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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BAURU

Mantido pela Instituição Toledo de Ensino


CURSO DE DIRIETO

MARINEUDE RODRIGUES SILVA

VIOLÊNCIA DOMÉTICA E A (IN) EFICÁCIA DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE


URGÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA: APLICABILIDADE NA PRÁTICA.

BAURU
2022
CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BAURU
Mantido pela Instituição Toledo de Ensino
CURSO DE DIRIETO

MARINEUDE RODRIGUES SILVA

VIOLÊNCIA DOMÉTICA E A (IN) EFICÁCIA DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE


URGÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA: APLICABILIDADE NA PRÁTICA.

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado à Banca Examinadora do
Curso de Direito, Centro Universitário
de Bauru, mantido pela Instituição
Toledo de Ensino, para a obtenção do
grau de bacharel em Direito, sob a
orientação do Prof. Bento.

BAURU
2022
MARINEDUE RODRIGUES SILVA

VIOLÊNCIA DOMÉTICA E A (IN) EFICÁCIA DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE


URGÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA: APLICABILIDADE NA PRÁTICA.

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado à Banca Examinadora do
Curso de Direito, Centro Universitário
de Bauru, mantido pela Instituição
Toledo de Ensino, para a obtenção do
grau de bacharel em Direito, sob a
orientação do Prof. Bento.

Banca Examinadora

____/____/______
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO.....................................................................................................x
2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS DA MULHER E OS AVANÇOS NO
DIREITO ATUAL...............................................................................................xx
3. MULHER E SOCIEDADE..................................................................................xx
3.1. A mulher como Sujeito do direito........................................................xx
3.2. Conceito de gênero...............................................................................xx
3.3. Gênero e Direito Penal.........................................................................xx
4. A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA COMO VIOLAÇÃO DOS DIREITOS DA
MULHER...........................................................................................................xx
4.1. Violência Doméstica contra a mulher.................................................xx
4.2. Formas de Violência Doméstica..........................................................xx
5. LEGISLAÇÃO DO DIREITO DA MULHER EM SOCIEDADE – LEIS
GERAIS.............................................................................................................xx
5.1. A Constituição Federal e o Princípio da Igualdade...........................xx
5.2. Código Civil – Questão do casamento...............................................xx
5.3. Lei nº 14.132/2021 – stalking................................................................xx
5.4. Lei Nº 12.737/2012 - Carolina Dieckmann...........................................xx
5.5. Lei nº 11.340/2006 – lei Maria da penha como ferramenta de
coibição à violência doméstica.........................................................xx
5.6. Mecanismo Legais de Proteção à Mulher...........................................xx
5.7. Princípios da Dignidade da Pessoa Humana.....................................xx
5.8. Princípios da Igualdade........................................................................xx
5.9. Importância do apoio a Vítima de Violência.......................................xx
6. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E A (IN)EFICÁCIA DAS MEDIDAS
PROTETIVAS....................................................................................................xx
6.1. Medidas Protetivas...............................................................................xx
7. DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA QUE OBRIGAM O
AGRESSOR......................................................................................................xx
7.1. Afastamento do domicilio ou local de Convivência com a
Ofendida................................................................................................xx
7.1.1. Vedação de Conduta........................................................................xx
7.1.2. Suspensão da Posse ou Restrição ao porte de Armas.....................xx
7.1.3. Restrição ou Suspensão de Visitas...................................................xx
7.1.4. Fixação de Alimentos Provisionais ou Provisórios............................xx
8. DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA À
OFENDIDA........................................................................................................xx
8.1. Encaminhar a Ofendida e seus Dependentes a Programa de
Proteção e Atendimento.......................................................................xx
8.2. Recondução ao Domicílio após afastamento do agressor...............xx
8.3. Afastamento do lar...............................................................................xx
8.4. Separação de corpo..............................................................................xx
8.5. Medidas de Ordem Patrimonial...........................................................xx
9. CONCLUSÃO....................................................................................................xx
REFERÊNCIAS ...............................................................................................xx

RESUMO
ABSTRACT
1. INTRODUÇÃO
Falar sobre violência doméstica nos leva a refletir em um problema relacionado à
classe, etnia, gênero e poder. A figura masculina sempre foi vista como modelo patriarcal,
onde o homem era considerado o alicerce da sociedade contemporânea, uma autoridade com
imposição onde imperava o machismo. Já a mulher, tinha o papel inferior ao homem, seja de
maneira econômica, profissional, física ou emocionalmente.
Este tema tem grande visibilidade e repercussão nas redes de mídia e comunicação e
vem sido muito debatido na sociedade, onde as vítimas ao buscar apoio à justiça e aos
membros que a compõe solicitando medidas protetivas passam a sofrer ainda mais, e em
alguns casos danos fatais. É um tema bastante primitivo, mas com muita força de repercussão
nos dias atuais, onde vemos muitos e muitos casos de violência contra mulheres, que mesmo
com a criação de lei específica que assegura mulheres de violência doméstica e familiar o
número de casos de violência só cresce.
Froster e Buralde, 2018 descrevem que ao longo dos séculos a sociedade vem
reproduzindo a subordinação da mulher perante o sexo masculino através da tradição e dos
costumes, e desse modo, banaliza e naturaliza a opressão sofrida e que até hoje se reflete na
sociedade.
Froster e Buralde, 2018 relatam ainda que a violência contra a mulher guarda estreita
relação de poder com as categorias de gênero, classe e raça e, a medida dessa relação se dá
através de uma ordem patriarcal proeminente na sociedade brasileira, a qual atribui aos
homens o direito a dominar e controlar as mulheres, podendo, inclusive, atingir os limites da
violência (Froster e Buralde, 2018).
Segundo o Senando, 2022, mesmo perante o cenário existente no Brasil, em que uma a
cada cinco mulheres, independentemente da idade e do nível de escolaridade, refere já ter sido
espancada pelo cônjuge, companheiro, namorado ou excompanheiros, a violência doméstica e
familiar contra a mulher é um fenômeno velado estimando-se que, em cada cinco mulheres
agredidas, uma não tenha tomado nenhuma atitude perante o ocorrido, o que remete à
subnotificação e dificulta o conhecimento da real dimensão do problema.

2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS DA MULHER E OS AVANÇOS NO


DIREITO ATUAL

Matos e Gitahy, 2007, descreve que durante séculos, as mulheres viveram


contidas em seus espartilhos tratadas como seres insignificantes. Não tinham
direitos, vez, nem voz. Aquelas que se submetiam ao autoritarismo do homem eram
consideradas mulheres respeitáveis, mas quando se negavam a aceitar o que lhes
era imposto, eram tidas como cortesãs, sendo ainda mais marginalizadas.

Os mesmos autores relatam ainda que em relação à mulher, esse fenômeno


pode ser notado, principalmente no século passado, através das diversas
modificações ocorridas nos nossos diplomas legais, no sentido de legitimar a mulher
como cidadã, detentora de direitos e capazes de exercê-los. Podemos também notar
a transformação da sociedade nos inúmeros documentos de âmbito internacional
que passam a reconhecer os Direitos da Mulher.

A historiadora Mary Del Priore, em sua obra “Mulheres no Brasil Colonial”,


tece algumas considerações atinentes ao regime patriarcal:

O sistema patriarcal instalado no Brasil colonial sistema que


encontrou grande reforço na Igreja Católica que via as
mulheres como indivíduos submissos e inferiores acabaram por
deixar-lhes, aparentemente, pouco espaço de ação explicita.
Mas insisto: isso era apenas mera aparência, pois, tanto na sua
vida familiar, quanto no mundo do trabalho, as mulheres
souberam estabelecer formas de sociabilidade e de
solidariedade que funcionavam, em diversas situações, como
uma rede de conexões capazes de reforçar seu poder
individual ou de grupo, pessoal ou comunitário. (PRIORE;
2000, p. 9).

Uma vez que o sistema jurídico não proporcionava direitos iguais aos do
homem, as mulheres aos poucos se colocavam a luz do sol e saiam de suas casas,
mesmo que para realizar trabalhos voluntários e com pouca ou nenhuma
representatividade social, no entanto, era um começo.

