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E S P E R A N Ç A

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A N D R E Y R O S S I

L E A N D R O J U N I O R

D E S A L I

E S P E R A N Ç A
YA S M I N G U I M A R Ã E S

M O I S É S PA T R Í C I O

M A G M A G R E L A

E N I V O LUZ Contemporânea

A N A J U L I A V I L E L A Curadoria de Simon Watson

T H I A G O R O C H A P I T TA Museu de Arte Sacra de São Paulo • 27 de junho à 22 de agosto de 2021

L Í D I A L I S B O A

PA U L O N A Z A R E T H

J O Ã O T R E V I S A N
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Esperança
A pandemia global provou de forma dolorosa o quanto uma crise local pode
acabar afetando a todos. Suspeito que a maioria de nós foi levado a repen-
sar nossas relações cotidianas com o mundo — pessoas, comunidades e so-
ciedades. Eu, por exemplo, descobri que a exposição “Esperança” foi uma
resposta curatorial muito pessoal ao coronavírus, que desencadeou reflexões
sobre objetivos e valores que estão profundamente arraigados em mim. Em
um momento de tristeza e até desespero compartilhado por todo o planeta,
“Esperança” é literalmente uma exposição sobre esperança – esperança de
tempos melhores.

Uma exposição temática composta por obras de doze artistas visuais bra-
sileiros, Esperança oferece um caleidoscópio de respostas à pandemia por
meio de uma diversidade de obras contemporâneas. A obra de cada artista
vem acompanhada por um ensaio escrito de um curador ou crítico de arte
brasileiro. Para muitos de nós, a pandemia parecia desacelerar de forma ago-
nizante a passagem do tempo. A pandemia trouxe dificuldades, privações e
bloqueios indesejados regados de antecipação e expectativa, juntamente a
períodos de espera e desejo difíceis de tolerar. No entanto, para os artistas
desta exposição, a espera e o desejo forçados também trouxeram a oportu-
nidade de autorreflexão – focada não apenas em um problema de saúde pú-
blica que ficará marcado na história, mas em muitas outras crises sociais en-
volvendo bem-estar e meio ambiente, e responsabilidade pessoal e coletiva.

Conforme é revelado nesta exposição, esses artistas perceberam que a pan-


demia do coronavírus não é simplesmente uma parte da história em constru-
ção, mas uma presença constante, uma batalha contínua pela qual estamos
passando diariamente. Através de suas práticas artísticas individuais e dís-
pares, que resultaram em uma variedade estonteante de obras expressivas,
essas dezenas de artistas que fazem parte de Esperança nos contam como é
estar vivo agora através de uma perspectiva impressionista. Quando vistas
coletivamente, essas obras dialogam, entre outras coisas, sobre as múltiplas
formas pelas quais as mãos e os corpos dos artistas estão presentes durante
seus processos de criação. Ao tornar sua presença tão palpável, esses artistas
reafirmam sua existência, e a nossa - a perene aventura humana na terra-,
apesar da nossa fragilidade e impermanência individual. Há um registro
permanente desses tempos difíceis nessas obras, além dos sinais íntimos de
nossa intenção de sobreviver a eles. Em outras palavras, sinais de esperança.

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A ideia dessa exposição surgiu a partir de uma primeira visita ao estúdio de com uma pintura deslumbrante, em grande escala, retratando uma mulher
Andrey Rossi o meu encontro, nos primeiros dias da pandemia, com um ciclo negra vestida de branco em um ritual performático, comovente e comemo-
de desenhos criados por Rossie que sugerem uma meditação tranquila numa rativo, de nascimento e renascimento.
enfermaria fictícia de hospital. Os desenhos são altamente detalhados e são
base de um ciclo contínuo de pinturas, quatro das quais estão expostas em A exposição Esperança apresenta três murais pintados diretamente nas pare-
Esperança. Associado ao espírito das meditações em aquarela de Albrecht des do museu. Dois dos murais ficam expostos nas extremidades opostas da
Dürer do início do século XVI sobre uma lebre do campo e uma moita, que galeria. De um lado está uma enorme figura feminina pintada por Mag Ma-
agem como memento vivere (“Lembre-se de viver”), a visão gótica de Rossi grela e, do outro, uma enorme figura xamânica masculina pintada por Enivo.
sobre o mundo de hoje mapeia o tédio contemporâneo em um ambiente hos-
pitalar imaginário representado por azulejos quebrados, paredes manchadas, Mag Magrela se inspira no tumulto das paisagens urbanas e na mistura de
vidraças rachadas, restos de plantas e canteiros vazios. E, por mais sombrio culturas brasileiras. Suas obras expressam alegria e sensualidade, bem como
que isso possa parecer, essas obras são estranhamente sedutoras e transmitem a dor e o sofrimento causados pelas
​​ barreiras do cotidiano. Seja uma ilus-
uma mensagem poderosa. A concentração magistral de Rossi nos detalhes tração na uma capa de álbum de LP ou em um mural, Magrela concebe o
minuciosos atrai o telespectador a inspecionar o detalhamento dessa pintura, nascimento e o mundo dessas figuras gigantes gentis, mulheres que são po-
entrando em um estado de meditação. Como resultado, as pinturas acabam derosas e dominantes, mas que se mantêm vulneráveis em sua intimidade,
por representar celebrações sobre o impulso humano de superar a tragédia e fator evidente em seus olhos e em sua postura.
descobrir as possibilidades de vida nos lugares mais improváveis.
Há mais de quinze anos, Enivo é uma presença constante nos murais de rua
O olhar aparentemente melancólico de Rossi reflete a arte de Leandro Jú- de São Paulo, tendo feito mais de mil pinturas nos muros da cidade. Mais
nior, cujas pinturas figurativas feitas com materiais primários como o barro recentemente, ele também se tornou conhecido por suas pinturas feitas em
líquido se inspiram na cultura, na história e na intimidade do vale do Jequiti- estúdio, que retratam “alienígenas futuristas”; e nesta exposição os dois ar-
nhonha, onde ele cresceu. O próprio artista garimpa a maior parte do mate- tifícios do artista se unem em um imenso mural, instalado junto a pinturas
rial com que pinta nas colinas do Quilombo da Cuba. Muitas vezes evocando em resina, que retrata uma figura futurista xamã, que expressa otimismo e
a tragédia da história escravista da região, os retratos recentes de Júnior evo- esperança em seu semblante.
cam angústia e tristeza, bem como sentimentos de empoderamento, já que
as figuras parecem estar contemplando a luz intensa de um dia de céu azul. O terceiro mural presente na exposição foi criado por Ana Júlia Vilela. A
obra, que une uma intervenção direta na parede com um aglomerado de
Visando talvez uma versão visual de um canto espiritual, Desali cria obras telas, parece trabalho infantil, porém sofisticado, como um Paul Klee do sé-
pintadas em tinta acrílica em pequena escala em pedaços de madeira en- culo XXI. Assim como as páginas de um diário digital de algum poeta punk,
contrados nas ruas. A criação dessas obras parece ser um ato de meditação as obras de Vilela transitam entre o figurativo e o abstrato. Ela brinca com
pessoal do artista. As pinturas representam reflexões sobre o sofrimento co- o visualizador revelando apenas fios de sua investigação pitoresca – como
tidiano, embora muitas incluam representações de luz natural e céus azuis. imagens de gatos em uma briga, ou um campo de lápides, ou um arbusto em
chamas – todas interrompidas com fragmentos de texto que lembram um
Temas de esplendor cósmico irradiam das imagens de Yasmin Guimarães, que tweet ou um trecho de uma conversa ouvida por acaso: ardente e divertido,
remetem a paisagens sublimes. Seja em obras de pequena escala que exami- suave e fantasmagórico.
nam detalhes aparentemente microscópicos, ou em telas maiores e robustas, a
artista transmite a magia e o encantamento presentes no mundo natural. Os temas fogo e ressurreição têm sido elementos recorrentes na prática artís-
tica de Thiago Rocha Pitta. Seus trabalhos mais recentes, incluindo as aqua-
Imerso na história afro-brasileira, Moisés Patrício é conhecido por retratar, relas presentes nesta exposição, sugerem um mundo mítico estremecendo
em uma série de fotografias tiradas ao longo de quase uma década, sua mão entre o apocalipse e a alucinação.
aberta como plataforma para todo tipo de objetos em escala semelhante:
uma pena, um pedaço de fruta, um objeto de fetiche. Mais recentemente A arte de Lidia Lisbôa é igualmente alucinógena. Com características mis-
Patrício tem explorado a escultura e a pintura, e ele participa nesta exposição teriosas, lúdicas e sobrenaturais, as esculturas do Casulo de Lisboa repre-

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sentam uma versão moderada da pesquisa da artista sobre formigueiros
encontrados em todo o Brasil. A exposição inclui Alvorecer, uma vídeo per-
formance encenada dentro da Estação da Luz em que Lisboa performa ves-
tida com uma das suas esculturas de tecido de dois metros e meio de altura.
Apresentando movimentos ondulares e primários, a performance representa
uma jornada mística sobre o nascimento de um bicho-da-seda gigante.

O principal tema da exposição, esperança, é retratado de forma mais vívida na


vídeo performance “Cuando tengo comida en mis manos” de Paulo Nazareth,
no qual o artista escala um muro para alimentar um grupo de gaivotas. Contra
o céu azul claro, incorporando a imagem das mãos erguidas e do alimento para
os pássaros, que chegam voando, a obra pulsa uma virtude histórica, evocando
uma generosidade e fragilidade que poderia ser atribuída a São Francisco.

A exposição Esperança termina no pátio interno do museu com uma instalação


escultórica em sete partes de dormentes de madeira feita por João Trevisan. A
obra convida os espectadores a se sentarem nela – na verdade, reclinar-se so-
bre os elementos de madeira como se estivessem em um banco de parque. Ao
fazê-lo, os espectadores tornam-se mais conscientes, primeiro, da arquitetura
requintada deste espaço, que é também um patrimônio de 250 anos, e tam-
bém do céu acima de suas cabeças. No meio desta cidade movimentada, esta
escultura convida a um momento de descanso e contemplação, e convida os
espectadores a se lembrarem do encanto e do espírito do mundo natural.

Como um estrangeiro engajado e apaixonado pela cena cultural contempo-


rânea brasileira, estou extremamente impressionado com a nova onda de
curadores e críticos de arte brasileiros que, sozinhos, estão moldando uma
nova versão da história da arte – vista através de novas e variadas perspecti-
vas-, com perguntas provocativas sobre quem estaria faltando nas chamadas
histórias mainstream e por quê. Esses curadores e críticos questionam e pro-
vocam incansavelmente, apoiando uma ampla gama de artistas e de práticas
artísticas diversas. O meu interesse por esta nova onda artística me levou,
junto a Esperança, a convidar críticos e curadores para elaborarem ensaios
que ilustram as obras destes doze artistas extraordinários.

—Simon Watson

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Esperança. ............................... Simon Watson.................. ........................................... 9

Andrey Rossi........................... Márcio Harum.......................................................... 16

Leandro Júnior. ..................... Jackson Gleize.......................................................... 22


Desali........................................ Fernano Mota. ................. ........................................ 30

Yasmin Guimarães. ............... Carollina Lauriano........ ........................................ 38

Moisés Patrício. ...................... Guillherme Teixeiro. ....... ........................................ 46

Ensaios Mag Magrela........................... Gabriela Longman......... ........................................ 50

Enivo.. ....................................... Gabriela Longman......... ........................................ 58

Ana Júlia Vilela. ..................... Thierry Freitas......................................................... 68

ThiagoRocha Pitta. ............... Ulisses Carrilho. .............. ........................................ 76

Lidia Lisbôa. ........................... Mirella Maria. ......................................................... 82

Paulo Nazareth.. ..................... Janaina Barros........................................................ 92

João Trevisan. ......................... André Vechi. ............................................................ 104

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Andrey
Rossi
Ensaio por Márcio Harum

Taciturno, 2021
Óleo sobre tela 19
150 x 100 cm
Por entre brechas, a pintura de Andrey Rossi nos mostra camadas acumula-
das de abandono e ruína pela passagem do tempo. Através de portas entre-
abertas, se avista ambientes escurecidos, de paredes descascadas e batentes
surrados, parcas peças de mobília, utensílios domésticos e pouco do vestígio
humano. O par de botas, um vaso no chão. Catres de estrutura tubular com
colchões listrados rasgados. Pode ser a representação interior de alguma casa
de chácara ou talvez a decadência originada pela especulação imobiliária e
gentrificação urbanística. A soberania da madeira, seus marrons, fazem esta-
lar sons e toques na roça da memória. Os detalhes da hera subindo por uma
parede de aspecto mofado pela infiltração. A maçaneta inútil, um interrup-
tor de época com fiação aparente. O cheiro de muro estufado pela umidade.
Vistas de pisos, uma muda de roupa deixada sobre cadeira, pia no quarto.
Marcações de azulejos e tinta verde casebre até o meio da parede. Bolor, va-
zamento. Um buquê de flores secando amarrado e pendurado de cabeça para
baixo. Um conjunto estranho - carta, folha de papel com desenho e docu-
mento tirados ao solo.

O trabalho do artista Andrey Rossi consiste em pintura e desenho. A proximi-


dade com ambientes de oficina de marcenaria e produção de peças de cerâmi-
ca pintadas a mão ao longo de seus anos de infância e juventude em sua cidade
natal, Porto Ferreira, estado de São Paulo, fez incorporar um matiz amarron-
zado de lonas de caminhão em suas obras. Rossi lida com seu próprio imagi-
nário como objeto central de interesse. Quando pinta é notório a percepção e
as aproximações à prévias experiências sensoriais - suas passagens por entre
paisagens de sítio da cultura ítalo-caipira. Tais lembranças imaginadas se per-
petuam em suas telas, já que o artista se vale em sua prática de um repertório
ontológico por ele nunca antes visualizado.

Rossi é um artista que vem labutando o entrelaçamento caótico de sentidos


quanto ao encontro de ossadas, corpos de animais mortos e esqueletos de pás-
saros desde os tempos de seus primeiros caminhos de formação junto à beira
do rio Moji-Guaçu e região, seu lugar de origem. Não é à toa, e com emoção,
que chega a mencionar, em conversações de ateliê, pinturas flamengas realiza-
das pelos mestres da era de ouro dos Países Baixos acerca de caçadas aéreas de
faisões no século XVII. A obra Boi Dissecado de Rembrandt (1655) também
é citada por sua carga de tradição do vanitas. A carcaça decapitada e partida
ao meio sem vísceras aparece fixada como natureza-morta, apoiada como se
fosse uma crucificação. A estranha e fantasmagórica figura de uma açougueira
surge por uma porta encostada, apontando para a pintura de gênero em tal
cena banal de vida cotidiana. A noção que Andrey Rossi nos revela, como ele
mesmo diz com suas palavras, é a de ‘uma linha que conduz o fenômeno’, to-
mando partido de sua força de orientação reflexiva. É o fio condutor fino que
une universos distintos em uma única mirada: o vegetal, o animal e o humano,

Corpo de pássaro, 2021


Óleo sobre tela 21
80 x 60 cm
a passagem entre a vida e a morte. Traços e ecos longínquos de sua ancestra-
lidade imigrante conformam esse fio de Ariadne, ligando a espacialidade de
seu ateliê no bairro do Ipiranga, em São Paulo, capital, às temporalidades la-
birínticas da memória. Enxerga-se amarrado pela pata, um passarinho preso a
um prego. O mesmo fio de linha igualmente sustenta um ramalhete de flores.
Desenraízadas, as flores parecem sem vitalidade. Batendo asas no ar, dois pás-
saros tentam desamarrá-las para devolvê-las à terra. Ao mesmo tempo, a linha
que iça a ave como se fosse um pêndulo é a que faz do corpinho sua própria
base em suspensão. Como um mapa mental em exibição, tecemos diante de
seus quadros relações, ciclos e transições de ambivalência e fragilidade inte-
respécies: cadáveres transformados em alimento para as plantas e plantas que
alimentam corpos vivos - tal loop é declarado e exposto.

