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CURSO INTENSIVO DE

OBRAS LITERÁRIAS PARA


UFRGS 2021

Aula 01: Poemas -


Florbela Espanca

PROFESSORA LUANA SIGNORELLI


Professora Luana Signorelli
Aula 01: Obras Literárias para UFRGS 2021

Sumário

Introdução ..................................................................................................................... 4
1 – Contextualização ...................................................................................................... 5
1.1 – Em Portugal.......................................................................................................................... 5
1.2 – No Brasil ............................................................................................................................... 6
1.3 – Na França ............................................................................................................................. 7
1.4 – O Simbolismo ....................................................................................................................... 8
2 – Florbela Espanca ....................................................................................................... 9
2.1 – Florbela Espanca na UFRGS e nos Vestibulares ................................................................... 11
3 – Pré-Leitura ..............................................................................................................13
3.1 – Figuras de Palavra .............................................................................................................. 15
3.2 – Figuras de Sintaxe .............................................................................................................. 16
3.3 – Figuras de Pensamento ...................................................................................................... 18
3.3 – Figuras de Som ................................................................................................................... 19
4 – Resumo Analítico dos Poemas..................................................................................20
4.1 – "Fanatismo" ....................................................................................................................... 21
4.2 – "Horas Rubras" ................................................................................................................... 25
4.3 – "Eu" - Livro de Mágoas ....................................................................................................... 28
4.3.1 – "Eu" - Charneca em Flor ............................................................................................... 32
4.4 – "Vaidade" ........................................................................................................................... 33
4.5 – "Lágrimas Ocultas" ............................................................................................................. 36
4.6 – "A Minha Dor" .................................................................................................................... 39
4.7 – "Suavidade"........................................................................................................................ 42
4.8 – "Se Tu Viesses Ver-Me"....................................................................................................... 44
4.9 – "Ser Poeta" ......................................................................................................................... 47
4.10 – "Fumo" ............................................................................................................................. 50
4.11 – "Frêmito do Meu Corpo"................................................................................................... 53
4.12 – "Realidade" ...................................................................................................................... 55
4.13 – "Súplica" ........................................................................................................................... 58
4.14 – "Doce Certeza" ................................................................................................................. 60
4.15 – "Quem Sabe?!..." .............................................................................................................. 62

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4.16 – "A Mulher I" ..................................................................................................................... 64


4.17 – "A Mulher II" .................................................................................................................... 66
4.18 – "Amiga"............................................................................................................................ 68
4.19 – "Ódio?"............................................................................................................................. 69
4.20 – "Amar!" ............................................................................................................................ 70
4.21 – "O Maior Bem" ................................................................................................................. 71
4.22 – "Neurastenia"................................................................................................................... 72
5 – Fortuna Crítica .........................................................................................................74
6 – Florbela Espanca e a Intertextualidade .....................................................................75
6.1 – Epígrafes ............................................................................................................................ 75
6.2 – Sugestões ........................................................................................................................... 77
7 – Questões sem Comentários .....................................................................................78
8 – Gabarito ..................................................................................................................88
9 – Questões com Comentários .....................................................................................88
10 – Referências Bibliográficas .................................................................................... 103
11 – Considerações Finais ............................................................................................ 105

Professora Luana Signorelli

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Signorelli

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Introdução
Olá, vestibulandos.
O meu nome é Luana. Sou Mestra em Literatura e
Práticas Sociais pela Universidade de Brasília (UnB) e
Doutoranda em Teoria e História Literária pela Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp). Tenho 10 anos de
experiência com revisão e padronização textual e 9 anos em
cursinho pré-vestibular, tendo passado por instituições
conhecidas e renomadas.
Vamos iniciar nossa programação de estudo de Obras
Literárias para UFRGS 2021. Lembrem-se sempre de nosso
lema:

“O segredo do sucesso é a constância no objetivo”.

O nosso plano de aulas será indicado logo abaixo.

AULA 1 – Análise de obra da leitura obrigatória: Poemas


Resumo, análise, crítica, exercícios.
– Florbela Espanca.

AULA 2 –Análise de obra da leitura obrigatória: Úrsula – Resumo, análise, crítica, exercícios.
Maria Firmina dos Reis.

Logo, segundo o nosso cronograma de aulas, o espaço da aula de hoje será dedicado para
estudar os Poemas Selecionados de Florbela Espanca. São 23 ao total. Eu irei organizar a aula da
seguinte maneira:
• Pré-aula: contextualização do período e do movimento literário do Simbolismo;
• Análise: Poemas (resumo e análise dos poemas selecioandos); análise de alguns outros
poemas importantes com temática condizente; fortuna crítica e intertextualidade.
• Pós-aula: quadro sinóptico, questões sem e com comentários.
O quadro sinóptico (sinopse: resumo) é um material de apoio que irá poder ajudá-los pouco
antes da prova, por se tratar de conteúdos grandes com muita informação.
A aula de Florbela Espanca é exigente, pois envolve vários temas. Nessa aula em particular,
gostaria de agradecer aos seguintes professores: Marco Túlio, Alessandra Lopes, Bruna Klassa e
Guilherme Alves e Priscila Lima. Obrigada pelas explicações, cada um da sua área, e por me ajudarem
a deixar o material mais interdisciplinar.
Então, vamos lá, não percamos tempo!

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1 – Contextualização
Para quem viveu a virada do século XX para o XXI sabe que geralmente nessas ocasiões da
humanidade predominam dois sentimentos contraditórios: ou um completo êxtase, uma alegria,
uma emoção por estar presenciando um fato histórico ou um medo diante do desconhecido. Era
mais ou menos assim que também se sentiam as pessoas na virada do século XIX para o XX.
Nesse período, houve uma determinada forma de expressão no plano artístico. Em termos
de estilo, segue a tradição do le fin de siècle (o fim de século) e da la décadence (a decadência),
movimentos originalmente franceses que pretendiam representar a onda de pessimismo, declínio e
a atmosfera sufocante dessa época. Romances que são exemplos disso são Madame Bovary (1856)
do francês Gustave Flaubert e Anna Kariênina (1877) do russo Tolstói, obras que anteviram e
anteciparam essa temática. E ainda Os Buddenbrooks (1901), do alemão Thomas Mann, traz temas
semelhantes acerca da falência de uma família. Logo, a tendência se propagou e esses movimentos
não se restringiram localmente, mas sim se generalizaram. Eles foram se alastrando até chegar em
Portugal, e foi nesse contexto que se insere a poetisa Florbela Espanca.
Entre os artistas dessa geração, prevaleciam os seguintes aspectos:
➢ Pessimismo diante de tantas teorias científicas do século XIX que tanto prometiam, mas que
só acabaram acentuando problemas, como a desigualdade, por exemplo;
➢ O movimento literário do Simbolismo surgiu como uma reação ao materialismo e à
racionalidade do século XIX;
➢ Havia uma parte dos jovens que adotou uma postura revolucionária e rebelde. Reivindicavam
basicamente a queda de regimes monárquicos e proclamavam o republicanismo;
➢ Porém, muitos sofriam de desânimo e tédio para com a vida burguesa. Muitos desses artistas
procuravam negar a própria classe e até a vida, com isso procurando saídas como fuga da
realidade; uso (mais ou menos) exagerado de drogas e apelavam até mesmo para o suicídio.

1.1 – Em Portugal

Camilo Pessanha (1867-1926), poeta português, é o escritor simbolista de maior


reconhecimento em Portugal. Seu livro mais conhecido, Clepsidra (1920),
apresenta traços típicos do movimento, como o pessimismo e o
antimaterialismo. Morreu em virtude de uma overdose de ópio.

Eugênio de Castro em 1869 e faleceu em 1944. Sua produção consta de 2 fases:


uma simbolista e outra chamada de neoclassicista. Sua poesia no geral é
marcada por: rimas e métricas inovadoras, uso de figuras de linguagens como
aliteração e os temas são paixão, pessimismo e necrofilia. Obras principais:
Oaristos (1890); Horas (1891); Interlúnio (1894); Salomé e Outros Poemas
(1896); Saudades do Céu (1899). Versos dele são epígrafe do Livro de Mágoas.

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Fatos históricos importantes

Regicídio Revolução Russa Guerras Coloniais


O assassinato do Rei D. As Forças Armadas Portuguesas
Iniciada por uma revolta em 1905,
Carlos I e do seu filho enfrentavam suas colônias
foi uma série de manobras políticas
herdeiro, príncipe D. Luis africanas que queriam
que culminaram na queda do
Felipe de Bragança, marcou independência: Angola; Guiné-
governo autocrático e no Governo
o fim da tentativa de Bissau e Moçambique.
Provisório Duma.
Reforma Monarquista.

Infográfico:
1908 1910 1917 1930 1961 1974

Showeet.
Revolução
Proclamação da República Ditadura Militar
dos cravos
Em 5 de outubro de 1910, a República é Golpe nacionalista e antiparlamentar Em 25 de abril de
implementada. Foi organizada pelo contra a Primeira República. O 1o 1974, o regime
Partido Republicano Português. Depôs presidente foi General Carmona. salazarista é deposto.
a Monarquia Constitucional.

1.2 – No Brasil
Cruz e Sousa (1861-1898) foi o poeta simbolista brasileiro mais
conhecido, tendo se tornado popular no mundo todo. É considerado
um dos primeiros escritores negros brasileiros, tendo sido chamado
de Cisne Negro. Ele era filho de escravos forros.
Ao longo da vida, ele combateu o preconceito racial e militou pelo
fim da escravidão. Assim, a condição do negro na época era um de seus
temas de interesse na literatura. Ele também produz muitas obras
retratando sofrimento e dor, com uma fixação na ideia de morte.
Obras principais: Broquéis (1893) e Missal (1893).

Alphonsus de Guimaraens (1870-1921) é o pseudônimo do


escritor Afonso Henrique da Costa Guimarães. Ele adaptou seu nome
para aproximá-lo da língua latina.
Sua obra é em sua grande maioria poética e muito ligada ao
misticismo e à religiosidade, principalmente católica. As principais
características de sua poesia são: descrição de ambientes, tanto
paisagens quanto construções; melancolia e sofrimento; misticismo e
religiosidade.
Obras principais: Septanário das dores de Nossa Senhora (1899),
Câmara Ardente (1899) e Dona Mystica (1899).

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1.3 – Na França
Charles Baudelaire (1821-1867) foi um célebre poeta francês.
Morreu aos 46 anos de idade. Teve uma vida desregrada desde
criança. Foi expulso do colégio, fez uma expedição à Índia, retorna
à França onde vive em completa boemia com o colega Jeanne
Duval. Principais obras: Flores do mal (1857); Paraísos artificiais
(1860) e O Spleen de Paris: pequenos poemas em prosa (1869). O
spleen definia o estado de melancolia. Era reconhecido como um
dândi pelo seu requinte.

Stéphane Mallarmé (1842-1898) foi de uma geração em que os poetas


publicavam muito em revistas. Um lance de dados, uma reflexão sobre o
acaso, por exemplo, surgiu primeiramente na revista Cosmopolis em 1897.
Outra obra conhecida dele foi Tarde de um fauno (1876), que foi musicado
por Claude Debussy. Seus temas eram obscuros, existencialistas e filosóficos.
A obra Igitur (1925) já é tardia e traz no título um conectivo em latim.
Consiste em prosa poética.

Guillaume Apollinaire (1880-1918) é considerado o pai do movimento


literário do Concretismo. Foi influenciado pela vanguarda do cubismo; Pablo
Picasso foi seu colaborador direto. Sua obra-prima é Caligramas, publicados
em 1918 após a Primeira Guerra Mundial, idealizado para ser justamente
uma mistura de caligrafia e ideograma.

Paul Verlaine (1844-1896) foi um poeta do


simbolismo francês. Envolveu-se com outro poeta de sua geração, Arthur
Rimbaud. Versos dele servem como epígrafe para o Livro de Mágoas de
Florbela Espanca: “Isolados de amor assim que se bebe o negro/Nossos
dois corações exalam sua ternura pacífica/Serão dois rouxinóis queu
cantão ao pôr do sol” (livre tradução). Principais obras: Poemas
Saturnianos (1866) e Os poetas malditos (1884). Alguns deles são
encontrados na versão brasileira: A voz dos botequins e outros poemas (2009).

Arthur Rimbaud (1854-1891) estudou latim. Começou a traduzir os clássicos,


mas depois tomou uma posição contra os parnasianos. Viveu em época
turbulenta, como a Comuna de Paris (1871). Suas principais obras são e
Temporada no inferno (1873) e Vogais (1883). Em português, há uma obra
chamada Rimbaud livre, que é tradução dos Irmãos Campos: “A negro, E
branco, I rubro, U verde, O azul, vogais” (RIMBAUD, 2013, p. 37).

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1.4 – O Simbolismo

Na mesma época em que o Realismo, o Naturalismo e o Parnasianismo, surge mais um


movimento literário: o Simbolismo.
Ao longo do tempo, o homem vive sob a ideia de que o progresso científico e tecnológico
sempre levaria à evolução, ou seja, seríamos melhores na medida em que tivéssemos uma sociedade
mais tecnológica. De fato, a tecnologia foi capaz de melhorar nossa vida e facilitar nossas ações
cotidianas. A tecnologia, porém, não foi capaz de solucionar alguns problemas essenciais aos seres
humanos: a igualdade não foi alcançada, não fomos capazes de eliminar a pobreza e ainda passamos
por momentos de guerra e conflito intenso. Muitas vezes, inclusive, a tecnologia parece estar no
centro de diversos desses problemas. É dessa frustração com a racionalidade e o pensamento
científico que surge o Simbolismo.
As principais características do Simbolismo na literatura são:
Espiritualidade e misticismo
• A religiosidade é um tema frequente para os autores simbolistas.
• Outros temas espirituais e metafísicos, como a morte, por exemplo.

Intuição e aproximação do sensorial


• Uso da figura de linguagem da sinestesia (mistura de sensações) e da metáfora.
• O tema da sexualidade aparece com frequência.

Linguagem vaga e musicalidade


• A linguagem trabalha com a sugestão e os símbolos, muito mais do que com a
objetividade.
• Uso de figuras de linguagem como a aliteração e a assonância

Não-racionalidade
• Numa espécie de resgate dos valores românticos caídos em desuso, os simbolistas buscam
se afastar da abordagem racional da realidade e buscam observá-la de maneira mais
sensível.
• Antimaterialismo.

Pessimismo
• Os poetas simbolistas não se sentem confortáveis num mundo que valoriza a
racionalidade. Assim, eles têm uma visão soturna do cotidiano.

Subjetividade
• Interesse pelas noções de inconsciente e pela investigação da mente humana,
tangenciando assuntos como a loucura e o subconsciente.
• O tema do sonho é muito frequente no simbolismo, normalmente referido pela palavra
onírico.

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2 – Florbela Espanca

Em meio a tantos artistas homens, produzindo em um


cenário masculino, Florbela Espanca surge como uma
importante voz feminina do seu período.
Em alguns de seus poemas, Florbela Espanca pinta um
autorretrato de si, especialmente em Charneca em flor (1931).
Chega a fazer até algumas descrições físicas, como em
“Realidade”: “Eu tenho os olhos garços, sou morena”. Porém,
são interessantes aqueles poemas em que a artista revela mais
de si do que pensa, pois daí assim está revelando a sua alma.
São os casos de “Conto de fadas”: “– Eu sou Aquela de quem
tem saudade” e em “Versos de orgulho”: “Porque eu sou Eu e
porque Eu sou alguém”. Foi uma mulher empenhada com sua
arte e, infelizmente, até hoje, incompreendida.
Florbela Espanca (1894-1930) foi uma poetisa portuguesa que produziu uma obra marcada
pelo sofrimento, feminilidade e erotismo. Seus livros mais conhecidos são o Livro de Mágoas (1919)
e o Livro de Sóror Saudade (1923). Ela morreu por uma overdose de barbitúricos aos 36 anos.

Dúvidas de Química?
O professor Guilherme Alves responde
Barbitúricos é um grupo de moléculas, compostos, que são
usados como sedativos e hipnóticos. O Veronal foi o
primeiro barbitúrico comercial, utilizado como remédio
receitável. Para Florbela Espanca ter se suicidado por essa
via, ela fez uso indiscriminado desse remédio, que é da
classe dos barbitúricos.

Ela nasceu em 08 de dezembro de 1894 em Vila Viçosa e faleceu em 07 de dezembro de 1930


em Matosinhos. Outras cidades provincianas por onde passa e que são descritas em seus poemas
são Évora e Alentejo. Nasce numa condição de bastarda, pois o pai só iria reconhecê-la como filha
posteriormente. Na verdade, bem depois de sua morte, em 1949. Talvez daí o ressentimento em sua
obra, que também foi sombria, porque foi feita nas sombras. Foi contemporânea de Fernando
Pessoa, embora os poetas do Orfismo, a primeira geração modernista portuguesa, não tenham feito
menção a ela. Consta apenas que Fernando Pessoa fizera uma homenagem a ela, um poema de 6
estrofes intitulado “À memória de Florbela Espanca”. Por isso, pode ser considerado que, enquanto
poetisa, Florbela Espanca foi marginal.
Há ambiguidade já desde o seu nome, que não é um pseudônimo. O primeiro nome lembra
algo dócil, delicado, ao passo que o segundo se remete à violência. Porém, era mesmo o sobrenome
de seus pais. Essa seria uma das suas principais características inclusive temáticas ao longo de sua
produção poética.

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Ela era afastada das grandes capitais e não participou do movimento modernista. A
pesquisadora Renata Junqueira destaca que talvez o maior experimentalismo de Florbela Espanca
tenha sido a criação de uma teatralidade, uma criação de uma persona fictícia que predomina em
seus poemas e que acaba por lhe conferir uma aura mítica.
Algo importante de destacar na biografia de Florbela Espanca são suas escolhas literárias. Ela
escreveu predominantemente sonetos, porém, escreveu também outros gêneros como quadras,
quintilhas e também cartas. A opção pelos sonetos tornaram possível uma aproximação com o
movimento literário do Parnasianismo, afinal, contemporâneo a ela. Porém, iremos estudar melhor
na análise que Florbela Espanca na verdade encarna uma mistura de tendências. Por exemplo, as
quadras e quintilhas a aproximam de um gosto popular comum na Idade Média, sobretudo nas
cantigas de amor do Trovadorismo. Então, vemos uma poetisa que ao mesmo tempo consegue
sintetizar o popular e o erudito.
Florbela Espanca se suicida na noite de 7 de dezembro de 1930
com uma overdose do calmante Veronal. Lembrando que vários

Fonte: Shutterstock.
poetas malditos tiveram vida curta. Para tal, não custa nada lembrar a
campanha Setembro Amarelo: mês de prevenção ao suicídio e
também que existe um apoio no número 188 – Centro de Valorização
da Vida.
Florbela Espanca integra o cânone literário português e foi
reconhecida postumamente. Alguns artistas prestaram homenagem a
ela inclusive literariamente. Para ficar em apenas alguns exemplos:
➢ Agustina Bessa-Luís – A vida e a obra de Florbela Espanca. Biografia/ficção (1979).
➢ Adília Lopes – Florbela Espanca espanca. Poemas (1999).
Abaixo encontramos o resumo de suas principais obras.

Livro de Sóror Saudade Reliquiae


O Livro D’Ele Consiste em 37 sonetos. A poetisa
São versos póstumos
publicados pela primeira
Foi um entre vários projetos, cria para si uma imagem que ao
vez na 2ª edição de
como Alma de Portugal, mesmo tempo remete ao sagrado
Charneca em Flor.
Primeiros Passos, Minha Terra, e ao profano. A mulher rebaixa-se
Continua esse projeto,
Meu Amor e Primeiros Versos. e se autossacrifica por um amor.
com a ampliação de 5
Trata-se da poesia juvenil de Uma espécie de monja
sonetos àqueles 28 e
Florbela Espanca, enclausurada.
totalizando 33.

1915-1917 1919 1923 1931


1915-1917 1931
Trocando Olhares Livro de Mágoas Charneca em Flor
Hoje conhecemos como livro, São 33 sonetos. O título em si
mas a autora o deixou apenas promete muita melancolia e Editado postumamente, em 1931.
como projeto literário ou como pessimismo. Aqui ela adota a Inclusive, um amigo e admirador de
livro virtualmente contido em um máscara da princesa encantada Florbela, o professor italiano Guido
caderno manuscrito, datando de que sofre pela espera pelo Battelli, acrescentou à segunda
10 de maio de 1915 a 30 de abril santo redentor. edição 28 sonetos inétidos.
de 1917. Contém quadras,
quintilhas e alguns sonetos. Infográfico: Showeet.

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2.1 – Florbela Espanca na UFRGS e nos Vestibulares

Eis na tabela abaixo como a poetisa Florbela Espanca caiu nos vestibulares.

INSTITUIÇÃO ANO OBRA/TEMA


UFRGS 2019 Sonetos: “Fanatismo” versus “Imagem” de Cecília
Meireles (literatura comparada); “Fumo”;
“Neurastenia”; “Ser Poeta” → 4 poemas dos 22
cobrados e 1 extra.
PUC-MG 2015 e 2014 Soneto “Fanatismo”e literatura comparada: Ana
Hatherly com “A máscara da palavra” e Fernando
Pessoa “Autopsicografia”.
UNIVAG-MT 2014 Soneto “Fanatismo”.
ESPM-RS 2012 Caiu um verso da Florbela Espanca em uma das
alternativas, mas a pergunta era de Gramática.
UNIFESP 2009 Soneto “Esquecimento”. Cobrança sobre figura de
linguagem.
UESPI 2008 Caiu em uma das alternativas e a questão era sobre
Modernismo Português.
Mackenzie 1998 Literatura comparada. Comparação de 3 poemas:
trecho de “Lua adversa” da modernista Cecília
Meireles; trecho do soneto “Eu” de Florbela Espanca e
“Quadrilha” do modernista Carlos Drummond de
Andrade.

Vimos acima o histórico de cobrança da poetisa. Essas questões estarão no nosso material,
com exceção da questão sobre gramática. Além do mais, vamos ajudá-lo ao máximo em nossas
análises, inclusive, com questões autorais. Abaixo vocês encontram se separam os 22 poemas
cobrados pela UFRGS 2021. Eram exatamente os mesmos cobrados para o vestibular UFRGS 2020.

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Proporção entre poemas/livros

Trocando Olhares O Livro D'Ele Livro de Mágoas


Livro de Sóror Saudade Charneca em Flor Reliquiae

Fonte: elaboração da própria autora (2020).

Trocando Olhares
• 3 poemas: "A Mulher I"; "A Mulher II" e "Súplica" (embora ela tenha 3 poemas com esse título;
estando 2 deles em Trocando Olhares e 1 em O Livro D'Ele. Porém, a UFRGS especificou.
O Livro D'Ele
• 2 poemas: "Doce Certeza" e"Quem Sabe!?...", embora haja um poema chamado "Quem Sabe?..."
apenas com a interrogação em Charneca em Flor.
Livro de Mágoas
• 6 poemas: "Vaidade"; "Lágrimas Ocultas"; "A Minha Dor"; "Amiga"; "Neurastenia" e "Eu",
embora tenha outro poema diferente, mas com mesmo nome em Charneca em Flor.
Livro de Sóror Saudade
• 5 poemas: "Fanatismo"; "Horas Rubras"; "Suavidade"; "Fumo" e "Ódio", embora o poema que
esteja lá tenha interrogação, ao passo que a UFRGS não especificou essa pontuação.
Charneca em Flor
• 5 poemas: "Se Tu Viesses Ver-me"; "Ser Poeta"; "Frêmito do meu corpo (III numa série de X)";
"Realidade"; "Amar!". Embora haja um poema chamado "Eu" e outro "Quem Sabe?..." nesse
mesmo livro.
Reliquiae
• 1 poema: "O Maior Bem".

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3 – Pré-leitura

Eis abaixo elencados alguns tópicos essenciais que nos ajudarão a conduzir a
análise dos poemas. Vamos prestar bastante atenção, pois esses tópicos serão
desenvolvidos no momento específico da análise.

• AMBIGUIDADE. Muito do que diz Florbela Espanca passa pelo efeito de texto da
ambiguidade, a começar já desde os títulos dos poemas. A ambiguidade ocorre quando um
mesmo vocábulo ou expressão pode ser interpretado de mais de uma maneira. Ela pode
aparecer de duas maneiras: como recurso expressivo, principalmente no caso da publicidade
ou dos textos humorísticos; ou como um defeito na construção, prejudicando a clareza da
mensagem. Ou seja, ela pode ser intencional ou não. Por exemplo: brincadeiras com classes
morfológicas, como a preposição “a”, que não sabemos se indica direcionamento/dedicatória
ou um adjunto adverbial de lugar, como no soneto “Ao vento” do Livro de Mágoas.

• MISTURA DE ESTILOS. Como já vimos nas seções anteriores, Florbela Espanca varia estilos
que vão do popular ao erudito, mas também uma série de escolas literárias, passando pelo
Trovadorismo, Ultrarromantismo, Realismo, Simbolismo e Modernismo. Não só em relação
aos movimentos literários em si, mas, aprimorando um conceito importante do século XIX
que se chama Gesamtkunstwerk (obra de arte total), cunhado pelo compostir alemão Richard
Wagner, a poesia simbolista tentava incorporar a si elementos de outras artes, como é o caso
da música e da pintura. Como a expressão: ut pictura poiesis (pintura e poesia). Por isso,
vocês encontrarão frequentemente na poesia de Florbela a representação de cores, de
sensações (e órgãos de sentidos: visão, tato, paladar, audição e olfato) e figuras de linguagens
sonoras, como aliterações e assonâncias, o que estudaremos abaixo. Um exemplo é o uso
frequente de adjetivos, que costumam indicar o estado de espírito do eu lírico, como em
“Horas rubras” do Livro de Sóror Saudade.

• SUBENTENDIDOS. Em se tratando de poesia, às vezes é muito mais importante do que ela diz
é o que ela NÃO DIZ. Portanto, precisamos nos atentar para as insinuações para além da
palavra escrita, aprendendo a lidar com mecanismos de interpretação de texto que envolvem
inferências, a fim de identificarmos o que está nas entrelinhas. Faz parte do estilo refinado
de Florbela Espanca, da construção de sutiliezas e de seu jogo entre essência e aparência.

• LEITMOTIVE. Mais abaixo está um quadro do conceito de Leitmotiv (plural: Leitmotive),


utilizado primeiramente na música e depois incorporado à literatura. Encontramos também
um quadro concatenando o que a pesquisadora Renata Junqueira classifica como sendo 4
máscaras principais que o eu lírico de Florbela Espanca assume ao longo de sua poesia.
Lembrando que o eu lírico a voz do ser abstrato que fala no poema. Ele pode ser uma invenção
do poeta ou pode coincidir com o poeta, mas nem sempre. Também é chamado de eu-lírico
(com hífen), eu poético ou poemático. A UFRGS 2019 também chama essa categoria de
sujeito lírico. Para além dessas máscaras, outros assuntos de extrema relevância para a

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poesia de Florbela Espanca são: o luar; o desmaio; o silêncio; o outono, às vezes, a


primaveria; o verbo pisar; o sentido (significado/sensação); o período do dia da noitinha; a
procura; a asa (simboliza liberdade); a(o) irmã(o); a relação entre sagrado e profano.

Máscaras de Florbela Espanca


Fonte: JUNQUEIRA, 2015, p. 9-10 (adaptado).

Princesa Monja
Feiticeira amorosa Velha solitária
encantada enclausurada
• Características: • Características: • Características: • Características:
espera pelo afastada do busca num projeta na Morte
príncipe mundo exterior e parceiro ideal a idealizada e
redentor mergulhada na imagem personificada os
• Obras imaginação • Obras sonhos que, na
• Livro de Mágoas onírica • Charneca em Flor vida, não
• Obras consegue
• Trocando Olhares • Trocando Olhares
• Livro de Sóror realizar
• O Livro D'Ele
Saudade • Obras
• Trocando Olhares • Reliquiae
• O Livro D'Ele • Trocando Olhares

Richard Wagner LEITMOTIV


Fonte: Pixabay.

Utilizado inicialmente na linguagem musical,


sobretudo em relação às óperas de Wagner, o
vocábulo designava uma técnica mediante a qual se
associavam, ao longo da composição, uma melodia ou
harmonia e uma pessoa ou ideia.
Transferida para os domínios literários, dentro
e fora dos círculos germânicos, a palavra nem sempre
tem sido empregada univocamente, mercê de sua
vizinhança e confusão com “motivo”, “tema”, “tópos”.

