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ESTUDO PARA TOMBAMENTO DO CENTRO HISTORICO DE NATAL/RD

Da mesma forma, 0 prédio do antigo Grupo Escolar

Augusto Severo, constitui mais um projeto do arquiteto


Herculano Ramos, tendo sido inaugurado em 1908. O

Grupo Escolar foi o primeiro construido no Estado dentro


do novo modelo educacional que deveria ser adotado e
difundido por todo Brasil (NESI, 1994). O edificio exibe
toda a exuberancia que se queria transparecer, com ricos
elementos decorativos em argamassa ou em ferro fundido, bem ao gosto art nouveau. A fachada

simétrica e de boas proporgées, apresenta platibanda e um frontao marcando o eixo da

composigao. A planta representa 0 novo esquema que deveria ser implantado na adequagao do
ensino aos novos padrées inseridos pela Republica, com entradas separadas para meninos e
meninas, por exemplo.

Ha de se destacar por fim que, da arquitetura historica remanescente na area, os

exemplares ecléticos sio os mais representativos em termos quantitativos. A aquisigao de


materiais importados e 0 emprego de uma mfo-de-obra mais qualificada, se comparada a dos
movimentos estilisticos anteriores, possibilitou a presenga de uma arquitetura exuberante e de

recursos técnicos bastante modernos, seguindo a tendéncia das demais localidades brasileiras.

Esta nova modernidade, permitida pelos avancos tecnologicos da industria, se refletia na busca
por uma arquitetura condizente com os novos tempos, ondese privilegiava a higiene, o conforto

ea funcionalidade das edificagGes, e ainda, sua roupagem, pois era através dela que se transmitia

toda a importancia e imponéncia do moradorou da fun¢ao que abrigava.

Art Déco e Modernismo


Ainda em principios do século XX, sobretudo por volta da década de 30, periodo de
grande efervescéncia intelectual tanto no Brasil como no mundo, surgia uma manifestacao
artistica que, originada na Europa, se difundia rapidamente para as Américas. O estilo

denominado Art Déco foi langado formalmente na Exposition Internationalle des Arts
Décoratives et Industrielles Modernes, em Paris, no ano de 1925. O nome da exposicgao de

langamentoapresenta as palavras-chaves que definiam oestilo (CONDEetal., 2000):

> Artistico - 0 estilo se definia como arte, sendo inicialmente mais ligado ao design e as

artes graficas. Estende-se posteriormente a arquitetura, area em que representou uma


tentativa de reformular os conceitos estéticos dos estilos precedentes.

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» Decorativo - apesar de ainda trazer no seu nome idéia do decorativo, o ornamento’

deixava de ser neste momento um elemento aplicado e passava a fazer parte da


concepgao do edificio, sendo derivado do seu estudo de volumetria, das suas solugdes
estruturais e de suas técnicas construtivas.
Internacional - em contraposi¢ao 4 posterior busca pelo nacional que caracterizaria o
Vv

Movimento Moderno.
>» Industrial - em resposta a sociedade industrial nascente.
> Moderno- nosentido mais amplo da palavra, associando sua imagem a tudo que poder-

se-ia definir comotal.

A arquitetura Art Déco no Brasil se caracterizou, sobretudo pelas linhas retas, pela
sobriedade formal, pelo uso de formas geométricas e de elementos escalonados ou em zigue-
zague. Difundiu-se desde edificios oficiais do governo até residéncias, passando por cinemas,

hotéis, lojas e equipamentos urbanos. Em Natal, na area levantada, ha alguns representantes


significativos da presenga do estilo Art Déco na cidade como, por exemplo: algumas residéncias
na Rua Santo Anténio e uma residéncia na Praca Dom Vital.
Analisandoestes exemplares notamos algumas semelhancas nosrecursosutilizados como:
a predominancia de cheios sobre vazios, a articulagao de volumes geometrizadose simplificados,

a utilizacao de superficies curvas, o uso de platibandas escalonadas e a contengao dos elementos


decorativos.

Rua SantoAnt6nio, 657. Rua Santo Antonio, 669.

Rua Santo Antonio, 697. Praca Dom Vital, 518.

