Você está na página 1de 288

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

O PÚBLICO
E O PRIVADO NA
SAÚDE

O processo de mudança da prestação de serviços de


saúde no Brasil num contexto histórico e comparativo

Propostas e reflexões para o futuro

ANTONIO CORDEIRO FILHO

Doutorado em Serviço Social

PUC

SÃO PAULO
2012
I
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

O PÚBLICO
E O PRIVADO NA
SAÚDE
O processo de mudança da prestação de serviços de
saúde no Brasil num contexto histórico e comparativo

Propostas e reflexões para o futuro

Tese apresentada à Banca Examinadora


da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, como exigência parcial à obtenção
do Título de Doutor em Serviço Social sob
a orientação da Professora Dra. Regina
Maria Giffoni Marsiglia.

São Paulo

2012
II
Banca Examinadora:

_________________________________________________________

_________________________________________________________

_________________________________________________________

_________________________________________________________

__________________________________________________________

III
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a
reprodução, total ou parcial, desta tese, por processos de
fotocopiadoras ou eletrônicos.

Assinatura:
______________________________________________________

São Paulo, Dezembro / 2011.

IV
Agradecimentos e dedicatórias,

À minha esposa Vera, aos meus filhos Fábio, Rodrigo fico agradecido pela força
espiritual fornecida para elaborar esta obra.

Aos meus netos, em ordem alfabética, Ana Laura, Gabriel, Mariana e Vinícius, todos
de sobrenome “ Cordeiro “, que – eu por estar bem mais velho e com visão social
muito mais abrangente - me abriram os olhos para o quanto devemos cuidar das
nossas crianças deste imenso Brasil e o quanto é importante a atividade do Serviço
Social.

Fica aqui mais uma contribuição do vovô para o futuro que será de vocês.

Um agradecimento muito especial àquele que sempre me apoiou e fez com que
acreditasse que um dia ainda seria um Mestre Titulado e posteriormente Doutor: Prof.
Mestre e Doutor, Silvio Nececkaite Sant’Anna.

À Professora Dra. Aldaíza Sposati, nas primeiras orientações pela paciência que
demonstrou em todas as nossas reuniões e posteriormente, a iluminação da Dra.
Maria Regina Giffoni Marsiglia, no Núcleo de Saúde, na continuidade da Orientação,
que com sua inteligência, idéias e sua visão plena da importância do Serviço Social no
Brasil me mostrou o caminho que deveria seguir neste trabalho.

Agradeço pelo carinho e amizade que ambas têm por minha pessoa.

Dedico esta tese ao amigo inesquecível e quase irmão, Prof. Antonio Carlos Lopes
Álvares, o qual, sempre terá a minha eterna amizade.

V
A palavra Saúde se origina do latim salute que significa “salvação, conservação da
vida, cura, bem-estar”. A OMS – Organização Mundial de saúde definiu como um
estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência da
doença ou enfermidade. 1

Os direitos de cidadania e particularmente


os direitos sociais, são um parâmetro fundamental da vida civilizada e refletem
conquistas importantes do movimento democrático e das lutas sociais dos séculos XIX
e XX.

São provas cabais de que a humanidade


tem sabido construir, ao lado da exacerbação do mercado, da competição, da
violência, da exploração capitalista, formas mais dignas de convivência. Os direitos,
porém, não são uma dádiva, nem uma concessão. Foram arrancados por lutas e
operações políticas complexas. Além disso, também têm funcionado como um
importante fator de reprodução social e de reposição da força de trabalho: não foram
doações dos poderosos, mas um recurso com o qual os poderosos se adaptam às
novas circunstâncias histórico-sociais, dobrando-se com isso, contraditoriamente, as
exigências e pressões em favor de mais vida civilizada. (Nogueira, 2005).

Tais direitos adquiridos ao longo dos séculos, conforme se observa no presente


trabalho, mostra que as pessoas não estão chegando próximos à terra do Shangri-lá
conhecido, mas, perdido, todavia, mostra que a luta civilizatória deve acompanhar a
modernidade tecnológica e a globalização. A fila caminha...
(O autor desta tese - 2011)

VI

1
Fonte: Enciclopédia Mirador Internacional – SP. Enciclopédia Britânica do Brasil Publicações, 1975 v.18 p. 10.271
Glossário de siglas:

Abepss – Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa de Serviço Social

ACS - Agentes Comunitários de Saúde

Aids - Síndrome da Imunodeficiência Adquirida

AIH - Autorização para Internação Hospitalar

AIS – Ações Integradas de Saúde

Anas – Associação Nacional dos Assistentes Sociais

ANS/MS - Agência Nacional de Saúde Suplementar do Ministério da Saúde.

Anvisa/MS - Agência Nac. de Vigilância Sanitária do Min. da Saúde

Apac - Autorização para Procedimentos de Alta Complexidade e Alto Custo

Apassp – Associação Profissional de Assistentes Sociais de São Paulo

BCG - Bacilo de Calmette e Guérin (vacina contra a tuberculose)

Bemfam - Sociedade Civil Bem-Estar Familiar no Brasil

BPA - Boletim de Produção Ambulatorial

CAP – Caixa de Aposentadoria e Pensão

CAT - Comunicação de Acidente do Trabalho

Cbas – Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais

Cefor – Centro de Formação de Trabalhadores da Saúde

Ceneas – Comissão Executiva Nacional de Entidades Sindicais de Assistentes.


Sociais

Cenepi/Funasa - Centro Nacional de Epidemiologia da Fundação Nacional de Saúde

Cepal – Comissão Econômica para a América Latina

CES – Conselho Estadual de Saúde

CF – Constituição Federal

CGPRH/SPS - Coordenação Geral de Políticas de Recursos Humanos da Secretaria


de Políticas de Saúde

CIB – Comissão Inter-gestores bi-partite

CID-10 - Classificação Internacional de Doenças, 10a revisão. OMS, 1993.

VII
CIH – Comunicação de Internação Compulsória

CIT – Comissão Inter-gestores Tri-partite

CLT – Consolidação das Leis do Trabalho

CMS – Conselho Municipal de Saúde

CMS – Conselho Municipal de Saúde

CN-DSTs/Aids/MS - Coordenação Nacional de Doenças Sexualmente Transmissíveis


e Aids do Ministério da Saúde

CNS – Conselho Nacional de Saúde.

COMUDA – Conselho Municipal de Políticas de Drogas e Álcool

Conasems - Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde

CONASP – Conselho Consultivo de Administração de Saúde Previdenciária

Conass - Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde

CPO-D - Dentes Permanentes Cariados, Perdidos e Obturados aos 12 Anos de Idade

Cras - Conselho Regional de Assistentes Sociais

DATAPREV/MPAS - Empresa de Processamento de Dados da Previdência Social.

DATASUS/MS - Departamento de Informática do SUS

DN - Declaração de Nascido Vivo

DO - Declaração de Óbito

DS – Distritos de Saúde

DST – Doença sexualmente transmissível

Enesso – Encontro Nacional de Ensino de Serviço Social

FAE – Fator de Apoio ao Estado

FAM – Fator de Apoio ao Município

FAS – Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social

Fideps – Fator de Incentivo ao Desenvolvimento do Ensino de Pesquisa em Saúde

FNS – Fundo Nacional de Saúde

GED – Grupo Especial para a Descentralização

IAP – Instituto de Aposentadoria e Pensão

VIII
INAMPS – Instituto Nacional de Previdência Social

IVH – Índice de Valorização Hospitalar

IVISA – Indice de Valorização do Impacto em Vigilância Sanitária

LBA – Legião Brasileira de Assistência

LOAS – Lei orgânica da Assistência Social

LOS – Lei Orgânica da Saúde

MAS - Pesquisa de Assistência Médico Sanitária

MPAS – Ministério da Previdência e Assistência Social

MS – Ministério da Saúde

NOB – Norma Operacional Básica

ONU – Organização das Nações Unidas

PAB – Piso Assistencial Básico

PACs – Programa de Agente Comunitário de Saúde

PBVS – Piso Básico de Vigilância Sanitária

PEC – Proposta de Emenda Constitucional

PIB – Produto Interno Bruto

PPA – Plano de Pronta Ação

Pros – Programação e Orçamentação da Saúde

PSF – Programa de Saúde da Família

PSF/Qualis – Programa de Saúde da Família

RCA – Recursos para Cobertura Ambulatorial

SAI – sistema de informações Ambulatoriais

SDS – Secretaria de Desenvolvimento Social

SESP – Serviço especial de Saúde Pública

SIH – Sistema de Informação Hospitalar

SINPAS – Sistema Nacional de Previdência Social

Sisvan – Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional

IX
SNAS – Secretaria Nacional de Assistência & Saúde

SUDS – sistema unificado e Descentralizado de Saúde

SUS – Sistema Único de Saúde

TFA – Teto Financeiro de Assistência

UMPS – União dos Movimentos Populares de Saúde

X
Palavras chave:

1)- Público e Privado no Direito; 2) História da atenção à saúde no Brasil; 3) SUS e


Saúde Suplementar no Brasil; 4) Mudanças demográficas e saúde; 5)
Compartilhamento público e privado.

XI
Resumo

Cordeiro Filho, Antonio.

O Público e o Privado na Saúde:

“o processo de mudança da prestação de serviços de saúde no Brasil num contexto


histórico e comparativo; propostas e reflexões para o futuro”.

Esta tese discute as relações entre o setor público e o setor privado de saúde no
Brasil. O assunto é extenso, vem sendo discutido há várias décadas e as análises
apontam para vários ângulos da questão.

O mercado de saúde suplementar no país é composto por mais de 45 milhões de


beneficiários. Apesar do seu tamanho, o setor se desenvolveu à margem de um
regramento oficial até 1998, com a promulgação das Leis 9.656/98 e 9.961/00.

Os agentes mais presentes nas discussões foram e vem sendo os prestadores


privados de serviços na saúde. Houve alguns consensos quanto à Reforma do Estado,
e na saúde, sobre o papel das agências reguladoras, no que se refere à efetividade
dos contratos, pré-regulação e participação ou interferência do Judiciário no processo.

Os objetivos do trabalho foram:

a) discutir o que é conceituado como público e privado na área do direito;

b) as relações entre o sistema público e o setor privado no Brasil, desde a Colônia, até
os dias atuais, após a implantação do SUS no país;

c) as implicações das mudanças demográficas para o sistema de saúde;

d) e apresentar uma proposta de compartilhamento futuro entre os setores público e o


privado no sistema de saúde.

Metodologia:

recorreu-se a várias fontes e instrumentos: pesquisa bibliográfica, pesquisa


documental, bancos de dados existentes, textos originários da área de história da
medicina e da saúde no Brasil, artigos sobre as mudanças demográficas e sistemas
de saúde em vários países e duas entrevistas com o responsável pela Associação
Brasileira de Medicina de Grupo- ABRAMGE, e um ex-Diretor da Agencia Nacional de
Saúde Suplementar- ANS.

Após a análise do material encontrado nas fontes pesquisadas, apresentou-se nas


Considerações Finais, uma proposta de Compartilhamento futuro entre os dois setores
no Brasil.

XII
Abstract

Cordeiro Filho, Antonio.

The Public and the Private in Health:

"The process of changing the provision of health services in Brazil in a historical and
comparative context; proposals and ideas for the future."

This thesis discusses the relationship between the public and private health segment in
Brazil. The matter is extensive, has been discussed for several decades and the
analyses pinpoint several views of the issue.

The supplementary health insurance market in the country is made up by more than 45
million beneficiaries. Despite its size, the segment grew at the edge of an official ruling
until 1998, with the enactment of Law 9656/98 and 9961/00.

The ever present agents on these discussions have been the private providers of
health services. The State Reform achieved a small degree of consensus, and so did
health concerning the role of regulatory agencies regarding the effectiveness of
agreements, pre-regulation and involvement or interference of the Judiciary in the
process.

This work was intended to:

a) discuss what is regarded as public and as private according to the legal field;

b) the relationship between the public system and the private segment in Brazil, since
the Colonial Period until today, after the introduction of the Single Health System (SUS)
in the country;

c) the implications of demographic changes in the health system;

d) and present a proposal for future sharing between the public and private segments
in the health system.

Methodology:

several sources and tools were used: bibliographic research, document research,
existing databases, texts from the areas of history of medicine and health in Brazil,
articles on demographic changes and health systems in several countries, and two
interviews with the head of the Brazilian Association of Group Medicine (ABRAMGE)
and a former Director of the National Agency of Supplemental Health (ANS).

After examining the material found in the sources researched, a proposal for future
sharing between the two segments in Brazil was presented in the Final Considerations.

XIII
Indice

Introdução ..................................................................................................................01

Capítulo 1 – O público e o privado no Direito ........................................................08

O público e o privado na Saúde ............................................................18

A Saúde Pública e a história..................................................................22

Doenças preocupantes / A febre amarela e assemelhadas .................23

O agregado do saber médico e as escolas ...........................................25

Espaço do Terceiro Setor e cidadania – Orbitando entre o Público e

o Privado ................................................................................................26

Políticas públicas, ONG’s e PPA’s. ..................................................... 28

O aprendizado com a Igreja e a Universalização ..................................34

Capítulo 2 – Saúde no Brasil : da Colônia ao Pacto pela Saúde (2006)..............36

Brasil – Monarquia e Saúde ..................................................................40

Criação das primeiras Escolas Superiores ...........................................41

Desenvolvimento e aumento das Escolas Superiores .........................43

A República e a Saúde .........................................................................47

As Caixas de Aposentadoria e Pensões – CAP’s ................................53

O apoio da Igreja Católica; a Filantropia e outras Instituições ..............65

O início das integrações Públicas, Privadas, ONG’s e PPA’s ...............68

Novos e antigos dados comparativos ....................................................79

O processo de unificação da Saúde Pública e a criação do SUS .........81

A descentralização do SUS ...................................................................84

O financiamento da Saúde e seus aspectos políticos e gerenciais /

Fontes, fundos e procedimentos ............................................................86

Receitas dos municípios / Próprias estabelecidas pela Constituição.....91

XIV
Pactos / Saúde / 2006 – apresentação / Pacto pela vida – Exemplo.....93

O Pacto em defesa do SUS e o Pacto de Gestão ..................................94

Capítulo 3 – Saúde Supletiva no Brasil: relações com a Saúde Pública............95

Marco Regulatório – Lei 9656/98 ..........................................................105

A criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS ...........105

Segmentos na Saúde Privada ..............................................................111

Comentários e Avaliações gerais .........................................................123

Judicialização da Saúde .......................................................................125

Dados e reflexões ................................................................................129

A alta complexidade e as aproximações Público / Privada..................145

Convergências complementares...........................................................150

Capítulo 4 – Mudanças demográficas: repercussões no setor saúde..............151

A construção e estudo de indicadores ................................................152

Mudanças sociais e epidemiológicas no Brasil...................................153

Mensurações demográficas gerais .....................................................153

Os idosos e a longevidade ...................................................................157

Tecnologias, genética e futuro – no caminho da Saúde Pública e

Privada ................................................................................................164

Controle das populações nos vários países e Saúde .........................167

Controle no Brasil ................................................................................167

Home Care e a A Telemedicina ..........................................................169

Custos e riscos envolvidos ..................................................................171

Análise e prospecção ..........................................................................171

A invalidez ...........................................................................................173

XV
Capítulo 5 – Sistemas de Saúde no Mundo: custos da atenção à saúde........174

Doenças, epidemias nos séculos XVIII e XIX ......................................176

A criação da OMS – Organização Mundial de Saúde ..........................178

Novos rumos para a Saúde no Brasil e em outros países ...................180

Gastos em Saúde .................................................................................181

Sistemas de Saúde em diferentes países – Austrália ..........................183

Nos EUA ...........................184

No Reino Unido ............... 191

Na China ...........................193

No Canadá ...................... 194

No Chile ........................... 196

Em França ....................... 198

Na Alemanha ....................199

No Japão ...........................202

Na Holanda........................203

Visão no Brasil ..................205

Cobrança do Estado para os planos de Saúde.....................................207

O Direito do consumidor no estrangeiro ...............................................208

Considerações finais – As propostas

Compartilhamento entre o Público e o Privado .....................................211

O Compartilhamento na alta complexidade ..........................................216

Outras propostas – o Capitation ............................................................218

Poupança Saúde ou Previdência Saúde ...............................................225

Padronização de Normas e Formulários ...............................................226

XVI
Programas de Acreditação e Qualificação...............................................................227

Capitation odontológico ..........................................................................................228

Propostas para a ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar ..................... 229

O Brasil e os modelos do futuro ..............................................................................232

Anexo I – A Genética e a Declaração do Milênio ...................................................234

Anexo II – Entrevista - Dr. Arlindo de Almeida (Presidente da ABRAMGE)..........237

Anexo III – Entrevista com Dr. Fábio Fonseca – ex-Diretor da ANS .....................252

Tabelas:

Tabela I

ONG’s brasileiras / relações / agências de Cooperação / País de Origem...............30

Tabela II - Tipo de Agente financiador na composição da Receita das ONG’s........30

Tabela III – Quantidade de AIH’s por Estados ..........................................................88

Tabela IV – Grupos de interesse na Saúde ............................................................103

Tabela V – Antes da Lei 9656/98 e após a Lei ......................................................115

Tabela VI – Distribuição dos planos por segmento ................................................122

Tabela V – Distribuição de operadoras ..................................................................136

Tabela VI – Concentração de beneficiários ............................................................138

Tabela VII – Operadoras registradas / Região .......................................................147

Tabela VIII – Gasto anual per capita / Saúde .........................................................181

Gráfico:

Gráfico 1 – Fluxo Financeiro / SUS .........................................................................92

Bibliografia .............................................................................................................257

Webgrafia ..............................................................................................................267

XVII
Introdução

As mudanças na área de saúde não param, na perspectiva de atender às


necessidades, oferecer melhor acolhida e solução aos problemas da população.
Afinal, “saúde não tem preço”, mas não se pode esquecer que ela “tem custo”. No
Brasil também muitas foram as mudanças nas últimas décadas: várias delas
contempladas nas Diretrizes Operacionais dos Pactos pela Vida, em Defesa do SUS e
de Gestão, firmados entre os três níveis de governo em 2006.

A regionalização é diretriz do Sistema Único de Saúde e um eixo estruturante do Pacto


de Gestão, devendo orientar a descentralização das ações e serviços de saúde e os
processos de negociação e pactuação entre os gestores no Brasil. Os principais
instrumentos de planejamento da regionalização são o Plano Diretor de
Regionalização – PDR –, o Plano Diretor de Investimento – PDI – e a Programação
Pactuada e Integrada da Atenção à Saúde – PPI –, detalhados no corpo daquele
documento. Constitui, portanto, um processo de aprimoramento do SUS.

Ele deverá expressar o desenho final do processo de identificação e reconhecimento


das regiões de saúde, em suas diferentes formas, em cada estado e no Distrito
Federal, objetivando a garantia do acesso, melhoria no atendimento e acolhimento, a
promoção da eqüidade, a garantia da integralidade da atenção e o que é mais
importante: a qualificação do processo de descentralização, a racionalização de
gastos e otimização de recursos.1 Também em relação ao setor privado de saúde, o
processo vem mudando, e nesse sentido, a ANS – Agência Nacional de Saúde
Suplementar – ANS, vem alterando processos, controles, cobertura de novos
procedimentos, adequações de planos, e exigindo maior abrangência, acolhimento
dos usuários e promoção da saúde no setor privado.

Como exemplo dessa dinâmica, a partir de 28 de julho de 2011 os milhões de usuários


de planos de saúde do setor privado, podem trocar de operadora sem precisar cumprir
novos prazos de carência. O prazo de 90 dias estabelecido pela ANS - Agência
Nacional de Saúde Suplementar - para que as operadoras se adaptassem à nova
regra terminou no mês de julho de 2011. Há também mais de 50 procedimentos
médicos novos que deverão ser atendidos pelos planos de saúde individuais. Esses
movimentos nos setores - público e privado - da saúde levam a entrelaçamentos que
serão apresentados neste trabalho, e que podem apontar para futuros
compartilhamentos, alguns dos quais até já estão existindo, mas por meio de
processos ainda não visíveis a todos.

Na atividade pública de saúde essa dinâmica caminha também a passos largos. O


SUS não pode ser invisível pela população, meios acadêmicos e outros conjuntos da
sociedade. A revista inglesa The Lancet registrou para a comunidade internacional a
experiência brasileira de construção de um sistema único e universalizado de saúde.
Há diversos artigos de pesquisadores que analisam a situação epidemiológica do
Brasil, ressaltando os avanços na saúde materno-infantil, os sucessos e desafios no
combate às doenças infecciosas e crônicas, os impactos individuais e coletivos da

1
- Série - Pactos pela Saúde – 2006 - volume 1

1
violência. O desafio da saúde brasileira é político, de articulação entre governos e
sociedade e de revisão das relações que subordinam o público ao privado, alertam os
pesquisadores ingleses. 2

Os projetos de pesquisa já envolvem analises e preocupações com as relações entre


a saúde e o meio ambiente, como pode ser conformado pelos trabalhos apresentados
no 5.º Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde (USP, abril de
2011). Os estudos realizados pelo capital sobre as áreas sociais, como é o caso da
saúde, devem também conter uma visão humanista e social e seus resultados
aplicados com o objetivo de proporcionar melhores condições de trabalho, higiene,
saúde e segurança às pessoas que enfrentam diariamente jornadas de trabalho.

As obras da Usina de Jirau, em Rondônia, é um exemplo recente de como as mega


empreiteiras brasileiras são capazes de submeter trabalhadores a condições indignas
de vida e trabalho: alojamentos inadequados, falta de equipamentos de segurança,
tempo para refeições, jornadas extenuantes sem pagamento de horas extras e
agressões físicas, estão entre as irregularidades encontradas pelo Ministério Público.
Isso também é problema de saúde a ser enfrentado. Tudo, socialmente, está
entrelaçado. 3

Essas discussões ocorrem em muitos países. Um exemplo é do hospital privado


australiano que irá compartilhar serviços com o setor público, tendo em vista reduzir as
lacunas de atendimento na região de Queensland. É de certa forma um
compartilhamento por regionalização. Outro hospital está em construção em Kawana,
na Austrália, um hospital privado no qual haverá um compartilhamento do corpo clínico
com hospitais públicos. A obra é estimada em 20 milhões de dólares australianos, cujo
valor se aproxima de 33,5 milhões de reais e deverá estar terminado em 2014. A troca
de profissionais irá reduzir a lacuna por serviços em Queensland, melhorará o
atendimento e vem ao encontro das necessidades da crescente população idosa. Este
é um exemplo de inovação e criatividade que passa por cima de convenções,
ideologias e situações criadas, provando que a necessidade das partes interessadas é
o que importa e que deve comandar as decisões políticas e administrativas.

A preocupação e discussão sobre a área de saúde é constante e vem de longe. A


Administração em Saúde é um assunto muito discutido hoje no Brasil, e as bases de
sua prática têm raízes nos Estados Unidos, na visão norte-americana de como os
recursos para a saúde devem ser planejados e distribuídos, embora os americanos, na
atualidade não possam ser espelho de saúde para a sua população. A primeira fase
teve seu início em 1923, quando um pequeno número de médicos brasileiros voltou ao
país após graduarem-se em saúde pública na renomada universidade norte-americana
de John Hopkins.

Nesse mesmo ano, um grande congresso médico reuniu especialistas em saúde


pública de todo o país em Belo Horizonte. Nessa ocasião, os conceitos trazidos do
exterior foram divulgados nacionalmente. Um dos principais conceitos divulgados foi o

2
- Fonte: Revista Radis – número 107 – julho de 2011 – Editorial.
3
- Fonte: Revista Radis – número 107 – julho de 2011 – Editorial.

2
do "health center", adotado e traduzido para a nossa realidade como o "Centro de
Saúde", que dominou a saúde pública brasileira durante cinqüenta anos, a partir de
então. Dentre os brasileiros ilustres que estudaram nessa universidade destacava-se o
médico Marcolino Candau4 um dos mentores da criação e o primeiro diretor-geral da
Organização Mundial da Saúde, cargo que ocupou durante 25 anos, até meados da
década de 1970.

Mas até então médicos de várias especialidades dedicavam-se, de forma superficial e


não especializada, ao trabalho administrativo, que muitas vezes era diretamente
relacionado à prática médica, como por exemplo, os médicos coordenadores dos
antigos Institutos de Aposentadoria e Pensões nos anos 30. O primeiro curso
universitário para formação de administradores hospitalares foi criado nos Estados
Unidos no ano de 1934, na Universidade de Chicago. Desde então, mais de duas
centenas de cursos de graduação e pós-graduação surgiram nos Estados Unidos,
movimento que se ampliou globalmente.

Por outro lado, na atualidade, existe uma preocupação dos médicos e de suas
entidades representativas, como a Associação Médica Brasileira (AMB), em reavaliar
constantemente os procedimentos e terapêuticas, substituindo-os por outros de maior
eficácia e com menor possibilidade de efeitos adversos. Isso justifica a retirada da
prática clínica de equipamentos obsoletos e a incorporação de outros mais modernos
e eficientes. A AMB e o CFM trabalham num rol de procedimentos, batizado de
Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos, com o objetivo de
informar e disponibilizar para os cidadãos a integralidade da medicina moderna. A
elaboração dessa lista segue parâmetros técnicos e científicos. São critérios como
estes que norteiam decisões públicas que interferem na saúde da população.

Com base na minha experiência de muitos anos como profissional Atuário e Diretor de
empresa do setor de prestação de serviços na saúde - operadora – detectamos as
necessidades presentes e futuras dos setores abrangidos, quais sejam as operadoras
ou empresas de assistência médica, e buscamos compreender o que pensam os
gestores do setor privado sobre os vários aspectos da regulamentação da ANS
atualmente em vigor.

Muitas foram as discussões a respeito e algumas delas foram apresentadas


previamente aos gestores das empresas operadoras de assistência à saúde, o que
enriqueceu o debate, sobre os seguintes aspectos:

4
Para evitar a falsa impressão de que o Brasil não contou com importantes figuras nas organizações relacionadas com
as Nações Unidas, mencionam-se algumas que exerceram um papel relevante neste cenário internacional,
destacando-se outros que também prestaram importantes serviços para todo o mundo. O que se lamenta é que só
recentemente vem se reconhecendo que o Brasil, como um dos países emergentes, deve assumir maiores
responsabilidades, pois dispõe de profissionais que vinham se concentrando em assuntos brasileiros, mas que podem
ampliar suas influências internacionais. Um dos primeiros brasileiros foi o Dr. Marcolino Gomes Candau, ex- diretor
geral da Organização Mundial de Saúde em Genève, na Suíça, que ficou no seu comando por longos vinte anos de
forma que a instituição ficou conhecida pela participação dos brasileiros. (Fonte: site da Ásia comentada por Paulo
Yakota). http://www.asiacomentada.com.br/2011/06/brasileiros-importantes-nos-organismos-das-nacões-unidas/
(Acessado em 02/08/2011).

3
a) Possibilidades de assegurar ao beneficiário, cobertura integral e regular às
condições de acesso aos planos de saúde; como reagem os operadores relativamente
ao aumento do alcance da ANS em relação a sua interface de trabalho com a
população e o Ministério da Saúde; o que pensam as operadoras sobre a definição e o
controle das condições de ingresso, operação e saída das empresas e entidades que
operam no mercado;

b) Verificação da validade e do funcionamento dos mecanismos legais de garantias


assistenciais e financeiras, como as provisões obrigatórias, que assegurem a
continuidade da prestação dos serviços de assistência à saúde contratados e os que
poderão advir de novas contratações;

c) Transparência e garantia da integração do setor de saúde suplementar ao SUS de


forma compartilhada e o ressarcimento de gastos gerados por beneficiários do sistema
público que são portadores de planos de saúde;

d) O que pensam os operadores sobre o estabelecimento de mecanismos de controle


e abuso de preços e a satisfação das necessidades do sistema de regulamentação,
normatização e fiscalização do setor de saúde suplementar;

e) Posicionamento da ANS face aos problemas de prestação de serviços em saúde no


geral e sua posição em relação a saúde das camadas de maior poder aquisitivo, e
discussões sobre o duplo pagamento, ou seja, recolhimentos ao INSS e, ao mesmo
tempo, pagamento de um plano ou seguro de saúde;

f) Alta complexidade, seus custos e suas implicações de impacto no sistema geral de


assistência à saúde e verificação da perspectiva de aumento da quantidade de
beneficiários, fazendo alterações no status quo;

g) Discussão das possibilidades de apresentar “fatores moderadores”, flexibilização de


coberturas, na utilização de planos via empresas com o objetivo de reduzir preços
finais;

h) Verificação das relações de compartilhamento entre o que acontece na saúde


suplementar e o que acontece na saúde pública e análise do posicionamento da ANS
em relação à prestação de serviços de saúde aos brasileiros;

i) Reflexão sobre o atual estágio da saúde suplementar e sobre os atores corporativos


para que se possa tomar novas decisões de direcionamento e rediscussão das
possibilidades de reduções consideráveis nos preços dos planos de saúde em vista de
novas estratégias que possam ser adotadas, aumentando o mutualismo com planos
empresariais coletivos - na forma do capitation - oferecidos para as micros, pequenas
e médias empresas;

j) Considerações se a alta complexidade é um entrave comercial para o


desenvolvimento do mercado e das pequenas operadoras de planos de saúde ou é
benéfica.

4
k) Modelos econométricos mais sofisticados para obtenção de precificações de planos,
conforme histórico do usuário e tempo de exposição ao risco.

l) Questionamento sobre a necessidade ou não de um índice econômico somente para


o setor de saúde com o objetivo de deixar claro aos consumidores os problemas
gerados por aumento ou reajuste das mensalidades.

As Políticas de saúde, por sua vez, não podem passar apenas por negociações
políticas nem merecer tratamento meramente econômico. Se não houver critérios
técnico-científicos, não se consolidará um SUS integral e de qualidade. O processo de
discussão entre o público e o privado e sua visão no Direito, com destaque para a
saúde, é tema fundamental de discussão e debate nas políticas de saúde. Eles são
identificados como relativos à bioética e suas formas de enxergá-los, de tratá-los, da
saúde das pessoas e de como viver melhor. Pesquisar e refletir sobre essas relações
públicas e privadas faz parte do processo de todas as sociedades. As mudanças
demográficas, as aglomerações nas grandes cidades, o processo de saúde versus
doença estão na pauta das discussões também.

A Constituição Federal de 1988 definiu claramente o conceito de saúde e estabeleceu


o Sistema Único de Saúde – SUS - ampliando as ações que tiveram como meta a
promoção e proteção social da saúde, equidade, maior visão sanitária e com isto,
promover a justiça social. mas chegar até aí foi um caminho árduo, difícil.

Quanto ao setor privado na Saúde, a Constituição de 1988 também deixou claro que
ele poderia conviver com o setor público. Juntos poderiam melhorar o quadro de
saúde no Brasil. Vinte e cinco anos depois há ainda muitas arestas para serem
aparadas, mas o eixo central está contemplado.

No Brasil, o aumento da população e consequentemente das famílias, por exemplo, foi


uma necessidade contemplada pela NOB/96, mas as experiências começaram a
desenvolver-se a partir de 1994, com objetivos de ampliar o que se denominava de
Atenção Básica em Saúde. Destinaram-se mais recursos federais para implantação de
equipes de um novo programa, que se denominou Programa de Saúde da Família.

Considerando-se as mudanças demográficas no país e seus reflexos na saúde,


percebe-se que será necessário dar atenção ao envelhecimento, não só sobre os
aspectos de saúde, mas também emprego, proteção, previdência, seguros, bens de
consumo, qualidade de vida e hospitais especializados. Enfim, uma estrutura de
saúde, pública e privada, bem diferente da atual, será necessária nos próximos 30
anos. A profissão de “cuidador”, com certeza, será bem vinda, e brevemente deverá
contar até com sindicatos, piso mínimo e outros elementos vinculados a estrutura do
trabalho de ocupações especializadas.

A longevidade é um fenômeno que está acontecendo há algumas décadas. É um


processo que se destaca em vários países. Nota-se, nos estudos de Demografia, que
a cada censo, opera-se uma taxa de mortalidade diferente e que está havendo óbitos
mais tardiamente. Os estudos levam a crer e convém frisar que os critérios para
caracterização da estrutura etária de uma população são bastante variados para efeito

5
de análise. Um destes critérios é o que caracteriza a população em progressiva,
estacionária e regressiva, cujas descrições mais completas fazem parte do capítulo 3
deste trabalho.

O índice de envelhecimento de uma população é apresentado como a relação entre o


número de pessoas com mais de 60 anos ou mais e o de jovens, com menos de 20
anos. Segundo a ONU uma população está envelhecendo quando 7% de seus
habitantes passam de 65 anos.

De resto o que é permitido em termos de comparações entre o Brasil e outros países,


aponta para novos ideários, políticas, controles, também fazem parte das
considerações finais. Fica claro, todavia, que o assunto é inesgotável e em todos os
países do mundo a Saúde, tanto pública, como privada são partes do processo de
idealização que todos desejam, mas difíceis de atingir.

Os objetivos deste trabalho foram:


Geral: discutir o que é conceituado como público e privado;
Específicos:
a) o que a história do setor saúde no mundo e no Brasil apontam sobre a questão;
b) quais os desafios que se apresentam para o desenvolvimento do setor privado no
país;
c) discutir a regulamentação que a Agência Nacional de Saúde Suplementar- ANS
vem desenvolvendo em relação ao funcionamento do setor privado;
d) apresentar uma proposta para as relações entre esses setores no futuro.

Para tanto, desenvolveu-se a seguinte Metodologia:


a) pesquisa bibliográfica: discussões filosóficas originárias da área do Direito, a
respeito do que é definido como Público e Privado e, suas análises na saúde e na
sociedade;
b) acesso a bancos de dados e pesquisas qualitativas sobre o tema;
c) pesquisas sobre o crescimento populacional e envelhecimento da população, bem
como de suas repercussões sobre o sistema de saúde, como referência
complementar;
d) resgate histórico sobre a atenção à saúde no Brasil, desde o período Colonial até a
definição do Pacto pela Vida, Saúde e SUS (2006), considerando as várias
Constituições Federais do país até a Constituição de 1988;
e) referências sobre como outros países vêm enfrentando as consequências das
mudanças demográficas da população e dos custos crescentes da atenção à saúde;
f) duas entrevistas semi-estruturadas: uma com o Diretor da ABRAMGE – Associação
Brasileira das Empresas de Medicina de Grupo, uma das modalidades de atenção à
saúde do setor privado no país, e outra com um ex-Diretor da ANS Agência Nacional
de Saúde Suplementar.

No capítulo 1: abordagens e as discussões filosóficas sobre a questão do Público e do


Privado na área do Direito.

No capítulo 2: contempla-se a trajetória histórica do sistema de atenção à saúde no


Brasil, desde o período colonial, até os dias atuais, considerando a definição e

6
implantação do Sistema Único de Saúde em 1988 e a aprovação do Pacto
intergovernamental pela Vida, em defesa do SUS e pela gestão do sistema, em 2006.

No capítulo 3: concentram-se as discussões e informações sobre o Sistema Supletivo


de Saúde no país, especialmente no que se refere aos processos de regulamentação
de suas atividades pela ANS.

No capítulo 4: ressaltam-se as mudanças demográficas que estão ocorrendo no


mundo e no país, especialmente com o envelhecimento da população, e as
repercussões desses processos na atenção à saúde e nos custos financeiros do
sistema de saúde.

No capítulo 5: apresentam-se os sistemas de saúde dos diversos países e como estão


enfrentando as mudanças demográficas, epidemiológicas e os custos crescentes de
assistência à saúde.

Considerações Finais: partindo das discussões apresentadas nos capítulos anteriores,


apresentamos uma proposta de compartilhamento entre o setor público e o privado no
Brasil, denominado de Captation.

7
CAPÍTULO 1

O público e o privado no Direito

Qualquer que seja a reflexão ou discussão a mesma deve ser dirigida ao ser humano,
centro natural de tudo que se objetiva. O foco deve ser em seu sentido mais amplo,
considerando suas necessidades, alegrias, angústias e principalmente seus direitos.
Numa breve abordagem histórica, vamos encontrar traços das declarações de direito
nos forais e até em cartas de franquia da idade média. A opressão do absolutismo
sempre foi mola mestra dessas declarações. Existem algumas como a Declaração do
Estado de Virgínia em junho de 1776, todavia a mais conhecida é a dos Direitos do
Cidadão de 1789, editada pela Revolução Francesa. 5 Os direitos fundamentais ou
direitos dos homens são os direitos subjetivos dos indivíduos que vinculam e limitam o
exercício do poder do Estado e dos particulares. O entendimento maior é o de direitos
civis, políticos e de cidadania. Direito à vida, direito à privacidade, a integridade moral
e cívica. Tais direitos são pressupostos elementares de uma vida humana livre, tendo
por objetivo a autonomia das pessoas que é a liberdade face ao Estado para se ter
uma vida digna.

Esses são os paradigmas institucionalmente garantidos e limitados no espaço


temporal independentemente se isto ocorre em virtude da atuação de um poder
privado ou do público. Os Direitos Fundamentais estão inseridos dentro daquilo que o
Constitucionalismo denomina de princípios constitucionais fundamentais, que são os
princípios que guardam os valores fundamentais da Ordem Jurídica. Bobbio (1987) diz
que o problema da discussão e dialética dos Direitos Fundamentais teve sua solução
atual na Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada em Assembléia Geral
das Nações Unidas em 10/12/1948, onde se lê a proclamação dos direitos pessoais
dos indivíduos.

Numa parte o direito à vida, à liberdade e à segurança. Em outra parte encontram-se


expostos os direitos do indivíduo em face das coletividades: direito à nacionalidade,
direito de asilo para todo aquele perseguido com exceção de crime de direito comum,
direito de livre circulação e de residência, tanto no interior como no exterior e
finalmente o direito de propriedade. Mais à frente em outro grupo são expostas a
liberdade pública e os direitos públicos: liberdade de pensamento, de consciência e
religião, de opinião e de expressão, de reunião e de associação, princípio na direção
dos negócios públicos e finalmente figuram os direitos econômicos e sociais: Direito ao
trabalho, à sindicalização, ao repouso, à saúde e à educação.

5
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 – Os representantes do povo francês, constituídos em
assembléia nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do homem são as
únicas causas das desgraças públicas e da corrupção dos governos, resolveram expor em declaração solene os
Direitos naturais, inalienáveis e sagrados do Homem, a fim de que esta declaração, constantemente presente em todos
os membros do corpo social, lhes lembre sem cessar os seus direitos e os seus deveres; a fim de que os atos do Poder
legislativo e do Poder executivo, as instituições políticas sejam por isso mais respeitados; a fim de que as reclamações
dos cidadãos, doravante fundadas em princípios simples e incontestáveis, se dirijam sempre à conservação da
Constituição e à felicidade geral.
http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/legislacao-pfdc/docs_declaracoes/declar_dir_homem_cidadao.pdf (acessado em 15/05/2009).

8
Havendo subordinação de alguma das partes seu poder de autodeterminação resta
aniquilado, não havendo como se cogitar de aplicação do princípio da liberdade.
(Guimarães 2006)

Como é que se poderia imaginar que qualquer pessoa teria sua dignidade garantida se
não lhe fosse assegurada por Direito, decente qualidade de vida? Por isso o Direito é
o principal objetivo – instrumento normativo – de concretização do discurso e das
promessas políticas. O Direito serve à Política, mas o Direito é o limite da Política. 6 Se
não lhe fosse garantida sadia qualidade de vida, como é que se poderia afirmar a
dignidade? A dignidade humana é um valor já preenchido a priori, isto é, todo ser
humano tem dignidade só pelo fato de já ser pessoa, pois como se diz, é difícil a
fixação semântica do sentido de dignidade, mas isso não implica que ela possa ser
violada.

Os direitos fundamentais nasceram para a defesa de uma esfera de liberdade dos


particulares em face do Estado. Toda a teoria geral dos direitos fundamentais se
construiu em torno deste paradigma. Entretanto, com o desenvolvimento da
sociedade, esta, cada vez mais, passa a ter uma participação ativa no exercício do
poder, antes adstrito ao Estado. Nessa esteira, passa a liberdade individual a ser
ameaçada não só pela ingerência estatal, mas também pelos entes privados
detentores de uma parcela deste poder.

A partir desta constatação, passaram a doutrina e a jurisprudência a se ver


defrontadas com casos em que um ente particular invade a esfera de liberdade
individual de outro, trazendo à baila a questão de se verificar até que ponto também os
particulares estão vinculados aos direitos fundamentais de uns em relação aos outros.
Casos há em que tal vinculação se demonstra mais cristalina, como a questão dos
direitos dos trabalhadores, que a Constituição expressamente apresenta. Em outros
casos, tal vinculação não se mostra tão clara, exigindo maiores reflexões para a sua
configuração.7

Os direitos fundamentais constitucionais são tão importantes que Guimarães (2006),


citando Paulo Bonavides,8 diz:

“Os direitos fundamentais são a bússola das Constituições e a pior das


inconstitucionalidades não deriva, porém, da inconstitucionalidade formal, mas da
inconstitucionalidade material, deveras contumaz nos países em desenvolvimento ou
subdesenvolvimento, onde as estruturas constitucionais, habitualmente instáveis e
movediças, são vulneráveis aos reflexos que os fatores econômicos, políticos e
financeiros sobre elas projetam.”

A teoria dos deveres de proteção, de forma geral, reconduz os problemas da tutela


dos direitos fundamentais às relações entre indivíduo e Estado, entre o Público e o

6
Idem 1
7
Dr. Luis Carlos Martins Alves Jr. Resumo de artigo na revista do site:
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11853 ( acessado em 15/05/2009)
8
Curso de Direito Constitucional – 13ª. Edição - Malheiros Editores, pág. 601

9
Privado e entre o Cidadão9 e o Privado. O Estado não tem apenas o dever de
respeitar os direitos fundamentais dos cidadãos, mas tem o dever de fazer com que os
outros cidadãos os respeitem, e quando não impede a lesão de um direito fundamental
por um particular, na verdade, está a permiti-la, participando assim da violação.
(Guimarães 2006).

Marshall, (1967) sociólogo britânico, que analisou o desenvolvimento da cidadania


como desenvolvimento de direitos civis, seguidos dos direitos políticos nos séculos
XVIII, XIX, introduziu o conceito de direitos sociais, sustentando que a cidadania só é
plena se é dotada de todos os três tipos de direitos e esta condição está ligada à
classe social. 10 Segundo o autor, a cidadania seria composta pelos direitos civis e
políticos – direitos de primeira geração – e pelos direitos sociais, direitos de segunda
geração.

Na segunda metade do nosso século, surgiram os chamados direitos de terceira


geração. Trata-se dos direitos que têm como titular não o indivíduo, mas grupos
humanos como o povo, a nação, coletividades étnicas ou a própria humanidade. 11

Numa ampliação do Direito, no Brasil, houve a inserção dos Direitos da Personalidade


na “Carta Magna” de 1988 que consagra o instituto jurídico em que: os direitos da
personalidade, devido ao seu caráter não patrimonial, têm por objeto bens integrantes
da interioridade da pessoa, isto é, aquilo que é inato à pessoa e deve ser tutelado pelo
Direito. Justamente por serem inerentes à pessoa, caracterizam-se tais direitos por
serem absolutos. Os Direitos de personalidade constituem um ramo do Direito Privado
que protege, na esfera jurídica, os objetos de Direito que pertencem à natureza
humana, tais como a vida, a inteligência, a moral, a autoestima, a dignidade. Nessa
mesma linha de raciocínio estão outros juristas, os quais defendem que a terminologia
correta no Código Civil deveria ser Direito da humanidade e não Direitos da
personalidade, já que o objeto desses direitos refere-se à humanidade, não ao
indivíduo isolado. Devem ser acrescidos ainda os direitos atinentes ao próprio homem,
em seus aspectos moral, intelectual e físico. 12

A análise não é muito simples. Quando se deseja posicionar o Direito em relação ao


Público e ao Privado, principalmente sob o ponto de vista Constitucional entra-se em
seara mais complexa. O processo de evolução é contínuo e já existem os Direitos de
quarta geração. Esses direitos são identificados como relativos à bioética, dessa forma
tentam impedir a destruição da vida e regular a criação de novas formas de vida em
laboratório. Eles podem consistir no direito à autodeterminação, direito ao patrimônio
comum da humanidade, direito a um ambiente saudável e sustentável, direito à paz e
ao desenvolvimento. Necessário pesquisar e refletir sobre essas relações públicas e
privadas.

9
Sugere-se ler “Citizenship and Social Class and Other Essays” – ensaio de 1950 de Thomas Humphrey Marshall –
sobre cidadania – Cambridge Cup.
10
Marshall e os direitos da cidadania – A cidadania tem assumido historicamente várias formas de função nos
diferentes contextos culturais. O conceito de cidadania, enquanto direito a ter direitos, tem se prestado a diversas
interpretações. Entre elas, tornou-se clássica a concepção de T.H. Marshall, que, analisando o caso inglês e sem
pretensão de universalidade, generalizou a noção de cidadania e de seus elementos constitutivos. (Marshal, 1967).
11
Marshall, T.H. (1967) – Cidadania, Classe Social e Status. RJ – Zahar Editores.
12
Dr. Thiago Baldani G. de Filippo em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11853 ( acessado em 15/05/2009)

10
O que é Público? O que é Privado? Ambos no contexto da Saúde, por exemplo –
objeto deste trabalho. Qual a natureza do trabalho em Saúde? Pelas suas
características deve ser somente Pública ou podem existir compartilhamentos? Há
limite para a Saúde Privada? Até onde deve ir a Saúde Pública? Como essas relações
econômicas e políticas na saúde aconteceram nos séculos passados?

Não há como desvencilhar esse novelo histórico sem pesquisar e desenvolver dados e
retrospectivamente às sociedades ocidentais de várias épocas as quais vão desde o
século XVII até o século XX e chegando à atualidade, com clareza de objetivo final,
para que tenhamos uma visão ampla e dialética da formação do que é o público e do
que é o privado.

Para se ter uma visão abrangente dos embates e discussões sobre o Público e o
Privado é fundamental acompanhar a história dos Estados antes e depois das
revoluções, desde o século XVII, com sentido democrático ou não, acontecidas no
mundo, principalmente e retrospectivamente, na Europa.

A abordagem inicial deve privilegiar a história das instituições, atores, coadjuvantes e


protagonistas. Na definição de Jepperson (1991)13 , instituições são sistemas de
regras socialmente construídas e reproduzidas rotineiramente que operam como
ambientes limitadores e são acompanhadas de eventos tidos como dados. É na
perspectiva mais ampla das instituições como regras do jogo ou como limites que
estruturam a interação humana que o conceito de instituição é incorporado à análise
de políticas públicas e é dessa forma que foi considerado no estudo da política de
assistência à saúde.14 Menecucci (2007).

É necessário conceituar e definir também o que é território público e território privado,


pois ele é elemento de partida. Tal situação está ligada ao que é particular e ao que é
coletivo. Duas instâncias distintas devem ser as opções para análise: o Estado e a
sociedade civil, que de forma representativa, constituíram a efetiva aplicação do
processamento jurídico. A sociedade civil poderá ser encarada como a instância das
necessidades sociais em que a gênese aos antagonismos econômicos pode gerar
conflitos que poderão acontecer em várias áreas. No caso específico, um desses
conflitos é a Saúde.

O termo privado, em oposição a público, foi associado a idéia de mercado: lugar dos
produtores privados, individuais, desprovidos da função ou da dimensão pública
(estatal). Privado assume desse modo, um forte vínculo com a produção e circulação
de mercadorias e serviços, como o espaço em que operam produtores e
consumidores, individuais e ou coletivos, atuando em seus interesses mais imediatos
e diretos. (Aciole 2006)

13
Apud – Menecucci (2007) – Telma M.G. – pág. 24
14
Menecucci (2007) – pág. 25 e Apud Pierson, 1993, 1994.

11
Romano (1979) aponta que existem três matizes na análise para as questões que
envolvem a sociedade civil e o Estado. A marxista, a liberal e a foucaultiana.15

No caso, a marxista, diz Liguori (2009)16 que o tema da sociedade civil tornou-se o
centro do debate cultural e político no âmbito da chamada revolução neoconservadora
ou neoliberal. Opondo-se radicalmente à concepção do Estado enquanto sujeito
ampliado, para usar uma expressão gramsciana, essa discussão sustenta uma
supremacia da sociedade civil, significando tal supremacia uma forte reivindicação do
não estatal, de sua maior atuação na vida econômica, no mercado, em contraposição
ao Estado do bem-estar social.

O conceito de sociedade civil também foi fundamental para o processo de redefinição,


antes de tudo cultural, por parte de uma determinada esquerda – que, por sua conta
demonstrou a necessidade de abandonar o paradigma interpretativo ligado ao
conceito de classe. Em suma, as concepções que se impõem majoritariamente dentro
da esquerda são de matizes liberais e sinteticamente indicamos como sendo a
supremacia da sociedade civil sobre o Estado; a superioridade do econômico sobre o
político; do privado sobre o público; do mercado sobre a programação estatal e
podemos dizer ainda, conjuntamente com Marx, do burguês sobre o cidadão.

Tais tendências triunfaram no ano de 1989, com a crise dos modelos hiperestatistas e
autoritários do socialismo real e com os limites de gestão governamental apresentados
pelos países social democratas do Welfare State sob o foco liberal. A cultura da
política da direita tornou-se preponderante em forma e conteúdo, sobre a esquerda.
Na verdade, para fugir do conceito de classe, a idéia de cidadania desde então se
tornou central para essa determinada esquerda liberal. Na teoria do indivíduo –
também entendido como ser humano – que faz parte de uma comunidade política
nacional, proveniente do liberalismo clássico, o cidadão aparece fortificado enquanto
portador dos direitos aparentemente iguais e inalienáveis.

Por outro lado, segundo Foucault,17 o Estado é algo imaginário. Não existe a macro-
realidade, mas sim a fragmentação do poder localizado. A família, as instituições,
agremiações e nos dias de hoje poderíamos citar as organizações não
governamentais, empresas. Nos modelos mais próximos do neoliberal essas visões
são um pouco atenuadas.

Na antiguidade, a separação entre o público e o privado nasce na sociedade grega e


se manifesta sob o ponto de vista da privacidade. O cidadão grego pertencia a duas
ordens de existência rigorosamente separadas: sua vida privada, própria do indivíduo,
e a sua vida política, comum a todos. A esfera privada estava ligada a casa, tanto pelo
nome quanto pela posse de bens de produção como terra. (Aciole – 2006).

15
Michel Foucault critica o pensamento liberal, seguindo modelos do positivismo ou teorias produzidas por marxistas.
Ele afirma que o poder é fracionado. Depreende-se de seus textos que: existe uma fragmentação institucional e alguns
seguidores dizem até que “o Estado não existe” – é um “ser imaginário”. (Romano – pág. 24)
Sugere-se ler também a Microfísica do Poder de Michel Foucault.
16
Apud - originalmente em G. Petrônio & M.P. Musitelli – (orgs.), Marx e Gramsci: memória e attualitá (Roma) –
Manifesto libri – 2001 – PP.69-80 – tradução de Tatiana Fonseca Oliveira – acessado em 01/07/2009.

17
Apud – Romano – pág. 24 – O Público e o Privado – Edit. Hucitec - 2005

12
J. Habermas (1984) apresenta pensamento semelhante à Foucault (1994), no que se
refere ao público como aquela instituição – estatal formada pela burguesia – e que –
pressionando o Estado, promove políticas que sejam de interesse da sociedade civil –
limitando assim, o Estado. A instituição estatal teria como contrapartida a chamada
opinião pública, a qual se define pelo conjunto dos cidadãos burgueses que
pressionam as decisões políticas por meio do diálogo na sociedade civil e nos
parlamentos, o que resulta em limitar o Estado.

As propostas de Habermas (1984) ligam-se à universalização trazida pelo século XVIII


e não por acaso um dos autores mais freqüentados por ele é Kant, sobretudo nas
distinções entre o público e o privado, apresentadas pelo filósofo crítico. (Romano –
1979). A partir daí é que se consolidam duas forças: o mercado ou o capitalismo, e a
imprensa. Romano, (1979), destaca que Habermas (1984), diz que o termo “público”, é
um semeador de polissemias, com grande número de significados.

Há outros autores como, por exemplo, Dorner (1974)18 citado por Romano (1979) que
modifica as proposições de Foucault (1994) e Habermas (1984). Ele torna o debate
mais equilibrado. Os termos “recepção pública”, “opinião pública”, “renome público”,
“prédio público ou estatal”, operam o sentido de comum, de interesse geral, coletivo. A
idéia do coletivo, daquilo que é comum, nos remete, na Saúde, principalmente ao
princípio de universalização do direito.

Recordemos que se, para os gregos, a função de legislar não pertencia à esfera
pública, na sociedade moderna essa função não só não adquire tal caráter, como
acaba por perdê-lo. A solução dada para a vida em comum nas sociedades
capitalistas ocidentais passa pela separação entre a sociedade e os espaços
institucionais que se vão corporificando em grandes estruturas. Assim os modernos
parlamentos, embora adquiram ares de representação para a sociedade, na verdade,
sequer parecem reais para a maioria dos cidadãos comuns. (Bobbio, 1987).19

Aciole (2006) complementa que a partir das idéias de coletivo, de pertencimento


comum, e de opinião pública, podemos emprestar a uma coisa ou a um indivíduo uma
força de significação, quando lhe ressaltamos uma atribuição de caráter público, ou de
importância para o coletivo (Habermas, 1984). Essa significação dá lugar, força e valor
intangível a bens, como a saúde, que adquire importância pública, coletiva, mas que
não leva, necessariamente, à supremacia da saúde pública.

Ao empregarmos a palavra “público” em expressões como serviço público ou saúde


pública ela se sobrepõe, quase que imediatamente, à idéia de pertencimento coletivo,
que carrega significados implícitos. Correlato da idéia de que se é de todos não é de
ninguém, em particular, todos indistintamente possam gozar da sensação de que a
possuem, ou seja, a materialidade do pertencimento coletivo está também na
privacidade do gozo e usufruto não só como sensação, mas como consumo de
serviços e ações concretas que poderão ser compartilhadas por todos,

18
Dorner , Klaus – Psiquiatra – Livro “Cidadãos e Loucos” – Editora Taurus – Ano 1974
19
Apud em Aciole – pág. 61

13
simultaneamente. Há vários exemplos. Estádio Municipal do Pacaembu, Hospital das
Clínicas e outros.

Relativamente aos investimentos em infraestrutura podemos destacar a grande


demanda existente para prover a sociedade de serviços como educação e saúde, por
exemplo. Essas são algumas aberturas de licitações públicas em que o sistema
privado de serviços aproveita - nem que sejam de forma parcial – para ajudar a
resolver inúmeros problemas em áreas em que os governantes não têm como dar
velocidade às demandas dos países. Isso acontece na Educação, na Saúde, na Infra
Estrutura e muitas outras áreas, inclusive a da comunicação com as populações.

Conforme Aciole (2006), tal situação acontece no momento em que se encerra a etapa
liberal do desenvolvimento do capitalismo, revelando seus principais defeitos: a sua
incapacidade para proporcionar o pleno emprego, e a sua arbitrária e desigual
distribuição de riqueza e das rendas. Nesta etapa, as formulações keynesianas
revelam a compreensão de que o Estado deve cooperar com a iniciativa privada,
embora jamais justifiquem um socialismo do Estado abrangendo a maior parte da vida
econômica da nação. Para Keynes (1996)20, não é a propriedade dos meios de
produção que convém ao Estado assumir. Suficiente é que seja capaz de determinar o
montante agregado de recursos destinados a aumentar esses meios e a taxa básica
de remuneração aos seus detentores e terá realizado o que lhe compete.

A Saúde – nosso objeto - é um bordado de tudo isso como uma teia complexa e talvez
o mais evidente seja de urgência coletiva. São muitos os exemplos que acontecem e
muitos serão os descritos que já se sucederam no passado. Sader (2000)21 afirma
que:

“uma das características das transformações do campo teórico sob a hegemonia


neoliberal foi a da centralidade do debate em torno do par Estatal-Privado. Como quer
que sejam definidas as esferas públicas e privada, a diferenciação entre elas pode ser
interpretada como refletindo o que pertence ao grupo enquanto tal, à coletividade, e o
que pertence a seus membros individuais ou, de forma mais geral, entre a sociedade
global e eventuais grupos como a família, por exemplo, ou ainda entre um poder
central superior e poderes periféricos inferiores, que tenham relativa autonomia em
relação àquele”.

Na saúde como questão de caráter social, com exigências de serviços, prestadores,


profissionais, hospitais, empresas para diagnósticos envolvendo o mercado de bens e
serviços para a coletividade, isso tudo tem um soar de Público e também de Privado.

Partindo de um pressuposto democrático, presumem-se os conceitos de Público e


Privado, os quais não se limitam ao âmbito do Estado, mas incluem a cidadania.

20
Apud – Aciolle – Keynes J.M. – A teoria geral do emprego, do juro e da moeda. SP – Nova Cultural – 1996 – 352 pp.
(Coleção os Economistas).
21
Sader , Emir Simão

14
Entende-se que a vida pública não é feita apenas de atos de governo, mas também da
atividade cidadã.22 23

Em todo caso, a participação cidadã não pode circunscrever-se apenas à expressão


de interesses setoriais. A primeira pergunta que abre esse ponto assinala a condição
de cidadania como algo que concerne diretamente à res pública. Apela, pois, aos
sujeitos sociais, enquanto cidadãos, ocupados na promoção e defesa de interesses
públicos. Experiências como a do “orçamento participativo” ou dos “comitês municipais
de Saúde”, em vários municípios do Brasil, assim como múltiplas práticas em outros
países, ilustram intervenções orgânicas nesse sentido. (Pereira, Grau – 1999).

É preciso saber onde a sociedade está nessa mistura de relações. Com a Internet, o
cidadão torna-se mais ainda distante daquilo que ele poderia pensar como espaço
público, pois há um novo elemento: o virtual. A confusão para o homem comum e
distante de maiores elucidações acadêmicas torna-se ainda maior quando ele opera o
computador para fazer uma série de atividades. Antes desse espaço virtual que nos
acompanha atualmente a vida era aparentemente mais simples.

Normalmente as redes de televisão privadas são concessões do Público.24 E como


ficam as privatizações nesse contexto de Público e Privado?

A colocação é de um conceito bem mais amplo, pois o que muitas pessoas desejam
como objetivo é a diminuição do Estado, outras, aumentar, mas não se pode esquecer
que, para diminuir o Estado é necessário desregular, que é o fato de mitigar a
intervenção do próprio Estado. Deve-se desmonopolizar e se for o caso ou ainda,
vender ações de empresa que pertence ao Estado ao setor conhecido como privado
ou fazer algum tipo de concessão pública.

São várias as formas e inclusive a terceirização é uma delas. Foram necessidades


liberais numa época em que se desejava diminuir o tamanho do Estado. Os princípios
do liberalismo que tinham como objetivos proteger a igualdade de direitos foi incipiente
para mitigar a desigualdade gerada. Daí as discussões em torno de privado, público,
coletivo, privatização, interesse público, espaço público. São temas que estão
presentes na atualidade. Restam ainda muitas discussões que envolvem outro tipo de
relação entre Público e Privado. É a privatização daquilo que era estatal.

22
A associação de moradores que se mobiliza para arborizar as ruas do bairro cumpre uma função pública
perfeitamente adequada às suas dimensões e ao seu mandato institucional. Não apenas o governo, mas também
pessoas que se aglutinam ao bem comum, organizações e iniciativas privadas, são funções públicas. Essas
organizações não estão no governo agora e não levam normalmente suas idéias ao governo no futuro. Diferem, neste
sentido, dos partidos políticos, cuja função consiste justamente em estabelecer veículos institucionais de passagem da
sociedade para o governo e vice-versa.
23
Imagens de ecologistas amarrados à árvore diante da serra elétrica, de mães expostas à sanha policial na Praça de
Maio, daquele estudante solitário que interrompe o rolar dos tanques numa Avenida de Pequim, da fragilidade de uma
madre Teresa de Calcutá, de jovens fazendo a dança do protesto contra o racismo nos bairros pobres de
Johannesburgo, do milionário que estipula uma vasta doação em seu testamento são emblemáticas entre o público e o
privado. (Fernandes 1994).
24
As concessões de exploração das estradas com cobrança de pedágio são concedidas pelo Poder Público. No Brasil,
Empresas como a Petrobrás e o Banco do Brasil – são um mix de Público, pois 50% das ações são do governo e o
governo é Público. É do contribuinte. Essa dicotomia pode levar a simplificações do tipo: “se é público, por exclusão,
não é privado” ou é não-público e não é bem assim, pois somente fica lógico – como definição – se houver a
contraposição.

15
A palavra privatização é relativamente complicada para ter uma definição simplista.
Ela está situada muito próxima das Ciências da Administração, perto das Ciências
Políticas e de caráter econômico. Há um grande advogado argentino, de nome
Cassagne25 (2001) que faz uma definição até interessante com algumas observações.
Ele diz que:

“A chamada privatização era, até pouco tempo, uma daquelas palavras exóticas que
os dicionários se omitiam de incluir até num certo momento da história. Apenas no
início da década de 80 as novas edições de dicionários e léxicos da América do Norte,
começaram a dar conta de uma definição que fosse satisfatória: popular e embaraçoso
jargão com o objetivo de desintoxicar e desembaraçar o Estado de funções próprias
do setor privado”.

Há outras definições e princípios, por exemplo, na subsidiariedade, no linguajar de


juristas famosos. O princípio da subsidiariedade, embora bem anterior à nova
concepção do Estado de Direito Democrático, assume num certo momento da história,
importância fundamental na definição do papel do Estado. Ele foi formulado, em fins
do século XIX e começo deste século passado, dentro da Doutrina Social da Igreja,
principalmente pelas Encíclicas Rerum Novarum (1891), de Leão XIII, Quadragésimo
Anno (1931), de Pio XI, Mater Et Magistra (1961), de João XXIII e, mais recentemente,
a Centesimus Annus (1991), de João Paulo II. (Di Pietro – 1999).

As discussões sobre o princípio da subsidiariedade nos leva ao socialismo e ao


liberalismo. O socialismo faz intervenções, via Estado, em todos os aspectos da vida
social, enquanto que o liberalismo, ao contrário, faz com que o Estado intervenha o
menos possível na vida das pessoas. O catolicismo – como contexto religioso – possui
uma doutrina intermediária a respeito do assunto. Ele encoraja as sociedades que
nascem da livre iniciativa e nesse aspecto aproxima-se mais do liberalismo
fomentando associações, instituições e reuniões sociais para discussão de assuntos
diversificados. 26

O Direito Público como normas, leis, controles, nasceu depois do Direito Privado. O
Direito Público é decorrente da criação dos Estados no processo histórico. A
expropriação ou desapropriação como utilidade pública é um modelo posterior – a
partir do século XV - ao privado,27 por isso, muito antigo. Antes do final do século XIX,
onde a política clássica tinha seu poder bem determinado e as classes sociais tinham
no seu inconsciente uma atividade para o espaço de liberdade das pessoas, onde a
25
É uma das figuras do Direito Público argentino. Foi eleito por uma revista inglesa em 2001 como um dos cem
advogados mais destacados do mundo.
26
Porém, a doutrina católica reconhece o Estado com responsabilidades na vida social, principalmente como árbitro e
regulador, preenchendo os vazios deixados pela iniciativa privada. A iniciativa do Estado deve ser guiada pelo princípio
da subsidiaridade. A socialização também oferece perigos. Uma intervenção sem exageros do Estado pode constituir-
se de ameaças à liberdade e às iniciativas das pessoas ou de uma comunidade. Por isso a Igreja elaborou algo que é
intermediário, ou seja, o princípio da subsidiaridade.

27
Nem por isso podemos entrar em qualquer rede de TV e fazer um discurso, negar o pagamento de pedágio, discutir
a validade de cobrança de alguns impostos ou entrar nos meandros das plantas industriais da Petrobrás – que é
cinquenta por cento pública - ou exigir atitude unicamente pública do Banco do Brasil. As lógicas e o direito de
cidadania, no sistema estatal, do direito do consumidor no campo do sistema privado devem ser analisadas com
critérios e cuidados.

16
praça era – muitas das vezes o local da discussão e da participação crítica e do
desabafo – para vários tipos de assuntos, o largo ou o espaço público tinham, no
coletivo, comunidades, a influência do poder. Quando há algum desequilíbrio, o que o
Estado faz? O Estado intervém. Essa intervenção, de forma genérica, num certo
momento, dar-se-á pela constitucionalização de uma esfera pública politicamente
ativa, o que corresponde a transferência de competências públicas ou recursos para
entidades privadas. A ampliação da autoridade pública a setores privados está ligada
ao processo de substituição de poder público por poder social. (Aciole – 2006).

O espaço público é a fonte das funções de crítica e controle que a sociedade exerce
sobre a coisa pública. Está plasmado, em primeira instância, nos parlamentos, nos
partidos políticos e na imprensa, através dos quais se configura a vontade e a opinião
política. Mas, nos umbrais do século XXI, adquire máxima importância a ampliação do
espaço público, tanto porque tais instituições atualmente se revelam insuficientes para
o exercício da cidadania, como porque, na medida em que a esfera pública transcende
cada vez mais os limites do Estado, requer modalidades de controle social que
também se exerçam sobre a sociedade e, em particular, sobre as organizações
públicas não estatais. Tudo isso certamente, não supõe o desconhecimento da
importância das instituições tradicionais para o desenvolvimento da democracia.
(Pereira e Grau – 1999).

Pierre Bourdier (2002) 28 diz que o Estado, é por definição nem público e nem privado.
Ele é um espaço de disputa entre os dois. Não é um espaço vazio. Sua estrutura
burocrática-repressiva condiciona a luta entre os dois. Nesse meio está a política.

O aparecimento do social, com significado diferente do de política, é contribuição


Romana para a modernidade, pois, para os gregos, nem mesmo havia por que e como
estabelecer tal distinção, mercê da relação que instituíam nas fronteiras entre ambas,
a partir do reconhecimento de que o homem possuía duas condições de existência:
aquilo que lhe pertencia – sua vida e sua casa e aquilo que era comum com os outros
homens, e que se exercia e era vivido na praça pública. (Aciole 2006).

Interessante notar observações destacadas por Aciole, (2006), comentando o fato de


que nessa discussão entre o público e o privado, as divergências de pensadores como
Arendt (1999) 29 e Marx (1993 e 1998) decorram de que observaram a realidade de
perspectivas diferentes, salientando que nenhum dos dois jamais acreditou nas leis do
mercado como solução para os problemas do homem moderno. Diz Aciole (2006) que
afinal não se pode confiar que o mercado se mova sempre tendente ao equilíbrio e
seja capaz, por si próprio, de resolver os problemas atuais da sociedade. 30

28
Apud – Sader, Emir Simão – Interventions (1961-2001) – Paris Agone, 2002.
29
Apud – Aciolle 2006 – pág. 39
30
Tais reflexões mostram que de fato, na atualidade, se analisarmos a crise americana que se espalhou pelo mundo a
partir de 2007 necessitou, quase que sem exceção, do Estado para intervir nas relações da sociedade, ou seja, sem o
Estado provavelmente a crise poderia ter tentáculos extremamente perigosos para todo o mundo. Resta ainda,
salientar o esforço do novo presidente americano, eleito, em 2008, Barack Obama com intervenções jamais
imaginadas por pensadores presentes ou do passado. Tal subsidiariedade – sob a forma efetiva de subsídio ao
capitalismo – com objetivos sociais - aconteceu também na Europa, América do Sul e Países Asiáticos.

17
Percebemos de antemão o mix entre o que é individual e o que é coletivo.31 Para
melhor entendimento, necessário se torna a delimitação de espaço. Haver regras e
constituírem-se instituições e estatutos. No público, muitas das vezes há grandes
privatizações ou individualidade de interesses. Isso se observa na condução de
algumas políticas públicas. As autoridades são as que mais conduzem essas relações
de aproximações entre o público e o privado.

Público e Privado na Saúde

Aciole (2006) destaca que no caso específico de Saúde, é de fundamental importância


distinguir esse processo. A compreensão do processo saúde-doença e das práticas
médico-sanitárias, por sua vez, tem sido predominantemente inserida no paradigma
explicativo dos determinantes sócio-históricos. A Saúde fica compreendida como uma
política social resultante das relações históricas entre capital e trabalho, a exemplo do
que apontam, por exemplo, Donnangelo (1976), Fleury (1994, 1997), Merhy (1992) e
Schraiber (1993).

Os estudos do setor Saúde têm reconhecido a Medicina e a Saúde Pública como


campos de organização das ações de saúde, que utilizam saberes tecnológicos
distintos e, portanto expressam uma dada compreensão do que é, para cada uma, o
processo saúde-doença e, ao serem práticas sociais que operam saberes tecnológicos
distintos, são práticas produzidas e produtoras de ideologias. Não é suficiente,
portanto, serem distinguidas em aspectos valorativos.

Nem por isso a Saúde deve ser encarada diferentemente pelo fato de ser Privada ou
Pública. Ideologias à parte, ambas são distintas na forma, mas únicas na necessidade.
Em seu livro a Saúde no Brasil – cartografias do público e do privado, Aciole (2006)
afirma que a Saúde tem acompanhado a história do homem ao longo de sua
existência como espécie e, enquanto tal, tecida em uma historicidade peculiar e
reveladora.

As práticas da saúde estão dentro da história de como uma das várias condições de
sobrevivência das pessoas diante das vinculações existentes entre condições
materiais de sobrevivência e a produção do mundo real pela ação dos homens.

As preocupações com a manutenção de um dos recursos materiais mais


fundamentais, o corpo humano – antes e depois de ser transformado em mercadoria
no modo de produção capitalista moderno – constituíram elemento central na
sobrevivência da espécie e no desenvolvimento do ser humano. 32

31
Hoje o espaço público serve mais para apelos mediáticos, bancos da praça com nomes de lojas – em cidades do
interior isso é muito comum – às vezes, discursos e muitas vezes com distribuição de algum tipo de folder consumista.
Em São Paulo, Capital, há lei contra toda essa poluição mediática, visual, todavia, nas cidades à volta de São Paulo o
que existe é uma grande explosão da mídia nas avenidas, praças e onde for possível instalar alguma placa ou
mensagem publicitária. Os locais são públicos, mas as placas, anúncios e out-doors são todos – ou quase todos –
privados. Tudo com o objetivo de atingir o coletivo.

32
Para os antigos hebreus, a doença não era devida à ação de demônios ou de maus espíritos, mas representava, de
qualquer modo, um sinal de cólera divina diante dos pecados humanos. Diz a Bíblia: “Eu sou o senhor, e é saúde que
te trago”. (Êxodo 1526). “De Deus vem toda a cura” – Eclesiastes, 38,19). (Scliar – 1987).

18
As preocupações eram tão grandes com saúde pública, que Donnangelo, (1976),
baseada em Foucalt (1994), mostra a Polícia Médica na Alemanha e a Medicina Social
na França referindo-se a higiene ou sanitarismo e, mais tarde, a saúde pública na
Inglaterra.

Para Foucault33 (1994), a polícia médica que é programada na Alemanha em meados


do século XVIII, e que foi efetivamente posta em prática no final do século XVIII e
começo do século XIX, consiste em um sistema muito mais completo de observação
da morbidade do que os simples quadros de nascimento e morte. Observação da
morbidade pela contabilidade pedida aos hospitais e aos médicos que exercem a
medicina em diferentes cidades ou regiões e registro, ao nível do próprio Estado, dos
diferentes fenômenos epidêmicos ou endêmicos observados. Ele diz ainda que:

1.º - Tratava-se de um fenômeno importante de normalização médica, que é


programada na Alemanha, em meados do século XVIII, sobre diferentes fenômenos
epidêmicos ou endêmicos. Era um tipo de normalização médica colocada pelo Estado
para os diferentes fenômenos epidêmicos ou endêmicos observados.

2.º - Um fenômeno importante é o de normalização da prática e do saber médicos,


procurando não deixar só para as universidades e, sobretudo para a própria
corporação dos médicos, o encargo de decidir em que consistirá a formação médica e
como serão atribuídos os diplomas. Aparece a idéia de uma normalização do ensino
médico e, sobretudo de um controle, pelo Estado, dos programas de ensino e da
atribuição dos diplomas. A medicina e o médico são, portanto, o primeiro objeto da
normalização. Antes de aplicar a noção de normal ao doente, se começa por aplicá-la
ao médico. O médico foi o primeiro indivíduo normalizado na Alemanha.34

Esse movimento de normalização na Europa é algo a ser estudado por quem se


interessa por história das ciências. Segundo Foucault (1994), houve a normalização
dos médicos na Alemanha, mas na França, por exemplo, a normalização das

33
Apud Romano – Foucault, M. O nascimento da clínica. 4. ed. Rio de Janeiro : Forense Universitária, 1994. Foucault,
M. O nascimento da medicina social. In : Foucault, M. Microfísica do poder. 14 ed. Rio de Janeiro : Graal, 1999a, p. 79-
98. Foucault, M. A política da saúde no século XVIII. In : Foucault, M. Microfísica do poder. 14 ed. Rio de Janeiro :
Graal, 1999b, p. 193-207.

34
Na mesma linha o filósofo, cientista e político alemão Gottfried Wilhelm Von Leibniz (1646-1716) propõe a criação de
uma repartição administrativa central para assuntos de polícia, incluindo-se nela um conselho de saúde. Em sua
proposta para uma Autoridade Médica, Leibniz insiste, provavelmente pensando na Bill of Mortality (1662) de John
Graunt, na importância do registro de nascimentos e óbitos e dos dados de morbidade. A proposta de polícia sanitária
continuou sendo desenvolvida. Em 1800 aparece Franz Anton Mai (1742-1814), educador, que submete um código de
saúde com vários tópicos. Os doentes mentais, que até a idade Média eram tolerados e encarados com religioso
respeito e temor pela população, agora são recolhidos aos hospícios. No início da Renascença a Nau dos Insensatos
(Nef dês Fous, Narrenschiff) percorre rios europeus, levando os loucos que são expulsos das cidades e dos quais os
barqueiros são encarregados de se livrar. Há uma história parecida em Histoire de La Folie à l’Age Classique. Paris,
Plon, 1961. O século 17, diz Rosen, vê uma mudança na percepção social da loucura. Predomina agora a visão de
Blaise Pascal (1623-1662): pode-se conceber um homem sem as mãos, sem os pés, sem a cabeça, até, mas não sem
a razão. O doente mental tornou-se uma criatura exótica. Na América, as pessoas visitavam o hospício de Bedlam
como quem vai a um zoológico; a entrada custava um penny e dava ao visitante o direito de atiçar os loucos. Os loucos
tinham a cabeça raspada e eram sistematicamente submetidos à purga, à emese, à sangria e ativados sem aviso a
água gelada – o choque do frio que precedia a eletrochoque, terapia de Cerletti. O gesto dramático de Philippe Pinel
(1745-1826), durante a Revolução Francesa, libertando de seus grilhões os loucos da Salpetrière e da Bicètre, alterou
em parte este tipo de conduta. Somente no século 20 com a psicanálise e nos novos medicamentos a psiquiatria viria a
ter novos conceitos para seus pacientes. Depois, Sigmund Freud (1856-1939) deu inestimáveis contribuições também.

19
atividades, ao nível do Estado, dirigiu-se, a princípio à indústria militar. Normalizou-se
em primeira instância a produção dos canhões e dos fuzis, em meados do século
XVIII, a fim de assegurar a utilização por qualquer soldado de qualquer tipo de fuzil, a
reparação de qualquer canhão em qualquer oficina, etc. Depois de ter normalizado os
canhões, a França normalizou seus professores. As primeiras Escolas Normais
destinadas a dar a todos os professores o mesmo tipo de formação e, por conseguinte
o mesmo nível de qualificação apareceu em torno de 1775, antes de sua
institucionalização em 1790 ou 1791. A França normalizou seus canhões e seus
professores, a Alemanha normalizou seus médicos.

3.º - Uma organização administrativa para controlar a atividade dos médicos, tanto na
Prússia quanto nos outros Estados alemães: ao nível do Ministério ou da
Administração central, um departamento especializado é encarregado de acumular as
informações que os médicos transmitem, ver como é realizado o esquadrinhamento
médico da população, verificar que tratamentos são dispensados, se reage ao
aparecimento de uma doença epidêmica, e finalmente, emitir ordens em função
dessas informações centralizadas. Subordinação, portanto, da prática médica a um
poder administrativo superior.

4.º - A criação de funcionários médicos nomeados pelo governo com responsabilidade


sobre uma região, seu domínio de poder ou de exercício da autoridade de seu saber.
E assim que um projeto adotado pela Prússia, no começo do século XIX, implica uma
pirâmide de médicos, desde médicos de distrito que têm a responsabilidade de uma
população entre seis e dez mil habitantes, até oficiais médicos, responsáveis por uma
região muito maior e uma população entre trinta e cinco, e cinqüenta mil habitantes.
Aparece, neste momento, o médico como administrador de saúde.

Com a organização de um saber médico estatal, a normalização da profissão médica,


a subordinação dos médicos a uma administração central e, finalmente, a integração
de vários médicos em uma organização médica estatal, tem-se uma série de
fenômenos inteiramente novos que caracterizam o que pode ser chamada a medicina
de Estado. Essa medicina de Estado que aparece de maneira bastante precoce, antes
mesmo da formação da grande medicina científica de Morgani e Bichat,35 não tem, de
modo algum, por objeto a formação de uma força de trabalho adaptada às
necessidades das indústrias que se desenvolviam neste momento.

Não é o corpo quem trabalha, o corpo do proletário que é assumido por essa
administração estatal da saúde, mas o próprio corpo dos indivíduos enquanto
constituem globalmente o Estado: é a força, não do trabalho, mas estatal, a força do
Estado em seus conflitos, econômicos, certamente, mas igualmente políticos, com
seus vizinhos. É essa força estatal que a medicina deve aperfeiçoar e desenvolver. Há
uma espécie de solidariedade econômico/política nesta preocupação da medicina de
Estado. Seria, portanto, falso ligar isto ao cuidado imediato de obter uma força de
trabalho disponível e válida.

35
Este modelo tem sua origem no século XVIII, através de Morgani e Bichat com o aparecimento da anatomia
patológica e se afirma a partir da Revolução industrial, pelas necessidades do capitalismo, que organiza a instituição
médica, estabelecendo o conceito de normalidade para atender as necessidades da produção e operariado da época.

20
O exemplo da Alemanha é igualmente importante por mostrar como, de maneira
paradoxal, se encontrava no início da medicina moderna, o máximo de estatização.
Desde esses projetos que foram realizados em grande parte no final do século XVIII e
começo do século XIX, desde a medicina de Estado alemã, nenhum Estado ousou
propor uma medicina tão nitidamente funcionarizada, coletivizada, estatizada quanto a
Alemanha desta época. Vê-se, por conseguinte que não se passou de uma medicina
individual a uma medicina pouco a pouco e cada vez mais estatizada, socializada.

O que se encontra antes da grande medicina clínica, do século XIX, é uma medicina
estatizada ao máximo. Os outros modelos de medicina social dos séculos XVIII e XIX
são atenuações desse modelo profundamente estatal e administrativo já apresentado
na Alemanha.

Essa é a primeira série de fenômenos a que Foucault (1999) se refere no episódio que
os historiadores da medicina em geral negligenciam totalmente, mas que foi estudado
de perto por George Rosen36 na série de estudos sobre as relações entre o
cameralismo37, o mercantilismo e a noção de polícia médica. Ele escreveu em 1953
um artigo sobre o problema no Bulletin of history of medicine, intitulado Cameralism
and the Concept f Medical Police e o estudou posteriormente em seu livro History of
Public Health, de 1958.

A saúde pública trouxe muitas preocupações na modernidade e em suas feições é


explicada pela necessidade do Estado capitalista, num processo que apresenta uma
trajetória que vai de longínquos séculos à vários países até as intervenções sanitárias
de país a país para higiene pública do século XX. A OMS – Organização Mundial da
Saúde é resultante dessa internacionalização da medicina.

Todas representam um conjunto de práticas que, além de terem em comum o fato de


serem práticas alocadas como tarefa do Estado, são antecessoras da visão
bacteriológica que se torna hegemônica ao final do século XIX. E é na Alemanha que
surge em 1779, a idéia da intervenção do Estado na área de saúde pública. Neste ano
é publicado o primeiro dos seis volumes do System einer Vollstandigen medicinischen
Polizei, obra monumental com a qual Johan Peter Frank (1745-1821) lançava o
conceito de polícia médica ou sanitária. Um conceito eminentemente autoritário e

36
Livro de George Rosen – Uma história da saúde pública – livro detalhando a história da medicina desde o Egito
antigo – Editora Hucitec. –
36
- Expressão econômica do século XVIII. Na Europa central, especificamente nas nações germânicas que
enfrentavam crises econômicas, os estudiosos e os técnicos da política e da administração financeira preocupados em
encontrar soluções práticas para as questões financeiras formaram o Cameralismo. Nas universidades alemãs e
austríacas houve a formação da cátedra das ciências camerais e os conselhos Kammern, que significa local onde são
depositados os tesouros reais, criados para prestar assistência sobre os assuntos de política financeira e econômica,
de técnicas de administração e de direito aos príncipes.
37
John M. Last. A Dictionary of Epidemiology - Nova Iorque Oxford University Press, 1983. (Apud – Scliar – 1987).

21
paternalista, preocupado, sobretudo com os aspectos legais das questões de saúde.
(Scliar – 1987).

Preceitos bíblicos são citados38 para prevenir doenças e proteger a saúde pública.
Animal com tuberculose – mal de Pott – não poderia ser abatido para consumo; alguns
moluscos, que poderiam transmitir a hepatite também. De certa forma esses preceitos
tinham a ver com o ambiente natural. O antropólogo Marvin Harris (1968), (1978) 39 vê,
por exemplo, a origem da restrição a carne de porco e a criação de suínos no Oriente
Médio, como um contrassenso: é uma região árida, sem a água que estes animais
necessitam como forma de manter seu equilíbrio térmico.

Além disso, povos nômades, teriam dificuldades em manter um animal que se move
pouco, como o porco. A circuncisão40, por exemplo, previne o câncer do pênis, o
herpes genital, o câncer de colo de útero e as doenças venéreas de maneira geral.
Atualmente, todavia, não há consenso sobre o assunto. As razões mais freqüentes
dadas pelos pais são: higiene, proteção à saúde e o costume (Scliar – 1987). Isso tudo
têm a ver com saúde pública.

A saúde pública e a história

Mas o que é saúde pública? O que era saúde pública nos séculos passados ?

Conceituar saúde é um problema que só surgiu recentemente e surgiu exatamente em


função das necessidades de planejar ações de saúde, individuais ou coletivas. Em
1947, a Organização Mundial da Saúde formulou o seguinte conceito: “Saúde é o
estado de mais completo bem-estar físico, mental e social e não apenas ausência de
enfermidade”. Esse conceito entrou em vigor no dia 7 de abril de 1947.

Xavier Bichat (1771-1802),41 médico francês, dizia que a saúde é o “silêncio dos
órgãos”. A doença se faz ouvir. John Last (1988), 42 menciona dois outros conceitos
segundo os quais a saúde é: “um estado de equilíbrio entre o ser humano e seu
ambiente, permitindo o completo funcionamento da pessoa e ou um estado
caracterizado pela integridade anatômica do ser humano e pela capacidade de
desempenhar todas suas funções, livre da ameaça imediata da doença e da morte.”43

38
Torá ou Pentateuco
39
Marvin Harris (Nova Iorque, 18 de agosto de 1927 - 25 de outubro de 2001) foi um antropólogo dos Estados Unidos,
principal teórico do "materialismo cultural". Entre as influências de seu trabalho pode-se incluir a repercussão na teoria
do comportamento e na antropologia cultural. (Fonte Wikipédia – acessada em 25/08/2011).
40
Ato de cortar o prepúcio.

41
Marie François Xavier Bichat (Thoirette, 14 de novembro de 1771 — Paris, 22 de julho de 1802) foi um anatomista e
fisiologista francês.Bichat é melhor lembrado como o pai da moderna histologia e patologia. (Fonte: Wikipédia –
acessada em 25/08/2011).

42
Autor, organizador, do: O Dicionário de Epidemiologia – 1988.

22
No início do século XX havia muitas doenças que ainda causavam grande
preocupação para os Estados. Os EUA através da Fundação Rockfeller e outros
organismos interessados em ampliar seus objetivos econômicos desejavam eliminar
essas epidemias, pois elas se disseminavam pelas portas do mundo. Eram elas: febre
amarela, varíola, tuberculose e a peste bubônica que atingiu os países através das
fronteiras. As relações do Estado com a Medicina da época deu início a correlação
público e privada e a retrospectiva que segue.

Doenças preocupantes / a febre amarela e assemelhadas

Muitos foram os fatos e decisões sobre saúde pública. A febre amarela era um dos
grandes empecilhos para negócios principalmente com os países tropicais nos séculos
XIX e XIX.

Goldim,44 (1999) relata em artigo que o controle da febre amarela,45 devido a sua
morbidade e mortalidade, foi um dos grandes desafios da medicina que preocupava os
Estados – saúde pública – e as instituições de trabalho – empresas privadas. Vários
foram os pesquisadores em várias épocas que colocaram até suas vidas em risco para
descobrir suas causas e efeitos. Ele informa em seu artigo que os primeiros relatos
dessa doença remontam a 1700. Antes disso não há nenhuma citação.

Informa ainda, Goldim (1999), que foi o médico escocês, Dr. Patrick Mason que
demonstrou, em 1878, pela primeira vez, que um inseto podia transmitir uma doença,
ainda que de modo não definitivo. Neste caso foi a transmissão da Wuchereria
bancrofti, causadora da filariose.46 Posteriormente, em 1894, o Dr. Mason descobriu
que era a mosca tsé-tsé que transmitia uma tripanossomíase, denominada de febre
n'gana ou doença do sono. Ele também orientou o trabalho do Dr. Donald Ross que,
em 1896, estabeleceu a transmissão da malária por mosquitos.

Em suas pesquisas, Dr. Goldim relata a primeira evidência irrefutável de que um inseto
podia transmitir uma doença, isso em 1892 e complementa que o Dr. Theobald Smith,
microbiologista e o Dr. Fredrick L. Kilborne, veterinário, demonstraram a transmissão
por meio de insetos da chamada febre do Texas, uma doença bovina. O Dr. Carlos

44
José Roberto Goldim concluiu o doutorado em Medicina (Clínica Médica) pela Universidade Federal do Rio Grande
do Sul em 1999, com tese sobre Consentimento Informado. (Fonte: Lattes). http://www.ufrgs.br/bioetica/finlay.htm
(acessado em 04/07/2009).
45
O nome de febre amarela surgiu de uma epidemia em Barbados em 1715. Acreditava-se que ela se propagava pelo
contágio direto com o vômito dos pacientes. Muitos foram os médicos que até provaram vômitos e se submeteram aos
seus terríveis testes, mas não desenvolveram a doença. Desde 1800 muitos foram os tipos de pesquisa efetuados para
identificar como era a transmissão. A primeira proposta de que o mosquito era o transmissor da doença foi feita pelo
Dr. John Crawford, de Baltimore/EUA, em 1807. Antes dessa data aqueles que contraíam a doença eram colocados
em quarentena.

46
A filariose ou elefantíase é a doença causada pelos parasitas nematóides Wuchereria bancrofti, Brugia malayi e
Brugia timori, comumente chamados filária, que se alojam nos vasos linfáticos, causando linfedema. Esta doença é
também conhecida como elefantíase, devido ao aspecto do(s) membro(s) afetado(s) elefante do paciente com esta
doença. Tem como transmissor os mosquitos dos gêneros culex e algumas espécies do gênero Anopheles, presentes
nas regiões tropicais e subtropicais. Quando o nematóide obstrui o vaso linfático, o edema é reversível, no entanto, é
importante prevenção com mosquiteiros e repelentes, além de evitar o acúmulo de água parada em pneus velhos,
latas, potes e outros. (Fonte: Wikipedia).

23
Juan Finlay, médico cubano, com formação feita nos EUA, apresentou, em 14 de
agosto de 1881, um trabalho sobre "O mosquito hipoteticamente considerado como
agente transmissor da febre amarela".

Somente em 1891 uma comissão americana resolveu discutir com Dr. Finlay o
assunto dos insetos transmissores. Após vários testes na própria comissão e em
alguns voluntários a proposta de Finlay teve força para continuar. No Brasil muitos
médicos não aceitavam a proposta de transmissão por mosquito. Os Drs. Emílio Ribas
e Adolfo Lutz propuseram a realização de novos experimentos. Em 1894 o Dr. Finlay
propôs, em um congresso médico em Budapeste, que a melhor maneira de erradicar a
febre amarela seria através da eliminação dos mosquitos. Não convenceu a todos.
Anos se passaram e muitos voluntários se submeteram a vários tipos de testes.

Em 1900, o Departamento Médico do Exército dos Estados Unidos nomeou duas


comissões para estudar as doenças tropicais, a primeira nas Filipinas e a segunda em
Cuba. Entre 1898 e 1901, Gorgas47, médico do Exército, havia tentado erradicar a
febre amarela, sem êxito, com base na limpeza do porto de Havana, de acordo com o
pensamento da época. Em março de 1901, Gorgas mudou a estratégia, ao levar em
conta a quarta comissão norte-americana que havia confirmado a teoria de Finlay,
segundo a qual o mosquito transmitia a febre amarela, conseguindo em seis meses a
erradicação da doença. (Iyda – 1994). 48

Entre dezembro de 1902 e janeiro de 1903, Dr. Reed, outro médico e mais quatro
voluntários deixaram-se picar por mosquitos sabidamente contaminados. Dos seis,
três, incluindo os dois pesquisadores, não desenvolveram sintomas. Os demais
ficaram doentes. O Dr. Emílio Ribas confirmou, posteriormente em 1909, que não tinha
dúvida alguma sobre a forma de transmissão da febre amarela e que somente repetiu
os experimentos de Reed em Cuba, pois considerava útil a sua realização. O Dr.
Reed morreu em 1902, de uma causa não relacionada com a febre amarela. A causa
foi apendicite. Em 1906 os Drs. Carroll e Agramaonte receberam o Prêmio Nobel
pelos trabalhos desenvolvidos em Cuba. 49

Em 1906 o impaludismo atrapalhava todos os planos de desenvolvimento do governo


como Usinas Hidroelétricas, Estradas de Ferro Central do Brasil, Noroeste e aquela
que nunca terminou de fato, a Madeira Mamoré no Pará, já na República. A primeira
vacina para febre amarela foi desenvolvida na França, em 1928.

47
Major-médico William Gorgas, do exército norte-americano.
48
Curiosamente, Sorocaba foi considerada a primeira cidade do mundo a erradicar a febre amarela. Tal conhecimento
do fato modifica um pouco a história de que tudo se passou inicialmente em Havana na erradicação da doença. O
início de fato, foi determinado por Emílio Ribas no município de Sorocaba um mês antes, precisamente em janeiro de
1901 com base nas pesquisas existentes de Cuba e também de um outro major americano, médico, de nome Walter
Reed.
49
Com o objetivo de estudar a mecanismo de contágio da Febre Amarela o Departamento Médico do Exército Norte-
Americano, em maio de 1900, criou uma comissão para realizar uma pesquisa a este respeito. O Dr. Walter Reed,
major do exército e professor de medicina na Universidade Johns Hopkins, em Baltimore/EUA, foi nomeado seu
coordenador. Os Drs. James Carrol, Jesse W. Lazear e Aristides Agramonte, todos médicos e majores, eram os
demais membros desta comissão. (fonte: www.ufrgs.br/bioética/finlay/htm - acessado em 26/12/2009).

24
Outra vacina de febre amarela foi desenvolvida pela Fundação Rockfeller, em 1931.
Ela foi desenvolvida pelos Drs. Sawyer, Wray Lloyd e Kitchen. Em 1935, o Dr. Max
Theiller e seus colaboradores desenvolveram uma nova vacina que é utilizada até os
dias de hoje. 50 51

O agregado do saber médico e as escolas

Com esses conhecimentos sobre algumas doenças iniciou-se um processo de agregar


tais saberes e as velhas escolas da Bahia e do Rio de Janeiro integraram-se nas
universidades da Bahia e do Brasil, respectivamente. A última denomina-se Nacional
de Medicina.

Outros estabelecimentos surgiram no século XX. O mais completo deles é a


Faculdade da Universidade de São Paulo, que começou a funcionar em 1913, sob a
direção de Arnaldo Vieira de Carvalho (1867-1920). Alguns de seus laboratórios foram
construídos pela Fundação Rockefeller. Houve contratações de professores, inclusive,
italianos e franceses. Possui um monumental hospital de clínicas, outros hospitais
especializados incluindo institutos complementares. Dela nasceu, em 1945, a
Faculdade de Higiene e Saúde Pública, cujo primeiro diretor foi Geraldo Horácio de
Paula Sousa (1889-1951).

Situam-se ainda, em São Paulo, a Escola Paulista de Medicina (1933) e a Faculdade


de Ciências Médicas da Santa Casa de Misericórdia fundada em 1913. No interior do
Estado localizam-se a Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (1951), da USP, a de
Sorocaba (1950) da PUC, a Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Botucatu
(1962) e a Faculdade de Medicina da Universidade de Campinas, que iniciou seus
trabalhos em 1963.

No RJ, além da Faculdade Nacional de Medicina há a Faculdade de Ciências Médicas


(1936), da URJ, cujo primeiro diretor foi Antonio Cardoso Fontes e a Escola de
Medicina e Cirurgia (1921), que pertenceu ao Instituto Hahnemaniano e seu fundador
foi Licínio Atanásio Cardoso. Era homeopática e hoje contém também o curso de
medicina oficial. Há ainda em Belo Horizonte a Faculdade de Medicina da
Universidade de MG. (1911), cujo primeiro diretor foi Eduardo Borges da Costa (1880-
1950).

Há outras como a Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais. Em Juiz de Fora


também há uma faculdade de Medicina e outra em Uberaba, que se denomina
Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro. José Otávio de Freitas (1871-1919)
higienista e microbiologista, foi o principal idealizador da Faculdade de Medicina
(1920) da Universidade do Recife. Em Pernambuco, está ainda a Faculdade de

50
Os experimentos iniciais foram feitos em macacos. A primeira aplicação em seres humanos foi feita nos Drs. Theiller,
Lloyd e Bruce Wilson, que se ofereceram como voluntários. O Dr. Theiller ganhou o Prêmio Nobel de 1951 por esta
sua contribuição à saúde das populações

51
Fonte: Vieira S, Hossne WS. A experimentação em seres humanos. São Paulo: Moderna, 1987:21. Altman LK. Who
goes first ? Berkeley: California, 1998:134-158.

25
Ciências Médicas. Antonio Emiliano de Sousa Castro, organizou e dirigiu a Faculdade
de Medicina e Cirurgia do Pará (1919), sediada em Belém.

Em Niterói, encontra-se a Faculdade Fluminense de Medicina (1929), cujo principal


fundador e diretor, Antonio Pedro Pimentel e em João Pessoa a Faculdade de
Medicina da Universidade da Paraíba (1951). No Paraná, Vitor do Amaral foi o
primeiro diretor da Faculdade de Medicina da Universidade do Paraná (1912), em
Curitiba. Protásio Antonio Alves, dirigiu a Faculdade Livre de Medicina e Farmácia de
Porto Alegre, a qual, fundada em 1898, começou a funcionar em 1899 e foi
reconhecida pelo governo em 1900.

No interior do RGS fica a Faculdade de Medicina de Santa Maria. Diversas outras


escolas surgiram, como a de Vitória, no ES em 1961, a de Fortaleza da Universidade
do Ceará, a de Natal, do Rio Grande do Norte, a de Alagoas (1951), em Maceió, a de
Goiás, em Goiânia (1960), a de Santa Catarina (1960) em Florianópolis, a Escola
Baiana de Medicina e Saúde Pública, em Salvador e a Faculdade de Medicina da
Universidade de Brasília. Em 1961, quando havia no Brasil, 25 escolas de medicina, o
número de diplomados foi de 1.787. (Santos Filho – 1980).

Naquela altura, no início do século XX no Brasil, já funcionava regularmente o Instituto


Oswaldo Cruz o qual recebia muitas solicitações e também atendia entidades públicas
e privadas além do acompanhamento do Ministério das Relações Exteriores tendo em
vista as questões de caráter internacional e interesses econômicos. Tais doenças da
época atrapalhavam e muito negociações entre o Brasil e outros países.52

Médicos e pessoas da atividade eram procurados. Havia relações de governo e de


instituições comunitárias na época com médicos denominados como típicos
autônomos. Eles também colaboravam. Era - de certa forma – o médico particular
contribuindo com a Saúde Pública. A descoberta da bactéria e o conhecimento do
mundo dos microorganismos podem ser considerados como o estopim de esperança
para a cidadania, tamanho o temor e tensão que vai provocar nos corações e mentes.
Torna-se necessário então a intervenção de uma estrutura mais forte: o Estado. A
emergência de atitudes, da medicina preventiva também guarda correlação importante
com o fato de que o saneamento vai ser uma das marcas da ação Estatal, a qual
gerará outras providências.

As preocupações com o “status quo” do comunitário, do coletivo, aglomerações


urbanas como cortiços, falta de saneamento básico – água e esgoto - e outras
comunidades assemelhadas desenhavam debates acalorados de agentes de saúde.

Espaço do Terceiro Setor e cidadania / Orbitando entre o Público e o Privado

Nas últimas décadas, a cidadania dilatou-se de forma inédita e inusitada. O campo dos
direitos está hoje definido pela reiteração de antigas conquistas de direitos civis e
políticos, pela oscilação dos direitos sociais e pela afirmação incessante de novos

52
No Brasil, como exemplo, destaca-se que no último ano da Monarquia os recursos reservados para a Saúde era
0,4% do total enquanto para os Ministérios da guerra e da Marinha 19,6%, as vias férreas 35% e a imigração 7%. Em
alguns países europeus o tratamento sanitário era diferente. Fonte: A.R. Netto, op. Cit. 1942 – pág. 24

26
direitos que recobrem territórios tão vastos quanto o meio ambiente, a sexualidade e a
bioética. A vida moderna ficou inseparável de um progressivo, tenso e irregular
reconhecimento jurídico dos direitos de cidadania. Os direitos estão complicados
também, porque temos hoje no mundo, e, portanto também no Brasil, uma espécie de
crise da idéia de cidadão.

A idéia de cidadão parece que está em crise, sobretudo porque tende a se afirmar
quase que exclusivamente no plano dos direitos, deixando para trás o plano das
obrigações. Há também uma crise de idéia de República, ou seja, o cidadão
republicano está hoje gravemente reduzido ou à condição de consumidor ou à
condição de eleitor, de alguém que é chamado a referendar decisões que são
tomadas em âmbitos aos quais ele não tem acesso. Os cidadãos reclamam,
protestam, fazem plebiscitos, votam regularmente, mas não conseguem entrar no
ventre em que são geradas as decisões. (Nogueira, 2005). Na saúde, por exemplo,
essas discussões caminham para soluções variadas.

Uma delas é a possibilidade de um Terceiro Setor vir a ser uma das portas de entrada
que podem ajudar na minimização dos problemas na saúde, além das relações de
compartilhamento da saúde privada e da pública que acontecem há anos e poderão
ser maiores como veremos à frente deste trabalho. Isso já se enxerga na educação,
por exemplo, onde ONG’s tomam as rédeas de creches e outros tipos de instituições
ou serviços.

Na saúde isso é evidente. O médico tem seu consultório particular,53 mas fornece seus
saberes para hospitais públicos. Muitos dentistas trabalham para instituições públicas,
todavia, atendem também no seu consultório. Muitos hospitais e empresas privadas de
atividade em saúde atendem também os usuários do SUS via convênios com o
Estado. Tudo no mesmo território. Como exemplo – pontual – dentre milhares, temos a
Beneficência Portuguesa em São Paulo – Capital – cujas divisões internas se
confundem e há momentos em que não se sabe se estamos no lado particular,
privado ou no público para atendimento dos casos oriundos do SUS.

O setor produtivo público não estatal é também conhecido por “terceiro setor”, “setor
não governamental” ou “setor sem fins lucrativos”. Por outro lado, o espaço público
não estatal é também o espaço da democracia participativa ou direta, ou seja, é
relativo à participação cidadã nos assuntos públicos. Pode ser chamado de público
não estatal, que define com maior precisão do que se trata: são organizações ou
formas de controle “públicas” porque voltadas ao interesse geral; são “não estatais”
porque não fazem parte do aparato do Estado, seja por não utilizarem servidores
públicos, seja por não coincidirem com os agentes políticos tradicionais. Em outras
palavras, supõe-se a existência de quatro esferas ou formas de propriedades
relevantes no capitalismo contemporâneo: a propriedade pública estatal, a pública não
estatal, a corporativa e a privada. (Pereira e Grau – 1999).

53
Denominado por alguns autores como “Liberal típico”.

27
Políticas públicas, ONG’s e PPA’s

Essa nuance entre o público e o privado nos leva a um espaço que surgiu no mundo e
consequentemente no Brasil – por exemplo – que é o Terceiro Setor. Já é consenso
na América Latina que nem o mercado nem o Estado têm condições de responder por
si sós, aos desafios do desenvolvimento com equidade. (Fernandes – 1994).

Na década de 80 foram as ONGs que, articulando recursos e experiências na base da


sociedade, ganharam alguma visibilidade, enquanto novos espaços de participação
cidadã, principalmente com relação à saúde e necessidades básicas mínimas de
alguns grupos da sociedade. Hoje percebemos que o conceito de Terceiro Setor é
bem mais abrangente. Inclui o amplo espectro das instituições filantrópicas dedicadas
à prestação de serviços nas áreas de saúde, educação e bem estar social.
Compreende também as organizações voltadas para a defesa dos direitos de grupos
específicos, como mulheres, negros e povos indígenas, englobando as experiências
de trabalho voluntário para a melhoria das comunidades. 54

São as organizações não governamentais – ONG’s55 que não são governo, não são
lucrativas, mas pretendem – via associações civis – ser organizações da sociedade de
interesse público. São iniciativas privadas que não visam lucro. Um terceiro setor –
não lucrativo e não governamental – que coexiste hoje. As ONG’s tornaram-se rotina
sob a liderança das agências multilaterais que compõem o Sistema da ONU. Dentre
suas muitas funções a saúde também foi colocada como necessidade no seu
contexto. Banco Mundial, FAO, Unicef, OMS, Pnud e tantas outras são programadas
para pensar em escala global. (Fernandes - 1994).56 Nesse bojo entra também a
filantropia empresarial.

Laura Tavares57, (2003), fornece elementos para o debate sobre as percepções do


local, que resume: comunitário, moderno, mecanismos societários, parcerias e mais
atualmente do terceiro setor. Verificamos em discursos das décadas de 90 e 2000,
referências a parcerias e necessidades de união entre Estado e o poder privado em
algo que podemos relacionar com o compartilhamento entre o Público e o Privado.

Segundo Bresser Pereira e Cunil Grau, (1999), Ruth Cardoso, (1997-1998) descreve o
conceito de terceiro setor como um espaço de participação e experimentação de
novos modos de pensar e fazer sobre a realidade social. É um campo marcado por
uma irredutível diversidade de atores e formas de organização.

No Brasil, há ainda em parte, um grande desconhecimento, por parte do governo


federal, das ações desenvolvidas por esses atores, tanto em termos de abrangência e
diversificação, como da eficiência dos métodos e da eficácia dos resultados em
conformidade com os recursos humanos e financeiros mobilizados em dimensões

54
Fonte:
http://empreende.org.br/pdf/ONG's,%20OSCIP'S%20e%20Terceiro%20Setor/Evolu%C3%A7%C3%A3o%20s%C3%B3
cio-pol%C3%ADtica%20das%20ONGs%20no%20Brasil.pdf (acessado em 13.03.2011).
55
Decreto Presidencial de junho de 1999.
56
Fernandes – pág. 15
57
Tavares, Laura

28
também desconhecidas. Todavia, há dados internacionais, que denunciam o potencial
de mobilização de recursos.

Nos EUA, por exemplo, onde há uma cultura do voluntariado, os volumes anuais de
recursos mobilizados estão por volta de 601 bilhões de dólares, dos quais 70 bilhões
são doados por cidadãos. Sabe-se, ou estima-se lá, que 94,2 milhões de adultos, num
total de 180 milhões de pessoas com mais de 18 anos, doaram 4,2 horas de trabalho
voluntário semanal, o que equivale a 15,2 bilhões de horas anuais. A saúde está
integrada nesse volume de horas. O valor anual desse trabalho voluntário está
estimado em 176 bilhões de dólares e equivale ao emprego, em tempo integral, de
nove milhões de pessoas. Sabe-se ainda, que o percentual de geração de emprego
remunerado no Terceiro Setor tem sido muito superior ao dos setores governamental e
privado.58

Os Diretores das primeiras ONG’s59 - surgidas entre 1960 e 1970, na América Latina,
por exemplo, têm agora entre 45 e 70 anos. Eram jovens na década de 60 –
adolescentes que chegaram à idade adulta aprendendo através dos jornais sobre
personagens como Kennedy, Krushtchev, Mao, Fidel, Guevara e João XXIII. Como a
maioria das pessoas esclarecidas de então, cresceram pensando de si mesmas que
eram partícipes de um vasto processo de transformação histórica; acreditavam que
justiça e liberdade seriam alcançadas, para todos, ainda no decorrer de suas vidas. A
política era carregada de conteúdos messiânicos que condicionavam até mesmo a
imaginação dos mais sisudos planejadores.60 (Fernandes – 1994). O crescimento da
quantidade de ONG’s é notável.61 Todos esses aspectos refletem as mudanças e
reformas que o Estado estava passando. Eram as reengenharias de idéias e de
gestão.
A grandeza dos números que tornaram possível a existência das ONG’s no mundo,
em geral, e no Brasil, em particular, faz refletir que o fenômeno nativo ONG tem como
um dos condicionantes da sua multiplicação “lógicas que vieram do Norte”. Fernandes
(1991), relacionou os países que têm colaborado com as ONG’s brasileiras, a partir
das informações fornecidas por dirigentes que participaram de uma reunião no Hotel
Glória, em agosto de 1991 e responderam à questão sobre relações com agências de
cooperação internacional. O quadro possibilita visualizar a grande concentração de
ajuda provenientes da Europa, com destaque para Alemanha e Holanda, 62 países
com os quais mais da metade das ONG’s nacionais se relacionam.

58
Fonte:
http://empreende.org.br/pdf/ONG's,%20OSCIP'S%20e%20Terceiro%20Setor/Evolu%C3%A7%C3%A3o%20s%C3%B3
cio-pol%C3%ADtica%20das%20ONGs%20no%20Brasil.pdf (acessado em 13.03.2011).
59
Como condição de existência, necessária para quem estava descobrindo as particularidades de atuação
desenvolvidas, as ONGs vão redefinindo seu papel numa conjuntura de reorganização da sociedade civil. Dessa forma
é que constroem seus discursos de “autonomia face ao Estado, às Igrejas, aos movimentos populares, partidos e à
Universidade”. Desta rearticulação surgiu em 1990 a Associação Brasileira das ONGs - a ABONG. (Fonte: acesso a
http://www.comunicacao.pro.br/artcon/movsocong.htm) em 13.03.2011
60
Fernandes – pág. 30.
61
Segundo Fernandes e Piquet Carneiro, (1991), a denominação ONG passou a ser empregada por volta dos anos 80,
para designar várias entidades que, originárias dos vários movimentos sociais dos anos 70, vinham agregando quadros
de matrizes ideológicas diversas, como o marxismo e o cristianismo, e passaram a contar com uma estreita
cooperação com entidades não-governamentais internacionais. (Artigo de Mário Aquino Alves – Anpad – maio de
1999).
62
Os Estados Unidos, segundo depoimentos obtidos na pesquisa de campo desenvolvida para este trabalho (abril a
setembro de 1996), têm ampliado, para alguns segmentos, a colaboração com as ONG latino americanas, com ênfase

29
Os recursos que captaram, segundo pesquisa realizada em 1991 entre 102 ONG’s
brasileiras, ainda que modestos, provêm em sua maioria de fontes não
governamentais, religiosas e organismos multilaterais, em sua maioria de cooperação
internacional, conforme resumido na Tabela II a seguir. 63

Tabela I

ONG’s brasileiras que mantém relações / agências de Cooperação / País de Origem.