No geral, assinala “os motivos centrais que se repetem numa obra, ou na totalidade da
obra, de um poeta ou prosador” (KAYSER, 1958).
Verdadeiramente, porém, a recorrência de um objeto no decurso de uma obra não
constitui, por si só, um Leitmotiv; para sê-lo, é preciso que o seu reaparecimento envolva
alguma significação especial.

Fonte: MOISÉS, 2013, p. 267-268.

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• FIGURAS DE LINGUAGEM. Figuras de linguagem é um tema muito importante no vestibular.


Elas são essenciais em todas as áreas do português. As figuras de linguagem são recursos
expressivos para garantir maior expressividade ao texto. Como na análise de hoje estamos
lidando com textos que constituem em poesia, nesse gênero textual vocês encontrarão
bastante a utilização desse recurso, uma vez que há linguagem altamente metafórica.. Por
isso, levantei uma relação do que é mais interessante prestarmos atenção em relação à poesia
de Florbela Espanca. Dica: se você se sentir familizarizado com esse tema, sinta-se à vontade
para pular essa seção. Em todo caso, ela sempre servirá como ponto de apoio para você. As
figuras de lingaugem podem aparecer em nesses grandes grupos:

Figuras de Figuras de Figuras de Figuras de


Palavra Sintaxe Pensamento Som
• São os recursos • São os recursos • São os recursos • São os recursos
associados ao associados à associados à associados aos
significado das organização e combinação de sons das
palavras. estrutura ideias e palavras.
gramatical das pensamentos, ou
frases. seja, à
interpretação
das frases.

3.1 – Figuras de Palavra

Comparação
Quando se estabelece confronto entre dois termos a partir do que eles têm de semelhante.
Ex.: Seus olhos são como o céu.

Os olhos e o céu têm uma relação de semelhança: a cor. Ao invés de


escrever “os olhos são azuis”, parte-se desse ponto comum entre eles (a cor)
para garantir maior expressividade.

Outros exemplos: Ele é teimoso que nem uma mula.


“Meu coração tombou na vida / tal qual uma estrela ferida” (Cecília Meireles)

ATENÇÃO: Essa figura de linguagem vem sempre acompanhada de um conectivo: como, assim
como, tal qual, que nem.

Metáfora
É uma comparação subentendida: emprega-se um termo com significado de outro a partir da
semelhança entre ambos.

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Ex.: A notícia foi um balde de água fria.

“Água fria” é algo que assusta, que pode apagar o fogo, que pode acordar
alguém dormindo, entre outras possibilidades. Aqui, a expressão é empregada
simbolicamente para significar algo que causou desânimo: a notícia desanimou as
pessoas, “apagou o fogo”.

Outros exemplos: A história era apenas a ponta do iceberg.


“Amor é fogo que arde sem se ver” (Luís de Camões)

Comparação: Metáfora:
Sua boca é como um túmulo. Sua boca é um túmulo.

Sinestesia
Se caracteriza pela mistura de sensações (audição, olfato, paladar, tato, visão).
Ex.: Sentiu o cheiro doce da liberdade.

“cheiro” é da propriedade do olfato; “doce” é da propriedade do paladar. Aqui,


misturam-se propriedades de sentidos diferentes de forma a expressar
simbolicamente uma sensação.

Outros exemplos: Eles tiveram uma discussão amarga.


“É uma sombra verde, macia e vã.” (Carlos Drummond de Andrade)

3.2 – Figuras de Sintaxe

Assíndeto
Quando as palavras ou orações se sucedem sem conectivos.
Ex.: “Eu chorando, sofrendo, gostando, adorando, gritando” (Gonzaguinha)

As palavras aqui são encadeadas por vírgulas, omitindo os conectivos possíveis, nesse
caso, o “e” entre “adorando” e “gritando”.

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Outros exemplos: Ele vivia estudando, lendo, resumindo, praticando.


“- Almas tristes, severas, resignadas,
De guerreiros, de santos, de poetas.” (Camilo Pessanha)

Polissíndeto
O oposto de assíndeto: quando um conectivo é reiterado muitas vezes na ligação entre
palavras ou orações.
Ex.: Ela trabalha e sofre e se cansa e recomeça.

Há aqui uma ausência de vírgulas, provocando a repetição do conectivo “e”.

Outros exemplos: Não conseguiu nem dinheiro, nem reconhecimento, nem nada.
“Fui cisne, e lírio, e águia, e catedral!” (Florbela Espanca)

ATENÇÃO: mesmo com a presença de vírgulas nos exemplos acima, a repetição dos conectivos
caracteriza como polissíndeto.

Assíndeto: Polissíndeto:
Ausência de conectivos. Reiteração de conectivos.

Hipérbato (inversão)
Ocorre quando há inversão da ordem normal das palavras em uma oração ou da ordem das
orações em um período.
Ex.: Está pronto o almoço.

Na ordem normal, essa frase seria “O almoço está pronto”. Aqui, há uma inversão dos
termos, sem, no entanto, prejudicar o entendimento do significado.

Outros exemplos: “Terminou o Carnaval”


“Ouviram do Ipiranga as margens plácidas de um povo heroico o brado
retumbante” (Hino Nacional)

Pleonasmo
Ocorre quando há repetição de uma palavra a fim de intensificar o significado.

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Ex.: A mim me parece que deveríamos ficar em casa.

Essa repetição serve para reforçar a ideia de que o que está sendo dito é uma opinião
pessoal. Na construção comum seria: “Parece-me que deveríamos ficar em casa.”
Outros exemplos: “E rir meu riso” (Vinícius de Moraes)
“Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!” (Fernando Pessoa)

ATENÇÃO: Quando a repetição não acrescenta intensidade à expressão, ela é considerada


pleonasmo vicioso, uma incorreção gramatical. É o caso, por exemplo de “Ele subiu para cima do
prédio”: só se pode subir para cima, portanto, essa repetição é desnecessária.

3.3 – Figuras de Pensamento

Hipérbole
Ocorre quando há o uso de uma expressão exagerada, claramente simbólica.
Ex.: Eu estava morta de cansaço.

Evidentemente, não se pode estar verdadeiramente “morta”, senão não


a pessoa não poderia falar sobre seu estado. “morta de cansaço” é uma expressão idiomática, que
torna mais evidente a profundidade daquilo que se diz. É equivalente a dizer “Eu estava muito
cansada”.

Outros exemplos: Tentei resolver esse exercício um milhão de vezes.


“Chega mais perto e contempla as palavras. / Cada uma / tem mil faces secretas
sob a face neutra” (Carlos Drummond de Andrade)

Ironia
Ocorre quando aquilo que está sendo dito é o contrário do que realmente se pretende dizer.
Ex.: Quem foi o gênio que tirou zero na prova?

Presume-se que um “gênio” é uma pessoa inteligente. Por isso, um gênio


não tiraria zero numa prova. Aqui, a palavra “gênio” está empegada significando seu
contrário: “burro”.

Outros exemplos: Eu fico muito feliz quando você me ignora.


“Era boa moça, lépida, sem escrúpulos (...)” (Machado de Assis)

Paradoxo
Ocorre quando são apresentadas ideias de sentidos opostos formando um todo de sentido,
ou seja, é uma expressão formada por palavras cujos significados são aparentemente excludentes.

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Ex.: O silêncio é eloquente.

“silêncio” significa a ausência de sons e “eloquente” significa capacidade de


expressar-se bem.

Apesar de aparentemente se negarem, a construção com essas duas palavras tem um


objetivo: afirmar que, por vezes, não dizer nada também é uma resposta. Por isso, há aqui uma
expressão paradoxal e que forma um todo de sentido.

Outros exemplos: “Estou cego e vejo./Arranco os olhos e vejo.” (Carlos Drummond de Andrade)
“Só sei que nada sei” (Sócrates)

Personificação (prosopopeia)
Ocorre quando se atribuem características humanas a seres inanimados ou irracionais.
Ex.: O dia acordou triste.

“acordar” e “sentir tristeza” são ações humanas. O dia, como fragmento


temporal, não pode sentir nada nem agir de maneira alguma. Neste caso, há a
atribuição de um sentimento humano a algo inanimado.
Outros exemplos: O céu chorava de alegria.
“Em vão me tento explicar, os muros são surdos.” (Carlos Drummond de Andrade)

ATENÇÃO: muitas vezes, a personificação é a projeção do sentimento de quem fala. No exemplo “O


dia acordou triste”, por exemplo, possivelmente o falante acordou triste naquele dia e projetou no
recorte temporal seu próprio sentimento. É como se estivesse dizendo “Acordei triste neste dia”.

3.4 – Figuras de Som

Aliteração
Ocorre quando há repetição de sons consonantais.
Ex.: O rato roeu a roupa do rei de Roma.

A repetição da consoante “r” é essencial para a constituição do ritmo desse trava-


língua.

Outros exemplos: Quem com ferro fere com ferro será ferido.
“Chove chuva, chove sem parar” (Jorge Bem Jor)

ATENÇÃO: muitos trava-línguas e ditos populares se baseiam em aliterações.

Assonância
Ocorre quando há repetição de sons vocálicos.

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Ex.: Tinha o coração na mão.

Há aqui a repetição do som “ão” como elemento que constitui a sonoridade da


expressão.

Outros exemplos: O Museu Galileu pereceu.


“Juro que não acreditei eu te estranhei / Me debrucei sobre teu corpo e duvidei”
(Chico Buarque)

4 – Resumo Analítico dos Poemas


Para a análise dos poemas propriamente ditos, separamos um a um a seguir a numeração
proposta pela própria banca da UFRGS. Aproveitando para alguns procedimentos:
• Para cada poema, eu elaborei um quadro sinóptico específico, com tudo o que você precisa
saber dele em termos de técnica e estilo. Para cada poema, além do quadro sinóptico,
também há um comentário geral.
• Há alguns poemas de Florbela Espanca cujo nome se repete. Para tal, a própria banca da
UFRGS delimitou qual seria cobrado, quando for o caso. Em todo caso, cuidado para não se
confundirem. A UFRGS adotou medidas diferentes para discerni-los:
1) Indicou o link do poema certo (no caso de “Súplica”, pois há 3 poemas diferentes de
Florbela Espanca com esse mesmo título). Como o poema foi indicado, iremos analisar
apenas ele, já tendo em vista que se trata de um assunto importante para a autora;
2) Diferenciou com numeração, no caso de “A Mulher I” e “A Mulher II”, presentes no mesmo
livro: Trocando Olhares;
3) Indicou com uma pequena diferença, como é o caso de “Quem Sabe?!...” com
interrogação e exclamação, que está em O Livro D’Ele; porém, há outro poema com quae
o mesmo título, “Quem Sabe?...”, apenas com a interrogação, que está em Charneca em
Flor. Iremos nos ater à pontuação e analisar o que foi pedido;
4) Especificou ou título, mas há 2 poemas diferentes de Florbela Espanca com o mesmo
nome, como é o caso de “Eu”, que está tanto no Livro de mágoas quanto em Charneca em
flor, tratando-se de poemas diferentes. Iremos analisar os 2.
5) O título indicado não condiz totalmente com a obra, como é o caso de “Ódio”, indicado
pela UFRGS sem pontuação, quando o poema presente em Livro de Sóror Saudade
apresenta interrogação.
6) A UFRGS identificou o primeiro verso do poema como título, e ainda não o verso todo, só
uma parte dele, embora no livro Charneca em Flor o poema “Frêmito do meu corpo” seja
indicado como o número III em uma série de X poemas que não são intitulados.
O nosso intuito é complementarmos cada vez mais a sua análise e o entendimento da obra
lírica de Florbela Espanca. Para isso, tentei sistematizar ao máximo as informações. Por isso, não
vamos parar só nas obras obrigatórias, mas estudar uma breve seleção de outros poemas que são
importantes para as nossas análises e podem condizer em conteúdos.

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4.1 – “Fanatismo”
Este soneto se encontra no Livro de Sóror Saudade.

Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida ambiguidade no sentido/verbo de ligação


Meus olhos andam cegos de te ver! paradoxo
Não és sequer razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida! conectivo: introduz oração subordinada adverbial causal

Não vejo nada assim enlouquecida...


Passo no mundo, meu Amor, a ler mistura as noções de razão x sentimento
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!

"Tudo no mundo é frágil, tudo passa..." utiliza o mecanismo moderno de discurso direto
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:


"Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim!..." confunde os conceitos de eterno x passageiro

Comentário geral
O título do poema é um único substantivo. Segundo o Dicionário Houaiss (2009, p. 872), esse
termo pode significar: 1) zelo religioso obsessivo que pode levar a extremos de intolerância; 2)
faccionismo partidário; adesão cega a um sistema ou doutrina; dedicação excessiva a alguém ou
algo; paixão. Logo, parte-se já desde o título de um termo polissêmico, isto é, com mais de um
significado. Aqui, o eu lírico embaralha as noções de sagrado e profano: o fanatismo está ao mesmo
tempo para a condição da idolatria quanto para a de amor.
Já no primeiro verso, observamos algo muito típico da prosódia portuguesa, isto é, da
entonação: a contração de uma vogal entre o pronome possessivo “minha” e o substantivo “alma”.
Outro elemento típico é a ênclise (colocação pronominal ao fim do verbo), em “sonhar-te”. Chamo
atenção para os verbos no infinitivo.

O infinitivo, junto com o particípio e o gerúndio, constituem na Gramática Normativa


as formas nominais de um verbo, que chegam a enunciar um fato de maneira
impessoal, pois todas aproveitam a mesma pessoa gramatical, flexionando-se da
mesma forma. Só nesse poema, temos os seguintes infinitivos: “sonhar”, “ver”,
“viver” (substantivado), “ler”, “ser”, “voar” e “morrer”, todos verbos significativos.

Da mesma forma, chamo atenção para os particípios: “perdida”, “enlouquecida”, “lida” (que
dialoga com o infinitivo “ler”) e “postos”. Aqui, no caso, os particípios atuam como adjetivos, pois

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concordam em gênero e número com o termo com que concordam. Outros adjetivos no soneto são:
“cegos”, “misterioso”, “frágil”, “divina”.
Ainda no plano gramatical, há o uso do verbo andar não como verbo de movimento, mas sim
verbo de ligação (VL). Aliás, eles são predominantes no poema, pois o verbo “ser” também está nas
seguintes construções:

• Minh’alma anda perdida → em que “anda” é VL e “perdida” é o predicativo do sujeito;


• Meus olhos andam cegos → em que “andam” é VL e “cegos” é o predicativo do sujeito;
• Não és sequer (razão) do meu viver → em que “és” é VL e “razão do meu viver” é o predicativo
do sujeito, com núcleo em “razão”
• Pois que tu és já toda a minha (vida)! → em que “és” é VL e “toda a minha vida” é o
predicativo do sujeito
• Tudo no mundo é frágil → em que “é” é VL e “frágil” é o predicativo do sujeito
• Que tu és como Deus → em que “és” é VL e “como Deus” é predicativo do sujeito
preposicionado, indicando uma figura de linguagem de comparação.

Continuando a análise, é indicado um eu lírico em conflito. A ambiguidade é colocada já no


primeiro verso: ela diz que se sente perdida, o que é ambíguo, pois pode se remeter tanto à moral
religiosa, quanto a um sentimento de estar sem rumo, o que se repete em outros poemas, como
“Eu”, mediante o paradoxo, que ao mesmo tempo é uma hipérbole: de tanto ver os olhos andam
cegos. Este “estar perdida” ainda pode remeter à tradição do viandante, como se no movimento
literário do Modernismo preciso fosse retornar às origens de nomadismo. Aqui, também há o
sentido da visão, que também é ambíguo: pode indicar tanto a visão física, sensorial, quanto apenas
uma percepção.
Em “Não és sequer razão do meu viver”, o eu lírico embaralha a noção da racionalidade x
sentimento, e ainda tenta rebaixar o objeto amado, com o advérbio “sequer”. Primeiro, utiliza-se
uma construção na negativa, e depois o advérbio. Daí o eu lírico se explica por meio de uma oração
subordinada adverbial causal: Pois que tu és já toda a minha vida!”. A pontuação da exclamação
aponta êxtase, o pronome “toda”, uma hipérbole. O fanatismo do eu lírico é tão arrebatador que faz
com que o amor a ofusque.
De amor enlouquecida, ela invoca o seu Amor, mediante um vocativo em que o substantivo
comum aparece como próprio. Ela está brincando com a gramática normativa, mas também reflete
o processo de endeusamento de seu amor. Sem rumo e sem ter como se concentrar em nada, pois
está enlouquecida, ela passa a ler. Então, há um recurso metalinguístico, e ao mesmo tempo
paradoxal, pois como ela vai ler se está enlouquecida? O enlouquecimento é um tema frequente no
Simbolismo e representa também o inebriamento, a embriaguez. Passar a ler também assinala uma
mudança de postura: ela começa a fazer algo que antes não estava fazendo e aqui ainda pode
retratar uma fuga da realidade, uma vez que ela quer se distrair, esquecer o seu amor, ainda que
momentaneamente. Ela lê o seu amado como se ele fosse um livro, o que ela chama de “o livro do
teu ser”, que, ao mesmo tempo é misterioso, de forma que há algo no sentido desse livro que vai
sempre escapar, ser sempre insondável, já que é misterioso.
Aí, o eu lírico utiliza um elemento modernista: a introdução de um diálogo (discurso direto)
por meio de aspas. Como se fosse uma fofoca, um dito popular, alguém querendo dar palpite em
sua vida: “tudo passa, tudo é frágil”. E ela não deixa passar, ela retruca essa voz. Sente-se dona de
uma voz divina, que aqui se associa à voz do poeta: deixe que voem (que passem) mundos e astros

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morram, pois ela sabe que o amor dela é eterno e não vai passar. O amor dela, o “tu” dela, é como
se fosse Deus, um princípio uno, indivisível e, portanto, atemporal: o princípio e o fim, o alfa (A) e o
ômega (Ω). Há um ditado latino que diz que vox populi, vox Dei, isto é, a voz de povo é a voz de Deus.
Aqui, a voz do poeta é a voz de Deus; elas se coincidem e é o eu lírico quem dá a palavra final. Se é
ela quem diz que o seu amor vai durar, é porque ele vai mesmo. Se o eu lírico é uma mulher, ela está
na condição de freira, pois espera o amado e se dirige a Deus.

A etimologia da palavra “sóror” vem do latim, pois sororis significa irmã,


parente de sangue, companheira. É uma forma de tratamento usado para
freiras, professas, irmãs ou madres. No francês moderno, o termo para
irmã é “sœur”, seguindo essa mesma lógica.

No fundo, é um poema prosaico, pois a introdução do discurso direto aproxima o soneto do


diálogo, da voz mundana, o que é paradoxal já que um dos temas no poema é o ser divino.

Segundo Rocha Lima (2011), o discurso direto ocorre quando “o


Discurso escritor apresenta a personagem e deixa-a expressar-se,
reproduzindo-lhe textualmente as palavras” (p. 592). Identificar
direto um discurso direto é simples: ele costuma ser expresso por um
travessão antes da fala ou pelo emprego de aspas.

Por fim, ter consciência da efemeridade da vida já é um passo dado rumo a poder ter domínio
dela. Aqui há uma relação entre duração do amor e duração da vida. O soneto é difícil, pois tem mais
de um ponto de vista: o da personagem, o de um “tu” ao qual ela alude como sendo seu amor, o de
alguém que dá conselhos a ela. Isso pode ser indício também de loucura, ainda mais, esquizofrenia
(confusão de várias vozes). Lembrando que a loucura também é um tema importante para o
Simbolismo. As reticências indicam um sentimento vago e no final elas ainda acompanham a
exclamação.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO Eu lírico em primeira pessoa do singular que leva em consideração uma
segunda pessoa do singular, um “tu”, com quem dialoga. Embaralha as
seguintes noções: eu e tu; sagrado e profano; eterno e passageiro; razão e
sentimento; Deus e mundo; Deus e poeta; razão e loucura. Temas
importantes: metalinguagem (leitura, a voz do poeta é a voz de Deus), fuga
da realidade (loucura, leitura), processo de endeusamento do amor. Pela
inovação na forma (introdução do discurso direto), o poema está mais ligado
ao movimento do Modernismo.

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VERSO Versos decassílabos = com dez sílabas poéticas


*Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
Mi-nh-al-ma,-de-so-nhar-te,an-da-per-di-da (10 sílabas poéticas)
Meus-o-lhos-an-dam-ce-gos-de-te-ver! (10 sílabas poéticas)
Não-és-se-quer-a-ra-zão-do-meu-vi-ver, (10 sílabas poéticas)
Pois-que-tu-és-já-toda a-mi-nha-vi-da! (10 sílabas poéticas)

Não-ve-jo-na-da as-sim-en-lou-que-ci-da... (10 sílabas poéticas)


Pas-so-no-mun-do,-meu-A-mor,-a-ler (10 sílabas poéticas)
No-mis-te-rio-so-li-vro-do-teu-ser (10 sílabas poéticas)
A-mes-mahis-tó-ria-tan-tas-ve-zes-li-da! (10 sílabas poéticas)

"Tu-do-no-mun-doé-frá-gil,-tu-do-pas-sa..." (10 sílabas poéticas)


Quan-do-me-di-zem-is-to,-to-daa-gra-ça (10 sílabas poéticas)
Du-ma-bo-ca-di-vi-na-fa-laem-mim! (10 sílabas poéticas)

E,-o-lhos-pos-tosem-ti,-di-go-de-ras-tros: (10 sílabas poéticas)


"Ah!-Po-dem-vo-ar-mun-dos,-mor-rer-as-tros, (10 sílabas poéticas)
Que-tu-és-co-mo-Deus:-Prin-cí-pio-e-Fim!..." (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Regular. Os versos são decassílabos, também chamado de heroicos.
RIMAS Seguem o esquema ABBA/ABBA/CCD/EED. Logo, os dois quartetos
classificam-se como rimas intercaladas (interpoladas).
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida (2-6-10)
Meus olhos andam cegos de te ver! (2-6-10)
Não és sequer a razão do meu viver, (2-6-10)
Pois que tu és já toda a minha vida! (4-6-10)

Não vejo nada assim enlouquecida ... (2-6-10)


Passo no mundo, meu Amor, a ler (4-8-10)
No misterioso livro do teu ser (4-6-10)
A mesma história tantas vezes lida! (4-8-10)

"Tudo no mundo é frágil, tudo passa..." (4-6-10)


Quando me dizem isto, toda a graça (4-6-10)
Duma boca divina fala em mim! (3-6-10)

E, olhos postos em ti, digo de rastros: (2-6-10)


"Ah! Podem voar mundos, morrer astros, (2-6-10)
Que tu és como Deus: Princípio e Fim!..." (2-6-8-10)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito à infinidade de Deus = amor =
voz do poeta. É introduzida por uma oração subordinada adverbial
consecutiva: “que”.

O intérprete brasileiro Fagner já musicou o soneto “Fanatismo”.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 24


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O soneto é uma forma fixa desenvolvida na Itália no século XV. O soneto


clássico é formado por 2 quartetos (estrofe com 4 versos) e 2 tercetos (estrofe
com 3 versos). Essa é a forma mais utilizada por Florbela Espanca. A chave de
ouro, como costuma ser chamada, é o último verso do soneto, o qual costuma
sintetizar as ideias-chave do poema. Em todo caso, há um outro tipo de soneto,
o shakespereano, empregado pelo dramaturgo inglês. Estruturalmente, ele é
composto de 3 quartetos e 1 dístico (estrofe com 2 versos).

4.2 – “Horas Rubras”


Este soneto se encontra no Livro de Sóror Saudade.

Horas profundas, lentas e caladas sinestia: mistura dois órgãos de sentido diferentes
Feitas de beijos sensuais e ardentes, coordenação por adição
De noites de volúpia, noites quentes
Onde há risos de virgens desmaiadas... pronome relativo/tema da insconsciência

Oiço as olaias* rindo desgrenhadas... personificação


Tombam astros em fogo, astros dementes. tema da queda
E do luar os beijos languescentes
São pedaços de prata p’las estradas...

Os meus lábios são brancos como lagos... cor = Simbolismo


Os meus braços são leves como afagos, comparação + repetição no início do verso = anáfora
Vestiu-os o luar de sedas puras...

Sou chama e neve branca misteriosa...


E sou talvez, na noite voluptuosa, verbo de ligação
Ó meu Poeta, o beijo que procuras! inclusão de uma segunda pessoa
*Árvore da família das leguminosas, também chamada de olaeira e árvore-de-judas (dicionário Aulete).

Comentário geral
A ambiguidade está presente novamente. Se as horas são rubras, elas podem ser horas do
amanhecer ou do crepúsculo. E se são lentas, trata-se do tempo psicológico.

Tempo psicológico
É o tempo que transcorre numa ordem determinada pela vontade, pela memória ou pela
imaginação do narrador ou personagem. É característico do enredo não linear, ou seja, do
enredo em que os acontecimentos estão fora da ordem natural.
Fonte: (CEREJA; MAGALHÃES, 2005, p. 281-283).

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Todos os dois primeiros versos servem para caracterizar que horas são estas e são
empregados numa função adjetiva. Os beijos sensuais e ardentes, isto é, sensações, teoricamente
abstratas, aqui funcionam como matéria para as horas. O soneto então descreve essa passagem do
tempo que muito mais tem a ver com o plano da sensibilidade do que o tempo cronológico de fato.
A noite é espaço ao mesmo tempo para quentura, virgindade e desmaio.
Não só o eu lírico como também toda a natureza sente. As
árvores riem e são ouvidas pelo eu lírico. Há num mesmo verso a
união de gerúndio e particípio, de novo, num uso adjetivo: “olaias
rindo desgrenhadas”. Os astros tombados podem ter dois sentidos:
ou estrelas cadentes, que trazem sorte, ou a queda real de algo
superior, o que já remete a um sentido negativo. A demência dialoga
com o desmaio no sentido da inconsciência. Lembrando que Florbela
Espanca foi contemporânea do psicanalista Sigmund Freud,
estudioso, entre outros temas, justamente do inconsciente e das
neuroses (vide soneto “Neurastenia”). E palavra “astros” ainda se
repete nesse verso. É como se a loucura fosse uma mulher, e esse tema também lembra o poema
simbolista de Alphonsus Guimaraens: “Quando Ismália enlouqueceu...”.
Outro elemento que se repete é a preposição “de”: “E do luar os beijos languescentes/São
pedaços de prata p’las estradas”. Pode ser encontrada a figura de linguagem da metonímia (parte
pelo todo). Aqui pode ser observada a prosódia (entonação) portuguesa na contração das palavras.
Os lábios brancos indicam um estado apático, doentio, que se remete à estética do
Ultrarromantismo, revela um certo apego à morte. Bem como a imagem do luar, que
metaforicamente vestem os braços do eu lírico como se fosse seda.
No último terceto, mais do que se revelar como primeira pessoa, o eu lírico se revela com
atributos, por meio de verbo de ligação: “Sou chama e neve branca e misteriosa”. Aqui observa-se
polissíndeto, mediante a repetição do conectivo “e”. E ao mesmo tempo paradoxo, na formação de
uma imagem que é ao mesmo tempo quente (chama), dialogando com a quentura e ardência da
primeira estrofe, e fria como gelo. Isto é, uma possibilidade não exclui a outra. Retornam os temas
da noite e da volúpia: “na noite voluptiosa” é um adjunto adverbial temporal (ênfase para o tempo).
Por fim, o eu lírico invoca o poeta e deixa transparecer o porquê de as horas serem rubras:
porque elas são de espera. É como se houvesse um “tu”, que é Poeta igual a ela, aqui elevado à
categoria divina, pois novamente o substantivo comum se tornou próprio. E, se esse Poeta a procura,
ela o está esperando. Há relação de reciprocidade. A pontuação mesclada de reticências e pontos
de exclamação marcam um estado de espírito oscilante entre o êxtase e a espera.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico associa a noção de tempo ao plano da sensibilidade, dos sentidos.
As horas são rubras, pois elas são sofridas, sentidas, trata-se de um tempo
psicológico de uma espera pelo Poeta/Amado. Distingue-se como primeira
pessoa apenas na segunda estrofe, a primeira é mais descritiva. Na última, há
verbos de ligação, que revelam ainda mais do eu lírico. Temas importantes:
queda, noite, luar, insconsciência, procura x espera. O poema segue mais a
tendência do movimento literário do Romantismo.

