Você está na página 1de 16

POR MEIO DA DOR E DA RESISTÊNCIA MORAL:

um olhar sobre a inquietação na arte de Paulo César

Pedro Henrique Felix Barbosa (Sihan Felix)


202100211

Ensaio realizado como trabalho final da disciplina de


Metodologia da Investigação I, sob a regência do Professor
Dr. Dinis Cayolla Ribeiro, no âmbito do Mestrado em
Estudos de Arte e na área de especialização Teoria e Crítica
da Arte.

Porto, 2022
Para o meu pai.
RESUMO

“Não construa um muro em volta


do seu próprio sofrimento —
ele pode devorá-lo por dentro.”
Frida Kahlo

A História da Arte existe, objetivamente, para permitir a tentativa de compreensão da arte


através do tempo. Nesse âmbito, por mais que perpasse por pontos diversos, ela funciona
como moderadora do presente, revelando características que, de acordo com cada
período, foram distintas e influentes. À vista disso, alguns dos artistas mais reverenciados
fundamentaram e fundamentam suas artes em inquietações íntimas: como Beethoven com
sua infância conturbada e sua surdez, Spielberg com o antissemitismo provado por sua
família e por ele mesmo e Frida Kahlo com seu sofrimento jamais amuralhado exposto
em tintas vivas. Sem o íntimo, portanto, talvez não existisse uma Sinfonia nº 9 evocando
a alegria, um A Lista de Schindler sublinhando a empatia como um colosso e aqueles que,
talvez, são os autorretratos mais viscerais possíveis. É por meio dessa perspectiva que, ao
longo deste texto, procurar-se-á detalhar essa materialização do íntimo. Para tal, levar-
se-á em conta o trabalho do artista contemporâneo Paulo César — ainda desconhecido do
sistema da arte —, que tem toda a sua obra centrada nas estruturas dos faróis marítimos.
À luz da concepção de Proust sobre apropriação da vida pela arte, o trabalho do citado
artista será conduzido paralelamente à obra O Mundo como Vontade e Representação, de
Schopenhauer, atestando o papel da arte no modo privilegiado de conhecer e superar o
sofrimento. Finalmente, ao incluir uma entrevista detalhada com o próprio Paulo César à
luz de Schiller e a possibilidade de exercício da liberdade por meio da dor e da resistência
moral, pretender-se-á valorizar o olhar à complexidade humana por meio do que há de
mais humano em uma obra: o ser humano que a criou.

Palavras-chave:
Criação artística
Farol
Inquietação
Materialização do íntimo
Sofrimento
ABSTRACT

“Don't build a wall around


your own suffering —
it can eat you up from the inside.”
Frida Kahlo

Art History exists, objectively, to allow the attempt to understand art through time. In this
scope, as much as it goes through different points, it works as a moderator of the present,
revealing characteristics that, according to each period, were distinct and influential. In
light of this, some of the most revered artists have based and base their art on intimate
restlessness: such as Beethoven with his troubled childhood and his deafness, Spielberg
with the anti-Semitism experienced by his family and himself, and Frida Kahlo with her
never-walled suffering exposed in vivid paints. Without the intimate, therefore, there
might not have been a Symphony No. 9 evoking joy, a Schindler's List underlining
empathy as a colossus, and what are perhaps the most visceral self-portraits possible. It
is through this perspective that, throughout this text, we will seek to detail this
materialization of the intimate. To do so, we will consider the work of the contemporary
artist Paulo César — still unknown to the art system — who has all his work centered on
the structures of lighthouses. In the light of Proust's conception about the appropriation
of life by art, the work of the mentioned artist will be conducted in parallel to
Schopenhauer's The World as Will and Representation, attesting to the role of art as the
privileged way to know and overcome suffering. Finally, by including a detailed
interview with Paulo César himself according to Schiller and the possibility of exercising
freedom through pain and moral resistance, we intend to value the look at human
complexity through what is most human in a work: the human being who created it.