Países / agências Número de ONG’s Países/agências Número


Alemanha 57 Suécia 9
Holanda 53 Áustria 7
EUA 42 Dinamarca 4
Inglaterra 31 Espanha 4
Canadá 28 Portugal 3
Suíça 20 Finlândia 3
França 17 Noruega 2
Irlanda 14 Luxemburgo/Escócia 1
Bélgica 10 Itália 10

Fonte: Fernandes & Piquet Carneiro. (1991)

Tabela II

Importância / Cada Tipo de Agente financiador na composição da Receita das ONG’s


Tipos de Agências Importância relativa em %
Ecumênicas/Evangélicas 45,10%
Católicas 25,50%
Fundações privadas 23,50%
Multilaterais 8,80%
Governamentais 2,90%

Fonte: Fernandes & Piquet Carneiro.(1991)

A reforma do Estado que ocorreu desde os anos 90, segundo seus autores (Pereira e
Grau, 1999), “ deverá conduzir a um Estado fortalecido em 20 a 30 anos, com suas
finanças recuperadas e sua administração obedecendo a critérios gerenciais de
eficiência. Mas a reforma também deverá alcançar a garantia, pelo Estado, de que as
atividades sociais, que não são monopolistas por natureza, possam ser realizadas
competitivamente pelo setor público não estatal e por ele controladas ainda que com

em projetos de pesquisa e na área ambiental, equilibrando, em geral, a retração de recursos das agências européias,
nos últimos anos. (Fonte: Autoria: Artigo na Anpad - Mário Aquino Alves – maio 1999).

63
Fonte: artigo publicado em “Seminários de Reforma do Estado” - São Paulo 26-28 março 1998 – As ONG’s na
Reconstrução da sociedade civil no Brasil – de Ricardo Toledo Neder – Apoio Fapesp.

30
seu apoio financeiro, de maneira a conseguir a ampliação dos direitos sociais. Assim,
inclusive como condição para o desdobramento de suas outras dimensões, a reforma
visa renovar o sistema político incorporando a própria participação cidadã mediante o
controle social. Um Estado assim reconstruído poderá resistir aos efeitos
perturbadores da globalização e garantir uma sociedade não somente mais
desenvolvida, mas também menos injusta. “. (Pereira e Grau – 1999).

De fato, temos observado a hegemonia de discursos, que por um lado reforçam a


centralidade do mercado e que – de certa forma – prescindem da ação dos governos
como regulador, ordenando juridicamente os atores e com isso tentando minimizar os
problemas daí decorrentes. Muito conhecimento do que acontece na prática é de
fundamental importância, pois temos que analisar também como são financiados os
dois sistemas: público e privado. Se o privado é decorrente do capital o público
também precisa de recursos para atender o coletivo.

Conforme Pereira e Grau (1999), a partir de tais considerações, pode se deduzir que
um dos nós críticos para a transformação social é o deslocamento do foco de análise,
de espaços predeterminados a práticas sociais, partindo de duas premissas. Primeiro,
a democratização das instituições políticas e da sociedade são processos
interdependentes nos quais é fundamental ampliar as possibilidades de realização do
que concerne a todos e interessa a todos: o público.

Segundo, o Estado não monopoliza nem necessariamente realiza o interesse público,


mas a sociedade em abstrato tampouco. Trata-se em suma, de abrir a discussão
sobre a institucionalidade, que tanto pode favorecer a satisfação de necessidades
públicas a partir da sociedade, como pressionar a partir dela para que a esfera pública
estatal se faça real e efetivamente pública, ou seja, esteja aberta à participação de
todos e possa assim regular adequadamente os centros de poder social e econômico,
respeitando concomitantemente os espaços de liberdade que são crescentemente
reclamados.

Por outro lado, assim como não é possível conceber mercado sadio sem Estado que
não abdique de seu papel de regulação econômica, também é impossível imaginar
sociedade democrática sem Estado que controle os centros de poder privado e opere
sobre as desigualdades sociais.

Os recursos públicos muitas das vezes acontecem conforme as necessidades


públicas, todavia, para que tais metas - via impostos - sejam atingidas necessita
fundamentalmente do privado. Discursos e recados para que haja uma mistura de
relações são fatos. Não faz muito tempo, o ex-presidente do BID – Banco
Interamericano de Desenvolvimento – Enrique Iglesias - fez a seguinte declaração
numa reunião sobre destinação de recursos do BNDES:

"A acumulação de recursos no mercado de investimentos institucionais oferece uma


oportunidade tanto para o setor público, quanto para o setor privado. Temos que
explorá-la, e o BID está trabalhando muito analisando as possibilidades de criação de
fundos de infraestrutura locais que permitam promover a captação de recursos e

31
contar, para isso, com a participação dos organismos internacionais, da CAF, do BID,
do Banco Mundial.” 64

Obviamente as referências são os assuntos de todas as esferas como Saúde,


Educação, Transporte e Lazer.65

Sob a visão retrospectiva e com foco na política e interesses mais variados estão as
campanhas públicas, principalmente as de saúde, que se iniciaram há muitos anos
atrás, pois as condições péssimas de saúde da população e as possibilidades de
transmissões endêmicas atrapalhavam o dia a dia das sociedades locais – embora
absolutamente necessárias. Esses arroubos de soluções dos governos e políticos
referem-se a fase da “higienização” e das várias reformas sanitárias do passado.
Foram muitas e serão quase todas citadas em suas épocas e respectivas datas.

A dialética do por que isso acontece na atualidade não importa, pois sempre – em
todos os tempos - foram fatos reais, ou seja, do privado prestar serviços ao Estado,
todavia, estudar suas causas e efeitos é relevante. Nessas intervenções ditas
modernas e decorrentes da ortodoxia liberal com os atores da política pública e os
protagonistas do privado, além das ONG’s, começam a surgir outros grupos de
fornecimento de bens e serviços, muitos na área de saúde.

Em alguns momentos houve até substituição do Estado. Bancos como o Mundial e o


Fundo Monetário Internacional apóiam programas sociais, ações filantrópicas e de
benemerência tomam espaço na Saúde. Esses Bancos sugerem parcerias em todas
as áreas. Com isso as ONG’s proliferaram. A atividade associativa ganhou impulso
nos anos 70 e acelerou dos 80 para a atualidade. Isto é notório no movimento de
mulheres, minorias étnicas, ecologia. Segundo estimativa do Pnud, as ONG’s
beneficiariam cerca de 250 milhões de pessoas nos países em desenvolvimento. No
Brasil, cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, segundo pesquisa em 1986, revela
que 65% das entidades haviam sido criadas a partir de 1970. 66

Fernandes (1994) informa que na França, o número de associações deu um salto


igualmente expressivo. Mais de 54.000 associações foram criadas somente no ano de

64
Discurso em 13 e 14/11/2003 – no Seminário de Parceria público privada na prestação de serviços de infra-
estrutura.
65
Nesse caminho estão a Educação Pública e a das Entidades Privadas; o transporte público que deve ser pago –
ônibus, trem, metrô, e o transporte privado – lotações, avião, ônibus, automóveis. Espetáculos de Circo no Sesc –
gratuitos ou extremamente baratos e o “Cirque de Soleil” como exemplo de privado e caro e por aí inúmeros outros
exemplos. Sob a visão de modernidade, shows de final de ano, inaugurações, showmícios, comemorações de datas
importantes, pagos pelo poder público – com dinheiro do contribuinte – mas quase todos executados pelo privado são
costumeiras para a sociedade. Empresas privadas de eventos são as mais favorecidas por esses espetáculos, artistas,
empresas de segurança, de iluminação e tudo o mais.

66
Entre 1960 e 1980 houve um crescimento de 68% na ajuda externa para o “Terceiro Mundo”, através de agências
não governamentais de países europeus, do Canadá e dos EUA: passou-se de 2,8 bilhões de dólares para 4,7 bilhões
de dólares. Uma das razões importantes do aumento foi o crescimento dos subsídios governamentais para NGOs
(Non-Governamental Organizations): quanto aos países membros da OECD (Organization for Economic Cooperation
and Development), por exemplo, eles subiram de 778,2 milhões de dólares em 1973 para 1,5 bilhões, em 1980. Com
respeito à comunidade européia, se em 1976 dava às ONGs européias 4,8 milhões de dólares, em 1982 essa quantia
chegou a 22,7 milhões. (Fonte:
http://empreende.org.br/pdf/ONG's,%20OSCIP'S%20e%20Terceiro%20Setor/Evolu%C3%A7%C3%A3o%20s%C3%B3
cio-pol%C3%ADtica%20das%20ONGs%20no%20Brasil.pdf (acessado em 13.03.2011).

32
1987 em contraste com 10.000 a 12.000 por ano na década de 60. Entre 1980 e 1986
a arrecadação das organizações filantrópicas – charities - britânicas cresceu cerca de
221%. Estimativas mais recentes da década de 90 registram em torno de 275.000
charities na Grã-Bretanha, com um ingresso equivalente a mais de 4% do PIB. Na
Itália, pesquisas indicam um forte impulso na formação de organizações voluntárias
nos anos 70 e 80.

Assistíamos a uma formidável expansão das iniciativas civis em cujo ventre também
estava a Saúde. O fenômeno não é novo, com certeza. A tese do sacerdócio
universal, proclamada pela reforma protestante no século 16, abriu as hierarquias
sagradas para a participação dos fiéis. O ingresso das classes trabalhadoras na vida
pública é tema constante da modernidade e compõe um capítulo obrigatório das
histórias sociais a partir do século 19. (Fernandes - 1994)

Após aprofundamentos no tema, é possível traçar a mesma temática de análise e


retrospectiva para o Brasil no sentido de que essa distinção entre a idéia do Público e
a idéia do Privado nos remete até as revoluções americanas e a revolução francesa,
pois, são nesses períodos que o poder do Estado se impunha e proporcionou as
possibilidades de se desenvolverem políticas de Estado e políticas de pressões da
sociedade civil. As visões são as mais variadas entre definições do que é Estado e do
que é Privado. Do que é política pública e política privada e terceiro setor.

Conforme descreve Carlos Antonio Morales67, (1999), não estamos nos referindo
apenas a quantidades significativas, mas da qualidade socialmente reconhecida e de
importância cultural inquestionável. Tomando alguns exemplos esparsos, podemos
alinhar, no caso do Brasil, algumas instituições de grande prestígio nacional que se
enquadram como Fundações, com braço filantrópico, produzindo serviços sociais,
como as Pontifícias Universidades Católicas, a Fundação Getúlio Vargas, na área de
ensino e as Santas Casas de Misericórdia, o Hospital Sírio Libanês de São Paulo e
sua benemerência e a Beneficência Portuguesa, na área de Saúde, diferentes entre si,
mas convergentes na saúde.

Nos países desenvolvidos, existe larga tradição de instituições sem fins lucrativos
organizadas pela sociedade civil. A partir dos anos 80, entretanto, vimos nascerem
novas organizações públicas não estatais a partir de organizações estatais
transformadas. Esse é o caso, na Inglaterra, dos Quangos, quasi non-governmental
organizations – sociedades civis que passaram a receber recursos orçamentários do
governo inglês; dos museus nacionais, na Holanda; das charter schools, escolas
comunitárias gratuitas, financiadas com recursos públicos, nos EUA, todos eles
exemplos de organizações públicas não estatais que assumiram papel institucional de
grande relevância social. 68 Isso, com certeza, poderá também acontecer na saúde,
embora seja mais complicado e custoso.

67
No livro “O Público não-estatal na reforma do Estado” – de Luiz Carlos B. Pereira e Nuria Cunill Grau (org). – pág. 51
68
Algumas escolas charter são fundadas por professores, pais e ativistas que se sentem limitados pelas tradicionais
escolas públicas. O Estado autoriza. São muitas sem fins lucrativos.

33
No Brasil, o Parque Nacional da Serra da Capivara, o maior e mais importante sítio
arqueológico brasileiro, onde se encontram indícios da presença humana no
continente americano há mais de 40 mil ano é administrado por uma organização não
governamental, a Fundham – Fundação Museu do Homem Americano.

Finalmente, as experiências têm demonstrado que, apesar de esses programas serem


financiados com recursos públicos, o caráter público de suas ações não tem sido
preservado, levando a uma espécie de privatização. Nesse modelo, portanto, os
critérios públicos são substituídos por critérios privados de organização e de acesso a
bens e serviços sociais.

“A filantropia substitui o direito social. Os pobres substituem os cidadãos. A ajuda


individual substitui a solidariedade coletiva. O emergencial e o provisório substituem o
permanente.” (Laura Tavares – 2003).

O aprendizado com a Igreja e a Universalização

Para fazer políticas públicas é necessário analisar – sob o ponto de vista da dialética
marxista – que o Estado é a fonte universal da vida ética da nação, pois ele tem a
norma jurídica, tem a cobrança dos impostos e têm a força para impor sua capacidade
de monopolizar eventuais dúvidas de decisão. O Estado é detentor daquilo que dá
visão de público. A força, as normas jurídicas e os impostos.

Para conquistar a saúde é necessário intervir, de maneira deliberada e programada,


para mudar as relações sociais, não bastando modificar a relação direta, sob a visão
da saúde, entre o homem e a natureza. A saúde, justamente, porque exige uma
mudança das condições de vida, isto é, uma remoção das causas morbígenas criadas
pelo homem, exige democracia, comporta participação direta da comunidade.
Portanto, as instituições de saúde para atingirem seus objetivos devem ser
democraticamente geridas pelos técnicos e pelos cidadãos.

Giovanni Berlinguer, (1978) 69·, afirma que as doenças de hoje e de amanhã se não se
intervier a tempo, têm como causas fatores artificiais, isto é, fatores não preexistentes
na natureza, mas criados, estimulados ou reforçados pela intervenção do homem.

J. Habermas (1994), mais próximo da concepção de Foucault, naquilo que se refere


ao público como aquela instituição - formada pela burguesia - e que – pressionada por
ela promovem políticas que sejam de interesse da sociedade civil – limitando assim, o
Estado. A instituição estatal teria como referência a chamada opinião pública, a qual
se define pelo conjunto dos cidadãos burgueses que pressionam as decisões políticas
por meio do diálogo na sociedade civil e nos parlamentos, o que pode resultar em
limitar o Estado.

Quase todos esses referenciais teóricos não vão a antes do século XVIII. É a partir
desse período que um desses atores, a Igreja, mostra sua força como instituição e
fonte de saberes e de conceitos de seu interesse.

69
Em seu livro, Medicina e Política- 1978

34
Tais questionamentos demonstram que o público tem ligações próximas ao privado e
vice-versa. Afinal, não se pode esquecer que é a sociedade civil que paga os impostos
para que o público produza ações sociais e políticas. Pode-se correlacionar com a
igreja que capta recursos das pessoas na forma de coletivo para atender o individual –
situações emergenciais – ou o privado da comunidade – casos de extrema
necessidade do indivíduo ou da família.

A análise de todo esse quadro estrutural nos leva a conceber a difusão existente entre
o público e privado em vários setores da economia e na sociedade, com suas
limitações de tamanho, contradições e paradoxos quando comparadas suas
imbricações com o Estado e o mercado.

Trata-se de uma aferição difícil quando nos aprofundamos no tema. A fronteira entre o
público e o privado confunde muito o cidadão comum. Essa discussão teórica quer
parecer, tem relação prospectiva nas revoluções Americana e Francesa, todavia,
conforme afirma Romano (1979) ela é proveniente e recorrente de séculos anteriores
com forte influência da Igreja Católica.

E novos pensamentos sobre o Protestantismo e o Ateísmo? Como ter novamente e


com maior abrangência o mando sacral? Necessário então ter mais detalhadamente
os registros dos fiéis. Há extensa biografia à respeito do mundo sacral. A Bula Clericis
Laicos de 1296 foi escrita para proibir os reis de taxar impostos, por exemplo.70

Dessa forma a igreja toma corpo e define um mapeamento de sua região, paróquia,
conhecendo os que efetivamente dela participam e a temem, sabendo quem vai à
missa ou quem deixa de ir. De certa forma a igreja era – no passado – muito mais
organizada e mais forte que o próprio Estado, pois se adiantou em informações e
definiu sua linha de conduta para o futuro que se avizinhava. Houve momentos na
história da Igreja em que ela se confunde verdadeiramente com o Estado local.

70
Romano sugere a leitura do Livro “Os dois corpos do Rei” de Ernest Kantorowiz sobre o assunto do mando sacral –
tradução de Cid Knipel Moreira – Companhia das Letras – SP – 1998.

35
CAPÍTULO 2

A saúde no Brasil
Da Colônia ao Pacto pela Saúde (2006).

Assim foi no Portugal de 1500, onde os encarregados da saúde do povo eram os


almotacéis, aos quais competia verificar os gêneros alimentícios, apreendendo e
destruindo os que não estivessem em boas condições. Ao Brasil-Colônia eram
extensivas a legislação e práticas vigentes na Corte. D. Manuel, em 1521, o
Regimento do Físico-Mor e do Cirurgião-Mor do Reino, instituindo-se os Comissários-
Delegados nas Províncias, inclusive no Brasil. 71Os brasileiros ainda eram os
selvagens.

Os selvagens brasileiros eram de robusta constituição física. Segundo historiadores


escasseavam as moléstias quando do descobrimento. Segundo descrições deixadas
pelos sacerdotes do século XVI as doenças que existiam e que atacavam os
selvagens era a bouba ou piã, caracterizada pelo aparecimento de lesões cutâneas. O
bócio, também conhecido como papeira, algumas parasitoses e dermatoses,
reumatismo, gripe e disenterias. Situações também como mordeduras por animais
venenosos, cegueira e perda de membros. Quanto a sífilis e a malária, a questão é
controvertida. Quer parecer que não existiam.

O selvagem tinha nojo e horror pela doença. Apartava-se logo daquele que enfermava.
Nos partos a mulher paria com a maior facilidade, seccionando ela mesma o cordão
umbilical e carregava o recém-nascido para o banho no rio. Quando o doente estava
desenganado pelo pajé, o indígena via-se abandonado à própria sorte e morria sem
assistência nenhuma. Morto, era enterrado de cócoras, com a cabeça entre os joelhos
de frente para o nascente. Algumas tribos mumificavam os corpos pelo fogo e outras
conservavam o esqueleto, untado com óleos vegetais e enfeitado com penas de
pássaros.

Como plantas medicinais, usava-se o caju, o ananás e o jaborandi como diuréticos; o


guaraná nas disenterias; a copaíba, a pariparoba e a cabriúva na bouba e em
ferimentos e outras afecções. O maracujá nas febres, a poaia e a batata-de-purga
como purgativos, a contra erva e o pau-cobra nas mordeduras de serpentes, o tabaco
e o jataí nas doenças pulmonares. Utilizava ainda a urina, a saliva, o sangue humano
e de animais, gordura de onça, bicos, garras, chifres, osso e cabelos e ainda sapos
queimados e reduzidos a pó. Os dentes, quando careados, eram arrancados com
instrumentos de madeira. Para se preservar das picadas dos insetos untavam-se com
fruto do jenipapeiro e do urucuzeiro. 72

Nos tempos da catequese, os jesuítas moveram campanha de descrédito aos pajés.


Com isso, muitas plantas medicinais brasileiras incorporaram-se à farmacopéia
brasileira e mundial. Embora não se tenha conhecimento de qual é o relatório médico
mais antigo do Brasil, sabe-se que, nos três primeiros séculos de colonização, as

71
Santos Filho (1980) – Este capítulo 2 – foi baseado em grande parte neste autor.
72
Santos Filho (1980)

36
únicas formas de assistência médica e hospitalar disponibilizadas à população eram
as enfermeiras jesuítas e as Santas Casas de Misericórdia73 .Elas precedem a própria
constituição jurídica do Estado brasileiro. Uma vez criadas, a primeira em 1543, por
Tomé de Souza, que era o mandante geral da colônia, passaram a se dedicar ao
atendimento de enfermos, amparo à velhice, à criança, aos hansenianos e a educação
entre outros trabalhos. A assistência médica foi uma das formas de catequisar o
indígena. Contava-se então, na época, com a Companhia de Jesus para atender além
do indígena, os colonizadores e outros. (Santos Filho – 1980).

Chegados à Bahia em 1549, no séquito do governador geral Tomé de Sousa, os filhos


de Santo Inácio aqui permaneceram até 1759, quando foram expulsos por
determinação do Marquês de Pombal. Nesses dois séculos que permaneceram,
ajudaram o indígena, foram os professores das primeiras letras e de artes e ofícios.
Seus colégios espalharam-se por todo o território. Desses irmãos jesuítas,
sabidamente, Manoel de Nóbrega e José de Anchieta.

Fizeram de tudo. Medicavam, lancetavam, sangravam e até partejavam. As cartas


enviadas sobre o Brasil do século XVI, endereçadas aos superiores da Companhia de
Jesus na Europa, encerram preciosos dados e observações sobre a patologia e
terapêutica da época. As doenças da época e seus remédios. Já naquela época
epidemias apavorantes de varíola e de sarampo, malária, disenterias, dizimavam
adultos e crianças. Não poupava ninguém. A todos socorriam os jesuítas com seus
parcos conhecimentos médicos e de enfermagem. Sangraram variolosos e os
sarampentos. Receitavam cará nas disenterias. Contra a maleita aplicaram a quina do
Peru. A quina do Peru ficou conhecida na Europa como o pó dos jesuítas. Contra o
cálculo de vários tipos, receitavam caldo de ananás verde. Obtiveram êxito com a
poaia, ou ipecacuanha, como purgativo. (Santos Filho – 1980).

Uma das atribuições principais de autoridades na Colônia era conceder graduação aos
físicos, licenciar boticas e autorizar o exercício de atividades auxiliares da arte de
curar. E em 1744, já no reinado de D.João V, foi reiterada ao então Vice-Rei do Brasil,
Conde de Galvêas, em ordenação real, quanto à imposição de inspecionar as boticas
de três em três anos, com percepção de taxas, bem como a apreensão e destruição
de drogas alteradas.

Em 1782, por lei da Rainha D. Maria I, foi reformada a organização estabelecida,


instituindo-se a Junta do Protomedicato, constituída de sete deputados com mandato
de três anos. A primeira organização nacional de saúde pública no Brasil,

73
No Brasil, a necessidade de internação de pacientes destituídos de recursos ou recém-chegados, sem família e sem
moradia, acarretou logo no século XVI a criação das Santas Casas da Misericórdia, segundo os moldes da
estabelecida em Lisboa. O surgimento dessas coincidiu com uma nova política de ocupação de terras inaugurada pela
Coroa Portuguesa, promovendo a intervenção direta dos empreendedores europeus na esfera da produção conforme a
legislação das sesmarias e o estabelecimento de capitães-donatários, todos fidalgos da pequena nobreza, segundo a
prática feudal lusa. Em 1548, a Coroa portuguesa resolveu intervir mais diretamente na questão do povoamento do
território brasileiro, nomeando como primeiro governador-geral Tomé de Souza, fidalgo e rico aventureiro da carreira
das Índias. Esse se estabeleceu na Bahia, fundando a cidade de São Salvador, capital do Brasil colonial até 1763. O
governo de Tomé de Sousa (1549-1553) foi sucedido por outras quatro administrações gerais até a União Ibérica, em
1580, quando o reino de Portugal se uniu ao da Espanha. O domínio espanhol sobre o Brasil foi importante na
formação das várias das nossas instituições - entre elas as Santas Casas - que se disseminaram ao longo dos séculos
pelas principais cidades e vilas, com fins de dotar a colônia de estabelecimentos para a assistência hospitalar, ou seja,
visando entre outras obras piedosas e de caridade também curar os enfermos.
http://www.sbhm.org.br/ - acessado em 19/05/2005. (sbhm: sociedade brasileira da história da medicina)

37
propriamente em 1808, quando D. João VI, transferia a Corte para o Brasil,
restabeleceu as funções de Físico-Mor e Cirurgião-Mor, além dos Juízes-Comissários,
Delegados do Físico-Mor, com a exigência de que fossem formados por Coimbra. No
mesmo Ato de 27 de fevereiro de 1808 foi criado o cargo de Provedor-Mor de Saúde
da Côrte e do Estado do Brasil, embrião da Diretoria de Saúde dos Portos, com
delegados nos Estados.74

Nas boticas dos colégios havia uma farmacopéia manuscrita intitulada Coleção de
Receitas, onde se alinhavam drogas simples e compostas, as mais indicadas para
diversas doenças. Quando sobrevinham epidemias de bexigas, os padres cediam as
suas próprias casas para internação e tratamento dos variolosos. Pode-se afirmar que
a medicina predominante no Brasil no século XVI foi a dos jesuítas.

Depois de instaladas as Misericórdias é que se passou a assistência com as


enfermarias e boticas através do irmão-enfermeiro e do irmão-boticário. Assim, as
Santas Casas de Misericórdia se espalharam pelo território brasileiro. Atualmente, via
CMB - Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades
Filantrópicas, são mais de 2.000 em todo o território brasileiro. São responsáveis por
mais de 175.000 leitos hospitalares do País e em muitos deles são verdadeiros
centros de referência e excelência médica. As Santas Casas foram responsáveis pela
criação das primeiras Escolas de Medicina e de Enfermagem.75 76

Nos três primeiros séculos a medicina e a saúde praticada no Brasil basearam-se nos
princípios e ensinamentos da ciência ibérica, de Portugal e Espanha. A partir do
século XIX percebe-se que ela seguiu a medicina e os métodos de saúde da França.
Outras teorias também tiveram seu período de moda. A homeopatia, por exemplo,
doutrina lançada em Dresde (1810) por Samuel Hahnemann, foi introduzida por Benoit
Jules Mure (1809-58), João Vicente Martins (1808-54) e outros que nela acreditavam.

No século XIX, a doença infecciosa gastrintestinal provocada pelo vibrião colérico,


descoberto em 1883, veio acrescer o quadro patológico brasileiro. A primeira epidemia
começou no Pará, onde desembarcaram coléricos e por dois anos (1855-56) acarretou
a morte de umas duzentas mil pessoas. (Santos Filho – 1980)

Durante o período colonial, a medicina também era exercida por pajés, feiticeiros
africanos, jesuítas, cirurgiões portugueses, hispânicos e holandeses. A forma de
administração, na época, dificultava a criação de ensino superior de medicina, pois
isso seria uma ameaça à dependência de Portugal. Havia alguns médicos brasileiros,
formados na Europa e alguns europeus que vinham exercer aqui a sua profissão.

A partir do século XVIII e foi em 1773 que o Marquês de Pombal decretou a abolição
das expressões diferenciadoras de “cristão-novo” e “cristão-velho” a todos igualando, e
74
Santos Filho (1980)
75
http://cmb.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=16&Itemid=30&limit=1&limitstart=2
76
Cerca de 2.100 Santas Casas e Hospitais sem fins lucrativos fazem a diferença para a saúde no Brasil e todas elas
estão ligadas a Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas – CMB. Estima-
se que 800 são Santas Casas de Misericórdia. Quase 7 milhões de internações hospitalares em 2008, das quais quase
5 milhões pelo SUS. As Santas Casas respondem por 41% das internações do SUS. Há 104 Operadoras Filantrópicas
de Planos de Saúde. Empregam quase 500 mil empregos diretos e mais de 140 mil médicos autônomos.
(www.cmb.org.br)

38
isso proporcionou que os médicos passaram a usufruir de melhor consideração social
e ocupar posição social de relevo em vista de suas origens de centros europeus como
Edimburgo e Montpellier. Já haviam também médicos brasileiros formados em centros
europeus.

Ser médico era ser destacado na sociedade colonial. Desfrutavam de boa situação
financeira e tinham grande respeitabilidade pela burguesia citadina. Alguns destacam-
se. A Academia dos Felizes, fundada no RJ em 1736, teve a presidência do cirurgião-
mór Mateus Saraiva. A Academia Científica de 1771, e a Sociedade Literária, de 1786-
94, ambas no Rio de Janeiro, contavam em seu seio profissionais dos mais
destacados do Vice-Reino. Foram eles, José Henriques Ferreira, Ildefonso José da
Costa Abreu, Maurício da Costa, Luís Borges Salgado, Vicente Gomes da Silva e
Manuel Joaquim Henriques de Paiva. Este último, conceituado clínico em Lisboa,
publicou várias obras medicas e retornou ao Brasil. Em 1829 faleceu no cargo de
professor da Academia Médico-Cirúrgica, José Pinto de Azeredo e Francisco de Melo
Franco, naturais do país, fizeram fama na metrópole.

Muitos foram os físicos no Brasil entre os séculos XVI a XVII, portugueses, espanhóis,
franceses, holandeses, mas merece, entretanto, um destaque a figura do médico
holandês Willem Piso (1611-78), senhor que foi de cultura humanística, adquirida nos
Países-Baixos, o autor da primeira parte da História Naturalis Brasilae, Amsterdam,
1648, denominada de Medicina Brasiliense. Permaneceu em Recife de 1637 a 1644.
Tal obra é um verdadeiro tratado da patologia brasileira de então. Quem o trouxe para
o Brasil foi o conde de Nassau. (Santos Filho – 1980)

Cirurgiões-barbeiros, cirurgiões-aprovados e cirurgiões-diplomados, tais foram os que


praticaram a arte da medicina e da saúde nas populações do século XVI a princípios
do século XIX. Foi um grande período. Os cirurgiões-aprovados seguiram um curso
teórico-prático em hospitais. Antes disso não havia no Brasil escola para o ensino
médico e isso foi o propósito para a formação de cirurgiões-barbeiros em algumas
Santas Casas de Misericórdia e Hospitais Militares no século XVIII.

Em 1803 o capitão-general de São Paulo, Antonio José de Franca e Horta, instituiu


oficialmente no Hospital Militar uma “Aula de Cirurgia” que foi freqüentada por seis
estudantes, os quais, em março de 1804, passaram por exames e foram aprovados.
No início do século XIX, se não havia condições para a administração do ensino
médico, já para o de cirurgia, muito menos complexo, achavam-se aptos certos
hospitais e mestres. (Santos Filho – 1980).

Durante todo o período Colonial no Brasil, os problemas de saúde e higiene ficavam


sob a responsabilidade das localidades. Elas tomavam medidas contra a imundície
das ruas e quintais. Era necessário criar também escolas de nível superior para as
inúmeras necessidades que, com uma nova corte, o país iria necessitar.

39
Brasil – Monarquia e Saúde

No Brasil a Constituição de 1824, primeira carta Magna,77 estabeleceu os socorros


públicos. Havia alguma preocupação com a seguridade social, sendo criado o primeiro
Montepio cujo nome era montepio Geral dos Servidores.

A data de 1889 foi a dicotomia entre Reinado – Monarquia – e a República.78 Nesses


idos do final do século XIX, a igreja já tinha suas articulações estabelecidas em
territórios em que o Estado ou a República nem imaginavam que existiam.

A penúria era geral. Não havia nenhum tipo de atendimento público às populações que
se encontravam em São Paulo, Capital, Rio de Janeiro, Salvador e interior desses
Estados. Doenças debilitantes como a Ancilostomíase79 e a Malária eram comuns em
todas as províncias.

Outras regiões como o sertão brasileiro, estados longínquos como Mato Grosso, Mato
Grosso do Sul,80 Piauí, Roraima, Amazonas e outras regiões consideradas distantes
do governo central, não eram ainda territórios de serviços de Saúde. Higienização
ainda era uma palavra pouco conhecida. Não se pode esquecer que relações com
escravos e o domínio português, foram atividades durante quase três séculos,
acompanhando ciclos econômicos do açúcar (1550-1570) e do café entre 1820 e
1870.81 Nesse período não havia nenhum desenvolvimento econômico e a miséria,
doenças, invalidez, indigência prevaleciam sob o mando dos exportadores de madeira,
café, açúcar e da Igreja Católica que abarcava a evangelização através de
mecanismos de controle e apoio do Reinado e depois da República.

No Brasil, desde a colônia até o século XX, a Igreja cumpriu funções na área da saúde
e de todas as demais áreas que atendiam a população. As Santas Casas são
exemplos marcantes na filantropia de saúde no Brasil. De resto, a benemerência das
pessoas. Na tese de Doutorado de Aldaíza O. Sposati,82 ela retrata alguns episódios
da época- 1803 - um dos quais, em que o vigário de São Miguel informava ao
governador da Capital de São Vicente (São Paulo) sobre a “impossibilidade d’elle
poder existir com a insignificante porção que os moradores oferecerão a sua

77
A elaboração da Constituição do Brasil de 1824 foi bastante conturbada. Logo após a Proclamação da
Independência do Brasil, em 7 de setembro de 1822, ocorreu um conflito entre radicais e conservadores na Assembleia
Constituinte. A Independência do Brasil não havia se consolidado com a aclamação e coroação do Imperador, mas sim
com sua Constituição. A Assembleia Constituinte iniciou seu trabalho em 3 de maio de 1823, quando o imperador Dom
Pedro I discursou sobre o que esperava dos legisladores.

78
O Estado brasileiro – de certa forma - surgiu contra a Revolução Francesa, como uma tentativa de prevenir nos
trópicos os supostos desmandos democráticos das Revoluções Americana e Francesa, mas com bastidores de comitê
privado das classes dominantes. (Aciole – 2006).

79
Transmite-se através do solo pelos ovos depositados nas fezes e daí tornam-se embrionados. Nas crianças causa
amarelão, enfraquecimento e conseqüente anemia. Na década de 50 era chamada doença do Jeca Tatú.
Recomendava-se higiene. Lavar as mãos e usar sapatos.
80
Nessa época eram um único Estado.
81
Yida – pág. 25
82
Sposati, Aldaiza– livro “História da Pobreza assistida em São Paulo” – 1987 – pág. 65

40
subsistência e não devendo ser obrigados a contribuir com mais pela pobreza a que
se vêem reduzidos”.

Com a super concentração de todas as decisões no poder central e com a maior força
dos poderes do Executivo tem um federalismo que não permite diversidade nos
ordenamentos legais e nas políticas públicas principalmente de Saúde dos estados e
municípios.

Criação das primeiras escolas superiores

Depois da transferência da Corte Portuguesa para o país, em 1808, duas escolas de


medicina foram criadas por D. João, uma em Salvador, na Bahia, em fevereiro de
1808, e outra no Rio de Janeiro. Quem foi nomeado para cuidar da fundação das
escolas foi o cirurgião-mor do Reino, o brasileiro Dr. José Correia Picanço (1745-
1823). A realidade da Saúde no Brasil precisa ser vista como um grave problema que
esteve latente antes da vinda de D. João VI ao Brasil e que foi sendo curada somente
e lentamente ao longo das últimas gerações. No caso do Brasil aquela vinda de D.
João VI, que fugia de Napoleão na Revolução Francesa deu início ao Estado brasileiro
e a Saúde brasileira. Um Estado de decisões centralizadas, monárquico num território
tão grande e uma diversidade de culturas e de população que nem o rei conhecia.

É necessário ter uma visão do que era a população na época. Em 1822, o Brasil tinha
4,5 milhões de habitantes – menos de 3% de sua população atual – divididos em
800.000 índios, um milhão de brancos, 1,2 milhões de escravos, africanos ou seus
descendentes e 1,5 milhão de mulatos, pardos, caboclos e mestiços. 83 Bem depois,
em 1884, faltando cinco dias para a Proclamação da República, ainda havia no Brasil
1.240.806 escravos. De cada três brasileiros, dois eram escravos, negros, forros,
mulatos, índios ou mestiços. Era uma população muito pobre e carente de tudo.

A atual Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro foi criada


por D.João VI, por meio de Carta Régia assinada em cinco de novembro de 1808, que
determinava o estabelecimento de uma Escola de Anatomia, Medicina e Cirurgia no
Hospital Morro do Castelo. Posteriormente, em três de outubro de 1832, durante a
Regência,foi sancionada a lei que transformava as academias médico-cirúrgicas das
cidades do Rio de Janeiro e de Salvador em Escolas ou Faculdades de Medicina. As
duas escolas transformaram-se anos depois em Academias Médico-Cirúrgicas,
obedecendo ao plano apresentado pelo Dr. Manuel Luís Álvares de Carvalho, que em
1812 foi nomeado diretor dos estudos médicos e cirúrgicos da Corte e do Estado do
Brasil. Uma característica desse período foi o predomínio das chamadas doenças
pestilenciais, notadamente varíola, febre amarela, malária e tuberculose.

A Academia no Rio de Janeiro instalou-se em 1813, na Santa Casa de Misericórdia,84


83
Laurentino Gomes – 1822 – Nova Fronteira – RJ – 2010 – (também em história demográfica do Brasil em:
http://historia_demografica.tripod.com/pop.pdf).

84
Atualizando, de 1988 a 2008, realizou 11,8 milhões de consultas, 746 mil internações e 704 mil cirurgias para os
pacientes do SUS de Porto Alegre e de todo o Rio Grande do Sul – como exemplo do volume de atendimentos.

(Fonte: http://www.santacasa.org.br/revista/vermateria.asp) (acessado em 13.03.2011).

41
e a da Bahia, também sediada na Santa Casa, só funcionaria em 1815. Havia aulas e
concediam o diploma de cirurgião-aprovado ao aluno que em cinco anos cursasse as
diversas cadeiras de anatomia, química, fisiologia, higiene, etiologia, patologia,
terapêutica, operações, obstetrícia e clínica médica. Recebia o título de cirurgião
diplomado, aquele que repetisse em mais um ano as disciplinas lecionadas nas duas
últimas séries. Essas academias perduraram até 1832.

Santos Filho,(1980) destaca, que nesse ano, que era Regência, o futuro D. Pedro II,
transformou-as em Faculdades de Medicina. O curso passou então para seis anos. No
final do curso após defesa de tese, o aluno obtinha o diploma de doutor em medicina.
Essas faculdades passaram também, até o século XX, ministrar cursos farmacêuticos
em três anos, curso de obstetrícia para parteiras em um ou em dois anos e o curso
odontológico, em três anos. Este último foi instituído em 1884 por uma reforma. Foi
nesse período, entre o fim da Monarquia e início da República Velha, que a sociedade
brasileira iniciou a constituição do seu Estado moderno, marcado pelo predomínio dos
grupos sociais vinculados à agro exportação cafeeira.

Após a Independência foi promulgada aos 30 de agosto de 1828 a lei de


municipalização dos serviços de saúde, que conferiu às Juntas Municipais, então
criadas, as funções exercidas anteriormente pelo Físico-Mor, Cirurgião-Mor e seus
Delegados, todavia, foi retirado das mesmas Juntas o direito de cobrar tributos
sanitários. A Inspeção de Saúde Pública do Porto do Rio de Janeiro, subordinada ao
Senado da Câmara, foi criada ainda em 1828, sendo duplicado em 1833 o número de
seus integrantes, com a divisão das atividades em serviços de terra, inclusive a
quarentena em Jurujuba, e o serviço de mar, com sede na então Ilha de Villegagnon,
além da criação de Inspetorias em todas as províncias marítimas.

Obedecendo ao mesmo critério de luta contra as epidemias criava-se o Instituto


Vacínico do Império em 1846 e tornava-se obrigatória a desinfecção terminal dos
casos de morte por doença contagiosa, a critério da autoridade sanitária, em 1878. Até
1850 as atividades de Saúde Pública, em resumo, estavam limitadas aos seguintes
itens observáveis: a) Delegação das atribuições sanitárias às Juntas Municipais, b)
Controle de navios e saúde dos portos e c) Autoridades vacinadoras contra a varíola.
(Rodrigues – 1967).

Em 1851 era regulamentada a lei que criara a Junta Central de Higiene Pública. Essa
Junta era composta de um Presidente, nomeado pelo Governo, dos Cirurgiões-Mores
da Armada e do Exército, além do Provedor da Saúde do Porto e do Inspetor Geral do
Instituto Vacínico. Esse colegiado criou as funções de médicos efetivos das Paróquias,
para atender a polícia sanitária e ao saneamento.

O primeiro Hospício de Pedro II, para os alienados, inaugurou-se somente em 1852.


Os doentes mentais, antes do hospício, eram recolhidos às cadeias públicas e isso
transcorreu ainda durante muito tempo. Em 1854 surgiu o Imperial Instituto dos
Meninos Cegos, o primeiro que se sabe para propiciar assistência especializada aos
destituídos de visão. (Santos Filho – 1980)

Em 1856, a Faculdade de Medicina foi transferida para o antigo prédio do

42
Recolhimento das Órfãs, na Rua Santa Luzia, ao lado da Santa Casa de Misericórdia.
Três nomes importantes relativamente às ações empreendidas na medicina e saúde
em Salvador, foram publicadas na Gazeta Médica da Bahia, a partir de 1866: Oto
Edward Henry Wucherer (1820-73), de ascendência alemã, mas nascido em Portugal,
formou-se na Alemanha e veio para Salvador em 1843 que fez pesquisas sobre o
amarelão, uma parasitose e a “Wuchereria” que era a causa desencadeadora da
Elefantíase. Outro notável, foi José Francisco da Silva Lima (1826-1910), natural de
Portugal, formado em Salvador e o terceiro pesquisador, foi John Ligertwood Paterson
(1820-82), natural da Escócia e falecido em Salvador, aonde chegou em 1842. Esses
três é que deram início ao que era chamado de Medicina Tropicalista.

Nesse período podem ser destacadas algumas realizações importantes que marcaram
profundamente a sociedade brasileira da época: a) reforma urbana do Rio de Janeiro;
b) reforma urbana da cidade portuária de Santos em São Paulo; c) criação do Instituto
Oswaldo Cruz no Rio de Janeiro; d) criação do Instituto Vital Brasil; e) leis e códigos
que davam vida à política de saúde. (Oliveira & Teixeira, 1989).

Uma Constituição, a de 1824 em quase nada muda o cenário, principalmente na


Saúde. Províncias foram criadas, governadores nomeados, era a Monarquia
hereditária e os deputados eram eleitos por quem possuía renda superior a cem mil
réis por ano. O Senado era vitalício.85 Esse novo Estado cria algumas leis como a Lei
de Terras, em 1850, lei número 601, autoriza-se a vinda de mão de obra do exterior, o
tráfico de negros foi extinto efetivamente em 1850 e a discussão da Abolição da
Escravatura vai até 1888. (Yida - 1994).

Em 1902 iniciou-se o governo Rodrigues Alves e, com ele, a saúde pública federal foi
entregue à lucidez e capacidade de Oswaldo Cruz, que iria inaugurar uma nova era
para a higiene brasileira, ao mesmo tempo em que São Paulo surgiam os trabalhos
desenvolvidos pela equipe onde se destacariam entre muitos Emílio Ribas e Vital
Brasil. Na reforma, Oswaldo Cruz, introduzida com o Decreto Legislativo n.º 1151, de 5
de janeiro de 1904, foi criada a Diretoria Geral de Saúde Pública, para atender as
capitais do país e a cuidar da defesa sanitária dos portos brasileiros.

Desenvolvimento e crescimento das escolas superiores

Em 12 de outubro de 1918, foi inaugurado, então, o primeiro prédio próprio da


Faculdade de Medicina da Praia Vermelha. Essa construção funcionou como escola
até 1920,86 quando foi criada, por decreto, a Universidade do Rio de Janeiro.

Outro marco importante da evolução sanitária brasileira foi a reforma Carlos Chagas
que, reorganizando os serviços de saúde pública pelo Decreto Legislativo 3.987, de 2
de janeiro de 1920, criou o Departamento Nacional de Saúde Pública. A
regulamentação desse diploma legal sofreu substituições e modificações até a
publicação do Decreto 16.300 de 31 de dezembro de 1923, que vigorou como
Regulamento Sanitário Federal por muitos anos. (Rodrigues – 1967).

85
Caio Prado Jr. – “Evolução política e outros estudos” - de 1957
86
Devido a epidemia da Gripe Espanhola.

43
Muitas mudanças ocorreram a partir de então: criação de Diretorias grupando
atividades então mais numerosas e diversificadas. Introdução de propaganda e
educação sanitárias na técnica rotineira de ação, ao contrário do critério policialesco;
criação de órgãos especializados de luta contra a tuberculose, a lepra e as doenças
venéreas, visando alcançar os êxitos que o já extinto Serviço de Profilaxia da Febre
amarela proporcionara; deu assistência hospitalar, infantil e a higiene industrial;
expandiu as atividades de saneamento em âmbito nacional, cuidando-se, pelo que se
sabe, pela primeira vez, de assistir e dar cooperação aos Estados mediante ação
executiva do governo federal; criação da Escola de Enfermeiras Ana Nery, abrindo o
caminho para essa importante profissão integrar a equipe de saúde pública.

Referências dos últimos 150 anos da Saúde no Brasil têm seus alicerces que
transcorria nas grandes capitais como São Paulo e Rio de Janeiro. Antes desse
período o que acontecia fora de São Paulo, Rio de Janeiro era desprezível como
informação, com exceção das Santas Casas de Misericórdia. (Santos Filho – 1980).

Mais de 90 anos se passaram até que outra escola fosse criada. Até 1960, havia 26
Faculdades de Medicina no Brasil. De 1930 a 1970, foram criadas 43 Escolas
Médicas, a maioria de iniciativa privada. Em 1996, havia 82 Instituições de Ensino de
Medicina autorizadas a funcionar e, com isso, teve início uma visão contextual geral de
uma identidade própria da saúde dos brasileiros. 87

Apesar dos percalços houve grandes reformas na saúde dos brasileiros. Houve
reformas no tempo do Brasil-Colônia e Brasil Reinado, Brasil Império, criação da
Diretoria Geral de Saúde Pública com Oswaldo Cruz, em 05/01/1904, a Organização
do Departamento Nacional de Saúde Pública com a reforma Carlos Chagas, pelo
Decreto 15.003 de 15/09/1921, a criação do Departamento Nacional de Saúde,
efetivamente, com Barros Barreto, em 02/04/1941. O Departamento Nacional de
Endemias Rurais e a Escola Nacional de Saúde Pública passaram a integrar o
Ministério da Saúde, respectivamente por força da Lei 2.743, de 06/03/1956 (Decreto
40.870 de 07/02/1957) e da Lei 2.312 de 03/09/1954 (Decreto nº 43.926, de
26/06/1958).88

A identidade da saúde brasileira passou por vários estágios. Ainda está presente a
mística, que coexiste com o saber técnico e com a questão do benefício social. O fato
de a Igreja Católica ter participado de nossa colonização e de ter aqui desenvolvido o
culto e a crença no passado entre a população e os indígenas, promovendo a idéia de
salvação pela fé jesuítica, gerou muitas fortalezas místicas e religiosas para a cura das
doenças.

Muito mais adiante, nos anos 60 essa mistura de identidades e uma saúde
desacreditada e com problemas graves de solução levantou uma identidade vinda do
setor privado: Na visão dos governantes da época, uma saúde suplementar seria bem-

87
Fonte: http://www.medicina.ufrj.br/notíciasAntDet.asp. Acessado em 22/01/2006.
88
Em virtude da Lei 5.019, de 7 de junho de 1966, a Escola Nacional de Saúde Pública foi incorporada à Fundação
Ensino Especializado de Saúde Pública. A Fundação Serviço Especial de Saúde Pública (F. SESP) foi criada pela Lei
3.750 de 11/04/1960.

44
vinda para ajudar a desafogar a pública. Começam a surgir então os planos de seguro
saúde e os convênios de saúde com empresas embora houvesse uma corrente
absolutamente contrária a abertura da Saúde para a atividade privada.

Em resposta ao Concílio Vaticano II, os bispos latino-americanos reuniram-se em


Medellin, Colômbia, em 1968 e proclamaram a doutrina de que a boa nova do
Evangelho implicava uma opção preferencial pelos pobres. O aggiornamento na
América Latina colocou a Igreja Católica num novo caminho. Foram os agentes
pastorais que deram origem as Comunidades Eclesiais de Base. 89 As paróquias
permaneceram poucas e imensas.

Tabela IV - Rede Paroquial no Brasil por Século


Século 15 17 18 19 20 Total
Número de Paróquias 22 76 282 1210 5.282 6.872
Dados até 1985 – Fonte – Bartholo, 1991

Traços deste passado histórico restaram na própria definição de “Público” e “Privado”


e geraram, por exemplo, a permanência e a influência da Igreja Católica nas políticas
públicas. 90

A análise da formação histórica mostra com clareza a Igreja participando das decisões
do Estado nas políticas públicas. Apesar da visão que temos na atualidade, é inegável
a forte permanência e cumprimento da Igreja Católica nas áreas de Saúde e de muitas
outras tarefas que caberiam ao Estado. Por isso o Clero era chamado pelos políticos
em todas as ocasiões importantes. Isso aconteceu desde a Colônia, Monarquia e até o
século XX. Nesses casos resta uma pergunta: A Igreja era pública por prestar
inestimáveis serviços públicos ou era privada como as instituições por ela
administradas, tais como as como as Santas Casas de saúde?

Na Saúde Pública pouco se discutia até então.91 A benemerência era o que contava e
já estava arraigada na sociedade da época. Homens ligados ao Império e mulheres
benemerentes, todos com títulos, participavam de comissões para a Saúde Pública e
isso lhes fornecia prestígio e celebridade. A tuberculose, a febre amarela,92 varíola93 e

89
Ainda que o ímpeto inicial tenha passado e que o impacto seja diferenciado, não há dúvida de que - nos últimos
tempos - introduziram um novo capítulo na história das associações formadas nas igrejas locais no continente. As
comunidades puseram as pessoas para falar. Difundiu-se nos meios católicos a crença genuína de que se as pessoas
pensarem juntas serão capazes de transformar a si próprias, a Igreja e o mundo. (Fernandes – 1994).

90
O Público e o Privado na Saúde. - Orgs. Luiza Sterman Heimann, Lauro César Ibanes e Renato Barboza - Editora
Hucitec - OPAS/IDRC São Paulo, 2005 pág. 23 - 41.
91
Em São Paulo, criou-se o Serviço Sanitário em 1892, com um orçamento de 300 contos de réis, que correspondia a
1/6 do orçamento estadual em 1891.

92
A febre amarela que era endêmica nas costas do golfo do México e nas Antilhas, propagou-se à Europa e à África
após a descoberta da América. Negros infeccionados teriam trazido para o Brasil. A primeira epidemia data de fins de
novembro de 1685. Principiou-se no Recife onde desembarcaram negros doentes. Durou cerca de dez anos. Há um
Tratado único da Constituição Pestilencial de Pernambuco, Lisboa, 1694, de João Ferreira da Rosa, segundo livro, em
vernáculo, da literatura médica brasileira. Somente em 1849 é que irrompeu outra epidemia e sabe-se que uma das
vítimas foi o senador e ex ministro Bernardo Pereira de Vasconcelos. O Rio de Janeiro livrou-se desse mal em
princípios do século XX, pelo saneamento levado por Oswaldo Cruz, conforme já comentado.
93
Importada da África onde era endêmica. Havia também na Europa. Denominação popular “bexigas”. Matou centenas
de milhares de indígenas e é apontado como o maior exterminador dos índios brasileiros. Segundo os jesuítas, os

45
a malária andavam à solta. Essas informações que temos da história retratam cidades
como as do Rio de Janeiro, São Paulo, algumas cidades de Minas Gerais e outras
onde se situavam as pessoas de forte opinião pública e de alguma influência política.
Imagine-se o resto do País com os problemas de Saúde Pública. Foram apurados
alguns dados que seguem em tabela abaixo.

No Vale do Paraíba, por exemplo, os municípios ficaram cem anos sem os serviços
públicos essenciais como cemitério, hospital e escola. Sem os serviços, eles recolhiam
os impostos que seguiam para o poder central, que distribuía os recursos segundo o
apoio político que recebiam das províncias. Em 1820 constatou-se aumento do
número de leprosos e em 1846 uma epidemia de febre amarela em Salvador.94

Tabela V - Mortalidade para cada 100.000 habitantes

Períodos Tuberculose Febre amarela Malária Varíola


De 1860 à 1870 11.303 1.706 801 620
De 1871 à 1880 7.902 5.225 3.149 2.513
De 1881 à 1890 5.648 2.274 2.640 1.964
De 1891 à 1900 4.952 4.369 3.410 1.866

A tabela foi resumida pelo autor da tese.


Fonte: B.A. Rodrigues – pág. 112.

O surgimento das Irmandades de Misericórdia a partir do século XVI, com suas


hospedarias e com os seus hospitais, foi dando início às Santas Casas. Além das
enfermarias jesuíticas, as Santas Casas, destinadas principalmente à pobreza,
contava ainda com os hospitais militares, destinados à tropa, os lazaretos para os
morféticos e os isolamentos para as quarentenas e para os portadores de doenças
contagiosas e epidêmicas como a varíola. Imagine como isso era pouco para a
vastidão do nosso território brasileiro. Hospitais militares datam de fato a partir do
século XVIII. Não se falava ainda como atender doenças mentais.

Os morféticos95 proliferavam e eram encaminhados aos lazaretos. A lepra torna-se


doença de notificação compulsória em 1911 – na forma como é determinado na
atualidade e é assumida pelo governo, passa para os cuidados da Santa Casa em São
Paulo em 1917 e oito anos depois é criada a Inspetoria de Profilaxia da lepra. (Yida –
1994).

primeiros variolosos chegaram à Bahia em 1561 e a primeira grande epidemia ocorreu em 1563. Não havia remédio.
Durou quatro séculos. A principal arma contra a doença, que é devida a um vírus, foi a vacina anunciada ao mundo em
1796 pelo médico inglês Edward Jenner. Em 1798, o médico Francisco Mendes Ribeiro iniciava no RJ a vacinação. O
povo era temeroso e fugia da vacinação. O primeiro vernáculo sobre o assunto e o sarampo intitulava-se Tratado único
das bexigas e sarampo, Lisboa, 1683 e o autor foi Romão Mosia Reinhipo. Fonte: Santos Filho, pág. 45 e 50.
94
A.R. Netto – “O caminho para formação do Serviço Sanitário de São Paulo” – 1942 – pág. 18/21
95
De acordo com o decreto federal 6.168, de 24 de julho de 2007, os pacientes internados compulsoriamente e
isolados em hospitais colônias de todo o País, até o ano de 1986, terão direito à pensão vitalícia mensal no valor de R$
750,00. Para receber o benefício, os pacientes precisam apresentar documentos que comprovem a internação
compulsória e preencher um requerimento de pensão especial. Outro dado importante, é que o Estado de São Paulo,
mantém um arquivo microfilmado de documentos, fichas de internação e prontuários de vítimas de hanseníase desde
1924. São 83 anos de informações sobre a doença. Outras informações sobre o benefício podem ser obtidas pelo site
da Secretaria de saúde no link definido como “hanseníase”.

46
O modelo agroexportador vigente na economia brasileira, no período, exigia
basicamente uma política de saneamento dos espaços de circulação das mercadorias
exportáveis e o controle de doenças que prejudicassem a exportação.

As municipalidades tinham autoridade para legislar e tomar providências, todavia,


percebe-se pela leitura da época, uma aversão dos negócios públicos para evitar
confrontos políticos. Sposati,96 em sua descrição, revela que “os fiscais da Câmara
também deveriam realizar inspeções e sugerir medidas adequadas, como por
exemplo, em relação aos cortiços. Uma das situações urgentes em São Paulo era
solucionar a precariedade das moradias. Contudo, como consta de jornal da época, os
fiscais temiam que as medidas mais efetivas comprometessem seu compadrio com os
vereadores e que isso levasse a perda do seu emprego...”

A República e a Saúde

A República já contava com alguns notáveis como Oswaldo Cruz97 e Emílio Ribas98
que sob a notoriedade conseguida, de forma privada, eram abraçados pelos
intelectuais republicanos. Outras doenças maltratavam a população brasileira. As mais
simples eram a Sarna e a Escabiose. As mais complicadas eram a Bouba,99 o Papo,100
o Sarampo, Sífilis, Filariose, Dracunculose, Macula, Escorbuto, doenças venéreas e
produtos contaminados.

Algumas datas são interessantes para reflexão: 1895 – decreto de Floriano Peixoto
sobre a carne de charque e contágio. Em 1895, por pressões da burguesia, criou-se a
Diretoria Geral de Saúde Pública. 1889 – surgiu a peste bubônica em Santos – que se
espalhou para o Rio de Janeiro. Isso gerou a criação de laboratórios como Butantã e
Manguinhos e entre 1899 e 1910 começaram a surgir as primeiras campanhas
sanitárias em Santos, São Paulo, Rio de Janeiro e Recife.101 A varíola dizimava
grandes contingentes de todas as raças e classes sociais. (Iyda - 1994).

Os períodos que merecem informações retrospectivas na saúde e suas relações


público-privadas são aqueles entre 1889 – a instalação da República até 1930 –
getulismo – de 1930 a 1950, de 1950 ao início do golpe militar em 1964, de 1964 até
final da década de 70 e até os dias atuais. Obviamente nesses períodos, à exceção
das décadas de 60 em diante, serão abrangidos os processos históricos, políticos e

96
Sposati, A. de O – “História da Pobreza Assistida em São Paulo” – 1987 – Tese de Doutoramento – PUC-SP.
97
Oswaldo Cruz – Era filho do médico Bento Gonçalves Cruz e de Amália Taborda de Bulhões. Nasceu em 1872 e
viveu em sua cidade natal, São Luís do Paraitinga até 1877. Seu pai transferiu-se para o Rio de Janeiro. Ingressou na
Faculdade aos 15 anos e interessava-se muito por microbiologia. Especializou-se em Paris no Instituto Pasteur de
Paris em bacteriologia. Em 1902 assumiu postos de direção na Saúde e teve muitas vozes contra quando tentou fazer
uma campanha de vacinação no Rio de Janeiro. Ele insistiu e depois venceu a batalha, pois em 1907 a febre amarela
foi considerada erradicada no RJ.
98
Emilio Ribas – Nasceu em Pindamonhangaba em 11/04/1862 e faleceu em 19/02/1925. Sanitarista. Formou-se pela
Faculdade de Medicina do RJ. Fundador do Instituto Butantã, implantou sanatórios em Campos do Jordão.
99
Os primeiros que versaram sobre essa doença foram André Thevet e Jean de Lery. Era endêmica no Brasil e atingia
os selvagens, que a chamavam de piã e miá e começou a atacar brancos e negros principalmente no Nordeste. São
lesões pustulosas na pele e mucosas. O primeiro ensaio a versar sobre o mal, Memória sobre as boubas, foi o
manuscrito de 1797, do Dr. Bernardino Antonio Gomes (1768-1823) – Santos Filho, Lycurgo – pág. 44.
100
Detectada pelos naturalistas viajantes entre os indígenas e seus descendentes mestiços, nas regiões do Sul, o
papo ou bócio, chamava a atenção pelo volume enorme atingido pelo pescoço. Sabe-se hoje que é uma hipertrofia da
glândula tireóide. Curioso é que naturalistas como Spix e Martius anotaram que elas consideram o papo mais
embelezamento do que deformação.
101
Iyda – pág. 36

47
sociais da Saúde Pública, pois a privada até então era incipiente e utilizada pelas
classes mais favorecidas via médicos particulares.

Apesar do longo período, observa-se que a sociedade vai se articulando sobre as


questões de saúde e doença e historicamente – numa luta permanente – demonstra a
necessidade de seus direitos, isso legitimado na forma de seguridade em longo futuro
na Constituição de 1988, ou seja, um século depois.

A Saúde Pública passa para a responsabilidade estatal quando da implantação da


República em 1889. A miserabilidade era o quadro nesse período. A República não
aconteceu por acaso. A deterioração do poder que reinava espalha-se. As classes
dominantes apavoram-se com o abandono e o descaso em todos os níveis, educação,
o saneamento básico, as doenças transmissíveis. Nesse ponto é que se pode afirmar
que a gênese da Saúde Pública se formou como objeto de consciência pública.

Nesse período o Nordeste nem fazia parte do mapa da República ainda. Durante
muitas décadas a questão social foi caso de polícia para o novo Estado, pois somente
por volta de 1930 é que se referia à ele nos discursos à trabalhadores brasileiros.
Pode-se afirmar que até essa época o Estado brasileiro ainda não existia. O que havia
de fato eram coalizões de poder de interesses privados daqueles que exportavam.
Eram as classes dominantes. A força do privado sobre o público fraco.

Eram de extrema urgência na República recém instalada, práticas sociais, regras,


sanções, ou seja, tornou-se um elemento político muito forte. Necessário
institucionalizar a Saúde Pública e para isso serão exigidos os recursos para tal. O
Estado, então, estabelecido e tentando uma hegemonia de poder inicia com uma série
de práticas burocráticas e nesse processo cria algumas medidas positivas para o
proletariado na época. Pode-se também afirmar que as relações sociais – nelas
envolvendo a Saúde Pública – tiveram seus primeiros conflitos de classes. Merhy,
(1985), observa que na etapa da República houve uma emergência institucional das
práticas sanitárias.

A legitimidade do Estado estava definida e a burocracia terá que buscar as forças e os


recursos financeiros para contratar as forças de trabalho para a Saúde e ir de fato de
mãos à obra. Constituirá então ao Estado a tarefa de controlar algumas doenças que
poderiam ser transmitidas à população na época, inclusive às classes dominantes até
então.

Relativamente à saúde das populações pode-se afirmar que somente as regiões


dotadas de maiores aglomerados e nas capitais é que havia trabalhos em Saúde
Pública. Com pouquíssimos hospitais e a preocupação maior dos governos era a
higienização. Tais preocupações em realidade eram pressões das burguesias locais
que temiam a progressão da tuberculose, rubéola, sífilis e outras doenças
consideradas na época, infeciosas. Ao capitalismo reinante interessa apenas pagar a
força de trabalho e não pagar paralisações por motivos de doença ou disseminação
dela pela sociedade.

48
Iniciavam-se os primeiros movimentos por melhores condições de trabalho e de vida
mais digna. Engrossavam então as fileiras de pessoas sem qualificação profissional e
de pobres que proporcionavam ainda mais o aumento de doenças por décadas em
vista de crescimento urbano ser maior que a industrialização. Algum tipo de ruptura
estava próxima. A gênese da saúde e de outras necessidades básicas da população
estava na forma e influência do colonialismo sob pressão do capital na época.

A situação da população continuava a mesma. No caso de novos brasileiros que


nasciam pelas mãos das parteiras curiosas, a vida e a saúde – quando não
prematuros ou com problemas neo-natais - os mesmos estavam nas mãos ainda de
homens bons102 e a benemerência da Igreja ou associações de bondosas senhoras. A
cirurgia obstetrícia no passado foi eminentemente mutiladora. Quanto a outras
cirurgias cortava-se o membro doente. Extirpava-se o órgão afetado. Lancetava-se a
tumor ação. Nessa época era perigoso intervir no corpo humano, pois a infecção pós-
operatória era quase certa. A quantidade de casos fatais eram impressionantes.
Somente após o advento da anestesia e da assepsia, em pleno século XIX é que a
cirurgia se expandiu. 103

A cirurgia104 principiou a tomar incremento no Brasil, no século XIX, já então exercida


pelos doutores em medicina e pelos professores das duas escolas do RJ e da Bahia.
Foi em 1842 que Cândido Borges Monteiro, realizou na Côrte a ligadura da aorta
abdominal, num caso de aneurisma da artéria ilíaca externa. (Santos Filho – 1980).

Nessa época ainda queixavam-se os profissionais de falta de instrumentos. Os ferros,


como foram chamados compreendiam tesouras, pinças, serras, cautérios, agulhas,
lancetas, escalpelos, bisturis e cânulas. Existiam ainda as sondas de prata,
evacuadoras da bexiga e seringas de metal para lavagem de feridas e da uretra.
Atendimentos às parturientes por médicos é assunto a partir do século XIX. 105

102
Não confundir com homem cordial. Em “Raízes do Brasil” de 1936, Sérgio Buarque de Holanda criou o conceito de
homem cordial – uma crítica à promiscuidade entre o Público e o Privado na vida brasileira. Revista Veja – pág. 131 de
21/01/09 – Edição 2096 – ano 42 – número 3.
““... A vulgarização de que foi acometido o conceito de “homem cordial” me faz lembrar-se das dores de cabeça que já
me causaram as interpretações equivocadas da teoria da dependência. Sérgio tomou a expressão de empréstimo a
Ribeiro Couto. Ao contrário do defendido por muitos, como Cassiano Ricardo, a cordialidade em tela nada tinha a ver
com os ritos de polidez. Na verdade, opunha-se a eles. Se a polidez era definida por normas impessoais, de aplicação
geral, a cordialidade tinha o timbre pessoal, dizia respeito ao comportamento ditado pelo coração, a lhaneza no trato, a
hospitalidade, mas também a inimizade, o favor. Enfim, identificava-se com os padrões de sociabilidade inerentes à
família... (Fernando Henrique Cardoso – Acervo de O Globo).

103
A instalação da sala de cirurgia, nos hospitais, data de fins do século XIX, depois das pesquisas de Louis Pasteur
(1822-95), em França, sobre os micro-organismos, depois da adoção da assepsia ou da desinfecção das mãos do
operador e dos instrumentos, preconizadas por Joseph Lister (1827-1912), depois da descoberta dos micróbios
contaminadores da ferida operatória. Nessa data, ou pouco antes, o operador fazia intervenções vestido como estava,
nem um avental usava e muito menos luvas. Os instrumentos eram apenas lavados em água e serviam para uma
operação ou para uma necropsia.
104
Praticou-se pela primeira vez nos EUA, em 1846, uma operação indolor através da inalação do éter. No ano
seguinte a experiência repetida no Hospital Militar do RJ. O clorofórmio foi usado na Europa em 1847, e em 1848,
empregando a máscara de Souberain, o cirurgião Manuel Feliciano Pereira de Carvalho efetuou a primeira
cloformização.
105
Há uma relíquia de obra de 1790 que o médico brasileiro, Francisco de Melo Franco, publicou o Tratado da
educação física dos meninos, para uso da nação portuguesa, em Lisboa, na oficina da Academia Real das Ciências,
onde se constata teorias e ensinamentos sobre a assistência à parturiente e sobre os cuidados com o recém-nascido.
O ensino da obstetrícia para mulheres iniciou no Brasil em 1832.
No Rio de Janeiro diplomou-se a mais célebre das parteiras, francesa de nascimento, Maria Josefina Matilde Durocher
(1808-1893) que passou para a história sob o nome de madame Durocher. Ela partejou a imperatriz D. Teresa Cristina

49
Se pensarmos que o Estado brasileiro firmou-se num território do tamanho de um
continente e nele os municípios se situavam numa enorme distancia em relação ao
poder central, os mesmos municípios viveram durante toda a colônia e a maior parte
do século XIX, entrando para século XX , na mais triste penúria de recursos públicos.
A década de 1920 – como já comentado - pode ser fixada como marco para se afirmar
que a partir dessa referência é que o processo histórico de Saúde se iniciou de fato.
Antes disso era um salve-se quem puder.

Nesse sentido o sanitarismo brasileiro, do início do século, guarda uma relação muito
próxima com a idéia de polícia médica desenvolvida na Alemanha e com a medicina
urbana desenvolvida na França. Braga e Paula (1981) mostram que na década de 20,
especificamente no ano de 1923, com a “Lei Eloy Chaves”, surge a Previdência Social
no Brasil com a criação das Caixas de Aposentadoria e Pensões (Cap’s). A partir de
1926 a assistência médica é incorporada como uma atribuição das Cap’s.

A descentralização republicana é meramente executiva, uma vez que os recursos


orçamentários, provenientes de taxas de importação, de selo e de consumo,
estabelecidos pela Constituição de 1891,106 beneficiaram apenas os estados
economicamente mais poderosos. Consequentemente, grande parte dos estados
dependia do governo federal, não se concretizando os ideais republicanos de
autonomia estatal. Uma maior interferência do governo federal encontrará maior
aceitação após 1920, em virtude da crise econômica cafeeira desde o início do século
e agravada com a Primeira Guerra Mundial.

Essas oligarquias – muitas regionais – tiveram seu modelo rompido na Revolução de


1930. Nesse momento getulista o Estado mostrou-se como esfera Pública forte em
novos conceitos econômicos e sociais. Nesse momento, no Brasil, o Público e o
Privado começam a ter rostos diferentes.

A expansão da assistência médica individual no Brasil como política pública faz parte
do processo de montagem e desenvolvimento da Previdência Social. A estruturação
do sistema previdenciário, de forma incipiente a partir dos anos 20 e mais
intensamente a partir dos anos 30 é o marco básico do sistema de proteção social
montado no Brasil, por meio do qual se desenvolveu a sustentação pelo Estado dos
direitos sociais. 107 108

Essa forma de se definir o público no Brasil seguiu para estabelecer uma ética política
peculiar. Como os municípios não possuíam recursos para as obras, como pontes,
estradas, prédios oficiais, “os homens bons”, os ricos fazendeiros que eram

e foi a primeira mulher a ser recebida, como membro titular, na Academia Imperial de Medicina, em 1871. (Santos Filho
– 1980).

106
Foi na República de 1891 que foi utilizado pela primeira vez na ordem jurídica brasileira o termo Aposentadoria.
Pela lei, Carta Magna, artigo 75 a aposentadoria por invalidez cobria apenas os funcionários públicos (Giusti, 2008). No
ano seguinte, a Lei 217 de 29/11/1892 instituiu a aposentadoria por invalidez e a pensão por morte para os operários
do Arsenal de Marinha do RJ.
107
Menicucci – pág. 61
108
No século XX o sistema de saúde brasileiro transitou do sanitarismo campanhista para o modelo médico-
assistencial privatista, até chegar nos anos 80, ao projeto neo-liberal (Villaça-Mendes-1999).

50
vereadores ou prefeitos, emprestavam seu dinheiro, seus escravos, e compravam
materiais para as obras. A contrapartida era emprestar do cofre público quando
estavam com dificuldades.

É a partir daí que se inicia, um longo processo pelo qual a pobreza começa a ser
identificada como incômoda e até perigosa e associada a valorização do trabalho e a
uma esfera de maior atuação do Estado no mercado de trabalho.

É também nessa década que se delineia a fragmentação de uma política social


dirigida aos trabalhadores em geral e aos trabalhadores urbanos ativos, via
previdência social. “O liberalismo, do qual que se serviram os independentes para
libertar-se de Portugal, sempre foi sensível às pressões dos interesses privados pelo
aumento da capacidade regulamentadora do poder público”. 109

Um tema correlato às relações entre público e privado que estamos investigando é o


da forma de governo. Os motivos pelos quais incluímos esta discussão a respeito do
tema são três. O primeiro é que o pensamento predominante tem elegido a
democracia como a forma de governo ideal para o Estado moderno. O segundo é que
os movimentos de Reformas Sanitárias110 brasileiras desde cedo abrigaram a idéia de
relações intrínsecas entre democracia e saúde, chegando a brandir o lema de
democracia na saúde como um de seus temas, e como bandeira central de sua luta
para a reforma pretendida, numa abrangência que tanto implicava participação ampla
da população quanto extensão da assistência ao maior contingente possível da
população brasileira. O terceiro é que o desenvolvimento da sociedade moderna está
marcado, como vimos, pela separação entre o Estado e a Sociedade, isto é, entre a
esfera pública e a privada. (Aciole - 2006).

Nesse momento, demarca-se, com maior nitidez, o Público e o Privado, a saúde


pública e a assistência médica privada de caráter liberal – liberalismo, diga-se de
passagem, incipiente – ligada ao setor público, por auxílios e subvenções estatais, que
manterão a maioria dos serviços médico-hospitalares, de caráter filantrópico,
dominantes na época, e onde se desenvolve grande parte da atividade da medicina
liberal.

As relações na medicina e saúde geral entre o público e o privado, com recursos


estatais, já caminhavam na Europa e nos EUA no século XVIII, todavia, no Brasil,
pesquisas efetivas de cunho científico só se iniciaram com o médico Oswaldo
Gonçalves Cruz (1872-1917) e com os seus discípulos do Instituto de Manguinhos no
RJ. Em São Paulo, Adolfo Lutz (1855-1940) e Vital Brasil (1865-1950) interessaram-se
por investigações da patologia brasileira.

109
Yida – pág. 48
110
No Brasil do começo do século, a partir do Código Sanitário de 1918, observam-se outras Reformas Sanitárias em
1925, 1931 e 1938 que suprimiu as Delegacias de Saúde e foi criada a Inspetoria de Higiene dos Municípios, a
Inspetoria de Educação Sanitária e os Centros de Saúde para a profilaxia geral e o controle das doenças
transmissíveis como a lepra, a tuberculose, a sífilis, doenças venéreas, a febre amarela e a assistência dentária. Artigo
de Joyce Mendes de Andrade Schramm ett all – Revista Ciência e Saúde Coletiva – vol.9 – número 4 – RJ –
Oct/dez/2004.

51
Em fins do século XIX, graças aos recursos econômicos oriundos das plantações de
café, permitiu-se o surgimento de laboratórios e contratação de pessoal na área de
saúde. Data de 1888 o aparecimento do Instituto Pasteur no Rio de Janeiro para o
preparo da vacina contra a raiva ou hidrofobia. Quem instalou foi Augusto Ferreira dos
Santos (1849-1903), que era lente de química da Faculdade do RJ e aprendera a
técnica no Instituto Pasteur de Paris, enviado pelo imperador D. Pedro II. A esse
centro sucederam-se outros. O de São Paulo é de 1903 fundado por um grupo de
médicos dirigidos por Ulisses de Freitas Paranhos (1880-1954).

Após a proclamação da República, foi criado em São Paulo em 1892, o Instituto


Bacteriológico para estudos de microbiologia e confecção de vacinas. O primeiro
diretor, que foi trazido da França foi o parasitologista Félix Le Dantec (1893), que logo
foi substituído por Adolfo Lutz. 111

Com o advento dos trabalhos de Pasteur, a luta contra as doenças transmissíveis


destacou-se como das mais importantes atividades em saúde pública, surgindo a
necessidade dos laboratórios especializados como elementos indispensáveis na
elucidação diagnóstica, assim como na descoberta e libertação de portadores,
fabricação de soros e vacinas, orientação científica do tratamento médico, além da
avaliação da imunidade prevalente na população, antes e após surtos aparentes ou
não de epidemias. O Instituto Pasteur de Paris serviu durante muito tempo de
paradigma aos laboratórios integrantes de organizações administrativas
governamentais de grande número de países, incluindo-se o Brasil, desenvolvendo-se
rapidamente em todo o mundo as pesquisas aplicadas ao diagnóstico, prevenção e
tratamento daquelas doenças. Posteriormente outros laboratórios foram surgindo e
incentivo à pesquisa científica foi estimulado na Alemanha, EUA e na Dinamarca.

No Brasil, a criação em 1907, por Oswaldo Cruz, do Instituto de Patologia


Experimental de Manguinhos foi marco importante na luta contra as doenças
transmissíveis com base na orientação científica, destacando-se entre outras, as
pesquisas de alto interesse sanitário desenvolvidas por Carlos Chagas sobre a doença
que posteriormente tomou o seu nome, de Gaspar Vianna na leishmaniose e de Adolfo
Lutz na epidemiologia da esquistossomose.

Nessa mesma época verificou-se uma relação entre doenças e o meio rural. É comum
nesse meio ambiente, no caso brasileiro, se construir os currais ao lado das
habitações, com todas as desvantagens decorrentes como invasão maciça de
moscas, poeira e mau cheiro. Também a promiscuidade do homem rural com
galinhas, porcos, carneiros e outros animais é habitual, tornando-se tanto mais comum
111
Adolfo Lutz, nasceu e faleceu no Rio de Janeiro. Formou-se em medicina em Berna, Suíça (1879). Fez muitos
cursos em escolas européias. Em 1886, associado a Unna, em Hamburgo, descreveu as granulações de Lutz, do
bacilo da morféia. Em 1892 dirigiu o leprosário de Honolulu. De 1893 a 1908 foi diretor do Instituto Bacteriológico de
São Paulo, onde fez inúmeras pesquisas. Em 1889 irrompeu em Santos, uma epidemia provocada por ratos. Tratava-
se da peste bubônica. Lutz enviou o seu assistente Vital Brasil para verificação. O governo federal enviou também
Oswaldo Cruz. Ambos investigaram e diagnosticaram que, de fato, era peste bubônica. Cogitou-se então, rapidamente,
de se instalar estabelecimentos para fabricação da vacina e do soro contra a peste. Fundou-se então em São Paulo,
por iniciativa de Emílio Marcondes Ribas (1862-1925), diretor do serviço sanitário o Instituto Seroterápico, na fazenda
Butantã. Indicado por Lutz, Vital Brasil assumiu a chefia e nela ficou até 1919, quando se retirou depois para o RJ. A
cólera e a escarlatina foram investigadas e comprovadas por Lutz em São Paulo. Junto com Alfonso Splendore,
descreveu a esporotricose (1907) e no ano seguinte, apontou a blasto micose sul-americana. Em 1908, convidado por
Oswaldo Cruz para o Instituto Manguinhos, Lutz foi para o RJ e lá ficou até sua morte. (Fonte: Instituto Adolfo Lutz -
http://www.ial.sp.gov.br/).

52
quanto menos educado o indivíduo, exposto assim às mais variadas zoonoses.
(Rodrigues - 1967). No interior ou meio rural utilizava-se o médico ou farmacêutico
mais próximo da região. Em muitas regiões não havia atendimento público.

Essa passagem entre o publico e o privado integra a ética do cotidiano dos políticos e
da população se pensarmos que além dessa praticas e da presença da Igreja
garantindo os serviços, existia a concentração do poder na capital do País. Em 1918, o
governo estabelece convênio com a Fundação Rockfeller para ministrar cursos de
Higiene aos estudantes de Medicina em moldes modernos, sendo enviados para o
Brasil dois sanitaristas, Darling e Smillie. O primeiro foi chefe dos Laboratórios da
Missão Gorgas no Panamá, Malaia e zonas tropicais e foi diretor do Laboratório de
Higiene, de 1918 a 1920.

As Caixas de Aposentadoria e Pensões – CAPs

Outro marco histórico da assistência médica no Brasil data de 1923: por iniciativa do
Estado, foram criadas as Caixas de Aposentadoria e Pensões, conhecidas como
CAPs, sendo que, depois, algumas empresas também disponibilizaram esse benefício
a seus trabalhadores 112 O objetivo era, então, atender ao binômio - saúde e
aposentadoria - por meio de uma forma tripartite de financiamento - governo,
empregadores e empregados. Tratava-se, pois, na época, de um compartilhamento
triplo entre o público e o privado.

As primeiras instituições previdenciárias surgidas por iniciativa estatal para os


trabalhadores do setor privado, uma vez que já existiam diversas iniciativas voltadas
para funcionários públicos, são as Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAP’s),
criadas nas empresas a partir de 1923 por determinação governamental e com a
participação de recursos públicos.113 A partir de 1926 a assistência médica é
incorporada como uma atribuição das Cap’s.

Nessa ocasião, as CAPs se desenvolveram e levaram à criação dos Institutos de


Aposentadorias e Pensões (IAPs), em 1930, que eram ainda destinados a categorias
profissionais.

Na década de 30, o sistema previdenciário brasileiro passa por profunda reformulação,


com a criação dos Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs), que sucederam e
foram absorvendo as CAPs.114 Em vez de serem vinculados a uma empresa como as
caixas, os IAPs incorporam cada um deles, uma categoria profissional e passam a ser
de caráter nacional. 115

Existiam, por exemplo, os IAPI dos industriários, os IAPC dos comerciários, o IAPM
dos Marítimos, o IAPB dos bancários e o IAPTEC daqueles que trabalhavam com
transportes e cargas. Tais institutos adquiriram um poder muito forte, decorrente de

112
A primeira empresa a oferecer assistência dessa natureza, somente para seus empregados e dependentes foi uma
empresa ferroviária - (CF. Bahia, Ligia & Nunes, 2000, p. 10).
113
Menicucci – pág. 62
114
Em 1930, existiam 47 CAP’s e davam cobertura para 142.464 beneficiários (Villaça Mendes 1999).
115
Menicucci – pág. 63

53
seus tamanhos, e passaram a deter força de pressão política. O maior problema que
enfrentavam, porém, era a grande diferença entre eles.

De certa forma, alguns eram mais elitizados que outros, gerando diferenças no
atendimento à saúde e nas pensões, com taxas diferenciadas na folha de pagamento.
Assim, o IAPB dos bancários era considerado um dos melhores institutos - a
estabilidade era de dois anos, a aposentadoria ocorria depois de vinte e cinco anos e
os serviços médicos eram de padrão superior, criando certo descontentamento em
outras classes de trabalhadores.

Além disso, quando precisavam mudar de emprego, os bancários, bem como seus
familiares eram prejudicados com a perda desses benefícios. Apesar desses
problemas, o sistema público se cristalizou.

Dentre às evoluções da legislação, destaca-se uma antiga que vale a pena ser
rememorada. Em 1919, por exemplo, foi criado o Seguro de Acidentes do Trabalho
para atender um número muito grande de acidentados nas fábricas que começavam a
proliferar em São Paulo e Rio de Janeiro.

A partir daí, houve uma ligação muito forte entre saúde pública/privada e previdência,
que foi sendo mais bem definida a partir da década de 20, época de crise mundial que
levou a intensas mudanças. Na privada eram apenas ensaios de apoio de médicos,
embriões de convênios ou algo do gênero. Na década de 30, o crash da Bolsa de
Nova York também afetou o Brasil, levando à necessidade de se fazer adaptações e
mudanças no sistema geral de saúde e previdenciário.

Em 1926 foram criadas as Prefeituras Sanitárias das quais a de Campos de Jordão (lei
2140 de 01/10/1926) nomeando seus Prefeitos. Com essas decisões abrem-se
também inúmeras oportunidades de compartilhamento entre o Público e o Privado.

Nos países onde atuava a Fundação Rockefeller já referida, buscava fomentar


localmente as atividades das empresas norte-americanas, seja por meio de suporte
operacional, estudos de campo ou outros meios ao seu alcance. Em abril de 1915,
Wickliffe Rose enviou carta ao seu compatriota Percival Farquhar, magnata e
empreendedor, considerado o último dos robber barons, participando-lhe a
possibilidade de realizar no Brasil um convênio para fazer estudos sobre a
ancilostomose, ou ainda qualquer outra investigação que fosse de seu interesse. O
Sindicato Farquhar fundara, entre outras, a Amazon Land Colonization Co., empresa
constituída para explorar a borracha na Amazônia (Moniz Bandeira, 1973:193).

A borracha assumia relevância crucial e estratégica em tempos de guerra, daí a oferta


de Rose para garantir a salubridade aos trabalhadores nos campos de produção. A
política do “dollar diplomacy” do governo Taft (1921-1930) concorreria para completar
o controle financeiro até o início da década de 1930. Aponte-se também o contrato
obtido por Percival Farquhar do Legislativo para a Itabira Iron em 1928, empresa
nominalmente inglesa e precursora da atual Companhia Vale do Rio Doce, com 60%
de capital controlado pelos norte-americanos (Moniz Bandeira, 1973:214). Ressaltem-

54
se ainda os esforços das empresas petrolíferas dos EUA visando obter o monopólio
brasileiro de petróleo. 116

O convênio acima citado possibilitou a criação desse laboratório, subordinado a


cadeira de Higiene da Faculdade de Medicina, e, em 1924, transforma-se em Instituto
de Higiene. No mesmo ano, 1918, indicados pelo International Health Board of the
Rockfeller Foundation, fazem parte da primeira turma de Johns Hopkins School of
Higiene and Public Health (instituída e subvencionada por aquela fundação) os
doutores Francisco Borges Vieira e Geraldo Paula Souza. Em 1927, Paula Souza e
Borges Vieira escrevem ao doutor Strode,117 solicitando auxílio da Fundação
Rockefeller para defender a autonomia do instituto. E, em 1930, Paula Souza sugere a
transformação do instituto em organização internacional, que posteriormente
transformou-se na Faculdade de Saúde Pública – USP.118

Definitivamente – podemos afirmar – está institucionalizada a Saúde no Brasil. A


década é a de 30 e a crise que já se aproximava desde 1929 bate às portas. O
período Vargas que se inicia em 1930 marca um momento de reorganização das
relações Estado/Sociedade de forma corporativista, que teve como um de seus
objetivos: incorporar os trabalhadores urbanos ao jogo político, embora de forma
subordinada ao Estado. Isso se deu pelo reconhecimento do trabalho organizado e de
políticas sociais.

A ordem política é o ser humano, a paz, a felicidade de quem trabalha e quer


prosperar. O ideal é a justiça social. Iniciam-se os mecanismos de centralização de
poder a partir de 1930 com a progressiva ocupação do espaço organizacional e
decisório das agências burocrático-estatais, às quais o Departamento Nacional de
Saúde (DNS) se integra.

No Brasil, o ensino e a pesquisa científica no campo da administração começaram


logo após a revolução constitucionalista de São Paulo, em 1932, com a criação da
Fundação IDORT, 119 - Instituto de Organização Racional do Trabalho - cabendo a
Roberto Simonsen, Armando de Salles Oliveira e Clóvis Ribeiro a liderança desse
movimento. A administração Sanitária começou a ser ensinada nos Estados Unidos da
América do Norte durante a década de 20, embora de modo um tanto empírico, pois
constituía tal ensino pouco mais que uma exposição da prática da Administração de

116
Documento 011 da Coleção Rockefeller, Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz.
117
Diretor da Fundação Rockefeller
118
“Histórico do Instituto de Higiene” – datilografado (arquivo) – Yida – pág. 53
119
A crise de 1929 evidenciou as falhas da estrutura econômica brasileira, principalmente a má organização e a falta
de controle eficiente da produção; o abalo revolucionário indicou a necessidade inadiável de mudança.
Nesse contexto, novas idéias, como a organização científica do trabalho, eram mais do que bem-vindas.
O industrial Roberto Simonsen foi um desses pioneiros, ao imprimir em suas organizações as idéias de racionalização,
promovendo na indústria paulista uma nova mentalidade no tratamento das empresas e nas relações de trabalho.
A Associação Comercial de São Paulo também agiu efetivamente para a divulgação dos princípios da racionalização.
Em 1929, a entidade convidou o professor suíço Léon Whalter, que realizava estudos e experiências no campo da
psicotécnica, para ministrar cursos e conferências na sua sede.
A ação foi tão bem sucedida que deu origem à criação de uma comissão de especialistas, composta pelos professores
Geraldo de Paula Souza, Monteiro de Camargo, Lourenço Filho e Roberto Mange, que estudaram o projeto de criação
de um Instituto que cuidasse da organização científica do trabalho. (Fonte:
http://www.idort.com/History.aspx?subjectId=743F81AF-E4BE-DC11-9D7D-0014220BC504&langId=1&fatherId=1)
acessado em 29/06/2011.

55
Serviços de Saúde Pública do país, sem obedecer a uma metodologia científica: era
como que um relato do trabalho de administradores sanitários.

Somente na década de 50 é que apareceu naquele país, escrito por J.J. Hanlon, um
livro de Administração Sanitária baseado em princípios e métodos de administração
geral e pública. Em 1955 veio à luz o livro de Molina e Adriasola – Princípios de
Administración sanitária.120 (Rodrigues – 1967)

A ocupação do espaço é demonstrada pela Constituição de 1934 em seus vários


artigos. (Campello e Yida - 1994).121 Foram tempos difíceis na nova Constituição de
1934 com Revolução Constitucionalista e a formação do Partido Integralista. Essa
Constituição é a que definiu os rumos da Saúde em geral, dando-lhe a importância
que precisava. Pode-se afirmar que nem a Constituição de 1946 foi tão destacada
para a Saúde como a de 1934.

A partir de 1930, e dentro desta estratégia federal, a Saúde Pública ocupa um maior
espaço institucional e, inclusive, como assinalam alguns historiadores “por pressão
dos intelectuais e militares na criação de novos serviços... num período de dificuldades
financeiras... em que a administração federal não se propõe a grandes esforços de
aprimoramento”.

Havia também grande preocupação com os problemas decorrentes da toxicomania.


Ela já era conhecida como problema na China do século XVII, agravando-se no século
XVIII quando os seus habitantes aprenderam a fumar o ópio, por intermédio dos
javaneses. Havia pressões de várias naturezas.122

Esta pressão resultou em 1931, na criação do Ministério de Educação e Saúde e, em


nível estadual, das Secretarias de Educação e Saúde Públicas. Essa
institucionalização da Saúde torna-se mais forte a ponto de, em 1943, ter sob sua
égide a Saúde Mental, a Medicina Social, o Instituto Butantã, o Departamento de
Profilaxia da Lepra e posteriormente o Departamento Estadual da Criança. O Dia da
Criança que foi instituído em 12/10/1924 através do Decreto 4867 foi considerado data
importante, todavia, as crianças só obtiveram a atenção devida a partir de 1937

120
Esses dados constam do Prefácio de Rodolfo dos S. Mascarenhas no livro de Adm. Sanitária de Dr. Bichat de
Almeida Rodrigues.
121
M.C. Campello de Souza em “O Estado e partidos políticos no Brasil – (de 1930 a 1964 ) pág. 84 e citação do
mesmo autor em Yida - página 56.
122
O grande mercado que era a China, a qual chegou a consumir em 1906 cerca de 22.000 toneladas de ópio,
determinava lutas por interesses financeiros internacionais, visando assegurar o uso e os mercados – tornou-se sede
em 1909, na cidade de Xangai, da primeira reunião para estudar o problema, sob o patrocínio dos EUA. Na conferência
de Haia em 1912, também convocada pelos EUA, procurou-se também limitar a produção desses alcalóides. No
Brasil, medidas legais de controle de Entorpecentes passaram a vigorar desde 1921, quando o Decreto Legislativo n.º
4.294, de 6 de Julho, estabeleceu penalidades para os contraventores da venda de cocaína, ópio, morfina e seus
derivados. Nessa época cria-se um estabelecimento especial para internação dos intoxicados pelo álcool ou
substâncias tóxicas. O Decreto n.º 14.969 de 3 de setembro de 1921 é que aprova o regulamento para entrada no país
das substâncias tóxicas, impõe penalidades aos contraventores e cria sanatórios para os toxicômanos. O Decreto
20.930, de 11 de janeiro de 1932 delegava às autoridades de saúde pública a fiscalização e controle dos
entorpecentes, criando uma Inspetoria, mas o passo mais importante foi a criação da Comissão Nacional de
Fiscalização de Entorpecentes, estabelecida pelo Decreto n.º 780, de 28 de abril de 1936. (Rodrigues -1967).

56
quando foi criado o Instituto Nacional da Criança e já nesse período havia
conhecimento dos espantosos índices de mortalidade materna. 123

Uma análise da incorporação de problemas, que constituirão áreas tradicionais de


Saúde Pública, mostra a relação do Privado/Público e como o aparelho estatal vai
incorporando-os, desenvolvendo atividades, destinando-lhes recursos iniciais e
estruturando-se em organizações burocráticas mais complexas.

Conforme já comentado, a tuberculose,124 a lepra e a mortalidade infantil já aparecem


no cenário nacional como fenômenos relevantes do século anterior,125 ficando a
responsabilidade de seu controle, basicamente para as Santas Casas. A mortalidade
infantil126 era insustentável como índice e informações. Em 1952 iniciaram-se a
instalação de centenas de postos de puericultura por todo o Brasil. Nas capitais
juntamente com a LBA – Legião Brasileira de Assistência127 e as Pastorais da Igreja
Católica foram instalados postos volantes.128 Igreja e Estado demarcaram as bases e
os horizontes da sociedade civil organizada, ela mesma tendendo a estruturar-se em
crescentes conglomerados associativos. (Fernandes – 1994).

Essas instituições ao adquirirem maior transparência com as aglomerações urbanas,


dão origem a movimentos civis que congregam médicos da área privada e leigos,
basicamente, e mulheres que se dedicam à filantropia, em associações ou ligas. Estas
ligas contra a lepra e a tuberculose e que também dão proteção e alimentação à
infância, servem-se da divulgação e propaganda, arrecadam recursos da população
em geral, criam taxas de contribuições, buscam auxílios governamentais fundando
sanatórios, leprosários ou casas de proteção aos órfãos e até hospitais. Organismos
da ONU, como FAO e UNICEF estavam nessa rede de proteção. De certa forma já era
algum tipo de compartilhamento Público e Privado.

123
Conceito: é o número de óbitos maternos, por 100 mil nascidos vivos de mães residentes em determinado espaço
geográfico no ano considerado.

124
Ela era inexistente antes da descoberta do Brasil. Veio com os brancos e negros. A tísica ou febre héctica
desenvolveu-se com a falta de higiene e o fácil contágio. Indígenas morreram aos milhares. Os brancos também não
foram poupados. Poetas como Castro Alves e muitos outros morreram doentes do peito. (Santos Filho – 1980). Para
combater preconceitos e conscientizar a população sobre detecção precoce e tratamento da tuberculose, há no bairro
da Rocinha, RJ, o Grupo de Apoio a ex-pacientes, pacientes e amigos do combate à Tuberculose. Com cerca de 111
mil casos novos e 6 mil mortes anuais no Brasil, a situação é agravada por más condições de vida. Para a especialista
Margareth Dalcolmo, o SUS também tem sua responsabilidade: “Não existe paciente difícil de ser tratado, existe
serviço ineficiente”. Fonte: Radis número 69 – maio/08.
125
O advento da era microbiana, com os trabalhos iniciais de Pasteur, permitiu a substituição de medidas empíricas,
embora corretas em muitos casos. Estabelecido o princípio fundamental da especificidade do agente etiológico, fixado
por Koch, nos seus postulados outros aspectos foram sendo esclarecidos.
126
A mortalidade infantil era extremamente preocupante. Os coeficientes chegavam a assustar em alguns municípios.
Por exemplo, em 1960, em Maceió o índice era de 225,7, em Goiânia, 258,0, em Fortaleza 263,2, em Teresina 298,8,
em Natal 263,4, em Japoatã, 385,0, em Bezerros (PE) 409,0, em Caruaru 455 e em Canhoba 460,0. (Rodrigues –
1967 – pág. 262).

127
A Legião Brasileira de Assistência (LBA) foi um órgão brasileiro fundado em 1942 pela então primeira-dama Darcy
Vargas, com o objetivo de ajudar as famílias dos soldados enviados à Segunda Guerra Mundial.

Com o final da guerra, se tornou um orgão de assistência a famílias necessitadas em geral. A LBA era presidida pelas
primeiras-damas. Em 1991, sob a gestão de Rosane Collor, foram feitas denúncias de esquemas de desvios de verbas
da LBA. A LBA foi extinta durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.

57
Nesse período a benemerência da sociedade civil e o Estado ainda terão fortes
ligações durante muito tempo. Sposati (1987) lembra que as associações filantrópicas
sempre tinham um representante governamental ou eram presididas pelo próprio
governador do Estado. Em 1929, a Associação de Socorro aos Tuberculosos, é
presidida pela senhora Clementino Fraga, esposa do diretor do Departamento
Nacional de Saúde. As relações entre o Público e o Privado davam passos largos,
infelizmente, via benemerência, colaborando na falta de um Estado mais forte.

O modelo implantado pelas entidades privadas que dava ênfase ao atendimento pelos
sanatórios particulares deu grande resultado. Protocolos para tratamento da doença
foram apresentados na 1ª. Conferência Nacional de Saúde em 1941. Detectou-se que
havia necessidade de aumento do número de leitos públicos e privados, fato que se
tornou realidade após essa data.

O tratamento da tuberculose não teve a eficiência que se esperava. O tempo de


hospitalização era alto: entre 250 e 300 dias em média. Custos altíssimos. Seria
necessário detectar a doença no início. Era a estratégia mais lógica para aquele
momento. Houve então a exigência legal da Abreugrafia na CLT já em aplicação.129

Dentro da mesma política para os casos de internações e dentro da política de


cooperação com entidades assistenciais privadas, procurou-se ampliar os números de
leitos em convênios que já atingiam 900 em 1961. Em 1965, a Divisão de Serviço de
Tuberculose contava com 4.358 leitos, contando, ainda, a Secretaria com 3607 leitos
particulares e 645 de convênios, no controle da doença. 130

Em ambos os casos, os serviços são favorecidos. Não conseguindo os dispensários


atender a demanda legal, a canalizaram para os serviços privados que proliferavam
junto às Delegacias de Trabalho e que, provavelmente, deveriam ser compostos por
elementos do próprio serviço público. A canalização da clientela dos serviços públicos
para os privados constituirá uma prática incorporada, não só em termos de prestação
de serviços médicos como no de serviços de diagnóstico, com a introdução e
expansão daqueles métodos baseados em exames complementares, considerando-se
inclusive, a precariedade na manutenção de equipamentos dos serviços públicos de
saúde.131

Em 16 de maio de 1931 a lei 2169 de Dezembro de 1926 foi modificada pelo decreto
5027 e permite a “médicos clínicos, devidamente habilitados, examinar, tratar em seus
consultórios particulares ou em domicílio, as pessoas atacadas por lepra.” Esse
mesmo decreto autorizou os hospitais gerais a fundarem dispensários, cria subvenção
aos sanatórios privados.

A década de 30 mostrava ainda crescimento da tuberculose e num Congresso da


época sugeria-se a criação de um seguro contra a doença. Era o Estado desejando

129
Wilhelm Conrad Rontgen (1845-1923), físico alemão que inventou o Raio-X.
130
Yida – pág. 76
131
Yida – pág. 76

58
sair da obrigatoriedade de cuidar do doente e de seus familiares em vista da
quantidade de aposentadorias por invalidez.

Com base nos variados tipos de impostos sobre jogos, aguardente, cassinos132 criou-
se um “funding” específico e os serviços de saúde Pública e também e juntamente a
Privada ampliam-se. Na sequência institucional da Saúde Pública, mas com grande
apoio de profissionais da atividade privada, entre 1938 e 1941 duas decisões foram
marcantes. Uma delas foi o início do Hospital das Clínicas, em São Paulo e de uma só
vez a construção – com auxílio do governo - de vários sanatórios privados para auxiliar
o governo nos casos de tratamento para tuberculose.133 Mostra-se a relação intrínseca
entre o Público e o Privado na Saúde novamente.

Voltando alguns anos, curiosamente, Mascarenhas134 135 (1949) em sua tese de Livre
Docência na USP informa que alguns anos depois, em 1933 a Secretaria de Educação
e Saúde cria e regulamenta “uma comissão de assistência social do Estado de São
Paulo” composta de senhoras e cavalheiros sob a presidência do Diretor Geral do
Serviço Sanitário, todavia, com o passar de alguns anos os custos de Assistência
tornam-se altos e é necessário incorporar, tais atividades ao aparelho do Estado. Isso
necessita recursos e outro braço da Saúde Privada foi chamado. Os conceitos de
Saúde Pública ampliam-se. Mas o que vem a ser Saúde Pública? É preciso defini-la.

Em 1949, Winslow ofereceu a seguinte definição: “Saúde pública é a ciência e a arte


de evitar a doença, prolongar a vida, e promover a saúde física e mental, e a
eficiência, através de esforços organizados da comunidade, visando o saneamento do
meio, o controle das infecções comunitárias, a educação do indivíduo nos princípios
da higiene pessoal, a organização dos serviços médicos e de enfermagem para o
diagnóstico precoce e o tratamento da doença, e o desenvolvimento dos mecanismos
sociais que assegurarão a cada pessoa na comunidade o padrão de vida adequado
para a manutenção da saúde. Last, diz que é a prevenção da doença e a manutenção
da saúde na população como um todo... Saúde pública é pois uma prática, uma
disciplina e uma instituição social”.136

No período de 1938 a 1941 tendo como interventor no Estado de São Paulo o senhor
Adhemar de Barros a Saúde cresceu em sua institucionalização, mas começou a ser
criticada pelo populismo de Jânio da Silva Quadros, todavia, assim mesmo Adhemar
conseguiu ser prefeito de São Paulo e posteriormente já na década de 60, governador.
A criança passou a ser atendida pela criação de serviços de puericultura –
Departamento Estadual da Criança.

Nos últimos anos de pós-guerra a população crescia e saía do campo para as cidades.
Era 1942 e foi o ano da criação da ONU e os organismos mundiais tais como OMS –

132
Houve liberação do jogo nas Estâncias Balneárias com taxação voltada para aplicação na Saúde.
133
Dados da FGV – Centro de Documentos de 1984
134
Sergio Mascarenhas - Professor da USP.
135
Rodolpho Mascarenhas ainda afirma que a Saúde pública tem as fases que vão do Saneamento empírico do meio
ambiente, que vai de 1840 a 1890, o período de controle científico de doenças infecto-contagiosas, que vai de 1890 a
1910 e o período moderno que se iniciou por volta de 1910.
136
E.A. Winslow, “The Evolution of Public Health and its Objectives”, in Public Health in the World Today. Simmons,
J.S. Ed. Cambridge, Harvard University Press, 1949.

59
Organização Mundial de Saúde, OIT – Organização Internacional do Trabalho, CEPAL
– Comissão Econômica para a América Latina, FAO – Organização das Nações
Unidas para a Agricultura foram todos, cuidados dos americanos para que os países
da América Latina, inclusive o Brasil, não caíssem nas malhas do comunismo
internacional. Esses cuidados dividiram o mundo em capitalistas e comunistas e um
bloco de Terceiro Mundo no qual o Brasil estava incluído. Era efetivamente o sintoma
da guerra fria.

Durante o primeiro governo Vargas que foi de 1930 até 1945, o Brasil passa por
inúmeras transformações, tanto econômicas, quanto sociais, mas as de maior
destaque são as mudanças relativas ao trabalhador, sua organização, saúde e relação
com o Estado. O princípio da unidade sindical foi restabelecido e apenas os sindicatos
poderiam defender os direitos da categoria que representavam perante o Estado e o
Decreto 1402, de julho de 1939, define em detalhes a nova organização sindical. O
imposto sindical foi criado em 1940, correspondente a um dia de salário pago ao
sindicato.

Essa política do presidente estimula o surgimento dos institutos de previdência


separados por categorias. Seguindo o curso da história, os funcionários públicos de
São Paulo, tinham seu Instituto de Previdência, o IPESP que, com a promulgação de
um decreto de número 12.762, de 16/06/1942, passa a ser responsável pela prestação
de assistência médica hospitalar aos servidores públicos estaduais, diminuindo a
angústia daqueles que precisavam do serviço médico e não tinham recursos
suficientes para obtê-los com a mínima qualidade.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada em 10.12.1948, pela ONU,


resgatou os ideais da Revolução Francesa de igualdade, liberdade e fraternidade,
tornando-se um marco de grande relevância, por promover o reconhecimento
universal dos direitos humanos e das liberdades fundamentais. A Declaração delineia
tanto os direitos civis e políticos (artigos 3.º a 21) como os direitos sociais, econômicos
e culturais (artes. 22 a 28).

Em São Paulo, instalou-se uma caixa de aposentadoria e pensões que é a dos


funcionários públicos do Estado de São Paulo: o DAMSP. Assim, representantes do
funcionalismo na Câmara resolvem tomar providências e, desse modo, em 1948, o
deputado e funcionário público Pinheiro Júnior, apresentou um projeto de lei criando o
Serviço Social e de Assistência Médica aos Servidores Estaduais. Em São Paulo, no
bojo de uma efervescência onda de retomada de alguns focos de resistência
trabalhadora, os funcionários públicos reafirmam a disposição legítima de reivindicar,
através de sua associação a instalação, na capital de São Paulo, um hospital que
atendesse aos servidores estaduais.

A idéia era construir o HSPE para atender, na época, 98.000 servidores públicos e
suas famílias num total aproximado de 400.000 pessoas. O plano prevê a construção
de um conjunto hospitalar com cerca de 1.000 leitos, compreendendo um pavilhão
geral com 850 leitos, um pavilhão de convalescentes e outro de moléstias crônicas,
tendo respectivamente 100 e 50 leitos. Previa ainda um grande ambulatório. O projeto
seria erguido no Ibirapuera, na Rua Pedro de Toledo, em terreno de 47.000 metros

60
quadrados. Comissões foram criadas e aprovadas com desconto de um percentual em
folha de pagamento dos servidores.

A pedra fundamental da construção aconteceu em 25 de janeiro de 1957 com a


presença do governador, na época, Jânio Quadros. O hospital foi inaugurado em
1961. Em 11 de março de 1966, o DAMSPE mudou de nome e de status jurídico
passando a se chamar Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual –
IAMSPE, conforme a Lei de número 9.323. Deixou de ser subordinado ao Ipesp,
permanecendo sob a tutela financeira da Secretaria da Fazenda. Atualmente o
IAMSPE é uma autarquia especial.

O Iamspe137 é uma autarquia ligada à Secretaria Estadual de Gestão Pública que


presta atendimento médico aos funcionários públicos estaduais, seus dependentes e
agregados. Atua na promoção da saúde, prevenção de doenças, assistência e
reabilitação aos doentes garantindo o acesso à rede de serviços, contribuindo para a
melhoria de vida de seus contribuintes e beneficiários. Atualmente o Instituto possui o
Hospital do Servidor Público Estadual Francisco Morato de Oliveira (HSPE-FMO), o
Departamento de Administração e o Departamento de Convênios e Assistência
Médica (Decam), que coordena 18 centros de assistência médica ambulatorial
(Ceamas) espalhados pelas principais cidades do interior paulista.138

Os conflitos sociais e a nova Constituição de 1946, a criação de organismos mundiais


sob a proteção americana no Brasil como a Aliança para o Progresso, Conferência
Interamericana para Manutenção da Paz e o Tratado de Assistência Recíproca,
traziam em seu bojo americano o receio do comunismo ao terceiro mundo. Nesse
contexto de época a Educação, a Agricultura e a Saúde geral tomam corpo e acende-
se a democratização no Brasil, na qual está embutida a Saúde, a Atenção às crianças
e a Assistência rural. Estávamos, então, por volta de 1950.

O processo de industrialização acelerada que o Brasil viveu a partir da década de 50


determinou um deslocamento do pólo dinâmico da economia para os centros urbanos
e gerou uma massa operária que deveria ser atendida pelos serviços de saúde. A
partir desse período passa a configurar-se o denominado modelo médico-assistencial
privatista, que vigorará hegemônico de meados dos anos 60 para frente.

Em 1959 eclode a Revolução Cubana.139 Os Estados Unidos também influenciavam


muito na política da Ilha, que apoiava sempre os presidentes pró-Estados Unidos. Do

137
Dentro do esquema geral de saúde no Brasil, esses hospitais de Servidores Públicos são totalmente diferenciados
do que institui a legislação vigente. Outros institutos nesse ínterim, também foram criados, como no Piauí, o Iapep, em
Goiás, o Ipasgo, no Rio de Janeiro, o Iaserj, os quais após a Constituição de 1988 e adaptações da Lei, atualmente,
muitos passam por dificuldades, pois não são SUS, não são Privados, não são ONGs, não são Beneficentes e não
recebem, pela Lei, fundos do governo federal, pois são autárquicos e com identidade atualmente difusa.

138
Coelho – (2009)
139
Em 1957, Fidel Castro e um grupo de cerca de 80 combatentes instalaram-se nas florestas de Sierra Maestra e
iniciaram estratégia para derrubar o governo. Com mensagens revolucionárias, os guerrilheiros conseguiram o apoio
de muitas pessoas. Isto ocorreu, pois havia muitos camponeses e operários desiludidos com o governo de Fulgêncio
Batista e com as péssimas condições sociais. No primeiro dia de janeiro de 1959, Fidel Castro e os revolucionários
tomaram o poder em Cuba. Fulgêncio Batista e muitos integrantes do governo fugiram da ilha. O governo de Fidel
Castro tomou várias medidas em Cuba, como, por exemplo, nacionalização de bancos e empresas, reforma agrária,
expropriação de grandes propriedades e reformas nos sistemas de educação e saúde. O Partido Comunista dominou a

61
ponto de vista econômico, Cuba seguia o capitalismo com grande dependência dos
Estados Unidos. Era uma ilha com grandes desigualdades sociais e muitos casos de
malária, febre amarela e outras doenças tropicais.140

Institucionalmente, os IAP’s são substituídos em 1966, por um único e poderoso


Instituto Nacional da Previdência Social – INPS – o que significou a uniformização dos
benefícios numa Previdência Social concentrada e um crescimento da demanda por
serviços médicos em proporções muito superiores à capacidade de atendimento então
disponível nos hospitais e ambulatórios dos antigos Institutos da Previdência. Saúde
pública era prioridade e vacinar era a ordem primeira em tudo na saúde.

