sobre
suplementação com vitamina A, outras estratégias de prevenção e
controlo, e resumos das investigações de surtos.

Os relatórios de vigilância demonstram que as autoridades de saúde preocupam-se e


analisam os dados de vigilância que são submetidos, sendo por isso um forte factor
motivacional para os níveis responsáveis pela notificação. Estes esforços são
fundamentais para manter níveis elevados de colaboração entre os intervenientes dos
diferentes níveis, incluido clínicos, laboratórios e técnicos de vigilância, que por seu
turno melhora a disseminação dos dados de vigilância.

SAIBA MAIS Em Moçambique, o MISAU partilha dados de vigilância através de


boletins epidemiológicos, que podem ser semanais, mensais, e
trimestrais.. Por outro lado, são partilhados relatórios mensais de
vigilância de doenças seleccionadas.

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Saúde da Comunidade

3.3.7 Sumário
Foram descritas quatro funções básicas da vigilância, sendo cada uma delas composta
por actividades e responsáveis específicos. A primeira função (recolha de dados), implica
a detecção de casos através da aplicação de definições de caso, e anotificação dos
mesmos obedecendo normas pré-definidas. Os dados são de seguida analisados e
interpretados de acordo com os objectivos de vigilância, e as especificidades de cada
doença/condição sob vigilância. Por fim, os dados são disseminados para os diferentes
níveis, incluindo a retro-informação, através de boletins epidemiológicos e outros
meios.

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Saúde da Comunidade

3.3.8 Exercícios de auto-avaliação


1. Diferencie vigilância activa de vigilância sentinela.
2. Quais são os critérios utilizados para definir a obrigatoriedade de notificação de
uma doença/condição?
3. Quais são as vantagens da utilização de definições de caso padronizadas?
4. Indique as doenças/condições que requerem notificação semanal para o nível
acima, segundo as orientações do Ministério da Saúde de Moçambique.
5. Durante a segunda semana de Março, 87 pessoas de uma pequena comunidade
em Mutua (população 460 habitantes) participaram num evento social que tinha
um alimento preparado por diferentes participantes. Dentro de 3 dias, 39
participantes desenvolveram diarreia aquosa. Calcule a taxa de ataque entre os
participantes.
6. O distrito de Nacala-Porto reportou na última semana, a ocorrência de um surto
de cólera numa pequena comunidade (População 500 habitantes). Depois de
alguma investigação, foram identificados 15 óbitos entre 100 casos. Calcule a
taxa de letalidade.
7. Observe a figura abaixo, e proponha o tipo de fonte desta epidemia.

8. Por suas palavras, explique a relevância da utilização dos limiares.


9. No contexto de Moçambique, como é que é feita a disseminação dos dados de
vigilância?
10. Qual é a relevância da retro-informação nas actividades de vigilância?

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Saúde da Comunidade

Prática
Implementação da vigilância nutricional.

Introdução das prática


Para melhor intervenção sobre os problemas nutricionais a nível da comunidade, é
importante monitorar as tendências da situação ao longo do tempo, através de
procedimentos consistentes e sistemáticos de recolha, análise, interpretação, e
disseminação dos dados de nutrição. A vigilância nutricional é um processo que permite
monitorar situação nutriocional, e informar decisões sobre a necessidade de
implementação de medidas, e selecção das referidas medidas (por exemplo:
desenvolvimento ou actualização de políticas; introdução ou alteração de programas).
Nesta prática, irá descrever o processo da vigilância nutricional no contexto de
Moçambique.

Resultados esperados
• Relatório de revisão bibliográfica sobre o processo da vigilância nutricional.
• Definições de caso usadasem vigilância nutricional na comunidade e nas
unidades sanitárias.

Material
• Computador; conexão à internet; bibliografia relevante.

Procedimento
• Revisão bibliográfica.
• Entrevista com informantes-chave do Programa de Nutrição a nível do MISAU e
das Direcções Provinciais e Distritais.

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Saúde da Comunidade

Demonstração
• Não aplicável.

Acompanhamento
• Serão realizadas sessões tutoriais para esclarecer as dúvidas, e orientar os
estudantes na execução da prática.

Registo dos resultados


Estrutura de relatório resumido

• Capa
• Objectivos da vigilância nutricional.
• Detecção e notificação (definições de caso, fluxo de notificação e
responsabilidades).
• Análise e interpretação dos dados.
• Disseminação dos dados.
• Anexo: Definições de caso usadas em vigilância nutricional na comunidade e nas
unidades sanitárias.

Questões
Todas as perguntas abaixo devem ser respondidas tendo em conta a actividade prática
(contexto de Moçambique).

1. Mencione os objectivos da vigilância nutricional.


2. Quais são os problemas de nutrição sob vigilância?
3. Descreva o fluxo de informação do sistema de vigilância nutricional.
4. Liste os indicadores-chave da vigilância nutricional.
5. Como é feita a disseminação da informação de vigilância nutricional?

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Saúde da Comunidade

Bibliografia
1. Ministério da Saúde, Organização Mundial da Saúde. Manual de Vigilância Integrada
de Doenças e Resposta em Moçambique. 1 ed. Maputo: MISAU; 2019.
2. Dicker RC, Coronado F, Koo D, Parrish RG. Principles of epidemiology in public health
practice; an introduction to applied epidemiology and biostatistics. 2006.
3. Beaglehole R, Bonita R, Kjellström T. Basic Epidemiology: World Health Organization
Geneva; 1993.
4. Pereira MG. Epidemiologia: teoria e prática. Epidemiologia: teoria e prática2001. p.
596-.
5. Tuffrey V, Hall A. Methods of nutrition surveillance in low-income countries.
Emerging themes in epidemiology. 2016;13:4.

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