Nos últimos anos, suas obras têm sido adquiridas para importantes coleções
de arte do país, como as do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e Mu-
seu de Arte do Rio (MAR). Em paralelo ao seu doutoramento acerca da pin-
tura pela Unicamp com orientação da Profa. Marta Strambi, é visível o ama-
durecimento apresentado de sua produção em desenho por volta das duas
temporadas em que esteve em residência artística em Lüben, na Alemanha,
em 2017 e 2019. A partir da exposição ‘Cycles to an end’ do início do ano de
2021 em Nova York, se entrevê perfeitamente adiante as possibilidades de
desenvolvimento de sua trajetória profissional.

— Marcio Harum

Tempo que ainda não é, 2021


Óleo sobre tela 23
150 x 100 cm
Leandro
Júnior
Ensaio por Jackson Gleize

Jacyara, 2021
Barro com pigmentos sobre tela 25
90 x 70 cm
Esperança é o sentimento de quem vê como possível a realização daquilo que
deseja; confiança em coisa boa; fé.

Em tempos tão obscuros como os que estamos vivenciando, assistir uma ex-
posição com esse tema é um afago para o público. Afinal, a pintura é a ema-
nação do real.

Nesse sentido, acredito na importância da tela para expressar uma situação


e seu espaço físico inserido na subjetividade, suscitando emoções e aguçando
o senso crítico de quem as vê.

Uma vez que ela estimula a tomada de consciência, a imagem pode servir
como um elo de integração entre a arte, a ciência, a cultura e a sociedade.
Nesse contexto, a série “Sonhos” composta na mostra Esperança apresenta
figuras do Vale do Jequitinhonha, pelo olhar, sensações e experiências viven-
ciadas pelo artista plástico Leandro Júnior. Sonhos, as telas são marcadas
com o fundo azul claro, remetendo um céu. Trazendo leveza para as obras,
diferente da vida das pessoas que vivem no Vale. As obras têm uma identi-
dade cultural, um conjunto híbrido e maleável de elementos que formam a
identitária do povo do Jequitinhonha. As obras de Leandro Júnior refletem
em seus traços, tons e paixão pelas suas raízes e pela natureza brasileira. As
pinturas revelam gestos e formas que compõem um mosaico atemporal das
relações societárias. Sob um olhar para o horizonte, os quadros revelam a
esperança de que dias melhores dias virão. Barro tingido sobre tela, é o teste-
munho da luta e da sobrevivência desse povo.

Os traços são marcados com detalhes, podemos ver as rugas de um lenço


amarrado na cabeça de uma senhora e até conseguimos enxergar os detalhes
de presilha no cabelo de uma jovem, os quadros são marcados por sentimen-
tos e delicadezas. Olhando para as figuras de costas conseguimos imaginar
essas elas de frente, como se pudéssemos estar ali naquele exato momento,
desvendando mistérios da cultura desse povo.

Hoje, Leandro Júnior dá voz e visibilidade para essas pessoas, revela em suas
obras de arte a cultura de um povo que por muitos anos foram esquecidos.
Hoje essas pessoas que vivem no Vale do Jequitinhonha e até mesmo em
comunidades quilombolas, são protagonistas de suas histórias através das
obras de Leandro Júnior. Pessoas que fazem o Vale do Jequitinhonha com
seus saberes e fazeres.

Leandro Junior é um artista promissor que desenvolve e explora a história e


o caráter único das diversas comunidades da região rural do Jequitinhonha,
no Brasil.

Thaiane, 2021
Barro com pigmentos sobre tela 27
90 x 70 cm
Argila é o material central nas pinturas de Leandro. O artista extrai pesso-
almente o barro das colinas de Jequitinhonha e, depois, o refina para ser
transformado em tinta e, assim, aplicado em tela dá vida às obras de artes.

O Vale do Jequitinhonha é terra de gente sabedora de rezas, folias de reis,


cantigas de roda, de fazer pão e biscoito no forno a lenha. É terra de casas
acumulando tempo, de vagalumes tão sociáveis que vão no dedo e no nariz
da gente. É lugar onde fazer carrinhos de madeira, bichinhos de frutas, pião
de sementes, batizar bonecas e puxar versos é coisa de sempre. É terra de
artistas, terra de sonhadores. Jequitinhonha seria um estado de espírito para
os que nele vivem ou dele se originam.

­— Jackson Gleizer

Nilda, 2021
Barro com pigmentos sobre tela 29
90 x 70 cm
Mila, 2021 Tia Rita, 2020
Barro com pigmentos sobre tela Barro com pigmentos sobre tela 31
90 x 70 cm 90 x 70 cm
Desali
Ensaio por Fernano Mota

MUDA-ARMA / ARMA-MUDA
Acrílica sobre madeira
33
29 x 23 cm
Coleção Henrique Martins Modenesi, São Paulo, Brasil
Nascido na periferia de Contagem (MG), Desali retrata, repensa e redimen-
siona na sua obra o mundo que vê e o mundo em que vive - de casa para a
rua, da rua para o bairro, do bairro para a cidade, da cidade para o estado, do
estado para o país. E do país, inevitavelmente, de volta para a casa.

Apesar de sua formação em Artes Plásticas na tradicional Escola Guignard


em Belo Horizonte, seu trabalho esta relativamente distante de uma lingua-
gem acadêmica convencional. Atuante em diferentes mídias, dentre as quais
fotografia, video, instalação e pintura, Desali canibaliza os métodos conheci-
dos de cada meio para então produzir sua obra com uma linguagem própria,
a qual ao mesmo tempo flerta e faz reverencia a grandes nomes e movimen-
tos da arte moderna e contemporânea, enquanto realinha os mesmos com o
universo popular e a arte de rua. É nessa intersecção que o trabalho se desen-
volve, entre o banal e o magistral, o rústico e o refinado, o publico e o privado.

Com as pinturas em foco, é possível perceber essa natureza singular que atrai
tanto um olhar mais apurado quanto outro despreparado. São imagens que
remetem ao universo local e regional, porem fazem parte de um imaginário
coletivo familiar a muitos, se não a todos. Isso porque os objetos, as paisa-
gens e personagens que habitam e compõem as cenas apresentadas aparen-
tam oriundos de um lugar simultaneamente especifico e indeterminado: um
lugar qualquer. Utilizando tinta acrílica sobre pedaços de madeira encontra-
dos e reutilizados como suporte, Desali produz pinturas de pequeno e medio
formato que muitas vezes geometrizam e/ou destorcem as figuras conheci-
das, sejam elas caras, casas ou coisas. O artista não se intimida com o uso de
cores fortes e explora a variação cromática de cada uma de forma ousada e
harmoniosa, ao passo que brinca com linhas e ângulos nas superfícies irregu-
lares e incompletas das madeiras - ora absorvendo intuitivamente as falhas
do material precário, ora destacando as cicatrizes de outras vidas da matéria.
Assim, as pinturas possuem intenso brilho e ampla textura, facilmente per-
ceptível aos olhos, enquanto formam uma topografia própria, desnivelada -
uma colagem como parte da linguagem de base, estrutural da obra, ao invés
de técnica aplicada ou ornamental, próxima ao resultado.

Junto às imagens estão palavras, algumas vezes soltas, outras em sequen-


cia, como frases ou interjeições, ou ainda com as silabas e letras espaçadas,
abrindo margem para múltiplos significados. Essas “colagens”, agora grama-
ticais, adicionam na obra um elemento passível de interpretação, em certas
ocasiões servindo como uma interlocução direta com o observador. Assim
como as imagens, as palavras são referencias visuais e auditivas do universo
pessoal do artista e também podem ser facilmente reconhecidas pelo publi-
co, porém, a ausência de pontuação e a subjetividade irão diferenciar entre
uma leitura sarcástica e outra séria, formam o fator decisivo entre uma ana-

DES_LIZA_LAMA
Acrílica sobre madeira
35
29 x 23 cm
Coleção Jarbas Velloso, São Paulo, Brasil
lise cômica ou dramática. A ironia esta justamente na indefinição das coisas:
à primeira vista reconhecemos tudo, mas a principio não sabemos nada. As
imagens são procedentes de fotografias analógicas feitas pelo próprio artis-
ta em caminhadas cotidianas, antes de se converterem em pinturas. Cabe
ressaltar uma característica presente em muitas delas que faz alusão direta
à linguagem da câmera: as figuras e os cenários não são vazados, ou seja,
não se expandem até o limite da superfície, ao contrário, costumam estar
cercados nas laterais por faixas de tinta branca que formam uma especie de
moldura interna no plano, sendo a parte inferior a mais larga e onde estão
as palavras, como se fossem anotações manuais feitas em fotos Polaroid. Isso
traz um aspecto de pessoalidade às obras, que por sua vez ja possuem um
certo grau de intimidade devido à artesania contida nas características físi-
cas dos materiais - alem das próprias madeiras descritas anteriormente, te-
mos a presença visível de grampos e pregos para construir de fato o suporte.

As “foto-pinturas-poemas-colagens” de Desali são registros de um dia co-


mum: às vezes recortes de dias calorosos e iluminados, noutras, fragmen-
tos de dias sombrios e desesperados. São dias em que encontramos nossas
esperanças desalinhadas com o mundo - seja para cima ou para baixo; por
um breve momento, compartilhamos dos tempos difíceis onde a sociedade
atual desanda, e também, daqueles pequenos instantes diários nos quais ela
sutilmente desaba.

— Fernando Mota

Pouco antes da prisão, 2020


Acrílica sobre madeira
37
25x28 cm
Coleção Wilson Pinheiro Jabur, São Paulo, Brasil
Parem de Trabalhar, 2014 DES_CASO_ASTRE
Acrílica sobre madeira Acrílica sobre madeira
39
27 x 34,3 cm 29 x 23 cm
Coleção Fernando Mota, São Paulo, Brasil Coleção Jarbas Velloso, São Paulo, Brasil
Yasmin
Guimarães
Ensaio por Carollina Lauriano

Sem título, 2019


Óleo sobre linho 41
30 X 24 cm
Em suas pinturas, Yasmin Guimarães parte da ideia da representação de paisa-
gem, mas sem que esta aponte fidedignamente elementos da natureza, traba-
lhando assim essa noção de paisagem no campo do simbolismo. Sem se apegar
a um conceito totalmente abstrato, muito menos de representação figurativa,
suas pinturas evocam índices desses elementos que estão no mundo.

Lembro-me de um dia, ainda em 2019, visitar seu ateliê em um fim de tarde,


e ao me deparar com a imagem do pôr-do-sol na janela, as cores presentes no
céu eram as mesmas das pinturas de Yasmin. Os tons pastel que se formaram
no horizonte, com predominância dos alaranjados e azulados, se confundiam
com as diversas pinturas do ateliê da artista. E não eram somente as cores
que faziam parte do trabalho de Yasmin, mas também a sensação que esse
momento poderia nos causar: tranquilidade, calmaria, pureza e serenidade
são algumas dos sinônimos que podem ser associadas às pinturas de Yasmin.

Para Esperança, os trabalhos selecionados partem desse lugar: são seis pintu-
ras que traduzem as interfaces e sensações de uma paisagem imaginária. Ora
abstratas, ora como sugestão, a artista cria suas composições a partir de pon-
tos, pinceladas curtas, empastados de cor e manchas cromáticas sutis que se
formam em tons pastel sobre linho. A tela aparente também serve como maté-
ria de investigação pictórica da artista; e este ato é, para mim, um dos pontos
mais interessantes da pesquisa da artista: transformar a complexidade que a
própria história da pintura carrega em um ato corajoso de simplicidade.

Mas aqui, não tomemos simplicidade por algo simplório. As pinturas de Yas-
min se debruçam a partir do seu processo de pensar a gestualidade da pintu-
ra e os desdobramentos que ela pode alcançar. Existe em seu trabalho uma
busca em escalonar o espaço e eliminar a perspectiva trazendo a imagem
para o plano, sendo estas autônomas em relação a estes eixos, apontando
assim uma intenção pictórica clara em sua pintura; a da planaridade. Seus
trabalhos se atém ao plano, explorando as possibilidades de expansão dos
limites de se pensar e de se fazer pintura.

É interessante pensarmos a respeito da intensidade e amplitude do gesto que


Yasmin investe nas inscrições pictóricas que realiza em suas pinturas de peque-
nos e grandes formatos, as quais podemos observar na mostra. Enquanto as
menores concentram a intenção do gesto da artista sobre a superfície, a maior
fazem com que os gestos se potencializem através da escala. E sobre a gestu-
alidade que a artista emprega sobre suas telas, evoco um comentário do pin-
tor norte-americano Cy Twombly sobre seu próprio trabalho, a qual vejo uma
aproximação com as imagens propostas por Yasmin: “Minha linha é como a de
criança, mas não é infantil. Cada linha é habitada por sua própria história, da
qual é a experiência presente, é o evento de sua própria materialização”.

Sem título, 2020


Óleo sobre linho 43
24 x 30 cm
A citação acima aproxima-nos de detalhes estreitamente ligados à poética
construída pela artista. Os traços suaves e aparentemente despreocupados
de Yasmin, a um primeiro olhar, podem se assemelhar quase a desenhos
primários ou infantis, mas é exatamente no início do desenvolvimento cog-
nitivo da criança - onde o desenho é uma atividade lúdica - que o estímulo
de tal atividade pode ampliar suas capacidades imaginativas e referenciais
de mundo. Nessa fase inicial, a criança vai percebendo as possibilidades
desses traços e essa exploração de natureza motora vai se ampliando para a
elaboração de representações. As garatujas apresentam traços como se fos-
sem descargas de energia, que em princípio parecem indecisas e vacilantes,
mas aos poucos se tornam linhas mais fluidas e rígidas. A construção de
repertórios imagéticos também é uma prática importante para as vivências
relacionadas ao desenho infantil.

E aqui, tal suavidade e despreocupação propostas pela artista estão ligadas à


liberdade e não à displicência ou descaso; percebe-se neste conjunto de telas
apresentadas em Esperança, um cuidado na composição, uma lógica interna
em seu método de trabalho e de ordenação dos elementos em suas pinturas.
Com isso, diversos procedimentos, materiais e diferentes intensidades de
gestos são colocados na tela, seguindo uma ordem muito particular.