As campanhas de vacinação iniciaram-se da Carta de Punta Del Leste. Nos arquivos


de higiene de 1962, Yida (1994) 141 informa que com a contribuição da OPAS –
Organização Panamericana de Saúde foi realizada uma vacinação contra algo
inexoravelmente perigoso como doença: a poliomielite.142

Eram vacinações-piloto e o lugar escolhido inicialmente foi em São Paulo – Santo


André. Depois na Capital, São Bernardo, São Caetano, Mauá, Ribeirão Pires e
Diadema. Seguiu-se depois para o Interior e outros Estados.

1966, 1967, 1968 foram anos – a título experimental – das vacinas como Sarampo,
Varíola e quase todas acompanhadas da Tríplice. (Difteria, Tétano e Coqueluche).
Quanto à questão de que era necessário planejar a Saúde, em geral, muitas vozes se
levantavam contra e a favor de interesses públicos e privados devido a Convênios
desde o Estado novo. Relativamente aos problemas de Saúde na área rural destaca-
se a doença de Chagas causada por um inseto comumente chamado de barbeiro.

vida política na ilha, não dando espaço para qualquer partido de oposição. Com estas medidas, Cuba tornou-se um
país socialista, ganhando apoio da União Soviética dentro do contexto da Guerra Fria
140
No Brasil, sob a visão atualizada dos casos de malária, o Ministério da Saúde anunciou que dados sobre a malária
apontam queda de 24,7% no número de casos nos últimos dois anos. Em 2007 foram notificados 457.659 casos de
malária, contra 607.827 em 2005 – ou seja, 150.168 pessoas doentes a menos. As internações caíram em 46,3% de
12,542 em 2005 para 6.736 em 2007. Os óbitos foram 59 em 2007 contra 122 em 2005. Na Amazônia Legal, que
concentra 99% dos registros de malária, a redução foi de 54,4%: 52 mortes em 2007 contra 114 em 2005. 140

Para o Ministro, José Gomes Temporão, 2010, isso é resultado da integração da vigilância epidemiológica com a
atenção básica, o meio ambiente e outros setores nas três esferas de governo. Os Estados que mais reduziram os
casos de malária: Acre (-45,4%) e Maranhão (-30,5%). Roraima reduziu os casos em 26,2%; Pará, 25,3%, Amapá
25,1%, Tocantins 24%; Rondônia, 19,5%. Houve aumento no Amazonas (6%) e em Mato Grosso (1,5%). O que mais
contribuiu para a redução de óbitos está a expansão em 172% da rede de laboratórios para diagnóstico de malária, de
1.182 em 1999 para 3.217 em 2007. Os agentes comunitários colheram quase meio milhão de lâminas para exames,
informou o secretário de Vigilância em saúde do ministério, Gerson Penna.
141
– Yida - páginas 93-4

142
W.S. Prado – “Aplicação da vacina Sabin ...(1962). Albert Bruce Sabin nasceu a 26 de agosto de 1906 em
Bialistock-Rússia, hoje Polônia. Formou-se doutor em medicina pela Universidade de Nova York (1931) e foi médico
interno do Hospital Bellevue (1932-34). Fez curso no Instituto Lister de Medicina Preventiva de Londres (1934-35), foi
associado do Instituto Rockfeller para pesquisas médicas (1935-37) e professor de pesquisas pediátricas da
Universidade de Cincinnati (1939). Dedicou 25 anos de sua vida ao estudo da poliomielite e desde 1952 voltou-se
especialmente à obtenção de uma vacina de vírus vivo atenuado, para uso oral, o que conseguiu realizar por volta de
1960. A primeira vacina contra a poliomielite foi a vacina Salk, injetável, desenvolvida com vírus morto, por Jonas
Edward Salk. A vacina Sabin, lançada no mercado em 1961-62, é a mais usada atualmente porque permite imunidade
intestinal e corporal, enquanto que a vacina morta só oferece imunidade corporal. Além disso, a vacina Sabin produz
imunidade vitalícia, sem a necessidade de injeção ou vacinação auxiliares.

62
Esse inseto habita casas de pau-a-pique. Havia, desde 1958 uma Comissão Especial
de Combate à Moléstia de Chagas foi criada. Outras campanhas foram acontecendo
como o combate à Esquistossomose, BCG, Varíola. Desse período em diante e na era
JK as condições de vida nas grandes cidades ficaram difíceis face à queda dos
salários e a inflação no governo de Juscelino Kubischek.

Os sindicatos pararam muitas categorias por aumentos salariais e contra a carestia.


Nesse embalo de reclamos para aumentos salariais e carestia a Saúde Pública
deteriorava-se e com isso a Saúde Privada já enxergava outros horizontes e parecia
florescer. Em 1959 os governos dos Estados precisavam de algum plano. A Saúde
Pública piorava a cada ano. Por volta de 1960 situava-se – na participação
orçamentária da época - em torno de 2% a 5% do PIB.

Nesse plano geral, um dos itens – nas considerações gerais – dizia que: em
população de baixo nível econômico, não pode o Estado deixar de atender às
necessidades de assistência médico-hospitalar das classes menos favorecidas.
Cumpre não esquecer, entretanto, que nesta atividade extremamente onerosa, é
imperativo empregar criteriosamente, recursos disponíveis, no sentido de obter o
máximo rendimento. Neste sentido, a experiência tem comprovado que os melhores
resultados são obtidos através do estímulo e auxílio às instituições privadas, ao invés
do próprio Estado assumir diretamente o encargo por meio de fórmula mais onerosa e,
mesmo, muitas vezes menos eficiente.143 (Yida – 1994)

Neste sentido, salienta-se a “corajosa mudança na orientação governamental que se


vinha desenvolvendo no último decênio, com a construção de hospitais oficiais de
clínica geral – uma vez que – o desenvolvimento da iniciativa estatal direta nesse setor
condiciona, por decorrência, o retraimento da participação privada, mais apta a
proporcionar assistência mais eficiente e menos onerosa...” 144 (Yida – 1994).145
Atualmente, em 2010, o controle é quase perfeito, mas ainda surgem surtos.146

Consequentemente, a diretriz do plano era canalizar os recursos previstos no sentido


de auxiliar e estimular a assistência hospitalar privada. Tais recursos serão
empregados, não só em auxílio para construção de novos hospitais de iniciativa
privada, mas ainda em reformas e ampliações, assim como melhorias de
equipamentos, visando a elevação do padrão técnico da assistência privada. Assim,
em relação à tuberculose,147 como já foi dito, além de intensificar o diagnóstico

143
Yida – pág. 109
144
Yida – referindo-se a F. Carlos – op. Cit., 1958/1959
145
Atualmente, em 2010, o controle é quase perfeito, mas ainda surgem surtos.
146
O Brasil registrou nos últimos dois anos, 489 surtos e emergências em saúde pública, segundo dados inéditos do
Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde, desde doenças transmitidas por insetos, como dengue,
febre amarela e mal de Chagas, até enfermidades provocadas por alimentos contaminados, como beribéri, informou o
Estado de São Paulo em 06/04. (Fonte: Revista Radis número 69 – maio/08).
147
O médico Júlio de Moura, proferiu em seu discurso no 2.º Congresso Brasileiro de Medicina e Cirurgia – em 1889,
discurso esse recuperado pela pesquisadora Dilene Raimundo do Nascimento em “As pestes do século XX –
Tuberculose e Aids no Brasil, uma história comparada” – revela que a preocupação com a doença, infelizmente, não é
recente. Mais de 100 anos depois, mesmo com tratamento de comprovada eficácia, a tuberculose é reconhecida como
emergência global pela OMS desde 1993, por ser a maior causa de morte de adultos por doença infecciosa. Ela integra
o rol das “doenças negligenciadas”, ainda que um terço da população mundial – cerca de 2 bilhões de pessoas – esteja
infectado pelo bacilo de Koch, seu agente causador, o que representa 100 milhões de casos registrados por ano em
todo o planeta. (Radis número 69 – maio/08).

63
precoce pela abreugrafia maciça, com aquisição de doze equipes móveis e estimular a
imunização, mediante vacinação de BCG, o Plano de Ação amplia o número de leitos
hospitalares públicos e, em convênios com entidades de leitos privados. Estava,
portanto, aberto o campo de pouso ideal para uma grande participação do Privado na
Saúde Pública.

Nesses anos seguintes, até 1949, criam-se nos Estados os estabelecimentos oficiais
de Saúde. Para combater a malária, proteção à maternidade,148 proteção à infância,
doenças tropicais, lepra, tracoma, cursos de saúde e higiene são desenvolvidos, nos
níveis Federal, Estadual e Municipal como centros polivalentes e distritais de Saúde.149
e muitos privados na mão da Igreja Católica.

A articulação de tantas instituições e projetos no interior da Igreja é objeto de uma


organização especializada, chamada Caritas. Estruturada em 1950 como uma
instância mundial, a Caritas Internationalis150 acompanha a estrutura complexa da
Igreja, abrindo escritórios em cada país e quando possível em cada diocese. Possui
120 escritórios só no Brasil.

Tabela VII
Unidades Sanitárias criadas151

Acre 7 - Amazonas 6 - Pará 7 - Maranhão 6 - Piauí 3 - Ceará 4


R.G. Norte 11 - Paraíba 0 - Pernambuco 10 - Alagoas 10 -
Sergipe 7 - Bahia 10 - Espírito Santo 7 - Rio de Janeiro 11 -
Distrito Federal 15 - São Paulo 93 - Paraná 6 - Santa Catarina 7 -
Goiás 7 - Total : 350 unidades. (ano: 1940).

Resumindo, de 1918 a 1946 foram criados 1008 estabelecimentos de Saúde Pública,


dos quais 186 eram unidades federais, 733 estaduais e 89 municipais. 152

Yida, (1994), afirma que o predomínio da assistência médico-hospitalar privada mostra


o equívoco de alguns autores brasileiros que afirmam que esta se expande após 64.
Realmente, neste período, verifica-se uma nova expansão, cujo caráter mais
empresarial corresponde às novas condições da sociedade brasileira, contudo, a rede
Privada sempre foi dominante e privilegiada pelos regimes governamentais. De outro
modo, parte dos recursos destinada à Saúde Pública, na Secretaria Estadual de São
148
Muitas tentativas vêm sendo feitas desde muitos anos visando obter medidas que permitissem ter dados da Saúde
Pública. O coeficiente de mortalidade geral e infantil, os índices vitais e vários outros foram igualmente adotados. No
Brasil, Carlos Sá, em 1926, apresentava critério a ser adotado na avaliação do trabalho de Postos de Higiene em
cidades providas de abastecimento de água e esgotos. Barros Barreto e Fontenelle organizaram, igualmente, no ano
de 1931, tabela para avaliação das atividades dos Centros de saúde da então Capital Federal.
149
Tais dados em detalhes constam do Anuário Estatístico do Brasil (1949) – (1950) – pág. 442 / 5. A Igreja Católica e
outras igrejas, de observação nas mudanças políticas resolvem também aumentar o braço da benemerência
eclesiástica. A Roda da Santa Casa de Misericórdia, que funcionou até 1950, criavam as crianças até os sete anos de
idade e depois eram encaminhadas para diferentes seminários.

150
É uma entidade cuja confederação abrange mais de 200 países e tem objetivos sociais e tentar fomentar uma vida
melhor. Atende principalmente os pobres e os oprimidos. A primeira conhecida foi em Freiburg, Alemanha, em 1897,
outras aconteceram na Suíça em 1910 e nos EUA em 1910. (Fonte: Wikipédia).
151
Fonte: Barros Barreto – arq. Hig. RJ – v.10, n.1, p. 7-79, 1940 – citação detalhada em (Yida - 1994).

152
Fonte: Anuário Estatístico do Brasil - 1949

64
Paulo, é canalizada para entidades privadas sob o rótulo de “Auxílio e Subvenções” ,
inclusive para expansão da rede hospitalar privada, na qual se desenvolverão as
atividades ligadas à assistência médica previdenciária, sendo, portanto, aparente a
divisão entre Saúde Pública e Medicina Previdenciária. (Yida – 1994).

A Reforma Sanitária entre 1964 e 1966 – gestão militar - criava três superintendências:
Saúde da comunidade, Hospitais e Pesquisa. Empresas particulares participaram do
planejamento. Era o Privado dando seu braço para o Público. Outra discussão passou
a fazer parte da agenda de gestão, onde após anos de dificuldades foi vitoriosa a
discussão que a Saúde Pública não deveria só estabelecer aspectos preventivos, mas
também de recuperação. Havia, de certa forma, receio de que tal decisão poderia
prejudicar a iniciativa da Medicina Privada. A Odontologia sanitária também já era
preocupação reinante nos meios públicos e privados da saúde.

O conceito polivalente de saúde e saúde pública e privada condicionou que todas as


possibilidades que levassem a essa meta fossem mobilizadas, daí resultando que a
Odontologia sanitária aparecesse como um dos componentes mais importantes e
necessários para se atingir os objetivos. O retardamento da incorporação da
Odontologia sanitária aos programas sanitários foi possivelmente influenciado pelo
conceito superado, de que a saúde pública estava restrita quase que exclusivamente
aos assuntos de doenças transmissíveis a cujo risco estava exposta a maioria da
coletividade.

A saúde da boca sendo considerada principalmente um problema individual, seus


danos prováveis a outros membros da comunidade seriam remotos, daí resultando a
inexistência de pressão sobre os governos para resolvê-los. Nestes casos da saúde
bucal, a Igreja e os trabalhos de benemerência em pouco ajudavam embora tivesse
grande força e influência política sobre a saúde das comunidades.

O apoio da Igreja Católica, a filantropia e outras instituições

No caso da Igreja, sobretudo no período da ditadura militar, ela sofreu uma


expropriação de seus serviços pelo Estado. O golpe de 1964 assumiu fortes
elementos do Estado preexistente e lhe deu contornos novos, que o diferenciaram na
sua essência do modelo hegemônico anterior. (Sader – 2000).

Fernandes (1994) menciona alguns números relativos à diocese do Rio de Janeiro


para que se tenha uma noção das dimensões deste gênero de trabalho. Esta diocese
é particularmente significativa, entre outras razões, pela liderança conservadora
exercida pelo seu bispo nos anos 70 e 80.

Havia 228 paróquias na cidade do Rio de Janeiro, cada uma delas abrigando ao
menos um projeto de cunho assistencial. Havia também ainda 47 ordens religiosas
masculinas e 92 congregações femininas. Enquanto os homens concentram-se no
apoio às obrigações paroquiais, grande parte das irmãs trabalhavam em obras de

65
caridade. Existe ainda, uma instituição denominada de Banco da Providência153 que
organiza campanhas anuais de captação de recursos para o trabalho social, com
ampla cobertura da mídia.154

Cerca de 265 instituições com estatuto legal distinto dos projetos paroquiais
distribuem-se da seguinte maneira: 41 creches, 113 escolas, 22 centros para a
distribuição de roupas e alimentos, 51 centros de saúde, 4 centros para grupos
marginalizados, 5 centros de formação profissional, 3 casas para mulheres jovens, 6
asilos para velhos, 6 centros comunitários, 9 orfanatos, 3 centros para meninos de rua,
2 centros para apoios legais, 1 centro para pessoas inválidas.

A Pastoral do Menor na cidade do Rio de Janeiro oferecia apoio de saúde e outras


campanhas a 4.259 crianças e adolescentes em 1992. 155156 Todos esses processos
de mudanças se refletiram na saúde geral. Mostrou a força do Privado versus Público-
estatal. Veio então a descentralização.

O governo de um lado, fornecendo as unidades locais da administração e estimulará o


seu aperfeiçoamento, aumentando a eficácia; de outro, criará as condições para que o
setor privado possa desempenhar, a contento, sua missão, criando facilidades para os
investimentos, orientando-o sobre o sentido geral do desenvolvimento e intervindo
supletivamente quando as condições o recomendarem.157

As empresas dentro do cenário geral também se preocupavam com a filantropia, pois


era assunto latente. A par de criar uma seguridade social à brasileira, no final do
governo Kubitschek promulga-se a Lei Orgânica da Previdência Social que garantiria a
uniformização dos benefícios aos trabalhadores urbanos e, em 1963, surge o Estatuto
do Trabalhador Rural.

O Estatal ou o Público tornou-se então diferente com o período militar. Era outro
Estado, era outro Público. A visão estatista deu lugar à estatista-militar. O Público se
enfraquece como participante diante do militar e o Privado nacional e internacional vão
se estabelecendo. Após o golpe militar e a entrada de grande volume de capital
estrangeiro, empresas multinacionais e empréstimos vultosos agiam no
desenvolvimento econômico e social e nisso inclui-se a Saúde da população.

Em 1967 é promulgada a nova Constituição e apenas dois partidos representativos.


Movimentos grevistas e estudantes nas ruas geraram o conhecido Ato Institucional
número 5. Nessa altura da Saúde, as doenças mentais e lepra são consideradas
doenças de segundo plano para a nova Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo,

153
Criado em 1959 por Dom Helder Câmara, o Banco da Providência é o maior e mais antigo projeto social da
Arquidiocese do RJ, cuja missão é colaborar para transformar o indivíduo socialmente excluído em um cidadão capaz
de alcançar condições necessárias a uma vida digna. Ele atua com recursos próprios captados através da Feira da
Providência, do Arraial da Providência, do Programa Amigos do Banco com contribuições mensais de pessoas que
apadrinham uma família e de parcerias economicamente sustentáveis. O Balanço social registra que através do
programa social, atendeu-se já mais de 39.000 famílias. (ver site na Bibliografia).
154
(Fernandes – 1994)
155
Fonte: Anuário 1993 – Arquidiocese do Rio de Janeiro.
156
Ainda hoje, em 2011, e há muitos anos a PUC – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, possui o DERDIC,
que dá apoio de Fonoaudiologia a mais de 4.000 crianças com problemas de audição.
157
Yida – pág. 113

66
enquanto se aumentou consideravelmente o número de leitos mantidos por meio de
convênios com entidades privadas. 158

Tabela VIII

O Desenvolvimento da Filantropia Empresarial no Brasil159


Década Número de organizações %
1930 2 6,25
1950 4 12,50
1960 3 9,38
1970 4 12,50
1980 13 40,63
1990 6 18,74
Total 32 100,00

Os problemas da saúde, educação, políticos e de fluxos de caixa dos governos


militares fez com que essa crise tornasse urgente novas decisões, pois com o tempo,
críticas ao Estado, então autoritário, emergiram. As propostas neoliberais, como
privatização, diminuição do Estado, desregulamentação da economia e aberturas ao
mercado internacional foram surgindo. Era necessário encontrar soluções. A Saúde
Pública era um verdadeiro caos nacional e a saúde privada já olhava esse modelo
com olhos de negócio.

Faltavam médicos, todavia, para atender a demanda de doentes. No novo


planejamento era necessário criar mais Escolas de Medicina – públicas e também
privadas. Percebe-se esse aumento na graduação à partir de 1967. Apesar desses
dados, havia 74.543 leitos privados no País e em 1984 eles chegaram a 348.255, ou
seja, num período de 24 anos, dá-se um aumento da rede privada em 465%,
possibilitada, sobretudo, pelas políticas da Previdência Social. (Villaça – 1999), mas
com grande insuficiência de profissionais médicos e distribuídos de forma fragmentada
pelo País.

O Estado resolve então renunciar – em parte - as suas funções sociais e abre mão
para o Privado que prometia colaboração com o governo em seus inúmeros problemas
de várias naturezas: Saúde, Educação. Outros movimentos de massas como o
previdenciário, o rural seriam revistos posteriormente. Havia um ministro desse
período militar que afirmava que “antes de repartir o bolo era necessário fazê-lo
crescer”.160 Embora militar as embrionárias células do neoliberalismo, desqualificando
o Estado começavam a se multiplicar. Era a década dos anos 70. Sob o ponto de vista
da Saúde, parte do bolo – na visão da época - poderia ser dividido algum dia através
de Convênios na Educação Médica.

158
Yida – pág. 115
159
Fonte: Fonte: Fundação Emílio Odebrecht, 1993. - (Por data de fundação dos membros do Grupo de Institutos e
Fundações).

160
Ministro Delfim Netto.

67
Em 1971/1972, instituiu-se o Programa de assistência ao trabalhador rural (Prorural),
já comentado, gerido pelo Funrural e, em 1972, incluíram-se, na Previdência Social, os
empregados domésticos e autônomos. (Villaça, Mendes – 1999).

Até 1973, ressaltava-se que a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo,


colaborando com o ensino médico, celebrou convênios com a Faculdade de Ciências
Médicas da Santa Casa, Escola Paulista de Medicina, Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo, Fundação Regional do Ensino Superior Araraquarense,
Fundação Luzíadas, Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Botucatu,
Fundação municipal de Ensino Superior de Marília, Fundação Universitária do ABC,
Faculdade de saúde Pública da USP, objetivando o funcionamento dos Centros de
Saúde-Escola, na Barra Funda, Vila Mariana e nos Centros de Saúde de Paulínia, São
José do Rio Preto, Peruíbe, Botucatu, Marília e Santo André.

Estas unidades serviram à instrução de alunos de medicina no campo da medicina


preventiva e ao treinamento de pessoal auxiliar da Secretaria.161 O governo militar não
se esqueceu de suas relações com a Igreja, pois sabia que ela teve papel
preponderante nessas últimas três décadas na saúde e na educação privada e
benemerente.

O início das Integrações Públicas, Privadas, ONG’s e PPA’s

A presença de instituições, como a Igreja, define uma idéia bem diferente da que
imperou no mundo democrático a partir das Revoluções Francesa e Americana.
Observe-se que durante bom tempo foi dito que as PUC’s – Pontifícias Universidades
Católicas seriam instituições públicas não-estatal.

As PUC’s seriam públicas porque eclesiástica e, ninguém fez mais serviços públicos
no Brasil do que a Igreja Católica. (Romano - 1979). No aproveitamento dos serviços
da Igreja à favor do Estado há um liame de óleo e água que não se misturam com o
público estatal. A Igreja – freiras e padres – sempre ou quase sempre deram palavras
de peso. Trabalho comunitário é uma expressão das mais usadas por aqueles que
transitam por organizações da Igreja e atualmente do Terceiro Setor.

Em todas as práticas nacionais, médicas, educacional, encontra-se esta realidade da


não-fusão plena entre o público e o estatal. Acontece ainda um outro fenômeno
chamado de “terceirização” na contratação de pessoas e serviços privados. O caso
das Universidades ou Faculdades particulares para cuidar da Educação e do
florescimento de corporações para a venda de Planos Privados de Saúde são
exemplos notórios. O nosso Estado é tudo, menos federativo e democrático e as
políticas públicas que ele determina não passam pelas três faces (Executivo,
Legislativo e Judiciário) e menos ainda pela sociedade civil.

A integração entre o Público e o Privado na Saúde, se observa antes de 1973 – como


exemplo - todavia, formalmente, através do Decreto 52.182 de 16/6/1969, a atribuição
da Secretaria de Saúde era estudar, planejar, orientar, coordenar, supervisionar em

161
Yida – pág. 125

68
todo território do Estado de São Paulo, medidas visando a melhoria das condições
sanitárias da população, promovendo a saúde, prevenindo a doença, bem como
participar das medidas de recuperação de saúde. Iniciam-se então possibilidades de
convênios com empresas/clínicas para controle de saúde.

Por volta de 1974, com o fim do período de expansão econômica e iniciada a abertura
política lenta e gradual, novos atores surgem na cena política, como os movimentos
sindicais, profissionais e intelectuais de saúde, questionando a política social e as
demais políticas governamentais. Neste ano duas medidas destacam-se no campo da
saúde: 1) a implementação do chamado Plano de Pronta Ação (PPA), com diversas
medidas e instrumentos que ampliaram ainda mais a contratação do setor privado
para a execução dos serviços de assistência médica sob responsabilidade da
Previdência Social; 2)- a instituição do Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social
(FAS), destinado a financiar subsidiariamente o investimento fixo de setores sociais.
(Braga & Paula, 1981).

Em 1975, com base nas diretrizes do II Plano Nacional de Desenvolvimento e tendo


como referencial doutrinário a teoria de sistemas, surgiu a Lei 6.229, que
institucionalizou o modelo médico-assistencial com forte presença do setor privado,
definindo as competências das instituições públicas e privadas e propondo
mecanismos de integração e coordenação.

A ação combinada do PPA e do FAS representou, na verdade, um poderoso


mecanismo de alavancagem do setor privado na área da saúde, o primeiro abrindo
mercado cativo e, o outro, garantindo uma expansão física adicional, com recursos
subsidiados, especialmente na área hospitalar. Com isso houve substancial
crescimento do número de consultas, internações, exames, no período de 1971 a
1977, sobretudo no setor contratado pela Previdência Social. As internações
cresceram 322% as consultas médicas 638% e o serviço de apoio diagnóstico 434%
(Lima & Pucú, 1981).162

A partir da década de 70, o milagre brasileiro, como ficou conhecido, levou o país ao
crescimento. Houve inúmeros financiamentos do exterior, além da criação dos projetos
do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), de Bancos de Investimentos e
do Sistema Financeiro da Habitação (SFH). Também foram iniciadas as obras de
imensas hidrelétricas e de estradas importantes para a época, tais como a
Transamazônica, Trans-Pantaneira, absorvendo um grande número de trabalhadores
e de mão de obra não qualificada163. Tais informações são relevantes para a
atualidade, pois demonstram a forma de utilização dos recursos, cujo mérito as
gerações futuras julgarão. Eram reflexos daquilo que se denomina de crescimento,
decorrente das políticas de desenvolvimento do Ministro Roberto Campos164.

162
Em: Direitos Humanos no Brasil – Apud: Cláudio Moser e Daniel Rech (1984).
163
Em 1973 ocorre a crise internacional de petróleo que foi extremamente danosa para o Brasil, cujo percentual de
consumo de petróleo importado era de 80% de seu total. Quando Geisel tomou o poder em 74, ainda persistia aquela
idéia de milagre brasileiro. Fica encarregado o economista Mário Henrique Simonsen pela linha política econômica
substituindo Delfim Neto. É verdade que o PIB cresceu, mas a inflação subiu em média 37,9 % ao ano.
164
http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/a126.htm - Gustavo Franco sobre o neoliberalismo, criação do BNDES, FGTS,
Bancos de Investimentos, Sistema Financeiro da Habitação. Acessado em 22/04/2005.

69
Porém, ainda havia muitos problemas a resolver. A máquina do INPS era imensa, e os
recursos ainda eram grandes; com isso, sobrava dinheiro no caixa. Conforme
comentário em parágrafo anterior, o Seguro de Acidentes do Trabalho completava
nessa época 50 anos de criação e tornou-se um apêndice de gastos consideráveis nos
balanços da Previdência Social. Os números tornaram-se enormes, gerando grande
saída de recursos. Foram constatados, na época, abuso e fraudes na utilização pelos
trabalhadores e empregados, pois os acidentes do trabalho eram arcados pelo
Instituto do governo e não havia controle e nem transparência.165

Houve, então, a mudança na lei, e as empresas passaram a ser responsáveis pelos


primeiros quinze dias do acidentado. Com isso, os acidentes diminuíram 40%. Já era,
pois, uma forma de compartilhar o público e o privado, tendo vencido a eficácia de
controle do segundo. Era a medicina nas empresas, de certa forma compulsória,
iniciando suas primeiras manifestações de preocupação com a saúde dos
empregados, ao mesmo tempo em que se preocupavam com as saídas de seu caixa.
Todo esse aparato regulatório deu início à criação, nas empresas, das CIPAS -
Comissões Internas de Prevenção, Assistência e Segurança no Trabalho, que
promoviam, por conta própria, cursos de prevenção de acidentes.

As empresas passaram então a fornecer equipamentos profissionais especiais, como


capacetes, luvas e outros para proteger os trabalhadores de costumeiros riscos da
atividade, e também passaram a promover a medicina ocupacional. Uma das
primeiras exigências foi que todos os empregados fizessem obrigatoriamente a
popular chapa do pulmão com os exames de raios-X.

De certa forma, essas primeiras legislações eram também embriões de


compartilhamento entre o público e o privado: atualmente as NRs - Normas
Regulamentadoras - da saúde ocupacional são rotina, e essa legislação específica
levou à criação de empresas prestadoras de serviços de monitoramento das
atividades dos empregados e do tipo de trabalho conforme o ramo de atuação - se
químico, construção civil e outros. Em 1975 a Lei 6.229, já referida, organiza o
Sistema Nacional de Saúde e estabelece as principais competências às distintas
esferas de governo, Federal, Estadual e Municipal envolvendo regulação em vários
Ministérios que tinham relação direta com o trabalho, epidemiologia, formação de
profissionais, saneamento básico. Essa Lei é a que realmente deu todo o eixo para o
sistema de saúde atualmente existente, que foi sendo aperfeiçoada ao longo do tempo
até os dias atuais.

Uma das formas de saída de recursos estava sob controle, que eram os acidentes do
trabalho; todavia, saber quanto se deveria ter no caixa para pensionistas e para
assistência médica e tal situação orçamentária continuava a ser um desafio ao
governo.

Para tanto, em 1977, foi criado o SINPAS – Sistema Nacional de Previdência e


Assistência Social, que era composto do INPS - Instituto Nacional de Previdência
Social - cuja função era conceder e controlar a manutenção dos benefícios, do

165
Fonte: Cordeiro, Antonio Filho – Tese de Mestrado – PUC-SP.

70
INAMPS - Instituto Nacional Assistência Médica e Previdência Social, cuja função era
prestar assistência médica, do IAPAS- Instituto da Administração Financeira da
Previdência e Assistência Social, cuja função era arrecadar, fiscalizar e cobrar
contribuições, do DATAPREV - (Empresa de Processamento de Dados da Previdência
Social) - da LBA - Legião Brasileira de Assistência, que foi criada para prestar
assistência às pessoas carentes, do FUNABEM (Fundação para o Bem Estar do
Menor) e do CEME (Central de Medicamentos do governo). Essa lei de número 6.439
criando o SINPAS, juntamente com a Constituição de 1967/69 e a Lei 6.229 formaram
a base Jurídica Legal do Sistema de Saúde na década de 70. Essa estrutura se
manteve até a Constituição de 1988.

Observa-se que eram muitos os órgãos que consumiam os recursos disponíveis, além
de haver muita disputa política entre eles, mas esses órgãos levaram à separação
entre o que hoje chamamos Assistência Médica e Pensões de Aposentadoria. Os
recursos eram imensos, mas as despesas de burocracia consumiam muito dinheiro
misturando receitas e despesas de duas situações diferentes e que necessitavam de
monitoramento cada uma de per si, quando então houve uma declaração pública
bombástica para a época, do SINPAS, onde se informou que não haveria mais
dinheiro no caixa e que seria necessário aumentar as contribuições de empresas e
trabalhadores.

Dentro dessa atribuição e ao estabelecer sua política de saúde, assinalava como um


dos objetivos: melhorar o rendimento do sistema de assistência médica, aperfeiçoando
o sistema de colaboração técnica e financeira com instituições privadas, ampliando e
melhorando a assistência médico-hospitalar, definindo adequadamente as condições
que tornaria necessária a atuação de Regulação supletiva do Estado, coordenando
atividades oficiais e privadas.166

Aciole (2006) diz que:

“... a realidade social brasileira, aqui será vista como duplamente cindida: é tanto uma
sociedade desigual na qual se insere a Saúde, como esta apresenta uma assistência
ofertada em dois modos distintos: um público e outro privado ou um, pelo Estado, e
outro, pelo mercado. A Saúde torna-se assim, um dos setores no qual,
estrategicamente, se desenha a luta entre o que constitui interesse público e iniciativa
privada, portanto, entre interesses sociais antagônicos, espaço real de ação e disputa
de projetos de diferentes estratos sociais, por eles gestados e/ou a eles dirigidos. Luta
que repercute as profundas raízes ideológicas emprestadas ao que é público e ao que
é privado. Diante disso, torna-se necessário perseguir para estes dois termos o
sentido imanente à ideologia que as cerca. Para tanto, buscamos estudar as raízes em
que residem os significados atribuídos ao termo público e ao termo privado. “ 167

Nossa federação é regida por uma uniformidade normativa que reúne povos, culturas,
situações diversas de modo igual. Uma portaria sobre educação, saúde, segurança,
rege o País de norte a sul, sem variações. As políticas públicas são monopólio eficaz

166
Apud – W. Leser - Massako 131
167
Aciole, Giovanni Gurgel – (2006) - A Saúde no Brasil – Cartografia da Saúde - pág. 23

71
do Executivo federal.168 Essas condições impedem a emergência de práticas sociais e
políticas transparentes e democráticas. Além do braço estatal e do mercado, há um
terceiro setor não governamental e não lucrativo, embora atualmente muitas ONGs,
sejam braços do Executivo federal e não organismos livres. Os recursos são
fornecidos pelo Executivo que pratica uma política fiscal tirânica, sem retorno em
serviços públicos dignos deste nome. Sugere-se ler Carvalho, Isabel (2001) sobre o
assunto.

Para uma visão bem definida no caso dos embates entre o público e o privado no
Brasil, é necessário analisar a história do Estado antes e depois das grandes
revoluções democráticas mundiais. Além disso, é importante ter dados comparativos
para que não se faça abstrações distantes da realidade. Os números chamam a
atenção e precisam de análise profunda.

A Organização Mundial de Saúde sinaliza que as doenças crônicas corroem quase a


metade dos recursos utilizados nos sistemas de saúde, ocasionando a grande maioria
das internações nos serviços públicos e dos sinistros das operadoras de planos de
saúde. O excesso de peso afeta dezenas de milhões de indivíduos, a hipertensão, o
diabetes mellitus e as doenças cardíacas apresentam crescimento exponencial nos
países em desenvolvimento, enquanto o infarto agudo do miocárdio (IAM), mata
milhões de pessoas todos os anos. Em nosso meio prevalece a hipertensão arterial,
líder inconteste no ranking de doenças, relacionando-se diretamente com a maioria
absoluta dos acidentes vasculares cerebrais e IAM. 169

Depois, para efeito comparativo, é importante conhecer o quanto e como o nosso


Estado se instaurou contra as conquistas daquelas revoluções. No Brasil, pode-se
afirmar que após a fase de desgaste do militarismo um novo momento histórico se
iniciou e com ele houve uma evolução na política ideológica com fortes tendências ao
liberalismo. Collor, o ex-presidente deixou o País na década de 90 com uma situação
para reformas no Estado que foram iniciadas posteriormente por Itamar Franco e
implementadas em sequência, por Fernando Henrique. Iniciou-se a
desregulamentação da economia. Um plano Diretor então foi gerado e um dos tópicos
importantes foi a Saúde como um todo.

Menecucci (1993 / 1994), afirma que diversos incentivos fornecidos pelo modelo de
assistência delineado pela política de saúde das décadas de 60/70 favoreceram, por
exemplo, o desenvolvimento da assistência médica de caráter empresarial em
detrimento da assistência pública, afetando, dessa forma, o desenvolvimento de
diversos segmentos empresariais e propiciando o surgimento de instituições e
organizações, como a medicina de grupo, as cooperativas médicas e os sistemas de
auto-gestão vinculados a empresas empregadoras. Saúde, então é uma das vertentes

168
Não se trata de pretensão acadêmica, mas devem ser descentralizadas muitas ações médicas, na medida da
complexidade dos procedimentos. Locais primários para alta complexidade e hospitais secundários para cirurgias mais
simples como, por exemplo: apendicites, retirada de vesícula, debridamento do pé diabético, herniorrafias, ferimentos
superficiais, compensação diabética, hipertensão arterial e outros tratamentos de doenças mais prevalentes. (Waldemir
W. Rezende) – Apud – (Amorim – 2008 - pág. 174).
169
Artigo de Waldemir Washington Rezende no livro de Amorim, Maria Cristina Sanches e Perillo, Eduardo Bueno da
Fonseca (org) – pág. 169

72
fortes nesse novo mundo civil e democrático e o cuidado médico começa a deixar de
ser – digamos – artesanal. (Menecucci – 1993/1994).

Não se pode esquecer que nessa fase o país passava por aguda crise fiscal. Tais
situações abriram fortemente as possibilidades de abertura da economia, gerando
convergência de propostas neoliberais. Há uma tendência de encerramento do Estado
autoritário e centralizador e foco no mercado nacional e internacional. Privatizações e
descentralizações eram palavras na moda. O objeto era esgotar a estratégia
estatizante, fórmulas encontradas no governo militar. Numa fase recessiva como a de
1976, o governo abriu as portas para empreendimentos privados nos setores mais
diversos. Nesses empreendimentos havia as metas do II PND – Plano Nacional de
Desenvolvimento e contratações dos serviços privados em várias áreas e
primordialmente da Saúde.

Foram nítidas as correlações público-privadas e o crescimento embrionário de uma


nova modalidade assistencial que surgia – a medicina de grupo – viabilizada a partir
do convênio-empresa. O primeiro foi realizado entre o IAPI e a Volkswagem em
maio/64. Esse modo de relação destinava-se a uma clientela específica, isto é, à mão
de obra das empresas maiores e, portanto, atingia um operariado mais qualificado e
com melhor padrão organizativo.

O crescimento dessa modalidade deu-se progressivamente, atingindo em 1977, 4.699


convênios que cobriam 10% do total da população previdenciária da época. Pode-se
afirmar então que o convênio-empresa foi o modo de articulação entre o Estado e o
empresariado que viabilizou o nascimento e desenvolvimento do subsistema que viria
a se tornar hegemônico na década de 80 que é a da atenção médica supletiva. Em
1977, através da Lei 6.439, criou-se o Sistema Nacional da Previdência Social –
SINPAS, que, conjuntamente com a Constituição de 1967-69 e a Lei 6.229,
conformaram a base jurídico-legal do sistema de saúde vigente nos anos 70. (Villaça –
99).

Yida (1994), afirma que dentre as várias exigências e reclamos da população, na


época, havia os pedidos de creches, melhores salários, anistia, habitações e nesse
contexto a Saúde, pois em 1970/72 uma epidemia de meningite assustava a
população civil e até os militares. Recursos da Loteria Esportiva foram destinados ao
FAS – Fundo de Assistência Social – e ajudou ao setor privado na expansão da rede
de assistência Médico/Hospitalar privada. Entre 1974 e 1977 de U$ 240 milhões
aplicados em saúde, quase 66% foram destinados à saúde privada no Estado de São
Paulo). (Yida – 1994)

Muitos são os discursos no Brasil à respeito do Público e do Privado. Muitos desses


discursos datam do início de governos como de Itamar Franco e Fernando Henrique
Cardoso. Pode-se afirmar ainda que as décadas de final dos anos 80 e de 90 deram o
toque expressivo à essa hegemonia política – privatizações, regulações, parcerias
público/privadas - e percebe-se isso quando do lançamento das parcerias
público/privadas e das idéias das Agências Reguladoras que transformariam
Autarquias e Fundações em Agências Autônomas e nesse bojo as idéias de
organizações sociais que deram origem – de forma mais organizada - posteriormente

73
as ONG’s – Organizações não Governamentais – com dotação de orçamentos estatais
na década de 90.170 Há até discursos sobre o assunto.

Nesse período, década de 90, as CEB’s - Comunidades Eclesiásticas de Base –


puseram-se a questionar situações de caráter social junto às comunidades, com o
objetivo de convencê-las a exigir direitos, fazer manifestações e falarem dos seus
problemas. Inicia-se então, fortemente uma corrente de diminuição do Estado – pois
havia um sentimento de que ele não funcionava bem - e muito se falava em
privatizações. Discursos e entrevistas de ministros dão ênfase a esse liberalismo que
aportava. Por outro lado, a Demografia torna-se necessária e emergente disciplina
para colher dados sobre crescimento populacional, urbanização, pesquisas em saúde
e educação tornam-se absolutamente importantes para conhecer as realidades do
Brasil com o objetivo de fazer comparações com o resto do mundo. Por exemplo, o
Rio de Janeiro.171

A América Latina passa por um processo dramático de urbanização, comparável


apenas a alguns casos do Sudeste Asiático. A população da América Latina, cresceu
de 210 para 450 milhões entre 1960 e 1990. Enquanto isto, o percentual de habitantes
das cidades aumentou de 49% em 1960 para 72% em 1990. Ou seja, as cidades do
continente tiveram de absorver um excedente superior a 221 milhões de almas e
corpos em apenas 30 anos. A população urbana mais que triplicou no período. Muita
saúde precisava então ser cuidada. Educação era também prioridade. Áreas de
proteção social do tipo Saúde e Previdência são exemplos de saltos rápidos citados
acima. 172

Outros discursos de fato, podem ser citados, como exemplos de preocupação recente
em consagrar atividades públicas e privadas como compartilhamento em todos os
níveis. Tito Ryff, (2001) 173 que foi Secretário Estadual de Desenvolvimento Econômico
e Turismo, em 2001, dizia:

"Não existe projeto nacional bem sucedido sem alguma forma de parceria público-
privada. E essa parceria, evidentemente, ganha em todos os sentidos quando é
explicitada, regulamentada, quando tem regras estabelecidas previamente e os seus
objetivos são discutidos ampla e democraticamente. É isso que nós estamos fazendo
aqui, nesse processo que estamos iniciando. Acredito que as discussões e os
desdobramentos dessa reunião e desse seminário certamente terão um resultado

170
O intitulado “terceiro setor” alimenta-se da opinião, mais ou menos notória, da necessidade de aprimorar a gestão
da política social. Nele se buscam resultados, participação, eficiência, eficácia nos programas sociais, por intermédio
da atuação conjunta do Estado e de “setores” da sociedade. Com o “terceiro setor”, retomam-se as antigas práticas da
filantropia e do voluntariado, agora com trajes empresariais, decretando um novo mundo, livre de antagonismos e de
conflitos entre classes sociais, mesmo com a injustiça, a desigualdade e a miséria que nos olham. (Vieira, 2007).
171
Os especialistas sempre se perguntam por que o Rio de Janeiro é o campeão de tuberculose no Brasil? É uma
tendência histórica secular. O Rio foi o porto de entrada da tuberculose no Brasil com os primeiros jesuítas, no século
16, transmitida a uma população indefesa por razões provavelmente étnicas e imunológicas. Além disso, o Rio tem
geografia muito particular, com riqueza e pobreza muito próximas numa faixa mínima de terra entre montanha e o mar,
onde sempre houve favela, uma população escrava maior, fora fatores recentes como imigração, exclusão social e
deterioração da rede de serviços de saúde pública. Isso atravessou séculos. Ainda hoje, “Considero inadmissível que
ainda morram cerca de seis mil brasileiros por ano de tuberculose”, diz Margareth, que numa entrevista à Radis, onde
faz balanço do estágio da doença no país e enumera algumas recomendações aos profissionais que lidam com
pacientes de tuberculose. (Revista Radis – artigo de Margareth Dalcolmo – maio/2008).
172
Mais detalhes populacionais e demográficos devidamente atualizados no capítulo 3 deste trabalho.
173
Fonte: Revista Inteligência Empresarial – número 08 – julho / 2001.

74
muito positivo, no sentido de nos beneficiarmos com experiências de outros países e
podermos implantar aqui uma parceria público-privada, duradoura, um instrumento
efetivo para retomada dos processos de desenvolvimento econômico, de geração de
emprego e de renda em nosso país."

Pode ser citado ainda, Paulo Sérgio de Oliveira Passos, que foi Secretário de Gestão
do Ministério dos Transportes e depois Ministro dos Transportes (2006), que em
discurso também se referia a esse compartilhamento entre o Público e o Privado:

“Hoje, nós temos o convencimento de que quando se reúnem aqui especialistas,


profissionais e os diversos interessados nessa questão, quando estamos diante de um
debate que seja positivo e enriquecedor e quando o governo está às vésperas de
encaminhar ao congresso nacional um projeto de lei de PPP – Parceria
Público/Privada, a nossa expectativa é de que de tudo isso resulte num instrumento:

...uma base normativa que possa, de maneira clara, objetiva e com regras estáveis,
abrir um novo flanco para que diversos empreendimentos - que ainda não podem ser
realizados pelas limitações do Estado - possam ser executados pela iniciativa privada
e colocados à disposição do usuário..."

Demian Fioca – (2004/2006), Secretário de Assuntos Internacionais do Ministério do


Planejamento, Orçamento e Gestão, representando o senhor Guido Mantega, Ministro
do Planejamento:

"...Há dois grandes vetores que nos parecem importantes e que fazem com que as
Parcerias Público-Privadas sejam promissoras. Por um lado, permitem ao estado
retomar ou avançar na sua perspectiva de planejamento, ou seja, elas ajudam o
Estado a contribuir para delinear o horizonte de médio e longo prazo, algo necessário
e desejável para o desenvolvimento de qualquer país, inclusive para a própria
atividade estritamente privada. E outro vetor é que elas combinam essa capacidade de
planejamento com uma perspectiva de eficiência..."

Marcio Fortes de Almeida, (2003/2004), como Secretário Executivo do Ministério do


Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior:

"...Basta olhar a dimensão continental do Brasil, e ver a desigualdade econômica das


várias regiões, para saber que alguns projetos serão atrativos para o setor privado. Em
outras o interesse vai ser médio, em outras vai ser difícil o setor privado aparecer.
Temos que achar meios de estimular esta presença e, dentro deste contexto, o marco
legal, jurídico, necessário; a modificação de legislação, constituição de fundos; saber
como nós vamos administrar tudo isso e, sobretudo como ter uma visão geral do
nosso país quase que continental, e do próprio continente sul americano..."

Os últimos anos, especialmente as duas décadas que encerraram o segundo milênio,


têm sido marcados pelo candente debate em torno da natureza do Estado capitalista,
ainda mais diante das profundas transformações por que passa o próprio capitalismo
nos países industrializados, seja pela intervenção estatal na economia e no
desenvolvimento de sistemas de proteção social, seja pela queda das experiências

75
socialistas no Leste europeu e o advento de um período hegemônico para o
capitalismo. (Aciole, 2006).

Wallestein (2000) afirma que, após todos os argumentos contidos em seu livro,
depreende-se que ser Estado não é nada fácil. Além disso, percebe-se um
distanciamento das populações em relação ao Estado e que se todos ou quase todos
pudessem viver sem ele, assim seria. “...Há uma desistência hoje generalizada da
crença nos Estados...” 174 Na realidade, observa-se que tais discursos estão
diretamente preocupados com os movimentos sociais que aconteciam por todo o País,
na época, ou seja, décadas de 80 / 90.

Muitos movimentos sociais urbanos se iniciaram sobretudo no âmbito dos bairros.


Bairro é um conjunto de casas e a casa é um território de ampla intervenção feminina.
Temas como água, lixo, segurança, saúde geral e saúde das crianças, creches,
escolas, alimentação e outros fizeram a substância de grande parte das mobilizações
na época.175

Nessa trajetória de inclusão, os governos, através das políticas sociais ainda


estabeleceram no Plano de Pronta Ação (PPA), com o objetivo de tornar os serviços
mais acessíveis aos previdenciários, determinando que os casos de urgência
deveriam ser atendidos tanto na rede privada como na estadual, independente de
vinculação com a Previdência. Esta medida possibilitou não só que parte da população
excluída tivesse acesso a um mínimo de consumo de serviços de saúde, como
também a expansão da iniciativa privada aos serviços de caráter ambulatorial. (Yida –
1994)

O que se apresenta no contexto histórico é que a Saúde – como um todo público e


privado – foi estruturado a partir dos anos 60. Essa referência, é considerada como
marco e dicotomia entre passado, presente e futuro para este trabalho como pesquisa
e história de todo o contexto da Saúde no Brasil a ser considerado.

O Sistema Nacional de Saúde, criado pela lei 6.229 de 17 de junho de 1975,


estabeleceu, de forma sistêmica, o campo de ação na área de saúde dos setores
público e privado. 176 Poucos anos depois, Villaça observa que dá-se uma coincidência
entre a proposta internacional dos cuidados primários, acordada em Alma-Ata, 177 em
1978, e a necessidade de desenvolver e expandir uma modalidade assistencial de
baixo custo para os contingentes populacionais excluídos pelo modelo médico-
assistencial privatistas, especialmente os que viviam nas periferias das cidades e nas
zonas rurais.

174
I. Wallestein – “A Reestruturação capitalista e o sistema mundo. In: P. Gentili. (Org) – “Globalização excludente.
Desigualdade, exclusão e democracia na nova ordem mundial. Vozes – 2000 – pág. 243
175
Fernandes – pág. 52
176
Apud – Ministério da Saúde – Evolução institucional da Saúde Pública, 1979 - p. 22 – (Yida)
177
DECLARAÇÃO DE ALMA-ATA - CONFERÊNCIA INTERNACIONAL SOBRE - CUIDADOS PRIMÁRIOS DE SAÚDE
- Alma-Ata, URSS, 6-12 de setembro de 1978 - A Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde,
reunida em Alma-Ata aos doze dias do mês de setembro de mil novecentos e setenta e oito, expressando a
necessidade de ação urgente de todos os governos, de todos os que trabalham nos campos da saúde e do
desenvolvimento e da comunidade mundial para promover a saúde de todos os povos do mundo, formulou a conhecida
Declaração de Alma-Ata.

76
Assim, começa a desenvolver-se no Brasil, a proposta da atenção primária seletiva,
concebida na sua concepção estreita de um programa, executada com recursos
marginais, dirigidos a populações de regiões marginalizadas através da oferta de
tecnologias simples e baratas, providas por pessoal de baixa qualificação profissional,
sem possibilidades de referência a níveis de maior complexidade tecnológica,
incluindo a retórica da participação comunitária. (Villaça – 99).

Redes prestadoras de serviço, empresas com regimes próprios para seus funcionários
e uma rede pública precária e incipiente é que fortaleceu o braço privado e se prestou
como início para a construção das pilastras de mudanças daí em diante. As pessoas
e entidades formadas denominadas de comunidades, associações, forçavam e
exigiam mudanças. Uma pesquisa feita em 1986 no Rio de Janeiro e em São Paulo
concluiu que 90,7% das associações de moradores existentes haviam sido criadas nos
últimos 16 anos. 178 Contudo, não só o momento é outro, como em torno da Saúde e
da Previdência giram interesses diversos, mais complexos, como bem colocados pelo
documento do Conselho Estadual de Saúde de São Paulo (1986), que teve grande
influência em todo o País, ao abordar o problema da implantação de programação
integrada de saúde.

Apesar disso, o que prevaleceu – anos 80 - no Brasil, foi o entendimento reducionista


da atenção primária seletiva, especialmente através dos programas de medicina
simplificada ou das estratégias de sobrevivência de grupos de risco. (Villaça – 1999).

Considerou-se como opção política já estabelecida o caráter multiinstitucional e não-


monopolistico do setor saúde, compreendendo órgãos subordinados a vários
Ministérios, várias Secretarias de Estado e de Municípios – composto ainda, por
agências de caráter beneficente ou filantrópicas, por profissionais liberais e por
empresas de caráter lucrativo. As dificuldades institucionais em conseguir a integração
decorreram, principalmente, dos obstáculos políticos às diferentes alternativas de
subordinação entre as instituições. Vários foram os documentos tentando a integração.
179

Nesse período, começava a esboçar-se uma entrada no aparelho de Estado de


técnicos provindos do movimento sanitário, o que viria a ser um ponto importante nas
políticas públicas dos anos 80. Para dar suporte a esses programas, o governo criou o
Programa de Preparação Estratégica de Pessoal de saúde (PPREPS) através de um
convênio MS/MEC/OPAS e, em 1977, as carreiras de Sanitarista e Agente de Saúde
Pública. Em 1979, o PIASS180 foi estendido para todo o território nacional adaptando-
se o modelo adotado no Nordeste às peculiaridades das outras regiões, o que resultou
numa grande expansão da rede ambulatorial pública. No período de 1975/1984, o
número dessas unidades passou de 1.122 para 13.739, num crescimento de 1.225%.

Por outro lado, no lugar do pensamento dicotômico, dividido entre interesses


particulares e públicos, recupera-se o valor da tríade, afirmando-se a presença

178
Santos – 1993 e Boschi 1987
179
Citação SES, op. Cit. 1978 – p. 3 em Yida - pág. 136
180
Programa de Interiorização das Ações de saúde e Saneamento no Nordeste.

77
constante e eficaz de uma terceira possibilidade.181 que poderiam ser as Parcerias
Públicas Privadas, as Organizações não Governamentais ou outras possibilidades de
compartilhamento entre o Público, o Privado e o não Estatal.

Em termos de modernidade, quando Luiz Fernando Furlan (2003 / 2004 / 2005) era
Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior o qual participava de
seminários sobre as Parcerias Público-Privadas, sempre se referia a projetos ligados à
área de infraestrutura - setor rodoviário, setor ferroviário, portuário, energético, de
aeroportos. Projetos para a irrigação eram muitos, uma vez que o Brasil vai
crescentemente sendo um produtor eficiente na área de produtos irrigados.

Nunca se referiu ele, as possibilidades de Parcerias Público- Privadas no setor de


Saúde. Talvez porque não desejasse entrar em seara alheia, pertencente ao Ministério
da Saúde, todavia é uma verdade que precisa ser enfrentada dentro de uma visão
mais ampla das necessidades da população, pois ela também é – com certeza – uma
parceria do Público e do Privado há muito tempo. A discussão de oponentes na Saúde
é complexa.

Há defensores de políticas de prevenção e outros de políticas curativas, saúde


totalmente pública e não unidades básicas de saúde, mas hospitais gerenciadores da
saúde da população. São muitas nuances premissas e afirmações e que também dão
frutos de muito conhecimento. Há muita dúvida e discussão à respeito.

Mendes, 1994, acrescenta que estruturalmente o modelo médico-assistencial privatista


constitui-se de quatro subsistemas: a) o subsistema estatal, representado pela rede de
serviços assistenciais do Ministério da Saúde, Secretarias Estaduais e Secretarias
Municipais de Saúde, onde se exercia a medicina simplificada destinada à cobertura
de populações não integradas economicamente; b) subsistema contratado e
conveniado com a Previdência Social, para cobrir os benefícios dessa instituição e
setores não atingidos pelas políticas de universalização excludente; c) o subsistema
de atenção médica supletiva, que buscava atrair mão-de-obra qualificada das grandes
empresas; d) o subsistema de alta tecnologia, organizado em torno dos hospitais
universitários e alguns hospitais públicos de maior densidade tecnológica. Todos
esses modelos receberiam críticas severas, mas construtivas, durante as décadas de
70 e 80 dos meios acadêmicos, universidades e órgãos de saúde pública, além do
próprio setor civil.

É inimaginável para as novas gerações que a tão ambiciosa Reforma Sanitária que
pudesse dar atenção universalizada à população brasileira, só teve alguma
materialidade a partir da Constituição de 1988 que propiciou a criação do SUS –
Serviço Único de saúde. Essa promessa veio de longe. Estas são as referências ao
caos existente nas capitais e grandes cidades. E o resto do Brasil?

Aciole, 2006, afirma que a Saúde Pública naquele período – década de 80 - era um
aglomerado imenso de instituições públicas e privadas que lhe prestavam serviço.
Mais de 60% dos hospitais/leitos –na época - eram conveniados. Há, por outro lado,

181
Fernandes – pág. 20

78
atualmente, instituições privadas com comportamento estatutário de públicas. Noções
embaralhadas pela ideologia que cerca estes termos; que se alimenta e alimenta esta
incompatibilidade de gênios entre o que é público e o que é privado: reforça, sugere e
produz distorções nos significados dos dois termos. Há muitos debates.182

Novos e antigos – dados comparativos

Neste início do século 21, está de novo no ar a discussão em torno da necessidade de


estabelecer um Estado forte no Brasil. Essa discussão envolve também a saúde tanto
pública como privada. Índices de controle estão por toda parte e na saúde temos até a
possibilidade de utilizar o DALY, o YLL e o YLD, conforme sugere dados e estudos.183
184

Até 1940, havia um nítido predomínio das doenças infecciosas185 e parasitárias como
principal causa de morte. Representavam 43,5% do total de óbitos. As doenças
cardiovasculares correspondiam a 14,5% e as neoplasias malignas a apenas 3,9%
dos óbitos com causa definida. Trinta anos depois, inversões nas causas, pois em
1970, as doenças cardiovasculares já surgiam como a primeira causa de morte. A taxa
de mortalidade por doenças cardiovasculares apresentou aumento de cerca de 20%

182
O estímulo para o debate foi a crise econômica que recentemente aconteceu em 2006/2007 e sucedâneos. Esse
argumento é forte para não deixar que problemas tão sérios assim continuem ocorrendo. Os menos ambiciosos se
contentam com uma situação em que a liberdade econômica é tolerada, mas na qual sempre caberá ao governo dar a
palavra final (e a inicial, também) em tudo o que julgar de alguma importância.

183
- O DALY é um indicador que procura medir simultaneamente o impacto da mortalidade e dos problemas de saúde
que afetam a qualidade de vida dos indivíduos. O DALY mede os anos de vida perdidos seja por morte prematura (YLL
–Years of Life Lost – Anos de vida perdidos por morte prematura) ou incapacidade (YLD – Years Lived with Disability –
Anos de vida vividos com incapacidade) em relação a uma esperança de vida ideal cujo padrão utilizado foi o do
Japão, país com maior esperança de vida ao nascer do mundo (80 anos para homens e 82,5 anos para mulheres). A
metodologia propõe a utilização da tábua de mortalidade desenvolvida por Coale & Guo (1989), na qual a esperança
de vida é calculada para cada idade exata. A utilização de um mesmo padrão para todos os países é importante para
garantir a comparabilidade dos resultados. Para que os anos perdidos por morte prematura e anos vividos com
incapacidade possam ser adicionados é preciso criar uma escala associando pesos à mortalidade e às doenças e
seqüelas. Neste sentido, o DALY está ancorado em uma escala de saúde que varia entre zero e um, onde zero
significa o estado de plena saúde e um é a morte, o pior estado de saúde possível.
A metodologia do estudo da Carga de Doença propõe dois ajustes no cálculo de cada um desses componentes (YLL e
YLD). O primeiro ajuste é feito por meio da incorporação de uma função de ponderação de idade que atribui pesos
menores aos anos perdidos no início e fim do ciclo da vida – crianças e idosos (Murray & Lopez, 1996ª; 1996b),
considerando-se as críticas que têm sido feitas ao uso da ponderação de idade, principalmente em relação à
equanimidade do método (Arnand & Hanson, 1997; Bobadilla, 1996). O segundo ajuste refere-se à incorporação de
uma taxa de desconto em relação aos anos perdidos no futuro, objetivando estimar os anos de vida perdidos no
presente. Esta prática tem sido muito comum nos estudos em economia da saúde (Dasgupta, 1972; Layard & Gleister,
1994). O desconto de futuros benefícios é praticado de forma padrão em análises econômicas e refere-se a uma
prática de atribuir um valor maior ou menor no futuro quando comparado ao presente. (Lind ET al., 19082). No Estudo
de Carga de Doença no Brasil optou-se por incorporar a taxa de desconto de 3% ao ano, taxa definida em painel de
experts em economia e saúde. (Gold et al., 1996). (Apud - Artigo de Joyce Mendes de Andrade Schramm ett all –
Revista Ciência e Saúde Coletiva – vol.9 – número 4 – RJ – Oct/dez/2004).
184
Como dados mais recentes sabe-se que as doenças cardiovasculares são as responsáveis por 33% dos óbitos
vindo em segundo lugar as causas externas com 15% e em terceiro as neoplasias malignas com 12%. No passado os
dados eram bem diferentes.
185
Brasil registrou perto de 85 mil novos casos de tuberculose por ano, e o Estado do Rio tem as piores estatísticas: 16
mil novos casos anuais, que chegam a 20 mil se somados os não-curados do ano anterior. De 30% a 33% das mortes
por tuberculose – a maior taxa de mortalidade do país – ocorre na emergência dos hospitais terciários, o que revela a
baixa eficácia da rede básica no diagnóstico e no tratamento da doença. No bairro de Curiacica, zona oeste do Rio de
Janeiro, fica o Centro de referência Hélio Fraga, transferido em abril à Fiocruz. Sua experiência de mais de 20 anos em
pneumologia sanitária permitiu que, a partir de 1995, desenvolvesse protocolo clínico para validação de um tratamento
das formas multirresistentes da tuberculose (TBMR) – quando o paciente não responde a remédios como Rifampicina e
Isoniazida. O objetivo: dar resposta aos chamados casos crônicos da doença. (Fonte: Margareth Dalcolmo – Adriano
de Lavor e Karine Thames de Menezes - Revista Radis – número 69 maio/2008).

79
nos últimos 50 anos. Entretanto, na cidade de São Paulo houve um declínio importante
nas taxas de mortalidade, em média de 28% para as doenças isquêmicas do coração
e 16% para as doenças cerebrovasculares nos últimos anos.

Nas regiões Sul e Sudeste, a obesidade atinge mais de 5% das crianças menores de
cinco anos, mesmo em famílias de baixa renda. A partir dos 18 anos de idade, o
sobrepeso e a obesidade tornam-se cada vez mais freqüentes. Na média, mais de
32% dos brasileiros adultos apresentam algum grau de excesso de peso. A
hipertensão arterial é um dos maiores problemas de nutrição pública no Brasil e a
terceira causa mais comum de incapacidade temporária para o trabalho. Atinge entre
12 a 18% da população. 75% do total de hipertensos ignoram a sua condição e
apenas 16% fazem tratamento dietético.

Os níveis de colesterol acima de 240 mg/dl, variou entre 5 a 12%. Os dados do


Registro Nacional de Patologia Tumoral indicam um ligeiro predomínio de neoplasias
malignas em mulheres, na ordem de 53%. Nos homens, pele, 28%, estômago 11%,
próstata 7%, pulmões 6% e esôfago 4%. Nas mulheres, pele 24%, colo uterino 20%,
mama 17%, estômago 4%, corpo uterino 4%. A porcentagem média de baixo peso ao
nascer que é de 2.500 g ou menos, é de 11%. Em crianças brasileiras menores de
cinco anos, 31% apresentam déficit de peso em relação às respectivas idades, sendo
que em 5% delas, o quadro é moderado ou grave. (Oliveira, 1996).

Na atualidade, o Ministério da Saúde destacou o guia para médicos “Dengue –


Decifra-me ou devoro-te”. A idéia é ótima, já que não poucos médicos do Rio falharam
no diagnóstico, em especial com crianças. Há um comentário de Maulori Cabral, do
Instituto de Microbiologia da UFRJ, deu à revista Radis a explicação desse fenômeno
inadmissível em país tropical: virologia é praticamente ausente no currículo de
Medicina, e por isso a maioria das mazelas de natureza infecciosa é considerada
virose. 186 187

Nessa análise admite-se três modelos de políticas sociais, sendo um modelo


institucional-redistributivo que concebe o sistema de bem-estar como elemento
importante e constitutivo das sociedades contemporâneas, voltado para a produção e
distribuição de bens e serviços sociais extra mercado, os quais são garantidos a todos
os cidadãos universalmente cobertos e protegidos; o modelo residual, onde as
políticas sociais intervêm ex-post quando os canais naturais e tradicionais de
satisfação das necessidades, que são as famílias e os mercados, não estão em
condições de resolver determinadas exigências do indivíduo e o modelo meritocrático-
particularista que se fundamenta na premissa de que cada um deve estar em
condições de resolver suas próprias necessidades, em base a seu trabalho, à
performance profissional, à produtividade. Como exemplo, temos a antiga República
Federal Alemã. (Mendes, 1999).

Ainda dentro dessa análise, deve ser lembrado o caos reinante na Saúde dos EUA,
neste ano de 2009 e a luta do novo presidente em tentar viabilizar um plano de saúde

186
Revista Radis - número 69 – maio/08.
187
Há cursos médicos que, em seu currículo de disciplinas, dão duas horas de aulas sobre tuberculose. (Fonte: Radis
– 69 – maio/2008).

80
que seja, próximo da Universalidade de Direitos, algo assemelhado ao que temos no
Brasil. Todos esses dados nos leva a questionar no Brasil qual é a mais adequada
situação.

O processo de unificação da saúde pública e a criação do SUS

Se considerarmos que o volume de recursos financeiros dos IAPs era grande, tanto
em dinheiro como em títulos públicos, pois milhões de trabalhadores contribuíam
mensalmente, e observando as diferenças entre os benefícios oferecidos às
categorias profissionais, o governo começou a pensar na possibilidade de unificar
esses institutos. Nessa época, ainda o assunto de saúde privada ou planos privados
de assistência à saúde era incipiente.

Com o golpe militar de 1964, a idéia de unificação já era latente, pois os institutos
estavam com muita força política. Em 1967, o governo militar resolveu, então, criar o
INPS - Instituto Nacional da Previdência Social, unificando todos os institutos. Essa
centralização e o grande volume de recursos financeiros levaram à aplicação desses
valores vultosos tanto em empreendimentos já existentes, como na Cia. Hidrelétrica do
Vale de São Francisco ou em novos, como a Siderúrgica Nacional, a Petrobrás, parte
da construção de Itaipu e até a construção de Brasília188. Mas essa unificação trouxe
muitos problemas. A máquina do Estado cresceu, assim como a burocratização.
Surgiram os famigerados favores políticos, os cabides de empregos e esse
mecanismo fragmentado de poder criou uma atividade política exacerbada189.

O processo de industrialização acelerada que o Brasil viveu a partir da década de 50


determinou um deslocamento do pólo dinâmico da economia para os centros urbanos
e gerou uma massa operária que deveria ser atendida pelos serviços de saúde. A
partir desse período passa a configurar-se o denominado modelo médico-assistencial-
privatista, que vigorará hegemônico de meados dos anos 60 até meados dos anos 80
(Luz, 1979).

Em vista da grande máquina criada pela unificação dos institutos, surgiu, então, um
novo perfil assistencialista para a saúde dos brasileiros, e para isso era necessário
trazer os serviços privados para cumprir os objetivos de melhor atendimento à
população. Tem início a utilização de serviços de terceiros para atender a essa
gigantesca máquina de saúde e pensões. Clínicas, médicos, laboratórios e hospitais
foram sendo credenciados para prestar serviços ao governo.

Essa mentalidade assistencialista estendeu-se a outros benefícios, sendo criados em


1967, o salário-família e, posteriormente, o salário maternidade. Também as
empregadas domésticas e os autônomos passaram a poder utilizar o INPS para a
saúde e a aposentadoria, desde que fossem contribuintes, isso tudo a partir de 1972.

A declaração bombástica de que não havia mais recursos foi feita ainda na década de 70 –
pelo SINPAS - e advertia que haveria muitos problemas, pois o INPS e demais órgãos
estavam quebrados e o rombo financeiro já existia há anos. Havia se passado uma década e

188
http://www.apape.org.br/fs290703.htm - acessado em 20/05/2005
189
http://www.dhnet.org.br/direitos/sos/assist/acpromotor.html - acessado em 14/04/2004

81
era previsível a necessidade de unificar a saúde pública de forma diferenciada. Novamente, era
preciso mudar. O que fazer então para cobrir o imenso déficit? Duas soluções foram discutidas:
aumentar as receitas ou diminuir as despesas. Houve então o aumento das alíquotas de
contribuição conforme já comentado.

Empregadores e empregados passaram a pagar mais e houve uma emissão de


ORTNs - Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - compulsoriamente
adquiridas pelos bancos para cobrir o caixa do governo relativamente a despesas de
assistência médica e pensões. Podemos observar então que, compulsoriamente ou
não, as mudanças e inovações sempre aconteciam. Ao mesmo tempo, foram criados o
F.A.S. - Fundo de Assistência Social - e o FINSOCIAL. Novamente, há o
compartilhamento, compulsório, entre o público e o privado.

Adaptadas às condições da época e empregando técnicas modernas de administração


hospitalar, graças, ainda, à obrigação da aplicação de seus eventuais resultados
positivos na própria instituição - para o aperfeiçoamento e melhoria da qualidade dos
serviços que presta à sociedade -, representam a grande opção que o Governo tem
para consolidar a implantação do Sistema Único de Saúde em todo o território
brasileiro.190

Segundo Amorim, (2008), dados da Organização Mundial de Saúde mostram que o


Brasil está entre os dez países do continente americano com maiores gastos em
saúde. Desse total, 45% foram oriundos de fontes públicas e os outros 55% de fontes
privadas.

Próximo à década de 80, o governo resolveu fazer uma grande extensão da


assistência médica, ou da saúde para toda a população e, de acordo com a
Constituição de 1988, que já previa a unificação da previdência à saúde, foi criado o
SUDS, Sistema Unificado e Descentralizado da Saúde, posteriormente denominado
apenas SUS - Sistema Único de Saúde, como o conhecemos até nos dias atuais.

Em 1986 realizou-se em Brasília a VIII Conferência Nacional de Saúde, cujo principal


objetivo foi o da Reforma Sanitária. No ano seguinte surge o SUDS - Sistema
Unificado Descentralizado de Saúde, que recebeu as unidades do INAMPS que era
mantido através de convênios firmados entre União, entre os Estados e Municípios e
se defrontou com sérios problemas políticos.

No movimento da crise financeira da Previdência social, manifesta-se mais fortemente


como resultado da política econômica recessiva imposta ao País no período de 1981-
82. Pinotti (1986), já dizia que dinheiro na crise da década de 80 na saúde existia e
sempre existiu. A distorção estava na sua fragmentação, a começar pela coexistência
pouco lógica de dois Ministérios – o da Saúde e o da Previdência Social – para cuidar
da mesma coisa. Essa crise leva à identificação da assistência médica – o lócus das
despesas compressíveis – como um dos focos geradores dos problemas financeiros
da Previdência Social e acirra o fracionamento dos diferentes interesses no interior da
arena política da saúde.

190
http://cmb.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=16&Itemid=30&limit=1&limitstart=2

82
É necessário que se mencione, pela importância que viria a adquirir posteriormente na
modelagem do projeto neoliberal, as posições diferenciadas da Federação Brasileira
de Hospitais, acuada pelas denúncias de fraudes, e a Associação Brasileira de
Medicina de Grupo que procurava colocar-se como alternativa de custo zero para a
crise da atenção médica. Ou seja, começava a delinear-se um processo de mudança
de hegemonia no setor privado pelo confronto entre um setor Estado-dependente e
outro mais dinâmico e que não mantinha relações diretas com a Previdência Social.

Era necessário um órgão para regular todo esse aparato até 1981 e foi criado em 2 de
setembro de 1981, pelo Decreto 86.329 o Conselho Consultivo da Administração de
Saúde Previdenciária (CONASP), composto por notáveis da medicina, representantes
de vários ministérios, de trabalhadores, do setor patronal e dos prestadores privados
de serviços, com o objetivo de reorganizar a assistência médica no país, reduzindo
seus custos e controlando seus gastos. 191

Esse órgão inicia então com uma série de medidas de curto prazo e de caráter
emergencial, visando a redução de gastos, especialmente em atenção hospitalar.
Houve concentração da normatização no INAMPS, saindo do Ministério da Saúde tais
regulações. É aí que se constata a importância desse órgão na reversão gradual do
modelo médico assistencial. O plano do CONASP tinha, na época, apoio no
movimento sanitário, na medicina liberal e na Abramge e grande oposição, obviamente
na FBH – Federação Brasileira de Hospitais. Iniciam-se então os grandes encontros
nacionais de Secretários Municipais de Saúde em 1982 o primeiro e o segundo em
São José dos Campos, o terceiro em Montes Claros, e em 1987, o quarto em
Londrina.

É no período de 1985 a 1987 com a proposta institucional da Nova República, que


parte considerável de atores políticos do Movimento de Reforma Sanitária tem acesso
ao aparelho do Estado. Foi nesse momento que MPAS/Inamps passou a ser um
grande alavancador da política de descentralização e desconcentração das ações de
saúde. Há um aprofundamento da estratégia das Ações Integradas de Saúde – AIS –
e em 1987, após a VIII Conferência Nacional de Saúde (1986), a sua transformação
em Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde – SUDS – em 20 de junho de 1987.
(Fleury – 1991). Nesse período foi criado também o Conasems – Conselho Nacional
de Secretários Municipais de Saúde, (10 de julho de 1987) que se torna a Plenária das
entidades de Saúde no Brasil.

A Constituição brasileira de 1988 criou o conceito de Seguridade Social, composto por


um tripé: Saúde, Previdência e Assistência Social. A promulgação da Carta Magna em
seu artigo 196 foi a pedra que faltava para a criação do SUS. Na saúde foi instituído o
Sistema Único de Saúde. Criaram-se as bases legais para garantir saúde como direito
de cidadania e dever do Estado.

Com a Seguridade Social estaria garantida a universalidade dos cidadãos às ações e


aos serviços de saúde. Diferenças significativas demarcaram o SUS do sistema
anterior. Uma delas é a garantia da existência de um sistema articulado em todas as

191
Apud – Andrade – pág. 25.

83
esferas do governo. União, Estados e Municípios. Outra mudança significativa foi a
introdução de princípios doutrinários, em que se destaca o princípio da universalidade,
rompendo radicalmente com o sistema anterior, excludente, que dava acesso ao
atendimento só aos contribuintes do sistema.

O princípio da integralidade foge da lógica de ter todos os serviços funcionando com


base na assistência médica individual-curativa, uma prática introduzida pelo antigo
INAMPS. É importante notar que a Lei do Sistema Nacional de Saúde de 1975, definia
como atribuições do Ministério da Saúde a assistência coletiva e do Ministério da
Previdência Social as ações de caráter individual. Com o surgimento do SUS, todas as
atividades consideradas de saúde coletiva e individual são unificadas no Ministério da
Saúde, ficando o Ministério da Previdência Social apenas com as atividades de
Previdência e Assistência Social, (Andrade, 2001).

De 1988 até hoje, vários processos foram estabelecidos com a finalidade de


operacionalizar a adequação da máquina pública da União, dos Estados e dos
Municípios para implantação do SUS. 192

O SUS foi regulamentado em 1990, em decorrência e necessidade de se dar


materialidade a Constituição de 1988. As leis foram 8080 e 8142 definindo o Direito
Constitucional de cidadania em relação também à saúde e o dever do Estado de
fornecê-la de alguma forma. O processo envolveu todas as esferas de poder, desde o
Municipal, Estadual e Federal. Houve a extinção, já comentada do Inamps.

Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, o então chamado Movimento


Sanitário passou a estabelecer como prioridade a regulamentação do Sistema Único
de Saúde no âmbito da União. 193O grande embate colocado pelas Leis 8080 de 19 de
setembro de 1990 e 8.142 de 28 de dezembro de 1990 passou a constituir a Lei
Orgânica da Saúde – LOS. São Leis infraconstitucionais que disciplinam o
cumprimento do mandamento constitucional da proteção e da defesa da saúde.
(Andrade, 2001).

A descentralização do SUS

Até a sua regulamentação os serviços de saúde à população em geral era


extremamente – e de forma desordenada – fragmentado e quem tinha maior poder na
saúde era o governo federal.

192
Ao tratar do SUS, a Constituição enumera, em seu artigo 200, as seguintes atribuições: controlar e fiscalizar
procedimentos, produtos e substâncias de interesse para saúde e participar da produção de medicamentos,
equipamentos imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos; executar as ações de vigilância sanitária e
epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador; ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde;
participar da formulação da política e da execução das ações de saneamento básico; incrementar em sua área de
atuação o desenvolvimento científico e tecnológico; fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de teor
nutricional, bem como bebidas e águas para consumo humano; participar do controle e fiscalização da produção,
transporte, guarda e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos; colaborar na proteção do
meio ambiente, nele compreendido o trabalho. Os serviços de assistência á saúde, a cargo do SUS, abrangem toda a
área médica, ambulatorial e hospitalar, odontológica e os serviços auxiliares de apoio a diagnóstico e tratamento,
prestados segundo as necessidades da população. A descentralização da prestação dos serviços é outro marco na
forma da prestação pública da assistência à saúde.
193
(Apud Andrade – Rodrigues Neto, 1991 – pág. 29).

84
O Brasil gastou em 2007 o valor total de 219 bilhões de reais em Saúde pública e
Saúde Privada. A divisão é de 56,8% pelo setor público e 43,2% pelo setor privado.
Isso quer dizer que, os gastos médios anuais por pessoa em planos privados ficou em
torno de R$ 1428,00 reais e no SUS em torno de R$ 675,00194

Amorim, (2008), afirma que havia contraposições à descentralização e não se


limitavam ao plano interno e ao passado; o relatório Hospital Performance in Brazil,
The Search for Excellence, de 2008, - vinte anos depois da Constituição de 1988 -
patrocinado pelo Banco Mundial, critica o modelo descentralizado do SUS, sobretudo
a autonomia – considerada excessiva – dos municípios, apontando-a, entre outras,
como uma das causas da ineficiência do sistema de saúde brasileiro. 195 (Amorim –
2008).

Embora não haja consenso, Júlio de Moura (1889), afirma que todo esse aparato
desperdiçou recursos e ações em duplicidade e triplicidade. Os Municípios cuidavam
de calamidades, urgências e os Estados eram responsabilizados por grandes ações
como vacinação, imunizações, vigilância a epidemias e algumas doenças específicas
eram preocupantes, como por exemplo, a tuberculose. 196

As ações foram se alterando após a ativação do SUS e o fato de que a


descentralização esteja sendo discutida no espaço institucional não quer, de nenhum
modo, deixar entender que ela se exclui dos dois outros espaços de transformação: o
jurídico-legal e o operativo.

Ao contrário, neles, também, manifesta-se adquirindo, em cada qual, uma conotação


própria. No espaço institucional, sua dimensão mais marcante irá expressar-se no
processo de municipalização da saúde, contudo, a municipalização – na perspectiva
da discussão que se fez sobre a descentralização – não deve buscar uma
autonomização, o que leva, por consequência, ao qualificá-la, concomitantemente,
identificar novos papéis para as instâncias federativas de nível estadual e municipal.

A opção aqui colocada, pela descentralização, não pode ser exercitada num país
federativo, grande e complexo, separadamente da municipalização. Isso se justifica,
pelas razões, de que a democracia exige obediência às leis, e a Constituição Federal
diz, no seu art. 30, item VII, que compete aos municípios, com a cooperação técnica e
financeira da União e dos estados, prestar serviços de atendimento à saúde da
população; porque os cidadãos nascem, crescem, vivem, adoecem e morrem no
município; porque é no espaço social, definido pelo município que a autoridade

194
Levantamentos efetuados pela Revista Exame em 2009 – revista de Nov\2009\pág.174
195
Apud – Amorim, Maria Cristina Sanches – pág. 185
196
A tuberculose ainda é uma doença negligenciada. “Tratando-se de uma enfermidade que assola o Brasil, com a
teimosia inexorável de uma endemia que não tem paradeiro, há quem afirme que a situação de tal enfermidade
encontra-se na mesma lamentável contingência dos nossos antepassados, lutando tanto ou mais do que eles por um
lado com a indiferença pública, por outro, com a ineficácia ou mesmo ausência dos meios aconselhados para preveni-
la ou debelá-la”. (Palavras em discurso do médico Júlio de Moura proferido no 2.º Congresso Brasileiro de Medicina e
Cirurgia – em 1889. (Recuperação pela pesquisadora Dilene Raimundo do Nascimento) em: “As pestes do século XX
– Tuberculose e Aids no Brasil, uma história comparada”, revela que a preocupação com a doença, infelizmente, não é
recente. Mais de 100 anos depois, mesmo com tratamento de comprovada eficácia, a tuberculose é reconhecida como
emergência global pela OMS, desde 1993, por ser a maior causa de morte de adultos por doença infecciosa. Ela
integra o rol das ‘doenças negligenciadas’, ainda que um terço da população mundial – cerca de 2 bilhões de pessoas
– esteja infectado pelo bacilo de Koch, seu agente causador, o que representa 100 milhões de casos registrados por
ano em todo o planeta. (Radis – maio/2008 – pág. 69).

85
sanitária tem endereço certo e sabido e outros motivos que não são necessários citá-
lo um a um. (Mendes, 1999).

O SUS detém o controle atualmente de algo em torno de 60 mil unidades de saúde


para atendimento ambulatorial espalhadas pelo Brasil e 6.500 hospitais públicos,
privados contratados e privados filantrópicos197. (Negri, 2003). O sistema público de
saúde foi responsável, em 2003, por mais de 12 milhões de internações hospitalares e
por quantidade superior a isso de atendimentos ambulatoriais envolvendo milhares de
profissionais 198.

Os números são grandes, mas na medida em que se considera a destinação dos


recursos para a Saúde em comparações com o pagamento da dívida pública
brasileira, tanto a interna quanto a externa, percebe-se que se trata de uma corrida
onde o pagamento de juros para os órgãos internacionais torna-se quase uma ditadura
financeira.

Aciole (2006) ainda observa que não se vê uma luz de mudanças na medida em que a
Reforma tributária nem saiu de discussões no Congresso. Há boas idéias,
simplificação de todo o bojo tributário, o CVA – Contribuição sobre Valor Adicionado,
substituição de outros impostos para promover melhor distribuição, mas as forças
contrárias ainda são muito conservadoras.

Desde a sua criação, o SUS199 enfrenta críticas contínuas quanto à qualidade,


insuficiência e iniqüidade da atenção prestada. Problemas existem muitos, de ordem
financeira e, principalmente, gerencial. As soluções desses problemas são desafios
que têm sido enfrentados sob alguns focos: estabilização do financiamento, ampliação
da descentralização, mudança de modelo assistencial, redução das desigualdades e
ampliação da atividade reguladora. 200 Ainda há muito por fazer.

O financiamento da saúde e seus aspectos políticos e gerenciais


Fontes / fundos e procedimentos

O acesso e o domínio da informação sobre o orçamento e os gastos na assistência à


Saúde são fundamentais, para garantir a consolidação de seu financiamento. Os
recursos orçamentários garantem a implantação e custeio de programas, serviços,
benefícios e projetos contidos nos planos municipais, estaduais, federal e nacional de
assistência social. As perguntas são muitas e poderão ser respondidas. O
financiamento para a assistência social tem sido suficiente para o atendimento das
necessidades sociais da população que demanda esta política?

A interiorização da assistência à saúde caminha de modo significativo, nos três

197
Negri, 2003, p. 31.
198
Assistência de média e alta complexidade no SUS - Secretaria da Assistência à Saúde - Brasília - Min. da Saúde -
500 páginas - ISBN-85-334-0494-8 - Anuários organizados por João Gabardo dos Reis e outros. (2003).
199
Os princípios da Reforma Constitucional que criou o SUS, são: descentralização (trabalhos operacionais pelos
Municípios), democratização – participação do cidadão nos serviços prestados; integralidade e sistema misto de
integração entre a área pública com a atuação privada não lucrativa e lucrativa. (Fonte: construção do SUS – 2006) –
Ministério da Saúde.
200
Negri, 2003 - p. 3

86
estágios descentralizados, Federal, Estadual e Municipal. Quatrocentos e noventa e
quatro municípios tiveram coragem política de assumir, de forma integral, a gestão dos
serviços de saúde em sua área geográfica, enquanto outros 4.849 estão no estágio
intermediário de integração com o sistema. Os resultados são de 1997, mas são
interessantes: mais de um bilhão de procedimentos no ano, entre os quais 300
milhões de consultas médicas, 50 milhões de vacinações, 12 milhões de internações,
2,8 milhões de partos, 3,8 milhões de hemodiálises. O calcanhar de Aquiles do
desenvolvimento do SUS ainda é a insuficiência e inconstância de seus orçamentos. O
Brasil gasta pouco com saúde ainda. (Gouveia, 2000).

Sabe-se já então que a Constituição brasileira de 1988 criou o conceito de seguridade,


criado pelo tripé Saúde, Previdência e Assistência Social. Essas são as bases legais
para garantir saúde como direito de cidadania e dever do Estado. Está garantida a
universalidade dos cidadãos às ações e aos serviços de saúde.

As diferenças entre o que existia e o que existe atualmente são bastante significativas.
Uma delas é a garantia da existência de um sistema articulado em todas as esferas do
governo. Outra é a construção de suas bases em princípios norteadores únicos, pois,
anteriormente, cada esfera de governo tinha a sua política e muitas vezes, dentro de
um mesmo nível, instituições desenvolviam políticas de saúde desarticuladas.

Outra mudança foi a introdução de princípios doutrinários, em que se destaca o


princípio da universalidade, rompendo radicalmente com o sistema anterior,
excludente, que dava acesso somente aos contribuintes ao sistema. De 1988 até hoje,
vários processos foram estabelecidos com a finalidade de operacionalizar a
adequação da máquina pública da União, dos Estados e Municípios para implantação
do SUS.

Nesta perspectiva destaca-se a Lei Orgânica da Saúde que é composta das Leis
8.080/90 e 8.142/90. Em relação ao financiamento do setor, o artigo 35 da Lei 8.080
de 19/09/1990, estabelece critérios claros para definição de uma política alocativa. A
edição das Normas Operacionais Básicas – as NOB’s vem sendo utilizadas como
mecanismo regulador do processo de estadualização e municipalização das ações e
serviços de saúde.

Uma dessas adequações foi como pagar os Estados e qual o critério a ser adotado.
Apesar de ser o critério populacional considerado melhor que o anterior, este ponto na
época provocou bastante polêmica, especialmente entre os dirigentes dos Estados
que historicamente produziam maior quantidade de serviços. Apesar de estarem
dadas as condições jurídicas para a mudança da lógica de ter um governo que compra
– no caso a União – e governos que vendem serviços – os Estados e Municípios – por
meio da Lei Orgânica da Saúde, mais precisamente do artigo 35 da Lei 8.080/90, este
dilema relacionado ao financiamento das atividades hospitalares iniciou-se com a
NOB-01/91 e permanecerá presente nas Normas Operacionais subseqüentes. O que
essa norma determina é que, diferente do que existia como convênio, apenas,
estabeleceu-se um teto, que é a Unidade de Cobertura Ambulatorial (UCA), valor que
multiplicado pela população produzia o valor máximo – chamado de teto – de cada
Estado para implementação de ações ambulatoriais.

87
A trajetória de financiamento das ações e serviços de saúde evoluiu do pagamento por
procedimentos aos prestadores de serviços, característica da década de 70, passando
na década de 80 para as Ações Integradas de Saúde (AIS) e em 1987, para o Sistema
Único de Saúde e Descentralização da Saúde (SUDS). Mecanismos reguladores
então foram criados para estabelecer critérios e regulações. Todos esses aspectos
deram origem as Normas Operacionais Básicas. São Parte de um forte processo
político de pactuação entre gestores. As normas inicialmente criadas editadas pelo
Ministério da Saúde foram respectivamente: em janeiro de 1991, a NOB-SUS-01/91,
em fevereiro de 1991, a NOB-SUS, 01/92, em maio de 1993, a NOB-SUS-01/93 e em
agosto de 1996, a NOB-SUS-01/96. As NOB’s regularam então os Controles das
Autorizações de Internações Hospitalares.

Tabela I

Quantidade de AIH’s por Estados definidas pela Portaria 19 de 08/01/91 do MS

Acre 2.898 Paraíba 28.503


Alagoas 18.916 Pernambuco 57.024
Amazonas 14 759 Piauí 20.999
Amapá 1.783 Paraná 77.846
Bahia 81.166 Rondônia 7.500
Ceará 49.999 Rio de Janeiro 117.181
Distrito Federal 12.023 Roraima 906
Espírito Santo 19.764 Rio Grande do Norte 16.340
Goiás 35.737 Rio Grande do Sul 78.749
Maranhão 39.561 Sergipe 11.370
Minas Gerais 140.456 Santa Catarina 38.346
Mato Grosso 17.656 São Paulo 279.301
Mato Gr do Sul 15.677 Tocantins 9.843
Pará 35.945
Fonte: Andrade – pág. 35

A NOB-SUS-01/91, constituiu-se de um conjunto de Portarias (15,16, 17, 19, e 20) da


SNAS/MS, de 8 de janeiro de 1991 e da Resolução 158, anexo 2, que aprovou a NOB-
01/91 do Inamps, publicadas pelo Diário Oficial da União em 10/01/1991. Destacam-se
a criação do SIH (SUS) – Sistema de Informação Hospitalar como forma de
pagamento a prestadores de serviços hospitalares e ambulatoriais. Definiram-se ainda
nesta NOB as quantidades de AIH – Autorização de Internação Hospitalar e UCA –
Unidade de cobertura ambulatorial – a serem distribuídas mensalmente a cada
Estado. Acima a tabela. Ela sofreu reformulações com valores ajustados no tempo. As
AIH’s, foram alocadas por Estado pelo critério populacional.

A NOB-SUS 01/92, segundo Andrade, (2001), pode ser considerada um avanço em


relação à NOB-SUS-01/91, pois nela já aparece o reflexo do movimento municipalista.

88
Pode ser considerada como precursora de um documento denominado: Ousadia de
Cumprir e Fazer cumprir a Lei que foi publicada pelo Ministério da Saúde. Ela é
composta de um conjunto de portarias e que em última análise procurava assegurar o
poder do Inamps dentro do Ministério da Saúde no processo de Reforma Sanitária.
(Santos, 1991).

Do ponto de vista da gestão e do planejamento a NOB-SUS 01/92, avançou


procurando definir o conceito de integralidade quando tenta explicar as definições de
promoção, proteção e recuperação da saúde. Ela também propôs dois mecanismos de
estímulo à municipalização e a estadualização: criou o FEM – Fator de Estímulo à
Municipalização – e o FEGE – Fator de Estímulo à Gestão Estadual. Isso até hoje não
saiu da teoria.

Na IX Conferência Nacional de Saúde que aconteceu em Brasília, de 9 a 14 de agosto


de 1992, o tema central foi: “Saúde: municipalização é o caminho”. Com a destituição
do governo federal, impeachment do Collor, em final de 1992, cria-se a expectativa de
avanço democrático. Assume então a gestão da saúde um grupo técnico/político do
Movimento Sanitário vinculado á vertente de descentralização/municipalização. É
neste momento que é publicada a Norma Operacional Básica SUS-01/93, que se
expressa no documento a Ousadia de Cumprir e fazer cumprir a Lei, de 24 de maio de
1993. (Andrade, 2001). Com o fim de assegurar a descentralização foi criado um
grupo, no início de 1993, o GED – Grupo Especial para a Descentralização.

A situação de habilitação dos municípios ao final de 1997, de acordo com a NOB-SUS-


01/93, pode ser observada em tabela do Banco de Dados de Habilitações/SPSA/MS.
Pode-se constatar que, dos quase 5.000 municípios brasileiros, apenas 3.127 estavam
enquadrados em algum tipo de gestão. Ressalte-se que destes, 2.367, achavam-se
em gestão incipiente, 616 na parcial e somente 144 em gestão semi-plena. Esse
cenário gerou a NOB-SUS 01/96. Essa nova NOB teve como princípio básico
estabelecer a responsabilidade do município sobre o cidadão.

Ela definiu o município em três áreas: o da Assistência, o das Intervenções ambientais


e o das Políticas externas do setor de Saúde. De certa forma, foi introduzida a idéia do
SUS Municipal. Há ainda o PAB – Piso Assistencial Básico de acordo com um per
capita nacional pela população de cada município. Essa nova NOB-01/96, foi a
primeira Norma Operacional a fazer referência ao reembolso das despesas realizadas
em função de atendimentos prestados por unidades públicas a beneficiários de planos
privados de saúde e isso é muito interessante pois a legislação específica da atividade
privada dos Planos de Saúde e Convênios somente seria aprovada e fortalecida pela
Lei 9656 em 1998, ou seja, dois anos depois cuja regulação foi destinada a uma
agência específica para o assunto que foi a ANS – Agência Nacional de Saúde
Suplementar.

Foi aquela NOB – 01/96, que estabeleceu também os tetos financeiros abrangendo
todos os recursos que fazem parte do processo saúde/doença. As regulações aos
Programas de Saúde da Família (PSF) e de Agentes Comunitários de Saúde (Pacs)
estão integrados e com acréscimos sempre que estiverem atuando – os municípios
integradamente. (Andrade, 2001).

89
Quanto as fontes de financiamento, a Constituição Federal de 1988, estabelece em
seu artigo 195, que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, com
recursos do orçamento da União, Estados, DF e municípios e das seguintes
contribuições sociais: dos empregadores incidente sobre folha de salários, o
faturamento e o lucro; dos Trabalhadores; Sobre a receita das loterias. Cria a
Contribuição Sobre o Lucro Líquido das Pessoas Jurídicas – CSLL – Lei 7.698/88;
COFINS - Contribuição Social para o financiamento da Seguridade: contribuição
federal, sobre a receita das empresas; Contribuição dobre a Receita de Concursos de
Prognósticos (Decreto lei 204/67 – FAS lei 6.168/74) ;Parte do PIS e Outras receitas
da União, dos Estados e municípios.

Segundo Aciole201 (2006) a quase totalidade dos recursos destinados à Saúde é


originária das chamadas Contribuições Sociais. São elas: Contribuição para o
financiamento da Seguridade Social, conhecido como COFINS cujo percentual incide
sobre o faturamento bruto das empresas, a Contribuição sobre o Lucro Líquido das
empresas, também chamado de CSLL, a já falecida CPMF até 2007 a qual foi
agregada em 94, suspensa em 95 e 96, retomada em 97 e extinta.

Há ainda a Contribuição dos empregados e dos empregadores para a Seguridade


Social, cujo percentual incide sobre a folha de pagamentos. Há ainda recursos do
orçamento do governo federal e outras arrecadações em cada nível de poder político.

Os valores dos recursos são notáveis, todavia, insuficientes para os problemas que o
Brasil enfrenta. Em 2002, o Ministério da Saúde, por exemplo, transferiu valores
altíssimos (Radis, 2008), para Estados e Municípios – onde quase 63% se deveram a
gastos com assistência médica hospitalar e ambulatorial - e o restante em programas
de atenção básica, ações coletivas ou assistência médica de baixo custo e programas
especiais como DST/Aids,202 Exames de próstata, Cataratas, Deficiência auditiva e
outras como Dengue.203

Resumindo para um entendimento básico, pode-se afirmar que a Saúde do modelo


brasileiro tem pontos positivos e negativos. Uma agenda deve ser sempre discutida
não esquecendo que Saúde existe pública e existe saúde privada.

201
Giovanni G. Aciole – pág. 249
202
O Globo em 30/03/08, publicou a reportagem “Aids: sem medo da morte, jovens se descuidam”, apontando o
crescimento do número de casos entre homossexuais de 13 a 24 anos. Segundo o Ministério da Saúde, que lançou
várias campanhas de conscientização o percentual de jovens gays contaminados pelo HIV cresceu 26% em 1996 para
41% dos 32 mil novos casos registrados em 2006. Entrevistados algumas pessoas de sites gays se não tinha medo,
respondeu: “hoje em dia tem o coquetel de graça. Ninguém morre de Aids no Brasil, não”. A verdade é outra. Entre
1991 e 2007, 2.916 pessoas com mais de 60 anos contraíram o HIV. Os medicamentos para a disfunção erétil têm
encorajado a população idosa a ter mais relações sexuais, muitas vezes, desprotegidas. O número de mortes está
estabilizado em torno de 11 mil anuais desde 1998. Mas a Aids permanece uma das maiores causas de morte por
doença no Brasil. Em 2006 o índice foi de 17,5 óbitos para cada 100 mil habitantes. Foram 474 mil casos notificados
desde 1980, mas a estimativa de contaminados chega a 600 mil. O infectologista David Ulip, diz acreditar que o
fenômeno é fruto da banalização da epidemia. Ele diz por exemplo que está desanimado. A população homossexual
aceitou bem a prevenção no primeiro momento, talvez tenha sido a que mais aderiu, mas, neste momento está
baixando a guarda. (Fonte: Radis, número 69 – maio/2008).
203
No meio da disputa entre governos, municipal, estadual e federal, a população do Rio de Janeiro enfrentou em
2008, desde o mês de janeiro, grave epidemia de Dengue. Somente nos quatro primeiros meses , foram notificados
93.498 casos, sendo 16.573 em janeiro, 22.355 em fevereiro, 46.780 em março e 7.790 em abril (até o dia 16/04/08).
Essa epidemia está matando cinco vezes mais que a anterior de 2002. A epidemia só aconteceu em função da
omissão do poder público, critica o presidente do sindicato, o médico Jorge Darze. Todas as esferas falharam, diz ele.
Os números de 2011 mostram nova iminência da epidemia. (Radis, número 69 – maio/08).

90
Há imperfeições de mercado e regulação. Há custos da própria regulação. Esses
custos podem impactar de forma positiva ou negativa. Não se deve esquecer em
nenhum momento que hoje existe o Direito da pessoa e há um dever do Estado,
constante do artigo 196 da CF. Que existe um Sistema Único de Saúde, no artigo 198
e que há também a permissão de que se execute a Saúde privada, na forma do artigo
199 e que há ainda os princípios do SUS, que são universalidade, integralidade e
equidade.

Esses direitos, geram, segundo o Instituto de Estudos de Saúde Suplementar


(IESS)(2009), um Estado paternalista e ignora os deveres do indivíduo para com a sua
saúde. O financiamento necessário para toda essa gama de direitos envolve os
tributos da União, as contribuições à Seguridade, tais como a COFINS, CSLL, CPMF
(extinta) e por tributos dos Estados e do Distrito Federal na base de 12% e Municipais,
15%.

Há ainda a Filantropia que deve ser considerada em todo esse Sistema complexo e o
Sistema Privado que tem pagamentos diretos dos usuários aos Planos e seguros
saúde. 204 Vejamos mais detalhadamente.

Receitas gerais dos municípios

Próprias estabelecidas pela Constituição

IPTU, ISS. ITBI ; Taxas – localização estabelecimentos, anúncios ; Contribuições de


melhorias – pavimentação ruas ; IR na fonte - de funcionários públicos e prestações
de serviços aos municípios - ; Operações de crédito – IOF – dinheiro internacional ou
BB CEF BNDES.

Todo esse aparato de recursos obedece a uma distribuição, para capitais, interior,
conforme limites populacionais, necessidades, contingências e conseqüências.

204
- Fonte: IESS – Instituto de Estudos de Saúde Suplementar – 13/02/2009.

91
Gráfico 1

Transferências: FPM estabelecido constitucionalmente (cerca de 70% dos recursos


dos municípios PP e MP e do norte e nordeste: FPM e demais transferências).
Constituído de: 23,5% IPI / 23,5% IR / 50% do ITR arrecadado pela União ; Lei
Kandir – Estado repassa 25% para os municípios – 1996 desonerada exportação
ICMS produtos semi-elaborados e básicos. A União compensou os Estados que
deixaram de recolher. As regras nas transferências são as seguintes:

FPM Regra de distribuição: Capitais: 10% total rateio proporcional a população e


inversamente proporcional a renda per capita. Interior: 90%. Critério populacional com
limite inferior e superior.
Transferências vinculadas: Parte do salário-educação que vai para o Estado e ele
repassa para os municípios.

Transferências voluntárias: Entrega de recursos a outro ente, a título de cooperação,


auxílio ou assistência financeira, não decorrente de determinação constitucional ou
legal. Convênios, outros.

Receitas dos Estados: ICMS – representa cerca de 83% da arrecadação do Estado.


Transfere 25% e fica com 75% ; IPVA ; imposto de Transmissão Causa Mortis e
Doações ; Taxas ; Imposto de Renda.
Transferências da União: FPE: 21,5% do IPI ; 21,5% do IR - 10% do IPI exportação
para compensar as desonerações das exportações e mais recursos da Lei Kandir,

92
negociados ano a ano no Congresso Nacional.
Receitas do Estado para os municípios: 25% do ICMS. Regra para SP: 75% do que é
gerado de valor pelo município e 25% é decidido pela ALESP. Algo próximo a: 13%
população; 5% receita própria ; 1% questões bacias ; 80% pelo valor adicionado ;
Metade IPVA – carros licenciados no município ; 25% da lei Kandir e do IPI
exportação. Critério semelhante a ICMS.

Pactos pela saúde – Exemplo de 2006

Apresentação

O documento das Diretrizes do Pacto pela Saúde em 2006 – Consolidação do Sistema


Único de Saúde, publicado na Portaria/GM nº 399, de 22 de fevereiro de 2006,
contempla o Pacto firmado entre os gestores do SUS, em suas três dimensões: pela
Vida, em Defesa do SUS e de Gestão. 205

Esse Pacto apresenta mudanças significativas para a execução do SUS, dentre as


quais ressaltamos: a substituição do atual processo de habilitação pela adesão
solidária aos Termos de Compromisso de Gestão; a Regionalização solidária e
cooperativa como eixo estruturante do processo de Descentralização; a Integração
das várias formas de repasse dos recursos federais; e a Unificação dos vários pactos
hoje existentes. É o resultado de um intenso trabalho de discussão de cerca de dois
anos, envolvendo os técnicos e a direção das diversas áreas do Ministério da Saúde,
do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde – CONASEMS e do
Conselho Nacional de Secretários de Saúde – CONASS e foi aprovado na reunião da
Comissão Inter gestores Tripartite, de 26 de janeiro de 2006, e na reunião de 9 de
fevereiro de 2006, pelo Conselho Nacional de Saúde.

Esta publicação é o primeiro volume de uma série que detalhará diferentes dimensões
do Pacto, ajudando a qualificar o seu processo de implementação que considere as
diferentes realidades loco-regionais. Assim, a partir de agora, a implantação do Pacto
dependerá da adesão dos muitos atores que, em cada parte deste nosso imenso e
diverso País, constroem o cotidiano da Saúde Pública Brasileira.206

O Pacto pela Vida

Transcorridas quase duas décadas do processo de institucionalização do Sistema


Único de Saúde, a sua implantação e implementação evoluíram muito, especialmente
em relação aos processos de descentralização e municipalização das ações e
serviços de saúde. O processo de descentralização ampliou o contato do Sistema com
a realidade social, política e administrativa do país e com suas especificidades
regionais, tornando-se mais complexo e colocando os gestores à frente de desafios
que busquem superar a fragmentação das políticas e programas de saúde por meio da
organização de uma rede regionalizada e hierarquizada de ações e serviços e da
qualificação da gestão.207

205
Fonte: Ministério da Saúde.
206
Idem 196 -
207
Idem 197 -

93
Frente a esta necessidade, o Ministério da Saúde, o Conselho Nacional de Secretários
de Saúde (Conass) e o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde
(Conasems), pactuaram responsabilidades entre os três gestores do SUS, no campo
da gestão do Sistema e da atenção à saúde. O documento a seguir contempla o Pacto
firmado entre os três gestores do SUS a partir de uma unidade de princípios que,
guardando coerência com a diversidade operativa, respeita as diferenças loco-
regionais, agrega os pactos anteriormente existentes, reforça a organização das
regiões sanitárias instituindo mecanismos de co-gestão e planejamento regional,
fortalece os espaços e mecanismos de controle social, qualifica o acesso da
população à atenção integral à saúde, redefine os instrumentos de regulação,
programação e avaliação, valoriza a macro função de cooperação técnica entre os
gestores e propõe um financiamento tripartite que estimula critérios de eqüidade nas
transferências fundo a fundo. A implantação deste Pacto, nas suas três dimensões –
Pacto pela Vida, em Defesa do SUS e de Gestão –, possibilita a efetivação de acordos
entre as três esferas de gestão do SUS para a reforma de aspectos institucionais
vigentes, promovendo inovações nos processos e instrumentos de gestão que visam
alcançar maior efetividade do desempenho.208

Esse Pacto envolve uma série de Controles e Diretrizes e se inicia pelo Pacto pela
Vida, divididos em: Saúde do Idoso ; Controle do câncer do colo do útero e da mama;
Redução da mortalidade infantil e materna ; Fortalecimento da capacidade de resposta
às doenças emergentes e endemias, com ênfase na dengue; hanseníase; tuberculose;
malária e influenza ; Promoção da saúde, com ênfase na atividade física regular e
alimentação saudável ; Fortalecimento da Atenção Básica.209

O Pacto em Defesa do SUS e o Pacto de Gestão

Na sequência as Diretrizes a serem seguidas, as iniciativas e ações do SUS no âmbito


geral ; Diretrizes para a gestão e Descentralização ; Regionalização;Financiamento;
Planejamento ; Programação Pactuada e Integrada ; Regulação ; Participação e
Controle Social ; Gestão do Trabalho ; Educação na Saúde ; Responsabilidade
sanitária das instâncias gestoras do SUS ; Responsabilidades Gerais; Regionalização;
Planejamento e Programação; Regulação, Controle, Avaliação e Auditoria;
Participação e Controle Social; Gestão do Trabalho; Educação na Saúde, com todos
esses itens e monitoramento e articulação do SUS. 210

208
Idem 198 -
209
Idem 199 -
210
Idem 200 – Fonte: Transcrição: Pactos pela Saúde 2006.

94
CAPÍTULO 3

Saúde supletiva no Brasil: relações com a Saúde Pública.

Na saúde essa dualidade entre Público e Privado tem a ver também com as situações
coletivas e aquelas individualizadas. Planos de Saúde já foram considerados
benefícios muito distantes da condição financeira de grande parte da população
brasileira, porque é pago de forma individualizada, enquanto a Saúde Pública é de
todos – principalmente dos pobres – ou aqueles que não podem participar – pagando
um convênio ou grupo segurado de Saúde Privada. Porque então saúde pública e
saúde privada. Há diferenças?

A inflação foi um dos fatores para o grande desenvolvimento do mercado em seguros


e planos de saúde na década de 80 e 90. Seu crescimento desordenado, longe dos
olhos do governo, e suas conseqüências de caráter lesivo aos usuários foram os
maiores motivos que forçaram o governo, via Congresso, a aprovar a Lei 9656/98 para
disciplinar o setor, até então sem regulação e sem rumo definido.

Antes da lei 9656/98, era necessário apenas um médico portador de CRM para abrir
uma empresa de assistência médica. Não havia necessidade de reservas financeiras e
nem capital mínimo para garantia futura dos adquirentes e usuários. Assim, surgiram
as cooperativas de medicina, os planos administrados e as empresas que criavam sua
própria auto-gestão para dar assistência médica aos seus funcionários.

Porém, a saúde suplementar necessita ser muito criteriosa, pois cuida de dois
assuntos extremamente delicados: um é a saúde e o outro é a poupança das pessoas,
pois um plano de saúde familiar, vendido no passado e cujo contrato foi mal
intencionado em suas cláusulas, condições e exclusões, pode destruir anos e anos de
poupança amealhada e levar o usuário a um desastre financeiro. Por exemplo, uma
doença cardíaca não coberta pelo plano, mas sem que o usuário o soubesse, pode
fazer uma família perder seu patrimônio em meses.

Na década de 80 havia uma liberação geral para venda de planos de saúde. Milhares
de planos foram criados e milhares de empresas foram se desenvolvendo até final da
década. Com o passar de mais de uma década, percebeu-se que a atividade
precisava de regulação, pois as reclamações contra os planos de saúde aumentavam
de forma assustadora 211.

Contratos com letras minúsculas, cláusulas leoninas ou unilaterais, riscos não


cobertos e também não bem definidos nos contratos foram o estopim para que a
liberdade e a falta de credibilidade dos planos de saúde fosse comprometida junto à
população e aos governos. A essa altura, o judiciário recebia milhares de ações de
usuários descontentes e exigindo tutela.

O projeto de lei aprovado pela Câmara de deputados ao final de 1997 mostrou


claramente as dificuldades dessa regulamentação à posteriori, que teria de agir sobre
211
“Evolução e Desafios da Regulação do Setor de Saúde Suplementar - Série ANS-4 - Januário Montone - Diretor
Presidente da ANS - 2003 - RJ - ISBN-85-334-0730-0 - p. 12. p. 38

95
uma atividade que já atingia mais de 30 milhões de brasileiros profundamente
descontentes com os serviços recebidos de centenas de empresas dos mais diversos
tipos, sendo que pouco se sabia de fato a respeito da questão 212.

Jornais, rádios, televisões, em programas dos mais variados, traziam problemas


gerados pelos planos de saúde. Os contratos eram vendidos e assinados na aquisição
por pessoas de boa fé. Assim, antes da lei 9656/98, os titulares de planos de saúde só
saberiam quais as reais coberturas assistenciais nos momentos de utilização do plano
para diagnósticos e internações hospitalares, quando é grande a aflição e a
necessidade de atendimento, configurando-se em surpresas, na maior parte das
vezes, desagradáveis.

Os corretores desses planos de saúde, com o objetivo único de vendê-los, forneciam


informações contraditórias, e o usuário mudava de plano sempre que aquele outro
adquirido gerava problemas de cobertura. Processos judiciais de contenciosos
variados, de empresas e clientes acumulavam-se. Milhares de reclamações
amontoavam-se junto a delegacias e ao Ministério Público. Iniciou-se, então, um
processo instável, já que as pessoas não tinham segurança na aquisição de um plano
complementar de saúde.

