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FILOSOFIA GERAL:

PROBLEMAS METAFÍSICOS
APRESENTAÇÃO
Professora Especialista Francielle Freire Favareto.

Currículo lattes: http://lattes.cnpq.br/9058704080330971

● Graduada em Filosofia – Licenciatura Plena pela Universidade Estadual de


Maringá
● Graduanda em Pedagogia – Unicesumar.
● Especialista em Gestão do Ensino de Religião, Sociologia e Filosofia –
Faculdade Eficaz.
● Especialista em Tutoria em Educação a Distância – Faculdade Eficaz.
● Especialista em Educação Especial – Faculdade Paulista.
● Curso de Filosofia para Crianças – Centro Brasileiro de Filosofia para
Crianças.
● Projeto de extensão: O Papel Pedagógico das Tragédias Gregas –
Universidade Estadual de Maringá
● Professora durante nove anos na rede estadual, atuando no Ensino Médio,
nas disciplinas de Filosofia e Sociologia.
● Professora no Curso Preparatório Inovação nas disciplinas de Filosofia e
Sociologia.
● Palestra sobre a “Origem da Filosofia – Organização social e política entre os
gregos” na Câmara Municipal de Marialva – Projeto Câmara Jovem – 2018.
● Palestra sobre “Escola Pública e Privada: a formação de um cidadão crítico”
na Faculdade Cidade Verde.
APRESENTAÇÃO DA APOSTILA

Seja muito bem-vindo(a)!

Prezado(a) aluno(a), que satisfação ter você nesta disciplina. Iniciaremos uma
grande jornada ao conhecimento filosófico, elementar para a construção de um
pensamento reflexivo e crítico no assunto que tange até hoje a mente de grandes
pensadores, que é a questão do Ser. Iremos percorrer o caminho que a metafísica
trilhou desde o seu nascimento, ápice e declínio, dando espaço para uma nova forma
de pensar o Ser.
Na Unidade I, começaremos nossa jornada conhecendo a forma que os gregos
clássicos se relacionam com questões cotidianas, histórias fantasiosas para explicar
a própria realidade, denominado de Mitologia, ponto inicial para o pensamento
cosmogônico.
Na Unidade II vamos inserir um novo conceito. Se a Unidade I, com a
descoberta da metafísica, palpitou nossa mente, será na Unidade II que
conheceremos a ontologia, que, em poucas palavras, significa “o estudo do ser”.
Nesta unidade, a metafísica já é um conceito – estudo para tudo que está além da
física – e o estudo do ser começa a ganhar corpo.
Na Unidade III veremos a filosofia cristã surgir e fundamentar-se no
pensamento das autoridades Platão e Aristóteles. Neste momento, a filosofia será
suprimida pela revelação.
Por fim, na Unidade IV, veremos o declínio da metafísica e o nascimento da
fenomenologia, momento este em que o sujeito volta a ser dono da sua própria
experiência e sendo auxiliado pela ciência. Aqui, a filosofia deixa de ser subordinada
e passa a ser fator essencial para busca e compreensão da dualidade corpo-mente.
É neste momento que lanço a mão para reiterar o convite de juntos trilharmos
o caminho do conhecimento sobre os temas propostos neste material. Espero
alcançar o objetivo de instigar em você o pensamento filosófico.

Grata e bom estudo!


UNIDADE I
PROBLEMAS METAFÍSICOS E FILOSOFIA – PRÉ-SOCRÁTICOS
Professora Especialista Francielle Freire Favareto.

Plano de Estudo:
• Mitologia – Pensamento Cosmogônico;
• Pré – Socráticos – A busca pela Arché;
• Permanência e Devir – Parmênides e Heráclito;
• Pensamento Cosmológico.

Objetivos de Aprendizagem:
• Compreender a relação do pensamento mítico com o pensamento racional no
contexto grego;
• Compreender a importância dos filósofos pré-socráticos para a busca da origem das
coisas "arché";
• Estabelecer a diferença entre a Cosmogonia da Cosmologia.
INTRODUÇÃO

Prezado(a) estudante da disciplina “Filosofia Geral: Problemas Metafísicos”, é


com grande satisfação que te convido a entrar no universo do conhecimento filosófico.
Este processo de conhecimento irá trazer a você, caro(a) estudante, a oportunidade
de navegar no processo de busca para encontrar o sentido do ser – metafísica –
processo este que custou uma extraordinária mudança no pensamento ocidental em
relação à origem das coisas materiais e sobrenaturais.
Esta introdução busca orientar e situar você, estudante, a entender a
importância em conhecer o nascimento do processo racional que utilizamos até hoje,
processo este que não aconteceu de forma rápida ou engendrado pelo acaso.
Como citado, a metafísica não se estabeleceu de forma aleatória, foi
necessário que o homem grego entendesse o mundo que estava inserido e, a partir
daí, levantasse questionamentos da própria realidade. Mas, para tanto, o mundo
grego precisou passar por transformações no mundo material, tendo como efeito a
revelação da própria existência.
Iremos, nesta unidade, entender como esse processo de “revelação” e
ambientação foi necessário para o homem levantar a questão sobre o Ser.
O homem grego no seu princípio estava conhecendo seu mundo,
estabelecendo verdades intuitivas, não questionando as explicações sobre o mundo
que estava inserido.
Embarcaremos no estimulante ato de aprender sobre o mito, cosmogonia,
cosmologia e iniciar um passeio nas condições que a Grécia proporcionou para o
nascimento da Filosofia.
Vamos conhecer o berço da investigação do pensamento?

Bons estudos!
1 MITOLOGIA – PENSAMENTO COSMOGÔNICO

Iremos iniciar nosso estudo referente à Metafísica e, de uma forma genérica e


inicial, podemos traduzir como uma forma de entender o sentido do Ser. Mas, para
entendermos essa necessidade de encontrar o sentido do Ser, faz-se necessário
voltarmos à época dos povos primitivos.
Desde os povos primitivos, o homem sempre tentou entender sua realidade,
buscar explicações para compreender o meio onde habitam, os fenômenos naturais e
quiçá as questões sobrenaturais que faziam parte da vida cotidiana. Dessa forma, foi
entre os povos primitivos que o mito se fez presente.
O mito era, para os povos primitivos, uma forma de explicar a realidade em que
estavam inseridos, construída de explicações fantasiosas, não crítico para
compreender fatores naturais e sobrenaturais.
Mesmo sendo uma forma fantasiosa de explicar a realidade que esses povos
primitivos estavam inseridos, não se pode negar que essas explicações eram para
eles uma verdade – verdade esta que chamamos de intuitiva –, ou seja, que não
precisa de provas para ser aceita.
Vale ressaltar, querido(a) leitor (a), que o mito, reproduz um desejo do homem
em dominar o mundo em que está inserido e apaziguar o medo e a insegurança do
desconhecido.
Devido a esse medo de enfrentar o desconhecido, o mito passou a ser
entendido como pensamento mítico, carregado de magias, para sanar o desejo de
que as coisas acontecessem da forma que desejavam. Para que isso fosse possível,
os mitos apresentavam uma ferramenta para transformar um pensamento em ação,
os rituais. Os rituais eram os mitos em forma de ação.
Prezado(a) estudante, como citado, o mito é uma verdade intuitiva e, por
carregar esse significado conceitual, temos que ressaltar sua função. Tendo em vista
que o mito nasce do desejo do homem em dominar o mundo em que estava inserido,
sua função consiste em fixar modelos, exemplos das atividades humanas – as ações,
utilizando como ferramenta os rituais, que eram expressões imaginárias do homem
em relação aos deuses. Dessa forma, o homem, em sua necessidade de encontrar
explicações sobre sua realidade, utilizava dos ritos para demonstrar aos homens
exemplos do que era o bem e o mal, recorrendo como protagonista o papel dos
deuses.
Por conseguinte, o mito tem sua característica para ser considerado como tal.
Quando pensamos nos mitos dos povos primitivos, é necessário entender que
consistia na busca de uma explicação que atendia a todo o grupo. O indivíduo só se
sentia pertencente, quando era reconhecido como parte do grupo, isto é, sua
consciência/sua existência tinha que ser reconhecida pelos outros.

Figura 1 - Cosmogonia e Teogonia

Outra característica do mito é que, por não necessitar de provas e por não
haver contestação dos fatos relatados, era considerado como um conhecimento
dogmático, pois sua aceitação dependia da fé ou da crença. Como suas normas
atendiam o coletivo, não respeitar os rituais, por exemplo, não afetava só o indivíduo,
mas sua família também, e, por necessidade de impor medo caso houvesse
transgressão, foram criados os tabus (proibição).
Mas do que se tratava o mito de fato? Como os mitos chegaram ao
conhecimento de todos? Quem os contava?
O que versava os mitos eram narrativas sobre as origens ou o fim das coisas,
sobre a formação do universo. Os mitos eram recheados de narrativas de lutas,
intrigas, trabalho, numa tentativa de explicar situações costumeiras no cotidiano,
utilizavam as narrativas com o intuito de educar e as histórias eram contadas
oralmente.
O nome dado às narrativas sobre a origem do universo é cosmogonia – “gonia”
significa engendrar, gerar e “cosmo” quer dizer “o universo organizado”.

No início de tudo, o que primeiro existiu foi Abismo: os gregos dizem


Kháos. O que é o Caos? É um vazio, um vazio escuro onde não se
distingue nada. Espaço de queda, vertigem e confusão. [...] depois
apareceu Terra. Os gregos dizem Gaîa, Gaia. [...] Depois de Caos e
Terra aparece em terceiro lugar, o que os gregos chamam Éros, e que
mais tarde chamaram “o velho Amor (VERNANT, 2008 p. 17-19).

Já os mitos que explicavam a origem dos deuses eram classificados de


teogonia.

No teatro do mundo, o cenário está montado. Abriu-se o espaço, o


tempo passou, gerações vão se suceder. (...) Assim como a terra é um
local estável para os homens e bichos, também, no alto, o céu etéreo
é morada segura para a divindade (VERNANT, 2008, p. 28).
Figura 2 - Homero e Hesíodo

As narrativas, histórias e mitos eram contados pelos aedos – rapsodos “Aedos”


–, que compõem os próprios poemas e os cantam acompanhados de instrumentos.
“[...] Rapsodos, artista popular ou cantor que, na antiga Grécia, ia de cidade em cidade
recitando poemas” (WIKIPEDIA, 2021).
Há dois nomes importantes que narram os mitos, são eles Homero e Hesíodo.
A Homero, no final do século VIII a.C. ou século IX a.C., não se sabe ao certo
em qual época ele existiu ou se ele existiu, são atribuídos os poemas Ilíada e Odisseia,
epopeias que relataram valores culturais que eram memorizados desde a infância por
ser um meio de entendimento sobre questões sobre a vida.
Ilíada conta a história da guerra de Troia. A Odisseia relata o regresso de
Ulisses para a sua ilha, chamada Ítaca, após o término da guerra. Ressalvo,
prezado(a) estudante, que a guerra durou cerca de dez anos e a única embarcação
que sobrou depois da guerra foi a de Ulisses, este que demorou mais ou menos dez
anos.
Hesíodo teria vivido no século VII a.C., trouxe a gênese dos deuses com a sua
teogonia, narrativa que contava o nascimento dos deuses, tendo como base inicial o
caos que significa “universo desorganizado”.
Cada cidade grega tinha um deus ou uma deusa representando a sua ligação
com o sagrado. Faziam festas, rituais, oferendas na intenção de agradar, para que
não houvesse nem um tipo de castigo.
Foi com o desejo de entender ou até mesmo em dominar o que não entendiam,
que as cosmologias e as teogonias foram fortemente construídas na mentalidade
do homem grego primitivo.
Cativo estava o homem grego mítico, preso à uma verdade intuitiva, temeroso,
rude, tentando construir sua própria história.
2 PRÉ-SOCRÁTICOS – A BUSCA DO ARCHÉ

Os primeiros homens a pensar a natureza de forma racional questionando o


princípio das coisas, não aceitando mais narrativas fantasiosas ou imaginárias foram
chamados de Pré-Socráticos ou Naturalista ou Filósofos da Physis, nome dado
para identificar pensadores que tinham como objeto de observação a natureza como
princípio das coisas.
Pré-socrático – é uma corrente de pensamento que iniciou antes de Sócrates,
portanto essa denominação tem a função de situar as filosofias pré-socráticas dentro
da história, estabelecendo uma ordem cronológica. Outra contribuição desses
filósofos foi fomentar a ruptura do mítico para o racional filosófico, com suas
indagações sobre a origem das coisas.
Através da busca pela arché, os pré-socráticos, por meio de seus
questionamentos, introduziram um conceito transformador, o lógos – razão ou
explicação racional e argumentativa das coisas do mundo.
Conceitos introduzidos, como arché, physis, lógos, caro(a) estudante,
determinaram a mudança da mentalidade dos gregos, que foram pensados de forma
racional pelos pré-socráticos, estes que eram classificados em monistas e
pluralistas.
Os monistas foram os pré-socráticos que elegeram um único elemento para
designar o princípio, foram eles Tales de Mileto (640 a.C. – 548 a.C.) a água,
Anaxímenes (588 a.C. – 524 a.C.) o ar infinito, Heráclito (544 a.C. – 484 a.C.) o fogo,
Pitágoras (século VI a.C.) o número e Parmênides (544 a.C. – 450 a.C.) o Ser.
Os pluralistas, como o nome indica, estipularam mais de um único elemento
como arché, sendo eles: Empédocles (483 a.C. – 430 a.C.) o Úmido, o Seco, o
Quente e o Frio, Anaxágoras (499 a.C. – 428 a.C.) as sementes que continham os
elementos de todas as coisas “raízes”, os atomistas Leucipo (século V a.C.) e
Demócrito (460 a.C. – 370 a.C.) os átomos.
Mas o que vem a ser Arché? É o conceito atribuído para designar a busca pelo
princípio, “a origem de todas as coisas”, partindo de que a origem ou o princípio das
coisas não surgem do nada.
3 PERMANÊNCIA E DEVIR – PARMÊNIDES E HERÁCLITO

Parmênides de Eléia

Parmênides de Eléia (século VI a.C.) foi um filósofo pré-socrático significativo


para a história da Filosofia. O primeiro a se atentar para a importância da metafísica.
Na verdade, seu propósito deixou de ser uma mera especulação cosmológica,
tornando-se uma ontologia (teoria do ser).
Sua teoria diz que a realidade é imutável: “O ser é, o não ser não é”. Demonstra
que o mundo sensível é ilusório, e que só o mundo inteligível é verdadeiro e imutável.

3.1 Permanência

Parmênides escreveu um poema filosófico, em versos: Sobre a Natureza. Essa


obra é composta por três partes: Proêmio, Primeira Parte e Segunda Parte. Na
primeira trata da verdade; na segunda da opinião. Conservam-se numerosos
fragmentos da primeira parte e alguns da segunda de acordo com Souza (SOUZA,
1996, p. 26).
A primeira parte, a da verdade, esclarece as coisas enquanto são, isto é, a
do que é e que não tem a possibilidade que não seja. É nesta primeira parte do poema
que o naturalista Parmênides anuncia o grande princípio de não-contradição, “o ser
existe e não pode não ser e o não-ser não existe e não pode ser” (REALE, 2007, p.
34 ).
Na segunda parte do poema, Parmênides abandona a via da verdade e
argumenta sobre a opinião dos mortais. São poucos os fragmentos que chegaram
até nós sobre essa segunda parte, o que foi possível interpretar foi que essa via
introduz o conceito de movimento.
Vale ressaltar que, na primeira parte do poema, são tratadas duas vias:
verdade e opinião. Na segunda parte que é tratado sobre a opinião dos mortais é
a terceira via, lembrando: são escassos os fragmentos da segunda parte.
É por esse caminho que Parmênides identifica o que seria para ele o arché,
chegando ao resultado de que as coisas são entes,

As coisas [...] mostram aos sentidos múltiplos atributos ou


propriedades. São coloridas, quentes ou frias, duras ou moles,
grandes ou pequenas. [...] Mas consideradas como órgão, com o
pensamento (noûs), apresentam uma propriedade sumamente
importante e comum a todas: antes de ser brancas ou vermelhas, ou
quentes, são. São simplesmente (MARÍAS, 2004, p. 26).