No Brasil, sob o pretexto do adultério, o assassinato de mulheres era legítimo


antes da República. Koerner mostra que a relação sexual da mulher, fora do
casamento, constituía adultério – o que pelo livro V das Ordenações Filipinas
permitia que o marido matasse a ambos. O Código Criminal de 1830 atenuava o
homicídio praticado pelo marido quando houvesse adultério. Observe-se que, se o
marido mantivesse relação constante com outra mulher, esta situação constituía
concubinato e não adultério. Posteriormente, o Código Civil (1916) alterou estas
disposições considerando o adultério de ambos os cônjuges razão para desquite.
Entretanto, alterar a lei não modificou o costume de matar a esposa ou companheira
(BLAY, 2003).

3. MULHER E SOCIEDADE
Quando se procura entender o papel da mulher na sociedade, há de se voltar
o olhar para os primórdios da existência de nossa sociedade, dando ênfase à
formação do sujeito, seus grupos e classes sociais.

Naquela época, os costumes heterodoxos eram vistos como indícios de


barbarismo e da presença do Diabo. Do nascimento à velhice, as mulheres
Tupinambás recebiam tratamentos e tarefas enredadas à selvageria e com marcas
de barbarismo. Esta pode ser uma visão estrangeira das mulheres Tupinambás, mas
para aquele povo, tudo era feito seguindo as determinações de sua concepção da
natureza humana. Talvez, ainda hoje, o inconsciente das mulheres brasileiras esteja
atrelado às ideias passadas por gerações. O desregramento, pecado e danação
originados da fragilidade moral do sexo feminino tiveram enorme utilidade ao “poder”
social masculino, e ao “bem estar” feminino. (SILVA, SANTOS, TEIXEIRA, et al,
2004)

O imenso rol de reivindicações femininas pode se resumir apenas em um a


única — que seja obedecida à regra genérica que define a igualdade de todos
perante a lei, ou melhor, que não seja mais ferido o chamado princípio da igualdade
que está assegurado no artigo 153, § 1.° da Constituição Federal, Emenda n.° 1, de
1969, pelo qual todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho,
credo religioso e convicções políticas (MAGALHÃES, 2018).

Toda via, apesar de ser norma constitucional, baseada na idéia de justiça e


hierarquicamente superior a todas as demais, tem sido, com relação à mulher,
frequentemente descumprida, não só por leis ordinárias e atos administrativos, m as
principalmente na vida cotidiana, desde o próprio lar até o trabalho e a participação
na vida pública (MAGALHÃES, 2018).

3.1 A mulher como Sujeito do direito

O direito é reconhecido como um instrumento de controle social, de sujeição


(MASCARO, 2008, p. 14), assim como a moral, os costumes, as religiões, a família e
outras formas de organização da vida em sociedade. Ao contrário dessas formas
disciplinares aqui destacadas, o direito é dotado de coercibilidade, ou seja, da
possibilidade de imposição de uma sanção pelo Estado, em face do
descumprimento de uma ou mais normas jurídicas reconhecidas como válidas
(REALE, 2002, p. 43).
Entretanto, da mesma forma que as normas jurídicas, a produção doutrinária
sobre o direito também é reflexo das relações e modelos sociais, estabelecidos por
interesses específicos, embora nem sempre acompanhe par e passo a evolução
social e do próprio sistema normativo. Devemos lembrar que toda fonte do direito ou
de sua interpretação também funciona como mecanismo de controle social e como
fonte de poder e hierarquia (REALE, 2002, p. 12).

É nesse contexto que colocamos em discussão, a classificação de fato natural


dada ao nascimento pela Teoria dos Fatos Jurídicos como herança persistente de
um direito fundado em valores patriarcais.
3.2. Conceito de gênero

Segundo Cunha (2014), gênero é uma categoria criada para demonstrar que
a grande maioria das diferenças entre os sexos são construídas social e
culturalmente a partir de papéis sociais diferenciados que, na ordem patriarcal, criam
polos de dominação e submissão.

O ser que nasce com características biológicas femininas, também deve


corresponder à expectativas, como um ser submisso aos homens dentro dos
diversos campos sociais e que deve executar os serviços domésticos. Esse
raciocínio torna essas três categorias idênticas, no sentido de que, como regra, não
se considera a diferença entre sexo, identificação de gênero e orientação sexual,
sem se levar em conta que é justamente essa diferença biológica que impulsiona a
enorme assimetria nas relações de gênero (SILVA, 2015).

A mulher sendo vista como um ser inferior ao homem, ou seja, mais uma
construção que acabou por se naturalizar: todo ser que nasce com características
femininas necessariamente será inferior àquele que nasce com características
masculinas, em qualquer âmbito da vida social (SILVA, 2015)

Almeida e Bandeira, 2014 considera que a tal situação se fundamenta no fato


de que a desigualdade é parte de um arraigado sistema supra contextos histórico-
culturais, que condicionou as mulheres a uma posição de inferioridade na hierarquia
ético-social e ontológica humana. Esse ordenamento patriarcal produziu relações
assimétricas e hierárquicas entre homens e mulheres, materializado em interações
corriqueiras de força e violência tanto nas relações interpessoais como nas relações
sociais. Existe, portanto, um a priori que institui as mulheres como seres de segunda
categoria em todos os âmbitos da vida íntima, social e política, associando-a a um
desvalor que atinge sua dignidade e sua condição de igualdade, submetendo-as aos
preconceitos, discriminações, intolerâncias e inviabilizando seus direitos e
autonomia de uma vida sem violência.

3.3. Gênero e Direito Penal

A diferença por gênero é uma realidade exposta em sociedades, sem


diferença entre idade, cor ou classe social. Com o intuito de inibir os crimes
praticados contra as mulheres, foi sancionada em 9 de março a Lei nº 13.104/2015
de feminicídio, com a alteração no artigo 121 Código Penal do Decreto Lei n
2.848/1940, importando um novo tipo de homicídio qualificado: o feminicídio, que
tem sua configuração quando o assassinato é por questões de gênero ao expressar
que o crime é praticado “contra mulher da condição de ser do gênero feminino
fazendo parte assim, dos crimes mais graves e hediondos(BRASIL, 2015; SILVA,
2015).

O feminicidio é o resultado das pequenas coisas que as mulheres pensam


que de repente não são relevantes, mas que consolidam a subalternização e essa
condição objetivada da mulher que permite que o homem se considere dono e possa
fazer o que bem entender, inclusive matá-la.

“Maus-tratos, opressão, agressões, exclusão, danos misóginos,


subordinação, lesões, exploração, discriminação, ameaças e marginalização, que
podem ocorrer no âmbito familiar, na comunidade, institucional e feminicida” são
descrições da violência contra as mulheres com reações ao diferencial de gênero,
sendo que a partir dos anos 2000 a violência feminicida passou a ser incluída na
violência contra a mulher por gênero (LAGARDE Y DE LOS RIOS, 2007, p.33).

4. A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA COMO VIOLAÇÃO DOS DIREITOS DA MULHER


Ao homem sempre coube o espaço público. A mulher foi confinada ao limite
do lar, com o dever de cuidado do marido e dos filhos. Isso ensejou a formação de
dois mundos: um de dominação, externo, produtor; outro de submissão, interno e
reprodutor. A essa distinção estão associados os papéis ideais dos homens e das
mulheres. Ele provendo a família e ela cuidando do lar, cada um desempenhando a
sua função (CAMPOS et. al 2011, p. 195).
Campos et. al, 2011 comenta ainda que com as mudanças ocorridas no
decorrer do tempo, acabou por provocar o afastamento do parâmetro
preestabelecido, criando um contexto potencializado para situações de violência,
que tem como justificativa a cobrança de possíveis falhas no cumprimento ideal dos
papéis de gênero. Quando um não está satisfeito com a atuação do outro quanto ao
cumprimento do modelo, surge a “guerra” dos sexos. Em geral, cada um dos
envolvidos usa suas armas: eles, os músculos; elas, as lágrimas. As mulheres, por
evidente, levam a pior, tornando-se vítimas da violência masculina.

A violência contra a mulher por parceiro pode ser prevenida quando abordado
sob a ótica das relações sociais de gênero ( Machado DF et al, 2021) isto acontece
devido às relações de poder e dominação própria do patriarcado estão presentes na
forma com que os indivíduos são socializados, e desde o nascimento a socialização
já está voltada para que assumam papéis e estereótipos próprios de cada sexo.
Nesse sentido, a socialização de gênero é entendida como um processo que
determina o que se espera de uma mulher e de um homem antes mesmo do
nascimento. São regras sociais e expectativas reproduzidas por família, escola,
igreja, entre outros, norteadas pelo sexo biológico.