Havia empresas que já estavam no ramo há vários anos, muitas das quais ligadas a
estruturas bancárias. Eram empresas conceituadas, todavia, apresentavam muitas
exclusões de riscos em seus contratos, o que levava o cliente em desespero com seu
plano a utilizar o SUS quando a enfermidade não era coberta pelo plano adquirido, em
muitos casos, há anos.

Quando não se utilizava o sistema público, a internação em um hospital particular


causava ao usuário grandes prejuízos de ordem financeira. Acrescente-se a isso as
muitas fases econômicas pelas quais o país passou, governos que não deram atenção
ao assunto, inflação de 0% a 80% ao mês na década de 80, levando o valor das
mensalidades a níveis absurdos, o que gerava discussões de toda ordem.

O ambiente e o clima em geral nos sistemas de saúde brasileiros tanto público como
privado foram, e ainda são, de muitas incertezas quanto ao que deverá acontecer em
um futuro breve. Singularmente, podemos defini-lo como um sistema muito jovem – se
comparado à Europa - e com muitas variações que deverão, com o devido tempo, ser
ajustadas à realidade.

A legislação do lado privado ainda é inacabada e está em permanente mudança,213


pois, inicialmente, toda a regulamentação foi desenvolvida e criada, aprovada pelo
Câmara e pelo Senado e imposta às empresas da atividade. Não havia mais tempo
para discussões. Os problemas se acumulavam no setor.214

212
Idem ref. anterior - página 12. (Montone, 2003).
213
Fonte: Ver site ANS – mudanças na legislação – só medidas provisórias foram mais de 45.
214
Uma poderosa energia transformadora abre novos caminhos para a nossa sociedade. Nessa onda está o drama,
mas também a possibilidade de outro desfecho. Está o nó e a faca. O grito é o desafio. A morte, mas também a vida.
No limite é que ocorrem os partos. Já passamos muitas vezes do limite. A vida está com pressa de nascer. (Herbert
José de Souza – Betinho em Gouveia, 2000).

96
É necessário algum esforço para entender essas inovações e adaptações, pois essa
regulação é apontada como o início das mudanças e devem considerar o que
aconteceu em um passado recente para absorver o aprendizado e em seguida, sugerir
algumas reformulações, pois a identidade da saúde brasileira é uma mistura de
capital, técnica/ científica e de Direito Social. Todavia, devido aos níveis de educação
de grande parte da população, aspectos religiosos e crenças interferem na saúde,
promovendo também um caráter místico na saúde.215

Sob a visão científica e de capacidade tecnológica, a identidade técnica é também


muito presente, pois contamos atualmente com instituições cujo apelo é a
competência de Hospitais como: Albert Eistein, Sírio Libanês e Incor - Instituto do
Coração, Hospital de Clínicas, Universidade de São Paulo, Unicamp, Ribeirão Preto,
Instituto Dante Pazanezzi.

Há também outra identidade, foco do presente estudo: a de negócio. De fato, a saúde


privada cresceu, chegando a 2.700 operadoras216 registradas e nem todas estavam
em atividade até 1999/2000. Os planos de assistência médica que foram oferecidos à
população são muito variados e estima-se que, em passado recente, atenderam,
aproximadamente, 35 milhões de usuários, gerando, com isso, uma identidade
comercial na saúde particular - suplementar - bastante fortalecida e quando de sua
regulação, em 1998, contava com perto de 30 milhões de usuários.

Resta, ainda um enorme contingente e há que se expor que o SUS tem mais de 140
milhões de pessoas dependendo de sua estrutura, gerando, com isso, de forma
compulsória, uma identidade muito forte de Direito social (benefício social). Podemos
verificar, portanto, que há uma grande mistura de identidades no Brasil no que tange à
saúde, o que acaba se refletindo no plano legal. Apesar dos descasos até final do
século XIX a saúde brasileira teve um processo dinâmico à favor.

A evolução do mercado de saúde privada ou suplementar no Brasil se dá a partir de


uma relação público privado no setor da saúde em que a demanda por serviços é
direcionada pelo Estado enquanto sua oferta é privada. Esse modelo de relação
público/privado perdura até o momento em que o Estado tem capacidade financeira
para a compra dos serviços produzidos pelo setor privado e até que este setor crie as
condições necessárias para se autonomizar com relação ao próprio Estado, através da
oferta direta de serviços para compradores privados, dando assim força e consistência
aos planos privados de saúde. Em vista dos inúmeros problemas na saúde pública,
tem início um nicho de negócio no ramo, levando ao surgimento dos primeiros planos
de saúde particulares.

A primeira empresa de medicina de grupo no Brasil, com as características de


empresa operadora como as atuais, foi a Policlínica Central, fundada em São Paulo na
215
De um lado parte da população ainda sofre influências místicas, tanto da Igreja Católica como de outras igrejas,
mais intensamente da Igreja Universal. Por um lado, há ainda a mistura de crenças, como candomblés, santos,
promessas para Nossa Senhora Aparecida, com milhares de romeiros viajando todos os anos até Aparecida do Norte,
cirurgiões não diplomados como José Arigó, médicos diplomados e espíritas, médiuns e mães de santo, que criaram
uma identidade mística muito forte na população.

216
Ver site - www.ans.gov.br

97
data de 1960 217. Nesse período, foi criado o convênio empresa, gerando um grande
impulso às atividades de prestação de serviços em saúde na época. 218

Outra iniciativa pioneira ocorreu em 1967, na cidade de Santos. Tratava-se da criação


da primeira cooperativa de serviços médicos e hospitalares - UNIMED – formada, em
sua maioria, por sócios médicos219. Atualmente, há discussões a respeito da formação
societária dessas cooperativas, pois o médico é sócio e, ao mesmo tempo, é o
atendente do usuário. São, portanto, interesses antagônicos. Todavia, foi uma
iniciativa pioneira e de mérito como embrião de saúde suplementar. Em seguida, em
1972, surge a primeira cooperativa odontológica, conhecida como UNIODONTO220.

Tudo isso acontecendo porque na esteira da criação do SINPAS – Lei 6.439/77 e da


Lei 6.229 deram início ao desenvolvimento de um subsistema, que se tornou
hegemônico na década de 80, o da atenção médica privatista. (Mendes, 1994). O
mesmo autor acrescenta que estruturalmente o modelo médico assistencial privatista
constitui-se de quatro subsistemas:

Um subsistema, de atenção médica supletiva, começava a delinear-se e a implantar-


se, aproveitando-se dos incentivos do convênio-empresa, é o subsistema de atenção
médica complementar que buscava atrair a mão-de-obra qualificada das grandes
empresas.

Seu principal interlocutor político era a Associação Brasileira de Medicina de Grupo -


(Abramge). Contudo, esse subsistema, que veio hegemonizar-se nos anos 80, não
chega a atingir uma massa significativa de beneficiários na década de 70, mas o
modelo médico-assistencial privatista teve como subsistema hegemônico o setor
privado contratado e conveniado como ator social mais significativo a FBH –
Federação Brasileira de Hospitais e como núcleo ideológico a burocracia
previdenciária, desde os anos 80. (Mendes – 1999)

A idéia de planos de saúde começou a ser concebida por pessoas físicas da atividade
empresarial, como auto-gestão e por clínicas que já operavam nas grandes cidades,
que viram, então, a possibilidade de oferecer serviços nas áreas de assistência
médica para as empresas e seus funcionários. Iniciava-se a saúde com a identidade
de negócio, impulsionada para o mercado como assistência à saúde. A região do ABC
também foi uma das pioneiras em empresas com essas características na década de
60/70.

Havia uma crise orgânica do Estado, exacerbada pelas desigualdades que vinham
desde a década de 70. O Estado que sustentou as elites nacionais até final de 70,
passa a ser, especialmente no final da década, o grande vilão, abrindo espaço a
propostas neoliberais que conduzam a um Estado mínimo. (Mendes, 1999). É a era
da re-engenharia, cortes de custos e espírito reducionista do Estado.

217
Cf. BAHIA, Ligia & Nunes, Roberto F.V. 2000, p. 10.
218
Convênio celebrado entre as empresas e o governo que permitia deduzir da cota devida ao INPS, 2% da folha de
pagamento.
219
UNIMED - http://www.unimed.com.br
220
UNIODONTO - http://www.uniodonto.com.br

98
Com a proliferação das entidades de Medicina de Grupo e Seguradoras em vista das
constantes crises do Sistema Estatal, foi aprovada a Lei 6.839 de 30/10/1980, que
obrigou essas empresas a se registrarem junto aos órgãos competentes da época
para a fiscalização do exercício profissional, no caso o Conselho Federal de Medicinas
e Respectivos Conselhos Regionais de Medicina de cada Estado.

Atualmente, os planos privados de assistência à saúde são operados por pessoas


jurídicas, constituídas sob a modalidade de sociedade civil ou comercial, em que se
encaixam as medicinas de grupo, odontologias de grupo, seguradoras especializadas
em saúde, denominadas operadoras, separadas das seguradoras normais, as
cooperativas médicas, odontológicas e as instituições que possuem auto-gestão221.

O setor de saúde suplementar, segundo dados de dezembro de 2006 da Agência


Nacional de Saúde Suplementar – ANS, atende a um total de 44,7 milhões de
beneficiários entre consumidores de planos de saúde com ou sem cobertura
odontológica e de planos exclusivamente odontológicos (Brasil, 2007b). Expurgando-
se os planos exclusivamente odontológicos o mercado de saúde suplementar atende
36,9 milhões de usuários. Este contingente representaria uma cobertura de 19,6% da
população brasileira, considerando a base populacional estimada pelo IBGE, 2007
(Brasil, 2007a), embora não seja possível garantir uma relação entre beneficiários e a
população total, pois podem existir mais de um plano por usuário cadastrado.

Para dar conta dessa cobertura, o cadastro da ANS em dezembro de 2006 indica a
existência de 2070 empresas operadoras de planos de saúde, das quais 1.255 estão
ativas e atuando no segmento não exclusivamente odontológico. A receita total gerada
por estas operações é estimada em R$ 39,3 bilhões para 2006 (Brasil 2007b),
representando aproximadamente 1,8% do PIB. Apesar da quantidade de operadoras
oferecerem indícios de este ser um mercado altamente concorrencial, uma análise
mais aprofundada dos dados aponta para uma forte concentração de beneficiários em
um pequeno número de operadoras: 12% dos beneficiários são atendidos por somente
três operadoras, enquanto 79,5% dos beneficiários restantes são atendidos por 217
operadoras, indicando a presença de grande número de operadoras com pequena
massa de beneficiários ou usuários.

A estrutura que conforma este setor compreende além das operadoras e


consumidores, prestadores de serviços médicos, odontológicos, laboratoriais, de
diagnóstico por imagem, indústria farmacêutica, de materiais e insumos, de
equipamentos médicos, governo, órgãos de defesa do consumidor, judiciário,
profissionais da área da saúde, órgãos de defesa destas categorias, entre outros,
formando um emaranhado de interesses e posicionamentos quanto ao alcance, limites
e abrangência da regulação.

A saúde privada no Brasil divide-se hoje em duas vertentes. As empresas chamadas


não lucrativas, que são as Santas Casas de Misericórdia, e outras entidades
filantrópicas que têm contrato com o SUS, e as lucrativas, que não têm nenhum

221
Cf. Inciso II do artigo 1° da Lei 9656/98, alterada pela Medida Prov. 1908-20, de 25/11/1999.

99
vínculo com esse sistema definidas como de saúde suplementar, que são as
Medicinas de Grupo. Essas empresas utilizam serviços próprios e credenciados e
compram serviços de terceiros. Como exemplos, temos a Golden Cross, a extinta
Interclínicas, a Amil, a Blue Life, a Bradesco Saúde, as Classes Laboriosas e centenas
de outras. Dentro desse grupo existem sub-grupos – considerados como
especializados – como a empresa Prevent Sênior – que é considerada especializada
em Medicina para a terceira idade. 222

Há também as denominadas de Auto-Gestão. 223 Este subsistema tem como objeto a


doença e suas seqüelas. Como seu próprio nome indica, é um sistema de atenção
médica e não de saúde e estrutura-se em uma base social, vez que seu acesso
depende da capacidade de pagamento de indivíduos, famílias e empresas. Por isso
mesmo, vai compor-se de diferentes modalidades e sub-modalidades ofertadas a
distintas clientelas. Somente as modalidades de pré-pagamento, ocupam-se,
induzidas pela racionalidade dos gastos e não por uma preocupação com a saúde,
com algumas intervenções de natureza preventiva que sirvam de barreira à utilização
de serviços de mais alto custo.

As cooperativas médicas são aquelas geridas ou que têm como sócios médicos
cooperados que participam com cotas, como é o caso das Unimeds, as quais têm a
atuação bastante discutida, pois o médico é, ao mesmo tempo, atendente e associado
da operadora, conforme já comentado.

Existem, ainda, outros segmentos na área de auto-gestão, que operam com serviços
de terceiros, utilizando-se de tabelas de honorários médicos, e têm administração
própria. São exemplos: o Banco do Brasil (Cassi), a Petrobrás (Petros), a Volvo, a
Villares, a Cofap, entre outras.

E há também os planos de administração que operam a prestação de serviços com


tabelas para reembolso, tanto para serviços ambulatoriais como hospitalares,

222
Pioneiro no atendimento dedicado para a terceira idade no Brasil, o plano de saúde Prevent Sênior ingressou no
mercado há 14 anos, fundamentando-se em um novo conceito de atendimento médico: "a medicina preventiva".
Prevent Sênior inovou não apenas nos serviços voltados especialmente às pessoas da terceira idade, mas também no
segmento de mercado que atende, acreditando que a medicina preventiva, além de propiciar melhor qualidade de vida
e longevidade, ainda possibilita a redução de custos no atendimento à saúde. Os planos de saúde - Prevent Sênior -
foram criados para desafiar o paradigma de que apenas a medicina curativa, normalmente relacionada a grandes
hospitais, sofisticados procedimentos e custos elevadíssimos, poderiam ter sucesso neste país. Enfrentando o desafio
de demonstrar que esse conceito poderia dar lugar a uma nova concepção de atendimento à saúde, os planos da
Prevent Sênior revitalizou a tradicional medicina preventiva, oferecendo aos seus beneficiários não apenas os
tratamentos curativos, mas também a possibilidade de prevenir, cuidar e retardar o aparecimento de problemas
relacionados à idade.

(Fonte: institucional da Prevent Sênior). http://www.preventsenior.com.br/paginas/institucional.htm

223
As Organizações Militares, apesar de manterem sistema próprio de assistência à saúde, convivem pacificamente
com a presença de operadoras de planos privados que oferecem, subsidiariamente, cobertura assistencial aos militares
e seus dependentes. No entanto, essa atividade suplementar centra-se nos objetivos corporativos e capitalistas das
empresas que exploram comercialmente o segmento. Opostamente a essa filosofia, surgem os sistemas de autogestão
em saúde, sem fins lucrativos e paradigma das ações de gerenciamento da atenção à saúde neste setor. O que se
mostra é que a auto-organização de recursos com o objetivo de oferecer, internamente, um sistema mais social e
solidário de coberturas de saúde, traz para as Organizações Militares oportunidades estratégicas relevantes no
gerenciamento de seus recursos humanos. Há também as Auto-Gestões privadas como os planos da Volkswagem, por
exemplo. (Fonte: artigo acessado em 04/07/2011 - http://www.administradores.com.br/informe-se/artigos/autogestao-
em-saude-suplementar-um-modelo-estrategico-de-assistencia-a-saude-privada-em-organizacoes-militares/11334/).

100
mediante vales de procedimentos. São modelos a Sul América, Med-Service e outras.
Há aquelas que operam com o seguro saúde, que difere dos planos de saúde, pois
utilizam o sistema de reembolso, não têm rede própria e cobrem, somente, despesas
hospitalares. É o caso de planos da Omint e da Bradesco Seguros Saúde. Nos casos
de seguro saúde a rede referenciada é apenas sugestiva e indicada, porém, o usuário
utiliza o serviço que desejar - livre escolha - e pede posteriormente o reembolso.

O tratamento regulatório dado a essas operadoras é o mesmo para qualquer


segmento médico assistencial, com exceção das empresas de auto-gestão, em que
não há interferência da ANS no que diz respeito aos aspectos de valores de cobrança
(pré-pagamentos) e nem ao tipo de gestão médica existente e rede de
credenciamento. Todas, no entanto, são obrigadas a prestar contas para a ANS, com
relatórios, estatísticas, informações de balanços, cálculos atuariais - notas técnicas -
de novos planos, auditoria externa e contabilidade.

Há as operadoras de assistência odontológica, que também devem se enquadrar


como operadoras, mas sem o detalhamento de exigências que existe para as
empresas de assistência médica hospitalar.

Empresas que já estavam vinculadas - antes da lei 9656/98 - aos Institutos de


Aposentadoria e Pensões, ou seja, aquelas entidades que já possuíam sua própria
“caixa” (designação de atendimento médico ou afastamento do trabalho por doença de
alguma categoria) aproveitaram o ensejo para criar suas próprias administrações de
assistência médica, sendo a primeira no país a CASSI - Caixa de Assistência dos
Funcionários do Banco do Brasil, fundada em 1944 e que funciona até os dias de hoje.

O seguro saúde ou seguro de assistência médica e hospitalar como o conhecemos


atualmente, foi criado a partir da Resolução CNSP (Conselho Nacional de Seguros
Privados) de número 16, de 20/12/1988, que autorizava as companhias seguradoras
que operavam seguros de vida a trabalhar com essa nova modalidade de seguro, que
se destinava, originalmente, ao reembolso a seus segurados de despesas com
assistência médica e hospitalar, a qual foi se desenvolvendo e incorporando as
características que conhecemos dos planos de saúde.

Antes da implantação da Lei 9656/98, as seguradoras que tinham Planos de Saúde,


se reportavam à SUSEP - Superintendência dos Seguros Privados que era
subordinada ao Ministério da Fazenda. Por iniciativa particular, foram criadas as
medicinas de grupo para atendimento de empresas, mas não havia nenhum órgão
regulador para elas a não ser o órgão representativo das inúmeras operadoras na
época.

As ações eram norteadas por um órgão de classe, chamado ABRAMGE


(Associação Brasileira das Empresas de Medicina de Grupo), conforme já comentado
acima, fundado em 8 de agosto de 1966 224, com o objetivo de unir, organizar, regular,
disciplinar, defender e representar as empresas privadas que já estavam atuando e as

224
História da Abramge: tal evento se deu em uma sala do Hospital São Luiz, na Avenida Santo Amaro, em 1966, onde
se reuniram os representantes de onze grupos médicos, constituídos por empresas de medicina de grupo, pioneiras do
setor. Vide site: http://www.abramge.com.br

101
que desejassem se organizar na atividade de prestação de serviços de atenção à
saúde. De fato, a Abramge tem o seu papel na saúde suplementar, pois as empresas
a ela associadas – grupos de interesse - têm atendimento de assistência médica em
qualquer lugar do país. Atualmente há muitos grupos além da Abramge, conforme
mostra a Tabela XIII.

Basta ligar para o telefone da empresa que opera esse tipo de serviço e informar a
cidade onde a pessoa está. Funcionários treinados indicam, então, o local onde o
paciente poderá ser atendido. Os casos de urgência e emergência são os que mais
permitem essas facilidades.

A tendência à cartelização e o medo de uma regulação estatal gerou um movimento


de auto-regulação das empresas de Medicina de Grupo que criaram, em 1988, o
Conselho das Empresas de Medicina de Grupo (Conange) e um Código de Ética.

Constitui um mercado de alta concentração todo esse subsistema privado. Em 1987


havia doze empresas no mercado. Apesar disso, em termos de arrecadação, a
Bradesco Seguros detinha 56,59%, seguida da Itaú e da Sul América Nacional, com,
respectivamente, 16,69% e 14,65%. Essa modalidade é exercitada por seguradoras
em estreita ligação com o capital financeiro bancário. (Mendes, 1999).

A tabela em sequência demonstra que há interesses dos mais diversos no setor de


Saúde, tanto do privado quanto de Entidades sem fins lucrativos, Associações,
Conselhos Federais, Força Sindical de Trabalhadores na área de Saúde, Entidades
especializadas em alguns tipos de patologias e mais o governo via Ministérios,
Secretarias e órgãos de regulação. O sistema vem sendo montado há muito tempo, e
sob o ponto de vista da visão privada, a história vem se montando desde a década de
60 mais precisamente.

Data de novembro de 1966 a instituição legal no Brasil do seguro privado de saúde.


Isso ocorreu por meio do decreto-lei n° 73/66, que, em seus artigos 129 a 133,
estabeleceu condições para que operações dessa natureza fossem empreendidas por
parte das companhias de seguros, possibilitando o pleno desenvolvimento desse setor
no mercado, conhecido como setor de saúde complementar ou suplementar.

Já o artigo 134 do mesmo decreto proibiu a venda pelas sociedades civis ou


comerciais de títulos, contratos, garantias de saúde, segurança de saúde, benefícios
de saúde, títulos de saúde ou seguros sob qualquer outra denominação, para
atendimento médico, farmacêutico e hospitalar, integral ou parcial225 .

225
Caderno de Seguros - Coletânea de 1981 a 2001 – Funenseg, p. 64.

102
Tabela II –

Grupos de interesse e Entidades representativas na Saúde (2011)


ANS Diretorias da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar
Autogestões UNIDAS – União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde
Compradores CNC – Confederação Nacional do Comércio
CNI – Confederação Nacional da Indústria
Consumidores Entidades de Defesa do Consumidor
PROCON – SP – Fundação Procon
PROCON – SJC – Fundação Procon
Associações de Consumidores de Planos Privados de Saúde
IDEC – Instituto de Defesa do Consumidor (até 11/2002).
PRO TESTE – Assoc. Bras. de Def. do Consumidor (desde 06/2003)
ADUSEPS – Assoc; de Def. dos Seguros, Planos e Sistema de
Saúde.
Cooperativas UNIMED – Confederação Nacional das Cooperativas Médicas
UNIODONTO – Cooperativas de Serviços Odontológicos
Gest. Públicos CNS – Conselho Nacional de Saúde
CONASEMS – Conselho Nacional de Secretários Municipais / Saúde
CONASS – Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde
Governo MF- Ministério da Fazenda
MJ – Ministério da Justiça
MPAS – Ministério da Previdência e Assistência Social
MS – Ministério da Saúde
MT – Ministério do Trabalho e Emprego
Operadoras
De Grupo SINANGE – Sindicato Nacional das Empresas de Medicina de Grupo
SINOG – Sindicato Nacional das Empresas de Odontologia de Grupo
Prestadores CNS – Confed. Nac. de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços
CMB – Confed. das Santas Casas , Hospitais e Entidades filantrópicas
FBH – Federação Brasileira de Hospitais
Profissionais AMB – Associação Médica Brasileira
CFM – Conselho Federal de Medicina
CFO – Conselho Federal de Odontologia
COFEN – Conselho Federal de Enfermagem
Seguradoras FENASEG – Feder. Nac. / Seguros Privados e de Capitalização
Trabalhadores CUT – Central Única dos Trabalhadores
Força Sindical
SDS – Social democracia sindical
Usuários Entidades de Portadores de Deficiência e de Patologias Especiais
FARBRA – Feder. das Assoc. de Renais e Transplantados do Brasil

103
Associação Franco Basaglia
Os artigos 134 e 135 continham duas exclusões - uma para cada artigo - que
forneciam a possibilidade de entrada de entidades na atividade da saúde. Uma era
relativa a entidades filantrópicas e a outra, a associações sem fins lucrativos, mediante
pré-pagamento de associados. Posteriormente, em vista do silêncio relativo ao decreto
acima, o Conselho Nacional dos Seguros Privados (CNSP) baixou uma resolução de
número 11/76 sobre as normas do seguro saúde, pois, na época, havia uma discussão
interminável sobre o assunto.226

Esse subsistema, que é o da atenção médica supletiva é o que manteve, na época, a


hegemonia. Ele, pelas razões consideradas anteriormente, beneficia-se do processo
de universalização excludente e cresce vertiginosamente na década de 80, de tal
modo que, no ano de 1989, cobriu 31.140.000 de brasileiros, correspondentes a 22%
da população total do País. Somente no período 1987-1989 incorporam-se a esse
subsistema 7.200.000 beneficiários.

Em termos de volume de faturamento, o subsistema vai de US$ 1,85 bilhões em 1987


para US$ 2,42 bilhões em 1989. A atenção médica supletiva é vendida pelos seus
representantes como um conjunto de modalidades assistenciais que funcionam a
custo zero para o Estado, aliviando as despesas da Previdência Social. (Mendes,
1999). Tal aumento de beneficiários deu-se pelo medo exacerbado das pessoas em
ter problemas de saúde e ter de ficar no caos existente do INAMPS até então.

Porém, a efetiva regulamentação do setor de saúde suplementar, exigida pela


Constituição de 1988, ocorreu apenas em 1998, sendo formada pelo conjunto da lei
9656/98, de 03/06/1998, da MP-2177-44 e da lei 9961/00, que criou a Agência
Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Posteriormente, em 2001, é que foi aprovada
a Lei 10.185, que instituiu a figura da seguradora especializada em saúde. As demais
empresas estão atualmente reguladas pela ANS, que são as operadoras de saúde
privadas, as administradoras e as de auto-gestão. O surgimento, no ordenamento
brasileiro das Agências Reguladoras tem guarida constitucional.

A Constituição Federal de 1988, ao dispor sobre a ordem econômica, fixou o papel do


Estado como agente normativo e regulador e como executor subsidiário de atividades
econômicas com forte influência norte-americana, na época. Haveria então, após a
promulgação da Carta Magna uma grande Reforma do Estado. 227

Então, até 1998, por falta de uma ação regulatória, a saúde suplementar no Brasil
passou por estágios de grandes dificuldades no que se refere a aspectos jurídicos,
operacionais e de recursos - nessa ordem - sendo que somente após esse ano a
atividade tornou-se um segmento empresarial regulamentado.

226
O ponto de partida para o entendimento do processo de regulação da saúde suplementar é uma abordagem
histórica da formação do sistema de proteção social brasileiro, com particular ênfase no sistema de saúde, na
participação do setor capitalista na produção de serviços de saúde e no modelo de saúde suplementar, dinamizado a
partir da década de 80.

227
A Reforma do Aparelho do Estado foi capitaneada pelo então ” Mare “ – Ministério da Administração e Reforma do
Estado, no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso.

104
Marco regulatório - Lei 9656/98

A lei 9656/98, que regulamenta os planos privados de assistência à saúde, foi


sancionada em 03 de junho de 1998, depois de mais de seis anos de discussões e
diversos projetos apresentados na Câmara e no Senado Federal.

Historicamente a discussão só tomou forma e saiu do papel em fevereiro de 1994,


quando o Senado aprovou o projeto 93/93 do então Senador Iram Saraiva, contendo
apenas três artigos.

O projeto seguiu para a Câmara dos Deputados sob o número 4.425/94. Em setembro
de 1996, após longo tempo ausente da pauta das discussões e debates, a Câmara
criou uma comissão especial para examinar o assunto e dar seqüência aos trâmites
legais. O Governo criou, inclusive, um grupo de trabalho interministerial – saúde,
justiça e fazenda – que apresentou uma versão preliminar para discussão. A história
da aprovação da lei é longa e merece detalhamentos, alguns dos quais são aqui
comentados. Objetivamente, em 12 de maio, o plenário do Senado aprovou, por
unanimidade, o parecer 235, de 1998. Em 03 de junho, o projeto tornou-se lei 9656,
com a sanção, sem nenhum veto, pelo Presidente da República, Fernando Henrique
Cardoso.

A criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS

Posteriormente foi criada a ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar, pela lei
9961. A partir dela, o governo resolveu centralizar e gerenciar todo o sistema de
saúde suplementar no Brasil, criando a Agência Nacional de Saúde Suplementar
(ANS), regulamentando as empresas que operavam no setor e legislando para as
novas operadoras228 do sistema, fornecendo, inicialmente, por meio de medidas
provisórias, as regras para operação e desenvolvimento, consideradas nada
democráticas pelos empresários do setor. Iniciou-se, daí em diante, um verdadeiro
cabo de guerra entre governo, seguradoras e operadoras de planos de saúde.

Através da lei número 9.961, foi definida a finalidade da ANS, sua estrutura,
atribuições, funções, sua receita e a vinculação ao Ministério da Saúde. A estrutura
organizacional simplificada da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar - ficou
formatada. Em seguida, iniciou-se o processo de regular, então, as operadoras
setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores,
contribuindo, com isso, para o desenvolvimento das ações de saúde no Brasil. Assim,
a Medicina de Grupo tomou corpo e forma e cumprindo seu papel constitucional dando
continuidade as atividades que já vinha cumprindo desde as décadas passadas.

A ANS é um órgão criado por técnicos que vieram da SUSEP e vislumbraram as


operadoras de saúde como se fossem empresas já existentes, de longa vida e
tradicionais; mas, ao contrário disso, elas estavam apenas surgindo.

228
Instituições que – devidamente registradas na ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar – podem operar
Planos de Saúde na forma da Lei 9656/98.

105
Esses técnicos estavam acostumados a lidar com antigas empresas seguradoras,
devidamente instaladas há mais de 50 anos no Brasil e que receberam, a princípio,
ajuda de governos passados, por sistemas de repartição de resseguros do próprio
governo - as primeiras receitas – e, com isso, desenvolveram seus ativos ao longo do
tempo.

As operadoras, por outro lado, por si só, muitas das quais não ligadas a bancos, são
empresas jovens, não tiveram as benesses governamentais do passado e sofreram
uma regulação de certa forma abrupta em vista das rotinas de regulamentação,
normas de seguradoras no passado, critérios e formas de fiscalização da SUSEP nos
últimos anos.

A ANS foi criada para disciplinar o setor de saúde suplementar e teve a ela transferida,
por meio da lei 10.185, de 2001, a competência para controlar e normatizar o seguro-
saúde, o que antes era de obrigação da SUSEP, bem como dos planos de saúde. Em
vista disso, as operadoras tiveram de se adaptar a normatizações de grande volume,
fazendo com que investissem pesadamente em recursos de pessoal e recursos
técnicos.

A cronologia da criação da ANS é a que foi citada, de forma sucinta e teve como
objetivos:

a) Assegurar ao beneficiário a cobertura integral e regular as condições de acesso;

b) Definir e controlar as condições de ingresso aos planos, operação e saída das


empresas e entidades que operam no mercado;

c) Definir e implantar mecanismos de garantias assistenciais e financeiras que


assegurem a continuidade da prestação de serviços de assistência à saúde dos
contratados;

d) Dar transparência e garantir a integração do setor de saúde suplementar ao SUS e


o ressarcimento dos gastos gerados por beneficiários do sistema público;

e) Estabelecer mecanismos de controle de abuso de preços;

f) Definir o sistema de regulamentação, normatização e fiscalização do setor de saúde


suplementar.229

Porém, regular seguros do patrimônio, tais como roubo, incêndio, multirriscos é bem
diferente de regular a saúde financeira e administrativa das operadoras na área de
saúde, atitudes que interferem em seus custos, gerando consequências no tratamento
de saúde dos adquirentes de planos assistenciais.

Há distorções que afetam todas as pessoas que desejam rediscutir o papel das
agências reguladoras no Brasil: quais os seus verdadeiros limites, obrigações e
229
Assim é que, em se tratando de atividade de natureza econômica, os serviços privados de saúde estão submissos
aos primados da dignidade da pessoa humana, da livre concorrência e da defesa do consumidor. (Gregory, 2007).

106
funções. As agências foram criadas para fiscalizar e regular, definições de
precificações, funções estas a serem exercidas por um corpo técnico, a partir de
controles e ordens do Estado.

A ex ministra das Minas e Energia, hoje Presidente do Brasil, enfatizou de forma


contundente em sua proposta, à época, a necessidade de corrigir distorções nas
agências reguladoras de sua área:

“A definição da política de preço, da política de petróleo, da política de energia elétrica,


não é papel de agência, mas sim do Ministério, do Estado...” 230 Evidentemente ela se
referia também à política de preços e custos na Saúde.

Há outros pontos de instabilidade entre a regulação e as operadoras, sendo


necessário e urgente sublimar essa situação. Algumas dessas arestas do setor serão
descritas, para maior entendimento.

Há problemas das mais variadas classes: desde criação de massas críticas atuariais
convenientes para operação de planos individuais, os quais estão em extinção,
empresas irregulares e que ainda operam na clandestinidade, cooperativas
absolutamente ingerenciáveis, grandes corporações pressionando o governo por
maior margem de lucros e empresas que se ‘deixam’ quebrar para tentar obter as
benesses do governo, como acontece no sistema bancário.

Será necessário flexibilizar o sistema e, ao mesmo tempo, ampliar a base de clientes


nas áreas suplementares de saúde, pois esse mesmo sistema, apesar de muitas
arestas, encontra-se no ponto para mudanças técnicas e administrativas.

Muitas foram as mudanças imediatamente à promulgação da lei 9656/98. A primeira


ocorreu logo no dia seguinte a 03 de junho de 1998 por meio de uma Medida
Provisória - MP. De lá para cá, o número de MPs já chega a mais de 40.

Tantas resoluções geraram muitos problemas e reclamações dos operadores. São


problemas atuais e, por esse motivo, é necessário alimentar o setor suplementar
dando-lhe possibilidades de crescimento na forma, mudança de segmentações e
apoio normativo.

Muitas empresas do setor de seguros de saúde tiveram de se adaptar às exigências


da lei 9656/98, e aquelas que não o conseguiram foram obrigadas a entregar seus
ativos ou a se associarem a outros grupos nacionais ou estrangeiros, como
poderemos verificar mais adiante. Acredita-se que após 12 anos de sua aplicação,
funcionamento e amadurecimento seja o momento de se pensar em formas de
compartilhar esses conhecimentos adquiridos. No artigo de Amorim e Perillo, na
Gazeta Mercantil de 05/04/2004, diz que:

“Até hoje o Brasil não conseguiu atender as necessidades básicas de saúde de vastas
parcelas da população, bem como proteger adequadamente os usuários dos serviços

230
Revista ABRAMGE - Ano XVI - n°. 181 - Abr/Mai/Jun/2 003 - pág. 09 - Dilma Rousseff.

107
privados. As causas repousam nas características peculiares do setor e, mais
recentemente, na política econômica pós-Plano Real, que, se de um lado obteve o
controle da inflação, de outro jogou os brasileiros na armadilha da recessão eterna. A
recessão (o PIB cresceu 0,1% em 2003) e a decorrente queda de renda do brasileiro
(perda de 12,5% do rendimento médio em 2003) retiraram 5 milhões de pessoas dos
planos de saúde, pressionando ainda mais o SUS. ” 231 (2004).

A legislação na época surgiu, inicialmente, com o objetivo de cadastrar as empresas,


definir um plano de saúde padrão, denominado Referência, com um mínimo de
atendimento obrigatório à saúde para todas as empresas, e daí iniciar a regulação
entre a ANS, as seguradoras e operadoras. A legislação demonstrava que as
empresas deveriam se preparar para o que viria pela frente. 232

A Medicina de Grupo chegou a deter em 2001/2001 a participação de 46,15% do


mercado de planos e seguros de saúde. As cooperativas 24,79%, auto-gestão 14,81%
e Seguros 14,25%. As pessoas atendidas caíram de 18,4 milhões para 17,6 milhões
em 2001 e para 16,2 em 2002.233 Também foi necessária a separação por segmentos
na atividade.

As operadoras de saúde então foram organizadas na forma da lei 9656/98 com um


organograma de segmentação, sendo divididas com a seguinte classificação:
Administradora - de planos; Medicina de grupo - segmento médico hospitalar;
Cooperativas médicas - segmento médico hospitalar; Filantropias - segmento médico
hospitalar; Odontologias de grupo - segmento odontológico; Cooperativas
Odontológicas - Segmento Odontológico; Auto-gestão - que poderá ser Patrocinada ou
Não patrocinada; A Patrocinada poderá ser ainda singular ou Multipatrocinada.

Provém dessas separações, as arestas, algumas das quais já comentadas, a serem


discutidas, tais como, reajustes de preços, criação de Rol de procedimentos médicos,
confecção das Normas e Procedimentos, já disponibilizando bens de administradores
e dezenas de resoluções, portarias, medidas provisórias, com imposição, quase que
tutelar, como deveriam proceder as empresas da atividade, conforme o seu
segmento.

A atividade é extremamente regulada, com determinações de coberturas de


procedimentos médicos, hospitalares e ambulatoriais muito extensas234 as quais
provocam repercussões de grande peso nos custos de operação final, levando a
discussões severas sobre como proceder. Com a obrigatoriedade de coberturas
mínimas - pois, antes eram muitas exclusões de procedimentos médicos - houve
conseqüentemente aumento da sinistralidade. Afinal, trata-se de um tema sério e
importante, que envolve milhões de segurados e o seu bem-estar físico: a saúde.

231
Gazeta Mercantil - 05/04/2004 - Maria Cristina S. Amorim e Eduardo Perillo.
232
Conforme dados e projeções do Ministério da Saúde, o Brasil ocupará em 2025 a posição de sexto lugar entre os
países que possuem uma população acima de sessenta anos de idade. Imaginemos o ônus que isso acarretará ao
governo. Por isso, propõe-se uma ação conjunta e mais abrangente entre o público e o privado. A história mostra que a
dinâmica das mudanças está agindo novamente.
233
Fonte - ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar - acessado em 12/04/2004.
234
Toda a legislação desde a origem no site: www.ans.gov.br

108
Dentre as primeiras alterações propostas na lei, foram vedadas quaisquer restrições
quantitativas e de prazos para internação, tornou-se obrigatória a cobertura para todas
as doenças CID (Controle Internacional de Doenças), foram reduzidos os prazos de
carência, foi instituída a obrigatoriedade de cobertura para doenças preexistentes após
dois anos de contrato, além de ser garantida, também, a assistência ao recém-
nascido.

O aumento de preços desenfreado acabou 235 e quaisquer mudanças nas tarifas dos
planos de saúde somente podem acontecer com autorização da Agência reguladora.
Isso vale para contratos individuais, pois os empresariais ou coletivos são acertados
de comum acordo, anualmente. Também foram proibidas suspensões de serviços e
cancelamentos de contratos de forma unilateral antes dos 60 dias de inadimplência,
sendo que, para tanto, o cliente deve ser devidamente informado e a medida,
protocolizada.

Os contratos coletivos, embora prevejam a possibilidade de o funcionário afastado por


pedido de demissão ou demitido - desde que não seja por justa causa - continuar
pagando seu plano por prazo de até seis meses depois de sua saída da empresa,
deverão ser muito discutidos em futuro breve, pois, após esse prazo limite, esse
funcionário ficará desprovido de qualquer assistência médica.

Uma das hipóteses para resolver esse problema é a possibilidade de o plano ter uma
portabilidade236 - liberdade de transferência - ou seja, deveria ser possível transferi-lo
para outra operadora por ocasião do novo emprego, se assim desejar o funcionário.
Caso a nova empresa não tenha plano coletivo de saúde, esse funcionário continuaria
pagando para a operadora anterior, via emprego antigo, por um prazo maior a ser
definido. Tais situações ainda são obscuras e deverão ser resolvidas em médio prazo.

Os usuários com 60 anos de idade e dez anos de plano não podem ter aumento de
sua contribuição de pré-pagamento por mudança de faixa etária, e as coberturas são
obrigatórias para transplantes de rim e córnea. O Estatuto do Idoso 237 veio trazer essa
obrigatoriedade, embora tardiamente, pois alguns planos já previam essa possibilidade
em seus contratos bem como a remissão por morte.238 239

235
Fonte: ANS. - www.ans.gov.br. A ANS divulgou em 28/06/2000 o índice de reajuste por variação de custos. O
primeiro índice foi de 5,42%. Houve pequeno resíduo para aquelas empresas que estavam sem reajuste há mais de 12
meses.
236
Já existe, todavia, conforme entrevista com o Presidente da Abramge – a portabilidade foi um fiasco. (Entrevista
anexa).
237
Após sete anos tramitando no Congresso, o Estatuto do Idoso foi aprovado em setembro de 2003 e sancionado
pelo presidente da República no mês seguinte, ampliando os direitos dos cidadãos com idade acima de 60 anos. Mais
abrangente que a Política Nacional do Idoso, lei de 1994 que dava garantias à terceira idade, o estatuto institui penas
severas para quem desrespeitar ou abandonar cidadãos da terceira idade.
238
Remissão: os beneficiários têm direito de permanecer no plano – sem pagamento – por mais 5 anos após o
falecimento do titular. Há variações nos contratos antigos – antes da Lei.
239
Após período de gratuidade, viúvas têm convênio extinto. (Estado de S.Paulo de 26/09/2010). Casos já chegam aos
tribunais e para a área de fiscalização da Agência Nacional de saúde Suplementar, que promete para os próximos dias
uma súmula para vetar o fim dos contratos, com previsão de multas. Há casos concretos. Logo depois de perderem
seus maridos, Diva e Josee souberam que teriam direito a um aparente benefício de seus planos de saúde, mantidos
por anos pelos companheiros: ficar sem pagá-los durante cinco anos. Mas depois perceberam que não era bem assim.
Após o período de gratuidade, chamado de “Remissão” os contratos mantidos por décadas seriam extintos. E, para
continuar com a mesma cobertura, teriam de fazer um novo plano e pagar mais, muito mais. “Me pediram R$ 6,5 mil
pelo plano novo. Para mim, sozinha. Fiquei desesperada”, relata a professora aposentada Josee Diamant Lisbona, de
62 anos, viúva há cinco e que pagava R$ 1,4 mil junto com o marido. Já Eunice Cicuto, de 81 anos, tem usufruído do
benefício da remissão nos últimos três anos, mas sabe dos riscos.

109
As carências foram alteradas para 24 horas nos casos de urgência e emergência e de
seis meses para outros procedimentos. No caso de partos a carência passou para dez
meses. Antes da lei as carências eram mais convenientes para os operadores.
240
Dentre as alterações gerais, outras de caráter administrativo e de controle foram
incorporadas para uma maior transparência da atividade.

A Lei criou ainda elementos de controle, contabilização e uma padronização do plano


de contas, que permite análise do desempenho de uma mesma operadora ao longo de
sua existência, sua solvência, padronagem de dados de custos dos produtos, além da
consolidação de ativos, passivos e resultados de um determinado segmento. Esses
dados têm como objetivo comparar uma operadora com outras e agilizar o trabalho de
fiscalização, além de, com isso, se obter informações gerenciais.

Ademais, após a lei, são necessários provisões técnicas 241 e a determinação de um


capital mínimo para se criar e desenvolver uma operadora de saúde. As garantias
financeiras são obrigatórias, devendo haver provisão de risco, provisão para eventos
ocorridos e não avisados - IBNR242, chamada de PEONA - elaborada por Atuário
registrado no IBA - Instituto Brasileiro de Atuária - análise de margem de solvência e
provisão de operação para aquelas operadoras sem fins lucrativos. Por outro lado, a
lei determina que as operadoras sejam classificadas conforme a área de atuação, que
são chamadas de Regiões de Abrangência, com a seguinte ordem:

Região 1: em todo o território nacional ou em grupos de pelo menos três Estados


dentre os seguintes: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul,
Paraná e Bahia;

Região 2: No Estado de São Paulo ou em mais de um Estado, excetuando os grupos


definidos no critério da Região 1;

Região 3: Em um único Estado, qualquer que seja ele, excetuando-se o Estado de


São Paulo;

Região 4: No município de São Paulo, do Rio de Janeiro, de Belo Horizonte, de Porto


Alegre ou de Curitiba;

Região 5: Em grupo de municípios, exceto os definidos na região 4;

Região 6: Em um único município, excetuando os definidos na região 4;

A lei tentou enquadrar todos os tipos de contratos, mas houve pressão das operadoras
para saber como ficariam aqueles usuários que estavam nos planos antigos, ou seja,
em vigor antes da lei. Assim, são definidos como planos antigos os contratados antes
de 02/01/1999, ou seja, antes da lei 9656/98. As coberturas são exatamente aquelas
que constam no contrato, e as exclusões estão nele expressamente relacionadas.

240
Tais carências estão descritas no decorrer do trabalho.
241
Provisões são Reservas Técnicas em função de faturamento de prêmios de contra-prestações pecuniárias.
242
Incurred but not reported

110
Esses contratos, porém, não têm uma linguagem clara e se referem a muitas
exclusões. Haviam muitas cláusulas abusivas. O usuário só saberá das surpresas no
dia em que precisar utilizar o plano. 243

São definidos como planos novos os contratados a partir de 02/01/1999 e


comercializados de acordo com as regras da lei 9656/98, que proporcionam aos
consumidores a cobertura assistencial definida pela ANS relativa a todas as doenças
reconhecidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), além de outras garantias. É
um trabalho de regulação contínuo.

Após a decisão do STF em final do ano de 2003 (21/08/2003) e eficácia a partir de


03/09 de que os contratos antigos deveriam ser mantidos na forma como foram
contratados inicialmente e que deveriam ser ajustados ou adaptados na forma da nova
legislação, Bradesco Saúde e Sul América, por exemplo, após várias liminares de
órgãos representativos de consumidores, enviaram a todos os seus clientes de
contratos antigos reajustes de 82% no valor de suas mensalidades ou pré-
pagamentos, o que gerou grande confusão em 2004.

Depois de intensas discussões jurídicas no STF, sobraram - por decisão do Supremo -


os planos antigos que, conforme resolução da ANS, poderiam ser adaptados, ou seja,
os consumidores que têm um plano antigo podem adaptá-lo à lei, bastando solicitar
isso a sua operadora, que é obrigada a oferecer uma proposta de adaptação que,
obviamente, acarretará em um aumento de preço. O consumidor, porém, não estará
obrigado a aceitá-la, podendo, caso seja mais conveniente, permanecer com seu
plano antigo.

Segmentos da Saúde Privada

As regras da legislação definem coberturas obrigatórias em função do tipo de


assistência médica. Há segmentos específicos conforme o caso. Os planos foram
divididos com a segmentação abaixo:

Segmento ambulatorial

Com direitos a consultas, exames, tratamentos e procedimentos ambulatoriais.

Segmento hospitalar

Sem obstetrícia:

Com direito a internações.

Segmento hospitalar

Com obstetrícia:

243
O STF, após mais de quatro anos de discussões, decidiu manter as cláusulas dos contratos antes da Lei 9656/98 e
o governo lançou mão de MP para a regulação das migrações.

111
com direitos a internações e partos.

Segmento odontológico:

Com direito a tratamento odontológico.

Segmento referência:

Com direitos a consultas, exames, tratamentos e procedimentos ambulatoriais,


internações e partos em ambiente de enfermaria.

Com esses segmentos definidos em lei, as operadoras podem oferecer diferentes


combinações, como cobertura ambulatorial e hospitalar com obstetrícia ou cobertura
ambulatorial com cobertura odontológica.

Outras situações que estavam à deriva foram regulamentadas também. Como


situação específica, podemos citar que não há mais possibilidades de aumento de
preços de forma unilateral. Esse aumento, denominado técnico, só é autorizado na
forma prevista em lei para planos individuais e familiares.

Uma vez por ano é determinado qual será o aumento dos valores de pré-pagamento
das mensalidades com base na inflação e no aumento do preço de insumos e outros
elementos complementares. Deve ficar claro, ainda, que os planos podem ser
coletivos por adesão ou não. Esse é o caso de uma empresa fazer um plano coletivo
em que todos os funcionários sejam participantes. Caso não seja obrigatória a
participação de todos os funcionários, haverá apenas a adesão daqueles que tenham
interesse em participar do grupo.

Com certeza, a legislação estará sempre sob alterações, contudo, é hora de focar e
ampliar sua abrangência a fim de dar sua contribuição à sociedade que esperou muito
tempo, de forma resignada e paciente, para chegar este momento. Ao longo dos
anos, as saúde pública e privada atravessaram períodos conturbados. Essa dicotomia
entre público e privado na saúde deve ser mais tênue e encarada com serenidade, já
que a saúde e as enfermidades atingem a todos que têm ou não planos.

Após a regulamentação, foi limitada a liberdade de definição do produto a ser


oferecido à população e a liberdade de preço, não podendo mais ser negada a entrada
de quem quer que seja em planos de saúde, isto é, a seleção de risco foi proibida, não
podendo também haver rompimento unilateral de contrato com o usuário 244.

Em seguida, criado o Plano Referência, o qual é o mínimo em atendimento que a


operadora deve oferecer. Dentre outros planos aprovados, este é o mais simples que
toda operadora tem de possuir para oferecer aos seus clientes obrigatoriamente. Esse
plano oferece enfermaria e CTI, cobertura de doenças infecto-contagiosas,
transplantes de córnea, renal, cirurgia de miopia maior que sete graus, psiquiatria,
terapia de crise com alguns limites de internação, urgências, emergências, garantia ao

244
A seleção de risco entende-se como a “não aceitação de pessoas com doenças ou com idade avançada”.

112
recém-nascido e filho adotivo menor de 12 anos, carências de no máximo seis meses,
parto com dez meses, doenças pré-existentes com prazo de 24 meses de carência.

A criação do agravo245 no preço para doença Pré-Existente está ainda um pouco


confusa, pois não há base técnica para precificação. No caso do Plano Referência não
há limitações quantitativas e a operadora não pode descredenciar o hospital, pois é
muito complicado. Foram criadas inicialmente sete faixas de idade, atualmente
alteradas para dez, sendo a última faixa no máximo seis vezes o preço da primeira, e
valem a partir de primeiro de janeiro de 2004.246

Faixa I - de 0 a 18 anos Faixa II - de 19 a 23 anos


Faixa III - de 24 a 28 anos Faixa IV - de 29 a 33 anos
Faixa V - de 34 a 38 anos Faixa VI - de 39 a 43 anos
Faixa VII - de 44 a 48 anos Faixa VIII - de 49 a 53 anos
Faixa IX - de 54 a 58 anos Faixa X - de 59 anos ou mais.

Em preços, o reajuste só pode ser técnico247, anual e excluindo a possibilidade de


cancelamento do plano do usuário pela operadora por esse motivo. Como exemplo
histórico, podemos dar os números dos reajustes entre maio de 2003 e abril de 2004:
9,27% (IPCA 5,14%). Tal número, para reajuste, deixou as operadoras de saúde
insatisfeitas em seus objetivos de aumentos de preços. O reajuste de 2004 /2005 ficou
em 11,75% (IPCA 7,79) e o de 2005/2006 em 11,69%248. Caso o cliente esteja
internado, também não é possível o cancelamento do plano. A lei 9656/98 criou um
enlace difícil para as operadoras cancelarem os planos de saúde individuais.

Esse foi o limite máximo de reajuste autorizado pela ANS para as operadoras e
seguradoras de planos de saúde nas épocas citadas. Nenhuma operadora foi
autorizada a reajustar as mensalidades de seus consumidores acima daquele
percentual nas renovações automáticas dos contratos.

Essas projeções feitas pela ANS mostraram que esta metodologia é mais vantajosa
para o consumidor, já que, antes, grande parte dos contratos de planos de saúde foi
indexada ao IGP-M. Nesse mesmo período, o IGP-M variou 32,48% e o ICV 17,38%.
O índice de 9,27% foi a média ponderada dos reajustes de 145 mil contratos coletivos
de um total de 10,8 milhões de usuários. Esses contratos representavam, na época,
448 operadoras que atenderam a mais de 22 milhões de usuários249.

As empresas preferem, portanto, vender planos com contratos empresariais coletivos;

245
É um aumento do valor da contra-prestação pecuniária pelo fato de declarar doença pré-existente.
246
Essa regra estabelece que da última faixa etária pudesse ser cobrada uma mensalidade no máximo seis vezes
superior à cobrada da primeira. Posteriormente definiu-se – por decorrência do Estatuto do Idoso – a variação entre a
1ª. e a 7ª. faixa etária deveria ser igual à variação entre a 7ª. e a 10.a. faixa etária. Esse é o princípio da solidariedade
Inter geracional. Há um projeto de lei no Congresso Nacional que propõe que a diferença máxima seja de quatro e não
de seis vezes. É um assunto tecnicamente complexo sob o ponto de vista de riscos atuariais.
247
É obrigatório que a operadora demonstre os níveis de sinistralidade para solicitar quaisquer aumentos
de preços.
248
Mensagem do Presidente da Abramge - Arlindo de Almeida - Editorial da Revista Medicina Social - número 188 - de
jan/fev/mar/2005. ANS - RN-99 de 27/05/2005.
249
Fonte: Folha de São Paulo em artigo publicado em: http://www.cprcorretora.com/noticias_038.asp - acessado em
21/05/2005.

113
todavia, quando o empregado sai da empresa, tais planos criam problemas futuros
para ambas as partes, ou seja, se o funcionário for demitido sem justa causa, ele terá
direito de permanecer no plano, no mínimo, durante seis meses e no máximo dois
anos, desde que ele pague as suas mensalidades. De certa forma, o vínculo com o ex-
empregado permanece.

Atualmente, os planos de saúde individuais são minoria no mercado, correspondendo


a 25% do total250. A outra fatia é contemplada pelos planos empresariais ou coletivos
que precisam também de novas reflexões, pois, se as operadoras não desejam vender
planos individuais e somente aquelas pessoas com carteira assinada podem ter um
plano de saúde via empresas, haverá um cerceamento para quem está desempregado
ou ganha pouco.

Quando encontrar outro emprego, a pessoa verificará, muitas vezes, que a empresa
não tem condições de registrá-la - os empregos formais estavam em declínio, na
época, quanto mais instituir um plano de saúde para seus empregados.

As empresas operadoras de saúde já perceberam que a prevenção é o melhor para


seus usuários e para a própria empresa em termos de custos. Por isso já há muitas
empresas operadoras que preferem fazer uma Medicina preventiva do que curativa.
Tais informações mais detalhadas estão na sequência.

No caso do Brasil, a informação na mídia, tem sido um dos vetores que aumentam a
intensidade da utilização.

Dizem os veículos:

“faça exame da próstata, examine seu colesterol, faça exame de prevenção do câncer
de mama, faça check-up anualmente e outras chamadas em jornais, revistas, TV e
outras mídias. ”

Entre 1995 e 2003, o percentual de sinistros ou de utilização do setor aumentou cerca


de 17%, passando de 73,4% para 86,22%. Enquanto, o número de segurados, que era
de 4,8 milhões, em 1996, passou para 6,3 milhões em 2000 e declinou para 4,9
milhões em 2003, praticamente o mesmo de 1996. Se compararmos o ano de 1996
com o ano de 2003, verificaremos que o número de usuários é quase o mesmo, mas
duplicaram a freqüência e o custo de utilização.251

“Quer você seja um prestador de serviços de Assistência Médica ou um usuário, não


precisa ser relembrado de que o aumento dos custos assistenciais é um desafio
nacional. De forma conservadora já representam 14% do PIB norte-americano e
significam 1,4 trilhão de dólares anualmente, e, por volta de 2008, esta quantia está
projetada para alcançar 2,2 trilhões de dólares...” 252

250
Fonte: Abramge - Associação Brasileira de Medicina de Grupo. acessado em 22/10/2005.
251
Miranda, 2005
252
Traduzido e condensado por Dr. Ieraldo Rubo, presidente da Conange - Revista Medicina e Saúde - pág. 21 - artigo
publicado pelo The Official Newsmagazine da Associação Urológica Americana de março/2004.

114
Tabela III

Antes da lei e após a lei - quantidade de beneficiários


Faixa Plano Anterior Plano Posterior Total
Etária a Lei 9.656/98 a Lei 9.656/98

Anos Quantidade Quantidade Quantidade


Beneficiários % Beneficiários % Beneficiários %

0 a 17 6.034.377 26,92 2.223.896 28,92 8.258.273 27,43


18 a 29 4.780.424 21,32 1.813.511 23,59 6.593.935 21,90
30 a 39 4.123.535 18,39 1.364.758 17,75 5.488.293 18,23
40 a 49 3.266.155 14;57 1.075.159 13,98 4.341.314 14,42
50 a 59 1.980.958 8,84 584.789 7,61 2.565.747 8,52
60 a 69 1.205.085 5,37 335.560 4,36 1.540.645 5,12
70 e + 1.026.619 4,59 290.809 3,79 1.317.428 4,38

TOTAL 22.417.153 100,00 7.688.482 100,00 30.105.635 100,00

Fonte: Abramge - 2001 - 9.o Congresso (Hotel Inter-Continental - RJ).

Como se pode observar (Tabela XVI), a quantidade de beneficiários antes e depois da


lei 9656/98 é de pouco mais de 30 milhões. Para que um cliente de contrato antigo, ou
seja, antes da lei tenha direitos adquiridos por meio dela é necessário que ele pague
diferenças de pré-pagamento para ter direito a novas coberturas, não previstas em seu
plano antigo. Observe-se que as faixas etárias de maiores de 60 anos até 69 anos e
mais de 70 anos, não representam 10% da população atendida.

Isso gerou um grande volume de pessoas que desistiram de ter um novo plano devido
ao aumento de preço e fez com que as operadoras tivessem uma queda considerável
das aquisições já efetuadas e perdas daqueles que pagavam seus planos
mensalmente.
As conseqüências tiveram duplo resultado negativo para todos: operadoras, governo e
consumidores, pois estes, na medida em que não têm mais planos de saúde, recorrem
ao SUS. Os consumidores deixaram de ter um plano particular, as operadoras
perderam um cliente e o governo ganhou um novo usuário via SUS.

Em 2003, o PIB teve recuo no primeiro semestre quando comparado com o igual
período anterior e isso teve repercussão negativa nos planos em andamento e na
venda de novos planos. Houve ainda o racionamento de energia e a liquidez real caiu
15%. O salário médio das famílias sofreu perda não inferior a 5%. Era um período
recessivo. O consumo das famílias foi diminuindo, indicando que o mercado interno se

115
retraiu até início de 2004.253 Nos anos seguintes houve retomada econômica e afetou
positivamente a venda dos planos de saúde

Conforme já afirmado, essas perdas de clientes nas operadoras de 2001 até 2005 se
aproximam de seis milhões. Tais dados estão nas tabelas constantes da ANS de
vários anos. Observe-se, então, que a ANS, em vez de promover maior acesso da
população aos serviços de saúde complementar, promoveu, de forma indireta e
involuntariamente, um esvaziamento do setor ampliando a procura pelos serviços do
SUS.254

A partir da lei 9656/98, as operadoras devem ter seu registro de operação e atender
várias regras. Os planos a serem lançados e os em andamento devem também ter
seus registros. As operadoras devem pagar também uma taxa de saúde suplementar
– para garantir a subsistência da ANS - ao órgão controlador - para efetuar quaisquer
registros, sejam de renovação de planos já existentes ou de novos planos.

É previsto, ainda, nas normativas, que caso algum cliente de plano de saúde utilize-se
do SUS, por quaisquer motivos, a operadora deve efetuar o ressarcimento ao órgão.255
Se isso não for feito, o SUS, mediante o RG e o CIC do usuário, faz a devida
cobrança. Já houve muitos casos de pagamentos e outros estão sendo discutidos na
ANS pelas operadoras.256

Sob o aspecto administrativo, é obrigatório um plano de contas específico para a


contabilidade e um controle de registros auxiliares. A média de planos por operadora
no Brasil é atualmente de quinze, e a região mais abrangida é a Sudeste.

No livro de Bayma e Iasznar, lançado pela Fundação Getúlio Vargas há observações


interessantes sobre o que se pensa e o que acontece com os planos de saúde.257

“...Há problemas urgentes a serem analisados para o futuro da saúde no Brasil que
envolvem também as empresas que trabalham com saúde privada. De um lado, são
eles: estrutura organizacional inadequada; falta de entrosamento entre os diversos
setores, estrutura gerencial causando morosidade nos processos, ausência de
indicadores, baixos salários, pouca qualificação, inexistência de descentralização,
inexistência de um sistema de análise de custos, assistência farmacêutica, faltam

253
Revista Medicina Social - n.° 182 – jul/ago/set/200 3 - pág. 10 - Artigo de Wagner B. de Castro.
254
As tabelas estão no site da ANS: http://www.ans.gov.br/portal/site/perfil_operadoras/index.asp
255
Após ficar quase um ano sem pedir de volta às seguradoras de saúde – operadoras - ressarcimento das
internações de conveniados em hospitais públicos, a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) bateu recorde de
cobrança e arrecadação neste ano. Relatório feito a pedido da Folha revela que a agência voltou a emitir notificações
para as operadoras em julho. Nos cinco primeiros meses de 2011, a agência arrecadou R$ 25 milhões. O valor é
superior à soma dos anos de 2008, 2009 e 2010. Neste ano, 2011, o valor efetivamente cobrado dos planos (sem
direito a recurso administrativo) é de R$ 97 milhões, também superior à soma dos três anos anteriores. A diferença não
foi paga ou está sendo contestada judicialmente. Apesar dos recordes, os valores continuam pequenos em relação à
dívida dos planos com o SUS. E devem crescer. Isso porque as últimas notificações da ANS são de atendimentos
feitos no segundo semestre de 2008. As notificações são usadas pela ANS para informar a operadora, que tem duas
instâncias de recursos na própria agência para negar que o paciente atendido na unidade pública tenha plano de
saúde válido. (Fonte: http://www.plurall.com.br/novo/noticia.php?noticia_id=4400) – acessado em 07/07/2011.
256
Tais dados podem ser verificados no si t e da própria agência reguladora – ANS - que controla essas cobranças.

257
Fundação Getúlio Vargas - Saúde e Previdência Social - Desafios para o Terceiro Milênio - Editora Pearson
Education - 2003 - Organizadores: Fátima Bayma e Istvan Kasznar.

116
ações nas áreas materno-infantil, insuficiência das atividades de promoção e
prevenção à saúde, falta programas de saúde das famílias, insuficiência no
atendimento à demanda de sangue, componentes e derivados...” 258.

Amorim (2006), ainda faz comparações interessantes entre o que acontece na Saúde
Pública e na Saúde Privada, mostrando os paralelismos que existem. No SUS a
população ainda enfrenta um grave problema, a dificuldade de acesso evidenciado
pela sobrecarga nas emergências e pela longa espera para se conseguir realizar
determinados procedimentos.

No que se refere a Saúde Suplementar, existem hoje no Brasil cerca de 50 milhões de


brasileiros dependendo desta alternativa de saúde, uma complexa engrenagem que
envolve usuários, prestadores, hospitais, clínicas, laboratórios, serviços de imagem e
médicos e cerca de 1.400 operadoras, entre cooperativas médicas, odontológicas,
seguradoras, empresas de medicina de grupo, de auto-gestão, odontologias de grupo
e filantrópicas. (Amorim, 2006).

Ainda hoje, os associados de planos reclamam dos preços e aumentos praticados e


das restrições contratuais; os prestadores de serviços estão com seus valores
profundamente defasados; as operadoras alegam dificuldades advindas da
obrigatoriedade de ampliação das coberturas – determinadas pela ANS – e dos
reajustes concedidos, sempre menores que os custos médico-hospitalares,
impactados pelos elevados valores dos materiais e medicamentos; e os médicos, por
sua vez, vêm sofrendo com reduções em seus honorários. Vale destacar ainda a total
falta de incentivos por parte do governo e a pesada carga tributária que incide sobre o
setor, que hoje é em torno de 38%. 259

Pode-se assim resumir os principais problemas vivenciados atualmente pelos


estabelecimentos de serviços de saúde no país; alto grau de endividamento; fluxos de
caixa negativos; pendências nos pagamentos de fornecedores e tributos; dificuldades
de obtenção de linhas de crédito próprias para o setor, a fim de que estes
estabelecimentos possam acompanhar o desenvolvimento e atualização que o setor
de saúde requer. Os financiamentos ainda hoje disponíveis são aqueles de 2006, de
duas ordens: crédito rotativo com garantia de recebíveis e financiamento para
investimentos pelo BNDES a juros de mercado, não havendo, portanto, qualquer
subsídio ou alongamento de prazos diferentes de pagamento com relação àqueles
aplicados ao mercado em geral. (Amorim, 2006).

Em virtude do cenário da época, de crise, evidenciou-se uma diminuição da rede


credenciada o que gerou uma restrição no número de atendimentos. Isso, por sua vez,
ocasionou um desequilíbrio ético profissional e levou a um significativo aumento das
demandas judiciais do setor.

258
FGV, 2002/2003 - páginas 10 e 11.
259
Somente de forma direta estudo divulgado em (06/04/2010) pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário
(IBPT) mostrou que a alíquota média de impostos e tributos cobrados sobre bens e serviços na área de saúde no Brasil
é de 33%. Sobretudo para alguns itens específicos, como o de muletas (39,59%), termômetros (38,93%) e xarope
contra tosse (34,80%). Esse percentual é maior do que, por exemplo, o que incide sobre medicamentos veterinários, de
14,5%. (Fonte: http://oglobo.globo.com/economia/mat/2010/04/06/estudo-do-ibpt-revela-que-aliquota-media-de-
impostos-na-area-de-saude-de-33-916262452.asp) – acessado em 07/07/2011.

117
A área de saúde em geral demanda pesados investimentos em recursos humanos e
tecnologia de ponta. A atualização dos profissionais, dos equipamentos e técnicas
aplicadas tem de ser permanente e, portanto, requer a destinação de cifras vultosas.

Há ainda que mencionar que a inflação na área de saúde é muito maior do que a de
outros setores da economia em qualquer parte do mundo, uma vez que boa parte dos
equipamentos, medicamentos e materiais utilizados é importada, cara e logo necessita
de substituição frente aos avanços científicos e tecnológicos.260

De outro lado, sabe-se que haverá um aumento considerável de idosos nos próximos
anos, o que denota o envelhecimento da população. Essa visão demográfica do
assunto será detalhada mais adiante e um artigo à respeito será publicado. Do lado
privado ainda há reclamações sobre a grande interferência do Estado nos serviços da
saúde privada261 e uma tendência de elevação dos custos de assistência médica nos
preços dos remédios, equipamentos e administração, embora ser o regulador o
Estado.
Ao longo destes poucos anos, o sistema de saúde foi se adaptando e regulamentando
todos os entraves e chaves de segurança que, aos poucos, apareceram nos vários
pontos do país. Daí, com o objetivo de melhorar todas as relações do setor,
regulamentos não faltaram. Criaram-se definições de planos de saúde, repactuações,
definições na área odontológica e médica, formas de liquidação de operadoras,
modelos de contratos, definição de segmentações, faixas etárias, abrangências
geográficas, mas faltava, na hierarquia, um órgão que administrasse e resolvesse as
pendências que até essa data ainda persistiam. Foi necessário regular e controlar, já
que a lei 9656/98 – dos planos de saúde - não era suficiente.

Muitas foram as discussões à respeito e algumas delas foram elaboradas previamente


especialmente aos gestores das empresas operadoras de assistência à saúde, que
enriquecem o debate, sobre os seguintes aspectos:

a) Possibilidades de assegurar ao beneficiário, cobertura integral e regular às


condições de acesso aos planos de saúde e como reagem os operadores
relativamente ao aumento do alcance da ANS em relação a sua interface de trabalho
com a população e o Ministério da Saúde e o que pensam as operadoras sobre a
definição e o controle das condições de ingresso, operação e saída das empresas e
entidades que operam no mercado;

260
Segundo dados da FIPE, a variação do INPC no período de janeiro de 1995 a janeiro de 2006 foi de 135,6%,
enquanto a dos índices de inflação saúde foi de 196,4%. O economista Cláudio Salm, do Laboratório de Economia
Política da Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz que os gastos do governo com saúde são
inferiores ao desembolso privado. De cada R$ 100,00 destinados ao setor, R$ 45 saem do orçamento público, dados
compatíveis com os da OMS. Segundo o professor, 55% dos gastos brasileiros com saúde são privados. Significa dizer
que há uma parcela expressiva de brasileiros mal servidos, porque não tem dinheiro nem para pagar planos de saúde,
nem para custear remédios. Para ele, o que chama a atenção nos gastos privados é a enorme participação das
despesas diretas. “São exames e intervenções não cobertos pelos planos de saúde, pagos também por particulares, e,
principalmente medicamentos. Esses gastos, quando dependem do nível de renda, podem ter conseqüências
catastróficas para quem é pobre”, diz Salm. Apesar de todos os conflitos trata-se de um setor de fundamental
importância, uma vez que atende a população, que, de uma forma ou de outra (pública ou privada), tem de ter acesso
a uma assistência digna e de qualidade. (Amorim, 2006 – O Globo/Coluna Panorama Econômico, de 07/01/06).
261
Mas também na saúde privada trata-se de um “Direito do cidadão e um dever do Estado” – CF/1988).

118
b) Verificação da validade e do funcionamento dos mecanismos legais de garantias
assistenciais e financeiras, como as provisões obrigatórias, que assegurem a
continuidade da prestação dos serviços de assistência à saúde contratados e os que
poderão advir de novas contratações;

c) Transparência e garantia da integração do setor de saúde suplementar ao SUS de


forma compartilhada e o ressarcimento de gastos gerados por beneficiários do sistema
público que são portadores de planos de saúde;

d) O que pensam os operadores sobre o estabelecimento de mecanismos de controle


e abuso de preços e a satisfação das necessidades do sistema de regulamentação,
normatização e fiscalização do setor de saúde suplementar;

e) Posicionamento da ANS face aos problemas de prestação de serviços em saúde no


geral e sua posição em relação a saúde das elites e ainda, discussão sobre o duplo
pagamento, ou seja, recolhimentos ao INSS e, ao mesmo tempo, pagamento de um
plano ou seguro de saúde;

f) Alta complexidade, seus custos e suas implicações de impacto no sistema geral de


assistência à saúde e verificação da perspectiva de aumento da quantidade de
beneficiários, fazendo alterações no status quo;

g) Discussão das possibilidades de apresentar “fatores moderadores” , flexibilização


de coberturas, na utilização de planos via empresas com o objetivo de reduzir preços
finais;

h) Verificação de estabelecimento de relações de compartilhamento entre o que


acontece na saúde suplementar e o que acontece na saúde pública e análise do
comportamento da ANS e sua coerência em relação à prestação de serviços de saúde
dos brasileiros;

i) Reflexão sobre o atual estágio da saúde suplementar e sobre os atores corporativos


para que se possa tomar novas decisões de direcionamento e rediscussão das
possibilidades de reduções consideráveis nos preços dos planos de saúde em vista de
novas estratégias que possam ser adotadas, aumentando o mutualismo com planos
empresariais coletivos - na forma do capitation - oferecidos para as micros, pequenas
e médias empresas;

j) Considerações se a alta complexidade é um entrave comercial para o


desenvolvimento do mercado e das pequenas operadoras de planos de saúde ou é
benéfica.

k) Modelos econométricos mais sofisticados para obtenção de precificações de planos,


conforme histórico do usuário e tempo de exposição ao risco.

l) Questionamento sobre a necessidade ou não de um índice econômico somente para


o setor de saúde com o objetivo de deixar claro aos consumidores os problemas
gerados por aumento ou reajuste das mensalidades.

119
Posteriormente, em 2002, o Congresso Nacional, provocado por instituições de Defesa
do Consumidor e entidades médicas, instaurou uma CPI a pedido do deputado
Henrique Fontana. Argumentava-se, nessa CPI, que os planos de saúde eram
verdadeiras caixas pretas, pois se desconheciam os números da sua atividade.262

Essa CPI encerrou-se em dezembro de 2003, gerando um longo relatório de 24


deputados com as sugestões de alterações na lei e supressão de artigos relativos aos
assuntos:

1) Proibição do cheque caução - os hospitais exigiam cheque de garantia quando da


internação de um usuário;
2) Criminalização dos falsos planos e cartões de desconto - existiam planos falsos, ou
seja, não registrados na ANS e também foi definido que os cartões de descontos263
não seriam aceitos como planos de saúde;
3) Contratos obrigatórios entre operadoras e prestadores - a partir da lei todos os
prestadores de serviços e credenciamentos deveriam ter contrato bilateral de direitos e
obrigações;
4) Redução da carência para doenças preexistentes - as carências variavam de
empresa para empresa e não havia uma padronização das carências;
5) Fiscalização de planos coletivos pela ANS;
6) Foram estudadas formas, na época - ainda não aplicadas - do direito do usuário
trocar de plano, sem cumprir novas carências;
7) Foram discutidas formas de aplicação da assistência à saúde privada junto aos
institutos de assistência a servidores;
8) Discutiu-se as ações de prevenção e direitos dos usuários após liquidação de
operadoras;
9) Os procedimentos estéticos foram objeto de reflexões na atividade do setor de
saúde suplementar;
10) Discutiu-se a bi-tributação do ISS;
11) As formas de migração de planos antigos para novos;
12) Normatização e fiscalização dos contratos antigos com base do CDC;
13) Formatação de reajustes com critérios regionais e planilhas de custos;
14) Repasse automático de reajustes a prestadores e mais rigor no registro das
operadoras, registro nos Conselhos de medicina e odontologia;
15) Formas de transferência e arrendamento de carteiras e melhoria do controle
social;
16) Formatação do concurso público na escolha de diretores da ANS e definidas
metas referenciais, núcleos regionais de fiscalização;
17) Definição das formas de verificação de glosas abusivas;
18) Central de atendimento a usuários, central de atendimento a prestadores, melhoria

262
Editorial da Revista Abramge - 1a. página - número 182 – ano 2003
263
Trata-se de empresas que fornecem um cadastro de médicos, dentistas e hospitais – do qual eles fazem um
convênio para descontos – e ganham um percentual dos atendimentos pagos pelos usuários. Não é Plano de Saúde,
não está previsto em Lei e por isso ainda existem. Se for Operadora não pode ter esse tipo de operação, conforme a
RN-40 de junho de 2003. “Art. 1º Fica vedada às operadoras de planos de assistência à saúde e às seguradoras
especializadas em saúde a operação de sistemas de descontos ou de garantia de preços diferenciados a serem pagos
diretamente pelo consumidor ao prestador dos serviços, bem como a oferta de qualquer produto ou serviço de saúde
que não apresente as características definidas no inciso I e § 1º do art. 1º da Lei n.º 9.656, de 1998”.

120
do ressarcimento ao SUS, banco de preços, incorporação de tecnologia e protocolos
médicos;
19)- Sanções para propaganda enganosa;
20)- Definições de urgência e emergência, rol de alta complexidade e problemas
relativos a falsos planos coletivos;
21)- Definições de reajustes por faixa etária e problemas resultantes de contratos
antigos mantendo inúmeras restrições, exclusões para casos de graus de miopia,
exclusões em casos de planos odontológicos, reclamações de médicos.

Ao se ler o relatório tem-se a impressão de que falta tudo no sistema de saúde


suplementar e que a ANS não estava cumprindo o seu papel. Não era o caso. A
conclusão que se chegou é a de que essa agência não conseguiu ampliar a
quantidade de usuários de forma considerável, tendo em vista seus rigores e
controles, e que crises econômicas, baixos salários e muitas reclamações geraram
condições para que a CPI fosse criada. Quase tudo foi rediscutido.

Porém, o aumento da base na pirâmide social, relativamente ao atendimento das


operadoras para a população, não foi atingido nessa discussão, deixando, mais uma
vez, que um plano de saúde seja ainda um “sonho distante” para muitos brasileiros.

Se verificarmos as informações mais atualizadas do PNAD / IBGE / 2008 e as


comparações de aumento ou diminuição do contingente da população que tem planos
de saúde, concluímos que:

a) Em 1998, havia na região Norte 17% de pessoas com planos de saúde, em 2003
caiu para 14,8% e em 2008 caiu novamente para 13,3%.

b)-No Nordeste eram 12,4%, caiu para 12,1% e subiu pouco para 13,2%.

c)- Na região sudeste, 33,3% em 1998, caiu para 32,9% em 2003 e em 2008 subiu
para 35,6%.

d)- No Sul, 25,3%, aumentou para 27,9% em 2003 e em 2008 aumentou para 30,0%.

e) No Centro-Oeste, a situação é de 1998, 22,5% da população tinha plano de saúde,


aumentou para 24,7% em 2003 e em 2008 houve pequeníssima redução para 24,6%.

f)- Se analisarmos, no Brasil como um todo, em 1998, em média, havia 24,5% de


pessoas com planos, aumentando pouco para 24,6% em 2003 e pouco também para
2008, mas mantendo um percentual de 25,9%.

Tais colocações não se referem aos segmentos populacionais mais pobres ou


excluídos. O que se tenta elucidar são as possibilidades de pessoas, cuja renda
familiar se situe entre três e seis salários mínimos, serem atendidas em redes
particulares administradas pelas operadoras de saúde. Esse é um dos vetores que
poderão se tornar reais como resultados das mudanças propostas, principalmente,
considerando que uma nova classe C está surgindo no Brasil.

121
Obviamente, o atendimento poderia ser melhor e ainda trazer economia ao governo.
Não é um sonho, é uma realidade plausível. O crescimento só será possível quando
se aumentar a base de atendimento privado de saúde com planos empresariais mais
baratos e produtos para população de renda mais baixa. Torna-se necessário,
portanto, que governo, via ANS e operadoras, criem mecanismos de aproveitamento
da imensa estrutura existente na rede privada para atendimento dessa população que
está empregada, com carteira assinada em pequenas, médias e micro empresas.
Além disso, necessário é também atender àqueles que não estão empregados,
todavia, têm renda e podem pagar planos mais baratos que são os autônomos ligados
a alguma associação legalmente constituída. Nos dois casos, são milhões de pessoas.

Claro que tais mudanças e ampliação dessa base de clientes deverá ser
compartilhada entre governo e iniciativa privada com flexibilização fiscal ou outras
formas de troca de interesses. Esse é o momento social adequado, pois a população
não pode ficar só à mercê do atendimento no SUS. A materialização dessa troca de
interesses é assunto de discussão e reflexão entre milhares de operadores,
prestadores de serviços na saúde privada, ANS e o Ministério da Saúde, não cabendo
neste trabalho seus detalhamentos operacionais.

Tabela IV

Distribuição dos Planos de Assistência à Saúde Registrados na ANS por


Segmentação Assistencial - 2002

SEGMENTAÇÃO QTDE DE PLANOS %


Ambulatorial 2603 8,19%
Hospitalar com obstetrícia 333 10,49%
Hospitalar sem obstetrícia 159 5,01%
Odontológico 3968 12,49%
Referência 986 3,10%
Ambulatorial+hospitalar com obstetrícia 12915 40,64%
Ambulatorial+hospitalar sem obstetrícia 4225 13,30%
Ambulatorial+odontológico 308 0,97%
Hospitalar c/ obst+odontológico 141 0,44%
Hospitalar s/ obst+odontol. 125 0,39%
Amb+Hospit+obst+odont 1357 4,27%
Amb+Hospit s/ obst+ odont 223 0,70 %
TOTAL 31776 100,00%

Fonte: ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar – 2002

Em fórum da Abramge264 - (2006) - já foi discutida a necessidade de criação de


produtos para atendimento da população de renda mais baixa: estima-se atualmente

264
Associação Brasileira de Medicina de Grupo – Abramge.

122
que haja um total próximo entre 50 e 52 milhões de pessoas nos planos particulares
como conhecemos, dos quais, entre 10 e 12 milhões são planos odontológicos. Vale
salientar, que havia, antes da Lei 9656/98, uma variedade imensa nos tipos de planos,
conforme se verifica na tabela IV.

Comentários e avaliações gerais

A modalidade de seguro-saúde ou planos de saúde, vinculada ao segmento do qual se


espera um alto grau de racionalidade do capital, produziu em 1993, como exemplo, 3
milhões de internações, responsáveis por 10,8 milhões de diárias hospitalares. Isso
significa, em média, uma internação para cada 12,9 usuários/ano com duração média
de 3,7 dias.265

As informações do SUS são que, no mesmo período, há uma internação por 9,6
usuários habitantes266, mas há uma diferença de 25% a menos a favor do setor
privado; ou seja, ou o setor privado é mais eficiente, ou as internações do setor público
foram mais complexas.

A comparação entre os números fornecidos pelo SUS e os dos seguros ou planos de


saúde, a despeito de restrições à comparação entre habitante e usuário, mostra que
eles estão relativamente próximos. Há quase 30 anos, isto é, até 1976, quando o
Seguro de Acidente no Trabalho era pago totalmente pelo governo, a Previdência
Social arcava com todas as despesas dos acidentados, cujo número chegou a
comprometer os seus recursos, causando saídas de caixa que alertavam para o
problema.

Essa questão foi resolvida por meio do compartilhamento entre o público e o privado e
de mudanças na legislação acidentária, ou seja, de forma compulsória. Não havia,
nessa época, agência regulatória e/ou normas específicas. Tal mudança teve
aprovação do Congresso Nacional. Desde então, a responsabilidade do pagamento ao
acidentado passou a ser da Previdência somente após o 16° dia de afastamento do
trabalhador. Com isso, conseguiu-se uma redução de 40% nos acidentes em um
período de oito anos de análise - 1975 a 1982.267

Após a mudança na legislação dos acidentes do trabalho, as empresas procuraram


criar as CIPAS, que eram organizações dentro da própria empresa, para dar cursos de
segurança, além de fornecer aos trabalhadores roupas, material adequado para seu
trabalho e cartilhas para o caso de desenvolvimento de trabalhos considerados
perigosos.

265
Fonte: - Abramge - Associação Brasileira de Medicina de Grupo – 2006.
266
Fonte SUS - Sistema Único de Saúde - Anuário 2000.
267
Cadastro da Comunicação de Acidente de Trabalho – CAT - A Comunicação de Acidente do Trabalho – CAT foi
prevista inicialmente na Lei nº 5.316/67, com todas as alterações ocorridas posteriormente até a Lei nº 9.032/95,
regulamentada pelo Decreto nº 2.172/97. A Lei nº 8.213/91 determina no seu artigo 22 que todo acidente do trabalho
ou doença profissional deverá ser comunicado pela empresa ao INSS, sob pena de multa em caso de omissão. Cabe
ressaltar a importância da comunicação, principalmente o completo e exato preenchimento do formulário, tendo em
vista as informações nele contidas, não apenas do ponto de vista previdenciário, estatístico e epidemiológico, mas
também trabalhista e social. Portaria número 5051 de 26 de fevereiro de 1999.

123
Tais cuidados permanecem até os dias atuais, de forma mais bem regulada, na
empresa através da medicina ocupacional, e deram origem a muitas outras empresas
especializadas no setor, inclusive, fazendo exames admissionais e demissionais. São
as conhecidas Normas Regulamentadoras - NRs, cuja legislação atualmente é
abrangente e têm vida própria. Tais fatos demonstram que o compartilhamento é
possível e pode ser solução para muitos problemas em várias áreas.

De certa forma, o salário-maternidade que passou a ser pago pela empresa a partir de
1.° de setembro de 2003 não deixa também de ser um compartilhamento entre o
público e o privado. Em decorrência do pagamento do benefício pela empresa à
empregada gestante, as empresas compensarão o referido valor quando dos
recolhimentos das contribuições incidentes sobre as folhas de salários e demais
rendimentos pagos ou creditados.

É o caso realmente de compartilhamento efetivo, no qual todas as partes envolvidas


ganham, quando essa alternativa é possível e funcional. Verifica-se também, como
exemplo, o compartilhamento entre o público e o privado na inclusão digital. A esse
respeito, afirma Gonzáles (2005).

Após a Lei 9656/98 a situação é praticamente a mesma, com a diferença de que a


saúde suplementar atualmente está regulada. É preciso evoluir. A atividade agora está
em outro momento, por isso é preciso mudar o repertório ou no mínimo, refletir sobre
ele. “Vamos ter de compartilhar o trabalho da maneira mais ampla possível...” .268
Keynes, 1930 - (Apud Dowbor 2004).

Enfim, há muito que se fazer ainda, mas grandes foram os avanços. De fato, houve
muita pressão, principalmente da classe média, a grande consumidora da saúde
suplementar, e a legislação - extensa, complexa e que vem sofrendo inúmeras
alterações - veio para ficar e tem sido discutida nesses últimos anos em vários fóruns
públicos e privados, cada qual com seus interesses. De um lado, as operadoras
tendem a supor que essa lei pode levá-las à falência; de outra, o governo, via ANS
tem se mantido firme em suas resoluções. Com raras exceções, há um consenso de
que o sistema de saúde suplementar, como vimos, hoje regulado pela ANS, em muito
ajudou a saúde brasileira269. 270 Essas afirmações estão contidas em pesquisas.

Segundo Montone (2001), houve profundas transformações no segmento, agregadas


a um grande esforço de eficácia, representando sua inserção na esfera do novo
aparato de intervenção do Estado brasileiro: o das agências reguladoras,

268
Referindo-se as palavras de Keynes ainda em 1930. Dowbor – (2004) - pág. 51
269
Assim é que, em recentes pesquisas encomendadas pela ANS ficou constatado que 84% dos milhões de
consumidores estão satisfeitos com seu plano de saúde. Em outra pesquisa do IBGE mostrou que entre os 20,1
milhões de pessoas atendidas nas duas semanas anteriores à entrevista, por encomenda do Ministério da Saúde,
35,5% delas haviam usado plano de saúde nos últimos 30 dias e 86,2% avaliaram como “Bom” ou “Muito bom” o
atendimento recebido.
Pelo Data-Folha o percentual foi de 84%, por pesquisa da Fiesp/Ciesp juntamente com o Sindicato dos Metalúrgicos foi
de 80% de bom o nível de satisfação dos empresários e trabalhadores. (Revista Medicina Social de Grupo - Abramge -
out/nov/dez/2004 - n.° 187 - página 4). As reclamaç ões nos órgãos de defesa do consumidor prendem-se, em sua
maioria, a problemas de reajustes de preços e não de atendimentos.
270
Há ainda outras pesquisas da R.A.E. – Revista Eletrônica – de Pesquisa de satisfação, um modelo para Planos de
saúde de Gabriel Sperandio Milan, UCA e de Guilherme Trez, Unisinos. (2005). RAE-eletrônica, v. 4, n. 2, Art. 17,
jul./dez. 2005

124
potencializando a efetividade da regulamentação.271

De fato, aprovada, a lei 9656/98 trouxe muitos benefícios, mas também paralisou
parcialmente o sistema de saúde suplementar. Há ainda muito que se regulamentar,
pois o conteúdo da legislação em vigor traz em seu bojo o acompanhamento técnico e
impõe às seguradoras e operadoras de assistência médica a necessidade de
avaliações anuais, revisões de provisões técnicas, acompanhamento de auditoria
independente e normas para precificação dos planos em andamento e daqueles que
serão lançados. Todavia, a alarmante elevação da sinistralidade é a atual maior
preocupação dos gestores operadores de saúde, segundo Miranda (2005). 272

Os planos prevêem ainda três tipos de reajustes: por faixa etária, por custo financeiro -
devido a inflação e custos médicos, e, e por sinistralidade. Os dados sobre
sinistralidade estão diretamente ligados a contratos coletivos e dependem da
quantidade de usuários da apólice. Sinistralidades acima de 75% chamam a atenção
para renegociações.273

Embora jovem, o sistema parece tender ao amadurecimento, pois se observa que,


apesar das dificuldades, há interesse de grandes empresas na atividade e de outras,
menores para entrar no setor, algumas delas ligadas aos bancos e empresas
estrangeiras estritamente dessa atividade. Enfim, o setor deseja crescer.274 A
configuração do mercado em 2010 comparando-se com 2000, ou seja, doze anos
após a legislação de 1998, é a seguinte: há ainda os sistemas de Auto-gestão, o
aparecimento de Administradoras especializadas na prestação de serviços em saúde
e outras, de prestação de serviços gerais, trazendo novas tecnologias para o meio. Os
hospitais, por sua vez, desenvolvem novas técnicas e aplicam softwares para
consecução de protocolos hospitalares, sistemas de controle, técnicas avançadas de
diagnósticos de grandes laboratórios e de sistemas de administração.

Judicialização da Saúde

Percebe-se a necessidade de reestruração. Arranjos institucionais podem ser revistos


sob aspectos de legislação, comerciais e de gestão. Nota-se a necessidade de mudar
alguns focos da ANS, sendo que um deles é a urgência de trazer de volta os usuários
que desistiram dos seus planos de saúde ou migraram para outros de preços mais
acessíveis. Isso é necessário, pois, aumentando o mutualismo, pulveriza-se o risco,
dizem as operadoras e os técnicos. Outro legado que gera muitos problemas na área
de saúde suplementar são as ações contra as Operadoras e/ou as Medicinas de
Grupo.

O advogado e professor de Direito Comercial da UFRJ, Luiz Felizardo Barroso, (2010),

271
ISBN85-334-0374-7 - Série ANS - número 2 - Januário Montone - Diretor Presidente da ANS - 2001 - pág.18.
272
Entre 1995 e 2003, o percentual de sinistralidade aumentou em 17%, passando de 73,4% para 86,22% (Miranda,
2005).
273
Fonte: http://www.segurado.com.br/saude_reajuste.asp - acessado em 28/02/2006.
274
Com o neoliberalismo em pauta e a conseqüente abertura econômica, agora é a vez das empresas estrangeiras de
seguros de saúde, que já dominam 11% do mercado, que iniciam sua entrada no país. Algumas já chegaram e outras
já saíram do Brasil, como a Cigna, Golden Cross, Amico, AIG (Unibanco), Aetna (Sul América) e Hartford (Icatu).
Coerentemente com suas práticas, todas elas são ligadas a instituições financeiras. Fonte: Revista Espaço Acadêmico
- Ano II - número 20 - ano 2003 - Mensal - ISSN-15196186.

125
afirma que, a princípio a “desjudicialização” das questões da saúde, ou seja, a trégua
das ações judiciais é o caminho mais racional para reduzir a sobrecarga de processos
avaliados, repetidas vezes pelas varas cíveis da justiça brasileira. Os atores da cadeia
são bastante antagônicos entre si; a receita, considerando-se os ingredientes dos
representantes de cada parte, exigirá novas leis para corrigir as imprecisões do
sistema, um Estado de fato disposto a oferecer serviços mais adequados à população,
de modo a desafogar a excessiva gama de serviços transferidos, por bem ou por mal,
à iniciativa privada e um consumidor consciente dos seus direitos e deveres. Em vez
de Justiça, também as cortes arbitrais, podem ser muito úteis, desde que obedecendo
a legislação vigente, poderão ter uma participação proativa, impedindo que as disputas
convertam-se em futuras ações judiciais. 275

É o momento da estrutura conseguida no privado, hoje comprovadamente eficiente,


conforme pesquisas da ANS e Data-Folha 276 (2004 / 2005) atenderem a outras
necessidades da sociedade, via planos empresariais mais acessíveis, através das
pequenas, médias e micro empresas e atendimento daqueles que não estão ligados a
nenhum CNPJ como arranjo complementar, como veremos adiante.

A desjudicialização da saúde é um assunto muito complexo e delicado: há um avanço


na longevidade que trouxe e vai trazer outros impactos para o seguro de vida,
previdência e para os planos de saúde. O País deverá lidar ainda com questões
éticas, morais e de envolvimento da família. Há também a questão do avanço
tecnológico, que prolonga a vida de uma pessoa em alguns casos por mais de um mês
na UTI.277

Apesar da Constituição Federal de 1988, garantir a participação da iniciativa privada


de forma complementar na assistência à saúde, conflitos ainda perduram. Não raro
vemos manifestações práticas dessa situação, que em vez de atuar em prol dos
usuários, dificulta a implantação de um Sistema de Saúde Brasileiro, que poderia ter
dois grandes sub-sistemas: o Estatal, representado pelo Sistema Único de Saúde -
SUS e o Sistema Suplementar de Saúde, sob a coordenação e fiscalização da ANS -
275
Nos planos antigos, os usuários convivem com maior insegurança jurídica e precisam recorrer ao Judiciário em
resposta às negativas de coberturas e cláusulas abusivas, mesmo nos casos em que há jurisprudência pacificada,
destacam órgãos de defesa do consumidor. Já os planos novos têm menos controvérsias porque atualizam seu Rol de
Procedimentos médicos por exigência da ANS. Mas há centenas de casos em planos antigos, em que a tecnologia
oferece, por exemplo, condições de se colocar um “stent” , numa situação em que evita-se a cirurgia coronariana,
todavia, a Operadora se nega a pagar o Hospital, tendo em vista que tal procedimento não está previsto em contrato e
a denomina como uma prótese. É óbvio, que não há previsão. O plano foi assinado há 20 ou 30 anos e é claro que a
colocação do “stent”, na época, nem era previsto como procedimento médico. O certo é que, até alcançar o modelo
ideal, parece claro que as negativas de coberturas, a demora em conseguir consultas em algumas especialidades e
exames mais complexos continuarão a impor um estado de tensão permanente na relação entre as operadoras e
segurados de planos de saúde, em posicionamentos antagônicos. (Fonte: Revista Apólice, ano 15, número 141 –
julho/2010).
276
Assim é que, em pesquisas encomendadas pela ANS ficou constatado que 84% dos milhões de consumidores
estão satisfeitos com seu plano de saúde. Em outra pesquisa do IBGE mostrou que entre os 20,1 milhões de pessoas
atendidas nas duas semanas anteriores à entrevista, por encomenda do Ministério da Saúde, 35,5% delas haviam
usado plano de saúde nos últimos 30 dias e 86,2% avaliaram como “Bom” ou “Muito bom” o atendimento recebido.
Pelo Data-Folha o percentual foi de 84%, por pesquisa da Fiesp/Ciesp juntamente com o Sindicato dos Metalúrgicos foi
de 80% de bom o nível de satisfação dos empresários e trabalhadores. (Revista Medicina Social de Grupo - Abramge -
out/nov/dez/2004 - n.° 187 - página 4). As reclamaç ões nos órgãos de defesa do consumidor prendem-se, em sua
maioria, a problemas de reajustes de preços e não de atendimentos.

277
Este é um tema que ultrapassa o âmbito brasileiro, como mostra Michel Porter e Elizabeth Teisberg no livro
“Repensando a Saúde”. (Bibliografia). Precisamos rever a questão da trégua nas ações judiciais com muita seriedade.
(Palavras de Ariovaldo Bracco – Presidente da Acoplan – Associação dos Corretores de Planos de Saúde e
Odontológicos do Estado de São Paulo – Revista Apólice, pág. 29 – ano 15, número 141 – julho/2010).

126
Agência Nacional de Saúde Suplementar e das operadoras de planos privados de
assistência à saúde. Há espaço para a atuação de ambos os sistemas e eles se
complementam. Eventuais erros e/ou problemas existentes em um dos sistemas, não
justifica a negação do outro. O caminho adequado é a adoção de medidas corretivas
para cada situação e dosadas a cada circunstância, nos termos da legislação vigente,
desonerando o SUS. Há espaço para um apêndice de parceria, e tais gastos poderiam
ser reembolsados às operadoras de acordo com uma tabela de remuneração com
base nos preços praticados no mercado de serviços de saúde.

Segundo Cata Preta (2004), “ estimular e facilitar a adesão das pessoas e das
empresas aos planos privados de saúde é, pois, uma forma de parceria público-
privada, que viabilizará o Sistema Único de Saúde, permitindo que se estruture e se
passe a prestar à população, que efetivamente dele necessita, um serviço de
qualidade, assegurando a plenitude da cidadania às classes menos favorecidas...”278

No 7.° Simpósio dos Planos de Saúde, (2004), promov ido pela Abramge, foi defendida
a viabilidade de se criar sub-segmentações, conforme a região e o poder aquisitivo da
população, para aumentar o número de usuários de renda menor na medicina privada
para desafogar o SUS.279 A idéia comum é a da criação de novos rumos e, nesse
caso, são válidas discussões de rotas diferenciadas, no sentido de aumentar o volume
de atendimento privado, compartilhar a saúde empresarial com a saúde pública e
detectar em que aspectos podem ser efetuadas mudanças que minimizem os
problemas da saúde em geral. É válida essa discussão no sentido de sempre
melhorar a qualidade de atendimento da Saúde em geral, tanto privada quanto
pública, embora tais sub-segmentações estejam – como alguns defendem – na contra-
mão da política da própria ANS.

No plano macro-institucional é fundamental rediscutir o papel do Estado e da iniciativa


privada na saúde. Cláudio Rocha Miranda, (2005) do MBA – Gerência da Saúde da
FGV, afirma que o Estado quer um sistema complementar forte e, para isso, tem um
entendimento de que a saúde privada pode reduzir milhões de atendimentos em
órgãos públicos e, com isso, aliviar a quantidade de pessoas que procuram o SUS.
No plano micro, das operadoras, é importante a redefinição do conceito de rede de
prestadores. É necessária a sua reestruturação, o estímulo às parcerias e à rede
própria. 280 A rediscussão do Rol de Procedimentos da atividade de saúde
complementar é muito dinâmica e sempre haverá necessidade de novos atendimentos
além de atividades diferenciadas na linha médica e de exames complementares.

Os planos de saúde já incluíram 70 novos procedimentos médicos e odontológicos a


partir de 7 de junho de 2010, segundo determinação da ANS, publicado no Diário
Oficial da União. Entre um dos procedimentos fundamentais na discussão está a
inclusão do transplante de medula óssea.281 A nova norma atualiza os procedimentos

278
Funenseg - Fundação Escola Nacional de Seguros - Fundación Mapre Estudios - Madrid - Espanha - Horácio L.N.
Cata Preta - “Gerenciamento de Operadoras de Planos Privados de Assistência à Saúde” - ISBN 85-7052-453-6 -
Edição de 2004, p. 21-22.
279
Revista Medicina e Saúde - n.° 187 - out/nov/dez/20 04 - Palavras do Dr. Arlindo Almeida - Presidente da Abramge,
280
Revista Abramge - Assoc. Brasileira de Medicina de Grupo - p.28 - Revista 188 - jan/fev/mar/2005 - Cláudio Rocha
Miranda - prof. MBA - gerência de Saúde - Fundação Getúlio Vargas e Diretor de Saúde da Fundação Cesp.
281
Trata-se de transplante alogênico – de uma pessoa para outra – de medula óssea.

127
inclusos na cobertura mínima obrigatória oferecida pelas Operadoras de Planos de
Saúde a todos aqueles que possuem contratos celebrados a partir de 29 de janeiro de
1999 – data em que entrou em vigor a Lei de regulamentação do setor de saúde.

Além do transplante de medula óssea, também passam a estar inclusos nos planos
básicos o exame de Pet-Scan, usado para diagnosticar câncer,282 além de outros,
implante de marca passo multissitio, oxigeno terapia hiperbárica e mais de 20 tipos de
cirurgias torácicas por vídeo. Ao todo, cerca de 40 milhões de pessoas que adquiriram
ou adaptaram planos de saúde a partir de janeiro de 1999, serão beneficiados pelas
mudanças. Além da inclusão desses novos procedimentos, também passam a valer
outras normas como a cobertura pelos planos coletivos aos acidentes de trabalho e
aos procedimentos de saúde ocupacional 283 e atendimento em hospital – dia – para
necessidades em saúde mental.

Miranda (2005), diz que tradicionalmente, sabe-se qual é o papel das agências ou
órgãos responsáveis, no caso, a ANS e o Ministério da Saúde. Um deles é ter sempre
como estratégia o aumento da quantidade de atendimentos à população, pois a
evasão da saúde suplementar aumentou de forma considerável até 2006 os
atendimentos e problemas do SUS 284.

A partir daí surgem necessidades de apresentar alternativas por meio de novas


premissas. Uma delas é ter como meta, alternativas para proporcionar planos coletivos
de assistência médica junto as micros, pequenas e médias empresas a preços mais
acessíveis. No plano da regulação e fiscalização, a ANS mostra-se disposta a sair do
casulo, ainda que sob a desconfiança dos que são porta-vozes dos consumidores. Em
agosto de 2010, por exemplo, a Agência planeja estrear um novo mecanismo de
mediação de conflitos entre operadoras de planos de saúde e consumidores que
tiverem pedidos de cobertura negados. Trata-se da Notificação de Investigação
Preliminar (NIP), cujo objetivo é confirmar denúncias dos pacientes com mais rapidez
e exigir que as operadoras revejam as decisões e permitam os procedimentos
médicos.285

O aumento na quantidade de usuários deve ser a meta da ANS e de seus agentes,


pois, aumentando o mutualismo, ou massa crítica, via planos coletivos empresariais,
com descontos em folhas de pagamento, haverá uma tendência de redução de custos
e preços finais Finalmente, confirma-se que essas reflexões continuam, da parte das
Operadoras, pois, no seu 9.º Congresso em (2001) 286 patrocinado também pela
Abramge, foram levantados e discutidos alguns importantes itens, tais como:
282
Além de mais 16 novos procedimentos no plano odontológico e aumento de consultas para nutricionistas,
fonoaudiólogos, terapeutas e psicólogos. As Operadoras tiveram 5 meses para adaptarem-se às novas regras.
283
Outra mudança é o fim da limitação de 180 dias de atendimento em hospital-dia para pacientes com necessidade
de acompanhamento da saúde mental. De acordo com a ANS, a medida visa substituir as internações psiquiátricas.
(Arte Folha On Line – 12/01/2010).
284
Ver Revista Abramge - pág. 28 - Revista 188 - Medicina Social - Artigo de Cláudio da R. Miranda - 2005.
285
“A NIP é uma oportunidade de avanço na regulação do setor. Neste caso, o regulador procura ir além da sua função
de normalização e fiscalização para mediar conflitos. Sendo bem sucedida, é uma boa iniciativa para reduzir os custos
de transação no mercado, tornar mais ágil o atendimento da demanda contratual quando for o caso e evitar-se o litígio.
A autarquia está normatizando a NIP precisamente porque o projeto-piloto implantado há mais de um ano mostrou
resultados positivos” (Palavras de Márcio Coriolano da Fenaseg. ) (Fonte: Revista Apólice ano 15, número 141,
julho/2010).
286
Congresso de 2001 - “Estratégias para o crescimento sustentado” - Realização Abramge em 22 e 23 de novembro
de 2001 - Hotel Inter-Continental - Rio de Janeiro - RJ.

128
1) Desenvolver produtos para a população de renda mais abaixo daquela a que
estamos acostumados a operar como planos de saúde e ir atrás de outras questões;

2) Como fornecer mais cuidados à saúde para o máximo de pessoas possíveis?

3) Como financiar o Sistema?

4) Quem ganha com a saúde? a) a indústria farmacêutica? b) é a indústria do fumo?


c) São as seguradoras? d) São as operadoras? e) Outros?

5) Como estabelecer diretrizes e controle?

6) Qual a melhor forma de gestão?

7) O mercado de mais de 100 milhões de pessoas no Brasil existe de fato?

8) O capitation seria uma alternativa?

9) Será possível atender as pequenas, micro e médias empresas de até no mínimo,


por exemplo, 5 funcionários?

10) Será possível um multi-patrocínio para saúde dos trabalhadores de pequenas


empresas?

Dados e reflexões

O setor saúde representa atualmente no Brasil em torno de pouco mais de 7% do PIB


e gera dois milhões de empregos diretos e outros cinco milhões, indiretos. A previsão
orçamentária para o setor em 2006, segundo dados do Ministério da Saúde / IPEA /
Abramge /Fenaseg de março desse ano, foi de um total de R$ 136 bilhões, assim
divididos: R$ 35 bilhões para o sistema suplementar; R$ 43 bilhões para o SUS/MS;
R$ 20 bilhões para o SUS/Estaduais; R$ 19 bilhões para o SUS/Municipais e outros
R$ 19 bilhões para gastos pessoais. Os dados atuais, do CNS, e agosto de 2011,
informam que: os serviços de saúde no Brasil, cadastrados no MS, municipais são
63.043, estaduais 2.640, federais 264 e privados 170.279, ou seja, resumindo, o total
de públicos é 65.947 e o de privados 170.279.

Quanto a leitos hospitalares no Brasil, os dados do CNS de agosto/2011, informam


que existem para Cirurgia do SUS 76.180 leitos e não SUS 41.126; quanto a clínica
geral 83.148 do SUS e 31.698 não SUS; quanto a Psiquiatria 38.228 do SUS e 10.674
não SUS; de Pediatria 50.178 são do SUS e 11.740 não SUS; para Obstetrícia do
SUS 45.064 do SUS e não SUS 14.260. Há ainda outros, de caráter geral, do SUS
50.080 do SUS e 13.372 não SUS. Em resumo, há 342.878 de leitos do SUS e
122.870 do não SUS, fornecendo um total de 465.748 leitos entre SUS e não SUS.

Dados da OMS (WHO), revelam que enquanto no Brasil em 2004, gastou-se US$ 256
per capita com saúde, a Argentina, investiu US$ 352; o Canadá, US$ 2.992; os

129
Estados Unidos US$ 6.103 e a França, US$ 3.359. Em 2005, enquanto o Brasil teve
um orçamento de R$ 121 bilhões de reais, cerca de US$ 52 bilhões, nos EUA a verba
para a área foi de US$ 1 trilhão e 800 bilhões. (Amorim, 2006).

Com relação aos serviços de saúde cadastrados no MS, tínhamos em 2006 um total
de 80.120 privados; 50.570 municipais; 2.169 estaduais e apenas 211 federais, de
acordo com os dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES),
divulgados em junho de 2006. Em resumo, dispomos de um total de 51.950 serviços
públicos de saúde no Brasil frente a 80.120 privados, totalizando 133.070 serviços do
gênero no país. 287 (Amorim, 2006).

Uma pesquisa realizada pelo IBGE/MS, e divulgada em março de 2005, revelou que o
SUS realizou quase 12 milhões de internações; mais de 2 milhões e 400 mil partos;
40.496 transplantes; quase 9 milhões de sessões de terapias renais substitutivas; mais
de 1 trilhão de procedimentos ambulatoriais e quase 350 mil exames laboratoriais.

Segundo pesquisa feita pela Abramge/Unimeds/Fenaseg, referente aos procedimentos


realizados em 2005 pelo sistema suplementar, foram registrados 154 milhões de
consultas médicas; 4,93 milhões de internações e 258 milhões de exames
complementares/procedimentos. 288 São dados que mostram a evolução do privado
em relação ao público e que podem ser compartilhados no futuro. Fazendo-se uma
retrospectiva das avaliações Público/Privado na Saúde, com base em Massaro (2001),
da Stra Consultores, sabe-se que na mesa redonda “Saúde Brasil - 1999” 289 já se
discutia essa idéia de compartilhar o público e o privado. Seguem abaixo, frases que
fizeram parte das palestras sobre o assunto.

“...a única maneira de se conseguir progresso relevante na área de saúde é criar


incentivos para o setor privado fazer a maior parte do trabalho ...”

“definir o pacote mínimo de serviços, que a partir dos recursos disponíveis, possam
atingir qualidade e confiança...”

“Definir as funções do Estado e do setor Privado, mudando, se for necessário,


provisões constitucionais para a viabilização de novas estruturas...”

“Definir os critérios pelos quais a população será dividida de acordo com sua
capacidade de pagamento, para ajudar a direcionar o gasto público”

“... Estabelecer as relações funcionais entre os setores público e privado, as quais


poderão incluir mais contratos com o setor privado, para prestar serviços de melhor
qualidade dentro do sistema público...

287
Segundo o CNES, do total de 6.474 hospitais hoje no Brasil, 70% deles são privados; 21% são municipais; 8%
estaduais e apenas 1% federais. Após todos os percalços enfrentados em seu processo de implantação, o SUS dispõe
atualmente de mais de 5.800 hospitais credenciados no Brasil, entre públicos e privados, com e sem fins lucrativos,
que juntos respondem por um total de cerca de 400 mil leitos. (Amorim, 2006).
288
Os dados do INEP de junho de 2006 revela que existem 163 faculdades de Medicina no país; 552 faculdades de
Enfermagem; 93 cursos de Administração em Serviços de Saúde e 610 cursos de Pós-Graduação em Saúde. (Amorim,
2006).
289
César Massaro pertence a Stra Consultores e escreve sobre assuntos de Saúde. Revista Medicina Social de Grupo
- out/nov/dez/2001 - pág. 01.

130
“... Criar incentivos para a expansão do setor privado, fornecendo aqueles que podem
pagar a oportunidade de uma opção fora do sistema público e alocando parte de suas
contribuições de impostos para um fundo solidário de assistência àqueles de menos
posses...”

“... Continuar o processo de descentralização com a implementação de instrumentos


apropriados de gerenciamento e, se necessário, novas instituições para assistir na
criação, gerenciamento e avaliação de projetos...”

“... implementar um processo competitivo de licitação pelo qual o governo possa


reduzir custos...”

“... integrar as organizações filantrópicas e as ONG’S no processo de reforma...”

“... a crescente participação do setor privado trouxe a visão de negócios para a saúde
e, sem dúvida, possibilitou avanços importantes...”

