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SISTEMAS AGROFLORESTAIS E
AGRICULTURA FAMILIAR: UMA PARCERIA
INTERESSANTE
Maria Teresa Vilela Nogueira Abdo1, Sérgio Valiengo Valeri2, Antônio Lúcio Mello Martins3
1
Eng.Agr., Mestre, Pesquisador Científico, Pólo APTA Centro Norte, Caixa Postal 24, CEP:15830-000 Pindorama SP. Correio
Eletrônico: mtvilela@apta.sp.gov.br;
2
Eng.Agr., Doutor, Professor titular, Departamento de Produção Vegetal, UNESP- FCAV- Campus de Jaboticabal,
valeri@fcav.unesp.br;
3
Eng. Agr., Doutor, Pesquisador Científico, Pólo APTA Centro Norte, lmartins@apta.sp.gov.br.
RESUMO
Os Sistemas Agroflorestais (SAFs) têm sido amplamente divulgados como modelos de exploração
agropecuária que muito contribuem para a sustentabilidade da exploração agrícola atual. Para que
modelos agrícolas possam ser assim classificados esses devem seguir a definição dos SAFs, no qual é
necessário o uso de plantas arbóreas, arbustivas e herbáceas, consorciadas com espécies agrícolas e
forrageiras com ou sem a presença animal, mas obrigatoriamente associadas às espécies florestais. Tais
modelos se tornam alternativas interessantes para pequenos agricultores que buscam obter uma
exploração economicamente viável intensiva. Utilizando-se de uma diversidade de plantas de vários
estratos, numa mesma área, para atingirem o resultado esperado, esses produtores devem ter como
aliado imprescindível o manejo adequado e tecnicamente embasado. No Estado de São Paulo essa
discussão ganhou ainda maior destaque pela possibilidade de uso de modelos de SAFs nas áreas de
Reserva Legal, apoiados por lei em fase de regulamentação. O uso de SAFs exige uma maior difusão de
técnicas desenvolvidas, um comprometimento maior de políticas públicas de implantação e escoamento
de produção. Sendo assim, o presente trabalho tem por objetivo traçar considerações sobre o assunto e
apresentar alguns modelos de Sistemas Agroflorestais já implantados viáveis para instalação por
pequenos agricultores.
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O sucesso depende muitas vezes do agricultor tipo de exploração, e eventualmente trabalhada com a
que, amparado tecnicamente, deve ter o espírito ajuda de terceiros (Estatuto da Terra).”
inovador e investigativo para experimentar novas O conceito de propriedade familiar é
formas de associação de culturas e/ou animais, mas fundamental para entender o significado de Módulo
sem deixar de ser atento e cauteloso na observação dos Rural. O conceito de módulo rural é derivado do
resultados e problemas que possam surgir. Os conceito de propriedade familiar e, sendo assim, é uma
conhecimentos práticos, aliados ao conhecimento unidade de medida expressa em hectares, que busca
científico, dão uma grande contribuição na condução exprimir a interdependência entre a dimensão, a
dos plantios. situação geográfica dos imóveis rurais e a forma e as
O associativismo entre produtores é uma condições do seu aproveitamento econômico. A
alternativa sábia para vencer as dificuldades da cadeia Pequena Propriedade é o imóvel rural de área
produtiva, que vai desde a obtenção de sementes até a compreendida entre um e quatro módulos fiscais.
entrega do produto ao consumidor. O cooperativismo Módulo fiscal, por sua vez, é estabelecido para cada
facilita a compra de insumos, faz uso racional de município, e procura refletir a área mediana dos
equipamentos, racionaliza as atividades pós-colheita e Módulos Rurais dos imóveis rurais do município. Esses
promove um escoamento eficiente dos produtos. A valores variam para cada município e região
demanda por mão-de-obra é concentrada no momento Para Guanziroli et al.(2001), citado por Colla et al.