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VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a


última sílaba poética
Ho-ras-pro-fun-das,-len-tas-e-ca-la-das (10 sílabas poéticas)
Fei-tas-de-bei-jos-sen-suais-e-ar-den-tes, (10 sílabas poéticas)
De-noi-tes-de-vo-lú-pia,-noi-tes-quen-tes (10 sílabas poéticas)
On-dehá-risos-de-vir-gens-des-mai-a-das... (10 sílabas poéticas)

Oi-çoas-o-la-ias-rin-do-des-gre-nha-das... (10 sílabas poéticas)


Tom-bam-as-tros-em-fo-go,-as-tros-de-men-tes. (11 sílabas poéticas)
E-do-lu-ar-os-bei-jos-lan-gues-cen-tes (10 sílabas poéticas)
São-pe-da-ços-de-pra-ta-p’las-es-tra-das... (10 sílabas poéticas)

Os-meus-lá-bios-são-bran-cos-co-mo-la-gos... (10 sílabas poéticas)


Os-meus-bra-ços-são-le-ves-co-moa-fagos, (10 sílabas poéticas)
Ves-tiu-os-o-lu-ar-de-se-das-pu-ras... (10 sílabas poéticas)

Sou-cha-mae-ne-ve-bran-ca-mis-te-ri-o-sa... (11 sílabas poéticas)


E-sou-tal-vez,-na-noi-te-vo-lup-tu-o-sa, (11 sílabas poéticas)
Ó-meu-Po-e-ta,-o-bei-jo-que-pro-cu-ras! (11 sílabas poéticas)
MÉTRICA Versos decassílabos mesclados com hendecassílabos.
RIMAS Seguem o esquema ABBA/ABBA/CCD/EED. Logo, os dois quartetos
classificam-se como rimas intercaladas (interpoladas).
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Horas profundas, lentas e caladas (4-6-10)
Feitas de beijos sensuais e ardentes, (4-7-10)
De noites de volúpia, noites quentes (2-6-10)
Onde há risos de virgens desmaiadas... (3-6-10)

Oiço as olaias rindo desgrenhadas... (4-6-10)


Tombam astros em fogo, astros dementes. (3-6-11)
E do luar os beijos languescentes (4-6-10)
São pedaços de prata p’las estradas...

Os meus lábios são brancos como lagos... (4-6-10)


Os meus braços são leves como afagos, (4-6-10)
Vestiu-os o luar de sedas puras... (2-6-10)

Sou chama e neve branca misteriosa... (2-4-6-10)


E sou talvez, na noite voluptuosa, (4-6-11)
Ó meu Poeta, o beijo que procuras! (4-7-11)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro chama um poeta de: dela (pronome
possessivo), Deus (com letra maiúscula) e vocativo (gramaticalmente). Ela
manifesta desejo de se unir a esse poeta, artista como ela, mas também
amado esperado; ela, a mulher que espera.

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4.3 – “Eu” – Livro de Mágoas


Existem 2 sonetos com título igual, mas conteúdo diferente.
Iremos analisar os 2.

Eu sou a que no mundo anda perdida, perdição: vagar pelo mundo sem direção
Eu sou a que na vida não tem norte, a inominada, a não determinada, a vaga = Simbolismo
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte plano onírico = Simbolismo; tema da irmandade
Sou a crucificada... a dolorida... sacrifício religioso que lembra o fanatismo

Sombra de névoa tênue e esvaecida, Simbolismo


E que o destino amargo, triste e forte, repetição da coordenação por adição
Impele brutalmente para a morte! advérbio de modo = hipérbole
Alma de luto sempre incompreendida!... apego ao morte ultrarromântico; incompreensão

Sou aquela que passa e ninguém vê... condição de invisibilidade da mulher


Sou a que chamam triste sem o ser... mais comentam sobre a vida dela do que a ajudam
Sou a que chora sem saber porquê... sentimentalismo exacerbado

Sou talvez a visão que Alguém sonhou, cria uma categoria: pronome indefinido definido
Alguém que veio ao mundo pra me ver, preposição “para” + infinitivo = finalidade
E que nunca na vida me encontrou! apelo constante à morte como única redenção

Comentário geral
Já desde o título, a centralidade na individualidade, ou seja, num eu que fala, lembra a escola
do existencialismo, da qual autores como Albert Camus e Jean-Paul Sartre fizeram parte. Lembrando
que o poeta pré-modernista brasileiro Augusto dos Anjos também tem uma obra chamada Eu
(1912). Ela se define com uma estrutura gramatical formada por: pronome de primeira pessoa “eu”,
que inclusive dá título ao soneto + verbo de ligação ser + pronome demonstrativo. Dois 2 primeiros
versos da primeira estrofe para os 2 últimos há o desaparecimento do sujeito, sendo que ele passa
a ser oculto (desinencial).

Termo filosófico. Corrente de pensamento que destaca a


importância filosófica da existência individual como o foco da
Existencialismo conceituação filosófica (e não os sistemas e conceitos abstratos)
e segundo a qual o homem é livre e responsável por seu destino
(dicionário Aulete).

As duas últimas palavras do primeiro verso – “anda perdida” – são idências as do poema
“Fanatismo”. Observamos aqui o Leitmotiv, a repetição de temas com significação. O eu lírico se
sente errante e errática, sem turmo e torta, como poeta brasileiro modernista Carlos Drummond de

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Andrade se sentia gauche (justamente torto, errado), na sua fase pessimista. A imagem crucificada
e dolorida formam adjetivos na forma de particípio e indicam sacrifício.

O eu lírico crucificado de Florbela Espanca, com um vestido adornado de brocados, vagando pelo mundo,
mais especificamente, no castelo de sua cidade natal, Vila Viçosa.

Continuando, nada mais simbolista do que o verso “Sombra de névoa tênue e esvaecida”, ou
seja, imagem de total fluidez. É como se ela se consolasse a si próprio: mesmo o mais pungente
sofrimento se esvai, já que tudo está submetido a esse estado de corrente. Porém, ela retorna a uma
série de adjetivos colocados em série por assíndeto (conectados sem conetivo): amargo, triste e
forte. O “amargo” remete ao plano das sensações. O luto e a morte invocam temas do movimento
literário do Ultrarromantismo, a segunda geração romântica e, ao mesmo tempo, a vertente
filosófica do fatalismo que estava em voga na Europa, com romances como Madame Bovary e Anna
Kariênina por exemplo (romances em que as protagonistas se suicidam ao final). Esse aspecto
também alude ao plano religioso, já que ela não é deusa e sente que perde o controle de sua vida.
Então paira ali naquela atmosfera uma desolação total. Uma diferença entre ser
incompreendida x se sentir de fato incompreendida. O eu lírico perde a noção de realidade, não
sabe mais definir o que está ao redor de si. Elementos no poema vão se tornando ambíguos aos
poucos: “norte” pode indicar direção ou ponto cardeal e “desta sorte” pode significar o destino ou
o conectivo.

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Neste poema há um tema central: o papel da mulher. No primeiro terceto, o


eu lírico dá a ver que a sociedade só a julga sem poder ajuda-la. Ela passa pela
sociedade como quem não passa, pois se sente invisível. Não é à toa, portanto, que
ela viva chorando sem saber o porquê. O eu lírico deixa subentendido que essa é
uma consequência do comportamento da sociedade para com ela.
E diante de uma solidão que ela sente, pois passa sozinha sem ser vista, sem
ter companhia, sem que a compreendam, ela cria um outrem, um Alguém. É a
criação de um pronome indefinido (alguém) que é elevado a uma categoria importante (Alguém,
com letra maiúscula). Entre as classes morfológicas, ele até consegue ascender de pronome a nome,
retornando à sua condição original de substantivo. É como se fosse uma subjetividade cuja existência
dependesse do outro. Aqui há o que o filósofo alemão Friedrich Hegel chamou de sujeito-objeto
idênticos: se ela cria Alguém para pensá-la, alguém a pensa para poder criá-la e vice-versa. Era para
ser um processo recíproco. Ela encontra então nessa criação uma via de escape; porém, este Alguém
não a corresponde. Da sua frustração surge um único sentimento: que a única solução possível é a
morte, pois, “na vida”, como é dito no último verso, esse processo de procura e busca não se
completa. Ela permanece no plano dos sonhos e não no da concretização.

(QUESTÃO AUTORAL – LUANA/2020)

Eu
Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida... (...)

Fanatismo
Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida! (...)

Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as seguintes afirmações sobre os trechos


( ) Ambos os sujeitos líricos passam por um processo de busca por autoidentidade.
( ) Ambos os sujeitos líricos estão apaixonadas e projetam seu amor numa criação.
( ) Ambos os sujeitos líricos pressupõe uma atitude fervorosamente religiosa.
( ) Ambos os sujeitos líricos questionam o papel da mulher na sociedade.

a) V – F – F – V
b) V – V – F – F
c) V – F – F – F

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d) V – V – V – V
e) V – F – V – F
Comentários
Uma das maneiras de a UFRGS cobrar mais poemas de Florbela Espanca é comparando-os.
Por isso, eu aposto em uma questão de Literatura Comparada.
Afirmação I: verdadeira. Tanto é que as duas últimas palavras dos dois primeiros versos
são idênticas. O tema da perdição é central na poesia de Florbela Espanca.
Afirmação II: falsa. Cuidado: apenas o segundo sujeito lírico fala de um “tu”, de sonhar com
o amado. A centralidade no primeiro poema é na individualidade, na subjetividade.
Afirmação III: verdadeira. Como é o caso do uso da palavra “irmã” na primeira estrofe, que
pode se remeter a “sóror”, o que já foi explicado e inclusive nomeia um dos livros de Florbela
Espanca, e pelo próprio título do segundo poema, cujo fanatismo implica uma atitude
fervorosa, religiosa, devota, reverente, embora aqui para com o amado, e não
necessariamente Deus.
Afirmação IV: falsa. Cuidado: apenas o primeiro eu lírico, e o trecho que esse
questionamento aparece não é nem exatamente a estrofe que cobrou. Dica: algumas questões
da UFRGS partem do subentendido que o aluno domina a obra inteira. Então, ao dizer que o
eu lírico feminino (e sabemos disso pelas flexões de gênero) anda perdida no mundo,
posteriormente, descobrimos que ela também está sozinha, é julgada e incompreendida.
Sequência correta: V – F – V – F.
Gabarito: “e”.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico é aquela que busca determinações, identidade própria,
autoafirmação, mas ainda se sent presa. Temas importantes: existencialismo,
identidade, determinação x indeterminação (do sujeito, inclusive:
“chamam”), subjetivismo, individualismo, ambiguidade, perda da noção da
realidade, papel da mulher, criação x criatura. Este poema segue mais a
tendência do Simbolismo.
VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
Eu-sou-a-que-no-mun-doan-da-per-di-da, (10 sílabas poéticas)
Eu-sou-a-que-na-vi-da-não-tem-nor-te, (10 sílabas poéticas)
Sou-air-mã-do-So-nho,-e-des-ta-sor-te (10 sílabas poéticas)
Sou-a-cru-ci-fi-ca-da...a-do-lo-ri-da... (10 sílabas poéticas)

Som-bra-de-né-voa-tê-nueees-va-e-ci-da, (10 sílabas poéticas)


E-que-o-des-ti-noa-mar-go,-tris-tee-for-te, (10 sílabas poéticas)
Im-pe-le-bru-tal-men-te-pa-raa-mor-te! (10 sílabas poéticas)
Al-ma-de-lu-to-sem-prein-com-preen-di-da!... (10 sílabas poéticas)

Sou-a-que-la-que-pas-sae-nin-guém-vê... (10 sílabas poéticas)

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Sou-a-que-cha-mam-tris-te-sem-o-ser... (10 sílabas poéticas)


Sou-a-que-cho-ra-sem-sa-ber-por-quê... (10 sílabas poéticas)

Sou-tal-vez-a-vi-são-queAl-guém-so-nhou, (10 sílabas poéticas)


Al-guém-que-vei-oao-mun-do-pra-me-ver, (10 sílabas poéticas)
E-que-nun-ca-na-vi-da-meen-con-trou! (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Versos regulares = decassílabos.
RIMAS Seguem o esquema ABBA/ABBA/CCC/ECE. Logo, os dois quartetos
classificam-se como rimas intercaladas (interpoladas).
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Eu sou a que no mundo anda perdida, (6-10)
Eu sou a que na vida não tem norte, (6-10)
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte (4-10)
Sou a crucificada... a dolorida... (6-10)

Sombra de névoa tênue e esvaecida, (4-10)


E que o destino amargo, triste e forte, (4-6-8-10)
Impele brutalmente para a morte! (2-6-10)
Alma de luto sempre incompreendida!... (4-6-10)

Sou aquela que passa e ninguém vê... (6-10)


Sou a que chamam triste sem o ser... (4-10)
Sou a que chora sem saber porquê... (4-10)

Sou talvez a visão que Alguém sonhou, (6-10)


Alguém que veio ao mundo pra me ver, (2-4-6-10)
E que nunca na vida me encontrou! (3-6-10)
FORMAS FIXAS Soneto clássico com dois quartetos e dois tercetos. A chave de ouro (o último
verso do poema) diz respeito à frustração: ela cria um Alguém para sonhá-la,
mas esse alguém se mostra indiferente. Ao menos, nem conhece a existência
dela. O processo de procura/encontro não se consolida e o eu lírico
permanece vagando incompreendido. Ela também fala da sua própria
condição de poetisa, que, na sua época em vida, passou despercebida.

4.3.1 “Eu” – Charneca em Flor


Até agora eu não me conhecia. busca por uma identidade
Julgava que era Eu e eu não era tautologia (filosofia, lógica): volta a si mesma
Aquela que em meus versos descrevera
Tão clara como a fonte e como o dia. comparação

Mas que eu não era Eu não o sabia tautologia introduzida por um conectivo de adversidade
E, mesmo que o soubesse, o não dissera…
Olhos fitos em rútila quimera Barroco
Andava atrás de mim… e não me via! condição de invisibilidade

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Andava a procurar-me – pobre louca! – temas da procura e da loucura


E achei o meu olhar no teu olhar, sentido da visão/introdução da segunda pessoa
E a minha boca sobre a tua boca!

E esta ânsia de viver, que nada acalma, perturbada por sensações e pensamentos
É a chama da tua alma a esbrasear
As apagadas cinzas da minha alma! paradoxo: chama e cinza (tu és pó e ao pó retornarás)

Comentário geral
Por esse poema podemos passar mais brevemente, uma vez que entendemos que muito
provavelmente o que a UFRGS irá cobrar será o primeiro.
Aqui o eu lírico revela a tendência barroca do cultismo, isto é, um jogo de ideias calcado na
repetição de palavras e mesmo construções sintáticas. O Barroco também está presente na figura
da quimera, isto é, ser híbrido que pode simbolizar a combinação de 2 ou mais outros seres, como
o grifo (mistura de leão com águia). Esta é a característica do feíismo e a representação do grotesco,
aspectos do movimento literário do Barroco, bem como rebuscamento na forma.
Nesse hibridismo, o eu lírico é como se fosse uma esfinge que guarda o segredo, repleta de
aura de mistério. Começa a entender a alteridade e reconhecer o outro é reconhecer a si. Por fim,
há o processo de busca por idenficiação, por autoconhecimento, o que pode ser frustrante e
enlouquecedor, podendo culminar em cinzas. A ânsia de viver e a de morrer andam juntas, como diz
o psicanalista Sigmund Freud: os impulsos de eros e tânatos.

4.4 – “Vaidade”
Este soneto se encontra no Livro de Mágoas.

Sonho que sou a Poetisa eleita, Simbolismo/misticismo/republicanismo


Aquela que diz tudo e tudo sabe, elenca 3 verbos, só “dizer” é de ação
Que tem a inspiração pura e perfeita, anáfora: repetição no início do verso
Que reúne num verso a imensidade!

Sonho que um verso meu tem claridade sinestesia


Para encher o mundo! E que deleita hipérbole
Mesmo aqueles que morrem de saudade! Sebastianismo
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita! ou seja, o poeta

Sonho que sou Alguém cá neste mundo... ter sucesso, reconhecimento, “ser alguém” é só sonho
Aquela de saber vasto e profundo,
Aos pés de quem a Terra anda curvada! posição de submissão

E quando mais no céu eu vou sonhando, uso de locução verbal + verbo no gerúndio
E quando mais no alto ando voando,
Acordo do meu sonho... E não sou nada!... a realidade é frustrante

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Comentário geral
Só o título do soneto já é ambíguo. Vaidade pode remeter ao universo feminino, mas também
àquilo que é vão, passageiro, logo, humano. Então, o gênero feminino converge para o humanismo,
não está excluída dele. Ela se autoproclama poetisa da vaidade, mas há um vínculo subentendido
entre poetisa/profetisa. Então, o poema ganha uma aura mística, buscando uma perfeição que pode
ser parnasiana. Na mitologia greco-latina, as profetisas eram videntes, tinham o poder de desvendar
oráculos. A linguagem estava envolvida, portanto, com um plano desconhecido.
No plano da gramática, o pronome demonstrativo elenca ações: diz tudo e tudo sabe
(havendo inversão), tem a inspiração pura e perfeita (parnasiana) e reúne num verso a imensidade
(profetisa).
Ao dizer “Poetisa eleita”, possivelmente, ela poderia estar aludindo também à república
portuguesa, proclamada em 1910. Então, a poetisa tem inspiração como se remetesse ao poema
épico de Ilíada, em cujo começo o eu lírico também pede por inspiração às Musas. Logo, há
brincadeira com os gêneros textuais: é um soneto que se alça a épico.
Usa também figuras de linguagem como a anáfora (repetição no início do verso) e a sinestia
(um verso que tem cor). Nesse soneto, ela parece querer explorar temas históricos de Portugal, pois
quem morre de saudade pode aludir ao Sebastianismo.

Crença existente em Portugal de que o rei D. Sebastião (1554-


1578) voltaria um dia como uma espécie de messias para conduzir
Sebastianismo
o país a novas glórias; qualquer esperança messiânica da volta ao
poder de um dirigente carismático (dicionário Aulete).

A noção de imensidade e encher todo o mundo novamente lembra algo divino. Só Deus
conseguiria fazer isso, mas a Poetisa também o tenta. Poesia é poder, capaz de fazer mesmo a Terra
se curvar sobre a linguagem. Isto é, há uma hierarquia. No latim, há positio, uma posição forjada. E
quando mais alto o eu lírico voa, parece o mito de Ícaro, o qual voou tão perto do céu que teve suas
penas de suas asas de cera derretidas e caiu. A realidade é entendida como uma queda, isto é, a
volta à consciência é dura. E ela no fim se descobre um nada, lembrando os versos que iniciam o
poema “Tabacaria” de Álvaro de Campos, um heterônimo de Fernando Pessoa:

Não sou nada.


Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

É quase como se Florbela Espanca tivesse criado uma metafísica dos


pronomes: alguém/aquela ganham uma outra importância, conferindo
sempre uma eterna alteridade.

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Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO Três estrofes seguidas começa com a palavra “sonho”, ambígua, pois pode ser
verbo conjugado na primeira pessoa ou o próprio substantivo. No caso, é a
primeira opção. O eu lírico em primeira pessoa está no plano do sonho e
insiste nele. Temas importantes: universo feminino; republicanismo; épico;
Aqui o eu lírico segue mais o movimento literário do Parnasianismo.
VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
So-nho-que-sou-a-Po-e-ti-sae-lei-ta, (10 sílabas poéticas)
A-que-la-que-diz-tu-doe-tu-do-sa-be, (10 sílabas poéticas)
Que-tem-ains-pi-ra-ção-pu-rae-per-fei-ta, (10 sílabas poéticas)
Que-re-ú-ne-num-ver-soai-men-si-da-de! (10 sílabas poéticas)

So-nho-queum-ver-so-meu-tem-cla-ri-da-de (10 sílabas poéticas)


Pa-raen-cher-o-mun-do!-E-que-de-lei-ta (10 sílabas poéticas)
Mes-moa-que-les-que-mor-rem-de-sau-da-de! (10 sílabas poéticas)
Mes-moos-deal-ma-pro-fun-daein-sa-tis-fei-ta! (10 sílabas poéticas)

So-nho-que-sou-Al-guém-cá-nes-te-mun-do... (10 sílabas poéticas)


A-que-la-de-sa-ber-vas-toe-pro-fun-do, (10 sílabas poéticas)
Aos-pés-de-quem-a-Ter-raan-da-cur-va-da! (10 sílabas poéticas)

E-quan-do-mais-no-céu-eu-vou-so-nhan-do, (10 sílabas poéticas)


E-quan-do-mais-no-al-toan-do-vo-an-do, (10 sílabas poéticas)
A-cor-do-do-meu-so-nho...E-não-sou-na-da!... (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Regular. Versos decassílabos.
RIMAS Seguem o modelo ABAB/BABA/CCD/EED. As duas primeiras estrofes são
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Sonho que sou a Poetisa eleita, (1-4-8-10)
Aquela que diz tudo e tudo sabe, (6-8-10)
Que tem a inspiração pura e perfeita, (2-6-10)
Que reúne num verso a imensidade! (3-7-10)

Sonho que um verso meu tem claridade (1-4-10)


Para encher o mundo! E que deleita (3-5-10)
Mesmo aqueles que morrem de saudade! (3-6-10)
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita! (3-5-10)

Sonho que sou Alguém cá neste mundo... (1-6-10)


Aquela de saber vasto e profundo, (2-6-10)
Aos pés de quem a Terra anda curvada! (2-6-10)

E quando mais no céu eu vou sonhando, (2-6-10)

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E quando mais no alto ando voando, (2-6-10)


Acordo do meu sonho... E não sou nada!... (2-6-10)
FORMAS FIXAS Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito à volta à realidade, uma certa
frustração. Se o sonho era a fuga para a realidade, o acordar não traz nada
de bom.

4.5 – “Lágrimas Ocultas”


Este soneto se encontra no Livro de Mágoas.

Se me ponho a cismar em outras eras pensar em outros tempos, ambiguidade: nome/verbo


Em que ri e cantei, em que era q'rida,
Parece-me que foi noutras esferas, anáfora: repetição no início do verso
Parece-me que foi numa outra vida...

E a minha triste boca dolorida sinestesia


Que dantes tinha o rir das Primaveras, sentido temporal: retorno às origens
Esbate as linhas graves e severas
E cai num abandono de esquecida! condição de invisibilidade ou autoisolamento?

E fico, pensativa, olhando o vago...


Toma a brandura plácida dum lago
O meu rosto de monja de marfim... santidade, assume para si esse fardo

E as lágrimas que choro, branca e calma, pleonasmo


Ninguém as vê brotar dentro da alma! interioridade
Ninguém as vê cair dentro de mim!

Comentário geral
Aqui o eu lírico se mostra perfeitamente portuguesa, pois
sente nostalgia de outros tempos, vê-se numa condição que
está pensando no passado. E é sempre aquela máxima: o
passado é melhor que o presente. Lá é o lugar quando ela ria e
cantava, pairava outra atmosfera que não a de agora. Há uma
ambiguidade entre o substantivo “era” e o verbo no imperfeito
“era”, que são idênticos. Logo, há trocadilho. As lágrimas
indicam tristeza, mas poderiam muito bem ser as mesmas
daquelas choradas em “Mar português” de Fernando Pessoa:
“Ó mar salgado, quanto do teu sal /São lágrimas de Portugal!”
Porém, logo o eu lírico usa uma hipérbole: “parece que foi
em outra vida” e a imagem distorcida de uma boca lembra o
grotesco barroco. Uma série de exageros nos faz crer se o eu
lírico realmente está falando a verdade ou se, na verdade, não
está amplificando o sentido.

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Dos mesmos criadores do narrador em primeira pessoa não confiável, eu


lhes apresento o eu lírico em primeira pessoa não confiável. Quando ele
aparecer, utilizarei o símbolo ao lado. Frequentemente, Florbela Espanca
cria máscaras ficcionais para os seus eu líricos. No fundo, ela
constantemente nos faz questionar o quanto do que ela está nos expondo é
verdadeiro ou não.

Além disso, a temática das lágrimas, causadas por saudade e que lembram o mar é bem
importante para os portugueses. Eles não só valorizavam o mar (símbolo do império português,
pioneiro nas grandes navegações a partir da Escola de Sagres), como também o Rio Tejo.

Dúvida de Geografia? A professora Priscila Lima responde


Com a nascente localizada na Espanha (onde as variações de
altitude o encaminha para Portugal), o Rio Tejo é o mais extenso
da Península Ibérica. Margeando cidades importantes, esse rio
tem sua foz em um estuário na cidade de Lisboa, de onde muitas
embarcações partiram e marcaram o pioneirismo português nas
Grandes Navegações do século XV e XVI.

Continuando, o poema começa com uma oração subordinada adverbial condicional: “se me
ponho”, junto a verbo reflexivo. Estamos no plano da hipótese e não da realidade. No título, temos
um substantivo + adjetivo (adjunto adnominal). A questão do ocultismo lembra de novo o papel da
poetisa, que deveria desvelar significados. É preciso escavar pelo passado para buscar sentido.
E o passar do tempo indica um movimento orgânico, mas negativo. É como algo que apodrece
e se deteriora, estando sujeito ao efeito do tempo. Essa castidade à que ela se impõe parece forçada,
algo de antinatural. É negativa, pois paralisa: ela parece marfim. Aqui temos um paradoxo, num
poema que está falando sobre o passar do tempo, ao passo que o rosto do eu lírico se mostra
estanque como escultura.
O rosto dela é branco e calmo. A presença da cor lembra o movimento literário do
Simbolismo. A repetição no final soa como uma acusação: ninguém! Ninguém. O eu lírico quer
desesperadamente se fazer notar.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico revela uma vida de privações de quem quis ter realizações, grandes
feitos heroicos, concretizações na vida e no entanto não conseguiu. A
sensação é de vazio, tentando entender o processo pelo qual se chegou até
ali. Logo, há um resgate do passado por meio do pensamento. Temas

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 37


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importantes: santidade; trocadilho; passado, vazio, confiabilidade. Aqui o


poema segue predominantemente o Barroco/Simbolismo.
VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
Se-me-po-nhoa-cis-mar-em-ou-tras-e-ras (10 sílabas poéticas)
Em-que-ri-e-can-tei,-em-quee-ra-q'ri-da, (10 sílabas poéticas)
Pa-re-ce-me-que-foi-nou-tras-es-fe-ras, (10 sílabas poéticas)
Pa-re-ce-me-que-foi-nu-maou-tra-vi-da... (10 sílabas poéticas)

Ea-mi-nha-tris-te-bo-ca-do-lo-ri-da (10 sílabas poéticas)


Que-dan-tes-ti-nhao-rir-das-Pri-ma-ve-ras, (10 sílabas poéticas)
Es-ba-teas-li-nhas-gra-ves-e-se-ve-ras (10 sílabas poéticas)
E-cai-num-a-ban-do-no-dees-que-ci-da! (10 sílabas poéticas)

E-fi-co,-pen-sa-ti-va,o-lhan-doo-va-go... (10 sílabas poéticas)


To-maa-bran-du-ra-plá-ci-da-dum-la-go (10 sílabas poéticas)
O-meu-ros-to-de-mon-ja-de-mar-fim... (10 sílabas poéticas)

Eas-lá-gri-mas-que-cho-ro,-bran-cae-cal-ma, (10 sílabas poéticas)


Nin-guém-as-vê-bro-tar-den-tro-da-al-ma! (10 sílabas poéticas)
Nin-guém-as-vê-ca-ir-den-tro-de-mim! (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Regular. Versos decassílabos.
RIMAS Seguem o esquema: ABAB/BAAB/CCD/EED.
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Se me ponho a cismar em outras eras (3-6-10)
Em que ri e cantei, em que era q'rida, (3-6-10)
Parece-me que foi noutras esferas, (2-5-10)
Parece-me que foi numa outra vida... (2-5-10)

E a minha triste boca dolorida (3-5-10)


Que dantes tinha o rir das Primaveras, (2-4-6-10)
Esbate as linhas graves e severas (2-4-6-10)
E cai num abandono de esquecida! (2-6-10)

E fico, pensativa, olhando o vago... (2-6-10)


Toma a brandura plácida dum lago (4-6-10)
O meu rosto de monja de marfim... (3-6-10)

E as lágrimas que choro, branca e calma, (3-6-10)


Ninguém as vê brotar dentro da alma! (4-6-10)
Ninguém as vê cair dentro de mim! (4-6-10)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito ao processo autorreflexivo.
Envolve tanto queda (cair) quanto o movimento de olhar para dentro, que
pode significar olhar para si, para a sua alma, para o seu âmago.