O entrave está - como já discutido - nos procedimentos de alta complexidade que


aumentam os riscos das operadoras.

Mesmo sem uma precisão técnica, há um consenso de que esses procedimentos


apresentam custo elevado, condutas e equipamentos cuja operacionalidade é
específica. No 6.° Simpósio de operadoras de assist ência à saúde290 a médica
nefrologista do Hospital Osvaldo Cruz, gerente comercial e membro do comitê de
relação com fontes pagadoras da ANAHP,291 examinando o relacionamento comercial
entre hospitais e operadoras, afirmou que:

“o maior custo do atendimento hospitalar é a sua má hospitalização. Fora isso, alta


complexidade e permanência elevada, ou os dois, são os responsáveis pelos altos
custos”.

Não há uma fórmula que defina o valor que cada sociedade deve gastar para ter um
atendimento de saúde de qualidade. As despesas dependem do modelo definido e da
capacidade de administrar a estrutura de saúde. Há ainda um vazio nos sistemas. A
Constituição diz que o atendimento gratuito tem de ser universal, mas os sucessivos
governos não foram capazes de criar meios de fazer a lei valer.

A revista Exame em edição especial sobre a Saúde brasileira, diz que, através das
palavras de Carlos Alberto Suslik:

“A primeira providência de uma reforma séria é encarar o fato de que não é possível
dar tudo a todos.”. 292

290
Promovido pela Abramge - Associação Brasileira das empresas de Medicina de Grupo.
291
Associação Nacional dos Hospitais Privados.
292
Revista Exame – página 174 – Especial de Saúde – Palavras de Carlos Alberto Suslik. São perguntas obrigatórias:
até que estágio de cada doença devemos investir em tratamento

131
As empresas operadoras de prestação de serviços na saúde privada têm fins
lucrativos e, como tal, buscam minimizar os custos e maximizar os ganhos. Assim,
historicamente as operadoras têm procurado fornecer serviços à população de baixo
risco e deixar a clientela de alto risco sem cobertura, dependentes do SUS.

Isso era mais evidente antes da lei 9656/98, quando os segurados que sofriam de
enfermidades crônicas ou de alto custo - alta complexidade - como as doenças
mentais e muitas outras enfermidades de tratamentos considerados dispendiosos
eram excluídos dos planos de saúde. A alta complexidade envolve patentes,
profissionais altamente técnicos, equipamentos de ponta em termos de tecnologia,
medicamentos caros, itens esses que têm grande ligação com valores em dólares,
yens ou moeda européia.293

Diz-se que o procedimento, ao tornar-se rotineiro, deixa de ser de alta complexidade,


ou seja, sai da lista da ANS. Isso é relativo e pode ser perfeitamente determinado
como outros temas controversos e que estão na regulação da ANS. Tome-se, como
exemplo, o agravo e as doenças pré-existentes. É controverso porque algumas
operadoras consideram procedimentos que se tornaram rotineiros como de alta
complexidade. Tais fatos não devem ser considerados como complicador, desde que
sejam efetuados protocolos de trabalho para cada tipo de procedimento e definido seu
tempo de complexidade.

Há bastante discussão a respeito disso que findará quando os procedimentos de alta


complexidade forem anualmente revistos em sua lista, da qual sairão alguns
procedimentos e entrarão outros em vista dos avanços tecnológicos. Nada impossível
de ser gerenciado.

As demandas por informações de saúde cresceram nos últimos anos. Através da ANS,
o governo passou a assumir, com mais ênfase, seu papel de regulador do processo e
as operadoras passaram a ser obrigadas a enviar os cadastros de usuários e a
catalogar procedimentos para conseguir uma base estatística294do setor dentro de
suas classificações.

No caso de um plano individual/familiar, o mesmo conduz a valores maiores, uma vez


que não há grande diluição do risco: experience ratio. Da mesma forma, os prêmios
dos planos coletivos por adesão podem se aproximar dos individuais/familiares, por
motivos de fraude ou de uma natural anti-seleção de risco 295, ou seja, a natureza dos
planos fora dos planos empresariais é de difícil administração e de alta concentração
de risco.

293
Artigo de Eleonora D’Orsi - Biblioteca da ANS - “Doenças e lesões pré-existentes e alta complexidade: situação
atual e papel da ANS
294
Nessa fase, foi necessário conhecer e analisar algumas formas de contratação e, assim, ter referências para propor
medidas e alterações. Sabendo como elas funcionam maior será o esclarecimento para entender a proposição da
implementação do capitation. Ele pode ser considerado como um community ratio.

295
Fenômeno que ocorre quando há a inclusão de pessoas com doenças pré-existentes ou na iminência de uma
internação hospitalar.

132
Já nos planos empresariais, ou seja, quando existe a empresa no meio da
contratação, que é a proposição do capitation, há uma maior diluição do risco, pois há
uma massa grande de empregados que poderão ser de várias empresas (PMEs) com
seus dependentes, e as empresas, como já acontece atualmente, procurarão sempre
educar e controlar a utilização.

O controle não abusivo e desnecessário dos procedimentos é fator fundamental na


economia para a saúde em geral, tanto nas privadas, em que há maior controle, como
no SUS, mas é difícil o controle. Como já acontece, fatores moderadores serão
necessários para que não haja abusos na utilização, sem critérios do plano de
assistência médica para os usuários das empresas. Dentro dos formatos de gestão
privados, podem estar previstas, por exemplo, premiações aos usuários por bons
resultados na utilização, descontos nas mensalidades e outras promoções.

Um controle adequado poderá até gerar bônus nas novas contratações futuras -
renovações de apólices. Todas essas premissas são fundamentais e, à medida que o
capitation possa ser aplicado para as pequenas, micro e médias empresas, isso trará
grandes benefícios sob a forma preventiva e educativa, conseqüentemente ao SUS e
ao Estado. No aspecto de utilização, as empresas que possuem serviço próprio,
principalmente as medicinas e odontologias de grupo, ou seja, donas dos próprios
hospitais, ambulatórios, leitos, exames diagnósticos, tendem a ter os valores de
prêmios menores, pois são prestadores e o pagadores dos serviços.

As segmentações assistenciais estão devidamente atreladas aos preços dos prêmios,


e a abrangência geográfica é fator importante na precificação. Obviamente, um plano
que tenha abrangência em todo o Brasil deverá custar mais caro do que um plano que
só possa ser utilizado no Estado de Minas Gerais, por exemplo.

No caso do capitation as aplicações sempre seriam regionais. No INSS, quanto aos


descontos em folhas de pagamento, deveriam ser previstos, também como proposta
deste trabalho, algum desconto para quem tem plano particular. Isso poderia ser
resolvido com um Cadastro Único de Saúde para todos os brasileiros. Seria como um
CPF de saúde. Tal número de registro geral já está em andamento. 296

De 2002 em diante houve um controle regulatório muito forte da ANS com relação às
empresas que operam no setor privado de saúde. Até bem pouco tempo, não havia
estatísticas sobre esse setor, mas atualmente já se apuram dados que em breve futuro
serão importantes para a tomada de decisões.297

296
A nova carteira de identidade, chamada de RIC (Registro de Identidade Civil), passará a ser emitida com chip em
novembro deste ano. O documento reunirá em uma única carteira o RG, o CPF e o título de eleitor. A Receita Federal
determinou ainda regras para facilitar a obtenção imediata do CPF. Com formato semelhante ao do cartão de crédito,
o RIC terá foto, impressão digital, assinatura do portador, código e um número de dez dígitos com um dígito verificador
que será registrado numa central nacional de dados, controlada pelo Ministério da Justiça.

297
Há algumas: 22% das queixas no Idec eram contra Operadoras de Saúde. No ano de 2009 as reclamações
aumentaram 54,23% . Em 2009 foram 7.656 denúncias contra 4.964 em 2008. É a intermediação feita pela ANS – pela
NIP – Notificação de Investigação Preliminar já comentada. Pelo novo sistema, as companhias notificadas terão cinco
dias úteis para responder. Caso contrário, a ANS – abrirá processos que podem resultar em multas de até R$ 800 mil.
Para se livrar da penalidade, as operadoras podem voltar atrás na decisão de negar os procedimentos e atender o
paciente ou usuário. O diretor de Fiscalização da ANS, Leandro Reis Tavares, destacou que o sistema é testado como

133
Não há dúvidas: a saída é justamente o que as companhias já estão fazendo. Investir
em contratos coletivos, buscar quantidade de clientes e atrair a confiança das
empresas e de seus funcionários. O capitation só vem favorecer essa política de
negócios.

Do lado da informação, os hospitais privados, até bem pouco tempo - isentos de


encaminhar dados - com exceção das doenças de notificação compulsória - ao gestor
local do SUS, passaram a enviar, desde agosto de 1999, a CIH - Comunicação de
Internação Hospitalar. Na medida em que cresce a quantidade de informação em
saúde, expande-se também a possibilidade de avaliação da qualidade da assistência
na área privada e seu constante aprimoramento e evolução. O processo de
desenvolvimento está aí, diante de nós, e tende, cada vez mais, a proporcionar maior
controle no sentido de diminuir despesas e aumentar a base de atendimento. É o
caso, por exemplo, de empresas que vendem o serviço de Home Care.

Atualmente, existem nos EUA mais de 20.000 organizações de Home-Care e, em


2007, a quantidade de pessoas atendidas nesse sistema chegou a mais de 7 milhões.
A queda nos custos pode variar entre 20% a 60%, conforme a enfermidade. 298

No Brasil, os dados não são oficiais, mas estima-se que existam mais de 80 empresas
de Home-Care. Será preciso, brevemente, criar associações dessas empresas, pois
muitas delas ainda só fazem tratamentos geriátricos e outras só cuidam de pacientes
com pneumopatias e cardíacos. Talvez, o Home-Care poderá ser, em breve futuro,
uma forma de desafogar os leitos hospitalares.

Tudo começou com um plano denominado Referência, que foi o principal instrumento
para controlar o pólo assistencial privado. O Plano Referência, como conceito de plano
de assistência integral à saúde, passou a ser o único modelo aprovado para
comercialização de mínima cobertura de procedimentos, sendo proibida a redução ou
exclusão de coberturas assistenciais previstas em Lei. Mesmo a permissão de
comercialização de planos exclusivamente ambulatoriais ou hospitalares não abdicava
da cobertura integral no segmento 299.

Legislações posteriores complementares à lei 9656/98 e normativas causaram


grandes alterações em toda a estrutura já existente dos planos privados de assistência
à saúde. De um lado, regulavam as operadoras já definidas, mas por outro traziam
muitas dificuldades de adaptação e incertezas às empresas do setor.

No entendimento dos representantes do setor de planos de saúde essa ebulição


regulatória de adaptações e conjuntura de baixo crescimento econômico levou as
empresas privadas - muitas delas pequenas e médias - a consideráveis esforços para
atender às regras mutantes. Ainda hoje, desviam recursos que deveriam ser
destinados ao gerenciamento de custos operacionais e atendimento aos usuários para

projeto piloto desde 2008. Nesse período, 56% das reclamações foram solucionadas. (Diário de S.Paulo, sexta feira, 13
de agosto de 2010).
298
- Fonte: História do Home-Care - http://www.portalhomecare.com.br/pagina.php?pagina=6 - acessado em
04/02/2006.
299
Evolução e Desafios da Regulação do Setor de Saúde Suplementar - Série ANS - 4 - Rio de Janeiro - RJ. p. 13.

134
um monitoramento administrativo e de controle para atender às inúmeras exigências
da ANS, com a implantação de cadastros eficientes, relatórios estatísticos, contábeis,
atuariais e toda a sorte de controles, inclusive para o combate à fraude300.

Em um segundo momento foi criada a ANVISA – Agência Nacional de Vigilância


Sanitária e a ANA – Agência Nacional de Água, a ANTT – Agência Nacional de
Transportes Terrestres, a ANTAQ – Agência Nacional de Transportes Aquaviários,
ANCINE – Agência Nacional de Cinema e a ANAC – Agência Nacional de Aviação
Civil. A cronologia é a que segue.301

ANEEL – criada pela Lei 9.427 de 26/12/1996


ANATEL – criada pela Lei 9.472 de 16/07/1997
ANP – criada pela Lei 9.478 de 06/08/1997
ANVISA – criada pela Lei 9.782 de 26/01/1999
ANS – criada pela Lei 9961 de 28/01/2000
ANA – criada pela Lei 9.984 de 17/07/2000
ANTT – criada pela Lei 10.233 de 06/06/2001
ANTAQ – criada pela MP-2228 de 06/09/2001
ANAC – criada pela Lei 11.182 de 27/09/2005.

Arlindo de Almeida, presidente da Associação das Empresas de Medicina de Grupo


(Abramge) já dizia em 1999 que: “... neste contexto a nossa atividade - a medicina de
grupo - terá de confrontar-se com prováveis gigantes da área econômica, tanto na de
operadores de planos de saúde, como de seguradoras, algumas delas advindas de
outros países...”.

Na visão de periódicos representativos do setor, nessa medida, mesmo que se dê às


autoridades governamentais o crédito da boa-fé e do seu empenho em acertar nas
suas normativas, visando regulamentar um setor extremamente heterogêneo, a
verdade é que se nota pouca experiência e condição de compreender a realidade
nacional e, em especial, as peculiaridades que caracterizam o mercado operador de
planos e seguros privados de saúde no Brasil 302. (Lima, 1999).

O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), ao analisar detalhadamente


treze contratos de - Plano Referência - de empresas de planos e seguros-saúde
bastante conhecidas, lançados no mercado logo após 2000 – por exemplo - portanto
logo após a lei, constatou que os textos eram confusos, além de conter abusos
contratuais, semelhantes aos encontrados nos contratos antigos, ou seja, antes da lei
9656/98 303.

Discussões legais entre operadoras e o próprio governo, via ANS, foram invocadas no

300
Horácio L.N. Cata Preta - p. xiii - do Prefácio de Cláudio R. Contador - Diretor Executivo da Funenseg.
301
O PROCON/SP tornou-se a Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor. Lei Estadual 9.192 de 23/11/1995.

302
Revista Medicina Social - número 152 - janeiro/1999 - Artigo de Dagoberto J.S. Lima.
303
Idec - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor - Guia do Consumidor - São Paulo, 2000, p. 3.

135
Supremo Tribunal Federal (STF - ADIN-1931)304 durante vários anos até que o
Judiciário considerou legal a não obrigatoriedade de os planos antigos - de antes da lei
9656/98 - serem adaptados à nova lei. Tal fato criou uma dicotomia na legislação que
rege os planos privados de assistência à saúde entre os contratos assinados antes de
janeiro de 1999 e aqueles que foram assinados após esse ano.

A análise das informações econômico-financeiras fornecidas por 1514 administradoras


de planos de saúde - operadoras - à ANS, no ano de 2002, mostrava que, até
setembro, 314 delas operavam no vermelho e outras 145 estavam com patrimônio
líquido negativo. Ou seja, 30% das operadoras atravessavam dificuldades financeiras.
Em um setor que faturava cerca de 26,4 bilhões anuais no Brasil, esses focos de
infecção financeira recomendam cuidado aos usuários, que somavam, nessa época,
34,5 milhões305.306 Os aumentos de preços dos contratos antigos, a recessão e o
desemprego após esse período fizeram com que o mercado perdesse, de 2001 até
2004, quase seis milhões de usuários.

Outra observação interessante é analisar a concentração de beneficiários em relação


a quantidade de Operadoras – vide tabela XIV - do sistema privado de Saúde
Suplementar. Percebe-se que mais de 50% dos usuários concentram-se em
aproximadamente 50 Operadoras de Serviços de Medicina de Grupo. Por outro lado,
empresas pequenas, ou seja, com 2.000 usuários até 10.000, são mais de 2.000
empresas. Ou seja, há grande perigo de cartelização embora todo o cuidado da ANS –
Agência Nacional de Saúde Suplementar.

Tabela V

Distribuição de Operadoras // População de Beneficiários Ativos

Quantidade de Quantidade de % Quantidade de %


Beneficiários Operadoras Beneficiários

acima de 500.000 5 0,29 6.020.195 20,84


100.001a 500.000 47 2,68 9.117.539 31,56
50.001 a 100.000 58 3,31 3.937.215 13,63
10.001 a 50.000 312 17,79 6.719.793 23,56
2.001 a 10.000 536 30,56 2.555.731 8,85
Até 2.000 796 45,38 541.280 1,87

Fonte: Abramge - Associação Brasileira de Medicina de Grupo – 2004

Sem perda de qualidade, a ANS deve – constantemente - encontrar formas não


onerosas de controlar as pequenas e médias empresas de prestação de serviços na

304
ADIN - Ação Direta de Inconstitucionalidade no STF.
305
Dados da Folha Dinheiro, 03 de fevereiro de 2003, p.B1- Jornal Folha de São Paulo.
306
Segundo a fonte – ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar – o sistema privado está atualmente, em 2009
com 46 milhões de usuários, considerando-se os planos odontológicos, que estão por volta de 10 milhões.

136
saúde, pois do contrário, o controle governamental funciona como elemento de
concentração do segmento.

Nos últimos anos, passando pelas dificuldades econômicas que conhecemos, o setor
iniciou um processo de cortes de despesas e, com isso, as irregularidades também
foram mostrando o seu lado perverso, qual seja, recusas de atendimento e reajustes
ilegais de mensalidades. Como exemplo, temos o caso da Unimed - São Paulo, com
dívidas, na época, de 13,3 milhões no mercado e atrasos nos pagamentos a hospitais
e laboratórios 307 .

Por outro lado, o governo destaca que “... no passado essas empresas ganharam
muito com os reajustes de preços e agora as regras mudaram e elas deverão se
adaptar...” 308. Tornou-se necessário, portanto, encontrar novos caminhos de trabalho
e criatividade para que essa base quantitativa de pessoas que possuíam um plano de
saúde não fosse perdida, o que se tornou um desafio para o setor.

Um desses caminhos dizia respeito à busca de definições para cada tipo de


procedimento médico. Destacamos aqui aqueles que podem causar grandes perdas
às operadoras, tais como transplantes em geral e utilização de equipamentos cuja
operação eleva excessivamente os custos de assistência médica, como tomografia
computadorizada, e que são definidos na legislação própria como de alta
complexidade. Gastar melhor também requer mudança na maneira de remunerar os
prestadores de serviços. “É preciso mirar o resultado, não o procedimento”, afirma
Cláudio Lottenberg, presidente do Hospital Albert Einstein, de São Paulo. 309

Como se verá mais adiante, detalhamentos da Alta Complexidade são passíveis de


formatação técnica em termos de procedimentos e custos, o que tem sido denominado
protocolos de procedimentos. Inclusive, as prováveis intercorrências e seus custos são
previsíveis, tornando de extrema dificuldade, portanto, fraudar esses procedimentos.

Considerando tal situação técnica e de custos, torna-se viável compartilhar os riscos


das situações de Alta Complexidade entre governo - via ANS, Sistema Único de
Saúde (SUS) e Ministério da Saúde - e operadoras, no sentido de diminuir as
possibilidades de perdas financeiras das pequenas empresas que trabalham com
saúde e com isso criar mais empregos, aumentar o volume de impostos e
principalmente - a médio prazo - desafogar o SUS.

De fato, uma operadora que detém em sua carteira apenas alguns milhares de
usuários poderá comprometer perigosamente seus resultados e até mesmo falir se
tiver de arcar com custos inesperados de Alta Complexidade de alguns poucos
transplantados, por exemplo.

307
Isto é Dinheiro / 170, 29/11/2000.
308
Palavras do Diretor da ANS, João Barroca no artigo: A Saúde na UTI - Guerra entre governo e operadoras de
planos de saúde. Risco de colapso para o setor, Folha de S. Paulo, 29/11/2000.
309
Hoje, tanto os planos particulares quanto o SUS remuneram cada procedimento realizado, não o resultado do
atendimento. Portanto, quanto mais exames um laboratório fizer, mais ele receberá. Esse modelo estimula o
desperdício, diz Lottenberg. Uma mudança exige, sobretudo, eficiência de gestão tanto da operação quanto das
informações dos pacientes. (Revista Exame Nov\09 – pag. 176).

137
Tabela VI

Concentração de Beneficiários por Operadora (2001)

Número de
Operadoras / Número de Usuários /

1728 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 27.473.258 (100%)

435 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 24.725.847 (90%)

231 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 21,877,434 (80,02%)

133 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 19.256.073 (70,05%)

78 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 16.502.087 (60,02%)

45 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 13.794.390 (50,01%)

25 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 11.148.683 (40,49%)

12 \\\\\\\\\\\\\\\\\\- 8.280.859 (31,12%)

6 \\\\\\\\\\\\\\\- 5.981.250 (21,63%)

2 \\\\\\\\\- 3.416.657 (12,19%)

Fonte: 310 - ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar - 2001

Esses procedimentos – de Alta Complexidade - representam em torno de 1% dos


custos hospitalares311, mas, para pequenas empresas do setor, se o risco atuarial for
quase simultâneo, podem levar ao desastre financeiro. São procedimentos médicos e
hospitalares que, não raramente, trazem contingências no tratamento e que exigem
equipamentos de alta tecnologia e alto custo na sua utilização, além de atendimento
por profissionais preparadíssimos. 312
310
Fonte: ANS - “Integração do Setor de Saúde Suplementar ao Sistema de Saúde Brasileiro” - Januário Montone -
Presidente da ANS / RJ / julho de 2001 - Palestra proferida no Conselho Nacional de Saúde.

311
Percentual que faz parte do Anuário Qüinqüenal do Ministério da Previdência e Assistência Social de Média e Alta
Complexidade - anos de 1995 a 2000 do Ministério da Saúde. ISBN 85-334-0494-8 - 500 páginas - Secretaria de
Assistência à Saúde - Brasília - Ministério da Saúde - ano 2001.
312
A análise de utilização mostra que pequena queda na freqüência de consultas realizadas. Entre 2005 e 2007 houve
uma redução de 2,8% passando de 5,3 consultas por beneficiário para 5,15 (Jornal Atuar – IBA – Julho/

138
E não se pode esquecer que a grande maioria das operadoras de assistência médica
não se compara aos gigantes do setor e que administram carteiras de clientes com
rede credenciada de pequenos hospitais no interior, sendo que situações idênticas
acontecem pelos estados brasileiros.

A Alta Complexidade, que tem sua cobertura assegurada pela lei, representa,
portanto, um perigo constante para suas operações. Na medida em que os riscos das
operadoras menores aumentam em vista de procedimentos de Alta Complexidade, o
crescimento do setor fica impossibilitado e comprometido, pois, como mostra a Tabela
VI acima, apenas 50 empresas operadoras - respondem por 50% dos usuários tendo
os mesmos riscos - em função da lei - do que os pequenos do setor 313.

No Brasil, dentre as grandes oportunidades que o governo oferece às entidades


privadas, destaca-se as parcerias público-privadas propostas com grande alarde nos
anos de 2005 e 2006. Não é tudo tão simples quanto parece: há relações muito
próximas e que se fundem naquilo que muitos chamam de simples estatismo e
privatismo. No caso das relações da Saúde Pública com a Privada os entrelaçamentos
são complexos e entranhados há décadas no contexto da saúde geral.

Trata-se de um contexto social, econômico e político em que acontecem as práticas


dos serviços de saúde, sejam públicos ou privados. Como é feito tudo isso? Como é
que se produzem esses serviços e produtos? Quem está envolvido? Há muitas
parcerias? Quem tem interesses no âmbito de pequenas ou macro empresas?

Não se trata apenas de parcerias, mas de produção de serviços na saúde que –


muitas das vezes – dependem dos hospitais e agentes privados. As reformas políticas
envolveram nossa atualidade em empresas de telefonia privada com controle da
Anatel; passaram por privatizações com controle – no caso da eletricidade – da
Eletrobrás e outros exemplos podem ser dados. Eram setores considerados
estratégicos para todos os governos até a década de 90. Na área de Saúde,
atualmente temos uma dualidade ou mix.

Há o sistema público com redes de hospitais, leitos, ambulatórios, medicamentos,


centros de diagnósticos, internações que deveriam atender os mais de 145 milhões de
brasileiros e de outro lado um sistema privado, sem haver privatizações ou favores
diretos – pelo menos na atualidade - e que atende aproximadamente 45 milhões de
pessoas. Como favores diretos entenda-se, nunca houve privatização de nenhuma
entidade de saúde ou hospital – ou estatização.

Como veremos adiante, historicamente, a prestação de serviços na saúde no Brasil


passou por grande crescimento e total liberdade de coberturas e de preços até 1998.
Daí em diante, a atividade - após anos de adaptações e ajustes - tornou-se um
apêndice empresarial de saúde suplementar de grande experiência e
desenvolvimento. Tal situação, então, sob a égide da Superintendência dos Seguros

Ago/2007 – Ano XII – número 86).

313
Tabela XV- Concentração de Beneficiários por Operadora.

139
Privados (Susep) e posteriormente da ANS, justifica os debates surgidos envolvendo
os entes que participam de toda essa hierarquia empresarial e pública.

Os atores envolvidos em uma hierarquia primária são as empresas de assistência


médica e as operadoras de saúde, envolvendo também as odontológicas, o MTPS, a
ANS e o SUS.

Os atores envolvidos numa hierarquia secundária são quaisquer empresas micro,


pequenas ou médias e associações que desejam ter um plano coletivo de saúde, os
hospitais, as clínicas, consultórios e os profissionais da medicina em geral. Os
números mostram que houve crescimento expressivo até 1998, sendo que milhares de
empresas vendiam planos de saúde com as mais variadas coberturas ambulatoriais e
hospitalares.

Até o advento da lei 9656/98, o número de instituições cadastradas como empresas


operadoras no ramo de saúde era de 2700, aproximadamente 314. Atualmente, em
2011, estão por volta de 1400 operadoras, abrangendo em torno de 45 milhões de
consumidores, sendo 37,9 milhões de planos médico-hospitalares e 9,4 milhões de
planos odontológicos.315 Há, ainda, aqueles titulares que detêm planos em suas
regiões para consultas e outros procedimentos simples, mas são também titulares de
planos mais completos em regiões como a sudeste, para eventuais situações mais
complexas de atendimento e cirurgias.

O que mais chama a atenção no que diz respeito ao papel atual da ANS é a
quantidade de titulares de planos. São números discutíveis que merecem análise mais
profunda, pois parecem reduzidos em se tratando de uma agência nacional. Somente
a leitura real desses dados justificaria uma discussão mais pormenorizada a respeito.

Dados atuais, de pesquisas efetuadas pelo IBGE mostram que 24,5% dos brasileiros
eram adquirentes de planos de saúde 316, movimentando anualmente 20 bilhões de
reais 317, serviços esses que, atualmente, respondem por quase 2% do PIB brasileiro
318
. Atualmente, o número de usuários de planos de saúde chegou a 52 milhões
em 2010. O montante - revela o estudo - “Quem é Quem no Mercado de Saúde no
Brasil” organizado pela Austin Asis, 319 (2010) representa aproximadamente 30% da
população brasileira.

De acordo com o estudo, os planos coletivos foram um dos grandes responsáveis pelo
número expressivo, já que passaram de 12 milhões de beneficiários em 2001 para
quase 40 milhões em junho de 2008. Dentre os motivos para a evolução, está o bom
desempenho econômico, especialmente a evolução do emprego formal. No geral,

314
Site da Abramge - ano de 2005 - acessado em 20/05/2005.
315
Fonte: Caderno de informações da Saúde Suplementar – ANS/Dez/2008
316
PNAD - Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (1998 p.20) - IBGE - no qual se estima que 38,7 milhões de
brasileiros cobertos por pelo menos um Plano de Saúde (...) destes 29 milhões vinculados a planos de saúde privados
e 9,7 milhões vinculados a planos de institutos ou instituição patronal de assistência ao servidor público
civil ou militar.
317
Globo.com. Saúde, in: Clipping sobre Planos de Saúde - acessado na edição de 26/12/2000.
318
Jornal Valor Econômico (31/03/2001) - Pib brasileiro corresponde a R$ 1.089,7 trilhões, o equivalente a US$ 595
bilhões.
319
Fonte: Austin Asis – 01/03/2010 – http://ricardomontu.wordpress.com/2010/03/01/ (acessado em 04/07/2011).

140
ainda conforme o levantamento da Austin, 59% dos beneficiários estão concentrados
nas modalidades de Medicina de Grupo e Cooperativas médicas, que respondem por
17 milhões e 14 milhões de usuários, respectivamente.

A Odontologia em grupo, 6,8 milhões de clientes, e as seguradoras especializadas em


saúde, com 6,2 milhões de beneficiários, vêm em seguida. No que diz respeito ao
número de operadoras, a divisão é a seguinte: 445 estão no setor de Medicina de
Grupo, 338 atuam em Cooperativas médicas, 275 em Odontologia de grupo e 13 são
Seguradoras especializadas. Existem ainda as filantrópicas.320

Não é um número representativo de grande valor social, pois, nos Estados Unidos,
cujos serviços em saúde são ruins - por exemplo, os dados levantados em saúde
respondem por quase 15% do PIB e o povo pobre americano não tem um sistema -
nem de longe – estruturalmente parecido com o SUS.

Não se trata de comparar esses países, pois as discrepâncias econômicas e sociais


entre eles são muito grandes; todavia, esse percentual justifica, em uma rápida
correlação, o quanto será necessário ainda desenvolver a atividade de prestação de
serviços de saúde no Brasil, observando os números apresentados atualmente, pois,
com esses dados, percebe-se o tamanho do espaço a ser ocupado pelo poder público
ou pelo privado.

O crescimento setorial permitiu uma forte expansão e progresso de empresas


operadoras especializadas em odontologia, atraindo, inclusive novos investidores,
mediante processos de abertura de capital e venda de ações ao público na Bovespa.
Contudo, dentro do atual cenário econômico e dependência da expansão e
comercialização de contratos coletivos empresariais, a assistência médica não
consegue enxergar com o mesmo otimismo o seu horizonte de crescimento de apenas
19% nos últimos sete anos. (Amorim, 2008).

Há muito que evoluir na prestação de serviços à saúde. Ao longo dos últimos


cinqüenta anos, dentre as políticas setoriais no Brasil, a preocupação com esse setor
foi um dos pilares de reivindicações junto aos governos devido às necessidades da
população e aos interesses envolvidos. Daí as constantes inovações e adaptações. 321

Apesar das colocações conflitantes e dos problemas existentes, as companhias

320
Fonte: http://economia.uol.com.br/ultimas-noticias/infomoney/2010/02/26/numero-de-beneficiarios-em-planos-
privados-de-saude-chegou-a-52-mi-em-2009.jhtm

321
Há atualmente, o mais moderno conceito de tele assistência (tele care) do mundo: TeleHelp - um serviço exclusivo
que funciona através de um aparelho instalado em sua residência e que, com um único toque, solicita auxílio no caso
de uma emergência. Além disso, também oferece um botão de emergência pessoal, sem fio e à prova d’água, que
pode ser utilizado em forma de colar ou pulseira para que você possa circular por todos os cômodos da casa.
Caso necessite de ajuda, basta apertar qualquer um dos botões para avisar a Central de Atendimento 24h, que possui
atendentes capacitados que poderão avisar pessoas escolhidas por você e também profissionais especializados.
Esse serviço já é utilizado por milhares de pessoas em mais de 19 países no mundo, e a razão é muito simples: com
ele você garante a sua independência, sem abrir mão da sua saúde, do seu bem estar e da sua segurança. Você pode
ficar sozinho, no conforto de sua casa e, mesmo assim, estar muito bem acompanhado. (Um exemplo é:
http://www.helpsaude.com/sobre-Help-Saude/).

141
estrangeiras estão interessadas no mercado sul-americano e na renda dos hispânicos.
Há cifras para vários produtos, inclusive planos de saúde, para 2010, de um trilhão de
dólares322.

Autônomos e profissionais liberais devidamente associados a entidades de classes


representativas seriam mais um alvo a ser atingido com o objetivo de atender,
também, a essas categorias de classes de profissões. Como exemplo, podemos
indicar as associações de advogados autônomos, barbeiros, feirantes, contadores,
arquitetos, dentistas, entre outras.

No caso da prestação de serviços na saúde, justifica-se que o Estado possa ter


participação também na saúde privada não só como regulador, mas como facilitador
na cristalização de mudanças. O Estado pode ser do tipo empreendedor, ou
realizador, ou ainda oferecer o mínimo à saúde suplementar e, com isso, incentivar os
mercados.

Em parceria com a iniciativa privada, pode desenvolver atividades compartilhadas e,


com isso, se solidarizar com a sociedade em trabalhos das mais variadas naturezas.
De fato, transformações estruturais estão acontecendo e é necessário considerá-las.
O próprio Estado, à medida que as economias se globalizam, também precisa se
adaptar às novas realidades, pois não consegue atender às inúmeras atividades da
sociedade. No caso da saúde, observa-se também que o contexto global dessa
atividade mudou.

Nas áreas privadas muitas mudanças aconteceram. Os termos e modismos dessas


novas realidades sob o prisma privado são downsizing, reengenharia, entre outros.
Parcerias também se tornaram comuns. As transformações acontecem numa
velocidade impressionante e os avanços da tecnologia e da informação afetam toda a
sociedade. A globalização força os países e as empresas a não parar no tempo e, na
área de prestação de serviços na saúde, devemos enfrentar os novos desafios que
estão à nossa frente todos os dias.

Sempre houve avanço nesse campo no Brasil, e à medida que o Estado atual consiga
fazer com que os entes envolvidos participem desse avanço, teremos melhores
condições de atender a população como um todo. O Estado deve ser regulador, mas
também participativo. Houve um grande esforço também na redução da mortalidade
infantil. O nosso país é muito grande e cheio de paradoxos. Temos dados
interessantes e que fornece visão otimista do nosso futuro. Apesar de todos os
problemas na saúde, o país tem crescido.323 Até 2009, conforme dados do IBGE, a
população brasileira quase atingiu 193 milhões de pessoas,324 ficando na quinta
posição entre os países chamados de populosos. China, evidentemente, os Estados
Unidos, a Indonésia. Houve uma taxa de crescimento, no passado, em torno até de
2,5% ao ano, chegando a 1,69% e atualmente está em torno de 1,5% ao ano.

Todos esses fatores nos levaram a um aumento extraordinário na expectativa de vida

322
Revista Exame - número 4 - Edição 837 - março/2005.
323
Aciole – pág. 223.
324
Fonte - Wikipédia

142
– “Expectation of life” 325 – que, por volta de 1920 essa expectativa de idade era em
torno de 40 e atualmente estamos com 68,3 anos para os homens e 76,38 anos para
as mulheres.326 O SUS, nos últimos anos, aumentou o acesso às altas tecnologias
para a população e os governos têm dados complicados e preocupantes com relação
à distribuição e tratamento de águas e esgotos. Há muito a se fazer principalmente no
Norte e Nordeste brasileiro.

O mundo está mudando rapidamente. Os conceitos sobre o que acontece em várias


atividades também estão sendo alterados e é preciso realocar novas reflexões a
respeito. Observem-se as discussões – algumas mais antigas e outras mais recentes -
sobre prestação de serviços em saúde apresentadas em simpósios, e que apresentam
as necessidades imensas possibilidades de mudanças nesse setor. Um mais antigo: O
6° Simpósio promovido pela Abramge-SP aconteceu em maio de 2003, dias 28, 29 e
30 e promoveu seguidos debates sobre:

1) A Integração do atendimento à saúde entre os setores público e privado com foco


na melhoria dos argumentos para legitimar o financiamento das operadoras por um
fundo público; 2) O sucesso na parceria entre operadoras e hospitais; 3) A gestão de
risco na relação entre operadoras e provedores de serviços; 4) As relações entre
vários tipos de prestação de serviços e a importância da TI - Tecnologia de Informação
- como ferramenta na relação entre operadoras e prestadores; 5) As perspectivas
futuras das relações entre operadoras e prestadores; 6) A participação do setor de
saúde suplementar no atendimento à população e suas relações com as políticas de
saúde do Estado.

A Abramge-SP realizou o seu 7° Simpósio de Planos d e Saúde e a Health Business


Fair 2004, nos dias 19 e 20 de maio, tendo por foco vários assuntos da área de
prestação de serviços em saúde:327

1) Um deles foi o direito e a obrigação do consumidor - usuários - dos planos de saúde


e foi definida como a lei mais extraordinária do século XX, revolucionária pela
avançada técnica legislativa e porque acabou influenciando todo o sistema jurídico
nacional.328 ; 2) O Estatuto do Idoso329 e as preocupações de caráter geriátrico, além
de assuntos relacionados à prevenção; 3) Realinhamento de preços, pois ainda
persistem diferenças consideráveis de preços finais nos mesmos procedimentos
médicos para diferentes operadoras e hospitais; 4) PROCON; 5) Remuneração
médica; 6) Agravo330, franquia, coparticipação do usuário; 7) Aplicações da
robotização nas cirurgias por comando de voz.

Na medida em que o mercado se concentra em poucas empresas, conforme mostram


as Tabelas XIV e XV, pois, tais situações transitam pelo quase monopólio, fazendo
com que os preços dos serviços sejam cada vez mais fechados, não permitindo que

325
Trata-se de um cálculo atuarial que soma todos os sobreviventes de uma tábua de mortalidade e divide pelo total
inicialmente analisado. É um número que pertence a todas as tábuas.
326
Fonte: IBGE – Já existe em 2010 uma nova tábua de mortalidade da Experiência das Seguradoras Brasileiras.
327
Wilson Gomes no Informe da Revista Medicina Social da Abramge - jul/ago/set/2004 - p. 1
328
Palavras do Desembargador Sérgio Cavalieri Filho no 7°. Simpósio da Abramge.
329
Lei 10741 de 1°/10/2003 - é instituída, fornecendo os direitos das pessoas com mais de 60 anos.
330
Valor que se cobra a mais por detecção de doença pré-existente, ou seja, na aquisição do plano de saúde.

143
empresas pequenas ou prestadores de qualidade façam parte das redes
credenciadas. Na prestação de serviços em saúde, no entanto, é importante a
fragmentação. A legislação complexa, de certa forma, propiciou essa concentração.

“A saúde oscila entre esforços de privatização que estão gerando não mais políticas
de saúde, mas uma indústria da doença, com controle cada vez mais assumido por
empresas financeiras da área de seguros; outros segmentos buscam a racionalidade
na descentralização e municipalização, com idéias como o Sistema Único da Saúde
(SUS); outras propostas tentam viabilizar um sistema cooperativo; outras resgatam as
mais antigas tradições com políticas como o médico da família, por exemplo, e assim
por diante...” 331 (Dowbor, 2004).

De fato, a maior empresa de saúde privada no Brasil pertence a um grupo financeiro, o


Bradesco. Outros grupos, também muito fortes e que dominam quase 50% do
mercado de saúde nacional, forçam políticas de baixos preços para os procedimentos
médicos, desde consultas até exames diagnósticos, cirurgias e trabalhos periféricos de
apoio.

Reflexões sobre esses temas já justificam dissertar extensamente sobre eles. Nesses
casos é que se justifica a relação entre operadores, médicos e hospitais, a qual deve
ser cuidadosamente observada para não se fazer do prestador de serviços à
operadora um executor de procedimentos médicos a preços aviltantes. Tal situação é
perigosa e por isso preocupante. Aí deve entrar também a ANS, regulando essas
relações através de tabelas, análises de custos e pesquisas de mercado. O poder das
grandes operadoras pode gerar sérios problemas ao mercado.

“Sabe-se que um médico raramente consegue se sustentar hoje se não pertencer a


um plano de saúde. Dessa forma, muitas vezes, ele se sente humilhado e inútil em
termos de trabalho” 332 (Dowbor, 2004).

Uma consulta chega a custar para a operadora entre R$ 25,00 e R$ 30,00, que efetua
o pagamento após 30 dias, ou seja, é necessário que a consulta tenha rapidez para
sobrar tempo de se fazer outras. Isso foi muito condenado, mas poucas vezes
discutido em passado recente. Atualmente, já se trabalha com tabelas que, embora
defasadas, dão referências para cobrança.

“O corporativismo médico foi desarticulado por esse amplo supermercado da doença


que representam os planos privados de saúde, controlados por grandes instituições
financeiras, cujo corporativismo é ainda maior”.333 (Dowbor, 2004).

Outros aspectos discutidos e que justificam a preocupação com a saúde privada é que
as operadoras deveriam se concentrar, também, em planos que sejam mais baratos
para conseguir penetrar nas faixas de população de renda mais baixa e nas pequenas
empresas com planos coletivos por adesão ou não. Observe-se nos simpósios citados
acima que tal discussão já é reinante na atividade da saúde suplementar.

331
Dowbor, 2004, p. 25.
332
Dowbor, 2004, p. 44.
333
Dowbor, 2004, p. 65.

144
“É necessário traçar políticas para diminuir as desigualdades e estimular crescimento.
É necessário que governo e sociedade não criem um mundo de prosperidade
tecnológica acoplada a uma miséria medieval” 334. (Dowbor, 2004).

A resultante do trabalho proposto, no caso, deverá conter no futuro um mercado mais


fragmentado em número de empresas de saúde para evitar o que mostra a tabela III,
ou seja, pouquíssimas empresas operadoras dominam mais de 50% do mercado de
saúde suplementar. Não deve ser esquecido o poder que, muitas das vezes, pode
suplantar o mercado, e isso na prestação de serviços à saúde não é bem vindo.

“Esta concepção acadêmica dos mercados de trabalho tende a ser insuficiente, pois
deixa de lado o poder. Presume que os arranjos que resultam são simplesmente o
resultado de forças de mercado e não da luta política sobre como as relações de
mercado e as que não são do mercado devem se estruturar, e em benefício de
quem...” 335 (Kuttner, 1998).

“De forma simplificada, mas realista, os novos paradigmas de gestão social que
surgem, concentram-se na descentralização e participação”.336 (Dowbor, 2004).

De fato, o compartilhamento da saúde suplementar com o SUS vêm ao encontro de


políticas sociais mais descentralizadas, porém, tendo o Estado como regulador.

O terceiro setor ainda não chegou ao ramo da saúde de forma direta, pois são muitas
as entidades sem auxílio governamental, mas, certamente, devido à necessidade e
pressão da sociedade, em breve futuro, com auxílio do governo e das entidades
privadas, terão início compartilhamentos e serão dados os primeiros passos no sentido
de melhorar hospitais e criar até redes pára-hospitalares de atendimento. Hospitais de
grupos, como o Nipo-brasileiro e a Beneficência Portuguesa e outros, foram, num
certo momento, uma forma indireta de ONGs num passado em que nem se falava em
Terceiro Setor. Assim, já se observam entidades de prevenção e combate às drogas,
alcoolismo, AIDS, hepatite C, câncer infantil, saúde bucal de crianças, nutrição,
atendimento a idosos, pastorais de igrejas e centenas de outras.

Note-se ainda que a ANS regulamentou as operadoras sem diferenciá-las pelo porte, o
que em nosso ponto de vista técnico e profissional é injusto. A regulamentação
provocou a concentração do segmento, o que prejudica o usuário e cria problemas
para o governo no controle de verdadeiros oligopólios.

A alta complexidade e as aproximações público/privado

Se não bastasse, aqueles altos custos, já mencionados na área de Saúde, tais valores
e riscos, impedem a entrada de muitas outras operadoras menores que têm interesse

334
Dowbor, 2004, p. 63.
335
Citação de Robert Kuttner no livro “Tudo à Venda: virtudes e limites dos mercados” - São Paulo: Companhia das
Letras, 1998, p. 82.
336
Dowbor 2005, p. 85.

145
no negócio, conhecem a atividade, desejam ser registradas, mas vivem como clínicas
comuns e hospitais menores, atuando apenas como simples prestadores. Outros até
hoje permanecem na clandestinidade com seus antigos planos de saúde de antes da
lei 9656/98. Não há estimativa a respeito.

É nesse aspecto que a ANS e o Ministério da Saúde podem modificar o atual estágio
da saúde suplementar. Esse será o ponto principal de análise e reflexão entre o
público, o privado e seus agentes num possível compartilhamento. Essa já era a visão
do ex-presidente da ANS, Januário Montone, apresentada em seu discurso de julho de
2001, parcialmente citado a seguir:

“... é desejo da Diretoria da ANS que o Conselho Nacional de Saúde examine duas
proposições:

1.° Aprofundar a discussão sobre a interface SUS - Saúde Suplementar, não apenas a
partir do sistema comprador, mas do sistema produtor dos serviços de saúde. A
produção de serviços de assistência à saúde em nosso País é essencialmente privada
ou pública não estatal. Tanto o SUS como o setor de saúde suplementar compram a
maioria dos seus serviços, principalmente os de média e alta complexidade, de
prestadores privados ou públicos não estatais. Recente apresentação do INCA337
apontava que 80% dos serviços comprados pelo SUS nesta área são de prestadores
privados ou público não estatais. Creio que este é um dos eixos importantes na
organização da saúde pública brasileira, envolvendo estratégias de alocação de
recursos públicos e privados - para investimento na ampliação e regionalização dos
serviços; e ...

2.° Convocar semestralmente a ANS para prestar cont as e debater a evolução da


regulamentação do setor de saúde suplementar e sua integração ao SUS” 338.

Lamentavelmente, o que se verifica é uma discussão em torno de preços de planos e


reajustes, criando pressões entre governo, operadoras, médicos, hospitais e outros
atores envolvidos que não levará a uma melhoria dos planos, não aumentará o
número de usuários, ficando o consumidor,339 após os inevitáveis reajustes, na mesma
situação, embora os mandamentos constitucionais da década de 80.

Somem-se a isso as estratégias de marketing das empresas médicas, o interesse das


empresas do sistema produtivo no desenvolvimento de formas de assalariamento
indireto através da atenção médica e as pressões dos sindicatos mais organizados.

Observe-se a grande concentração de Operadoras na Região Sudeste (mais de 50%


delas lá estão), enquanto pouquíssimas Instituições têm interesse em desenvolver
suas atividades no Norte e Nordeste. Isso vem confirmar a necessidade proposta do

337
Instituto Nacional do Câncer - http://www.inca.gov.br/
338
Palavras de Januário Montone - Diretor Presidente da ANS - Agência Nacional da Saúde Suplementar - RJ -
Palestra proferida no Conselho Nacional de Saúde em julho/2001. Tema: Integração do Setor de Saúde Suplementar
ao Sistema de Saúde Brasileiro. Ficha catalográfica: Brasil. Ministério da Saúde. 35 p.il. ISBN-85-334-0374-7 - Série
ANS - CDU-614.2 (81), constante do site ANS - www.ans.gov.br (Home Page). pág. 32
339
O Código de Defesa do Consumidor foi materializado pela Lei 8078 de 11/09/1990 e regulado pelo Decreto 2181 de
20/03/1997 e considera o plano de saúde como uma relação de consumo.

146
Compartilhamento entre o Público e o Privado nas Altas Complexidades para as
empresas menores do setor de Saúde Suplementar.

A afirmação de que existem possibilidades de alterações significativas no ramo da


assistência à prestação de serviços na saúde suplementar é válida, desde que os
rumos sejam de inovações, que, à médio prazo, possam fazer crescer a seguridade do
sistema.

Tabela VII

Operadoras registradas segundo região e classificação / 2003

Tipo de Operadora Norte Nordeste Sudeste Sul C. Oeste Total


Administradora
de Planos 0 1 6 2 0 9
Administradora
de Serviços 1 4 19 4 1 29
Auto Gestão não
Patrocinada 3 21 70 23 15 132
Auto Gestão Patroc.
Multipatrocinada 1 3 15 10 6 35
Idem / RH 0 0 1 1 1 3
Auto Gestão Patroc.
Singular 0 7 17 2 11 37
Idem/RH 5 5 98 21 9 138
Cooperativa Médica 18 66 183 67 36 370
Coop. Odontológica 6 26 99 30 12 173
Filantropia 2 9 95 19 1 126
Medicina de Grupo 26 100 495 130 39 790
Odontol. de Grupo 8 67 268 86 19 448
Seguradoras Espec.
em Saúde 0 0 13 1 0 14
TOTAL 70 309 1.379 396 150 2.304

Fonte: Cadastro das operadoras - ANS/MS - 03/09/03


Censo demográfico / estimativa 2002 - IBGE340

A situação existente após adaptações da lei que regula o assunto e regulamentações


posteriores não deixa aberturas que possam vir a proporcionar novas estratégias
comerciais em sua missão de criar situações com o objetivo de aumentar a base da
pirâmide no atendimento particular ou privado da assistência à saúde.

340
Nota: Operadoras que não foram descredenciadas continuam registradas.

147
Foi necessário, pois, fazer ajustes na lei 9656/98 e não só padronizar procedimentos.
Ajustes de conduta, adaptações de contratos antes da Lei e após a Lei, definição de
Alta Complexidade, novas carências, doenças pré-existentes, descredenciamento de
hospitais e clínicas, abrangências, mudanças de faixas etárias, mudança e atualização
de Rol de Procedimentos, atualizações de caráter tecnológico e muitas outras
alterações.

As reflexões e discussões de novas proposições de estratégias de trabalho nas áreas


de saúde complementar, em revistas sob a forma de artigos, jornais, periódicos, livros,
seminários, fóruns são apenas indicações de que existem saídas, as quais, adaptadas
a outras realidades, poderão ser caminhos inovadores no ramo de assistência médica.
Há subsistemas se formando em todas as atividades, e o ramo de saúde suplementar
não é diferente. “O mundo está mudando e essa atividade está passando por um
verdadeiro taylorismo sanitário” 341 .

A Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS – discute com empresas do


mercado a criação de novos tipos de planos de saúde, baseados em um sistema de
capitalização. Uma das idéias em debate e que dependerá de mudança na legislação,
é criar um modelo que cobraria um pequeno valor, adicional ao da mensalidade, e
serviria para abater custos quando os usuários ficassem mais velhos, momento em
que os valores dos planos sobem.

Entidades do mercado, no entanto, pressionam para a criação de um produto


independente e não complementar ofertado por empresas da área previdenciária. Com
isso, o consumidor usaria o valor poupado para custear despesas de saúde, mas teria
um limite. 342 Tal tipo de plano se aproxima, na forma, da Poupança-Saúde, já
comentado.

Há atualizações quanto aos planos de saúde. A ANS - Agência Nacional de Saúde


Suplementar - publicou no "Diário Oficial da União" em 29/07/2011 uma resolução que
define regras para adaptação e migração de contratos firmados até 1º de janeiro de
1999 com planos de saúde. A resolução deve facilitar a mudança de usuários de
planos anteriores a 1999 para novos. Segundo a ANS, alterar os contratos dará
segurança e garantias oferecidas pela regulamentação do setor (que se deu com a lei
nº 9.656/98), tais como regras de reajuste, garantia às coberturas mínimas
obrigatórias listadas no rol de procedimentos e eventos em saúde e portabilidade de

341
Um médico, por exemplo, raramente consegue se sustentar hoje se não trabalhar para planos de saúde. Os
pagamentos são extremamente baixos e o ritmo de trabalho nos leva a lembrar os filmes de Charles Chaplin com a
diferença de que, no lugar dos parafusos, estão os pacientes. (Dowbor, 2004, p. 44).
342
A proposta tramita na Câmara dos Deputados, por meio de emenda a uma medida provisória e propõe que esses
produtos possam ser isentos de cobrança de tributos. “A idéia é que o novo produto não rompa com a visão mutualista
dos planos”, afirma o diretor-presidente da ANS, Fausto Pereira dos Santos até 2009. (Matéria completa no Jornal da
Tarde – 16/04/2009).

148
carências. O rol de procedimentos e eventos é a referência básica --estipulada pela
agência-- para cobertura mínima obrigatória da atenção à saúde nos planos privados
de assistência à saúde contratados a partir de janeiro de 1999.343

Na adaptação --feita por meio de um aditivo contratual--, a operadora deve apresentar


proposta ao beneficiário, demonstrando o ajuste do valor a ser pago pela ampliação
das coberturas. Este ajuste deve ser de, no máximo, 20,59%. Antes, os planos
decidiam a diferença que deveria ser paga pelo usuário, o que muitas vezes era muito
alto. A resolução entra em vigor em 3 de agosto de 2011 e é resultado de uma
consulta pública, além da contribuição de entidades representativas do setor. 344

A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) também publicou na primeira


quinzena de agosto de 2011, uma resolução que atualiza a cobertura assistencial
obrigatória para os planos de saúde. Os convênios terão que custear, a partir de
janeiro de 2012, 50 novos procedimentos --entre eles, cirurgia de redução de
estômago via laparoscopia, terapia ocupacional e a tomografia especial PET Scan,
usada no diagnóstico de câncer. 345

A regulação veio também de encontro ao respeito a forma de trabalhar das


operadoras, inibindo a concorrência desleal, aumentando a confiabilidade nos planos,
e também organizou a diversidade de produtos e um leque de escolhas muito difícil de
ser absorvido pelos usuários, todavia, tudo isso, aumentou os custos. Os impactos
foram positivos, mas criou algumas falhas no mercado.346

A regulação trouxe seriedade ao mercado na medida em que promove a eficiência,


segurança e qualidade, faz com que haja a manutenção de uma agência reguladora,
através da taxa de saúde suplementar e exige garantias de reservas, provisão de
informações e cria a TISS. Estima-se que os investimentos existentes entre 2003 e
2012, serão de ANS – 6,9 milhões, investimentos das operadoras, 1,8 bilhões e
investimentos de prestadores de serviço em torno de 9,5 bilhões.347

Propostas para novas regulações não faltam. Realmente é necessário flexibilizar os


desenhos de novos produtos de saúde suplementar, sejam no âmbito de planos
individuais bem como dos empresariais. Devem existir proposituras novas para
cobertura para demitidos e aposentados, na forma do artigo 30 e 31 da Lei 9.656/98.
Há sugestão também de planos mistos – em que possa ser agregada uma Poupança
Saúde e deve ser regulado o perfil comportamental e prêmios para os usuários, em

343
Fonte: Folha on line de 29/07/2011 -
344
- Idem 622
345
- Idem 623
346
A ausência de normas e a complexidade envolvida na troca de informações entre operadoras de planos privados de
assistência à saúde e prestadores de serviços de saúde, assim como o investimento pouco expressivo em Tecnologia
da Informação (TI) estimularam a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) a elaborar o Padrão TISS (Troca de
Informação em Saúde Suplementar). Esse padrão foi desenvolvido com base em normas nacionais e internacionais, e
visa melhorar a qualidade do atendimento, racionalizar custos e otimizar recursos existentes. O Padrão TISS tem como
premissa a interoperabilidade com os sistemas de informação em saúde preconizados pelo Ministério da Saúde. O
Padrão TISS foi estabelecido, em 2007, como um padrão obrigatório para Troca de Informações na Saúde
Suplementar – referente a troca de informações administrativas e de atenção à saúde, entre operadoras de planos
privados de assistência à saúde, prestadores de serviços de saúde, beneficiários de planos de saúde e a ANS.
(Fonte: http://www.ans.gov.br/index.php/planos-de-saude-e-operadoras/tiss) - acessado em 10/09/2011.

347
Palestra de José Cechin – em fev/2009 – na Abramge – Associação Brasileira empresas de Medicina de Grupo.

149
que o indivíduo deve ter maior responsabilidade sobre o seu plano e utilização. Tais
situações podem ser alinhadas aos incentivos do tipo que forneça menores
mensalidades conforme hábitos do usuário. Sob o ponto de vista fiscal e custos, a
regulação deve conter isenção sobre a Poupança-Saúde, caso venha acontecer no
futuro. (Checin, 2009). 348

Isto não quer dizer que todos estão perfeitamente cobertos de todos os procedimentos
médicos, cirúrgicos ou ambulatoriais, possíveis de acontecer a alguém, pois existem
as mais variadas situações: desde aqueles que só cobrem parte das moléstias, outros
só cobrem hospitalizações, outros apenas procedimentos ambulatoriais, ou seja,
estima-se que apenas entre 10 milhões, de fato, têm uma cobertura razoável, pois não
se pode esquecer que há ainda milhares de contratos antes da Lei 9656/98 que não
foram adaptados. Estima-se em 4 milhões.

Convergências complementares / Cooperativas de usuários

Há um processo de inovação nas profissões relativas à saúde e nas Instituições.


Necessário é criar escolas e cursos que promovam tais tipos de atividades
profissionais e de novos técnicos na saúde em vista do processo tecnológico que
abrange o setor. A visão deve ser mais ampla tanto no que se refere à saúde na área
privada como na saúde pública.

Após toda essa visão geral da saúde pública, privada, possibilidades de ONG’s,
compartilhamentos, podemos citar os autores BRESSER e GRAU (1999) no que se
refere as possibilidades de criação de Cooperativas de Saúde, mas não aquelas
formadas por médicos, mas sim aquelas formadas por gestão cooperativa de usuários.

Houve apresentação no I Congresso do CLAD 349 sobre a Reforma do Estado e da


Administração pública, celebrado no Rio de Janeiro em 1996, um trabalho de Gustavo
Zilocchi 350que expõe o caso da gestão cooperativa de serviços públicos urbanos na
cidade de Córdoba, Argentina, mostrando que ele é uma opção legítima de autogestão
ou de cogestão com o governo local e inclusive compartilhar seus trabalhos com as
empresas privadas, contra a imperante tendência à privatização.

Conclui que as cooperativas de usuários, ao reduzir custos e incrementar as


possibilidades financeiras de setores sociais baixos e médios terem acesso a
determinados serviços públicos, ampliam o número de demandantes solventes desses
serviços e, por essa via, realizam o sentido da participação social: estender a
distribuição de bens públicos a uma porção maior da população. Destaca, no entanto,
que os possíveis avanços dependem, entre outras coisas, de que se reconheça ser
este ainda um campo em disputa, dados os interesses econômicos que se enfrentam.

348
Cechin – palestra proferida em fev/2009 – Abramge – SP).
349
Congresso Latino Americano de Administración.
350
Que expôs seu artigo do Livro “Público Não-Estatal na Reforma do Estado” – Luis Carlos Bresser Pereira e Nuria
Cunnil Grau – (Organizadores) – 1996 – no Primeiro Congresso do Clad – em Córdoba – Argentina.

150
CAPÍTULO 4

Mudanças demográficas: repercussões no setor saúde

Maurício Lima Barreto e Eduardo Hage Carmo, em Monteiro (2000), comentam que
houve intensas modificações de alguns indicadores de morbimortalidade da população
brasileira nas últimas décadas, particularmente o aumento significativo da expectativa
de vida e a redução acentuada nas taxas de mortalidade infantil e de mortalidade por
doenças infecciosas. 351 Isso induz a que houve melhorias significativas nos padrões
de saúde da população no Brasil, mas elas precisam ser analisadas conforme a
situação, bem como suas implicações para as políticas de saúde.

As definições do que é doente ou de duração de uma doença são em grande parte


convencionais. É necessário, todavia, para os seguros contra doenças que haja uma
definição. O diagnóstico médico é em parte subjetivo e pessoal e é a subjetividade que
acaba servindo para definir uma doença. A relação de cada uma das enfermidades
com os dias em que elas permanecem em relação aos valores totais fornece as taxas
de morbilidade ou morbidade.

Esses padrões de mudança de morbimortalidade têm sido objeto de estudos desde a


década de 60, com base em alterações demográficas em todo o mundo e não só no
Brasil. Esse processo tem sido denominado de transição demográfica e está
relacionado com a redução das taxas de mortalidade e das taxas de fertilidade. A
evolução de uma sociedade tradicional para uma sociedade moderna, seria
acompanhada de uma redução na morbidade e mortalidade por doenças infecciosas,
passando a haver um predomínio das doenças crônico-degenerativas. No entender de
Frederiksen (1969) 352 no contexto contemporâneo os determinantes dessas
modificações nas sociedades menos desenvolvidas estariam relacionados à
incorporação de novas tecnologias. (Monteiro, 2000).

Posteriormente, Omran (1971) 353 denomina de transição epidemiológica este


processo de modificação nos padrões de morbimortalidade, que se daria em estágios
sucessivos e seguindo a trajetória de um padrão tradicional para um padrão moderno.
Ele identifica três tipos básicos de processos de mudanças dos padrões
epidemiológicos:

a)- o modelo clássico, ou ocidental, caracterizado por uma progressiva redução da


mortalidade e fertilidade, acompanhada de um predomínio das doenças degenerativas
e das doenças causadas pelo homem. Este foi o modelo seguido pelos EUA e pelos
países da Europa Ocidental.

b)- O modelo acelerado, caracterizado por rápida e acentuada queda da mortalidade e


fertilidade e pela rápida inversão nas causas de óbitos. O caso típico deste modelo é o
Japão, na segunda metade do século passado.

351
Apud – Em Monteiro (2000) - Bayer Et al, 1982, Bayer & Paula, 1984, IBGE, 1984, Kalache ET al, 1987, World
Bank, 1990).
352
Apud – Monteiro (2000)
353
Apud – monteiro (2000)

151
c)- O modelo tardio ou contemporâneo, característico dos países subdesenvolvidos,
em que a queda da mortalidade, mais lenta e recente que a observada nos países
desenvolvidos, não é seguida de redução na fertilidade na mesma proporção. Em
todos esses modelos haveria em comum a existência de três estágios fundamentais,
que seriam a idade das pestilências e da fome, a idade do declínio das pandemias e a
idade das doenças degenerativas aliadas às doenças criadas pelo homem, os quais
se sucederiam, em qualquer sociedade, variando apenas quanto á velocidade das
mudanças. Posteriormente, foi acrescentado um quarto estágio a este processo – a
idade do declínio das doenças degenerativas. 354

A construção e estudo de indicadores

Uma vez que o processo saúde-doença se insere na complexidade dos fenômenos


sociais, o seu estudo tem que levar em conta as limitações e divergências conceituais
e metodológicas próprias do estudo desse campo do conhecimento. Se existem
limitações ao conceituar saúde ou doença, é evidente que também surgem limitações
quando se busca a mensuração dos eventos relacionados a estes dois conceitos.
(Schroeder, 1983). 355

Se considerarmos um tratamento estatístico, relacionando doença e quantidade de


dias relativos a ela e o seu tempo, poderemos calcular a sua duração média bem
como as características da dispersão relativas a essa média. A isso denominamos
como expostos. A análise dos dados e a gráfica são fundamentais.

Muitos anos antes de Shortliffe356 e dos computadores, John Snow (1813-1858), 357
deve ter percebido a conveniência deste tratamento de caráter estatístico. Médico
britânico que liderou o uso da anestesia se dedicou muito à higiene como área
precursora da epidemiologia. E aí, notou que a representação dos agravos à saúde é
mais eficaz quando apresentada sob a forma de elementos gráficos que mostrem com
clareza as probabilidades dos fatos, como os índices de ocorrência, os percentuais de
surgimentos e as taxas de mortalidade.

É célebre o trabalho de Snow apresentando sobre um mapa da cidade de Londres, a


ocorrência dos casos de cólera durante a epidemia de 1854. Essa representação
permitiu-lhe ver que alguns casos se aglomeravam em classes – clusters – os quais
coincidiam com a área que fazia uso de água proveniente de uma mesma fonte
pública. Essa era a fonte de disseminação da doença para a população.

354
Apud – Monteiro (2000) - Olshansky & Ault, 1986
355
Apud – Monteiro – (2000).
356
Pioneiro em inteligência artificial. Edward (Ted) Hance Shortliffe, MD, PHD, nascido em 1947, em Edmondo,
Alberta, é um canadense com formação biomédica norte americana e cientista da computação. Ele foi o principal
desenvolvedor do sistema MYCIN.
357
Mostrou o Dr. John Snow os estudos de grupamentos de casos de cólera na epidemia de Londres (1854).

152
Mudanças sociais e epidemiológicas no Brasil

Há um trabalho de Leser (1975) 358 que mostra de forma contundente que na década
de 1960, em São Paulo, a tendência decrescente da mortalidade infantil se tinha
invertido imediatamente após a queda observada no salário real da população
trabalhadora. Nessa linha, um grande número de trabalhos, com diferentes níveis de
sofisticação analítica, tem mostrado o papel das mudanças sociais e econômicas e
das intervenções médicas sobre os padrões de mortalidade no Brasil.

Em São Paulo, Monteiro (1982)359 em análise mais detalhada, comprovou as


observações de Leser, ao mostrar que a queda da mortalidade infantil na década de
50 e o seu ascenso na década seguinte estão fortemente correlacionados a
tendências inversas do salário mínimo real ocorrido nas duas décadas consideradas.

Já na década de 70, o autor conclui que a tendência decrescente observada nesse


indicador está associada com o aumento na cobertura do abastecimento de água. Por
isso devemos levar – sempre - em consideração no debate demográfico, sempre as
políticas sociais, a estrutura econômica e as condições de saúde da população.
Monteiro (2000). São muitas as análises e estatísticas demográficas que podem ser
analisadas.

As mensurações demográficas gerais

Diversas medidas podem ser tomadas de um indivíduo em diversos locais. No serviço


militar, nos hospitais, nas maternidades, são ótimas fontes dessas medidas. A
natalidade é um dos importantes fatores, ao lado da mortalidade e da migração, para o
estudo da população. 360 A mensuração é um elemento que serve de fator indicativo
até da situação econômica de um determinado país. Um país em crise tende a ter
queda em sua taxa de natalidade. Na recuperação ou melhora da situação econômica
este país se recupera e a taxa de natalidade tende a voltar ao patamar anterior à crise
ou até maior. É a natalidade que trata da relação entre o número de nascidos vivos e o
total da população. Porém temos que ter em mente o que significa nascido vivo.

Considera-se como criança nascida viva, para o IBGE, aquela que, após a expulsão
ou extração completa do corpo da mãe, independentemente do tempo de duração da
gravidez, manifestou algum sinal de vida. Esses sinais são: respiração, choro,
movimentos de músculos de contração voluntária, batimento cardíaco, ainda que
tenha falecido em seguida.361

A população do planeta aponta para uma tendência de queda. É o que afirma Joseph
Chamie, diretor da Divisão de População da ONU. Segundo Chamie, a fecundidade

358
Apud – Monteiro (2000).
359
Apud – Monteiro (2000).
360
Universidade estadual de Campinas. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Roberto Luiz do Carmo e Alberto
Jakob (orgs.) Disponível em:
< http://cendoc.nepo.unicamp.br/iah/textos/aulas/roberto/Site/Curso603.html > Acesso em: 17 julho 2002
361
http://ibge.net/home/estatística/população/censo2000/fecundidade_mortalidade/conceitos - acesso em 28/07/2002.

153
humana, desde 1965, está se reduzindo.362 A taxa bruta de natalidade, ou
simplesmente natalidade, é obtida relacionando-se o número de nascidos vivos ao
número de habitantes. 363 Podemos obter a taxa de natalidade a partir da seguinte
relação: número de nascidos vivos / população absoluta x 1000.

Com os dados de taxa de natalidade em mãos podemos concluir em que grau de


desenvolvimento encontra-se um determinado país. É um indicador de IDH364. Em
países considerados avançados essa taxa é baixa, com média de 5 por mil, enquanto
que nos países menos favorecidos é mais alta com média de 30 ou mais por mil.
Essas relações têm a ver diretamente com a fecundidade.

A fecundidade 365 é um dos fenômenos demográficos mais importantes, pois mostra e


serve para identificar o grau de uma nação, já especificado. A fecundidade é definida
como o fenômeno relacionado aos nascimentos vivos considerados do ponto de vista
da mulher, do casal ou, mais raramente, em relação ao homem. 366

Em comparação à fecundidade, a taxa de natalidade é ineficaz para se mensurar a


fecundidade de uma população. As idades das pessoas desta população deverão ser
analisadas. Numa população em que haja um índice, preponderante de adultos entre
20 e 40 anos, sua taxa de natalidade, será maior que numa população onde haja
outros elementos preponderantes, como por exemplo, populações com idades
avançadas ou muito jovens. 367

Em face desta possível anomalia, a primeira retificação a ser feita é relacionar o


número de nascimentos não com o total da população simplesmente, mas com o
número de mulheres em idade fecunda, isto é, mulheres entre 12 e 49 anos obtendo aí
sim a taxa de fecundidade geral.5 Entretanto, como a fecundidade varia muito de
acordo com a idade da mulher, calcula-se então, as taxas de fecundidade segundo a
idade.

Quando analisamos uma população ou se quer demonstrar a composição de uma


população graficamente, como é o caso da pirâmide das idades, duas características
362
As mulheres estão tendo menos filhos com o decorrer dos anos.3 (3 Fisk, Robert. ‘Visão’ da ONU ignora questões
cruciais. Folha de São Paulo, São Paulo, 14 mar. 2002. Mundo, p. 18)
363
Souza, Manoel de Mello. Apostila – Processo de Formação Sócio-espacial do Brasil Urbano e Industrial. Disponível
em: < http://www.inx.com.br/~manoel/resumat3.html > acesso em: 14 julho 2002

364
Índice de Desenvolvimento Humano.
365
Nos EUA há um hospital que é considerado o segundo em maternidade. É o Winnie Palmer, em Orlando. Essa
maternidade é a mais movimentada do país. Uma exceção entre os países industrializados, os EUA têm taxa de
fecundidade relativamente alta, devido em parte à proporção de mães adolescentes e ao afluxo constante de
imigrantes. Até 2050, a previsão é de que nos EUA haverá 400 milhões de pessoas. (National Geographic – pág. 61 –
jan/2011 - John Stanmeyer).
366
De acordo com a projeção média da ONU, a população da Índia vai aumentar para mais de 1,6 bilhão até 2050. É
inevitável que a demografia indiana supere a da China até 2030. (Fonte: A.R. Nanda, ex-responsável pela ONG
Fundação População Índia. A esterilização é a principal forma de controle de natalidade na Índia e a maioria das
operações é realizada em mulheres. O governo vem se empenhando para mudar isso. Uma vasectomia sem bisturi é
bem mais barata e fácil de ser realizada no homem do que uma ligadura de trompas na mulher. O operado tem até
incentivo do governo. Recebe um valor equivalente a uma semana de trabalho de um trabalhador normal. Na China a
fecundidade despencou. Há a política rigorosa de filho único. A educação das mulheres também faz com que elas
sejam mais receptivas a contraceptivos e tenham filhos mais tarde. (Fonte – National Geographic – jan/2011).
367
(Sauvy, 19 e pág. 49)
5
Souza, Manoel de Mello. Apostila – Processo de Formação Sócio-espacial do Brasil Urbano e Industrial. Disponível
em: < http://www.inx.com.br/~manoel/resumat3.html > acesso em: 14 julho 2002

154
normalmente estarão presentes: a idade e o sexo dos indivíduos que compõem a
população estudada. Estas duas características determinam o crescimento de uma
população, pois, estão diretamente relacionadas àquelas. Convém ressaltar que as
estruturas por idade e sexo, de diferente países, ou mesmo aquelas que se refiram à
regiões dentro de um único país diferem entre si.368

Numa estrutura populacional por sexo são demonstradas quais implicações que uma
sociedade tende a ocorrer em decorrência dessa formação. A situação quanto a
possíveis matrimônios, acontecerão de acordo com o equilíbrio entre os sexos. Desta
forma, para um país com cultura monogâmica, por exemplo, o equilíbrio entre os
sexos será ideal quanto mais próximo for de 1. Para um país onde predomina uma
cultura poligâmica, onde os homens podem ter várias esposas, a proporção de
homens poderá ser menor do que a de mulheres. A fórmula simples que demonstra
este equilíbrio entre os sexos é chamada de razão de sexo. Ela é a relação entre o
número de homens em relação ao número de cem mulheres.

O resultado obtido com tal formula é também conhecido como índice de


masculinidade. Poderemos inverter, na fórmula, o número total de homens pelo de
mulheres, porém o índice de masculinidade é o convencionalmente aceito. Quanto ao
índice obtido, caso seja maior que 100 teremos então um predomínio de homens; se
for menor que 100 haverá predomínio de mulheres. Um índice próximo de cem, mostra
que há um equilíbrio de gêneros.

Estuda-se também a mortalidade. É um dos fenômenos demográficos mais


importantes, quando falamos de demografia, pois funciona conforme definição da
OMS, em 1950, de que ela deveria corresponder à cessação dos sinais de vida em um
momento qualquer após o nascimento. 369 A mortalidade é o evento demográfico
relacionado ao óbito370 e tem implicações diretas com a saúde de uma população.

A taxa bruta de mortalidade é obtida a partir da divisão do número total de óbitos pelo
número total da população, durante um determinado período. Se for ano a ano,
representa-se por - lx - que quer dizer população de idade x. A título de exemplo, a
taxa bruta de mortalidade, ou simplesmente mortalidade, de uma população de
5.400.000, cujo total de óbitos num determinado ano foi de 75.000, é de 13,88 por mil
habitantes – ou seja, para cada mil habitantes há um índice de 13,88 mortes no ano.
Aí analisam se os motivos da mortalidade e suas relações ou não com a saúde.

É desta forma mais apurada de cálculo envolvendo a taxa de mortalidade que


obteremos a chamada tábua de mortalidade e a partir desta deduzir as taxas de
sobrevivência e a tabela de sobrevivência. No Brasil, as causas de óbito são sempre
analisadas por tipo de mortalidade e por profissão, pois, há controles sobre o assunto

368
Santos, Jair L.F.; LEVY, Maria Stella F.; Szmrecsanyi, Tamás (orgs). Dinâmica da População - teoria, métodos e
técnicas de análise. São Paulo: T.A. Queiroz. 21. 1991
369
Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Roberto Luiz do Carmo e Alberto
Jakob (orgs.) - Disponível em:
< http://cendoc.nepo.unicamp.br/iah/textos/aulas/roberto/Site/Curso603.html > Acesso em: 17 julho 2002
370
O conceito de morte estabelecido pela Organização Mundial de Saúde - OMS em 1950 foi o de que ela deveria
corresponder a cessão dos sinais vitais em um momento qualquer depois do nascimento.

155
e também as relações com a sazonalidade. O aspecto da sazonalidade também deve
ser considerado quando da análise das causas de morte, pois pode ser importante
saber que em determinada época do ano ocorra aumento do número de mortes. Um
exemplo que podemos dar é o aumento de mortes num inverno rigoroso.

As tábuas de mortalidade são instrumentos estatísticos destinados a medir as


probabilidades de vida e de morte das pessoas, em cada idade. Para cada idade ou
grupo de idade, nestes casos são apresentadas as quantidades de falecimentos, a
taxa de mortalidade específica, a probabilidade de falecimentos, a probabilidade de
sobrevivência e a esperança de vida. A esperança de vida, que é obtida a partir uma
tábua de mortalidade, tende a aparecer junto com esta porque é da mortalidade que
se deduz seus dados. (Cordeiro, 2010).

Este assunto é longo e vale por uma dissertação. Trata-se de um dos mais
importantes instrumentos para se conhecer a mortalidade de uma população e é
chamada de tábua de mortalidade ou também de sobrevivência. Muitas empresas,
governos e seguradoras que se dedicaram a confecção de tábuas de mortalidade o
faziam por necessidade própria.

A idade média de uma população é a relação da soma de todas as idades e o total da


população e conforme Alfred Sauvy (1946) não pode ser confundida com a vida média
do habitante dessa mesma população.371

A fórmula para obtenção da idade média é representada pela seguinte relação:


somatória de todas as idades / total da população, enquanto a idade mediana é a
idade que divide o contingente populacional total de uma população em duas partes
iguais resultando que 50% da população está acima da idade mediana ou são mais
velhos e 50% está abaixo desta idade ou são mais jovens que a idade mediana.

Outro tipo de mensuração existente sobre a vida humana, é a Vida média ou


Esperança de vida ao nascer: Da tábua de sobrevivência se chega à fórmula do
cálculo. Este cálculo é feito da seguinte forma: soma-se o número de sobreviventes no
primeiro ano ao total de sobreviventes do segundo ano, e assim sucessivamente e
divide-se o total obtido pelo total de vivos inicial. Por fim, ao resultado desta operação,
soma-se ½ .
Com base nesta informação e analisando uma hipotética tábua de sobrevivência do
Brasil num determinado ano pode-se afirmar que a vida provável do brasileiro é de 65
anos porque nesta idade estão 50% dos indivíduos, os quais nasceram há 65 anos.
Ou seja, 65 anos depois, o número inicial de indivíduos que era de 10000 caiu para
5000, revelando assim que, hoje, a possibilidade de um recém-nascido chegar a 65
anos é de 50% por cento. Portanto, a vida provável deste recém-nascido será de 65
anos.

371
Sauvy, 19, pág.35

156
Os idosos e a longevidade

Todos os elementos citados acima têm direta ou indiretamente relações com a saúde
das pessoas para que, dentro das expectativas, se consiga uma maior longevidade
das populações. O envelhecimento saudável é desejado. Todos, sem exceção,
desejam viver mais e fatos dessa natureza levam a outras análises sobre o
envelhecimento populacional372 e que são relevantes.

Convém frisar que os critérios para caracterização da estrutura etária de uma


população são variados. Um destes critérios é o que caracteriza a população em
progressiva, estacionária e regressiva O índice de envelhecimento de uma população
é apresentado como a relação entre o número de pessoas com mais de 60 anos ou
mais e o de jovens, com menos de 20 anos. Segundo a ONU uma população está
envelhecendo quando 7% de seus habitantes têm mais de 65 anos.373

Deve-se observar que um método de pesquisa para que apresente resultado seguro
sobre os fenômenos, devem compreender um prazo de 5 anos, como no caso da
mortalidade, ou natalidade. Com isso os resultados de variados cálculos que devam
ser feitos terão finalização mais confiável. Um índice que deve ser constantemente
monitorado é o índice de envelhecimento da população brasileira, pois, esse aumento
da longevidade, caminha silencioso e crescente, influenciará no futuro nos dispêndios
da previdência pública e na Saúde Pública, Privada, Serviços sociais e seus
correlatos.

Segundo dados apresentados por Elza Berlquó, (1977) 374 no Seminário Internacional
sobre envelhecimento Populacional, uma agenda para o fim do século XX, é de fato
incontestável as previsões de aumento da população idosa no país: esperava-se
chegar ao final do século com 8.658.000 idosos, ou seja, um em cada 20 brasileiros
terá 65 anos e mais. Este número crescerá para 16.224.000 em 2020, quando 1 em

372
Responsável por tratar dos rumos do mercado de planos de saúde no País, que hoje atende a mais de 40 milhões
de brasileiros, o novo diretor de Desenvolvimento Setorial da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o
médico Maurício Cechin, apontou o risco de os convênios tornarem-se inviáveis para idosos e defendeu o estímulo ao
desenvolvimento de produtos específicos para essa faixa etária. Os mais velhos vêm sendo expulsos do setor em
razão de aumentos das mensalidades e da ausência de oferta de planos individuais. Ele que trabalhou para a Medial e
foi indicado pelo MS, assumiu o cargo há uma semana sob protesto de entidades de defesa dos direitos dos
consumidores. Abaixo assinado referendado por 62 organizações apontou que sua indicação e a de Leandro Tavares,
novo diretor de Fiscalização e ex-funcionário da Amil, faria da Agência, que tem cinco diretores, um órgão dominado
por pessoas ligadas aos planos. Também o atual diretor de Normas e Habilitação, Alfredo Cardoso, trabalhou para a
Amil. (Jornal Vida & Saúde – Estado de São Paulo, sexta feira, 11 de dezembro de 2009).
373
É importante questionar a visão de saúde na velhice devido a relação que se estabelece entre doença e
envelhecimento: um passa a ser sinônimo do outro. O idoso, ao sinalizar – ou negar – sintomas do organismo em
processo de envelhecimento, reflete influências sociais (...) isso evidencia a questão social a ser enfrentada pelos
poderes públicos (...) Como a velhice não é mais atendida somente pela família, deixando de ser preocupação
exclusivamente individual e pessoal, há que se pensar nos subsídios necessários aos profissionais que passam a
assumir essa função... (Costa, 2000). É preciso ouvir os velhos!! Este é um tema presente e que envolve novas
profissões a serem desenvolvidas em breve futuro: os cuidadores.

374
Pesquisadora Sênior - Professora titular aposentada da Faculdade de Saúde Pública da USP, foi Coordenadora do
Programa de Saúde Reprodutiva e sexualidade da Unicamp.

157
cada 13 pertencerá à população idosa. (Costa, 2000). Vejamos se as previsões
estavam corretas. 375 376

Há vários itens a serem explorados a partir de pontos levantados aqui. Um deles é a


questão da violência, em grande parte resultante de fatores como superpopulação ou
de imigrações. Vimos que a urbanização desintegrada é geradora de bolsões de
pobreza em grandes centros, incluindo neste, a cidade de São Paulo, Rio de Janeiro,
Belo Horizonte, Calcutá, Tókio e muitos outros grandes conglomerados de pessoas.377

Se há relação entre essa urbanização e os níveis de violência, esses fatores merecem


especial atenção. Este é um tema que convém ser estudado em medida que cresce
cada vez mais o número de mortes devido à violência, influenciando inclusive as
despesas públicas e privadas com hospitais, saúde em geral, os preços de seguros,
como o de vida, automóveis, roubos, furtos, de casas, apartamentos, empresas,
escolas e conseqüentemente afeta os orçamentos de segurança levando a aumentos
de impostos.

Há países europeus que estão experimentando o processo inverso. 378Está havendo


uma diminuição de sua população, ou seja, um aumento das pessoas com idade mais
avançada devido ao controle mais eficiente da morbidade e menos nascimentos.
Essas situações são quase inusitadas, pois os países têm experimentado, no geral,
nos últimos séculos um aumento contínuo das populações. Quais serão os fenômenos
que existirão na medida em que as populações diminuem e há um aumento
significativo das pessoas com idade mais avançada? 379 380

375
Os idosos são hoje 14,5 milhões de pessoas, 8,6% da população total do País, segundo o IBGE, com base no
Censo 2000. Considera-se pessoa idosa as com 60 anos ou mais, mesmo limite de idade considerado pela OMS para
os países em desenvolvimento. Em uma década, o número de idosos no Brasil cresceu 17%, em 1991, e ele
correspondia a 7,3% da população. (Fonte: IBGE – censo de 2000).
376
O quadro é um retrato do que acontece com os países como o Brasil, que está envelhecendo ainda na fase do
desenvolvimento. Já os países desenvolvidos tiveram um período maior, cerca de cem anos, para se adaptar. A
geriatra Andrea Prates, do Centro Internacional para o Envelhecimento Saudável, prevê que, nas próximas décadas,
três quartos da população idosa do mundo esteja nos países em desenvolvimento. (Fonte: IBGE).
377
Algumas regiões talvez fiquem infernais para se viver. Existem hoje 21 cidades com mais de 10 milhões de
habitantes e a quantidade delas só vai aumentar até 2050. As cidades de Daca, em Bangladesh e Kinshasa, na
República Democrática do Congo, cresceram nada menos que 40 vezes desde 1950. Suas favelas estão lotadas de
gente desesperada que fugiu de áreas rurais em que a miséria era ainda pior. Além disso, há a ameaça de mudanças
climáticas, como a elevação dos mares, Bangladesh é um exemplo provocando deslocamento de populações inteiras.
O massacre de 800 mil ruandeses foi conseqüência de vários fatores, não só de conflitos étnicos, mas também da
superpopulação – um excesso de agricultores – repartindo a mesma área em lotes cada vez menores que se tornaram
insuficientes à subsistência de suas famílias. Os cenários de Malthus podem começam a se concretizar. (Fonte: Livro
Colapso – de Jared Diamond).
378
Na Espanha, os imigrantes indianos fazem até comemorações, pois que em Barcelona estão reanimando o
estagnado crescimento demográfico na Europa. Ao decidir a quantidade de filhos, as mulheres jovens definirão o
crescimento ou a estabilização da população global. Quanto mais escolarizada é uma mulher, menor a quantidade de
filhos que ela provavelmente terá. (Randy Olson – Revista NG – jan/2011).
379
Don José Medina parou de beber aos 106. De vez em quando, ainda toma "um puro" (aguardente), mas não mais
de um por dia. Fuma, mas muito menos do que quando "era jovem" , em torno dos 70 anos. Aos 112, não conseguiu
largar o chamico, cigarro feito com uma erva alucinógena. Medina vive em Vilcabamba, um povoado com cerca de
4.000 habitantes no interior do Equador (650 km ao sul da capital, Quito) que a paranóia pela vida saudável ainda não
encontrou. As condições sanitárias do local são verdadeiros desastres pois, na maioria das casas, não há esgoto nem
água encanada. Seus habitantes fumam, bebem álcool, comem muito sal, tomam muito café, usam drogas. É um dos
povos com maior proporção de pessoas centenárias no mundo com cerca de dez vezes mais do que a média.
Centenários e saudáveis. Por ali, é comum encontrar idosos de 110, 120 anos. Lêem sem óculos, conservam os
dentes originais. A maioria ainda trabalha e tem vida sexual ativa. Os cabelos ficam brancos quando chega a idade,
mas depois voltam à cor natural, sem explicação. E, ao contrário da maioria dos lugares do mundo, os homens vivem
mais do que as mulheres. "Alguma coisa estranha acontece em Vilcabamba", diz o médico e escritor argentino Ricardo
Coler, um entre tantos profissionais que foram à cidade em busca de uma explicação. Sobre o mistério, ele escreveu
"Eterna Juventud - Vivir 120 Años" (editora Planeta) sem previsão de lançamento no Brasil, em que relata histórias
como a de José Medina. São várias as teorias que tentam explicar a longevidade saudável dos habitantes de

158
Esses processos demográficos fazem parte do que os especialistas chamam de
transição demográfica. Em um país que completou a transição, ou seja, está no
período em que se chama de país desenvolvido, as pessoas retomam da natureza
pelo menos algum controle sobre a morte e o nascimento. A explosão da população381
é um efeito colateral inevitável. No entanto, a taxa de crescimento estava no ápice
bem na época em que Ehrlich soou o alarme.

No início dos anos 1970, as taxas de fecundidade em todo o mundo haviam começado
a despencar – com maior rapidez que o previsto. Desde então, a taxa de crescimento
da população já caiu mais de 40%. Conforme o país, uma distinção de processo
demográfico diferente. A França foi uma das primeiras. Até o começo do século 18, as
mulheres nobres na corte francesa desfrutavam dos prazeres carnais e nunca tinham
mais de dois filhos. Para isso recorriam ao mesmo método anticoncepcional usado por
Leeuwenhoek para realizar seus estudos: a interrupção do coito. 382

Em Portugal, por exemplo, homens e mulheres entre 1987 e 2006 duplicaram aqueles
que chegaram até os 80 ou mais anos de idade. O aumento da população idosa,
considerando-se todos com mais de 65 anos ou mais em relação a população total é
bastante evidente naquele país. A proporção de pessoas com 80 ou mais anos de
idade duplicou passando de 2% em 1987 para 4% em 2006. Entre 1987 e 2006 subiu
de 19 para 26 o número de pessoas com 65 ou mais anos de idade por cada 100
pessoas em idade ativa.

Nos próximos 25 anos o número de idosos poderá ultrapassar o dobro do número de


jovens. Calcula-se que 300 mil idosos vivam isolados. Por isso é necessário
envelhecer com saúde. Incapacidades, doenças crônicas, solidão e exclusão tendem a
retirar vida aos anos de vida aumentados conseguidos pelas sociedades com tanto
esforço nessas últimas 30 décadas. No caso do Brasil, o envelhecimento da

Vilcabamba. Cientistas americanos afirmaram que era a composição da água que bebem. Franceses atribuíram o fato
ao clima da região. Outros dizem que é o ar, a alimentação saudável à base de milho, batata, vegetal, e pouca carne
ou a vida tranqüila. Nenhuma explicação foi comprovada até hoje."Estudei a água de Vilcabamba, e sua composição
se parece bastante com a água que se bebe em Buenos Aires", diz Coler, que também exclui a possibilidade de a
longevidade ser genética. "Até os cachorros vivem mais, cerca de 25 anos. Ninguém descobriu a causa, senão já
estaria rico." Há também algumas teorias pseudocientíficas, que vinculam os efeitos benéficos de Vilcabamba à
eletricidade no ar ou à possível presença de óvnis e extraterrestres. Seja qual for a explicação, a fama de Vilcabamba
atrai todo tipo de gente. O comediante mexicano Cantinflas (1911-1993) passou o ano de 1968 na cidade, onde teria se
curado de problemas cardíacos. Uma ex-executiva da Nasa fundou ali uma espécie de spa “new age” que promove
hábitos saudáveis. Um ex-astronauta e um general do Exército americano também estão entre os que circulam pela
avenida Eterna Juventud, a principal da cidade. Todos, acredita Coler, vão atrás dos 40 anos a mais de vida. "Por isso,
além dos cientistas, chegam os multimilionários, os crentes, os políticos, os messiânicos. Vêm por esses 40 anos como
antes se ia por ouro ao velho Oeste ou por petróleo ao Oriente Médio", conta.

Fonte: Folha de S.Paulo. http://www1.folha.uol.com.br/folha/equilibrio/noticias/ult263u467278.shtml


380
A importância dos idosos para o País não se resume à sua crescente participação no total da população. Boa parte
dos idosos hoje são chefes de família e nessas famílias a renda média é superior àquelas chefiadas por adultos não-
idosos. Segundo o Censo 2000, 62,4% dos idosos e 37,6% das idosas, são chefes de família, somando 8,9 milhões de
pessoas. Além disso, 54,5% dos idosos chefes de família vivem com os seus filhos e os sustentam. (Fonte: IBGE).
381
A escassez de alimentos poderá provocar um colapso da civilização. Os seres humanos estão vivendo do capital
natural, erodindo o solo e esvaziando os aqüíferos com maior rapidez do que eles podem ser recuperados. Isso
começará a prejudicar a produção de alimentos. (Fonte: Lester Brown, fundador do Instituto Worldwatch),
382
A inovação crucial era de natureza conceitual e não anticoncepcional, como diz Gilles Pison, do Instituto Nacional
de Estudos Demográficos em Paris. Até a época do Iluminismo, “a quantidade de crianças que se tinha era algo que
estava nas mãos de Deus. As pessoas não se davam conta de que poderiam tomar as rédeas do fenômeno”. Outras
nações ocidentais acabaram seguindo o caminho da França. No início da segunda guerra, houve declínio da
fertilidade, mas após o término houve um idéia de que a fecundidade subiria novamente, mas ledo engano dos
demógrafos, continuou caindo. (Nacional Geographic - pág. 62 – Robert Kunzig – jan/2011).

159
população é reflexo do aumento da expectativa de vida, devido ao avanço no campo
da saúde e a redução da taxa de natalidade. Prova disso é a participação dos idosos
com 75 anos ou mais no total da população – em 1991, eles eram 2,4 milhões (1,6%)
e, em 2000, 3,6 milhões (2,1%).

Os idosos são hoje 14,5 milhões de pessoas, 8,6% da população total do País,
segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base no Censo
2000. O instituto considera idosas as pessoas com 60 anos ou mais, mesmo limite de
idade considerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para os países em
desenvolvimento. Em uma década, o número de idosos no Brasil cresceu 17%, em
1991, ele correspondia a 7,3% da população. A população brasileira vive, hoje, em
média, de 68,6 anos, 2,5 anos a mais do que no início da década de 90. Estima-se
que em 2020 a população com mais de 60 anos no País deva chegar a 30 milhões de
pessoas (13% do total), e a esperança de vida, a 70,3 anos.

É necessário que os países intervenham articulando centros de saúde, hospitais,


cuidados continuados e instituições de apoio social. Promover a criação de serviços
comunitários sob a forma de parcerias, ONG’s e outras instituições. 383Desenvolver
hospitais de reabilitação, cuidados continuados e incentivando o idoso a participar da
vida ativa de outras pessoas também. Necessário reativar atividades em domicílio e
reforçar apoio à família, fornecendo rápida internação temporária em caso de
necessidade. Afinal, em Portugal, dentro de alguns anos eles serão maioria. Inúmeros
outros países estão no mesmo caminho.

Há países europeus que têm incentivado o nascimento de filhos pagando ao casal


valores consideráveis por criança e dão até outras regalias como garantia de estudos
e saúde. Há antigos estudos demográficos em épocas ou períodos em que não se
consideravam esses elementos como de importância para análises demográficas e
que pudessem envolver estudos de projeção de saúde pública e até da privada.

Existem muitos processos em Demografia para estudos de crescimento e


decrescimento das populações. Os primeiros estudiosos do assunto foram
Wappaus,384 Malthus, C.H. Carey,385 Paul Leroy-Beaulieu,386 Adam Smith, Doubleday
Verhulst,387Raymond Pearl,388 Yule,389 Pearl-Reed,390 Paul Douglas. 391No Brasil os

383
Essa preocupação de 8 bilhões – estimativa otimista da ONU – para 2050 de habitantes do planeta, faria com que
Bangladesh teria uma taxa de fecundidade de 1,35 em 2050, mas ainda 25 milhões de habitantes a mais que hoje. A
taxa de fecundidade em Ruanda também seria inferior ao nível de reposição, mas sua população atingiria o dobro do
que era antes do genocídio. Se esse é o cenário mais otimista, podemos afirmar que o futuro é de fato deprimente.
Talvez essa preocupação com os números populacionais não seja a melhor maneira de se confrontar o futuro. As
pessoas amontoadas em favelas necessitam de ajuda, mas os problemas a serem resolvidos são a pobreza e a falta
de infraestrutura, não a superpopulação. Proporcionar a todas as mulheres acesso aos serviços de planejamento
familiar é uma boa idéia. No entanto, o mais agressivo programa de controle populacional que se possa imaginar não
vai salvar Bangladesh da elevação no nível do mar, nem Ruanda de outro genocídio e nem todas as pessoas dos
enormes problemas ambientais que estão à nossa frente. O aquecimento global é um exemplo. A emissão de carbono
é outro. (Fonte: National Geographic – jan/2011).

160
estudos demográficos até então efetuados e os trabalhos científicos elaborados pela
Unicamp são inestimáveis e todos estão relacionados com as tábuas de mortalidade
ou sobrevivência. Todos esses aspectos são precedentes ao estudo das populações
que geraram as análises e confecção de dados que denominamos de tábuas de
sobrevivência, chamadas também de tábuas de mortalidade que veremos mais
adiante.

A demonstração da quantidade de pessoas vivas e a quantidade de falecimentos


conforme as idades, o tempo decorrido ou à decorrer, a vida média e provável, é o que
chamamos de tábua de sobrevivência ou de mortalidade. Com essa tábua podemos
medir as probabilidades de sobrevivência e morte das populações num determinado
período. Os primeiros estudos dessa natureza foram efetuados por empresas de
seguro que tinham interesse direto no assunto, e já existem há muito tempo.

As análises estatísticas mais antigas que se conhece sobre esses estudos foram de
John Graunt à respeito da mortalidade em Londres. Há também estudos de Halley,
Smart, Deparcieux, Duvillard, Wargentin, Price, Sussmilch, Farr, Finlaison, Quetelet,
Kersseboon, Wittstein, de empresas francesas, americanas, inglesas e alemãs.
No Brasil temos uma tábua brasileira do IBGE e acreditamos que em breve futuro
haverá outras até mais bem elaboradas.392 Se por hipótese, partirmos de um grupo
observável de 10.000 crianças nascidas, a cada ano, os sobreviventes serão função
do tempo, ou seja, o gráfico dessa população é uma função contínua, depois de sua
retificação e ajuste, cuja curva representa a sobrevivência do grupo considerado.

392
Uma mudança na forma de mensurar a expectativa de vida da população anunciada hoje pela Superintendência de
Seguros Privados (Susep) e pela Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (FenaPrevi) vai permitir que os
brasileiros paguem menos na hora de comprar seguros de vida. Por outro lado, terão que contribuir por mais tempo em
planos de previdência para manter o mesmo benefício.
A mudança, calculam as entidades, deve baratear em 10% a 15% o preço do seguro de vida para homens e mulheres
na casa dos 40 anos, segmento que mais consome esse tipo de produto no País. Já no caso da previdência, as
mulheres saíram mais prejudicadas porque terão de contribuir por mais seis meses, enquanto os homens vão precisar
de apenas um mês de contribuição para garantir o mesmo benefício.

O ajuste é fruto do aumento na expectativa de vida diagnosticada pela primeira tábua atuarial desenvolvida
especialmente para o mercado brasileiro. Antes, o segmento adotava como parâmetro para seus produtos dados da
população dos Estados Unidos.

"É um marco histórico para o setor que passará a ter produtos adaptados à nossa realidade", afirmou o presidente da
Susep, Armando Vergílio. A nova tábua toma como base apenas os consumidores de planos de previdência e seguros
no País, um universo de 32 milhões de pessoas. Com a mudança, a previsão de vida desses brasileiros na faixa de 40
anos subiu em sete anos. Na média geral, a tábua elevou a expectativa de vida dos homens em quase dois anos e de
mulheres, em 1,2 ano. (Fonte: 18/03/2010 às 18:25 – agência o Estado).

161
Todos esses aspectos relativamente a morbidades, saúde e consequências estão
diretamente relacionados com os estudos das funções de sobrevivência.
Intuitivamente sabemos como a função de sobrevivência se comporta. Os
falecimentos são relativamente fortes nos primeiros anos de vida e depois decrescem
quando meninos ou meninas, crescendo em seguida na adolescência até a meia-
idade e inicia um processo de aceleração com a aproximação do limite pressuposto
para o ser humano.

Os motivos que influenciam a mortalidade são tantos e de várias origens que não
podemos analisar de per si e somente sob a ótica quantitativa. As leis que a natureza
fornece para sobrevivência não podem apenas ser representadas, friamente e
somente como uma simples equação, todavia, é preciso sempre estar atento e
monitorando suas conseqüências. Influências como sexo, clima, alimentação, fatores
genéticos, hereditários, condições materiais, qualidade de vida, fumo, bebidas, DST393
são elementos que tem ligações na enorme teia de mortalidade ou sobrevivência. As
ciências sociais, portanto, trabalham com tábuas que, de certa forma, representam o
afunilamento de todas essas situações, resumindo dados quantitativos aproveitáveis
para conclusões sobre Saúde e a vida humana.

Tendo em vista então os primeiros ensaios de Demografia sua multidisciplinaridade,


funções básicas, conceitos estatísticos e probabilidades devem ser preparadas para a
introdução de conhecimentos acadêmicos e técnicos das tábuas de sobrevivência.
Muitos técnicos, cientistas sociais e/ ou estatísticos do Brasil e do exterior, que
exercem funções na atividade demográfica, devem tentar percorrer os caminhos de
inúmeros estudiosos da Geografia demográfica e sua abrangência multidisciplinar
relativamente às tábuas de sobrevivência.

Sabe-se que uma das mais antigas tábuas conhecidas com as características atuais
foi de Edmund Halley.394 no século XVI. Ele colheu dados sobre os óbitos e
nascimentos na cidade de Breslaw na Alemanha em 1693. Tais levantamentos
levaram a conclusão de que problemas sérios de saneamento básico existiam na
cidade e por isso muitas crianças não passavam do primeiro ano de vida.

Por outro lado, deslocando-nos no tempo, podemos imaginar as dificuldades, por


exemplo, um século atrás ou menos, para trazer informações. Necessário seria ir ao
início de 1900, época ainda muito difícil para se obter, catalogar e processar um
volume grande de informações. Não se pode esquecer que os dados eram
processados manualmente e não havia programas do tipo Excel, SPSS, Mini-tab e
outros para processamento do banco de dados.

Um dos problemas mais difíceis é o acompanhamento das migrações, pois, nasce


alguém em São Paulo, Capital, vai morar em Belo Horizonte, casa em Roraima, mora
em Manaus durante quarenta anos e morre em Corumbá no Mato Grosso do Sul.
Essas migrações também são estudadas para efeito de ajustes das tábuas. O estilo de

393
Doenças sexualmente transmissíveis
394
O mesmo que descobriu o cometa que levou o seu nome.

162
vida das pessoas observadas também é fator importante no ajuste. Ele deve obedecer
um certo padrão que acompanhe a dinâmica da própria vida que seria a educação,
conhecimento, saúde e acompanhamento dos progressos de saneamento, da
medicina e tecnologia. Em resumo, deve ter elementos com possibilidades de ajuste
para o futuro.

Outra relação demográfica interessante é aquela que compara a mortalidade com a


Densidade Demográfica. Onde há muitos indivíduos ocupando espaços (A), cada vez
menores, a relação ∆ (delta) é proporcional (Densidade) e população (P). Em resumo:
p
∆ = , chamado de fator Densidade. É claro que para os dias atuais tal relação
a
deve ser revista, mas a possibilidade da morbidade se alastrar em ambiente cada vez
mais populoso é uma verdade apurada até nos dias de hoje. 395 Doenças contagiosas,
gripes normais ou H1N1, AIDS, hepatites, se disseminam nos locais mais populosos
além dos problemas ambientais. Prédios superlotados, elevadores, metrôs, ônibus e
locais de grande quantidade de habitações, como cortiços, são exemplos de fatores de
densidade elevados.

Se fizermos tais comparações, de forma empírica, em populações carcerárias ou em


penitenciárias, por exemplo, verificaremos sua veracidade. Em estudos Demográficos
há ainda muito que se fazer no Brasil. Como exemplo, pode-se verificar que dados de
morbilidades em geral ainda são incipientes. Por isso, as estatísticas em Saúde são de
fundamental importância. Aspectos ambientais devem também ser levados em conta.

Com o aumento da quantidade de planos de saúde e dos seguros saúde, os


atendimentos no SUS, Hospitais e demais órgãos que processam dados estatísticos
como a ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar, tendo em vista os progressos
da tecnologia, deverão fornecer em breve futuro, estatísticas confiáveis para estudos
demográficos e de morbidade quase próximos da perfeição que muito ajudará nas
análises das morbidades. Em sequência há estatísticas interessantes do PNDS –
Plano Nacional de Demografia e Saúde – no caso específico, da saúde da mulher, por
exemplo, e da saúde infantil.

É óbvio que outras moléstias aparecerão para tumultuar a nossa espécie, pois a
história mostra que o homem sempre está atrás de uma nova cura para uma doença
que nos atormenta e para centenas de outras que atacam a raça humana. O
processamento de dados para esses estudos, e para o Demógrafo, Geógrafo ou

395
Claro que a quantidade de pessoas faz diferença. Mais relevante ainda é o modo como as pessoas consomem os
recursos. O principal desafio para o futuro das pessoas e do planeta é tirar da pobreza o máximo de gente e ao mesmo
tempo reduzir o impacto de todos nós sobre o planeta. O Banco Mundial prevê que até 2030 mais de um bilhão de
pessoas nos países em desenvolvimento vão passar a fazer parte da classe média global. Em 2005 eram apenas 400
milhões. Embora isso pareça muito bom, não será nada fácil para o planeta se essas pessoas passarem a comer carne
e a circular em carros movidos a gasolina. É tarde demais para evitar que nasça a classe média de 2030, mas não para
mudar a maneira como ela e todos nós produzimos e consumimos alimentos e energia. Há alertas apocalípticos e há
alertas otimistas. A controvérsia já existia na época do reverendo Thomas Malthus. Ele escreveu: o homem é
preguiçoso e avesso ao esforço, a menos que seja obrigado pela necessidade. A necessidade é a mãe da esperança.
Os esforços que os homens se vêem obrigados a fazer, a fim de se sustentar ou à suas famílias, despertam faculdades
que de outro modo teriam ficado para sempre dormentes, e é uma observação corriqueira que situações novas em
geral dão origem a mentes adequadas para enfrentar as dificuldades nas quais estão envolvidas. Sete bilhões de
pessoas logo mais 9 bilhões em 2045. Espera-se que Malthus esteja certo a respeito da engenhosidade do ser
humano. Fonte: National Geographic – Brasil – janeiro / 2011 – pág. 75 – Artigos de Robert Kunzig.

163
Estatístico chama-se Nosografia. Não há ainda tábuas de morbidade completas. O
que existem são tábuas de invalidez.

Necessário será para o futuro que os técnicos e os Demógrafos se unam, com o


auxílio dos governos, para desenvolvimento de tábuas de morbidade baseadas nas
moléstias constantes da Tabela da AMB396 e CID397 fazendo-se ajustes reais para
futuras determinações de preços para planos de saúde e projeções de mais longo
prazo para a Saúde Privada e Assistência Social Pública e com isso tirar conclusões.

No mínimo, esses preços deveriam ser nivelados. É uma revolução nos conceitos. As
separações por faixas etárias existentes no caso da saúde suplementar somente
prejudicam aqueles que têm idade mais avançada. Exatamente, aqueles que estão em
fase não produtiva e normalmente com mais dificuldade de obter recursos. Faixas
etárias é nivelamento simplista e não muito técnico. Ao invés de ajudar a população,
prejudica.

Aumentos por sinistralidade também são formas obscuras de se determinar reajustes


ou preços em morbidades, pois, com exceção dos planos empresariais de saúde, os
demais, com milhares de usuários, não têm acesso efetivo a sinistralidade da
companhia. São dados que jamais escapam das próprias entidades operadoras de
saúde e seguradoras. Não há transparência ainda, mas o futuro pode prometer muito
à Saúde, tanto pública quanto privada.

Tecnologias, genética e futuro

No caminho da saúde pública e privada

O desenvolvimento da Genética398 deve levar as ciências sociais a considerar


aspectos muito interessantes sobre a curva de sobrevivência da raça humana,
morbidades e suas aplicações futuras e também da Saúde. Tais conceitos modificarão
comunidades inteiras, populações e consequentemente os seguros, a previdência
pública e a privada, seguridades em geral, saúde pública, planos de saúde, seguros
saúde e necessariamente levará a um “managed care” rotineiro e obrigatório.

Enquanto isso talvez, a ciência aprenderá no tempo, a congelar órgãos para usos
médicos. Seria excelente avanço para transplantes, pois doadores e recipientes nem
sempre estão próximos ou preparados para uma cirurgia. Seria bom também que se
aprendesse como congelar tecidos de ovário para a saúde da mulher. Sem eles, ela
entra na menopausa. O tecido ovariano obtido e congelado da mulher ainda jovem
poderá ser usado para adiar ou controlar os efeitos da menopausa, quando ela estiver

396
AMB - Associação Médica Brasileira.
397
CID - Classificação Internacional de Doenças.
398
O projeto Genoma Humano passou por vários treinos antes de ser finalizado. Desde 1995, cerca de 40 organismos
tiveram seus genes decifrados. Há várias razões para isso. A princípio, os genomas completos de vírus e bactérias
serviram para testar a técnica do seqüenciamento de genes, que exige a ação conjunta de computadores poderosos,
sendo, portanto, dominada por poucos países. A Xylela fastidiosa, praga que provoca amarelinho em laranjais, foi o
primeiro fitoparasita – que ataca plantas – a ser seqüenciado no mundo. A proeza se deve a 35 laboratórios de
pesquisa e cerca de 300 cientistas brasileiros patrocinados pela Fapesp – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado
de São Paulo.

164
perto dos 50 anos.399.

Outros aspectos da Genética,400 é que os primeiros estudos já verificam as


possibilidades de se saber por antecipação, quando do nascimento ou até mesmo na
fase intrauterina, se uma pessoa terá diabetes, câncer ou até mesmo desenvolvimento
das doenças conhecidas como mal de Parkinson e outras enfermidades, através dos
exames do DNA.401 Artigos em periódicos sobre o assunto já fazem parte da literatura
futurista do que será a seguridade geral e em especial a Saúde em geral, nos
próximos anos.

Além disso, a popularização da Internet vai alterar as práticas de prestação de


serviços de saúde, com diminuição da morbidade em todos os elos da cadeia de
valores que compõem este setor afetando diretamente a Demografia. Deverá gerar
produtos compatíveis e mais criativos. Deverão reduzir custos e agregar diferenciais.
Fazer uma medicina multidisciplinar, tais como, acompanhamento diário de clientes
on-line com problemas de diabetes, hipertensão, para evitar males maiores como
internações, fazer monitoramento de doenças via “Home-Care” em formato digital.

As pesquisas nacionais de demografia e saúde demonstram esses avanços de


informação e tecnologias. É o caso da saúde da mulher, cujos dados atualizados até
2008 demonstram que está havendo grande evolução sob os aspectos de prevenção.
Luciano Gois,402 pesquisador, baseado na PNDS/2006, fez várias observações que
seguem em 24 de outubro de 2008.

