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Studiq
Nobel FAPESP l"oÏl

frxfê- J-Y
lntroduçáo: Fatores Gerais da
Modernizaçâo do Móvel no Brasil

Ao abordarmos o processo de modernizaçáo do móvel no Brasil, é preciso


considerar alguns fatores que contribuíram significativamente para essa
direçáo. É necessário estabelecer certo recuo no tempo e considerar aspectos
enovaçáo
das
e

partiðÙlarmente arnodernizaçáo da arquitetura; e, finalmente, as relaçöes do


design brasileiro com o concretismo.
Antes de mais nada é fundamental considerar o patrimônio artesanal dos
Anio portaloalha em madeira. Museu da
lnconfidência. Ouro Preto. Minas Gerais. trabalhos em madeira, herança lusitana que marcou a evoluçáo da mobília e
(Foto Pedro Lobo.) dos interiores da casa brasileira. Ao lado do móvel importado diretamente da
metrópole e, mais tarde, da lnglaterra, da França, dos Estados Unidos, da
Alemanha e da Áustria, a produçáo de móveis foi se intensificando pelas máos
habilidosas de artistas e artesáos brasileiros e europeus que aqui se

Em geral, a produçáo desses artistas seguiu os princípios clássicos,


quase nada havendo de criaçáo local, destacando-se sobremaneira as
insistentes cópias de modelos europeus, que se distinguiam dos congêneres
apenas pelo uso de nossas madeiras2.
Com a.abertura dos portos, em 1808, a vinda da Corte e da Missão
Francesa para o país e, mais tarde, a assinatura de vários tratados comerciais,
decresceu a importaçáo de peças portuguesas. O Brasil começou a receber
móveis ingleses, franceses, austríacos, que influenciaram a produçáo local,
trazendo maior complexidade e riqueza de estilos3. Além disso, havia um clima
incipiente de transformaçáo econômica e de industrializaçáo qu'e, embora de
maneira muito acanhada, se orientava no sentido da criaçáo de móveis
industrializados.
Data desse período a introdução no Brasil das cadeiras austríacas
Thonet, de madeira curvada a fogoa, cujo sucesso entre nós foi gra¡de,
permanecendo, à semelhança de Mena, hábito característico, nos interiores de
bares e restaurantes. Em 1890 foi aberta no Rio de Janeiro a Companhia de
Móveis Curvados, com a finalidade de produzir em larga escala móveis que
Mesa-cômoda com gavetas. Museu da
lnconfidência. Ouro Preto. Minas Gera¡s. imitavam os de procedência austríaca, "empregando o huranhém macho e
(Foto Pedro Lobo.) outras madeiras" s.
Lucio Costa.
Desenhos de mobiliário luso-brasíleiro
(L. Costa, 1939.)
F
Cadeira de balanço com abano Raphael.1891
Pereda- Patente registrada no Brasil em
(Arquivo Nacional. Rio de Janeiro )
f-
I

Portanto, a partir da segunda metade do século XlX, a evoluçáo do


móvel no Brasil ganhou maior complexidade. Já havia um número expressivo
de marcenarias e fábricas que produzlam móveis em todos os estilos.
Foi nesse contexto que se destacaram as atividades dos Liceus de Artes
e ofícios, de cujas "oficinas de arte em made¡ra" saíram encomendas de vulto,
para mobiliar residências finas, e equipamentos para edifícios públicos. Além
da produçáo de mobília, os l¡ceus exerceram ¡mportante papel como centro de
formaçäo de artesáos qualificados6'
Mas já naquele final de século vinha ocorrendo o desaparecimento
gradativo da produção artesanal de móveis, com a mecanizaçâo que ganhava
terreno, facilitando os processos de fabricaçáo. Entretanto, a riqueza deste
patrimônio acumulado por mais de quatrocentos anos e o esmero da
máo-de-obra, associados à generosidade de nossa floraT, estabeleceram uma
verdadeira tradiçáo do móvel em madeira no Brasil, que voltará a emergir, com
muita força, na obra de alguns designers do século XX, particularmente, com a
produçáo de carlos Motta, Joaquim Tenreiro, José Zanine caldas, Maurício
Azeredo e Sérgio Rodrigues.

vocabulário fõrmal implantado nos anos anteriores.

17
J
@
t
Aforça motriz da modernizaçáo da cultura brasileira e a abertura
definitiva do país para o século XX, no âmbito das artes, foi, sem dúvida, a
realizaçáo da Semana de Arte Moderna, em Sáo Paulo'
Faz parte do espírito modernista de primeira hora a exoerimentaçáo, o
que levou muitos artistas a se manifestar através de diferentes meios de
expressáo, libertando-se da cristalizaçáo das formas acadêmicas. Assim, as
preocupaçóes dessa vanguarda incluíram experiências nos vários setores da
produçäo: literatura, dança, pintura, arquitetura, música e até desþn etc.
Vivendo tudo isso, Mário de Andrade (1 893-1945) estudou com familiaridade e
admirável clarezatemas de todas as áreas de nossa cultura, revelando uma
de suas "trezentas e cinqÜenta" faces, sempre apaixonadas pelas coisas das
nossas artes e cultura. O mais expressivo representante do movimento
moderno no Brasil talvez tenha concluído que náo bastava enunciar os
princípios desse movimento; era preciso pô-los em prática. Norteado por esse
espírito e por necessidades pessoais relativas ao equipamento doméstico,
Mário de Andrade acabou dando uma colaboraçáo muito singular ao móvel
brasileiro, no início dos anos 20, desenhando alguns móveis para sua própria
casa8. A¡nda que sua produçáo seja pequena e pouco original, muito próxima
do Atl-Déco,já prenuncia novos padróes estéticos para o móvel.
Aspecto do ¡nterior de câsa burguesa em Sáo
Outra iniciativa de Mário de Andrade no setor do mobiliário foi a
Paulo. (C. A. C. Lemos, 1985.)
realizaçao do Primeiro Concurso de Mobília Proletária no Brasil, durante sua
gestáo, perante o Departamento de Cultura da Prefeitura do Município de Sáo
Paulo, em 1936e. Ainda que as fontes pesquisadas náo tragam informações
conclusivas a respeito do concurso, é certo que sua realizaçáo foi orientada
pelo espírito de universalidade, modernizaçâo e integraçäo das artes10,
propugnadas por Mário de Andrade, que o levou a perambulaçoes até pela
área da moda e programaçáo gráfica11.
Ao referir os pioneiros do projeto modernista, devemos assinalar a
produçáo de Flávio de Rezende Carvalho (1899-1973) que, em seu primeiro
estúdio, em São Paulo, à rua Cristóváo Colombo, oferecia serviços de:
decoração de interiores, jardins modernistas, projetos de mobília, lustres,
pintura mural, painéis decorativos, projeto e execuçáo de cenárlos para teatro
e cinema, anúncios12. Dentre os pioneiros vale ainda destacar a importante
contribuiçáo do arquiteto Gregori Warchavchik, que reconhecia com muita
clarezaa importância do design e suas relações com a arquitetura. Segundo
ele, os princípios da grande indústria, a estandardizaçáo de portas e janelas,
ajudaráo o arquiteto a criar o "estilo do nosso tempo"13.
Essas experiências modernistas lançaram as bases para a reformulaçáo
dos espaços, dos programas arquitelônicos e do próprio móvel. A elas se
somaram os esforços empreendidos pela primeira geraçáo de arquitetos, que
Galeria de exposiçþo permanente do Liceu de
Artes e Ofícios. (Lyc€u de Artes e Offícios. São
enfrentou vários desafios para a implantaçáo de uma nova concepção estética
Paulo. Prospecto sem data.) arquitetônica que também incluía o móvel.
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FLÄVIO DE R.ICARI'ALHO
I
I

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I

Flávio de Carvalho-
Folheto publicitário de seu escritórìo
(L C Daher, 1984 )

Flávio de Carvalho
Cadeira em metal e couro Década de 20
(L C. Daher, 1984.)
Apesar da modernização que vinha se processando, acredito, contudo,
que a virada se dará em 30. De fato, podemos dividir a história do móvel
moderno no Bras¡l em duas fases bastante distintas: antes e depois de 30'
Antes de 1930, seguindo a tradição colonial, o que lmperou foi a cópia
dos velhos estilos, a cartilha foi eclética, misturaram-se aos luíses e marias o
nosso colonial, o barroco, o inglês e, até mesmo, o árabe, que aqui chegou de
segunda mão, via Portugal.
A partir dos anos 30, com a emergência da arquitetura moderna, com a
ressonância e o assentamento das principais idéias e polêm¡cas levantadas
pelo Modernismo no âmbito da literatura e das artes plásticas, do decênio
anterior, enfim, com o desejo de modernização geral do país, configurou-se um
conjunto de fatores que desempenhou importante papel no processo de
modernização da mobília brasileira.
Os ideais modernistas nos anos 20 tinham sido privilégio de certos
grupos de intelectuais. O próprio Mário de Andrade esteve atento a esse fato
e, num texto de 1928, afirmou que o grupo modernista se constituiu numa
"elite, quando mais não seja, pelo requinte e pelo isolamento. (...) a única parte
da nação que fez da questäo artística nacional um caso de preocupação
quase exclusiva. Apesar disso, não representa nada da realidade brasileira (.'.).
Grcgori Warchavchik. Esiá fora do nosso ritmo social, fora da nossa inconstância econômica, fora
Cadeira em imbuia pintada. 1928. da preocupação brasileira. Se essa minoria está bem aclimatada dentro da
Mário de Andrade. realidade brasileira e vive na intimidade com o Brasil, a realidade brasileira
Poltrona em madeira escura envernizada.
não se acostumou ainda com ela e não vive na intim¡dade com ela"14- Só a
Detalhe de vãos para colocação de livros e
para encâixe de cinze¡ro. 1921. (Acervo partir de 30, conforme Antonio Candido, se "abre a fase em que tudo isto,
lnstituto de Estudos Bras¡le¡ros da UniverskJade deixando o terreno do projeto, do movimento restrito, da tentativa isolada, se
de São Paulo. Foto Mario Thadeu.)
alastra pelo país e transforma em estado de espírito coletivo o que era
llário de Andrade.
Sofá em madeira escura envernizada. Detalhe pensamento de poucos; em real¡dade atuante o que era plano ideal; em gosto
de vãos infer¡ores para colocaçao de livros. habitual o que parecia aberração de alguns. (...) No terreno literário, tenho
1921 . (Acervo lnst¡tuto de Estudos Brasileiros
da Unìversidade de São Paulo. Foto Mar¡o falado numa 'rotinizaçáo do Modernismo', mais ou menos inspirado no sentido
Thadeu.) efiì que Max Weber falava de 'rotinização do carisma'. É decisivo para o
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l-.\Ì

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È

historiador da literatura e d
sociólogo' esse
momento onde o excepcio
era restrito a se
o o que
ampliar. o decênio de 193
práticas
ento das
literárias e artísticas, trans
adráo de uma época o
que era considerado manif
os vanguardeiros' Assim'
a arquitetura 'futurista'foi
o' cada vez mais
difundido e aceito, até o m
rquiteto' mesmo
conservador, traça o seu ri
nes que pouco antes
eram objeto do riso, escân
entrando na rotina. (...) Ná ") Era a revoluçáo
cullura, mas a tentativa
consciente de arrancâ-rad
a transformá-la em fator
de humanizaçáo da maiori
lane¡adas"1s'
A modernizaçáo das
gosto, que passará a domi
antes' aiudou a formar o
na decoraçáo de
interiores e no móvel. Assi '
tura moderna já é fruto
dessa rotina, e da busca d
aís' embora
contraditoriamente coman 6'
O momento decisivo
em que a produção da mo
característlcas de
modernização, princíparm
oi' sem dúvida, este da
introduçáo da arquitetura
produçáo ainda se
mantivesse bastante artes
Como clara express
móvel acompanhará'
ainda que com certa defas
rias das vanguardas
Gogorl Warchavchlk.
européias. Primeiro, a fas
ldentro das tendências
Casa Modemista (P. M- Bardi, 1970.) internacionais das artes d
ojado' linhas retas'
Gegorl Warchavchlk. seguindo os padroes do,4
a ausência de ornamentQ
Aspeclos do ¡nterior da Casa Modemisla. passam a nortear a conce
(G. Fenaz, 1965.) eram os móveis dos
arquitetos-desþners, que
nizaçáo internacional da
mobília, do De Stijl à Bauh
Já a partir do segund
nos' entra-se numa outra
I etapa, em que o móvel vai
; mais brasileiras' O que
náo significa, porém, que c
:sse deixado de receber
influências deliberadas ou
leConentes do mOvimentO
moderno. O que acontecer
¡ mobiliário, fazendo parte
de um contexto mais ampk
rquitetura e da cultura
brasileira participou do
-,
conceitos, que foi se tornar
Iassimilação de idéias e
Jecendo-se com
elementos nacionais: os te
o uso de outros materiais
da terra. Conseqüentemen
aram amortecendo o
reflexo da importaçáo de ic
tnomia para a produçáo do
móvel e caracterizando obr
as dentro de um marco
estilístico que respondeu n
ossas condiçóes.