BB
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Podemos considerar que o Art Déco constituiu uma transi¢ao entre o Ecletismo e o
Modernismo, inserindo-se de forma lenta e gradativa no campo da arquitetura. Dai a sua
ambigiiidade, podendo ser classificado tanto como uma manifestagio tardia do Ecletismo(tardo-
ecletismo), como uma das primeiras expresses do Modernismo (protomodernismo).
O Art Déco e 0 Modernismo surgem nocenario nacional quase que paralelamente, pois a

Semana de Arte Moderna, evento que anuncia o inicio do Movimento Moderno, acontece no ano

de 1922, em Sao Paulo. Tratou-se de um movimento de jovens intelectuais com ideais

antitradicionalistas e nacionalistas, que defendiam a arte como representante do pais em que era
concebida. Pregavam a ruptura com o passado e o desenvolvimento de uma arte autéctone,
buscandoa independéncia artistica do pais frente a histérica influéncia européia.
Decerto que a Semana de 1922 nao mudou imediatamente o cenario das artes na esfera
nacional, tampouco exerceu uma influéncia direta na arquitetura. Contudo, a Semana propiciou o
desenvolvimento de um novo espirito, criando assim, um terreno propicio para a implantagao da
arquitetura moderna brasileira. Salvo alguns casos isolados, as manifestacGes do Modernismo na
arquitetura irao se concretizar efetivamente somentepor volta dos anos de 1930-40.
Junto 4 introducao de um novoestilo era comum utilizagao do termo “moderno” com
© intuito de diferenciar os novos modelos, as novas idéias e conceitos daquilo que era

considerado velho, antigo e obsoleto. O Art Déco, por exemplo, se autodenominava moderno,

no sentido mais amplo, e associava quase sempre 4 sua imagem 4s tecnologias nascentes.
Contudo, foi o Movimento Moderno que incorporou enfim a palavra ao seu nome, e constituiu

um movimento que se aprofundou nas questées sociais, politicas, econdmicas e ideolégicas com
intuito de buscar novas solug6es tanto pata a arquitetura como para as artes em geral.
Os grandes mestres racionalistas no 4mbito internacional foram Le Corbusier e Walter
Gropius. Em 1929, Le Corbusier realizou uma visita ao Rio de Janeiro que funcionou como o

estopim das novas idéias ja difundidas entre os jovens arquitetos através do seu livro “Vers une
architecture” (“Por uma arquitetuta”, em portugués), em que definia os cinco pontos da nova
arquitetura: pilotis, terraco-jardim, planta livre, fachada livre e janelas em fita. Além destas
caracteristicas presentes em sua arquitetura, Le Corbusier era um classico por exceléncia, adepto
de formas simples e geométricas, exaltando a pureza absoluta, através do jogo de volumes luz.
(BRUAND,2003)
A atquitetura moderna brasileira deriva praticamente da doutrina racionalista definida
pelos grandes mestres europeus das décadas de 1910-30, sobretudo da interpretacao pessoal de
Le Corbusier. Contudo, o Movimento Moderno brasileiro apresentou certa originalidade derivada
da tentativa de conciliagao entre a nova arquitetura racionalista e a tradi¢ao local, tradi¢ao esta

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que fazia referéncia 4 arquitetura colonial, implantada pelos colonizadores portugueses e seus
descendentes durante os séculos XVI e XVII. Assim, alguns elementos da arquitetura colonial

luso-brasileira foram tomados de empréstimo e empregadossistematicamente em exemplares da


arquitetura moderna, como:ostelhadosde telha-canal, as venezianas e os muxarabis, as varandas
e as galerias de circulacao externas e os revestimentos de azulejos. No Brasil, o arquiteto Lucio
Costa é considerado o grande mestre desta corrente que mesclou a arquitetura do século XX, de
carater internacional, e a tradicao local, tendo apresentado valiosa produgao tanto teérica como
pratica. (BRUAND,2003)
Além do movimento racionalista, outras correntes arquitet6nicas se fizeram presentes no
Ambito internacional que contribuiram para a diversificagao da arquitetura moderna brasileira: o
organicismo e o brutalismo (surgido mais recentemente). De acordo com Bruand (2003), “a
influéncia da concep¢ao organica permaneceu ocasional e nao pédeincrustar-se profundamente
® no Brasil; em compensacao, a veia brutalista impds-se com vigor, mas apenas numaregiao”.
Configuraram estas duas manifestagGes, correntes marginais 4 produgao moderna brasileira, nao
tendo resultado numa efetiva ruptura em relacao ao racionalismo.
Em Natal, a corrente moderna chega com certa defasagem temporal em relacao a outros
centros urbanosbrasileiros, mas ha na cidade, representantes significativos desta arquitetura. Na
area da poligonal de levantamento, trés edificagdes requerem especial atencao: o Tribunal
Regional Eleitoral (TRE), 0 Servico Social do Comércio (SESC) e o Banco do Nordeste.

O prédio do TRE,projeto elaborado em 1972 pelos

arquitetos Daniel Holanda e Joao Mauricio Miranda,


apresenta caracteristicas claras que permitem enquadra-
lo comorepresentante da arquitetura moderna. O jogo
de volumes geométricos, a independéncia da estrutura

em relacio 4 fachada (verificadas pelas colunas externas


ao panoda edificagao), o uso dejanelas corridas em fita
e envidracadas e o uso debrise-soleil sao algumas das caracteristicas que podem ser apontadas
de antemio.