Dessa forma, Parmênides faz seu trajeto contrapondo a mobilidade de


Heráclito que “tudo flui”, alegando que existe sim o movimento, mas esse movimento
acontece só no mundo sensível.
O mundo sensível, para Parmênides, é uma percepção ilusória, pois se baseia
na opinião, sendo assim, um conhecimento não confiável.
Figura 3 - Heráclito

Heráclito (século VI a.C.– V a.C.), pré-socrático, defendeu a ideia “o verdadeiro


é mutável”, pensador da frase célebre “não nos banhamos nunca duas vezes no
mesmo rio”. Sua filosofia consistia que a realidade sofre mudança, chamando essa
mudança de devir. Identificou que o ser é múltiplo. Apresentou também a doutrina da
“harmonia dos contrários”, o mundo é guiado pela luta dos contrários, assim,
determinando a harmonia.

3.1.1 Devir

A teoria do Devir, que tudo vir-a-ser, diz que tudo muda, transforma, tanto o
homem quanto o mundo, tudo flui. E essa concepção aconteceu após eleger o fogo
como arché. O fogo é, para Heráclito, o elemento que é menos consistente e o que
mais muda.
O dilema de Heráclito passa pela questão: se tudo muda, se transforma, como
posso afirmar que conheço algo verdadeiramente? Para o pré-socrático é perceber a
mudança que se instaura o conhecimento.
Por isso, acreditando na mudança, é que sua teoria apresenta a doutrina da
“harmonia dos contrários” pois é através da luta dos contrários que o mundo se
apresenta de forma harmônica.
4 PENSAMENTO COSMOLÓGICO

Chegamos ao nosso último tópico desta unidade onde trataremos do


“Pensamento Cosmológico”. Vamos percorrer por alguns períodos o que a sociedade
Grega passou, elencando fatores que consagrou a passagem do pensamento mítico
para o pensamento filosófico. Estamos falando aqui da transição entre a Cosmogonia
para a Cosmologia – cosmos (kósmos), que significa “a ordem e organização do
mundo” ou “o mundo ordenado e organizado”, e logia, que vem da palavra lógos que
significa “pensamento racional”, “discurso racional”, “conhecimento”.
No tópico I desta unidade, vimos o que era o mito, suas características e sua
função no mundo grego e que houve uma ruptura entre o pensamento mítico para o
pensamento racional filosófico por meio dos questionamentos sobre a origem das
coisas, o arché.
O questionamento foi a expressão racional que o homem grego passou a fazer,
deixando de lado a verdade intuitiva em busca da verdade lógico racional, é dessa
forma que os pré-socráticos tiveram seu papel na história da Filosofia. Mas o que
proporcionou essa “revolução” de forma de se pensar?
Grécia passou a ser o berço da Filosofia, proporcionando condições para o
exercício filosófico.
O homem grego passou a ser cidadão, a participar das decisões levantadas na
ágora, dispondo de argumento, oratória para apresentar suas ideias, abriu campo para
a indagação, questionamento atributos da Filosofia.
É neste momento que a metafísica surge como um exercício crítico de
perguntas e respostas. E como já vimos, foi com o pré-socrático Parmênides que não
só a metafísica, como a ontologia, começou a fazer parte dos questionamentos de
toda uma sociedade.
Vamos falar das condições para o nascimento do pensamento racional ou
filosófico? Foram seis fatores significativos para essa “preparação” que a sociedade
grega estava respirando são eles; 1. as viagens marítimas, 2. a invenção do
calendário, 3. a invenção da moeda, 4. o surgimento da vida urbana, 5. a
invenção do alfabeto e 6. A invenção da política.
1. As viagens marítimas proporcionaram ao homem grego a possibilidade
de conhecer novas culturas e novos modos de pensamento. O
relacionamento comercial entre os povos da Grécia, Babilônia,
Macedônia, Egito, trouxe uma nova mentalidade aos gregos.
2. A invenção do calendário proporcionou o cálculo das estações,
obrigando o homem a olhar a natureza de outra forma, isto é, criando
métodos para registrar as repetições que acontecem com a natureza,
possibilitando prever condições climáticas, favorecendo a agricultura e
a navegação.
3. Com a invenção da moeda, o homem grego passou a abstrair o valor
das coisas. Passou-se a usar as moedas abstraindo valores e o
escambo (trocar um material por outro) teve seu fim.
4. O surgimento da vida urbana, efeito das navegações, comércio e o
surgimento da moeda deu espaço para o artesanato, dessa forma,
diminuindo os prestígios da aristocracia (dos senhores donos de terras),
pois uma nova classe surgiu trazendo para perto o estímulo das artes,
fonte importantíssima para o nascimento da filosofia.
5. A invenção do alfabeto trouxe ao homem grego um pensamento
abstrato, isto é, com a manipulação do alfabeto, transformando letras
em palavras ao invés de desenhos (hieróglifos) dos egípcios ou os
ideogramas (símbolos gráficos) dos chineses, o alfabeto tornou possível
eternizar ideias, ao contrário dos signos que carregava conotações
mágica.

Figura 5 - Alfabeto grego

6. E o último, mas não menos importante, foi a invenção da política. Foi


com a política que desejos de uma comunidade eram discutidos,
favorecendo as relações internas, ou seja, as vontades da comunidade
beneficiam as relações internas, assim nascendo a pólis (nome dado a
cidade-Estado grega).

A pólis proporciona discussão, permitindo ao homem, aliás, ao cidadão o


exercício da oralidade, argumentação, persuasão para apresentar solução de
problemas que surgiam. Era na ágora (assembleia) que os cidadãos discutiam as
necessidades da polis.
Foram essas condições que possibilitaram o nascimento da filosofia, momento
que o mito deixa de ser a explicação da origem das coisas, passando para o
entendimento da metafísica pelos pré-socráticos das filosofias sobre a origem com
uma linguagem racional e sistemática buscando o princípio natural e eterno, gerador
de todas as coisas, ao contrário do pensamento cosmogônico que a origem é fruto do
acaso. Esse período é chamado de pré-socrática ou cosmológica.
SAIBA MAIS
Sobre o “Lugar dos Gregos na História da Educação”
“A posição específica do Helenismo na história da educação humana depende
da mesma particularidade da sua organização íntima – a aspiração à forma que
domina tanto os empreendimentos artísticos como todas as coisas da vida – e, além
disso, do seu sentido filosófico do universal, da percepção das leis profundas que
governam a natureza humana e das quais derivam as normas que regem a vida
individual e a estrutura da sociedade. Na profunda intuição de Heráclito, o universal,
o logos, é o comum na essência do espírito, como a lei é o comum na cidade. No que
se refere ao problema da educação, a consciência clara dos princípios naturais da
vida humana e das leis imanentes que regem as suas forças corporais e espirituais
tinha de adquirir a mais alta importância.”

Fonte: JAEGER (1995, p. 13).

SAIBA MAIS

Você sabia que na mesma época dos pré-socráticos viveram os sábios do


Oriente, como Confúcio e Lao-Tsé (China), Sidarta Gautama, o Buda, (Índia) e
Zaratustra (Pérsia, atual Irã).

Fonte: ARANHA, 2016, p. 25.

#SAIBA MAIS#

REFLITA

Será que reproduzimos, na atualidade, o termo mito, com a mesma conotação


que os povos primitivos entendiam?

Fonte: A Autora.

#REFLITA#
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo desta unidade, percorremos o caminho da instigante Filosofia: desde


as primeiras formas de se pensar o mundo até o pensamento filosófico.
Vimos que o mito teve papel fundamental nos povos primitivos como artimanha
de organização social, narrativas que conduziam não só o modo de se pensar sua
existência, mas normativas para manter a ordem social por meio dos rituais, elegendo
regras que, se fossem transgredidas toda a comunidade sofreria penas vindas dos
deuses.
Aprendemos que houve uma passagem do pensamento mítico para o
pensamento filosófico através de condições que a Grécia proporcionou.
O conceito metafísico foi o baluarte essencial para a indagação sobre o “ser”
através da filosofia de Parmênides, que não só conceituou a metafísica, mas a
ontologia com seu princípio Ente.
Vimos também que, com o advento dos pré-socráticos, o conhecimento do
mundo passou de cosmogonia para a cosmologia, em que a origem das coisas não
surgiu do acaso como a cosmogonia sugere, mas de um princípio natural que foi fonte
geradora de todas as outras coisas, o arché.
Passamos por alguns nomes de filósofos pré-socráticos que contribuíram para
esse crescimento do espírito grego, que, aliás, Parmênides chama de nôus.
LEITURA COMPLEMENTAR

“Sobre a verdade e as opiniões: o Poema de Parmênides e a incisão


entre ser e devir”
O ponto de partida desta tese consiste em avaliar o Poema de Parmênides
através da clivagem que lhe serve como principal orientação: a absoluta
incompatibilidade entre verdade e opiniões. É a partir dela que se torna
privilegiadamente possível analisar a obra parmenídica em sua integridade, na medida
em que configura o gesto que determina a própria estrutura tripartida do Poema. Essa
incompatibilidade que cinde verdade e opiniões de forma irreconciliável depende, no
entanto, de uma decisão de pensamento que a sustenta e que lhe é anterior, servindo-
lhe como fundamento – a clara e distinta incisão entre ser e devir. Defende-se, deste
modo, que o verbo ser aplica se tão-somente à verdade, assim como o devir
caracteriza as opiniões, o que exige a pergunta: ao que se pode aplicar, então, cada
um desses verbos em sua restrita propriedade, uma vez imiscíveis? Propondo uma
nova semântica e mesmo uma nova gramática para o verbo ser, a verdade
parmenídica e o ente de que trata serão aqui compreendidos como um artifício e um
exercício de autonomia da linguagem, de uma linguagem, por conseguinte,
necessariamente auto referente; ao passo que a linguagem que se faz como uma fala
acerca dos sensíveis, aquela que se propõe a responsabilidade de discorrer acerca
do que costumamos nomear “realidade sensível”, é necessariamente plural e,
portanto, opinativa. Verdade e opiniões não são dois modos distintos de pensar o
mesmo, mas modos distintos do pensar: o noético e o frenético, cabendo a cada uma
dessas modulações não apenas uma propriedade específica de operar o pensamento
e a linguagem, mas também a submissão àquele que que determina o seu gênero e
caráter: o motivo pelo que se fazem, respectivamente, verdade e opiniões deve-se
justamente àquilo sobre o que versam. Não há verdade sobre o “mundo”, posto que
este não é, deve ser plural e diverso, ele exige da linguagem a diversidade e a
pluralidade das opiniões. Em contrapartida, só é possível verdade sobre o que não
devem. E o que não devem? Seria pouco responder “o ente”. O desafio maior do
Poema de Parmênides resulta em saber do que se diz quando se diz “o ente”. Que
seja feita, finalmente, a pergunta: o que é o ente?
Fonte: COSTA, Alexandre, Domínio Público, 2010, Disponível em
http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=180903
LIVRO
Título: Odisseia
Autor: Ruth Rocha
Editora : Salamandra; 1ª edição (1 janeiro 2011).
Sinopse: Esta obra narra o retorno de Ulisses (Odisseu) para sua ilha Ítaca depois da
guerra de Tróia.

FILME/VÍDEO
Título:Tróia

Ano: 2004
Sinopse: Filme conta a história épica da guerra de Tróia, narrativa contada por Homero
na obra Ilíada.
REFERÊNCIAS

COSTA, Alexandre. Sobre a verdade e as opiniões: o Poema de Parmênides e a


incisão entre o ser e o devir. Portal Domínio Público, UFRJ/FILOSOFIA: Programa
de Pós-Graduação da CAPES, 2010. Disponível em:
http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co
_obra=180903. Acesso em: 14 jul. 2021.

JAEGER, Werner, Paidéia – A formação do homem Grego. Trad. Artur M.


Parreira. Martins Fontes – São Paulo. 1995.

MARÍAS, Julián. História da Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

Os Pré-Socráticos. Trad. José Cavalcanti de. Souza et al. São Paulo, Abril, 1989
(Coleção Os Pensadores).

REALE,Giovanni. “História da Filosofia: filosofia pagã antiga, v. 1. – São Paulo:


3ª ed. Paulus, 2007.

Vernant, Jean-Pierre. O universo, os deuses e os homens. 7. ed. São Paulo:


Companhia das Letras, 2000.

WIKIPÉDIA: Troia - Filme. 2020. Disponível em:


https://pt.wikipedia.org/wiki/Troia_(filme). Acesso em: 16 ago 2020.
UNIDADE II
A ONTOLOGIA ANTIGA
Professora Especialista Francielle Freire Favareto.

Plano de Estudo:
● Dialética Socrática;
● Teoria das ideias - Platão;
● Metafísica aristotélica;
● Escolas helênicas.

Objetivos de Aprendizagem:
● Conceituar e contextualizar o pensamento filosófico após o advento da
metafísica;
● Compreender os tipos de filosofias de acordo com a necessidade de interpretar
o homem;
● Estabelecer a importância da racionalidade para compreender a vida humana.
INTRODUÇÃO

Olá, caro(a) estudante, nesta unidade navegaremos no campo da investigação das


ações humanas.
Após termos estudado, na Unidade I, as filosofias pré-socráticas que se preocupavam
em encontrar o arché, nesta unidade iremos acompanhar a transformação da busca
para compreender a existência do homem.
Iremos navegar em águas racionais, exercitando a capacidade de explicar as ações
do homem sem indicar como pressuposto condições cosmogônicas, partindo da
filosofia de Sócrates e finalizando esta unidade com as Escolas Helênicas, que trazem
consigo pensamentos, correntes, teorias ou filosofias que buscam uma alternativa
prática para se viver com sabedoria.
É por meio de águas agitadas que a busca para atingir a felicidade acontece. Será
necessário aos filósofos elaborar conceitos relativos ao homem, não só na forma
material, mas o que move, o que dá a partida, o que faz com que exerçam as
atividades cognitivas e práticas.
O caminho para entender o pensamento de cada filósofo ou corrente filosófica será a
passagem da busca em compreender a metafísica para abraçar a ontologia, o estudo
que tenta compreender o ser.
Será uma honra navegar nas águas do conhecimento filosófico ocidental, tradição que
carregamos ainda atualmente, como a ciência, por exemplo.

Bons Estudos!
1 DIALÉTICA SOCRÁTICA

Figura - Estátua de Sócrates da Academia de Atenas, Grécia.