22
Esse processo de adequaçáo dos padrões funcionais da nova arqu¡tetura
problemas'
ao ¡nterior doméstico náo Se deu, entretanto, de forma linear e Sem
A discussáo que vem desde o século XlX, especialmente com o movimento
A¡ts and crafls sobre a relação entre a crlaçao artística e a
produçáo
industrial, prolonga-se até mesmo dentro do movimento moderno. sabemos
que a afirmaçáo de Walter Gropius de que "arte e técnica Sáo uma e mesma
coisa", de 1923, representou, na época, uma mudança importante na maneira
de encarar a produçáo dos objetos de uso doméstico, onde até entáo
prevalecia a oposiçáo entre objetos utilitários e objetos decoralivos. o
Walter GroPius. problema, entretanto, náo estava definitivamente resolvido. Até hoje discutimos
lnlerior de residência. 1923- (K. Mang' 1989.)
o estatuto desses objetos.
um outro aspecto dessa polêmica é que, durante muitos anos, o móvel
foi considerado como um gênero menor da produçáo artística, um tipo de
produçáo em que a inspiraçáo do gênio nunca se manifestou: uma arte menor,
a bemdizer, náo é uma arte, mas sim uma ocupaçáo técnica e manual. Náo é
à toa que, na Antigüidade, grande parte das operaçÓes técnicas era mantida
fora do domínio do pensamento: eram ocupaçóes que correspondiam a
ocupaçóes servis.
Entre nós, a polêmica também se reproduz. Assim, Mário de Andrade,
por exemplo, defensor inconteste da modernizaçáo, enfrentou as mesmas
dificuldades. É o que se depreende do seguinte texto: "Se eu possuísse uma
casa modernista (é lógico, inteiramente revestida modern¡stamente que nem
esta casa exposta), entre oS móveis modernos da sala de visitas eu colocava
(sic) uma cadeira Luís XV. lmaginemos isso em nossa cabeça: qual a
sensaçáo que dá? A única legítima atualmente a respeito de urna cadeira Luís
XV: a sensaçáo de um objeto de arte. Uma cadeira Luís XV náo é uma
cadeira, é objeto de afte e, como tal, pode decorar nossa vida' Náo tenho
culpa si (src) a gente daqueles tempos andou sentando em objetos de arte em
vez de Sentar em cadeiras, mas carece lembrar que aS duquesas e duques de
entáo eram objetos de arte também"17. O próprio Le Corbusier, apesar de
propor a modernizaçáo "do talher à cidade", ainda recorria em seus projetos às
cadeiras de Michael Thonet, cujas qualidades modernas eram enaltecidas por
ele, mas que, de fato, ainda sáo expressáo do gosto do séculô XlX, embora
i
corbusier, em colaboraçáo com o primo Pierre Jeanneret e com charlotte
I Perriand, tenha desenhado uma série de móveis com estrutura em aço tubular'
¡
I dentro dos princípios do racionalismo e da simplicidade, que caracterizaram

ü
sua obra18.
li As restriçóes ao emprego do móvel moderno estáo também ligadas a
outros fatores que náo sáo meramente de ordem estética. Como a
consolidaçáo da arquitetura moderna residencial no Bras¡l coincidiu com o
Gerrit Thomas RieWeld.
Cadaa Red and 8/ue. 1918. (Acervo Stedel¡jk advento de nossa indústria, foi possível a produçáo em série tanto de
Museum, Amsterdam.) elementos construtivos quanto de decoraçáo, por exemplo o inóvel moderno

23
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ii
1i

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'l'
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ir!'
il,

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Charlotte Perriand e Le Corbusier'


Chaiselongue com ¡nclinação variável em aço
aêento e encosto em couro ou pele
"roma¿o,
'I 928. (Arquivo Prob.ieto.)

Charlotte Perriand e Le Corbusier'


Pollrona estruturada em aço, com assento e
enclsto em revest¡mentos variados' 1928'
(Arqu¡vo Probieto.)

24
I

para uso doméstico. Mas foram principalmente os móveis modernos para


escritório os mais facilmente absorvidos, tendo-se beneficiado dessa
modernizaçáo, de forma mais imediata, inclusive porque a grande arquitetura
para
brasileira, especialmente a dos arquitetos cariocas, estava mais voltada
os prédios públicos.
Do fim dos anos 50, até, talvez, a construçáo de Brasília, a modernizaçáo
do ambiente doméstico se deu em pequena escala, o móvel sendo um dos
elementos-chave na constituiçáo da interioridade privada, a ser preservada em
contraposiçáo à exterioridade do ambiente de trabalho. Sobre o interior como
lugar de refúgio escreveu walter Benjamin, referindo-se à casa burguesa do
século XIX: "o ambiente em que se vive se contrapõe pela primeira vez, para
o homem privado, ao lugar de trabalho. o primeiro se constitui no interior, o
escritório é seu complemento. O homem privado, realista no escritório, exige
do interior que o mantenha em suas ilusoes. Esta necessidade é tanto mais
estimulante quando nem pensa em estender suas reflexoes mercantis às
sociais. Reprime ambas ao configurar seu entorno privado. E assim resultam
as fantasmagorias do interior. Para o homem privado o interior representa o
universo. Reúne nele o longínquo e o passado. Sua sala é a platéia no teatro
do mundo"1e. Segundo Benjamin, a dissolução desse culto ao interior
aconteceu no final do século passado, com o estilo Art-Nouveau'"A
Cartaz de exposição retrospectiva de Le transfiguraçáo da alma solitária se apresenta com sua meta. sua teoria é o
Corbus¡er, realizada na Fundação Bienal de individualismo. Em Van der Velde, a casa aparece como expressáo de
Säo Paulo em 1966. (P. M. Bardi, 1984.)
personalidade. Para eSSa casa o ornamento é comO uma assinatura para um
quadro. Porém, nessa ideologia náo chega a se expressar a significaçáo real
do estilo modernista. Representa a última tentativa de saída de uma arte
sitiada pela técnica em sua torre de marfim. Expressa-se na linguagem dos
médiuns, nas flores como símbolo da natureza vegetativa, que se opõe a um
mundo armado tecnicamente. Os novos elementos da construçáo em ferro, as
pilastras e as formas das vigas dominam o estilo Liberty. No ornamento, este
se eSforça em recuperar tais formas para a arte. O Concreto lhe oferece nOvaS
possibilidades de configuraçáo plástica na arquitetura' Nesse período, o
verdadeiro centro de gravidade do espaço vital é o escritório. o que está
destituído de realidade encontra lugar na casa. O resultado final do estilo
+
I Libertyê este: a tentativa do indivíduo de rivalizar com a técnica, em nome de
I
æ.
sua interioridade, o leva a sua ruína"

il Acredito que o estabelecimento dos limites da interioridade do homem
moderno, em termos da dicotomia, espaço privado interno versusespaço
I produtivo externo, também é decorrência da divisáo sexual do¡trabalho, que
it atribuía ao homem funçóes produtivas elternas e à mulher tudo o que diz
respeito à programaçáo e à manutençáo da interioridade privada. Por isso,
iil cuidados com a decoraçáo, a omamentação e com o próprio móvel sáo
il

25
Permite s¡tuarì
deaqueomóvel
em questáo tal
a a ser visto como elemento
a mesma imPortância deste'

88RiålH-,^
ia ContemPorânea'
e Hercules Barsotti'
autora')
r Gestaltung de Ulm'
ganhou
30, emborã só tenha se consolidado
na
no mobiliário' na arquitetura'

abrangente de racionalizaçáo
ica, uma esPécie de Zeitgeist
a arquitetura quanto a Pintura
Assim' Por
entem a mesma sintaxe'
Dessa
ao triunfo da arte abstrata'
esmo esPírito que Preside as
às
o e liga-se' de alguma maneira'

correntes estéticas em vlgor' entre o


devem considerar as conexÓes
É nesse contenä õ; *
móvel no Brasil' Quanto à avaliaçáo
que
em' Para Ferreira Gullar'
notadamente no
nvoluntariamente
que esta atividade
náo disPunha de um
ue o País ainda
olidado
2' Aracy Amaral reforça a tese

rtistas concretos nas atividades

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híbrida do desenho industrial, como também de sua manifestaçäo

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terreno mais Produtivo.æ

gtilizaçáo social
distanciou do equipamento doméstico e do móvel de maior
que freqüentemente se inspira no trabalho de arquitetos e designers- o
móvel de autor mas que resulta num simulacro desprovido da griffe e do
-
prestígio do original. A Partir
simulacro, entre a Produçáo
discutidos
-, é que o móvel il'
Notas

1 Segundo Lucio Costa, a presença da mão-de-obra Segundo Tilde Canti, essa empresa foi presidida por
portuguesa na produção de mobília sempre foi signifìcativa Ernesto Eugênio da Graça Bastos e teve como secretário
no Brasil: "se o material empregado era, isto sim, bem Leandro Augusto Martins, que, mais tarde, contratou
brasileiro, aqueles que o trabalharam foram sempre ou Joaquim Tenreiro para desenhar móveis em sua
marcenaria. CANTI, Tilde. O móvel do século XIX no
- muitos
portugueses, filhos mesmo de Portugal deles
irmáos leigos das ordens religiosas ou, quando Brasil. Rio de Janeiro, Cândido Guinle de Paula Machado,
-, 1989, p.153.
nascidos no Brasil, de ascendência exclusivamente
portuguesa, ou entáo mest¡ços, misturas em que entravam, 6 A implantaçáo dos Liceus de Artes e Ofícios iniciou-se no
junto com o do negro e o do índio, dosagens maiores ou Rio de Janeiro, em 1858. A eles se seguiram os liceus de
menores de sangue português. Quanto ao negro ou índio outras cidades: Bahia (1872), São Paulo (1873)'
sem m¡stura, limitava-se o mais das vezes a reproduzir Pernambuco (1880), Santa Catarina (1 883), Amazonas e
móveis do reino e de qualquer forma se faz¡a mestre no Alagoas (1884), Ouro Preto/MG (1886), Serro/MG (1879) e
ofício sob as vistas do português". COSTA, Lucio. "Notas Diamantina/MG (1896). A respeito do Liceu de Artes e -

sobre a evolução do mobiliário luso-brasileiro". Revista do Ofícios de Sáo Paulo, ver BELUZZO, Ana Maria de
Patrimonio Histórico e Arlístico Nacional, Rio de Janeiro, Moraes. Artesanato, arie e indústria. Tese de Doutorado.
(3): pp.1a9-62,1939. FAU-USP, Sáo Paulo, 1988. Especialmente capítulo 3,
Lucio Costa considera que a preferência pela repetiçáo de pp. 97-349 e anexos. Tese apresentada posteriormente à
determinados modelos em detrimento de outros mais em redação deste trabalho.
voga na metrópole se justifica: "(...) näo só porque as No que se refere às madeiras, o Brasil sempre foi
modas da corte chegavam aqui com muito atraso, e se favorecido, destacando-se, inclusive, como grande
infiltravam pela vastidáo do território da colônia ainda com exportador de lacarandá, mogno, peroba, imbuia, pinho e
maior lent¡dão, mas também porque nao havia nenhum de tantas outras. Nos últimos dez anos, a graciosidade e a
interesse particular que estimulasse e justificasse a adoçáo leveza das madeiras claras, principalmente o pinho da
apressada de formas novas em subst¡tu¡çáo, quando a araucâria,têm sido èxploradas com excelente resultado,
maneira de viver e todo o quadro social cont¡nuavam náo trazendo amplitude visual aos reduzidos ambientes
somente ¡nalterados, mas sem perspectivas próximas de modernos.
alteraçáo" (COSTA, Lucio, op. cit). Pode parecer até curioso: afinal, o que tem a ver o seu
3 No Sul do país foi significativa a presença da cultura . nome com o móvel e a arquitetura brasileira? As incursões
polonesa, que introduziu o hábito do uso da tradicional de Mário pelo desenho iniciaram e terminaram no restrito
cadeira Polaca, em madeira, com assento de taboa âmbito familiar. Tudo começou no ano de 1920, com a
trançada- mudança da velha casa da rua Paissandu para a rua
Michael Thonet (1796-1871) tezexperiências na Lopes Chaves. Conforme sua irmá, Maria de Lourdes
Alemanha, em Boppard, com folhas de madeira Andrade Camargo (1901-1989), "(...) antes mesmo de
compensada curvas, moldadas termicamente, entre 1836 e iniciar a mudança, Mário já estava preocupado em como
1840. A estandardizaçao e a produção em série mobiliar a nova casa. Mudamos para a Lopes Chaves em
começaram em 1849, quando instalou sua fábrica em 192'l , mas ainda quando estávamos ná rua Paissandu, ele
Viena. Em 1851 apresentou o resultado de seu trabalho na começou a desenhar e mandar fazer os móveis dele.
exposiçáo de Londres. A partir de 1860, com uma Desenhou móveis para o seu studio, duas peças para a
produção em série e industrializada, Thonet passou a sala de visitas, onde guardava santos, objetos antigos e
exportar seus móveis, que t¡veram grande aceitaçáo de liwos. Desenhou também um jogo de estofados, uma
mercado, pois eram baratos, leves e de fácil transporte. mesa, banco com repartiçóes para músicas, um oratório e
Durante toda sua vida, Le Corbusier utilizou mobília Thonet um gaveteiro, que ele tirou idéia de uma revista alemá, e
para equipar seus edifícios, pr¡nc¡palmente as cadeiras, às estantes de parede inteira com prateleiras que pegavam de
quais ele se refer¡a nos segu¡ntes termos: "Pela elegância alto a baixo, com banco embutido". (Depoimento de Maria
da concepção, a p.reza da execuçao e a eficácia de de Lourdes Andrade Camargo, São Paulo, 1980.) Essas
utilização, nada melhor foi feito até hoje". necessidades táo peculiares de uso do espaço levaram

28
Mário de Andrade ao desenho das segulntes peças: um fora e costuras aparentes; um modelo de vestido também
conjunto de sofá e duas poltronas em madeira escura e acompanhado de anotaçoes Na área de programaçáo
envernizada, com um elemento vazado para guardar livros gráfica, fez um proieto de encadernaçâo da Bevue
e espaço para encaixe de cinzeiro. Desenhou também: Musicale.
mesa redonda em madeira clara, com pés em forma de 12. Conforme DAHER. Luiz Carlos Flávio de Carvalho e a
lira; estante para guardar objetos de arte e santos, votúpiada forma.Sao Paulo, MWM, 1984, p' 137.
contendo duas prateleiras envidraçadas, portas de correr e 13. WARCHAVCHIK, Gregori. Acerca da Arquitetura Moderna
esquadrias de madeira para sustentação dos vidros, (1925), Afte em Revista. Ano 2, número 4, ago. 1980'
dispostos de forma assimétrica; prateleiras de parede CEAC/Kairós. Sáo Paulo (org' Maria Cecilia Loschiavo dos
inteira, com vão e repartiçoes para guardar partituras; Santos).
guarda-roupa de madeira escura envernizada; banco com 14 ANDRADE, Mário de. Diário Nacional. Sáo Paulo, 1e de

tampo e repartiçöes para guardar músicas. Mandou fevereiro de 1928.