Há no trabalho de Yasmin uma urgência que, ao mesmo tempo, é apaziguado-


ra, no qual o gesto traz movimento às composições; já a cor confere às pintu-
ras um ambiente calmo e rarefeito. Portanto, não há somente no conjunto de
obras de Yasmin Guimarães apresentados em Esperança, mas em toda sua po-
ética, uma tradução de sentimentos e sensações que buscam incitar em nós um
lugar de conforto, ou até mesmo de escapismo, frente aos conflitos do mundo,
ou diante do peso da nossa própria existência. Dessa forma, as pinturas de Yas-
min nos fazem ver as coisas, não somente como a artista as inscreve pictorica-
mente na tela, mas requerendo de seu espectador uma leitura subjetiva sobre
a ideia de paisagem, uma vez que em muitas de suas telas há a necessidade de
preenchermos-nas a partir de nossas próprias referências afetivas.

— Carollina Lauriano

Sem título, 2020


Óleo sobre linho 45
150 x 130 cm
Sem título, 2020 Sem título, 2020
Óleo sobre linho Óleo sobre linho 47
24 x 30 cm 30 x 24 cm
Moisés
Patrício
Ensaio por Guillherme Teixeiro

Oxum se banhando, 2021


Acrílica sobre tela
49
214 x 198 cm
Coleção Bruno Baptistella
O rio que fazia uma volta Um choro escorre da frustração da mãe perante nossa imagem e semelhança
atrás da nossa casa para o nome pouco que circunda a casa de Manoel e há um choro que escorre
era a imagem de um vidro mole... na sua vontade ondular cerúlea que esquece da violeta necessidade do céu re-
fletir também abismo e peço perdão pelo cafajeste movimento de linguagem
Passou um homem e disse: que segue, mas o motivo radical de precipitação é também o de precipício: é
Essa volta que o rio faz... sobre o fôlego da água ou do corpo em queda na espera do impacto?Um cho-
se chama enseada... ro escorre, uma metáfora não dá conta, uma mãe chora e seus filhos se perdem
frente o violeta e semblantes se dobram à paisagem e a única unidade desse
Não era mais a imagem de uma cobra de vidro emaranhado de acúmulos de tinta feita rastro e gesto são as mãos da mãe, suas
que fazia uma volta atrás da casa. vestes e ouro e é desse equilíbrio, da nuance como seu movimento se eleva ao
Era uma enseada. passo que o restante da pintura sucumbe, que me leva a não pensar mais em
Acho que o nome empobreceu a imagem. questões relacionadas ao firmamento, mas sim ao dilúvio.

Manoel de Barros — BARROS, M. Poesia Completa. São Paulo: Leya, 2011. É da decepção com o estar do mundo que nascem os rios dos olhos da mãe,
seus cursos e suas quedas; É da decepção com o nome, que nasce a parqui-
Se partíssemos das teorias que demonstram como se forma a cor do céu e as dade da cobra de vidro tornada palavra, que a imagem se esvazia: É vazando
ondas se espalham e o dia é cerúleo, seria violeta a manhã e uma mãe se ajo- da frustração que o ser nome transborda, no espaço entre essas decepções
elha, um mais um corpos a amparam e a mancha que delimita a relação de harmônicas - o todo da mãe, o um de Manoel - que a vontade de nome é
seus semblantes com o espectro daquela frequência primeira afirma, a partir também a potência radical da permutação pela insuficiência.
de gestos que se fazem espaço, que o limiar entre seus então é passível de ser
abocanhado - ao passo que os semblantes das figuras se fazem fundo, seus Suas mãos se erguem em prece sobre a miríade de tons de terra que impri-
corpos se entregam a um ato de proteção e se perdem por igual em um re- mem calma ao seu semblante e ouro vaza das suas vestes e do seu destino
flexo de algo como noite, e as mãos da mãe se prostram em prece, clamando erguido por seus filhos cujos corpos se entregam ao violeta e seria essa a cor
enquanto agradecem, e face e olhos da mãe como que perdoam seus gestos dos céus e das águas se a tarefa de dissolução daquilo feito imagem fosse
feitos mancha e pincelada, autorizando vontade de esquecimento. apenas a de dispersão do nome.

Um choro escorre e há um poeta sul-mato-grossense - seu nome é Manoel A mãe chora e faz rio ao conceber a violência que tomou uma espécie ao
de Barros, que fala sobre como um rio que passava atrás de sua casa era uma passo que o poeta desacredita a imagem a partir do modo como uma onda
cobra de vidro mole a qual alguém nomeou enseada e aqui, rasgando seu sonora falseou o sentido da geografia que circulava sua casa e então partimos
poema, acelero esta exposição ao último verso onde se lê: “Acho que o nome dessas decepções e as tornamos enunciado, e como um fio da lágrima da mãe
empobreceu a imagem” e é também deste espaço subtraído pelo nome que é capaz de inundar uma cidade e a arbitrariedade da linguagem e seus signi-
a frustração da mãe se apresenta, correndo por encostas, nascendo dos rios ficantes não impedem o poema, essa espécie ainda vaza.
que vertem sobre nossas cabeças e deslizando para o curso das águas que
engolimos e aterramos com vontade de civilização e concreto. Ora Yê iê, ô!

— Guilherme Teixeira

51
Mag
Magrela
Ensaio por Gabriela Longman

Esconderijo, 2018
Técnica mista sobre canvas 53
59 x 48 cm
“Quem é essa mulher um barco que flutua –, não escondem a brutalidade visceral que atinge a to-
Que canta sempre esse estribilho? dos, mas que têm suas vítimas preferidas de acordo com a origem e a classe
Só queria embalar meu filho social. Imagine a cor, imagine a dor.
Que mora na escuridão do mar”
À violência estrutural da sociedade vem somar-se uma pandemia que lite-
— Chico Buarque, Angélica ralmente nos tirou o ar. Chegando à marca dos 500 mil mortos, assistimos
atônitos à conjunção entre uma catástrofe global e seu agravamento extre-
mo pela conjuntura brasileira. Atravessados pela vulgaridade mortífera da
presidência, negociamos com nossas angústias ao mesmo tempo em que
“As histórias importam. Muitas histórias importam. As histórias foram usa-
ameaças à própria ordem democrática voltam a nos assombrar como ve-
das para espoliar e caluniar, mas também podem ser usadas para empoderar lhos fantasmas.
e humanizar”
Sair, ser, circular, trabalhar na rua ficou mais difícil. Longe do espaço de en-
— Chimamanda Ngozi Adichie, O Perigo de Uma história única contro e de troca que perpassa sua prática, Mag recolheu-se, como tantos de
nós. “Na rua a gente trabalha muito o corpo, a amplitude, pode sujar o chão.
Sóbrias, austeras, doces, melancólicas. As mulheres de Mag Magrela fazem No ateliê é mais contido, a pincelada é mais delicada”, ela conta.
suas aparições nas empenas, muros e recantos escondidos da maior cidade
da América do Sul. Pintando nas ruas há 14 anos, ela aos poucos começou a Presos nos casulos, cada um espera à sua maneira o fim da metamorfose,
estampar figuras femininas também em telas e papeis que hoje percorrem os torcendo para que nos devolva ao mundo mais transformados em borboletas
quatro cantos do mundo. esvoaçantes do que em baratas kafkanianas. O risco é sempre duplo e é pre-
ciso, diariamente, renovar práticas, votos, esperanças. Daí, quiçá, a potência
Quem são as mulheres de Mag? Não sabemos. Há traços nordestinos, negros, da arte.
indígenas em muitas delas. Os olhos, quase sempre amendoados, guardam
uma profundidade de quem muito sabe e pouco diz. A retina das telas

Às vezes, uns poucos elementos vêm nos dar uma pista: galhos de planta, er- Ao longo dos 14 anos de trajetória de Mag, duas coisas parecem ter mudado
vas de limpeza ou mesmo uma bacia de salmoura indicam trilhas de cura e sistematicamente: a primeira é o aumento expressivo do número de mulhe-
autocuidado. As mulheres sabem quem têm um caminho a percorrer – uma res artistas na cena do grafite e da arte urbana. Ainda assim a permanência
descida às profundezas que passa pelo conhecimento dos movimentos cícli- é mais difícil para elas, que volta e meia precisam largar mão e priorizar ou-
cos: as estações do ano, as fases da lua, a cheia e a baixa das marés. tras demandas. Ciente dos privilégios que tem e que lhe permitiram investir
tempo e correr riscos na carreira, Magrela não perde a chance de priorizar
Se “os ventos do norte não movem moinhos”, o sangue latino das mulhe- parcerias com artistas mulheres cis e trans de diferentes contextos. Chamar
res de Mag pulsa forte como a cidade em volta, nos lembrando das dores e junto, com-partilhar.
delícias de viver numa São Paulo que cheira poluição, café coado, frituras
amanhecidas. Que vê seus bairros de casas engolidos pela voracidade dos A outra mudança veio do alcance das redes sociais. Com um início de carrei-
novos empreendimentos e pelo zunido das motos, sem que possamos sequer ra em que as imagens circulavam via fotolog ou Flickr, a artista é parte de
nos perguntar se haveria outra solução, outro formato, outra cidade possível uma geração que assiste à ascensão de novos mecanismos de difusão, hoje
onde pousar nossos afetos e inquietações. especialmente capitaneados pelo Instagram. Criando novos circuitos e mer-
cados, as redes sociais colocam em xeque o sistema tradicional de museus e
No rio das ruas, no bosque do recolhimento. galerias, impondo novas estruturas de valor e validação mais democráticas
e inclusivas, ainda que novos desafios – especialmente o poderio político e
“Eu sou ela e ela sou eu”. O título da pintura de 2017 estampa um rosto, esse econômico concentrado por essas mesmas redes – se anunciem na paisagem.
sim reconhecível: Marielle Franco. Feita logo após o assassinato que revelou
um país bi-partido, a pintura ecoa outras obras de Mag em que as persona-
gens carregam na pele marcas de tiro ou machucados, mas que nem por isso
perdem a força no olhar. Ali, elementos de delicadeza – folhagens, uma cobra,

55
Cura e dor.

Quem é essa mulher? Pernas encolhidas, seios quase sempre pequenos, bei-
rando a androgenia, as mulheres de Mag somos todos e todas nós – “todx”,
esse significante que ainda desafia os limites da nossa própria cognição e
linguagem. Temos medo e temos coragem. Temos pressa e temos tempo. Ob-
servamos de olhos bem abertos, mas nem sempre sabemos como agir nem
que direção tomar. O corpo vivo pode ser casa, esconderijo, ninho, bandeira.
Está aberto ao giro e à transmutação.

No esquenta-esfria da vida, sabemos que temos um caminho a percorrer e


que desistir não é uma opção. Diante do tempo e da morte implacáveis, a
costura possível entre estética, política e espiritualidade vem nos trazer um
alento. Não estamos sozinhas. As mulheres de Mag Magrela podem estar em
silêncio, mas os sons que ecoam dessas figuras nos enchem de voz. Sons das
ruas, dos sinos, sirenes e sinais. Escutá-las nunca foi tão importante.

— Gabriela Longman

Eu sou ela. Ela sou eu, 2017


Acrílica sobre Canvas 57
96 x 73 cm
59
Enivo
Ensaio por Gabriela Longman

Esperança, 2021
instalação 61
dimensões variáveis
1. Se eu quiser falar com Deus

O divino, o sagrado, o celestial: ao passear pelos corredores do Museu de


Arte Sacra – dono de um dos mais importantes acervos de pintura, mobili-
ário e estatuária barroca da América Latina – nos defrontarmos inevitavel-
mente com nossas próprias crenças e rituais.

“Sou batizado, crismado, catequizado. Já fui na Assembleia de Deus, teste-


munha de Jeová, Universal, Quadrangular, templo budista, taoista, umban-
da, candomblé. Eu gosto da fé, gosto da teologia”, conta o artista e grafiteiro
Enivo, pesquisador ecumênico hoje profundamente influenciado pela nume-
rologia cabalística.

Longe de qualquer doutrina, o fazer artístico de Enivo é, em si, uma prática


espiritual. Originário do Grajaú, periferia Sul de São Paulo, ele criou uma
maneira sistemática de atuar na cidade, entregue a ela como um fiel volta-
do a Meca. Apóstolo da cor, criou uma liturgia própria que se espalha em
muros e empenas dos mais variados bairros paulistanos, ricos e pobres sem
distinção. Com 20 anos de atuação, seu nome tornou-se referência incontor-
nável para quem acompanha a cena do grafite e da arte urbana, seus capítu-
los e desdobramentos.

2. Na terra do sol

Concebido especialmente para a mostra “Esperança”, um mural com mais


de cinco metros de altura ostenta uma figura da série “Rainbow Warriors”.
Xamãs de uma nova era, os “guerreiros do arco-íris” criados pelo artista con-
jugam máscaras de inspiração afro-futurista, símbolos tradicionais – como o
Yin Yang –, a um repertório que inclui bananas, cones de trânsito e tijolos de
construção, emblemas cotidianos da megalópole periférica.

Um elemento inusitado vem somar-se à estética etno-pop da série: emojis de


Whatsapp. Ao descobrir que diferentes tribos indígenas do Xingu e de ou-
tras regiões do país estavam usando a linguagem de símbolos, Enivo espan-
tou-se. O esperanto – promessa de uma língua comum a toda a humanidade
– de alguma maneira havia se materializado: um pataxó brasileiro, uma alta
executiva de Taiwan e um camponês da Rússia usam hoje um mesmo dialeto
global com desenhos de fogo, corações vermelhos e smiles amarelos trocados
via celular. Estaremos todos rezando para um mesmo Deus?

3. No meio do redemoinho

Entre sinais de fumaça e toques de recolher, ninguém passou ileso pelo im-

Omulu e eu, 2020


Colagem e assemblagem 63
38 x 28 cm
pacto da pandemia: há quem tenha se recolhido, há quem tenha se perdido
e quem tenha se encontrado. Enivo, por sua vez, trabalhou com uma intensi-
dade sem precedentes: em quarentena quase absoluta – clausuro monástico
– concentrou-se na produção de mais de 350 telas, chegando a fazer jornadas
de 15 a 17 horas diárias. O que para muitos foi um ano apocalíptico, para ele
foi a travessia do deserto: um dos autorretratos que fez em 2020 o mostra
imerso nas pinturas de pequeno e médio formato produzidas com uma avi-
dez criativa sem precedentes.

“A rua me inspira a pintar nas telas e com as telas, eu crio possibilidades e ca-
minhos para os novos murais de rua, num movimento cíclico”, conta o artista.

Sócio fundador e um dos nomes mais atuantes por trás da galeria A7MA, ele
passou boa parte dos últimos nove anos dedicado a fomentar a cena, criando
exposições, saraus e festas que ajudaram a fazer da Vila Madalena um epi-
centro cultural da cidade. “A gente abria, fechava, limpava a galeria, a gente
que apartava briga e arrumava briga”, diverte-se. Foi só com a pandemia, no
entanto, que ele conseguiu desvencilhar-se um pouco do papel de curador-
-embaixador para dedicar-se exclusivamente à própria produção. Um mer-
gulho fundo no próprio mar, aberto em boa hora.