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Sócrates: 470/469 – 399 a.C., não se sabe ao certo a data de nascimento e morte,
pois nada escreveu. O que se tem registrado são seus saberes em forma de diálogos,
que seus discípulos escreveram após sua morte.
Por não haver nenhum registro de punho de Sócrates, seus sucessores reproduziam
seus diálogos da forma que entendiam, ou seja, a interpretação de seus saberes
ficava à mercê de quem reproduzia, como exemplo, Platão e Aristófanes.
Platão interpreta Sócrates de forma idealizada, reproduzia os diálogos socráticos de
forma séria ao contrário de Aristófanes, que ridiculariza Sócrates em sua peça As
Nuvens, confundindo Sócrates com os sofistas.
Apesar desses contratempos com os diálogos de Sócrates, o importante é entender
por que Sócrates é um marco no pensamento filosófico. Mesmo Platão idealizando
seu mestre ou Aristófanes o ridicularizando, o importante são as filosofias que
nasceram depois de Sócrates.
O pensamento socrático tornou-se um marco no pensamento filosófico por distanciar-
se do pensamento naturalista que foi concebido pelos pré-socráticos e se tornando
mais próximo a conhecer e identificar no homem suas ações, ou seja, diferenciando o
homem da natureza o tornando mais especial.
Os pré-socráticos se preocupavam em entender a natureza, procuravam descobrir o
princípio das coisas – arché. Sócrates estava em busca de justificação filosófica,
fundamentos para desvendar a natureza ou essência do homem.

1.1 Sócrates e os Sofistas

Com o advento do pensamento filosófico, pautado na razão, surgiram, na Grécia,


homens que ensinavam a técnica da argumentação, retórica, oratória para os
cidadãos que tinham o privilégio de ter um tutor. Esses homens eram chamados de
Sofistas. Os sofistas são considerados os primeiros professores, por ensinarem aos
mais abastados as regras da argumentação, para terem vantagens ou satisfazer seus
desejos. Viajavam de uma cidade para outra realizando discursos e exposições para
atrair alunos.
A bagagem intelectual dos Sofistas divergia dos pensamentos socráticos, ou seja, os
Sofistas pregavam que a verdade é relativa, mutável e múltipla, ao contrário dos
saberes socráticos que veremos adiante.

1.1.1 Sócrates e o conceito de alma

Sócrates estabeleceu alguns conceitos relativos ao homem, ao contrário dos pré-


socráticos, que buscavam entender a natureza a partir do seu princípio. Não que
Sócrates não tenha feito a mesma observação, mas após a filosofia de Parmênides,
as observações não ficaram permeando questões cosmológicas e metafísicas, mas
as questões ontológicas estavam pautadas na mente dos indivíduos que buscavam
compreender sua própria existência, explicações para suas ações de forma racional.
Desta forma, Sócrates, a partir de seus diálogos, buscava entender o que movia a
matéria do indivíduo, o que alimentava ou sustentava o homem nas suas tomadas de
decisões, chegando à conclusão de que o homem é a sua alma.
Alma no pensamento socrático era entendido como a consciência, a moralidade e a
capacidade de entender e de querer, atributos reconhecidos só entre os homens, o
que nos faz distanciar dos outros seres vivos.
A alma é a habilidade de aprender, é uma atividade cognoscitiva. E por atividade
entende-se ações, ações que são reflexos de conhecimentos adquiridos, isto é, a alma
é a ação em forma abstrata.
No pensamento socrático, a cura da alma acontece através da “virtude”, a virtude é a
ciência, o conhecimento que potencializa a alma.
Por tratar a virtude como ciência para a cura da alma, Sócrates entende que ninguém,
de forma voluntária, erra por que quer e sim por ignorância.

1.1.1.1 Sócrates e a Liberdade

Sócrates entende que a liberdade é o controle interior, é o autodomínio. Ou seja,


quando se entende que o homem é a sua alma, é o que torna o homem racional,
conquistando a liberdade quando consegue se afastar do mundo externo, libertando-
se das paixões. A liberdade socrática é entendida como desprendimento do mundo
externo.

1.1.1.1.1 O método socrático ou a dialética socrática

Na condução das suas conversas, Sócrates, nos seus diálogos articulados, criava dois
momentos: o irônico-refutatório e a maiêutica. Mas antes, caro(a) estudante, vamos
entender o que é a “Dialética Socrática”.
Dialética, traduzindo de forma literal, significa “caminho entre as ideias” (WIKIPÉDIA,
2020, on-line). O método que Sócrates usava em seus diálogos caminhava por ideias
na figura do “não-saber”, a partir de perguntas e respostas, método que foi inaugurado
pelo filósofo.
Percebe-se, caro aluno, que Sócrates inaugura um método e, como todo método, tem
que chegar em uma finalidade.
Chegamos agora, querido (a) aluno (a), na finalidade do método socrático. É
necessário entender a finalidade para depois compreender sua estrutura e a função.
A finalidade era de natureza ética e educativa, ou seja, era por meio do diálogo, no
formato de pergunta e resposta, que o homem tinha a oportunidade de fazer um
“exame da alma”, um acertar de conta da própria vida, um olhar interior, afastando-se
das paixões. Navegaremos agora na estrutura do método.
A estrutura da dialética socrática era indagar, perguntar, questionar a confiança do
interlocutor, ou seja, questionar suas crenças.
Sócrates propõe diálogo, se colocando na figura do “não-saber”, atitude não comum
aos sofistas, pois estes tinham a modéstia de quem sabia de tudo, ao contrário de
Sócrates, pois sua atitude era de quem não sabia de nada e que estava disposto a
aprender com o outro.
Sócrates, quando toma essa postura do “não-saber”, mostra que a sua filosofia
buscava algo diferente dos outros pensadores, como os naturalistas, sofistas e
políticos. Os saberes dos naturalistas eram em vão, dos sofistas demonstravam
convencimento e dos políticos, sem conteúdo.
Como apontado, chegou a hora de falarmos dos dois momentos que acontecem na
dialética socrática: a ironia e a maiêutica.
Em um primeiro momento, dentro da conversa, da dialética, do jogo de perguntas e
respostas, acontecia o irônico-refutatório, momento que Sócrates caminhava para
as ideias do interlocutor a partir de perguntas a cair em contradição, chegando sozinho
a reconhecer sua própria ignorância.
O momento irônico só acontecia, porque Sócrates se apresentava na figura do “não
saber”, indagando certezas estabelecidas, forçando uma definição, refutando
(dizendo o oposto) as ideias postas pelo interlocutor, utilizando de forma irônica as
mesmas palavras.
Esse momento de ironia e refutação, causava, nos soberbos, irritabilidade já para as
pessoas humildes causava uma certa purificação1, pois descobriram, com a ajuda de
Sócrates, certezas que eram concebidas como verdadeiras, porém depois de refletir
notavam que não podiam tomar como verdadeiras.
Agora, caro(a) aluno(a), chegamos no segundo momento da dialética socrática, a
maiêutica. Na concepção grega, “maiêutica” é a arte obstétrica, é o parir. Sócrates
apropriou-se do termo “maiêutica” para explicar como se dá o nascimento da verdade.
Vamos entender como ocorreu esse processo?
O termo “maiêutica” foi apropriado por Sócrates em decorrência de sua mãe ter sido
parteira, considerando também que a parteira grega era a mulher estéril, que não
podia ter filhos e que, mesmo assim, tinha a propriedade em julgar o recém-nascido,

1Purificação neste sentido significa “catarse” purificação da alma, termo utilizado pelos gregos na época da
Grécia Antiga.
se eram perfeitos ou não, de acordo com Cabral (2021). Através dessa analogia,
Sócrates julgava não saber de nada e que sua função, através do método, era a de
fazer nascer a verdade. A Maiêutica Socrática era um “parir” conclusões embasadas
em reflexões e não em tradições já estabelecidas sem o crivo da razão.
Sócrates apenas conduzia seu interlocutor a encontrar a verdade que estava dentro
de si, ceifando tradições que fugiam da luz da razão.
2 TEORIA DAS IDEIAS - PLATÃO

Figura Estátua de Platão e da deusa Atenas.

2.1 Platão

Platão (428/427 a.C.) nasceu em Atenas e teve como primeiro mestre Crátilo, depois
Heráclito e, por último, Sócrates. Idealizava os saberes socráticos. Vivenciou a
política, porém decepcionando-se com métodos violentos aplicados por dois parentes
que depositavam confiança. O ápice de sua frustração foi com a condenação de
Sócrates, afastando-se por completo da política. Sua maior contribuição foi a “teoria
das ideias”.

2.1.1 Teoria das ideias

Não podemos deixar de realçar, a importância de Platão para o estudo da “ontologia”.


Sua ontologia está explicada no “Mito da Caverna” ou “Alegoria da Caverna”.
Platão descreve que alguns homens, desde a infância, geração após geração, se
encontram aprisionados em uma caverna. Neste lugar, não conseguem se mover em
virtude das correntes que os mantêm imobilizados. Virados de costas para a entrada
da caverna, veem apenas o seu fundo. Atrás deles há uma parede pequena, onde
uma fogueira permanece acesa. Por ali passam homens transportando coisas, mas
como a parede oculta o corpo dos homens, tudo o que os prisioneiros conseguem ver
são as sombras desses objetos transportados. Essas sombras projetadas no fundo
da caverna são compreendidas pelos prisioneiros como sendo tudo o que existe no
mundo.
Certo dia, um dos prisioneiros consegue se libertar das correntes que o aprisionava.
Com muita dificuldade, ele busca a saída da caverna. No entanto, a luz da fogueira,
bem como a do exterior da caverna, agride seus olhos, já que ele nunca tinha visto a
luz. O ex-prisioneiro pensa em desistir e retornar ao conforto da prisão, a qual estava
acostumado, mas gradualmente consegue observar e admirar o mundo exterior à
caverna. Entretanto, tomado de compaixão pelos companheiros de aprisionamento,
ele decide enfrentar o caminho de volta à caverna com o objetivo de libertar os outros
e mostrar-lhes a verdade.
No diálogo, Sócrates propõe que Glauco, seu interlocutor, imagine o que ocorreria
com esse homem, em seu regresso. Glauco responde que os outros, acostumados à
escuridão, não acreditariam no seu testemunho e que aquele que se libertou teria
dificuldades em comunicar tudo o que tinha visto. Por fim, era possível que o
matassem, sob a alegação de perda da consciência ou loucura (MENEZES, 2011).
A Alegoria da caverna apresenta dois mundos, o “mundo sensível” e o “mundo
inteligível”. O mundo sensível é o mundo das aparências, da opinião, da mudança, é
o mundo das coisas, o mundo inteligível é o mundo da verdade, identidade,
estabilidade da permanência, da essência do Ser. Além das diferenças citadas, o
mundo sensível é o mundo da cópia, simulacro do mundo das ideias que é perfeito e
que corresponde a essência, aquilo que torna algo o que é.
A Alegoria da caverna está repleta de simbologias, o sol representa a ideia do bem,
as sombras são conhecimentos errados, os prisioneiros somos nós presos, sair da
caverna simboliza a busca pelo conhecimento.
3 METAFÍSICA ARISTOTÉLICA

Figura - Estátua do filósofo Aristóteles

https://www.shutterstock.com/image-photo/statue-aristotle-great-greek-philosopher-130207133

Aristóteles (384 – 322 a.C.) Nasceu em Estagira, na Grécia, ficou órfão com 18 anos
e mudou-se para Atenas; frequentou a escola de Platão por 20 anos. Após a morte de
seu mestre, Aristóteles fundou sua própria escola. Foi preceptor de Alexandre até este
tomar posse do trono. Neste momento, Aristóteles volta para Atenas e funda o Liceu,
permanecendo por dez anos.
Para Aristóteles, não há separação dos mundos, como teorizou Platão, para ele só
existe a essência o que faz uma coisa ser o que é, o que a define. O que existe para
o Estagirita é uma única realidade onde as coisas e a essência estão juntas. Momento
este que inicia a ontologia aristotélica, conceito que veremos adiante.
A Metafísica aristotélica está composta por três estudos, são elas: o “divino”, o estudo
dos “primeiros princípios” e, por último, os atributos dos seres.
Para Aristóteles, o divino é a realidade primeira, a perfeição, que não muda, o
“Primeiro Motor”. Todos os seres procuram aproximação, transformando-se na própria
vontade de encontrar sua essência divina e perfeita.
O segundo estudo são os “primeiros princípios” e as causas primeiras de tudo que
existe.
O terceiro estudo está relacionado aos atributos dos seres buscarem sua essência,
que faz dele o que é.
Dentro do estudo aristotélico sobre a metafísica existem conceitos que definem e dão
corpo ao seu estudo, são as causas primeiras, lógica, a definição do ser e o que faz o
ser como é. Iniciaremos pela lógica aristotélica.
São três os princípios da lógica, a identidade, não contradição e terceiro excluído. São
conceitos que demonstram que o ser é e não pode deixar de ser de forma racional.
As causas primeiras são compostas por quatro causas, a causa formal que a sua
substância, a causa material que a matéria da substância, causa eficiente que é o que
faz existir, que dá forma e a causa final que é a finalidade, para que existe.
Há definições que fazem um ser ser o que é, estamos falando da matéria que é do
que as coisas são feitas, a forma que particulariza a matéria, a potência que dá força
para algo vir a ser e o ato, o processo da matéria em uma forma.
Para completar a metafísica aristotélica, o estagirita 2 apresenta conceitos para
explicar o que faz um ser ser como é, os conceitos são: essência, acidente, substância
e os predicados.
A essência é o que define, que faz o ser o que é. Acidente são atributos que podem
existir ou não, não se fazem necessários; a substância é o que determina o ser, é o
que o diferencia de todas as outras coisas. O predicados são o que estrutura o ser,
são as qualidade, quantidades, e não afetam a própria natureza do ser.

2 Nome dado a quem nasceu em Estagira (onde nasceu Aristóteles), utilizado muitas vezes para se
referir a Aristóteles.
4 ESCOLAS HELÊNICAS

Caro(a) estudante, na Unidade I estudamos a passagem do pensamento


cosmogônico para o cosmológico, processo que aconteceu devido a uma certa
“maturidade” do pensamento humano. O surgimento das Escolas Helênicas passou
pelo mesmo processo. Aconteceu uma passagem da era clássica para a era
helenística.
Alexandre Magno (334-323 a.C.), com o seu comando para o Oriente, resultando em
conquistas territoriais e instituindo uma monarquia universal divina, causou crise na
Polis. Devido a expansão territorial, o conceito de cidade-Estado (Polis) foi superado
pelo ideal “cosmopolita” (o mundo inteiro é uma Polis), o homem da cidade foi
substituído pelo homem-indivíduo (REALE, 2007, p. 249).
Mudanças houve também na cultura e espiritual, empreendendo a necessidade de
novas filosofias, deixando de lado pensamentos de Platão e Aristóteles, recorrendo a
pensamentos mais práticos. A cultura helênica tornou-se cultura helenística, Atenas
deixou de ser o centro da filosofia, dando lugar para Alexandria.
Com todas as mudanças e a necessidade de novas filosofias, surgiram filosofias que
tratavam diretamente da vida prática. Essas filosofias são: Cínica, Epicurista, Estóica
e Cética. Nosso estudo terá início no Cinismo.
4.1 Cinismo

Figura 1 - Imagem do filósofo Diógenes - Filósofo Cínico e do Alexandre o Grande

https://www.shutterstock.com/image-vector/diogenes-cynic-greek-philosopher-alexander-great-
1822748762

O Cinismo, termo que deriva do grego kyôn - cão, e explica a forma que os cínicos
entendiam a existência. Entendiam que era necessário desprezar o mundo material,
os prazeres. Pregavam que cultivar a virtude bastava, pois os prazeres do mundo não
tinham importância. Andavam apenas com uma túnica e uma sacola, demonstrando
desprezo pelas “coisas do mundo”, passando uma imagem de superioridade, porém,
as pessoas não acreditavam e julgavam esse comportamento de falsidade, que não
era verdadeiro, era apenas fingimento.
A Filosofia Cínica focava na Autarquia, o indivíduo é capaz de se bastar, de ser
independente.
4.2 Epicurismo