Keywords:
Artistic creation
Lighthouse
Materialization of the intimate
Restlessness
Suffering
POR MEIO DA DOR E DA RESISTÊNCIA MORAL:
um olhar sobre a inquietação na arte de Paulo César1

Em 2020, o filme Horse Girl, realizado por Jeff Baena, havia me chamado a
atenção por trazer uma protagonista propositadamente distanciada da depressão e, a partir
de uma aparente normalidade, promover um mundo a desmoronar. A questão, porém, é
que tudo no universo daquela obra parece convergir para uma natureza além-física da
existência: do início, ao ver-se uma tesoura a cortar um tecido que imageticamente passa
a ser o céu — passando pelo desenvolvimento, com citações diversas a uma série de
televisão chamada Purgatório, a favorita da personagem principal, — ao fim, que carrega
uma simbologia que parece um comentário crítico sobre a realidade, esta que sempre está
disposta a arremessar pedras no desconhecido.

No mesmo período, tive a oportunidade de organizar e fazer a curadoria de uma


exposição2 que me trouxe uma sensação transversal à de Horse Girl: a de um mundo a
desmoronar e, através de um trabalho, vê-lo erguer-se. Em parte, porque o artista, Paulo
César, já me era íntimo desde sempre; mas a questão é que, por mais próximo que ele
assim fosse, talvez sua expressão maior estivesse em seu trabalho — praticamente
monotemático e ilusoriamente simplório — e, justamente pelo grau de proximidade, eu
nunca havia buscado uma experiência merecida: tudo era tão comum, quase diário, que
não percebia o universo exposto em meu quintal. Nesse sentido, senti-me percebendo o
óbvio do grito daquele artista somente naquele momento, quando, parafraseando Marcel
Proust, a arte dele me fez vislumbrar o único meio de reaver o Tempo Perdido (PROUST,
2013).

Proust, aliás, diz sobre do que é feita a obra de arte no volume 7, O Tempo
Redescoberto, da obra Em Busca do Tempo Perdido, afirmando (em primeira pessoa) que

a matéria da obra literária era, afinal, minha vida passada; que tudo
me viera nos divertimentos frívolos, na indolência, na ternura, na
dor, e eu acumulara como a semente os alimentos de que se nutrirá
a planta, sem adivinhar-lhe o destino nem a sobrevivência. Como a

1
Algumas de suas artes foram fotografadas pelo próprio artista e gentilmente enviadas para comporem o
Anexo II deste ensaio.
2
Exposição realizada no espaço cultural Mahalila Café durante o mês de novembro, em Natal/RN, Brasil.
semente, poderia morrer uma vez desenvolvida a planta, para qual
vivera sem o saber, sem nunca imaginar que minha vida devesse
entrar em contato com os livros que sonhara escrever e cujo assunto,
quando outrora me sentava à mesa de trabalho, buscara em vão
(PROUST, 2013, p. 76)3.

A partir dessas concepções proustianas e das palavras do próprio Paulo César


extraídas em entrevista, então, é possível perceber do que são feitos seus faróis marítimos
pintados em tela e construídos em madeira: de uma vida passada. Não digo no sentido
espiritual — o que deve ser óbvio também nas palavras de Proust —, mas do passado em
si. Este, por consequência, estava carregado justamente de dor. O artista em questão, ao
comentar sobre a sua iniciação às artes, que se deu somente aos 50 anos de idade, diz:

Tive depressão profunda no início do ano 2000. Minha esposa, que


sempre esteve ao meu lado, perguntou se eu gostaria de aprender
pintura. Eu disse que sim e ela me matriculou em um curso.
Frequentei durante dois meses e descobri esse meu caminho
(PAULO CÉSAR, 2022)4.

É como se Paulo César contivesse uma semente alimentada pela dor de uma
depressão e que, a partir da descoberta de um caminho, de um remédio efetivo na
manutenção de sua existência, fizesse crescer uma planta capaz de frutificar
indefinidamente. Não obstante, vem à tona a resistência moral do artista em relação à
tragédia, esta que, segundo o crítico literário Anatol Rosenfeld (1996, p.54) ao analisar
Friedrich Schiller, tem a capacidade de representar sensivelmente o suprassensível.
Assim, o artista dá sinais de que a depressão permanece como parte de si, como doença
que é, mas o trabalho desempenhado desde 2000 a transforma a seu favor, em um universo
para além do seu íntimo. Enquanto Arthur Schopenhauer (2001, p.338) diz que “a vida
de cada um de nós [...] é uma verdadeira tragédia”, sendo “a dor sempre gasta em vão” e,
assim, carrega “o sofrimento que vai aumentando”, os faróis pintados e construídos por
Paulo César podem ir de encontro ao filósofo alemão ao demonstrar que não: a dor não
precisa ser em vão; ela pode ser transformada. Como Ludwig van Beethoven, já
completamente surdo, ao compor uma ode à alegria em sua nona sinfonia, o artista dos
faróis busca por meio de sua arte uma ruptura do sofrimento. Essa ruptura surge a partir
de um trabalho que, à primeira vista, pode parecer simplório, mas, como dito, é uma