399
Mais de 80 corpos humanos estão hoje congelados em cápsulas especiais, a maioria nos EUA. São de pessoas
que esperam os avanços científicos do futuro. São ricas o bastante para bancar os 150 mil dólares que algumas
empresas cobram para fazer um picolé humano. A experiência não é simples. Quando o sangue começa a congelar,
aumenta a concentração de substâncias dissolvidas no plasma. A água escapa das células dos tecidos que ficam
perigosamente desidratados. À medida que a temperatura cai, as células viram uma peneira. A água congelada
transforma-se em cristais pontiagudos, danificando as membranas e outros componentes celulares. Os lipídeos, que
formam as membranas celulares, solidificam como nódulos que deixam buracos pelos quais o conteúdo celular escapa
ainda mais. (Artigo na Revista Galileu, de fevereiro de 2001 – de Andréa Kauffmann-Zeh – que é bióloga e editora
sênior da revista inglesa Nature. Nascida em Conceição do Mato Dentro, em Minas, é formada pela UFRJ. Fez
doutorado no Instituto Ludwig para a Pesquisa do Câncer e pós-doutorado no Imperial Câncer Research Fund, de
Londres). Será que teremos direito à imortalidade?
400
A princípio, a notícia da criação de uma ovelha clonada em laboratório causou sensação pelo inusitado. Parecia que
o homem, mais especificamente, Ian Wilmut e os cientistas do Instituto Roslin, na Escócia, estavam brincando de
inventar a vida, ao anunciarem ao mundo o nascimento da ovelha Dolly, em 1996. Mas Dolly foi apenas o começo. O
que os pesquisadores queriam realmente era o que veio depois de Dolly. Em 1997, os mesmos cientistas criaram uma
segunda ovelha, chamada Polly, que além de clonada, era transgênica. Ela continha genes que não eram de sua
espécie. O material genético dela havia recebido um gene humano. Isso tornava a ovelha capaz de fabricar o chamado
fator XI humano, que os hemofílicos não possuem. Quando uma pessoa se corta, são os fatores de coagulação, entre
eles o fator IX, que fazem o sangramento parar. Polly é capaz de produzir o fator IX e fornecê-lo pelo leite. A
possibilidade de usar animais e plantas para fornecer substâncias essenciais ao homem é um dos resultados da
pesquisa genética. (Fonte: Revista Galileu, 2001 – fev.º).
401
Problemas de saúde freqüentes na sociedade, como o diabetes, poderão ser diagnosticados com antecedência no
futuro. Todos poderão, no futuro, ter um código de barras como identificador. Quando observamos um ser vivo, o
identificamos por seu corpo, sua morfologia, que é a expressão de um código que pode ser usado literalmente como
um código de barras: o DNA, o código genético. O projeto The Barcode of Life Data systems (Bold, na Universidade de
Guelph, em Ontário, Canadá), que registra sequências curtas dos segmentos de DNA que distinguem uma espécie de
outra, para poder saber que ser vivo é esse que temos diante de nós não pelo seu aspecto, mas comparando seu DNA
com uma biblioteca de DNA de 65 mil espécies, a qual se pode acessar online. Foi usando o Bold que Brenda Tan e
Matt Cost, dois estudantes da Trinity School, de Manhattan, mantida pela Universidade Rockefeller, descobriram que
11 de 66 produtos comprados aleatoriamente enganavam os consumidores. Um deles foi o leite de ovelha, que na
realidade era leite de vaca, troca mais grave ainda se o consumidor for indiano. Em futuro não muito distante aparelhos
portáveis para detecção do DNA serão possíveis. A indústria alimentícia que se cuide. (Revista América Economia –
março de 2010\ pág. 81).
402
http://www.saudemulherdf.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=8:pesquisa-nacional-de-
demografia-e-saude-pnds-2006-&catid=2:noticias&Itemid=7 (acessado em 25/07/2009)

165
A Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde financiada pelo Ministério da Saúde e
realizada pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, por intermédio de um
conjunto de instituições de notório saber, demonstra que são inegáveis os avanços na
cobertura das ações de atenção à saúde da mulher. O Brasil está definitivamente
colocado diante do desafio de acelerar a qualificação dessas ações, consolidando os
direitos sexuais e direitos reprodutivos desse segmento populacional e reafirmando os
compromissos assumidos nas Conferências Internacionais de População e
Desenvolvimento 403

Outro espectro da visão futurista na atividade de saúde é a Nanotecnologia.


Laboratórios universitários e empresariais levam a nanotecnologia à indústria
farmacêutica regional, posicionando a região na vanguarda tecnológica e prometendo
reduzir enfermidades e custos sanitários.

No artigo da revista América Economia, de março de 2010, Juan Pablo Dalmasso, de


Córdoba, informa que já faz dez anos que na Argentina Eder Romero concluiu seu
pós-doutorado no exterior e se instalou na Universidade Nacional de Quilmes, na
Grande Buenos Aires. Aproveitou, nesse período, para desenvolver sua prática em
transferência tecnológica para pesquisar o transporte de remédios com base na
nanotecnologia, que é a introdução de medicamentos no corpo humano trabalhando
em uma escala equivalente a milionésima parte de um milímetro.

Se a escala era pequena a aposta era grande. No ano 2000, a nanotecnologia sequer
tinha alcançado o status de emergente. Mundialmente, registravam-se mais papers do
que pesquisas de fato, e os grandes laboratórios acabavam de fazer seus primeiros
anúncios, com mais prospectivas do que produtos. Mesmo assim, Eder Romero e a
Universidade de Quilmes criaram o Laboratório de Projeto de Transporte de
Remédios, o LDTD. 404 Há inúmeros estudos e constatações, inclusive quanto à
reprodução e fecundidade das mulheres.

403
Cairo - 1994) e da Mulher - Pequim 1995
404
Eder e seu grupo escolheram atacar o Trypanosoma cruzi, causador do Mal de Chagas. Sua particularidade é a de
que, quando provoca sintomas, já está alojado dentro das células do coração. Essa localização é inalcançável pelas
drogas conhecidas. A doença é uma endemia latino-americana que, apesar de atingir 90 milhões de pessoas, não está
entre as prioridades da indústria farmacêutica. Descobriu-se que transportar com base em polímeros biodegradáveis e
descobrir que droga conhecida poderia funcionar melhor. As provas in vitro mostraram que, com uma dose 200 vezes
inferior à habitual, era possível eliminar 100% da colônia de parasitas. Isso muda muitos resultados, inclusive os custos
em saúde. O impacto nos custos é enorme. Alguns estudos da Organização Panamericana de Saúde ilustram o
impacto. Somente a Bolívia tem de gastar mais de US$ 30 milhões anuais para atender os infectados por esse mal. No
Brasil, o custo é estimado em US$ 1 mil por doente, considerando somente medicamentos e 20 dias de internação
anuais. Se forem somados a isso os custos com marca-passos e outros intangíveis, como a invalidez parcial, os
números tornam-se mais altos. Isso quer dizer que estudos como esse, na última década, as aplicações
nanotecnológicas na medicina passaram de uma potencialidade teórica para uma promessa tangível. (Revista América
Economia, março\2010 – pág. 76 e 77).

166
Controle das populações

Vários países e saúde

A taxa de fecundidade total (TFT) 405 , na Rússia, manteve a tendência à queda, tendo
diminuído os diferenciais entre os locais de residência - urbana e rural. A praticamente
ausência de variação dos níveis estaria indicando comportamento reprodutivo
consolidado em patamares próximos do equivalente aos níveis de reposição da
população.

A TFT passou de 2,5 filhos por mulher, no período 1993 - 1996, para 1,8 filhos por
mulher, no período de 2003 – 2006. A diferença entre a TFT de mulheres da área rural
e de área urbana de 1,2 (3,5 e 2,3 filhos por mulher respectivamente) tornou-se de
0,23 (1,99 e 1,76 filhos por mulher) em 2003-2006.

No que concerne à anticoncepção os resultados encontrados demonstram os


inegáveis avanços alcançados pelas políticas públicas de planejamento reprodutivo,
particularmente no que diz respeito à ampliação do leque e do quantitativo de métodos
anticoncepcionais distribuídos gratuitamente. 406

O conhecimento de métodos anticoncepcionais estendeu-se universalmente e


apresentou um aumento no número de métodos modernos conhecidos, que passou de
7 para 10. A maioria das mulheres em idade fértil já fez uso de algum método
anticoncepcional, sendo este percentual de quase 100% entre as mulheres
sexualmente ativas.

Controle no Brasil

Houve um aumento de 12,4 pontos percentuais na proporção de mulheres em idade


fértil que estão fazendo uso de algum método no período de 1996 a 2006 (de 55,4%
para 67,8%) e de 3,9 entre as mulheres em idade fértil (de 76,7 para 80,6%). No Brasil
a prevalência por método anticoncepcional entre mulheres em idade fértil (MIF)
demonstra uma mudança profunda em relação à situação revelada pela PNDS 1996,
quando a anticoncepção estava praticamente restrita a dois métodos, quais sejam:
40% das mulheres laqueadas e 20,7% fazendo uso de pílulas. Nesses aspectos a
ANVISA torna-se indispensável para controle de medicamentos injetáveis ou não.

Destaca-se o uso de injetáveis que triplicou passando de 1,2 para 4% das MIF unidas.

405
Na Rússia, em Novotishevoye, um dos milhares de vilarejos russos cuja população vem se mudando para as
cidades e tendo menos filhos, o governo comprometeu-se a pagar 11.500 dólares às mulheres que tiverem um
segundo filho. (Randy Olson – revista National Geographic – jan/2011).
406
O fim do “baby-boom” costuma ter dois efeitos importantes na economia e consequentemente na saúde das
pessoas de um país. O primeiro é o “dividendo demográfico” – algumas poucas décadas afortunadas durante as quais
os membros dessa geração inflam a força de trabalho, ao mesmo tempo em que se mantém baixa a quantidade de
dependentes jovens e idosos; em conseqüência, sobra mais dinheiro para outros gastos. Mas em seguida vem o
segundo efeito, quando todos esses trabalhadores envelhecem e começam a se aposentar. O que antes parecia uma
situação demográfica perene agora virou uma festa prestes a acabar. Um problema se apresenta hoje a todo mundo
desenvolvido: o de achar meios para sustentar uma população cada vez mais idosa. A pergunta que não cala de Frans
Willekens, do Instituto Demográfico Interdisciplinar dos Países Baixos é se em 2050 vai haver trabalhadores em
quantidade suficiente para assegurar o pagamento das pensões?. (National Geographic - pág. 62 – janeiro/2011 –
artigo de Robert Kunzig).
407
Sugere-se ler – “A verdade sobre os laboratórios farmacêuticos” – Angell, M. RJ – Record – 2007.

167
Também o uso das pílulas e do DIU apresentou acréscimos, respectivamente, de 20,7
para 24,7% e de 1,1 para 1,9%. Entre as MIF 12% já tiveram experiência de uso da
pílula do dia seguinte, 23,2% no grupo das não unidas sexualmente ativas e 11% das
MIF.

Digno de nota é o fato de que no universo de mulheres em idade fértil o uso da pílula
superou a porcentagem de mulheres laqueadas. As farmácias continuam a ser a maior
fonte de obtenção de métodos hormonais (pílula e injetáveis) e da camisinha,
enquanto os serviços do SUS o são para a esterilização feminina, e os serviços
privados para a esterilização masculina. Na PNDS/2006 o SUS passou a ser a maior
fonte de obtenção do DIU (de 47,4 para 59,4%).

A PNDS/2006 mostra ainda que no Brasil foi alcançada a cobertura universal da


atenção ao pré-natal e ao parto institucional atendido por profissional de saúde
qualificado. A PNDS/2006 evidenciou um grande avanço no acesso de gestantes do
meio rural ao pré-natal.

Em 1996, 31,9% dessas mulheres não se submetiam a nenhuma consulta pré-natal.


Em 2006, esse número caiu para 3,6%. No meio urbano, a redução foi de 8,6% para
0,8% de mulheres sem nenhuma consulta. Houve um aumento em 17 pontos
percentuais das gravidezes em que a primeira consulta pré-natal ocorreu no primeiro
trimestre da gestação (de 66 para 83%) com relação à PNDS realizada em 1996.
Também a realização de quatro consultas ou mais de pré-natal sofreu um aumento em
13% , (de 77 para 90%).

A PNDS/2006 demonstra que no mínimo seis consultas de pré-natal, conforme


estabelecido pelo Ministério da Saúde, ocorreu em 77% das gestações. Vale ressaltar
que a Organização Mundial de Saúde considera um programa de saúde pública
implantado quando atinge cobertura de 80% dos/das beneficiárias. Comparando aos
resultados da PNDS/1996 houve um grande aumento na adesão ao cartão de pré-
natal que passou a ser utilizado por 94,5% das gestantes.

O Plano introduziu ainda variáveis que permitem avaliar alguns aspectos relativos à
qualidade da atenção prestada. Demonstrou que a determinação da pressão arterial
seguida da tomada de peso são procedimentos praticamente universais, pois foram
realizados em mais de 98% das gravidezes, independentemente das características
sócio-demográficas avaliadas. Dentre a natureza dos exames realizados, o exame de
urina foi realizado em 86,3% das gestantes e os exames de sangue em 91,3%.

As pesquisas mostram que o Brasil quase alcançou a cobertura universal da atenção


ao parto institucional atendido por profissional de saúde qualificado significando um
aumento em 7% em dez anos. Os partos assistidos por parteiras leigas mantêm
presença nas regiões Norte e Nordeste, onde representam respectivamente 5,8% e
3,6% dos nascidos vivos.

Esse plano introduziu variáveis que permitirão avaliar alguns aspectos relativos aos
procedimentos preconizados pelo Ministério da Saúde para garantir uma atenção
humanizada ao parto, quais sejam: 28% das gestantes tiveram acesso a medidas

168
farmacológicas407 e não farmacológicas para o alívio da dor; 16% à presença de
acompanhante no momento do parto; e quase 90% dos nascimentos ocorreram no
primeiro serviço procurado, apesar de só 40% das gestantes terem sido informadas do
local do parto durante o pré-natal.

Home Care
Com relação a outros atendimentos muito se fala do médico de família e do Home
Care. As possibilidades de “Home-Care” surgiram nos Estados Unidos por volta de
1947 logo após o pós-guerra. Várias enfermeiras se reuniam para atender os milhares
de pessoas com problemas de saúde em suas casas. Trata-se de uma
desospitalização. Os hospitais não tinham leitos suficientes e as filas para internação
aumentavam consideravelmente. Por volta de 1960 é que se percebeu que era algo
sério e caro. Surgiram então as “Nursing Home”, que eram as enfermeiras que
atendiam pacientes em sua própria casa para diversos tipos de patologias.
Evidentemente os custos para todos baixavam e verificou-se que o “Home-Care”
poderia ser uma realidade que interessava a todos.

Atualmente nos EUA, existem mais de 20.000 organizações de “Home-Care” e até


2000 a quantidade de pessoas atendidas nesses sistemas, chegou a mais de 7
milhões de americanos. As quedas nos custos poderão variar entre 20% a 60%
conforme a enfermidade. Há estudos já bem avançados de pagamentos de plano –
enquanto jovem – para garantir os cuidados em idade bem avançada. Evolução das
casas de repouso atuais.

No Brasil os dados não são oficiais, mas, estima-se que existam mais de 80 empresas
dessa natureza de “Home-care”. Muitas delas ainda, só fazem tratamentos geriátricos
e outras só cuidam de pacientes com pneumopatias e cardíacos. Em resumo, o
“Home-Care” será, em breve futuro, uma forma de desafogar os leitos hospitalares e
dar maior longevidade às pessoas. Esse fenômeno também afetará o estado de saúde
da população e da demografia no futuro.

A Telemedicina

Entre outros benefícios futuros está a Tele-Medicina e mais, dentro de alguns anos,
muitas doenças poderão ser diagnosticadas ou tratadas com sucesso. É o caso do
câncer.408 Ela possibilitará levar assistência médica com rapidez aos lugares mais
longínquos. As aplicações mais imediatas são os correios eletrônicos proporcionando
trocas de informações entre o médico e o hospital a grande distância. Todos esses
elementos farão parte dos estudos das morbidades afetando também diretamente
dados sobre a Saúde e a Demografia.

Profissionais do ramo já fazem palestras sobre o novo tipo de atendimento na área de


saúde que a tecnologia possibilitará aproximando os serviços médicos do paciente,
onde quer que ele esteja. Estima-se que: "90% das necessidades da Tele-medicina
408
A batalha contra o câncer, doença que mata mais de cem mil brasileiros por ano, está acontecendo nos hospitais,
nos laboratórios, nas nossas casas, corpos e nos núcleos de todas as células. O câncer é insidioso. É difícil de detectar
enquanto as células proliferam sem controle. Algumas vezes, ele é provocado por mutações no DNA herdado dos
pais, acionadas pelas condições pouco saudáveis ao longo da vida, como exposição à radiação, ingestão de
substâncias químicas danosas, vírus, cigarro e outras.

169
serão supridas pela Internet, que permite, por exemplo, que um médico especialista
acesse, em qualquer lugar do mundo, o prontuário do paciente, verificando o laudo de
exames ou funções vitais." 409

A utilização da Tele-medicina tem também como vantagem, segundo coordenadores


médicos dos projetos de Tele-medicina do Instituto de Cardiologia do Triângulo
Mineiro, uma redução de investimentos e informam que:

"Interligar um computador à Internet é muito mais barato do que montar uma unidade
hospitalar", afirmam. 410

Implantação do chip de controle sob a pele também é elemento futuro, bem como dos
genes humanos. Tais estudos e ainda o resultado futuro do Projeto Genoma Humano,
serão estatisticamente possíveis dentro de alguns anos, os quais com ética e
considerando novos aspectos jurídicos específicos de cada caso, deverão dar novo
rumo às precificações de seguros, planos de saúde, seguros saúde, previdência
privada e os fundos de pensão que deverão talvez - até levar em conta - quando da
contratação de uma pessoa por uma empresa - quais são as chances dela ter alguma
doença que possa comprometer sua saúde para os seus próximos anos.

No caso da Previdência Privada, as pessoas que, eventualmente tenham


possibilidades de contrair determinadas morbidades que possam comprometer seu
futuro, poderão antecipar seus depósitos futuros no sentido de aumentar suas
contribuições e chegar mais cedo ao valor do montante que permitirá uma
aposentadoria complementar que possa permitir uma renda razoável quando de seu
afastamento da vida produtiva.

No caso dos seguros, as companhias poderão exigir um seguro maior ou menor em


função dessas probabilidades futuras, bem como as empresas de assistência médica
e outros negócios que envolvam morbidades, longevidade e conseqüentemente
pagamentos ou despesas futuras. Tudo dependerá evidentemente da ética e da
legislação competente que estiver vigorando na época.

Estudos mostram que dobrar a longevidade não é algo tão distante assim mas terão
conseqüências que ainda estão em fase de análises, cuidados e especulação. O
caminho já foi aberto. Os cientistas geneticistas – estão modificando genes de insetos
e dobrando a longevidade deles. 411 É apenas o início.

Custos e riscos envolvidos

409
Roberto Botelho - Diretor e coordenador dos médicos do projeto de Tele-Medicina do Instituto de Cardiologia do
Triângulo Mineiro.
410
Idem 472
411
– por exemplo, a mosca Drosophila melanogaster. - Conhecida como mosca das frutas. Curiosamente, o gene da
longevidade foi batizado de INDY, sigla para “I am not Dead Yet” (Eu ainda não estou morto). O nome é inspirado
numa piada do filme de Monty Python em Busca do Cálice Sagrado.

170
Não se pode esquecer que em todos esses aspectos deverão sempre, ser
considerados aspectos econômicos no tempo. Os índices inflacionários decorrentes
de altas e baixas da inflação, mudanças de governos, administrações econômicas
irresponsáveis e todos os riscos sistêmicos possíveis de acontecer. Todos esses
aspectos poderão levar os valores de planos de saúde, previdência e seguros a se
tornarem insustentáveis quanto maior o prazo de aplicação ou valores segurados.

Sob os aspectos de custos envolvidos nas áreas de saúde, ainda há dados e


informações não muito precisas. No Brasil, na área privada, tendo em vista as
exigências da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar em exigir os dados
estatísticos de todas as operadoras a partir de Dezembro de 2002 e também
informações ao SUS, dos hospitais e clínicas, serão obtidas informações mais
precisas dos atendimentos hospitalares, morbidades acontecidas, doenças de alta
complexidade e informações de idade, sexo e outras.

O que se sabe é que os seguros e planos de saúde, ainda até os dias que iniciaram o
século 21, fazem seus cálculos com base em “Bench Mark” de concorrentes, os quais
também assim o fizeram, ou seja, utilizando-se de métodos cientificamente ou
estatisticamente não muito confiáveis, cujas demonstrações fazem parte de Notas
Técnicas não muito precisas estatisticamente, até para os especialistas,
principalmente de empresas que iniciam suas operações e pouco têm de base de
dados.

Em resumo, é necessário que se desenvolvam estudos de sobrevivência e


morbidades baseados em tábuas de morbidade reais, considerando que as leis
biológicas alteram-se ao longo do tempo na proporção em que são aumentados os
serviços de saúde pública, privada, saneamento, prevenção e desenvolvimento da
medicina e medicamentos.

Análise e prospecção

Numa viagem ao futuro, a história se passa daqui a 30 anos e o impacto é quase o


mesmo. Uma pessoa descobre que tem câncer de cólon, uma doença gravíssima. A
notícia abala a família. Ela vai ao médico e começa o tratamento. Mas então, seu
sofrimento não será tão terrível. O Oncologista tira algumas células do tumor da
pessoa e as coloca em um microchip. Em minutos, são identificados os genes
mutantes que provocam a doença. Graças ao Projeto Genoma, os cientistas
desenvolveram remédios que funcionam de maneira muito eficiente. O Oncologista
seleciona as drogas relacionadas aos genes, danificados do paciente, mas que não
atacam as suas células saudáveis.

Além do entusiasmo com os enormes benefícios que poderão advir das descobertas
genéticas, está a preocupação com algumas de suas conseqüências sociais. Não se
fala aqui da criação de seres reengenheirados para não apresentarem doenças, ou
ainda, para terem características de comportamento e aparência considerados ideais.
O problema que já se apresenta em alguns países onde os testes genéticos estão
mais disseminados é a possível manipulação das informações sobre a saúde das
pessoas.

171
Nos EUA, por exemplo, são realizados cerca de 4 milhões de testes genéticos por
ano. Graças a eles, se pode tratar problemas graves, como anemia falciforme 412,
fenilcetonúria 413 e doenças de tiróide congênita, desde o nascimento. Além disso, os
testes indicam predisposição a males como o câncer de mama, que a pessoa terá no
futuro, possibilitando o tratamento preventivo. Infelizmente, há doenças de origem
genética que ainda não têm cura. No ano passado, por exemplo, o Reino Unido
colocou à disposição das seguradoras dois testes genéticos para “coréia de
Huntington” 414 uma doença grave que afeta o raciocínio e a locomoção. A decisão
causou controvérsia.

Outros especialistas temem o uso que as seguradoras poderão fazer dos exames
genéticos. “Com a facilidade de se obter uma amostra do DNA de uma pessoa, muitos
vão querer cruzar a linha e invadir a privacidade alheia” , alerta do diretor do Instituto
Whitehead para Pesquisas Genômicas dos EUA, Eric Lander, no The New York
Times. As seguradoras brasileiras e de outros países já cobram o que chamam de
agravo em caso de doenças pré-existentes. Com as possibilidades abertas pelos
exames genéticos, ele poderá ser mais elevado ainda, mas, no caso de pessoas
saudáveis de fato, os valores de seguros poderão cair. O tempo vai mostrar o que de
fato acontecerá, pois, por enquanto, temos estudos e especulações.

A invalidez

412
Anemia falciforme é uma doença hereditária (passa dos pais para os filhos) caracterizada pela alteração dos
glóbulos vermelhos do sangue, tornando-os parecidos com uma foice, daí o nome falciforme. Essas células têm sua
membrana alterada e rompem-se mais facilmente, causando anemia. A hemoglobina, que transporta o oxigênio e dá a
cor aos glóbulos vermelhos, é essencial para a saúde de todos os órgãos do corpo. Essa condição é mais comum em
indivíduos da raça negra. No Brasil, representam cerca de 8% dos negros, mas devido à intensa miscigenação
historicamente ocorrida no país, pode ser observada também em pessoas de raça branca ou parda. Quando
descoberta a doença, o bebê deve ter acompanhamento médico adequado baseado num programa de atenção
integral. Nesse programa, os pacientes devem ser acompanhados por toda a vida por uma equipe com vários
profissionais treinados no tratamento da anemia falciforme para orientar a família e o doente a descobrir rapidamente
os sinais de gravidade da doença. Também é detectada com o exame Teste do Pezinho. (Fonte:
http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/dicas/127anemiafalci.html) – acessado em 14/07/2011.

413
A fenilcetonúria é uma doença genética, em que alguns alimentos podem intoxicar o cérebro e causar retardo
mental irreversível. As crianças que nascem com esta doença tem um problema digestivo em que um aminoácido
presente na proteína dos alimentos, a fenilalanina, seja “venenoso para o cérebro”. A ausência da enzima responsável
pela digestão e eliminação da fenilalanina não é eficiente e assim, faz com que ela se acumule no organismo tornando-
se tóxica. A doença afeta principalmente o cérebro e tem efeitos irreversíveis, como retardo metal permanente. O
diagnóstico da fenilcetonúria pode ser feito no recém-nascido por meio de triagem neonatal muito simples, conhecida
como “Teste do Pezinho“, geralmente ainda na maternidade. O diagnóstico precoce da fenilcetonúria permite que os
cuidados necessários com a alimentação sejam tomados desde o princípio, evitando uma série de efeitos indesejados,
que se apresentam logo no primeiro ano de vida do bebê, mas que podem ser todos evitados embora nunca possam
ser revertidos. (Fonte: http://www.tuasaude.com/fenilcetonuria/) – acessado em 14/07/2011.

414
A coréia de Huntington é uma afeção degenerativa progressiva do sistema nervoso com padrão de herança
autossômico dominante de penetrância completa. A síndrome foi descrita por George Huntington em 1872. Tem uma
incidência estimada de 5 a 10 casos por 100.000 indivíduos. Os pacientes apresentam uma expansão da trinca CAG
presente na porção 5’ do gene IT15 no braço curto do cromossomo 4, resultando na formação de uma proteína
funcionalmente alterada. O quadro sindrômico caracteriza-se por movimentos involuntários coreiformes e alterações
cognitivas que se desenvolvem em torno dos 40 anos de idade, progredindo até a morte em um período de
aproximadamente 10 a 15 anos. Fonte: Artigo dos acadêmicos em medicina Fernando Andersson Chemale et all –
Porto Alegre de 30/10/2000.
http://genetica.ufcspa.edu.br/seminarios%20textos/Huntignton.pdf (acessado em 14/07/2011).

172
Invalidez é uma forma de decremento da população estudada. Seus estudos mais
profundos pertencem aos Seguros Sociais. A invalidez de um segurado poderá ser
total ou parcial. Poderá ser invalidez permanente ou temporária. Poderá ser provocada
por fatores de saúde naturais, como, por exemplo, a senilidade, alguma moléstia que
venha causar a invalidez ou ainda, por acidente.

A senilidade ou velhice leva o segurado à aposentadoria por idade. Poderá ser


indenizada na forma de pagamento único ou transformada em rendas. A invalidez faz
parte contratual de seguros de vida em grupo como complemento ou não de cobertura
do evento morte por causas naturais ou acidentais.

Historicamente, o seguro que trata da invalidez surgiu no período da revolução


industrial, cujas condições de trabalho e maquinaria expunham os operários a perigos
e riscos constantes para a sua saúde, conforme a atividade. Casos de parcial ou total
incapacidade para o trabalho, bem como auxílio funeral, foram objeto de seguro nos
países europeus mais avançados desde o final do século XVIII e XIX especialmente
na Alemanha, Inglaterra e Áustria.415

Muitos levantamentos e estudos do SUS no Brasil existem sobre o assunto. Existem


também as experiências de invalidez das próprias seguradoras que podem ser
utilizadas com aval do órgão normativo oficial. 416 No Brasil não se utiliza taxa de
invalidez para pessoas menores de 14 anos. Há uma relação direta entre os estudos
de invalidez e a morbidade. Nestes apontamentos técnicos, os aspectos relativos a
morbidade são estudados em capítulo à parte nos seguros de saúde, planos de saúde
e convênios, os quais foram regulamentados a partir da Lei 9656/98 e a criação
posterior da Agência reguladora - ANS - Agencia Nacional de Saúde Suplementar,
embora haja também muitos estudos interessantes resultado de levantamentos
efetuados das áreas de atendimento á saúde pública. Trata-se de estudos que
envolvem as moléstias que atacam o ser humano levando-o à incapacidade e / ou à
morte.

O estudo da morbidade é vasto sob o ponto de vista estatístico e precedem as


análises - que consideramos - ainda incipientes sobre o assunto e deveriam sofrer
ajustes para atualização de seus valores tendo em vista uma série de medidas
preventivas – principalmente na área trabalhista - como a utilização de equipamentos
especiais, manuais de prevenção, comissões de prevenção de acidentes - CIPAS nas
mais diversas atividades, como, por exemplo, na construção civil, usinas, indústrias
químicas, eletricidade, nuclear e muitas outras. As CIPAs e a Medicina Ocupacional
vieram para ficar.

CAPÍTULO 5

415
Na década de 30 tal assunto já era preocupação dos sindicatos e governos no Brasil. Um Atuário brasileiro de
nome Clodoveu de Oliveira, executou estudos à respeito que foram adotados pelo governo brasileiro em 1935 através
de Decreto. (Weber - pag. 266 - vol. 4)). Antes disso, outro Atuário de nome E. Hamza, apresentou um
desenvolvimento de exaustivos estudos de acidentes no trabalho, no III Congresso Internacional de Paris em junho de
1900.
416
SUSEP - Superintendência dos Seguros Privados, IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, SPC -
Secretaria da Previdência Complementar, SUS – Sistema Único de Saúde.

173
Sistemas de Saúde no mundo: custos da atenção à saúde

Como os gregos, os antigos Romanos tinham conhecimento da influência ambiental


sobre a saúde. Com os Etruscos aprenderam a construir esgotos e a drenar pântanos.
A Cloaca Máxima foi construída no século 6.º a.C. De início, drenava pântanos para o
Tibre; mais tarde, foi adaptada para ser esgoto. O primeiro aqueduto trazendo água
para a cidade foi concluído em 312 a.C., possibilitando a construção de banhos
públicos.

Havia um esboço de administração sanitária com leis que dispunham sobre a inspeção
de alimentos e os locais públicos. Leprosários também já existiam e chegaram à
Europa, a aproximadamente vinte mil unidades. 417 (Scliar – 1987).

No Bhagvata Purana, livro sagrado dos hindus referido por Stallybrass418 está a
observação de que “a peste é iminente, quando um rato cai do forro, salta
desordenadamente no solo e morre em seguida”. São conhecidas as referências de
Heródoto de que a peste que dizimou 175.000 soldados de Sennacherib era tida,
àquele tempo, como associada ao rato, assim como o contágio da lepra e da gonorréia
constantes do Levítico.419

A idéia de transmissão das doenças remonta aos primórdios da civilização atual,


quando já eram recomendadas pelos hebreus medidas de isolamento para os
leprosos, levadas até à impiedade em algumas circunstâncias. A associação da peste
com os ratos era igualmente suspeitada pelos chineses, hindus, hebreus e gregos. No
período das Cruzadas, entre 1095 e 1270, e posteriormente no rastro da invasão dos
hunos e tártaros, apareceu a peste e a sua transmissão se fazia de forma epidêmica
na Europa, progredindo de país a país e recrudescendo sempre que havia novos
suscetíveis a vitimar.

O fechamento das portas das cidades e sua evacuação, por todos os que tinham
condições de fazê-lo, nos surtos pestilenciais, demonstravam a noção de contágio já
existente no passado, antes mesmo da descoberta dos micróbios. A observação de
que a invasão se processava inicialmente pelos portos, era a noção corrente. No fim
da Idade Média a situação começa a mudar. A medicina leiga torna a se desenvolver,
particularmente em Salerno, Itália, em 1240 com a criação de uma Escola Médica
nesse ano.

417
Fonte: Guia do Estudante - http://guiadoestudante.abril.com.br/estudar/historia/lepra-doenca-estigma-434502.shtml -
artigo na revista de Moacir Scliar – 01/01/2006.
418
Livro de C.O. Stallybrass – “Principles of Epidemiology”. (Apud – Rodrigues) – pág. 11

419
Levítico é o terceiro livro da Bíblia. Faz parte do Pentateuco, os cinco primeiros livros bíblicos, cuja autoria é,
tradicionalmente, atribuída a Moisés e um dos livros do Antigo Testamento da Bíblia e possui 27 capítulos. Os judeus
chamam-no Vayikrá ou Vaicrá. Basicamente é um livro teocrático, isto é, seu caráter é legislativo; possui, ainda, em
seu texto, o ritual dos sacrifícios, as normas que diferenciam o puro do impuro, a lei da santidade e o calendário
litúrgico entre outras normas e legislações que regulariam a religião. (Wikipédia).

174
Ao tempo em que florescia o comércio das cidades de Gênova e Veneza, com suas
agências distribuídas nos empórios do Oriente próximo e na Criméia,420 a Europa foi
devastada pela chamada peste negra, em 1347, cuja invasão se deu por Gênova,
onde a doença se manifestou poucos dias depois da chegada de um navio procedente
de Caffa, na Criméia.

Nasceu então a idéia de proteção contra situações semelhantes no futuro e no ano


seguinte, em 1348, Veneza estabeleceu a primeira providência de defesa coletiva de
saúde, instituindo a trintena, posteriormente ampliada para quarentena, destinada a
proteger sua cidade contra a invasão da peste, trazida por viajantes chegados de
regiões assoladas. No século XVI a lista das doenças que atemorizavam a Europa,
sofre um acréscimo: a Sífilis.

O nome vem do poema publicado em 1530 por Girolano Fracastorius (1478-1553) –


Syphilis Sive Morbus Gallicus – Sífilis ou doença francesa).421 (Scliar – 1987).Os
navios eram procedentes de áreas onde existia a peste e eram obrigados a
permanecer por espaço de trinta a quarenta dias, isolados e ao largo. Gênova,
Ragussa e todas as demais cidades assim passaram a proceder. As cartas de saúde
passaram então a ser instituídas a partir do século XVII, para entrada de navios em
portos estrangeiros.

No Ocidente, a Idade Média ficou conhecida como a Era das Trevas, e do ponto de
vista dos cuidados à saúde a denominação é exata. A queda do Império Romano e a
ascensão ao regime feudal proporcionaram profundas e desastrosas conseqüências
na conjuntura de saúde, na prevenção e no tratamento das doenças. A Idade Média
pode ser considerada como uma época de pestilências.

Os movimentos populacionais, a miséria, a promiscuidade e a falta de higiene dos


burgos medievais, os conflitos militares. Tudo isso criou condições para explosivos
surtos epidêmicos. Repetidas epidemias de peste, causada por uma bactéria.422 Todo
esse estado de doenças e epidemias atravessou séculos.

A partir do século XVII, os Estados tentavam de algumas formas, resolver os graves


problemas de saúde pública até então. Houve a necessidade então urgente de
proteger as populações, principalmente as classes menos favorecidas
economicamente que, pela falta de assistência e recursos, sofriam o impacto mais
forte da morbidade e da letalidade.

420
Atual Ucrânia
421
A obra de Fracastoro sobre o contágio - De Contagione - foi escrita numa época em que o misticismo da Idade
Média não havia ainda desaparecido e a ciência moderna não havia nascido. A noção de contágio, sim. Tanto que as
pessoas fugiam da peste, ou isolavam-se, como narra Boccacio no Decameron. Aliás, a peste inspiraria não só contos,
ou a novela de Camus, mas também uma canção famosa. Aconteceu em 1679, em Viena. Quando a peste chegou, a
população, em pânico, abandonou a cidade. Uns poucos ficaram; entre eles, o cantor de baladas Max Augustin, que
na ocasião compôs a conhecida Ach, Du lieber Augustin. Depois bebeu tanto que ficou em coma. Dado por morto foi
jogado numa vala comum com cadáveres de vítimas da peste. Mas escapou de pegar a doença; as pulgas
transmissoras de Pasteurella pestis abandonam os cadáveres – de homens e ratos – tão logo esfriam. (Scliar, 1987).
422
Pasteurella pestis que é transmitida pelas pulgas dos ratos. (Scliar, 1987).

175
Doenças, epidemias nos Séculos XVIII e XIX

A revolução industrial, iniciada na segunda metade do século XVIII, iria determinar


profunda repercussão na estrutura social da humanidade e sobre a saúde coletiva.
(Rodrigues – 1967), todavia, muitos fatos e descobertas relativas à saúde foram
acontecendo.

Todo esse problema repercutia na produção industrial que se ressentia da escassez


da mão de obra necessária. Os governos não poderiam ficar indiferentes a tal estado
de coisas, ignorando o problema e deixando-o aos cuidados de instituições religiosas,
para que o resolvessem dentro das suas características de misericórdia.

Coube à Inglaterra liderar o equacionamento da saúde pública no século XIX, quando,


no reinado da Rainha Vitória, foram organizadas comissões para investigar as
condições de saúde das classes trabalhadoras, assim como das grandes cidades e
seus distritos.

Como resultado de tais investigações foi criado em 1848, o primeiro Conselho de


Saúde, considerado por William Welch, 423 como o marco inicial da saúde pública
moderna, ao afirmar que pela primeira vez na história da humanidade a saúde do povo
era integralmente reconhecida como importante função administrativa do Estado.
Deve-se muito a Edwin Chadwick, 424 advogado e ministro inglês, nesse trabalho
pioneiro. Nos EUA, a partir da publicação do relatório da Comissão de Saúde de
Massachusets, em 1850, como resultado da atuação decisiva de Lemuel Shattuck,
professor e estatístico, iniciou-se a administração sanitária oficial.

Os programas de valorização de áreas subdesenvolvidas, em todo o mundo e no


Brasil, em saúde, educação, saneamento básico, por exemplo, sentiram a importância
de recuperar o homem como uma das metas mais importantes a atingir e os
economistas passaram a incorporar tal concepção, como se comprova na Ata de

423
A trajetória de William Welch Deloitte está diretamente ligada à história da auditoria independente. Nascido na
Inglaterra, Deloitte começou sua carreira muito cedo. Aos 15 anos foi trabalhar como assistente do Síndico da Corte de
Falências de Londres, onde adquiriu todas as bases necessárias para a profissão de auditor, atividade que começara a
tomar impulso devido ao lucrativo negócio de administração de massas falidas. Em 1845, aos 25 anos, abriu seu
próprio escritório, em frente à Corte de Falências, na Basinghall Street. Nessa época foram aprovadas importantes leis
que formaram o alicerce para as modernas sociedades por ações. Deloitte foi consolidando seu nome à medida que o
setor de transporte ferroviário se expandia.

Fonte:
http://www.deloitte.com/view/pt_BR/br/nossaempresa/historia/168a8d21091fb110VgnVCM100000ba42f00aRCRD.htm -
(acessado em 14/07/2011).

424
Sanitarista britânico nascido em Longsight, nas proximidades de Manchester, pioneiro da saúde pública e
incansável apóstolo da higiene, o primeiro a compreender a enorme importância da purificação da água e dos sistemas
de esgotamento. Filho de um comerciante e influente político, James Chadwick, estudou advocacia em Londres e
juntou-se a Unilitarian Society, onde encontrou Jeremy Bentham, James Mill, John Stuart Mill e Francis Place. Naquela
época sua pátria achava-se em pleno desenvolvimento industrial e as condições de higiene haviam-se agravado,
principalmente com o lançamento indiscriminado dos efluentes industriais líquidos nos arroios e rios.
Fonte: http://www.dec.ufcg.edu.br/biografias/EdwiChad.htm (acessado em 15/07/2011).

176
Bogotá 425 (1960)426 e na Carta de Punta Del Leste, 427 (1961) em cujas
recomendações os programas de saúde pública aparecem vinculados aos planos de
desenvolvimento recomendados. 428 Um exemplo dessa nova concepção é o olhar de
Louis Pasteur onde a arma é o microscópio. A trajetória de Pasteur é um exemplo
clássico de como o desenvolvimento depende da demanda das forças econômicas.429
Com o grande movimento científico devido a Pasteur, Koch, Lister, Semelweis,
Villemin e tantos outros, o conhecimento humano e a técnica se aprimoraram,
modificando conceitos e rotinas e revolucionando o panorama sanitário.

Assumiu tamanha importância o papel do governo nesse campo que o presidente


Franklin Roosevelt proclamou ao tempo em que foi governador do Estado de Nova
York, que o sucesso ou fracasso de um governo seria medido pelo bem-estar de seus
cidadãos, e que o mais importante para um Estado deve ser sua saúde pública.

As reuniões, conferências e convenções internacionais, desde a de Alexandria, em


1831, visando a estabelecer medidas de saúde – comuns - a serem aceitas e
cumpridas pelos diversos países, como a de Paris em 1851, subscrita por 12 nações
que se comprometiam a estabelecer acordos em bases razoáveis, a fim de uniformizar
as medidas.

425
As mudanças na orientação da diplomacia norte-americana já se fizeram sentir em fevereiro de 1960, quando o
presidente Eisenhower visitou o Brasil e buscou o diálogo, inclusive em relação à ruptura entre o Brasil e o FMI. E
ficaram ainda mais patentes durante a reunião de Bogotá, onde as propostas brasileiras encontraram plena
ressonância junto à delegação norte-americana, o que acabou por produzir um extenso documento – a Ata de Bogotá –
preconizando detalhadas e concretas medidas de desenvolvimento econômico e social.

426
Em setembro de 1960, o Conselho da Organização dos Estados Americanos (OEA) realizou, através da
convocação de uma comissão especial, uma reunião em Bogotá, que resultou na Ata de Bogotá, onde se reafirmava a
noção de que o desenvolvimento econômico e o progresso social estão indissoluvelmente ligados, e que, somente
poderão ser alcançados em ambiente que permita às Repúblicas Americanas preservar e fortalecer suas instituições
livres e democráticas. Nesta reunião, os governos latino-americanos aceitaram a proposta, do Governo dos Estados
Unidos da América, em estabelecer um fundo com o objetivo de fortalecer recursos de capital e assistência técnica, em
termos e condições flexíveis, para apoiar os países que estivessem dispostos a iniciar, ou expandir melhoramentos
institucionais efetivos.
Fonte:

http://cac-php.unioeste.br/projetos/gpps/midia/seminario2/trabalhos/educacao/medu01.pdf = (acessado em
16/07/2011).

427 Segundo a ordem estabelecida na Carta de Punta del Este, o modelo educacional proposto aos países latinos e
particularmente ao Brasil, deveria ter como elemento primordial o desenvolvimento integral de cada ser humano, onde
o espírito individual do homem se fortaleceria como parte decisiva na manutenção do pleno desenvolvimento social e
econômico.
428
Um exemplo dessa nova concepção é o olhar de Louis Pasteur onde a arma é o microscópio. A trajetória de
Pasteur é um exemplo clássico de como o desenvolvimento depende da demanda das forças econômicas.428
429
O microscópio tinha sido inventado no início do século 17, mas a microbiologia só começou a se desenvolver
quando Pasteur, a pedido de industriais de vinho, estudou em 1863, o processo de fermentação, evidenciando a
presença das leveduras que o causam. Demonstrou vários processos pela ação de microorganismos. No ano seguinte,
a pedido do Ministério da Agricultura, isolou os germes causadores da doença em bichos-da-seda. Estudou depois o
carbúnculo do gado e a cólera aviária e só a partir de 1880 começou a investigar doenças afetando seres humanos.
Em 1880, Alphonse Laveran, que viveu entre 1845 e 1922, descobriu, em serviço na Argélia, o plasmódio causador da
malária e Ronald Ross, que viveu entre 1857 e 1932, mostrou, na Índia, que a malária era transmitida por mosquito.
Em 1798, Edward Jenner, que viveu entre 1749 e 1823, um médico rural da Inglaterra, constatou que as pessoas que
ordenhavam vacas com vacina, não contraíam a varíola humana e resolveu usar o líquido das pústulas da vacina como
agente imunizante. Em 14 de maio de 1796, inoculou um menino, James Phipps, com o líquido extraído de uma
pústula de vacina adquirida por uma moça chamada Sara Nelmes, que, ordenhando vacas, adquirira a lesão. O garoto
desenvolveu uma reação vacinal. Em primeiro de julho, Jenner inoculou-o então com o pus de um varioloso. Phipps
não adoeceu. Estava imune à varíola.(Fonte: Apud Scliar – Donald R. Hopkins, Prince and Peasants, Smallpox in
History. Chicago - The University of Chicago Press, 1983).

177
A abertura do Canal de Suez, a introdução da navegação a vapor, diminuindo o tempo
de viagem e os deslocamentos de grandes parcelas da população, especialmente,
peregrinações religiosas à Meca, propiciando condições ideais para as infecções entre
indivíduos provenientes de áreas endêmicas de peste, varíola, febre recorrente e
cólera, agravavam a situação sanitária internacional, com riscos supervenientes, uma
vez que haviam sido precários os resultados práticos das medidas propostas e aceitas
pelos países convenientes.

Os fracassos das conferências e convenções firmadas resultavam da ineficiência dos


conhecimentos epidemiológicos da época e impossibilitavam medidas profiláticas
positivas, apesar de, em 1829, Bretonneau de Tours,430 haver evidenciado a invasão
de uma cidade pela febre tifóide e sua posterior transmissão de indivíduo a indivíduo.

Houve também um estudo sobre a epidemia de sarampo ocorrida nas Ilhas Faros em
1846 e a evolução da cólera que se desenvolveu em Londres, pela contaminação de
um poço, já citado, em Broad Street, Birmingham City, no ano de 1849. Era urgente
resolver o problema e outros relativos também à higiene e efluentes decorrentes de
urina e excrementos humanos. 431

A criação da Organização Mundial da Saúde - OMS

Os esforços continuaram por parte das nações mais diretamente interessadas em


encontrar um caminho. Assim, em 1894, foi firmada a Convenção de Paris, regulando
os aspectos sanitários das peregrinações religiosas ao Oriente Próximo, em virtude
das facilidades de invasão da peste pelo Canal de Suez. Em 1903 se consolidavam na
Convenção Sanitária Internacional, outras convenções parciais assinadas de 1892 a
1897 e o século XX iria iniciar-se com o aparecimento das Organizações Sanitárias
Internacionais.

Surgiu no início de 1900, a primeira Organização Internacional da Saúde com a


criação da Organização Sanitária Pan-Americana, instituída durante a segunda
Conferência da União Pan-Americana, realizada na cidade do México.

As Américas têm o privilégio de contar com a mais antiga organização sanitária


mundial, funcionando ininterruptamente desde a sua criação. Essas foram as razões
que determinaram, que quando da criação da Organização Mundial da Saúde - OMS,
os países americanos forçaram o não desaparecimento da organização Pan-
Americana da Saúde, passando a mesma, mediante acordo com a OMS, ser,
concomitantemente, o seu Órgão Regional para as Américas.
430
Um hospital da França - (Hôpital Bretonneau (Tours)
431
O excremento era muito utilizado no campo. O water closet já era conhecido na Europa desde a era Elizabetana,
mas não havia sistema de coleta de efluentes. A maior utilização de água para banho agravou o problema, porque as
fossas sépticas passaram a transbordar. A solução era drená-las para o rio. O rio Tâmisa tornou-se um esgoto a céu
aberto. Por outro lado, como havia uma taxa sobre janelas, as casas ficavam com pouca luz e ventilação, o que
agravava os efeitos da poluição ambiental. Assim, a investigação sobre o cólera – que parecia uma doença dos pobres,
dos habitantes de bairros miseráveis – só ocorreu depois que o surto de 1848 atingiu os moradores do aristocrático
Albion Terrace. A tuberculose exalta os sentidos, fala-se em ‘ouvido de tuberculoso’ para significar uma audição
apurada e as paixões, daí a mórbida atração que exercia sobre os românticos, evidenciada nos heróis e heroínas
tuberculosos: Mimi, de La Bohème, Marguerite Gautier de A Dama das Camélias. Não poucos poetas românticos foram
tuberculosos. Shelley e Keats, no Brasil, Castro Alves, Álvares de Azevedo. A doença era por vezes atribuída à eclosão
de emoções. Franz Kafka, que morreu tuberculoso aos quarenta e três anos, negava-se a se aceitar como doente. Ele
achava que era uma infelicidade por não conseguir se casar com sua noiva, Felícia Bauer. (Scliar, 1987).

178
Como resultado da Conferência de Paris em 1903, outro órgão internacional, o Office
International d’Hygiene Publique, surgia, por proposta da França. Seu funcionamento
efetivo começou em 1909, dois anos depois de sua ratificação por 54 nações na
Conferência de Roma, em 1907. Em abril de 1920, a Sociedade das Nações, criada
após a primeira guerra mundial, instituía o Serviço de Informações Epidemiológicas,
núcleo da Seção de Higiene daquela sociedade, o qual chegou a contar com 148
governos, como participantes de informes sistemáticos sobre ocorrências epidêmicas.
(Rodrigues – 1967).

Os dados relativos a todos esses países eram recolhidos por vários escritórios
regionais que os retransmitiam para Genebra. Na época a Organização Sanitária Pan-
Americana, com sede em Washington, recolhia dados da América e o Escritório de
Cingapura, criado em 1924, recolhia os informes da Ásia, retransmitindo-os
semanalmente pelo rádio para Genebra.

O Escritório de Saúde do Sul do Pacífico, com sede em Melbourne, criado em 1926,


cujos dados eram enviados a Genebra, via Cingapura e o Conselho de Quarentena de
Alexandria, é quem tinha a missão específica de enviar os dados relativos ao estado
sanitário dos peregrinos destinados aos lugares sagrados.

Interessante, é que durante a Segunda Guerra Mundial 432 as convenções


internacionais ficaram a cargo da UNRRA (United Nations Relief Rehabilitation
Administration), que na época, foi a única entidade internacional de proteção sanitária,
apesar de incipiente como auxílio médico-sanitário.

A Segunda Guerra Mundial apressou o desenvolvimento dos antibióticos, o primeiro


dos quais foi a penicilina, surgida a partir de uma observação casual de Alexander
Fleming, que viveu entre 1881 e 1955, em 1926, e que a partir de 1943 se tornou
disponível para uso clínico graças à colaboração de Howard Florey e Ernest Chain,
que aperfeiçoaram o método de produção da droga.433

Apesar dos grandes resultados que as organizações sanitárias anteriormente


existentes tinham representado para a economia dos países que detinham o comércio
marítimo, as nações aliadas, ao se reunir e propor em Dumbarton Oaks 434 a criação
da Organização das Nações Unidas – futura ONU - não fizeram qualquer menção
explícita sobre qualquer agência especializada de saúde pública.

Esse fato foi apreendido muito bem e contra ele lutou e conseguiu resultados, o
assessor de saúde da Delegação Brasileira àquela reunião, Geraldo Horácio de Paula

432
A Segunda Guerra Mundial ou II Guerra Mundial foi um conflito militar global que durou de 1939 a 1945, envolvendo
a maioria das nações do mundo – incluindo todas as grandes potências – organizadas em duas alianças militares
opostas: os Aliados e o Eixo. Foi a guerra mais abrangente da história, com mais de 100 milhões de militares
mobilizados.
433
Em 1944, Selman A. Waksman descobriu a estreptomicina que, combinada com outras drogas, revolucionou o
tratamento da tuberculose e esvaziou os sanatórios que Thomas Mann descrevera em A Montanha Mágica.
434
Dumbarton Oaks Conferência - (21 agosto - 7 outubro, 1944), reunidos em Dumbarton Oaks, uma mansão em
Georgetown, Washington, DC, onde os representantes de: China , o União Soviética , o Estados Unidos e o Reino
Unido formulou propostas de uma organização mundial que se tornou a base para a Das Nações Unidas – futura
ONU.
Fonte: Enciclopédia Britânica - http://translate.google.com.br/translate - (acessado em 18/07/2011).

179
Sousa, que apresentou as necessárias emendas ao projeto, consubstanciando nesse
documento, o mínimo que se poderia incluir relativamente à saúde internacional, a
começar pela inclusão do termo “ Saúde “, na própria carta das Nações Unidas.

Depois de discussões continuadas, foi, afinal, apresentada a declaração brasileira


relativa à saúde, à qual se associou a China. Daí resultou um Organismo Sanitário
Internacional, para o qual foi apontada uma comissão técnica preparatória. A
constituição da Organização Mundial da Saúde – OMS, foi aprovada em Conferência
realizada em Nova York, no período de 19 a 22 de julho de 1946 e após muitas
discussões foi aprovada e ratificada por 26 membros das Nações Unidas e Genebra
foi escolhida para sede permanente da Organização e a primeira Assembléia Mundial
de Saúde, validando vários princípios, foi realizada no período de 24 de junho a 31 de
julho de 1948.435

Atualmente, o entendimento acerca desses princípios na área da saúde são tão


relevantes que no Fórum Social Mundial, realizado em Porto Alegre em janeiro de
2005, houve a realização do I Fórum Social Mundial da Saúde. Nesse caso, os
indivíduos envolvidos compreenderam a importância de pensarem a Saúde como um
direito humano – e não um negócio - que transcende os entendimentos de governos.
(Dantas, 2006).

Novos rumos para a saúde no Brasil e em outros países

No Brasil as repercussões econômicas das doenças demonstram que, em


conseqüência da elevada mortalidade entre os brasileiros que se acham em plena
idade de produção, isto é, entre 15 e 60 anos, o tempo médio de vida de trabalho é
quase sempre inferior ao dos habitantes de outras nações que conseguiram se libertar
das doenças responsáveis pela situação reinante na época.

Uma característica notável é o sentido da solidariedade, comum aos sistemas


europeus. A comunidade e o governo suportam fortemente, tanto ideologicamente
quanto com suporte financeiro, a noção de que o acesso universal á saúde é um
direito do cidadão.

Para o governo ser o principal fornecedor dos cuidados da saúde, depende de cada
país, todavia, os valores subjacentes que estruturam os vários sistemas são similares.
Tratamento de doenças crônicas, informações da mídia, envelhecimento das suas
populações, custos de pesquisas farmacêuticas, requer conciliação de objetivos que
se antagonizam, provocando conflitos.

435
Vale saber que a Organização Mundial de Saúde – OMS – vinculada ao Conselho Econômico e Social constitui-se
uma das agências especializadas das Nações Unidas, cujas estruturas, com algumas modificações são formadas,
conforme artigo 9.º da Constituição, pela Assembléia Mundial de Saúde, integrada por delegados representantes dos
Estados-Membros e se reúnem uma vez por ano. Há também o Conselho Executivo, composto inicialmente por 18
pessoas designadas também pelos Estados-Membros, que se reúnem, pelo menos duas vezes no ano. O mandato é
de três anos. Todo esse aparato gerou as Resoluções, o Regulamento Sanitário Internacional, o Programa de Trabalho
e Orçamento e tem como missão a promoção e melhoria do padrão de saúde internacional, a elaboração de normas
técnicas sobre os mais variados assuntos, tais como, trabalhos em portos aéreos e marítimos, atestados de vacinações
conforme modelos internacionais, orientação para viajantes, expurgo de embarcações e outros cuidados. (Fonte:
Humberto Dantas, 2006).

180
Gastos em saúde

São muitos os problemas que se tornaram debates constantes no mundo inteiro. Um


deles é o crescente custo de saúde. Os outros são: o envelhecimento da população,
conforme descrito no capítulo anterior, a prevalência de doenças crônicas e os custos
farmacêuticos também crescentes.

Todo esse aparato de problemas requer convergência de interesses no sentido de se


lidar com um antagonismo que seja a menor possível. Esses objetivos conciliatórios
envolvem o acesso igualitário, o objetivo de fornecer cuidados de boa qualidade, o
objetivo econômico de conter custos e o objetivo político de garantir escolha do
paciente e de obter informações dos profissionais médicos.

Outras formas de análises em todo mundo, são os gastos anuais como proporção do
PIB que poderá ser observado numa relação interessante: nos países de alta renda,
11,2% do PIB é aplicada em saúde, a média do planeta é de 8,5% e há dados citados
do Brasil de 7,5% do PIB.

Gráfico 2

1ª. coluna – Brasil – 2ª. coluna – Argentina – 3ª. coluna – Japão – 4ª. coluna – França
– 5ª. coluna – Canadá – última coluna – EUA.

No Brasil, o gasto per capita com saúde passou de USD PPP 473 em 1996 para 765
em 2006; nos EUA, de 3.656 para 6.714. Nesse país, desde 1980, os gastos per
capita em saúde cresceram 669%, enquanto que a inflação foi de 186%. Por que os
gastos per capita em saúde crescem? Os gastos com saúde crescem mais do que a

181
inflação e as rendas, principalmente por três motivos: o envelhecimento populacional,
a incorporação de tecnologia e o aumento da renda.

A revista Exame, em sua edição de novembro de 2009, afirma que apesar de o gasto
brasileiro em saúde estar próximo da média global em termos relativos ao PIB, as
despesas ainda são baixas em valores absolutos. Em termos per capita, a situação é
a que consta da tabela na sequência.

Tabela VIII

Gasto anual per capita com saúde em US$ (Público e Privado) - 2006

Estados Unidos ...................................................................6.719

Canadá................................................................................3.673

Alemanha............................................................................3.465

França.................................................................................3.420

Inglaterra.............................................................................2.815

Argentina............................................................................1.205

México..................................................................................778

África do Sul ........................................................................715

Índia .....................................................................................86

Rússia..................................................................................698

Brasil....................................................................................674

China...................................................................................216

Fonte: OECD – and World Health Organization - 2006

182
Sistemas de saúde em diferentes países

Austrália

O sistema de saúde australiano é considerado um dos melhores do mundo e combina


fornecedores públicos e privados usando a tecnologia e o conhecimento científico para
prevenir, diagnosticar e tratar as doenças. Enquanto o governo nacional se ocupa de
criar as políticas, regulamentos e tipos de financiamento, cada um dos estados e
territórios é responsável pela gestão de serviços públicos e pelo gerenciamento das
relações com os profissionais de saúde e estabelecimentos hospitalares.

A peça chave desta engrenagem é o Medicare, o serviço universal de saúde


disponível para todos os cidadãos e residentes permanentes. Como agência do
governo australiano, o Medicare é parcialmente financiado pelo Medicare Law, um
imposto de 1,5% da renda para indivíduos de rendimentos intermediários, e de 2,5%
para aqueles que tenham rendimentos altos e não sejam associados de seguros de
saúde particulares. Ele engloba acesso a consultas médicas gratuitas em todos os
hospitais públicos e cobre a maior parte dos honorários médicos por serviços de
ambulatório.

Este sistema básico de financiamento é complementado com o Pharmaceutical


benefits scheme, que contribui com as despesas relacionadas com a compra de
medicamentos. Através deste sistema, o estado australiano subsidia os medicamentos
para fazer com que seu custo seja mais acessível. Existem ainda planos e subsídios
especiais para áreas rurais ou, de uma ou outra forma, mais necessitadas.

Além disso, Private Health Insurance gera incentivos para adquirir sistemas de
cobertura de saúde privados, alternativos ao Medicare. Através deste mecanismo,
famílias e indivíduos que pagam um seguro de saúde privado podem obter uma
redução de 30% do prêmio do seu plano. Este subsídio é uma parte importante das
iniciativas que o governo da Austrália está tomando para aumentar a percentagem de
pessoas que fazem uso de sistemas particulares de financiamento. Isto permite uma
maior direção de recursos para a medicina pública e contribui para garantir o acesso
universal à saúde.

Este tipo de incentivo por parte do governo faz com que a opção por planos
particulares seja mais atraente. Alguns australianos preferem afiliar-se a um seguro de
saúde privado para aproveitar uma cobertura mais ampla. Além disso, associar-se a
um serviço particular acarreta, na maioria dos casos, menor tempo de espera na
obtenção de horários para as consultas, especialmente para procedimentos médicos
não essenciais.

Desta forma, o estado federal australiano garante serviços de saúde confiáveis, de alta
qualidade e acessíveis universalmente. Ao mesmo tempo, descentralizando o
gerenciamento dos centros de saúde e a relação com os profissionais, deixa sob a
responsabilidade dos governos estaduais e territoriais as decisões que possam ser
afetadas por particularidades locais. Os esforços realizados a partir das políticas

183
públicas para envolver organizações particulares, tanto organizações sem fins
lucrativos como iniciativas e empreendimentos comerciais, fazem com que os serviços
de saúde na Austrália sejam parte de um sistema sustentável e integrador dos
diferentes setores da sociedade.436

Nos Estados Unidos da América - EUA

A cobertura para a saúde de forma universal está novamente sendo a bola da vez na
linha de frente dos debates que envolvem políticos nos EUA. Há ainda mais de 45
milhões de americanos sem cobertura de saúde e isso é muito complicado, pois os
custos de saúde são crescentes e o número de segurados não mostram sinal de
redução.

Os americanos gastam quase 16% do PIB com a saúde e ainda assim seus resultados
têm baixa classificação quando comparados a outros países com economias
desenvolvidas. O debate da criação de um modelo de cobertura universal norte-
americano, e o exame de sistemas de saúde de outros países permite reflexões úteis
sobre o que funciona e o que não funciona. Uma característica importante é o da
solidariedade comum aos sistemas europeus. Atualmente, comunidade e o governo
suportam fortemente, tanto ideologicamente quanto com suporte financeiro, a noção
de que o acesso universal à saúde é um direito do cidadão.437

O sistema americano tem muita liberdade de contratação. Foi considerado o país mais
avançado em sistemas de saúde empresarial, pois, sua identidade em saúde sempre
foi de negócio, todavia, é considerado o pior na Saúde Pública.

O Estado protege os idosos com mais de 65 anos pelo “Medicare” e os paupérrimos


pelo “Medicaid”. Todo o resto da população está na cobertura privada com uma gama
de planos e variedades de preços, atingindo perto da metade de toda a população
ativa dos EUA. Houve e ainda há muitos problemas em decorrência da crise
econômica porque passa os EUA. O excesso de liberdade em atividade estratégica
como na saúde também não é a solução ideal, conforme mostra a história. É
necessário um sistema híbrido e regulado. Talvez o Brasil esteja no caminho correto.
A história dirá.

É interessante notar que nos EUA, todos os produtos têm um fator moderador de
utilização. O plano de saúde, seja individual, seja empresarial, não podem ser
utilizados de forma indiscriminada. Trata-se de uma questão de consciência de custos
e de cidadania.

O sistema de saúde americano é extremamente liberal. 438 O filme de Michael Moore439


“Sicko - $O$ Saúde” – foi indicado ao Oscar em 2008 como melhor documentário e

436
Fonte: Intranet – Cassi – São Paulo.
437
O governo quer ser o fornecedor principal dos cuidados da saúde. Depende de cada país, no entanto, os valores
subjacentes que estruturam os vários sistemas que são notavelmente similares. Todos os sistemas são afetados por
desafios semelhantes ou similares. Estes desafios estão se tornando, rapidamente universais a todos os sistemas de
saúde, incluindo aquele dos EUA e do Brasil. (Palestra Paulo Hirai – Milliman do Brasil – fev/2009 – na Abramge – SP).
438
Apud – Scliar – Mas fornece ao mundo muita pesquisa.

184
mostra como funciona o Sistema de Saúde do Tio Sam. O vídeo está disponível nas
locadoras. As palavras “sistema de saúde” e “comédia” não são facilmente
encontradas na mesma frase, mas no mais recente filme de Michael Moore elas
podem ser vistas lado a lado.

Para mostrar como as coisas funcionam lá nos EUA, Moore ouve as histórias de vários
americanos comuns cujas vidas foram despedaçadas, ou arruinadas pelo sistema de
saúde americano. O filme mostra que a crise não somente afeta os milhões de
cidadãos que não possuem seguro de saúde, mas também milhões de outros que
pagam religiosamente suas prestações e que estão sempre lutando com a burocracia
e com suas regras oficiais obscuras. Para provar que nem tudo está perdido, o
cineasta compara outros sistemas de saúde visitando, o Canadá, a Inglaterra, a
França e Cuba onde todas as pessoas recebem um bom atendimento médico de
forma gratuita.

Se gasta mais nos EUA com a saúde, por habitante, incluindo gastos públicos e
privados, que em qualquer outro país do mundo, e o total de gastos está acima de
15% do PIB e, sem reforma, deverá chegar a 19,5% em 2017. 440

Starr (1982) 441 vê na ascensão da medicina norte-americana um esforço organizado,


que transformou uma profissão que até o começo deste século gozava de escassa
confiança do público num poderoso grupo técnico-profissional. Isto aconteceu, em
primeiro lugar pela vinculação da medicina ao estabelecimento científico e tecnológico;
em segundo lugar, pela peculiar relação entre médicos e pacientes, baseada numa
ascendência do profissional sobre o cliente e no pagamento de honorários – fixados
pelos profissionais – por serviços prestados. Em terceiro lugar, os médicos americanos
conseguiram controlar seu próprio número.

Em 1910, Abraham Flexner, comissionado pela Fundação Carnegie, publicou um


relatório mostrando as más condições de ensino nas escolas médicas americanas;
muitas faculdades foram então fechadas, reduzindo drasticamente o número de
profissionais formados. Numa análise do livro de Starr (1982), Relman (1984) mostra
que muitos destes aspectos são inerentes ao exercício da medicina; de um lado, o
médico exerce o papel de protetor de seu paciente, e por isso tem relativa autonomia
para decisões – embora esta seja contestada – por vezes em tribunais; de outro, o
paciente precisa confiar no médico. Mas Relman (1984) 442 está de acordo com Starr
(1982) no registro de um fenômeno preocupante: a ascensão das corporações que

439
Michael Moore dirigiu também “Fahrenheit - 11 de setembro e venceu no Oscar com “Tiros em Columbine” -
Europa Filmes.
440
Em 2007, foram gastos US$ 2,26 trilhões, ou $7.439 por pessoa, com crescimento médio anual projetado de 6,7%
entre 2007 e 2017. É o único país rico, industrializado que não assegura acesso à saúde de todos os cidadãos. Os
cuidados com a saúde nos EUA são fragmentados e proporcionados por muitas entidades distintas. Os EUA são
líderes em inovação médica, com um gasto per capita 3 vezes maior que a Europa. Os EUA também têm a maior taxa
de sobrevivência que a maioria dos países principalmente para certas condições como o câncer. A OMS classificou o
sistema americano como o primeiro em capacidade de resposta, o mais caro, 37º lugar em desempenho geral e 72.º
lugar por nível geral de saúde, entre as 191 nações membros incluídas no estudo. Em 2008, a Commonwealth Fund
classificou os EUA em último na qualidade dos cuidados da saúde entre os 19 países do estudo. (Fonte: Milliman –
Palestra proferida por Paulo Hirai – 13/02/2009 – Diretor Superintendente e IESS – Instituto de Estudos de Saúde
Suplementar).
441
Apud – Scliar – “The social Transformation of American Medicine” – NY – Basic Books, 1982.
442
Apud – Scliar - Arnold S. Relman – “The Power of the Doctors” – NYRB – 29/03/1984

185
entraram no mercado da saúde com o objetivo declarado de obter lucros através do
que é hoje uma vasta indústria.

O futuro da medicina dependerá, diz Relman (1984) da escolha dos médicos. Terão de
optar entre defender o interesse de seus pacientes ou se associar de forma
empresarial às corporações. As questões colocadas por Starr (1982) e Relman (1984)
remetem diretamente ao problema dos custos da assistência médica.

O que se tem constatado em vários países é que, deixados sem controle, os custos da
assistência médica tendem a subir num ritmo muito maior que o do processo
inflacionário porventura existente. Pode-se dizer que, havendo dinheiro, há assistência
médica e quanto mais dinheiro houver, mais assistência médica haverá. Este é um
fato conhecido há muito tempo e que se traduz às vezes por situações curiosas. Nisso
estão incluídos os produtos farmacêuticos e equipamentos tecnológicos.

Na Jamaica, havia, em 1832, um médico para cada 1.822 habitantes, enquanto que
em 1975 a proporção era de um médico para cada 3.509; e a Jamaica estava,
obviamente, mais desenvolvida. Como se explica então, a diminuição da proporção
médico/paciente? A razão é simples. Em 1832 os proprietários de escravos pagavam
aos médicos uma quantia por cada escravo que eles tomassem sob seus cuidados, o
que tornava lucrativa a prática médica nas fazendas e atraía profissionais.

A Gazeta Mercantil reproduziu artigo do economista Paul Krugman, publicado no New


York Times, de 04/07/2009, sobre os programas de saúde pública dos pré-candidatos
à presidência dos Estados Unidos, assunto que dominava a campanha na época. A
mulher do democrata John Edwards, que desistiu da disputa, botou lenha na fogueira
ao afirmar em março que pelo projeto do republicano John McCain ficaria sem
cobertura das seguradoras de saúde – e o próprio candidato também Elizabeth
Edwards tem câncer incurável nos osso e McCain recuperou-se de um tumor. 443

Durante a realização de estudo sobre a saúde nos EUA, os autores Michael Porter e
Elizabeth Teisberg (2007), formularam a hipótese de a crise da saúde naquele país
dever-se a falhas na forma de competição, pois, objetivando a minimização de custos,
esta acontece pela via de restrições de coberturas, procedimentos, limitação de
serviços, gerando baixa qualidade e tratamento insuficiente, não agregando valor para
o paciente. Segundo esses mesmos autores, nessa competição de soma zero, só um
ganha, todos os demais envolvidos perdem. Para aprimorar a qualidade e reduzir os
custos, Porter e Teisberg (2007) propõem um novo modelo competitivo, a competição
de soma positiva, centrada na figura do paciente, baseada em valor e focada em
resultados.

Segundo os autores norte-americanos, valor na assistência à saúde é o resultado


obtido na qualidade de vida por dólar gasto, considerada a condição de saúde do
paciente, ou seja, a competição deve ser integrada em toda a linha de cuidado, desde

443
“Já estava na hora de alguém dizer isso e, em geral, salientar que a visão de McCain em matéria de assistência
médica se baseia em economia vodu”, diz o texto, “de que a mágica do mercado” pode oferecer assistência médica
barata a todos. É que o projeto de McCain não impede que as seguradoras neguem cobertura aos que, como ela e
McCain, têm problemas de saúde pré-existentes. (Fonte: A Gazeta Mercantil de 07/04/2009 )

186
o monitoramento e prevenção, passando pelo tratamento, estendendo-se até a
reabilitação e acompanhamento do paciente.

Dessa forma, as informações sobre o paciente e a família vão sendo acumuladas e


compartilhadas podendo os resultados serem mensurados, analisados e relatados.
Esse novo modelo, onde todos os envolvidos podem se beneficiar possibilita um
controle sobre os custos e uma melhor qualidade da saúde dos cidadãos. Muito tem à
ver com a questão do planejamento familiar também. 444

Quanto a políticas públicas e gestão, 84,7% dos cidadãos têm algum tipo de seguro
saúde, seja através do empregador (59,8%), individual (8,9%) ou de programa
governamental (27,8%) – há evidentemente sobreposição. 445 446

Os estudos de Porter e Teisberg (2007) é inovador ao sugerir uma série de estratégias


possíveis para a crise dos serviços de saúde nos EUA, as quais podem implicar o
aprimoramento da qualidade da atenção, aliada à redução de custos. Nesse sentido,
ele poderá nos auxiliar como ponto de partida para se construir o significado de valor
na assistência à saúde para que tenha como paradigma o princípio constitucional
maior, que é a dignidade da pessoa humana como imperativo de justiça social, pois
saúde é uma atividade onde o valor social se sobrepõe ao econômico. (Amorim –
2008).

Ainda quanto a política e gestão americanos, considera-se elevado o custo


administrativo, maior que nos países com sistema de pagador único. Harvard Medical
School e Canadian Institute for Health Information: 31% do dinheiro da saúde, mais de
U$1.000 por pessoa/ano, vão para gastos administrativos, quase o dobro do que o do
Canadá.447 No caso do sistema privado americano comprar um plano de saúde não é
tão simples como parece. 448

444
De acordo com a teoria da transição demográfica, as populações passam por três fases: na primeira, fecundidade e
mortalidade evoluem paralelamente, e a população mantém-se estável; numa segunda fase a mortalidade diminui –
pelas melhores condições de vida, atividades da saúde e assistência médica, a população aumenta, às vezes
rapidamente – e é o que se chama de “explosão demográfica”; finalmente a fecundidade diminui e a população volta a
ficar estável ou até diminui, como acontece com países europeus. A fecundidade o mais das vezes é espontânea, mas
em muitos países – a China é o exemplo mais notável – resulta de programas governamentais. Questiona-se a
validade desses programas como uma forma de, reduzindo o número de pobres também diminuir a pobreza, ou pela
forma autoritária com que muitas vezes são impostos ou pelos altos custos, ou pelos interesses obscuros que muitas
vezes os movem. A controvérsia vai até para a semântica, cujas expressões têm conotação distinta: controle da
natalidade, planejamento familiar; dimensionamento da prole, espaçamento gestacional, etc. (National Geographic –
pág. 58 – janeiro/2011).
445
Os programas do governo americano têm elegibilidade restrita e não há sistema nacional que garanta acesso a
todos os cidadãos. Americanos não cobertos por saúde em 2007 somavam 15,3% de toda a população ou 45,7
milhões de pessoas. O sistema de saúde americano tem um grande número de atores. Há centenas de seguradoras e
operadoras. Há grandes limitações para cobertura de saúde mental. (Fonte Milliman Brasil – Palestra Paulo Hirai –
13/02/2009 e IESS – Instituto de Estudos de Saúde Suplementar).
446
Na Abramge, em palestra de 13/02/2009, informa que um quarto dos pacientes acredita que seus médicos os
expuseram a riscos desnecessários. Os clínicos gerais já não vêem seus pacientes quando estão no hospital. Médicos
do hospital são em geral utilizados e não conhecem o histórico do paciente, pois, não tiveram relação prévia com ele, o
que fragmenta os cuidados e em certos hospitais de especialidades, o uso de especialistas é requerido pelas
seguradoras como medidas de redução de custos.
447
America’s Health Insurance Plans: gastos administrativos para planos privados são em média 12% dos prêmios;
CBO (2008): gasto administrativo de seguradoras privadas é equivalente a 12% dos prêmios. Essas variações são
atribuídas a economias de escala. Planos para grandes empregadores têm o menor gasto administrativo e os planos
individuais têm o maior gasto. Tem havido muita reclamação dos provedores de serviço pela baixa remuneração;
pacientes com seguro do governo tem dificuldade de encontrar provedores próximos para certos serviços médicos;
Caridade para os que não podem pagar está às vezes disponível em qualquer facilidade médica e é em geral custeada
por fundações sem fins lucrativos, ordens religiosas, subsídios governamentais e outros. Alguns Estados como

187
O Estado de Massachusetts adotou um sistema de cobertura universal de saúde em
2006. 449Todos os residentes que tem poder de compra devem comprar seguro saúde.
Isso se verifica pelo imposto de renda. O Estado provê planos subsidiados tal que
quase todos possam ter um seguro saúde. Provê também um Fundo de Segurança da
Saúde para pagar pelos tratamentos necessários daqueles que não podem comprar
seguro ou são inelegíveis.

Quanto ao aspecto público, as organizações de serviço público não estatais que já


existem há muito tempo, mas que recentemente se originaram principalmente por
causa da publicitação, transformação em organizações públicas não estatais – de
organizações estatais ou de entidades constituídas voluntariamente por particulares -
aos quais se atribui uma relação formal com o Estado, se expressa em fomento e
fiscalização.

A discussão é antiga e há muitas controvérsias. Implementar um sistema universal de


saúde ou apenas melhorar o atual sistema americano é uma dúvida que paira sobre
as cabeças dos norte americanos. Há muita divisão. Os defensores dizem que os
custos dos não cobertos são, de alguma forma, arcados através de custos ocultos
absorvidos por todos e que estender a cobertura reduziria custos e melhoraria a
qualidade. Os oponentes defendem o direito das pessoas de optar pelo seu seguro
saúde e que programas governamentais irão requerer aumento de impostos, trazer
ineficiências administrativas, maior utilização e redução da qualidade. 450

A Lei de Tratamento Médico de Emergência obriga que todos os hospitais aceitem


todos os pacientes, independentemente da capacidade de pagar, para cuidados em
pronto socorro. 451

Usualmente estruturadas em forma de fundações de direito privado e associadas ao


movimento de reforma da administração pública, elas representam a recuperação da
prática antiga de ver as universidades e os hospitais como organizações públicas de
direito privado. As universidades americanas, por exemplo, ainda que sejam divididas
em universidades privadas e provinciais ou estatais, na verdade são todas públicas
não estatais. Não são privadas porque não visam ao lucro, não são estatais porque
não tem servidores públicos em seus quadros, nem estão subordinadas diretamente
ao governo.

Por outro lado, quanto aos hospitais, existe uma longa tradição de organizá-los como
sociedades beneficentes. Essas novas instituições atuam no campo social, em
particular educação e saúde, com recursos assegurados pelo Estado, submetidas a

Massachusetts e New Jersey e cidades como São Francisco já têm programas de subsídios e outros estudam
programas similares.
448
O Underwriting médico é requerido para se comprar um plano de saúde. As seguradoras mitigam a seleção adversa
de risco e gerenciam a diluição de risco através de análise de cada aplicação para ver condições pré-existentes. Há um
pensamento geral que os proponentes do underwriting afirmam que isso assegura prêmios individuais o mais baixo
possível e críticos argumentam que isso impede que pessoas com condições pré-existentes possam ter seu seguro-
saúde. (Palestra Abramge – 13/02/2009 – Paulo Hirai – Milliman Brasil).
449
Nos EUA os Estados podem fazer suas leis próprias.
450
(IESS – 13/02/2009 – palestra na Abramge – Paulo Hirai).
451
Tal Lei não dá acesso a cuidados não emergenciais se o paciente não puder pagar. Prontos Socorros estão no
limite da capacidade. Filas de espera se tornaram um problema nacional e ambulâncias redirecionam pacientes a
outros locais. (Fonte: 396, 397, 398 – Milliman – Brasil – 13/02/2009 – Abramge – São Paulo – SP).

188
uma relação contratual com ele e a certas exigências a respeito da conformação de
seus órgãos deliberativos. (Pereira, Grau – 1999).

Os EUA gastavam até recentemente entre 14% e 15% do PIB com saúde e sabemos
que mais de 40% da população americana não tem plano de saúde. Interessante
ainda é saber que na Inglaterra se gasta entre 6% e 7% do PIB e o sistema é público e
universal. Se os sistemas funcionam ou não veremos em análises detalhadas em
outros momentos. 452 453

De acordo com Barbara Starfield, as principais características da atenção primária à


saúde (APS) são:

Constituir a porta de entrada do serviço — espera-se da APS que seja mais acessível
à população, em todos os sentidos, e que com isso seja o primeiro recurso a ser
buscado. Dessa forma, a autora fala que a APS é o Primeiro Contato da medicina com
o paciente. Continuidade do cuidado — a pessoa atendida mantém seu vínculo com o
serviço ao longo do tempo, de forma que quando uma nova demanda surge esta seja
atendida de forma mais eficiente; essa característica também é chamada de
longitudinalidade. Integralidade — o nível primário é responsável por todos os
problemas de saúde; ainda que parte deles seja encaminhada a equipes de nível
secundário ou terciário, o serviço de Atenção Primária continua corresponsável. Além
do vínculo com outros serviços de saúde, os serviços do nível primário podem lançar
mão de visitas domiciliares, reuniões com a comunidade e ações intersetoriais. Nessa
característica, a Integralidade também significa a abrangência ou ampliação do
conceito de saúde, não se limitando ao corpo puramente biológico. Coordenação do
cuidado — mesmo quando parte substancial do cuidado à saúde de uma pessoa for
realizada em outros níveis de atendimento, o nível primário tem a incumbência de
organizar, coordenar e/ou integrar esses cuidados, já que freqüentemente são
realizados por profissionais de áreas diferentes ou terceiros, e que, portanto têm
pouco diálogo entre si.··.

O governo americano contribui com cerca de US$200 bilhões por ano, assegurando
um sem-número de atividades sociais e contribuindo não só para a solidariedade e
coerência do tecido social, mas para a produtividade econômica. É interessante ver
que esses US$$ 200 bilhões são gastos essencialmente na área de saúde, não como
contribuição filantrópica, mas como pagamento a instituições, inclusive muitas do

452
O governo americano subsidia o gasto com saúde pago pelo empregador isentando esses benefícios do imposto de
renda. O valor desse subsídio é estimado em US$ 150 bilhões por ano. As despesas médicas qualificadas dos
indivíduos são dedutíveis. Programas diretos do governo cobrem 27,8% da população que são 83 milhões, incluindo
idosos, inválidos, crianças, veteranos e parte dos pobres. Programas do governo respondem por 45% dos gastos com
saúde fazendo do governo o maior segurador de saúde do país. Quanto aos pagadores, hospitais e médicos negociam
com seguradoras e operadoras para definir os níveis de reembolso. Algumas tarifas são definidas por lei. O valor pago
a um médico por um serviço a um segurado é em geral menor que o pago do bolso por um paciente não segurado.
453
A propriedade do sistema de saúde está quase toda nas mãos do setor privado, embora os governos federal,
estadual e municipal também tenham suas próprias instalações, mas 65% dos hospitais são privados e sem fins
lucrativos. Existem também hospitais com fins lucrativos, bem como os pertencentes ao governo, sobretudo os
municipais. Não há um sistema de instalações médicas de propriedade do governo e aberta ao público em geral. O
Departamento de Defesa opera hospitais – Sistema de Saúde Militar – para o pessoal militar ativo. Veteranos e índios
têm também sistema próprio. Os clínicos gerais são o ponto de entrada para a maioria dos pacientes, mas em um
sistema fragmentado muitos pacientes e seus provedores têm problemas de coordenação dos cuidados: de cada 4 em
10 médicos reportam que seus pacientes têm tido problemas com a coordenação de seus cuidados, que 60% dos
médicos reportam que seus pacientes às vezes ou frequentemente têm longas esperas para testes de diagnósticos e
finalmente, 20% reportam que seus pacientes repetem testes devido a inabilidade de localizar os resultados já obtidos.

189
terceiro setor que ganham as concorrências, pois são as mais eficientes nessa área do
que o setor privado ou as administrações públicas tradicionais 454 Nesse conjunto de
instituições americanas estão também as universidades e empresas de ponta em
tecnologia que pesquisam tudo sobre saúde, bem estar, robotização e longevidade.

Sabe-se que há muito tempo discute-se o impacto nos custos de um sistema misto
público-privado nos EUA. Há defensores do mercado livre e eles dizem que gastos do
governo com a saúde aumentam os seus custos, e a intervenção do governo cria um
sistema distorcido de pagamentos a terceiros, tirando o paciente da escolha do
financiamento e dos serviços médicos, o que afeta os custos. 455 456 457

Atendimento melhor à totalidade da população com acesso a novos remédios e


tecnologias médicas, tudo isso é desejável, mas a pergunta que não cala é como ter
isso sem tornar os custos insustentáveis e com a tecnologia avançando numa
velocidade incrível. Numa reportagem efetuada por Roberta Paduan, na revista Exame
(2010).
Ela destaca que o cientista americano Raymond Kurzweill, 458 considerado uma das
mentes mais brilhantes da atualidade, provocou espanto e ceticismo recentemente ao
anunciar que estamos prestes a atingir um objetivo tão antigo quanto a própria vida – a
imortalidade.

Formado em ciências da computação pelo Massachusetts Institutute of Technology e


detentor de alguns dos mais importantes prêmios de inovação, Kurzweil diz que o
ritmo de avanço tecnológico é tão intenso que bastarão mais duas décadas para tornar
o homem imortal. De um lado, novas gerações de remédios vão sufocar as doenças.
De outro, a nanotecnologia e outras tecnologias serão utilizadas para construir órgãos
vitais que substituirão os biológicos gastos pelo tempo.

O fato é que ele afirma que existe um arsenal disponível para prolongar a vida que
nunca foi tão robusto. Em muitos casos não é um médico que se debruça para operar
o paciente – mas um robô. O cirurgião, sentado numa cabine ao fundo de uma sala,
comanda quatro braços robóticos que se movimentam no interior do abdome do

454
Dowbor, 2005, p. 88.
455
A Sobre-Utilização é um dos principais fatores do aumento de custos nos EUA. O baixo nível de reembolso do
Medicare e Medicaid aumenta a pressão de desvio de custo para o setor privado para compensar, o que aumenta o
valor dos prêmios. Os defensores do sistema de pagador único, existente em outros países, indicam que nesses casos
os resultados dos tratamentos são superiores e com menor custo. Os estudos mostram que se as reformas do sistema
baseado em mercado não forem implementadas em uma base sistêmica e com salvaguardas, podem trazer mais
problemas do que soluções.
456
Em 2007, 45,7 milhões de pessoas não tiveram cobertura de nenhum plano nos EUA. Desses, 37 milhões eram
adultos em idade de trabalho, entre 18 e 64 anos e mais de 27 milhões trabalharam pelo menos em tempo parcial.
38% dos não-segurados vivem em família com renda de US$ 50.000 ou mais. Quase 36 milhões dos não-segurados
são cidadãos legais no país. 9,7 milhões não são cidadãos americanos, incluindo os imigrantes ilegais. (Fonte :
Instituto de Estudos de Saúde Suplementar – IESS – 2009).
457
O sistema de saúde americano é regulamentado a nível federal e estadual, com o governo federal delegando aos
Estados maior responsabilidade. Estados regulam o conteúdo das apólices e requerem que a cobertura de tipos
específicos de serviços médicos. A regulação em geral não se aplica aos planos de grandes empregadores, devido a
uma cláusula da Lei “Employee Retirement Income Security”. Os planos são financiados pelos empregadores,
empregados e governos financiam o custo da saúde. Os planos normalmente são contributários. O empregador
negocia com as operadoras/seguradoras. As coberturas odontológicas e oftalmológicas são vendidas separadamente,
e remédios prescritos são benefícios com processamento distinto. Esses benefícios são pagos pelos empregadores e
/ou empregados e/ou governo.
458
Raymond Kurzweil (Nova Iorque, 12 de fevereiro de 1948) é um inventor e futurista dos Estados Unidos, pioneiro
nos campos de reconhecimento ótico de caracteres, síntese de voz, reconhecimento de fala e teclados eletrônicos. Ele
é autor de livros sobre saúde, inteligência artificial, transumanismo, singularidade tecnológica e futurologia. (Wikipédia).

190
paciente. Três deles manobram bisturis, pinças e agulhas. O quarto leva uma câmera
que mostra tudo o que se passa na operação e produz imagens ampliadas 12 vezes.
Elas guiam o cirurgião, que opera com os olhos grudados em um monitor, como se
jogasse videogame.

No Reino Unido

A Inglaterra tem sido o objeto privilegiado para as análises que, dos mais variados
ângulos, têm como objetivo compreender o nascimento das relações sociais
capitalistas e não tem sido diferente naquelas que se têm preocupado com o
surgimento das práticas de saúde. É o fato de ter sido o pólo hegemônico do
desenvolvimento do capitalismo que lhe tem dado este destaque, o que se tem
traduzido na riqueza de informações, dados e análises disponíveis. O século XVIII, na
Inglaterra, é o momento de grandes transformações sociais e institucionais. Já em
1640 dá-se a revolução burguesa naquele país, após a fase de acumulação primitiva
do capital que, diferentemente da França e da Alemanha, não se assenta na
organização política do Estado Absolutista.

O período que vai do século XVII até o XVIII, economicamente se caracteriza como
aquele em que se dá passagem da fase de capitalização da renda fundiária para a de
revolução urbano-industrial, sendo que, no começo do século XIX, temos a
consolidação da fase industrial. No plano institucional verifica-se em 1601, na era
Elizabetana, a instituição da Lei dos Pobres, na qual a pobreza era vista como
consequência do “não trabalho”. A partir de 1934, com a forma desta Lei, a pobreza
passa a ser vista como uma expressão das condições de vida do trabalhador, e como
tal se torna uma questão social. A Saúde virá nessa esteira da Lei.

Por esta Lei, uma das maneiras de combater a pobreza era através das “casas de
trabalho”, de cunho paroquial, a forma administrativa imperante na Inglaterra da
época, é onde cada paróquia era responsável por seus pobres.459

São no interior destas instituições, as casas de trabalho, que se instala o cuidado


médico ao pobre, o qual se constitui no início do processo de medicalização da
pobreza. A perspectiva destes serviços de saúde, assim como a separação dos
pobres do resto da sociedade, tinha em vista criar barreiras para que a pobreza não
contaminasse, com seus perigos, os outros grupos sociais, diretamente relacionados à
produção material ou à gestão social.

No fim do século XVIII e começo do XIX há um grande aumento da pobreza e das


dificuldades sociais para enfrentá-la, só que agora a mesma é assumida, como já se
viu, como resultado das novas relações sociais, que haviam amadurecido na Inglaterra
– as relações sociais do capitalismo industrial. Os pobres não eram fruto do não
trabalho, mas eram os próprios trabalhadores empobrecidos pelas relações de
exploração. É dentro desta nova situação social, a do século XIX, com a
industrialização e a urbanização, que ocorre a medicalização do ambiente, a qual,
459
Sugere-se ler, para uma abordagem mais completa, Dobb, M. – “A Evolução do Capitalismo” – Zahar Editores – RJ,
1973, capítulos VI e VII e mais: “Esse controle muito direto exercido pelas comunidades locais implicava mesmo um
princípio de retenção geográfica do pobre, o qual ‘pertencia’ à paróquia ou freguesia. (Donnangelo, M.C.F. – op. Cit., p.
63).

191
segundo Rosen, se dá sob a forma de um projeto de Reforma Social, que,
posteriormente, se transforma em um programa de reforma sanitária. (Menicucci,
2007).

Em 1834, com o novo Parlamento inglês, forma-se uma comissão para estudar e
propor soluções para a Lei dos Pobres Elizabetana, dadas a nova realidade da
sociedade inglesa. Esta Lei tinha se tornado um obstáculo para a livre relação entre o
capital industrial e a força de trabalho, porque, devido ao seu caráter paroquial e pré-
capitalista no trato da pobreza, impedia o livre vem-e-vem do trabalhador, segundo a
dinâmica do mercado da força de trabalho, amarrando-o a uma localidade específica,
que era o município da Paróquia.

Em 1842, Edwin Chadwick realizou uma investigação, que se tornou clássica: é o


“Inquérito Sanitário das Condições da População Trabalhadora da Inglaterra”, no qual
mostra a relação entre a presença das doenças e as péssimas condições de moradia,
a falta de esgotos, a ausência de água limpa, erros na remoção e tratamento do lixo
entre outros problemas. Assim, percebe-se a relação entre a pobreza e a doença. A
Saúde Pública, enquanto Sanitarismo, configurará aquilo que serão as práticas
sanitárias, restringindo-as a um conjunto de ações sobre os fatores que serão
encarados como os responsáveis pelo aparecimento da doença coletivamente. O
cuidado médico individual não teria a saúde como objeto, mas a doença, e por isso é
tido como limitado, dentro da visão miasmática – de sujeira, de imundície - tendo certo
valor para mostrar ou apontar o problema.

Mas, assinale-se aqui que algumas doenças de massa, como a tuberculose, tiveram
seu comportamento epidemiológico alterado também à custa de melhorias das
condições de vida. É necessário, portanto, investigar de que forma as práticas
sanitárias participaram dos processos sociais em curso na época. O processo inglês,
mas também o francês ou o alemão, de emergência das práticas sanitárias é um
exemplo bem rico para a compreensão das práticas sanitárias como práticas sociais
estruturadas infra e supra estruturalmente nas sociedades capitalistas. Com essas
sumárias referências ao processo histórico, no qual se institucionalizou o Sanitarismo
na Inglaterra, pretendeu-se indicar como as práticas sanitárias podem ser
caracterizadas como práticas constitutivas da sociedade capitalista. Muitas ainda são
as perguntas e questionamentos.

As respostas as diversas perguntas em saúde devem ser respondidas por um comitê


especializado que reúna médicos e especialistas em economia da saúde. Para definir
prioridades, é preciso saber quanto custa cada coisa e seu real benefício, afirma Bryan
Stoten, presidente do conselho do Sistema Nacional de Saúde britânico, o NHS, que
equivale ao SUS brasileiro e referência de qualidade.

No Reino Unido, o Ministério da Saúde tem um departamento que se dedica a analisar


o custo-benefício de cada nova droga ou técnica cirúrgica para, só então, decidir se
ela deve ser incorporada aos protocolos do NHS. Médicos e enfermeiros têm de
obedecer aos protocolos, uma espécie de guia de atendimento para cada doença. “O

192
comitê verifica se o tratamento é capaz de oferecer um ano a mais de vida com boa
qualidade ao paciente a um custo que não ultrapasse 50.000 dólares”, diz Stoten.460

Na China

As doenças transmissíveis sempre foram a grande preocupação de todos os países


que participam da Organização Mundial de Saúde, mas, deixando um pouco de lado
esses aspectos, é bom lembrar que naquela época em que a surge a necessidade
global de uma saúde pública monitorada globalmente, surge também o conceito de
puericultura,461 de proteção à infância. Até certa época, não determinada, mas de
passado recente, não havia condições de controle das doenças da infância. A
sobrevivência de vidas jovens era tão duvidosa que os pais – muitas vezes – evitavam
apegar-se às crianças para não sofrerem com a morte destas. Na China, por exemplo,
a criança só recebia um nome – só era contada entre os vivos – se sobrevivia à
varíola. Além disto, o infanticídio não era raro; era praticado entre as antigas
civilizações, na Inglaterra, tanto antes como depois da Peste Negra e foi uma das
causas que fez cessar o crescimento da população japonesa entre 1750 e 1850,
durante a Era Tokugawa. 462

A maternidade e a infância, tais como as conhecemos, são uma invenção da


modernidade. Na sociedade tradicional, as mães eram indiferentes ao bem-estar e ao
desenvolvimento das crianças de menos de dois anos. A Idade Média européia e no
Oriente, via mal a criança e pior ainda o adolescente. A duração da infância era
reduzida ao seu período mais frágil, enquanto a criança era ainda “engraçadinha”. As
pessoas se divertiam com a criança pequena, como se fosse um animalzinho. Se
morresse, o que era freqüente, alguns pais podiam ficar desolados, mas esta não era
a regra, pois outra criança logo chegaria igual à primeira: infância era anonimato.

Na Idade Moderna dissemina-se o hábito de entregar a criança às amas-de-leite,


principalmente na Europa, às vezes uma camponesa com a qual a criança passava
seus dois primeiros anos de vida. A terrível pobreza que fazia uma família camponesa
aceitar os filhos de outros gerava um ambiente inteiramente hostil ao bem-estar da

460
Esse tipo de prática ajudou o sistema de saúde britânico a se tornar um dos mais eficientes da atualidade. No ano
passado, o NHS gastou 168 bilhões de dólares e obteve superávit de 2,5 bilhões. No Brasil, há poucos protocolos e só
agora o Ministério da Saúde está criando um grupo para analisar drogas e tipos de tratamento que devem ser cobertos
pelo SUS. Segundo Helton Freitas, presidente da Unimed de Belo Horizonte, a maioria dos planos privados também
não segue esse tipo de política, mas terá de adotá-la para se sustentar no longo prazo. (Revista Exame \nov-2009\pág.
176).
461
A palavra puericultura foi criada pelo médico francês A.C. Caron em 1865; o título de seu manual era “ La Puéri-
culture ou La Science d’Élever Hygiéniquement ET Physiologiquement lês Enfants.” Surge daí uma nova disciplina que
depende em grande parte da educação. (Apud - Scliar, pág. 66).

462
Os samurais eram como soldados da aristocracia do Japão entre 1100 e 1867. Com a restauração Meiji a sua era,
já em declínio, chegou ao fim. Suas principais características eram a grande disciplina, lealdade e sua grande
habilidade com a katana. Os Samurais existiram por quase oito séculos (século VIII ao XV), ocupando o mais alto
status social porquanto existiu o governo militar nipônico denominado Shogunato. As pessoas treinadas desde
pequenos para seguir o Bushido, o caminho do guerreiro.

193
criança e até mesmo à sua sobrevivência. 463 No começo da Idade Moderna, ocorre
aquilo que Philippe Ariès,464 chama de revolução do sentimento.465

Canadá

O acesso à saúde no Canadá fornece cobertura universal livre de custo. A Lei de


Saúde faz com que todos os residentes de uma província ou de um território sejam
elegíveis para serviços médicos necessários de livre custo. Os serviços aos segurados
incluem virtualmente todos os hospitais, médicos e serviços de diagnóstico bem como
os serviços de clínicos gerais cobertos pelos planos Medicare da província. O sistema
de pagador único ainda é um problema no Canadá. Ele criou um gargalo para o fácil
acesso aos serviços. Embora as barreiras financeiras aos cuidados médicos tenham
desaparecido com a eliminação da maioria das taxas aos usuários do Medicare, o
acesso rápido aos cuidados é um problema com o qual os governos provinciais e
territoriais ainda continuam a batalhar. Por um lado, um sistema de pagador único é
muito mais eficiente administrativamente do que o sistema de pagadores múltiplos.
Por outro, pode criar um gargalo para o acesso aos serviços. 466

No Canadá o sistema de saúde é muito descentralizado. Existem Províncias e


Territórios que definem boa parte de suas próprias políticas de saúde e controlam sua
própria entrega dos serviços, embora o Governo Federal supervisione os serviços para
determinados componentes e populações. 467 O acesso à saúde é universal para a
população de 33,2 milhões de canadenses através de combinação de sistemas
públicos, mistos e privados de saúde.468

463
Estatísticas de Rouen, na França, durante o século XVIII, mostram que um terço destas crianças morriam antes dos
dois anos, contra um quinto de óbitos em crianças cuidadas por suas próprias mães. (Apud Scliar – Edward Shorrer,
op. Cit).
464
Philippe Ariès – “ História Social da Criança e da Família “ – Rio de Janeiro – Zahar, 1978 – Tradução de Dona
Flaksman.
465
Muda por exemplo, a atitude em relação à morte: encarada com fatalismo na Idade Média, dá lugar à sensação de
que a separação do outro já não é mais tolerável do ponto de vista emocional. E muda a atitude em relação à infância.
A família moderna nasce no meio da burguesia européia por volta de 1750. Localiza-se principalmente em zonas
urbanas; seu perfil demográfico progride gradualmente para um padrão de baixa mortalidade infantil e baixa
fecundidade. (Apud Scliar – página 65).
466
O Canadá está procurando melhorar a eficiência administrativa e a qualidade dos serviços. As listas de espera são
um ponto do descontentamento e corroem a confiança pública no sistema. O país deve atacar os custos crescentes da
saúde para continuar assegurando a sustentabilidade de seus programas. Províncias e Territórios fornecem cuidados
de longo prazo e outros serviços sociais a suas populações, e as opções variam de cuidados residenciais, que
fornecem alguns serviços de apoio ao dia-a-dia, a cuidados a doentes crônicos, com serviços intensivos para pacientes
com elevada necessidade. Sabe-se também que o Home-Care está também disponível nos setores público e privado.
(Fonte: Millimam Brasil – palestra Abramge – fev/09).
467
O pagador é único, ou seja, o governo para seus serviços hospitalares e médicos, pagam aos hospitais diretamente
ou através de fundos globais para as autoridades de saúde regionais.
468
No sistema público, que obedece a Lei da Saúde do Canadá para serviços hospitalares e médicos, considerado
como saúde pública, o financiamento tem contrapartida nos impostos, a administração de todo esse sistema é
provincial de pagador único sob a estrutura legislativa da província e os serviços são executados por profissionais
privados, por privados sem fim lucrativo, privado com fins lucrativos e há facilidades públicas. No sistema Misto, onde
os bens e serviços, por exemplo, medicamentos, home-care, cuidados de caráter institucional, são financiados pelos
impostos, pelos seguros privados de saúde e pagamento dos planos individuais. A administração no sistema misto, é
de serviços públicos objetivados, em geral com base na seguridade social. Há também os serviços privados regulados
pelo governo e os serviços entregues são por profissionais privados, privados sem fins lucrativos, privados com fins
lucrativos e outras facilidades públicas. No privado, existe, por exemplo, bens e serviços de odontologia, oftalmologia,
remédios, medicina alternativa, cujo financiamento acontece pelo seguro privado, pagamento dos usuários – que pode
ser total, co-participação e dedutíveis do imposto de renda. Nesse caso, a propriedade e o controle é das entidades
privadas, profissionais privados, a regulamentação é pública e há uma auto-regulamentação. Os serviços entregues, no
caso do sistema privado são todos profissionais privados e privados com fins lucrativos.

194
O governo e as províncias negociam tabelas de remuneração médica com
associações médicas. É raro, todavia, que as províncias assumam diretamente o
provimento dos cuidados da saúde. O Governo Federal no Canadá tem jurisdição
sobre determinados aspectos do sistema, regulando a prescrição de remédios e o
financiamento e a administração dos benefícios de saúde para indígenas, forças
armadas e Polícia Montada, veteranos e presidiários federais.469

O Canadá financia seu sistema da saúde basicamente através dos impostos, mais
coparticipações e reembolsos do seguro privado têm contribuição significativa.
Impostos dos governos provinciais, territoriais e federais representam quase 70% de
despesas totais da saúde.

O financiamento canadense para a saúde em 2004, somente para referência anual em


dólares deste trabalho, foi de US$ 104 bilhões, sendo: 43% em serviços hospitalares
(30%), e médicos (13%), 23% foram em programas de serviço social provinciais, 30%
em serviços privados de saúde e 4% em serviços federais diretos, atualizando um
pouco mais, houve um gasto per capita, de US$ 3.638 em 2006, com algumas
variações conforme a província. 470

O Seguro Saúde Privado canadense cobre bens e serviços não cobertos pelo
Medicare. Em 2004 o Seguro Privado cobriu 33,8% dos remédios, 21,7% dos cuidados
com visão e 53,6% dos odontológicos. As províncias proíbem seguro que tenta
fornecer acesso alternativo ou mais rápido aos cuidados cobertos pelo Medicare. A
maioria dos seguros saúde é empresarial, patrocinado pelos empregadores, por
sindicatos ou outras organizações. O seguro baseado no empregador é parte dos
benefícios, mas é mandatário e as províncias não taxam tais benefícios. Os recursos
para hospitais vêm dos orçamentos das autoridades de saúde regionais. 471

As autoridades de saúde regionais controlam a entrega dos cuidados médicos;


empregam equipe de funcionários remunerada na maioria das unidades de tratamento
intensivo e contratam com alguns provedores privados para serviços ambulatoriais
especializados. A maioria, dos 1,5 milhão de médicos e especialistas trabalha em uma
base fee-for-service. 472

469
O departamento federal de saúde, também tem um papel crítico na pesquisa dos serviços de saúde, na própria
saúde e na proteção pública. Recursos vêm de impostos sobre renda, consumo e impostos corporativos. Governos
provinciais e territoriais ajustam os impostos em suas respectivas jurisdições. Co-participações e reembolsos de
seguros privados cobrem 15% e 12%, respectivamente. Os 3% restantes vem de fundos de seguridade social e
doações de caridade. (Paulo Hirai – Palestra – Abramge – 13/02/2009).
470
No Canadá as autoridades de saúde regionais compram a maioria dos serviços de saúde, mas o seguro privado
paga pelos serviços que o Medicare não cobre. Os principais pagadores de serviços de saúde são as autoridades
regionais, que organizam serviços e alocam orçamento global para a população da região, cujos métodos de
financiamento variam entre províncias e territórios. As províncias têm liberdade para alocar – se necessário – fundos
para servir melhor às necessidades particulares de sua população. (Fonte: Abramge – Paulo Hirai – fevereiro/2009).
471
Embora historicamente hospitais sejam privados, ou instituições sem fins lucrativos, criou-se um relacionamento
integrado entre hospitais e governos provinciais. A maioria dos hospitais confia quase inteiramente nos recursos
orçamentários alocados pelas autoridades de saúde regionais. (Fonte: Milliman do Brasil – palestra proferida em fev/09
– Abramge).
472
O Fee-for-service – (Taxa por serviço) - responde por 79,5% da renda dos médicos. Os prestadores são
desencorajados de executar serviços nas esferas pública e privada, embora não seja ilegal.

195
Chile

O problema da organização dos serviços de saúde pública arrastava-se no Chile


desde fins do século XIX, sendo parcialmente resolvido em 1918, quando é publicado
o primeiro Código Sanitário que criou a Dirección General de Sanidad. Poucos anos
depois, foi criado o Seguro Social Operário Obrigatório (1924) e promulgada a
Constituição liberal moderna (1925) que estabeleceu o dever do Estado de manter um
serviço nacional de saúde pública graças, aliás, à influência do assessor do governo
chileno, John Long, médico higienista da Fundação Rockefeller, criando-se ao mesmo
tempo o Ministério da Salubridade, Previdência Social.

O sistema de saúde é um retrato da própria história do desenvolvimento nacional do Chile. Nele se


apresentam tanto a via pública, seguida por tantos anos, quanto a via privatista
característica essencial do período Pinochet. Mais que isso, a própria diversidade
econômica da sociedade chilena traduz-se num sistema que abre portas distintas para
seus cidadãos segundo características de capacidade de pagamento e riscos
envolvidos no seu atendimento. 473

Vale lembrar que a trajetória de constituição deste sistema teve seu caminho
caracterizado pelo descompromisso para com as instituições públicas ou mesmo a regulação
estatal. O mercado, no caso chileno, foi soberano como em poucas outras situações
pode se registrar, a despeito de ter sido criado pelo Estado ao transformar a
contribuição para saúde em compulsoriedade para o trabalhador. A riqueza da
avaliação do caso chileno repousa justamente na forma de composição dessa ruptura
entre público e privado. O Auge chileno é um direito de todos em saúde. É um benefício garantido por
Lei na qual não há discriminação de nenhum tipo e que foi implementado para melhorar a qualidade
de vida da população chilena e para impactar de forma positiva a família de todos os chilenos. 474

Os esforços dos últimos anos têm-se dirigido justamente no reforço à capacidade de


regulação do sistema como um todo, tanto no campo do financiamento quanto no
campo da efetividade do atendimento. O estabelecimento do fundo virtual que distribui
recursos captados pelas instituições públicas e privadas,segundo os riscos assumidos,
tendo em conta os percentuais de clientela, é um mecanismo poderoso de
organização sistêmica. A marca do setor saúde chileno é a convivência de um setor
público, que teve êxito nos mais importantes problemas de saúde pública e ostenta bons
indicadores, e de um setor privado organizado na forma de seguros, com expressiva
adesão das camadas de renda média e assalariada da população.O objetivo contínuo
é avaliar os elementos dessa convivência, a abrangência das instituições privadas, as
formas regulatórias e as questões postas pelo Plano Auge para o futuro do setor
saúde chileno.475

196
O comprometimento das unidades de saúde com padrões de atendimento por
protocolos e patologias representam a face da responsabilidade efetivados pelos
prestadores de serviços de saúde públicos ou privados. A inovação desenvolvida pelas
seguradoras privadas, no âmbito do Fundo Catastrófico, já enunciava este caminho, vinculando
recursos privados, prestadores públicos e oferta gerenciada. Todos os casos comprovam
a tendência estrutural do sistema a uma tentativa de integração entre os sistemas público e
privado, sem dúvida difícil, em decorrência das grandes divergências de poder contributivo
vigentes na sociedade, mas uma necessidade absoluta, em decorrência tanto da necessidade de
atendimento de direitos básicos da cidadania em sociedades democráticas quanto da enorme
tendência ao aumento de custos e riscos na administração de sistemas públicos e privados
em assistência à saúde.476

Há distribuições de contribuição por faixas de renda e a forma de organização das relações


entre o cotista e a instituição seguradora sempre foi extremamente complexa, tanto que todo o
desenrolar da legislação citada anteriormente remete a tentativa de estabelecer regras
que melhor protegessem o beneficiário. Um aspecto de enorme importância para a
análise do setor privado de saúde no Chile é que não existem noções de poupança de
longo prazo por parte dos cotistas nem de fidelização do afiliado por parte das
seguradoras. Na medida em que não há nenhum tipo de comprometimento de longo
prazo da seguradora para com o beneficiário, a troca de seguradora é usual, e a
prática da seleção adversa está consagrada na própria lógica da montagem do rol de
beneficiários. Como os preços são ditados pelas seguradoras segundo as condições
de saúde dos beneficiários, podendo ser alterados anualmente, mulheres em idade
fértil, idosos e portadores de doenças crônicas são altamente prejudicados na
formação de preços de contrato do setor.477

A existência de uma disciplina legal sobre a contribuição de saúde e a possibilidade de


escolha entre atendimento privado e público acabam por construir uma sólida inter-
relação entre seguradoras e Estado. Por um lado, há um mercado garantido para as
seguradoras, justamente porque a contribuição é compulsória e o atendimento tende a
ser melhor no setor privado que no setor público. Por outro, a migração do contribuinte
para o Fonasa 478 sempre é possível, o que dá plena liberdade às seguradoras para
praticar a expulsão dos usuários de alto custo ou de alto risco ao final do período de
vigência de contrato.
476
- Fonte: idem 537 – 538 - 539 – 541
476
O Fundo Nacional de Saúde, FONASA é o organismo público responsável pela cobertura de cuidados de saúde,
tanto dos 7% listados de sua renda mensal para a saúde FONASA, e àqueles devido à falta de recursos próprios,
fundos estatais a através de um imposto direto. Ele também oferece cobertura de saúde a todos os beneficiários, sem
exceção de idade, sexo, nível de renda, número de dependentes legais e condições de doenças pré-existentes,
recuperando a totalidade ou parte dos benefícios de saúde que são concedidos por instituições profissionais do setor
setores público e privado.