4. Tempo Rei

Não por acaso, o título e os subtítulos desse ensaio fazem menção a uma
visão estético-política do Brasil construída em torno dos anos 50-70: Gilber-
to Gil, Glauber Rocha, Guimarães Rosa, Caetano Veloso. Em comum entre
eles, havia uma aposta na conjunção entre o regional e o universal, com uma
tônica ímpar no multicuturalismo. O Brasil só é rico pois diverso, ponto tão
importante a frisar diante do retorno de discursos antidemocráticos que fler-
tam com o homogeneizante — branco, hétero, cristão.

Nesse sentido, como atualizar a herança moderno-tropicalista? Se o sertão nor-


destino marcou com tanta ênfase a produção nacional da segunda metade do sé-
culo 20, é sem dúvida a periferia das grandes cidades, suas dores mas sobretudo
suas potências, o locus por excelência da produção deste século 21, do funk ao
rap. Entender o Brasil de hoje passa por entender esse cenário que conjuga ter-
reiros, igrejas e bailes; violência e resistência; analógico e digital. Dessa mistura
nasce nossa nova mitologia, no melhor sentido da palavra.

Enquanto a maior parte dos grafiteiros costuma assinar o próprio nome, Enivo
muitas vezes deixa uma palavra/codinome: “Quando eu grafito na rua, eu escre-
vo ‘tempo’.” Em 2009, Tempo Novo foi o título de sua primeira exposição indivi-
dual: “Parti do Grajaú, da casa onde eu nasci e cresci, e saí grafitando por uma

Santana branco, 2020


Colagem, assemblagem e resina sobre madeira 65
34 x 27 cm
semana, dormindo na rua até chegar na exposição. No sétimo dia com a mesma
roupa eu estava fedido, sujo, mijado... eu virei um grafite. Cheguei desse jeito na
minha própria exposição, meus pais cortaram meu cabelo e eu tomei um banho.
Naquele dia eu senti que entrei para o mundo das artes”.

Da metáfora do batismo, passando pelo caráter simbólico do “sétimo dia” da


criação, a trajetória de Enivo é uma ode à peregrinação que existe em cada
ser em busca do melhor de si — “O sertão? o sertão é dentro da gente”. Um
bom grafite, como um bom samba, é uma forma de oração, conjunção feliz
entre o mundano e sagrado, ancestralidade e reinvenção. Que sorte Enivo
nos prover um tanto dessa água benta em tempos de aridez.

— Gabriela Longman

Go Black!, 2021
Colagem e assemblagem 67
33 x 24 cm
Nikimba, 2021 Kilombo, 2021
Colagem, assemblagem e resina sobre vidro Colagem, assemblagem e resina sobre tela 69
33 x 24 cm 35 x 35 cm
Ana Júlia
Vilela
Ensaio por Thierry Freitas

Luisa e lua, 2021


Óleo e pastel oleoso sobre tela
71
40 x 30 cm
Coleção Gustavo Amorim & Ranier Coimbra
Nascida na segunda metade da década de 1990, Ana Júlia Vilela faz parte
de uma geração cuja cultura de massas, a linguagem da internet e o acesso
irrestrito a um vasto campo de imagens e notícias, são elementos de cria-
ção tão importantes quanto as referências adquiridas via educação formal. É
inevitável, então, que sua pintura, direta ou indiretamente, se refira a essa
miscelânea de citações, trechos e colagens que nos rondam. Mas fazer pin-
tura é tornar o mundo analógico, é fazer o olhar se deter em um assunto por
pouco mais de alguns segundos, mesmo que esse assunto seja o mesmo que
em uma tela digital ignoraríamos rapidamente ao arrastar para esquerda.

Apesar de muito inclinado ao discurso, o corpo de trabalho que Vilela tem


constituído ainda é majoritariamente abstrato. Utilizando-se muitas vezes de
uma paleta rebaixada, a artista se mostra interessada em experimentar con-
trastes cromáticos e novos formatos e superfícies, provando-se uma excelente
colorista. Nas últimas apresentações de seus trabalhos, inclusive, uma ideia de
pintura em campo expandido tem aparecido, e as paredes ou o espaço exposi-
tivo são usados como suporte para as experimentações da artista.

No âmbito pictórico, seu trabalho está em diálogo, por exemplo, com a produ-
ção de artistas contemporâneas como Daisy Parris, Rebecca Morris e Marina
Rheingantz, mas carrega particularidades quanto ao processo, já que Ana Ju-
lia realiza uma espécie de auto-ficção em diversas fases de sua pintura, a come-
çar pelos títulos perspicazes que oferecem ao espectador algumas dicas sobre
os temas com os quais trabalha.

A reunião, 2021
Óleo e pastel oleoso sobre tela
73
30 x 20 x 8 cm
Coleção Gustavo Amorim & Ranier Coimbra
Mesmo nos silêncios, os enunciados se fazem presentes, por isso muitos de
seus quadros apresentam campos de cores organizados de maneira a reme-
ter a alfabetos ou espaços a serem completados - resta saber se pela imagina-
ção do observador, ou por algo que a própria artista deixou a dizer.

Além de um elemento compositivo, a lida com a palavra tem se mostrado um


artifício utilizado por Ana Julia para criar imagens mentais ou “pintar sem
imagens”, e nesse sentido seu trabalho tem sido associado por muitos - inclu-
sive eu - a ideia de diário, análise que não é errada, mas desconsidera o que
pode vir a ser a melhor parte desse trajeto: a mentira.

Ao trabalhar com o universal, o que Ana nos oferece é um exercício de iden-


tificação: pedidos de desculpas, instruções, inquietudes, poesias, o deboche,
listas, trechos de músicas, frases soltas. Suas histórias não precisam ser reais
porque são banais, são de todo mundo, mesmo que não sejam de ninguém.
Daí a impressão de intimidade ou auto-exposição que esses trabalhos nos
trazem: eles poderiam ser sobre nós?

Para esta montagem, oito pinturas foram escolhidas, sendo uma delas um
monocromo amarelo com a inscrição “não quero mais morrer”.

De vez em quando é bom olhar no espelho.

— Thierry Freitas

Alguém aí quer brigar comigo - parte 3, 2021


Óleo e pastel oleoso sobre tela
75
30 x 20 x 5 cm
Coleção Victor Gunsalus & Daniel Silva, São Paulo, Brasil
Todas as festas de amanhã - parte 2, 2021 Trocando em miúdos, 2021
Óleo, pastel oleoso e caneta sobre tela Óleo, pastel oleoso e bic sobre tela 77
80 x 60 cm 22 x 16 cm
Thiago
Rocha Pitta
Ensaio por Ulisses Carrilho

Phosphorum amplificado 2021


Aquarela sobre papel 79
90 x 66 cm
Em 1966, a artista Mira Schendel produziu uma aquarela em que uma grande
mancha vermelha preenchia a maior parte de sua superfície. A forma arre-
dondada recebeu em seu centro duas palavras escritas com um bastão de cera:
lemos as palavras “que beleza”. A encantadora frase em letra cursiva revela-se
um enigma: sem vibração da voz, entonação da fala ou sinal gráfico, não há
sentido fixo na justa distância dessas suas palavras. É impossível para o espec-
tador assegurar-se se tal expressão é uma interjeição, uma reação à percepção
de uma bela imagem, ou uma pergunta. Quiçá um elogio ao próprio vermelho
aguado que preenche o fundo da dupla de palavra – esgueira-se pela superfície
do papel e tal vermelho revela-se também rosa, esmaecido, fraquejante nas
bordas; mas pujante, carnal, violento e sanguíneo no centro. Não há como ter
certeza do que revela a linguagem assim como a linguagem tenta, de maneira
falida, dar conta de revelar ou definir uma cor. A palavra é traço, é limite, é
fronteira. A cor é percepção, alteração dos sentidos, fenômeno vivido no corpo
e acontecido no interior. Aquilo que é vivo e instável não se deixa enclausurar:
possui a vivacidade própria daquilo que respira, que é fluxo, fenômeno. Entre
a fantasia e o fato, irrompe o ímpeto do artista de realizar no mundo seus an-
seios e pôr em prática um fenômeno material. Aquilo que acontece na curva do
movimento. Singular e particular e comum.

Assim como as palavras de Mira e o enigma-cor da mancha vermelha e ro-


sácea sugerem ultrapassá-los com ferocidade, nas aquarelas de Thiago Ro-
cha Pitta não consigo me deter apenas às relações metamórficas da nature-
za, com as quais o artista vem desenvolvendo duas décadas de pesquisa. As
aquarelas de Thiago sugerem-me um exercício utópico: desejo vê-las com os
olhos livres. Liberado do sentido que motivou o artista a pintar tais trabalhos,
como interlocutor e mediador da obra elegi não destrinchar os vínculos cien-
tíficos que levam o artista a construir uma trajetória poética encharcada com
água, acalentada pelo fogo, firmada na terra e alçada nos ares.

O artista depura seu olhar a partir de sua posição no mundo, atento aos mo-
vimentos em diversas escalas do tempo e do espaço: da lenta erosão às areias
desérticas; da teoria de deriva continental ao grande evento da oxigenação; da
pangéia que a tudo deu forma neste planeta ao microscópico movimento de cia-
nobactérias. O próprio artista já manifestou, em entrevista, nunca deixar de fas-
cinar-se pela criatividade e poder da natureza e suas constantes metamorfoses.

Em Thiago Rocha Pitta, percebemos os fenômenos do interior e da superfície


do mundo como realmente são: a vida é estética, há sagrado, sublime, extra-
ordinário, pujante, pictórico e escultórico na vida prosaica que nos rodeia. Pu-
déssemos despir-nos da ficção do indivíduo moderno, estaríamos embriagados
por minerais em constante decomposição, visões subaquáticas e até mesmo
pelas labaredas de fogo rubro que consomem qualquer pedaço de madeira.

Cauda pavonis, 2021


Aquarela sobre papel 81
90 x 60 cm
Nas aquarelas, a matéria do pintor revela-se aguada, fluida. E nas aquarelas de
Thiago Rocha Pitta, as várias escalas e movimentos que acontecem no interior
e na superfície do mundo revelam suas cores. O artista institui imagens que
colaboram para que percebamos um mundo cujo fluxo é constante. É urgente
abandonar o antagonismo binário dos termos natureza e cultura, reivindicar
outros pontos de vista mais generosos e coerentes com a passagem do tempo e
as várias vidas, dos vários reinos, que coabitam este planeta.

Ao mirar as aquarelas de Thiago Rocha Pitta revela-se também lidar com


aquilo que jorra do mundo e do qual ele tem sede. Assim é a beleza: a beleza
está em tudo que há, em cada rachadura, em cada gruta escura, em cada fun-
do de caverna, em cada lambida de fogo e em todas as labaredas quentes. Ou
seria esse o desejo? Temos fome de beleza. Temos sede de beleza. O humano
atribui sentido às imagens e encontra no seu entorno o sentido e a manifes-
tação do mistério.Este texto não intenciona elucidar nenhum porquê. Se-
quer acredito que a linguagem é sempre uma boa porta de entrada ou saída.
Repito Oswald de Andrade, pois é insubordinado: devemos tentar ver com
olhos livres. O mais antigo escrito de Haroldo de Campos no campo das artes
visuais é sobre Mira Schendel, data também de 1966, redigido para uma ex-
posição da artista no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro: “uma arte
onde a cor pode ser o nome da cor/ e a figura o comentário da figura/ para
que entre significante e significado/ circule outra vez a surpresa.” Para Espe-
rança, proponho no Brasil de 2021 a difícil tarefa de ver com olhos livres – a
radical tarefa de perguntar-se o que a liberdade quer dizer hoje.

— Ulisses Carrilho

O Vulcão Invisível, 2021


Aquarela sobre papel 83
90 x 66 cm
Lidia
Lisbôa
Ensaio por Mirella Maria

Alvorada, 2020
Vídeo (cor e som) (detalhe) 85
3’40”
Da extensão do corpo e suas memórias vividas, costuram-se os processos es-
téticos vivenciados por Lidia Lisboa. A artista visual materializa linhas diver-
sas de sua narrativa, da natureza que a cerca e das referências de mulheres de
sua família. Nesse caminhar pode-se observar como os afetos percebidos por
Lidia são entrelaçados por tecidos e desdobrados nas sensações da natureza
que a cerca.

Nesse ambiente criado pela artista, pode-se acompanhar sua delicadeza e


precisão na construção da obra Casulos, uma casa natural a partir da memó-
ria visual da artista pautada na organização autônoma de formigas. Nesse
referencial, algumas espécies criam um habitat de proteção através de uma
tecelagem, formando assim um casulo, o qual é feito de um material deli-
cado e resistente denominado seda, assim como ocorre nos ciclos de vida
de outros seres vivos como da mariposa ou da borboleta. O resultado dessa
transformação é a formação de uma estrutura orgânica e consistente, que
permanece contínua por um tempo, sendo desmanchada apenas pelo pro-
cesso de metamorfose das formigas em conjunto com o movimento natural
do tempo. A tonalidade dos casulos criados pelas formigas tecelãs, dialoga
com tons claros e vagamente translúcidos, trazendo toda a sabedoria da es-
tética da natureza.

O processo visual que o meio ambiente organiza e transforma é reverberado


plasticamente no trabalho de Lidia Lisboa. Na obra Casulos, a artista ob-
serva e re-cria todo o detalhamento e riqueza manual da costura, bordado,
amarração e dos materiais têxteis para criar três grandes esculturas, feitas
numa proporção próxima ao corpo da artista. O entrelaçado de tecidos for-
ma um espaço acolhedor, o qual rememora o que já é visualizado na natureza.
Na obra da artista, as tramas elaboradas a partir da exploração de recursos
têxteis ampliam o olhar e participação do espectador na relação com o objeto
tecido. Dessa forma, na obra Casulos o convite fica para adentrar-se no uni-
verso dos processos de transformação, os quais são costurados e demorados
ao olhar por cada forma construída com as aberturas e penumbras visuais
tecidas, a fim de apresentar um grande alvéolo de proteção e curiosidade.
Lidia nos possibilita imaginar, entrar e (re)construir juntos espaços de aco-
lhimento e afeto pela imagem do casulo em tramas.

Faz parte do ambiente natural as alterações na estrutura do casulo, princi-


palmente pela ação da natureza, o que torna possível experienciar um dos
momentos mais importantes de transformação e beleza no ciclo de vida das
formigas, as quais se organizam para recriar novas moradas em novos cor-
pos. Essa projeção pode ser visualizada no processo artístico de Lidia Lisboa,
principalmente quando a obra é ativada pelo corpo, o que traz uma percep-
ção ampliada das possibildiades estéticas dos Casulos. Quando em ativação,

Alvorada, 2020
Vídeo (cor e som) (detalhe) 87
3’40”
a obra se articula com o espaço que está inserida, aproximando o espectador
dos movimentos compostos e da materialidade ali presentes. A sensação de
acolhida novamente é apresentada, o que torna a artista, seu processo artís-
tico conectados às narrativas e memórias de Lidia Lisbôa.