Figura 2 - Imagem de Epicuro, filósofo grego que fundou o epicurismo

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founder-1463680580

O Epicurismo, escola fundada por Epicuro de Samos (341 a.C.), em Atenas, traz uma
bagagem de filosofias extensa, como a de Demócrito, com a teoria atomista, de
Sócrates, com a arte de viver, e com a Escola Cirenaico, a relação entre felicidade e
prazer.
O prédio onde os epicuristas estudavam já era uma revolução, um prédio com jardim
no subúrbio, não no formato de palestras no tumulto da cidade, por isso a escola é
chamada de “Jardim” e os epicuristas de “filósofos do jardim”.
A filosofia epicurista se resume em: 1º. o homem consegue entender a realidade; 2º.
dentro dessa realidade há um espaço para a felicidade; 3º. a dor não é compatível
com a felicidade; 4º. a felicidade não depende do outro, só de si mesmo; e 5º. por não
depender do outro para alcançar a felicidade, as instituições, as cidades e a riqueza
contribuem para obter felicidade.
4.3 Estoicismo

Figura 3 - Filósofo grego estóico Marco Aurélio

https://www.shutterstock.com/image-illustration/greek-philosopher-marcus-aurelius-stoicism-
1749027080

O Estoicismo acreditava que só o prazer físico afasta o homem da sabedoria, que o


único meio para atingir a felicidade era a prática da virtude. Apreciam cultivar o
intelectualismo e a moral, tratam com indiferença tudo que é do mundo “Apathea”,
pois acreditavam que os prazeres do mundo viciam a Alma. Acreditam que o universo
é comandado por uma razão universal.
4.4 Ceticismo

Figura 4 - Imagem que representa o questionamento

https://www.shutterstock.com/image-vector/vector-illustration-silhouette-strange-man-detective-
1430715443

O Ceticismo entendia que a felicidade se encontrava na atitude de não julgar nada e


ninguém, e que a neutralidade é o comportamento ideal. A certeza das coisas era
impossível de ser encontrada, a atitude correta é a do questionamento. A corrente
cética, do ponto de vista filosófico, afirma que é impossível obter o verdadeiro
conhecimento. Portanto, para o cético, o indivíduo não é capaz de apreender o objeto
de conhecimento.
SAIBA MAIS

Sócrates foi acusado de “corromper” os jovens gregos e como punição tomou cicuta
(veneno). Sócrates teve a oportunidade de exílio, porém não aceitou pois estaria
contradizendo sua filosofia.

Fonte: A autora.

#SAIBA MAIS#

SAIBA MAIS

O termo metafísica surgiu no século I a.C. quando Andrônico Rodes ao classificar as


obras de Aristóteles de “Filosofia Primeira” após as obras de física: meta physis ou
seja, depois da física. Posteriormente o “depois” foi compreendido como “além” dessa
forma, o termo metafísica é o estudo para tudo que além da física (matéria), do
sensível

Fonte: Filosofando (2016, p. 112).

#SAIBA MAIS#
REFLITA

Será que na atualidade estamos na caverna, cegos pela luz do sol ou tentando voltar
para caverna para avisar aos outros sobre a verdadeira realidade?

Fonte: A autora.

#REFLITA#

REFLITA

A filosofia de Sócrates marcou um avanço no pensamento do indivíduo pois com o


seu método nos ensinou a refletir sobre verdades que estavam estabelecidas por
outros. Será que refletimos antes de agir ou agimos seguindo tradições que não foram
pensadas por nós.

Fonte: A autora.

#REFLITA#
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na Unidade II foi abordado o processo que a ontologia antiga percorreu. A ontologia


tem o homem como objeto de observação e, por consequência, o estudo é para
compreender o Ser.
Por este caminho, a filosofia grega passou por transformações, o que proporcionou
um ambiente de indagações sobre a questão do Ser.
Diferente dos pré-socráticos, que buscavam entender e explicar o arché (princípio,
origem) das coisas, filósofos como Sócrates, Platão, Aristóteles e os filósofos das
Escolas Helênicas direcionaram suas observações na condição humana.
Foi neste momento que o homem foi tratado de forma especial, quando todo o esforço
estava voltado a decifrar o Ser.
Espero que o esforço dos filósofos antigos tenha atingido a todos(as), causando em
uma reflexão sobre o ser e, como efeito, uma autorreflexão sobre o que entendemos
por Ser.
LEITURA COMPLEMENTAR

Do Mito da Caverna às Redes Sociais

O Mito da caverna, também conhecido como Alegoria da Caverna ou Parábola da


Caverna; é metáfora criada pelo filósofo grego Platão, presente na obra “A República”;
que consiste na tentativa de explicar a condição de ignorância em que vivem os seres
humanos e o que seria necessário para atingir o verdadeiro “mundo real”, baseado na
razão acima dos sentidos, nunca esteve tão atual.
A obra de Platão relata a história de um grupo de prisioneiros que viviam numa grande
caverna, com seus braços, pernas e pescoços presos por correntes, forçando-os a
fixarem-se unicamente para o fundo da caverna. Atrás dessas pessoas existia uma
fogueira e outros indivíduos que transportavam imagens de objetos e, ao redor da luz
do fogo, tinham as suas sombras projetadas na parede da caverna, onde os presos
ficavam observando. Os prisioneiros podiam enxergar apenas as sombras das
imagens, julgando serem aquelas projeções da realidade.
Certa vez, um dos prisioneiros conseguiu se libertar das correntes e saiu para o mundo
exterior. A princípio, a luz do sol e a diversidade de cores e formas assustou o ex-
prisioneiro, fazendo-o querer voltar para a caverna. No entanto, com o tempo, ele
acabou por se admirar com as inúmeras novidades e descobertas que fez. Assim, quis
voltar para a caverna e compartilhar com os outros prisioneiros todas as informações
e experiências que existiam no mundo exterior. As pessoas que estavam na caverna,
porém, não acreditaram naquilo que o ex-prisioneiro contava e chamaram-no de
louco. Para evitar que suas ideias atraíssem também outras pessoas para os “perigos
da insanidade”, os prisioneiros mataram o ‘fugitivo’.
Para Platão, a caverna simboliza o mundo onde todos os seres humanos vivem,
enquanto que as correntes significam a ignorância que prendem os povos. As pessoas
ficam presas a estas ideias pré-estabelecidas e não buscam um sentido racional para
determinadas coisas, evitando a “dificuldade” do pensar e refletir, preferindo
contentar-se apenas com as informações que lhe foram oferecidas por outras
pessoas.
O indivíduo que consegue se “libertar das correntes” e vivenciar o mundo exterior é
aquele que vai além do pensamento comum, criticando e questionando a sua
realidade.
O Mito da Caverna mantém-se muito atual. Fazendo uma analogia, bem
contemporânea, pode-se associá-la ao universo digital, das redes sociais e internet,
do qual, praticamente, todos estão inseridos. Os usuários encantados com tantas
possibilidades que estes dispositivos propõem para suas vidas, podem ficar presos a
esta realidade virtual como se fosse a única realidade que há, passando a viver em
uma escuridão como se estivesse dentro de uma caverna. E, inseridos nas redes
sociais, preferem permanecer alheios ao pensamento crítico (seja por preguiça ou
falta de interesse) e aceitar as ideias e conceitos que são impostos por um grupo
dominante, por exemplo, de influenciadores, blogueiros e artistas midiáticos.
Ao recorrer ao uso contínuo das redes sociais e da internet, o indivíduo, então,
desenvolve em sua mente, um mundo completamente diferente da realidade. E, com
medo de ser rejeitado, de seu conteúdo não ser compartilhado, cria a sua própria
realidade com intuito de se manter numa zona de conforto, ou seja, uma prisão social.
Com isso, há um isolamento social, na vida real. Afinal, o “inferno são os outros”,
parafraseando o filósofo e escritor francês, Jean-Paul Sartre. Ou seja, alienado da
realidade, vivendo o ‘mundo virtual’, os indivíduos acabam sendo intolerantes ao
convívio social real. Pois, o problema é que projetos pessoais entram em conflito com
o projeto de vida dos outros. E, os outros, tiram parte da autonomia pessoal. Porém,
ao mesmo tempo, é pelo olhar do outro que o indivíduo se auto reconhece, com erros
e acertos. Já que a convivência expõe as fraquezas pessoais.

Fonte: Folha do ABC (2019, on-line). Disponível em:


www.folhadoabc.com.br/index.php/secoes/item/12733-do-mito-da-caverna-as-redes-sociais
LIVRO

Título: Ficções
Autor: Jorge Luis Borges
Editora: Companhia das Letras
Sinopse: Contos que abordam questões metafísicas.
FILME/VÍDEO

Título: Baraka
Ano: 1992
Sinopse: Um mundo além das palavras. Baraka é uma antiga palavra que pode ser
traduzida como o sopro ou a essência da vida, de onde se desencadeia o processo
de evolução da vida. Com imagens captadas em 24 países, nos seis continentes do
globo, Baraka busca traduzir visualmente a ligação do ser humano com a Terra.
Baraka é um espetáculo visual deslumbrante que deve ser visto, sentido e vivido para
ser compreendido.
REFERÊNCIAS

CABRAL, J. F. P. Ironia e Maiêutica de Sócrates. 2021. Disponível em:


https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/ironia-maieutica-socrates.htm.

FILOSOFANDO. Introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 2016.

FOLHA DO ABC. Do mito da caverna às redes sociais. 2019. Disponível em:


http://www.folhadoabc.com.br/index.php/secoes/item/12733-do-mito-da-caverna-as-
redes-sociais. Acesso em 12 de jul de 2021.

MENEZES, P. Mito da caverna. 2011. Disponível em:


https://www.todamateria.com.br/mito-da-caverna. Acesso em 12 de jul de 2021.

REALE, G. História da Filosofia. São Paulo: Paulus, 2007.

WIKIPÉDIA. Dialética. 2020. Disponível em:


https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Dial%C3%A9tica&oldid=59016479. Acesso
em 12 de jul de 2021.
UNIDADE III
A ONTO-TEOLOGIA MEDIEVAL
Professora Francielle Freire Favareto.

Figura - Imagem de Agostinho de Hipona e Tomás de Aquino

Plano de Estudo:
● A questão da finitude e infinitude no pensamento medieval;
● Patrística e a existência do mal;
● Escolástica - Fé x Razão;
● Provas da existência de Deus.

Objetivos de Aprendizagem:
● Entender o processo de ruína que levou o pensamento grego e a metafísica
grega ter sido reelaborada pelos medievais.
● Compreender a problemática que os pensadores da Idade Média se
debruçaram a resolver.
● Estabelecer a importância da metafísica e ontologia conceitos que foi elencado
pelos filósofos gregos e que serviu de modelo para os pensadores medievais.
APRESENTAÇÃO

Olá, caro(a) estudante. A nossa viagem pelo conhecimento será no período da Idade
Média, palco do nascimento da Filosofia Cristã e nossos principais personagens serão
Santo Agostinho de Hipona e São Tomás de Aquino.
Vimos na Unidade II a consolidação da Metafísica e a busca em explicar a Ontologia.
O estudo do Ser foi o objeto de observação e estudo dos filósofos antigos. Platão e
Aristóteles teorizaram e conceituaram o ser sem desvincular do sagrado.
Porém, estudante, entraremos em um período em que a preocupação maior era unir
a filosofia dos gregos com a fé cristã, que estava sendo instaurada.
Com o advento do Cristianismo, surgiu a Patrística, que leva esse nome por ser
estudada pelos Padres da Igreja, padres estes que tinham a herança intelectual dos
filósofos gregos. A função desses padres era conciliar a fé e a razão como base do
conhecimento.
Além da Patrística estudaremos a Escolástica, filosofia que fundamenta a fé como
instrumento de conhecimento. Primeiro a fé, depois a razão, considera que o homem,
denominado por criatura, não é capaz de chegar ao conhecimento das coisas na sua
totalidade pela razão.
Questões como existência do mal, fé versus razão e a prova da existência de Deus
são assuntos que serão abordados nesta viagem.

Bons Estudos!
1 A QUESTÃO DA FINITUDE E INFINITUDE NO PENSAMENTO MEDIEVAL

Figura - PRAGA, REPÚBLICA CHECA - 12 DE OUTUBRO DE 2018: O ar fresco barroco do


teto de St. Agostinho entre os anjos na igreja de Santo Tomás de Václav Vavřinc Reiner (1689
- 1743)

https://www.shutterstock.com . 1263790747

A filosofia, na Idade Média, foi inserida de forma escassa, ocupando um lugar


secundário, subordinada da Teologia, que neste momento era o conjunto dos saberes.
Vale ressaltar que a idade média surge a partir de três fatores, a ruína do mundo
clássico antigo, a invasão dos bárbaros e o Cristianismo.
A passagem de um período para o outro acontece quando o antigo está arruinado,
sofrendo processos de aniquilação forçando uma formação de um novo pensamento,
deixando algum legado cultural. Não há uma ruptura sem deixar alguma herança; no
caso do período clássico antigo para o medieval, a filosofia esteve presente mas não
da mesma forma que no Classicismo, ou seja, a filosofia ficou abaixo da ciência divina
(revelação).
Neste momento, o homem medieval tende a olhar com os olhos da fé, voltado para as
coisas do espírito, mirando a Vida Eterna, ou seja, enquanto no classicismo o homem
é levado a buscar a posição de sábio para atingir a felicidade ou ser um homem de
bem, na idade média, com o advento do Cristianismo, o homem só se realiza na
plenitude divina – em Deus.
Considerados como primitivos, os bárbaros abraçaram o Cristianismo de forma
totalizante, não contribuindo com o pensamento filosófico.
O terceiro fator para o fortalecimento da idade média foi o Cristianismo, trazendo como
fundamento a renovação do homem, e, com a presença maciça dos bárbaros, o
Cristianismo ganhou espaço no pensamento dos homens medievais.
Na metafísica houve uma reelaboração da metafísica grega, pois alguns conceitos
gregos não teriam chance de serem aceitos pelo cristianismo como aponta Chauí
(2011). (CHAUÍ, 2011). Alguns desses conceitos são: a eternidade do mundo sensível
e inteligível, a divindade é uma forma cósmica, impessoal, o homem é um ser natural
(corpo e alma) e seu intelecto (razão) é superior e imortal, a liberdade é uma atividade
humana (ação) o que orienta na escolha e governa a vontade, o conhecimento é uma
ação da razão,segundo Chauí (2011). Essas e outras que não foram citadas não
faziam parte do fundamento do pensamento medieval atribuído ao Cristianismo.
A grande dificuldade encontrada no início do Cristianismo foi unir a razão de forma
filosófica com as verdades da crença e um ponto central dessa problemática foi a
questão da finitude e infinitude.
No Dicionário Básico de Filosofia, a palavra finitude tem o seguinte significado: "O
pensamento cristão introduz, na origem do mundo criado, um Deus perfeito e infinito.
O infinito ganha um sentido positivo, mas a finitude do mundo criado não sai da ordem
das coisas” (JAPIASSÚ; MARCONDES, 2006, p. 112). Se para os gregos Deus
aparece de forma cósmica e impessoal, segundo Chauí (2011, p. 243), “participamos
da natureza com a nossa alma, participamos da inteligência divina”, ou seja, o homem
além de interagir participa de toda realidade.
Mas como se ajustou a filosofia grega com o pensamento medieval sobre a questão
do homem e Deus?
Este ajuste, caro(a) aluno(o), partiu da separação entre o homem e Deus na
concepção cristã, através do pecado original. Mas antes faz-se necessário
entendermos essa problemática da finitude e infinitude.
Na Escolástica do século IX ao XVI pulverizou a expressão “o agir segue o ser”, ou
seja, o ser infinito – Deus – e aos seres finitos – criaturas. O ser é, portanto, fonte do
agir. No ser finito, o agir é o seu processo natural de ser-mais, de crescer no ser1,
de se enriquecer ontologicamente, aproximando de sua essência, do ser infinito
(COUTINHO, 2008, p. 132).