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4.6 – “A Minha Dor”


Este soneto se encontra no Livro de Mágoas.
A você este soneto tem uma epígrafe, mas seu direcionamento é indeterminado

A minha Dor é um convento ideal a máscara adotada é a de santidade


Cheio de claustros, sombras, arcarias, ambiguidade: plenitude ou estafa
Aonde a pedra em convulsões sombrias
Tem linhas dum requinte escultural. repetição da preposição + Parnasianismo

Os sinos têm dobres de agonias personificação


Ao gemer, comovidos, o seu mal... pronomes possessivos: a dor é dela; o mal, dos outros
E todos têm sons de funeral sinestesia simbolista + apego à morte ultrarromântico
Ao bater horas, no correr dos dias... adjuntos adverbiais temporais

A minha Dor é um convento. Há lírios não mais ideal, mas as flores confortam
Dum roxo macerado de martírios, a cor remete à violência, sofrimento, mas também à flor
Tão belos como nunca os viu alguém! idealismo

Nesse triste convento aonde eu moro, repetição do pronome relativo de lugar


Noites e dias rezo e grito e choro, polissíndeto
E ninguém ouve... ninguém vê... ninguém... condição de invisibilidade

Comentário geral
Em vários momentos, Florbela Espanca assume um ar de coitadinha. Por exemplo, em
“Pobrezinha” de Reliquiae, “Mendiga” de Charneca em Flor e “Velhinha” no Livro de Mágoas. Então,
o autossacrifício consiste numa imagem recorrente em sua poesia. O eu lírico se abdica dos bens
materiais mundanos em prol de algo que considera maior, superior, ideal. Talvez, algo que nem
exista, só negando a realidade puramente.
O título do poema é composto de artigo definido + pronome possessivo + substantivo = a
minha dor. Porém, a epígrafe é para uma pessoa indeterminada. Então, neste soneto o eu lírico
brinca com a relação entre determinação x indeterminação. No primeiro verso há metáfora,
equiparando a Dor, elevada à condição divina, a um convento ideal.

Na filosofia, doutrina ou postura que reduz o ser ao pensamento, ao


espírito, à consciência, às ideias, considerados estes a base de
solução dos problemas filosóficos. eoria segundo a qual o mundo
material só pode ser compreendido plenamente a partir de sua
Idealismo verdade espiritual, mental ou subjetiva. Na estética, Doutrina, no
âmbito da arte, que sustenta ser a representação fictícia (de pessoa,
objeto, sensação etc.) mais satisfatória para o espírito do que a
realidade objetiva. (dicionário Aulete).

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Então, o eu lírico diz que sua dor é ideal e está presa em um convento, mas logo se revela
farta, cheia. Na realidade, há ambiguidade: em português, a expressão “cheio de” pode representar
plenitude, preenchimento; porém, “estar cheio de” pode indicar esgotamento, estafa. Então, pode
significar ambas as coisas, quando o eu lírico diz estar “Cheio de claustros, sombras, arcarias”. Pois
a dor envelhece, consome. E com pedras sobre pedras constrói-se um requinte escultural. Aqui, o
poema se aproxima da estética do Parnasinanismo.
Na segunda estrofe, os sinos se personificam e testemunham a dor do eu lírico. Eles também
sentem sua agonia, gemem seus gemidos, sente seu mal-estar, comovem-se. Os sons de funeral
lembram o apego à morte Ultrarromântico, mas ao mesmo tempo uma mistura de sensações típica
do Simbolismo. Portanto, é um poema bem variado de tendências. O som se mistura ao tempo, os
sinos marcam o passar das horas e tudo é triste.
Há a repetição de um verso, a insistência nele. Porém, com uma alteração:

A minha Dor é um convento ideal


A minha Dor é um convento Ø. Há lírios

O eu lírico parece abandonar o idealismo, mas depois fala de flores. As flores


são um recurso importante para Florbela Espanca. Seu nome é composto de Flor +
Bela e ela explora frequentemente essas imagens. Muitas cartas ela assina como
Bela, por exemplo, e nos sonetos constantemente as flores aparecem tanto como
elemento estético, símbolo de uma beleza ideal, natural, imanente, quanto como
um consolo para o eu lírico que está sofrendo. Ao menos há flores no mundo e a
beleza pode ser contemplada.
E os lírios aqui não são brancos, mas sim machudos, por isso, roxos. Florbela Espanca também
gosta de violetas e elas aparecem em outros poemas seus. As flores também são ideais, se nunca
foram vistas por ninguém, se são de cores que não correspondem à realidade. Parece haver um
conflito no eu lírico, que quer se desfazer do idealismo, mas sente-se presa a ele, tal monja num
convento, presa em sua cela.
Por fim, a dor é um lugar físico. E não importa a ação do eu lírico, seus apelos constantes,
ressaltados pelo conectivo aditivo: “Noites e dias rezo e grito e choro”, que as pessoas não a
enxergam. Mas há lírios que estão lá, suportando-lhe. Se ela contempla os lírios, os lírios a contempla
de volta. A mera existência dos lírios serve de existência para a vida abafada que leva.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico adota uma posição de monja, de santidade, de autossacrificada.
Fala de uma dor que não parece ser de mais ninguém, apenas exclusivamente
dela. Ou seja, toma a dor humana para si. Temas importantes: dor,
sofrimento, estafa, escultura, funeral, lírios, convento. Nesse soneto, o eu
lírico amalgama várias tendências: Parnasianismo, Ultrarromantismo,
Simbolismo.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 40


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VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a


última sílaba poética
A-mi-nha-Dor-é-um-con-ven-toi-de-al (11 sílabas métricas)
Chei-o-de-claus-tros,-som-bras,-ar-ca-ri-as, (10 sílabas métricas)
A-on-dea-pe-draem-con-vul-sões-som-bri-as (10 sílabas métricas)
Tem-li-nhas-dum-re-quin-tees-cul-tu-ral. (10 sílabas métricas)

Os-si-nos-têm-do-bres-dea-go-ni-as (9 sílabas métricas)


Ao-ge-mer,-co-mo-vi-dos,-o-seu-mal... (10 sílabas métricas)
E-to-dos-têm-sons-de-fu-ne-ral (9 sílabas métricas)
Ao-ba-ter-ho-ras,-no-cor-rer-dos-di-as... (10 sílabas métricas)

A-mi-nha-Dor-é-um-con-ven-to.Há-lí-ri-os (10 sílabas métricas)


Dum-ro-xo-ma-ce-ra-do-de-mar-tí-ri-os, (10 sílabas métricas)
Tão-be-los-co-mo-nun-caos-viu-al-guém! (10 sílabas métricas)

Nes-se-tris-te-con-ven-toa-on-deeu-mo-ro, (10 sílabas métricas)


Noi-tes-e-di-as-re-zoe-gri-toe-cho-ro, (10 sílabas métricas)
E-nin-guém-ou-ve...-nin-guém-vê...-nin-guém... (10 sílabas métricas)
MÉTRICA Mescla versos eneassílabos, decassílabos e hendecassílabos.
RIMAS Seguem o o esquema ABBA/BAAB/CCD/EED. Logo, os dois primeiros
quartetos são rimas interpoladas (intercaladas).
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
A minha Dor é um convento ideal (4-8-11)
Cheio de claustros, sombras, arcarias, (4-6-10)
Aonde a pedra em convulsões sombrias (4-8-10)
Tem linhas dum requinte escultural. (2-6-10)

Os sinos têm dobres de agonias (2-5-9)


Ao gemer, comovidos, o seu mal... (3-6-10)
E todos têm sons de funeral (2-5-9)
Ao bater horas, no correr dos dias... (4-8-10)

A minha Dor é um convento. Há lírios (4-8-10)


Dum roxo macerado de martírios, (2-6-10)
Tão belos como nunca os viu alguém! (2-6-10)

Nesse triste convento aonde eu moro, (3-6-10)


Noites e dias rezo e grito e choro, (4-6-8-10)
E ninguém ouve... ninguém vê... ninguém... (4-8-10)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito à solidão, pois o eu lírico sente
que, das pessoas humanas, ninguém a vê. Ela menciona a existência apenas
de lírios, que estão lá ajudando-a a absorve ra sua dor.

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4.7 – “Suavidade”
Este soneto se encontra no Livro de Sóror Saudade.

Pousa a tua cabeça dolorida imperativo


Tão cheia de quimeras, de ideal, Barroco: o pensamento é múltiplo e denso, pesado
Sobre o regaço brando e maternal imagem da maternidade feminina
Da tua doce Irmã compadecida. mas é uma maternidade não concretizada, pois ela é sóror

Hás-de contar-me nessa voz tão q’urida sentido de futuro: expressão há-de + infinitivo
A tua dor que julgas sem igual, projeção da dor: não é só mais dela
E eu, pra te consolar, direi o mal jogo entre eu e tu
Que à minha alma profunda fez a Vida. hipérbato

E hás-de adormecer nos meus joelhos... dormir = inconsciente


E os meus dedos enrugados, velhos, imagem de coitada envelhecida
Hão-de fazer-se leves e suaves... reticências vagas/morte como única saída possível

Hão-de pousar-se num fervor de crente,


Rosas brancas tombando docemente, adjetivação + imagem da queda
Sobre o teu rosto, como penas de aves... a cabeça do eu lírico quer pousar no rosto do amado

Comentário geral
Suavidade é não pensar. No Modernismo, não há espaço para o idealismo. O eu lírico já
começa o soneto com a cabeça dolorida de tanto pensar, de tantos pensamentos híbridos. O soneto
é baseado em ambiguidades. A primeira está no verbo “pousar”, que pode significar aterrissar ou
repousar, residir, situar-se. A cabeça então lembra um pássaro; os pensamentos movimento a
cabeça, que precisa descansar. Essa mesma imagem dialoga com a chave de ouro, com as penas de
aves. “Pousa a tua cabeça dolorida”, diz o eu lírico, quando na realidade é a mente dela que precisa
repousar, que precisa de descanso, alento, que pode ser tanto no regaço da mãe quanto no do
amado. Trata-se de uma ordem imperativa ainda, pois o verbo “pousar” está conjugado no modo
imperativo na segunda pessoa do singular. Há transferência de amor libidinal, exatamente como
diz Freud na formulação da teoria do Complexo de Édipo.
E a maternidade não se concretiza, pois ela
está ligada à religiosidade. Ao eu lírico não é
permitido esse dom. Florbela Espanca não teve
filhos. Em cartas, chega a se mostrar grávida uma
Fonte: Pixabay.

vez, mas não sabemos que ela teve tido filho. Faz
parte de mais umas ausências de sua vida.
Chamo atenção para o tempo futuro nesse
poema, pois ele está centrado numa espécie de
promessa vindora, esperada, mas que não chega.
Na segunda estrofe, mediante o jogo entre eu e tu,
há um diálogo possível, o eu lírico chega a pensar

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 42


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que será compreendida. Projeta a sua dor “sem igual” em outro alguém que também julga sua dor
como sendo sem igual. Tenta consolar o amado em seu regaço, a quem serve de amada e mãe ao
mesmo tempo. É pondo as suas dores juntas que eles vão se entender. Porque amar também
significa compartilhar dores.
O eu lírico assume então uma postura que lembra a Pietá, Nossa Senhora carregando Jesus
morto em seus braços, imagem de dor profunda e desoladora. Porém, é como se o eu lírico
assumisse uma santidade suprema, uma Santíssima Trindade: mãe, amada e Irmã. Daí, observa-se
a ambiguidade no termo “Irmã”, que pode ser sóror ou irmã humanista, irmã de dor. E nessa
condição divina o consolo é possível, a vida há-de se fazer leve e suave. A suavidade está nessa
apoteose, nesse ascensão ao plano divino.

Glorificação (de uma pessoa ou de algo) por meio de honrarias,


Apoteose láureas, elogios; inclusão entre os deuses; divinização; profusão de
luzes; cintilação; clarão (dicionário Aulete).

Seu fervor de crente, assumidamente confessado, lembra o do soneto “Fanatismo”. A


imagem da queda lembra uma condição Outonal: flores caem, a cabeça reclina, tudo tende à
retornar à Terra, ao seu estado original, puxadas por uma certa força de gravidade invisível. A
irmande é sinônimo de fraternidade. Parece haver um resgate desse ideal da Revolução Francesa no
mundo moderno, em que as pessoas precisam voltar a se ouvir. A irmandade é o humanismo, que
transcende a condição do casal, do relacionamento entre o homem que descansa a cabeça no seio
da mulher, mas também pode representar uma humanidade que precisa de consolo pós-Primeira
Guerra Mundial (esse poema está no Livro de Sóror Saudade, lançado em 1923). A cabeça dolorida
também pode simbolizar o mal-estar da civilização, tema que dá título a uma das obras de Freud.
A Vida também é um ideal, algo a ser almejado, procurado, desejado e vivido. Ela é possível,
quando há esse enlace, esse repousar de cabeça. Em “q’rida” há prosódia portuguesa. Na realidade,
sempre que houver esses apóstrofos no meio das palavras.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO A mulher assume para si a condição de mãe e amada, uma religiosa Pietá,
consoladora. Encontra sentido na vida ao aliviar sua dor podendo aliviar a dos
outros. Porém, além de mãe e amada também é Irmã. Temas importantes:
trindade, maternidade, idealismo, pensamento, voo, movimento, Irmã, vida,
morte, queda. Nesse soneto, misturam-se as seguintes tendências:
Modernismo e Barroco.
VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
Pou-saa-tu-a-ca-be-ça-do-lo-ri-da (10 sílabas poéticas)
Tão-chei-a-de-qui-me-ras,-dei-de-al, (10 sílabas poéticas)
So-breo-re-ga-ço-bran-doe-ma-ter-nal (10 sílabas poéticas)
Da-tu-a-do-ceIr-mã-com-pa-de-ci-da. (10 sílabas poéticas)

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 43


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Hás-de-con-tar-me-nes-sa-voz-tão-q’uri-da (10 sílabas poéticas)


A-tu-a-dor-que-jul-gas-sem-i-gual, (10 sílabas poéticas)
Eeu,-pra-te-con-so-lar,-di-rei-o-mal (10 sílabas poéticas)
Queà-mi-nhaal-ma-pro-fun-da-fez-a-Vi-da. (10 sílabas poéticas)

E-hás-dea-dor-me-cer-nos-meus-jo-e-lhos... (10 sílabas poéticas)


E-os-meus-de-dos-en-ru-ga-dos,-ve-lhos, (10 sílabas poéticas)
Hão-de-fa-zer-se-le-ves-e-su-a-ves... (10 sílabas poéticas)

Hão-de-pou-sar-se-num-fer-vor-de-cren-te, (10 sílabas poéticas)


Ro-sas-bran-cas-tom-ban-do-do-ce-men-te, (10 sílabas poéticas)
So-breo-teu-ros-to,-co-mo-pe-nas-dea-ves... (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Regular. Versos decassílabos.
RIMAS Seguem o esquema ABBA/ABBA/CCD/EED. As primeiras estrofes seguem
rimas interpoladas (intercaladas).
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Pousa a tua cabeça dolorida (2-6-10)
Tão cheia de quimeras, de ideal, (2-6-10)
Sobre o regaço brando e maternal (4-6-10)
Da tua doce Irmã compadecida. (2-5-10)

Hás-de contar-me nessa voz tão q’urida (4-8-10)


A tua dor que julgas sem igual, (4-6-10)
E eu, pra te consolar, direi o mal (1-6-10)
Que à minha alma profunda fez a Vida. (3-6-10)

E hás-de adormecer nos meus joelhos... (2-6-10)


E os meus dedos enrugados, velhos, (4-8-10)
Hão-de fazer-se leves e suaves... (4-6-10)

Hão-de pousar-se num fervor de crente, (4-8-10)


Rosas brancas tombando docemente, (3-6-10)
Sobre o teu rosto, como penas de aves... (4-8-10)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro remonta ao início do poema. A mente
voadora em movimento precisa de um lugar para descansar. As rosas pousam
como penas de aves. O eu lírico pode sossegar apenas quando morrer, que é
o fim de todos os pensamentos.

4.8 – “Se Tu Viesses Ver-Me”


Este soneto se encontra no livro Charneca em Flor.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 44


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Se tu viesses ver-me hoje à tardinha, imagem do crepúsculo


A essa hora dos mágicos cansaços, inversão, misticismo, fuga da realidade
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços...

Quando me lembra: esse sabor que tinha repetição da conjunção temporal


A tua boca... o eco dos teus passos... excesso de reticências condiz com o sentimentalismo
O teu riso de fonte... os teus abraços... repetição da preposição “de”
Os teus beijos... a tua mão na minha... adjunto adverbial de lugar

Se tu viesses quando, linda e louca,


Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri

E é como um cravo ao sol a minha boca...


Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...

Comentário geral
O título do poema começa com uma conjunção de condicionalidade. Que ele vá vê-la não é
certeza, apenas uma hipótese, uma conjectura, um desejo. O título expõe o desejo de laço, união,
pois contém as duas pessoas gramaticais: o pronome “tu” e o pronome oblíquo átono “me”. “Tu”
está colocado na posição de sujeito e “me” na posição de objeto. Isto é, já desde o título e por meio
da gramática, o eu lírico está na posição de objeto, gramatical ou de amor. A ênclise em “ver-me”
indica a prosódia portuguesa. O crepúsculo é o momento mais bonito do dia para o eu lírico. É um
tempo propício, a hora do dia que tudo perdoa.
A noite é um espaço mágico. Na verdade, o eu lírico une no
elemento da noite o tempo e o espaço. Este poema se encontra em
Charneca em Flor, livro de 1931. Já em 1905 o físico alemão Albert
Fonte: Pixabay.

Einstein publicou a sua moderna Teoria da Relatividade, dizendo que


as noções de tempo e espaço podem ser relativas. Ora, Florbela
Espanca encara esse modernismo, inclusive científico. Pois sua noite
é um tempo e um espaço. O sentido temporal é reforçado pela
repetição da conjunção temporal “quando”. A imagem de tardinha
também lembra o crepúscula, um intermediário entre dia e noite,
também se remontando à ideia de queda, a queda do sol e a
ascensão da lua. E num plano mais geral o decadentismo, a transição
do século XIX para o XX.
E, ao mesmo tempo, parece ser moderna, mas está falando de um tema tradicional, lírico, o
enlace amoroso. Há sentimentalismo exacerbado e o apelo às sensações se adequa ao Simbolismo.
O estar da mão do amado na da amada também é um lugar. A segunda estrofe é essencialmente
descritiva, de atributos do objeto de adoração. No entanto, tudo permanece no plano da memória,
pois o encontro real ainda não se concretizou.
No primeiro terceto, o eu lírico chama o tu de “linda e louca” e aí parece haver um conflito:
ela está falando dela ou dele? A quem se refere essa flexão de gênero no feminino? O eu lírico ou

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 45


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parece estar lançando ambiguidades propositais ou começa a indicar um estado de loucura,


evidenciado justamente nesse adjunto adnominal (os adjetivos) interpolados na sentença. Quer
dizer, a espera enlouquece. O superlativo no dulcíssimas só ressalta mais o campo das sensações. A
seda é vermelha e a representação imagética das cores simbolista.
No último terceto, a alusão ao cravo é importante, pois Portugal passou por um episódio
histórico chamado justamente Revolução dos Cravos (25 de abril de 1974). No fim da ditadura
salazarista, o cravo enquanto flor nacional funcionou como símbolo de agracedimento que a
população distribuiu aos soldados rebeldes. Acompanhe a letra de música abaixo sobre o assunto.
Consiste na música “Tanto mar” do compositor e intérprete brasileiro Chico Buarque. Lembrando
que o álbum “Construção” também compõe o repertório da UFRGS 2021.

Foi bonita a festa, pá


Fiquei contente
E inda guardo, renitente
Um velho cravo para mim

Já murcharam tua festa, pá


Mas certamente
Esqueceram uma semente
Nalgum canto do jardim

Sei que há léguas a nos separar


Tanto mar, tanto mar
Sei também quanto é preciso, pá
Navegar, navegar

Os olhos cerrados do último terceto também lembram inconsciência. Essa metáfora dos olhos
fechados se repete em outros poemas de Florbela Espanca. Seus braços se estendem numa
dispositivo de fervor, que pode ser tanto de êxtase religioso quanto de entrega amorosa.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico funde tempo e espaço na noite, esse símbolo místico, signo da
espera. A lembrança é descritiva, mas permanece na memória. Os braços
elevados indicam apelo, oração, louvor. Temas importantes: crepúsculo,
noite, tempo, espaço, misticismo, loucura. Nesse soneto, as tendências
predominantes são: Simbolismo e Modernismo.
VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
Se-tu-vi-es-ses-ver-me-ho-jeà-tar-di-nha, (11 sílabas poéticas)
Aes-sa-ho-ra-dos-má-gi-cos-can-sa-ços, (10 sílabas poéticas)
Quan-doa-noi-te-de-man-so-sea-vi-zi-nha, (10 sílabas poéticas)
E-me-pren-des-ses-to-da-nos-teus-bra-ços... (10 sílabas poéticas)

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 46


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Quan-do-me-lem-bra:-es-se-sa-bor-que-ti-nha (10 sílabas poéticas)


A-tu-a-bo-ca...o-e-co-dos-teus-pas-sos... (10 sílabas poéticas)
O-teu-ri-so-de-fon-te...os-teus-a-bra-ços... (10 sílabas poéticas)
Os-teus-bei-jos...-a-tu-a-mão-na-mi-nha... (10 sílabas poéticas)

Se-tu-vi-es-ses-quan-do,-lin-dae-lou-ca, (10 sílabas poéticas)


Tra-çaas-li-nhas-dul-cís-si-mas-dum-bei-jo (10 sílabas poéticas)
Eé-de-se-da-ver-me-lhae-can-tae-ri (10 sílabas poéticas)

Eé-co-moum-cra-voao-sol-a-mi-nha-bo-ca... (10 sílabas poéticas)


Quan-doos-o-lhos-se-me-cer-ram-de-de-se-jo... (11 sílabas poéticas)
Eos-meus-bra-ços-sees-ten-dem-pa-ra-ti... (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Oscila entre decassílabos e hendecassílabos.
RIMAS Seguem o esquema: ABAB/ABAB/CDE/CDE. Os dois primeiros quartetos
seguem rimas alternadas ou cruzadas.
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Se tu viesses ver-me hoje à tardinha, (4-6-11)
A essa hora dos mágicos cansaços, (3-6-10)
Quando a noite de manso se avizinha, (3-6-10)
E me prendesses toda nos teus braços... (4-6-10)

Quando me lembra: esse sabor que tinha (4-6-10)


A tua boca... o eco dos teus passos... (3-5-10)
O teu riso de fonte... os teus abraços... (3-6-10)
Os teus beijos... a tua mão na minha... (3-8-10)

Se tu viesses quando, linda e louca, (4-6-10)


Traça as linhas dulcíssimas dum beijo (3-6-10)
E é de seda vermelha e canta e ri (3-6-10)

E é como um cravo ao sol a minha boca... (4-6-10)


Quando os olhos se me cerram de desejo... (3-7-10)
E os meus braços se estendem para ti... (3-6-10)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito a uma dispositio, uma posição
que o eu lírico assume para suplicar, pedir aos céus pela chegada de seu
amado.

4.9 – “Ser Poeta”


Este soneto se encontra no livro Charneca em Flor.

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior ambiguidade: ser poeta é ser e não ser humano
Do que os homens! Morder como quem beija! comparação: grau e figura de linguagem

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É ser mendigo e dar como quem seja postura de autossacrifício; o artista é um doador
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor! assim na terra como no céu: apoteose do poeta

É ter de mil desejos o esplendor hipérbole


E não saber sequer que se deseja! índice de indeterminação do sujeito: generalização
É ter cá dentro um astro que flameja, sente-se celeste, divina, superiora, orgulhosa
É ter garras e asas de condor! terceira geração romântica da lírica brasileira

É ter fome, é ter sede de Infinito! é ser perturbado, insatisfeito


Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito! poder de síntese da arte

E é amar-te, assim, perdidamente... a arte também passa pelo plano amoroso


É seres alma, e sangue, e vida em mim incorporação, encarnação + polissíndeto
E dizê-lo cantando a toda a gente! universalidade, abrangência

Comentário geral
”Ser poeta” e não “Ser poetisa” é o título do soneto. O eu lírico se coloca numa condição
universal, generalizada, em que a flexão gramatical de gênero parece não lhe importar muito nesse
caso. O título é ambíguo, pois é formado de verbo na forma nominal do infinitivo + substantivo. E
não é um verbo qualquer, é um verbo de ligação. Logo, o poema é baseado em definições do que
seria cumprir esse papel de poeta. O eu lírico está tateando a existência do poeta. E ainda há
ambiguidade, porque depois do verbo de ligação, geralmente vem um adjetivo e não um
substantivo. Logo, o questionamento filosófico levantado é: ser poeta é um substantivo ou um
adjetivo? É um cargo funcional ou um papel para toda a vida.
Para esse tema, sugiro a leitura do conto “Teoria do medalhão”
do realista brasileiro Machado de Assis, em que o escritor discute
justamente essas duas classes morfológicas de palavras.
Portanto, o soneto tem cunho metalinguístico. E também Florbela Espanca dialoga com o
poema do clássico Luis de Camões, “Amor é fogo que arde sem se ver”, composto por uma série de
definições do que seria o amor. E “morder como quem beija”, além de indicar sadomasoquismo,
uma vertente erótica, lembra os versos do pré-modernista brasileiro, Augusto dos Anjos, quando ele
diz em seus “Versos íntimos”: “Escarra nessa boca que te beija!”.
Ser poeta tem algo a ver com ser irreal, ser impossível, uma vez
que o Reino dos Céus religioso só é acessível para os bem-aventurados
após a morte. Logo, há um paradoxo temporal: ser poeta seria estar
morto?
O poeta é um diferenciado; há algo nele que o distingue dos
comuns. É passar por tudo, é se submeter em busca do Infinito. É primar
pela liberdade e ao mesmo tempo utilizar a forma fixa do soneto. O
soneto que é uma forma síntese. Então, o poeta é aquele capaz de
sintetizar, como diria o filósofo alemão Friedrich Hegel em sua dialética:
capacidade de unir teses e antíteses em sínteses.
Qual seria o átomo da poesia? O condensamento do mundo em
um grito, um verso, um soneto? A unidade mínima está sendo

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 48


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questionada. E é preciso falar de poesia para falar do amor. O amado aparece no último terceto, em
forma de pronome oblíquo: “amar-te” é “cantar-te”. O maior, mais nobre e mais digno objeto da
poesia ainda continua sendo o mesmo do amor.