A superação da violência implica uma revisão de valores, crenças e atitudes


socialmente estabelecida (GALVÃO; ANDRADE, 2004). Inúmeras pesquisas
demonstram que é no espaço doméstico onde a maior parte das agressões contra
mulheres ocorre (Barsted, 1998).

4.1. Violência Doméstica contra a mulher

O conceito de violência está simplesmente na posição forçada de uma pessoa


a outra, independentemente da forma, contexto ou nível de relacionamento ou
parentesco, podendo surgir no local de trabalho ou na privacidade da família, sobre
o qual os organismos estatais e a justiça têm a obrigação de proteger.

A origem do termo violência surgiu no início do século XIII, originado do latim


“vis”, que significa por força ou vigor, pessoa com caráter raivoso que estende a
fortaleza física. Expressa o ato de violar outrem ou de se violar, algo fora do estado
natural, relação de força, ao ímpeto. A prática de violência expressa atos contrários
à liberdade e à vontade de alguém e reside nisso sua dimensão moral e ética
(CACIQUE; FUREGATO, 2006).
Significa também uma relação de força quando alguém é obrigado a fazer
algo contra sua vontade, ou seja, agir pela força e consequentemente gerar a
violência. Contudo, os reconhecimentos do conceito de violência sofreram grandes
transformações e o que antes era considerado como uma atitude normal, legitima e
saudável hoje pode ser considerado uma violência contra uma mulher, um idoso,
uma criança ou até mesmo com um homem (GUIMARÃES e PEDROSA, 2015).

Guimarãe e Pedrosa, 2015, a violência em sentido amplo está sendo


modificada de tempos em tempos. E graças a essas mudanças não se aceita mais
as frases pejorativos de incentivo a violência contra a mulher como uma das frases
do tão famoso escritor Nelson Rodrigues quando disse que “Toda mulher gosta de
apanhar, o homem é que não gosta de bater”. Se Nelson Rodrigues um dia disse
isso, esse é um tempo passado e ele não permite mais se quer ser cantado ou
escrito. Essa expressão não só induz a normatização da violência doméstica, mas
ainda sugere que a mulher provoca a agressão porque se juga merecedora dela.
Nem uma mulher gosta de apanhar e nem tão pouco lhes faltam vergonha na cara,
como todos adoram julgar. Não se pode mais permitir esse tipo de manifestação em
um contexto artístico. Além de estruturar a violência é um reposicionamento que na
maioria dos casos termina na morte da mulher.

Assim, em 1985, o Conselho da Europa definiu a violência doméstica como


uma ação familiar:

Há violência em toda ação ou omissão que prejudique a vida, a integridade


física ou psicológica ou a liberdade da pessoa ou cause dano sério ao
desenvolvimento da sua personalidade (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002 )

Apesar da violência doméstica se configurar como sendo todo ato de


violência baseado em gênero, é entendido como sendo aquela sofrida pela mulher e
às vezes pela criança, mas nunca pela figura masculina. A violência contra a mulher
pode ser definida como qualquer ato que cause ou tenha alta probabilidade de
causar danos físicos, sexual, mental ou sofrimento, incluídas as ameaças, a coerção
ou a privação arbitrária da liberdade, seja a que aconteça na vida pública ou privada
(KRUG et al., 2002), e pode ser considerada como meritória causa de
morbimortalidade feminina (KUSUMA; BABU, 2017). Esse episódio complexo e
multicausal tem como principal perpetrador o parceiro íntimo (O’DOHERTY et al.,
2014).
De acordo com o monitor de violência divulgado em 2020, os dados apontam
que no primeiro semestre de 2020, 1890 mulheres foram assassinadas em todo
pais. O aumento foi de 2% em relação a 2019. Deste total 631 foram vítimas de
feminicidio, que são aqueles casos em que a vítima é agredida apenas por ser
mulher, sendo na maioria dos casos por ciúmes dos ex-maridos ou companheiros
que não aceitam o fim do relacionamento ou porque as resolvem começar uma nova
história.

Garcia-Morena et al., 2005 afirmam que ao contrário do aumento dos


assassinatos que tiveram alta, os crimes de violência doméstica tiveram baixa, bem
como lesões corporais e estupros, a redução de casos em relação aos outros crimes
significa que há subnotificação destes outros crimes, ou seja, menos mulheres estão
denunciando. Isso porque durante a pandemia as mulheres tiveram mais
dificuldades para acessar os canais e fazer a denúncia, neste período os serviços
públicos acabaram reduzindo bastante o seu horário de atendimento dificultando
ainda mais a situação para que as mulheres conseguissem fazer os registros desses
crimes. Também possui forte vinculação com a relação de poder e a posição do ser
masculino em relação ao ser e desigualdade de gênero como riscos de aspectos
sociais e culturais.

Mulheres são agredidas, assassinadas e silenciadas para sempre, por que


não quiseram falar, se expressar ou pedir por socorro. Esse silenciamento tem a ver
com à recorrência da violência como forma de um homem solucionar conflitos na
relação com a mulher. Tudo tem a ver com o binômio, poder patriarcado e o
licenciamento das mulheres, ou a tentativa de não permitir a voz das mulheres como
incomodo. Mas que temor é esse que o patriarcado tem medo? Que temor que não
permite e que não quer permitir a “fala” das mulheres? Porque tudo está ligado a
uma impossibilidade de permitir de modo geral que as mulheres falem. E mesmo
que as mulheres tenham avançado nas últimas décadas no que se refere a
autonomia gradual não foram superados os padrões de um modelo patriarcal, no
qual é naturalizado o direito dos homens de dominar as mulheres onde a maior parte
são agredidas. Este adoecimento familiar encontra expresso no seu modo e
condições de vida, e nas relações de poder vigente entre os sexos e na sociedade
(GUEDES; SILVA; FONSECA, 2009; OKABE, 2010; LEAL, 2010).
Para Saffioti (2004) o patriarcado é um caso específico das relações de
gênero, onde estas são desiguais e hierárquicas. A ordem patriarcal de gênero
admitiria então a dominação e exploração das mulheres pelos homens, configurando
a submissão feminina.
Assim foi denominado a cultura Machista que ainda se encontra infiltrada na
sociedade a séculos, onde a mulher não somente era permitida o cuidado com os
afazeres domésticos, com os filhos e os trabalhos manuais, não permitido que as
mesmas fossem a escola ou tivesse qualquer outro tipo de aprendizado diferente
dos que já eram impostos.

Essa cultura machista que perdura até os dias atuais também faz mal para o
gênero masculino. Entretanto ela não mata o gênero masculino, mas mata o gênero
feminino quando os danos são causados pela violência, humilhação, discriminação,
preconceito para ambos os gêneros.

É uma cultura que vem estruturada em valores postulados que sempre coloca
a mulher em condição de inferioridade, de subalternidade. E quando colocada nessa
condição tem a ver com dizer que ela é responsável por tudo. A condição de
subalternidade da mulher é uma construção social que determina os papeis sociais a
serem desempenhados por homens e mulheres. “Num sentido amplo, toda violação
dos direitos humanos das mulheres deve ser entendida como violência de gênero
resultado da construção de papéis social” (SALES, 2018, p. 1191).

Tanto no âmbito público como privado as mulheres ainda lidam com a


condição de subalternidade. Ocupam menos cargos na política46, a posição
de chefia no mundo empresarial é excepcional, a renda é menor, mesmo no
desempenho de atividades iguais ou assemelhadas e são a maioria das
vítimas de violência doméstica e sexual. (SLAES, 2018, p. 1191).

Essa posição de inferioridade imposta às mulheres é algo que vem nas


raízes culturais da sociedade há séculos. Quando se fala que a mulher apanhou se
pergunta o que ela fez para ser agredida, neste momento quem pergunta está
legitimando o feminicidio. É colocar a mulher como vítima do homem. Assim quando
se pergunta porque a mulher agredida não denunciou da primeira vez, não se sabe
o que ela passou para simplesmente jogar a responsabilidade nessa mulher. Essa
discriminação tem consolidado ao longo do tempo a desigualdade e a posição de
inferioridade da mulher em relação ao homem. “As diferenças biológicas ou culturais
não deveriam significar, necessariamente, superioridades e inferioridades, entretanto
ensejam desigualdades, arbitrárias e injustas” (SALES, 2018, p. 1178).