1A expressão “ser-mais, crescer no ser” demonstra que a ação dos seres finitos é um processo que
engrandece o ser finito, com meta de se aproximar do Infinito.
Finitude caracteriza-se por condição humana, seja na concepção cristã, por oposição
à transcendência e à perfeição divina, “[...]o infinito vai ser filosoficamente pensado
como positivo – por oposição à finitude (humana), que é doravante compreendida
como negação (ou carência) do ser” (DUROZOI; ROUSSEL, 1993, online), Deus é o
que dá vida às criaturas segundo Meier (2014).
No pensamento medieval, Deus é o criador de tudo que existe, sendo assim, o ato
puro, ser por essência, configurando, portanto, que tudo que existe, é derivado desse
Deus. No pensamento medieval, a criação do mundo e das criaturas se deu a partir
de uma iniciativa de amor gratuito, ao contrário do pensamento grego, que Deus não
é gerador da matéria (MEIER, 2014).
Vale ressaltar, caro(a) aluno (a), que a metafísica medieval não dialoga com a
metafísica do classicismo, pois ela deixou de ser indagação passando para questões
e respostas dogmáticas.
2 PATRÍSTICA E A EXISTÊNCIA DO MAL

Figura - Santo Agostinho

ID da ilustração stock livre de direitos: 1882110991

A Patrística (séc. II ao séc. V) é considerada a primeira corrente filosófica na fase


cristã. Leva esse nome por indicar como pensadores os Padres da Igreja, por serem
os primeiros a fundamentar a doutrina cristã.
Inicia com São Paulo e com os evangelhos de São João e finda no século VIII, com o
início do período medieval.
A filosofia Patrística inaugurou a relação entre a filosofia greco-romana e a fé, isto é,
relacionar a filosofia antiga com os pensamentos na nova religião que surgia, o
Cristianismo. Esta filosofia tinha como objetivo converter pagãos, aqueles que não
aceitavam ou não conheciam a nova religião, introduzindo conceitos e fundamentos
contrários ao pensamento clássico antigo. Esses fundamentos eram: a existência do
mal, fundamentar que a criação aconteceu do nada, que o homem carrega um pecado
original, a existência de um juízo final etc.
O assunto que iremos abordar dentro da Filosofia Patrística é a existência do mal,
tema tratado por Santo Agostinho.
Santo Agostinho, o bispo de Hipona, nasceu em 354 e converteu-se ao cristianismo
em 386. Serviu ao cristianismo até 430, ano da sua morte. Filho de pai pagão e mãe
cristã, teve o privilégio de frequentar e acessar a educação clássica e, ao contrário de
quem tinha o mesmo acesso a esta educação, não teve resistência aos pensamentos
e filosofias fora do âmbito cristão. Agindo de forma contrária, Agostinho apropriou-se
da filosofia platônica para defender o pensamento cristão.
Santo Agostinho justificava que os gregos não erraram por completo, apenas não
atingiram a razão, pois acreditava que o homem tem uma limitação, causando a
impossibilidade de conhecer todas, porém, defende que o homem – criatura – carrega,
na sua interioridade, a verdade. O homem é um ser racional, porém sua inteligência é
para buscar Deus, no pensamento de Agostinho a fé não prescinde da razão.
Destarte, Agostinho problematiza a questão do mal. Em primeiro momento, indaga a
origem, sendo o homem fruto do amor de Deus – criador de todas as coisas –, é
impossível pensar que O Criador foi o criador do mal.
Agostinho, recorre à matéria em um primeiro momento. Será que o mal surgiu da
matéria criada por Deus? Mas se Deus é infinita bondade e onipotente, criar o mal
seria contrariar o que Deus é. Portanto, o mal não advém da criação da matéria. Dessa
forma, não tem como alegar que o mal é criação divina, sugestionando que o mal é a
privação do bem.
Alcançamos, caro(a) aluno(a), três formas que Agostinho aponta como possível a
existência do mal, são elas: metafísica, moral e físico.
O mal metafísico não tem existência no cosmo, não existe uma entidade que aborda
essa característica. Para Agostinho, o mal metafísico é a inferioridade do homem em
relação ao Criador, isto é, o que acontece é a existência de criaturas que estão em
diferentes graus, porém, não conclui, acrescenta que o mal metafísico perante o ponto
de vista da grandiosidade que é o Universo, o mal metafísico desaparece incluindo
também em seu raciocínio, que aparentemente Deus sendo o criador de tudo seria
responsável pelo mal (MEIER, 2014).
Para resolver a questão do mal, Agostinho defende que nada mais é do que uma
interpretação a partir do ponto de vista da medida de quem analisa. O mal, a partir da
moral, de acordo com Meier (2014), é consequência do pecado cometido pelo homem,
por não saber fazer uso do livre-arbítrio, o homem que peca moralmente escolhe
desviar do caminho de Deus, aproximando-se dos bens finitos, mundanos.
A condição do mal no olhar físico surge devido às ações moralmente erradas, ou seja,
quando o desviamos de Deus, consequentemente o físico e o espiritual tendem ao
sofrimento.
Santo Agostinho, segundo Meier (2014), sugere que o mal, em todas as suas formas,
é nada mais que o orgulho, vaidade do homem enquanto criatura singular ou vivendo
coletivamente, é a corrupção do ordenamento da Natureza.
Concluímos, caro(a) aluno(a), a problemática em volta do mal questionada por Santo
Agostinho, pensador da Filosofia Patrística.
3 ESCOLÁSTICA: FÉ X RAZÃO

Figura - Imagem de Santo Tomás de Aquino

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Querido(a) aluno(a), agora iremos estudar o período conhecido por Escolástica, que
surge no final do século V, sobrevivendo até o século XVI. Foi neste período que
surgiu a primeira Universidade atuando como ponto de partida para difundir o
conhecimento cristão. Neste período, o aristotelismo se fez presente nos estudos de
São Tomás de Aquino.
Tomás de Aquino nasceu em 1225, na Itália, em uma família abastada. É o pensador
mais importante para a doutrina cristã, responsável por “cristianizar” a filosofia de
Aristóteles, fundamentando o aristotelismo a serviço da fé.
Haja vista que na filosofia cristã, Tomás também busca conciliar a fé e a razão. Tem
como tese a possibilidade que o homem pode alcançar em provar a existência de
Deus através da mente, embora não consiga decifrar por completo, pois os sentidos
não têm condições de alcançar. Faz-se necessária a intervenção da fé.
Tomás de Aquino teve como objeto de estudo a conciliação da fé com a razão.
A fé, para Tomás de Aquino, é a verdade que ultrapassa a razão, seguindo a
concepção que a razão demonstra, de forma racional, o que a fé revela, ou seja, a
razão é o caminho para a fé.
4 PROVAS DA EXISTÊNCIA DE DEUS

Figura - Imagem referente ao Cristianismo

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Caro(a) aluno(a), é na Filosofia Cristã que pensadores e teólogos buscam provar a


existência de Deus. Claro, em virtude de afirmar e fundamentar a doutrina cristã,
conhecida por nós de Cristianismo. Vimos no início desta Unidade os fatores que
causaram a mudança da metafísica, ou melhor, a mudança de conceitos referente a
assuntos metafísicos desenvolvidos pelos filósofos gregos.
É através da filosofia cristã que surgem os dogmas religiosos em defesa da fé, que
estava sendo pulverizado. Encontrar respostas para questões que alimentavam a
filosofia cristã foi o papel da Patrística e da Escolástica.
Com a Patrística, Santo Agostinho problematizou a questão do mal. Mas não foi sua
única tese. Agostinho também desenvolveu a sua filosofia sobre a existência de Deus.
Alegava que a razão humana é incapaz de resolver e entender a existência de Deus,
que esta questão é subjetiva, ou seja, essa problemática é uma questão a ser
resolvida pela fé.
Para embasar sua teoria sobre a existência de Deus, divide os seres em insensíveis,
sensíveis e racionais, as pedras seriam seres insensíveis, os animais sensíveis e o
homem racional. Deus é para Agostinho “verdade superior”. Partindo dessa
sequência, o homem, por ser dotado de razão, estaria acima dos seres insensíveis e
sensíveis, por ser capaz de emitir julgamento, porém está abaixo de Deus, que é a
verdade em excelência.
Na Escolástica, Tomás de Aquino é o grande expoente, conciliando a fé com a razão,
desenvolvendo cinco vias que provam a existência a Deus: 1ª via - Motor Imóvel, 2ª
via - Causa primeira, 3ª via - Necessário e contingente, 4ª via - Graus de perfeição e
a 5ª via - Finalidade do ser.
A primeira via tomista aponta para o movimento, tudo que se move precisa que seja
movido, essa questão seria infinita se não fosse admitido a existência de um Motor
Imóvel, o que dá movimento sem se mover, Tomás atribui esse Motor a Deus.
A segunda via, Causa primeira, sinaliza que tudo que existe deve-se a uma causa
que foi a primeira, pois as coisas não têm origem em si. Neste caso, Deus é a causa
primeira de todas as coisas.
O necessário e o contingente que corresponde à terceira via, responde a coisas que
existem ou que já existiram. Para as coisas existentes, a causa primária sustenta a
explicação; e para sustentar as coisas que já existiram, mas que não existem mais,
não é concebido sua geração acontecer do nada, por ser contingente existir ou não,
não afeta de ter sido gerado pela Causa primeira, Deus.
A quarta via tomista diz respeito aos Graus de perfeição. Todas as coisas são
melhores ou piores e, para definir o grau de perfeição, é necessário existir um modelo
que seja, por excelência, perfeito para atender parâmetros.
E a última via, a quinta, é a Finalidade do ser. A natureza é ordenada a chegar ao fim,
e, para isto, existe um ser Deus, que, através de sua excelência, orienta tudo que é
referente à natureza, todas as coisas, a chegar ao fim.
Tomás, com explanação das cinco vias, tenta, de alguma forma, justificar uma causa
primeira, causa esta que todas as outras coisas dependem, Deus (IZÍDIO, 2013, p.
35).
Não apenas Agostinho e Tomás tentaram provar a existência de Deus, Santo Anselmo
argumentou que existem dois tipos de perfeição, a perfeição que existe por excelência
e a perfeição que é fruto da mente. A perfeição por excelência é a que realmente
existe, superando a perfeição imaginária. O que contribui para existir a perfeição por
excelência é que ela existe e, se Deus é perfeito por excelência, não tem como
argumentar que Deus não existe (NICOLA, 2005, p. 140).
SAIBA MAIS

NEOESCOLÁSTICA

No século XIX, o pensamento Tomista reapareceu como o nome de Neotomismo pelo


Papa Leão XIII. A intenção era restaurar a filosofia cristã.

Fonte: A Autora.

SAIBA MAIS

Algumas ocorrências oriundas da Idade Média impulsionaram o Renascimento. Vale


ressaltar: as Grandes Navegações, o evento da colonização, a Revolução Comercial,
o Capitalismo, o surgimento da burguesia e o proletariado foram força motriz para a
superação da razão, libertando-se das crenças aplaudidas na Idade Média.

Fonte: A autora.

#SAIBA MAIS#

REFLITA
“Procurei o que era o mal e não encontrei uma substância, mas sim uma perversão
da vontade desviada da substância suprema – de vós – ó Deus.”

Fonte: Agostinho (1996, p. 190).

REFLITA

Os monges foram os grandes responsáveis pela reprodução das obras clássicas,


chamadas de copistas. A pergunta é: quem decidia o que era escrito, quem
manuseava os manuscritos?

Fonte: A autora.

#REFLITA#
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Caro(a) aluno(a), concluímos a Unidade III, superando temas que foram o alimento
para fundamentar a Filosofia Cristã.
Viajamos pelo período da Idade Média, época em que a filosofia foi posta à prova,
resultando subordinação à crença – a fé.
Com a passagem do pensamento clássico antigo para a Idade Média, aprendemos
que a metafísica grega sofre alterações, sendo reelaborada pelos padres, teólogos.
O homem medieval, principalmente aquele que estava incumbido de instaurar e
fortificar a nova metafísica, utilizou os pensamentos dos filósofos antigos e readequou
às necessidades da Igreja.
Filósofos pertencentes ao Classicismo como Platão e Aristóteles foram considerados
“Autoridades”, pois Agostinho banhou-se da filosofia platônica e Tomás de Aquino,
da filosofia aristotélica.
LEITURA COMPLEMENTAR

REFLEXÕES DE TOMÁS DE AQUINO

O objetivo deste texto é analisar as principais reflexões que Sto. Tomás de Aquino
faz, de modo particular na Suma Teológica e na Súmula Contra os Gentios, acerca da
natureza de Deus e sua criação, bem como das observações referentes à fé e a razão,
a fim de compreender as objeções e alguns propósitos da ciência teológica de São
Tomás.
São Tomás procura conciliar a filosofia aristotélica com os princípios do cristianismo;
desta forma, Tomás utiliza o discurso filosófico para abordar assuntos teológicos:
refutar os argumentos dos adversários, esclarecer, defender e transmitir os
ensinamentos da Doutrina Sagrada, ou ciência divina, a qual equivale a conteúdos de
verdades reveladas pelo próprio Deus a fim de corrigir, educar os homens na justiça
e ordená-los ao caminho da salvação (Suma T., art. 1, p. 138).
Todavia, vale questionar: até que ponto o discurso argumentativo ou racional é
vantajoso e útil para a teologia? Considerando que o conhecimento humano tem seu
princípio na sensibilidade e depende da experiência, é possível conhecer e
demonstrar a natureza e essência de Deus: um ser transcendental e finito? O nosso
intelecto é suficiente e capaz de entender as verdades divinas, e estas são acessíveis
aos homens?
Diante dessas dificuldades convém analisar a primeira objeção do artigo 1 referente à
primeira questão da Suma Teológica, onde São Tomás declara que: “na verdade, o
homem não deve esforçar-se por alcançar aquilo que está acima da razão humana.
“Não te afadigues com obras que te ultrapassam”, diz o Eclesiástico” (Suma T., art. 1,
p. 137); logo, fica claro que a razão humana é limitada e insuficiente para alcançar um
conhecimento pleno das coisas divinas, e como nos afirma ainda a seguinte
passagem: “a verdade sobre Deus pesquisada pela razão humana chegaria apenas a
um pequeno número, depois de muito tempo e cheia de erros” (Suma T., art. 1, p.
138). Nesta linha de raciocínio, é possível perceber uma semelhança entre Tomás e
o pensamento cartesiano, como em suas meditações, Descartes também admite as
imperfeições e os limites da razão natural em relação a realidade de Deus - um ser
independente, infinito e absoluto Ora, o que sustenta e garante, portanto, ao homem,
a existência e a plenitude de Deus?
Nessa medida pode-se inferir que a questão em pauta está, pois, no âmbito da fé,
conforme São Tomás pontua: “embora não se deva investigar por meio da razão o
que ultrapassa o conhecimento humano, contudo, o que é revelado por Deus, deve-
se acolher na fé” (Suma T., art. 1, p. 139). Percebe-se que Sto. Tomás faz uma
articulação entre a fé e a razão e sustenta que elas são distintas uma da outra, mas
não opostas; como já havia mencionado anteriormente: Tomás serve-se da razão
natural para explicar os “preâmbulos da fé”, contestar e mostrar o erro dos que
criticaram o pensamento cristão, defender e manifestar os ensinamentos religiosos e
divinos; neste sentido, vê-se que o objetivo não é provar os princípios divinos: porque
estes são indemonstráveis e verdadeiros por si mesmos - uma vez que recebem a
certeza da luz divina, ou seja, são revelados pelo próprio Deus.
Nota-se, com efeito, que, para São Tomás, a razão e a fé possuem cada uma a sua
ordem, mas ambas não podem opor-se. E ponderando que a verdade é una - e que
Deus é a verdade absoluta - a verdade segundo a razão e a verdade segundo a fé
devem, pois, coincidir nos seus resultados e ajudar-se mutuamente. Vale enfatizar
ainda que a razão trabalha sobre os dados factuais para abstrair, caracterizar,
fornecer conclusões e conhecimentos - segundo a sua ordem -; contudo, deve ser
deixado de fora das suas indagações o campo da fé e da Revelação. Todavia, isso
não significa dizer que o conhecimento divino, e os ensinamentos religiosos não
possuem bases sólidas; pois, conforme São Tomás nos mostra no artigo 5 da Suma
Teológica: “a dúvida que pode surgir em alguns a respeito dos artigos de fé não deve
ser atribuída à incerteza das coisas, mas à fraqueza do intelecto humano” (Súmula
Contra os Gentios, cp. 5, p.68); e considerando que Deus é assunto e objeto Doutrina
Sagrada (Suma T., art. 3, p. 141), conclui-se assim, que ela supera as outras ciências,
e estas são subordinadas a ela, porque enquanto as outras ciências concebem suas
verdades pela luz natural da razão que pode conduzir o homem ao erro, a Doutrina
Sagrada, por sua vez, recebe a sua da luz da ciência divina, que não pode enganar-
se” (Suma T., art. 5, p. 143).
Quanto à existência de Deus cabe analisar a seguinte passagem:

[...]embora não possamos saber de Deus quem Ele é; contudo, nesta doutrina, utilizamos, em
vez de uma definição para tratar do que se refere a Deus, os efeitos que Ele produz na ordem
da natureza ou da graça. Assim como em certas ciências filosóficas se demonstram verdades
relativas a uma causa a partir de seus efeitos, assumindo o efeito em lugar da definição dessa
causa. (SUMA T; art. 7, p. 148).