de implantação do SAF, portanto, a prática de mutirões (2008), enquadram-se na categoria de agricultores
é sempre indicada por alguns autores como sendo de familiares os produtores que têm a direção dos trabalhos
grande valia para grupos de produtores que trabalham realizados na propriedade feita pelo próprio produtor
com culturas semelhantes nos SAFs. rural e mão-de-inserir hífen antes da palavra (mesmo que
Como limitações técnicas para a implantação de fique em outra linha) regra nova ortográfica -obra
SAFs, podem-se citar: a existência de poucos estudos familiar utilizada em proporção maior do que a
das interações biofísicas entre os componentes do contratada. Sendo esse trabalho de grande importância
sistema que são de cunho multidisciplinar, poucos para a revalorização do meio rural, pois une a eficiência
conhecimentos sobre os arranjos, combinações de econômica com a eficiência social e contribui para a
espécies e manejo dos SAFs, alto custo das pesquisas de melhoria das condições de vida no campo. Segundo o
médio e longo prazos, inadequação dos serviço de Censo de 1997, 85,2% das propriedades brasileiras se
extensão rural e pequena disponibilidade de enquadravam na categoria de agricultores familiares,
germoplasma específico, pois o melhoramento genético ocupando 30,5% da área total nacional e respondendo
das espécies agrícolas e florestais sempre foi por 50,9% da renda na safra de 1995/1996. Essas
direcionado para o monocultivo. propriedades empregam mais de 2,5 milhões de pessoas
Para amenizar esses problemas enfrentados na no cenário nacional e para Guilhoto et al.(2006) um terço
fase de implantação, manejo e comercialização das do agro negócio nacional origina-se da produção
culturas, os órgãos competentes devem promover uma agropecuária realizada pela agropecuária familiar.
maior difusão de tecnologia disponível, oferecer apoio Abramovay (1997) ressalta que o conceito de
agricultura familiar não deve ser confundido
aos agricultores por meio de legislação, políticas
equivocadamente com “produção de baixa renda”,
públicas e incentivos para financiamentos. pequeno produção ou agricultura de subsistência,
conceitos esses que carregam uma carga de preconceito.
O conceito de agricultura familiar deve remeter a um
DISCUSSÃO conceito de agricultura social, ambiental e
economicamente viável e competitivo.
A busca de novos modelos com alternativas
Propriedade familiar e agricultura rentáveis e inovadoras empregando novas culturas e
familiar melhoria do escoamento da produção surge como uma
necessidade, pois segundo dados de Agroanalysis
A Propriedade Familiar é definida pelo artigo 4.º, (1998), os preços dos produtos como o arroz, feijão e
inciso II, da Lei n.º 4.504/64 como: “o imóvel rural que, milho tiveram redução de 3,55%, 3,59% e 3,52%,
direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua respectivamente, de 1990 a 1996 afetando os
família, lhes absorva toda a força de trabalho, agricultores familiares diretamente que tiveram acesso
garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e restrito às políticas públicas e que estavam voltados à
econômico, com área máxima fixada para cada região e produção de alimentos básicos (Colla et al., 2008).
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Para os autores é necessário que haja uma adoção espécies no espaço, combinam-se os consórcios no
de políticas públicas criando mecanismos alternativos tempo como no processo de sucessão natural de
de escoamento dessa produção e uma diversificação da espécies, em que os consórcios se sucedem uns após
produção por meio da agroindustrialização. A escolha outros, num processo dinâmico, dependendo do ciclo
do melhor mecanismo de comercialização leva em de vida das espécies. Outro aspecto fundamental é a
consideração a oferta, condições climáticas e introdução de alta diversidade de espécies, replicando
comportamento sazonal do produto. Colla et al. ( 2008) uma característica marcante de ecossistemas da Mata
apontam as feiras-livres como um canal de distribuição Atlântica, o bioma original.