executar também duas outras peças, seguindo modelos 15. CANDIDO, Antônio. "Prefácio". ln: DUARTE, Paulo. Mário
publicados em revista alemá: um oratório e um gaveteiro, de Andrade por ele mesmo.2? ed. corr. e aum' Sáo Paulo,
ambos em madeira escura envernizada. A fonte desses Hucitec, Secretaria da Cultura, Ciência e Tecnologia, 1977'
modelos é a Deustche Kunst und Dekoration, pp. x[ a xv.
Wohnungskunst, Malerei, Plastik, Architektur, 16. A propósito das relaçoes entre a arqu¡tetura moderna e o
Gartenkunstleriche, Frauenarbetlen. D a rmstadt, Estado Novo, Mário Pedrosa observou que "os iovens
4(24):212, jan. 1921 . arquitetos foram os verdadeiros revolucionários; e a
9. O edital para a realizaçáo deste concurso foi publicado em revolução que eles empreenderam foi a sua, em nome de
15 de outubro de 1936. Em seu primeiro artigo definiu que ideais sociais e estéticos muito afrmados, bem mais
o "concurso consistirá na apresentação de projetos de profundos que os dos políticos, e de sua revoluçáo, além
mobílias para uma sala, coniuntamente de iantar e estar, do mais muito superficial. (...) Os novos construtores
quarto de dormir, quarto infantil e cozinha". Foi utilizam-se do poder de ação dos ditadores para pôr em
estabelecido também, conforme artigo quinto, que "os prática suas idéias. Souberam lazer compreender entáo
projetos deveráo atender à originalidade de estilo, bem tudo o que pensavam e sonhavam realizar' A ditadura lhes
como ao conforto e economia", podendo participar do ofereceu essa possibilidade, mas resultou daí uma
evento tanto pessoas individuais quanto firmas comerciais contradiçáo ainda náo totalmente superada entre os ideais
estabelecidas no Brasil. Numa carta a Murilo Miranda, ele democráticos e sociais implícitos na nova arquitetura, entre
informou sobre a composição do júri deste concurso: seus princípios racionais e funcionalistas e as
Warchavchik, como representante do Departamento de preocupações de autopropaganda, de exibiçáo, de força, o
Cultura, um técnico de marcenaria, chefe das oficinas, gosto do suntuoso e da riqueza para impressionar os
como representante do Liceu de Artes e Ofícios, e um responsáveis pela ditadura, simboFzada talvez entáo pelo
representante do Sindicato dos Trabalhadores de Madeira' 'brio' às vezes excessivo e as formas gratuitas que se
10. Houve também um aspecto da reflexáo de Mário de tornaram moda'. (PEDROSA, Mário. Dos. mur'ais de
Andrade sobre a cultura brasileira que revelou sua Poftinari aos espaços de Brasília. Sáo Paulo, Perspectiva,
dimensão crítica num setor diretamente ligado ao desenho 1981, pp. 258-59.)
de móvel: a crítica de arquitetura- Em carta a Manuel 17. ANDRADE, Mário de. Diáio Nacional Sáo Paulo, 5 de
Bandeira, de 30.8.1927, Mário informou sobre seu ingresso abril de 1930.
como articulista no Diário Nacional, para o gual escreveu 18. Parte da produçáo de Corbusierfoi exposta no saláo do
"coisinhas quase diárias", discutindo ativamente os automóvel de Paris em 1929. Criou mesa com pés de aço
principais projetos e polêmicas em torno da arquitetura tubular e tampo de vidro (1928), sofá e poltrona
moderna brasileira e paulista. estruturadas em aço, com assento e encosto em
'11. Desenhou roupas numa pequenafolha de bloco: um revestimentos variados (1 928), cadeira giratória (1 928),
modelo de robe de chambre, acompanhado das segu¡ntes banqueta (1928), armários com pés de aço. No Brasil
explicações: setin brillantpor dentro e com debrun dele por ganhou grau de difusáo chaiselongue (1 928) com
inclinaçáo variável, carcaça em aço cromado, revestida
em 22- a arte
couro, como com pele ou tecido autoportante. Toda a linha
"Cassina I Maestri" aneiro,
- umaprincipais
significativo criado pelos
seleção do mobiliário mais
arguitetos modernistas: contribuiçáo brasileira',. Rev¡sta Crítica de Arle, Rio
Rietveld, Mackintosh, Frank Lloyd Wright, Asplund _ de
é Janeiro, l(1):5, março, 1962; 3) depoimento à autora,
produzi , pela probjeto. 'l g79.
Rio
de Janeiro,
19. BENJA
interíor.
nes ll"' Lurs FeliPe ou o 23. concretas em
20. BEN|JAMtN, Walter. Op. cit., p. 183. rojeto
21. Segundo Mário pedrosa, .A revolução arquitetônica . MAM; São
nâo é,
pois a se dirige para 24. KATINSKí, Júlio Roberto. O concretismo
lr fora e o desenho
tl

: p.m ll"^:':'l"n
rcas, quando o
industrial. projeto construtivo na arte l950_1962.
Janeiro, MAM; São paulo, pinacoteca do Estado,
Rio de
I
hom , tenhamos
1977,
I consciência física do avesso do espaço, da sua existência
p.329.
t
25. KATINSKY, Jútio Roberto. Op. cit., p.328.
física". (PEDROSA, Mário. Dos murais de portinari
i; aosl 26. DEPOIMENTO de Geraldo de Barros à autora.
espaços de Brasília. São paulo, perspectiva, 1ggi p. Sâo paulo,
ì. , 253.) 24 de setembro de 1979.
il

il
ll
¡l

'ii
ii
,tl

30
Parte I
Experiências Pioneiras de
moder nizaçâo do móvel no Brasil

Cama Patente: racionalizaçáo do


desenho e da Produçáo

ACamaPatentefoiumaexperiênciapioneiranaracionalizaçáododesenhoe
nova visáo do mobiliário e
da produçáo de móvel no país. Desenvolveu uma
das linhas. o projeto
antlclpou a preocupaçáo moderna com o despojamento
e consiste num
de I giS é de autoria de Celso Martinez Carrera 884-1955)
(1

marcofundamentalparaaevoluçáododesenhodomobiliáriobrasileiro.Ela
trouxeaSnovaspotencialidadesdousodamadeiratorneada,correspondendo
que, desde aproximadamente
a uma versáo em madeira da cama de ferro,
1830, foi utilizada para a fabricaçáo de camas na lnglaterra' onde se
uniáo dos tubos-
realizaramvárias tentativas para resolver a complexa
que as linhas e as formas
noìiron,"i, e verticais'. É preciso frisar, entretanto,
gosto reinante' no caso
puras, a levezae a simplicidade, táo inovadoras para o
programático' Pelo
da cama Patente não corresponderam a um despojamento
prioritariamente' a
contrário, a limpeza do desenho da Patente deveu-se'
questoeseconômicas'Tratou-sedepôrempráticaprincípiosfuncionaisque
tårn"r". possível a industrializaçáo da cama, a um custo acessível ao
isivq Para seu êxito comercial'

partes executadas em
produçáo se iniciou em 1836, através de cadeiras, com
2. A estandardizaçáo e a produçáo em
lompensaoo moldado term¡camente
e prosseguem até
série das cadeiras Thonet iniciaram-se a partir de 1850
hoje.onomeThonetestáindissoluvelmenteligadoaomóvelmoderno'eo
pråprio Le Corbusier exibiu, 'quase como manifestos", esses modelos
Exposiçáo das
estandardizados em seu "Pavillon de I'Esprit Nouveau", na
ArtesDecorativas,emParis,lg25,conformeregistrouGiedion:
'Nousavonsintroduitdanstepavitlondet'EspritNouveaucommedansnos
ou nos pet¡tes maisons ouvrières, I'humble fauteuil Thonet de bois
hôtets privées
fauteuils. Et nous
étuvée, cerlainement le plus banal comme le meilleur marché des
notre continent et les
croyons que ce fauteuit, dont les millions d'exemplaires meublent
pauvreté est un concentré des fo¡mes
deúx Anériques, porte de la noblesse, tant sa
susceptibtes de s'harmoniser au corps"s'
_-'::
==:g--+_::, iì¡_ _. _:
#Æl,p-9.1f#,*f^"'ö,ËË:Si,l^+t-yiëF'

tuburar' móvel moderno


:i :ilt"tuburar cromado' no t1;;:îi ;illli"
retendo-se assim a
uma

Presente na anos 5o o arquiteto


das princiPa o tubo de aço'
Paulo Mend rima em muitos de
seus
Geraldo de ém associou à madeira
assentos e mais recentem
de aço' rtr rcáo
te'
"""Èdos tubos
- uso
o
Pi""i'o temorar' """îtfl:: ::ilffi::iil
a
am a tônica' Pois' Partir
-'o passou a agregar
ãtà"ot" do "estilo" e produzida'
modelos - foi
amentos em vários
poderia ser conciliado
ica' da cama -' o q'" iát"i"
linhas'
com a racionalidade
formal de suas primeiras
foi executado em Araraquara'
oãtsa cama da
o primeiro Dr Francisco Pedro Monteiro
a
"""toi"' - a
atendendo
'or¡"ittclJî"";;;äì;; como' naquele momento'
silva da cidade o"ä;il;; 'i" "r¡ni""'
-
importaçáoo"'""ttJäiåî'o'ião'"'"natmenæusadasparaessefim'estavaque as
dificurtada em razao
o"ä"r.,'t", preciso criar um desenho
substituísse'
Essesantecedentessáoimportantesecontrib
simplicidade de I
similaridade de leveza'
formas Pu
Ë","n*, e, acima de tudo' as passage
a
fundamental para possibilitar
.",i"0" a
r verdadeiro maniresto
;"gffi:ålä,"Jiï,ilit":''.
tun"¡ðn"lid
rl' que trouxe alteraçóes
favor da moOernioaOã-"i" - -..^,
oot i'à"essos constnlivos' da
profundas t"'toJo"lro¡eto' da execuçáo' gosto no setor'
3""TS.,::'å?lî,.ilÏ:Ìii"""^iå"3:"'""å"':
"t d;;;J"Ãi I oot padróes do

Ëãto Pauto vànzolin¡') :' connercializaçá",


Fâbrica de Móveis Carrera
I

Celso Martinez Carrera, espanhol,


nascido na Galícia, filho
artesão que trabalhava de um
outrosimisra",",,"ã",3Ï"",."ltiil?rffii:.'*;:ï""äf"r,r.;::Ufil1::
de marcenaria da Companhia
O#"r,
Estrada
Er rõðJ, ;;;;
rro, própria r"r""n"rÎ:, 1'ri:#:i:,"î:::
t'.
I
l -ofi"'o :
equipadas
a
com maquinário rmportalo,
;Jìäå; com a excetência da
:äio*
!!

iiff :5årT3::'
dispon iver
""
;C;, ;"icamente i'is,";;";
I
o processo de seleçao, compra,
tratamento e preparo das
cuidado pessoarmente p madeiras era
r cerso Ma;¡nez ca;rera.
I o preparo das madeiraé
t; sor; os tinsimentos e ãIu".n¡."'"nio"
;:i:i:::"o"o;å:nu" " i"¡ìo"
a fábrica"..", "o,
I

i
duas fases: iÅicrï dividia_se em

lr

Ël
åll,lïll:lf;ermite
A primeira linha era composta
i:::""Ji.ff:""i,".
de armário
;l ca m as. pa ra essa
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ri nh a ro i o es en n aJa ;ö;;;"å:fi:;i:,ii,,äi"åi0i"0"",,"" "
ilr istaram o mercado.
l¡.
ilt empreendimento, para
Celso Martine z Carrera,
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Ít:
momento difícil na.vida dele: ,(...)
eu lembro que
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n ício da arcen aria nt¿ o" j::: j",åfl :,.li
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I

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o oficial de justiça
sido patenteada e o
i nificativo para com
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país, pois o desamparo
o"
a,""¡a é tradicionar.
iii
"r'olå"iålüiîxo"å
lir
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ìl

ii
A lndústria Cama patente
L. Liscio S.A.
Aspectos da produçã"
i

I'
ii
;;äciatização ;;
ìr

O fundador da lndústria
Cama patente L. Uscio
(18U-1974), chegou S.A., Luiz Uscio
rl ao Brasil, ø',,åi", em lB9+, radicando_se
"¡"J" em
.'iii3ì;llå'il?l's;ll"Jå1,ï;;;;ää"åi;,"."ondesaiu"o"'","uJ"nç"
e
A dedicaçáo ao mobiliário começou numa pequena serralherla
marcenaria que faziam móveis sob encomenda, vitrines, balcóes
etc. Depois,
"(...) bolar uma cama de fácil construçáo e montagem que
surgiu a idéia de
substituísseacamadeferro,pois,naqueletempo,eramuitocara,porqueo
quela éPoca, as camas de
das nos tradicionais jogos de
guarda-rouPa. Em geral, eram
ância da madeira acomPanhava
para as classes
o abuso da ornamentaçáo. lndiscutivelmente, eram móveis
mais abastadas.
AscamaspopulareseramaSchamadascamadevento,tipodecamade
campanha, de abrir e fechar, sobre pernas em "x", ou entáo as camas
e,
marquises. No norte do país, o hábito de usar as redes era indispensável
na
segundo câmara cascudo, todos "nasciam, viviam, amavam e morriam
o
rede" 6. Posteriormente, apareceram aS camas de ferro, material importado,
inaçáo do ferro com a
s acessível, com o estrado
O enxergáo, estrutura feita
longitudinalmente e, aPós
algumtempodeuso,afundava.Quandoatacadopelaferrugem,ficava
inutilizado.
Luiz Liscio tinha consciência dos problemas da produçáo de camas
populares: eram duraçáo' Segundo ele,
"(...) essas cama objeto de uma indústria, porque a
indústria é a aûe aticamente o objeto útil, sempre
melhor, mais. numeroso e mais barato. Eram elas fabricadas esporadicamente
e junto com outros artigos. Enfim, náo existia uma verdadeira indústria de
camas. Esse impressionante conjunto de imperfeiçoes e inconvenientes foi
visto e apreciado pelo senhor Luiz Liscio. Poderia haver, e era preciso que
houvesse, um tipo de cama simples e elegante, sólida e leve, resistente e
portátil, ao alcance de todas as bolsas, capaz de ser fabricado industrialmente,
em grande escala, para atender a todas as necessidades, com o
7.
aprweitamento de madeira, uma das riquezas naturais do país" Com essas
motivações, e marcada pela controvérsia a respeito dos direitos autorais do
desenho, nasceu se náo o mais brasileiro dos móveis, pelo menos uma peça
muito representativa da forma de morar dos brasileiros neste século.
Vista da seraria da Grande Fábrica de Móveis As almofadas das cabeceiras e peseiras das camas existentes foram
Finos Celso Martinez Canera. O segundo da
suprimidas e substituíram-se as ligaçóes de encaixes e parafusos por alças
direita à esquerda é o artesão ladeado de s,la
equipe. Araraquara. Sáo Paulo. 1920- (Arquivo com contrapinos. O enxergáo começou a Ser uma espécie de tecido metálico,
ÁMaro Martinez Carera.) de pequenos pedaços de arame, formando malhas articuladas entre si, ligadas
lnterior das instalações da lndústria Cama ao estrado por molas de tensáo, em toda a periferia, dotadas de ganchos
Patente S.A. (Album comemorativo de 3Íl anos
da Cama Patente. São Paulo. Sem data.) especiais, cujas hastes atravessavam as barras superiores das longarinas, de