3
Obra lida em formato digital.
4
Entrevista por escrito concedida por Paulo César. [dez. 2022]. A entrevista na íntegra encontra-se no
Anexo I deste ensaio.
simplicidade ilusória. Isso porque ela carrega os sentidos de um homem comum (talvez e
novamente de maneira ilusória) que tem como maiores desejos artísticos os
reconhecimentos mais despretensiosos. Diz ele: “Que meus faróis possam ser vistos como
obras de arte e que façam comentários sobre eles” (PAULO CÉSAR, 2022).
Ainda sob essa perspectiva, Paulo César parece consciente de sua condição por
mais que o resultado de sua arte seja uma transmutação do seu íntimo e, dessa forma,
contenha muito do seu inconsciente. Friedrich Schiller (2011, p. 30), na obra Do Sublime
ao Trágico, afirma que

[p]ara o sentimento do sublime é absolutamente exigido, portanto,


que nos vejamos completamente abandonados de todo meio de
resistência físico e que busquemos auxílio, ao contrário, em nosso
Eu não físico. Tal objeto tem de ser temível para a nossa
sensibilidade, e isso ele deixa de ser tão logo nos sintamos à sua
altura por meio de forças naturais.

De tal modo, parece-me ser autêntico perceber os faróis como o “Eu não físico”
de Paulo César, pois é neles que, a princípio, o artista apoia-se por um auxílio metafísico
quando se vê abandonado de sua expressão enquanto ser. Isso posto, é de se pensar, talvez,
o conjunta da obra de Paulo César como sendo uma sequência de autorretratos, porque,
quando o eu passa a ser fisicamente invisível devido à doença da depressão, a
sensibilidade pode transformá-lo e pô-lo à distância, no ver-se. Até que, em algum
momento, perceber-se-á que o temido eu é, na verdade, quem se deve procurar.
Essa relação é provavelmente explícita quando Paulo César diz que “[o] farol é a
vida que se vê ao longe, é a salvação para quem está perdido na imensidão do mar, é a
luz que brilha infinitamente e que traz de volta a calmaria e tranquilidade” (PAULO
CÉSAR, 2022).
Ora, existe a questão de que os faróis são, precisamente, construções sem vida
própria. Para além dessa questão, as obras de Paulo César possuem, na verdade, uma
ausência completa de vida animal (seja humana ou não). Nesse âmbito, mesmo assim,
existem elementos que parecem evocar a presença — ou a existência — humana, como
uma luz acesa, uma casa ou um barco: elementos que aproximam uma estrutura concreta
e inanimada à existência de vida. O próprio mar, quando pintado, parece ter uma vida
própria, seja em seu estado turbulento ou, em outra instância, ao chocar-se violentamente
contra um farol, como se o quisesse despertar.
Há de se pensar na temeridade de um mar turbulento a chocar-se contra o farol:
Até que ponto aquela estrutura aguenta tamanha violência contra si? O quanto pode ser,
por outro lado, aquele choque a natureza da contemplação? Por outro caminho: Quanto o
artista tem consciência de que seu trabalho é virginal a ponto de, diferente de Frida Kahlo
com seus dolorosos autorretratos, ser invisível de si enquanto corpo?
O grau de completude na arte de Paulo César parece traçar um paralelo fiel entre
Proust e Schiller enquanto põe em xeque (pela subjetividade da questão, jamais xeque-
mate) parte do que é dito por Schopenhauer. Se Proust (2013, p. 73) assegura que,

para escrever esse livro essencial, o único verdadeiro, um grande


escritor não precisa, no sentido corrente da palavra, inventá-lo, pois
já existe em cada um de nós, e sim traduzi-lo. O dever e a tarefa do
escritor são as do tradutor.[,]

deve ser plausível entender o conjunto da obra de Paulo César como uma tradução fiel de
si, do seu íntimo. Não há uma invenção em sua criação, mas a externação de um eu que
é sublime porque é temível e, ao mesmo tempo, nenhuma temeridade é despertada. Essa
condição é verdadeira, segundo Schiller (2011, p. 32), porque “o objeto sublime tem de
ser temível, mas o temor efetivo ele não pode despertar. O temor é um estado de
sofrimento e violência [...]”. Na contramão, Schopenhauer (2001, p. 338) afirma que