Nesse caminhar, uma dimensão complementar ao que a obra Casulos apre-


senta e se intensifica com seu uso pela artista pode ser visualizado na vídeo-
-performance Alvorada. O registro foi realizado em 2019 em um dos maiores
centros populares e culturais da cidade de São Paulo, a saudosa Estação da
Luz. Essa região da cidade é reconhecida por sua travessia entre a memória
viva de São Paulo e os confrontos diários com a extrema desigualdade social
vista dentro e fora da estação. Quotidianamente milhares de pessoas, paisa-
gens, histórias são (re)criadas nesse espaço de representatividade ativa da
velocidade acelerada de São Paulo. A memória latente e viva torna-se motriz
para a realização de uma performance na qual Lidia Lisboa ativa a obra Ca-
sulos com uma de suas peças, explorando as possibilidades de movimento,
respiração e observação dentro e fora do acolhedor casulo de tecidos. Aqui, a
obra percorre o território da Estação da Luz, pelos olhares das pessoas que
cotidianamente transitam pelo espaço e pelo corpo ativo de Lidia que convi-
da a esse olhar.

Nos momentos de aproximação e distanciamento do registro audiovisual,


tornam-se visíveis e latentes os detalhes do casulo, suas aberturas, cores, for-
mas e movimentos construídos na relação de contato com a performativi-
dade construída por Lidia. Desde um caminhar intenso e constante, até um
movimentar tranquilo, quase estático, a artista evidencia contrastes e con-
vergências em sua performance, as quais estabelecem uma mediação com
o ritmo acelerado e dinâmico de uma das regiões mais intensas da cidade
de São Paulo. O convite ao público presente no vídeo ou ao espectador que
assiste ao audiovisual é de observar e caminhar aos movimentos e pausas do
casulo-Lidia na (des)trajetória acelerada da metrópole que não para.

Lidia Lisboa narra pela expressividade uma relação de cuidado, curiosidade e


proteção através dos casulos têxteis, os quais na natureza em forma de acom-
panham a mesma perspectiva de diálogo para com o ambiente de transfor-
mação das formigas, ambiente o qual inspira a artista em seu processo artís-
tico. O andar que se orienta pelas aberturas do casulo, contribuem para que
a artista traga visualmente o seu contemplar para a deriva que se realiza na
Estação da Luz. O som também tece a narrativa abordada na performance,
trazendo de maneira intensa a sensação do que estar quotidianamente numa
estação de trem feita por tudo que a cerca e atravessa como as pessoas, os
ruídos externos, a iluminação de dentro e de fora. Esse mesmo som, torna-se
intermitente e agudo, assim como os movimentos de Lidia e sua narrativa se

Alvorada, 2020
Vídeo (cor e som) (detalhe) 89
3’40”
alonga na performance. A artista que performa com a estação e o que a cerca,
direciona-se ao lugar mais alto e mais iluminado a fim de experimentar as
potencialidades do espaço que ocupa. Nessa relação, seu corpo acompanha
a luz junto ao solo aproveitando as possibilidades de ver-estar dentro e tam-
bém fora do casulo têxtil. Aqui Lidia, expressa novamente sua curiosidade
com o que é externo ao casulo e num movimento breve retorna ao seu lugar
de proteção, afeto e cuidado. A materialização dessa relação entre artista e
objeto-obra-casulo é o encontro com a sua Alvorada, que faz também juz ao
nome da performance.

As tessituras propostas através do processo artístico de Lidia leva o espec-


tador a acompanhar uma extensão de seu corpo e de memórias vividas, as
quais se perfazem nos objetos e performances construídos pela artista, for-
mando um olhar estético aprimorado de encontro ao que a toca e reverbera
entre tramas, tecidos e afetos.

— Mirella Maria

Alvorada, 2020
Vídeo (cor e som) (detalhe) 91
3’40”
Alvorada, 2020
Vídeo (cor e som) (detalhe) 93
3’40”
Paulo
Nazareth
Ensaio por Janaina Barros

Sem titulo (Luna Game), 2017


Impressão fotográfica sobre papel algodão 95
75 x 100 cm
01_ao amanhecer------sempre ao amanhecer/caminhar à um lugar Num princípio análogo, o panfleto Cabrito não é pavão (2010) do artista Paulo
remoto, afastado de seres humanos/caminhar à um lugar remoto, onde Nazareth (homem velho nascido no Borun Nak, Vale do Rio Doce/MG), há a
somente se escute pássaros/ caminhar à um lugar remoto, onde não se seguinte proposição de ação performática: preencher espaço expositivo com
escute voz humana/caminhar à um lugar remoto para escutar o canto cabras brancas e pavões machos, a sala fica totalmente preenchida_ pavões
dos pássaros------------------------------------------------------ escutar o canto machos são territorialistas: gritam e repelem outros machos/ espalhar no ar
dos pássaros/emitir ruídos agudos na impossibilidade de cantar como o cheiro da fêmea do pavão/ cabras comem tudo que vê/ pavões machos eri-
um pássaro--------------------------------------------------------------------/ sam a pseudo-cauda quando sentem a presença da fêmea/inevitavelmente as
emitir ruídos agudos na possibilidade de acaso atrair pássaros/ emitir cabras comem a pseudo-cauda dos pavões machos. Então, o cabrito (Capra
ruídos agudos na possibilidade de acaso cantar como um pássaro.(...) aegagrus hircus) e o pavão (Pavo cristatus) acionam a instância da palavra a
(projecto: aprendendo a cantar com os pássaros, Paulo Nazareth, 2010) despeito daquilo que digerimos e processamos pelo nosso estômago traduzido
na dimensão do gesto que se torna ação corporificada no mundo. Destaca-se
ainda, a ação performática Sobre pássaros e gente (2007) ocorrida no desloca-
Os pássaros trazem em suas revoadas a dimensão do exílio num trajeto que mento entre o Mercado Novo e Mercado Central, na região central da cidade
nos remete, a princípio, ao desconhecido e ao inesperado. Sobretudo, as re- de Belo Horizonte, Minas Gerais. Eram espaços que comercializam diversos
voadas referem-se à aquilo que foi destinado, Fífifún, num movimento nô- produtos, anteriormente, possuíam viveiros superlotados de pássaros e outros
made e de ordem comunitária que sinaliza a ideia de dinâmica, continuidade animais. O artista caminha com uma gaiola estabelecendo uma forma de inte-
e perpetuação. A palavra Fífifún em yorùbá abarca uma série de sentidos ração com um canário (Serinus canaria) e a sua cabeça que coabitam o mesmo
como aquilo que é dado, destinado, transferido. Diferentemente, da palavra lugar. Neste sentido, aproxima-se no amalgamento destes dois corpos numa
Ayanmo que pode ser entendido de modo enfático como o destino deter- correspondência ao campo do pensamento e da autoconsciência associada ao
minado às pessoas. Ou, ainda, pode-se considerar a palavra destino, Odù, neter Djehuty em Kemet. Ou, Thoth, nome dado pelos gregos a esta divindade
como a ideia de acontecimentos que precedem a existência humana, arti- egípcia. Na mesma medida, estes corpos friccionam outros corpos enclausura-
culando no agora, formas de temporalidades distintas para algo aparente- dos e domesticados presentes nos viveiros destes dois mercados. A dimensão
mente inevitável. Bem como, destino refere-se, também, ao deslocamento, entre o Eu e Outro ora se tornam simétricas, ora esta relação entre Eu e Outro
a fatalidade, a sina, a sorte, a finalidade, a predestinação. Há um ìtàn numa se anulam numa relação de assimetrias como uma metáfora da colonialidade
temporalidade primordial onde os awon orisha vivendo perto das pessoas no do ser, do poder e da natureza. A ação termina no encontro do artista com um
Ayé, Terra, se rebelaram em relação a Olódùmarè, Deus Supremo, que vivia homem que imita o trinar de aves. Já não é mais um pássaro que trina, mas o
no Orun, Céu, ensejando destroná-lo. A partir desse acontecimento, o mun- simulacro dele.
do transformou-se num tempo de escassez e morte. Muitos pássaros (Eiye
púpo) foram enviados do Ayé para Orun pelos awon orisha sem que alcan- Neste processo de genealogia da presença de pássaros na poética de Paulo
çassem alguma comunicação entre esses dois mundos. Entretanto, somente Nazareth, em sua pesquisa visual aparece a narrativa da pequena ave Manon
Osun, divindade das águas doces, associada à beleza, a fartura e a materni- (Lonchura striata domestica), que surgiu a partir da seleção de criadores
dade, metamorfoseada em pavão (Eiye Oge) num ato de amor e devoção a japoneses da espécie silvestre (Lonchura striata) que habitava o Sul da Ásia,
humanidade, consegue alcançar o Orun transformando-se no abutre (Igún), parte sul da China e sudoeste da Ásia. A primeira geração de origem japone-
a ave mensageira, onde retorna trazendo a chuva que potencializa a reorde- sa nasceu e cresceu em cativeiro. Todavia, é uma ave que não faz distinção em
nação da vida. Num outro contraponto, outra história ocorrida num tempo relação a outras espécies, logo, é utilizada como ama seca no ato de chocar
primordial para os povos incas, o pássaro Chiauco, sabiá, é encarregado pelo ovos que não lhe pertence. Sobretudo, para o pássaro Manon (Lonchura
Deus Sol de levar a mensagem para a humanidade a despeito de tudo que striata domestica) já domesticado e cativo é impossível a sua sobrevivência
necessitassem para a sua sobrevivência estaria dentro do ari-mancacha, cal- diferentemente desta condição servil. A liberdade para alçar vôo é o pereci-
deirão mágico feito de barro, sem que houvesse trabalho algum. Tudo seria mento desta Vida, torna-se Morte. Paralelamente, define-se como um modo
belo, bom e útil. O pássaro Chiauco ao chegar a Terra cantando e saltitando de sedentariedade forjada a partir da noção de arquitetura para além de ha-
enganou-se. A partir daí, a humanidade inventou o trabalho e as tecnologias bitat. São, também, dispositivos de controle de corpos institucionalizados
relacionadas à sua produção... numa lógica econômica capitalista.

97
O ato de lançar arroz para atrair pombos (Columba livia) em algumas pra-
ças da Argentina (2010) e, posteriormente esta ação se repete na Confucius
Plaza em Chinatown, Nova York (2018) não é uma armadilha. O pombo (Co-
lumba livia) não é visto aqui como a manifestação do espírito santo manifesta
na imagem da pureza do branco de algo que se deve preservar. Mas, como
efeitos deste mundo que o considera como uma praga urbana a se ter cautela.
Sobremaneira, evidencia-se na figura do pombo, a fabulação do Outro, como
uma colonialidade de poder construída a partir de micro e macro narrativas.
Pode-se citar, o termo Complexo de Pombal, relativo à casa de pombos, é um
conceito reelaborado pelo artista em sua pesquisa visual, a partir da referência
deste uso lingüístico pelos moradores do bairro Palmital, cidade de Santa Lu-
zia, arredores de Belo Horizonte, local que se constitui como parte importante
de suas múltiplas vivências. Durante os anos 1980, um conjunto habitacional
foi construído pela Companhia Metropolitana de Habitação de Minas Gerais
(COHAB-MG) e financiado pelo Governo Estadual de Minas Gerais. Portanto,
crescer num espaço arquitetônico pequeno, tal como a casa de pombo, conferi-
ria as pessoas um impacto tanto físico quanto psíquico, pois há tanto a dificul-
dade de sair deste lugar pelo temor ao desconhecido, quanto ao sair deste lugar
de certo domínio, o desejo de retornar a ele torna-se constante. Da mesma
forma, como o pombo correio (Columba livia domestica) desloca-se para um
determinado destino, contudo, sempre retorna a seu lugar de origem.

No texto Eterno retorno do encontro (1999) do filósofo, escritor e ambienta-


lista Ailton Krenak, descreve a história primordial dos fundadores do povo
Tikuna, vivem na fronteira entre o Peru e Brasil, sobre os irmãos Hi-pí e Jo-í
que criaram as montanhas, os rios, a floresta... Quando Jo-í imaginava algo,
tornava forma concreta no mundo. Hi-pí vigiava o irmão para que não pu-
desse ter ideias perigosas. Certo dia, Jo-í subiu num pé de açaí e olhou para
mais longe que pôde e disse:

“Olha, lá muito longe está vindo um povo, são os brancos, eles estão
vindo para cá e estão vindo para acabar com a gente”.

“Olha, você não podia ter falado isso, agora que você falou isso você
acabou de criar os brancos, eles vão existir, pode demorar muito tem-
po, mas eles vão chegar aqui na nossa praia”.

E, assim, nasceram os brancos ...

No texto A barca aberta que compõe a obra Poética da Relação do escritor e


ensaísta martinicano Édouard Glissant, inicia com a imagem do mar que des-
vela o temor ao desconhecido na experiência violenta do exílio pela travessia
de povos africanos para as Américas. Neste aspecto, o conceito de nomadismo