Esse soneto encontra-se em forma musicada e


cantada por Luís Represas.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico usa o pretexto de falar da poesia para poder falar do amor.
Enumera uma série de conceitos, quando, no fundo, o conteúdo se revela
sendo o amado. Temas importantes: metalinguagem, superioridade, orgulho,
amor. Nesse soneto, as tendências predominantes são: Classicismo e
Parnasianismo.
VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
Ser-po-e-taé-ser-mais-al-to,é-ser-mai-or (11 sílabas poéticas)
Do-queos-ho-mens!-Mor-der-co-mo-quem-beija! (10 sílabas poéticas)
É-ser-men-di-goe-dar-co-mo-quem-se-ja (10 sílabas poéticas)
Rei-do-Rei-no-deA-quém-e-deA-lém-Dor! (10 sílabas poéticas)

É-ter-de-mil-de-se-jos-oes-plen-dor (10 sílabas poéticas)


E-não-sa-ber-se-quer-que-se-de-se-ja! (10 sílabas poéticas)
É-ter-cá-den-troum-as-tro-que-fla-me-ja, (10 sílabas poéticas)
É-ter-gar-ras-ea-sas-de-con-dor! (9 sílabas poéticas)

É-ter-fo-me,-é-ter-se-de-deIn-fi-ni-to! (11 sílabas poéticas)


Por-el-mo,as-ma-nhãs-deoi-ro-e-de-ce-tim... (11 sílabas poéticas)
É-con-den-sar-o-mun-do-num-só-gri-to! (10 sílabas poéticas)

Eé-a-mar-te,as-sim,-per-di-da-men-te... (9 sílabas poéticas)


É-se-res-al-ma,e-san-gue,e-vi-dae-mim (11 sílabas poéticas)
E-di-zê-lo-can-tan-doa-to-daa-gen-te! (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Oscila entre eneassílabos, decassílabos e hendecassílabos.
RIMAS Seguem o esquema: ABBA/ABBA/CDE/CDE. Os dois primeiros quartetos
seguem as rimas interpoladas ou intercaladas.
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Ser poeta é ser mais alto, é ser maior (3-7-11)
Do que os homens! Morder como quem beija! (3-6-10)

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É ser mendigo e dar como quem seja (4-6-10)


Rei do Reino de Aquém e de Além Dor! (3-6-10)

É ter de mil desejos o esplendor (2-6-10)


E não saber sequer que se deseja! (2-6-10)
É ter cá dentro um astro que flameja, (2-6-10)
É ter garras e asas de condor! (3-6-9)

É ter fome, é ter sede de Infinito! (3-6-11)


Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim... (2-6-11)
É condensar o mundo num só grito! (4-6-10)

E é amar-te, assim, perdidamente... (3-5-9)


É seres alma, e sangue, e vida em mim (3-6-11)
E dizê-lo cantando a toda a gente! (3-5-10)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito à universalidade, capacidade do
poeta tanto de abranger mais gente em seu conteúdo, poder falar de mais
gente, mais nações que não a sua própria, quanto poder falar A mais gente,
essa gente também o direcionamento de sua poesia. O seu público-alvo.

4.10 – “Fumo”
Este soneto se encontra no Livro de Sóror Saudade.

Longe de ti são ermos os caminhos, anda perdida novamente + anáforas


Longe de ti não há luar nem rosas; conectivo de adição na negativa = verbo + substantivo
Longe de ti há noites silenciosas, ausência de som é o oposto da musicalidade
Há dias sem calor, beirais sem ninhos!

Meus olhos são dois velhos pobrezinhos metáfora + personificação + autossacrifício


Perdidos pelas noites invernosas... uso de particípio e adjetivação
Abertos, sonham mãos cariciosas,
Tuas mãos doces plenas de carinhos!

Os dias são Outonos: choram... choram... imagem de queda + repetição


Há crisântemos roxos que descoram... as flores se empalidecem
Há murmúrios dolentes de segredos... a poetisa é uma esfinge

Invoco o nosso sonho! Estendo os braços! convida a participar do sonho + posicionamento


E ele é, ó meu amor pelos espaços, tertium datum: um terceiro elemento
Fumo leve que foge entre os meus dedos... embriaguez; Paraísos artificais de Baudelaire

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 50


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Comentário geral
O eu lírico coloca o “ti” numa posição de
dependência, mais do que física até, química. O amado
é uma condição necessária para a sobrevivência do eu
lírico, pois, como é indicado por meio da repetição da
anáfora, na estrutura sintática “longe de ti” só há
elementos negativos: “longe de ti” + verbos como
“ser” e “haver”, e o “haver” envolvido num jogo: no
segundo verso na negativa e no terceiro na afirmativa.
Essa dependência beira o desespero, o parasitismo. Há
várias hipérboles que sugerem que sem o amado o eu
lírico não pode viver. O eu lírico projeta no “ti” todas
as suas frustrações e desesperanças.
Os olhos são personificados, são uns
coitadinhos. De tanto chorarem e sofrerem se tornam
roxos igual crisântemos. No soneto “A Minha Dor”, os
lírios também se tornam roxos. Então, o amor não
correspondido é esse sofrimento capaz de
transformar a cor das cores, mesmo as naturais.
Os olhos sonham e estão perdidos, mas abertos ao mesmo tempo. As mãos também sonham,
personificadas. Só há imagens noturnas, de noites que são ora silenciosas (sem música, portanto,
sem vida), ora invernosas (indica estação temporal). E do inverno não sucede estação melhor, pois
vem o Outono, com sua imagem de queda. Só as mãos dele são plenas de carinho, pois o dias de
Outono, também eles personificados, tudo o que fazem é chorar. O choro é uma ação que se repete,
insistente. O sentimento extravasa o peito; a alma não dá conta dele. Na imagem acima, o eu lírico
não sente vontade de viver. Espera a morte, descomposta, deitada em sua cama de crisântemos
rosas/roxos (depende do ponto de vista) e cravos amarelos.
A cor foge das flores, do rosto, a vida se esvai. Há apelo desesperado, há invocação, que
lembra o fervor religioso. Porém, há um elemento interessante: um tertium datum. No verso, “E ele
é, meu Amor”, parte-se do pressuposto que “ele” não coincide com “meu Amor”. Logo, só pode ser
outra pessoa, mas quem? O Amor está deificado, como é de costume, mas “ele” aparece com letra
minúscula. No fundo, tudo o que é sólido se desmancha no ar. O fumo foge entre os dedos, a vida
escoe pelos dedos também. Tudo é vago. A atmosfera simbolista está consolidada. O sonho também
se embruma, se envolve no fumo. Nada mais tem consistência e há perda da noção da realidade,
como se fosse uma onda de torpor, embriaguez.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico sente dependência química pelo amado. Longe dele, não consegue
se sustentar, sua vida não tem sentido, está imobilizada numa inação. Os dias
são como Outonos, tristes, e até as rosas incorporam cores tristes. No fim, o
eu lírico se encontra em apelo, invocação. Temas importantes: embriaguez;
fuga da realidade; paraísos artificiais. A escola predominante desse poema é
o Simbolismo.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 51


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VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a


última sílaba poética
Lon-ge-de-ti-são-er-mos-os-ca-mi-nhos, (10 sílabas poéticas)
Lon-ge-de-ti-não-há-lu-ar-nem-ro-sas; (10 sílabas poéticas)
Lon-ge-de-ti-há-noi-tes-si-len-ci-o-sas, (11 sílabas poéticas)
Há-di-as-sem-ca-lor,-bei-rais-sem-ni-nhos! (10 sílabas poéticas)

Meus-o-lhos-são-dois-ve-lhos-po-bre-zi-nhos (10 sílabas poéticas)


Per-di-dos-pe-las-noi-tes-in-ver-no-sas... (10 sílabas poéticas)
A-ber-tos,-so-nham-mãos-ca-ri-ci-o-sas, (10 sílabas poéticas)
Tu-as-mãos-do-ces-ple-nas-de-ca-ri-nhos! (10 sílabas poéticas)

Os-di-as-são-Ou-to-nos:-cho-ram...-cho-ram... (10 sílabas poéticas)


Há-cri-sân-te-mos-ro-xos-que-des-co-ram... (10 sílabas poéticas)
Há-mur-mú-rios-do-len-tes-de-se-gre-dos... (10 sílabas poéticas)

In-vo-coo-nos-so-so-nho!-Es-ten-doos-bra-ços! (11 sílabas poéticas)


Ee-le-é,-ó-meu-a-mor-pe-los-es-pa-ços, (11 sílabas poéticas)
Fu-mo-le-ve-que-fo-geen-treos-meus-de-dos... (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Oscilam entre decassílabos e hendecassílabos.
RIMAS Seguem o esquema ABBA/ABBA/CCD/EED. Os dois quartetos seguem as rimas
interpoladas ou intercaladas.
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Longe de ti são ermos os caminhos, (1-4-6-10)
Longe de ti não há luar nem rosas; (1-4-8-10)
Longe de ti há noites silenciosas, (1-4-6-11)
Há dias sem calor, beirais sem ninhos! (2-6-8-10)

Meus olhos são dois velhos pobrezinhos (2-4-10)


Perdidos pelas noites invernosas... (2-6-10)
Abertos, sonham mãos cariciosas, (2-4-6-10)
Tuas mãos doces plenas de carinhos! (1-4-6-10)

Os dias são Outonos: choram... choram... (2-6-10)


Há crisântemos roxos que descoram... (3-6-10)
Há murmúrios dolentes de segredos... (3-6-10)

Invoco o nosso sonho! Estendo os braços! (2-4-6-8-11)


E ele é, ó meu amor pelos espaços, (2-6-11)
Fumo leve que foge entre os meus dedos... (3-6-10)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito aos paraísos artificiais, ao fumo
que escorre entre os dedos, à irrealidade.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 52


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4.11 – “Frêmito do Meu Corpo”


Este soneto se encontra no Charneca em Flor. Lá, ele não está intitulado, mas
sim compõe uma série de poemas, consistindo no soneto III de X. Seu título é
dado de acordo com o primeiro verso.

III
Frémito do meu corpo a procurar-te, saga do eu lírico que procura
Febre das minhas mãos na tua pele estado de embriaguez, anormalidade, doença
Que cheira a âmbar, a baunilha e a mel, pronome relativo + sinestesia
Doído anseio dos meus braços a abraçar-te, repetição da construção: a + infinitivo; pleonasmo

Olhos buscando os teus por toda a parte, personificação + hipérbole


Sede de beijos, amargor de fel, ambiguidade: necessidade ou depositório?
Estonteante fome, áspera e cruel,
Que nada existe que a mitigue e a farte! insatisfação, insaciedade

E vejo-te tão longe! Sinto tua alma sensibilidade à flor da pele: sentir o insentido
Junto da minha, uma lagoa calma,
A dizer-me, a cantar que não me amas... fofoca, personificação, desolação, frustração

E o meu coração que tu não sentes, poeta da percepção aguçada x amado indiferente
Vai boiando ao acaso das correntes, gerúndio + fluidez
Esquife negro sobre um mar de chamas... paradoxo: morte e vida

Comentário geral
Esse poema integra uma série de dez poemas. Logo, ao intitulá-los com números romanos e
ter uma projeção serial de extensão um pouco maior que a do próprio soneto, Florbela Espanca
parece pretender se aventurar no épico.
O corpo passa por frêmito, está em estado de choque. A procura provoca uma espécie de
exaustão. As mãos estão quentes de febre, querendo passar esse calor também para o corpo do
amado. O pronome relativo “Que” o qual inicia o terceiro verso é ambíguo: não se sabe se ele se
remete ao que vem imediatamente anteriormente, “pele” ou se se remete à “febre”. Essa
ambiguidade é gerada gramaticalmente.
Esse estado de confusão em que se encontra o eu lírico lhe faz confundir os sentidos. Sente o
gosto de baunilha e mel, logo, gostos adocicados, ao mesmo tempo em que enxerga a cor âmbar. O
anseio é doido e doído, ao mesmo tempo, de forma que o tema da loucura, junto com a febre,
também está posto aí.
Os sentidos são aflorados. Ela sente sede, ou os seus beijos têm sede? Seus olhos buscam,
como que personificados. Também eles participam dessa busca. Paradoxalmente à primeira estrofe,
o gosto evocado na segunda estrofe é o amargor do veneno. O veneno também lembra “Fumo”,
como se fosse uma droga, algo tóxico, que faz mal. Por isso, ela sente mal-estar, tontura. Sente
também fome, trata-se de uma eterna insaciabilidade não só espiritual, como também sensorial.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 53


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Ela está incompleta. Pensa que o vê de longe, mas como ter certeza? Apenas sente uma
intuição de que ele está perto. Há um elemento da natureza, um lago, que transmite ideia de calma,
mas ao mesmo tempo, fluidez. E esse lago é inxerido, personifica-se e conta ao eu lírico uma fofoca:
ele não te ama, ele não te quer.
O amado é indiferente para com o eu lírico. Seu coração sente e sofre sem ser percebido. Há
novamente a condição da invisibilidade. O coração boia e flui, embora esse fluxo conduza mais à
morte (esquife negro) e à perdição (mar de chamas) do que à vida.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico está numa eterna saga de procura. O amado é indiferente para com
ela. Os sentimentos estão à flor da pele, tanto é que o eu lírico se fia neles.
Temas importantes: confusão, sensação, loucura, insaciabilidade, intuição.
Esse soneto segue predominantemente o movimento do Simbolismo.
VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
III
Fré-mi-to-do-meu-cor-poa-pro-cu-rar-te, (10 sílabas poéticas)
Fe-bre-das-mi-nhas-mãos-na-tu-a-pe-le (10 sílabas poéticas)
Que-chei-raa-âm-bar,-a-bau-ni-lha-ea-mel, (11 sílabas poéticas)
Do-í-doan-sei-o-dos-meus-bra-ços-aa-bra-çar-te, (12 sílabas poéticas)

O-lhos-bus-can-doos-teus-po-to-daa-par-te, (11 sílabas poéticas)


Se-de-de-bei-jos,-a-mar-gor-de-fel, (10 sílabas poéticas)
Es-ton-te-an-te-fo-me,-ás-pe-rae-cru-el, (12 sílabas poéticas)
Que-na-dae-xis-te-quea-mi-ti-guee-a-far-te! (11 sílabas poéticas)

E-ve-jo-te-tão-lon-ge!-Sin-to-tu-aal-ma (11 sílabas poéticas)


Jun-to-da-mi-nha,-u-ma-la-go-a-cal-ma, (11 sílabas poéticas)
A-di-zer-me,-a-can-tar-que-não-me-a-mas... (11 sílabas poéticas)

E-o-meu-co-ra-ção-que-tu-não-sen-tes, (10 sílabas poéticas)


Vai-boi-an-doao-a-ca-so-das-cor-ren-tes, (10 sílabas poéticas)
Es-qui-fe-ne-gro-so-breum-mar-de-cha-mas... (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Oscilam decassílabos, hendecassílabos e dodecassílabos.
RIMAS Seguem o esquema: ABB*A/ABBA/CCD/EED. “Pele” não rima exatamente
com “mel”, mas a rima foi considerada. Os quartetos seguem as rimas
interpoladas ou intercaladas.
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
III
Frémito do meu corpo a procurar-te, (1-6-10)
Febre das minhas mãos na tua pele (1-6-10)
Que cheira a âmbar, a baunilha e a mel, (2-4-8-11)
Doído anseio dos meus braços a abraçar-te, (2-5-9-12)

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 54


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Olhos buscando os teus por toda a parte, (1-4-6-11)


Sede de beijos, amargor de fel, (1-4-8-10)
Estonteante fome, áspera e cruel, (4-6-8-12)
Que nada existe que a mitigue e a farte! (2-4-8-11)

E vejo-te tão longe! Sinto tua alma (2-6-11)


Junto da minha, uma lagoa calma, (4-9-11)
A dizer-me, a cantar que não me amas... (3-7-11)

E o meu coração que tu não sentes, (4-10)


Vai boiando ao acaso das correntes, (3-6-10)
Esquife negro sobre um mar de chamas... (2-4-8-10)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito a um paradoxo: união de morte
(esquife negro) e vida/perdição (mar de chamas).

4.12 – “Realidade”

Este soneto se encontra no livro Charneca em Flor.

Em ti o meu olhar fez-se alvorada, Iluminismo, racionalidade, foge dos padrões anteriores
E a minha voz fez-se gorjeio de ninho, processo de naturalização: VL + predicativo
E a minha rubra boca apaixonada
Teve a frescura pálida do linho. mistura de cores

Embriagou-me o teu beijo como um vinho embriaguez, inconsciência, paraísos artificiais


Fulvo* de Espanha, em taça cinzelada, Parnasianismo
E a minha cabeleira desatada descomposta, enloquecida
Pôs a teus pés a sombra dum caminho. um empecilho, um obstáculo, um fantasma

Minhas pálpebras são cor de verbena, vampiresca, planta com propriedades místicas
Eu tenho os olhos garços**, sou morena, autodescrição
E para te encontrar foi que eu nasci... objetivo de vida

Tens sido vida fora o meu desejo, externaliza o sentimento


E agora, que te falo, que te vejo, invocação do tu
Não sei se te encontrei, se te perdi... perdição (moral, desnorteamento) que também o envolve
*fulvo = a cor amarela queimada, louro dourado ou castanho-avermelhado (dicionário Aulete).
**garço = diz-se de olho verde-azulado ou esverdeado, sinônimo de gázeo (dicionário Aulete).

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Comentário geral
A realidade é uma possibilidade, concretizada (o tempo verbal utilizado é pretérito perfeito):
“fez-se”. Há uma brincadeira com a classe morfológica das palavras, pois depois do verbo de ligação
há substantivo – alvorada – e não adjetivo. Essa realização só é possível no olhar dele; logo, o eu
lírico ainda sofre dessa dependência.
Há uma enumeração de órgãos de sentidos: olhar, voz, boca. Existe a representação das cores
e alusão ao frescor da natureza. O gorjeio do ninho indica musicalidade, vida natural, e o linho
lembra a própria tessitura do texto. Porém, nesse poema a paixão passa pela iluminação; a
atmosfera aqui não é mais de pura dor e sofrimento. Pode-se até falar de certo resgate de ideiais
iluministas.

Movimento filosófico e literário do séc. XVIII, caracterizado por


Iluminismo profunda crença no poder da razão humana e da ciência como
forças propulsoras do progresso da humanidade; Ilustração;
Filosofia das Luzes (dicionário Aulete).

O eu lírico faz um autorretrato de si; descreve-se, que tange ao individualismo. Lembrando


que a crença no indivíduo também era um dos valores iluministas. Ela própria é matéria de poesia.
Tudo passa pelo crivo da perfeição, até utensílios domésticos como a taça. Há menção a um país
vizinho de Portugal, a Espanha, que aqui é representada em um tom de amarelo, como o de sua
bandeira.
Por fim, ao mesmo tempo ela não sabe se perde ou se encontra o amado. A ideia semântica
transmitida é simultaneamente a de condição e alternância. Ela atinge certos resultados gramaticais
que colaboram para o efeito de ambiguidade.

(QUESTÃO AUTORAL – LUANA/2020)

Realidade – Florbela Espanca


(...)
Minhas pálpebras são cor de verbena,
Eu tenho os olhos garços, sou morena,
E para te encontrar foi que eu nasci...

Tens sido vida fora o meu desejo,


E agora, que te falo, que te vejo,
Não sei se te encontrei, se te perdi...

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Soneto da fidelidade – Vinicius de Moraes


(...)
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):


Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Considere as afirmações a seguir.


( ) Ambos os poetas fazem parte do mesmo movimento literário: o Simbolismo.
( ) Utiliza-se o mesmo gênero poético, a forma fixa do soneto.
( ) Tematicamente, o conteúdo se assemelha no encontro incerto.
A sequência de itens CORRETOS é:
a) V – V – V
b) V – F – F
c) F – V – V
d) F – F – V
e) F – F – F
Comentários
Afirmação I: falsa. Apenas Florbela Espanca, mas Vinicius de Moraes enquadra-se na
terceira geração modernista brasileira.
Afirmação II: verdadeira. Ambos são sonetos clássicos com métrica regular.
Afirmação III: verdadeira. O que se verifica na chave de ouro de Florbela Espanca: “Não sei
se te encontrei, se te perdi...” e no verso de Vinicius de Moraes: “quando mais tarde me
procure”. Inclusive, o tempo/modo verbais utilizados neste último é o presente subjuntivo,
indicando hipótese, dúvida, isto é, incerteza da realização verdadeira desse encontro.
Sequência correta: F – V – V.
Gabarito: “c”.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico ainda sente paixão, mas agora não está mais sofrida. Sente-se
iluminada, a paixão se naturaliza. Temas principais: racionalidade,
iluminação. Este poema segue predominantemente a tendência do
Parnasianismo.
VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
Em-ti-o-meu-o-lhar-fez-seal-vo-ra-da, (10 sílabas poéticas)
Ea-mi-nha-voz-fez-se-gor-jei-o-de-ni-nho, (11 sílabas poéticas)
Ea-mi-nha-ru-bra-bo-caa-pai-xo-na-da (10 sílabas poéticas)
Te-vea-fres-cu-ra-pá-li-da-do-li-nho. (10 sílabas poéticas)

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Em-bri-a-gou-meo-teu-bei-jo-co-moum-vi-nho (11 sílabas poéticas)


Ful-vo-deEs-pa-nha,em-ta-ça-cin-ze-la-da, (10 sílabas poéticas)
Ea-mi-nha-ca-be-lei-ra-de-sa-ta-da (10 sílabas poéticas)
Pôs-a-teus-pés-a-som-bra-dum-ca-mi-nho. (10 sílabas poéticas)

Mi-nhas-pál-pe-bras-são-cor-de-ver-be-na, (10 sílabas poéticas)


Eu-te-nhoos-o-lhos-gar-ços,-sou-mo-re-na, (10 sílabas poéticas)
E-pa-ra-teen-con-trar-foi-queeu-nas-ci... (10 sílabas poéticas)

Tens-si-do-vi-da-fo-rao-meu-de-se-jo, (10 sílabas poéticas)


Ea-go-ra,-que-te-fa-lo,-que-te-ve-jo, (10 sílabas poéticas)
Não-sei-se-teen-con-trei,-se-te-per-di... (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Oscilam decassílabos e hendecassílabos.
RIMAS Seguem o esquema ABAB/BABA/CCD/EED. Os quartetos seguem as rimas
alternaradas ou cruzadas.
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Em ti o meu olhar fez-se alvorada, (2-6-10)
E a minha voz fez-se gorjeio de ninho, (4-7-11)
E a minha rubra boca apaixonada (4-6-10)
Teve a frescura pálida do linho. (4-6-10)

Embriagou-me o teu beijo como um vinho (4-8-11)


Fulvo de Espanha, em taça cinzelada, (4-6-10)
E a minha cabeleira desatada (3-6-10)
Pôs a teus pés a sombra dum caminho. (4-10)

Minhas pálpebras são cor de verbena, (3-10)


Eu tenho os olhos garços, sou morena, (4-6-8-10)
E para te encontrar foi que eu nasci... (6-10)

Tens sido vida fora o meu desejo, (4-6-10)


E agora, que te falo, que te vejo, (2-6-10)
Não sei se te encontrei, se te perdi... (2-6-10)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito ao eterno processo de busca e
procura frustrada, a um estado de imprecisão, indeterminação, confusão,
incerteza. Uma dúvida: a fuga é da realidade ou à realidade? Consciência ou
inconsciência?

4.13 – “Súplica”
Existem 3 poemas com título igual, mas conteúdo diferente.
Porém, a UFRGS especificou qual é o poema exatamente mediante a disponibilização de
um link, já tendo em vista que este é um assunto importante para a autora.

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Olha pra mim, amor, olha pra mim;


Meus olhos andam doidos por te olhar! personificação/loucura
Cega-me com o brilho de teus olhos quiasma: entrelaçamento
Que cega ando eu há muito por te amar.

O meu colo é arminho imaculado autoproclama-se virgem, a mulher que espera


Duma brancura casta que entontece; mal-estar, febre, inebriamento, arrebatamento
Tua linda cabeça loira e bela
Deita em meu colo, deita e adormece! imagem da Pietá = castidade

Tenho um manto real de negras trevas medievalismo, monarquia, obscurantismo


Feito de fios brilhantes d’astros belos paradoxo
Pisa o manto real de negras trevas
Faz alcatifa*, oh faz, de meus cabelos!

Os meus braços são brancos como o linho cor + comparação


Quando os cerro de leve, docemente... imagem dos olhos fechados = inconsciência
Oh! Deixa-me prender-te e enlear-te pedido, apelo
Nessa cadeia assim eternamente!... repetição

Vem para mim, amor... Ai não desprezes interjeições indicam sentimentos


A minha adoração de escrava louca! lembra “Fanatismo”
Só te peço que deixes exalar
Meu último suspiro na tua boca! impulso de eros e tânatos (amor e morte)
*alcatifa = tapete ou tecido de lã ou seda, com desenhos e cores variados, usado para cobrir o chão ou enfeitar as
janelas em dias festivos (dicionário Aulete).

Comentário geral
O eu lírico espera pelo amado enquanto apela por ele. Lembra as cantigas de amigo
têm raízes na Península Ibérica, em festas rurais e populares, com música e dança, com vestígios da
cultura árabe. São suas características:
• Ambientação rural;
• Linguagem simples;
• Repetições;
• Estrutura paralelística;
• Forte musicalidade.
Na cantiga de amigo, o eu lírico é geralmente feminino, e o tema mais frequente é um lamento
amoroso da moça cujo namorado partiu para as guerras árabes.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO Temas importantes: espera, medievalismo, trovadorismo, dama. O soneto
segue predominantemente a tendência do Trovadorismo.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 59


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VERSO Vamos simplificar essa análise, pois ela costuma ser mais regular. Vamos
nos ater somente à primeira estrofe.
*Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
O-lha-pra-mim,-a-mor,-o-lha-pra-mim; (10 sílabas métricas)
Meus-o-lhos-an-dam-doi-dos-por-teo-lhar! (10 sílabas métricas)
Ce-ga-me-com-o-bri-lho-de-teus-o-lhos (10 sílabas métricas)
Que-ce-gaan-doeu-há-mui-to-por-tea-mar. (10 sílabas métricas)
MÉTRICA Versos regulares = decassílabos.
RIMAS Os segundos versos costumam rimar com os quartos das quadras.
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Olha pra mim, amor, olha pra mim; (4-6-10)
Meus olhos andam doidos por te olhar! (2-4-6-10)
Cega-me com o brilho de teus olhos (1-6-10)
Que cega ando eu há muito por te amar.
FORMA FIXA Quadra. Segundo Moisés (2012, p. 387), a quadra ou quadrinha “consiste num
quarteto, ou estrofe de quatro versos, que autonomizou e se fixou como
poema”. É conhecida desde a Idade Média pelo gosto popular e geralmente
tem versos redondilhos.

4.14 – “Doce Certeza”

Este soneto se encontra em O Livro D’Ele.

Por essa vida fora hás de adorar sentido de futuro


Lindas mulheres, talvez; em ánsia louca, recalque
Em infinito anseio hás de beijar projeção: é ela e não ele que sente infinito anseio
Estrelas d'oiro fulgindo em muita boca! ideia de que outras mulheres são iluminadas, não ela

Hás de guardar em cofre perfumado


Cabelos d'oiro e risos de mulher, repetição da preposição
Muito beijo d'amor apaixonado;
E não te lembrarás de mim sequer!... como ela pode ter certeza?

Hás de tecer uns sonhos delicados...


Hão de por muitos olhos magoados,
Os teus olhos de luz andar imersos! como se ele fosse um Rei Midas

Mas nunca encontrarás p' la vida fora, como se fosse uma vingança
Amor assim como este amor que chora
Neste beijo d'amor que são meus versos! metáfora

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Comentário geral
Há uma sinestesia já desde o título: uma certeza (abstrato) que é doce (palatável). O estado
de espírito do eu lírico é de ciúme. Diante da indiferença do amado, o eu lírico se vinga, desejando
que ele também não encontre o amor, que ele não se satisfaça. Ao mesmo tempo, sabe que ele
procurará por outros beijos, outros braços. Até se resigna com isso, não tem o que fazer.
Está certa como a certeza que tem da morte de que ele não se lembrará dela. Os olhos andam
imersos, aqui o verbo “andar” não está sendo utilizado no sentido de movimento, mas sim como
verbo de ligação. O amado lembra o Rei Midas, como se tudo o que ele tocasse virasse ouro.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico sente-se enciumado por causa da indiferença do amado. Enquanto
ele vive sua vida e busca por outros amores, ela se ressente contra ele. Temas
importantes: recalque, vingança, luz. Segue predominantemente a tendência
do Simbolismo.
VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
Por-es-sa-vi-da-fo-rahás-dea-do-rar (10 sílabas poéticas)
Lin-das-mu-lhe-res,-tal-vez;-em-án-sia-lou-ca, (11 sílabas poéticas)
Em-in-fi-ni-toan-sei-ohás-de-bei-jar (10 sílabas poéticas)
Es-tre-las-d'oi-ro-ful-gin-do-em-mui-ta-bo-ca! (12 sílabas poéticas)

Hás-de-guar-dar-em-co-fre-per-fu-ma-do (10 sílabas poéticas)


Ca-be-los-d'oi-roe-ri-sos-de-mu-lher, (10 sílabas poéticas)
Mui-to-bei-jo-d'a-mor-a-pai-xo-na-do; (10 sílabas poéticas)
E-não-te-lem-bra-rás-de-mim-se-quer!... (10 sílabas poéticas)

Hás-de-te-cer-uns-so-nhos-de-li-ca-dos... (10 sílabas poéticas)


Hão-de-por-mui-tos-o-lhos-ma-go-a-dos, (10 sílabas poéticas)
Os-teus-o-lhos-de-luz-an-dar-i-mer-sos! (10 sílabas poéticas)

Mas-nun-caen-con-tra-rás-p' la-vi-da-fo-ra, (10 sílabas poéticas)


A-mor-as-sim-co-moes-tea-mor-que-cho-ra (10 sílabas poéticas)
Nes-te-bei-jo-d'a-mor-que-são-meus-ver-sos! (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Oscilam decassílabos, hendecassílabos e dodecassílabos.
RIMAS Seguem o esquema: ABAB/CDCD/CCE/FFG. Os quartetos seguem rimas
alternadas ou cruzadas.
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Por essa vida fora hás de adorar (2-6-10)
Lindas mulheres, talvez; em ánsia louca, (4-7-11)
Em infinito anseio hás de beijar (4-6-10)
Estrelas d'oiro fulgindo em muita boca! (2-4-7-12)

Hás de guardar em cofre perfumado (4-6-10)

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Cabelos d'oiro e risos de mulher, (4-6-10)


Muito beijo d'amor apaixonado; (3-6-10)
E não te lembrarás de mim sequer!... (6-10)

Hás de tecer uns sonhos delicados... (4-10)


Hão de por muitos olhos magoados, (3-6-10)
Os teus olhos de luz andar imersos! (3-6-10)

Mas nunca encontrarás p' la vida fora, (2-7-10)


Amor assim como este amor que chora (4-6-10)
Neste beijo d'amor que são meus versos! (3-6-10)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito à concretização do amor na
poesia, já que em vida ele não se realiza.