a fatalidade de nossa existência não nos reserva nem mesmo a


dignidade do personagem trágico, e a cada dia de trabalho, a cada
novo engano, os desejos satisfeitos apenas para serem substituídos
incessantemente por novos desejos, reduz a vida a uma verdadeira
comédia, reservando-nos o papel de bobos.
.
Claro que há de se levar em conta o existencialismo pessimista de Schopenhauer
em detrimento da poeticidade apaixonada de Proust e Schiller, porém, de todo modo e
objetivamente, a dita fatalidade de nossa existência na obra de Paulo César acaba por
transformar o próprio artista, sim, em um tipo de personagem trágico. A tragicidade, aliás,
é expressa pela consciente inconsciência do artista sobre o que busca. Isso porque, quando
perguntado sobre as cores de suas pinturas, sempre saturadas e distantes da frieza — por
mais que o mar e as demais águas sejam azuis —, ele diz buscar vida no colorido: “Cor é
vida, é brilho, faz-nos sentir felizes, com esperança e focados em um futuro promissor”
(PAULO CÉSAR, 2022).
É possível pensar que, ainda assim, exista algo de tolo nesse sentimento e que,
schopenhaurianamente, estejamos fadados a uma comicidade da tragédia. Mas recuso a
crença de que a busca de si por meio da arte possa ser vista como uma narrativa burlesca
ou, para ser menos descrente, tragicômica. Parece-me mais viável a alternativa de que
uma arte como a de Paulo César seja a tal externação e consequente exposição de seu
íntimo. Não como um pedido de ajuda ou de socorro, visto que seu próprio trabalho já é
o Belerofonte5 de sua Quimera6, mas um movimento que é, em si mesmo, uma resistência
moral que, diferente da ação, por exemplo, de Steven Spielberg quando ao realizar A Lista
de Schindler e lançá-lo em 1993 — sublinhando a empatia como um colosso por meio do
sofrimento causado pelo antissemitismo —, é inconsciente ou, melhor: instintiva. Além
do mais, sendo a arte do exposto artista sublime como é, ela só pode agradar na
contemplação livre e por meio do sentimento da atividade interna e, portanto, é autêntica
e, para mais, essencialmente humana.
Ademais, se em Horse Girl o universo finda com uma simbologia da partida do
purgatório (a existência terrena), de um mundo sempre apto a jogar pedras no
desconhecido, também é possível ver, nesse mesmo fim, a vida daquela protagonista
como uma metáfora da esperança da mera possibilidade de olhar o diferente com
compaixão. Paulo César, aliás, apesar de toda a subjetivação de si mesmo, quando
perguntado sobre quem seriam os seus faróis se eles fossem pessoas, responde,
exatamente, com esse olhar ao outro: “Seriam pessoas iluminadas transmitindo vida e
esperança para todos” (PAULO CÉSAR, 2022).
Finalmente — e não para realizar os desejos artísticos explícitos pelo artista —,
que esse ensaio que aqui finda seja um dos comentários desejados e, a meu ver,
necessários sobre os faróis de Paulo César, o meu pai; que, de algum modo, esse texto
ingênuo, simplório e até mesmo distante do sistema da arte para alertá-lo, possa atestar
que tais faróis foram vistos como obras de arte — como devem ser para além da visão de
um filho.

5
Herói da mitologia grega que mata o monstro Quimera com somente um golpe.
6
Monstro mitológico derrotado por Belerofonte.
BIBLIOGRAFIA

BAENA, Jeff (Diretor). (2020). Horse Girl. In Jeff Baena, Alison Brie, Alana Carithers
(Produtores). EUA: Duplass Brothers Productions.
PAULO CÉSAR. (2022). Entrevista sobre os faróis/Entrevistador: Pedro Henrique Felix
Barbosa (Sihan Felix).
COPPOLA, Francis Ford (Diretor). (1974). The Conversation. In Francis Ford Coppola
(Produtor). EUA: Paramount Pictures.
PROUST, Marcel. (2013). Em busca do tempo perdido 7: o tempo redescoberto (Lúcia
Miguel Pereira, Trad.). São Paulo, SP, Brasil: Editora Globo.
ROSENFELD, Anatol. (1996) O mito e o herói no moderno teatro brasileiro. São Paulo,
SP, Brasil: Editora Perspectiva.
SCHILLER, Friedrich. (2011). Do sublime ao trágico. (Pedro Süsseking e Vladimir
Vieira, Trad.). Belo Horizonte, MG, Brasil: Autêntica Editora.
SCHOPENHAUER, Arthur. (2001). O mundo como vontade e representação (M. F. Sá
Correia, Trad.). Lisboa, Portugal: Editora Contraponto.
ANEXO I