35
modo que a pressão exercida sobre qualquer ponto do enxergáo dividia-se
^ pela superfície inteira, impedindo a sua deformaçáo e aumentando a sua
elasticidade. O perigo da flexão das longarinas, em virtude da pressão
^ exercida sobre o enxergão, foi evitado mediante o emprego de um dispositivo
f, elástico de madeira, que atuava como mola na parte mediana e transversal
dos estrados para equilibrar a flexáo com a pressáo.
A cama era composta por um conjunto básico de três elementos:
cabeceira, peseira e estrado, todos executados em madeira torneada.
lnicialmente, eram utilizados a imbuia e o pinho. Com a diversificação de
modelos, passaram a ser usadas madeiras folheadas: sucupira, imbuia,
amendoim, pau-marfim e até jacarandá, mas só sob encomenda prévia.
Foram produzidos seis modelos de Cama Patente. Os mais conhecidos
foram os das camas populares, ambos em madeira roliça, sendo um deles em
madeira curvada ou torneada, com ou sem filele de madeira clara, e o outro
com plaquetas nas pontas do baluarte da cabeceira e peseira. Havia também
modelos de estilos almofadados: a cama Nobre, a cama Seleta, a cama Maria
Antonieta e a cama Regência. Essas linhas de cama eram completas,
.., -çrio/o/o ./o..r/.rÍ. ! incluindo berço, cama de solteiro, cama de casal, em diversas medidas e
acabamentos.
A Cama Patente conquistou o mercado brasileiro. Os modelos populares
eram muito difundidos. Custavam, em 1928, aproximadamente de onze a
dezessete cruzeiros. Seus principais usuários eram a classe operária e a
classe média. A comercializaçâo era feita em Sáo Paulo, através das principais
lojas de departamentos: Mappinstore
- Casa Anglo-Brasileira Mesbla,
Cássio Muniz, Casa Alemã. No interior era vendida em qualquer-,casa de
móveis,. até mesmo em feiras e armazéns. Segundo Govido Liscio, no norte do
país a Cama Patente disputou o mercado com a rede, que, "a princípio, se
constituiu num empecilho comercial, mas o hábito da rede foi dominado pela
comodidade da cama e pelo preço. Mas, mesmo assim, a Cama patente náo
conseguiu extinguir o uso da rede" 8.
Um dos problemas enfrentados pela Cama patente foi a concorrência
comercial. Os fabricantes de cama de ferro faziam anúncios explorando a
facilidade de incêndio que a cama de madeira apresentava, oferecendo a
segurança das camas antiinflamáveis. Além disso, as imitaçóes eram
constantes e "(...) foi necessário, entáo, defender-lhe o nome e com ele sua
legitimidade e perfeiçáo, pelo que se criou uma conlramarca ou marca de
garantia, v¡stosa e inconfundível: a Faixa Azul, como sinal de autenticidade da
verdadeira Cama Patente (...). Foi preciso também defendê-la, torná-la
conhecida, através de incessante propaganda, pela imprensa, rádio, painéis,
prospectos, concursos radiofônicos, graças ao que, em todos os rìncóes do
Publicidade da Cama Patente. (Album
comemorativo de 33 anos da Gama Patente. território nacional, o público pôde adquirir, com segurança, a legítima e
São Paulo. Sem data.) verdadeira 'cama Patente' "e. A cama patente näo representou somente uma

36
Berço em made¡ra lomeada. Década de 30.
Cama Patente S.A.
Cama Patente em madeira tameada. lndústr¡a
Cama Patente S.A. Década de 20. Residência
Olga Ferreira do Amaral. (Foto Marcelo An¡elo.)
A mesma cama desmontada. Residência Olga
Ferreira do Amaral. (Foto Marcelo Anielo.)

37
Conjunto de móveis da linha Patente: inovação nos háb¡tos do dormitório brasileiro; acima de tudo ela foi um dos
guarda-roupa, sapateira e criado-mudo.
lndústria Cama Patente S A Década de 40 episódios mais significativos na história da indústria brasileira, em termos de
(Arquivo da Autora. Foto Mario Thadeu.) criaçáo de novas tecnologias. Foram desenvolvidos métodos próprios de
fabricação e, sucessivamente, construídas máquinas: a máquina defazer
arcos tóricos de madeira, a nova lixadeira para peças curvas de seçáo circular
e raio reduzido, trafilas e lixadeiras para as espigas das travessas, tornos
automáticos para as pontas dos pés, trafilas para tornar roliça a madeira,
lixadeira para lixar continuamente os montantes, longarinas, travessas e
balaústres, furadeiras automáticas múltiplas, acionadas por cinco motores,
especialmente projetadas e construídas em suas oficinas, para furar
universalmente, o que permite obter todas as peças estandardizadas,
facilitando assim a montagem das camas, automaticamente. Merece destaque
especial a colocaçáo das molas de suspensáo de boca quadrada, objeto da
patente na 23.351, que, tecida na própria rede do estrado, dela fazendo parte
integrante, economizando arame galvanizado e eliminando certos problemas
da rede, notados no antigo sistema, quando as molas de suspensáo eram
amarradas com pequenos arames, abaixo da rede.
John de Souza, ex-sócio de Ernesto Hauner na Homestore, que esteve
presente na liquidaçáo das máquinas da indústria cama patente, declarou que
viu, inclusive, uma máquina a vapor de quinhentos cavalos de potência, tirada
de um navio inglês, que era utilizada para movimentar parte deste complexo
maquinário10. Afábrica se mudou de Araraquara para sáo paulo, em 1919,
quando foi registrada. Três anos mais tarde se transferiu para a rua Rodolfo
Miranda, no Bom Retiro, onde funcionou até 196g, ano de seu fechamento.

Notas

1. As primeiras patentes inglesas para a cama metálica foram sua grandeza devem ser vividas eÍn nossos coraçoes. Sâo
registradas enlre 1827 e 1 841. Paulo, Ediçáo Martinez Carrera, 1991 , pp. 13-4.
No caso da Cama Patente, os elementos verticais sáo DEPOIMENTO de Govido Liscio, cedido à autora. Sáo
torneados, bem como o gradeado da cabeceira, os dois Paulo, 1980.
elementos curvos nos cantos sáo fresados e encaixados. 6. CASCUDO, Luís da Câmara. Rede de dormir. lJma
Na delimitaçáo dos encaixes sáo introduzidos dois filetes pesquisa etnográfica. Rio de Janeiro, FUNARTE, lnf.,
de madeira clara, marchetados, que fazem o acabamento. Achiamé, UFRN, 1983, p. 12.
3 LE CORBUSIER. "Le pavilton de I'Esprit Nouveau". tn: 7. ÁLBUM 33 anos da Cama patente S.A. Sáo paulo, Editorâ
Almanach d'architecture moderne. paris, Crés, 1925, & Publicidade Roman Ltda., 19S2, s.p.
p.145.
8. DEPOIMENTO de Govido Liscio à autora. Sáo paulo, 1980.
4. DEPOIMENTO de Ângela Martinez Corrêa cedido a Maria 9. ÁLBUM 3g anos da Cama patente S.,4. Säo paulo, Editora
Cecília Loschiavo dos Santos. Araraquara, Sáo paulo,
& Publicidade Roman Ltda., 1952, s.p.
1980. A esse respeito ver também Martinez Carrera,
10. DEPOIMENTO de John de Souza à autora. Sáo paulo,
Cecília. Recordaçoes de meus pais: tembranças que por 1980.

38
A geraçáo dos Pioneiros

os primeiros artistas e arquitetos que, de fato, lançaram as bases do estilo


moderno da mobília no Brasil foram: John Graz, Cassio M'Boi, Gregori
Warchavchik, Lasar Segall, Theodor Heuberger. À primeira vista pode parecer
estranho que as origens da modernizaçáo do móvel brasileiro dependeram da
atuação de profissionais estrangeiros, mas, na prática, o movimento moderno
era isento de nacionalismo e apresentou caráter internacional.
A transiçäo do móvel de estilo eclético e acadêmico para o móvel
moderno deu-se a partir dos anos 20-30. Nesse primeiro momento, os
conceilos e as posturas t¡veram um caráter preponderantemente
John Graz.
Poltrona em aço tubular cromado, veludo e internacionalizante. As novas concepçõeS acerca do móvel transfOrmaram-se
madeira. (Arquivo da Autora. Foto Mario em senso comum num meio restrito de alguns profissionais da área de
Thadeu.)
arquitetura e decoraçáo.
O móvel brasileiro produzido nesse período foi inovador pela introduçáo
de novas concepçóes, utilizaçäo de materiais e processos produtivos, porém
ele acompanhou tal e qual a evolução normal do mobiliário europeu, sem criar
um vocabulário próprio, repetindo muito da linguagem Att-Déco' Foi uma
produçáo elàborada para disseminar o espírito da modernidade. Mas, na
verdade, tratava-se de um desenho padronizado. Os modelos eram repetidos
e abusados em nome dos novos princípios. A importância maior dessa fase
residiu em seu caráter revolucionário, cuja principal conseqüência foi o
despertar da inércia acadêmica.
De qualquer forma, essa fase de intensa ebuliçáo, ainda que num plano
I muito restrito e elitista, propiciou a revisáo de posiçóes. Dentro desse contexto

I de revisionismo, o próprio conceito de estética foi dessacralizado e passou a


penetrar na esfera do cotidiano e dos anônimos objetos do uso, ou seja, "(-..) a
arte é para ser utilizada e náo olhada; é, em outros termos, uma funçáo da
sociedade. (...) Náo interessa que as máquinas se multipliquem e ofereçam à
produçáo uma ampla gama de variaçóes: o standard poderá ser repetido ao
infinito, porque o objeto produzido náo serve para ser contemplado
estaticamente, mas para ser usado"l.
É inegável que o mérito pela realizaçáo desse movimento em prol das
novas idéias coube a toda aquela geraçáo. Entretanto, houve um norne que

1 39
John Graz.
Sala de jantar em madelra Cadeira em
made¡ra com assenlo e encosto estofados em
veludo 1925 Besidência Carvalho da Fonseca
(Arquivo Annte Graz )
serviu de traço de união entre o estilo acadêmico e a modernidade: John Graz
(1891-1980). Embora nascido na Suíça, o nome de Graz ficou
indissoluvelmente ligado à pintura. ao desenho industrial e às artes gráficas
brasileiras e, como tal, ele foi considerado um de seus grandes expoentes,
part¡cipante dos principais momentos da modernizaçáo cie nossa cultura,
inclusive da Semana de 22. No conjunto de sua obra ressalta uma
interpretaçáo muito peculiar do Brasil.
Graz fixou residência em Sáo Paulo em 1920, tendo sido casado com a
brasileira Regina Gomide, irmá do pintor paulista Antônio Gomide.
o casal Graz-Gomide realizou uma produçáo que sintetizou as principais
tendências da vanguarda européia com o Art-Déco, estabelecendo uma
ligação fundamental entre pintura, arquitetura e artes aplicadas, traduzindo
para o plano do ambiente a estética do cubismo, fato que Graz reconheceu ao
afirmar: "(...) eu introduzi no Brasil esses móveis cubísticos, com o metal e
Reglna Gomide Graz. diversos materiais nobres"2.
Tapeçaria com desenho de John Graz. Sem
data. Residência Mario Celso de Figueiredo.
o reconhecimento da obra do casal Graz-Gomide está explicitamente
Décâda de 30. (Arquivo Annie Graz.) comprovado pelas inúmeras encomendas que recebeu para projetar, o que se
poderia chamar de arquitetura de interiores, de vários edifícios paulistas, entre
os quais as residências de José de castro, Jeremia e Branca Lunardelli, Jane
Gama cerqueira, Roberto simonsen, Rafael Noschese, Godoy Moreira, caio
Prado, família Jafet, cunha Bueno, celso Figueiredo, carvalho da Fonseca,
Ferrabino Borges Figueiredo, Sergio Scuracchio, Franco Zamparl
as principais te
ntouaEscolad na
opaepassou" do
novo vocabulário formal lá vigente, tendo sido precursora na renovaçáo de
interiores, a partir dos princípios cubistas. Assim, dedicou-se ao artesanato de
tapetes
- criou a lndústria de Tapetes Regina Graz-, panneaux, almofadas,
tapeçarias, utilizando-se de vários tipos de veludos e fios de metal. Em 1930
colaborou na decoraçáo da casa Modernista de warchavchik. o êxito
comercial de sua produção foi grande, levando-a a organizar uma fábrica de
tapetes e tapeçarias, além da implantaçáo de um curso de decoraçáo, por
volta de 1950.
John Graz náo foi só pioneiro no desenho de mobíria, mas também foi o
primeiro a pôr em prática no Brasil o conceito de desþn total, táo presente
nos
ideais da Bauhaus. Dessa forma, Graz projetou o móvel, previu sua
distribuição no espaço, as luminárias, painéis, vitrais e afrescos.. lnfelizmente,
o legado de táo significativa produçáo náo foi preservado, pois as residências
foram demolida s contemplar em São paulo.os
vitrais do Portal projelo de Graz do ano de .192g,
executado pela