Cuando tengo comida en mis manos, 2012


Vídeo (cor e som) 7’12” 99
Coleção Privada, São Paulo
para estes povos não ocorre pela contingência, pelo movimento de circularida- das baleias ​(Balaenoptera physalus), o perigo em migrar decorre ao atra-
de que permite a sobrevivência de uma comunidade em razão da escassez de vessarem a península para retornar pelo Oceano Pacífico direcionando-se
alimento. Este movimento que se pauta pela prudência seria nomeado de no- para o norte, onde é comum ocorrer muitas mortes. Porém, houve alguma
madismo circular. Segundo Glissant: O nomadismo circular é uma forma não morte apenas entre o período anterior e posterior a sua estadia. Esta ação é
intolerante da sedentariedade impossível. De fato, este movimento inicial so- anterior a vídeo performance, Cuando tengo comida en mis manos (When
bre o abismo da travessia, constitui-se por meio da conquista e pelas diferentes I have food in my hands) de 2012, presente na mostra Esperança. A ação
formas de destituição do Outro como uma espécie de salto absoluto em frente. em Cuando tengo comida en mis manos sucede-se no lado estadunidense,
Então, definir-se-ia como nomadismo em flecha. Para o autor, o nomadismo Califórnia, num registro em plano sequência, pelo qual o artista sobe num
em flecha é um desejo devastador de sedentarismo. Sobremaneira, imagem dos poste, ao equilibrar-se no seu topo, retira migalhas de pão de um saco de te-
pássaros na pesquisa visual de Paulo Nazareth apresenta a metáfora do exílio cido lançando-as ao céu, conforme este gesto se repete várias gaivotas (Larus
que é atravessada pela colonialidade ainda no presente e que se amalgama dominicanus) se aproximam ensejando alimentarem-se. Entretanto, não é
ao movimento de errância do artista. Assim como aparece no panfleto pro- possível ver o artista sobre o poste, seu corpo parece flutuar tal como as aves.
jecto observatórios de pássaros (2010): criar sítios para se observar pássaros/ Ao mesmo tempo, que há a revoada de gaivotas (Larus dominicanus) em tor-
criar pontes suspensas entre as árvores/estabelecer lugares suspensos entre as no de si, a imagem de um parapente, associado a um vôo dinâmico que permi-
árvores, para se observar pássaros/ não deixar que as árvores deixam de ser te manter-se em períodos longos em altitude, funde-se entre o seu simulacro
árvores/ esperar que os pássaros venham pousar nestas árvores/criar meios de pássaro e o vôo real de pássaros. O parapente é a metáfora do mito grego de
de se chegar na copa das árvores/observar a vida existente na copa de uma ár- Ícaro. Este ao fugir de Creta, encantado, com o seu simulacro de asas de pás-
vore/observar o mundo como se observa um pássaro (...). Neste sentido, não é saros que foram urdidas com cera, conforme ia se aproximando mais perto do
apenas o caminhar como prática estética que pode ser localizada na figura do sol, as suas penas se desprendiam continuamente, sucumbindo-se nas águas
flâneur do poeta e teórico da arte moderna Charles Baudelaire no século XIX, do mar Egeu. Pode-se citar neste contexto, o desejo humano de vôo apresenta-
o vaguear de dadás e surrealistas no início dos anos 1910 e 1920, as deambu- do também no vídeo do artista intitulado Intento de vuelo (2012). As gaivotas
lações situacionistas e o ato de peregrinar na produção de artistas da land art (Larus dominicanus) encarnam para o artista vidas que não são domesticadas
entre os anos 1960 e 1970. Mas, contrapor conceitualmente estas analogias facilmente. São atrevidas. São arredias. Estão sempre preparadas para alçar
numa ideia de rizoma que é uma raiz desmultiplicada, que se estende em rede vôo quando está em superfície. Diferentemente, dos pássaros do filme dirigido
pela terra ou ar, sem que nenhuma origem intervenha como predador irre- por Alfred Hitchcock, título homônimo, a natureza indomável dos pássaros so-
mediável. Dialogicamente, este é o sentido que Glissant compreende sobre a brepõe-se ao desejo de transformação da natureza domesticada pelo homem.
noção de Poética da Relação, no qual a identidade manifesta-se no prolonga- O enredo refere-se aos ataques violentos de pássaros sem uma causa específica
mento da relação entre Eu e o Outro. Este campo tenso entre o que constitui as aos habitantes de Bodega Bay na Califórnia. Em Cuando tengo comida en mis
memórias, na mesma medida, que se constitui em silenciamentos, é sinalizado manos encontra-se a relação ambígua no jogo estabelecido entre aquele que
na descrição de dois panfletos logo a seguir: alimenta com aqueles que são alimentados. Outro trabalho que dialoga com
este mesmo gesto de Paulo de semear as migalhas do pão é a vídeo performan-
O galo e as galinhas ---Aelbert Cuyp (s.d) * 1620 + 1691 Holanda [?]. ce Encantando pajaros (2011). Quando se alimenta aos pássaros é deixá-los
óleo sobre madeira, 48x45 cm. Museu de Belas Artes, Gand. (2013) que se alimentem? Quais outras analogias se apresentam neste mesmo gesto?
Quando este prolongamento é simetricamente prolífico entre o Eu e Outro na
Galinha sem cabeza---possivelmente de autoria de um fotografo mexi- fabulação de narrativas universais? O movimento de ruptura da cena dá-se
cano muito conhecido (2015) quando sobrevêm diante deste acontecimento duas pessoas desconhecidas:
Isto está acontecendo! Isto é de verdade! Dessa maneira, decorre a quebra da
Por outro lado, a ação performática esperando as baleias ​(Balaenoptera phy- estética da janela numa imagem que aparece flutuante (Céu), mas também,
salus) que viessem morrer ao lado de Nazareth, aproxima-se da fricção da enraíza-se (Terra). Este acontecimento no plano do real torna-se mais enfático
incerteza no exílio tanto das aves nesta cartografia da travessia quanto ou- nos diferentes lugares de memória: o registro produzido, o gesto do artista, a
tros seres viventes em nomadismo. Paulo passa três dias na Baixa Califórnia, fruição de transeuntes. O pão como metáfora da domesticação e adestramento
estado pertencente ao México na Península da Baixa Califórnia e na fron- em fricção com a dimensão com o sagrado retoma a série fotográfica Pão e Cir-
teira com Golfo de Santa Clara. Conseguintemente, no processo migratório co (2012). O pão recobre ora os olhos, ora boca, ora os ouvidos numa maneira

1 01
de obliteração da consciência coletiva ou autoconsciência como tradução de
uma narrativa de poder que reafirma o cegamento, a surdez, o silenciamento
para grupos subalternizados. Em oposição, a sacralidade do pão na hagiolo-
gia de Cristo. Quando tenho fome numa relação contraposta a Quando tenho
comida em minhas mãos. As sentenças que abarcam em seu sentido ambigüi-
dades no seu modo imperativo:

Não fale enquanto come!


performática por Nazareth, quando atrela um ìtàn de um tempo primordial com os impactos
Não fale de boca cheia!
do presente pela colonialidade: deixar que galinhas de angola invadam o terreiro do museu do
A mão que alimenta não apedrejai!
crime (antropologia do negro/antroplogia do cangaço) cidade de Salvador, Bahia (2014).
Não cuspir no prato que comeu!
um conto de África diz que a morte, num tempo antigo, se parou sobre uma cidade
O vídeo Cuando tengo comida en mis manos está em direção ao Oceano Pacífi-
de pretos e ahi ficou sem sair por um tempo ---- a cada hora um negro caia morto
co e as fotografias também presentes na mostra Esperança, Untitled (Bird Sky-
e já não tinha o que fazer ------ a gente do lugar andava desesperada com tantos
fall) e Untitle (Luna Game), 2017, encontram-se geograficamente em direção
mortos a enterrar----------------------------------------------------------------------------------
ao Oceano Atlântico. Estes dois últimos trabalhos foram realizados em Coney
--------------------------------------------então Oxalá interviu, depois das preces de quem
Island, península ao sul do Brooklyn, na cidade de Nova York. O contexto desta
andava vivo, -----polvilhou galinha preta com farinha de maniva (mandioca, ma-
pesquisa poética deu-se durante o trânsito de Paulo Nazareth pela rota clandes-
cacheira, aipim) ------polvilhou galinha preta com cal e gesso ---- polvilhou galinha
tina de escravizados, Underground Railroad, existente entre os séculos XVIII e
preta com efum----no mercado soltou galinha preta polvilhada de efum----e a morte
XIX. Portanto, escravizados em fuga iam em direção ao norte dos Estados Uni-
assustada com o canto de cascata de galinha preta polvilhada de efum_ coisa que
dos chegando ao Canadá, ou utilizavam outras rotas subterrâneas que levavam
nunca viu _foi-se embora de ahi..........................................................................................
ao México, Caribe, Bahamas, Haiti. Estes registros fotográficos localizam-se
..................................
numa região de parques de diversão a beira da praia. Assim como, abarcam um
imaginário da cultura visual dos anos 80, 90, 2000 em filmes hollywoodianos.
Esta dinâmica de vida ou da morte se desvela como um princípio de correspondência re-
Em Untitled (Bird Skyfall), as gaivotas encontram-se em sobrevôo numa apa-
ferente a seguinte sentença: O que está acima é como está embaixo. O que está embaixo
rente infinitude, da mesma maneira, a imagem do artista semeando pedaços de
é como está em cima. Define-se, esta sentença como uma das sete leis atribuídas ao filó-
pão em direção ao Céu se constitui num ponto de fuga criando uma noção de
sofo kemético Hermes Trismegisto para os caminhos que compreendem a sabedoria e a
profundidade a cena. A complementaridade existente entre Céu e Terra é inten-
responsabilidade manifestadas pela autoconsciência. O que ocorre no plano espiritual é
sificada pelo brinquedo Skyfall, queda do céu, que traz o movimento de ascender
análogo ao plano mental. Pois, se a colonialidade oblitera a simetria entre Eu e o Outro e
e descender, descender e ascender. Já em Untitle (Luna Game), Paulo encontra-
desvelam profecias sobre a impossibilidade deste mundo. Portanto, toda ação lançada no
-se no centro da cena e alimenta as gaivotas que estão ao seu entorno. Os mes-
mundo como fricção sobre a restituição de narrativas subalternizadas, torna-se uma ação
mos pássaros que antes sobrevoavam o artista agora caminham sobre o piso de
que potencializa outras epistemologias para escritas insurgentes.
madeira. A Lua aparece como referência tal como a temporalidade dos proces-
sos do plantio, o crescimento, a poda, a colheita, o período de gestação de uma
— Janaina Barros Silva Viana
pessoa e o seu nascimento... Para o artista, refere-se ao feminino, água que está
sobre a terra, a água do corpo e o movimento de inconstância da vida em suas di-
ferentes esferas sociais, políticas e econômicas. Dessa maneira, constitui-se em
analogias a presença dos pássaros em sua pesquisa visual. São formas de corres-
pondências entre aquilo que parece oposto, mas estabelece complementaridade
como princípio de ordenação do mundo. Céu e Terra. Sagrado e Profano. Bem
e Mal. Eu e Outro. Identidade e Diferença. Domesticado e Indomável. Micro e
Macro Políticas. Regional e Global. Norte e Sul Global. Vida e Morte... Por fim,
retoma-se aqui uma outra história apresentada num panfleto como proposição

103
Sem título (Bird Skyfall), 2017
Impressão fotográfica em papel algodão 105
75 x 100 cm
João
Trevisan
Ensaio por André Vechi

Corpos em Prostração, 2021


Dormentes de ferrovia e ferro 107
7 peças, cada um aproximadamente 420 x 21 x 15 cm
Um homem caminha. Sol alto. Em volta o ar quase parado, fazendo, vez ou
outra, tremeluzir o mato ingrato. Tudo seco em volta, as árvores, a terra aver-
melhando-se em levante a cada passada. Um homem caminha, sem saber aon-
de quer chegar. Não se trata de uma deriva, pois antes, houve um chamado e,
ao escutá-lo, pôs-se em locomoção, como locomotiva, demorando-se sobre os
trilhos, os dormentes esquecidos no sono profundo das coisas desprovidas de
uso. Um homem caminha, sabendo que o movimento é a única opção quando
a vida parece estanque, quando o mundo age em retrocesso, quando a mente
efervesce na desatenção às pequenas coisas. Um homem caminha, pois sempre
caminhou e sempre há de caminhar, lembrando que a conquista da geografia
é um direito; sabendo que não se trata de mapear, de colonizar qualquer ter-
ritório, mas de apenas estar nele, a cada segundo, deixando-se atravessar em
novo passo. Um homem anda como quem medita, e medita como quem anda
dentro de si, para fora e dentro mais uma vez, encontrando, ao respirar, um
equilíbrio com o ao redor. Um homem anda até estancar, pois algo em si, o fez
parar: uma resposta, sim, para a pergunta que ainda não veio a ser formulada.

O homem que anda o faz pois precisa de um corpo. Ele procura um outro
para que possa agir. Ele o anseia, pois o pressente necessário para trazer ao
mundo algo, um gesto, um átimo, uma coisa que se configure e desapare-
ça, incrustando-se na memória miraculosa de quem assiste. O homem tem
vontade de fazer acontecimento. E ele faz. Ao encontrar, depositado na terra,
inerte, o tronco, lanhado pela passagem dos vagões que deveriam integrar
uma nação, ele reconhece, ali, algo mais do que um objeto, algo mais do que
um cadáver, já que não mais árvore, já que condicionado pelo corte e pelo
uso ferroviário. O homem sente apreço pelas coisas abandonadas, esqueci-
das por não mais encontrarem serviço. Ele se vê nelas e recusa deixá-las en-
tregues, como se opõe a entregar-se à escuridão dos próprios pensamentos.
Então ele arranca o corpo da terra e o carrega sobre os ombros, sem nunca
parar. Ele sabe que parar é uma espécie de abandono, um pouco pior até,
pois é se abrir para o cansaço, uma renúncia de si e não há espaço para isso.

Com o outro-corpo sobre os ombros ele, a cada átimo, remete-se ao seu pró-
prio. Aquele que sustenta: carne; o amparado: tronco. Invertem-se as rela-
ções: não mais a madeira se faz coluna para construção, mas sim o homem.
Ele o faz, pois impregnado da figuração do masculino como ossos e muscula-
tura, e sangue e pele, e pelos e dentes. O homem como suor do trabalho bra-
çal, moldando sua imagem àquela do labor. O homem trabalha, pois sempre
trabalhou, pois gosta de ver num outro corpo o resultado do seu gesto, pois
este fica como algo que afirma: estive aqui, eu o fiz, eu sou potência. E assim
ele vai construir formas que remetem a sua vitalidade, seja em monumenta-
lidade, ou como simples afirmação de seu falo, sua marca de diferença que
incessantemente demanda certificação.

Um homem retorna ao seu próprio lar e prepara-se para fazer reviver aquele
quase-nada. Opera-se uma espécie de transmutação, em que nada em si, mudou.

Corpos em Prostração, 2021


Dormentes de ferrovia e ferro 109
7 peças, cada um aproximadamente 420 x 21 x 15 cm
A madeira não volta a fazer raízes e florescer, mas algo nela altera-se assim como
permanece. Esse gesto executado pelo homem, nada mais é do que a resposta do
seu trabalho, de seu cansaço ali está impregnado. Sabemos que a transformação
operada é resultado de um poder e de seu encontro com outro, pois a matéria,
em si, carrega a possibilidade do vir a ser tantas outras coisas. Mas não, ela per-
manece como foi achada, negando apagar suas próprias marcas. Sua crueza, sua
brutalidade não nos ameaça, mas nos convida ao afago. Ainda que vigorosas
essas estruturas não assustam, a não ser ao nos fazer ver que nós sim, em nossa
voraz transitoriedade, podemos perturbar seu equilíbrio.

Ainda que em pé, os dormentes dormem. Meditação silenciosa que ecoa em


nosso olhar.

Um homem possuí um espírito místico, pois sabe que as respostas não repou-
sam em livros científicos. Nem filosóficos. E não há nada a ser explicado que
não possa se fazer saber melhor pelo sentir. Por isso ele trata de encontrar no
mundo uma outra ordem, que lhe seja própria, que o sintonize com o universo.
Sete. Ele diz: sete. Ele pensa em números pois entende que a arte, como a ma-
temática, surge pela abstração, fazendo figurar grandezas. Sete. As estruturas
por ele criadas assemelham-se ao número. Sete. As estruturas por ele dispostas
correspondem ao número. Sete. As estruturas por ele manipuladas assumem
uma posição de um repertório de poses que é o mesmo do número. Sete corpos
no formato do número sete podem assumir sete atitudes. Mas ainda assim, ele
escolhe apenas uma posição, sabendo que não há necessidade de revelar tudo,
deixando-nos aberto o segredo que nós mesmo devemos suplantar.