Quanto a causa da violência doméstica estudos mostram que a violência por


parceiro íntimo pode estar associada a alguns fatores como: estresse pós-
traumático, drogas ilícitas, uso abusivo de álcool considerado como desencadeador
da violência contra mulher, prejudicando a capacidade do agressor de julgar
situações e controlar suas emoções, assim como as infecções sexualmente
transmissíveis (IST), depressão, ideações suicidas e morte (JEWKES et al., 2010;
DEVRIES et al., 2013).

Por tanto não há justificativas para a agressão contra as mulheres, seja ela
física, psicológica, moral, sexual ou patrimonial. Infelizmente, a cultura machista
ainda faz com que as mulheres se sintam culpadas pelas agressões sofridas. Esse é
um assunto que precisa ser observado como um problema de saúde pública e
social, apesar de muitas pessoas pensarem que a violência doméstica não é um
problema delas.

Entretanto, todos precisam estar envolvidos para que a sociedade seja mais
justa e igualitária. E em defesa da integridade de muitas mulheres vítimas em
potencial, não cabe mais a frase “em briga de marido e mulher, ninguém mete a
colher” a mesma deve ser ignorada, porque em briga de marido e mulher todos
devem sim meter a colher e assim reduzir as estáticas de violência contra a mulher.

4.2 Formas de Violência Doméstica

Ainda que o Ministério da Saúde diferencie tipos de violência, eles se


entretecem e se fundem de formas diversas, articulam-se a violência psicológica e a
violência física, principalmente, dentre outras (SILVA; COELHO; CAPONI, 2007).

Entre os tipos de violência praticados contra as mulheres, as principais estão


expressamente definidas no art. 7º da Lei 11.340, Lei Maria da Penha que não traz
um rol de crimes de violência doméstica, mas referências às formas de violência
praticadas contra a mulher dada a sua condição particular:

Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre


outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça,
constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância
constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularizarão,
exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada,
mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a
comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a
impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao
matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação,
chantagem, suborno ou manipulação, ou que limite ou anule o exercício de
seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure
retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos,
instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou
recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas
necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure
calúnia, difamação ou injúria.

Nota-se que no primeiro inciso o legislador especifica-se como forma de


violência física o meio da força física ou tudo aquilo que pode colocar em risco a
integridade ou a saúde da vítima, mesmo que essas agressões não deixem marcas
evidentes em seu corpo.
A violência física é representada como qualquer comportamento que ofenda a
integridade ou saúde corporal da mulher, de modo que o agressor fere a vítima, com
o uso da força física, podendo provocar lesões internas e externas. Esta violência
pode ser manifestada de diversas formas, seja como tapas, queimaduras,
estrangulamentos e até mesmo como danos à integridade decorrentes de
negligência, identificados como omissão de cuidados e de proteção em situações de
perigo (ANDRADE e SOUZA, 2021).
O Código Penal define o crime de lesão corporal no seu art. 129, afirmando
em seu décimo parágrafo que se a agressão grave ou que levou a morte, se
configurada dentro do seio doméstico, tem pena aumentada em até 1/3.
Vale lembrar que a violência doméstica só foi inserida no Código Penal como
forma qualificada de lesão corporal no ano de 2004. Assim como o advento da lei
Maria da Penha e o acréscimo do § 9º do art. acima citado, a pena desse delito que
era de seis meses a um ano passou de três meses a três anos.
Já Violência psicológica acontece de múltiplas formas. Enquanto
algumas agressões podem passar despercebidas outras são mais evidentes como
ameaças, humilhações, chantagem, cobranças de comportamento, discriminação,
exploração, violação de intimidade, limitação do direito de ir e vir provocando o
isolamento de amigos e familiares, “assim, ela se sente sozinha, fica com medo da
solidão, e consequentemente dependente do homem, que conseguiu o que queria.
Fazer que ela se sentisse dependente dele” (TRINDADE, 2016, p. 19).

Trindade (2016, p. 19) destaca ainda que a violência psicológica, denominada


também de agressão emocional, “conjectura tamanha gravidade quanto a oriunda da
agressão física, visto que as marcas deixadas podem comprometer o emocional da
mulher causando danos irreparáveis”.

Dentre as formas de violência, a psicológica é tão sutil que dificulta a sua


correta identificação. Apesar de ser bastante frequente, ela pode levar a pessoa a se
sentir desvalorizada, sofrer de ansiedade e adoecer com facilidade, situações que se
arrastam durante muito tempo e, se agravadas, podem levar a pessoa a provocar
suicídio. (BRASIL, 2001).

A violência psicológica não afeta somente a vítima de forma direta. Ela atinge
a todos que presenciam ou convivem com a situação de violência, a exemplo, os
filhos que testemunham a violência psicológica entre os pais e podem passar a
reproduzi-la por identificação ou mimetismo (AZEVEDO, GUERRA, 2001;
GEOCITIES, 2005).

5. LEGISLAÇÃO DO DIREITO DA MULHER EM SOCIEDADE – LEIS GERAIS


Afim, de preservar a mulher os Estados-Partes realizaram a interamericana
para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher (Convenção de Belém do
Pará), assinada na 34ª sessão da Assembleia Geral da OEA a 6 de setembro de
1994 (Promulgada em 1996), nessa convenção, foi reconhecendo que o respeito
irrestrito aos direitos humanos foi consagrado na declaração Americana dos Direitos
e Deveres do Homem e na Declaração Universal dos Direitos Humanos e reafirmado
em outros instrumentos internacionais e regionais.

Nessa convenção foi proposto o direito de toda mulher a ser livre de violência,
onde abrange:

a) o direito da mulher a ser livre de todas as formas de discriminação; e


b) o direito da mulher a ser valorizada e educada livre de padrões
estereotipados de comportamento e costumes sociais e culturais
baseados em conceitos de inferioridade ou subordinação.
Os Estados-Partes condenam todas as formas de violência contra a mulher e
convêm em adotar, por todos os meios apropriados e sem demora, políticas
destinadas a prevenir, punir e erradicar tal violência.

5.1 – A Constituição Federal e o Princípio da Igualdade

De acordo com Silva, 2007, a Constituição Federal, vigente até o momento ela
é o ato de constituir, estabelecer, firmar ou ainda, o modo pelo qual se constituí uma
coisa, um ser vivo, um grupo de pessoas; organização, formação. A Constituição por
definição é uma técnica ou conjunto de técnicas que submete o governo a limites,
resultado muito menos prováveis a ocorrência de atos de violência arbitrária e
tirânica em um governo constitucional. Além disso, uma Constituição bem elaborada
adotará as oportunas medidas para sua alteração de modo que evite, enquanto for
humanamente possível, o movimento revolucionário. O princípio da igualdade vem
expresso no Caput do art. 5º, inciso I, apropriados ao título de “direitos e garantias
fundamentais” entre os cidadãos brasileiros, figurando em seu texto as figuras do
gênero “homens e mulheres” equiparados em direitos e obrigações.

Segundo Maciel, 1997, à luz dos ensinamentos do curso em Hermenêutica


Constitucional, a evidente contradição entre preceitos constitucionais que
determinam tratamentos diferenciado às mulheres e o enunciado do art. 5º, caput e
inciso I, que assim dispõe a Constituição Federal de 1988:

 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer


natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos


termos desta Constituição;
No Campo do reconhecimento da individualidade de cada ser humano, a
igualdade está ligada à afirmação do princípio da não-discriminação, reconhecendo
assim que todos são iguais perante a lei e, portanto, não pode haver discriminação
que excluam determinada pessoas ou grupo de pessoas pelas suas escolhas,
religião, raça, classe social ou possuírem características própria como as de gênero.
“Dar tratamento isonômico às partes significa tratar igualmente os iguais e
desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades’’ (NERY
JUNIOR, 1999, p. 42).
Como Salienta Moraes, (2002) o legislador não poderá editar normas que se
afastem do princípio da igualdade, sob pena de flagrante inconstitucionalidade.
O intérprete e a autoridade política não podem aplicar as leis e atos normativos aos
casos concretos de forma a criar ou aumentar a desigualdade.

O sentimento de discriminação entre os sexos é algo que está enraizada na


história da humanidade e que precisa ser mudado. As mulheres são diferentes dos
homens não apenas em sua forma física e características biológicas, mas também
na forma como gênero feminino vem sendo construído socioculturalmente. E mesmo
com todo progresso e conquistas nos últimos séculos as mulheres continuam
sobrecarregadas e tratada com desigualdade pela própria sociedade (BOBBIO,
2004, p. 17).