40
John Graz-
Sala de vis¡tas Residência N¡ario Celso de
Frgueiredo Década de 30 (Arquivo Annie
Graz )

l',.
I, il*:
itr'
L
Continuando na análise da produçáo dessa época, que foi, sob muitos
aspectos, um momento de ruptura, é preciso sublinhar a atuação decisiva de
Gregori Warchavchik (1896-1972), que deu um passo a mais no sentido da
incorporação do estilo moderno ao móvel brasileiro. Procurando atender às
exigências da arquitetura e da vida moderna, utilizando-se das novas
possibilidades técnicas e materiais disponíveis, Warchavchik procurou
despertar nos brasileiros uma síntese das principais reformas daquilo que ele
chamou de "lógica da beleza de uma época histórica"7. O ¡nício de sua
atividade no setor do mobiliário foi marcado pelo atendimento à adequação de
linguagem e funcionalidade entre sua arquitetura e o móvel. Assim, entre 192g -
e 1933 desenvolveu uma completa linha de móveis abrangendo uma
diversificada gama de tipos e modelos, todos eles executados segundo os
princípios básicos da modernidade. os principais materiais utilizados eram a
madeira, principalmente a imbuia lustrada ou esmaltada em cores, os tubos de
metal cromado, o couro, tecidos e veludos para estofamentos.
Warchavchik projetou também móveis institucionais: móveis para
bibliotecas e salas de leitura. É dele o projeto de equipamentos de interiores
da sede da Associaçáo Paulista de Medicina, executado em 1931 . Segundo
Geraldo Ferraz, "a diretoria da Associaçáo Paulista de Medicina pediu a
warchavchik um projeto de interiores com as subdivisões e o mobiliário
adequado. Aceita a incumbência, a Associação teve assim um interior
moderníssimo para a época, a primeira sede de uma associaçáo a ter um
ambiente uplo-date, devendo-se notar que náo era tarefa fácil adaptá-lo num
edifício de condenável arquitetura como era o Martinelli,'8.
o mobiliário moderno foi empregado decididamente em todas as obras
do arquiteto, tendo, inclusive, realizado as primeiras exposiçóes desse gênero
de mobília nas casas modernas de sáo paulo e Rio de Janeiro. Esse fato
ganhou repercussão nos jornais da época, conforme registro feito por ocasiáo
da inauguraçáo do apartamento moderno de Copacabana: "Realizou-se,
ontem, às 5 horas da tarde, no edifício Olinda, a exposiçáo do apartamento
moderno, que o architecto (src) russo Gregori warchavchik racionalizou em
todos os elementos de construçáo, de móveis e de outras utilidades para
servirem à vida do homem moderno"s. Nesse mesmo dia, outro periódico
carioca, o Jomal, noticiou: "Pela primeira vez nesta capital sáo utilizados
i móveis de aço! se, por um lado, o sucesso obtido com as exposiçóes de suas
!
I obras propicioulhe ce¡to número de projetos, incluindo também o mobiliário,
:
por outro lado o grande obstáculo enfrentado foi a falta de uma infra-estn¡tura
i industrial para fabricar seus móveis e elementos para a construção em geral:
Gregorl Warchavch¡k. esquadrias, caixilhos metálicos para janelas, grades, lantemas e outros
Mesinhasdecentro. 1928. (G. Fenaz, 1965.) acessórios".
com plantas e
Na área da mobília, Graz desenhava os móveis
a reproduçáo em
perspectivas e detalhava em tamanho natural para facilitar
de perto por ele: "("') no
oficinas de terceiros. A produçáo era acompanhada
proporçóes que eu querla
momento da execuçáo eu ia lá para verificar se as
cortar o móvel e
dar estavam corretas, e, muitas vezes, eu mandava
com os operários' para'
recomeçar (...). Eu tinha que conversar com o mestre'
minhas plantas' de acordo
naturalmente, poder executar de acordo com as
3'
com os detalhes que eu fornecia"
pois' desde aquela
A produçáo dos móveis em oficinas trouxe problemas'
os designers: "("') os
época, a polêmica sobre direitos autorais lmportunava
marceneirosaproveitavamosmeusdesenhoseforamexecutandofora;náo
coisa em literatura' em
havia lei sobre a originalidade do desenho' É a mesma
a'
pintura, em tudo é a mesma coisa"
Noiníciodasatividades,Grazencontrourestriçóesaoconsumodeseus
e se considerou o
móveis. Ele se referiu àquela época como a Betle Époque
e de novos materiais' segundo
introdutor das formas cubísticas, simplificadas
ele, isso foi possível porque: "( ) iá estava na cabeça da época essa
aliás' as primeiras
simplificaçáo. Já estava, especialmente na arquitetura;
s'
casas 'cubísticas'foram as de Warchavchik"
Os desenhos de Graz para móveis refletiram de fato
certa purificaçáo
que ele chama de "móveis futuristas"' mas' ao mesmo
nas formas, aquilo
aspectos pesados que o filiaram ao mobiliário Att-Déco'
tempo, apresentaram
Foiumaproduçáoexecutadaartesanalmente,sobencomenda,exclusivapara
chapas de
)r... .
uma elite privilegiada e até mesmo com materiais importados:
':
i;): .
cobre,metal,couroeatémadeira.Entretanto,oresultadofinal,emrelaçáoà
... direçáo para a
arquitetura e às luminárias, já indicava, nitidamente, uma nova
modernizaçáo do interior.
de ter dado
Sua iroduçáo abrangeu o período de 1925 a 1940' Depois
e ao desenho
uma grande contribuição ao setor das artes decorativas
abandonou-os e voltou à pintura, atividade que sempre
indusirial, Graz
acanhado
desejou desenvolver. Entretanto, num meio artístico de certa forma
Foi esse o
náo åra possível comercializar a própria arte para sobreviver.
'Quando eu cheguei' era
motivo que o encaminhou ao desenho de móveis:
p"r""ontinu"raminhapintura;mas,aqui,apinturaeraatrasadíssima'
que me desse
ninguém se interessava. Entáo eu tive que descobrir um ofício
alguma coisa Para come/'6.
Assim,osanos20representaramUmaépocabásicanahistóriadomóvel
para o
moderno brasileiro, acarretando algumas conseqüências importantes
entre um
desenvolvimento do desenho e produçáo de móveis, situando-se
John Graz. passado acadêmibo e as novas possibilidades que se abriram com a
Planta de mesa em made¡ra e metal. Década
de 20. (Arquivo Annie Graz.) modernizaçáo.

ß
a

Gregori Warchavchik.
Poeto para gabinete de estudo. Residência A.
Schwartz. 1932. (G. Fenaz, 1965.)
Grcgori Warchavch¡k.
Escrivaninha com poltrona de tubos cromados
e estofada em couro. Gab¡nete de estudo-
Residência A- Schwartz. 1932. (G. Ferraz,
196s.)
Gregori Warchavch¡k.
Biblioteca e sala de le¡tura da Assoc¡ação
Paulista de Med¡c¡na, localizada no Edifício
Martinell¡, São Paulo- 1931. (G. Fenaz, 1965.)

45
Lasar Segall.
Conversadeira em madeira p¡ntada com
¿stofamento em couro. (Foto Mario Thadeu')
Lasar Segall.
Cadeira õm braços em madeira maciça 1932'
(Catálogo Nucleon.)

NumacartadeWarchavchikaGiedion,elesereferiuaessesobstáculos:
"lrvedemontaroficinaspaßÍazerexecutarjanelas'portasdemadeiralisa'

eo
uma etapa fundamental para o rompimento com o academismo
de um novo Vínculo com a estética moderna. Entretanto, ele
estabelecimento
preocupaçáo
se destacou dos demais designers do período pela constante
teórica na tegraQáo das artes modernas',Essas
indagaçoenaáreacrítica,participardevários
debates g âçáo da arquitetura moderna no Brasil e
deixa roduçao crítica'
anos 20, embora quantitativamente restrita,
foi es reender a evoluçáo do processo de

bem aproximado ao espírito do estilo Art-Déco'


outra contri.buiçáo que participou desse esforço de modernizaçâo'toi a
era cassio
obra do artista cassio de M'Boi (1896-1986), cujo nome verdadeiro
da Rocha Mattos.

47
u*ç
|,il

/'r

#,
O ano de 1926 marcou a fundaçáo, no Rio de Janeiro, de uma
riu e divulgou o móvel moderno' Trata-se da Galeria
por Theodor Heuberger (1898-1987), personalidade
ral no Brasil, onde se radicou a partir de 192411' Em
1938, instalou uma filial em sáo Paulo, na esquina da rua Marconi com a rua
Baräo de ltapetininga. Na verdade, casa & Jardim erao slogan e a própria
filosofia da empresa, cujo nome era A Forma Decorativa s.A. A idéia mestra
que presidiu a criaçáo da loja era a unidade e a integraçáo de estilo entre o
espaço elderno e o interno da casa, entre a arquitetura, o paisagismo e o
mobiliário, como também a unidade entre as artes decorativas, sem nenhuma
espécie de discriminaçáo. Segundo Heuberger, "tudo o que era necessário
para uma casa, das louças aos objetos de vidro, cerâmica, metal, móveis e
obras de arte propriamente ditas, era encontrado na loja. Era uma coisa
completa. Em geral, separam-se as coisas, mas a nossa idéia era juntar tudo,
tanto que o nome da loja era, inicialmente, A Forma, mas como naquela época
näo foi possível registrar essa marca, fomos obi'igados a acrescentar a palavra
'Decorativa'. Entäo ficou A Forma Decorativa S.A. e o slogan era Casa &
Jardim"l2.
Casa & Jardim seguiu os princípios da Bauhaus e näo estabeleceu
Cassio de M'Boi. nenhuma distinçáo entre arquitetos, pintores, escultores, marceneiros. Todos
Cadeira em made¡ra, com assento estofado.
1933. (Arquivo da Autora. Foto Mar¡o Thadeu.) sáo igualmente artesáos no sentido autêntico da palavra.
Como a mentalidade da época ainda náo estava preparada para
absorver integralmente a produçáo de móvel moderno, Casa & Jardim foi
obrigada afazer uma concessáo comercial e manteve duas seçóes básicas:
uma dedicad.a a móveis modernos e outra a móveis clássicos.
Os móveis clássicos, que sempre foram alvo principal da clientela, erâm
representados pelos estilos ecléticos, confeccionados em madeiras nobres,
estofados com tecidos especiais. Eram as tradicionais linhas para dormitórios,
conjuntos para sala de jantar e living-room.
A linha de móveis modernos era composta por móveis rústicos
executados em nó de pinho. Nesse particular, revelou-se o pibneirismo da
empresa na utilizaçáo do pinho encerado para a confecçáo de móveis,
material que só veio a ser utili4¿do em grande escala nos dias atuais.
Afábrica e a oficina de montagem eram muito bem equipadas e
contaram com máo-de-obra artesanal de alta qualidade. A colaboraçáo de
Lasar Segall.
Sala de visilas. Residência Jenny e Lasar alguns profissionais e arquitetos foi decisiva para a implantaçáo do setor de
Segall. São Paulo. 1944. (Acervo Museu Lasar desenho e projeto de móveis e decoraçóes. Entre eles se destacaram: o
Segall.)
arquiteto alemão Kublinsk, Ludwig Heuberger, irmáo do fundador da empresa,
Lasar Segall. e aquele a quem Theodor Heuberger náo poupou elogios, o arquiteto austríaco
lnterior. Residênc¡a Jenny e Lasar Segall. São
Paulo. 1944. (Acervo Museu Lasar Segall.) Bernard Rudofsky, que viveu em Sáo Paulo alguns anos durante a guerral3.

49
Notas

1. GRINOVER, Lúcio. As impticações da ciência


e do 9.
pensamento logico no desenho ¡ndustr¡at.
São paulo, 10.
FAU-USP, 1964.
11.
2. DEPOIMENTO de John Graz à autora. Sáo paulo,
1979.
3. DEPOIMENTO de John Graz cedido à autora.
São paulo,
1 979.
4. ldem, ibidem.
5. DEPOIMENTO de John Graz à autora. Sáo paulo,
1979.
6. ldem, ibidem.
7.

gravuras expressionistas e desenhos.


O nome de
Heuberger está ligado a uma série de
outras atividades no
setor das artes e da cultura do país: foi
o fundador da
Sociedade pró-Arte, com o objetivo de promover
o
intercâmbio musical e artíshco com a
Aiemanha; com eése
mesmo propósito criou a Revista tntercâmbio,
em 19S5.
Foi também o criador de uma das primeiras
galerias de
arte em Sáo paulo, a Galeria Casa & Jardimlem
193g.
AMARAL, Aracy Abreu. Afte e me¡o ariíst¡co
(l96l_l9Bl):
entre a Íeijoada e o x_burguer. São paulo,
Notel, 19g3,
pp.97-101.
I FERRAZ, Geraldo. Warchavchik e a introdução 1 2. DEPOIMENTO de Theodor Heuberger à
autora. São
da nova Paulo, 1980.
arqu¡tetura no Brasil: l92S a 1940.
Sao paut, n¡RSp, 13. A produçáo de móveis de Rudofsky
1965, p. t48. será analisada na
parte 3.
Parte ll
O movimento moderno na
arquitetura e o móvel

Oarquitetoeomóvel

Os dois grandes centros do país, Sáo Paulo e Rio de Janeiro, praticamente


detiveram, entre os anos 30 e 60, a maioria das iniciativas em matéria de
modernizaçáo da mobília.
O Rio de Janeiro, de certa forma, na qualidade de Capital Federal,
concentrava boa parte dos recursos para investimentos em obras públicas,
surgindo daí uma demanda bem característica de produçáo de mobília de
escritório. Já Sáo Paulo, como maior pólo industrial e econômico, aglutinava
grande parte dos recursos tecnológicos para a execuçáo do mobiliário entáo
projetado.
As outras cidades brasileiras limitavam-se, em sua maioria, a seguir a
orientaçáo proveniente dessas metrópoles. Como já observamos, a
contribuiçáo dos arquitetos para a modernizaçáo da mobília foi expressiva,
ainda que na maioria das vezes a sua produçáo tenha sido em pequena
escala, assistemática e náo comercializada em canais de venda regulares,
ficando mais no nível do atendimento das necessidades de seus próprios
projetos.
Em virtude desses caracteres próprios da participaçáo dos arquitetos no
processo de.modernizaçáo de mobília, nesse momento do texto é necessário
deixar de lado a ordem cronológica que vem presidindo esse trabalho para-
evidenciar este aspecto específico da formaçáo do móvel moderno no país.
Muitos arquitetos acabaram fazendo móveis como eldensáo de sua
própria arquitetura, como parte integrante de seus projetos. Nesse caso,
possuem uma produçáo pontual, direcionada pela busca da unidade do
espaço construído. Entretanto, alguns móveis de arquitetos acabaram
adquirindo vida própria e entraram para o circuito comercial.
O movimento de modernizaçáo do
móvel no Rio de Janeiro

A presença do grupo de arquitetos cariocas


exerceu papel importante
para a animaçáo do movimento
de m¡dernizaçáo do móvel e para a
introduçáo do desenho industriar no país.
Essa posiçáo é defendida por Júrio
Katinsky, apontando, incrusive, várias
características desse fenômeno, entre
as quais "uma teoria coerente do projeto
com a indústria, fruto, sem dúvida
alguma, da absorçäo das riçóes do mestre
francês Le corbusiei, 1. Esse grupo
de arquitetos, liderado por Lucio Costa,
era composto, entre outros, por:
Affonso Reidy, Arcides da Rocha Miranda,
carros Leáo, Ernani vasååncel¡os,
Jorge Moreira e oscar Niemeyer. Esses
arquitetos articuraram-se com os
principais designers, artesáos e produtores
ie móve¡s à época,
encomendando_lhes r ,
res d ê n ci as d e s u a
i

de desenho moderno.
i::ffi ääJ
",[",.L'
:: ::jiiï".,ffi :Íïî:3 :iffi ;"
Entre os arquitetos desse período destacaram-se
duas personaridades,
Lucio costa e oscar Niemeyer, que fomentaram,
sobremaneira, o surgimento
do novo estilo de móvr '
paor compreto nos anos
entáo, sradat'u"r"n,"1Tåu,i;:;ïii,11,""i 60, sendo,

, Foi peras' máos de Lucio costa que a produç âo de designers tarentosos,


rrincipalmente em fins dos anos 5O e
em arquiteto pernambucano, Artur
ar da montagem da exposição de
tendo sido o responsável pela
ito elogiados por Mies van der Rohe
década
de 50, associado a Aroísio Masarháes
"
í::;fli:fi:ï,äffi:."
comunicaçáo visual e desenho industri foi um dos
a criaçáo daLoja Rio de Janeiro,
com a intençáod uma escolha de
que, naquela épo
eqüentes no
Os projetos de móveis de pontual
nda-
Entre eles, destacam-se: o sofá desmo
Artur Lício pontual. integrados, com um desenho racional
LoltJona.O9 gscritório, premiada no Concurso também uma cadeira para mesa de
Nactonat de Mobiliário Brafor. 1g62. re
e
couro, ¿¡þ¿5 desmontáveis.
52

ti
fr
I
j

Artur Lício Pontual.