Sob esse raciocínio pode-se dizer, portanto, que o homem não é capaz de encontrar
razões para justificar todas as coisas - sobretudo porque é limitado a conhecer apenas
as coisas sensíveis; e no caso de Deus, não é possível ter experiências dele, e nem
demonstrar sua existência, pois ele é um ser transcendental, invisível, que excede e
ultrapassa o conhecimento natural do ser humano – ou seja: é algo muito superior a
tudo que pode ser pensado. Entretanto, São Tomás nos mostra que é possível
compreender Deus a partir das coisas do mundo ou dos efeitos da sua criação; assim,
Deus é, pois, causa primeira de tudo o que existe, conforme nos lembra São Paulo na
Carta aos Romanos: “sua realidade invisível (...) tornou-se inteligível, desde a criação
do mundo, através das criaturas” (Rm.1, 20).
No Capítulo Quarto da Súmula Contra Os Gentios São Tomás analisa se é justo que
as verdades divinas acessíveis à razão nos sejam propostas como objeto de fé, e
neste sentido o filósofo observa que há duas espécies de verdades em Deus: algumas
das quais são acessíveis à nossa inteligência e outras que ultrapassam as nossas
capacidades (Súmula Contra os Gentios, cp. 4, p. 66); ora, de que vale, pois, o esforço
dos homens em buscar o conhecimento de coisas infinitas, que ultrapassam a razão
natural? Por que as verdades divinas não poderiam ficar restritas à razão natural, ao
invés de serem propostas e transmitidas como objetos de fé?
Quanto à primeira dificuldade, Sto. Tomás adere a uma reflexão feita por Aristóteles
no livro X de sua Ética e pontua que: “o conhecimento das realidades mais nobres,
por mais imperfeito que seja, confere à alma uma perfeição muito alta” (Súmula Contra
os Gentios, cp. 5, p. 68); ou seja: por mais limitada que seja a razão humana – para
apreender as verdades suprassensíveis - essa busca é importante e proporciona
alegria e perfeição à alma. É, pois, “útil que o espírito humano
São Tomás observa que haveriam três inconvenientes caso as verdades divinas
estivessem restritas exclusivamente à força da razão humana: primeiramente, poucos
homens desfrutarem do conhecimento de Deus, devido a preguiça – vício que os
afastam de Deus, uma vez que tal busca exige muito esforço e estudo- , a má
disposição de temperamento das pessoas e o fato de muitos ficarem presos aos bens
materiais e não reservarem um tempo para a vida contemplativa. O segundo
inconveniente consiste no seguinte: os homens que descobrissem as verdades
divinas só as alcançariam com dificuldades e após muito tempo de busca, devido a
profundidade dessas verdades, e isso exigiria ainda conhecimentos preliminares; e o
terceiro grande inconveniente que surgiria, caso Deus não houvesse revelado
sobrenaturalmente suas verdades que, em si, são acessíveis à razão natural, é que
as investigações segundo a ordem da razão humana seriam contaminadas de erros –
pois temos mais dúvidas do que certezas sobre as coisa, devido a fraqueza do
intelecto. Sendo assim, cabe inferir que é justo, pois, que Deus - com sua misericórdia
– tenha provido o homem em aceitar como objeto de fé as coisas que são acessíveis
à razão natural.
Portanto, era necessário que Deus transmitisse aos homens, pelo caminho da fé, seus
ensinamentos e suas verdades, pois estas ultrapassam a força da razão natural. Vale
enfatizar que, como nos mostra São Tomás no Capítulo Quinto da Súmula Contra os
Gentios, é pelo fato de Deus propor certezas superiores à razão natural que o homem
reconhece e confirma sua crença em Deus, um ser que “é superior a tudo quanto se
possa pensar” (Súmula Contra os Gentios, cp. 5, p. 68).
Vê-se que é nessa linha de raciocínio que Tomás expõem a função principal da
religião cristã, ou seja: a partir dos seus ensinamentos -revelados por Deus – atrair os
homens a buscar aquilo que supera o estado de vida terrena, uma vez que a
Providência divina revela uma felicidade bem maior do que a fraqueza humana pode
experimentar no decorrer da vida presente, isto é: a salvação e a vida eterna.

Fonte: A Autora.
LIVRO

Título: O Nome da Rosa


Autor: Umberto Eco
Editora: Record
Sinopse: Uma série de assassinato ocorre no interior de um mosteiro no período
medieval. O frade franciscano Guilherme de Baskerville é designado para investigar
os crimes e descobre uma conspiração para evitar a divulgação de uma obra de
Aristóteles e contradiz a metafísica cristã.
FILME/VÍDEO

Título: Ágora
Ano: 2009.
Sinopse: Mediante os vários enfrentamentos entre cristãos, judeus e a cultura greco-
romana, os cristãos se apoderam, aos poucos, da situação, e enquanto Orestes se
torna prefeito e se mantém fiel ao seu amor, o ex-escravo Davus (que recebeu a
alforria de Hipátia) se debate entre a fé cristã e a paixão. O líder cristão Cirilo de
Alexandria domina a cidade e encontra na ligação entre Orestes e Hipátia o ponto de
fragilidade do poder romano, iniciando uma campanha de enfraquecimento da
influência de Hipátia sobre o prefeito, usando as escrituras sagradas para acusá-la
de bruxaria.
REFERÊNCIAS

AGOSTINHO, Confissões. Livro VII, 16, 22. São Paulo: Nova Cultural, 1996.

CHAUÍ, M. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2011.

DUROZOI, G.; ROUSSEL, A. Dicionário de Filosofia. Campinas: Papirus, 1993.


Disponível em: https://sites.google.com/view/sbgdicionariodefilosofia/finito-e-infinito.
Acesso em 18 de jul de 2021.

IZIDIO, C. A Demonstração da Existência de Deus através do Conhecimento


Sensível em Tomás de Aquino. Cognitio-Estudos, São Paulo: v. 10, n. 1, p. 34-43,
jan./jun., 2013.

JAPIASSÚ, H.; MARCONDES, D. Dicionário Básico da Filosofia. Rio de Janeiro:


Editora ZAHAR, 2006.

COUTINHO, J. Elementos de história da filosofia medieval. 3ª versão. Braga:


Faculdade de teologia/Universidade Católica Portuguesa, 2008. Disponível
em:https://repositorio.ucp.pt/handle/10400.14/12729. Acesso em 18 de jul de 2021.

MEIER, C. Filosofia: por uma inteligência da complexidade. Belo Horizonte: PAX,


2014.

NICOLA, U. Antologia Ilustrada de filosofia: das origens à idade moderna. Editora:


Globo, São Paulo: 2005.

WIKIPÉDIA. Neoescolástica. 2020. Disponível em:


https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Neoescol%C3%A1stica&oldid=59939561.
Acesso em 4 dez. de 2020.
UNIDADE IV
CORPO E ALMA: LIBERDADE VERSUS DETERMINISMO
Professora Francielle Freire Favareto.

Figura - O livro representando o conhecimento

Profª. Francielle Freire Favareto

Plano de Estudo:

● Corpo e Alma: Liberdade Versus Determinismo;


● Metafísica Moderna;
● Idealismo;
● Nietzsche e a crítica à metafísica;
● Ontologia Contemporânea - Fenomenologia.

Objetivos de Aprendizagem:
● Compreender os conceitos básicos da Metafísica moderna.
● Entender o dualismo na Filosofia Moderna.
● Conhecer o que levou a reelaborar a Metafísica.
● Estabelecer a distinção entre Ontologia e a Nova Ontologia na Filosofia
Contemporânea.
INTRODUÇÃO

Prezado(a) aluno(a), através do desenho da Metafísica traçado desde a


Antiguidade, chegamos na discussão e na reelaboração da Metafísica e Ontologia.
Tema que os antigos, medievais e os modernos discutiram, elaboraram, impuseram
para dar respostas sobre o Ser, Deus e alma.
Apesar dos temas serem de expressão e conteúdo pesado e até singular no
pensamento do indivíduo contemporâneo, a elaboração de um novo conceito foi
necessária para explicar de acordo com a ciência. Esse conceito chama-se
Fenomenologia.
A Fenomenologia é um conceito que discute a relação entre o sujeito-objeto,
auxiliando nas demais ciências com as Ciências Humanas.
Com o surgimento da Fenomenologia, a ontologia teve algumas mudanças e
um novo entendimento ontológico, crise na metafísica como auxílio de alguns filósofos
criticando.
Dessa forma, caro(a) aluno(a), nesta unidade iremos entender o que levou à
crise da metafísica e ao nascimento de um novo conceito, para explicar o que mais é
complexo no indivíduo, o Ser.

Bons estudos!
1 CORPO E ALMA: LIBERDADE VERSUS DETERMINISMO
Figura - Representação da discussão sobre corpo e mente

Olá, estudante. Nesta unidade iremos estudar a crise na metafísica, sua


reelaboração, a nova antologia e o nascimento de mais um conceito discutido a partir
da Idade Moderna e conceituada na contemporaneidade. Esse conceito, chama-se
Fenomenologia, mas do que se trata este conceito?
Antes de conhecermos o significado de fenomenologia, precisamos entender
qual era o “universo” do conhecimento que este período denominado pela filosofia
moderna estava vivendo.
O debate da filosofia moderna estava em torno do Sujeito e do Objeto, a
dualidade entre alma e corpo, contribuindo para a reforma da ontologia clássica a
partir de uma nova leitura sobre a noção de objeto.
É notório que o estudo da metafísica iniciou entre os clássicos, adormeceu
entre os antigos e medievais e revigorou no pensamento moderno com René
Descartes, que matematizou a natureza.
Porém a nossa discussão está no campo do dualismo corpo e alma, mas faz
necessário apresentar um gigante do pensamento contemporâneo, Merleau-Ponty.
Ponty nasceu em 1908 e morreu em 1961, na França, no ápice da sua
genialidade filosófica. Amigo de Sartre, Ponty tratou dualismo corpo e alma com uma
destreza de gênio. Nas suas reflexões, o corpo é tudo o que é extenso e que ocupa
lugar no espaço e a alma, ao contrário, é inextensa, não ocupa lugar no espaço e não
é o cérebro, considerando o fato de que a alma é o Eu que se alcança de forma
imediata.
Para exemplificar o dualismo, em sua obra Conversas explicou que a pintura
de uma obra de arte não é simplesmente prazer, é a interpretação da expressão do
mundo a partir da expressão de nós mesmos. Neste momento, uma nova filosofia
surge. O objeto considerado verdadeiro não é absoluto e sim relativo, devido ao
tempo e ao lugar de onde quem observa apreende, descobre o objeto.
Partindo desse ponto em que o objeto não pode ser considerado como absoluto
ou puro em si, passa a ser desconsiderado, pois o sujeito é sensível e não um corpo,
ou seja, não é espírito (alma) e um corpo, mas um espírito encarnado. O corpo não
está à mercê de eventos externos, um local onde acomoda uma consciência pura que
controla ou guia o corpo.
Merleau Ponty, para fundamentar sua teoria, recorre à percepção que ganha
um novo significado, a partir de novas características que são: o conhecimento das
formas com sentido, uma vivência corporal, a experiência tem significado e carrega
sentido que depende do mundo exterior, proporcionando ao homem dar novos
significados de acordo com a interação que ele tem com o mundo, com a cultura, com
a sociedade.

Figura 1 - Imagem representando a liberdade de pensamento


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É nesse ambiente que questões como liberdade e determinismo começam a


vibrar à procura de um significado que condiz com as investigações do momento.
A liberdade sempre caminhou junto das investigações filosóficas, desde a
antiguidade, como tentativa de conceitualizar ou mesmo definir as ações dos
indivíduos.
Com a tentativa de decifrar e conceitualizar as ações humanas, a liberdade é
definida por meio de termos contrários como, necessidade, que se refere ao todo da
realidade, é em si; atua sem a interferência do ser humano, tem como explicação
causa e efeito, o destino que tem a influência de alguma força transcendental e
o determinismo, em que leis adestram pensamento e emoções, tornando a liberdade
ilusória, tudo está definido.
Para Aristóteles, a liberdade opera na capacidade do ser humano não
encontrar obstáculos, é o poder de escolha. Ainda acrescenta um outro termo
possível, que se refere ao que pode ser feito ou pode acontecer.
A filosofia aristotélica apresenta a distinção entre necessidade/contingência,
que significa que ação ou causa externa determina o modo que o agente – o homem
– age, e o ato voluntário livre, quando o homem tem o poder de dominar suas ações.
O ato voluntário livre tem duas condições para ser executado: a capacidade de
controlar e dominar os impulsos e de definir, por meio da razão, o bom e justo,
encaminhando sua teoria para o campo da ética.
Na concepção da Ética aristotélica, a liberdade é quando a harmonia e a
vontade se tornam aliadas, transformando-se no resultado final da razão.
Na contemporaneidade, com Sartre, em sua obra O ser e o nada (1943), a
liberdade se apresenta ao ser humano através da escolha, mesmo sendo forçado por
a escolher opções já determinadas, mesmo assim essa escolha é uma decisão livre.
Dessa forma, para Sartre, toda decisão e toda ação do ser humano é uma decisão
livre, trilhando para o entendimento de que o homem está condenado a ser livre.
Explicando a ilustre frase sartriana, “estamos condenados à liberdade”, somos
condenados a fazer escolhas e se não fizermos, também é uma atitude do conceito
liberdade.