4.15 – “Quem Sabe!?...”


Existem 2 poemas com título parecido, mas conteúdo diferente. A única
diferença é a pontuação. Vamos nos ater à escolha da UFRGS.

Eu sigo-te e tu foges. É este o meu destino: eterna perseguição


Beber o fel amargo em luminosa taça, paradoxo: veneno trazido em taça luminosa
Chorar amargamente um beijo teu, divino,
E rir olhando o vulto altivo da desgraça!

Tu foges-me, e eu sigo o teu olhar bendito; só é possível encontrar bonança com ele
Por mais que fujas sempre, um sonho há de alcançar-te projeções
Se um sonho pode andar por todo o infinito,
De que serve fugir se um sonho há de encontrar-te?! fatalismo, inexorabilidade

Demais, nem eu talvez, perceba se o amor


É este perseguir de raiva, de furor, recalque, ressentimento, sublimação
Com que eu te sigo assim como os rafeiros leais.

Ou se é então a fuga eterna, misteriosa, música


Com que me foges sempre, ó noite tenebrosa!
......................................................................
Por me fugires, sim, talvez me queiras mais! psicologia reversa, EM OFF, como se fosse podcast

Comentário geral
O título do poema é uma expressão idiomática. O eu lírico parece não fazer muito caso, mas
segue uma lógica perniciosa de ressentimento, desejando o mal ao amado por não querê-la, por ser
indiferente com ela. A eterna perseguição parece mitológica, há seres como Sísifo que são
condenados eternamente a repetir o mesmo trabalho. “Beijo divino” e “olhar bendito” são imagens
insólitas, ela glorifica demais o amado.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 62


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Em “perceba se o amor é (...)”, a conjunção indica uma conjectura, ela ainda não chegou a
nenhuma conclusão. A chave de ouro é quase um comentário à parte. Há, por fim, ambiguidade no
termo “fuga”.

Na música, é a composição polifônica em contraponto imitativo,


cujas seções são caracterizadas por conjuntos de apresentações
Fuga temáticas e divertimentos; músicas com modificações
intervalares (dicionário Houaiss).

A categoria do “semissoneto” não existe na nomenclatura normativa da teoria


literária. Foi criada por mim. Eu a utilizarei sempre que o poema tem todas as
características de um sonetot, mas apresenta algum tipo de corruptela, como é
o caso de uma linha com pontos finais antes da chave de ouro. Esse recurso
gráfico pode ter sido utilizado com 2 pretensões: 1) tornar o poema mais
moderno e menos convencional, tradicional; ou 2) causar o efeito de impacto no
leitor, deixando-o mais curioso antes da chave de ouro.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O sujeito se ressente contra o amado. A fuga é eterna, mas essa fuga pode ser
a duração de uma música ou o processo de busca. O eu lírico endeusa o
amado que continua por menosprezá-la. Temas importantes: O soneto segue
predominantemente a tendência do Modernismo.
VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
Eu-si-go-tee-tu-fo-ges.-É-es-teo-meu-des-ti-no: (13 sílabas poéticas)
Be-ber-o-fel-a-mar-goem-lu-mi-no-sa-ta-ça, (12 sílabas poéticas)
Cho-rar-a-mar-ga-men-teum-bei-jo-teu,-di-vi-no, (12 sílabas poéticas)
E-rir-o-lhan-doo-vul-toal-ti-vo-da-des-gra-ça! (12 sílabas poéticas)

Tu-fo-ges-me,-eeu-si-goo-teu-o-lhar-ben-di-to; (12 sílabas poéticas)


Por-mais-que-fu-jas-sem-pre,um-so-nhohá-deal-can-çar-te (12 sílabas poéticas)
Seum-so-nho-po-dean-dar-por-to-doo-in-fi-ni-to, (12 sílabas poéticas)
De-que-ser-ve-fu-gir-seum-so-nhohá-deen-con-trar-te?! (12 sílabas poéticas)

De-mais,-nem-eu-tal-vez,-per-ce-ba-seo-a-mor (12 sílabas poéticas)


É-es-te-per-se-guir-de-rai-va,-de-fu-ror, (12 sílabas poéticas)

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 63


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Com-queeu-te-si-goas-sim-co-moos-ra-fei-ros-le-ais. (13 sílabas poéticas)


Ou-seé-em-tão-a-fu-gae-ter-na,-mis-te-ri-o-sa, (13 sílabas poéticas)
Com-que-me-fo-ges-sem-pre,-ó-noi-te-te-ne-bro-sa! (13 sílabas poéticas)
......................................................................
Por-me-fu-gi-res,-sim,-tal-vez-me-quei-ras-mais! (12 sílabas poéticas)
MÉTRICA Oscila entre dodecassílabos e versos bárbaros.
RIMAS Seguem o esquema ABAB/CDCD/EEF/GGH. Os quartetos seguem rimas
alternadas ou cruzadas.
RITMO Os versos deste poema são grandes para se fazer marcação rítmica. A chave
de análise segue a dos poemas anteriores.
FORMAS FIXAS Semissoneto. Quer dizer, já não se trata mais de um soneto assim tão clássico.
A chave de ouro é quase que uma intromissão, um comentário à parte.

4.16 – “A Mulher I”
Este soneto se encontra em Trocando Olhares.

Um ente de paixão e sacrifício, lembra a personagem trágica de Medeia


De sofrimentos cheio, eis a mulher! se há algo de que a mulher está plena é sofrimento
Esmaga o coração dentro do peito, hipérbole
E nem te doas coração, sequer! ambiguidade: doer e doar

Sê forte, corajoso, não fraquejes imperativos: a mulher dá conselhos a si mesma


Na luta; sê em Vénus sempre Marte; mitologia
Sempre o mundo é vil e infame e os homens
Se te sentem gemer hão-de pisar-te!

Se às vezes tu fraquejas, pobrezinho, jogos: se/sê + muda o foco da ação


Essa brancura ideal de puro arminho aqui a cor não é simbolista. Branco = pureza
Eles deixam pra sempre maculada;

E gritam então os vis: “Olhem, vejam julgamento = discurso direto (falas, senso comum)
É aquela a infame!” e apedrejam como a prostituta apedrejada na Bíblia
A pobrezita, a triste, a desgraçada!

Comentário geral
Este é o primeiro poema de uma série de dois, um atrás do outro, intitulados e
igualmente enumerados. A mulher é um ser trágico. Já dizia Eurípides em sua
tragédia Medeia: “De todos os seres viventes é a mulher a que mais sofre”. Florbela
Espanca neste poema fala de uma importante questão: a condição da mulher. O
eu lírico não é sofrido à toa, é por que é mulher. A mulher é uma incompreendida.
Nós somos as que devemos reprimir os sentimentos; não podemos mostrar
sentimentalismo exacerbado, senão, logo já somos julgadas.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 64


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Por falar em mitologia, o universo feminino é ligado à deusa do amor, Vênus/Afrodite, mas
também ao de Marte/Ares, o deus da guerra, não por que a mulher é feminina, mas sim por que ela
deve ser forte no enfrentar de suas lutas.
Mas não é sempre que é possível ser forte. Às vezes, a mulher é uma pobrezinha. A diferença
entre ela e o homem é marcada também no julgamento: se a mulher se relaciona com o homem,
ela será a maculada; ele não, segue incólume. Mas a mulher é a melhor amiga de si, como se fosse
no Juca-Pirama de Gonçalves Dias, diz a si mesma: seja forte, seja brava.
Logo, há uma diferença acentuada entre os comportamentos masculinos e femininos.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico é feminista antes do feminismo. Denuncia diferenças entre
comportamentos e a injustiça de o mundo ser mais masculino do que
feminismo. Temas importantes: condição da mulher, feminismo,
comportamentos. O soneto é predominante modernista em sua temática.
VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
Um-en-te-de-pai-xão-e-sa-cri-fí-ci-o, (10 sílabas poéticas)
De-so-fri-men-tos-chei-o,-eis-a-mu-lher! (10 sílabas poéticas)
Es-ma-gao-co-ra-ção-den-tro-do-pei-to, (10 sílabas poéticas)
E-nem-te-do-as-co-ra-ção,-se-quer! (10 sílabas poéticas)

Sê-for-te,-co-ra-jo-so,-não-fra-que-jes (10 sílabas poéticas)


Na-lu-ta;-sê-em-Vé-nus-sem-pre-Mar-te; (10 sílabas poéticas)
Sem-preo-mun-doé-vil-ein-fa-mee-os-ho-mens (10 sílabas poéticas)
Se-te-sen-tem-ge-mer-hão-de-pi-sar-te! (10 sílabas poéticas)

Seàs-ve-zes-tu-fra-que-jas,-po-bre-zi-nho, (10 sílabas poéticas)


Es-sa-bran-cu-rai-deal-de-pu-roar-mi-nho (10 sílabas poéticas)
Eles-dei-xam-pra-sem-pre-ma-cu-la-da; (10 sílabas poéticas)

E-gri-tam-em-tão-os-vis:-“O-lhem,-ve-jam (10 sílabas poéticas)


É-a-que-la-ain-fa-me!”-ea-pe-dre-jam (10 sílabas poéticas)
A-po-bre-zi-ta,a-tris-te,-a-des-gra-ça-da! (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Regular = decassílabos.
RIMAS Apenas os segundos versos dos quartetos rimam com os quartos. Nos
tercetos, seguem o esquema: AAB/CCB.
RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.
Um ente de paixão e sacrifício, (2-6-10)
De sofrimentos cheio, eis a mulher! (4-6-10)
Esmaga o coração dentro do peito, (2-6-10)
E nem te doas coração, sequer! (4-8-10)

Sê forte, corajoso, não fraquejes (2-6-10)

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Na luta; sê em Vénus sempre Marte; (2-4-6-8-10)


Sempre o mundo é vil e infame e os homens (3-5-7-10)
Se te sentem gemer hão-de pisar-te! (3-6-10)

Se às vezes tu fraquejas, pobrezinho, (2-6-10)


Essa brancura ideal de puro arminho (4-6-10)
Eles deixam pra sempre maculada; (3-6-10)

E gritam então os vis: “Olhem, vejam (2-4-6-10)


É aquela a infame!” e apedrejam (2-4-10)
A probrezita, a triste, a desgraçada! (2-6-10)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro é um lamento próprio da mulher que se
sente julgada, injustiçada.

4.17 – “A Mulher II”

Este soneto se encontra em Trocando Olhares.

Ó mulher! Como és fraca e como és forte! invoca a si própria/ficcionaliza-se em um “tu”


Como sabes ser doce e desgraçada! mulher paradoxal = amável e pecaminosa
Como sabes fingir quando em teu peito “Autopsicografia” de Fernando Pessoa
A tua alma se estorce amargurada! ressentimento, loucura

Quantas morrem saudosas duma imagem Sebastianismo português


Adorada que amaram doidamente! amor fanático
Quantas e quantas almas endoidecem a loucura é uma mulher
Enquanto a boca ri alegremente! não é levada a sério, tem que fingir sentimentos

Quanta paixão e amor às vezes têm conectivo de adversidade e não adição


Sem nunca o confessarem a ninguém credibilidade = precisasm dialogar para se entenderem
Doces almas de dor e sofrimento! no plural, embora o título traga um singular

Paixão que faria a felicidade


Dum rei; amor de sonho e de saudade, por muito tempo as mulheres foram damas submissas
Que se esvai e que foge num lamento!

Comentário geral
A temática amorosa desaparece e o eu lírico parece resgatar o amor-próprio. É autorreflexiva,
pensa na sua própria condição. Esse poema está dialogando com o anterior. A serialidade entre os
poemas tornam a sua temática ainda mais forte, mais potente. E é a mulher a responsável por se
conferir força. Um coletivo de mulheres pode se entender, pode surgir sororidade.

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Lembra os versos de Fernando Pessoa em “Autopsicografia”: “o poeta é


um fingidor”. Se a mulher é uma fingidora, ela é a artista ideal. As mulheres
costumavam ser reprimidas, desencorajadas. Tudo o que podiam fazer estava
num raio de ação limitado. Porém, não para sempre; isso pode ser mudado e
Florbela Espanca já irá vislumbrar isso, embora o feminismo enquanto
movimento social só irá surgir nos anos de 1960 nos Estados Unidos.

Doutrina que preconiza o aprimoramento e a ampliação do papel


e dos direitos das mulheres na sociedade; movimento que milita
Feminismo nesse sentido; teoria que sustenta a igualdade política, social e
econômica de ambos os sexos (dicionário Houaiss).

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO A mulher está começando a abandonar um papel de sofrida e percebe que a
sua vida não é só esperar por um homem. Ainda há limitações, mas se elas se
pluralizarem, elas podem se entender. A compreensão partirá do coletivo.
Temas importantes: condição da mulher, feminismo, comportamentos. O
soneto é predominante modernista em sua temática.
VERSO *Os grifos em vermelho significam as elisões, quando houver, e em azul é a
última sílaba poética
Ó-mu-lher!-Co-moés-fra-cae-co-moés-for-te! (10 sílabas poéticas)
Co-mo-sa-bes-ser-do-cee-des-gra-ça-da! (10 sílabas poéticas)
Co-mo-sa-bes-fin-gir-quan-doem-teu-pei-to (10 sílabas poéticas)
A-tu-aal-ma-sees-tor-cea-mar-gu-ra-da! (10 sílabas poéticas)

Quan-tas-mor-rem-sau-do-sas-du-mai-ma-gem (10 sílabas poéticas)


A-do-ra-da-quea-ma-ram-doi-da-men-te! (10 sílabas poéticas)
Quan-tas-e-quan-tas-al-mas-en-doi-de-cem (10 sílabas poéticas)
En-quan-toa-bo-ca-ri-a-le-gre-men-te! (10 sílabas poéticas)

Quan-ta-pai-xão-ea-mor-às-ve-zes-têm (10 sílabas poéticas)


Sem-nun-cao-con-fes-sa-rem-a-nin-guém (10 sílabas poéticas)
Do-ces-al-mas-de-dor-e-so-fri-men-to! (10 sílabas poéticas)

Pai-xão-que-fa-ri-aa-fe-li-ci-da-de (10 sílabas poéticas)


Dum-rei;-a-mor-de-so-nhoe-de-sau-da-de, (10 sílabas poéticas)
Que-sees-vai-e-que-fo-ge-num-la-men-to! (10 sílabas poéticas)
MÉTRICA Versos regulares = decassílabos.
RIMAS O primeiro quarteto só rima o segundo e o quarto versos. No segundo
quarteto, há esquema ABAB. Os tercetos seguem o esquema: CCD/EED.

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RITMO *Seguem marcações abaixo de apoio rítmico.


Ó mulher! Como és fraca e como és forte! (3-6-10)
Como sabes ser doce e desgraçada! (3-6-10)
Como sabes fingir quando em teu peito (3-6-10)
A tua alma se estorce amargurada! (3-6-10)

Quantas morrem saudosas duma imagem (3-6-10)


Adorada que amaram doidamente! (3-6-10)
Quantas e quantas almas endoidecem (1-4-6-10)
Enquanto a boca ri alegremente! (2-7-10)

Quanta paixão e amor às vezes têm (4-6-10)


Sem nunca o confessarem a ninguém (2-6-10)
Doces almas de dor e sofrimento! (3-6-10)

Paixão que faria a felicidade (2-5-10)


Dum rei; amor de sonho e de saudade, (2-4-6-10)
Que se esvai e que foge num lamento! (3-6-10)
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito à languidez com quem se esvai
a esperença da mulher, outrora, perturbada, julgada, injustiçada. Porém, há
uma possibilidade de saída.

Prezados alunos!
A partir daqui os quadros sinópticos se tornarão mais
concisos e menos técnicos. Sugiro preencherem por conta
própria! As anotações autorais são muito importantes para
o seu aprendizado!

4.18 – “Amiga”
Este soneto se encontra no Livro de Mágoas.

Deixa-me ser a tua amiga, Amor, pede permissão ao amado = inferioridade


A tua amiga só, já que não queres ambiguidade: solitária ou apenas?
Que pelo teu amor seja a melhor, a determinada, a eleita
A mais triste de todas as mulheres. a escolha também da mais sofrida

Que só, de ti, me venha mágoa e dor jogo de palavras + acusação dele pelo seu sofrimento
O que me importa a mim?! O que quiseres pergunta retórica
É sempre um sonho bom! Seja o que for, há algo nela de não corruptível, não negativo
Bendito sejas tu por mo dizeres!

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Beija-me as mãos, Amor, devagarinho... idílio = uma atmosfera de ternura é possível


Como se os dois nascêssemos irmãos, irmandade, fraternidade
Aves cantando, ao sol, no mesmo ninho... o amor se naturaliza, torna-se algo natural

Beija-mas bem!... Que fantasia louca duplo pronome + embriauguez


Guardar assim, fechados, nestas mãos a ideia de cofre também está em “Doce Certeza”
Os beijos que sonhei pra minha boca!... é como a mulher tivesse o dever de se preservar

Comentário geral
O título é ambíguo: parece sororidade a outrem quando no fundo fala de si. É outro o
interlocutor, retorna a imagem do Amor. Há contraste nos comparativos. A dor, o sacrifício, o
sofrimento, só são aceitáveis se partirem dele. Ela é desafiadora ou provocadora, ou ao menos
parece numa primeira instância, mas volta a permitir que ele a despreze.
Os dois últimos tercetos o eu lírico retorna a um idílio: o amor é percebido como ferramente
possível para sair do abismo.

• É uma interrogação que não tem como objetivo


Pergunta retórica obter uma resposta, mas sim estimular a reflexão
do individuo sobre determinado assunto.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico deseja tornar-se irmã do amado, no sentido da fraternidade, da
lealdade, da sororidade para com ele (não mais para com as mulheres). É
possível um idílio, uma cena de amor.
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito ao sonho e a temática do poema
é predominantemente simbolista.

4.19 – “Ódio?”

Este soneto se encontra no Livro de Sóror Saudade, embora a UFRGS não tenha
especificado o título com pontuação, e lá no livro o título inclua ponto de interrogação.

Ódio por Ele? Não... Se o amei tanto, ela se autoindaga, faz uma autocrítica
Se tanto bem lhe quis no meu passado, anáfora
Se o encontrei depois de o ter sonhado,
Se à vida assim roubei todo o encanto,

Que importa se mentiu? E se hoje o pranto mulher que tudo aceita, tudo perdoa
Turva o meu triste olhar, marmorizado, imobilização

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Olhar de monja, trágico, gelado postura/máscara adotada


Com um soturno e enorme Campo Santo! tanto Jardim do Éden quanto Campos Elísios

Nunca mais o amar já é bastante! hipérbole


Quero senti-lo doutra, bem distante,
Como se fora meu, calma e serena! ambiguidade: advérbio ou verbo no pretérito + que perfeito?

Ódio seria em mim saudade infinda, futuro do pretérito


Mágoa de o ter perdido, amor ainda! aparente não superação
Ódio por Ele? Não... não vale a pena... consciência de que não vale o esforço

Comentário geral
Este poema no original tem uma epígrafe: “À Aurora Aboim”, uma mulher, na verdade.
Mesma a mais taxativa as palavas pode ser colocada em dúvida, pois o título no original também
leva o ponto de interrogação.
O amor (cego) que tudo perdoa e tudo desculpa lembra a santidade de Sóror Saudade. O
tempo do “nunca” mais é intensificado. O paraíso é um jardim sem início e fim, como o eu lírico
aponta em “Fanatismo”. Parece responder a Fernando Pessoa: nem tudo vale a pena se você está
sofrendo.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico se revela bem mais madura, consciente, sensata, ponderada e
comedida, quase parnasiana. Aqui não é mais tanto o lugar para excesso de
emoções.
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito a uma tomada de consciência.
Por esse motivo, o soneto pode ser aproximado do Realismo.

4.20 – “Amar!”
Este soneto se encontra no Charneca em Flor

Eu quero amar, amar perdidamente! locução verbal + advérbio de intensidade


Amar só por amar: Aqui... além... nomes comuns se tornam próprios
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar! Amar! E não amar ninguém! ninguém ou nada, como em “Nihil novum” (nada novo)

Recordar? Esquecer? Indiferente!... aprende a retribuir a indiferença


Prender ou desprender? É mal? É bem? volta-se para as próprias reflexões
Quem disser que se pode amar alguém ditado popular, senso comum
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma Primavera em cada vida: primavera como símbolo de esperança, renascimento

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É preciso cantá-la assim florida, sente-se rejuvenescida


Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar! mas não a todos = privilégio de poetisa

E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada Gênesis 3:19


Que seja a minha noite uma alvorada, anáfora, subjuntivo = desejo
Que me saiba perder... pra me encontrar...

Comentário geral
O título do poema é um verbo no infinitivo seguido de uma exclamação. Parece êxtase, mas
também indica uma dor de não poder amar. Amar a todos pressupõe humanismo, irmandade.
A imagem do canto e da primavera indicam um eu lírico num estado de espírito mais leve. No
fundo, ela se livra de um amor não correspondido e defende amor nenhum, apenas o amor-próprio.

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico defende um amor humanitário e para consigo mesmo. Apesar do
título invocar um sentimento, o eu lírico revela-se consciente.
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito a uma tomada de consciência.
Por esse motivo, o soneto pode ser aproximado do Realismo.

4.21 – “O Maior Bem”


Este soneto se encontra no Reliquiae.
Este querer-te bem sem me quereres, verbo nominalizado, amor não correspondido
Este sofrer por ti constantemente
Andar atrás de ti sem tu me veres sente-se uma sombra, invisível
Faria piedade a toda a gente. ironia = menos a ele

Mesmo a beijar-me a tua boca mente... motivo do fingimento


Quantos sangrentos beijos de mulheres recalque
Poisa na minha a tua boca ardente,
E quanto engano nos seus vãos dizeres!...

Mas que me importa a mim que me não queiras.


Se esta pena, esta dor, estas canseiras, repetição do pronome
Este mísero pungir, árduo e profundo

Do teu frio desamor, dos teus desdéns, metonímia: até do desdém, ela é digna só de parte
E, na vida, o mais alto dos meus bens?
É tudo quanto eu tenho neste mundo?

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Comentário geral
No título, “O Maior Bem” parece ser um superlativo, mas só na linguagem, porque é uma
ironia. No fundo, ela se rebaixa constantemente.
O homem irá amar e ela irá sofrer. Essa imagem já foi bem pintada ao longo dos romances.
Muitas outras mulheres serão beijada se amadas e ela não. Ela não se reconhece nunca como objeto
de desejo e amor. Sente-se sempre abandonada, ignorada.
Porém, como diz a máxima: “quanto mais ele pisa, mais ela se apaixona”, ela valoriza dele até
mesmo o desdém. Seria esse o maior bem para ela, que não é físico, mas sim abstrato. É uma grande
ironia, porque sequer é um bem.

A ironia consiste em utilizar uma palavra ou expressão, atribuindo-


lhe diferente sentido ou significado de acordo com o contexto. Na
Ironia construção de um texto, ela pode aparecer em três modos: ironia
verbal, ironia de situação e ironia dramática (ou satírica).

Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico volta a se rebaixar e situar seu amor acima de tudo e de todos. É
como se ela tivesse tido uma recaída.
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito a uma ironia, pois desdém não
é um bem, quanto muito o maior bem. Por esse motivo, o soneto pode ser
aproximado do Realismo.

4.22 – “Neurastenia
Este soneto se encontra no Livro de Mágoas.

Sinto hoje a alma cheia de tristeza! ironia = só hoje?


Um sino dobra em mim Ave-Maria! musicalidade, religiosidade, oração
Lá fora, a chuva, brancas mãos esguias, personificação
Faz na vidraça rendas de Veneza ...

O vento desgrenhado chora e reza personificação


Por alma dos que estão nas agonias! uma espécie de purgatório
E flocos de neve, aves brancas, frias,
Batem as asas pela Natureza ...

Chuva ... tenho tristeza! Mas por quê?! desespero, tenta entender indagando
Vento ... tenho saudades! Mas de quê?! Sebastianismo português + pergunta retórica
Ó neve que destino triste o nosso! destino coletivo, português

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Ó chuva! Ó vento! Ó neve! Que tortura!


Gritem ao mundo inteiro esta amargura,
Digam isto que sinto que eu não posso!! ...

Comentário geral
É extremamente importante nesse poemas os elementos naturais: chuva, flocos
de neve, aves, vento: tudo condiz à naturalidade dos sentimentos. Eles se vinculam
aos ciclos da natureza.
E ao mesmo tempo há estranhamento desses sentimentos, que conduzem a
várias saídas: religião, loucura, esgotamento total dos nervos.
Se é triste o nosso destino, seria o triste destino português pós-Primeira Guerra
Mundial. A humanidade se encaminhava para a loucura de uma outra guerra. A
responsabilidade do poeta não é mais só individual, mas sim social, coletiva. Esse poema se aproxima
do Realismo, também pelo seu cientificismo, por trazer um termo técnico já desde o título.

No século XIX, ao otimismo exagerado com o método científico e à


tentativa de submeter outras áreas da vida humana a essa mesma
Cientificismo lógica denominaremos cientificismo. O primeiro ímpeto dessa
tendência se traduz em várias teorias filosóficas: positivismo,
darwinismo, evolucionismo, determinismo e o racismo científico.

Dúvida de Biologia? A professora Bruna Klassa responde

Crise nervosa ou colapso nervoso, é o sinal de que algo está, literalmente, fora de controle,
e é preciso estar atento, tanto às causas quanto às consequências desse mal.
Existem diversos fatores que podem levar o indivíduo a uma crise nervosa, e os principais
são:pressão excessiva no trabalho;conflitos no relacionamento;situações de violência;traumas
e perdas;estresse;ansiedade.
Neurastenia é um distúrbio psicológico que resulta do enfraquecimento aumentado do
sistema nervoso central (neuro = cérebro, astenia= fraqueza), ocasionado principalmente por
estafa, esgotamento mental, permanência por longos períodos em lugares pouco arejados,
sujeição a frequentes emoções fortes, entre outros fatores.
O indivíduo acometido por neurastenia apresenta, geralmente, impossibilidade de realizar
atividades físicas, oscilação contínua de humor, depressão, tremores sem causa aparente,
dormência e formigamentos dos membros, memória debilitada, vertigens, dores de cabeça e
musculares, insônia, dificuldade de concentração, problemas alimentares, perda da capacidade
de sentir prazer e ansiedade.
Pessoas neurastênicas devem evitar rotinas estressantes, para não vivenciarem crises
nervosas.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 73


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Quadro sinóptico

CATEGORIA DEFINIÇÃO
EU LÍRICO O eu lírico abandona uma postura individualista para adotar questionamentos
outros, de cunho coletivo.
FORMA FIXA Soneto clássico. A chave de ouro diz respeito ao enlouquecimento, a um não
mais aguentar, dar conta. Porém, pela temática social, o poema se associa ao
Realismo/Naturalismo.