. Sofá desmontável de três lugares, estruturado
.'l
as soltas em espuma
tecido, apoiadas em
ì; (Arquivo Davino

fr
O mesmo sofá, desmontado.
#
tr æ
Em 1962 participou do concurso Nacionar de
Mobiriário Brafor, no quar
conquistou mençáo honrosa por uma portrona
e mesa para escr¡tório. segundo
o memor¡ar, com este trabarho procurou "estudar
uma portrona e uma mesa
para profissionar riberar ou d¡retor de
empresa, tendo por princípio a opiniao de
que o mobiriário de escritório é um todo.
Que uma portrona e mesa de
executivo devem ser o coroamento de uma
linha de móveis, na qual o
parentesco visuar é gerado pero pranejamento
e racion arizaçaodbs processos
de produçáo"3. pontuar também foi docente
na Escora superior oe oesenno
lndustriar, entre 1g67 e 196g, onde trabarhou
com Karr Heinz Bergmite¡
Aloísio Magalháes e Alexandre Wollner.
Lucio Costa exerceu cont¡nuamente um papel
estimulador para o
desenvorvimento do desenho industriar, riganio-se
a designers,arquitetos, a.
quem encomendou projetos para
Carlo Benvenuto Fonqaro- equipar suas obras. Nesse sentioo, manteve
I
Sala de estar. Década ãe 50. (Arquivo
Fongaro.)
Wilma :::,r, ^": :ï^"_"Ti":î. gau ista Am
I b iente, cont,atanco,
õ;ö, ; ;;;ä;;
ti

:i T: T"":::.:
o:'.i B o a. Vi
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p;;å ; ;;;;; ñ;;åä ;:
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_:, -=:'tí:,o
1,:.,0^",r*:'r?:,o.g_",1:,doarquiteto¡t"r¡"noTarJoã;";;ffi
"t"
;ä;l
ti
desmontáveis,
Joi u ma. das prim
llt^j^ i?l.l I em tubos de ei ras n has de, ó"" i" ;";rnàr,""'rXåoår"""
I i
;;
aço quadrado, com tampos e gaveteiros
jacarandá. em
Fongaro chegou ao Brasir em 1g47. Naquere
momento, o móver moderno
era uma exceçáo num mercado hostir
às novas propostas. o mais fácir era
aliar-se a iniciativas do tipo pascoar Bianco,
mas o arquiteto insistiu no
moderno e coraborou com várias empresas
de mobiriário moderno: paubra,
Jatobá, Ambiente e probjeto. Em todas
eras desenhou rinhas compretas para
residências: salas de janta¡ jogos para
dormitórios, estofados, usando muito
jacarandá e ferro.
À épo"", Fongaro conseguiu bastante
.... . sucesso com uma peça simples e
utilitária, comerciarizada pera roja cristais prado
e Dominici: um móver que
funcionava, ao mesmo tempo, como caixa para
rádio e porta_trabalhos
manuais, permitindo que a mulher
o rádio p"r" qu"tqr", ãnto Oa
casa. ""rr"g""."
idades para ace itar as con cepções
:Tr:::: ":
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I

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:::"'"'ï:: :i:iîï-1ndiçóes p"'" à p'ããLçtå ãã ;ffi;""iä#:
ñTliü::::^"::pî,:l:::r1ïtu"q,ä"s,r;;"'',*;"";"'ffi
uma cadeira especial, diferente da cadeira
Oãamigaa.
::i;
Essa relação entre os pioneiros da arquitetura moderna e o
desenvolvimento do mobiriário no Brasir, arém de caracTetizar a
tendência de
um tempo de renovação, estabereceu uma firiaçáo do ponto
de vista da criaçáo
estética, que ficou arraigada na produção de nossos grandes
designers.
Durante a construçáo de Brasíria, oscar Niemeyer convidou
vários
arquitetos e designers a projetarem móveis para os edifícios púbricos:
Joaquim
Tenreiro, que já havia equipado um projeto que fez para
a residência de
Bemardo Figueircdo. Peixoto, jzr¡çslasuascs. lvlines Gerais, em 1s42: Sérsio Rodrtsues,
:11i:lt:"
andá, desenhada para
::1si"_ (Bernardo Figueiredlsre úrtimo rormou-se árquiteto pera
palácio dos Arcos, ":'îîrdes
l- acu ldade n a'r-de4rqn*etuç æ,aø-¿e J an
N aci o
ei ro, e m 1 9 s7. Ai nda co m o
(Arquivo Bernardo
estudante, começou a fazer móveis na base do autodidatismo
e, entre acertos_
e erros, foi aprendendo à custa de muita dedicação. partiu
para os projetos de
móveis residenciais, pois no mercado havia certa racuna
de móveis adLquaoos
e acessíveis a seus crientes; arém disso, com a verticarizaçãodos
espaços a
partir dos anos 60, o projeto de interiore
canal importante de
absorçáo d
Entre
uitetura de lnteriores
S.A., onde iniciando uma

Joaquim Tenreiro, outro mestre, a quem reconhece


o aprendizado: ,,Tenreiro
me aguçou o estiro; com ere aprendi como uma cadeira
vibra e dura anos sem
se desmanchar" 5. rnfruências bem pesadas, guardando
as marcas dos
mestres, Figueiredo passou a desenvorver uma produçáo
própria. Definiu seu
estilo e inaugurou uma roja para com >rciarizâ-ro,a
chióa ¿a s¡rva & ntetier ¿e
Arquiteturá. o ponto arto de seus projetos foram
os móveis concebidos para o
Palácio dos Arcos, ltamaraty, móveis de grandes
dimensöes, todos em
madeira nobre, inclusive os estofados
Dentre os arquitetos cariocas que contribuiram para
o dgsenvorvimento
da mobília moderna brasireira, vare ressartar
a obra de Aida Boar (1930- ).
Formada na Facurdade Nacionar de Arquitetura,
sob o crima renovador dos
anos 50, Boar iniciou sua produçäo em pequena
escara e pauratinamente seus
produtos ganharam reconhecimento do mercado.
Finalmente, é importante observar que os dois
mais consagrados
arquitetos da verha geraçáo modernista do Rio
de Janeiro, oscai Niemeyer e
Lucio costa, também emprestaram sua coraboração
como desenhistas de
Bemardó Figueiredo. móveis modernos. Ambos desenvorveram uma produçáo
que náo se destaca
Poltrona em jacarandá e palhinha. Década quantitativamente, sendo, porém, muito significativa
60. (Arquivo Bemardo Figueiredo.)
de pâra o pro""""o C"
consolidaçáo do novo móvel.

56
tr
Aida Boal.
Cadeira de balanço Augusta (Arqu¡vo Aida
Boal Foto C. Paranaguá.)
A¡da Boal.
Cadeira Auguslo. (Arquivo Aida Boal Foto C
Paranaguá )
A¡da Boal.
Mesa Sérgio. (Arquivo Aida Boal. Foto C.
Paranaguá.)

i
57
(rl
o
E nesse conteldo que se coloca a contribuiçáo de Lucio Costa com a
empresa Oca, onde, em 1960, desenhou um modelo de poltrona em jacarandá
e couro. Oscar Niemeyer, no entanto, iniciou sua produçåo um pouco mais
tarde, por volta de 1970, quando, na busca de uma continuidade entre sua
arquitetura e os elementos que a completavam, passou a desenhar móveis.
Dessa forma, procurou garantir a harmonia entre o equipamento, o arranjo
interno e o edifício, preservando a unidade dos espaços concebida em seus
projetos.
Essa posiçáo é explicada por Oscar Niemeyer: "O problema que eu
encontrei no equipamento dos edifícios é que, muitas vezes, o mobiliário, o
arranjo interno, prejudica completamente a arquitetura. A arquitetura prevê os
espaços que devem ficar livres entre grupos de móveis, e às vezes, os móveis
sáo colocados de uma maneira imprópria, os espaços se perdem e a
arquitetura fica prejudicada. De modo que nós procuramos sempre marcar o
Luclo Costa. lugar dos móveis, mas, mesmo assim, às vezes eles náo estáo de acordo com
Poltrona eslruturada em jacarandá, assento e a arquitetura, e o ambiente se faz sem a unidade que a gente gostaria. por
encoslo em espuma de borracha revestidos em
couro. 1960. (Arquivo Sérgio Rodrigues.) isso tudo é que eu comecei- É claro que existem bons decoradores no Brasil,
mas, quando a gente náo tem sorte de encontrar um desses decoradores, o
nosso p lmbuído dessas preocupa
principa uçäo de mobília em nosso
começo e madeira colada, que era
suecas, e projetá-los com superfícies maiores. Assim, fez cadeiras, poltronas,
mesas, cadeiras de balanço, espreguiçadeiras e marquesas. Além da madeira,
ggæglq[Þe¡!Æuro e a palhinha para asseotoe_encosto. lã-¡c¡almente, a
empresa responsável pela fabricação desses móveis foi a Tendo Brasileira, em
Sáo Paulo. A partir do final da década de g0, Móveis Teperman passou a
produzir a coleçáo da mobília de Oscar Niemeyer.
Com esses móveis, combinados a outros, Oscar equipou vários de seus
projetos, entre eles Baubigny e a sede do partido Comunista na França7.
Segundo ele: "Gostamos de usar esses móveis, com outros, de outros
arquitetos, de modo que há uma variaçáo, mas todos presos ao princípio de
A¡da Boal.
Cadeira Cecília. (Arquivo Aida Boal. Foto C. que o móvel é complemento da arquitetura e deve ser atualizado e moderno
Paranaguá.) como a própria arquitetura. Deve haver uma adequação entre o móvel e o
n Aida Boal.
Cadeira J. C. Cavalcanti. (Arquivo Aida Boal.
interior, dependendo do tipo de prédio. Numa residência, por exemplo, os
móveis devem acompanhar a maneira de viver do homem de hoje; eles sáo
Foto C. Paranaguá.)
mais simples, menos austeros. o mobiliário antigo se adaptava a uma atitude
A¡da Boal.
Pohrona Mônica com puff. (Arquivo Aida Boal. diferente do homem. Hoje a coisa mudou muito e o mobiliário acompanha esse
Foto C. Paranaguá.) modo de vida diferente, esse modo de ser das pessoas de hoje"a.
Oscar N¡emeyer e Anna Mar¡a Niemeyer'
Croquis de caãeira com puff e espreguiçadeìra'
Oscar NiemeYer.
lnterior da casa em Canoas. Rio de Janeiro'
tSSe. 1n."*o Fundaçáo Oscar Niemeyer' Foto
Michael Mach )

' i't:.,'.
-. !
-;..
Oscar Niemeyer e Anna Maria Niemeyer.
Marquesa em madeira com assento em
palhinha natural. '1974. (Foto Paulo Romeu

Oscar N¡emeyer e Anna Maria N¡emeyer.


Espregu¡çade¡ra de balanço em madeira e
palhinha com almofada em rolo revest¡da em
couro. 192. (Foto Paulo Romeu Bissoli.)

61
Sergio Bernardes.
Cadeira Rampa, estruturada em aluminio,
madeira, acrílico e aÇo tubular Acabamento em
tecido, couro, lona, junco (Arquivo Sergio
Bernardes.)

Sergio Bernardes.
Sofá berço, estrutura em alumínio, madeira'
acríl¡co, ferro, aço, junco. Acabamento em rede
dobrada, tec¡do, couro e lona (Arqu¡vo Serg¡o
Bernardes )

Sergio Bernardes.
Cadeira-rede, estrutura em alumÍnio, madeira
tubular, aço, junco. Acabamento em rede
dobrada, tecido, couro e lona (Arquivo Sergio
Bernardes.)

\i&t'>:
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l'r
¡.1
¡d
--ï--
do
O movimento de modernizaçáo
móvel em Sáo Paulo
movel
de modernizaçáo do
Paulo' a-se que o movimento
Em Sáo
se desenvolveu, inici dos
nos

so referir a obra de Rino


novaçáo da arquitetura
Levi (1901-1965), que se
d de unidade entre a
no Brasil. Sensível til
atento às necessidades
"
arqu'"..-"å"0,.'"a,oconto,io-ámoiental,odesigndemobília
ele t
de
conl ao
co
1942, Pode-se observar de conforto n
t"ra atender as necessidades entre as
"t"Lãã r""ionatiia* o" circulaçáo ¡nterna de espectadores com
auditório
"" uma portrona em aço tubular'
fireiras da pratéia, *,nã',]äJ';;"Ë*
t"""n¡"to basculante' em',l 948' Bratke
em 1930 pelo Mackenziee'
Formado
"nn"nñå''iå-utã"n""
define-secomohomemdeprancheta,com.interesses
de mil obras
pãr"ã tendo proietado cerca
'"o," ""*uuçáo'
o¡,", B ratke *'
;il?: :îg::1i"t:ii"!Ele. desenhou
o
" å:' 1.111,:::l,oo, "o "
riscos para
;;;;"t artes aplicãdas' ou em ponlo richelieupara
ados em ponto-de-cruz
desenhou
Bareo de ltapetininga' Enlre 1924125
a Agência Lila, na rua para serem exibidos antes
#"d;Je vidro' pintados'
anúncios de filme
ã"" no cin",.i"ääoäijjo;;::"""Xî::åff j:ii!;-1ff
"","0". " "","
estilo' passando pela fase
sua geraçáo, ele fez muito
de começar a projetar o
moderno'
,", ..,
"ñt", contribuiçáo de Bratke' e seu escritório à rua
Deu-se, então' a grande
encontro
Baráo de ttapetiningJa'c"¡ou
t" transfórmando nu I ponto de muitos
Com ele colaboraram
obrigatório p"'t e arquitetos da época' da
campos
"nËì"" se destacaram nos vários
profissionais o*, pãtìã*'tint"' como desenhista'
gni'" efest Lívio Abramo' que trabalhou
cultura brasileira' zan¡ne catdas, maquetista'
Francisco Reboro ö;;J;;(1903-1980), José

Carlo Benvenuto Fongaro'


63
t/ææ ¡qSA

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b'
¡. þ
b,
$
Rino Levi.
Desenhos para o edifíc¡o Columbus, São paulo,
1 932. (R. Le'ti,'t974.)

64
Bino Levi.
Cadeira de auditório do Teatro Cultura Artíslica,
em aço tubular cromado, com assento
revestido em tec¡do, dotada de um mecanismo
basculante que perm¡te recuo para facilitar o
acesso aos assentos. 1948. (Arquivo Rino Levi
Arquitetos Assoc¡ados.)
Bino Levi.
Corte esquemático. Sem data.
R¡no Levi.
V¡sta do auditório com äs cadeiras ¡nstaladas.
(Arquivo Rino Levi Arquitetos Associados.)