2 METAFÍSICA MODERNA
Figura - Immanuel Kant, filósofo alemão que estava alinhado com a Revolução Científica, na
introdução da obra “Crítica da Razão Pura”, Kant faz uma crítica praticada até o momento,
rompendo com o pensamento medieval. Sua filosofia consiste em encontrar um caminho para
a metafísica

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1451523287

Como toda passagem de um pensamento para o outro, há sempre algo que


marca esse “rito de passagem”, e com a metafísica não foi diferente.
A metafísica moderna rompeu com a tradição platônica, aristotélica e com o
neoplatonismo, separou a fé da razão (os medievais conciliou), mesmo que a filosofia
não estivesse autorizada a expor as teorias que fossem contrárias aos dogmas da fé
e a reelaboração do conceito de substância/ser.
René Descartes (1596 - 1650) teorizou a substância em três; a substância
pensante (alma) que tem como atributo o pensamento, a substância extensa (matéria)
e a substância infinita (Deus), que representa a infinitude.
Hobbes (1588- 1679) afirma que não tem como conhecer a substância divina,
nem mesmo a anímica (alma) por não serem dados sensoriais, e que a discussão só
poderia ficar em torno da substância corpórea, pois é a única que podemos conhecer.
Espinosa (1632-1677) explica que pensar na substância como “existente em si
e por si” e que não há dependência de outros para existir, define que toda a criação
divina ou produzidas por Deus não pode receber o nome de substância, ou seja, não
são por si, pois depende da ação divina.
Dessa forma, o conceito de causa (aquilo que produz um determinado efeito)
sofreu uma reelaboração, ou seja, no pensamento moderno existem dois conceitos
de causa: a eficiente e a final.
A causa eficiente é uma ação interna que tem como consequência um efeito, o
alcance é universal, atende toda a natureza. A causa final é a escolha em realizar ou
não uma ação, só os seres dotados de razão e vontade são contemplados – os seres
humanos.

1.1 Crise na Metafísica

Foram essas mudanças, transformações, releituras na questão do


ser/substância que fizeram com que a metafísica entrasse em crise. O que cravou
essa crise foi a afirmativa de que o pensamento é capaz de conhecer a realidade em
si e que as ideias corroboram para um conhecimento verdadeiro da realidade, levando
ao entendimento de que Deus é infinito e, por ser infinito, garante a inteligibilidade e a
realidade.
David Hume (1711 - 1776) contribuiu para a crise na metafísica. Sua filosofia
alega que o sujeito do conhecimento, através das percepções, sensações e
impressões, atribui nomes gerais, isto é, fazendo ligações de sensações por meio do
hábito.
3 IDEALISMO

Figura - Idealismo, o sujeito que vai de encontro com a ideia

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Desde a Antiguidade, atravessando pela Idade Média, findando na Filosofia


Moderna, o realismo dava resposta à problemática do ser, atribuindo ao ser a
existência em si, que o ser pode ser conhecido através da razão humana, são alguns
dos termos que fizeram parte do fundamento do realismo.
Como visto há pouco, Hume foi um dos filósofos que atacou duramente a
metafísica atuante. Anunciou que o hábito é que faz a mediação entre as ideias que
são atribuídas aos nomes.
Immanuel Kant (1724 - 1804) contribuiu com duas novidades. A primeira foi
transformar sua teoria do conhecimento em metafísica (estuda a universalidade e o
que é necessário dos fenômenos) e a segunda é que o sujeito tem uma estrutura
universal e idêntica para todos os seres humanos em todos os tempos e lugares e que
é a razão como faculdade a priori.
O Idealismo, em um sentido geral, é o compromisso com algum ideal sem a
intenção de acontecer de forma imediata ou concreta. Na metafísica, o significado é
quando o conhecimento não vai de encontro com o sujeito, mas o sujeito é quem
produz as ideias para as coisas.
No sentido do conhecimento, há uma redução do objeto do conhecimento ao
sujeito que vai conhecer e na ontologia a redução acontece na matéria ao pensamento
(espírito).
4 CRÍTICA DE NIETZSCHE À METAFÍSICA

Figura - Imagem de Nietzsche

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Friedrich Nietzsche (1844 - 1900) atacou a metafísica tradicional através do
conceito da verdade, pois o que acreditamos conhecer não alcança um “em si”, porque
a afirmação de verdade só existe para garantir a paz e acabar com os conflitos com
as outras pessoas.
Nietzsche afirma, na sua filosofia, que o intelecto colabora para dar valor à
existência, criando um tipo de ilusão. O conhecimento é igual a invenção, e a verdade
é a ferramenta que o ser humano usa para a dissimulação.
O ponto que marca a ruptura da metafísica clássica com o pensamento
aristotélico: “Todos os homens têm por natureza, desejo de conhecer: uma prova
disso é o prazer das sensações, pois, até fora da sua utilidade, elas nos agradam por
si mesmas e, mais do que todas as outras, as visuais” (ARISTÓTELES, 1984, p. 11).
Para Aristóteles (1984), o ser humano desejar conhecer faz parte do desejo
natural. Nietzsche faz dura crítica dizendo que o conhecimento é uma forma de
sobrevivência não é de teor natural, o que existe é luta para sobreviver, por isso a
invenção do conhecimento.
Nietzsche (1844 - 1900) atacava com a afirmativa de que o conhecimento não
é “em si”, mas uma manobra social, política e até moral. O ato de conhecer é mais
uma invenção histórica e o conhecimento pode até ter ligação com o instinto, mas não
faz parte.
5 ONTOLOGIA CONTEMPORÂNEA - FENOMENOLOGIA

Figura - Imagem que representa a estrutura do pensamento

Neste tópico, iremos aprender, caro(a) estudante, o surgimento da nova


ontologia e o nascimento da Fenomenologia. Primeiro vamos ver o significado de
ontologia?
Martin Heidegger (1889-1976) diferencia ontologia em duas palavras: ôntico e
ontológico.
Ôntico refere-se à estrutura e à essência do que é próprio de um ente, sua
singularidade, sua identidade. Ontológico é o estudo filosófico e a investigação dos
conceitos, se apresenta como um método que possibilita o conhecimento das formas
de ônticas através do pensamento, ou seja, ôntico são os entes da própria existência
e ontologia são os entes que são tomados como objeto, de um conhecimento.
O conceito ôntico, como foi referido, é a estrutura e a essência de um ente, são
elas:
● Entes Materiais/Naturais: “coisas reais” (animais, frutas, árvores etc.).
● Entes Materiais Artificiais: “coisas reais” (construções, balanço etc.).
● Entes Ideais: não são materiais, mas conseguimos conceber através
do pensamento, a matemática, por exemplo.
● Entes que se referem a valores: positivo/negativo – vício/virtude.
● Entes que pertencem a uma realidade diferente dos ideais, das coisas,
dos valores metafísicos.

Coisas reais é um conjunto de entes que têm as mesmas características, a


mesma estrutura ontológica, está no mundo, está diante de nós, refere-se à realidade.
Existe, entretanto, uma passagem entre o ôntico para o ontológico
(investigação) e essa passagem acontece quando situações cotidianas se tornam
confusas ou estranhas.
Os conceitos que são atribuídos à ontologia são: ser (existe), realidade (entre),
temporalidade (possui uma duração) e causalidade (causa-efeito).
É necessário entender que os entes ideais não carregam as mesmas
características dos outros entes, por se referirem a entes no campo da metafísica; são
entes ideais, atemporais, idealidade, relação e atemporal.
O que será que essa “nova ontologia” trouxe de novidade para o pensamento
filosófico?
A questão que pairava era liberar a ontologia “do velho questionamento
metafísico" – o dilema entre realismo/idealismo.
A nova ontológica, investigava a impossibilidade de conceitos realista (se
destruir a consciência, resta as coisas) ou idealista (se destruir as coisas resta a
consciência). Por isso a nova ontologia prega nem realismo nem idealismo, o viável é
a conciliação dos dois conceitos.
Heidegger e Ponty desenvolveram a filosofia de que a eliminação da
consciência contribui para que não sofra nada, pois as coisas só existem porque é a
consciência que as percebe. Vice-versa com as coisas, se acabarmos também não
vai sobrar nada e surge um problema maior, pois não somos Deus ou criador das
coisas, somos moradores desse mundo criado.
Esse novo conceito de ontologia fundamental que estamos no mundo, que o
mundo é mais velho que nós seres humanos, que a consciência é o que dá sentido,
referência do mundo, isto é, somos nós que atribuímos sentido ao mundo, pois somos
consciência encarnada num corpo.
Outra característica da nova ontologia é a descrição do Ser, somos seres
temporais – nascemos e temos consciência da morte, intersubjetivos –, vivemos com
outros semelhantes e somos seres culturais - pois a sociedade, o trabalho, a
linguagem é nossa criação.

Figura 2 - Filósofo fenomenólogo

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O significado geral de fenomenologia: “é a descrição de todos os fenômenos,


ou eidos ou essências, ou significação de todas estas realidades: materiais, naturais,
ideais, culturais” (CHAUÍ, 2011, p. 255), manifestação filosófica do século XIX,
formulada por Edmund Husserl. Vale ressaltar, prezado(a) aluno(a), que as ciências
humanas fizeram uso da fenomenologia como suporte, inspiração e método.
Falar de fenomenologia é falar de Edmund Husserl (1859 - 1938), que, além de
formular a fenomenologia, criticou a metafísica e o positivismo.
Husserl afirma que a fenomenologia é uma ciência rigorosa, não de cunho
exato por não ser um método dedutivo e sim descritivo.
Epoché, termo que Husserl apropriou-se, dos antigos céticos, significa
suspender o juízo, caso exista a possibilidade de não atingir a certeza de alguma
coisa, utiliza esse termo com ressalva, diz que é necessário suspender as crenças
ingênuas ou seja, quando um dado objetivo da realidade, usar as crenças para tentar
explicar não é o bastante.
A investigação de Husserl é acerca dos fenômenos experienciado pela
consciência e reelabora a temática da percepção, por isso a crítica à metafísica e ao
positivismo, estruturando sua tese na epistemologia e ontologia não em teóricos, mas
nas experiências vividas pela consciência pré-reflexiva.
Husserl foi o filósofo que formulou a fenomenologia, porém outros pensadores
caminharam por essa estrada com suas próprias reflexões, teorias e pensamentos.
Alguns deles são: Martin Heidegger, Merleau-Ponty, Jean-Paul Sartre, Emmanuel
Lévinas, Paul Ricoeur.
SAIBA MAIS

Quando Nietzsche chorou por um cavalo

Existe uma história que perambula (não confirmada) de que Nietzsche ao ver
um cavalheiro batendo em um cavalo. O filosofo vai até o cavalo, abraça e chora e diz
baixinho “Mãe, eu sou um idiota”. O cavalo apanhava porque não andava devido ao
cansaço, fome, exausto.
Não se sabe se esta situação aconteceu de fato porque depois desse
acontecimento o filósofo parou de falar até a sua morte. Nietzsche foi detido pela
polícia com a alegação de perturbação da ordem pública, “o filósofo entrou em
colapso”.

Fonte: A Mente é Maravilhosa (2020).

SAIBA MAIS

O conceito de fé tem múltiplos sentidos, porém a apropriação desse conceito é


usada para sustentar alguma crença religiosa. Kant acomoda este conceito em Fé
Filosófica, ou seja, ao invés de empregar como um axioma religioso, Kant argumenta
e defende a fé na subjetividade, pois, mesmo não tendo fundamentação teórica
sustentável, a fé filosófica molda e dá sustentação na moralidade. É um deslocamento
da fé em uma crença criada e pensada por outros, para o próprio sujeito.

Fonte: A autora.

#SAIBA MAIS#

REFLITA
Pensar na liberdade, ou condicionar ao que está posto?

Como seria, se estivéssemos aprisionados por conceitos que foram nomeados


na antiguidade, estabelecendo/atribuindo conceitos que estão em desuso
impossibilitando o ser humano a conhecer, aprender e a evoluir cientificamente? Será
que nos libertamos? Será que a humanidade está atrelada a um passado longínquo e
tentando encaixar pensamentos arcaicos com acontecimentos contemporâneos?

Fonte: A Autora.

#REFLITA#

LEITURA COMPLEMENTAR
O QUE É RACIONAL É REAL, E O QUE É REAL É RACIONAL

Hegel vê a ineficiência em que se configura a construção do verdadeiro


conceito de ser das coisas da filosofia tradicional. No que diz respeito a esta lógica, o
movimento gerado na tentativa de explicar o ser cai no vazio, o autor aponta o
problema presente na ontologia fundamentada no qual reduz o conteúdo e a forma do
conceito de ser no discurso da mera aparência justamente por tratar de uma
percepção do movimento; do devir em que separa da essência a negação de si, pois
na perspectiva de Hegel o movimento dialético é um caminho produzido pelo próprio
ser. O autor aponta o erro a partir de uma fenomenologia do espírito. Trata-se de
reavaliar, em paralelo, a forma e o conteúdo, tanto no âmbito do pensamento quanto
da consciência. O pensamento que orienta as ações do indivíduo suscita a
consciência, contudo, esta surge em primeiro momento segundo o sentimento
produzido por uma ação determinada, já o pensamento surge por intermédio da
reflexão de uma idéia. Nas palavras do autor: “[...] Esta diferença religa-se ainda no
facto de que o conteúdo humano da consciência, constituído pelo pensar, não aparece
logo na forma do pensar, mas como sentimento, intuição, representação – formas que
há que distinguir do pensar enquanto forma.” (Hegel, 1988, p. 70)
Esta ação que define a representação e que implica na forma, não passa de
uma categoria racional de distinção trazido à consciência, ou seja, é por meio dele
que identificamos as semelhanças e dessemelhanças de algo. O pensamento
reflexivo tem por conteúdo o próprio pensamento, todavia, a reflexão origina dois
conceitos distintos inseridos no pensamento, a saber, a representação e a intuição. O
autor nos diz: “[...] Inversamente, são duas coisas distintas ter pensamentos e
conceitos, e saber quais as representações, intuições, sentimentos que lhe
correspondem. – Com isto se relaciona um aspecto do que se chama a
incompreensibilidade da filosofia.” (Hegel, 1988, p 71).
O que está em jogo é o conteúdo em que se trata o pensar filosófico, pois esta
forma de pensar tem por conteúdo o pensamento puro e para isto é preciso criar um
abismo entre qualquer mescla, ou seja, dos conceitos que como vimos é constituído
não só por pensamentos,mas, também por sentimentos, representações, intuição,
etc.. Hegel procura contrapor a tradição por um modelo cognitivo de caráter totalmente
genuíno diferente do pensamento constituído na mente na qual a filosofia ainda não
tratou, chamado pelo autor de pensamento abstrato ou pensamento especulativo. A
objeção de Hegel da lógica tradicional está no pensar somente no predicado, sendo
este, para Hegel, finito e o conceito não se enreda no finito, pois o conceito é absoluto,
quando se diz do predicado está limitando a natureza universal do ser; do absoluto; o
predicado restringe a dimensão do sujeito no juízo. Segundo o autor, a estrutura
mental está impregnada da forma de pensar tradicional, para pensar desta forma
recorremos sempre a um referencial, pensar abstratamente requer que construamos
um abismo sob qualquer forma de pensamento que temos em nossa mente. Em outros
termos: é preciso uma reflexão de uma ideia desvinculada de qualquer outra que não
seja ela mesma, melhor ainda: ter uma ideia originária a respeito de um determinado
objeto abdicando das ideias que já possuímos deste.
Mas como escapar das estruturas que configuram nosso pensamento e partir
para uma nova fórmula de pensar? É possível abdicarmos dos conceitos que já
possuímos e prender todos nossos esforços em um pensamento genuíno?
Como uma forma de pensar não surge do nada, o pensamento especulativo
deve conter um fio condutor que pontue a ele um alicerce para se fundamentar isto
nos dá subsídios para subentender que quando entramos no “reino” dos pensamentos
puros, adentramos em terras desconhecidas. O autor nos diz:

[...]Quando se vê deslocada para a pura região dos conceitos, não


sabe em que mundo se encontra. – Acham-se, pois, imensamente
compreensíveis os escritores pregadores, oradores, etc., que
proporciona aos seus leitores ou ouvintes coisas que eles já sabem de
memória, que lhe são familiares e que se compreendem por si.
(HEGEL, 1988, p. 72).

