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João Almino - Anotações

Sentidos da  Antropofagia? Como proceder enquanto meio de leitura? E de


divergências/conflitos?

Interligando sistema global de cultura; universal, local e cosmopolitismo; civilização e


barbárie.

Resumo: exposição da dinâmica cosmopolítica da Antropofagia: há uma recusa a um centro


europeu de cultura mas também uma recusa ao fechamento brasileiro. Formula-se uma
cosmopolítica da cultura brasileira proposta não por uma aceitação da cultura do colonizador -
domesticação cultural - mas por uma assimilação dela a partir da presença local, primitiva.
Daí se deriva a metáfora da antropofagia, na qual comer o outro seria o que nos une,
formulando assim uma identidade nacional sintética. Logo, a Antropofagia procura
estabelecer o local do Brasil em um sistema global de cultura, enquanto colônia. Negando o
universalismo eurocêntrico como meio de chegada a civilização, a proposta civilizacional é
realizada pelo local baseado na assimilação do outro, fundando uma nova civilização pela
barbárie. Por isso há a mescla entre o primitivo/selvagem e a técnica/ ciência. A floresta e a
escola.

Definição já no início: Antropofagia não enquanto um corpo coerente de ideias, mas enquanto
uma rica metáfora que animava parte do debate cultural brasileiro naquele momento.

Comentário: lembrar de enfatizar isso no texto. A Antropofagia é uma metáfora.

“A antropofagia está obcecada pelo tema da identidade cultural nacional, a partir de um "nós",
cujas fronteiras são nacionais e multi-étnicas, a primeira pessoa do plural, sujeito e objeto de
todo o Manifesto. Ao procurar responder à questão básica sobre "o que somos" ou "o que nos
une", a metáfora antropófaga indica que o que nos une é o outro, é o fato de ele existir, de
termos interesse por ele e sobretudo de querermos devorá-lo. Já em seu inicio, o Manifesto
deixa isto claro: "Só a antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente.
Filosoficamente". E ainda: "só me interessa o que não é meu." Conclui-se que a cultura
brasileira não é, portanto, insular e voltada unicamente para suas raízes, para o solo nacional,
como a leitura superficial de outras passagens do Manifesto poderia deixar entender, nem, por
outro lado, se insere, de forma secundaria ou subordinada, numa civilização universal
centrada na Europa. Está não apenas aberta ao outro, mas preparada para devorá-lo.” (Almino,
1999, p. 41)

Comentário: A metáfora antropofágica é voltada para a formação de um nós, buscando a


formulação de uma posição da cultura brasileira em um sistema global de cultura. O que
formula essa identidade seria o interesse pelo outro, não enquanto dependente, mas a partir de
uma abertura pronta para devorá-lo, para produzir algo novo, como atesta também o trecho
abaixo

“Nossa abertura é feita através de bons dentés e de um grande estómago. Somos capazes de
devorar o outro e, com isso, de regenerar nosso proprio tecido, produzindo o novo.” (Almino,
1999, p. 42).
Comentário: Produção do novo, devorando o outro

“O Manifesto exprime uma utopia simultaneamente de volta ao passado, pois "antes dos
portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha descoberto a felicidade", e de salto para o
futuro, através do domínio da ciência e da técnica. De fato, a revolução que propõe se volta
também para a modernização e esta não existe sem as conquistas da ciência e da técnica e sem
o progresso material.” (Almino, 1999, p. 42)

Comentário: Utopia com a junção do passado e o futuro. Felicidade de antes, mas chamando
atenção para as conquistas da ciência e da técnica. Barbaro tecnizado

“Mediante esta junção de passado e futuro, de primitivo e de civilizado ou mais bem da


subversão dos termos da barbárie e da civilização, a vara de condão da antropofagia torna o
Brasil contemporâneo dele mesmo. A revolução caraíba é o processo através do qual a utopia
é a transformação brasileira em sua própria essência, em seu passado anterior ao contato com
o europeu, mas um passado enriquecido pela assimilação da técnica e da ciência
contemporâneas e de tudo o mais que o estômago nacional puder devorar e digerir.

Assim como não se faz, apesar das aparências, uma opção pelo primitivo contra o civilizado,
porque o primitivo é, pela subversão empreendida, moderno e civilizado, assim também com
a crítica as correntes ditas cosmopolitas, apêndices da Europa nos trópicos, cegas as
realidades e contribuições mestiças, indígenas e negras locais, não se faz uma opção pelo
nacional em detrimento do cosmopolita.” (Almino, 1999, p. 43)

Comentário: Revolução caraíba: transformação brasileira em sua própria essência, retorno a


esse passado alegre, porém com a assimilação da técnica. Produção do novo, recuperando a
antropofagia sublimada, devorando a técnica.

“Existe, na antropofagia, uma abertura para o mundo, não apenas porque os valores nacionais
são afirmados através de uma linguagem moderna e de uma vanguarda de linhagem
cosmopolita, mas também porque é considerada fundamental essa assimilação dos outros.
Não se é brasileiro por oposição ao cosmopolita, mas, ao contrário, se é brasileiro porque
cosmopolita.” (Almino, 1999, p. 44)

Cosmopolitismo estaria inscrito no ser brasileiro, que é essencializado a partir dessa abertura
para o outro, pronto a devorá-lo.
Benedito Nunes: Anotações

Sentido do Manifesto Antropofágico? Como orientar a leitura a partir deles?

Radicalização do primitivismo nativo já presente no Manifesto Pau-Brasil.