5 – Fortuna Crítica
A UFRGS não tem tendência de cobrar crítica e essa seção serve tão somente para o
aprimoramento das nossas análises.
Selecionei apenas alguns trechos da fortuna crítica para compreendermos ainda melhor
nossas análises e ainda por cima um trecho de uma carta (logo, escrita em prosa) da escritora
Florbela Espanca, para percebermos como ela se manifestava nesse gênero.
A pesquisadora Eliana Barros diz que existem várias formas de amor em Florbela Espanca. O
amor pode ser idealizado ou sublimado por exemplo. O amor pode ser:
• paixão (sensorial);
• cortês (trovadoresco, com código de conduta, a dama é intocável);
• amor de transferência (de substituição, como a criação de uma ficção para preencher um
vazio);
• amor trágico (diferença entre querer e poder).
Além disso, vamos observar um trecho da pesquisadora Eliana Barros.

Florbela busca obstinada e sucessivamente o amor em seus escritos. Anseia ser muito mais
do que um objeto causa de desejo. Quer ser o próprio objeto do desejo e, como tal, aquela
que completa e se completa com o amado. Assim, comparece a agonia em face do não
reconhecimento do outro e da falta de amor – é preciso confirmação do outro, para que
possa reconhecer-se como mulher. Daí sua poesia queixosa, em que apreende um lamento,
uma ferida (...). Dito de outro modo, Florbela nunca se satisfaz, está sempre demandando,
porque sonha com a relação sexual, com o gozo pleno. Na busca desse gozo absoluto, jamais
alcançado, o que se repete de diferentes formas é o fracasso. Ela quer ser a flor mais bela,
o agalma*, o objeto precioso, mas essa fantasia transforma o impossível em impotência,
razão pela qual sua poesia é um testemunho poético do sofrimento.
*agalma = é um termo lacaniano, utilizado em seus seminários. Tem a ver com enigma.
Fonte: BARROS, 2014, p. 35 (grifos meus).

Sendo a poesia de Florbela Espanca um “testemunho poético do sofrimento”, o amor um


tema primordial na poesia da poetisa. Porém, ele frequentemente está ligado a uma dor ou a uma

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 74


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espécie de perda. Por isso, é comum ela representar a dor de existir e a dor como fonte de gozo, o
que já beira a margem do sadomasoquismo.
Essa eterna insatisfação e busca sem fim é um fato que também aparece na própria biografia
de Florbela Espanca. A poetisa se casou 3 vezes:
• Alberto de Jesus Silva Moutinho (1913-1920);
• António José Marques Guimarães (1921-1925);
• Mário Pereira Lage (1925-1930).
A pesquisadora Maria Lúcia dal Farra explica sobre a complexidade das cartas de Florbela
Espanca, pois lá também a poetisa se revelava como sendo várias Florbelas: introvertida;
estrategista; quando ela estava grávida de Guimarães, mas longe dele; com senso de humor;
destemida; desafiadora etc. Assinava a carta como Bela e chamava António de Toninho. A pesquisa
da autora se estende de 1920 a 1925, portanto, a esse relacionamento. A correspondência de
Florbela Espanca também tem outro importante destinatário: Apeles, seu irmão.

6 – Florbela Espanca e a Intertextualidade


Essa seção é um destroncamento da análise. Lembrando que se entende por
intertextualidade a relação entre 2 ou mais textos, entendendo qual a natureza dessa relação.
Algumas vezes a intertextualidade é mais evidente outras não. Pode também aparecer entre textos
de diferentes naturezas, verbais e visuais.

6.1 - Epígrafes
Florbela Espanca teve os seus admiradores, seus artistas de preferência, dedicando alguns de
seus poemas a eles e até mesmo utilizando-os como epígrafes em seus livros. Nesse sentido,
dialogou com o cânone e os seus contemporâneos. Vamos compreender então qual era o interesse
dela neles.

Amar, amar, amar sempre e com todo


O ser e com a terra e com o céu,
Com o claro do sol e o obscuro do todo.
Amar por toda a ciência e amar por todo o anelo.

E quando a montanha da vida


Nos seja dura e larga, e alta, e cheia de abismos,
Amar a imensidade, que é de amor acesa,
E arder na fusão de nossos peitos mesmos...
Livre tradução do espanhol.

Rubén Darío

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 75


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Rubén Darío foi um poeta nicaraguense (1867-1916). Estes versos servem


de epígrafe para o livro Charneca em flor. Florbela Espanca entendia de
galego-português. Nesses versos, encontramos um sentimentalismo
exacerbado, também típico de Florbela Espanca. Amar em sua totalidade
é como a arte. O infinito é visto como o objeto do amor. O artista,
insatisfeito com a sua incompletudo, busca pela perfeição. Só a procura é
eterna, e o amor pela procura. Por fim, até o amor passou pelo
cientificismo do século XIX. Mais que arte, agora também é ciência.

Irmã, Sóror Saudade, ah! se eu pudesse


Tocar de aspiração a nossa vida,
Fazer do mundo a Terra Prometida
Que ainda em sonho às vezes me aparece!

Os versos são uma epígrafe do Livro de Sóror Saudade.


Dialoga abertamente com ele, foi daí que Florbela Espanca
tirou a inspiração para o título do livro. Sua autoria é do Américo Durão
poeta português Américo Durão (1896-1969). Além da
imagem aproveitada, o poema fala de utopia, da criação de
um sonho ou uma Terra Prometida (Bíblia).

Não é preciso reclamar sobre aquele que espera


um sentimento mais ardente e mais generoso
Não é preciso reclamar sobre aquele que espera
o desejo de um pouco de felicidade, de
um pouco de beleza, de um pouco de justiça.
A sabedoria e o destino
Livre tradução do francês

Maurice Maeterlinck

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Os versos são uma epígrafe do Livro de Sóror Saudade. O tema


da espera é bem frequente na lírica de Florbela Espanca. Na
realidade, do processo da procura e do encontro, que
geralmente é frustrada. Boa-vontade não falta para ir atrás dos
ideais, mas há algo que impede. Os versos são do dramaturgo
belga Maurice Maeterlinck (1862-1949).

6.2 – Sugestões
Não que tenha sido intenção da própria autora estabelecer essas conexões. Esta é a minha
proposta aqui, para ampliarmos o nosso repertório e enxergar mais uma vez a importância de
Florbela Espanca, e a coerência de seu pensamento a qual proporciona um possível diálogo com
outros autores.

EU – FLORBELA ESPANCA AUTORRETRATO – CECÍLIA MEIRELES


Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Eu não tinha este rosto de hoje,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Assim calmo, assim triste, assim magro,
Sou a crucificada... a dolorida...
Nem estes olhos tão vazios,
Nem o lábio amargo.
Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Eu não tinha estas mãos sem força,
Impele brutalmente para a morte!
Tão paradas e frias e mortas;
Alma de luto sempre incompreendida!...
Eu não tinha este coração
Que nem se mostra.
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Eu não dei por esta mudança,
Sou a que chora sem saber por quê...
Tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida
Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
A minha face?
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!

OUTONAL – FLORBELA ESPANCA VIOLÕES QUE CHORAM – CRUZ E SOUSA


Caem as folhas mortas sobre o lago; (...) Harmonias que pungem, que laceram,
Na penumbra outonal, nao sei quem tece Dedos nervosos e ágeis que percorrem
As rendas do silencio... Olha, anoitece! Cordas e um mundo de dolências geram,
- Brumas longínquas do País do Vago... Gemidos, prantos, que no espaço morrem...

Veludos a ondear... Mistério mago... E sons soturnos, suspiradas mágoas,


Encantamento... A hora que náo esquece, Mágoas amargas e melancolias,
A luz que a pouco e pouco desfalece, No sussurro monótono das águas,

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 77


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Que lança em mim a bênçâo dum afago... Noturnamente, entre remagens frias.

Outono dos crepúsculos doirados, Vozes veladas, veludosas vozes,


De púrpuras, damascos e brocados! Volúpias dos violões, vozes veladas,
- Vestes a terra inteira de esplendor! Vagam nos velhos vórtices velozes
Dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas.
Outono das tardinhas silenciosas,
Das magníficas noites voluptuosas Tudo nas cordas dos violões ecoa
Em que eu soluço a delirar de amor... E vibra e se contorce no ar, convulso...
Tudo na noite, tudo clama e voa
Sob a febirl agitação de um pulso.

O MEU SONETO – FLORBELA ESPANCA VIA LÁCTEA – OLAVO BILAC


Em atitudes e em ritmos fleumáticos, Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Erguendo as maos em gestos recolhidos, Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Todos os brocados fúlgidos, hieráticos, Que, para ouvi-Ias, muita vez desperto
Em ti andam bailando os meus sentidos... E abro as janelas, pálido de espanto...

E os meus olhos serenos, enigmáticos, E conversamos toda a noite, enquanto


Meninos que na estrada andam perdidos, A via láctea, como um pátio aberto,
Dolorosos, tristíssimos, extáticos, Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Sao letras de poemas nunca lidos... Inda as procuro pelo céu deserto.

As magnólias abertas dos meus dedos Direis agora: "Tresloucado amigo!


Sao mistérios, sao filtros, sao enredos Que conversas com elas? Que sentido
Que pecados d"amor trazem de rastos... Tem o que dizem, quando estão contigo?"

E a minha boca, a rútila manhá, E eu vos direi: "Amai para entendê-las!


Na Via Láctea, lírica, paga, Pois só quem ama pode ter ouvido
A rir desfolha as pétalas dos astros!... Capaz de ouvir e de entender estrelas."

7 – Questões sem Comentários


Vestibulandos, eis algumas informações práticas, antes de começarem a resolver as questões.
Essa é uma aula de análise de obra literária, portanto, muito densa. Porém, é essencial
resolvermos exercícios para a sedimentação do conhecimento. Para a aula de hoje, iremos encontrar
exercícios organizados da seguinte maneira:
1) do vestibular UFRGS;
2) de outros vestibulares;
3) questões autorais.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 78


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Aula 01: Obras Literárias para UFRGS 2021

1. (UFRGS/2019)
Leia trechos dos poemas “Fanatismo”, de Florbela Espanca, e “Imagem”, de Cecília Meireles.

Fanatismo
(...)
“Tudo no mundo é frágil, tudo passa...”
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:


“Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim!...”

Imagem
Tão brando é o movimento
das estrelas, da lua,
das nuvens e do vento,
que se desenha a tua
face no firmamento.

Desenha-se tão pura


como nunca a tiveste,
nem nenhuma criatura.
Pois é sombra celeste
da terrena aventura.
(...)

Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as seguintes afirmações sobre os poemas.

( ) Ambos os sujeitos líricos comparam o ser amado à perfeição divina.


( ) Ambos os sujeitos líricos veem o amor de modo idealizado.
( ) Ambos os sujeitos líricos falam diretamente ao ser amado.
( ) Ambos os poemas citam diretamente a voz da opinião pública.

A sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima para baixo, é


a) V – V – V – F.
b) V – V – F – V.
c) F – F – V – V.
d) F – V – F – V.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 79


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Aula 01: Obras Literárias para UFRGS 2021

e) V – F – V – F.

2. (UFRGS/2019)
Considere os poemas de Florbela Espanca.
Leia as seguintes afirmações sobre os sonetos “Fumo” e “Neurastenia”.

I. Em ambos os sonetos, a natureza é solidária aos sentimentos dos sujeitos líricos.


II. Em “Fumo”, o estado de alma do sujeito lírico é comparado à primavera.
III. Em “Neurastenia”, o sujeito lírico pede ajuda à natureza para dizer o que sente.

Quais estão corretas?


a) Apenas I.
b) Apenas II.
c) Apenas III.
d) Apenas I e III.
e) I, II e III.

3. (UFRGS/2019)
Considere os poemas de Florbela Espanca.
Assinale a alternativa correta sobre o poema “Ser poeta”.

a) O sujeito lírico canta a condição de inferioridade do poeta em relação às outras pessoas.


b) A intensidade de sentimentos impede o poeta de cantar o ser amado.
c) O poeta é capaz de sentir e viver com mais intensidade os acontecimentos da vida.
d) O poeta canta suas certezas.
e) O poeta é Rei de todos os reinos.

4. (PUC-MG/2015)
FANATISMO
Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...


Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!

“Tudo no mundo é frágil, tudo passa...”


Quando me dizem isto, toda a graça

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 80


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Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:


“Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim! ...”
ESPANCA, Florbela. Livro de Sóror Saudade. [1923]. Domínio Público. Disponível em:
http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?
select_action=&co_obra=7534. Acesso em: 15 fev. 2015.

A poesia de Florbela Espanca é conhecida por sua singular representação do universo feminino. No
poema, a imagem construída pelo eu lírico é a de uma mulher
a) convicta de seu amor.
b) devota à vida religiosa.
c) receosa diante da morte.
d) obcecada pelo ser amado.

5. (PUC-MG/2014)
“Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!”
(Florbela Espanca, “Ser poeta”).

“Com a máscara da palavra


reinventamos
o som da voz amada
que nos inunda
com seu luar de espuma.”
(Ana Hatherly, “A máscara da palavra”).

“O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.”
(Fernando Pessoa, “Autopsicografia”).

Os textos têm em comum:


a) a concepção de escrita enquanto fingimento.
b) a recusa da inspiração sobre o trabalho artístico.
c) a temática voltada para a própria atividade poética.
d) a utilização de rimas ricas e versos metrificados.

6. (UNIVAG-MT/2014)

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 81


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Aula 01: Obras Literárias para UFRGS 2021

Leia o soneto Fanatismo, da poeta portuguesa Florbela Espanca.

Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida


Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...


Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!

“Tudo no mundo é frágil, tudo passa...”


Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, vivo de rastros:


“Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim!...”
(Sonetos, 1997.)

A temática desse poema pode ser relacionada ao


a) Modernismo, pois se notam experimentações linguísticas que objetivam dar uma linguagem
rebuscada e hermética ao texto.
b) Classicismo, uma vez que a presença de seres da mitologia clássica é evidente na descrição que o
eu lírico faz de si mesmo.
c) Barroco, visto que o eu lírico condena o fanatismo atrelado a crenças e a misticismos considerados
irracionais.
d) Romantismo, visto que o eu lírico despreza a contenção dos sentimentos e expressa suas emoções
de forma exacerbada.
e) Arcadismo, pois o eu lírico e o ser amado inserem-se em um ambiente campestre em que os
elementos da natureza são descritos detalhadamente.

7. (UNIFESP/2009)
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES:

ESQUECIMENTO
Esse de quem eu era e era meu,
Que foi um sonho e foi realidade,
Que me vestiu a alma de saudade,
Para sempre de mim desapareceu.

Tudo em redor então escureceu,


E foi longínqua toda a claridade!

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 82


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Ceguei... tateio sombras... que ansiedade!


Apalpo cinzas porque tudo ardeu!

Descem em mim poentes de Novembro...


A sombra dos meus olhos, a escurecer...
Veste de roxo e negro os crisântemos...

E desse que era meu já me não lembro...


Ah! a doce agonia de esquecer
A lembrar doidamente o que esquecemos...!
Florbela Espanca

Na última estrofe, o eu lírico expressa, por meio de:


a) Hipérboles, a dificuldade de se tentar esquecer um grande amor.
b) Metáforas, a forma de se esquecer plenamente a pessoa amada.
c) Eufemismos, as contradições do amor e os sofrimentos dele decorrentes.
d) Metonímias, o bem-estar ligado a amar e querer esquecer.
e) Paradoxos, a impossibilidade de o esquecimento ser levado a cabo.

8. (UNIFESP/2009)
O esquecimento descrito pelo eu lírico:
a) Decorre do seu sentimento de perda e de saudade.
b) É fruto dos seus sonhos, incompatíveis com a realidade.
c) Torna-o ciente de que sua agonia está por findar.
d) Traduz a esperança, pelo jogo de cores remetendo à claridade.
e) Mostra o amor como intenso e indesejável.

9. (UESPI/2008)
Os enunciados seguintes versam sobre o Modernismo em Portugal, suas fases e seus autores.
Assinale a alternativa correta.
a) Divide-se o Modernismo português em quatro momentos, todos eles marcados pelo viés
surrealista e cubofuturista.
b) Fernando Pessoa, inserido no primeiro momento do Modernismo em Portugal, experimentou
radicalmente a poesia, atribuindo, inclusive, muitos poemas a heterônimos determinados.
c) O segundo momento do Modernismo português ficou conhecido como Orfismo, caracterizado
pelo diálogo intenso com as vanguardas européias.
d) O neo-realismo português coincidiu com o neorealismo brasileiro, e se caracterizou pelo retorno
ao positivismo dominante nas obras de Eça de Queirós, escritor eleito como modelo da escrita
realista.
e) Florbela Espanca e José Saramago marcaram o início do quarto momento do Modernismo
português, caracterizado por uma estética romântico-sentimental.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 83


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10. (Mackenzie/1998)
I - Não me encontro com ninguém
(tenho fases, como a lua...)
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
(Cecília Meireles)

II - Sou talvez a visão que Alguém sonhou,


Alguém que veio ao mundo pra me ver
E que nunca na vida me encontrou!
(Florbela Espanca)

III- Quadrilha
João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes que não tinha entrado na história.
(Carlos Drummond de Andrade)

Assinale a alternativa INCORRETA.


Sobre a relação entre os textos afirma-se que:
a) há uma confluência entre eles, na afirmação do eterno desencontro, inerente à busca amorosa.
b) os dois primeiros unem-se num tom de lamento poético, enquanto o terceiro, definindo-se pela
incorporação ao poético, do cotidiano prosaico, encaminha-se para o tom de ironia e de humor.
c) os dois primeiros fragmentos, com métrica regular, opõem-se ao poema QUADRILHA, que
transgride a métrica tradicional, o que vem confirmar uma postura ideológica dos textos.
d) no poema QUADRILHA, a sucessão de especificações dos três primeiros versos introduz a ideia de
desencontro, confirmada nos três últimos versos.
e) os três textos unem-se pelo fato de apresentarem o tema por meio de um EU que fala e se assume,
contando e lamentando a própria história.

11. (3º Provão de Bolsas – Estratégia Vestibulares 2020 – Profa. Luana Signorelli)
Leia o soneto abaixo para julgar aos itens.

Eu
Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada … a dolorida …

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 84


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Sombra de névoa tênue e esvaecida,


E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!…

Sou aquela que passa e ninguém vê…


Sou a que chamam triste sem o ser…
Sou a que chora sem saber porquê…

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,


Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!
Florbela Espanca – Eu.
Disponível em: https://tinyurl.com/sm5co7s. Acesso em: 06 mar. 2020.

I. O caráter depressivo do poema indica um eu lírico propenso ao sentimento abstrato e que


se sente invisível.
II. O jogo entre perder e se encontrar também é gramatical, da transição entre o pronome
demonstrativo para o relativo.
III. Temas como morbidez, tédio e indiferença fazem com que o soneto possa se enquadrar na
estética ultrarromântica.

Está CORRETO o que se afirma em:


a) I.
b) I e II.
c) III.
d) II e III.
e) todas estão corretas.

12. (2º Simulado FUVEST – Estratégia Vestibulares 2020 – Profa. Luana Signorelli)
FONÓGRAFO
Vai declamando um cômico defunto.
Uma platéia ri, perdidamente,
Do bom jarreta... E há um odor no ambiente
A cripta e a pó, do anacrônico assunto.

Muda o registo, eis uma barcarola:


Lírios, lírios, águas do rio, a lua...
Ante o Seu corpo o sonho meu flutua
Sobre um paul, extática corola.

Muda outra vez: gorjeios, estribilhos


Dum clarim de oiro o cheiro de junquilhos,
Vívido e agro! tocando a alvorada...

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 85


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Cessou. E, amorosa, a alma das cornetas


Quebrou-se agora orvalhada e velada.
Primavera. Manhã. Que eflúvio de violetas!
Camilo Pessanha – Clepsidra. Fonte: Domínio Público.
Disponível em: https://tinyurl.com/vgdzopv. Acesso em: 03 de abril de 2020.

Atente para as seguintes afirmações relativas ao soneto do simbolista português.

I. A relação do título com o poema em si é percebida na mudança do foco temático.


II. O movimento literário do Simbolismo emprega frequentemente a sinestesia.
III. Num tom vidente, em “extática corola” o eu lírico chama atenção do cientificismo.

Está correto o que se afirma apenas em


a) I.
b) II.
c) I e II.
d) II e III.
e) I e III.

13. (QUESTÃO AUTORAL – LUANA/2020)


Considere os sonetos de Florbela Espanca.

1. “Lágrimas Ocultas”
2. “A Minha Dor”.

( ) A dor do sujeito lírico acompanha a sua máscara de santidade.


( ) Há personificação quando os sinos assumem a ansiedade do sujeito lírico.
( ) O sujeito poeta resgata lembranças de outras eras.
( ) A transfiguração do sofrimento do sujeito lírico lembra o rebuscamento barroco.

A sequência correta de associações é:


a) 1 – 2 – 1 – 2
b) 1 – 1 – 2 – 2
c) 1 – 1 – 1 – 2
d) 2 – 2 – 1 – 1
e) 2 – 2 – 2 – 1

14. (QUESTÃO AUTORAL – LUANA/2020)


Leia as seguintes afirmações sobre os poemas de Florbela Espanca.

I. Sonetos como “Quem Sabe!?...” podem ser caracterizados como modernistas.


II. “Súplica” não é um soneto, mas sim uma quadra inspirada em estilo medieval.
III. Em “O Maior Bem”, o sujeito poético critica o materialismo do século XIX.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 86


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Quais estão corretas?


a) Apenas I.
b) Apenas II.
c) I e II.
d) II e III.
e) I, II e III.

15. (QUESTÃO AUTORAL – LUANA/2020)


TEXTO I
III
Frémito do meu corpo a procurar-te,
Febre das minhas mãos na tua pele
Que cheira a âmbar, a baunilha e a mel,
Doído anseio dos meus braços a abraçar-te,

Olhos buscando os teus por toda a parte,


Sede de beijos, amargor de fel,
Estonteante fome, áspera e cruel,
Que nada existe que a mitigue e a farte! (...)

TEXTO II – AMIGA
Deixa-me ser a tua amiga, Amor,
A tua amiga só, já que não queres
Que pelo teu amor seja a melhor,
A mais triste de todas as mulheres.

Que só, de ti, me venha mágoa e dor


O que me importa a mim?! O que quiseres
É sempre um sonho bom! Seja o que for,
Bendito sejas tu por mo dizeres! (...)

Ao se comparar os trechos de soneto, é correto afirmar que:


a) em ambos há procura pelo amor, mas no segundo existe igualmente desdém.
b) o apelo às sensações parte do Sensacionismo do qual Florbela Espanca participou.
c) no primeiro poema há desespero, porém o segundo indica um caminho rumo à esperança.
d) em ambos os poemas é indicado o recurso do discurso direto.
e) no cheiro da pele há hipérbole e na mais triste das mulheres existe sinestesia.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 87


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8 – Gabarito

1. A 9. B
2. D 10. E
3. C 11. B
4. A 12. C
5. C 13. D
6. D 14. E
7. E 15. A
8. A

9 – Questões com Comentários

1. (UFRGS/2019)
Leia trechos dos poemas “Fanatismo”, de Florbela Espanca, e “Imagem”, de Cecília Meireles.

Fanatismo
(...)
“Tudo no mundo é frágil, tudo passa...”
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:


“Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim!...”

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 88


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Imagem
Tão brando é o movimento
das estrelas, da lua,
das nuvens e do vento,
que se desenha a tua
face no firmamento.

Desenha-se tão pura


como nunca a tiveste,
nem nenhuma criatura.
Pois é sombra celeste
da terrena aventura.
(...)

Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as seguintes afirmações sobre os poemas.

( ) Ambos os sujeitos líricos comparam o ser amado à perfeição divina.


( ) Ambos os sujeitos líricos veem o amor de modo idealizado.
( ) Ambos os sujeitos líricos falam diretamente ao ser amado.
( ) Ambos os poemas citam diretamente a voz da opinião pública.

A sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima para baixo, é


a) V – V – V – F.
b) V – V – F – V.
c) F – F – V – V.
d) F – V – F – V.
e) V – F – V – F.
Comentários
Afirmação I: verdadeira. Em “Fanatismo”, o ímpeto, o êxtase fazem o eu lírico inclusive
confundir seu objeto de amor. O amado e Deus se transfmam num só corpo e só espírito, o princípio
e o fim. Já no poema de Cecília Meireles, observamos “que se desenha a tua/face no firmamento”
Afirmação II: verdadeira. A idealização romântica é um dos traços do movimento literário do
Romantismo. Estudamos durante a aula que Florbela Espanca costuma misturar várias tendências,
estando a romântica incluída entre elas. O fato de o eu lírico associar o amado a Deus, inclusive
desdenhando dos palpites do senso comum, indicam uma idealização desse amor não concretizado
e certa fuga à realidade, temas recorrentes em sua poesia igualmente. No caso de “Imagem”, o
amado é alçado ao céu pelo lírico, há um exclusivismo, que chega a ser uma hipérbole: nunca
ninguém foi antes igual a ele.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 89


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Afirmação III: verdadeira. No primeiro poema, isso se


observa no verso: “E, olhos postos em ti, digo de rastros”.
Além da presença do pronome oblíquo tônico “ti”, e também
porque o discurso direto se dirige a ele especificamente, ou
seja, ele é o interlocutor do eu lírico. No segundo poema, há
uma diferença de registro, pois na primeira estrofe o eu lírico
fala de “tua face”, isto é, segunda pessoa do singular, ao passo
que na segunda fala: “Pois é sombra celeste/da terrena
aventura”, com o verbo conjugado na terceira pessoa do
singular para designar “você”. Em todo caso, trata-se do
amado.
Afirmação IV: falsa. Apenas em “Fanatismo”, o verso
assinalado entre aspas, “Tudo no mundo é frágil, tudo
passa...”, transmite o discurso alheio da opinião pública,
estabelecendo o contraditório com o que pensa e sente o eu-lírico, desmentindo a última afirmação.
Sequência correta: V – V – V – F.
Gabarito: “a”.
2. (UFRGS/2019)
Considere os poemas de Florbela Espanca.
Leia as seguintes afirmações sobre os sonetos “Fumo” e “Neurastenia”.

I. Em ambos os sonetos, a natureza é solidária aos sentimentos dos sujeitos líricos.


II. Em “Fumo”, o estado de alma do sujeito lírico é comparado à primavera.
III. Em “Neurastenia”, o sujeito lírico pede ajuda à natureza para dizer o que sente.

Quais estão corretas?


a) Apenas I.
b) Apenas II.
c) Apenas III.
d) Apenas I e III.
e) I, II e III.
Comentários
Atenção: nesse tipo de questão, era preciso conhecer os sonetos previamente.
Afirmação I: correta. Em “Fumo”, há todo um caminho de rosas que acompanham o eu lírico
em seu sofrimento. Basta lembrar da caricatura com os crisântemos (ainda mais especificamente,
roxos). Já em “Neurastenia”, os elementos da vhuca, do vento e da neve servem de interlocutora
com quem o eu lírico pode se lamentar, tentar travar um diálogo.
Afirmação II: incorreta. Cuidado: os dois temas, tanto do Outuno quanto da Primavera são
importantes para Florbela Espanca, mas vai depender do estado de espírito eu lírico, que varia ao
longos dos poemas, às vezes dentro de uma mesma obra. Em “Fumo”, há literalmente o verso: “Os
dias são Outonos: choram... choram...”.
Afirmação III: correta. Há invocação de uma série de elementos: chuva, flocos de neve, aves,
vento, neve. O eu lírico diz: “Batem as asas pela Natureza...”, aqui, encarada como ser divino, mais
uma técnica empregada por Florbela Espanca: transformação de um substantivo comum em próprio.
Gabarito: “d”.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 90


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3. (UFRGS/2019)
Considere os poemas de Florbela Espanca.
Assinale a alternativa correta sobre o poema “Ser poeta”.

a) O sujeito lírico canta a condição de inferioridade do poeta em relação às outras pessoas.


b) A intensidade de sentimentos impede o poeta de cantar o ser amado.
c) O poeta é capaz de sentir e viver com mais intensidade os acontecimentos da vida.
d) O poeta canta suas certezas.
e) O poeta é Rei de todos os reinos.
Comentários
Alternativa “a”: incorreta. Pelo contrário, de superioridade. Inclusive, aqui está manifesta
uma das outras máscaras de Florbela Espanca: uma que não é sofrida, mas sim assume postura de
orgulho, como indica este outro poema da poetisa:

O mundo quer-me mal porque ninguém sentimento de incompreensão


Tem asas como eu tenho! Porque Deus
Me fez nascer Princesa entre plebeus postura de orgulho/superioridade
Numa torre de orgulho e de desdém. beira a ironia

Porque o meu Reino fica para além...