importante na comercialização de produtos A classificação dos SAFs se baseia nos critérios de
provenientes da agricultura familiar, pois apresentam arranjos espacial e temporal, na importância e no papel
uma relação mais estreita com o consumidor e uma dos componentes, no planejamento da produção ou na
melhor rentabilidade dos produtos comercializados. produção do sistema, e suas características
A agregação de valores aos produtos obtidos, socioeconômicas (Nair, 1985 appud Santos 2000). Os
valorizando a produção regionalizada diferenciada na Sistemas Agroflorestais, segundo Bernardes (2008),
tentativa de superar a restrição de escala imposta pela podem ser classfificados de acordo com seus
pequena propriedade e a diversificação da produção componentes em Silviagrícola ou agrossilviculturais,
tornando os produtores menos susceptíveis à (Espécies florestais e culturas agrícolas) (Figura1);
sazonalidade, devem ser importantes preocupações Silvipastoril ( Espécies florestais e forrageiras para
dos produtores que se enquadram como produtores alimentação animal) ou (espécies florestais, forrageiras
familiares. e animais) (Figura 2) e Agrossilvipastoril ( Espécies
florestais, culturas agrícolas e forrageiras para
alimentação animal)(Figura 3).
Sistemas agroflorestais De acordo com a disposição das espécies no
O termo “Sistema Agroflorestal” (SAF) campo os modelos podem ter uma grande variação,
corresponde a uma forma de uso da terra e manejo dos consistindo desde sistemas mistos adensados como
recursos naturais, nos quais espécies lenhosas (árvores, quintais caseiros, mistos de baixa densidade, como os
arbustos, palmeiras) são utilizadas em associação com sistemas agrissilvipastoris, em faixas ou contínuos ou
cultivos agrícolas ou animais, na mesma área, de ainda ao acaso. E de acordo com a disposição das
maneira simultânea ou em uma sequência temporal espécies no tempo, os SAFs podem ser simultâneos ou
(Montagnini, 1992). sequenciais.
Para Nair (1989) e Young (1990) o Sistema Os SAFs sequenciais ocorrem de forma que haja
Agroflorestal (SAF) é um sistema de uso da terra com a um intervalo de tempo entre a colheita da primeira
introdução ou retenção deliberada de árvores em cultura e a semeadura da cultura subsequentes. Já para
associação com outras culturas perenes ou anuais e/ou os simultâneos podem-se observar que existem várias
animais, apresentando mútuo benefício ou alguma situações: duas culturas com a mesma época de plantio
vantagem comparativa aos outros sistemas de e colheita (SAF coincidente), culturas de mesma época de
agricultura resultante das interações ecológicas e semeadura e épocas diferentes de colheita
econômicas. Pode apresentar várias disposições em (concomitantes). Um exemplo interessante de SAFs de
espaço e tempo, e deve utilizar práticas de manejo culturas concomitantes é o plantio de palmeira real e
compatíveis com o produtor. palmito jussara para obtenção de palmito sob plantio de
Peneireiro (2008) afirma que a floresta é eucalipto (Figura 4) onde a cultura do palmito é extraída
composta por várias espécies, que se desenvolvem em com cinco anos, portanto antes do término do primeiro
diferentes contextos (nichos) e ocupam o espaço vertical ciclo do eucalipto que se dá com sete anos.
de forma bastante completa, com seus estratos, de Outro modelo de SAF é o sobreposto quando
acordo com a necessidade específica de cada uma ocorre a semeadura de uma cultura antes do final do
dessas espécies, em luz, direta ou filtrada, fazendo com ciclo de uma cultura já instalada no local e cuja colheita
que a energia do sol seja aproveitada da melhor maneira será feita após o término do ciclo da primeira cultura
possível. Nos SAFs as plantas cultivadas são instalada. Ainda temos o modelo interpolado no qual
introduzidas em consórcio, de forma a preencher todos durante o ciclo de uma cultura perene temos a
os nichos, inclusive, considerando nessa combinação, implantação de culturas de ciclo menor. Por exemplo, o
espécies nativas remanescentes, espécies da cultivo de culturas anuais sob árvores de seringueira ou
regeneração ou reintroduzidas. Além de combinar as eucalipto.