O que está em causa aqui é a manobra que Hegel visa na dialética, pois a
tarefa filosófica da dialética Hegeliana consiste na tentativa de estabelecer o estatuto
do ser presente na relação sujeito e objeto tendo em vista uma racionalidade negativa
que só pode ser propriamente entendida ao se lançar luz do pensamento “destrutivo”.
É a partir desta racionalidade que transcendemos o deserto da região pura dos
conceitos. Nós somos externamente estimulados em referência ao que movimenta o
nosso pensar, contudo, isto não pode ser de uma maneira afastada do negativo. O
pensar se faz enquanto instância afirmativa pela “destruição” (negação) do imediato
dados pelos sentidos.
A figura de destruição, portanto, a da negação, sobre a qual tal tarefa filosófica
estará fundamentada, norteará o sentido de uma possível transcendência,
vislumbrada por Hegel resultando no processo de constituição da dialética junta a
experiência filosófica. Como vimos a forma de pensamento da tradição entende o
mundo como entidades finitas que se organizam mediante o princípio de identidade e
de contradição. Cada coisa é idêntica a si mesma, a predicação atribuída ao sujeito
é, segundo a lógica tradicional, a essência da coisa e, as qualidades “mutáveis” são
vistas como contingentes. As operações do entendimento desta lógica dividem o
mundo em polaridades conceituais que se relacionam. A crítica hegeliana encontra-
se na observação isolada deste entendimento, o autor aponta o erro no complexo
desta oposição, a verdade do ser não se restringe às oposições fixas, estas são na
verdade estados de existência das coisas, no qual o ser toma posse para confirmar-
se. Isto nos dá base para compreender a unificação dos opostos, pois a estrutura do
ser é a mesma, ele simplesmente perpassa por todos os seus estágios de existência.
Assim Hegel dá ao ser uma posição privilegiada em seu estatuto ontológico, pois como
vemos, não existem qualidades predicáveis, existe sim estados de ser, ou seja,
unidades mais ou menos duradouras do mesmo sujeito. Em outras palavras: tudo se
passa no reino do sujeito. E é papel do pensamento abstrato ou especulativo encontrar
esta unidade. É por meio da razão em que a identidade se dá pela ação consciente
do conhecimento, “o pensamento especulativo compara as formas dadas pelas coisas
às potencialidades, distinguindo assim, nas coisas, a essência, do estado acidental
de existência.” (Marcuse, 2004)
O pensamento especulativo vê o mundo como o vir-a-ser, e seu ser como um
produto e produzir. É possível ver nas palavras de Hegel em sua “alegoria do floreio”,
o autor diz:

[...] O botão desaparece no desabrochar da flor, e pode-se dizer que


é refutado pela flor. Igualmente, a flor se explica por meio do fruto
como um falso existir da planta, e o fruto surge em lugar da flor como
verdade da planta. Essas formas não apenas se distinguem mas se
repelem como incompatíveis entre si. Mas a sua natureza fluida as
torna, ao mesmo tempo, momentos da unidade orgânica na qual não
somente não entram em conflito, mas uma existe tão necessariamente
quanto a outra; e é essa igual necessidade que unicamente constitui
a vida do todo. (HEGEL, 1980, p. 06).
Com estes esclarecimentos já podemos pontuar o intuito do presente texto, pois
a lógica pressupõe a identidade entre o pensamento e a existência. O movimento
dialético presente na relação sujeito e objeto traz à consciência o conceito da coisa
apoiado na existência do ser. Todo pensamento produzido pelo entendimento
especulativo traz à consciência pensamentos puros, que por sua vez, reproduz o
movimento do ser. O conceito, portanto, representa a forma real do objeto, pois é
resultado do processo que revela o mundo objetivo; uma forma de pensar que nega
os conteúdos produzidos pela operação do entendimento tradicional e traz à luz o
sujeito como verdadeira substância da realidade. Hegel nos diz:

[...] é igualmente importante que a filosofia tome nota de que o seu


conteúdo não é mais nenhum senão o que originalmente se produziu
e se produz no espírito vivo, conteúdo que se tornou mundo, mundo
externo e interno da consciência – isto é, de que seu conteúdo é a
realidade [...]. (HEGEL, 1988, p. 73).

Fica claro então que cabe à filosofia tratar da realidade, somente esta pode por
meio de seu conteúdo, a saber, o pensamento puro – alcançar a verdade. Desta
forma, o autor em estudo pode resolver o problema em que apresentava a perspectiva
ontológica da tradição e apresentar um sistema que entende a dissolução da
verdadeira forma da realidade e dizer que o que é racional é real, e o que é real é
racional. Como dito anteriormente na citação acima, a consciência tem por conteúdo
a realidade e, mais adiante apresentado que a consciência deste conteúdo é chamado
experiência. Contudo, Hegel deixa claro em sua filosofia o tratamento que dá ao
espírito; este é visto pelo filósofo através de sua essência que junto ao processo
dialético avança do abstrato ao concreto. No interior da concepção, a teoria e a
experiência da consciência não parecem encontrar repouso algum, pois apresenta
dificuldades na relação entre a realidade e o pensamento. No âmbito da filosofia, a
operação do entendimento é, segundo o autor, constituída pelas ideias abstratas que
têm seu conteúdo limitado no campo mental, ou seja, que não se encontra na
realidade efetiva, pois, ao que parece o conteúdo encontrado na realidade não pode
ser o mesmo encontrado na mente. Há, no presente momento, um abismo entre a
realidade e a ideia, então, como entender o vínculo entre a realidade e a experiência?
Para Hegel, o que está na consciência é resultado do empírico, o pensamento
especulativo não deixa de lado os conteúdos empíricos das outras ciências, todavia,
é complementado com outros conteúdos. Desta forma, os conceitos podem alcançar
o infinito, como Descartes que afirma não podermos imaginar a figura de mil lados,
contudo, podemos concebê-la. O espírito como ser ciente tem consciência de si, este
como autoconsciente tem em si o conhecimento do objeto, o problema se estabelece
nas outras formas de pensar da consciência na qual ela se perde. Sendo a dialética a
natureza do pensar, esta deve superar a confusão elaborada para estabelecer o
sistema racional. Na concepção de Hegel, a atividade empírica se encontra no
pensamento do indivíduo e é uma atividade do pensar, porém, de uma forma
autônoma.

[...] A filosofia, ao dever assim o seu desenvolvimento às ciências


empíricas, confere ao conteúdo delas a forma essencial da liberdade
(do a priori) do pensar e a garantia da necessidade, em vez da
certificação do lado e do facto experimentado, isto é, o facto torna-se
representação da originária e plenamente autônoma actividade do
pensar (HEGEL, 1988, p. 82)

Não se pode dar a filosofia um estatuto empírico. A filosofia é uma atividade do


intelecto, portanto, a ideia de negatividade que se encontra em todas as coisas
vinculadas à natureza também está vinculada ao seu oposto. A representação está
no intelecto como universal. O Eu também é universal, mesmo que tenha outro, este
outro é em si mesmo um Eu outro, todas as representações e sentimentos está no Eu.
O Eu é o pensar enquanto sujeito, o pensamento invade todas as categorias. Desta
forma, o sujeito tem que estar consciente para poder pensar em toda a representação
e sensação. A reflexão é atividade do Eu enquanto sujeito pensante, a verdade
sempre é vista do ponto de vista do absoluto, por conseguinte, a verdade universal; o
objeto em sua totalidade permeia o estado absoluto. Aqui nos deparamos com outra
dificuldade, pois ao que parece o pensamento puro se encontra no vazio; no nada. No
entanto, o nada é, na concepção hegeliana, o ser puro e a noção do nada é o oposto,
pois quando tentamos pensá-lo caminhamos em direção a outra ideia. Para esclarecer
a dificuldade é preciso prender os olhos sobre o caráter de ser que Hegel visa
empregar.
Para o autor, o ponto de partida é sempre o zero que avança no caminho do
final em que devemos nos afastar. O ser para ser começo não pode ser mediado, pois
tem que haver outro diferente para ser mediação que resulta na perda de sua inicial
posição e, também, não pode ser determinado, pois caso isto ocorra, também deixa
de ser começo. O que está em jogo é o caráter puro, pois isto significa que não pode
haver nada no conceito de ser, ou seja, não pode haver nada alheio, pois caso ocorra
alguma impureza a igualdade Eu=Eu deixa de existir. Em outros termos: sucumbi o
puro ser. O puro ser é o abstrato, este se revela como o nada, caso busquemos
alguma determinação do ser caímos no nada porque não se pode intuir algo do ser.
Desta forma, cada coisa busca transcender os limites da particularidade e a uma
relação de oposição ao universal. É neste sentido que o ser é também o nada, o ser
se revela imediato sem mediação como ponto de partida para o movimento dialético.

Perante tantas e tão diversas filosofias, há que distinguir o universal e


o particular, segundo a sua própria segundo sua própria determinação.
O Universal, tomado formalmente e posto de particular, torna-se
também ele algo de particular. Uma tal posição, junto dos objectos da
vida comum, revelar-se-ia por si inadequada e imprópria [...] (HEGEL,
1988, p. 83).

Como podemos ver as coisas só atingem sua própria verdade quando negam
suas condições determinadas. Portanto, o processo dialético de Hegel constitui de
forma circular.

Cada uma das partes da filosofia é um todo filosófico, um círculo que


se fecha em si mesmo, mas a ideia filosófica está aí numa particular
determinação ou elemento. O círculo individual, por ser em si uma
totalidade, rompe também os limites do seu elemento e funda uma
mais ampla esfera; o todo representa-se, pois, como um círculo, de
círculos, de que cada um é um momento necessário, de tal modo que
o sistema dos seus elementos peculiares constitui a idéia inteira, a
qual aparece igualmente em cada um deles (HEGEL, 1988, p. 84).

Fonte: A Autora.

REFERÊNCIAS

HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich, Enciclopédia das Ciências Filosóficas em


Epítome. Trad. Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 1988.
MARCUSE, Herbert. Razão e Revolução: O Advento da teoria social. Trad.
Marília Barroso. São Paulo: Ed. Paz e Terra, 2004.

HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. A Fenomenologia do Espírito, trad. Henrique


Cláudio de Lima Vaz, Orlando Vitorino e Antônio Pinto de Carvalho. São Paulo: Ed.
Abril Cultura, 1980. (Coleção: Os pensadores).

HARTMANN, Nicolai. A Filosofia do Idealismo Alemão, trad. José Gonçalves Belo.


Lisboa, Ed. Fundação Calouste Gulbenkian.

INWOOD, Michael. Dicionário Hegel, trad. Álvaro Cabral; revisão técnica de Karla
Chediak. Rio de Janeiro; Ed. Jorge Zahar, 1997.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta unidade abordamos questões como: corpo-alma, liberdade -


determinismo. Conceitos que foram elencados na Filosofia Moderna e tiveram seu
escopo na Filosofia Contemporânea.
Compreendemos as mudanças e transformações até a “crise da
metafísica”, com o filósofo David Hume.
Vimos também a “nova ontologia”, investigando o dilema entre o idealismo e o
realismo na tentativa de livrar a ontologia dos velhos problemas metafísicos.
Conhecemos alguns filósofos que se destacaram com suas filosofias na
tentativa de estabelecer e trazer para o debate conceitos que foram estabelecidos na
Antiguidade que no desenrolar da história carece de novos significados.
Dessa forma, acredito ter alcançado o objetivo desta unidade em demonstrar o
caminho percorrido pela metafísica, entender a investigação da ontologia e o advento
da fenomenologia, considerando que todo esse caminho que percorremos foi na
intenção de mostrar os pontos ou características para a criação de um conceito.
O estudo da metafísica, ontologia e da fenomenologia sempre estará presente
na discussão filosófica, seja pelo retorno de algum conceito que ficou para trás, ou
refutando algum pensamento para dar base a um conceito novo.
Pensar, falar e interpretar o Ser é pauta de qualquer discussão, seja em um
ambiente religioso, político, científico ou cultural, sempre na tentativa de descobrir a
origem de toda manifestação exercida pelo pensamento.
LIVRO

Título: Admirável mundo novo.


Autor: Aldous Huxley
Editora: Globo
Sinopse: Romance que conta como as pessoas irão viver no futuro condicionadas
biologicamente e psicologicamente de forma equilibrada entre si obedecendo a regras
sociais.

FILME/VÍDEO

Filme: A sociedade dos poetas mortos


Direção: Peter Weir
Sinopse: O filme conta a história de um professor que precisa driblar conteúdos que
traz debate sobre novas maneiras de pensar devido ao sistema rígido e conservador
do colégio.
REFERÊNCIAS

A MENTE É MARAVILHOSA. Por que Nietzsche chorou abraçando um cavalo...


2020. Disponível em: https://amenteemaravilhosa.com.br/por-que-nietzsche-chorou/
Acesso em: 14 abr. 2021.

CHAUÍ, M. Introdução à Filosofia. São Paulo: Ática, 2016.

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: editora: ÁTICA, 2011.

METAFÍSICA, Aristóteles, Livro I, capítulo 1, tradução de Vincenzo Cocco, Ed. Abril


Cultural, SP, 1983
CONCLUSÃO GERAL

Prezado(a) aluno(a),

Neste material busquei traçar o caminho que a metafísica percorreu,


apresentar outros conceitos que foram definidos neste percurso, apresentar o
movimento do pensamento filosófico desde a antiguidade.
Na Unidade I analisamos a transição do pensamento cosmogônico para o
pensamento cosmológico, a descoberta do arché e exploramos com os pré-socráticos
a ontologia.
Na Unidade II compreendemos a ontologia antiga, o estudo da metafísica e
uma nova forma de conhecimento através do diálogo. Conhecemos as primeiras
escolas que investigavam as ações humanas.
Já na Unidade III vimos surgir a filosofia cristã fundada pelos padres que se
apropriaram da filosofia pagã – platônica e aristotélica – para fundamentar uma nova
filosofia baseada na revelação, tornando a filosofia do questionamento subalterna.
Na Unidade IV vimos a decadência da metafísica, o surgimento de uma nova
ontologia e o nascimento da fenomenologia. Nesta última unidade, vimos o homem
ser protagonista da sua vida, através dos filósofos contemporâneos, o sujeito é o
agente causador dos efeitos que atingem a sua experiência no mundo.
Dessa forma, espero ter contribuído na busca pelo conhecimento filosófico.
Porém é preciso salientar que essa busca não cessa ao final deste material. Foram
elencados os principais filósofos de cada época, e apresentado os conceitos que
definiram e que definem nossa maneira de pensar. Os problemas metafísicos ainda
permanecem, enquanto existirem indivíduos pensantes, a discussão sobre o ente não
terminará pois cada um tem sua visão do mundo, basta fundamentar.
Lembre-se caro(a) aluno(a) a tendência é o discípulo superar o mestre.

Até uma próxima oportunidade. Grata!

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