Entrevista SOBRE OS FARÓIS


Dezembro de 2022

ENTREVISTADO: PAULO CÉSAR


ENTREVISTADOR: Pedro Henrique Felix Barbosa (SIHAN FELIX)

SIHAN FELIX: Como começou nas artes? Algum momento específico da vida?
Algo estava acontecendo? E o mundo passava por quais situações?
PAULO CÉSAR: Tive depressão profunda no início do ano 2000. Minha esposa,
que sempre esteve ao meu lado, perguntou se eu gostaria de aprender pintura. Eu disse
que sim e ela me matriculou em um curso. Frequentei durante dois meses e descobri esse
meu caminho.

S. F.: Sempre pintou faróis? Se sim, de onde veio essa, digamos, fixação? Se não,
quando começou a pintar faróis e por que decidiu por eles?
P. C.: Comecei a pintar paisagens e cavalos, que também gosto muito. Mas
sempre gostei de faróis e o que eles significam para mim. O farol é a vida que se vê ao longe,
é a salvação para quem está perdido na imensidão do mar, é a luz que brilha infinitamente e que
traz de volta a calmaria e tranquilidade

S. F.: Suas obras têm uma clara influência do impressionismo, sobretudo da


primeira fase de Monet. Por outro lado, se o impressionismo, além de ter sido uma época
histórica e ter como característica quebrar completamente laços com o passado, os faróis
parecem uma estrutura muito ligada ao que já passou. Você vê isso de outra forma? O
que pensa sobre essa relação?
P.C.: Gosto muito do impressionismo e dos trabalhos de Monet. Além do
expressionismo de Van Gogh. Continuarei a pintar quadros assim, é a minha influência
mesmo. De todo jeito, o que me estimula mais são os faróis, estes vou pintar muito ainda,
pois sempre vão trazer a esperança e a calmaria para as pessoas. O farol, por si mesmo,
impressiona a vida.

S. F.: Se o farol fossem pessoas, quem elas seriam? Como elas seriam?
P. C.: Seriam pessoas iluminadas transmitindo vida e esperança para todos. Um
exemplo, bem próximo, seria a sua mãe.

S. F.: Você tem alguma cor preferida? Se sim, por quê?


P. C.: Tenho. É o azul. Ele me transmite a tranquilidade do infinito, a exuberância
do céu e do mar.

S. F.: Suas pinturas de faróis têm uma total ausência de seres humanos. Mesmo
assim, existem elementos que evocam a presença humana, como uma luz acesa do próprio
farol, uma casa, um barco... todos são elementos que aproximam a estrutura concreta e
inanimada do farol à vida. O próprio mar, quando pintado por si, tem uma espécie de vida
própria. O que pensa sobre isso?
P. C.: Basta olharmos para o farol para que ele nos transmita vida. Talvez por isso
tudo que está presente na pintura faça imaginar a presença do ser humano.

S. F.: Ainda sobre a questão anterior, essa vida expressa nos detalhes está também
nas cores das pinturas, todas coloridas, bem saturadas, distantes da frieza por mais que o
mar e as águas sejam azuis. É premeditado? Você busca essa vida também nas cores?
P. C.: Sim, claro. Cor é vida, é brilho, faz-nos sentir felizes, com esperança e
focados em um futuro promissor

S. F.: Quando começou a pintar, tinha algum desejo enquanto artista? E hoje, há
algo que lhe falta?
P. C.: Não tinha desejo como artista. Como disse antes, comecei a pintar porque
estava passando por um momento muito difícil. Depois, com a ajuda de minha esposa e
dos meus filhos, fiz exposições. A vontade de continuar pintando só cresceu. Mesmo hoje,
passado dos 70 anos.

S. F.: Como você gostaria que suas pinturas fossem vistas pelos visantes?
P. C.: Que meus faróis possam ser vistos como obras de arte e que façam
comentários sobre eles.
ANEXO II

Fotografias de algumas das obras de PAULO CÉSAR

Você também pode gostar