Um homem nos convida a caminhar, a circular por entre esses corpos que
apesar de instaurarem em nós uma ideia qualquer de repouso, clamando
para nos espreguiçarmos, em realidade nos fazem querer percorrer seu cami-
nho, entender sua calma naquela adoração em que permanecem tombadas.
O homem precisa que admirem sua criação. Ele também é vaidade, ainda
que no buscar o reconhecimento exista sempre a generosidade do dar, de en-
tregar ao mundo algo novo: uma construção fantástica em sua simplicidade
que nos faça recuar para um tempo interno, incoerente, nosso.

Nós homens-mulheres-seres-coisas nos prostramos, não por nos rendermos,


não pela fraqueza, não por nos reconhecermos abatidos, nem pelo cansa-
ço de há tanto carregar um peso na espera de algo maior que está para se
levantar, mas por antever no outro (coisa-ser-mulher-homem) a dignidade.
Toda a potência se faz reverência, não para si mesmo, não parra sublinhar o
assombro da própria força, desfazendo o ar de ameaça, mas pelo reconheci-
mento. Essas estruturas-esculturas se prostram uma para as outras e para
nós. Assim como nós lhes prestamos reverência.

A arte nos saúda, para que nos saudamos e possamos sentir, amanhã, sauda-
de deste encontro.

— André Vechi
Corpos em Prostração, 2021
Dormentes de ferrovia e ferro 111
7 peças, cada um aproximadamente 420 x 21 x 15 cm
Corpos em Prostração, 2021
Dormentes de ferrovia e ferro 113
7 peças, cada um aproximadamente 420 x 21 x 15 cm
Andrey Rossi Leandro Júnior
Graduado em Artes Plásticas pela Universidade Estadual Pau- Leandro Júnior é pintor e escultor figurativo, com temas artís-
lista (Unesp), Andrey Rossi concluiu Pós-Graduação em Dis- ticos extraídos da humilde vida rural do vale do Jequitinhonha,
curso e Leitura de Imagem pela Universidade Federal de São em Minas Gerais. Morador desta região há 35 anos, Júnior de-
Carlos (UFSCar). É mestre em Artes Visuais pela Universida- senvolveu seu método artístico usando argila nativa que extrai
de de Campinas (UNICAMP), onde atualmente é doutorando dos íngremes vales da região, o que resulta em obras que ecoam
em Artes Visuais. Artista representado pela OMA Galeria, tra- a natureza de suas raízes regionais e culturais. Esculpidas em
balha com pintura, desenho e assemblagem. Suas obras com- argila sólida ou pintadas sobre tela com argila caseira liquefeita,
põem acervos institucionais por meio de prêmios aquisitivos as obras de Júnior exploram a vida no vale do Jequitinhonha e
no Brasil e no exterior, a exemplo do Museu de Arte Contem- sua ancestralidade histórica, que inclui numerosos descenden-
porânea do Rio Grande do Sul (MAC-RS), em Porto Alegre, tes de africanos escravizados fugitivos que ainda vivem em mui-
Brasil; da coleção Gilberto Chateaubriand no Museu de Arte tos quilombos da região. Estudou arte na Faculdade São Luís
Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio), no Rio de Janeiro, de Jaboticabal. Desde 2017, expõem em inúmeras exposições
Brasil; do Museu de Arte do Rio (MAR), no Rio de Janeiro, coletivas. É professor de arte de um Centro de Referência de
Brasil; e da Coleção Kunstmuseum Kulturverein Wittingen, Assistência Social (CRAS), onde trabalha com adolescentes e
na Alemanha. jovens adultos.

Márcio Harum Jackson Gleize


Marcio Harum trabalha na interseção entre curadoria, pro- Desde a adolescência, Jackson Gleize dedica-se ao teatro, es-
gramas públicos e educação. Entre 2018 e 2020, coordenou o tudando Teatro Vocacional no Teatro Paulo Eiró. Formado
programa “CCBB - Arte e Educação” no Centro Cultural Ban- em artes dramáticas pela Escola de Teatro Macunaíma (2017),
co do Brasil, em São Paulo. Foi curador de artes visuais do atuou como ator e produtor em diversos espetáculos. Em 2016
Centro Cultural São Paulo (CCSP) entre 2012 e 2016; e dirigiu fundou a Cia dos Errantes, um coletivo de artistas periféricos
o programa “Experiências dialógicas” no Centro Cultural de com o objetivo de levar a arte para espaços não convencionais.
España, em São Paulo, entre 2009 e 2011. Integrou comis- Atuou como ator na Cia de Artes Nissi. Ficou em cartaz com
sões julgadoras dos mais diversos editais de artes visuais do espetáculo “Acúmulos” (2018) dirigido por Kenia Dias e Ri-
país. Atualmente, realiza cursos, interlocuções, laboratórios cardo Garcia e com dramaturgia de Kenia Dias, Márcio Abreu
e acompanhamentos artísticos em diversos formatos on-line, e Ricardo Garcia. Convidado para trabalhar como produtor
integra o comitê curatorial da 1ª Bienal de Arte Contemporâ- cultural no Centro Cultural Santo Amaro, tornou-se responsá-
nea SACO no Chile. vel pela elaboração e execução de projetos, programas, even-
tos e atividades culturais e sociais.

115
Desali Yasmin Guimarães
Desali é formado em Artes Plásticas pela Escola Guignard As pinturas de Yasmin Guimarães partem da representação
(UEMG). Criador do Coletivo Piolho Nababo, há dez anos em de paisagens, imagens e elementos do mundo, que se des-
Belo Horizonte, viaja por múltiplas linguagens, incluindo grafi- mancham e se fragmentam através de diferentes suportes, em
te, fotografia, vídeo e intervenção urbana, promovendo o contato pinceladas curtas , manchas de tinta rala ou empastados de
entre a margem e o centro, questionando as instituições artísti- cor. Uma possível representação da ação dos ventos sobre a
cas tradicionais e seu colonialismo, contaminando esses espaços paisagem, ou sobre as coisas que estão no mundo. Realizou
com as ruas. Participou de residências e exposições coletivas e in- as exposições individuais, “Minutos antes de acordar” (2020),
dividuais no Brasil e no exterior, além de ter obras em coleções na Galeria Simões de Assis, em Curitiba, Brasil; “Eyes e Yes”
institucionais, como as do Centro Cultural São Paulo (CCSP), em (2018), na Galeria Superfície, em São Paulo, Brasil; e “Reti-
São Paulo, Brasil; Museu de Arte da Pampulha (MAP), em Belo cências” (2016), na Galeria Superfície, em São Paulo, Brasil;
Horizonte, Brasil; e no acervo da Pinacoteca de São Paulo, em São além de diversas exposições coletivas.
Paulo, Brasil. Individuais recentes incluem “Rua mútua” (2020), na AM Galeria de Arte, em
Belo Horizonte, Brasil; “Pele fera” (2020), na Galeria Athena, Rio de Janeiro, Brasil; “Vulgo.
Lembra-se da grande mesa na sala de jantar” (2017), no Palácio das Artes, Belo Horizonte, Bra-
sil. Recentemente, participou das exposições: “Enciclopédia Negra” (2021), na Pinacoteca de
São Paulo, em São Paulo, Brasil; exposição “Carolina Maria de Jesus: Um Brasil para os brasi-
leiros” (2021), no Instituto Moreira Salles (IMS), em São Paulo, Brasil; 36o Panorama de Arte
Brasileira (2019), no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP), em São Paulo, Brasil.

Fernano Mota Carollina Lauriano


Fernando Mota é mestre em Arte Contemporânea pelo Sothe- Formada em Comunicação Social com ênfase em Jornalismo,
by’s Institute of Art e pela University of Manchester. Desde Carollina Lauriano tem extensão em Pesquisa em Arte, De-
2008, trabalha de forma independente e colaborativa com sign e Moda pela Central Saint Martins/ual, atuando como
artistas, instituições, galerias, colecionadores, casas de leilão, curadora independente desde 2017. Entre 2018 e 2020 atuou
feiras de arte e outros profissionais. Escreveu textos críticos como curadora e gestora do Ateliê397, um dos principais es-
sobre diversos artistas brasileiros, incluindo os ensaios para paços independentes de arte de São Paulo. Em suas pesquisas,
o catálogo da exposição “7SP-Seven Artists from Sao Paulo” interessa discutir a inserção, desafios e conquistas de jovens
(2012) no CAB Art Center, em Bruxelas, Bélgica; trabalhou mulheres artistas no mercado da arte. Dentre os principais
em Nova York e Londres na produção da feira de arte lati- projetos recentes realizados estão as exposições “Corpo além
no-americana Pinta (2011-2012); Com passagem por diversas do corpo” (2020), na Ponder70, em São Paulo, Brasil; e “A noi-
galerias, como Sprovieri, Casa Triângulo e Gomide & Co, atu- te não adormecerá jamais nos olhos nossos” (2019), na Galeria
almente faz consultoria privada e desenvolve exposições auto- Baró, em São Paulo, Brasil. Atualmente, colabora, como cura-
rais, dentre as quais destacam-se: “Marcone Moreira: Conjun- dora adjunta, na 13ª. edição da Bienal do Mercosul (2022), e
ção” (2020), na Gomide & Co., em São Paulo, Brasil; “Corpo coordena a residência artística da Usina Luis Maluf.
poético/ político” (2020), na Portas Vilaseca Galeria, no Rio
de Janeiro, Brasil; “Ficaremos bem (?)” (2019), na Galeria
Marilia Razuk, em São Paulo, Brasil; e “Saideira” (2015), na
Casa Triângulo, em São Paulo, Brasil.

117
Moisés Patrício Mag Magrela
Moisés Patrício é artista visual. Trabalha com fotografia, vídeo, Desde 2007, as ruas servem de suporte para os trabalhos de
performance, rituais e instalações em obras que tratam de ele- Mag Magrela, que podem ser encontrados nas ruas de São
mentos da cultura latina, afro-brasileira e africana. Desde 2006, Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Salvador, Natal, Lisboa,
realiza ações coletivas em espaços culturais em São Paulo. For- Londres e Nova York. Mag se inspira na euforia urbana de São
mado pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de Paulo para transitar por temas que falam sobre culturas bra-
São Paulo (USP), compõe obras que tratam de elementos sa- sileiras, como a fé, o profano, o ancestral, a batalha do dia-dia,
grados da cultura ameríndia e afro-brasileira. Uma caracterís- a resistência, a busca pelo ganha-pão e o feminino. Realizou
tica significativa de seu trabalho é a alusão ao candomblé, para algumas exposições individuais. A exposição “Não trago seu
quem o sagrado passa pelo corpo e seu potencial manual. Apre- amor de volta” (2016), na Galeria KingCap, em São Paulo, Bra-
sentou trabalhos em diversas exposições, entre elas a individual sil; e “Pindorama in Flames” (2016), na Galeria NYC, em Nova
“Exuberância” (2020), na Galeria Estação, em São Paulo, Brasil; York, Estados Unidos. Em 2018, pintou sua primeira empena
além das coletivas “Against, Again: Art Under Attack In Brazil” (2019), na Anya and Andrew de edifício,”Fortaleza Cansada” de 36 metros de altura por 12
Shiva Gallery, em Nova York, Estados Unidos; “Histórias Afro-Atlânticas” (2018), no Museu metros de comprimento, durante o Festival Concreto em For-
de Arte de São Paulo (MASP) e no Instituto Tomie Ohtake (ITO), em São Paulo, Brasil; “Ago- taleza. Em 2020, pintou três empenas de São Paulo, em dife-
ra somos todxs negrxs?” (2017), na Associação Cultural Videobrasil, em São Paulo, Brasil; e rentes pontos da cidade.
“A Nova Mão Afro-Brasileira” (2013), no Museu Afro Brasil, em São Paulo, Brasil. Seus traba-
lhos integram as coleções da Pinacoteca do Estado de São Paulo, São Paulo, Brasil; do Museu
Afro Brasil, São Paulo, Brasil; e do Museu da Abolição, Recife, Brasil.

Guillherme Teixeiro Gabriela Longman


Guilherme Teixeira é escritor, curador e editor. Sua pesquisa Gabriela Longman é jornalista, mestre em Arte e Linguagem
fala sobre enunciações e outros nomes que as coisas deman- pela École des hautes études en science sociales (EHESS) de
dam hoje. Trabalhou em instituições como o Centro Cultural Paris e doutoranda em Teoria Literária pela Universidade de
São Paulo (CCSP), o SESC_Videobrasil e o Pro Helvetia, além São Paulo (USP). Especializada em cultura, cidades e tecnolo-
de galerias e escritórios de consultoria. Entre suas curadorias gia, é colaboradora em diversos periódicos, entre eles a Folha
destacam-se “Notas sobre alguma disfuncionalidade” (2021), de S.Paulo, o Valor Econômico, e a Vogue. Desenvolve conte-
na plataforma digital Homeostasis.Lab; “PAREDÃO” (2018), údo para instituições como o Sesc, a Feira Literária de Paraty
no Centro Cultural São Paulo (CCSP), em São Paulo, Brasil; (Flip) e a Fundação Bienal de São Paulo. É sócia do Cit.Lit
“Ruído e ausência contínuos” (2018) e “A imensa preguiça” project., start-up que costura cidades e literatura.
(2018), ambas na Galeria Sancovsky, em São Paulo, Brasil;
“Ontem foi um dia longo” (2017), no Museu de Arte de Ribei-
rão Preto (MARP), em Ribeirão Preto, Brasil; entre outras.
Editor do periódico O TURVO, Teixeira já produziu e publi-
cou textos críticos para diversos artistas.

119
Enivo Ana Júlia Vilela
A primeira experiência de Enivo com a arte se deu em 1998, Graduada em Artes Visuais pela Universidade Federal de Pe-
através do Graffiti, quando o artista tinha 12 anos de idade. lotas (UFPel), Ana Júlia Vilela atualmente reside e trabalha
Desde então, marca as ruas da cidade com a materialização de em São Paulo. Sua pintura, direta ou indiretamente, se refere
idéias, expressão de sentimentos e questionamentos, através à miscelânea de citações, trechos e colagens que nos rondam.
da imagem. Enivo, entende que a técnica, conceito e expressão Apesar de muito inclinado ao discurso, o corpo de trabalho
transitam de forma cíclica. Cada nova série criada é resultado que Vilela tem constituído ainda é majoritariamente abstrato.
do que já foi feito e ao mesmo tempo um passo para novas pes- Utilizando-se muitas vezes de uma paleta rebaixada, a artista
quisas, ramificações de idéias que apresentam a continuidade, se mostra interessada em experimentar contrastes cromáticos
novas possibilidades de criação. Além da arte livre-expressiva e novos formatos e superfícies. Desde muito jovem, expõe re-
nas ruas e no ateliê, já ilustrou campanhas publicitárias para gularmente em salões e coletivas em diversas cidades do país:
múltiplas marcas e realizou projetos comissionados para clien- foi premiada no 43º Salão de Arte de Ribeirão Preto (2018) e
tes privados e empresas. Graduado em Artes Plásticas pela Fa- recebeu Menção Honrosa na Bienal das Artes Sesc-DF (Brasí-
culdade Paulista de Artes, é também arte-educador, na partilha lia, 2018), entre outros. Suas individuais incluem: O romance
de conhecimentos e vivências com jovens focados em pesquisar morreu (Porto Alegre, 2021), Todas as festas de amanhã (São
e produzir arte. Sócio fundador da A7MA Galeria, atua como Paulo, 2021), A morte de uma festa, MARP (Ribeirão Preto,
curador e organizador de exposições em sua galeria represen- 2019), e O som dos olhos, Museu Municipal Casa da Memória
tando artistas dentro e fora do Brasil. (Cajamar, 2012).