Porque trago no olhar os vastos céus
E os oiros e clarões são todos meus!
Porque eu sou Eu e porque Eu sou Alguém! tautologia, autorreflexividade

O mundo? O que é o mundo, ó meu Amor? expressa suas dúvidas e inquietações


– O jardim dos meus versos todo em flor ... ao amado
A seara dos teus beijos, pão bendito ...

Meus êxtases, meus sonhos, meus cansaços ...


– São os teus braços dentro dos meus braços,
Via Láctea fechando o Infinito. Intertextualidade com o parnasiano Olavo Bilac

Alternativa “b”: incorreta. Pelo contrário. Florbela Espanca não trabalha com limites, com
impedimentos. Sua obra é aberta para potencialidades. No verso “Morder como quem beija!” de
“Ser Poeta”, o eu lírico compara a ânsia e o ímpeto de escrever como se fosse um impulso amoroso,
erótico (vide reflexões sobre Freud ao longo da aula).
Alternativa “c”: correta – gabarito. Como é expresso já desde o primeiro verso: “Ser poeta é
ser mais alto, é ser maior” até a chave de ouro: “E dizê-lo cantando a toda a gente!”. Logo, o poeta
é o artista da abrangência, da superioridade per se.
Alternativa “d”: incorreta. A linguagem é altamente metafórica. São dados vários conceitos
para o que seria ser poeta. Porém, a metaforicidade do texto não necessariamente coincide com as
realidades, as certezas. Até porque em vários outros poemas o que predomina é o contrário: são as
indeterminações.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 91


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Alternativa “e”: incorreta. Especifica os reinos: “Rei do Reino de Aquém e de Além Dor”, mas
também é mendigo. Ou seja, ser poeta é ser paradoxal, é conseguir encarnar em si forças
contraditórias e saber representá-las na arte.
Gabarito: “c”.
4. (PUC-MG/2015)
FANATISMO
Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...


Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!

“Tudo no mundo é frágil, tudo passa...”


Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:


“Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim! ...”
ESPANCA, Florbela. Livro de Sóror Saudade. [1923]. Domínio Público. Disponível em:
http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?
select_action=&co_obra=7534. Acesso em: 15 fev. 2015.

A poesia de Florbela Espanca é conhecida por sua singular representação do universo feminino. No
poema, a imagem construída pelo eu lírico é a de uma mulher
a) convicta de seu amor.
b) devota à vida religiosa.
c) receosa diante da morte.
d) obcecada pelo ser amado.
Comentários
Alternativa “a”: correta – gabarito. Tão convicta que chega a comparar o ser amado a uma
divindade perfeita.
Alternativa “b”: incorreta. Cuidado: Florbela Espanca o tempo inteiro embaralha as noções
de sagrado e profano. Não é porque o poema mencione Deus que ele necessariamente vai abordar
temática religiosa.
Alternativa “c”: incorreta. O Amor é deificado como se fosse a divindade mitológica do
Cupido. O impulso erótico e o de morte (tânatos) caminham juntos. Ela não receia a morte, mas sim
tem apego a ela, chega a desejá-la. Em determinados momentos, a morte parece a única solução
possível. A morte, então, representaria o anseio pelo infinito.
Alternativa “d”: incorreta. Atenção: no fundo, a obsessão é pela busca. Só ela é eterna. Seja
pelo amado, seja por Deus.

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Gabarito: “a”.
5. (PUC-MG/2014)
“Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!”
(Florbela Espanca, “Ser poeta”).

“Com a máscara da palavra


reinventamos
o som da voz amada
que nos inunda
com seu luar de espuma.”
(Ana Hatherly, “A máscara da palavra”).

“O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.”
(Fernando Pessoa, “Autopsicografia”).

Os textos têm em comum:


a) a concepção de escrita enquanto fingimento.
b) a recusa da inspiração sobre o trabalho artístico.
c) a temática voltada para a própria atividade poética.
d) a utilização de rimas ricas e versos metrificados.
Comentários
Questão de Literatura Comparada entre 3 escritores portugueses, sendo 2 deles mulheres.
Alternativa “a”: incorreta. Cuidado: apenas no terceiro. No primeiro poema, o eu lírico fala
sobre a figura do poeta e no segundo a máscara da linguagem se
remete a algo específico: o som da voz da amada.
Alternativa “b”: incorreta. Pelo contrário, não recusa, mas
associação da arte ao trabalho.
Alternativa “c”: correta – gabarito. O que os 3 textos têm em
comum entre si é caráter metalinguístico, que pode ser tanto uma
função de linguagem quanto um efeito de texto. A metalinguagem é a
linguagem se remetendo a ela mesma. Porém, pode ser um filme se
remetendo a ele mesmo; ou uma fotografia se remetendo a ela
mesma → trata-se de algo se remetendo a si mesmo.
Alternativa “d”: incorreta. O poema de Ana Hatherly, na
caricatura ao lado, não é metrificado (os versos têm tamanho
diferentes). Rimas ricas são entre palavras de diferentes classes
morfológicas.
Gabarito: “c”.
6. (UNIVAG-MT/2014)

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Leia o soneto Fanatismo, da poeta portuguesa Florbela Espanca.

Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida


Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...


Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!

“Tudo no mundo é frágil, tudo passa...”


Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, vivo de rastros:


“Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim!...”
(Sonetos, 1997.)

A temática desse poema pode ser relacionada ao


a) Modernismo, pois se notam experimentações linguísticas que objetivam dar uma linguagem
rebuscada e hermética ao texto.
b) Classicismo, uma vez que a presença de seres da mitologia clássica é evidente na descrição que o
eu lírico faz de si mesmo.
c) Barroco, visto que o eu lírico condena o fanatismo atrelado a crenças e a misticismos considerados
irracionais.
d) Romantismo, visto que o eu lírico despreza a contenção dos sentimentos e expressa suas emoções
de forma exacerbada.
e) Arcadismo, pois o eu lírico e o ser amado inserem-se em um ambiente campestre em que os
elementos da natureza são descritos detalhadamente.
Comentários
Alternativa “a”: incorreta. Em outros poemas, sim, como é são o caso do que chamei de
semissonetos, mas não é o caso. Esse consiste num soneto clássico.
Alternativa “b”: incorreta. Não diretamente. Ela continua chamando Amor de amor, não de
outra coisa, como Cupido. Trata-se apenas de uma inferência, mas, se for aludir a uma religião, o eu
lírico menciona a católica, mediante citação de Deus.
Alternativa “c”: incorreta. Não há condenação moral neste poema. Pelo contrário, o eu lírico
se confessa andar perdida.
Alternativa “d”: correta – gabarito. Cuidado: Floberla Espanca pode concatenar várias
tendências de movimentos literárias diferentes, até mesmo no mesmo poema (como é o caso de
“Lágrimas Ocultas”, por exemplo), mas a questão queria saber qual era a vertente predominante. O
sentimentalismo exacerbado, a idealização, até mesmo uma criação de uma utopia (transformação

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do amado em Deus), e a fuga da realidade são características que nos permitem enquadrar esse
poema na temática romântica.
Alternativa “e”: incorreta. Não detalhadamente, mas apenas com alusões vagas, como
repetição de ciclos, princípio e fim, o velho retorno do mesmo, como chamaria o filósofo alemão
Friedrich Nietzsche: “A mesma história tantas vezes lida!”.
Gabarito: “d”.

7. (UNIFESP/2009)
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES:

ESQUECIMENTO
Esse de quem eu era e era meu,
Que foi um sonho e foi realidade,
Que me vestiu a alma de saudade,
Para sempre de mim desapareceu.

Tudo em redor então escureceu,


E foi longínqua toda a claridade!
Ceguei... tateio sombras... que ansiedade!
Apalpo cinzas porque tudo ardeu!

Descem em mim poentes de Novembro...


A sombra dos meus olhos, a escurecer...
Veste de roxo e negro os crisântemos...

E desse que era meu já me não lembro...


Ah! a doce agonia de esquecer
A lembrar doidamente o que esquecemos...!
Florbela Espanca

Na última estrofe, o eu lírico expressa, por meio de:


a) Hipérboles, a dificuldade de se tentar esquecer um grande amor.
b) Metáforas, a forma de se esquecer plenamente a pessoa amada.
c) Eufemismos, as contradições do amor e os sofrimentos dele decorrentes.
d) Metonímias, o bem-estar ligado a amar e querer esquecer.
e) Paradoxos, a impossibilidade de o esquecimento ser levado a cabo.
Comentários
Este soneto está em Reliquiae. Nele, o eu lírico explora a angústia de pertencer sem ser
pertencida, trata-se de um não pertencimento. Em “Que foi um sonho e foi realidade” a conjunção
é mais adverstativa do que aditiva. O esquecimento passa pelo filtro temporal, pela relação entre
passado e presente. O esquecimento também passa pelo inconsciente, pela loucura, um “lembrar
doidamente o que esquecemos”.
Alternativa “a”: incorreta. O esquecimento é involuntário. É mais fácil esquecer que lembrar.
Para lembrar, precisamos fazer esforço. Mas não escolhemos o que esquecemos.

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Alternativa “b”: incorreta. Nunca plenamente, pois há algo no substrato do inconsciente que
pode permanecer e retornar. Trata-se do amor sublimado.
Alternativa “c”: incorreta. Eufemismo é uma figura de linguagem de abrandamento,
mitigamento e não de contradição.
Alternativa “d”: incorreta. Metonímia é uma figura de linguagem que ocorre para representar
a relação entre uma parte e o todo. O estar com o amado é só um sonho. Na realidade, ela não está
com ele. E lamento que o fato do desaparecimento físico do amado também pode simbolizar o
mental, seu respectivo esquecimento.
Alternativa “e”: correta – gabarito. Pois é como diz o ditado popular: “quanto mais quer se
esquecer, pelo contrário, mais se lembra”.
Gabarito: “e”.

8. (UNIFESP/2009)
O esquecimento descrito pelo eu lírico:
a) Decorre do seu sentimento de perda e de saudade.
b) É fruto dos seus sonhos, incompatíveis com a realidade.
c) Torna-o ciente de que sua agonia está por findar.
d) Traduz a esperança, pelo jogo de cores remetendo à claridade.
e) Mostra o amor como intenso e indesejável.
Comentários
Alternativa “a”: correta – gabarito. A representação do amor em Florbela Espanca
frequentemente passa pela noção da perda, da falta. Nesse poema, reaparecem os crisântemos
roxos, as flores que simbolizam seu alento, que a amparam.
Alternativa “b”: incorreta. Não são incompatíveis. Seu desejo é que fossem compatíveis. O
esquecimento tem a ver com a realidade. O sonho é um lugar em que o eu lírico ainda pode resgatar
a lembrança do amado, mas, a partir do momento que acorda, percebe a sua ausência física.
Alternativa “c”: incorreta. Em nenhum momento. A busca por algo é eterna; logo, sempre vai
haver uma falta, a qual constantemente está associada à dor, à angústia, ao desespero.
Alternativa “d”: incorreta. A claridade é longínqua. Há versos que dizem literalmente: “Tudo
em redor escureceu, /e foi longínqua toda a claridade”. Talvez haja um jogo de luz e sombras, o que
remete à técnica do chiaroscuro do Barroco.
Alternativa “e”: incorreta. “A doce agonia de esquecer”, um paradoxo sadomasoquista. Ela
não gosta nem de lembrar nem de esquecer. Em tudo ela sente dor, mas parece se comprazer dessa
dor.
Gabarito: “a”.

9. (UESPI/2008)
Os enunciados seguintes versam sobre o Modernismo em Portugal, suas fases e seus autores.
Assinale a alternativa correta.
a) Divide-se o Modernismo português em quatro momentos, todos eles marcados pelo viés
surrealista e cubofuturista.
b) Fernando Pessoa, inserido no primeiro momento do Modernismo em Portugal, experimentou
radicalmente a poesia, atribuindo, inclusive, muitos poemas a heterônimos determinados.
c) O segundo momento do Modernismo português ficou conhecido como Orfismo, caracterizado
pelo diálogo intenso com as vanguardas européias.

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d) O neo-realismo português coincidiu com o neorealismo brasileiro, e se caracterizou pelo retorno


ao positivismo dominante nas obras de Eça de Queirós, escritor eleito como modelo da escrita
realista.
e) Florbela Espanca e José Saramago marcaram o início do quarto momento do Modernismo
português, caracterizado por uma estética romântico-sentimental.
Comentários
Alternativa “a”: incorreta. São 3 as gerações modernistas portuguesas, assim como as
brasileiras. A primeira é chamada de Orfismo, em que encontram Fernando Pessoa e Mário de Sá-
Carneiro. Leva esse nome por conta da Revista Orpheu que coordenavam. Depois ouve o
Presencismo, que continuou o trabalho de seus precursores. Destaca-se José Régio, por exemplo. E,
por fim, o Neorrealismo. Florbela Espanca se situa na historiografia literária entre o Simbolismo e o
Orfismo, embora não tenha participado deste. Justamente por isso, ela parecia ter livre trânsito
entre as tendências. Em certa medida, sentia-se livro do Orfismo e de suas regras protocalores.
Alternativa “b”: correta – gabarito. Fernando Pessoa tinha 117 heterônimos. Heterônimos:
são autores fictícios, com personalidade e estilo próprios. Um mesmo poeta pode assumir diferentes
personalidades e ter diversos heterônimos e cada um escrever de uma maneira. Eles se diferenciam
do ortônimo, o nome correto, certo, do escritor. O primeiro foi criado com 5 anos de idade, quando
ele inventou um interlocutor para quem enviava cartas. Os heterônimos tinham vida própria,
características de personalidade e estilo, data de nascimento e alguns de morte (outros, nem isso.
Pairam por aí vivos até hoje...).
Alternativa “c”: incorreta. Foi o primeiro. A segunda geração
modernista é conhecida como Presencismo.
Alternativa “d”: incorreta. O neorrealismo português foi a sua
terceira geração modernista, ao passo que foi a segunda geração
modernista brasileira a conhecida como neorrealista.
Alternativa “e”: incorreta. José Saramago é um escritor
contemporâneo de Portugal. Representa a literatura contemporânea,
ou tendências contemporâneas. Porém, Florbela Espanca é uma
escritora da transição do século XIX para o XX.
Gabarito: “b”.

10. (Mackenzie/1998)
I - Não me encontro com ninguém
(tenho fases, como a lua...)
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
(Cecília Meireles)

II - Sou talvez a visão que Alguém sonhou,


Alguém que veio ao mundo pra me ver
E que nunca na vida me encontrou!
(Florbela Espanca)

III- Quadrilha
João amava Teresa que amava Raimundo

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que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili


que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes que não tinha entrado na história.
(Carlos Drummond de Andrade)

Assinale a alternativa INCORRETA.


Sobre a relação entre os textos afirma-se que:
a) há uma confluência entre eles, na afirmação do eterno desencontro, inerente à busca amorosa.
b) os dois primeiros unem-se num tom de lamento poético, enquanto o terceiro, definindo-se pela
incorporação ao poético, do cotidiano prosaico, encaminha-se para o tom de ironia e de humor.
c) os dois primeiros fragmentos, com métrica regular, opõem-se ao poema QUADRILHA, que
transgride a métrica tradicional, o que vem confirmar uma postura ideológica dos textos.
d) no poema QUADRILHA, a sucessão de especificações dos três primeiros versos introduz a ideia de
desencontro, confirmada nos três últimos versos.
e) os três textos unem-se pelo fato de apresentarem o tema por meio de um EU que fala e se assume,
contando e lamentando a própria história.
Comentários
Atenção: novamente, uma questão de Literatura
Contemporânea, envolvendo 3 escritores, entre eles 2
mulheres. E ainda 2 escritores brasileiros, apenas Florbela
Espanca é portuguesa. A questão ainda traz outro grau de
dificuldade: era para marcar a alternativa INCORRETA.
Alternativa “a”: correta. Em Florbela Espanca,
revela-se muito presente o processo de eterna busca e
frustração diante do desencontro. O eu lírico de Carlos
Drummond de Andrade brinca inclusive com os sujeitos
gramaticais: os sujeitos nem sempre são correspondidos
e uma ação nem sempre é correspondida. Há uma
enumeração de ações que podem conduzir a pontas
soltas, elos perdidos. e o eu lírico de Cecília Meireles diz “Não me encontro com ninguém”.
Alternativa “b”: correta. Em Florbela Espanca manifesta-se a melancolia; o eu lírico de Cecília
Meireles revela inconstâncias: há dias e caça e de caçador; e o de Carlos Drummond de Andrade
satiriza que essa situação pode ocorrer comumente, em qualquer lugar. Há um viés tragicômico.
Alternativa “c”: correta. Os versos de Drummond são irregulares, o que já constatamos pelo
seu tamanho. Os de Florbela Espanca já vimos ao longo das aulas que são regulares, costumando ser
decassílabos, como é o caso. E os de Cecílias Meireles são redondilhas maiores.

Não-meen-con-tro-com-nin-guém (7 sílabas poéticas)


(te-nho-fa-ses,-co-moa-lu-a...) (7 sílabas poéticas)
No-di-a-deal-guém-ser-meu (7 sílabas poéticas)
Não-é-di-a-deeu-ser-su-a... (7 sílabas poéticas)

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 98


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Alternativa “d”: correta. No Modernismo, não há idealização, finais felizes necessariamente.


Não é porque as pessoas amam que elas serão correspondidas. Uma frustração de um amor não
correspondido pode levar ao suicídio. Ou as pessoas podem apenas se reinventar.
Alternativa “e”: incorreta – gabarito.
Gabarito: “e”.

11. (3º Provão de Bolsas – Estratégia Vestibulares 2020 – Profa. Luana Signorelli)
Leia o soneto abaixo para julgar aos itens.

Eu
Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada … a dolorida …

Sombra de névoa tênue e esvaecida,


E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!…

Sou aquela que passa e ninguém vê…


Sou a que chamam triste sem o ser…
Sou a que chora sem saber porquê…

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,


Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!
Florbela Espanca – Eu.
Disponível em: https://tinyurl.com/sm5co7s. Acesso em: 06 mar. 2020.

I. O caráter depressivo do poema indica um eu lírico propenso ao sentimento abstrato e que


se sente invisível.
II. O jogo entre perder e se encontrar também é gramatical, da transição entre o pronome
demonstrativo para o relativo.
III. Temas como morbidez, tédio e indiferença fazem com que o soneto possa se enquadrar na
estética ultrarromântica.

Está CORRETO o que se afirma em:


a) I.
b) I e II.
c) III.
d) II e III.
e) todas estão corretas.
Comentários

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 99


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Florbela Espanca (1894-1930), poetisa portuguesa, produziu uma poesia caracterizada


pelo sofrimento, feminilidade e erotismo. Seus livros mais conhecidos são o Livro de Mágoas (1919)
e o Livro de Sóror Saudade (1923). Ela morreu por uma overdose de barbitúricos aos 36 anos.
Afirmação I: correta. Abstrato porque ela se sente como uma visão sonhada por alguém, no
caso, Alguém, com letra maiúscula, o que requer superioridade a um ser, divindade até, um nome
próprio a alguém que nem existe.
Afirmação II: correta. No caso: “eu sou a que/aquela que” para “a visão que Alguém sonhou”.
Um dos motivos para o eu lírico se sentir perdida é que ela não foi encontrada.
Afirmação III: incorreta. Embora essa geração portuguesa também tenha sido “maldita”,
suicida (Camilo Pessanha também se suicidou), o soneto se enquadra no Simbolismo e não no
Ultrarromantismo. Além disso, uma característica correta seria talvez o apego à morte, mas não
indiferença (o eu lírico sente muito, é extremista). Percebemos o Simbolismo em outros temas:
“névoa tênue e esvaecida”.
Gabarito: “b”.
12. (2º Simulado FUVEST – Estratégia Vestibulares 2020 – Profa. Luana Signorelli)
FONÓGRAFO
Vai declamando um cômico defunto.
Uma platéia ri, perdidamente,
Do bom jarreta... E há um odor no ambiente
A cripta e a pó, do anacrônico assunto.

Muda o registo, eis uma barcarola:


Lírios, lírios, águas do rio, a lua...
Ante o Seu corpo o sonho meu flutua
Sobre um paul, extática corola.

Muda outra vez: gorjeios, estribilhos


Dum clarim de oiro o cheiro de junquilhos,
Vívido e agro! tocando a alvorada...

Cessou. E, amorosa, a alma das cornetas


Quebrou-se agora orvalhada e velada.
Primavera. Manhã. Que eflúvio de violetas!
Camilo Pessanha – Clepsidra. Fonte: Domínio Público.
Disponível em: https://tinyurl.com/vgdzopv. Acesso em: 03 de abril de 2020.

Atente para as seguintes afirmações relativas ao soneto do simbolista português.

I. A relação do título com o poema em si é percebida na mudança do foco temático.


II. O movimento literário do Simbolismo emprega frequentemente a sinestesia.
III. Num tom vidente, em “extática corola” o eu lírico chama atenção do cientificismo.

Está correto o que se afirma apenas em


a) I.
b) II.

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c) I e II.
d) II e III.
e) I e III.
Comentários
Afirmação I: correta. O fonógrafo é um instrumento antigo para se tocar discos. Mudar o
registro é literalmente como trocar o disco.
Afirmação II: correta. Figura de linguagem que materializa a união de sentidos, como no verso
“Dum clarim de oiro o cheiro de junquilhos”.
Afirmação III: incorreta. Não há informações suficientes para se afirmar isso.
Gabarito: “c”.

13. (QUESTÃO AUTORAL – LUANA/2020)


Considere os sonetos de Florbela Espanca.

1. “Lágrimas Ocultas”
2. “A Minha Dor”.

( ) A dor do sujeito lírico acompanha a sua máscara de santidade.


( ) Há personificação quando os sinos assumem a ansiedade do sujeito lírico.
( ) O sujeito poeta resgata lembranças de outras eras.
( ) A transfiguração do sofrimento do sujeito lírico lembra o rebuscamento barroco.

A sequência correta de associações é:


a) 1 – 2 – 1 – 2
b) 1 – 1 – 2 – 2
c) 1 – 1 – 1 – 2
d) 2 – 2 – 1 – 1
e) 2 – 2 – 2 – 1
Comentários
Afirmação I: “A Minha Dor” (2). O soneto começa com o verso: “A minha Dor é um convento
ideal”. Ela mora em sua dor, tal qual ela fosse um lugar físico. E se compadece dela, e se
autossacrifica. Ela aceita essa dor.
Afirmação II: “A Minha Dor” (2). Como ocorre em: “Os sinos têm dobres de agonias/ Ao
gemer, comovidos, o seu mal...”.
Afirmação III: “Lágrimas Ocultas” (1). O processo de rememoração evoca o passado, ela está
mergulhada num estado contemplativo que lembra o de uma monja.
Afirmação IV: “Lágrimas Ocultas” (1). Como no verso “E a minha triste boca dolorida”. O
grotesco lembra a característica do feíismo no movimento literário do Barroco.
Sequênceia correta: 2 – 2 – 1 – 1
Gabarito: “d”.
14. (QUESTÃO AUTORAL – LUANA/2020)
Leia as seguintes afirmações sobre os poemas de Florbela Espanca.

I. Sonetos como “Quem Sabe!?...” podem ser caracterizados como modernistas.


II. “Súplica” não é um soneto, mas sim uma quadra inspirada em estilo medieval.

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 101


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III. Em “O Maior Bem”, o sujeito poético critica o materialismo do século XIX.

Quais estão corretas?


a) Apenas I.
b) Apenas II.
c) I e II.
d) II e III.
e) I, II e III.
Comentários
Afirmação I: correta. Em seu experimentalismo de forma (no caso, inserção de pontos finais
e algumas corruptelas), Florbela Espanca aproxima-se mais do movimento literário do Modernismo
do que do Simbolismo.
Afirmação II: correta. Inclusive, incorpora procedimentos da cantiga de amigo, em que o eu
lírico é geralmente feminino, e o tema mais frequente é um lamento amoroso da moça cujo
namorado partiu para as guerras árabes. “Súplica” são quadras invocando o amado; o eu lírico sente-
se pronta para ele na sua eterna espera.
Afirmação III: correta. Implicitamente, mas sim. Ao colocar algo imaterial como o amor na
posição de bem maior, ela critica que os bens podem não ser só materiais, como também espirituais,
metafísicos.
Sequência correta: todas estão corretas.
Gabarito: “e”.
15. (QUESTÃO AUTORAL – LUANA/2020)
TEXTO I
III
Frémito do meu corpo a procurar-te,
Febre das minhas mãos na tua pele
Que cheira a âmbar, a baunilha e a mel,
Doído anseio dos meus braços a abraçar-te,

Olhos buscando os teus por toda a parte,


Sede de beijos, amargor de fel,
Estonteante fome, áspera e cruel,
Que nada existe que a mitigue e a farte! (...)

TEXTO II – AMIGA
Deixa-me ser a tua amiga, Amor,
A tua amiga só, já que não queres
Que pelo teu amor seja a melhor,
A mais triste de todas as mulheres.

Que só, de ti, me venha mágoa e dor


O que me importa a mim?! O que quiseres
É sempre um sonho bom! Seja o que for,
Bendito sejas tu por mo dizeres! (...)

Aula 01: Poemas – Florbela Espanca 102


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Ao se comparar os trechos de soneto, é correto afirmar que:


a) em ambos há procura pelo amor, mas no segundo existe igualmente desdém.
b) o apelo às sensações parte do Sensacionismo do qual Florbela Espanca participou.
c) no primeiro poema há desespero, porém o segundo indica um caminho rumo à esperança.
d) em ambos os poemas é indicado o recurso do discurso direto.
e) no cheiro da pele há hipérbole e na mais triste das mulheres existe sinestesia.
Comentários
Alternativa “a”: correta – gabarito. No segundo, ela parece melindrar os outros possíveis
amores de seu amado. Ele deve estar apaixonado e dedicando seu amor a outras pessoas,
praticando-o que não com o eu lírico, para demonstrar-lhe assim tanta indiferença.
Alternativa “b”: incorreta. Sensacionismo é a segunda geração modernista portuguesa. De
todas as tendências, essa não é uma que Florbela Espanca manifesta, embora o apelo às sensações
seja, sim, um de seus temas mais frequentes. Porém, essa característica diz respeito ao Simbolismo.
Alternativa “c”: incorreta. A ironia é uma válvula de escape, sem dúvida, mas não esperança
necessariamente.
Alternativa “d”: incorreta. Apenas no segundo há um interlocutor claro, contudo, o diálogo
não é estabelecido mediante pontuação de dois pontos, aspas ou travessão, permanecendo apenas
no plano da invocação, do vocativo. No fundo, é um monólogo e o eu lírico revela a sua solidão.
Alternativa “e”: incorreta. É o contrário.
Gabarito: “a”.

10 – Referências Bibliográficas
ANJOS, Augusto de. Versos íntimos. Disponível em: https://tinyurl.com/mj6dxl. Acesso em: 07 jul.
2020.
APOLLINAIRE, Guillaume. Caligramas. Trad. Álvaro Faleiros. 2. ed. São Paulo; Brasília: Ateliê Editorial;
Editora UnB, 2019.
BARROS, Eliana Luiza dos Santos. Florbela Espanca: laços de amor e dor. Rio de Janeiro: Contra Capa,
2014.
BAUDELAIRE, Charles. Pequenos poemas em prosa (o Spleen de Paris). Trad. Dorothée de Bruchard.
São Paulo: Hedra, 2009.
______. As flores do mal. Trad. Júlio Castañon Guimarães. São Paulo: Penguin Classics Companhia
das Letras, 2019.
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Aula 01: Obras Literárias para UFRGS 2021

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VERLAINE, Paul. A voz dos botequins e outros poemas. Trad. Guilherme de Almeida. São Paulo:
Hedra, 2009.

11 – Considerações Finais

Eu me coloco à disposição de vocês para sanar eventuais e possíveis dúvidas.


Tenho a meta de responder ao Fórum de Dúvidas, com a qualidade e profundidade exigidas,
assim como podem me encontrar em redes sociais. E agora temos também a Sala VIP.

Versão Data Modificações


1 07/07/2020 Primeira versão do texto.

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