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O prédio do SESC possui em sua fachada trés tipos de


fechamentos tipicos da arquitetura modernabrasileira: os
brises-soleils, os cobogés e os panos de vidro. Apresenta
também uma marquise sustentada por pilares em “V”
marcando a entrada principal e o térreo recuado em
relagao ao restante do edificio com o uso de pilares
descolados da alvenaria, este recurso parece uma tentativa

vemos queas referéncias ao estilo resultam mais de uma associacao de elementos caracteristicos
doestilo do que uma concep¢’o modernista de projeto propriamente.

Ja no prédio do Banco do Nordeste pode ser verificada


uma clara influéncia da corrente brutalista. No Brasil, o

brutalismo teve grande repercussio em Sao Paulo,

limitando-se nos outros estados praticamente a algumas


manifestagdes pontuais. Fora algumas divergéncias, esta
cotrente caracteriza-se pela austeridade absoluta e pela
exposigio de todos os elementos e materiais da

construcao, incluindo equipamentos geralmente ocultos e canalizagGes de todos os tipos, que


ficavam agora aparentes. No caso do prédio do Banco do Nordeste percebemos claramente 0
contraste entre aos pesados panos cegos de concteto aparente e os leves panos envidracados
ptotegidos porbrises-soleils de aluminio, recurso também muito adotado pelo brutalismo que
buscava exploraras tensdes e os contrastes entre os diversos materiais.

No Ambito internacional as criticas ao modernismo tém inicio na década de 1960,

resultando num movimento denominado pés-modernismo. Apesat de possuit base conceitual


s6lida € constituir uma critica 4 austeridade e impessoalidade do modernismo, no Brasil nao

houve debate intenso acerca do assunto, e a forte tradi¢ao moderna, mesmo que desgastada, nao

permitiu que houvesse uma verdadeira critica a esta arquitetura. O que se conhece como
arquitetura pds-modernabrasileira busca referéncias sobretudo na versao norte-ameticana do
movimento da década de 1980, e se resume 4 adoga’o de elementos formais 6bvios desta
manifestacao como:usoirénico e exagerado de referenciais histéricos, divisao classica do edificio
em base, corpo e coroamento,uso de frontdes e colunas sem critério € uso exageradodecores.

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O estilo pés-moderno na arquitetura é constantemente adotado em espagos comerciais,


sobretudo nos atualissimos shoppings centers, criando uma associa¢ao direta 4 nova cultura do
consumo. Difunde-se num contexto de globalizagao, tendo pouca correspondéncia e referéncia
aoslocais onde sio empregados.
E neste cenario de pés-modernidade,globalizagao e sociedade de consumo que se assiste
4 maior degradacao dos centros histéricos brasileiros. A falta de uma politica de preservacao e a
constante mentalidade de renovacao tém sido os grandes vilées na manutengao de sitios, pois
tém acarretado na demolicao de diversos exemplares arquiteténicos de expressivo valorhistérico
¢ artistico. Em geral, estes exemplares tém sido aos poucos substituidos por uma arquitetura de
ma qualidade estética e sem compromisso com o ambiente que a circunda, descaracterizando os

centros histéricos. Por isso faz-se urgente preservar o que ainda existe. No caso de Natal, nao
obstante o que j4 se perdeu, ainda hoje a area conserva um rico acervo arquitetonico da cidade.

5.9. Pracas Histéricas


Segundo Macedo(1994) a configuracao geral de uma Paisagem Urbana podeser expressa,
em cada momento do tempo, por alguns elementos formadores, sao eles: 0 suporte fisico; as
edificag6es; os elementos de vegetacio; os espacos livres de edificagGes; os seres vivos, em
especial os homens; suas méquinas e institui¢des; e a luz, articulados entre si dentro de uma

determinada situagio de clima.


Observando nossas cidades atualmente, podemos perceber que as solugdes adotadas, em
termos de desenho e distribuigdo dos elementos organizadores, normalmente se repetem. A
relacao entre os espacos livres e construidos e 0 tratamento dado 4s 4reas livres sao bastante
semelhantes. Contudo, as Paisagens Urbanas nao foram sempre as mesmas, elas mudaram

consideravelmente ao longo da histéria, conforme cresceram as cidades e mudaram as


necessidades da sociedade. Por isso a importancia de se preservar sitios hist6ricos, pois guardam

registro da conformagaodas cidades de épocas ulteriores.


Neste contexto, os espacos livres de edificacdes também tém papel fundamental na
conformacio das cidades; e em sitios histéricos, estes espagos sao igualmente responsaveis por
contar a histéria da cidade. O tragado das ruas, os desenhos das calcadas, as areas verdes retratam
como eram feitos os acessos, o transito de pessoas e dos meios de transportes e como eram

desfrutados os momentosdelazer, por exemplo.


As pracas também constituem patriménio cultural e o seu estudo é vital para o
entendimento dositio histérico como um todo e das relagdes do homem com a natureza. No

aT

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