Gabriela Longman Thierry Freitas


Gabriela Longman é jornalista, mestre em Arte e Linguagem Thierry Freitas é historiador da arte pela Universidade Fede-
pela École des hautes études en science sociales (EHESS) de ral de São Paulo (Unifesp), curador independente e assistente
Paris e doutoranda em Teoria Literária pela Universidade de curatorial da Pinacoteca do Estado de São Paulo. Sua pesquisa
São Paulo (USP). Especializada em cultura, cidades e tecnolo- se debruça sobre as relações entre arte, gênero e sexualidade
gia, é colaboradora em diversos periódicos, entre eles a Folha na arte brasileira e na arte contemporânea. Curou as exposi-
de S.Paulo, o Valor Econômico, e a Vogue. Desenvolve conte- ções “John Graz: Idílio tropical e moderno” (2021), com Fer-
údo para instituições como o Sesc, a Feira Literária de Paraty nanda Pitta, na Pinacoteca do Estado de São Paulo, em São
(Flip) e a Fundação Bienal de São Paulo. É sócia do Cit.Lit Paulo, Brail; “Suave coisa nenhuma” ( 2019), na OMA Galeria,
project., start-up que costura cidades e literatura. em São Bernando do Campo; e “Hecatombe” (2018), na Gale-
ria Sancovsky, em São Paulo, Brasil; entre outras. Atuou como
assistente de curadoria em diversas mostras como “Hudnilson
Jr.: Explícito” (2020), na Pinacoteca do Estado de São Paulo,
em São Paulo, Brasil; “My Name Is Ivald Granato - Eu Sou”
(2019), no SESC São Paulo, em São Paulo, Brasil; e “No su-
búrbio da modernidade: Di Cavalcanti 120 anos” (2018), na
Pinacoteca do Estado de São Paulo, em São Paulo, Brasil.

1 21
Thiago Rocha Pitta Lidia Lisbôa
A prática diversificada de Thiago Rocha Pitta está conectada a Formada originalmente em gravura, escultura e pintura, Lidia
uma fascinação profunda com as sutis transformações do seu Lisbôa desenvolve sua prática na intersecção entre objeto de
entorno. Suas instalações, vídeos e pinturas têm capturado a vi- arte, performance e ritual a partir de técnicas que incluem,
bração de um planeta vivo por meio do treinamento do olhar do sobretudo, a costura e o crochê. Essas últimas se apresentam
observador acerca das lentas transformações materiais, das pro- como caminho primordial, em que cada passo dado na cons-
gressões físicas de minúsculas partículas de um território e das trução de uma poética aponta para um desdobramento na
alterações repentinas do tempo. Vencedor dos prêmios Marcan- forma de ação performativa. O uso do tecido e de materiais
tonio Vilaça (2005), Brasil, e Open Your Mind Award (2009), descartados constituem as estruturas fundamentais na sua lin-
Suíça. Apresenta trabalhos em mostras individuais, desde 2002, guagem, abordando presente e passado, através de temáticas
incluindo as exposições: “Noite de abertura” (2020), no Museu autobiográficas e ancestrais. Lisbôa foi contemplada com o
de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio), no Rio de Ja- 2o Prêmio Nacional de Expressões Culturais Afro Brasileiras
neiro, Brasil; “O primeiro verde” (2018), na Galeria Millan, em São Paulo, Brasil “L’Eremo e Il (2012) e com o Prêmio Maimeri 75 anos (1998). Dentre as principais exposições individu-
Campo Accampa” (2013), na Igreja Santa Maria Incoronata e na Gluck 50 Gallery, em Milão, ais, destacam-se: “Acordelados” (2022), na Galeria Milan, em São Paulo, Brasil; “Vestidos
Itália; “Nostalgia of Pangea” (2012), no Andersen’s Contemporary, em Copenhague, Dinamar- & Cupinzeiros” (2019), na Galeria Espaço Caixa Branca, em São Paulo, Brasil; “Performan-
ca; “Notas de um desabamento” (2010), na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio ce Corpos e Tramas” (2018), no SESC Pinheiros, em São Paulo, Brasil; “Casulos” (2015), no
de Janeiro, Brasil; “A Rocky Mist” (2009), no Meyer Riegger, em Karlsruhe, Alemanha; “The Instituto Pretos Novos (IPN), no Rio de Janeiro, Brasil; “Vila das Oyas” (2012), na Fibra
BAR vol. 2 – Donna Ong and Thiago Rocha Pitta” (2008), no Arts Initiative Tokyo, em Tóquio, Galeria, em São Paulo, Brasil; entre outras. Integrou mostras coletivas, como a 12a Bienal
Japão (2008); Também participou da 5ª e 9ª edições da Bienal do Mercosul, Porto Alegre, RS do Mercosul (2020), em Porto Alegre, Brasil; “Estratégias do Feminino” (2019), no Farol
(2005 e 2013). Suas obras integram diversas coleções públicas, tais como: Maison Européene Santander, em Porto Alegre, Brasil; e “Mapas Urbanos” (1998), na Fundação Bienal de São
de la Photographie, Paris, França; Hara Museum, Tóquio, Japão; Coleção Patricia Pelphs de Paulo e Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC USP), São
Cisneros, Nova York, Estados Unidos; Colección Jumex, Cidade do México, México; e Museu Paulo, Brasil; entre outras.
de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP), São Paulo, Brasil; entre outras.

Ulisses Carrilho Mirella Maria


Ulisses Carrilho é curador da Escola de Artes Visuais do Parque Mirella Maria é artista visual, pesquisadora e professora. Gradu-
Lage (EAV Parque Lage). Pós-graduado em Economia da Cul- ada em Artes Visuais e mestra em Arte Educação pela Univer-
tura pela Universidade Federal do Rio Grande Do Sul (UFR- sidade Estadual Paulista (Unesp). Atuou como arte educadora
GS), onde também estudou Letras – Português/Francês. Car- e formadora em espaços como o Museu Afro Brasil, o SESC, e o
rilho possui formação em Comunicação Social pela Pontifícia Instituto Adelina, todos em São Paulo; além da Sparks School,
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Iniciou na África do Sul. Como artista visual, participou da 12ª Bienal
sua trajetória como assistente de direção do Museu de Arte do do Mercosul (2020), em Porto Alegre, Brasil. Atualmente, é
Rio Grande do Sul (MARGS). Integrou a equipe de relaciona- professora de atendimento educacional especializado na Prefei-
mento institucional da Fundação Bienal do Mercosul, em Porto tura Municipal de São Paulo e consultora educacional. Sua pes-
Alegre, e da galeria Rolando Anselmi, na Alemanha. Sua pes- quisa é voltada para a produção artística contra-hegemônica,
quisa orienta-se para a cultura e as imagens. No âmbito das alinhando a epistemologias do sul global, questões étnico-ra-
artes, mira contranarrativas e críticas à lógica de produção do ciais e de gênero, além de estudos pós-coloniais.
capitalismo. Interessa-se por manifestações de insubordinação,
desobediência e indisciplina no campo da educação.

123
Paulo Nazareth João Trevisan
O trabalho de performance e instalação de Paulo Nazareth ex- João Trevisan é pintor, escultor e performer. Utilizando dos
plora com frequência suas raízes africanas e indígenas. O ar- elementos encontrados às margens de ferrovias, João os agru-
tista lida com vários assuntos que normalmente estão ligados pa e ordena de diferentes maneiras produzindo novos corpos.
à raça, ideologia e distribuição desigual do desenvolvimento. Seus trabalhos, sejam eles os criados pelo espaço entre chapas
Sua prática é ao mesmo tempo interdisciplinar e participativa. de ferro que se mantém em pé com o auxílio dos parafusos, ou
Nazareth busca personificar a ideia do artista como conector, suas pinturas de fundos pretos e linhas verticais de diversas
decodificador e filósofo. Suas exposições individuais incluem espessuras, e, até mesmo, as pequenas ripas de madeira com
“Melee” (2019), no Institut of Contemporary Art (ICA), em Mia- tinta a óleo discutem intervalos entre as formas e os vazios. En-
mi, Estados Unidos; “Faca cega” (2018), no Museu de Arte da tre as exposições individuais estão: “Corpo e Alma” (2021), no
Pampulha, em Belo Horizonte, Brasil; “Old Hope” (2017), na Museu de Arte Sacra, em São Paulo, Brasil; “Das noites uma
Galeria Mendes Wood DM, em São Paulo, Brasil; “Genocide in livre sensação” (2020), na Central Galeria, em São Paulo, Bra-
Americas” (2015), na Meyer Riegger Gallery, em Berlim, Ale- sil; “Da repetição ao silêncio”, na Galeria Foro.Space, em Bogotá, Colômbia; “Corpo-trajeto”
manha; “Journal” (2014), no Institute for Contemporary Arts, (2019), no Instituto Adelina, em São Paulo, Brasil; “Corpo, breve instante” (2019), na Gale-
em Londres, Reino Unido; “Premium Bananas” (2013), no Mu- ria Karla Osório, em Brasília, Brasil; “Descarrilho” (2018), no Decurators, em Brasília, Bra-
seu de Arte de São Paulo (MASP), em São Paulo, Brasil. Parti- sil. Seus trabalhos podem ser encontrados nas coleções do Museu de Arte do Rio (MAR),
cipou da 56ª e 55ª Bienal de Veneza (2015 e 2013), na Itália, e no Rio de Janeiro, Brasil; Museu Nacional da República (MUN), em Brasília, Brasil; Mu-
da 35ª Bienal de São Paulo (2021), no Brasil, além de inúmeras seu de Arte de Ribeirão Preto (MARP), em Ribeirão Preto, Brasil, entre outras.
exposições coletivas ao redor do mundo.

Janaina Barros André Vechi


Artista visual, pesquisadora e crítica de arte, Janaina Barros é André Vechi é escritor, pesquisador e propositor em artes visu-
professora adjunta na Escola de Belas Artes da Universidade ais. Doutorando em Literatura, Cultura e Contemporaneidade
Federal de Minas Gerais (UFMG). Possui Pós-doutorado pelo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PU-
Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da C-Rio), com estágio de doutorado sanduíche na University of
Escola de Ciência da Informação da Universidade Federal de Texas, em Austin, possui mestrado em Linguagens Visuais
Minas Gerais; Doutorado pelo Programa de Pós-Graduação pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de
Interunidades em Estética e História da Arte pela Universi- Janeiro (UFRJ), onde também atuou como professor substi-
dade de São Paulo (USP); e Mestrado em Artes pelo Instituto tuto no curso de Artes Visuais - Escultura, entre 2016 e 2018.
de Artes da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Possui Atua na produção e curadoria de exposições desde 2012. Atu-
publicações sobre epistemologias e metodologias em arte con- almente trabalha como pesquisador na Galeria Nara Roesler.
temporânea de autoria negra.

1 25
LUZ Contemporânea
LUZ Contemporânea é um programa de exposições de arte contemporânea
que se desdobra em eventos e ações públicas. Desenvolvido pelo curador
Simon Watson, o projeto, atualmente, encontra-se baseado no Museu de
Arte Sacra de São Paulo. Nesse espaço, LUZ Contemporânea apresenta
exposições temáticas de artistas convidados, de modo a estabelecer diálogos
conceituais e materiais com obras do acervo histórico da instituição. Embora
fortemente focada no cenário artístico brasileiro atual, LUZ Contemporânea
está comprometida com uma variedade de práticas, cultivando parcerias
com artistas performáticos e organizações que produzem eventos de arte.

Simon Watson
Nascido no Canadá e criado entre Inglaterra e Estados Unidos, Simon Wat-
son é curador independente e especialista em eventos culturais em Nova
York e São Paulo. Um veterano com trinta e cinco anos de experiencia na
cena cultural de três continentes, Watson concebeu e assinou a curadoria
de mais de 250 exposições de arte para galerias e museus, e coordenou pro-
gramas de consultoria em colecionismo de arte para inúmeros clientes in-
stitucionais e particulares. Nas últimas três décadas, Watson trabalhou com
artistas emergentes e os pouco reconhecidos, trazendo-os para a atenção de
novos públicos. Sua área de especialização curatorial é identificar artistas
visuais com potencial excepcional, muitos dos quais agora são reconhecidos
internacionalmente na categoria blue-chip e são representados por algumas
das galerias mais famosas e respeitadas do mundo.

Atualmente, Simon desenvolve o projeto Artist in Residence (AIR), possi-


bilitando o aprofundamento de jovens artistas em suas práticas, assim como
sua circulação pelo Brasil e exterior.

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CURADORIA PRODUÇÃO GRÁFICA

Simon Watson Camera Press

A RT I S TA S INTERNATIONAL LIAISON

Andrey Rossi Xavier Auza


Ana Julia Vilela
Desali DESIGN
Enivo Stephen Sunderland
João Trevisan
Leandro Junior CATÁL OGO
Lídia Lisboa
André Vechi
Mag Magrela
Stephen Sunderland
Moisés Patrício
Paulo Nazareth
AGRADECIMENTOS
Thiago Rocha Pitta
José Carlos Marçal de Barros,
Yasmin Guimarães
Diretor Executivo MAS
Beatriz Augusta Correa da Cruz, Museóloga MAS
TEXTOS
Silvia Balady, Assesoria de Imprensa MAS
André Vechi
A dedicada equipe do Museu de Arte Sacra de
Carollina Lauriano
São Paulo
Fernando Mota

E S P E R A N Ç A
Secretaria de Cultura e Economia Criativa do
Gabriela Longman
Estado de São Paulo
Guilherme Teixeira
Prefeitura da Cidade de São Paulo Governo do
Jackson Gleizer
Estado de São Paulo
Janaina Barros
Alvin Hall
Márcio Harum
Bboy Biel
Mirella Maria
Beth Rudin DeWoody
Pollyana Quintella
Bruno Baptistella
Thierry Freitas
Daniel Silva
Ulisses Carrilho
Fernando Mota
Gustavo Amorim
GALERIAS
Henrique Martins Modenesi
AM Galeria, Belo Horizonte e São Paulo Jarbas Velloso
Casa Triângulo, São Paulo Luciana Farah
Central Galeria, São Paulo Michel Farah
Galeria Athena, Rio de Janeiro Rafael Scur
Galeria Estação, São Paulo Ranier Coimbra
Galeria Simões de Assis, São Paulo Victor Gunsalus
Galeria Superfície, São Paulo Wilson Pinheiro Jabur
Mendes Wood DM, São Paulo FSNOW
OMA Galeria, São Paulo SECONDS”
SWA Artist In Residence
M O N TA G E M

Oficina de Artes

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