5.2. Código Civil – Questão do casamento

De acordo com o site âmbito Jurídico 2010, quando se faz referência ao


código Civil de 2002 e suas alterações a respeito do entendimento das questões
relacionadas à família, sua constituição, seu regramento, seu direito e dever, estão
chamando a atenção para as transformações ocorridas na própria sociedade. Em
que pese uma série de leis que acabaram incorporadas ao Código Civil de 2002, ele
na verdade veio substituir o antigo Código Civil de 1916.

À época, a sociedade brasileira vivia sob a égide de um sistema patriarcal, em


que os papéis masculinos e femininos eram definidos a partir de comportamentos
esperados deles, ou seja, ao homem caberia o papel de provedor do lar, tendo sobre
a família, poderes e, exigindo dela, da família, ações de cumprimento desse mesmo
ordenamento. Já à mulher cabia a função de auxiliar do marido na direção da
família. Esse papel foi substituído por outro estatuto em 1961 que virou a lei 4121.
Segundo Oliveira, a referida lei: “deu-lhe promoção para “assistente”, mas
conservando a submissão feminina, uma vez que sua incumbência restringe-se a
velar pela direção material e moral da casa” (OLIVEIRA, 2022). Essa condição da
mulher será alterada então em 2002, quando ela passa a ter os mesmos direitos e
deveres do homem.
Tedeschi, 2008 chama a atenção no seu livro História das Mulheres e as
representações do feminino que os discursos colocados na sociedade sobre o papel
da mulher influenciaram os movimentos de contestação e, por conseguinte, as
alterações que se processaram nas leis a partir de então. O autor assim
relata: “Esses discursos recorrentes exerceram influência decisiva na elaboração de
códigos, leis e normas de conduta, justificando a situação de inferioridade em que o
sexo feminino foi colocado […] Assim, a desigualdade de gênero passa a ter um
caráter universal, construído e reconstruído numa teia de significados produzidos por
vários discursos, como a filosofia, a religião, e educação, o direito, etc. perpetuando-
se através da história, e legitimando-se sob seu tempo. Essa definição dos papéis
também foi prejudicial aos homens, porque os colocando em uma situação de
superioridade inclusive de sentimentos, impossibilitaram que a sua dimensão
humana pudesse ser destacada, ou dito de outra forma, os homens eram tidos na
sociedade como super-homens, incapazes de fraquejar, de demonstrar sentimentos.
Essas situações corroboraram e legitimaram o poder de um sobre o outro,
deflagrando inúteis conflitos geradores da chamada Guerra dos Sexos.

5.3. Lei nº 14.132/2021 – stalking

Damássio, 2021 define Stalking como uma forma de violência na qual o


sujeito ativo invade a esfera de privacidade da vítima, repetindo incessantemente a
mesma ação por maneiras e atos variados, empregando táticas e meios diversos:
ligações nos telefones celular, residencial ou comercial, mensagens amorosas,
telegramas, ramalhetes de flores, presentes não solicitados, assinaturas de revistas
indesejáveis, recados em faixas afixadas nas proximidades da residência da vítima,
permanência na saída da escola ou trabalho, espera de sua passagem por
determinado lugar, frequência no mesmo local de lazer, em supermercados etc.

Conforme se vê a conduta de “Stalking” é bastante variada, abrangendo uma


série praticamente indeterminada de ações e podendo ter por sujeitos ativo e
passivo qualquer pessoa.

Cabette, 2021, relata que o crime é comum, podendo ser praticado por
qualquer pessoa, independentemente de alguma especial qualidade. Como já
destacado, o delito pode ser perpetrado tanto por homens como por mulheres. Não
obstante, estatisticamente é mais comum sua prática por homens contra mulheres,
envolvendo assim, muitas vezes, questões atinentes à violência doméstica e familiar
contra a mulher. Observe-se, porém, que homens também podem ser vítimas de
perseguição, seja por outros homens ou por mulheres. O crime em estudo, como já
dito, é comum.

Segundo Lima 2021, A lei contra Stalking foi publicada na Lei n°14.132, em
01 de abril de 2021, acrescentou o artigo 147-A ao Código Penal, estabelecendo
como crime a perseguição reiterada e ameaçadora a outra pessoa (assédio por
usurpação), conhecida como “stalking”. A palavra “stalking” é traduzida como
perseguição do inglês, e é popularmente atribuída a que, utiliza mecanismos digitais
para perseguir alguém, podendo ser praticado por qualquer pessoa.

5.4. Lei Nº 12.737/2012 - Carolina Dieckmann

De acordo com Cavalcante, 2012 foi promulgada a Lei nº 12.737/2012,


denominada de Lei Carolina Dieckmann, que “dispõe sobre a tipificação criminal de
delitos informáticos; altera o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 -
Código Penal; e dá outras providências”, visando suprir as lacunas legislativas sobre
a temática, recordando que o crime constitui fato típico, devendo todas as suas
nuances estarem previstas especificamente na norma, sob pena de atipicidade da
conduta. A Lei 12.737/2012 surgiu em meio ao fato escandaloso que ocorreu com a
famosa atriz brasileira, sendo a norma jurídica conhecida popularmente como a Lei
Carolina Dieckmann. A referida Lei teve vários elogios no âmbito jurídico, no sentido
que veio para garantir mais dignidade aos usuários da internet, prezando pela tutela
da honra, privacidade e intimidade das pessoas. Entretanto, houve criticas a mesma,
pois inegável foi à grande demora para sua edição, sendo feita apenas quando uma
pessoa de notória fama foi vítima da invasão de dispositivo informático.

5.5. Lei nº 11.340/2006 – lei Maria da penha como ferramenta de


coibição à violência doméstica

Prates, 2019 descreve que a Lei 11.340/2006, denominada como "Maria da


Penha", trata-se de uma legislação especial cujo objetivo criar mecanismos para
coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher e seus efeitos para
a ampliação do acesso à justiça para as mulheres em situação de violência
doméstica e risco social. A legislação está adequada à Convenção Interamericana
para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher. No artigo 6º da lei
dispõe a nova legislação como paradigma o reconhecimento da violência contra as
mulheres como uma violação dos direitos humanos. Bem como dispõe sobre a
criação dos juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher; altera o
Código de Processo Penal, o Código Penal e a lei de Execução Penal; e dá outras
providências.

Embora a lei represente uma conquista e um avanço no combate à violência


contra a mulher, no sentido de proteger a vítima e punir os agressores, muitas
mulheres ainda se sentem ameaçadas e acuadas em seus lares. A agressão a
mulher independe de classe social ou de uma formação acadêmica. A pressão
psicológica é tão forte diante dessa violência que a mulher não tem forças para
denunciar os agressores. Teme não só a própria vida, mais também a dos seus
filhos. A exemplo da Maria da Penha que mesmo com uma formação acadêmica e
emprego estável, temia a separação e a coragem de denunciar o agressor. O ex-
marido conhecido como “Antônio, possuía um histórico de agressões contra suas
filhas e esposa, que, por sua vez, temia se separar por conta de seu comportamento
violento” (BRUNO, 2016).

Essa agressividade entre quatro paredes faz com que a mulher se cale para
os seus familiares e para o mundo. Em muitos casos de agressão, os familiares das
vítimas só têm conhecimento quando a mulher denuncia o agressor ou quando a
vítima sofre lesões mais grave que a leva a morte.

Vale ressaltar que um dos fatores que também contribui para o


descumprimento da Lei Maria da Penha é o desconhecimento das mulheres sobre
seus direitos e sobre a própria lei. (SARDENBERG; TAVARES, 2010, p. 12).

As mulheres passaram a ter conhecimento da existência da lei através da


mídia e das campanhas contra a violência doméstica. Entretanto essas mulheres
ainda desconhecem que direitos lhes são assegurados, uma vez que as campanhas
são voltadas para defesa e proteção das mulheres e não dos direitos que as
assegura contra qualquer tipo de agressão.