Seção II: A metafísica bárbara

Iconoclastia da Antropofagia: Imagem como lembrança desagradável do canibalismo,


transformada em engenho verbal ofensivo que ataque múltiplas faces: “o aparelhamento
colonial político-religioso repressivo sob que se formou a civilização brasileira, a sociedade
patriarcal com seus padrões morais de conduta, as suas esperanças messiânicas, a retórica de
sua intelectualidade, que imitou a metrópole e se curvou ao estrangeiro, o indianismo como
sublimação das frustrações do colonizado, que imitou atitudes do colonizador”. (p.15)

O autor, explorando a imagem da antropofagia nesse manifesto justifica a multiplicidade de


seus significados devido a um sentido dada da antropofagia, enquanto palavra-guia que
conduz o pensamento à caça das ideias. Se em texto anterior tratamos da Antropofagia
enquanto metáfora, Benedito Nunes coloca que ela é, ao mesmo tempo, metáfora, diagnóstico
e terapêutica, englobando tudo quanto deveríamos repudiar, assimilar e superar para a
conquista da nossa autonomia intelectual. Estendo abaixo os significados possíveis quanto a
antropofagia enquanto diagnóstico e terapêutica:

a) Diagnostico da sociedade traumatizada pela repressão colonizadora que lhe condicionou o


crescimento, a qual o modelo terá sido a repressão da antropofagia ritual pelos Jesuítas;

b) Terapêutica pela reação violenta e sistemática contra os mecanismos sociais e políticos, os


hábitos intelectuais, as manifestações literárias e artísticas (combate pela sátira e pela crítica -
empregando o instinto antropofágico numa catarse imaginaria para servir de tônico
reconstituinte do país e seu desenvolvimento futuro) Remédio drástico para o país (veneno-
remédio)? Outro tipo de farmáco?

Para a realização de uma análise das ideias que circulam no texto, o autor distingue três
planos analíticos no Manifesto: a crítica da cultura; o histórico-político e o filosófico. Trato
aqui, sobretudo, da crítica da cultura que estabelece, analisando a simbólica da repressão.

Crítica da cultura: sociedade brasileira surgindo a partir das oposições que a dividem, uma
polarização a partir da religião, moral e do direito que promovem uma primeira censura com a
Catequese e o Governo Geral. Descrição de um processo civilizatório de sublimação, por
meio de uma simbólica da repressão, com seus emblemas e símbolos míticos. Oposição destes
a símbolos míticos propriamente ditos, que saem de reservas imaginárias do inconsciente
primitivo, catalisadas em uma operação antropofágica que devora os emblemas de umas
sociedade. Liberação da consciência coletiva a partir desse processo antropofágico
(superação, em vista de uma autonomia intelectual). COMPARAR COM POEMA DE
ASCANIO LOPES. Contradição entre um e outro. O do Ascânio é uma epopeia da
colonização, mas tem uma sublimação da violência.

Histórico político (revolução caraíba): Revolução individual a serviço da revolução caraíba.


Retomada por nós do impulso antropofágico da rebeldia a partir do indígena. Reabertura do
homem natural, elaborado na Europa, e reinvindicação do impulso originário aqui presente. A
revolução não mais como produto de importação, elaborado no estrangeiro sob forma
histórica alheia a nossa. Revolução caraíba, sendo o protótipo de todas as revoluções, teria a
paternidade delas todas (humor)

Traduzindo as fixações psicológicas e históricas da nossa cultura intelectual, os emblemas são


personalidades e situações consagradas intocáveis como os tabus: Padre Vieira (a retórica e a
eloquencia), Anchieta (o fervor apostólico e a pureza), Goethe (o senso de equilíbrio, a
plenitude da inteligência), a Mãe dos Gracos (a moral severa, o culto à virtude), a Corte de D.
João VI (a dominação estrangeira), João Ramalho (o primeiro patriarca etc.). A esses
emblemas, que cabem na categoria de mitos culturais, opõem-se os símbolos míticos
propriamente ditos – Sol, Cobra grande, Jaboti, Jacy, Guaracy etc. Estes, que saem das
reservas imaginárias instintivas do inconsciente primitivo catalisariam, quando satiricamente
lançados contra os primeiros, a operação antropofágica, como devoração dos emblemas de
uma sociedade. É a transformação do tabu em totem, que desafoga os recalques históricos e
libera a consciência coletiva, novamente disponível, depois disso para seguir os roteiros do
instinto caraíba gravados nesses arquétipos do pensamento selvagem – o pleno ócio, a festa, a
livre comunhão amorosa, incorporados à visão poética pau-brasil e às sugestões da vida
paradisíaca, “sem complexos, sem loucura, sem prostituições e sem penitenciárias do
matriarcado de Pindorama”. (p.17-18)

 Os sentidos do primitivo (consciência e forma). Dialética da civilização e barbárie nas


vanguardas. Primitivo enquanto fonte de renovação, mas com sentidos diferentes na
Europa e América Latina (independência cultural aqui, exotismo contra a tradição
civilizacional que levou a barbárie lá).
o A descoberta do pensamento selvagem, e a descoberta que este se faz presente
no Brasil.
o Se propõe a uma reeducação da sensibilidade/teoria da cultura brasileira a
partir do primitivismo, buscando um retorno ao material e à natureza
psicológica. Ou seja, uma busca pelos estados brutos da alma coletiva, com
as formas simplificadas e depuradas que captam a originalidade nativa,
tornando possível a partir da lente primitiva o encontro do "pensamento
selvagem" no Brasil. (3º parágrafo, p.10)
o Essa assimilação se dá por uma tensão? Entre a floresta e a escola, uma
dialética.
 A Antropofagia enquanto um sistema de pensamento para pensar o Brasil: novo
modelo que é metafora, diagnóstico e terapeutica. Os três pontos da analíse. A crítica
cultural, o socio-político e a metafísica.

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