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O conhecimento acerca das espécies tem outro As plantas perto do eucalipto apresentaram
aspecto interessante: quanto mais o agricultor conhece a produtividade muito superior quando comparadas ao
espécie e seu uso, mais retorno pode ter do SAF, seja restante da parcela (Figura 5) Os resultados da área de
para uso da família (alimentação, medicamentos, observação implantada indicam a complementaridade
artesanato), para alimentação dos animais ou como uso do uso do ambiente disponível (solo e clima) pelos
de espécieschave sendo repelentes ou atratoras de cultivos envolvidos (eucalipto, feijão, milho e mandioca).
fauna e/ou insetos e para a destinação final do produto Com as produtividades obtidas para os componentes
obtido (Penereiro, 2008). Para Castanho Filho (2008), milho e feijão e considerando as médias de produtividade
embora, o uso da madeira e seus resíduos no Estado de dos plantios em área total para essas culturas no Espirito
São Paulo como fonte energética seja pequeno, este Santo, pode-se concluir que, apesar do reconhecimento
apresenta um grande potencial de crescimento. O dos benefícios dos SAFs, o entendimento sobre o seu uso
plantio de árvores na propriedade pode reduzir os em condições específicas e sobre sua capacidade de
custos de produção agrícola devido aos menores gastos gerarem benefícios ainda são limitados.
na conservação de solos e combate de pragas e doenças,
substituição de material para cercas e construções, fonte
alternativa para abastecimento energético e rendas
alternativas com a madeira explorada e subprodutos.
Essa situação também leva a uma menor pressão na
utilização de florestas nativas como fonte de matéria-
prima, principalmente para energia.
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Santos (2000), avaliando Sistemas Agroflorestais Esse valor nos dará a área necessária para
em áreas degradadas por pastagens na Amazônia, obtenção da mesma produção em monocultivo
concluiu que além de economicamente viável, esses comparada a um ha de SAF.
sistemas são benéficos para recuperar essas áreas. O A seguir algumas fotos de SAFs já implantados:
modelo multiestrato com introdução de diversas
espécies arbóreas definidas pelo autor como frutíferas
perenes (mogno, castanha-do-brasil e teca) e
semiperenes (araçá-boi, jenipapo, acerola e maracujá) e
com cultivo de arroz no primeiro ano juntamente com
cupuaçu, apresentou maior desempenho pelo valor
comercial das espécies adotadas. O oferecimento de
produtos madeireiros e não madeireiros contribuem no
sucesso do empreendimento, pois proporcionam fluxo
de caixa maior ao agricultor, flexibilidade de
comercialização e otimização de mão-de-obra. A
produção de culturas em SAFs pode superar o
monocultivo em termos de produtividade se for
adotado manejo adequado.
Para efeito de cálculo da área necessária para se
obter uma determinada produtividade comparando-se
a cultura em sistema de monocultivo e em SAFs deve-se
utilizar o conceito de equivalência de uso da terra
representada pela fórmula (Bernardes, 2008):
N
produtividade da cultura i no SAF
EUT = ?
produtividade da cultura i em monocultivo
i=1
Figura 11. Seringueira e Palmito Jussara (Fonte: Brioschi. V Ciclo de
Palestra sobre a Heveicultura Paulista)
Figura 10. Plantio de maracujá cultivado entrelinhas de seringueira Figura 12. Plantio de filas duplas de seringueira ( 13,0 x 3.0 x 2,5 m)
(Fonte: Bernardes, 2008) (Fonte: Bernardes,2008)
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Figura 13. Café arborizado por coco e seringueira, experimento Figura 16. Plantio de milho entre seringueira (Fonte: Brioschi. V Ciclo
realizado na área do Polo Apta Centro Norte, Pindorama, SP. de Palestra sobre a Heveicultura Paulista)
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