(Fonte:

http://www.fonasa.cl/prontus_fonasa/antialone.html?page=http://www.fonasa.cl/prontus_fonasa/site/edic/base/port/que_
es_fonasa.html ) - acessado em 27/07/2011).

197
Essas considerações indicam que há uma espécie de subsídio público ao
funcionamento das seguradoras. Esse subsídio começa no estabelecimento de um mercado cativo
comprador de seguros e termina na oferta de pontos de fuga para a empresa
seguradora, com a possibilidade de alteração contratual e conseqüente transferência
do segurado, e das despesas a ele relativas, para o Fonasa.

Em França

O governo Francês provê cobertura de saúde a todos os quase 65 milhões de


residentes do país e das províncias. A França implementou várias mudanças no
sistema de saúde. Houve uma reforma em 1996 que mudou o esquema de
financiamento alterando o imposto sobre a renda para financiar a saúde. Essa reforma
veio aumentar a supervisão do Parlamento, que estabeleceu a política de objetivos
financeiros e criou as agências regionais hospitalares. A França provê – agora –
cobertura universal de saúde a todos os residentes.

Quanto à parte política e de gestão, a França distribuiu a responsabilidade pelos


serviços de saúde da população em níveis nacional, regional e departamento do
Governo. O Parlamento define a cada ano o teto para gastos com saúde no país e
adota novas provisões sobre benefícios e regulamentação.

No nível regional, agências regionais hospitalares são responsáveis pela alocação de


recursos a hospitais públicos, ajustando tarifas para hospitais privados com fins
lucrativos, e planejando outras unidades hospitalares. Reportam-se ao Ministro da
Saúde. Há Conselhos gerais que provêm serviços sociais, de saúde e saúde pública
no nível do Departamento. 479

Na França o esquema de seguro é organizado por tipo de empregador. Há os fundos


de Seguro Saúde – denominado de Fundo Nacional de Seguro Saúde – para
trabalhadores assalariados – Caisse nationale d’assurance maladie dês travailleurs
salariés – CNAMTS. Há ainda o esquema agrícola, que é o Mutualité sociale agricole –
MAS - e o Fundo Nacional de seguro saúde para profissionais independentes –
CANAM. Cada fundo nacional de seguro saúde distribui recursos aos fundos regionais
e locais. Os fundos contratam serviços com provedores auto-empregados e negociam
o nível dos honorários. 480 481

479
A regulamentação da política e da gestão é efetuada pelo Ministério da Saúde em quase 100% das situações. O
Ministério da Saúde francês aloca fundos nacionais entre os setores e as regiões, fixa preços, aprova tarifas
negociadas, estabelece padrões de segurança em hospitais, controla a oferta, tal como o número de estudantes que
ingressam nas escolas médicas todos os anos e define, por antecipação, as prioridades nacionais na saúde. Todo
esse financiamento é decorrente de receitas tributárias de várias fontes. Em 2000, somente como exemplo para este
trabalho, 88,1% da receita de seguros veio da contribuição social geral e contribuições de empregadores e
empregados. As contribuições ao sistema de seguridade social diferem de acordo com a fonte de renda. Cada
residente paga a contribuição social geral com base na renda total. Há o imposto sobre renda de 5,25% e sobre as
pensões de 3,95%. Os demais valores de fundos necessários vêm de subsídios do Estado e tributos sobre uso de
carro e consumo de tabaco. Companhias farmacêuticas contribuem também via imposto sobre propaganda. (Fonte:
palestra de Paulo Hirai – fev/2009 – Abramge).
480
As receitas para o Seguro Saúde Francês, chegou em 2000/2001 – em torno de 126 bilhões de dólares,
considerando todos os impostos, acertos entre Estados, compensações e ajustes.
481
Os pagadores na França, são as entidades já citadas e respectivamente o CNAMTS – cobre cerca de 85,6% da
população e residentes franceses, incluindo empregados no comércio, na indústria e suas famílias, bem como os
elegíveis pela Lei da Cobertura Universal da Saúde que é estimado em torno de 1,6% da população. Esses dados são
de 2001/2002. Quanto ao esquema agrícola, já comentado, MAS, cobre fazendeiros e empregados rurais, com

198
Quanto aos pagadores, no plano de seguro saúde, o reembolso dos custos sobre
84,9% das despesas totais. Os restantes 15,1% são pagos para maternidade, doenças
e ferimentos relacionados ao trabalho e invalidez. Os reembolsos são efetuados ao
paciente que pagou de seu bolso ou ao provedor. Cada vez mais, benefício farmácia e
laboratórios são pagos diretamente pelos seguradores. Para cobrir a co-participação,
86% da população compram seguro saúde por vontade própria. Somente 43%
compram voluntariamente – empregadores compram a maioria das coberturas através
de apólice em grupo. 482

Quanto aos provedores de serviço, eles poderão ser hospitalares, de reabilitação ou


fisioterapia. Os cuidados pós-hospitalares com clínicos gerais, especialistas, dentistas
e enfermeiras. Há também os serviços de diagnósticos prescritos e os cuidados. Os
remédios prescritos e elegíveis ficam disponíveis. Há transporte relacionado à saúde
prescrita e várias práticas de cuidados preventivos. Os residentes podem consumir os
serviços com saúde à vontade, todavia, para aumentar a sensibilidade aos preços, os
pacientes pagam pelo serviço prestado e não recebe reembolso total, pagando uma
co-participação de 30% para médicos e dentistas e de 40% para serviços auxiliares e
de laboratório. Para situações diferenciadas, como pacientes crônicos, há isenções
também para casos de saúde muito debilitada e para gravidez. 483

O acesso francês à Saúde aos residentes cuja renda tributável anual abaixo de um
mínimo de 11.200 dólares484 é garantida de forma gratuita. O sistema é bastante
liberal e os pacientes podem escolher ser atendidos por qualquer médico licenciado a
qualquer tempo e sem limite. A média francesa é de 4,7 contatos com clínicos gerais
base ano.

Alemanha

A Alemanha é um país de quase 83 milhões de pessoas com expectativa de vida em


torno de 81,9 anos para mulheres e 78,7 para os homens. 485 Os problemas alemães
que existem no sistema de saúde são todos conhecidos e o governo está sempre
atento a eles. A qualidade é comparativamente baixa em relação à expectativa dos
usuários. Os custos são altos.

aproximadamente 7,2% da população e nos últimos, os auto-empregados, cerca de 5% da população estão cobertas
pelo CANAN.
482
Os hospitais recebem diárias e os serviços cobertos por tais tarifas variam conforme o tipo de hospital. No caso dos
hospitais públicos, eles recebem uma diária que cobre todos os serviços prestados. No caso de hospitais privados com
fins lucrativos faturam os honorários médicos e outros itens, tais como próteses, separadamente. Há uma participação,
por paciente, que contribuem com - em torno de - US$ 13,71por dia de permanência hospitalar. Em 2000 e 2001,
pesquisam indicavam que o número de clínicos gerais e de especialistas na França estava equilibrado, pois 194.000
médicos, representavam 51% de especialidades e 49% eram clínicos gerais. Metade dos especialistas e 29% dos
clínicos gerais recebem salário, trabalhando boa parte em hospitais e em torno de 25% dos clínicos gerais, ainda
fazem visitas domésticas em suas atividades. Os prestadores de serviços recebem pagamento dos pacientes ao
prestar serviço. Os provedores negociam o valor unitário à ser aplicada a tabela para determinar a tarifa de cada
procedimento.
483
Os pagamentos individuais na França correspondem a aproximadamente 11,1% dos gastos totais com saúde. A
França tem sido considerada pela OMS – o melhor serviço de saúde no mundo, todavia, luta com relação ao
financiamento sustentado e atendimento a crescente demanda pela população que envelhece. Há ainda, cobertura
para doenças mentais e dependentes químicos, bem como para idosos e inválidos. (Millimam – Brasil – fev/09 –
Abramge).
484
Base 2008 / 2009
485
Essa “Expectation of Life” da Alemanha é a definida em Atuária como a que inicia desde a idade zero, ou seja, ao
nascer e é aquela contida nas tábuas de mortalidade normalmente conhecidas.

199
Sob o ponto de vista de gastos, há dados de 2004/2005, que servem como referência,
pois estão em dólares.onde a Alemanha gastou em torno de US$ 3.635 com a saúde
de cada pessoa. Os US$ 300 bilhões gastos representam 10,6% do PIB alemão.
Sabe-se que antes de 2007 o sistema Social de Seguro Saúde (GKV) cobria 88% da
população, que era, na época, em torno de quase 73 milhões de pessoas e 9,7%
compraram seguro saúde privado (PVK). Os demais cidadãos eram cobertos por
programas estaduais especiais tais como planos para militares. Na Alemanha existem
perto de 200.000 residentes que não estão segurados.

O sistema alemão, conhecido desde os velhos tempos como modelo Bismarck, é o


mais antigo do mundo e foi estabelecido em 1883. 486Houve muitas alterações ao
longo do tempo, mas sua estrutura básica tem se mantido através das décadas.
Houve uma reforma em 2007 que tinha quatro objetivos principais: cobertura universal
de seguro saúde obrigatória, melhoria dos cuidados médicos, modernização do Fundo
Enfermidade e a Reforma do Fundo Saúde, a base do financiamento da saúde na
Alemanha. 487

Quanto ao financiamento, o empregador e o empregado pagam suas contribuições


diretamente a um Fundo Enfermidade aplicável. As contribuições são calculadas com
base em percentual do salário e pode ser diferente dependendo do Fundo
Enfermidade.

Empregados, empresários e empregados dividem as contribuições igualmente. Em


média, empregados contribuem com 7,6% do salário e empregadores com 6,6%. Para
aqueles que não têm condições financeiras, ou que ganham abaixo que US$ 60.000
por ano, para aposentados, estudantes, desempregados, inválidos ou sem teto há
subsídios disponíveis. Os subsídios federais são pagos diretamente ao fundo, que
distribui os recursos aos planos de seguro em uma base de capitação, que é definido
como por cabeça ou per capita.

Nos casos de seguros privados bem gerenciados e eficientes podem até devolver
dinheiro ao segurado ou prover benefícios adicionais não incluídos no pacote padrão.
No caso de planos de seguro que tenham déficit devidamente comprovado, há a
opção de requerer um prêmio adicional do segurado, mas limitado a 1% da renda
bruta. São os casos em que a sinistralidade ultrapassa a capacidade de pagamento da
Operadora ou Seguradora. Se caso o plano imputar um segundo prêmio, o segurado
ficará livre para mudar de plano. É como se fosse uma portabilidade, como no caso

486
Sob os pontos de vista de política e gestão, o governo alemão controla a política de saúde e a entrega dos cuidados
com a saúde. O Ministério da Saúde desenvolve e executa política de saúde e administra o fundo solidário de saúde.
Principais políticas requerem aprovação das duas casas do Congresso. Há uma atual política de solidariedade, onde
todos os cidadãos devem ter acesso igualitário a cuidados médicos de alta qualidade, independente da capacidade de
pagamento. O sistema de Seguro Social para a Saúde, um grupo de fundos denominados de enfermidade, provêm um
pacote padrão de benefícios, sujeitos a regulamentação do governo. A parte de financiamento, que é o sistema de
subsídio do modelo alemão atualmente está em reorganização. Consumidores pagam tanto o seu “imposto
solidariedade” quanto o prêmio de seguro diretamente ao fundo correspondente. Governo subsidia os prêmios para
residentes de baixa renda ou de classe especial, mantendo o princípio da solidariedade. Todo esse esquema é
chamado de subsídio interno.
487
Fonte: Abramge – Associação Brasileira de Medicina de Grupo – palestra proferida por Paulo Hirai – Diretor da
Milliman do Brasil – fevereiro/2009.

200
brasileiro, onde o usuário pode não desejar mais ficar naquela seguradora ou
operadora.

Os objetivos da Reforma de 2007 tiveram como alvo aumentar a transparência para os


consumidores, padronizar a taxa de contribuição para os programas de seguros
mandatórios, assegurar o equilibrado compartilhamento de risco através de
pagamentos em capitação ajustado a risco, aumentar a concorrência entre as
seguradoras, cujos instrumentos foram implantados como adicionais de direitos de
negociação de desconto e taxas de contribuição adicional. Restou ainda, o objetivo de
aumentar a possibilidade de escolha pelo consumidor com a possibilidade de
mudança imediata de planos se a companhia impuser custos adicionais.488

Conclui-se então que o sistema é Público e Privado com relação aos cuidados
médicos. Os serviços hospitalares estão aí incluídos. A maioria dos hospitais participa
de planos hospitalares, que implicam no recebimento de fundos através dos mesmos
mecanismos independentemente do esquema de propriedade – exceto cuidados
psiquiátricos, que são reembolsados em uma base diária.

Quanto às resseguradoras,489 sabe-se que a Munich-Re tem um braço de saúde muito


forte na Alemanha. Os dois canais principais de financiamentos hospitalares são: o
Fundo Enfermidade, que provê em torno de 93% do total cobrindo despesas
recorrentes e custos de manutenção e os governos estaduais planejam investimentos
em hospitais e cobrem os 7% restantes. Os reembolsos hospitalares são baseados no
DRG – que é uma moeda de base - para reembolso no sistema alemão. 490

488
Quanto aos pagadores, além do sistema padrão, residentes têm a opção de comprar seguro privado suplementar.
Havia, até 2007, 253 Fundos Enfermidade sem fins lucrativos contra 1.200 em 1991. Em 2004 o Seguro Social de
Saúde gastou US$ 168 bilhões, ou 56,3% do gasto total do ano. Os maiores gastos conhecidos são os de
Hospitalização, em torno de US$ 70 bilhões, correspondente a 34,1%, o de Visita Médica, que foi de US$ 27,7 bilhões,
que girou em torno de 15,3% e os remédios que custaram US$ 26 bilhões, correspondente a 14,7% do total gasto no
ano. Há 49 seguradoras privadas de saúde que fornecem cobertura suplementar ou chamada de substituta. Essas
seguradoras cobram prêmio baseado em risco e podem ser ou não ser mais custo-efetivo para alguns consumidores.
Para segurar custos, pacientes podem arcar com custos em adição aos prêmios e contribuições aos Fundos Solidários.
Há co-participações e pagamentos diretos não são incomuns e permitidos após a reforma de 2007. (Fonte: Milliman –
Paulo Hirai – fev/2009).
489
São entidades jurídicas, que efetuam o Seguro do Seguro para uma diluição do risco.
490
Relativamente aos provedores privados, com fins lucrativos, só eles que prestam serviços ambulatoriais. São
133.000 médicos dos quais 118.000 são provedores autorizados no sistema oficial de Seguro Saúde. Metade destes
são clínicos gerais e metade especialistas. Há 17 associações médicas regionais que negociam contratos anuais para
cuidados ambulatoriais. Sabe-se que cada associação recebe um valor total, que é dividido em dois fundos – um para
clínicos gerais e outro para especialistas. Médicos individuais recebem pagamento baseado em uma fatura total de
serviços prestados e calculados de acordo com uma escala de valor relativo. A reforma de 2007 obriga a cobertura
universal, mas considera a cobertura anterior. Certas classes de cidadãos são seguradas por lei. Todos os segurados
têm acesso igual aos benefícios e os planos não podem recusar qualquer aplicação. Benefícios incluem cuidados
hospitalares e ambulatoriais, todos os remédios necessários, terapia de reabilitação e tratamento odontológico. Os
planos incluem a família, tal que , esposas desempregadas e filhos são também segurados sem custo adicional.
Acesso a seguro privado é limitado. Indivíduos que ganharam mais de US$60.000/ano, por três anos consecutivos ou
os auto-empregados podem sair do seguro social e adquirir seguro privado. Funcionários públicos são elegíveis a um
reembolso de 50% em seus custos de saúde se comprarem seguro privado para cobrir o restante, todavia, escolher
seguro privado pode ser desvantajoso. Os prêmios são baseados no risco de todos os membros da família e voltar
para o seguro social fica difícil. Os ideais de solidariedade mantiveram-se ilesos após a reforma alemã na saúde. Os
médicos são obrigados a tratar de todos. Se o indivíduo não for capaz de pagar seus prêmios, o sistema de seguridade
social cobrirá os pagamentos. Os prêmios de seguros privados estão limitados à contribuição média máxima no
sistema Social. Há problemas atuais no sistema alemão. A transição para a cobertura universal impõe alguns desafios
ao sistema. A Organization of Economic Cooperation and Development (OCDE) tem criticado o plano alemão por não
fazer o suficiente para aliviar os custos crescentes da saúde na Alemanha em detrimento da população. (Paulo Hirai –
palestra proferida em fev/2009 – Abramge).

201
Japão

A população do Japão está em torno de 128 milhões de pessoas e é considerada a


segunda economia do mundo. O gasto médio per capita, foi de US$ 2.358 em
2004/2005. A Lei de Seguro Saúde é antiguíssima – desde 1922 – definiu pela
primeira vez o seguro de saúde público para empregados do setor privado. A
cobertura, na época, era muito limitada em escopo e duração. Atualmente, o Japão
tem uma ampla cobertura de seguro saúde, com um sistema de entrega privado e
financiamento público.

O sistema japonês é bastante centralizado e favorece o papel do Governo Nacional


tanto na política da saúde quanto na sua administração. O Ministério da Saúde,
Trabalho e Bem Estar executa funções relacionadas à elaboração de políticas, coleta
de dados e monitoramento do “status” da saúde e do setor. Ainda assim, o Ministério
administra alguns dos fundos de seguro saúde e assume o controle de qualidade e
custo. Uma das funções mais importantes é regulamentar o sistema de financiamento
do seguro social.

O Ministério facilita as negociações do nível de reembolso. Um programa nacional de


reembolso fixo é um dos pontos centrais das medidas de contenção de custo no
Japão. Quase todos os serviços de saúde são pagos com a mesma taxa de honorários
por serviço, independentemente de quem presta ou onde são prestados. Certos
hospitais, na maioria de cuidados de longo prazo ou geriátricos, são reembolsados de
acordo com Tabela de Honorários e Grupo de Combinação Diagnóstico –
Procedimento – DRG – japonês.

O sistema japonês é de cobertura universal da saúde e seu financiamento é oferecido


em decorrência de combinações de fundos públicos e privados. O sistema consiste em
um tripé de seguros. O Seguro Saúde gerenciado pela Sociedade (SMHI) e
Associação de Mútua Ajuda (MAA), que cobrem empregados de grandes companhias
e do setor público, respectivamente. O Seguro Saúde Gerenciado pelo Governo, que é
o GMHI, cobre empregados de pequenas e médias empresas. Há ainda o Seguro
Saúde do Cidadão (CHI), que incluem os planos municipais que cobrem os auto-
empregados e aposentados. 491

Existe a co-participação e ela varia conforme a idade, renda e doença. Os prêmios


variam de 6 a 9,5% da renda mensal e as co-participações podem iniciar em 10% e
chegam até a 30%. Todas as pessoas, exceto as crianças, idosos e portadores de
doenças determinadas em lei – crônicas - tem 30% de participação.

491
Consumidor não tem escolha de plano. Prêmios variam com base na renda mesmo que as coberturas e reembolsos
sejam padrões. Somente os planos GMHI e CHI recebem subsídios do governo. Todos os planos, contudo, contribuem
para a diluição do risco dos idosos. As receitas são de Impostos, que é a fonte dos subsídios, há a co-participação de
pacientes, na média, em torno de 30%, os empregados contribuem no SMIHI e no MAA com cerca de entre 6% e 9%
da renda mensal e o empregador paga pelo menos 50% e o empregado paga o restante. No caso do GMHI, os
prêmios giram em torno de 8,6% do salário, sendo que 50% pagos pelo empregador e 50% pagos pelo empregado
havendo 14% de subsídio do governo e no caso dos não empregados, o CHI, há um prêmio municipal baseado na
renda, tamanho da família, ativos e há 50% de subsídio do governo. Em todos os casos há a diluição, já comentada,
de risco para os Idosos. (Fonte: Abramge – Milliman – Paulo Hirai – palestra / fev/09).

202
Os idosos com 70 anos ou mais de idade contribuem com 10% do que recebe.
Crianças de até 3 anos, pagam 20% e pacientes de custos excessivos tem um teto
para a co-participação. Não há variação nacional para pagamentos de procedimentos
e reembolsos. Eles são estabelecidos nacionalmente sem variação regional. O
governo define uma tabela de preço para os serviços e revê a cada 2 anos. Mais de
3.000 preços são revisados individualmente para controlar a utilização. Os honorários
de alta tecnologia ou serviços sobre-utilizados são reduzidos para desencorajar seu
uso, e tarifas para serviços necessários e subutilizados são aumentados.492

O sistema japonês de saúde é universal e não tem controles de entrada, como um


gatekeeper, por exemplo. Pacientes têm livres acessos a qualquer prestador e a
qualquer tempo. O sistema de reembolso padrão permite aos pacientes procurarem
hospitais e clínicas privadas mais convenientes ou que tenham mais confiança do
paciente. Financeiramente, contudo, o acesso é menos equitativo. Pacientes de menor
renda pagam uma maior porcentagem de sua renda com prêmios e co-participações,
mesmo com a assistência do governo. A natureza regressiva do sistema pode fazer a
assistência a medicamentos menos fácil na medida em que os custos sobem. 493

O envelhecimento da população está afetando a economia japonesa e em


conseqüência, todo o processo de saúde muito mais do que em outros países. Há
uma grande população idosa. Mais de um terço dos gastos com saúde vai para os
idosos. Os valores de co-participação já chegaram ao limite e não há como aumentar
mais do que 30% previsto em lei. Haverá mudanças em breve futuro.

Holanda

Relativamente à saúde, a Holanda iniciou um processo de mudanças recentemente e


que está sob a mira e o olhar contínuo de outros países, atualmente. A população está
em torno de 17 milhões de habitantes e a última lei sobre saúde é a Lei do Seguro
Saúde de 2006 e foi o último elo de uma reforma com base no mercado e que vem
desde o início dos anos de 1990.

O sistema Holandês é de pagador único. O governo fez uma série de reformas494 para
evoluir do sistema baseado no fornecimento para um sistema de competição
gerenciada. A Holanda é o primeiro país a implementar plenamente sua reforma e está

492
Quanto aos pagadores, nos remédios, por exemplo, os preços são revisados para refletir o preço médio ponderado
do mercado, o que criou uma espiral descendente de preços. As novas drogas são reembolsadas de acordo com sua
inovação e efetividade. Devido a padronização, os benefícios e taxas de reembolso são padronizadas no país,
seguradoras não competem por pacientes para qualquer dos benefícios considerados padrão. Os médicos são o
elemento chave no lado dos prestadores de serviço. Um terço deles trabalha em clínicas, onde 94% delas são
privadas. Os médicos, raramente, têm acesso a hospitais e tendem a focar o atendimento considerado primário. Dois
terços dos médicos trabalham em hospitais e recebem um salário fixo, não tendo assim incentivos para buscar
produtividade. Os donos de hospitais são na maioria, médicos. O Presidente de um hospital, por lei, deve ser médico.
A grande maioria dos hospitais – 80% - é privado - embora os de maior prestígio sejam públicos ou de universidades.
O reembolso com tabela fixa de honorários é o único método disponível. Cuidados que não fazem parte do histórico do
paciente ou não listados, são integralmente pagos pelos pacientes.
493
O Seguro Saúde é apenas uma parte do programa geral de seguro social no Japão. Pelo que se sabe há também
suporte para maternidade e aposentadoria e auxílio doença.
494
As reformas foram mais no sentido de mudanças nas formas de arrecadação.

203
sob observação pelos demais países, pois esse assunto é objeto de tensão no mundo
de hoje.495

As funções principais do Conselho de Seguro Saúde na Holanda, são as de controlar


o orçamento baseado em risco, alocando pagamentos equalizados por risco às
seguradoras. Dar atenção de cuidados para grupos especiais, implementando as
provisões e regulamentações para os cidadãos holandeses que vivem fora do país e
residentes que se recusam a participar do seguro saúde ou recusam pagar suas
contribuições. Todo o ajustamento do pacote de benefícios e o monitoramento é
obrigação também do Conselho de Saúde. A reforma de 2006 redefiniu a forma de
financiamento das despesas da saúde na Holanda.

O financiamento do novo sistema vem de duas fontes. Uma delas é a dos


empregados. Eles aportam metade das receitas direcionadas ao fundo de equalização
através de contribuição de 7,2% da renda ou 4,4% para auto-empregados ou idosos,
para os primeiros 31.200 Euros da renda anual – base 2008. Empregadores deduzem
as contribuições dos salários.496

Os adultos, todos, com algumas exceções, têm uma co-participação de 150 Euros por
ano, excluindo serviços de clínicos gerais e maternidade. Quem desejar assumir mais
riscos pode pagar prêmios menores, assumindo co-participações maiores limitadas a
640 Euros por ano. Para famílias de baixa renda, o Estado provê subsídios. Cerca de
dois terços das famílias recebem esse subsídio, que é disparado quando o prêmio
médio excede um percentual da renda, como exemplo, 4% para adultos solteiros. O
Estado também financia os prêmios para crianças, adolescentes e quase adultos até
os 18 anos.497

Em 2006, houve a privatização do seguro de saúde na Holanda. Todas as 14


seguradoras de saúde da Holanda são privadas. As seguradoras podem negociar
descontos com determinados prestadores e usar incentivos para encorajar pacientes a
procurar provedores preferenciais, pois, não são mais obrigadas a contratar com todos
os provedores.

Os níveis de cobertura do esquema de benefícios podem também ser ajustados. As


seguradoras podem oferecer também descontos de até 10%. Porém, não podem
495
O governo nacional trabalha em conjunto com um Conselho independente para alocar e distribuir recursos para a
saúde. O Ministro da Saúde, Bem Estar e Esportes supervisiona o esquema de seguro compulsório e os cidadãos
holandeses devem adquirir dois tipos de seguro saúde: o Seguro de acordo com a lei de saúde de 2006 e o Seguro
sob a lei “Exceptional Medical Expenses”. O Conselho de Seguro Saúde é responsável por assegurar que cada um dos
dois esquemas ofereça um pacote básico de cuidados e que os mesmos sejam acessíveis. O Conselho age de forma
independente como um órgão não governamental, embora o Ministério da Saúde aponte os três membros do Conselho
Executivo. Uma das tarefas básicas do Conselho é calcular e alocar os pagamentos às seguradoras com o fundo de
equalização de risco de 15 bilhões de Euros. Os pagamentos são ajustados ao risco e baseados na idade, sexo,
invalidez e estado sócio-econômico, bem como nos custos de grupos baseados em remédios, grupos de custo por
diagnóstico e auto-empregados.(Fonte: Abramge – palestra de fev/09).
496
Indivíduos adultos contribuem também com 45% dos custos do sistema na forma de prêmios médios por grupo
fixado de acordo com a região, que deu em média 1.100 Euros por ano em 2008. (Fonte: Abramge – palestra de
fev/09).
497
As Seguradoras privadas podem tanto receber fundos ou pagar ao fundo de equalização de risco. O Conselho de
Saúde aloca fundos às seguradoras com base em um mix de severidade, alocando mais fundos para os segurados de
maior risco. Se, todavia, as seguradoras têm um perfil de segurados de baixo risco, então devem pagar um valor de
equalização ao fundo. As seguradoras podem dar descontos a consumidores que gastam menos de 255 Euros por
ano, excluindo visitas a clínicos gerais. Em 2005, quase 4 milhões receberam um desconto. (Paulo Hirai – palestra na
Associação Brasileira de Medicina de Grupo – Abramge – 09).

204
ajustar os prêmios ao risco dos consumidores nem negar aceitação para a cobertura
básica. 498

Os médicos, principalmente aqueles que atuam como clínicos gerais, tiveram


expansão de sua atividade como controladores de acesso. Há um cadastro profícuo.
Cada consumidor deve se registrar a um único clínico geral para ter acesso aos
especialistas e para que o clínico coordene cuidados entre especialidades. Clínicos
gerais contratam diretamente com seguradoras, buscando crescentemente, cuidados
integrados. Essa integração com os planos de saúde busca controlar custos, com
formas de integração que vão desde ser parte de um centro clínico de atendimento
primário a participar de incentivos financeiros, tais como prescrever genéricos em
lugar de remédios de marca e mesmo participar do risco.

Mais de 90% dos hospitais são privados. Os públicos, em sua grande maioria, são
hospitais universitários de aprendizado. Um método de equalização de casos
substituiu valores do orçamento anterior. Houve adaptações após a reforma. Hospitais
podem agora definir preços e contratar seletivamente com seguradoras para serviços
categorizados como Combinações de Tratamentos Diagnosticados, que representam
em torno de 20% de toda a receita do hospital, isso em 2008. 499 Assegurar a
cobertura obrigatória é problemática. Cerca de 1,5% dos segurados não paga há seis
meses – (base fevereiro de 2009). 500

Os problemas relativos à seleção de risco, ou equalização de risco, é uma grande


preocupação na Holanda. Caso a fórmula de equalização de risco seja inadequada,
seguradoras tentarão selecionar somente os consumidores saudáveis, de baixo risco.
Finalmente, agora que o país tem uma estrutura institucional englobando tanto a
cobertura universal quanto a concorrência gerenciada, a Holanda deve desenvolver
redes de entrega integradas e de qualidade para atender as preferências dos
consumidores. Necessário será dar tempo ao tempo, pois os outros países estão
mirando seus olhares sobre essa reforma Holandesa na Saúde.

Visão no Brasil

O relatório do IBGE, Economia da Saúde – Uma perspectiva macroeconômica


2000/2005 apontou que o Brasil despende 8% do PIB com a rubrica saúde, cabendo

498
Os clínicos gerais provêm atendimento primário e atuam como “gatekeeper” – que é um controlador de acesso –
para especialistas e cuidados hospitalares. São pagos tanto com base em capitação e taxa por consulta. Especialistas
recebem um salário, uma taxa de serviço ou as duas. A maioria dos especialistas trabalha em hospitais e são auto-
empregados. (Fonte: Millimam Brasil – palestra proferida por Paulo Hirai – fev/09).
499
Ninguém, na Holanda, pode ter a cobertura negada. Para os que não podem pagar os prêmios, o governo oferece
um subsídio para ajudar a cobrir os custos. Para cobrir os benefícios excluídos do plano básico, como assistência
odontológica para adultos, óculos, medicina alternativa, cirurgias plásticas, 90% dos consumidores compram apólices
suplementares que não precisam ser compradas da mesma seguradora da cobertura básica, mas clientes em geral
compram uma combinação de pacotes. Para aumentar a concorrência entre seguradoras, pacientes podem mudar seu
plano a cada início de ano. É um sistema de portabilidade. O grande desafio da Holanda, após a implementação das
reformas em 2006 são os próximos anos para o futuro que se aproxima rápido. Controlar custos foi uma das maiores
razões da reforma. A Lei de 2006, espera reduzir os custos crescentes e mesmo reduzir os gastos com a saúde.
500
No caso de não pagamento, as seguradoras podem cancelar a apólice e recusar a cobertura nos próximos 5 anos,
porém, outras seguradoras devem ainda aceitar o inadimplente. O governo espera, com a reforma de 2006, combater a
inadimplência permitindo que prêmio sejam deduzidos diretamente dos salários e benefícios, da mesma forma que as
contribuições relacionadas a renda. A penalidade por disparar tal mecanismo consistirá no pagamento de um prêmio
maior que qualquer outro no mercado. (Paulo Hirai – palestra em fev/2009 – Abramge).

205
às famílias mais de 60% desse dispêndio, representando, em 2005, 8,2% de seus
gastos totais.

As despesas governamentais montaram a menos de 40% do total dos gastos com


saúde, contrapondo-se a valores oscilando entre 70-85% nas economias
desenvolvidas, exceto nos Estados Unidos (45%). Com relação aos demais países do
BRIC, os gastos brasileiros foram superiores aos da Índia (19%) e China (39%), porém
inferiores aos da Rússia (62%). 501

No Brasil, o tema saúde é particularmente delicado. Apesar de a Constituição


assegurar atendimento gratuito a todo cidadão, na prática a maioria da população tem
acesso, depois de muita espera, a um serviço que chega a desejar e muitas vezes
precário, todavia, comparativamente com alguns países houve grande evolução no
atendimento público. Uma das grandes preocupações é com o envelhecimento.

A situação tende a piorar – e muito – com as mudanças demográficas. A projeção é


que a proporção e pessoas com mais de 60 anos passe dos atuais 10% para 30% da
população até 2050. Serão 64 milhões de idosos, ante 19 milhões atuais. Trata-se de
um cenário complicado. Os gastos com idosos equivalem a seis vezes as despesas
com crianças no Brasil.

Diante desses dados, o único desfecho possível parece ser o colapso. O entanto,
estudiosos sustentam que é possível não só evitar a piora como também melhorar o
atendimento. “Teremos de aumentar um pouco mais os gastos, mas, sobretudo, gastar
com muito mais qualidade do que hoje”, afirma Carlos Alberto Suslik, coordenador do
curso de gestão em saúde da escola de negócios Insper. 502

Para muitos usuários, a alternativa de utilizar os planos privados não existe, já que
mesmo os mais baratos estão acima das possibilidades da maioria. Trata-se de um
mercado complexo, pois as empresas do setor são reguladas pela Agência Nacional
de Saúde Suplementar – ANS, que precisa mediar um conflito entre o paciente, que
quer todas as conquistas da medicina, o médico, que indica os procedimentos, e o
plano, que paga a conta do hospital e precisa zelar pelo equilíbrio financeiro.

Segundo as empresas do setor, seria possível cobrar menos pelos planos – e ampliar
o mercado – caso a ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, permitisse a
venda de opções menos abrangentes. A agência, por sua vez, alega que a saúde não
é uma mercadoria como as outras e que não é possível reduzir muito o rol de
procedimentos que podem constar nos planos.

501
Idem – Paulo Hirai – palestra na Abramge – fevereiro de 2009).
502
Na comparação internacional, o Brasil ainda gasta pouco. Em proporção do PIB, os investimentos com saúde
somam 7,5% pouco abaixo da média global de quase 9%. A diferença é maior em termos de valor absoluto – nosso
gasto per capita é inferior, por exemplo, ao de Chile, Rússia, África do Sul, México e Argentina. Há também enorme a
diferença entre o gasto público e o privado. Mais da metade dos 219 bilhões de reais desembolsados com a saúde no
Brasil em 2008 foi para pacientes do sistema privado, que atende apenas em torno de 40 milhões de pessoas. É como
se os pacientes dos planos privados ficassem com 1.428 reais por ano e os do Sistema Único de saúde com 675. Na
realidade, o valor destinado aos pacientes da rede publica é ainda menor. Embora ofereça um serviço básico sofrível, o
SUS é referência em muitos procedimentos complexos e caros, como transplantes. Por isso, nesses casos, os
hospitais públicos também são procurados por pacientes de convênios privados. É aí que o modelo se revela mais
perverso. Como não há recursos para todo mundo, quem chega antes consegue melhor atendimento. Normalmente, os
desassistidos são os que dependem de transporte público e têm mais dificuldade para negociar faltas no trabalho e
acabam no fim da fila. (Revista Exame, 18\11\2009).

206
O risco é exagerar na regulação e terminar por expulsar mais gente para o já
sobrecarregado SUS. Há, portanto, um difícil paradoxo nesse campo – quanto mais a
regulação favorecer as famílias em detrimento do plano, menos pessoas terão
condições de pagar por ele.

O gasto das famílias não é homogêneo; o gasto médio mensal com saúde da parcela
da população constituída pelos 10% mais ricos é de R$ 376,00 contra R$ 28,00 gastos
pelos 40% mais pobres, despesas mais de treze vezes superior e concentrada nos
planos de saúde, medicamentos e atenção odontológica. (Amorim, Perillo – 2008).

O país possui mais de 7.000 hospitais, refletindo tanto densidade de leitos como
utilização de cuidados hospitalares em níveis superiores aos verificados em
economias de renda média semelhantes, mesmo possuindo uma população mais
jovem, relativamente aos demais países do BRIC, com perfil epidemiológico que não
depende tanto do emprego intensivo de hospitalização. Como explicar então que a
maior parcela dos gastos estatais com saúde destine-se aos hospitais? Antecipando
parte da resposta, sabemos que a porta do pronto-socorro tornou-se via de acesso
aos cuidados de saúde. (Amorim, Perillo – 2008).

A cobrança do Estado irá para os planos de saúde

Uma medida entrará em vigor em 30 dias, a partir de 12 de julho de 2011, no Estado


de São Paulo, onde o governo estadual informa que pacientes de planos particulares
não serão privilegiados no atendimento à saúde. Os hospitais estaduais paulistas
gerenciados por OSs (Organizações sociais) passarão a cobrar diretamente dos
planos de saúde o atendimento feito a seus conveniados.

Esses hospitais, porém, não poderão reservar leitos ou dar tratamento diferenciado a
pacientes particulares. É o que diz o decreto do governador Geraldo Alckmin publicado
no “Diário Oficial” do Estado, que regulamenta lei que permite a oferta de até 25% dos
seus atendimentos a doentes particulares. 503

O governo deve publicar ainda uma resolução em que identificará as unidades de


saúde que poderão firmar contratos com os convênios. A Lei passará a vigorar em 30
dias. Levantamento da Secretaria Estadual da Saúde aponta que um em cada cinco
pacientes atendidos em hospitais estaduais na capital paulista têm algum tipo de
convênio ou plano de saúde, mas quem paga essa conta, avaliada em R$ 468 milhões
anuais é o SUS. Um exemplo disso é o Instituto do Câncer do Estado Octávio Frias de
Oliveira. Hoje, 18% dos pacientes atendidos no hospital têm planos de saúde, que
nada pagam. 504

Há uma legislação federal que já permite o ressarcimento ao SUS. Todavia, o governo


estadual alega que a lei entrou em vigor antes de um modelo de OSs ser implantado,
o que inviabiliza a sua aplicação nessas unidades. Há contestações. Por exemplo, a
advogada Lenir Santos do Instituto de Direito Sanitário Aplicado, diz que hospitais

503
- Folha de São Paulo – 12 de julho de 2011 – C1 – Reportagem de Cláudia Collucci e Talita Bedinelli
504
- Idem

207
administrados pelas OSs continuam sendo SUS. A lei federal poderia estar sendo
usada em São Paulo para esse ressarcimento.

Segundo ela, os planos de saúde poderão contestar na Justiça a constitucionalidade


da nova lei porque só uma legislação federal pode agir sobre os seguros-saúde. Há
quem diga que estão abrindo dupla porta de entrada nos atendimentos. Para o
promotor da área de saúde Arthur Pinto Filho, o decreto que regulamenta a cobrança
dos planos de saúde contraria a regra do SUS que determina que o atendimento
público de saúde deva ser igualitário para todos. A cobrança, segundo ele, criará nos
hospitais públicos uma “dupla porta” onde pacientes de convênios terão atendimento
mais rápido. Isso viola a lógica do SUS. São Paulo não pode ter um SUS diferente do
resto do Brasil. Estão entregando patrimônio público às Operadoras de Saúde. Já
houve manifestação de cerca de 50 entidades de saúde e de defesa do consumidor.

A maior mudança que alterou o rumo do funcionamento de planos de saúde no Brasil


ocorreu em 1998, com a entrada em vigor da lei 9656. Empresas de medicina de
grupo e seguradoras tiveram de se adequar as novas medidas elaboradas à luz do
Código de Defesa do Consumidor já em vigor desde 11 de setembro de 1990 – lei
8078. Planos mais completos, sem exclusões, com a obrigatoriedade de atender a
todas as necessidades do paciente passaram a ser incorporados pelas operadoras
que não tiveram escolha.

O direito do consumidor no estrangeiro

É expressivo o desenvolvimento do direito do consumidor relativamente aos planos de


saúde e outros serviços, considerados como relação de consumo, no último século e
nos primeiros anos deste. Alguns países já deram tratamento sistematizado ao tema
com a edição de Códigos consolidando o entendimento vigente, outros optaram por
leis tópicas. Assim é que, ao fazer um breve apanhado do universo legislativo no
estrangeiro, pode-se destacar a evolução do tema no ordenamento jurídico dos
seguintes países.

Os Estados Unidos foram os pioneiros na difusão do movimento consumerista em todo


o mundo. Não há um conceito geral e uniforme sobre a figura jurídica do consumidor,
uma vez que o sistema norte-americano baseia-se nos leadings cases e statutues
sobre o tema. As normas sobre a proteção do consumidor estão previstas de forma
esparsa, de acordo com a abrangência da Lei específica e a constituição. 505

A Suécia se destaca por ter sido a pioneira ao criar a figura do Ombudsman e o


Juizado de Consumo, em 1971, no que foi seguida pela Noruega em 1972, Dinamarca
em 1974 e Finlândia em 1978. Todos têm textos legais sobre consumidores.506

505
Gregori, Maria Stella, 403 – Idem, 404, Idem, até 411

208
Na França, desde a edição do Código Civil de 1806, legisla-se sobre temas
relacionados com a defesa do consumidor, mas, somente a partir dos anos 70 é que
começam a surgir leis esparsas para proteger os consumidores. A mais conhecida foi
a Lei Royer de 1973, que dispunha sobre a proteção aos pequenos comerciantes
contra os grandes e também sobre a proteção aos consumidores por meio da
regulamentação de publicidade enganosa e a legitimidade processual conferida às
associações de consumidores no exercício da ação civil. Foi também aprovada a Lei
78-23, de 10.01.1978, que especificamente tratava da proteção contratual do
consumidor contra cláusulas abusivas, inseridos em contratos entre profissionais e
não profissionais – consumidores. A partir de 1993, o legislador francês optou por
consolidar as leis existentes criando o Code de La Consommation, Lei 93-949, de
16.08.1993.507

Na Alemanha, a antiga Lei, AGB-Gesetz, de 09.12.1976, dispunha sobre as condições


gerais dos contratos. Alcançava não só a regulamentação das negociações entre
consumidores e grandes empresas.

Em Portugal, a Constituição Portuguesa, de 1976, revista em 1982, consagra o direito


do consumidor. Foi aprovada a Lei 29, de 22.08.1981, alterada pela Lei 24, de
31.07.1996, que dispõe sobre a defesa dos consumidores. 508

Na Espanha, a Constituição espanhola, de 1978, consagrou o direito do consumidor e


em 1984, foi aprovada a Lei 26, de 19.07.1984, Ley General para La Defensa de los
Consumidores Y Usuários, para proteger os consumidores. 509

No México, foi aprovada a Ley Federal Del Protección al Consumidor, de 05.02.1976,


que define consumidor como quem contrata para sua utilização a aquisição, usos ou
desfrute de bens ou a prestação de serviço.510

Na Argentina, foi aprovada a Lei. 24.240 de 22.09.1993, Ley de Defensa Del


Consumidor, modificada em 1998, pelas Leis 24.568 e 24.999, de 01 de 07 de 1998,
que tratam da proteção jurídica do consumidor. Quando da aprovação desta Lei não
havia na Constituição Argentina nenhuma previsão sobre a defesa do consumidor, que
somente passou a ser tratada na Constituição de 1994.511

O Chile não trata da proteção dos consumidores em sua Constituição, mas tem uma
lei específica que é a Ley Del Consumidor, de número 19.496, de 07.03.1997. 512

209
No Paraguai, a Constituição trata do tema da proteção dos consumidores e foi
aprovada a Lei 1.334/1998, que define consumidor como toda pessoa física ou jurídica
nacional ou estrangeira que adquira, utilize ou desfrute como destinatário final bens ou
serviços de qualquer natureza.513

No Uruguai, foi editada a Lei de Relaciones de Consumo, Lei 17.189, de 07.09.1999,


que trata da proteção do consumidor. 514

210
Considerações finais

As propostas

Compartilhamento entre o Público e o Privado

Outras óticas para mudar e para melhorar algumas estratégias da prestação de


serviços na saúde privada só serão possíveis desde que haja uma reestruturação
entre o público e o privado, de forma compartilhada, o que poderá proporcionar melhor
atendimento e dignidade de trabalho a milhares de médicos, profissionais do ramo e
usuários. Um dos vetores dessas mudanças está concentrado nas pequenas, micro e
médias empresas - PMEs, onde há um grande potencial a ser explorado.

A estrutura existente da saúde privada tem forte espaço para atender a um percentual
muito grande da população que continua utilizando os serviços estatais e que poderá
ser atendida pelos operadores privados. Segundo Almeida (2011), presidente da
Abramge – Associação Brasileira das Empresas de Medicina de Grupo, Dr. Arlindo
Almeida:

“O Brasil tem grande chance de ter metade da população na saúde pública e metade
na iniciativa privada” 515.

É necessário que haja uma política, das entidades privadas, conforme recomenda a
Cartilha da Abramge e da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar (2008)
516
para se conhecer o perfil epidemiológico dessa grande quantidade de pessoas de
planos e de seguros saúde, seus custos e principalmente, que elas desenvolvam
programas voltados à promoção da saúde, com ações mais preventivas do que
curativas. É muito melhor tanto para as entidades privadas quanto para os usuários,
que uma pessoa vá todos os meses fazer consultas/exames do que ser internada em
estado grave, após todos esses meses.

Serviços que podem ser prestados por essas empresas desde que haja abertura para
discussão de algumas premissas inovadoras, num papel distribuidor de funções e de
alterações das normas atuais para prever a transferência de algumas
responsabilidades, ou o que será chamado de compartilhamento entre o público e o
privado. Esses detalhamentos estão mais à frente nas proposições. A vacinação, por
exemplo, já foi oferecida aos governos – pela Abramge - com ajuda em toda a logística
de vacinação, mas os órgãos públicos envolvidos se negam a compartilhar ou aceitar
tais colaborações.517

Não ao compartilhamento só poderá piorar os objetivos da Saúde em geral, como


ocorreu no passado: a tendência à deterioração real dos valores pagos pelo INAMPS
a produtores privados – houve perda real de 50% no período 1977-83, tendência que
continuou na segunda metade da década. (Mendes, 1999). Em 1986, para uma
515
Informação constante da entrevista com o Presidente da Abramge em 15/03/2011.
516
Na realidade são várias cartilhas sendo a primeira de 2008 da ANS e outras da Associação Brasileira de Medicina
de Grupo (Abramge). Quanto à cartilha lançada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar, a mesma traz
orientação sobre a aplicação do Decreto 6523 – SAC – Sistema de Atendimento ao Cliente em 02/02/2008).
517
Edson Godoy – Presidente da Amil em entrevista concedida ao Jornal “O Globo” em 29/12/2010.

211
inflação de 65% ao ano, esses reajustes atingiram 20% e, em 1987, para uma inflação
de 416%, chegaram a, apenas, 30%. Ademais, os gastos do INAMPS com o setor
privado caíram em 50% em valores reais, no período de 1981-89, decrescendo de
2.379,6 bilhões de dólares em 1981 para 1.225,6 bilhões de dólares em 1989.
(Mendes, 1999).

O abandono, pelo INAMPS, da tabela própria e o uso do porcentual de 30% da tabela


da AMB para pagamento dos procedimentos médicos aumentaram as dificuldades do
setor privado. A portaria publicada pelo MPAS, em dezembro de 1986, tornando livre a
complementação de honorários e serviços, pelo uso de dependências especiais,
terminou por expulsar a classe média e os trabalhadores formais da medicina
previdenciária. (Mendes, 1999).

Outras propostas privatistas aconteceram. Temos como registro o Plano de


Atendimento à Saúde (PAS) da Prefeitura de São Paulo nos anos 90; as Fundações
privadas de apoio às instituições públicas, nesses casos, desde os anos 90 também,
podem ser citadas, e dentre elas, o Hospital das Clínicas de São Paulo. A proliferação
dessas Fundações tem levado à crescente privatização dos serviços por elas
intermediados, especialmente através de contratos com empresas de Medicina de
Grupo e de Seguros de Saúde.

Tais organizações, além de passarem a utilizar instalações e equipamentos públicos,


ocupam vagas e procedimentos antes destinados à população em geral, criando
discriminação com relação aos pacientes do SUS, porque os beneficiários dessas
organizações encontram menos filas e agendamento facilitado, o que também tem
ocorrido no setor filantrópico conveniado. Tais situações não são de todo sem solução:
devem ser realizados ajustamentos, porque afinal, a dinâmica da saúde sempre foi
observada de forma positiva.

Na Saúde Pública ainda há situações sui-generis que permanecem. Elas escapam


totalmente do previsto na Constituição de 1988 para o SUS e para as empresas
privadas. Um dos exemplos é o caso do IAMSPE – Instituto Assistência Médica de
Servidores Públicos do Estado de São Paulo, voltado apenas para os servidores
estaduais e seus dependentes. E há outros Institutos que permanecem e insistem em
desenvolver seu próprio sistema, como os funcionários do Piauí e de Goiás, sem
citarmos os Hospitais das Forças Armadas.

A integração entre Estado e empresas privadas, sob forma de compartilhamento,


ícone atualíssimo do papel social das corporações, vem quebrar um antigo paradigma,
de que a saúde da população é problema só do governo. Na década de 80 esta
questão já era observada, mas houve resistência dos sanitaristas. 518 Tal assunto
constituiu um dos principais temas do Congresso da ALAMI – Associação Latino
Americana de Sistemas Privados de Saúde, realizado em 12 e 13 de Maio de 2005 em
Cartagena – Colômbia: “Integração - público privada - na cobertura da atenção à
saúde”, ao lado de outros como “Legislação e regulação dos sistemas de assistência à

518
Palavras do Presidente da Abramge – Dr. Arlindo Almeida em entrevista concedida a qual faz parte deste trabalho
em anexo.

212
saúde”, “O avanço tecnológico da medicina” , “Política de fornecimento de
medicamentos à população” e “Demandas judiciais”. Rubo519(Abramge), nesse
Congresso, confirmou que estava havendo uma grande evasão dos planos
particulares.

Nas empresas de medicina de grupo, os beneficiários de planos empresariais


recuaram de 14,3 milhões, em 2000, para 12,1 milhões, em 2002. Os planos
individuais e familiares, que em 2000 atingiam um marco de 4,1 milhões, aumentaram
em 100 mil, em 2002, recuando a seguir, em 2002, para os mesmos 4,1 milhões.520

Casos de compartilhamento entre o setor público e o privado, serão saídas


estratégicas para muitas situações no futuro, principalmente na saúde, uma vez que o
Estado no setor de saúde cresceu muito, está lento e sempre com dificuldades
financeiras ou operacionais. O compartilhamento pode resultar positivamente numa
situação de crise do Estado, em questões que envolvem o bem-estar social, muitas
das vezes com grandes prejuízos para ele mesmo.

Entender o que se passa com a saúde no Brasil envolvendo as empresas operadoras


privadas de assistência médica, governo, hospitais, clínicas, SUS, órgãos reguladores,
significa um desafio do qual o Brasil não pode escapar. Nessa área, além do plano
pessoal, aqui tematizado, há a questão da cidadania, uma vez que a nossa
Constituição considera a saúde como estatuto do direito universal, na forma do artigo
196 que diz:

“A saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais


e econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros agravos e ao
acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação”.

Nesse texto, de obrigações e interesses, está inserido o objetivo principal: garantir a


saúde da população brasileira. E, embora apenas o Estado seja citado, observa-se de
forma indireta a participação do setor privado com um grande volume de recursos e de
riscos envolvidos. 521

519
Informação no artigo de Reunião preparatória da Alami - Associação Latino Americana de Sistemas Privados de
Saúde. Revista Medicina Social - 188 - pág. 29.
520
Estes números podem ser encontrados no site: www.abramge.com.br/download/assessoria.htm - em informe de
imprensa.
521
Esse modelo, bastante útil para mostrar as interações entre um sistema público e um privado de saúde numa
economia, apresenta algumas limitações analíticas para o caso brasileiro, que devem ser consideradas. No que se
refere às similaridades, pode-se dizer que no Brasil coexiste um sistema público e um privado de saúde, ambos de
tamanho significativo. O primeiro se caracteriza pela existência de um tempo de espera positivo para a obtenção de
tratamentos, dada a sua pequena capacidade de produção e a garantia de acesso universal a todos os agentes da
economia. Entretanto, o tempo de espera positivo para a obtenção do tratamento público não é ótimo para todos os
tipos de tratamentos de saúde no Brasil. Pois o sistema privado de saúde, através de planos de saúde, gera um
esquema em que - para alguns tratamentos de alta complexidade – os agentes mais ricos acabam tendo melhores
condições de acesso aos bens públicos de saúde que os menos abastados, sem que isso se reverta para uma redução
de custos para o setor público, inclusive piorando a situação dos agentes com menor propensão a pagar pelos bens
privados de saúde. A explicação para esse fenômeno é descrita a seguir. Os indivíduos com maiores rendas e,
portanto, com maiores propensões a consumir o tratamento privado, compram seguros de saúde do setor privado8.
Quando ocorre a eventualidade de uma doença ou mal, tais indivíduos são atendidos pela rede privada de serviços de
cuidados médicos. Todavia, essa rede possui escassez de capacidade produtiva especificamente de cuidados médicos
de alta complexidade. A sustentação desta hipótese se dá pela existência de grandes instituições de excelência neste
tipo de tratamento, tais como INCOR, Santas Casas e Hospitais Universitários, que ou são públicas ou são financiadas
pelo setor público. Além disso, por tradição, no Brasil, apenas o setor público financia pesquisas em quantidade
significativa, capazes de gerar conhecimentos de fronteira sobre os assuntos de medicina, principalmente na forma de

213
Rigorosamente, se o princípio constitucional fosse cumprido pelo Estado, os planos e
seguros de saúde não existiriam. Deve-se rememorar também que a Carta Magna
estabelece o sistema de custeio, mantido por impostos e contribuições tanto dos
trabalhadores como dos empresários. O Estado, portanto, não consegue dar a
assistência necessária à saúde da população, obrigando-o a recorrer à iniciativa
privada. A situação não é tão ruim quanto parece.

“...foi um grande avanço. Saímos das páginas policiais para entrar nas páginas
destinadas a assuntos econômicos... “ 522

Como se vê, as entidades privadas já participam do sistema. Em muitas regiões elas


são contratadas do SUS e no Sudeste e Centro Oeste há uma grande integração com
o setor suplementar como, por exemplo, as Santas Casas de Misericórdia e inúmeros
outros hospitais.

Quanto aos meios para se conseguir tal objetivo, necessário será definir a participação
proporcional de cada um dos operadores, as tabelas a serem utilizadas, a forma
contábil de movimentação dos recursos, os prazos de recebimento, a área geográfica
de abrangência, a criação de um programa de esclarecimento às empresas,
funcionários e a população em geral através da mídia.

Será necessário, também, esclarecer a sociedade acerca da disponibilidade desses


novos serviços, projetar os orçamentos financeiros, criar o órgão centralizador dos
recursos a serem repassados, estabelecer tabelas para pagamento dos
procedimentos médicos e hospitalares de alta complexidade e iniciar a operação
começando pelo capitation de forma gradual e modesta.

Atualmente, funcionam em torno de 1.400 operadoras de saúde em todo o País,


empresas particulares e outras que, naturalmente, serão criadas - com certeza
pequenas - ao longo do tempo, pulverizando toda essa massa de consultas, exames,
internações para milhões de pessoas, com atendimento particular, digno e de forma
estratificada, sob as vistas do governo. Com certeza, haverá mais eficiência e
economia para os governos, federal, estadual e municipal.

Alguns dos números das operadoras precisam ser analisados. Hoje, pouco mais de
25% da população brasileira ou 45 milhões de pessoas – aproximadamente - têm
planos de saúde. A ANS informa que 34% delas tiveram prejuízo em 2003, 28%
tiveram rentabilidade patrimonial negativa e 38% faturaram menos em 2003 em
comparação com 2002.523

O Brasil tem, atualmente, mais de 190 milhões de habitantes, ou seja, se retirarmos os

capital humano. (Fonte: Artigo: Análise econômica da interação entre saúde pública e privada no Brasil: tratamentos de
alta complexidade ). Autor01: Profa. Dra. Marislei Nishijima (FEA-USP) / Autor02: Prof. Dr. Geraldo Biasoto Junior (IE-
Unicamp) / Autor03: Profa. Dra. Denise Cavallini Cyrillo (FEA-USP) – (acessado em 07/07/2011)).

522
Revista Medicina Social - jul/ago/set/2003 - Antonio Jorge Gualter Kropt - Diretor técnico da AMIL - pág. 03 e Revista
número 182.
523
Site de informações estatísticas da ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar.

214
45 milhões já descritos sobra uma população que depende dos serviços públicos de
saúde (SUS) de 145 milhões. Desses, uma parte, empregados de pequenas, micro e
médias empresas com carteiras profissionais assinadas poderão ser atendidos nas
formas apresentadas nesse estudo pelas quase 1400 operadoras existentes e mais
aquelas que poderão ser criadas, dentro de critérios a serem regulados pela ANS e
sempre com participação orçamentária do SUS nos casos de doenças de alta
complexidade, ou seja, tudo muito bem controlado.

As ações para solucionar os problemas nos serviços de saúde privado eram urgentes
e as pressões para prevenção e promoção de saúde até 1999, eram questões de
sobrevivência do setor. As soluções para o setor privado deveriam resultar das
medidas normativas da ANS, fundamentadas em pesquisas efetuadas e reuniões com
os agentes operadores.

Este trabalho observa, de fato, que após 12 anos de operações, o sistema privado de
saúde continua acessível apenas às classes de maior renda, que podem, mesmo com
dificuldades, adquirir planos de saúde; todavia, aqueles que não têm condições
mínimas de possuir um plano - a grande massa - inclusive da classe média,
atualmente empobrecida, estão diariamente nas filas do SUS.

Por isso, é preciso mudar, via ANS, inicialmente, não de forma compulsória, todavia
flexibilizando outros aspectos como: fiscais e normativos, que possam ser vantajosos
e interessantes para as operadoras, como o compartilhamento entre o público e o
privado. As operadoras precisam analisar mais profundamente qual é o perfil
epidemiológico da suas clientelas e com isso tomar providências nesse sentido.
Observa-se, então, que uma estrutura para atender o público e o privado já existe e
funciona, bastando, apenas, adequá-la e adaptá-la para o que se deseja. É neste
sentido que a alta complexidade é o ponto que pode aproximar mais ainda a Saúde
Pública e a Saúde privada. O que se propõe não é uma descentralização de serviços,
mas um compartilhamento efetivo.

Sobre esse assunto Cordeiro, (2011), diz que:

“Há três décadas, quando se hasteou as bandeiras da Reforma Sanitária, existia uma
condição bastante adversa durante a Ditadura Militar, com muitas lutas a serem
travadas. Os princípios de que a Saúde é um direito de todos e um dever do Estado
apontaram para a universalidade da atenção e para a equidade: o direito de todos a
tudo que o avanço do conhecimento e da terapêutica pode oferecer e a Constituição
Federal de 1988 definiu que para assegurar esses direitos, o Estado deve garantir a
atenção e o setor privado participar como complementar. Atualmente, em uma
conjuntura politicamente mais favorável, quais deveriam ser as bandeiras da saúde?

Hoje, a bandeira central vai além do acesso aos serviços: exige-se qualidade no
cuidado em saúde, o que envolve também decisões em relação à educação
permanente, à educação continuada e à remuneração dos profissionais de saúde.

Não é só uma questão simbólica, é uma questão material. As bandeiras da saúde


deveriam direcionar-se para a qualidade de saúde e pela construção de um sistema

215
brasileiro voltado para a qualidade do cuidado. Um sistema em que o público e o
privado se articulassem, com uma convivência entre o setor dos planos de saúde
privados e o setor público de uma forma mais inteligente, de forma complementar e
não ao contrário. Não o público complementando o privado, mas uma
complementaridade mútua entre os dois setores. Isso depende de se assumir um
consenso na sociedade, especialmente entre os profissionais de saúde, para que se
discutam de novo as propostas de saúde a partir da ótica da igualdade.” 524 (Cordeiro,
2011).

Se a alta complexidade é o grande desafio para o desenvolvimento e o crescimento da


saúde suplementar em vista do fator custo, embora seja um direito de todos que dela
necessitem, vamos eliminá-la, de forma parcial ou total dos custos das operadoras
atualmente existentes, principalmente das pequenas e médias, conforme
detalhamentos à frente.

Muito pode ser estudado e compartilhado. É o caso das OPME’s. 525 enfatiza um
membro da MMS - Saúde, Frederico Magalhães (2011). Almeida, presidente da
ABRAMGE, na entrevista para esta tese (2011), referindo-se a um curso de
atualização sobre OPME’s, ocorrido em julho de 2011 em São Paulo, Capital,
observou que no Brasil as Próteses, Órteses e Materiais Especiais estão com os
preços absurdamente altos, comparativamente com os levantamentos efetuados no
exterior. Necessário também que a ANVISA dê seus pareceres sobre a questão e dê
atenção a esse assunto também. Tudo isso em questão, são formas de
compartilhamento. Não se trata apenas de saúde pública ou privada, é necessário que
a qualidade dos equipamentos e materiais necessários à saúde tenham convergência
comum e respeitosa. Quem ganha com isso é a população. Explicitamos abaixo nossa
proposta.

O Compartilhamento na alta complexidade

O Ministério da Saúde deve reembolsar às operadoras quanto ao Rol de


procedimentos de alta complexidade, exigindo em contrapartida soluções na criação
de apólices de planos coletivos para atender à saúde dos trabalhadores das micros,
pequenas e médias empresas. Há ainda milhares de pequenas e médias empresas

524
Entrevista com Hésio Cordeiro - Revista Radis – número 102 – pág. 20/21 – fev/2011.

525
Órteses, Próteses e Materiais Especiais – OPME - Com cerca de R$ 8 bilhões gastos por ano em volume de
equipamentos, órteses e próteses, o Brasil tem se preocupado cada vez mais com o uso do material cirúrgico especial
(OPMEs). As informações da Associação Brasileira de Importadores e Distribuidores de Implantes vêm de frente com a
preocupação à liberação do produto solicitado, sem qualquer tipo de avaliação quanto à necessidade e qualidade.
“Cada caso pede um material cirúrgico específico. Muitas vezes, uma técnica não condiz com o produto solicitado. As
compras desestruturadas e sem a homologação de especialistas para o procedimento prescrito geram aumento de
custos em sinistros e perda da qualidade necessária para o melhor tratamento do paciente”, enfatiza um membro da
MMS Saúde, Frederico Magalhães. De acordo com ele, os altos custos refletem a falta de controle na aquisição desses
produtos. Além disso, a má indicação gera transtornos para os pacientes. “Muitas vezes, mesmo os materiais
registrados pela Avisa têm qualidade duvidosa, por isso o melhor a fazer é buscar por materiais que tenham indicação,
e essa busca tem que fazer parte do procedimento a ser realizado. São materiais de alto custo e tem que ter
racionalidade para se fazer o uso deles. A saúde não tem preço, mas tem custo! Está todo mundo preocupado e por
isso devemos racionalizar o uso e o valor desses materiais cirúrgicos”. (Fonte:
http://saudeweb.com.br/12156/instituicoes-de-saude-alertam-para-regulacao-dos-opmes/ (acessado em 07/07/2011).

216
que por serem pequenas não oferecem aos seus funcionários planos de saúde.
Nesses casos o compartilhamento para a alta complexidade seria um grande avanço
para as PME’s.

De certa forma, a alta complexidade já é atendida pelo setor público mas, pode ser
compartilhada com o setor privado. O que se observa e também atrapalha a visão
mais holística do problema é que muito se critica o papel da iniciativa privada, ainda
que seja complementar na saúde, como sendo um grande problema. Hésio Cordeiro,
por exemplo, comenta:

“Muitas vezes, essa saúde dita suplementar se vale do serviço público para os
procedimentos de alta complexidade. No fundo, o serviço público de saúde é que
trabalha complementarmente à iniciativa privada, quando a concepção inicial é que a
iniciativa privada complementaria as ações do setor público. A gente vê o contrário em
transplantes renais, de fígado, de coração. Os pacientes preferem ser operados no
serviço público, que desenvolveu estes procedimentos de alta complexidade, do que
no setor privado, mais caro e nem sempre com a qualidade mais adequada. Houve
uma inversão. O que se chama de suplementar, na realidade, está se valendo do
serviço público, que acabou se tornando suplementar à iniciativa privada. E não o
inverso. “ 526

Verifica-se que, comentários à parte, os assuntos são discutíveis, dependendo do lado


em que se ouve e se analisa. Esse é um ajuste, se assim podemos dizer, de grandes
proporções, sendo que o objetivo não deve ser, apenas, fazer crescer o sistema de
saúde suplementar, mas alicerçá-lo para crescer consistentemente. Críticas por
críticas apenas não levam a nada. Crescer por crescer é a lógica da célula
cancerosa.527

Mas, afinal, o que são procedimentos de alta complexidade? Alguns exemplos são:
transplantes renais, de fígado, de coração e outros como, radioterapia, quimioterapia,
implante de marca-passo, revascularização do miocárdio, cateterismo cardíaco e
colocação de “stent”, hemodiálise, ressonância magnética. Há outros ainda como
transplante de córnea, Ortopedia - coluna, Ortopedia - ombro, Ortopedia - mão,
Ortopedia - quadril, Ortopedia - joelho, Ortopedia - tumor ósseo, Tratamento de Aids -
infantil, Videolaparoscopia, Neurocirurgia II, Gestação de alto risco, Central de
captação notificação e distribuição de órgãos, Hospital amigo da criança - UTI: Nível III
- Adulto, UTI-NeoNatal, UTI – materna-ambulatorial: - Centro de terapia renal, Centro
de oftalmologia e de tratamento da retinopatia diabética, Litrotripsia, Audiometria,
Hemodinâmica, Tomografia helicoidal.

Os procedimentos de alta complexidade são definidos na resolução da ANS na RDC-


68, de 08/05/2001, e na RN/82 e podem ser o ponto de concórdia que poderá
promover o crescimento da saúde suplementar, beneficiando também a saúde pública,
considerando-se as situações e exposições das questões até então e a possibilidade
de compartilhamento entre a saúde pública e a saúde suplementar na forma e

526
Hésio Cordeiro – Revista Radis – número 102 – pág. 18/19/20 – Entrevista em fev/2011.
527
Dowbor, 2004, p. 50.

217
aplicações expostas na sequência. Devem ser cobertos, também, exames,
medicamentos, anestésicos, oxigênio e transfusões referentes aos procedimentos
acima, desde que o tipo de plano ou o atendimento parcial temporário não exclua alta
complexidade.

Não há uma definição ampla e técnica sobre os procedimentos de alta complexidade;


todavia, no caso de ser premissa para discussão e implantação de algum tipo de
rotina, os mesmos são perfeitamente identificáveis e podem ser definidos sob
protocolo, conforme a RN/82, mencionada.

Deve-se ter sempre em mente a perspectiva de atingir a maior quantidade possível de


pessoas, que, a partir de um determinado momento, venham a ser participantes de um
plano de saúde para o titular e sua família, via micro, pequenas e médias empresas,
com desconto em folha. Em resumo, a idéia é recuperar os usuários perdidos,
desafogar o SUS e aumentar a base de novos adquirentes. Outra proposta poderia ser
o capitation estudado dentro das nossas necessidades brasileiras.

Outras propostas

O capitation

No geral, atualmente o procedimento médico é pago de forma individualizada, ou seja,


para cada procedimento, um valor é determinado. Existe, porém, outra forma de
administração financeira desse aspecto e a respectiva gestão dos procedimentos.
Trata-se do pagamento a hospitais – ou agente operador - por quantidade de usuários,
ou seja, de um contrato de trabalho que se ajusta em bloco e não a tabelas de
procedimentos. Por exemplo, o hospital receberia mensalmente R$ 100,00 por
beneficiário ou per capita. Se a operadora fosse detentora, naquela carteira, de 4.000
usuários, então o hospital – ou agente operador - receberia todo mês R$ 400.000,00,
e, com esse valor, arcaria com todos os riscos.

Atendendo ou não, o hospital sempre receberia o valor “per capita”. É, pois, um acordo
comercial entre a operadora e o hospital – ou agente operador - por pacote de
clientes. Os riscos nos casos de alta complexidade, portanto, ficariam para o hospital.
A esse tipo de negociação em saúde denominamos capitation, sistema que já vem
sendo muito utilizado na área odontológica. Para riscos gerais hospitalares o capitation
pode ser utilizado, todavia, onde ele é mais utilizado no Brasil é na Ortopedia,
Oftalmologia e outras especialidades conforme adiante descrito.

Tal proposição também poderia ser estendida a Associações de Autônomos, como


apenas uma extensão dos benefícios do capitation para grupos de associações, em
vez de atender apenas grupos de trabalhadores de micros, pequenas e médias
empresas - PMEs. O que existe na verdade, são os planos coletivos - por adesão ou
não - que não são formas de capitation.

O atendimento por parte dessas pequenas empresas e hospitais aos casos de alta
complexidade e o reembolso pelo governo desses procedimentos às operadoras e, se
for o caso, aos hospitais que queiram correr os riscos diretamente, pode permitir a

218
eliminação de um risco financeiro, proporcionando condições para que outras
empresas se formem num crescente e constante desenvolvimento para o setor de
saúde suplementar. Com isso, teríamos a redução de preços em vista da redução dos
riscos e futura concorrência entre as próprias operadoras.

Uma das formas para implantação desse reembolso da alta complexidade, do


governo, via Ministério do Trabalho e Previdência Social (MTPS), SUS e ANS, seria
através da classificação das operadoras por quantidade de usuários, região de
abrangência geográfica e tipo de rede de atendimento, se própria ou não, sendo que
os gigantes do setor poderiam participar sob condições específicas, pois o que é
fundamentalmente importante para a saúde privada é o desenvolvimento das
pequenas e médias operadoras do setor e não deixar o mercado na mão de
operadoras monopolistas. O reembolso somente existiria nos casos enquadrados
dentro das premissas propostas de compartilhamento adiante descritas, planos em
capitation, usuários que trabalham em PMEs e associações.

Torna-se necessário, portanto, encontrar novos caminhos para aumentar essa base de
pessoas que poderiam ter, mas não têm, um plano privado de assistência à saúde
tendo a empresa onde trabalham como instituidora. Esses procedimentos de ajustes
entre operadoras e a ANS, aqui denominados de compartilhamento entre o público e o
privado, são detalhados nos parágrafos seguintes. Ressalta-se, porém, que este
trabalho apenas introduz a discussão promovendo muitos debates sobre o assunto,
não tendo pretensões de materializar a solução.

Para tanto, há propostas, que envolverão empresas, governo e operadoras. Uma


delas é a aplicação do capitation para essas empresas e a ampliação desse benefício
para as associações em geral. O capitation é um compartilhamento de riscos. É um
pacote per capita que é oferecido de uma operadora para um hospital ou clínicas por
exemplo. Esse compartilhamento do risco com fatura cheia recebida todo mês,
independente dos custos de procedimentos médicos, como vimos, é denominado
capitation.528 No Brasil ele ainda é incipiente na área de saúde, todavia, é muito
utilizado na odontologia.

As healthcare529 americanas estão continuamente procurando sócios para


desenvolvimento de capitation para seus clientes. É claro que suas taxas atualmente
são muito discutidas nesse país, pois tal tipo de operação também está passando por
estágios de amadurecimento. Dessa forma, são previstos gatekeepers, promoções de

528
A saúde nos Estados Unidos movimenta anualmente cerca de US$1 trilhão. Boa parte deste imenso dinheiro é
empregado no health business e paga dividendos, reparte-se em ações bonificadas. Boa parte desta soma entra
também sob a forma de subscrições de novas ações, Procedimentos de saúde estão deixando de ser autorizados
porque interferem na lucratividade. No ano de 1997, os estados americanos passaram 182 leis sobre o managed care
para dar vazão às já volumosas e crescentes queixas dos usuários. Muitos planos HMO - Health maitenance
organization - pagam aos médicos uma taxa fixa por usuário independente da quantidade de tratamento que venha a
precisar. Geralmente nos planos de cuidados clínicos mais simples, o paciente é "cotado" a US$ 150 por ano. (artigo
de João Hélio Rocha é médico em Nova Friburgo, Caixa Postal 97267- RJ -cep 28601-CRMRJ 52-07205-7).
http://www.datasus.gov.br/cns/temas/tribuna/tribuna.htm - acessado em 10/11/2005.

529
Understanding Capitation - Patrick C. Alguire, MD, FACP. Director, Education on Career Development.
http://www.acponline.org/counseling/understandcapit.htm - acessado em dez/2005. Capitation is a fixed amount of
money per patient per unit of time paid in advance to the physician for the delivery of health care services.

219
prevenção à saúde, formas de reembolso, franquias e outras possibilidades de
controle dos custos comentadas neste trabalho. Nos Estados Unidos existem formas
de capitation até para clínicas de atendimento médico. Mas não é o que se recomenda
neste estudo, mesmo porque, os EUA - atualmente - não são nenhum exemplo de
boa saúde e boa medicina para a população em geral.

De fato, cada país tem sua cultura, tamanho, estrutura de saúde já desenvolvida ou
não. No caso brasileiro, é necessário fazer adaptações na formatação de um
capitation, 530 pois há um grande sistema de saúde público e um sistema de saúde
suplementar e este pode novamente entrar em ascensão, se ousar e partir para
inovações e caminhos alternativos empresariais na saúde.531

Nos EUA trata-se de um contrato de risco. Se no período – por exemplo - o usuário


estiver sempre sadio, o médico recebe integralmente os US$ 150. Mas, se adoecer, o
médico ou o hospital deverá arcar com as despesas e poderá ter prejuízo. O sistema
denomina-se capitation. Como os americanos são saudáveis e bem nutridos - tirando
atualmente a obesidade - a maioria dos médicos não tem prejuízo. Mas o usuário
corre o risco de ter menor assistência porque quanto mais o paciente consome, menos
o médico ganha, e o sentido do lucro pode passar a presidir as relações
médico/paciente. 532

Não é o que se propõe como capitation brasileiro. Os benefícios que a assistência


médica traz a seus funcionários através dos planos empresariais, é muito grande. É
um dos aspectos mais valorizados pelos trabalhadores de qualquer nível hierárquico
de uma empresa. Não importa se ela é grande, pequena, média ou micro.

As grandes empresas já contam com tais benefícios, mas de forma diferente daquela
proposta aqui, que vai mais ao encontro das PME’s. E elas são milhões. Segundo uma
pesquisa da consultoria de recursos humanos, Towers Perrin, 100% das companhias
de médio e grande porte instaladas no Brasil já oferecem a seus funcionários o
benefício de assistência médica. O custo para a empresa na folha de pagamento varia
de 6% a 8% em média. São despesas inevitáveis533 para as grandes empresas.

As premissas básicas para implantação do capitation complementando outras


propostas deste trabalho são as seguintes:

a) Só podem participar desse sistema: micros e pequenas empresas.534 O objetivo é


as operadoras montarem apólices de capitation empresariais - coletivas - para

531
Mais informações do capitation nos EUA: - A collection of articles from Managed care magazine.
http://www.managedcaremag.com/capitation.html - acessado em 22/12/2005.
532
O usuário, um ser humano, começa a ser tratado como uma commodity da Bolsa de Cereais de Chicago.
533
Revista Exame / 1.° de outubro de 2003 - pág. 98 a 100.
534
O critério escolhido para a classificação do porte de empresas utiliza o número de empregados, conforme conceito
adotado pelo SEBRAE: considera-se como microempresa aquela com até 19 empregados na indústria e até 9 no
comércio e no setor de serviços as pequenas empresas são as que possuem, na indústria, de 20 a 99 empregados e,
no comércio e serviços, de 10 a 49 empregados: as médias empresas de 100 a 499 empregados na indústria e de 50 a
99 no comércio e serviços.

220
oferecê-las aos trabalhadores das PMEs, que são aquelas empresas que têm maior
dificuldade de fornecer assistência médica a seus empregados. As médias empresas
deverão ter seus limites na quantidade de empregados, que sugerimos sejam
classificados conforme os parâmetros do Sebrae - Serviço Brasileiro de Apoio às Micro
e Pequenas Empresas. Essa determinação ficaria a cargo da ANS – Agência Nacional
de Saúde Suplementar.

b) O SUS deve reembolsar às operadoras - que desenvolverem apólices de capitation


- os custos com tratamentos de doenças consideradas de alta complexidade. Se esse
reembolso ocorrer devidamente, ou seja, de acordo com as tabelas da Associação
Médica Brasileira - AMB, Tunep535 ou outras a serem consensualmente definidas, os
agentes dos setores privados poderiam atender mais alguns milhões de beneficiários,
além de propiciar o crescimento e/ou surgimento de milhares de novas empresas
operadoras de assistência médica no mercado. Esse é o compartilhamento entre o
público e o privado que complementa o capitation neste trabalho e procura colocá-lo
como uma alternativa para o futuro da saúde no Brasil. Embora o nome seja o mesmo
adotado em outros países, o formato é diferente.

c) Negocia-se qual o valor per capita para certo número de usuários com o hospital. A
operadora recebe por cabeça e repassa ao hospital também per capita, retirando
apenas suas despesas administrativas, de vendas e margem de contribuição. São
pacotes formados para grandes grupos ou adesões à apólices de muitos funcionários
agregados. Os riscos são inteiramente do hospital que aceita o capitation, não são da
operadora. Como a alta complexidade, inviabiliza ou aumenta os riscos para o
Hospital, a operadora - somente em procedimentos de alta complexidade - recebe do
Ministério da Saúde e repassa ao Hospital.

d) Outro grande grupo que pode ser atendido é aquele que se refere a não
empregados, ou seja, aqueles que pertencem a alguma associação profissional e tem
seu trabalho como autônomo. Nesses casos, a associação é apenas instituidora do
plano coletivo por adesão e o processo de gestão é o mesmo do capitation. Exemplo:
Associação dos Carrinheiros de Santos. Assim, com essa proposta - capitation -,
atingiríamos àqueles que têm carteira assinada ou o empregado formal; e com a
segunda, através das Associações, aos seus associados, que não têm carteira
assinada por nenhum empregador. São associações de profissões de menor
expressão.

Wagner Barbosa (2004), empresário da atividade há muitos anos, comentava:

“Na medida em que começamos a imaginar parcerias, alianças, fusões, temos de


estar abertos para uma nova convivência”.536

e) É claro que uma das consequências decorrentes das propostas é que o


compartilhamento da alta complexidade viabilizará um grande número de operadoras
de saúde que não se desenvolvem ou não existem porque o risco da alta

535
Tabela Única Nacional de Equivalência de Procedimentos TUNEP, aprovada pela. Resolução - RDC nº 17 da ANS.
536
Artigo de Wagner Barbosa de Castro - Economista, técnico em saúde privada e coordenador da comissão
econômica da Abramge e do Sinange. Revista Medicina Social n.° 187 - out/nov/dez/2004 - pág. 05.

221
complexidade inviabiliza as operações sob o ponto de vista de riscos. Dessa forma, a
Saúde Privada não continuará na mão de poucos gigantes do setor, abrindo espaço
para outras pequenas empresas pelo Brasil afora.

f) O compartilhamento entre o público e o privado já é muito discutido no governo atual


para a resolução de vários assuntos. Na saúde, não deverá ser diferente, pois se
assim não for, a criação da ANS ficará sem sentido prático e social, já que ela
continuará, apenas, a regular a saúde das elites ou da parte socialmente mais
importante dos trabalhadores do mercado formal As implicações, no tecido social,
relativamente à assistência à saúde estão bem além do que conhecemos como
missão institucional. Há, de fato, incomensuráveis chances de corporações privadas
contribuírem, de forma proporcional aos seus tamanhos e de acordo com suas
possibilidades, na atividade de saúde dos brasileiros, tendo em vista a obrigação
social do empresariado brasileiro para o futuro do país, ícone que marcará o novo
século da visão corporativa.

g) A proposição do compartilhamento entre o público e o privado, inicialmente, poderá


ser aplicado, não de forma compulsória, mas por opção da operadora. Basta que
esteja regulado. Aquelas que optarem pelo compartilhamento, terão suas apólices, nos
planos de capitation, cobertas pelo Ministério da Saúde no caso de despesas de alta
complexidade, e com isto, seus riscos serão menores. Tal diminuição do risco
fatalmente trará ao mercado muitas outras empresas que operam no ramo de saúde.
Trata-se de uma troca de interesses em benefício da sociedade; ou seja,
gradualmente as apólices de capitation chegarão, via operadoras, às pequenas e
micro empresas que não têm condições de ter plano de saúde para seus poucos
empregados, atendendo, assim, de forma gradual, milhões de empresas e milhões de
pessoas ao longo dos próximos anos.

h) Complementando, uma empresa faz a parte comercial e recebe as contra-


prestações mensais totais e outra faz o recebimento da fatura parcial, controla seus
procedimentos e corre os riscos da utilização ou não do grupo. Não há caracterização
de pagamento de parte a parte para procedimentos isolados. É tudo como pacote, no
caso exemplificado de odontologia. Aparentemente é tudo muito simples. Atualmente,
há empresas que só administram planos de saúde e cobram por cabeça. São apenas
gestoras administrativas. Elas não são operadoras de serviços na saúde e nem
executam procedimentos médicos. Hospitais interessados no capitation poderiam
utilizar os serviços dessas empresas para administrar os contratos de adesão das
PMEs, conforme proposições. Nesses casos, com devido acordo de ambos os lados,
os procedimentos relativos a tratamentos de alta complexidade seriam pagos pelo
Ministério da Saúde, via SUS, às operadoras que desenvolveriam planos de capitation
na assistência à saúde. Até o ex-presidente da ANS sugere uma aproximação na
interface do SUS com o sistema privado.537 (Montone, 2001).

As respostas mais positivas referem-se a estrutura funcional do setor privado, que se


utilizada na forma proposta, desafogará o setor público trazendo-lhe economia e
velocidade e quem ganhará com isso será grande parte da população que antes não
537
Januário Montone - ex-presidente da ANS - Agência Nacional da Saúde Suplementar. (Site ANS). Série ANS -
número 2 - ISBN-85-334-0374-7 - 2001 - página 18.

222
poderia adquirir um plano de saúde, mas que, com o desenvolvimento do capitation
poderá ter seu plano, via empresa onde trabalha, com valores que poderão chegar a
R$ 50,00 para uma família de até quatro pessoas. Não é utopia.

j) Existem muitas operadoras que desejam crescer, têm estrutura, mas têm grande
receio dos riscos de alta complexidade. Se o governo cria condições para fortalecer e
até subsidiar Bancos e Montadoras de veículos, porque não compartilhar a capacidade
operacional e importante para a sociedade, da saúde complementar? O ramo de
saúde suplementar tem milhares de operadoras pequenas desejosas de crescimento,
enquanto muitas já desistiram. A implementação da proposta é urgente, antes que
elas se auto-extingam. Eram 2304 em 2002 e atualmente estão funcionando em torno
de não mais que 1400: houve uma queda em torno de 26%, aproximadamente.

É um percentual expressivo. O ex-presidente da ANS – Montone (2001) comentou


que:

“...O mercado de saúde suplementar tem uma alta taxa de concentração de grandes
operadoras. São mais de 1728 operadoras atuando no setor, mas neste quadro
verifica-se que apenas 45 delas são responsáveis por metade dos usuários e que 80%
destes são atendidos por apenas 231 operadoras.”.538

k) Os modelos de capitation para procedimentos do compartilhamento entre o público


e o privado não são complexos em sua formatação, desde que obedecidos alguns
critérios e premissas. É necessário que se abram portas para essas possibilidades sob
vários ângulos. A visão de passado permite essa análise e impõe, necessariamente,
algum tipo de renovação.

A partir da abertura do portal da ANS na Internet, "http://www.ans.gov.br",


constatamos que sua missão vem ao encontro, aparentemente, do que se conhece
como novas estratégias, inovações e competências:

“A ANS tem por finalidade institucional promover a defesa do interesse público na


assistência suplementar à saúde, regular as operadoras setoriais - inclusive quanto às
suas relações com prestadores e consumidores - e contribuir para o desenvolvimento
das ações de saúde no País.” 539

Essa é, portanto, a missão da ANS, propondo a defesa do interesse público, relação


com prestadores e usuários e contribuição para o desenvolvimento das ações de
saúde no país. Apesar de todas as mudanças nos últimos anos, a saúde privada já
está preparada para agir de forma independente, mas dentro da lei, fornecendo
elementos que possam vir a melhorar, de fato, todo o sistema de saúde suplementar
e, conseqüentemente, a pública, pois, afinal, o objetivo de ambas deve ser
convergente e cada vez mais, minimizar os problemas existentes no atendimento à
saúde.

538
Palestra de Januário Montone - Presidente da ANS - série ANS 2 - Jul/2001 - RJ.
539
Site ANS - www.ans.gov.br (Home Page).

223
O que se percebe, após todas essas possibilidades, análises de alternativas e
dificuldades é que nenhum país tem um sistema de saúde perfeito. O sistema de
pagador único permite a cobertura universal mais facilmente, mas gera problemas de
filas de espera e de falta de tratamento diferenciado de acordo com o desejo do
usuário. Países com sistema de pagador único estão buscando alternativas de
mercado para o controle dos custos. Por outro lado, os sistemas de saúde orientados
para o mercado provêm melhor resposta às necessidades distintas dos vários
consumidores, mas tem dificuldade em garantir cobertura a toda a população. Os
sistemas de saúde são complexos, amplos e mudanças devem ser sempre graduais e
muito bem estruturadas.540

A humanização nos serviços de saúde passa pela percepção, por parte de todos os
envolvidos na prestação desses serviços, de que o doente necessita sempre de
atenção e que pode existir alguma alteração que é mais ou menos importante no seu
fluxo de vida. Ele não é um objeto ou um produto de prateleira, que paga o valor
devido para ser bem atendido como ser humano, preferencialmente sem filas
intermináveis, data de exames muito distantes de suas necessidades para a sua
enfermidade.

Muito se tem falado e escrito sobre os sistemas de saúde, gerando contribuições e


ideias para mudanças nas estratégias de atendimento, de entrelaçamento ou
compartilhamento entre o público e o privado nos sistemas de saúde, e em especial,
no sistema brasileiro. Isso não era, ou não seria possível há 10 ou 20 anos atrás, por
exemplo. Atualmente, há um amadurecimento do próprio sistema suplementar e, por
que não dizer, do sistema público também. As dificuldades e vicissitudes da atividade
trouxeram luz ao problema. Desenha-se, com isso, possibilidades de se clarear mais
ainda o ambiente da saúde.

Nesse entrelaçamento, os medicamentos podem ser incluídos como complemento


dessa atenção à saúde, por exemplo. Como recomendações, ainda, é importante a
incorporação tecnológica na gestão da saúde para a melhoria da qualidade e
diminuição dos custos: a concorrência e economia de escala são importantes em
qualquer sistema e com adequados incentivos, a livre concorrência é uma boa forma
de controlar e reduzir custos.541

540
Em quase todos os sistemas de saúde de pagador único tem componentes de mercado e os orientados à mercado
tem componentes de pagador único. Interessante tal observação, pois os compartilhamentos existiram, existem e
continuarão existindo. O Público depende do privado e vice versa. Tanto os sistemas de pagador único quanto os
sistemas orientados ao mercado têm mostrado problemas que em princípio podem ser solucionados ou melhorados. O
sistema deve proporcionar a cada consumidor os cuidados que ele deseja e pode pagar. O sistema de saúde depende
das condições sócio-econômicas e dos usos e costumes da população, dos provedores de serviços, da capacidade
dos agentes – governos federal, estadual, municipal, seguradoras, hospitais, ONG’s, etc., de bem administrar a saúde.
(Paulo Hirai – palestra proferida em fev/09 – na Abramge – Associação Brasileira de Medicina de Grupo).
541
No caso do Brasil, o Governo tem promovido pequenas e contínuas alterações no sistema de saúde suplementar às
vezes sem atentar que “Reformas do sistema baseado em mercado que não forem implementadas em uma base
sistêmica e com salvaguardas, podem trazer mais problemas do que soluções”. Há a necessidade de discutir conceitos
e modelos para a Saúde Suplementar e melhorar o entendimento geral sobre riscos, pois isso, é importante para o
aperfeiçoamento do modelo, bem como gastos improdutivos devem ser atacados e aumentar enormemente a escala
das operações. É imprescindível implantar um sistema robusto de cobertura universal, com cuidados de qualidade e
de bons serviços a toda a população, e isso é um projeto gigantesco, de muitos anos, e um desafio fiscal da maior
grandeza. Necessário também entender os objetivos sociais da população com relação à saúde, corrigir distorções do
atual sistema e melhorar a sua eficiência são a melhor atitude dos atuais agentes, bem como o desenvolvimento
coletivo da visão do sistema como um todo, tanto da parte do governo quanto das operadoras e outros agentes,
desenvolvendo conceitos e clarificando objetivos será fundamental para se ter um sistema viável e estável para o
futuro. (Fonte: Cechin – palestra de 13/02/2009 – Abramge)

224
Esses aspectos econômicos são interessantes, todavia, sob o ponto de vista de
acesso ao mercado, verificamos a desigualdade nas classes sociais. Dentro da cadeia
de valores, a ANS deveria contar com essas estruturas empresariais no processo de
parcerias. A doença é exatamente a mesma para as classes rica, média e pobre, mas
a perversidade e a diversidade no tratamento são enormes no tocante ao acesso aos
medicamentos.

Tendo em vista que o funcionamento atual do sistema privado de saúde não prevê o
compartilhamento entre o público e o privado no caso de riscos de alta complexidade,
e supondo que este aspecto dificulta a expansão de pequenas operadoras no setor,
este trabalho cumpre seu objetivo de propor alternativas para o desenvolvimento das
pequenas operadoras na prestação de serviços de saúde no país.

Também se pretendeu no presente estudo refletir como as médias e as pequenas


operadoras de prestação de serviços em saúde encaram os temas que mais causam
polêmica, especialmente no que diz respeito à regulação da ANS. São eles:

Exigências regulatórias; b) Alta complexidade e suas variações; c) Atual papel da ANS


no contexto de prestação de serviços de saúde do país; d) O capitation e sua
aplicação; e) Outros pontos polêmicos do setor, tais como: preços, reembolso ao SUS
pela operadora, descontos em folha de pagamento à Previdência Social, daqueles que
pertençam a um plano coletivo ou individual de saúde.

Considera-se fundamental, ainda, refletir sobre o futuro da regulação imposta pela


ANS, questionando seu posicionamento no passado e no presente e a possibilidade
de serem efetuadas mudanças, no mínimo pontuais, no setor. Cabe ainda discutir
onde se localizam as competências que identificam os pontos do compartilhamento
entre a saúde pública e a saúde privada, tendo em vista que há no Brasil uma
estrutura privada de operadores e prestadores de serviços altamente sofisticados.

Se frente a tais realidades e afirmações se verificar, de fato, a possibilidade de


implantação das premissas descritas, e tudo isso gerar preços de planos mais
acessíveis do que os atualmente praticados, boa parte do objetivo deste trabalho terá
sido cumprido, embora não caiba aqui essa ação de mudanças.

Poupança Saúde ou Previdência Saúde

Há ainda outras propostas bem atuais como, por exemplo, a Poupança Saúde ou
Previdência Saúde. Essa proposta surgiu devido ao Estatuto do Idoso e a relação de
diferenças de preços dos planos entre as faixas etárias, definidas na Lei 9656/98 e
posteriores alterações.

Conforme Amorim, (2008), 542 seria necessário rever a regra que estabelece a relação
de seis vezes entre preços cobrados para a assistência a usuários da primeira faixa
etária até os da última faixa etária. O aumento dessa proporção permitiria preços mais
acessíveis aos jovens e pessoas em idade ativa, possibilitando o crescimento da

542
Em artigo assinado por Cechin e Badia,

225
população coberta pelas operadoras com importantes efeitos positivos de escala e
diluição de risco. Na análise, contudo, a elevação da proporção entre as faixas etárias
elevaria o preço dos planos para os idosos, agravando um problema já existente. Essa
situação poderia ser contornada pelo desenvolvimento de produtos que permitissem a
formação de Poupança-Saúde, produtos que não substituiriam os atuais, mas que
seriam ofertados como mais uma opção. Seriam atrativos para aqueles que são mais
jovens, que ainda tivessem tempo suficiente para acumular reservas para custear seu
plano de saúde na idade avançada. 543

Independentemente do modelo de financiamento adotado para o cuidado com a


saúde, público através de tributos ou privado através do custeamento direto pelos
usuários, os países mais desenvolvidos têm se deparado com o fato de que os custos
para manutenção da saúde têm sido crescentes nas últimas décadas, tanto em termos
absolutos, como em termos relativos, quando verificada sua participação no PIB.544
No caso então da alta complexidade em que o uso da tecnologia é fundamental,
associada às inovações, as patentes, a concentração dos poucos fabricantes e
prestadores de serviços, os custos tornam-se perigosos à atividade que ainda luta com
aspectos como aumento do dólar, inflação, envelhecimento da população e uso da
medicina preventiva.

Segundo o IBGE, os ricos gastam, com saúde e medicamentos - em média - dez


vezes mais do que os pobres. 545 Isso nos leva a crer que as classes menos
favorecidas só consomem medicamentos quando estão, de fato, sofrendo demais e
muitos nem chegam a adquiri-los para tratar de suas enfermidades. As alternativas
para melhorar o cenário atual dos serviços de saúde no país incluem,
necessariamente, a readequação do relacionamento entre todos os agentes
envolvidos: prestadores de serviços, operadoras de planos de saúde, fornecedores,
órgãos governamentais, Ministério da Saúde, Agências, Judiciário e usuários do
sistema.

Padronização de normas e formulários

Entre outras propostas complementares, pode-se destacar:

1) A assinatura de contratos entre as partes, conforme preveem as resoluções


normativas da ANS, números 42, 54 e 71, além de contratação com os prestadores do
SUS, visto que somente 12% dos conveniados ao SUS possuem contrato com os
gestores segundo dados do próprio MS; 546
2)- Padronização eletrônica das informações e formulários, como prega o recém-
lançado TISS – Troca de Informações em Saúde Suplementar, da Agência Nacional
de Saúde Suplementar. Isso poderá representar uma evolução para o setor, uma vez

543
Segundo a Revista Exame (27/04/2005) a General Motors gastou cerca de US$ 5,3 bilhões em 2003 com plano de
saúde para 1,1 milhão de funcionários, aposentados e dependentes. O montante representava 5% de todas as suas
vendas no mercado norte-americano. (Pág. 48 – Amorim – 2008).
544
Maria Helena Leal Castro - UFJF/ IMS-UERJ - artigo pág.1 - acessado em 28/02/2006 -
http://www.abres.cict.fiocruz.br/docs/2.pdf

545
Segundo o IBGE.
546
Amorim, Maria Cristina – “Para entender a Saúde no Brasil” – 2006.

226
que pretende reduzir a burocracia e os erros atualmente existentes; 547
3)- Desenvolvimento do processo de acreditação para os serviços de saúde, calcado
nas normas da Organização Nacional de Acreditação (ONA). 548

Programas de Acreditação e de Qualificação

Trata-se de outro pilar fundamental na gestão e no incremento dos serviços de saúde


do país. Portanto, apóia-se os Programas de Qualificação e Acreditação, como os que
vêm sendo implantados na saúde suplementar, voltados tanto para as operadoras,
quanto para os prestadores, visando a melhoria dos serviços e do atendimento
oferecido 549 , criando um Código Nacional de Saúde.

Mudanças são urgentes e possíveis. O compartilhamento entre o público e o privado e


seus complementos comerciais e administrativos podem proporcionar saídas na
prestação de serviços à saúde para evitar o recrudescimento de um antagonismo
social entre a saúde privada e pública.

Os princípios do seguro podem ajudar muito: imprevisibilidade individual de eventos


futuros e incertos, previsibilidade coletiva, favorecendo a quantificação, mutualismo e
solidariedade, dividindo igualmente os riscos que se materializam desigualmente, boa
fé para que muitos paguem pouco para os poucos afetados terem o patrimônio
preservado e aos infortunados, a esperança.

Apesar da Constituição de 1988 tentar quebrar a exclusão das ações e o não acesso
aos serviços de saúde para grande parte da população, o problema continua
desafiando as autoridades. A distância entre o que dizem a Carta Magna, o Ministério
da Saúde e a ANS como instituições, e a realidade cotidiana, é muito grande. O
reembolso às operadoras dos serviços de alta complexidade, as inovações para as
PME’s e adaptações sugeridas neste trabalho, além de outras, podem contribuir para
minimizar essa exclusão.

É necessário insistir que as reflexões aqui levantadas têm como objetivo o


compartilhamento das experiências já obtidas, nos últimos quinze anos, pelos setores
privados da saúde com o sistema público,550 inclusive nas pesquisas. Não existe uma
verdade estanque, mas é necessário refletir, procurar o lado mais realista e promissor
para a saúde da população. Apresentar dúvidas e eventuais soluções nesta discussão,

547
Idem 32 -

548
Processos de avaliação e certificação de serviços de saúde. (Enfermeira Lilian Lestingi Labbadia - Palestra
proferida em Maio/2010) - http://www.nascecme.com.br/conferencias (acessado em 13/10/2011).

549
- Um Código Nacional de Saúde, devidamente respaldado pelo Novo Código Civil, a fim de estabelecer diretrizes
para responsabilidades civis. Hoje o setor encontra-se ainda atrelado ao Código de Proteção do Consumidor, todavia,
saúde é do ser humano - sua própria vida - e isso não dá para repor, nem dá para fazer troca. Isso dará maior
funcionalidade à relação médico/paciente. Outro aspecto a ser considerado é a bi-ou-tri-tributação e as elevadas
alíquotas que incidem sobre os estabelecimentos e treinamento de pessoal constante em nível nacional. (Amorim,
2006).
550
“Os exames laboratoriais e o diagnóstico vão melhorar”, prevê o professor de clínica médica Marco Antônio Zago,
da Faculdade de Medicina da USP, em Ribeirão Preto, interior de São Paulo. Hoje, contam-se nos dedos os testes de
laboratório específicos para determinadas doenças, como o PSA, que aponta a presença de uma proteína no sangue
indicativa de irregularidades na próstata.

227
é obrigação daqueles que estão no dia a dia da atividade.

A situação financeira das pequenas empresas de saúde, ou seja, daquelas cujos


prêmios anuais, não ultrapassam 20 milhões de reais, apresenta uma preocupante
combinação de: baixa rentabilidade, volatilidade e baixo nível de capitalização e
impossibilidade de constituir as provisões e/ou reservas e o capital mínimo requerido
para operar. Por outro lado, elas apresentam despesas administrativas extremamente
altas.

Completando, há um alto requerimento de capital para solvência dessas empresas.


Muitas empresas estão operando há algum tempo com um patrimônio líquido negativo,
havendo uma grande volatilidade dos resultados nesse segmento. A dinâmica do
mercado mostra que, mesmo sem as novas regras da ANS, o futuro será igual ou pior
do que já estamos vivenciando, e, que as grandes operadoras ficarão maiores ainda,
pois, muitas empresas pequenas e médias não conseguirão cumprir as novas regras
de garantias financeiras exigidas pela ANS e isso fará com que muitas poderão
desaparecer ou deverão mudar a sua forma estratégica.

Pelos motivos acima expostos, é que se sugere novas políticas operacionais para as
pequenas e médias empresas operadoras e também novas regras para seu
enquadramento: não se pode usar as mesmas regras para uma operadora – por
exemplo - que tem seis mil usuários – e atende grande parte do interior da Bahia - e
para outra, com um milhão e meio de usuários.551 (Hirai, 2009).

Capitation odontológico

Na área odontológica, tendo em vista os poucos procedimentos e as possibilidades


das sinistralidades serem mais controláveis, o capitation é perfeitamente possível de
ser aplicado. Seria o Bolsa Dentista.552 Segundo os profissionais do ramo: a saúde
começa pela boca. Fato que não acontece no caso da assistência à saúde por serem
os procedimentos de alta complexidade extremamente perigosos sob o ponto de vista
de sinistralidades.

Tirando-se a alta complexidade, todos os demais procedimentos são passíveis de


controle de risco principalmente para operadoras de pequeno porte.

Uma possibilidade de aliviar o sistema público estaria também na grande quantidade


de consultas, exames, pequenas internações e cirurgias de rotina. Essas inovações
deverão ser divulgadas pelos órgãos envolvidos. O que falta, hoje, para aumentar a
base da pirâmide no atendimento à saúde?

Bahia, (2000), em Cadernos de Saúde - ANS - informa que faltam modelos


assistenciais com base em valores mais populares e intermediários: planos básicos,
com enfermaria padrão C; planos intermediários para empregados de nível gerencial e
utilização de quarto em hospitais classe B, e, planos executivos, para sócios de

551
Fonte: Paulo Hirai – Milliman do Brasil – Consultoria – palestra proferida na abramge – em fev/2009.
552
Talvez não seja prioritário, alguns podem afirmar, todavia, imagine-se as conseqüências favoráveis para a
população. O pagamento seria efetuado diretamente ao Dentista ou Clínica no capitation.

228
empresas ou executivos empresariais, com utilização de livre escolha e hospitais
classe A. 553

No Brasil, a partir dos dados dos Suplementos de Saúde da PNAD, é possível


acompanhar vários indicadores relacionados ao acesso a serviços de saúde. A
população idosa e aquela que não têm um plano de Saúde recorrem a serviços
regulares. Claro que existem problemas, mas a população, em geral, tem sido
atendida. Alguns dados podem ser consultados para os três anos da série, tais como
os percentuais de pessoas que contam com serviço de uso regular ou que
consultaram médico e dentista nos últimos 12 meses.

Há também a possibilidade de calcular os percentuais de mulheres que realizaram


mamografia e citologia do colo do útero – exame de Papanicolau nos três anos que
antecederam as entrevistas, em 2003 e 2008. Tais dados podem gerar informações de
capilaridade dos sistemas, uso, freqüência, mostrando a performance dos níveis de
atenção.

Ter um serviço de saúde ao qual normalmente se recorre é considerado um indicador


de acesso aos serviços de saúde em muitos países, especialmente, nos casos em que
o sistema de saúde é hierarquizado e tem na atenção básica a porta de entrada e
referência para níveis mais especializados e de maior complexidade. O mais
importante a destacar é que os postos ou centros de saúde são os serviços cada vez
mais referidos pelas pessoas como serviço de uso regularmente procurado: 42% em
1998, e quase 57%, em 2008. 554

Uma das vantagens para se cristalizar o assunto em questão é que o sistema de


saúde empresarial brasileiro ou sistema de saúde suplementar ainda é muito jovem e
necessita de inúmeros ajustes de caráter regulador; contudo, está montado,
estruturado e dotado de equipamentos e profissionais do mais alto nível. Em
compensação, o sistema de saúde público está regulado, porém tem muitas
deficiências devido a sua grandiosidade e dificuldade de gestão.

É mais fácil moldar o sistema empresarial de saúde suplementar enquanto jovem


ainda. Há argumentos de que a fraude poderia aumentar, todavia nos casos de alta
complexidade ela é muito difícil de ser executada, tendo em vista as possibilidades de
se controlar quem foi o usuário, pois todos os procedimentos de alta complexidade são
passíveis de protocolos hospitalares.555

Propostas para a ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar

Neste ponto, devem então ser refletidas as ações da ANS - Agência Nacional de
Saúde Suplementar, não só pelo que já fez, mas também pelo que poderá fazer para
controlar e regular a saúde suplementar no Brasil.

553
Fonte: Cadernos de Saúde - ANS - Ref. Prof. Ligia Bahia – (2000) -
554
Isso se verifica nos gráficos da revista Radis número 69. (2008) .
555
O Protocolo Hospitalar é um manual passo a passo de todos os procedimentos médicos possíveis, inclusive com
intercorrências, num determinado tipo de situação de internação ou de ambulatório, onde são previstos todos os custos
por antecipação.

229
Da forma e no ritmo em que desenvolve suas atividades atualmente, a ANS tornar-se-
á, ao longo do tempo, um órgão apenas regulador e não participante dos problemas
que mais comprometem todo o setor: aumento da massa de usuários, comportamento
passivo ou contemplativo, novas estratégias e falta de recursos.

Trabalhando assim, pontualmente com cada operadora apenas, a ANS saberá sempre
com muito atraso, ou nunca terá em mãos, os números que precisam ser analisados
detalhadamente para tomar decisões amplas e de macro-saúde, conforme exige todo
o sistema suplementar. Tais objetivos não podem ficar distantes da ANS. A palavra
“complementar” em sua definição e no caso da Agência Nacional de Saúde
Suplementar deve contemplar outras atitudes mais amplas.

Nos Estados Unidos, os gastos com serviços com saúde chegam a mais de 15% do
PIB e há um compartilhamento entre o público e o privado, principalmente em relação
ao atendimento de idosos e dos menos favorecidos economicamente. É claro que os
EUA em hoje, após essa crise econômica americana, não é nenhum espelho. Antes
da crise já existia mais de 40 milhões de americanos sem assistência de planos de
saúde, mas pouco se comentava à respeito. Nas crises os problemas afloram.556 Não
é o caso do Brasil que tem uma situação de saúde que, comparada com os EUA, é
privilegiada e pouco se aproxima, na estrutura e na qualidade, da dos americanos.

Num sistema, em que as operadoras, cada qual considerando seu faturamento, dentro
de sua proporcionalidade de atendimento aos seus usuários - clientes pagantes -
possam oferecer atendimento a um outro contingente da população, via empresas,
através do capitation, atendendo a esses segmentos de forma justa e digna, será
possível detectar e resolver os problemas crônicos de saúde de grande parte dos
brasileiros. Com isso, teremos um atendimento com performance de plano particular,
com eficiência privada e olhos do setor público, prevenindo-se enfermidades e,
conseqüentemente, economizando para o governo e a sociedade, milhões de reais.

Por que hospitais com padrão de excelência de atendimento e operadoras de saúde


como Bradesco, Sul América, Amil, Intermédica, Unimeds além de outras de regiões
como Sul, Sudeste, Nordeste, por exemplo, não podem administrar e acrescentar ao
seu trabalho operacional, mais consultas, atendimentos ambulatoriais às PMEs
empresas cadastradas em capitation, as quais possuem trabalhadores que não podem
adquirir um plano de saúde em condições normais? E por que não poderiam fornecer
parte de sua estrutura para atendimento daqueles que não tem carteira assinada, mas
têm vínculos sérios com a sociedade ou uma Associação? E com isso aumentar a
quantidade de usuários?

Necessário será, ao longo do tempo, que as empresas operadoras tenham


possibilidades de atender as classes mais favorecidas, o que já acontece, oferecendo,
também, planos mais baratos e coberturas na forma da lei, com condições de atender
às pequenas, médias e micro empresas e seus funcionários, aumentando, assim, a
556
Para completar, o sistema de saúde é uma bomba-relógio para as contas públicas. O Medicare, muito criticado, por
exemplo, vai se tornar deficitário em oito anos. Os gastos com saúde crescem a uma taxa superior à inflação. Os EUA
são o país que mais gasta com saúde – US$ 7 per capita, ou 16% do PiB, mas está em 37º lugar em qualidade de
atendimento, ao lado da Eslovênia, segundo o ranking da Organização Mundial de Saúde – OMS. (Fonte: O Estado de
São Paulo – 09/09/2009).