65
Oswaldo Arthur Bratke. Bratke desenvolveu importantes iniciativas para a produção industrial de
Desenho da cadeira desmontada. Sem data.
(Arquivo Oswaldo Arthur Bratke.) equipamentos para acabamentos na construçáo c¡vil: janelasl0, maçanetas,
Oswaldo Arthur Bratke. esquadrias etc. Em matéria de mobília, projetou alguns equipamentos para
Cadeira em chapas de compensado recortado, completar suas construçóes e colaborou com a empresa Jatobá, para a qual
presas com um só parafuso 1948.
.J (Foto Fernando chaves.) desenhou uma mesa de centro para produçáo em série.
-i Em 1937, Bratke foi pioneiro no projeto e utilização de cozinhas e copas
il industrializadas, compostas por peças pré-fabricadas, que eram montadas na
própria obra e embutidas na parede. Na década de 40 começou aÍazer
experiências com o compensado recortado, tendo desenhado algumas
cadeiras. O projeto de Vila Amazônia e Vila Serra do Navio, desenvolvido pelo
arquiteto no ano de 1956/57, permitiu-lhe produzir móveis simples e
I adequados à região, através do uso de ferro pintado a duco e fibras naturais
da regiáo.
O interesse crescente dos pioneiros da arquitetura moderna pelo design
da mobíliae pelos equipamentos de interiores também acha-se presente na
obra do arquiteto Henrique Ephim Mindlin (1911-1971). Engenheiro-arquiteto
pela Escola de Engenharia Mackenzie, Mindlin desenvolveu uma carreira
marcada por realizaçoes importantes para a difusão e consolidaçáo da
arquitetura moderna entre nós. Entre 1933 e 1941 , através de seu escritório
em São Paulo projetou residências particulares e edifícios, para alguns dos
quais também desenhou mobília. Aliás, vale destacar que ele estabeleceu
sociedade com o arquiteto e designerde móveis Giancarlo palanti, originando
a empresa "Henrique E. Mindlin, Giancarlo palanti e Arquitetos Associados
s.c. Ltda-". Em 1942 transferiu residência para o Rio de Janeiro, iniciando-se
uma fase de intensa produçáo em sua carreira, que lhe valeu vários prêmios
em concursos. Dotado de espírito aberto e permanentemente comprometido
com o projeto moderno, Mindlin foi também um animador das artes e da
cultura, promovendo exposiçóes, escrevendo artigos para revistas
especializadas, além de desenvolver atividade docente na Faculdade Nacional
de Arquitetura da Universidade do Brasil.
Oswaldo Arthur Bratke.
Desenho de poltrona em madeira com assenlo
e encosto enca¡xados. Sem dala-
(Arqu¡vo Oswaldo Arthur Bratke )
Oswaldo Arthur Bratke.
Perspectiva de ìnlerior de sala de estar na
residência do arquiteto, em São Paulo 1948
(Arquivo Oswaldo Arthur Bratke )

67

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Outra personalidade fundamental que se impoe como marco de
referência do processo de modernizaçáo da mobília é Joao Batista Vilanova
Art¡gas (1915-1985), cujo nome está indissoluvelmente ligado à criaçáo valiosa
e autêntica da grande arquitetura brasileira, surgida nos anos 30 Mas a
própria concepçáo do espaço arquitetônico professada por ele levou-o
também a contrlbuir de maneira decisiva para a implantaçáo do desenho
industrial em nosso país.
Na área do mobiliário, Art¡gas desenhou, em 1948, uma poltrona,
influenciado por Richard Neutra, executada em compensado revestido de
peroba, com assento e encosto em tecido. Nesse mesmo ano, desenhou uma
outra poltrona da linha Bauhaus, em compensado de pinho, com assento e
encosto em borracha revestida de tecido. No setor do mobiliário institucional
Artigas projetou uma cadeira giratória em metal pintado, com assento e
encosto estofados recoberto por couro natural. Essa cadeira é atualmente
produzida pela Nucleon 8, na coleçáo Os Modernos Brasileiros.
Para Artigas, o que ¡mportava com relaçáo ao móvel no Brasil é
recuperar o afeto especial que o homem brasileiro Sempre teve pela madeira,
redescobrir a origem nos nomes das essências vegetais e das diversas
madeiras, "só assim sairemos de nossas raízes, partiremos para o plano
universal da forma moderna e, depois, reencontraremos na nossa própria terra
os principais elementos que compóem o passado de nosso gosto"' Dessa
maneira, concluiu ele, "(...) a consciência do colonizado flui sob o pé do
colonizador"ll.
Desde pequeno Artigas aprendeu a respeitar o trabalho dos artesáos;
seu avô lnocenzio Artigas era um deles. um camponês italiano, radicado no
Paranâ, que fazia de tudo, de queijos a rodas de carroças, que trabalhou
durante certo período com a comercializaçáo de madeiras. Foi pelas máos do
avô que ele tecebeu sua primeira coleçáo de livros de História da Arte e um
incentivo múito grande a deixar sua cidade natal para estudar em Sáo Paulo.
Na área do mobiliário Artigas desenhou, em 1943, uma cadeira em
compensado recortado, com couro. Em 1948, desenhou uma cadeira para oS
I vários projetos de residência executados à época, incluindo a sua própria, à.
rua Baráo de Jaceguai, Sáo Paulo. Trata-se de uma cadeira de braços'
Henrique Mindlin.
Cama em cerejeira. 1938. Residência José E.
assento e encosto estruturados em madeira, almofada em algodáo revestida
(r Mindlin. (Foto Bomulo Fialdin¡.) em tecido azul mescla. Projetou também móveis para cozinha, em
{
Henr¡que ilandl¡n. compensado revestido em mogno, 1982. Nesse mesmo ano desenhou estante
Penteade¡ra em cerejeira. 1938. Residência em compensado encerado, com portas revestidas em fórmica brilhante nas
José E. M¡ndlin. (Foto Romulo Fialdini.)
cores azul, amarela e vermelha, numa alusáo cromática à cadeira Red and
Henr¡que il¡ndl¡n.
Berço em madeia com tela de proteção lateral Blue de Gerrit Rietveld.
1942. Residência José E. M¡ndlin. A influência dos assentos aéreos e elásticos estruturados em metal,
(Foto Bomulo Fialcl¡ni.)
típicos do início do processo de modernizaçáo dos móveis europeu e
Henr¡que Mindlin. americano do final dos anos 20, está presente na obra de um dos mais
Mesa em madèira. (Acervo Museu Lasar
Segall. Foto Lucia M. Loeb.) expressivos arquitetos paulistas, Paulo Mendes da Rocha.
I
69
João Bat¡sta V¡lanova Artigas.
Foto e croqu¡s de cadeira de braços em
compensado recortado, assento e encosto
estsuturados em made¡ra, almofada revest¡da
em tecido de algodão. 1948. Residência Rosa
Camargo Artþas. (Arquivo da Aúora.)
João Baüsta Vllanova Art¡gas.
Polùona em compensado recortado e couro.
Msla frontal. (Arquivo Rasa Camargo Anþas.)

João Bdsta V¡¡anoya Artlgas.


Na página ao lado, poltrona em compensado
recoñado e couro. Croquis. Datado
retroativamente de 1948. (Afquivo da Autora.)

70
l-' -Ì = -î.
I
I
Desde o final de seu curso de Arquitetura na Universidade Mackenzie,
ele começou a trabalhar em equipamentos e decoração para a empresa
paulista lnterior's. Ainda que a título de atividade secundária, o arquiteto
acreditou que havia no desenho industrial do móvel um mercado promissor,
que estava sendo ameaçado pelas multinacionais.
Em 1955, Paulo desenhou uma cadeira em aço flexível dobrado a frio e
couro, para a lnterior's, de São Paulo, empresa pertencente a um grupo de
empresários italianos dedicados ao ramo de móveis e decoração.
Originalmente o arqu¡teto pretendia utilizar um tecido feito com a fibra do
@ s-e ad eq uqtro-o ao p rojètòleséñh o-l
também uma cadeira inspirada na cadeira africana, que foi êxecutada para
equipar o projeto de Warchavchik, do Clube Atlético paulistano.
A euforia do início das atividades como designerfoi passageira, pois,
como afirmou Paulo Mendes da Rocha, "(...) os arquitetos sentiram um campo
promissor, mas retrocederam. Havia possibilidade de fazer uma indústria
nacional, com perspectivas brasileiras, uma lndústria que pudesse ser
brasileira e nos ter libertado. O peculiar é o uso, o costume, que pode
redundar em característ¡cas estéticas próprias. lsso amplia nossa riqueza
visual e formal. Acho que os arquitetos náo tinham consciência de perder esse
mercado. lnfelizmente, náo floresceu o aspecto didático do móve|"12. Apesar.
das dificuldades com o mercado, Paulo Mendes da Rocha desenhou nos anos
80 uma chaise-longue executada em folhas de aço, pintadas à base de resina.
outra significativa contribuiçáo para o desenho industrial do móvel em
Sáo Paulo circunscreve-se a uma geraçáo de arquitetos formados pela
Faculdade de Arquitetura e urbanismo da universidade de são paulo a partir
de fins dos anos 50. Eles manifestaram um interesse crescente pelas artes
gráficas e.pelo desenho industrial e participaram ativamente dos concursos de
desenho
- entáo promovidos - publicaçÕes
dos mais variados objetos. Esse interesse
foi-se ampliando, das capas das do GFAU da FAU _,
- Grêmioque
para flâmulas, cartazes, luminárias e móveis. um dos arquitetos participou
desse momento é Júlio Roberto Katinsky. ocorre que sua contribuição para o
desenho industrial brasileiro destaca-se dos demais arquitetos; vai além da
prancheta, aventurando-se nos caminhos tortuosos das complexas relaçóes
entre arte e técnica no Brasil. Do esforço empreendido por ele para
Paulo Mendes da Rocha. compreender a evolução da história da técnica no Brasil surgiram vários
Cadeira estruturada em barra de aço flexível, trabalhos teóricos13-
com assento e encosto constituído por capa em
couro ou lec¡do. 1955. Esta cadeira fo¡ A contribuiçáo de Katinsky náo se restringiu, entretanto, à âreateórica,
desenhada espec¡almente para a área de pois, desde o final dos anos 50, ele desenhou móveis para produçáo industrial,
varandas, bar e piscinas da nova sede do
Clube Atlético Paul¡stano, projeto de Gregori
numa colaboraçao com Jorge Zalszupin, na empresa LAteliel entre 195g e
Warchavchik. (Catálogo Nucleon.) 1961 , onde projetou móveis sempre privilegiando os materiais nacionais.
Var¡ante giratória da mesma cadeira, com segundo Katinsky, "(...) era fatar que o crìmpo mais propício para se fazer
rodízio. experiências de desenho industrial tinha que ser a indústria de móveis, porque

72
ada,
a
riais

Paulo Mendes da Rocha.


Croquis da espregu¡çadeira'
(Arquivo da Autora.)

À 73

t
EmsuasconcepçÓesdoutrinárias,Katinskydiferencia-sedatendência
formalista presente no ensino do desenho industrial em algumas faculdades,
elaborando uma reflexáo ideológica diante do papel social do design, tentando
político' E o que
entender a relaçáo da arte e técnica em funçáo do momento

futurista-fascista ao movimento da "arte pela arte"'


outro arquiteto que prestou sua contribuiçáo para o desenvolvimento do
desenho da mobília moderna é Abraháo sanovicz. segundo ele,
"o que me
ligou ao desenho industrial foi um movimento dos estudantes da
FAU-Maranháo, entre eles Joäo Xavier, Ludovico Martino, Joáo Carlos
cauduro, Júlio Katinsky, Henrique Pait, Luis Gastáo de castro Lima e Joáo
Rodolfo stroetèr. Nós vivíamos com a sensaçáo de democratizar o mundo dos
objetos, principalmente com preocupaçoes estéticas de encontrar a beleza do
mún¿o dos objetos; ficar só na casa era muito limitado"16. Com a criaçáo da

realizou alguns projetos de equipamentos públicos para jardins da cidade de


Sáo Paulo.
As dificuldades para realizar os projetos de desenho industrial
ue
ob
po
De importância pioneira para o desenvolvimento do desenho de mobília no
Jullo Roberto Katlnsky. Brasil foi a colaboraçáo de Abraháo com a empresa Escriba, onde, num
período de mais de dez anos 1962-1973 projetou móveis de escritório,
- -,

)F
Jul¡o Roberto Kat¡nsky e Jorge Zalszupin.
Mesa de centro em compensado de iacarandá'
1959. (Arquivo Jul¡o Roberto Kat¡nsky. Foto
M¡chael Afues L¡ma.)
Julio Roberto Katinsky.
Poltrona estruturada em aço e madeira com
assento e espaldar de couro. (Arquivo Julio
Roberto Kat¡nsky. Foto M¡chaelAlves Lima')
Julio Roberto Katinsky e Jorge Zalszupin.
Tamborete estruturado em aç! e madeira.
Assento em couro. 1959. (Arquivo Julio Rob€rto
Katinsky. Foto M¡chael Alves Lima.)
Abrehão Sanovicz.
Sistþma de móveis para escritório. Escriba.
1962. (Arquivo Abrahão Sanovicz.)
Abrahão Sånoyicz
Croquis de mesa para escritório. Escriba.
1962. (Arqu¡vo Abrahão Sanov¡cz.)

76
implementando de forma representativa uma mentalidade de projeto na área
do mobiliário institucional.
Deve-se ainda destacar a contribuição do arquiteto gaúcho Eduardo
Corona. Na área de desenho industrial, trabalhou pela sua difusáo,
coordenando, em 1960, o concurso de mobília promovido pela empresa
Ambiente lndústria e Comércio de Móveis S.A', e o IAB lnstituto dos
-
Arquitetos do Brasil, departamento de Sáo Paulo.
Como desþner, sua produçáo é relativamente escassa, destacando-se
alguns projetos paraa empresa Ambiente, dentre os quais uma cadeira
desenhada em'1963, em jacarandá, com assento e encosto em couro natural
grosso costurado. O couro era Solto e afivelado embaixo e os braços eram em
tiras de couro Suspensas, fixadas em enrem¡dades arredondadas, integrantes
da própria estrutura de madeira dos pés.
Neste contexto da contribuiçáo dos arquitetos para o design da mobília
vale ainda destacar a obra de José Gabriel Borba Filho (1942- ). Ele pertence
a uma geraçáo que participou das atividades da Faculdade de Arquiletura e
urbanismo da Universidade de sáo Paulo na área do desenho industrial,
iniciadas em '1962, através de sua seqüência de disciplinas ministradas pelo
Departamento de Projeto.
Borba criou o Pequeno Mobiliário Brasileiro a parlir de uma ampla
pesquisa sobre as relaçÓes de posturas físicas transmitidas simbolicamente,
ao longo da história, através das artes plásticas' Trata-se de um trabalho
crítico sobre o desenho industrial, seu uso social e político no contexto
brasileiro. É composto por um conjunto de cinco peças, com estrutura de ferro,
assento e encosto em tecido e corda, tudo sobre rodízios. Algumas soluções
técnicas utilizadas derivam de tradiçóes correntes na cultura popular no Brasil:
ganchos de.rede, rede, rolemá de carrinhos de meninos. Este projeto obteve o
primeiro prêmio do concurso "Forma de Desenho lndustrial", em 1977 '
No extenso caudal das contribuiçoes dos arquitetos da FAU-USP na área
do design de mobiliário deve-se destacar a atuaçáo de Enzo Grinove¡ que
além de projetos também dedica-se à animaçáo do mercado neste setor,
divulgando a obra de designers brasileiros e estrangeiros.