Deve-se ressaltar que quando não se tem informações claras e eficientes


sobre os mecanismos para obter a proteção e assistência previstas na legislação
menos mulheres denunciaram os agressores e consequentemente mais mulheres
serão vítimas de violência sem pedido de socorro.
5.6. Mecanismo Legais de Proteção à Mulher

TAWIL 2018, descreve que diante da necessidade de uma proteção mais


abrangente que pudesse proteger as mulheres, criam-se instrumentos legais que
visam garantir direitos iguais às mesmas, tendo em vista a discriminação sofrida por
elas ao longo dos tempos, sendo que a classe feminina quase sempre é a mais
vulnerável e desta forma precisa ser contemplada.

Ainda nesse sentido, outra pesquisa realizada ao final da década de 80,


aponta que 68 % das agressões físicas sofridas pelas mulheres, tem relação com
afinidade pessoal e afetiva, sendo cometidas em seu próprio lar por homens, que ao
invés de protegê-las as agridem. (IBGE, 2018).

Entre o mecanismo de proteção à mulher vítima de violência doméstica, entre


os mecanismos que dispõe o art. 3º da Lei 11.340/2006

Art. 3º Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício


efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à
educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao
trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência
familiar e comunitária.

§ 1º O poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos


humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no
sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 2º Cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições


necessárias para o efetivo exercício dos direitos enunciados no caput.

Entre os outros mecanismos.

5.7. Princípios da Dignidade da Pessoa Humana

Constitui a dignidade um valor universal, não obstante as diversidades


socioculturais dos povos. A despeito de todas as suas diferenças físicas,
intelectuais, psicológicas, as pessoas são detentoras de igual dignidade. Embora
diferentes em sua individualidade, apresentam, pela sua humana condição, as
mesmas necessidades e faculdades vitais (DALLARI, 2002).

A dignidade é composta por um conjunto de direitos existenciais


compartilhados por todos os homens, em igual proporção. Partindo dessa premissa,
contesta-se aqui toda e qualquer ideia de que a dignidade humana encontre seu
fundamento na autonomia da vontade. A titularidade dos direitos existenciais, porque
decorre da própria condição humana, independe até da capacidade da pessoa de se
relacionar, expressar, comunicar, criar, sentir. Dispensa a autoconsciência ou a
compreensão da própria existência, porque “um homem continua sendo homem
mesmo quando cessa de funcionar normalmente.” (COMTE-SPONVILLE, 1999).
Como observa Ingo Wolfgang Sarlet: “mesmo aquele que já perdeu a consciência da
própria dignidade merece tê-la (sua dignidade) considerada e respeitada.”.

5.8. Princípios da Igualdade

Vigente até o momento a Constituição é o ato de constituir, estabelecer, firmar


ou ainda, o modo pelo qual se constituí uma coisa, um ser vivo, um grupo de
pessoas; organização, formação. A Constituição por definição é uma técnica ou
conjunto de técnicas que submete o governo a limites, resultado muito menos
prováveis a ocorrência de atos de violência arbitrária e tirânica em um governo
constitucional. Além disso, uma Constituição bem elaborada adotará as oportunas
medidas para sua alteração de modo que evite, enquanto for humanamente
possível, o movimento revolucionário. O princípio da igualdade vem expresso no
Caput do art. 5º, inciso I, apropriados ao título de “direitos e garantias fundamentais”
entre os cidadãos brasileiros, figurando em seu texto as figuras do gênero “homens
e mulheres” equiparados em direitos e obrigações dessa Constituição. Assim dispõe
o art. 5º da Constituição Federal de 1988:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta


Constituição.

No Campo do reconhecimento da individualidade de cada ser humano, a


igualdade está ligada à afirmação do princípio da não discriminação, reconhecendo
assim que todos são iguais perante a lei e, portanto, não pode haver discriminação
que excluam determinada pessoas ou grupo de pessoas pelas suas escolhas,
religião, raça, classe social ou possuírem características próprias como as de
gênero. “ Dar tratamento isonômico às partes significa tratar igualmente os iguais e
desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades. ’’ (NERY
JUNIOR, 1999, p. 42).

Como salienta Moraes, (2002) o legislador não poderá editar normas que se
afastem do princípio da igualdade, sob pena de flagrante inconstitucionalidade. O
intérprete e a autoridade política não podem aplicar as leis e atos normativos aos
casos concretos de forma a criar ou aumentar desigualdades.

Este princípio opera em dois mecanismos distintos. No primeiro mecanismo


impõe ao legislador o dever de não dar tratamento abusivamente diferenciados a
pessoas com situações idênticas. No outro plano, obriga o interprete a aplicar a lei
de maneira igual sem diferenciações em razão de sexo, raça, classe social, religião,
convicções políticas ou filosóficas (MORAES, 2002).

“[...] a igualdade dos homens não são um dado de fato, mas um


ideal a perseguir; não são uma existência, mas um valor; não
são um ser, mas um dever ser” (BOBBIO, 2004, p. 17)

De acordo com Louro, 1997 o sentimento de discriminação entre os sexos é


algo que está enraizada na história da humanidade e que precisa ser mudado. As
mulheres são diferentes dos homens não apenas em sua forma física e
características biológicas, mas também na forma como gênero feminino vem sendo
construído socioculturalmente. E mesmo com todo progresso e conquistas nos
últimos séculos as mulheres continuam sobrecarregadas e tratadas com
desigualdade pela própria sociedade.

5.9. Importância do apoio a Vítima de Violência

A Organização Mundial da Saúde (OMS) apresentou um ranking no qual o


Brasil ocupa a 5ª posição referente à violência contra a mulher, e o relógio da
violência do Instituto Maria da Penha, aponta que a cada 2 segundos, uma mulher é
vítima de violência física ou verbal no Brasil. Diante deste contexto, é importante
ressaltar a importância do acolhimento e do apoio psicossocial as vítimas de
violência doméstica, pois, na maioria das vezes essas mulheres se encontram em
muitos conflitos psicológicos, emocionais e com um estado de saúde debilitado.
Rolim e Falcke (2017), através de seus estudos, destacaram a insuficiência
dessas políticas públicas em relação ao suporte às mulheres em situação de
violência, oferta insuficiente para a demanda, profissionais que não conhecem bem
o seu papel e suas funções, isso faz com que o serviço não aconteça como deve
ser. Para corroborar com esta visão, também podemos observar a fala de Barreto,
Dimenstein e Leite (2013), onde as mesmas constataram o fato de que esses
serviços muitas vezes ocorrem de um modo precário devido à falta de material nas
redes de apoio, condições de trabalho desfavoráveis, baixa qualificação dos
recursos humanos e dificuldade na articulação com outros setores para conseguir
suporte para algumas demandas. Essas são algumas das dificuldades enfrentadas
por profissionais que atuam nessa área, o que enfraquece o serviço ofertado e
assim afasta as mulheres. Dessa forma, não conseguem fazer com que o
acolhimento se realize de um modo consistente, o que dificulta essas mulheres se
sentirem apoiadas por esses serviços.

6. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E A (IN)EFICÁCIA DAS MEDIDAS PROTETIVAS

Apesar da lei 11.340/06, ter buscado aplicar suas medidas de uma forma
célere e informal, “De uma forma geral, o processo protetivo conferiu informalidade e
agilidade à proteção e reparação da violência à mulher”, (FERNANDES, 2015,
p.185), a mesma possui na grande maioria das vezes quando acionada, a ineficácia
no caso prático, podemos observar esse aspecto quando a partir de alguns
pressupostos observamos lacunas enormes entre a lei e a “vida real”:
[...] Não menciona a Lei Maria da Penha o ̃ s requisitos para o
deferimento das medidas protetivas, nem exige que a
autoridade policial instrua pedido da ví tima com as
testemunhas do fato porventura existentes (art. 12, § 1o, da Lei
n. 11.340/2006), o que pode conduzir ao indeferimento de
medidas de proteção por ausência de provas. (FERNANDES,
2015, p.185).

Por não mencionar os requisitos para que as medidas protetivas de urgência


sejam deferidas quando solicitadas, a lei Maria da Penha apresenta uma lacuna que
pode impedir sua aplicabilidade. Além disso, a lei Maria da Penha não abordou
sobre as a duração das medidas protetivas de urgência, gerando confusão quanto
ao seu entendimento e aplicabilidade.

6.1. Medidas Protetivas


Podemos compreender por medidas protetivas as medidas que visam garantir
que a mulher possa agir livremente ao optar por buscar a proteção estatal e, em
especial, a jurisdicional, contra o seu suposto agressor. E para que haja a
concessão dessas medidas, é necessária a constatação da prática de conduta que
caracterize violência contra a mulher, desenvolvida no âmbito das relações
domésticas ou familiares dos envolvidos (SOUZA, 2006).

7. DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA QUE OBRIGAM O AGRESSOR


As medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor estão elencadas no
artigo 22 da Lei nº 11.340/2006 – Maria da Penha:

“Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a


mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao
agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas
de urgência, entre outras:

I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação


ao órgão competente, nos termos da Lei 10.826, de 22 de dezembro de
2003;

II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:

a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando


o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;

b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio


de comunicação;

c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade


física e psicológica da ofendida;

IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a


equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;

V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

§ 1º As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras


previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou
as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao
Ministério Público.

§ 2º Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas


condições mencionadas no caput e incisos do art. 6º da Lei no 10.826, de
22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão,
corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e
determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do
agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena
de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o
caso.
§ 3º Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá
o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial.

§ 4º Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto


no caput e nos §§ 5º e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de
1973 (Código de Processo Civil).”

Desse modo, verifica-se que são as medidas protetivas voltadas a quem


pratica a violência doméstica, ficando sujeitas as obrigações e restrições.

7.1 Afastamento do domicilio ou local de Convivência com a Ofendida

No Brasil, no que diz respeito à legislação infraconstitucional, entre os anos de


2002 e 2004, foram promulgadas duas leis que tentaram diminuir o número de casos
da violência doméstica. Uma foi a Lei nº 10.455/02 que acrescentou ao parágrafo
único do artigo 69 da Lei 9.099/1995 (Lei dos Juizados Especiais) o seguinte:
“[...] Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida
de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a
vítima." (BRASIL, 2002).
Como se vê, não foi uma medida que poderia assustar o agressor, uma vez
que somente o afastava do convívio doméstico, a livre arbítrio do juiz, quando da
tramitação do processo em juízo.
No caso da lei 13.827 de 2019 que modifica a Lei Maria da Penha, seu objetivo
fundamental foi facilitar a aplicação das medidas protetivas. Buscou facilitar a
tomada de decisão da justiça e da delegacia dando maior poder a essas duas
instâncias para adotar medidas emergenciais para proteção da mulher. Assim, ao se
notar o risco para a mulher ou seus filhos, o agressor deve de forma urgente ser
afastado do lar. Os presos não têm liberdade concedida até que se constate
ausência de risco para a vítima. Isso para imprimir rigor maior a proteção, conforme
o artigo 12, C, § 2.

Mas mesmo com essas mudanças, não se pode falar que as medidas
protetivas se tornaram eficazes, muito embora tenha havido avanços. Mesmo após
os avanços na legislação brasileira nas últimas décadas, as mulheres são
espancadas de forma quase que naturalizada na sociedade (LANGLEY e LEVY,
1980).

7.1.1. Vedação de Conduta


Porto, 2009 afirma que através das Medidas Protetivas de Urgência da Lei, é
possível que haja proibição do sujeito ativo, para a prática de certas condutas,
levando em consideração que essa medida possa prevenir crimes e
consequentemente proteger as reais vítimas da violência. Porém, como menciona o
mesmo autor:

“Há dificuldades estruturais do Estado em implementá-las. E, nesse ponto, é


bom ter presente que impor medidas que não poderão ser fiscalizadas ou
implementadas com um mínimo de eficácia é sempre um contributo para o
desprestigio da Justiça. De nada adianta o juiz justificar-se intimamente com
escusas do tipo: ‘isso é problema da policia, do poder executivo, etc.’, pois,
na visão social, todos os órgãos – polícia, Poder Judiciário, advogados,
Ministério Publico – estão entre as imbricados e compreendem o grande
sistema de justiça, de modo que as falhas em quaisquer dessas
engrenagens depõem contra o todo sistêmico.” 
Apesar de essas medidas protetivas serem de difícil fiscalização, elas devem
e podem ser deferidas, porém a imposição das mesmas deve ser bem refletida,
afirma Porto:

“Por exemplo, a fixação de distancia entre agressor e agredida é uma


dessas medidas de escassa praticidade e difícil fiscalização. Já se viu
pedidos em que, a deferir-se a distancia de afastamento pleiteada pela
ofendida, o suposto agressor teria que se mudar para o meio rural, pois o
perímetro urbano da pequena cidade onde ambos moravam, não lhe
permitiria continuar habitando a sede do município. Esta medida parece
todavia ter sentido naquelas hipóteses em que o agressor, obstinado em
acercar-se da vitima, segue-a teimosamente por todos os lugares,
especialmente, para o trabalho, causando apreensão e risco. Mas nesse
caso em que o agressor insiste em aproximar-se ou mesmo adentrar o local
de trabalho da vitima, é possível aplicar-lhe a proibição de frequência nesse
local, conforme letra ‘c’(PORTO, 2009).” 
7.1.2. Suspensão da Posse ou Restrição ao porte de Armas

Dias, 2008 relata que caso o agressor possua posse devidamente registrada
na Polícia Federal, o desarmamento só pode ocorrer caso haja pedido de medida
protetiva feita pela vítima, porém caso o uso ou a posse não sejam legais e haja
violação dos dispositivos legais, é a autoridade policial a responsável pelas
providencias a serem tomadas. 
Como descreve a desembargadora Dias, 2008:

“Sendo legal a posse e o uso da arma de fogo pelo agressor, denunciando a


vitima à autoridade policial a violência e justificando a necessidade de
desarmá-lo, por temer pela própria vida, será instalado expediente a ser
remetido ao juízo. Deferido o pedido e excluído o direito do ofensor manter a
posse da arma, ou sendo limitado o seu uso, deve-se comunicar a quem
procedeu ao registro e concedeu a licença: o Sistema Nacional de Armas
(SINARM) e a Polícia Federal. Caso o agressor tenha direito ao uso de
arma de fogo, segundo o rol legal, o juiz comunicará ao respectivo órgão,
corporação ou instituição que impôs. O superior imediato do agressor fica
responsável pelo cumprimento da determinação judicial sob pena de
incorrer nos crimes de prevaricação ou desobediência. A restrição é valida
para evitar tragédia maior. Se o marido agride a esposa, de modo a causar
lesão corporal, se possuir arma de fogo, é possível que, no futuro progrida
para o homicídio.”
7.1.3. Restrição ou Suspensão de Visitas
No artigo 22 da Lei nº 11.340/2006 inciso IV diz:

“[...] IV – restrição ou suspensão de visitas aos


dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento
multidisciplinar ou serviço similar;”

Porto, 2007, relata que se apenas um dos dependentes for vitima da violência
doméstica, as medidas podem ser estendidas aos outros, pois também estão
sujeitos ao risco. Caso haja apenas violência contra a mãe, entende-se que não há
razões para que as visitas sejam suspensas, portanto podem ser restringidas quanto
ao local e horário das visitas, além de ser proibida visitação, quando o agressor
encontra-se em estado de alcoolismo ou após o uso de substancias entorpecente,
além de frequentar determinados lugares não recomendados.

Descreve ainda Porto, 2007 que se a mulher e seus filhos forem removidos
para um abrigo ou até mesmo para a casa de seus familiares, essa restrição será
mais rígida, pois este lugar deve ser mantido em sigilo, e até mesmo não deve ser
mencionado no processo, justamente para que o sujeito ativo não tome
conhecimento. Em relação às visitas aos dependentes, não serão proibidas, porém
para que isto ocorra deverá ter um local previamente indicado pela autoridade.

7.1.4. Fixação de Alimentos Provisionais ou Provisórios

Alimentos provisórios são os arbitrados liminarmente pelo juiz, sem ouvir o


réu, no despacho inicial da ação de alimentos (Lei 5.478/68). Só é possível quando
houver prova pré-constituída do parentesco, casamento ou união estável (GOMES,
2008).
Já Frust, 2015 descreve que os alimentos provisionais são arbitrados em
medida cautelar, preparatória ou incidental, de ação de separação judicial, divórcio,
nulidade ou anulabilidade de casamento ou de alimentos, dependendo da
comprovação dos requisitos inerentes a toda medida cautelar: fumus boni juris e o
periculum in mora. Os provisionais destinam-se a manter o suplicante e a prole
durante a tramitação da lide principal.

8. DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA À OFENDIDA


Buzzo, 2011 comenta que quanto a ofendida, as medidas que o juiz poderá adotar
vai de desde a retirada da ofendida de seu domicílio, sem nenhum prejuízo, até a
separação de corpus e inclusão da mesma em programas de assistência e proteção,
como fica explícito no art. 23, desta lei:

Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo


de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a
programa oficial ou comunitário de proteção ou de
atendimento;
II - determinar a recondução da ofendida e a de seus
dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento
do agressor;
III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem
prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e
alimentos;
IV - determinar a separação de corpos.

8.1. Encaminhar a Ofendida e seus Dependentes a Programa de Proteção


e Atendimento
Segundo a autora Ortolani, 2018, as medidas protetivas de urgência
concedidas à ofendida estão elencadas nos artigos 23 e 24 da Lei 11.340/2006, e
com isso poderá o juiz determinar a recondução da ofendida ao lar mediante o
afastamento do agressor; fixar limite mínimo de distância para o agressor e a
residência da vítima; o encaminhamento da ofendida e seus filhos para abrigos
seguros; a determinação imediata da separação de corpos; a fixação de alimentos
provisórios; proibir temporariamente que sejam vendidos, comprados ou alugados
bens comuns do casal; suspensão de procurações conferidas pela vítima ao
agressor; a restituição de bens indevidamente subtraídos da vítima pelo agressor.

8.2. Recondução ao Domicílio após afastamento do agressor


Segundo o Tribunal de Justiça, 2021 a recondução da vítima e seus
dependentes ao domicílio após a retirada do agressor estão prevista no art. 23º,
inciso II: “determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao
respectivo domicílio, após afastamento do agressor;” Não vem explícito na lei, mas a
recondução da vítima e seus dependentes devem ser feita com o acompanhamento
de oficial de justiça, como também da ajuda policial, dependendo da situação.

8.3. Afastamento do Lar


Moura e Marques, 2019 relata que no inciso II, do artigo 22 enfatiza sobre o
afastamento do lar, domicílio ou local de convivência da ofendida, é uma medida
importantíssima, uma vez que retirando o agressor do local de convívio da vitima,
diminuirá o risco de violência física e psicológica, garantindo o sossego da ofendida
em seu lar. Vale ressaltar, que a segurança de seu patrimônio, pois estando o
agressor afastado do lar, impede-o de subtrair e destruir seus objetos e utensílios.
8.4. Separação de corpo
A medida de separação de corpos pode ser analisada sob dupla finalidade
(RODRIGUES FILHO, 1989): de um lado, na forma de uma autorização para que um
dos cônjuges se retire do lar conjugal, rompendo liminarmente a sociedade conjugal;
de outro, como uma sanção acauteladora pretendida por um dos cônjuges para que
o outro seja compulsoriamente afastado, diante de riscos para si ou demais, se
mantido o convívio.
No mesmo sentido, Maerrawi (2008) as classifica como separação de corpos
voluntária (consensual ou unilateral) ou compulsória (ou afastamento temporário de
um dos cônjuges ou companheiros), possuindo a primeira modalidade natureza
satisfativa e somente a segunda natureza cautelar propriamente dita.

8.5. Medidas de Ordem Patrimonial


BUZZO, 2011 fala em relação aos bens patrimoniais da ofendida o juiz poderá,
liminarmente, suspender todos os atos notariais realizados pela ofendida em favor
do agressor, como por exemplo, procurações, bem como, poderá ainda,
dependendo das circunstâncias do caso, determinar que sejam devolvidos os bens
da vítima subtraídos pelo agressor, proibição da realização de atos notariais de
venda e compra, locação e outros destas naturezas, que tenham por objeto os
imóveis em comum entre o casal, como segue:
Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal
ou daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá
determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras:
I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à
ofendida;
II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de
compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa
autorização judicial;
III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao
agressor;
IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por
perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência
doméstica e familiar contra a ofendida.

9. CONCLUSÃO

A lei Maria da Penha é de suma importância para a sociedade, principalmente


no que diz respeito ao seu forte vínculo com os direitos fundamentais, tendo em
vista seu importante papel para uma sociedade mais livre e justa. Diante dessa
realidade, faz-se imprescindível, o seu real funcionamento e aplicabilidade.
A proteção voltada para a mulher conserva a sua autonomia e bem estar,
proporcionando uma vida plena quando alcançada. É por essas razões que
devemos estar atentos a todos os detalhes que vinculam o direto da mulher. Como
sociedade, temos o papel de fiscalizar as leis, já que estas foram criadas para nós
mesmos. Os objetivos deste presente trabalho foram alcançados, partindo da ideia
de que a informação também faz parte do progresso do homem quanto à sociedade,
tudo que traz conhecimento é de extrema valia, enriquecendo e conscientizando o
próximo para reproduzir informações corretas e coerentes.
A ineficácia da Lei Maria da Penha é assunto que não deve deixar de ser
discutido no âmbito jurídico penal, pois de nada serve a lei, se esta não tem
capacidade de produzir seus efeitos.
A ineficácia da Lei Maria da Penha foi identificada dentro de dois problemas que
afetam diretamente o resultado esperado, ou seja, o medo das vítimas e a falta de
meios de cumprimento das determinações da legislação específica.
REFERÂNCIAS:

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.


Brasilia, DF: Senado, 1988.

NERY JÚNIOR, Nélson. Princípios do Processo Civil à luz da Constituição Federal.


São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2002.


Disponível em:
<https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/noticia/2020/09/16/assassinatos-de-
mulheres-sobem-no-1o-semestre-no-brasil-mas-agressoes-e-estupros-caem-
especialistas-apontam-subnotificacao-durante-pandemia.ghtml>: acessado: 26/
01/2022.

Violência contra as mulheres - OPAS/OMS - PAHO


Disponível em:<https://www.paho.org/pt/topics/violence-against-women>: acessado
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SALES, Camila Maria Risso. Direitos humanos das mulheres: cidadania e
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GUEDES, R. N; SILVA, A. T. M. C; FONSECA, R. M. G. S. A violência de gênero e


o processo saúde-doença das mulheres. Esc Anna Nery Rev Enferm, v.13, n. 3,
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BRUNO, Cecilia Roxo. Lei Maria da Penha: um estudo sobre os mecanismos de


proteção à mulher em situação de violência. 2016. 57f. Monografia (Graduação em
Direito) Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2016.

CUNHA, Bárbara Madruga. Violência contra a mulher, direito e patriarcado:


perspectivas de combate à violência de gênero. XVI Jornada de iniciação cientifica
de direito da UFPR. Curitiba, 2014. Disponível em:. Acesso em: 03 fev. 2022.

CERQUEIRA, Daniel. et al. Atlas da Violência 2021. Instituto de Pesquisa


Econômica Aplicada (IPEA): Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Brasília, 2021.
Disponível em: https://static.poder360.com.br/2021/12/Atlas-da-Violencia-2021.pdf.
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_______ Lei Maria da Penha: o Processo Penal no caminho da efetividade. 2013.


292 f. Tese (Doutorado) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP,
São Paulo, SP, 2013. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-
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TRINDADE, Vitória Etges Becker. Lei Maria Da Penha: violência doméstica e familiar
contra a mulher no âmbito da polícia judiciária. Anais... XII Seminário Internacional
Demandas Sociais e Políticas Públicas na Sociedade Contemporânea, Santa Cruz
do Sul, p. 1-19, 2016. ISSN: 2447-8229.

MACIEL, Eliane Cruxên Barros de Almeida. A Igualdade Entre os Sexos na


Constituição de 1988. Brasília, 1997. Disponível em
<http://www.senado.gov.br/conleg/artigos/especiais/AlgualdadeEntreosSexos.pdf>.
Acesso em: 05 mar. 2022.
RETORNAR A ESSE LIVRO (NÃO FOI MENCIONADO NADA AINDA DESSA REFERENCIA

Mary Wollstonecraft
Quais são os argumentos de Mary Wollstonecraft contra a visão de gênero defendida por
Rousseau?
Wollstonecraft rebate as assertivas de Jean-Jacques Rousseau na obra já
analisada por discordar sobre a consideração da fraqueza moral das mulheres que
justifica a submissão feminina às faculdades dos homens que são superiores à
delas, bem como reduzir à mulher, com o casamento, à condição de escravas por
conveniência.

WOLLSTONECRAFT, Mary. . Reivindicação dos direitos da mulher. Trad. de Motta, Ivania


Pocinho. . São Paulo: Boitempo, 2016

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