230
base da pirâmide de pessoas atendidas em planos privados de saúde. Com essas
várias premissas básicas, e outras reflexões que possam se materializar, diminuirá
fortemente essa população que hoje é atendida pelo SUS. Ela deverá paulatinamente
ser direcionada para operadoras via planos empresariais através de micro, pequenas
empresas, associações.

Existem posicionamentos que insistem em que o sistema de saúde suplementar passa


por uma profunda crise. Os atores que compõem esse segmento – usuários, médicos,
governo e prestadores de serviços de maneira geral – não se entendem. Operadoras e
prestadores, que deveriam ser parceiros no sentido mais puro e nobre da palavra,
mantém um péssimo relacionamento comercial, no qual a desconfiança impera. A
persistir o atual modelo, caminharemos para o estrangulamento de toda a cadeia, com
sérios prejuízos para médicos, usuários, hospitais, clínicas, laboratórios e até para o
governo, pois na esfera estatal, já se presencia o aumento das filas no SUS.

É necessário, portanto, a adoção urgente de um novo modelo de relacionamento. Até


1993, as empresas trabalhavam e ganhavam da forma mais fácil, aplicando suas
receitas no mercado financeiro. Com o advento do Plano Real, os prestadores de
serviços tiveram que remodelar a sua estrutura empresarial, procurando produtividade
com maior resolutividade. O mercado nessa época agia livremente.557

É claro que todos os aspectos gerenciais e jurídicos de projeto de capitation,


poupança-saúde,558 outras propostas e premissas constantes deste trabalho e com tal
magnitude, deverão ser desenvolvidos sob sérias disposições de gestão, com
responsabilidades e controle de ambas as partes e passíveis de cassação, multas e
outros dispositivos que podem ser pormenorizados de forma gradual e debatidos para
se tornarem projetos definitivos para possível aplicação e cristalização.

Muitos desejam regras para quaisquer situações; outros querem liberdade para
desenvolver suas empresas e seus planos em segmentos específicos. Há inclusive,
profissionais do ramo que defendem a possibilidade de criação de planos de saúde
específicos, tais como, planos somente para as possibilidades de câncer ou
transplantes.

Após esses anos e depois da Lei 9656/98 a experiência tem demonstrado que
atualmente a saúde empresarial está muito melhor para o público em geral do que no
passado, pois há muitas coberturas obrigatórias que antes da lei não existiam, todavia
há muito por fazer. Por parte da ANS, é necessário que seja estudado um mecanismo

557
Como representante dos prestadores de serviços de saúde privados, o Sindicato dos Hospitais, Clínicas e
Laboratórios do Estado de São Paulo (SINDHOSP) também teve de se adequar às mudanças impostas pelo mercado.
A primeira medida adotada foi a descentralização. Atualmente o Sindicato conta com nove escritórios regionais
distribuídos em pontos estratégicos do Interior do Estado, munidos de toda infra- estrutura para a realização de cursos,
seminários e reuniões. Há também um escritório político em Brasília. Objetivando um panorama geral do
relacionamento entre prestadores de serviços e operadoras de planos de saúde, o SINDHOSP realizou duas
pesquisas, cada uma com objetivos específicos. A primeira foi realizada pelo Datafolha, em 2003, junto a 82 hospitais
da Capital e Grande ABC, e demonstrou o resultado: relacionamento é péssimo. Problemas variados, como falta de
contratos, ou contratos com cláusulas leoninas, unilaterais, falta de pagamento, pagamentos com atrasos, glosas totais
ou parciais, desconfiança de parte a parte, pagamento no vencimento mas, com cheque pré-datado, falta de reajustes,
redução do CIH – Coeficiente de Honorários, demora na emissão de autorizações para atendimento, transferência de
pacientes em tratamento para hospitais próprios ou para aqueles de custo menor. (Dante Ancona Montagnana – artigo
– Amorim – 2006).
558
Um misto de Previdência Privada com Plano de Saúde.

231
de ressarcimento do passivo das operadoras de planos de saúde com o prestador de
serviços, quando uma operadora for liquidada. A Unimed São Paulo e a Interclínicas
deixaram ambas um passivo de, aproximadamente R$ 180 milhões, segundo
levantamento do SINDHOSP. 559

A proposta de Emenda Constitucional (PEC-29), que prevê, entre outros pontos, a


aplicação de porcentagens mínimas dos orçamentos públicos em cada nível, 10% do
federal, 12% dos estaduais e 15% dos municipais, só não vem sendo aplicada por
falta de vontade dos gestores públicos, conforme afirmação do deputado federal e
presidente da Frente Parlamentar de Saúde, Rafael Guerra, que esteve em Curitiba
participando de um encontro com gestores de saúde. Votada em 2000, a PEC está na
Câmara Federal para ser aprovada e muitos governos usam o argumento da falta de
regulamentação para a aplicação dos recursos.560

O Brasil e os modelos do futuro

É necessário olhar e projetar-se para o futuro. Os modelos do futuro serão aqueles


que trabalham e acreditam no “Managed Care”. A tele-medicina será uma realidade,
tendo em vista a internet, a televisão via internet com canais específicos dos próprios
hospitais para acompanhamento de muitas enfermidades.

A popularização da Internet vai alterar as práticas de prestação de serviços de saúde


em todos os elos da cadeia de valores que compõem esse setor, pois deverá gerar
produtos compatíveis e mais criativos. Há que se reduzir custos e agregar diferenciais
fazendo-se uma medicina multidisciplinar com procedimentos tais como:
acompanhamento diário de clientes on-line com problemas de diabetes, hipertensão,
para evitar males maiores como internações, isto é, monitoramento de doenças via
Home-Care. 561 Já há empresas de saúde, que fazem cobranças de performance dos
seus usuários quanto a medicamentos, consultas, exercícios físicos e outras
necessidades clínicas.

Quanto a tele-medicina, dentre os seus benefícios está a possibilidade de levar


assistência médica com rapidez aos lugares mais longínquos. Para alguns
especialistas, a aplicação mais imediata da tele-medicina é o correio eletrônico. Ele
proporciona, por exemplo, trocas de informações entre o médico rural e um hospital
tutor, localizado em um grande centro do País, com agilidade e eficiência.

Fóruns sobre o futuro da medicina já expõem sobre o novo tipo de atendimento na

559
A subsegmentação do plano ambulatorial é outro aspecto imprescindível, pois proporcionaria ao usuário escolher a
assistência mais adequada ao seu poder aquisitivo. O SINDHOSP defende uma ampla revisão de todo o sistema de
saúde suplementar. A Lei 9.656/98 engessou o mercado, pois inviabilizou os planos individuais, dificultou a entrada de
idosos no sistema, diante do alto custo e impôs um relacionamento baseado na pressão entre operadoras e Ancona
Montagnana – Médico, presidente do SINHOSP. (Amorim, 2006).
560
Para o deputado, isso faz com que muitas prefeituras e municípios acabem utilizando as verbas da saúde em outras
áreas, como saneamento e meio ambiente. Justificam que isso também é saúde. O deputado entende que o mau
exemplo vem do próprio governo federal, que aplicou o dinheiro em programas como o “Fome Zero”, “Bolsa Família”,
Hospital das Forças Armadas e Plano de Saúde dos servidores. Se o próprio governo cria um plano especial para os
servidores é porque não acredita no SUS, disse Guerra. Entre os Estados que menos aplicam recursos na saúde,
segundo Guerra, o Paraná aparece em terceiro lugar, atrás apenas do Rio Grande do Sul e Minas Gerais, com um
percentual próximo de 7%.(Fonte: artigo de Rosângela Oliveira – Internet).
561
O Home-Care é bem abrangente como tratamento. Trata-se de cuidar do paciente em sua residência. Significa
atendimento de enfermagem ambulatorial ou internação domiciliar durante 24 horas, se necessário.

232
área de saúde que a tecnologia possibilitará, aproximando os serviços médicos do
paciente, onde quer que ele esteja; "90% das necessidades da Tele-medicina serão
supridas pela Internet, que permite, por exemplo, que um médico especialista acesse,
em qualquer lugar do mundo, o prontuário do paciente, verificando o laudo de exames
ou funções vitais." 562

Consultas domiciliares, sorteios para lazer para quem se monitora com regularidade e
promoção de estudos para pacotes hospitalares para não haver surpresas tanto para a
operadora, como para o cliente, são opções complementares no futuro da saúde.
Isso será uma realidade brevemente.563 Cada hospital terá o seu próprio “www” com
seu canal de TV-internet para que o cliente acesse diariamente ou semanalmente do
computador de sua casa para fazer o seu monitoramento. Será a tecnologia a favor da
saúde das pessoas, diminuindo custos e aumentando as possibilidades do acesso à
cidadania para milhões de pessoas. Não se pode esquecer e deixar de lado a visão
não tão futurista na medicina/saúde da Inteligência Artificial e dos protocolos com as
árvores de probabilidades.

A Saúde no Brasil está fazendo fronteiras e é considerada atualmente uma referência


mundial, não só no lado privado como também no público. Hospitais brasileiros e
outras organizações médicas acabam de fechar acordo para atrair pacientes
estrangeiros. O consórcio foi firmado no mês de junho de 2010, com a Agência de
Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), órgão ligado ao Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

O Brasil faz parte hoje dos roteiros internacionais nos catálogos de empresas
especializadas em algo novo, chamado de Turismo Médico. Por possuirmos hospitais
de ponta, profissionais de alto nível e ainda termos custos, se comparados com os do
exterior, relativamente mais baratos: por isso somos alvo de pessoas que vem fazer
seus tratamentos e cirurgias no Sírio-Libanês, Einstein, Incor, 9 de Julho e outros.
Pesquisas de ponta já são desenvolvidas nessas entidades. As Células-Tronco são
um exemplo.

Conforme os autores, Amorim e Perillo, (2006), as estimativas do Banco Mundial


revelam que o Brasil despende hoje com assistência à saúde, tanto em termos
absolutos quanto relativos, mais do que países de renda média comparável, embora
obtenha resultados relativamente menores quanto ao montante despendido.

A mesma fonte declara que os hospitais brasileiros respondem pelo emprego de 56%
da mão-de-obra utilizada na saúde, representando ainda 67% das despesas totais e
70% dos gastos públicos com saúde.

562
Roberto Botelho - Coordenador médico dos projetos de tele-medicina do Instituto de cardiologia do Triângulo
Mineiro.
563
"http://www.hospital.com.br"

233
Anexo I

A Genética e a Declaração do Milênio

Quanto à tele-medicina564 dentre os seus benefícios está a possibilidade de levar


assistência médica com rapidez aos lugares mais longínquos. Para alguns
especialistas, a aplicação mais imediata da tele-medicina é o correio eletrônico. Ele
proporciona, por exemplo, troca de informação entre um médico rural e um hospital
tutor, ambos localizados num grande centro do País com agilidade e eficiência. E o
que se espera para os próximos anos, talvez 20 ou 30 anos?

Muitas inovações acontecerão. Sabemos, por enquanto, que a Genética é um caminho


a ser percorrido com muitas notícias e gerará muitos debates sob o ponto de vista de
futuro da saúde, coberturas por operadoras/seguradoras e muitas discussões de ética
e aspectos jurídicos.

Nos últimos anos, a Genética tem sido a vedete das notícias. O Projeto Genoma
Humano promete revolucionar a medicina, curar muitas doenças, proporcionar uma
longa vida, bebês mais bonitos e inteligentes. Entretanto, tudo isso parece muito
distante de nós. Como isso ocorrerá? Os novos conhecimentos vão nos ajudar a
entender como nossos genes interagem entre si e com o ambiente, o que vai ser
fundamental para o desenvolvimento de terapias.

Recentemente, descobriu-se que células sanguíneas ainda imaturas, presentes, por


exemplo, na medula óssea ou no cordão umbilical de um recém-nascido, podem
manter a capacidade de diferenciação em outros tecidos, como o muscular ou
nervoso. Abre-se assim a possibilidade de tratar doenças degenerativas, pois se
poderá usar células normais de um doador, ou células modificadas do próprio
paciente, para substituir tecidos doentes. Outra área que promete revolucionar a
medicina será a fármaco genética, que estuda o porquê temos reações tão diferentes
a drogas. É o caso, por exemplo, da hipertermia maligna, uma reação violenta a certos
anestésicos que causa uma morte rápida se não houver uma intervenção imediata. 565

564
Com aparelhos eletrônicos como câmeras e celulares, os cientistas Gordon Bell e Jim Gemmell registraram
exaustivamente dez anos de vida e armazenaram o material no disco rígido de um computador. São equipamentos
utilizados para monitoramento da saúde. Eles são responsáveis pelo projeto My LifeBits, da Microsoft Research, e
autores do Livro Total Recall (Memória total), lançado em setembro de 2009 nos EUA. Ele diz: “Eu me tornei portátil.
Me livrei de pilhas e pilhas de papéis. Toda a minha vida está arquivada num disco rígido. Ela ocupa 160 gigabytes.
Posso ir para qualquer lugar do mundo contanto que esteja com um computador por perto. Ter tudo digitalizado me
deixa muito seguro. Aliás, no futuro nossas memórias digitais poderão ser transformadas em Avatares. Eles
conversarão com nossos descendentes. Veremos uma explosão – no futuro – de sensores e equipamentos de
armazenamento de dados. Os mais incríveis sensores serão implantados no nosso corpo. Aparelhos cardíacos, como
marca-passo, já usam comunicação sem fio. Podem ser conectados à web. Há pouco tempo comprei uma balança com
tecnologia Bluetooth. Ela envia informações sobre o meu peso à memória digital do meu computador. Aparelhos que
controlam a respiração serão adaptados à roupas. Sinais vitais serão monitorados 100% do tempo. Você poderá
recorrer a dados do passado para fazer cirurgias no futuro. Qualidade de sono, pelo Sleep Coach analisa, por exemplo,
se o período de descanso foi leve e quanto tempo alguém realmente dormiu desde que se deitou. Se quiser monitorar
seus dados conecte o Google Health. (www.google.com/health) e há também o da Microsoft (www.healthvault.com)
recebe dados por Bluetooth (conexão sem fio). Fonte: Na entrevista de Veja de 18/11/2009 – Edição 2139 pág. 149
/150 e 182) com Lia Luz,
565
No futuro, em vez de sermos cobaias cada vez que experimentarmos uma medicação nova, teremos remédios
receitados de acordo com o perfil genético de cada um. Além disso, a identificação precoce de genes que aumentam a
nossa predisposição para doenças, como certos tipos de câncer, hipertensão ou males cardíacos, será importante para
futuros tratamentos e, com certeza, a medicina será muito mais preventiva do que é hoje.

234
Enquanto se procura a cura para essas doenças, busca-se também prevenir o
nascimento de bebês afetados por males graves e irreversíveis. Nesse sentido, o
número de testes genéticos disponíveis vem aumentando dia a dia. Hoje, casais ou
famílias que já tiveram filhos ou parentes afetados por uma doença genética podem
saber se correm o risco de vir a ter parentes com o mesmo problema e planejar a sua
prole de acordo com essa informação.

No futuro próximo, será possível identificar e excluir centenas de mutações graves, em


um estágio cada vez mais precoce da gestação. Entretanto, é fundamental que a
legislação acompanhe os avanços científicos e apóie a interrupção médica da
gestação em casos de fetos com doenças genéticas graves incuráveis para os casais
que assim o desejarem.

Finalmente, a possibilidade de testar um número cada vez maior de genes traz


questões éticas que devem ser discutidas por toda a sociedade. Já é um consenso
internacional que não se devem testar crianças assintomáticas para doenças
genéticas de início tardio para as quais não há tratamento. E em relação aos adultos?
Qual é a vantagem de sabermos que somos portadores de uma mutação para uma
doença grave ainda sem cura? As empresas de seguro-saúde certamente gostariam
de saber de antemão qual é o nosso perfil genético. Cabe a sociedade, lutar para
preservar os aspectos éticos e o direito de decidir se queremos ou não ser testados,
566
todavia, parte do que queremos já se encontra na “Declaração do Milênio na ONU.

Nem todos sabem os oito compromissos assumidos para o desenvolvimento humano


que formam a Declaração do Milênio567 e que foram estabelecidos, no ano 2000, por
191 Estados membros das Nações Unidas, por isso, seguem abaixo:

1. Erradicar a fome e a pobreza extrema: reduzindo pela metade, entre 1990 e


2015, a proporção de pessoas cuja renda é inferior a um dólar ao dia e a
proporção de pessoas que padecem com fome;
2. Alcançar a educação primária universal: assegurando que, em 2015, as
crianças de toda parte, meninos e meninas, sejam capazes de completar a
escolaridade primária;
3. Promover a igualdade de gênero e o “empoderamento” das mulheres:
eliminando a disparidade de gênero na educação primária e secundária,
preferentemente até 2005, e em todos os níveis de educação no mais tardar
até 2015;
4. Reduzir a mortalidade de crianças com menos de cinco anos: em dois terços,
entre 1990 e 2015;
5. Melhorar a saúde materna: Reduzindo em três quartos a razão de mortalidade
materna, entre 1990 e 2015;
6. Combater HIV/Aids, malária e outras doenças: reduzindo a metade e
começando a reverter a disseminação até 2015;
7. Assegurar a sustentabilidade ambiental: integrando os princípios do
desenvolvimento sustentável nas políticas e programas dos países e

Artigo de Mayana Zatz – que é coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano da USP. (Revista Galileu,
Fevereiro de 2001).
567
Fonte: HTTP://www.un.org/millennium/

235
revertendo a perda de recursos naturais; reduzindo pela metade, até 2015, a
proporção de pessoas sem acesso sustentado a fontes seguras de água
potável; alcançando, por volta de 2020, uma significativa melhora nas vidas de
pelo menos cem milhões de moradores de favelas e cortiços;
8. Desenvolver uma parceria global para o desenvolvimento: que viabilize um
sistema de comércio e financeiro aberto, baseado em regras claras, previsível
e não discriminatório; que seja direcionada para as necessidades especiais dos
países menos desenvolvidos, dos países sem fronteiras marinhas e das
pequenas ilhas que são Estados em desenvolvimento; que seja compreensiva
com a dívida dos países em desenvolvimento e que, por meio de medidas
nacionais e internacionais, vise torná-la sustentável no longo prazo; que, em
cooperação com os países em desenvolvimento, formule e implante estratégias
para assegurar oportunidades de trabalho decente e produtivo para os jovens;
que, em cooperação com as grandes empresas farmacêuticas, assegure o
acesso sustentado a medicamentos essenciais nos países em
desenvolvimento; que, em cooperação com o setor privado, torne disponíveis
os benefícios das novas tecnologias, especialmente de informação e
comunicação.

236
Anexo II

Entrevista com Dr. Arlindo de Almeida, Presidente da Associação Brasileira das


Empresas de Medicina de Grupo do Brasil, realizada na sede da Abramge, na
Avenida Paulista, 171 – 11.º andar.

Antonio Cordeiro: Olá Dr. Arlindo, permita fazer a minha breve apresentação. Sou
professor da PUC-SP e de outras Instituições. Sou Mestre e optei pela vida
acadêmica após os 50 anos. Sou Atuário por formação de graduação e já fui
empresário da construção civil e tive também uma empresa na área de saúde –
Medicina de Grupo. Quando eu ficar mais velho e com saúde desejo ser pesquisador,
daí o meu Doutorado.

Dr. Arlindo de Almeida: o que é isso ? Você está se achando velho? Quantos anos
você tem ?

Antonio Cordeiro: Quantos anos você acha que eu tenho? Isso mesmo... acertou!

Dr. Arlindo de Almeida: Eu tenho 10 anos mais que você.

Antonio Cordeiro: Tenho acompanhado sua luta pelas Empresas de Medicina de


Grupo e evidentemente pela representação da Abramge no Brasil. Leio e recebo a
Revista Medicina Social onde, você, normalmente faz o Editorial. É uma luta também.
Eu acompanhei bem a sua parte porque eu entrei em 2000 no ramo, tempo em que
ainda a Medicina de Grupo estava começando sob a égide da ANS – Agência
Nacional de Saúde Suplementar. Nessa época eu era dono da Real Saúde Ltda., uma
pequena empresa que iniciou com Odontologia e pretendia entrar em Medicina de
Grupo. Eu e o meu sócio não nos demos bem sob o ponto de vista comercial e algum
tempo depois eu vendi minha parte da empresa para o meu próprio sócio. Em 2000
ainda havia uns resquícios de que o mercado de vendas de planos de saúde ainda
seria como eram na década de final de 80 e início dos anos 90. Enganaram-se. Era
uma época que se vendia plano de saúde demais!

Dr. Arlindo de Almeida: Nesse período acabaram morrendo empresas que você nem
imaginava. Havia muitas pessoas – que tentaram ser empresários da saúde na época,
– e que se aproveitavam dos incautos. Mentiam as coberturas de planos e outras
falcatruas. O “futuro” empresário de saúde abria o escritório, fazia convênios com
algumas clínicas, hospitais, vendia milhares de planos e depois...desaparecia.
Depois que foi criada a ANS é que surgiu a possibilidade de se fazer controles
efetivos da saúde privada no Brasil. No início foi bom, até que a Agência começou a
fazer ingerências em tudo nas Operadoras. Além da saúde, na administração das
empresas também. A idéia inicial da ANS é que ela se dedicasse somente a aspectos
técnicos, de recursos, controle das reservas, controle das empresas sob o aspecto
médico e odontológico, mas não foi isso que aconteceu. Ela iniciou agindo no
mercado, na gestão das empresas, na garantia aos usuários e até na parte
econômica.

237
Antonio Cordeiro: Você acha que a ANS sofreu muita influência da Susep –
Superintendência de Seguros Privados, na época, principalmente na área econômica?

Arlindo de Almeida: Naquela época da criação da Agência Nacional de Saúde


Suplementar, surgiram duas correntes de caráter político e econômico. Inicialmente a
idéia e que uma parte da gestão ficaria com o Ministro da Saúde e a parte econômica
e financeira, ficaria com o Ministro da Fazenda. Havia uma dicotomia de gestão. Mas
o Ministério de Saúde passou a responsabilidade da parte econômica para a Susep,
tendo em vista os conhecimentos dos técnicos daquela Entidade face aos controles de
Seguros e Previdência aberta, incipientes ainda naquela época. Entendia-se que os
controles econômicos relativos aos aumentos de preços de planos de saúde e
reajustes seriam efetuados pela Susep tendo em vista que a Entidade estava sob a
égide do Ministério da Fazenda. Funcionava assim:
Os reajustes eram controlados e diferenciados pela Susep. A empresa apresentava
seus custos, suas planilhas, seus números, projeções e ela contra argumentava, se
fosse o caso, chegando a alguma conclusão e aprovava ou não o reajuste. Mas nessa
época, iniciou-se uma rusga política e o José Serra, tinha mais força política do que o
Ministro da Fazenda e aí iniciaram-se as interferências. Num certo momento, a Susep
apresentou um reajuste e isso gerou uma guerra entre o Ministério da Saúde e o
Ministério da Fazenda. Uma confusão de Ministros. E o Serra conseguiu, junto ao
governo suspender aquele aumento autorizado pela Susep. Daí prá frente a Susep
não quis mais cuidar do assunto e a Agência Nacional de Saúde sentiu que deveria
montar seus próprio departamento econômico e de análise de custos. Nessa época,
sim, aí, vieram técnicos da Susep para ajudar na ANS – Agência nacional de Saúde
Suplementar.

Antonio Cordeiro: O pessoal do ramo, na época, em 2.000 falava que a ANS era
Susepada. Talvez por causa da conseqüência desses conflitos políticos que
acabaram trazendo pessoas da Susep para a ANS – Agência Nacional de Saúde
Suplementar. O pessoal que assumiu a Agência Nacional de Saúde Suplementar tinha
uma pé no sanitarismo brasileiro ?

Arlindo de Almeida: A ANS sempre pendeu para o lado do sanitarismo. Foi


contaminada pelos Sanitaristas de plantão. E o Serra conseguiu ganhar essa briga e
foi atrás dos seus objetivos.

Antonio Cordeiro: Você é da Intermédica ?

Arlindo de Almeida: Eu não ! Atualmente eu somente dou consultoria para a Samcil.

Antonio Cordeiro: Essa empresa teve alguns problemas, não é ?

Arlindo de Almeida: Sim. Teve alguns problemas sérios no passado e hoje está sob
intervenção fiscal. Chama-se sob Direção fiscal. Tem muitos ativos. Precisa
desmobilizar um pouco, vender alguns imóveis, tem muitos hospitais. Seria bom para
capitalizar a operadora. É um problema, você sabe. Hospital não é fácil. Hospital é
complicado, um problema. Houve uma época boa, em passado não muito recente, na
qual as operadoras começaram a comprar hospitais. Sabe como é: havia muito

238
dinheiro. Atualmente, eles precisam desmobilizar ativos para viabilizar a operadora.
As coisas mudaram.

Antonio Cordeiro: A Intermédica mudou a filosofia de ataque ao mercado e de


trabalho, não é verdade ?

Arlindo de Almeida: Atualmente eu faço mais uma representação funcional da


Samcil. Ela está ainda sob intervenção fiscal e alguém precisa representá-la.

Antonio Cordeiro: Na PUC-SP temos duas Operadoras: a Intermédica e a


Sulamérica. Uso a Intermédica para assuntos de Exames Diagnósticos e algumas
emergências ambulatoriais, mas plano mesmo, hospitalar para outros casos mais
complexos eu tenho o Bradesco Saúde. Há muito tempo.
Eu sou do tempo do Plano Pai do Bradesco, que era um Plano internacional e familiar.
Por reembolso. Só hospitalar. Eu, minha mulher e meus dois filhos homens. Nunca
optei por mudança nenhuma. Nenhum tipo de migração. O que você acha ?

Arlindo de Almeida: Acho que você não deve mudar nada. Tem sorte. É um contrato
antigo e eram feitos de forma diferente dos de hoje. Hoje tem o Código do Consumidor
e planos familiares são mais complicados para as Operadoras. Tanto é verdade que
as operadoras eles pararam de vender esse tipo de Plano. Isso não existe mais há
muito tempo, e isso também por causa da interferência exagerada da ANS. Ela não
deixou fazer os reajustes que eram interessantes para as Operadoras na época e
agora os Planos ficaram baratíssimos. Se quiser brigar com a Operadora e só ir à
justiça e o usuário ganha todas. Desde o começo, quando a ANS começou a regular
os preços desses planos antigos – individuais e familiares - ficaram ótimos para quem
não fizer nenhuma alteração e nem migrar de plano.

Antonio Cordeiro: Neste trabalho, como muitos outros de Academia, em alguns há


uma certa objetividade técnica, mas também, os questionamentos levantados podem
promover uma dialética interessante sobre os temas elencados. Há todo um
andamento sobre o que é o Público e o que é o Privado, trabalhos assemelhados,
aproximações constantes e convergências inexoráveis e há premissas que procuram
analisar os compartilhamentos do passado e do presente entre Saúde pública e Saúde
privada. Uma das várias perguntas, por exemplo, é se será possível uma maior
aproximação entre o governo e a iniciativa privatista da saúde. Será que não seria este
o momento ? Considero o trabalho interessante, porque ele mostra todo esse andar no
tempo da Saúde Pública e suas relações com a Privada. Apesar dos problemas,
estamos muito melhor do que os americanos. Temos todo um sistema montado,
complexo, mas é uma teia de saúde e das grandes. Bem, vou precisar iniciar algumas
perguntas. Podemos dar andamento?

Arlindo de Almeida: Sim, podemos dar continuidade. Faça a pergunta.

Antonio Cordeiro: Então, por exemplo, em sua opinião, você evidentemente


conhece o Iamspe – que é o Instituto e Hospitais para Servidores Públicos Estaduais.
Há um em São Paulo para os funcionários públicos estaduais, que contribuem
mensalmente e há também um outro em Goiás. Dentro dessa rede ou teia de Saúde

239
brasileira temos ainda esse lado que não é privado, mas também não é público –
Iamspe é Autarquia – e também não é ONG. Mas o que é ?

Arlindo de Almeida: O Iamspe – Instituto e Hospitais para Servidores Públicos


Estaduais é uma situação realmente esquisita. Eles estão fora até da Constituição.
Porque não são públicos, não são privados, não são operadora, não são ONG, enfim,
não sei onde eles se classificam. Quem está lá o Abrão Latif Júnior, que é uma pessoa
extremamente competente. Ele era da Intermédica. Ele foi prá lá com o espírito de
Operadora de convênio mesmo, a idéia dele na época, que eu lembre, era de fazer
uma rede credenciada no Estado. Não sei como está esse assunto atualmente. O
serviço público é muito das vezes problemático por situações de gestão e de um olhar
mais administrativo. Minha sogra ficou 15 dias internada para esperar consertar um
aparelho de raios X. Em muitas situações, por aspectos políticos e de gestão, o
negócio desses hospitais públicos, é encher o hospital para ninguém falar nada, prá
deixar os leitos lotados, prá pedir mais médicos, enfermeiros. É um absurdo você
manter pessoas internadas para dizer: agora não tem mais vagas.

Antonio Cordeiro: Neste trabalho de Doutorado há colocações interessantes e que


colocam, por vários motivos, a necessidade de haver compartilhamento entre as
empresas públicas e as privadas principalmente para os casos de alta complexidade.
Há, por exemplo, referências ao capitation, mas por quê ? Porque o capitation é uma
forma de desenvolver a saúde privada principalmente para as pequenas e médias
empresas. Por exemplo, se formos analisar uma empresa do interior da Bahia, com
10.000 usuários – que é a média pouco acima das pequenas empresas Operadoras
em número de usuários – e se essa Operadora tiver o azar de ter uma dúzia de
cardíacos, num mesmo mês, ela quebra. Porque ela quebra: porque assuntos de alta
complexidade deveriam ser compartilhados entre Operadoras e Governo, no caso a
Agência Nacional. Por isso é que a TESE – sugere – em um dos seus itens de
premissa que o governo pague as Altas Complexidades para as pequenas operadoras
de forma técnica, mediante protocolos, tabelas médicas e outros controles.

Arlindo de Almeida: Interessante notar que 80% das pequenas empresas estão
nesse tipo de quantidade de usuários que foi comentado. A idéia do compartilhamento
é perfeita. É óbvio, pois as pequenas empresas não conseguem conviver sob o
fantasma de sinistros de alta complexidade. Pergunto para você: Onde o SUS é bom
? Eu mesmo respondo: é bom na Alta Complexidade, porque em Exames
Diagnósticos, Consultas, Terapias é um desastre. Eu falei isso para a presidente
Dilma. Ela chamou todas as empresas privadas e as Medicina de Grupo lá no Planalto
e eu falei que a Saúde Publica e Privada poderiam dar as mãos, numa forma que seja
inteligente! Vamos aproveitar onde o governo é bom que é na Alta Complexidade e
muito do que o governo faz, poderia ser feito por nós da rede privada. O SUS é bom
onde, pergunto novamente? Ele é muito bom
em transplantes, cirurgias cardíacas, e coisas do gênero. Todos que precisaram
sabem onde é que o SUS é bom, acabaram sabendo: Nos hospitais universitários. A
porta da alta complexidade está no governo, está no SUS.

240
Antonio Cordeiro: A pequena Operadora, por exemplo, lá do interior do Paraná tem
um paciente com um problema grave e ela tem que mandar para o SUS. O SUS
atende e depois manda a conta para a Operadora. Como pode acontecer isso ?

Arlindo de Almeida: Agora está aí um dos problemas. Por isso é que nós estamos
defendendo uma modulação diferenciada. Dividir em módulos essa parte dos
convênios. Abrindo uma maior flexibilização das coberturas. Assim, tudo ficaria mais
fácil.

Antonio Cordeiro: Em sua opinião, deve existir qual relação pública/ privada na
Saúde? Essa relação é benéfica ou problemática? Qual deve ser o grau de
integração ou separação ? Poderiam ser “Sistemas combinados” ou compartilhados?
Ou isso é utopia, que pode provocar desvios, discriminação e a regulação excessiva
que pode interferir em consumidores e operadoras ?

Arlindo de Almeida: Eu acho que a relação entre governo e entidades privadas é


interessante e necessária. Veja bem. O SUS foi criado no sistema universal, atende a
todos - na teoria – porque na prática não é bem assim. E se atende, muitas vezes,
atende mal. A porta de entrada do Público não funciona, mas na nossa, a privada,
atualmente não tem dado problemas, não. No Brasil, assim como nos EUA não há
atendimento para mais de 40 milhões de pessoas. Para fazer uma pequena cirurgia
no SUS é um desastre, no sistema privado é muito melhor. Porque acontece isso ? Eu
acho que deveria haver menos preconceito ao empresário de saúde no nosso país. Há
um preconceito muito grande, principalmente pelos sanitaristas. Quando queremos
compartilhar eles dizem que o sistema privado tem que fazer tudo igual ao SUS. Isso é
impraticável. O SUS foi criado para atender a todos. Nós queremos ajudar a porta de
entrada do sistema publico. Ela é uma desgraça ou um desastre. A nossa porta é boa,
é muito melhor. Exames no SUS é complicado, demorado, tem que marcar com um
mês de antecedência. Enfim, é um desastre. Mas, em compensação, o público é bom
na alta complexidade. Isso nós temos que admitir.

Antonio Cordeiro: Vocês associados das Empresas de Medicina de Grupo, têm idéia
sobre essa disposição da Abramge e de outras Operadoras, que nem fazem parte da
Abramge, em debater as possibilidades do compartilhamento entre o governo e as
empresas privadas, ou seja, entre o Público e o Privado? O que pensa a Abramge?

Arlindo de Almeida: A Abramge pensa de forma positiva. Existe sim. Claro que sim.
Só não aconteceu porque há ainda um grande preconceito entre aqueles que estão na
linha de frente da Saúde no Brasil. Há muitos sanitaristas, você sabe. Eles, os
sanitaristas, consideram que a iniciativa privada deve agir como o SUS. Eles acham
que a iniciativa privada tem que ter também universalidade, equidade, etc., e isso é
impraticável. Na iniciativa privada, tudo igual ao SUS é impossível. Em primeiro lugar
são palavras que não tem muito sentido sob o ponto de vista prático, não funcionam...
Os sanitaristas estão contra a colaboração da iniciativa privada, mas isso não quer
dizer que não é possível cada um dar a sua contribuição. Universalidade e equidade,
são palavras que sob o sentido prático não funcionam.

241
Outro dado interessante, é que, dentro dessa linha de colaboração, as parcerias
Público Privadas estão dando muito certo, é um sucesso tremendo, isto porque, na
área hospitalar, já se provou que o tempo de ocupação é muito menor na área privada
e que os resultados são melhores... e o que é mais importante, o público aprova. É
claro que dá para colaborar. Poderiam ser utilizados hospitais de primeira linha para
fazer transplantes de fígado, por exemplo, como no Hospital das Clínicas, Hospital
São Paulo, Sírio Libanês. Esse compartilhamento deve ser inteligente, bem preparado
e discutido em todos os detalhes. Nós da Abramge, nos dispomos a sentar, mas eles,
os sanitaristas não têm muito interesse. Daria para minimizar custos também, porque
toda vez que você faz ações repetitivas, ou seja, O estado faz uma ação e a iniciativa
privada faz a mesma ação, o custo fica maior. É um negócio absurdo... os dois estão
concorrendo no mesmo campo para fazer a mesma coisa. Porque então não
compartilhar?

Prá você ter uma idéia, nos colocamos à disposição para o Ministério da Saúde no
sentido de ajudar a partir para os movimentos de vacinação. O que aconteceu?
Nós temos – a Abramge - e outros operadores que nem fazem parte da Associação,
são milhares de clínicas, hospitais, enfim, é um grande aparato técnico de espaço e
logística de saúde. A Abramge, então se colocou à disposição com toda a sua
estrutura e partir para a vacinação. Como já foi informado, nós temos à disposição
milhares de clinicas, hospitais e atingimos cerca de 30 milhões de pessoas, mas eles
não aceitam a nossa colaboração. Eles querem fazer tudo sozinhos.
Porque o governo quer fazer sozinho? Tudo bem, porque vai fornecer a vacina?
Só por isso? E a logística toda de vacinação? A mão de obra qualificada, etc.? Tudo
pago pelos milhares de Associados que temos e milhares de clínicas, hospitais, que
prestam serviço para nós. Imagine a efetividade da campanha, o sucesso que seria,
se a rede privada pudesse oferecer graciosamente tal serviço. Imaginem o resultado ...
seria fantástico.

Uma vez isso foi conseguido em São Paulo, nós oferecemos e eles aceitaram, pois
havia uma greve de funcionários públicos da saúde e a Abramge colocou tudo à
disposição do público em geral. Sabe o que aconteceu? Em 24 horas estava pronta
toda a nossa estrutura e foi um sucesso numa dessas campanhas de vacinação.

Antonio Cordeiro: Os meus netinhos, por exemplo, eu levaria na Intermédica! Porque


eu levaria num Posto de saúde, se eu conheço a clínica, o endereço e até – conforme
o caso – os médicos, enfermeiros, funcionários.

Arlindo Almeida: Imagine o sucesso que seria com toda a nossa rede privada. Outra
coisa que é fundamental é a Abramge participar da discussão dos problemas,
conversar. Eles do Ministério da Saúde, precisam também nos ouvir. A nossa
Presidenta falou isso recentemente. Foi uma das coisas que a Dilma insistiu. De nada
adianta nós da Abramge, recebermos pacotes prontos, com tudo definido a qualquer
preço. É preciso conversar. A Dilma ventilou isso. Queremos participar do
planejamento de saúde no Brasil também. Podemos ajudar e muito.

Antonio Cordeiro: Vocês participam do Consu?

242
Arlindo de Almeida: Não do Consu não ! Ele é um Conselho de Ministros: Ministro da
Saúde, Ministro da previdência, Ministro da Fazenda, Trabalho, etc. Do Conselho
nacional de Saúde, CNS, Conselho Estadual de Saúde e o Conselho Municipal, a
Abramge pode participar.

Antonio Cordeiro: Mas a Abramge participa? Dá sugestões ? É consultada?

Arlindo de Almeida: A Abramge pode participar, mas é muito complicado. Pode


participar, mas pela Lei esses conselhos devem ser paritários, a população tem que
ter 50% das vagas e ninguém consegue fazer 50% das vagas ! É muito difícil.
Ninguém consegue fazer gestão em saúde por causa disso. 50% é povo – CUT, CGT,
e o resto somos nós – a Abramge - e os hospitais. É muito difícil.
O Conselho Nacional de saúde, por exemplo, é um órgão superior ao Ministro e
manda no ministro... quem manda no CNS é a Conferência Nacional de Saúde, órgãos
máximos, abaixo tem outros órgãos de votação paritários e aí você vai lá ... é
complicadíssimo. Muita discussão. Nós somos insignificantes perto de todo esse
conjunto.

Antonio Cordeiro: E olha que vocês representam, na Saúde, mais de 50% do


volume de recursos em saúde, considerando tudo, não é?

Arlindo de Almeida: Segundo dados que eu tenho: 57%

Antonio Cordeiro: Pergunta: O órgão regulador proporá um teto, a medida poderá


atingir 21% dos contratos não adaptados ou os contratos de planos antigos. Com isso
a tendência é que haja uma certa pacificação. No caso ele se refere a aumentos nos
últimos anos, usuários que foram á justiça. Isso é verdade?
Ou seja: se tem um Rol maior do que existia, onde está a relação com a garantia de
cobertura para os planos antigos? Por exemplo, o “stent” coronário. Como fica? Tem
cobertura?

Arlindo de Almeida: O “stent” coronário, por exemplo, não está no contrato antigo.É
óbvio. Não existia esse tipo de procedimento há dez, vinte anos atrás. Não existe um
Rol de procedimento para contratos antigos.

Antonio Cordeiro: A ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, não deveria


também fazer um rol de procedimentos para contratos antigos? Ficou ao Deus dará ?

Arlindo de Almeida: Não... não pode ! O Supremo Tribunal Federal considerou os


contratos antigos válidos. Considerou o princípio do Direito adquirido que está na
nossa Constituição. A ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, queria que
todo mundo migrasse e os órgãos de Defesa do Consumidor, brigaram na justiça,
dizendo que não eram obrigados e realmente acabou vencendo essa idéia. Os
aumentos ou reajustes ficariam fora de propósito.

Antonio Cordeiro: Qual a estimativa de aumento?

Arlindo de Almeida: Eles já puseram 21 % e tiraram o produto do mercado.

243
Antonio Cordeiro: O meu contrato é antigo não tem esses novo Rol de
procedimentos. Como é que fica ?

Arlindo de Almeida: Vou te dar outro exemplo. Antigamente não tinha o exame de
Pet Scan ...ora, nem existia, é tecnologia recente. Não dá para fazer nada. Não se
pode mexer em nada por causa do ADIN. O Supremo Tribunal Federal considerou os
contratos antigos válidos... por quê ? É um princípio básico da Constituição... a lei não
volta prá trás. Há uns tempos passados a ANS queria que todo mundo migrasse, mas
os reajustes fizeram com que os órgãos de defesa dos consumidores, se insurgissem
e acabou vencendo essa idéia.
Mas se pensar bem, alguém tem interesse de mudar ? Você com o seu Plano
Internacional, hospitalar, antigo da Golden Cross e que depois virou Bradesco, tem
interesse de mudar, por exemplo?

Antonio Cordeiro: Não, porque o Bradesco pediu na época 82% de aumento...

Arlindo de Almeida: E agora – atualmente - eles vão pedir 300%. Se voltar a ter o
produto você acha que ele vai te dar 21% de aumento? O Bradesco nem tem mais o
produto. Havia uma variedade muito grande de contratos. Havia contratos que se
chamavam de compreensivo - que era de seguradora – e que cobria todo tipo de
transplantes e havia contratos que só cobriam exames. É muita diversidade. É
impraticável, é impossível ajustar tudo isso. Quem tinha que migrar já migrou. As
operadoras, nesses anos ofereceram as migrações e algumas vantagens. Agora
acabou.

Antonio Cordeiro: Será que acabou o interesse?

Arlindo de Almeida: Todo ano as operadoras oferecem algumas vantagens, como


por exemplo, o cliente não ter que cumprir carências, etc. Quem não migrou é porque
não quer mesmo ou tem um contrato como o seu que é especial e diferenciado. Você
não quer migrar, com certeza. Tente procurar um contrato igual ao seu e você vai ver
quanto custa. O seu contrato por exemplo, na Omint, que é uma excelente empresa,
vai custar R$ 4.000,00 por mês. Eles têm interesse em migrações, afinal, nenhuma
operadora quer ficar toda hora no Fórum discutindo Rol de procedimentos.

Antonio Cordeiro: Será que a ANS vai fazer outras tentativas de migração?

Arlindo de Almeida: Acho que não. Não vai dar o resultado que eles pretendem. Da
outra vez já não deu. Vai ser muito pequena a adesão embora seja de uma
concentração de risco muito grande. Sabe como foi feito ? Por grupo familiar. É uma
pessoa só que vai migrar. Isso não dá certo. Só quem estiver na rua da amargura é
que vai migrar.

Antonio Cordeiro: Quantas pessoas ainda constam com planos antigos? Com
contratos antes de 1999.?

Arlindo de Almeida: 10% do total – estimativa de quatro milhões de pessoas na


física, os planos empresariais tem poucas pessoas.

244
Antonio Cordeiro: Os planos coletivos continuam liberados de ambas as partes para
conversar, discutir, fazer reajustes também de acordo com a sinistralidade?

Arlindo de Almeida: Sim. A ANS elaborou uma Resolução, na qual só pode ter
reajuste uma vez por ano. Foi bom e foi ruim, porque hoje, as empresas não querem
correr riscos e partem de aumentos maiores nos planos empresariais, principalmente.
Antigamente, as empresas estimavam e depois, quando chegava próximo do mês de
julho fazia um outro reajuste por sinistralidade. Agora não! Agora as empresas tem
que fazer um único reajuste para o ano inteiro.

Antonio Cordeiro: Você acha justo esse sistema com faixas de idade para planos de
saúde ou isso poderia ser mais nivelado?

Arlindo de Almeida: Já está caro prá pessoa entrar no sistema! Se houver


nivelamento eu acho que complica. Esse negócio de pacto Inter geracional para a
saúde não é simples, é mais difícil. Em minha opinião, se nivelar, então você pode
impedir que a pessoa entre no sistema. O ideal é que ele entre numa idade jovem.
Assim ele vai cuidando e aprendendo a se cuidar na saúde.

Antonio Cordeiro: Falo isso porque o seguro de vida, por exemplo, é nivelado. Há
uma idade, porém, o pagamento é nivelado pelo prazo existente do seguro.
Arlindo de Almeida: mas paga mais caro e também depende da idade...

Antonio Cordeiro: Me responda o seguinte: qual é a sua opinião,até onde deve ir o


controle estatal sobre a saúde? Você acha que tem limite ?

Arlindo de Almeida: Penso da mesma forma que o Ministro da Fazenda do tempo do


Fernando Henrique. Ele dizia o seguinte: toda a sua regulamentação do setor privado
tem que ter embutido com ela uma bomba - de efeito programado - de tal maneira que
em alguns anos ela explodirá e deixará o sistema se acertar, daí prá frente sozinho.
Vai ter que se virar. A idéia era que, criando uma agência, como foi criada, com o
tempo, ela criará vida própria e andará com as próprias pernas. O Fernando Henrique,
dizia que ela, a ANS, no tempo iria se ajeitar naturalmente. Toda a regulamentação do
setor privado deve ter embutido esse tipo de bomba para estourar num certo tempo.
Traça o objetivo do caminho e deixa andar. No caso da legislação pública, há uma
tendência a criar tentáculos. No nosso caso, é necessário que haja uma flexibilização,
uma desregulamentação. O governo está interferindo demais!

Antonio Cordeiro: Se eu quiser, por exemplo, fazer um seguro só contra câncer


numa operadora de saúde, legalmente não é possível? I

Arlindo de Almeida: Não. Isso não é possível.

Antonio Cordeiro: Mas isso é um absurdo ...!

Arlindo de Almeida: Prá você interessa planejamento familiar ? É claro que não! Prá
que você quer cobertura de parto com a idade que você tem ? E sua mulher vai usar

245
DIU? Vai fazer laqueadura de trompa? Prá você interessa planos de planejamento
familiar? É claro que não. A ANS cresceu e complicou tudo. Nos EUA tem 7 pessoas
para controlar a saúde, que é a Entidade que controla todo o Sistema. No Brasil, a
ANS tem mais de 1.000 pessoas, e o governo quer cada vez mais ...Tem que fazer um
negócio customizado. Há coisas que não tem sentido! Esse rol de procedimentos
novos que foi embutido em junho do ano de 2010, por exemplo, são mais de 70
procedimentos novos de cobertura e isso foi imposto. As operadoras vão poder cobrar
no plano coletivo, mas não no individual e as operadoras só terão condições de cobrar
nos planos coletivos, isso somente quando vencer o contrato.
A ANS diz: depois a gente ajusta.No individual não poderá cobrar nunca essas
diferenças. E quanto aos custos? Eles impõem o valor percentual e não discutem, não
debatem.
A interferência exagerada do Estado acaba atrofiando a Saúde Privada. Atrofia todo o
sistema. Você sabia que nós somos o único país do mundo em que a saúde privada
participa com 55% e o governo 45%? Os estudos estão aqui comigo. Não foi a
Abramge que fez não. É um estudo que envolve tudo que tem algum tipo de relação
com saúde. Desde hospitais, empresas fabricantes, medicamentos, odontologia,
clínicas, equipamentos, etc. É um estudo completo. Em outros países a média é de
70% do volume de recursos é do estado e 30% iniciativa privada. Se pegar todo o
dinheiro que circula no Brasil de saúde, indústrias de medicamentos, farmácias que
vendem o produto, porque o governo não tem fábricas, vacinas, laboratórios, a área
particular está com mais de 50%.

Antonio Cordeiro: É muito interessante essa informação. É relevante! Ou seja, a área


privada tem uma força muito grande. Considerando tudo que circula de dinheiro em
saúde, a área particular abarca mais de 50%.

Arlindo de Almeida: É um número considerável não acha?

Antonio Cordeiro: São números que representam a potência que é a saúde privada.
Deveriam ter mais força política. Aliás, politicamente Como vocês estão no Congresso.
?
Arlindo de Almeida: No congresso é difícil. É complicado. Há sobre a saúde privada,
mais de 1.000 projetos, alguns que mexem com as Operadoras de plano de saúde,
mas a grande maioria é aquele projeto que quer dar algo no plano de saúde. Plano de
Saúde daqui prá frente vai dar isso, aquilo, etc. Esse negócio, essa mentalidade e o
apetite dos políticos para fazer projetos é brutal, querem dar tudo. É o mesmo que
acontece com a cultura, ticket, disso, ticket daquilo, meia entrada, transporte grátis, ...
vai dar isso, aquilo e mais não sei o quê. Precisamos é de projetos decentes, porque
o custo da assistência médica está a subir, mas um projeto sério para resolver muitas
pendências, ninguém faz. Isso nos leva estar sempre atentos lá no Congresso,
lutando para que não sejam aprovadas determinadas medidas que possam ser
prejudiciais ao nosso sistema. Olha, quando nós não funcionamos direito, pode crer
que o resto também não funciona.

Antonio Cordeiro: Arlindo, me diga uma coisa: e a portabilidade é uma utopia ?

246
Arlindo de Almeida: É uma idéia furada. É uma utopia. Não dá resultado. E tanto
provou que é uma utopia porque desde a Resolução só 1.100 pessoas mudaram. Só
1100. Entre mais de 40 milhões e isso porque havia um problema da Unimed e se
você juntar esse pessoal que chega-se a mais de 100.000 usuários eles poderiam
optar para onde quisessem e aí eles aprovaram a resolução. Mas, por iniciativa própria
é uma barca furada. Para você mudar de um plano de saúde para outro é muito
complicado. Há quanto tempo você tem o seu plano? Mais de 30 anos ? Por exemplo,
no seu caso, você está no Bradesco e já sabe quem é o seu clínico, seu pediatra,
como funciona, como pega a guia, como faz o reembolso, onde levar a carta de pedido
de reembolso, a rede, os hospitais que você freqüenta, você vai mudar ? Só se for um
caso muito específico, alguém que realmente precise trocar de Operadora ou coisa
assemelhada. Parece simples, mas não é. Isso me faz lembrar uma vez que o nosso
ex-presidente Lula, disse que quem não estava contente com as taxas de juros dos
bancos, deveria mudar de banco. É piada. Quem é que quer mudar de Banco ? Trocar
talão de cheques, mudar o endereço de agência, cartão de crédito, débito em conta,
pagamento agendado de contas de luz, água, telefone e outros débitos e créditos, que
os seus clientes já conhecem, etc... é bobagem!! E imagina os laços criados entre o
ginecologista, pediatra, sua mulher vai ficar nervosa, estressada com as mudanças.
Eu cansei de falar isso. Vai dar problema. Ninguém vai mudar de plano. É muito difícil.
Isso só vai acontecer se alguém estiver muito doente e que, por algum motivo, talvez
jurídico, precise mudar de plano.

Antonio Cordeiro: E o outro é o obrigado a aceitar ?

Arlindo de Almeida: Sim... é obrigado !!

Antonio Cordeiro: Arlindo, você conhece o sistema de capitation de odontologia, que


é por cabeça, não é? Você acha isso viável? Por exemplo, recebe 40 e repassa 14
para o consultório que corre o risco de atendimento de vários pacientes. Esse é o
capitation na área Odontológica. Tudo bem? Gostaria de saber a sua opinião, se você
acha possível fazer o capitation para a Saúde ou na Medicina de grupo? Digamos, por
exemplo, que eu tenho uma operadora que recebe por cabeça e quer repassar para
algum hospital, por exemplo, por cabeça. Digamos 10.000 clientes e recebo R$
1.500,00 por cabeça e vou enviar R$ 1.000,00 para quem corre o risco de
atendimento. Entendeu? Você considera isso viável na Saúde Suplementar ?

Arlindo de Almeida: Sim, acho que é possível!

Antonio Cordeiro: Porque então não tem capitation no Brasil? Eu pelo menos não
conheço nenhum.

Arlindo de Almeida: Tem sim! O que não existe é uma capitation total. Nos EUA eles
fazem um capitation total. Eles congregam um grupo de médicos e a Operadora
repassa para um grupo de médicos 70% do que nós – os operadores – por exemplo,
recebermos. É uma negociação. As empresas ou o grupo de médicos topam o
negócio. Aqui não chegamos a fazer isso. Lá nos EUA existe esse tipo de negócio.
Nos EUA a Medicina de Grupo é exatamente isso. Aqui não dá para fazer esse tipo de
negociação, por causa da forma em que a Saúde Privada está organizada. Aqui no

247
Brasil nós não temos isso, mas dá para fazer o capitation por especialidade. Aí sim, o
negócio fica bom prá todo mundo.

Antonio Cordeiro: Mas como é que se faz isso ?

Arlindo de Almeida: Por exemplo, nós tínhamos uma empresa que tinha 50.000
usuários e obviamente tem o histórico de quanto você gastou em Pediatria e
ortopedia. Digamos que o Operador deixa essa clínica como responsável por essa
população de 50.000 pessoas para correr os riscos de Ortopedia. Por exemplo: tudo
que acontecer aqui na Operadora de Ortopedia é problema dessa clínica. Os
pacientes serão indicados para ir lá. Isso funciona.

Antonio Cordeiro: E foi boa a experiência ?

Arlindo de Almeida: Sabe o que aconteceu? Resultado excelente! Caiu


violentamente o custo. A Operadora gastou a mesma coisa e o médico ganha muito
mais porque há uma concentração de risco e de trabalho, clínico, de traumatologia e
cirurgia.

Antonio Cordeiro: poderia ser, por exemplo, no ramo de Neurologia?

Arlindo de Almeida: Sim, é possível. Quando se faz o capitation são necessários


alguns cuidados. Um dos cuidados é com a qualidade dos serviços. Negar
atendimento, por exemplo, para ganhar mais é um erro. Deve-se fazer uma pesquisa
constante no setor, pois, se um inescrupuloso começa a dar falhas no atendimento aí
dá problema sério. Tem que fazer pesquisa constante com relação ao atendimento,
verificar se os clientes estão aprovando, se os usuários estão felizes com os serviços.
O capitation faz a clínica trabalhar bem, porque ele participa do risco. Toma cuidados,
etc...negar atendimento para ganhar mais dá pane no sistema. Os casos que conheci
para clínicas de Ortopedia e Pediatria, foram sucesso. Aprovação foi formidável.

Antonio Cordeiro: Então ‘em tese’ o capitation dá para fazer em todas as áreas?

Arlindo de Almeida: Em tese não, dá para fazer em qualquer área. A Intermédica


trabalha assim...

Antonio Cordeiro: Eu não sabia. Em Oncologia, por exemplo dá para fazer ?

Arlindo de Almeida: Bem, aí é um negócio complexo... é fogo!

Antonio Cordeiro: Por quê ?

Arlindo de Almeida: Por exemplo, nesse ramo, o que os Operadores devem fazer é o
seu serviço próprio de Oncologia e eles mesmos comprarem os medicamentos, pois
isso é um problema. Oncologia e Ortopedia os preços são absurdos. Paga-se de 7 a
10 vezes o que se paga lá fora do Brasil. O Brasil paga muito caro.

Antonio Cordeiro: Qual outra especialidade que dá para fazer o capitation?

248
Arlindo de Almeida: Pediatria, cirurgia específica, hospitais infantis especializados, é
bom para fazer capitation... Dá para fazer uma rede de médicos, clínicas, hospitais
especializados Quando você pega um cirurgião infantil, vai incluir tudo. Desde a
consulta, exames e se necessário até a cirurgia, pós-operatório. Agora, pensar em
negociar com um hospital para pegar tudo, no Brasil, é complicado.

Antonio Cordeiro: Concordo, eles ainda não estão preparados... Continuando nossa
conversa, gostaria de saber o que você achou da implantação do Estatuto do Idoso.
Isso foi mais um complicador? Ou foi benéfico para a população?

Arlindo de Almeida: Na minha opinião foi a coisa mais perniciosa que existiu para os
idosos!

Antonio Cordeiro: Por quê ?

Arlindo de Almeida: É simples. Quando ele tinha 60 anos ele pagava x e com 65 ele
pagava x+y e com 70 ele pagava um pouco mais. Era muito mais lógico. O que as
operadoras fizeram? Preço máximo a partir de 59 anos. Agora as seguradoras cobram
por antecipação, ou seja, a partir de 59 anos. Foi todo mundo para cima em termos de
preço. Claro que isso acontece nos Planos Coletivos. No individual para o Idoso o
negócio ficou melhor, mas para quem já tinha o Plano. Pegue os dados de outros
países. O Chile, por exemplo, dá desconto para a empresa que fornece planos de
saúde aos seus funcionários. No Chile a saúde privada é fantástica. No Brasil, ele
paga os dois, o INSS, o plano de Saúde e utiliza um só na grande maioria das vezes.
Eu sugiro, por exemplo, um desconto no INSS para quem tem Plano de Saúde. No
Chile eles pagam x% da folha salarial e ele sabe para onde vai o dinheiro dele. Ou vai
para a iniciativa privada ou vai para o Estado. E aí a pessoa põe mais um pouco se for
necessário. Por outro lado, os juízes estão julgando os contratos antigos de pessoas
idosas com base no Código de Defesa do Consumidor, com base também no Estatuto
do Idoso. Os juízes estão proibindo também de fazer reajustes.

Antonio Cordeiro: Pelo que observo, você vê perigo de concentração de preços a


partir de 50 anos então?
Arlindo de Almeida: Sim...claro! Os custos não são muito diferentes até 59 anos. A
partir dos 60 anos os custos aumentam muito.

Antonio Cordeiro: Muitos sanitaristas acham que saúde não tem preço. Aliás, todo
mundo acha. Mas não se pode esquecer que saúde também tem custos e custos altos
porque, atualmente, 23% da população, ou um pouco mais, dependem de Planos de
Saúde, ou da Saúde privada. O que você acha então do artigo 196 da Constituição?

Arlindo de Almeida: O artigo 196 da Constituição é uma utopia também. Aconteceu


logo depois da queda do muro de Berlim, havia uma visão comunista sobre o assunto.
É o maior absurdo de que a saúde é um direito do cidadão e do dever do Estado. O
Estado têm obrigações sim e muitas, mas dessa forma você tira do cidadão a
obrigação de cuidar da sua saúde e da saúde dos outros. Essa é que deveria ser a
visão, na época, do Mário Covas, do Fernando Henrique e do Ulysses Guimarães que

249
foram os pais da Carta Magna. Chega de direitos. Vamos também dar obrigações. A
população tem o dever de cuidar da sua saúde e também da saúde dos outros, filhos,
netos, genros, enfim, de toda a família. Todos devem se preocupar, de forma coletiva,
para não se drogar, comer moderadamente, fazer exercício, não fazer sexo sem
segurança. Isso é aderência da população. Pegue um exemplo simples de epidemia,
por exemplo. No combate à Dengue, por exemplo, a população têm que participar,
caso contrário, não dá resultado. Isso sim é Dever do Estado e da população. Não
jogar lixo na rua, por exemplo, pois vai provocar inundações.

Antonio Cordeiro: O meu cardiologista comenta, que se houvesse água fluoretada


para toda a população ou água tratada você acabaria com 80% das doenças. São
coisas básicas que o Estado deveria fornecer e ainda não fornece a todos, mas a
Constituição prevê, não é verdade?

Arlindo de Almeida: E não é só isso..! O esgoto? De quem é a responsabilidade? Se


o governo se preocupasse em fazer só isso, ou seja, Saneamento Básico, que é a
colheita do esgoto e água encanada para todos, resolveria milhares de problemas da
saúde pública.

Antonio Cordeiro: Bem, estamos no final da entrevista. Gostaria de saber, como está
o clima geral da atividade privada na saúde, das Empresas de Medicina de Grupo. Há
consenso, há tranqüilidade, houve alguma pacificação, o que realmente acontece
atualmente?

Arlindo de Almeida: Nós achamos que o ano passado, 2011, a atividade de Medicina
de Grupo, cresceu 6,2% em relação a população de 2009. Isso foi um dado histórico
porque o crescimento estava em torno de 5%. Isso aconteceu devido ao crescimento
do país, não se pode negar isso. O Brasil passou pela crise muito mais suave do que
os outros países (Brics) e esse aumento do poder aquisitivo do povo, programas
sociais implantados pelo governo Lula, aquele programa: de Bolsa família. Tudo isso
foi bom para o nosso País. Mas temos ainda alguns problemas que precisam ser
analisados mais a longo prazo, como por exemplo, o envelhecimento da população.
Nós da Abramge, temos uma visão que, fazendo uma customização, havendo mais
compartilhamento, o governo participando, melhorando o SUS nós consideramos que
tudo irá bem. Nós sabemos que não adianta haver melhora só na área privada, tem
que existir uma melhora como um todo. Temos que acompanhar a alta tecnologia e
cuidar dos medicamentos. Estão cada vez mais caros. É preciso resolver essa
equação e fazer uma customização. O Estado tem que ter vagas, leitos, isso não pode
faltar.

Antonio Cordeiro: Qualquer hora vou convidá-lo a fazer uma palestra lá na PUC-SP.
Pode esperar.

Arlindo de Almeida: Eu fui muito na USP, eu tinha essa rotina, para mostrar como
estava e como será o mercado, mas faz tempo que eu não sou convidado...

Antonio Cordeiro: Muito obrigado pela entrevista.

250
251
Anexo III

Entrevista com Dr. Fábio Fonseca, ex-Diretor da ANS – Agência Nacional de


Saúde Suplementar, realizada por e-mail.

Comentário antes da pergunta:


A regulação de Saúde Suplementar vem sendo, desde o final dos anos 80, objeto da
produção acadêmica. As relações entre o Público e o Privado na saúde, intermediadas
direta ou indiretamente pelo Estado, desde a constituição das primeiras instituições
previdenciárias têm sido estudadas sob vários enfoques. As áreas de saúde coletiva,
economia, direito, sociologia e atuaria iluminam sob diversos enfoques o tema da
regulação na saúde. A UFRJ, que possui um convênio com a ANS para desenvolver
investigações sobre a regulação de saúde suplementar, pretende permanecer como
um ator relevante no debate sobre a saúde, envolvendo interesses diversos ou
conflitantes, através da produção de conhecimentos de fronteira, que exigirão, cada
vez mais, óticas plurais de análise.
Nesse sentido, o seminário “Relações entre o Público e o Privado: o Caso da Saúde
Suplementar”, nucleado pela apresentação para debate de parte da produção acadêmica do
Laboratório de Economia Política da Saúde da UFRJ, contribui para aprofundar e estimular a
reflexão sobre o tema.
01)-Pergunta:

Dado a natureza social dos serviços de saúde como poderá haver integração entre as
ações de saúde do sistema público e do sub-sistema privado.

a)- É possível o compartilhamento entre Saúde Pública e Saúde Privada? Quais são
as proposições, caso elas existam. Houve sugestões em passado recente? Lembra-se
de alguma?
b)- Em resumo, como às ações governamentais - representadas pela ANS - podem
auxiliar na cooperação do sistema publico e privado em prol do financiamento, da
prestação e da utilização dos serviços de saúde.?
c)- Quais os fatores de convergência e divergência entre o sistema publico e privado ?
d)- Como promover a Universalização com ampliação de coberturas, financiamento
público e diferentes arranjos organizacionais integrando sistema publico e privado. Há
saídas ?

Resposta:

Não concordo necessariamente com o compartilhamento entre Saúde Pública e Saúde


Privada. Se assim o fosse estaríamos “não concordando” com a Constituição e criando
duas classes de brasileiros. Assim, entendo de que a Saúde promovida pelo Estado,
como obrigação Constitucional tem de se aprimorar e, de fato, atender os ditames da
Constituição Brasileira. A Suplementar deve focar especialmente nisso, ser
suplementar e quem quiser -sem precisar de - que a adquira e pague por ela.
02)- Pergunta:

252
Qual a percepção do mercado de Saúde Suplementar diante do modelo de
substituição do Estado pela iniciativa privada como muitos desejam. Não seria mais
eficiente e bom para a sociedade em geral uma relação de complementaridade?

Resposta:

Novamente voltamos aos assuntos da Constituição Brasileira. A Saúde, por força da


constituição é universal. Assim o sendo, a iniciativa privada poderia exercer algumas -
ou muitas - das atividades de saúde contratada por ou em nome do Estado Brasileiro.
Não entendo de que a eficiência surge por que é privado (temos muitos exemplos
disso), mas também reconheço de que o público tem de ser exercido com muito mais
eficiência (em todos os sentidos) do que vem sendo exercido.

03)- Pergunta:

Como o sistema privado pode contribuir ainda mais para aprimorar a gestão geral da
Saúde no Brasil? Você conhece proposições, premissas e idéias a respeito?

Resposta:

O sistema privado pode contribuir estudando e implementando ações de gestão que


podem, em seguida, serem utilizados pela gestão pública.

04)- Pergunta:

Como lidar com a Evolução da tecnologia / inflação médica e o controle de preços


impostos pelo Estado na iniciativa privada.?

Resposta à 3 e à 4 (complementos)

Ao Estado não cabe controlar preços, mas sim manter concorrência e fiscalização.
São esses dois pontos que mantém preços razoáveis. Veja: o Estado brasileiro não
faz direito nenhuma das duas coisas. Não trabalha para manter a concorrência na
Saúde Suplementar, nem tampouco fiscaliza de forma minimamente decente o
exercício da atividade (pelo menos essa foi a minha percepção enquanto estive na
ANS). Inflação médica e tecnologia: sempre qualquer tecnologia no início é cara, mas
com a maior disseminação de sua utilização e com a concorrência, sempre acaba
ficando mais barata.

05)- Pergunta:

A regulamentação de planos de saúde têm produzido para o setor privado um


desinteresse por planos individuais no médio e longo prazo isso:
a)- poderá ocasionar uma maior dificuldade de integração do publico e privado?
Não é a regulamentação que causa isso, mas a camisa de força dos reajustes de
preços. Novamente a parte da Saúde que a ANS existe para cuidar é e deve continuar
sendo suplementar enquanto que a saúde universal deve ser provida pelo Estado. Se

253
isso acontecesse de forma eficiente os controles de preços se dariam de forma
harmônica.
b)- Como harmonizar os interesses da população brasileira no modelo assistencial de
universalidade (publico), financiado por impostos e a iniciativa privada.
Na forma jurídica - constitucional - de hoje não cabe harmonização nenhuma. Ao
Estado, com as formas clássicas de financiamento, cabe prover a assistência. O resto
é suplementar e quem quiser compra e recebe esses serviços suplementarmente.
c)- Em sua opinião, a relação público/ privado é:
- Benéfica ou problemática

Resposta:

Pode ser muito benéfica desde que o Estado brasileiro exerça seu duplo papel (i)
prover a saúde na forma da Constituição e (ii) fiscalizar e garantir a concorrência da
suplementar.

- Pode ter um bom grau de integração ou de separação ?

Acho que as respostas anteriores eliminam essa questão.

- Podem ser Sistemas combinados ?

Novamente. As respostas anteriores cobrem essa questão.

- Há muitos desvios, discriminação e a regulação excessiva interfere em consumidores


e Operadoras ?

Um emaranhado deles, alguns explícitos e outros escondidos ou não plenamente


escritos ou informados. A regulamentação é excessiva? Em alguns casos sim. Em
outros não. A discriminação é atentatória aos bons costumes e as boas práticas de
gestão pública. Há muito que fazer e muito mais o que fazer melhor. Muito há também
o que deve deixar de ser feito.

Comentário antes da pergunta.

O deputado José Linhares (PP-CE) pediu aos participantes da audiência da Comissão


de Seguridade Social e Família que apresentem sugestões ao seu parecer sobre os
projetos de lei que ampliam a cobertura de transplantes pelos planos privados de
saúde (PLs 2642/03 e 4164/04). Linhares lembrou que incluiu uma emenda segundo a
qual a amplitude da cobertura de transplante deverá respeitar os contratos ou
convênios pactuados com os usuários.

06)- Pergunta:

O que foi proposto pelas Operadoras sobre o assunto acima ?

Resposta:

254
Desconheço. Mas acredito que uma vez contratado entre partes - operadoras e
beneficiários - a inserção de nova disposição contratual deve ser concomitante com a
discussão da remuneração prevista nesse contrato.

Comentário antes da pergunta.

As empresas de Planos de Saúde não podem restringir o tipo de tratamento


necessário ao consumidor, mesmo que a restrição esteja prevista em contrato. O
Superior Tribunal de Justiça (STJ), por uma decisão unânime dos cinco ministros da
Terceira Turma, considerou que a cláusula que limita a terapia é abusiva. A decisão
refere-se a uma ação movida em 1998 por contratante do plano, já falecido, contra a
Seguradora contratada. A empresa fora condenada em primeira instância, mas
recorrera.

07)- Pergunta:

O que você considera importante nessa decisão ? É válido limitar terapias ?

Resposta:

No mínimo serve para exemplificar a confusão reinante. Se a cláusula é abusiva talvez


a totalidade do contrato tenha de ser revisto. Aí entra o Estado dando o tom dessa
nova contratação e ofertando a saúde universal prevista na constituição.

Comentário antes da pergunta.

É necessário repensar o modelo de sistemas de saúde para se obter bons resultados.


Isso é o que defende o guru em estratégia competitiva e professor da Harvard
Business School, Michael Porter. Porter, autor do livro "Repensando a Saúde",
defende um novo jeito de olhar o setor, tendo a competição baseada em valor como
princípio. "O valor tem que ser baseado nos resultados obtidos na melhora do paciente
em relação ao dinheiro investido. Enquanto o foco não for esse, todo o sistema de
saúde terá soma zero", afirma.

08)- Pergunta:

Quais os pontos de vista das Operadoras, ou seu pessoal, face à visão de Michael
Porter. ?

Resposta:

Totalmente afeta a situação americana que é integralmente diferente da brasileira.

09)- Pergunta:

Você considera que o Capitation pode ser aplicado em Planos de Saúde no Brasil ?

255
Resposta:

Inexiste dificuldades na aplicação do captation que até hoje não foi aplicado
exclusivamente por conta da falta de percepção de ganho financeiro sobre o que se
pretende.
10)- Pergunta:
Na sua opinião a ANS será bem sucedida nos próximos anos ? O que se espera dela
em termos de decisões fundamentais ?
Resposta:
As condições para que a ANS seja bem sucedida não estão presentes. Primeiramente
precisamos perguntar “para quem” ela será bem sucedida. Nos moldes atuais com
certeza não é para os beneficiários.
Em segundo lugar é essencial que a ANS veja e atue sobre sua dupla função (i)
promover a concorrência (como forma de “normalizar” preços e (ii) promover a efetiva
fiscalização do sistema de saúde suplementar. Não podemos sair de uma percepção
da Diretoria anterior onde a ANS é um braço do Estado e as Operadoras são más e
tem a “obrigação” de prover serviços cuja contratação não aconteceu, e cair na
percepção da Diretoria atual que pelo menos “parece” não agir, mas tão somente
esperar que os maiores assimilem os menores.
11)- Pergunta:
Você considera que o tratamento dado pela ANS a grandes empresas, médias e
pequenas Operadoras deve ser o mesmo ?
Resposta:
O Brasil é um país muito grande, heterogêneo e complexo para que tratamento igual
para todos seja feito. Ao mesmo tempo tratar diferentemente é muito difícil e demanda
extrema competência espírito público. Acho sim que operadoras pequenas em cidades
pequenas e médias onde inexista a ação de outras operadoras devem ser “vistas” com
muito cuidado e atenção. Ao mesmo tempo a forma jurídica das operadoras deve ser
levada em consideração pois, na prática, a ação de cada tipo (seguradoras, medicina
de grupo, cooperativas é completamente diferente.
12)- Pergunta:
O que você considera viável na Saúde Filantrópica ?
Resposta:
Tendo certeza de que a Filantropia é importante e tem papel essencial a exercer.
Entretanto em temos numéricos tem de ser alguma coisa residual e pontual e não uma
forma de agir. A principal filantropia tem de ser feita pelo Estado.

Grato pela entrevista:


Prof. Antonio Cordeiro Filho
Abril/2011

256
Bibliografia

ABRAMGE - Associação Brasileira de Medicina de Grupo. (30/04/2004). Hyperlink -


http://www.abramge.com.br

ABRANCHES, Ana Lucia - Mercado critica monopólio. Seguros & Riscos, São Paulo,
Technic Press, 9 (78): 6-7, abr. 1994.

ABRASPE - Associação Brasileira dos Serviços Assistenciais de Saúde Próprios de


Empresas. (2003). HYPERLINK "http://www.abraspe.org.br" - acessado em
29/11/2008

ACIDENTE de trabalho está voltando ao setor privado. Revista de seguro, Rio de


Janeiro, FENASEG, 72 (793): 40-1, mar./abr.1991.

ACIDENTES de trabalho na América. Seguro Moderno, Rio de Janeiro, Perfil, 5 (19):


42, out. 1996.

ACIDENTES do trabalho: gestão privada é viável. Previdência & Seguros, Rio de


Janeiro, SINCOR, 24-5, fev. 1996.

ACIOLE, Giovani Gurgel – A saúde no Brasil – Cartografias do público e do privado –


Editora Hucitec – Campinas – São Paulo – 2006.

AGÊNCIA Nacional de Saúde Suplementar - Evolução e Desafios da Regulação do


Setor de Saúde Suplementar - Informação e referências - elaboração - RJ - Série ANS
4 - Subsídios ao Fórum de Saúde Suplementar - 2003 - Januário Montone.

ALMEIDA, Célia. O mercado privado de serviços de saúde no Brasil: panorama atual e


tendências da assistência Médica Suplementar. Brasília. IPEA - 1998.

AMORIM, Maria Cristina e Perillo, Eduardo Bueno da Fonseca – (org) – “Para


entender a saúde no Brasil 2” – Editora LCTE – 2009 - e “Para entender a saúde no
Brasil - 2006

AMORIM, Maria Cristina Sanches, PERILLO, Eduardo Bueno da Fonseca - Artigo


Gazeta Mercantil – “A Política Econômica e a crise da saúde” - Publicação em
05/04/2004.

ANDRADE M, Lisboa M. Sistema privado de seguro-saúde: - lições do caso


americano. EPGE Ensaios Econômicos - 2000; 382.

ANDRADE, Luz Odorico Monteiro – “SUS passo a passo” – Edit. Hucitec\2001

ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar - (25/05/2004). HYPERLINK


"http://www.ans.saude.gov.br"

ANTONINI B. - Modelos de gestão de “auditoria médica” em organizações de saúde


do Estado de São Paulo Dissertação de Mestrado - São Paulo (SP): Fundação Getúlio
Vargas - EAESP; 2003.

257
ANTUNES, José Leopoldo Ferreira – “Hospital – Instituição e História Social” – Letras
& Letras - 1991

ARANTES LL. - Um estudo sobre parâmetros para a oferta de serviços de saúde:


dimensionamento nos planos de assistência à saúde [dissertação]. Rio de Janeiro
(RJ): - ENSP/Fiocruz; 2004.

BAHIA, Ligia - Cadernos de Saúde da A.N.S - ano 2000

BAHIA, Ligia. - Mudanças e padrões das relações público-privado; seguros e planos


de saúde no Brasil. RJ - 1999 (Tese de Doutorado). Escola Nacional de Saúde Pública
da Fundação Oswaldo Cruz.

BALZAN MV. - O perfil dos recursos humanos do setor de faturamento e seu


desempenho na auditoria de contas de serviços médico-hospitalares - Dissertação de
mestrado - São Paulo (SP): Fundação Getúlio Vargas/ -EAESP; 2000.

BANCHER A. - Medicina preventiva no setor suplementar de saúde: estudo das ações


e programas existentes e das motivações para sua implantação [dissertação]. São -
Paulo (SP): Fundação Getúlio Vargas/EAESP; 2004.

BANDEIRA, Moniz – 1973 – “Cartéis e Desnacionalização” – Editora – Civilização


Brasileira.

BARROS, Barreto, J. – “Bases para organização da luta anti-tuberculose em face do


momento epidemiológico” – arq. Higienista – RJ – v. 10 – n.1 – p. 7-79 – 1940 (Dados
da Dissertação de Mestrado de Massako Iyda em 1993 na Faculdade de saúde
Pública da USP).

BASTOS, Lilia da Rocha, PAIXÃO, Lyra, FERNANDES, Lucia Monteiro, DELUIZ,


Neise - Manual para a elaboração de projetos e relatórios de pesquisa, teses,
dissertações e monografias. 5a. Edição - Universidade Federal do Rio de Janeiro - 5a.
Edição - Editora LTC - Livros técnicos e científicos.

BENKO L. PPOs get turn under the microscope. Mod Healthc 2000; 30(23): 58.

BENKO L. PPOs get turn under the microscope. ModHealthc 2000; 30(23): 58.

BERLINGUER, GIOVANNI – “Medicina e Política” – Hucitec – 1978.

BOBBIO, N. “Qual Socialismo?” – Debate sobre uma alternativa – RJ – Editora Paz e


Terra – 1987 – 2ª. Edição.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 13ª. Edição. Malheiros Editores,


2003. Pág. 601.

BOREL, Émile – várias obras - “Élements de La Théorie des Probabilités, Paris, H.


Hermans, ET Cie. 1924 – “Le Hasard” - Troisiéme Edition, Paris, 1914 – Alcan – “Les
Probabilités ET La Vie” – Treizième Mille. 1946 – Coleção “Que Sais-je?” – Paris –
“Probabilité ET Certitude – Coleção “Que Sais-je?” – 1950 – Paris.

258
BOSCHETTI, Ivanete. Assistência Social no Brasil: um direito entre originalidade e
conservadorismo. 2ª ed. Brasília, Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Seguridade
Social e Trabalho – GESST/ Depto.de S.Social – SER UnB, CNPQ, 2003 (Cap 3).

BRAGA, J. C.: Dimensões econômicas e sociais do mercado de assistência


suplementar. Texto base da 2ª Oficina de Trabalho 2 – ANS – Disponível em:
<ww.ans.gov.br/portal/upload/forum_saude/forum_bibliografias/financiamentodosetor/
EE1.pdf>. Acesso: 25/08/2004.

BRASIL - Ministério da Saúde. Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).


Programa de qualificação da saúde suplementar. [acessado 2006 Fev 21]. - Disponível
em: http://www.ans.gov.br/portal/site/_qualificacao/pdf/texto_base.pdf

BRASIL - Ministério da Saúde. Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).


Programa de qualificação da saúde suplementar. [acessado 2006 Fev 21]. - Disponível
em: http://www.ans.gov.br/portal/site/ _qualificacao/pdf/apresentacao_2fase.pdf

BRASIL - Ministério da Saúde. Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Troca


de Informação em Saúde Suplementar (TISS). [acessado 2006 Fev 14].

BRASIL - Ministério da Saúde. Agência Nacional de Saúde Suplementar.“Duas faces


da mesma moeda: micro regulação e modelos assistenciais em saúde suplementar” /
Agência Nacional de Saúde Suplementar. - RJ-2005. - ISBN 85-334-0988-5

Brasil - Ministério da Saúde. Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).


Qualificação da Saúde Suplementar – Nova perspectiva no processo de regulação.
[acessado 2006 Fev 15]. Disponível em:

BRASIL. - Indicadores da gestão municipal da política de assistência social no Brasil


2005/2006. VI Conferência Nacional de Assistência Social, MDS/CNAS/PUCSP.
Brasília, dezembro de 2007.

CAMPELO , Tânia - Acidente do trabalho : Brasil é campeão. Seguros & Riscos, São
Paulo, Technic Press, 9 (78): 8-11, abr.- 1994.

CAMPOS C. Um estudo das relações entre operadoras de plano de assistência à


saúde e prestadores de serviço - [trabalho de conclusão]. Porto Alegre (RS): Escola de
Engenharia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2004.

CANOTILHO, José Gomes – Direito Constitucional e Teoria da Constituição – 7ª.


Edição – Editora Almedina – Portugal – 2008 (Prof. Catedrático de Direito
Constitucional da Universidade de Coimbra.

CARVALHO, Isabel – “ONG’s no Brasil – uma história e muitas histórias” – RJ – 2001


– Mimeo.

CASTRO, - UFJF/ IMS-UERJ - artigo pág.1 - acessado em 28/02/2006 -


http://www.abres.cict.fiocruz.br/docs/2.pdf

259
CASTRO, Maria Helena Leal - UFJF/ IMS-UERJ - artigo pág.1 - acessado em
28/02/2006 http://www.abres.cict.fiocruz.br/docs/2.pdf

CATA PRETA, Horácio L.N. - Gerenciamento de operadoras de planos privados de


assistência à saúde - RJ - Fundación MAPFRE Estúdios/FUNENSEG, 2004

CBA (Consórcio Brasileiro de Acreditação). Definição de acreditação. [acessado 2006


Mar 30]. Disponível em: http://www.cbacred.org.br/acreditacao.php

CFM - Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM nº 1.614/2001. [acessado 2006


Mai 02]. Disponível em: http://www.portalmedico.org.br/ -
resolucoes/cfm/2001/1614_2001.htm.

CINTRA, Fernando Pimentel – “O Princípio da subsidiariedade no Direito


Administrativo” – Tese – Faculdade de Direito – USP – 1991.
COELHO, Maria Inês Zampolim e Messias, Maria do Carmo – ano 2009 - Livro
“Iamspe – Traços Históricos e Vocação” . Publicação do próprio Iamspe.

COELHO, Maria Inês Zampollim e MESSIAS, Maria do Carmo - IAMSPE – “Traços


Históricos e Vocação”

COHN, Amélia ; ELIAS, Paulo Eduardo M. - Saúde no Brasil - Políticas e Organização


de Serviços - São Paulo - Editora Cortez - CEDEC - 2001 - 4a. Edição

COHN, Amélia ; NUNES, Edson ; JACOBI, Pedro R. e KARSCH, Ursula S. - A Saúde


como Direito e como Serviço – São Paulo - Editora Cortez –2a. Edição – 1999.

Congresso ABRAMGE - 9.° - Dias 22 e 23 de novembro de 2001 - Hotel Inter-


Continental - Rio de Janeiro - Estratégias para o Crescimento Sustentado.

CORDEIRO, ANTONIO FILHO – Cálculo Atuarial Aplicado – Editora Atlas - 2009

CORDEIRO, J.Lucas. “Gasto federal com Assistência Social e suas fontes de


financiamento”. Revista Serviço Social e Sociedade, no 62, São Paulo, Cortez Editora,
2000.

COTTA, Rosângela Minardi Mitre - MENDES, Fabio Faria - MUNIZ, José Roberto -
Descentralização das Políticas Públicas de Saúde - do Imaginário ao Real - Editora
UFV - Universidade Federal de Viçosa - 1998 - 148pag.

CREMESP – Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo - Código de


Ética Médica – Textos Legais sobre ética, direitos e deveres dos médicos e Pacientes
- 2001.

D’ORSI, Eleonora - artigo que faz parte da Biblioteca da ANS - “Doenças e lesões
pré-existentes e alta complexidade: situação atual e papel da ANS”. Acesso pelo site
da própria ANS.

DANTAS, Humberto - “Democracia e Saúde no Brasil”: uma realidade possível (>>)


Editora Paulus - 2006

260
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella – “Parcerias na administração pública: concessão,
permissão, franquia, terceirização e outras formas” – 3ª. Edição – São Paulo – Atlas, -
1999.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella – “Uso Privativo do bem público por particular” –
Revista dos Tribunais – SP – 1983

DONNER, Klaus – História Social de la Psiquiatria – Livro “Cidadãos e Loucos” –


Ciudadanos y Locos – Madri - Editora Taurus - Ano: 1974

DOWBOR, Ladislau - O que acontece com o trabalho? Senac - São Paulo - 2004
(Série Ponto Futuro)

ERLICH, Paul R. - The Population Bomb - A bomba demográfica - 1968 – Editora da


Universidade de Stanford.

ESCRIVÃO Jr. A. Uso de indicadores de saúde na gestão de hospitais públicos da


região metropolitana de São Paulo - São Paulo: FGV-EAESP; 2004. (Relatórios de
pesquisa, - nº 9/2.004).

ESCRIVÃO Junior, A. & Koyama, M. F. - Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional


de Saúde Suplementar (ANS). Consulta sobre os dados de assistência à saúde e SIP.
[acessado 2006 Set 30]. Dadossobresip.asp

FERNANDES, Rubem Cesar – “Privado porém público: o terceiro setor na América


Latina” – RJ – Relume – Dumará, 1994 – Editora Civicus – 2ª. Edição – Aliança
Mundial para a participação dos cidadãos -

FIOCRUZ – Fundação Oswaldo Cruz – Memória da Poliomielite – 31 Depoimentos


Orais – 2005 – Coordenação: Dilene Raimundo do Nascimento -

FOLHA de São Paulo em artigo publicado em:


http://www.cprcorretora.com/noticias_038.asp - acessado em 21/05/2005.

FUNDAÇÃO Getúlio Vargas - Saúde e Previdência Social - Desafios para o Terceiro


Milênio - Editora Pearson Education - 2003 - Organizadores: Fátima Bayma e Istvan
Kasznar.

FUNENSEG - FUNDAÇÃO ESCOLA NACIONAL DE SEGUROS - Caderno de


Seguros - Coletânea de 1981 a 2001 - Riscos Pessoais, Vida, Saúde, Acidentes do
Trabalho, Previdência Privada.

GIFFONI, R.M. – “Assistência médica e relações de trabalho na empresa: o modelo de


convênio com a Previdência Social – 1991 – Dissertação Mestrado – São Paulo –
USP.

GIL, Antonio Carlos - Como elaborar Projetos de Pesquisa - Atlas - 1996 - 3a. Edição.

GIUSTI, Miriam Petri Lima de Jesus – “Direito da seguridade social” – Editora Pillares,
2008.

261
GLOBO.com.Saúde, in: Clipping sobre Planos de Saúde - acessado na edição de
26/12/2000 - Maria Helena Leal Castro - UFJF/ IMS-UERJ - artigo pág.1 - acessado
em 28/02/2006

GLOBO.com.Saúde, in: Clipping sobre Planos de Saúde - acessado na edição de


26/12/2000

GOMES, Laurentino – “1822” – Editora Nova Fronteira – RJ – 2010.

GONDAR, Jônio. Seguro de Stop Loss para Planos de Saúde. Seguros e Riscos
número 145 - abril de 2000.

GORDILHO, A. et al. Desafios a serem enfrentados no terceiro milênio pelo setor de


Saúde na atenção integral ao idoso. Rio de Janeiro, UnATI/UERJ, 2000.

GREGORI, Maria Stella – “Planos de Saúde – A Ótica da Proteção do Consumidor” –


2007

GUERRA, Lucyneles L. Estratégia de serviços das empresas que operam planos e


seguros de saúde no Brasil: cooperativas, empresas de Medicina de Grupo e
Seguradoras. Funenseg - RJ - ano: 1998 - COPPEAD - Tese de Mestrado.

GUIMARÃES, Luiz Carlos Forghieri – SFH – Sistema Financeiro da Habitação.


Revisão de Contratos. Quartier Latin – 2006

HEIMAN, Luiza Sterman, IBANHES, Lauro César, BARBOSA Renato (Organizadores).


“O Público e o Privado na Saúde” – artigos de Roberto Romano, Emir Simão Sader,
Laura Tavares Soares.

HARRIS, Marvin - A Natureza das Coisas Culturais RJ, Civilização Brasileira, 1968 e
Vacas, Porcos, Guerras e Bruxas: os Enigmas da Cultura. RJ, Civilização Brasileira,
1978.

HUBER M. Orosz - Health Expenditure Trends in OECD Countries, 1990-2001. Health


Care Financ Rev - 2003; 25(1):1-22.

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por amostras


de Domicílios (PNAD) - Acesso e utilização de Serviços de Saúde - ano de 1998
- RJ. IBGE/2000.

IBGE. PNAD Saúde – Acesso e utilização de serviços de saúde. [acessado 2006 Set
20]. - IBGE. Estatísticas da Saúde Assistência Médico-Sanitária -2005.

Instituto Brasileiro de Administração Municipal - IBAM, Necessidades Financeiras par


Fazer Face à Pressão Demográfica sobre os Municípios – Rio de Janeiro, 2001.

INSTITUTO POLIS/PUC-SP - Organização: Virginia Junqueira –Saúde na cidade de


São Paulo – 1989 a 2000 – 2 a. Edição Revisada - janeiro 2002 – Avaliação da política
municipal.

262
IYDA, Massako – Cem anos de Saúde Pública – A cidadania negada – Editora Unesp
- 1994

KOYAMA MF. Auditoria e qualidade dos planos de saúde: percepções de gestores de


operadoras da cidade de São Paulo a respeito do Programa de Qualificação da Saúde
Suplementar da ANS [dissertação]. São Paulo (SP): - EAESP/FGV; 2006.

KUTTNER, Robert no livro “Tudo à Venda: virtudes e limites dos mercados” - São
Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 82.

LAURENTI, Ruy ; JORGE, Maria Helena Prado de Mello - LEBRÃO, Maria Lúcia
;GOTLIEB, Sabina Lea Davidson - Estatísticas de Saúde - Editora Pedagógica e
Universitária - São Paulo - 2a. Edição.

LIMA, Dagoberto J.S. – Artigo Revista Medicina Social - número 152 - janeiro/1999 .

LOURENÇO, R.A & MOTTA, L. B. Prevenção de doenças e promoção de saúde na


terceira idade. In: VERAS, Renato P. (org.). Terceira Idade: Alternativas para uma
sociedade em transição. Rio de Janeiro, Relume-Dumará/UnATI-UERJ, 1999.

MALIK AM. Avaliação, qualidade, gestão... Para trabalhadores da área de saúde e


outros interessados. São Paulo: Ed. SENAC; 1996.

MALIK AM. Quem é o responsável pela qualidade na saúde. Revista de Saúde Pública
2005; 39(2): 351-64.

MARQUES, Marilia Bernardes – “Saúde pública, ética e mercado no entreato de dois


séculos” – Editora Brasiliense – 2005 – São Paulo.

MARSHALL, T.H. (1967) – Cidadania, Classe Social e Status. RJ – Zahar Editores.

MARTINELLI, Maria Lúcia – “Serviço social – Identidade e Alienação” – 8ª.Edição –


Editora Cortez – 2003.

MARX, K. & ENGELS. A ideologia alemã (I – Feuerbach). 9ª. Ed. São Paulo – Hucitec,
1993, 138 pp.

MARX, K. & ENGELS. Manifesto comunista. 1.a. reimp. São Paulo – Boitempo, 1998
[1848], 254 pp.

McGUIRRE A, Serra V. The Cost of Care: Is There an - Optimal Level of Expenditure?


Harvard International - Review 2005; 27:70-73.

MEDEIROS, Suzana Aparecida Rocha – “Autora do prefácio do Livro “Saúde na


Velhice” – Educ. – Fapesp – de Ruth Gelehrter da Costa”.

MEDICI, André C. A Economia política das reformas em Saúde. Porto Alegre - RGS -
IAHCS - ano 1997.

MENDES, Eugênio Villaça – “Distrito Sanitário” - “O processo social de mudança das


práticas sanitárias do SUS” – 1999.

263
MENICUCCI, Telma Maria Gonçalves – Público e Privado na Política de Assistência à
Saúde no Brasil – Editora Fiocruz – 2007 -

MERHY, Emerson Elias – 1985 – Editora Papirus – Campinas – “O capitalismo e a


saúde pública: emergência das práticas sanitárias no Estado de São Paulo” – Editora
Papirus – 1985.
MILAN, Gabriel Sperandio, UCS e TREZ, Guilherme, Unisinos – Pesquisa de
Satisfação: um modelo para planos de saúde. - RAE-eletrônica, v. 4, n. 2, Art. 17,
jul./dez. 2005
http://www.rae.com.br/eletronica/index.cfm?FuseAction=Artigo&ID=2165&Secao=ARTI
GOS&Volume=4&Numero=2&Ano=2005 (acessado em 07/09/2011).

Ministério da Fazenda. Gasto Social do Governo Central 2001 e 2002, Brasília,


novembro de 2003. Orçamento Social do Governo Federal – 2001 a 2004, abril de
2005. SIAFI – Sistema Integrado de Administração Financeira.

Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome. Análise Comparativa de


Programas de Proteção Social–1995 a 2003–Brasília, abril de 2004.

MIRANDA, Cláudio da Rocha - Artigo na revista Medicina Social - número 188 - pág.
28.

MONTEIRO, Carlos Augusto – (organizador) – 2ª. Edição – Editora Hucitec – 2000 –


SP.

MOREIRA ML. Cobertura e utilização de serviços de saúde suplementar no Estado de


São Paulo [dissertação]. - Rio de Janeiro (RJ): ENSP/Fiocruz; 2004.

NCQA. Pay for Performance Program 2006. [acessado 2006 Mai 15].Disponível em:
http://www.ncqa.org/ - Programs/P4P/main.htm

NCQA. The State of Health Care Quality: 2005. [acessado - 2006 Mai 02]. Disponível
em: http://www.ncqa.org/Communications/Publications/ncqaannuals.htm

NCQA. The State of Health Care Quality: 2005. [acessado em 2006 Mai 02].
Disponível em: http://www.ncqa.org/Communications/Publications/ncqaannuals.htm

NCQA. What is HEDIS? [acessado 2006 Mai 02]. - Disponível em:


http://www.ncqa.org/Programs/HEDIS/ index.htm

NEGRI, Barjas - Fundação Getúlio Vargas - Desafios para o Terceiro Milênio - Prentice
Hall - 2003 –

NETTO, A.R. – “O caminho para formação do Serviço Sanitário de São Paulo” – arq.
Hyg., São Paulo – v.7 – n. 14 – pág. 5-34 – 1942.

NICZ, Luiz Fernando. Administração de Planos de Saúde - São Paulo - Abrapp - ano
2000.

264
NOGUEIRA, Marco Aurélio – “O desafio de construir e consolidar direitos no mundo
globalizado” – Serviço Social – Saúde e sociedade – ano XXVI – julho\2005.

NOVAES HM. Avaliação de programas, serviços e tecnologias em saúde. Revista de


Saúde Pública 2000; - 34(5): 547-59.

OLIVEIRA, José Eduardo Dutra – Et all – “A desnutrição dos pobres e dos ricos” –
Editora Sarvier de Livros Médicos Ltda. 1996

ONRAM, A.R (2005. First published 1971), "The epidemiological transition: A theory of
the epidemiology of population change", The Milbank Quarterly 83 (4): 731–57,
http://www.milbank.org/quarterly/830418omran.pdf. Reprinted from The Milbank
Memorial Fund Quarterly 49 (No.4, Pt.1), 1971, pp.509–538 (Apud Monteiro - 2000).

PAGANO, Aúthos – Lições de Estatística – 2ª. edição – publicada pela Prefeitura


Municipal de São Paulo - 1947

PEREIRA, Luiz Carlos e GRAU, Nuria Cunill – (org). Fundação Getúlio Vargas – 1999
– CLAD – “O público não estatal na reforma do Estado”.

PEREIRA, Maria Dusolina Rovina Castro - Fraudes e má utilização no sistema de


saúde suplementar e os reflexos para o consumidor - RJ - Editora - Funenseg 2002 -
Caderno de Seguros - Dissertação de Mestrado em 2001

PINOTTI, JOSÉ ARISTODEMO – Ação e Reflexão – Política, Educação, Saúde –


Editora Papirus – Editora da Unicamp – 1986 - Campinas

PORTER, Michael; TEISBERG, Elizabeth – Repensando a Saúde: estratégias para


melhorar a qualidade e reduzir os custos. Porto Alegre – Bookman - 2007

REVISTA EXAME - 30/07/2004 - Olho na Saúde das Empresas - Exigir que todos os
planos de saúde forneçam todos os serviços médicos e controlar os preços pode levar
empresas e usuários à falência.

RIZZATO, Nunes Luiz Antonio. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor.


Editora Saraiva, 2000 – págs. 15, 16 e 17 (...)

RODRIGUES, Bichat de Almeida – “Fundamentos de Administração Sanitária” –


Publicação brasileira com apoio da USAID – 1967 – Livraria Freitas Bastos.

ROMANO, Roberto – “Brasil – Igreja contra Estado” – São Paulo – Kayrós, 1979.

ROMANO, Roberto – “Da Liberdade do cristão” – Martinho Lutero – São Paulo –


Unesp – 1998.

RONCATTI VLC. Relação entre os atributos de qualidade de um serviço de


reabilitação ambulatorial e os padrões do modelo de acreditação - Joint Commission
On Accreditation of Healthcare Organizations: a visão do cliente- [dissertação]. São
Paulo (SP): EAESP/FGV; 2002.

265
ROSEN, George – Uma história da Saúde Pública – Hucitec, 2006 – SP – 3ª. Edição -

SADER, Emir Simão – “Que Brasil é Esse?” – São Paulo – Editora Atual – ano 2000

SADER, Emir Simão – “A Vingança da História” – São Paulo – Boitempo Editorial –


2003.

SALAZAR, Andréa, RODRIGUES, Karina, SILVER, Lynn, DOLCI, Maria Inês R.


Landini - Guia do Consumidor - Planos de Saúde - Publicação do Idec - Instituto de
Defesa do Consumidor - São Paulo - 2000.

SANTOS FILHO, Lycurgo – Pequena História da Medicina Brasileira – Cadernos de


História – caderno 13 – 1980 – Editora Parma.

SANTOS IS. Planos privados de assistência à saúde no mundo do trabalho


[dissertação]. Rio de Janeiro (RJ): - ENSP/Fiocruz; 2000.

SBHM - Sociedade Brasileira da História da Medicina - HYPERLINK


"http://www.sbhm.org.br/" - acessado em 19/05/2005.

SCLIAR, Moacir – “Do mágico ao Social” – 1987 – L&PM – Editores S\A.

SIMONET D. Patient satisfaction under managed care.

SIMONET D. Patient satisfaction under managed care.- Int J Health Care Qual Assur
2005;18 (6/7): 424.NCQA. What is HEDIS? [acessado 2006 Mai 02].Disponível em:
http://www.ncqa.org/Programs/HEDIS/index.htm

STARFIELD, B. Atenção primária — Equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços


e tecnologia. Brasília: Unesco, Ministério da Saúde, 2002. Disponível em:
http://unesdoc.unesco.org/ulis/cgi-
bin/ulis.pl?catno=130805&set=4BBCA640_1_386&gp=1&mode=e&lin=1&ll=1

TAVARES, Gisele C. “O orçamento como instrumento de gestão, financiamento e


controle da Política de Assistência Social”. Cad.Est. Desenvolvimento Social em
Debate. n.2. Brasília: MDS-Textos V Conf. Nacional de Assistência Social, 2005.

TAVARES, Laura Soares – “O Desastre Social” – RJ – Edit. Record – 2003.

TERRA V. Mudança organizacional e implantação de um programa de qualidade em


hospital do município de São Paulo [dissertação]. São Paulo (SP): EAESP/FGV; -
2000.

TURIN, Eva - Arquidiocese de São Paulo - Conhecendo São Paulo - Dados sobre a
Cidade - Edições Loyola - São Paulo - 2002.

UNIMED DO BRASIL - Setembro/2004 -

UNIODONTO - Fevereiro/2004 -

VENDRAMINI, Luiz Fernando. Metodologia para Precificação de Planos de

266
Assistência à Saúde - Dissertação de Mestrado - Universidade de Extremadura -
Espanha - Faesp/IPCA - Brasil. - Agosto de 2001.

VERAS, R. P. et al. Crescimento da população idosa no Brasil - transformações e


conseqüências na sociedade. Rev. Saúde Pública, S.P., 21 (3): 225-31987.

VERGARA, Sylvia Constant - Projetos e Relatórios de Pesquisa em Administração -


Editora Atlas - 2000 - 3a. Edição.

VIEIRA, EVALDO – “Os Direitos e a Política Social” – Edit. Cortez – 2007 – 2ª. Edição

W.S. Prado – “Aplicação da vacina Sabin “ (1962)

WAGNER, E.S. Hanna Arendt & Karl Marx: O mundo do Trabalho. 2ª. Edição – Cotia:
Ateliê Editorial 2002.

WHIPPLE, GEORGE CHANDLER – “Vital Statistics – An Introduction to the Science of


Demography – 2nd. Edition, N. York, John Wiley & Sons Inc., 1923.

YAZBEK, MARIA CARMELITA – “Classes subalternas e Assistência Social” –


5ª.Edição – Cortez Editora – 2006.

Webgrafia

http://cmb.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=16&Itemid=30&limit=1
&limitstart=2 (História demográfica do Brasil em).

http://cmb.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=16&Itemid=30&limit=1
&limitstart=2 (acessado em 21/02/2009).

http://economia.uol.com.br/ultimas-noticias/infomoney/2010/02/26/numero-de-
beneficiarios-em-planos-privados-de-saude-chegou-a-52-mi-em-2009.jhtm

http://empreende.org.br/pdf/ONG's,%20OSCIP'S%20e%20Terceiro%20Setor/Evolu%C
3%A7%C3%A3o%20s%C3%B3cio
pol%C3%ADtica%20das%20ONGs%20no%20Brasil.pdf (acesso em 13.03.2011).

http://guiadoestudante.abril.com.br/estudar/historia/lepra-doenca-estigma-
434502.shtml (acessado em 14/07/2011).
http://historia_demografica.tripod.com/pop.pdf - História demográfica do Brasil em:

http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto-asp?id=2075 (acessado em 13/04/09)

http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/legislacao-
pfdc/docs_declaracoes/declar_dir_homem_cidadao.pdfhttp://www.sbhm.org.br/ -
acessado em 19/05/2005.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Aten%C3%A7%C3%A3o_prim%C3%A1ria_%C3%A0_sa%
C3%BAde (acessado em 27/07)2011).

http://ricardomontu.wordpress.com/2010/03/01/ (acessado em 04/07/2011).

267
http://saudeweb.com.br/12156/instituicoes-de-saude-alertam-para-regulacao-dos-
opmes/ (acessado em 07/07/2011).

http://www.abramge.com.br

http://www.abramge.com.br

http://www.abramge.com.br/download/assessoria.htm

http://www.abres.cict.fiocruz.br/docs/2.pdf

http://www.acponline.org/counseling/understandcapit.htm - acessado em dez/2005.

http://www.acponline.org/counseling/understandcapit.htm - acessado em dez/2005.

http://www.administradores.com.br/informe-se/artigos/autogestao-em-saude-
suplementar-um-modelo-estrategico-de-assistencia-a-saude-privada-em-
organizacoes-militares/11334/). (acessado em 04/07/2011).

http://www.ans.gov.br

http://www.ans.gov.br/portal/site

http://www.ans.gov.br/portal/site/_hotsite_tiss/f_materia_15254.htm

http://www.ans.gov.br/portal/site/_qualificacao/pdf/ - texto_base.pdf

http://www.ans.gov.br/portal/site/legislacao/legislacao_integra.asp?id_original=455

http://www.ans.gov.br/portal/site/legislacao/legislacao_integra.asp?id=64&id_original=
0

http://www.ans.gov.br/portal/site/legislacao/legislacao_integra.asp?id=62&id_original=
0

http://www.ans.gov.br/portal/site/perfil_operadoras/index.asp

http://www.metodista.br/cidadania/numero-31/os-dilemas-da-medicina-tecnologica

http://www.ans.gov.br/portal/site/perfil_operadoras/index.asp

http://www.apape.org.br/fs290703.htm - acessado em 20/05/2005

http://www.apape.org.br/fs290703.htm - acessado em 20/05/2005

http://www.apape.org.br/fs290703.htm - acessado em 20/05/2005

http://www.comunicacao.pro.br/artcon/movsocong.htm - acessado em 13.03.2011

http://www.cprcorretora.com/noticias_038.asp - acessado em 21/05/2005.

http://www.cprcorretora.com/noticias_038.asp - acessado em 21/05/2005.

268
http://www.cprcorretora.com/noticias_038.asp - acessado em 21/05/2005. Int J Health
Care Qual Assur 2005;18 (6/7): 424.

http://www.cqh.org.br/?q=node/336 em 07/07/2007

http://www.datasus.gov.br/cns/temas/tribuna/tribuna.htm - acessado em 10/11/2005.

http://www.datasus.gov.br/cns/temas/tribuna/tribuna.htm - acessado em 10/11/2005.

http://www.datasus.gov.br/cns/temas/tribuna/tribuna.htm - acessado em 10/11/2005.

http://www.datasus.gov.br/cns/temas/tribuna/tribuna.htm - acessado em 10/11/2005.

http://www.datasus.gov.br/cns/temas/tribuna/tribuna.htm - acessado em 10/11/2005.

http://www.dec.ufcg.edu.br/biografias/EdwiChad.htm (acessado em 15/07/2011).

http://www.deloitte.com/view/pt_BR/br/nossaempresa/historia/168a8d21091fb110VgnV
CM100000ba42f00aRCRD.htm - (acessado em 14/07/2011).

http://www.dhnet.org.br/direitos/sos/assist/acpromotor.html - acessado em 14/04/2004

http://www.dhnet.org.br/direitos/sos/assist/acpromotor.html - acessado em 14/04/2004

http://www.dhnet.org.br/direitos/sos/assist/acpromotor.html - acessado em 14/04/2004

http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/a126.htm

http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/a126.htm
http://www.fonasa.cl/prontus_fonasa/antialone.html?page=http://www.fonasa.cl/prontus
_fonasa/site/edic/base/port/que_es_fonasa.html ) - acessado em 27/07/2011).

http://www.helpsaude.com/sobre-Help-Saude/

http://www.ial.sp.gov.br/ (acessado em 13.03.2011). Instituto Adolfo Lutz

http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/
noticia_visualiza.php?id_noticia=370&id_pagina=1 ([acessado 2006 Set 20].)

http://www.inca.gov.br/

http://www.inca.gov.br/

http://www.inca.gov.br/ - (Instituto Nacional do Câncer).

http://www.institutoastrojildopereira.org.br/novosrumos/file_46/4a10.pdf

http://www.intersystems.com.br/isc/healthshare/requerimentos.csp?CSPCHD=001000
000003357dhoa1002873621608 - acesso 09/07/2007

http://www.managedcaremag.com/capitation.html - acessado em 22/12/2005.

269
http://www.managedcaremag.com/capitation.html - acessado em 22/12/2005.

http://www.medicina.ufrj.br/notíciasAntDet.asp. Acessado em 22/01/2006.

http://www.medicina.ufrj.br/notíciasAntDet.asp. Acessado em 22/01/2006

http://www.medicina.ufrj.br/notíciasAntDet.asp. Acessado em 22/01/2006.

http://www.plurall.com.br/novo/noticia.php?noticia_id=4400 (acessado em
07/07/2011).

http://www.portalhomecare.com.br/pagina.php?pagina=6 - acessado em 04/02/2006.

http://www.portalhomecare.com.br/pagina.php?pagina=6 - acessado em 04/02/2006.

http://www.portalhomecare.com.br/pagina.php?pagina=6 - acessado em 04/02/2006.

http://www.preventsenior.com.br/paginas/institucional.html

http://www.providencia.org.br/novidades.htm - Banco da Providência

http://www.salutis.com.br/cortesias/pgartinoticias.asp?idt=6>. Acesso em: 29/08/2004.


(Disponível – 02/05/1999).

http://www.sbhm.org.br/ - acessado em 19/05/2005

http://www.sbhm.org.br/ - acessado em 19/05/2005.

http://www.sbhm.org.br/ - acessado em 19/05/2005.

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-
42302002000400010&lng=&nrm=iso&tlng= (acesso em 25/07/2007).

http://www.segurado.com.br/saude_reajuste.asp - acessado em 28/02/2006.

http://www.segurado.com.br/saude_reajuste.asp - acessado em 28/02/2006.

http://www.segurado.com.br/saude_reajuste.asp - acessado em 28/02/2006.

http://www.ufrgs.br/bioetica/finlay.htm - Site: Experimentos sobre febre amarela –


Universidade Federal do RGS acessado em 04/07/2009

http://www.unb.br/fe/tef/filoesco/foucault/

http://www.unimed.com.br

http://www.unimed.com.br – Hyperlink

http://www.uniodonto.com.br

http://www.uniodonto.com.br" - Hyperlink

270
http://www1.folha.uol.com.br/folha/equilibrio/noticias/ult263u467278.shtml

http:://www.abramge.com.br/download/assessoria.htm

http://www.cqh.org.br/?q=node/336 ( acessado em 07/07/2007)

http://www.ans.gov.br/index.php/planos-de-saude-e-operadoras/tiss (acessado em
10/09/2011).

271

Você também pode gostar