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7l
I

I
i;r
.:
'r

Gsbrlel Borbå.
Pequeno Mobil¡ário Bras¡leiro. Fotos e croquis
ñostrando variações na estrutura e no
€stofamento. 192. (Arquivo Gabriel Borba.)

78
Enzo Grinover.
Mesa de centro ou lateral com base em
made¡ra e tampo de cristal. Compasso D'Oro.
(Arquivo Enzo Grinover.)
Enzo Grinover.
Mesa Quadridona em madeira, com pés e abas
extensíveis. Compasso D'Oro. (Arquivo Enzo
Grinover.)

Enzo Grlnover.
Mesa Escrita em mogno e couro natural.
Compasso D'Oro. (Arquivo Enzo Grinover.)
Notas

1. KATINSKY, Júlio Roberto. "Desenho industrial no Brasil. São Paulo, 1980.


Meados do século XIX até 197O". ln:ZANlNl, Walter (org.). 12. DEPOIMENTO de Paulo Mendes da Rocha à autora. Sáo
História geral da arie no Brasil. Sáo Paulo, lnstituto Walter Paulo, 1980.
Moreira Salles, 1983. 13 Foi publicado um Guia para a historia da técníca no
2. Conversa telefônica de Lucio Costa com a autora. Rio de Brasil colônia, Sáo Paulo, FAU-USP,'1976. A primeira
Janeiro,1980. grande sistemalizaçáo crítica de todo o desenho
PONTUAL, Artur Lício. Memoríal de Projeto para Prêmio industrial brasileiro, de meados do século XIX até 1970,
Brafor de Mobiliário. Projeto de mesa e poltrona para foi publicada num teno de 1979, escrito para a História
escritório. Rio de Janeiro, 18.10.1962. da arie no Erasl, São Paulo, lnstituto Walter Moreira
DEPOIMENTO de Carlo Benvenuto Fongaro à autora. Sáo Salles, e, finalmente, a Katinsky conjuntamente com Ruy
Paulo, 1980. Gama coube a criaçáo e coordenação da primeira
5 DEPOIMENTO de Bernardo Figueiredo à autora. Rio de disciplina, em nível de. pós-graduaçáo, sobre a história das
Janeiro, 1980. artes e da técnica, ministrada em 1980, na FAU-USP, sob
6 DEPOIMENTO de Oscar Niemeyer à autora. Rio de o título de Trabalho e Pensamento na História das Artes e
Janeiro,1979. da Ciência.
7. Embora a Mobilier lnternational, em Paris, tenha produzido 14. DEPOIMENTO de Júlio Roberto Katinsky à autora. São
alguns móveis de Oscar Niemeyer para o mercado Paulo, 1980
europeu, as poltronas para a sede do Partido Comunista 15. KATINSKY, Júlio Roberto. História da arte no Brasil. Sáo
foram executadas pela Teperman. Paulo, Fundação Walter Moreira Salles, 1979.
8. DEPOIMENTO de Oscar Niemeyer à autora. Rio de 16. DEPOIMENTO de Abrahão Sanovicz à autora. São Paulo,
l; Janeiro, 1979. 1 980.
i

,t
9. Há um importante grupo de arquitetos formados pelo 17. Em sua formação profissional destacam-se, entre outras,
Mackenzie que se dedicaram ao desenho de mobília, nos as seguintes at¡v¡dades na âtea de desenho industrial:
anos 50: Salvador Candia, Roberto Aflalo, Carlos Barjas participaçáo no curso da Escola de Artesanato do Museu
Millan, Miguel Forte e Plínio Croce, cuja produçáo será de Arte Moderna de São Paulo, onde se familiarizou com
analisada na Parte 3. técnicas de cerâmica, gravura etc., com professores
10. Na década de 60 projetou uma janela basculante que náo renomados, como Lívio Abramo, Tarsila do Amaral,
oferece ¡mpactos, como as similares existentes no Antônio Gomide, Mário Gruber; em '1959, desenvolveu
mercado. Essa janela foi produzida em escala industrial. estág¡o de desenho industr¡al, artes gráficas e arquitetura
11. DEPOIMENTO de João Batista Vilanova Artigas à autora. no escritório de Marcelo Nizzolli, em Miláo.
Parte lll
A consolidaçáo da Produção
do mobiliário nacional

No limiar de um novo estilo

Nesta parte do trabalho pretendemos destacar o surgimento de um grupo de


profissionais que passou a realizar desenhos de móveis e outros
equipamentos da habitaçáo, e que, pela temática proposta e pelo uso de
materiais nacionais, estabeleceu um novo estilo, mais próximo de nossa
realidade cultural.
O início dos anos 40 apresentou um panorama que pode parecer, à
primeira vista, inócuo, pois, da produçáo corrente desse período, náo emergiu
nenhum tipo de originalidade e, em geral, os modelos náo passaram de
imitaçóes de obras então em voga na Europa. Foi um notável mostruário de
móveis pé-palito, que seguiram os vários estilos ecléticos, somando-se a esse
ecletismo um certo mau gosto que predominou na época. Mas, na verdade,
não se pode compreender a evoluçáo do móvel moder:no no Brasil, a partir do
segundo pós-guerra, sem considerarmos a lenta maturaçáo que a precedeu.
Esse período correspondeu à consolidaçäo de algumas conquistas
modernas. Caracterizou-se por intensificar as experiências de desenho e
produçáo, que foram tornando realidade o projeto do móvel moderno
brasileiro, pautado por um ideal estético mais condizente com a época e com
as nossas disponibilidades de materiais e condiçóes de produçáo. Os
profissionais gue estiveram preocupados em acompanhar as modas dos
grandes centros europeus tenderam a uma revisáo de suas posturas iniciais,
procurando um caminho diferenciado, muito embora ligado a esquemas
culturais europeus. Tais preocupaçóes e características se prolongaram
durante todo o fim da década de 40, mormente na obra de Joaquim Tenreiro,
Lina Bo Bardi, Giancarlo Palanti e Bernard Rudofsky. Nesses casos, obteve-se
uma þroduçáo que conjugou o espírito moderno do despojamento e
simplicidade ao uso de nossos materiais, assegurando ao móvel então
produzido uma qualidade universal e artisticamente elaborada, o que alterou
de maneira significativa o aspecto do mobiliário brasileiro.
Essa nova feiçáo orgânica, em contraste com o aspecto estático,
característico do período antecedente, é o traço que distingue, de um modo
geral, a produçáo daqueles autores. Em relaçáo ao móvel do período anterior,
isso trouxe uma nova concepçáo de conforto, permitindo melhor ajustamento
ao corpo, trazendo uma multiplicidade de formas, recurvas e adelgaçadas.

81
É importante frisar que, sob esse clima, o mobiliário foi, gradativamente,
sendo absorvido pela indústria, surgindo entáo, no sent¡do específ¡co da
palavra, nossos primeiros designers, embora ainda, em sua grande maioria,
profissionais estrangeiros que se radicaram no Brasil logo após a guerra. Este
fato entretanto conferiu uma característica mais internacionalizante aos
desenhos, conforme constatou Pietro Maria Bardi: "(...) Eram móveis ainda
ligados a esquemas culturais europeus, mas com uma procura acentuada de
materiais brasileiros"l .
Joaqu¡m Tenreiro.
Detalhe de capa de catálogo da empresa Como vimos anteriormente, a presença dos profissionais estrangeiros no
Tenreiro, Móve¡s e Decoraçöes. Década de 50. centro do processo de modernizaçáo da arquitetura e do móvel brasileiros foi
(Arquivo Joaquim Tenreiro.)
fundamental, sendo necessário, mais uma vez, reiterar que, apesar de seus
ideais nacionalistas, o movimento modernista náo fez nenhuma espécie de
restriçáo ao trabalho dos estrangeiros que aqui se estabeleceram.
A configuraçáo dos elementos indicados, entretanto, náo correspondeu,
antecipadamente, a um domínio total da situaçáo; quando muito podemos
dizer que, no conjunto, eles representaram as condiçöes mínimas necessárias
para assegurar a efetivaçáo do móvel moderno entre nós.

A presença de mestre Joaquim Tenreirot das grandes


marcenarias cariocas à Langenbach & Tenreiro
ëþ

H
De todos os designers de seu período, Tenreiro (1906-1992) é,
certamente, o mais representativo, seja pelo vìgorããsua obra, seja pela alta
qualidadeartesanal de sua produçáo, seja porque nos remete mais
profundamente às nossas tradieões lusas no uso corriqueiro e elegante dos,
jacarandás e da palhinha. Pintor da boa cepa portuguesa, ligou-se ao Núcleo
..-,
-BernãñêflÍz. logo depois de chegado ao Brasil, em 1928, realizando retratos e
paisagens, e interpretando liricamente os morros cariocas. Náo trouxe a

i+ # formaçáo especializada dos outros arquitetos que para cá afluíram nesse


mesmo período, pois nasceu em Melo, uma aldeia ao norte de Portugal, que
náo oferecia os recursos necessários para sua formaçáo profissional, o que,
de certa forma, era prescindível para o artista, herdeiro da verdadeira tradiçáo
artesanal portuguesa dos trabalhos em madeira, que já era um patrimônio
familiar. Ele afirmou: "Eu conheci o trabalho de madeira perfeitamente bem
com meu pai, que era um artesáo de móveis de primeira ordem. Na Província,
o que era de madeira era com ele; náo houve especializaçáo. Homem que
trabalhou em madeira, trabalhou em tudo, só náo fez tonéis de vinho"3.
De fato, a obra de Tenreiro revela essa proximidade familiar e quase
amorosa com a madeira: seu fascínio pela textura da fibra, pela organicidade e
Joaquim Tenre¡ro'
Po[rôna Leve, estruìurada em pau-marfim,
em
bracos e oés torneados, assento e encosto'1942
de bonacha revestido em tecido
"splt"
(Arquivo Joaqu¡m Tenreiro.)
Joaqu¡m Tenreiro.
Poltrona Leve em ¡mbuia lustrada preta'
estofada com tecido preto e branco, com
desenhos de Fayga Ostrower. 1942' (Arqu¡vo
Joaquim Tenreiro.)
Joaqu¡m Tenreiro'
Cadéira estruturada em jacarandá com assento
e encosto em tecido' Sem data. (Arquivo
Joaquim Tenreiro.)

83
tatilidade transparece no jogo de volumes, formas e cores que presidem a sua
produçáo. A esse respeito, Antônio Houaiss observou: ,,Como o amor de
Tenreiro por essa matéria, o senso organizador, despojador, buscador da
vocaçáo dessa própria matéria-prima, prlmava primeiro em dar-lhe na sua
forma final artesanalíssima, essa serena essência de linho, ligno, lenhame,
ligname" a.
As realizaçoes de Tenreiro no setor de mobília compreendem duas fases
bastante distintas: j a j942, em que
ele se dedicou ao es casas de
mobília, produzind unda abrangeu o
período de 1942 a Tenreiro Móveis
e Decorações, pondo em prática suas concepçoes de móvel moderno.
Joaquim Tenre¡ro. o contato com o desenho de mobiriário começou com o trabarho de
Cadeira estrutural em lalão, assenlo e encoslo auxiliar do designerfrancês Maurice Nosières, da firma alemá c. Laubisch,
estofados em veludo.l 961 . (Arquivo Joaquim
Tenreiro.)
H¡rth & C., entre os anos de 1931 a 1934. Como ele dominou os

Esse período, circunscrito à produçáo de móveis ecréticos, foi muito


¡mportante na formaçáo de Joaquim Tenreiro, possibiritando-rhe
desenvorver
. todos os estilos: Luís XV, Luís XVr, regente, francês, ingrês, itariano,
espanhor,
português, horandês, e até mobiriário de estiro árabe,
constituindo, dessa
forma, uma base sórida para as suas novas propostas, inventivas inovadoras.
e
_ I-:-l ' Ainda que, na Laubisch, o conjunto da produçáo refletisse a
monumentalidade do gosto dominante, Tenreiro ousou apresentar
seus
=_-l==:r desenhos modernos, despojados e sóbrios, que suscitaram entusiasmos,
_- r-':1!-
-____._
-- -----
.-f-----

Joaquim Tenrelro.
Cade¡ra estrutural em latão à frente de biombo
pantográf ¡co- 1 965. (Arquivo Joaquim
Tenreiro.)

84
Joaquim Tenre¡ro.
Canåoé de três lugares em jacarandá com
encosto-em palhinha 1958' (Arqu¡vo
".".nto "Tenreiro.)
Joaquim

geral
são um grupo que nunca aceita inovaçöes e, quando ace¡ta' em
deformam-nas"e.
É importante, sobretudo, destacar que essa produçáo inicial de Tenreiro,
garant¡u o
o anseio profundo de renovar a linguagem do móvel no Brasil,
al|cerceparaabuscadenovasespeculaçóesdomóvelmodernoquese
sucederam a Partir de entáo.
Se, por um lado, o mobiliário de Tenreiro funcionou quase como um
modo de
manifesto em favor do estilo moderno, por outro lado, em relaçáo ao
produçáo, é preciso lembrar que era ainda completamente artesanal' em que o
protótþo tinha uma tiragem mínima e, muitas vezes, ficava no exemplar único,

es- Mesa tr¡angular por questóes de compromisso com o cliente.


. 1961' Cadeira em contando com cerca de cem artesáos de alto gabarito, que trabalharam
' (Arquivo Joaqu¡m
Tenre¡ro.)
sob sua orientaçáo direta, Tenreiro sempre se manteve afastado da indústria.

85
I
I

Joaquim Tenreiro.
Foto e des€nhos da cadeira de balanço
esEuturada em madeira, com assento e
encosto em couro. 1947. (Arquivo Joaquim
Tenreiro.)

Joaqulm Tenre¡ro.
Cadeira de balanço em palhinha e jacarandá.
1959. (Arquivo Joaquim Tenreiro.)
Joaqulm Tenrelro.
Cadeira em jacarandá e palhinha, inspirada na
cadeira portuguesa, conhecida como cadeira
de "encostas ou.bacalhau". 1965. (Arquivo
Joaquim Tenreiro.)

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