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A Probabilidade e o

Mercado Financeiro
José Gaspar
30/08/2017

Uma das principais premissas da Análise Técnica é que o preço dos


ativos se move em tendências e que podemos acompanhar essas
tendências ou até mesmo apostar em sua reversão. Para tanto
precisamos determinar os momentos em que elas acontecem.

Em contraponto a esse princípio temos a Hipótese dos Mercados


Eficientes (HME), que prega fundamentalmente que os preços
refletiriam toda a informação disponível num dado momento. A
implicação desse fato é que o mercado seria imprevisível. Um trader
com um controle de risco fixo, não conseguiria ter consistentemente
retornos superiores à média do mercado, pois ele só disporia das
informações que todos os demais agentes também dispõe no momento
em que a operação é realizada. Assim, o mercado, espelhando nos
preços todas as informações disponíveis, até mesmo as ocultas ou
privilegiadas, seria mais eficiente do que um trader que não poderia
integrar todas as variáveis que o mercado já integrou para formar o
preço.

Isso não significa necessariamente que o mercado seria estável ou não


sujeito a crises e bolhas como a palavra “eficiente” sugere, apenas nos
diz que um trader não poderia vencer o mercado.

Sendo eficiente ou não, uma coisa é certa, todos os dias, milhares de


traders ao redor do mundo operam comprando e vendendo ações,
futuros, moedas e outros ativos financeiros com bons rendimentos e
consistência nos resultados, sem necessariamente disporem de muito
capital. Será que contam apenas com a sorte? Será que transitam num
mar de aleatoriedade apostando na roleta dos preços?
Antes de mais nada precisamos entender que traders profissionais
utilizam métodos estatisticamente comprovados. Como já abordei no
artigo anterior, basicamente temos dois tipos de métodos: para operar
tendências e lateralizações.

Geralmente quanto decidimos operar no mercado escolhemos um


timeframe no qual vamos nos concentrar. O trader pode decidir operar
observando os preços em uma periodicidade pequena, como 15
minutos ou 1 hora; média, como 1 dia ou 1 semana; ou grande como 1
mês ou 6 meses. Assim, ele vai fazer suas compras e vendas dos
ativos analisando os preços com base em um desses pacotes de tempo
(15 minutos, 1 hora, 1 dia, 1 semana, etc.). Em última análise, além de
tendências e lateralizações, um ativo em qualquer periodicidade, ou
timeframe, apresenta dois tipos de comportamento possíveis. Ele pode
ser ordenado, ou seja, conseguimos observar um padrão para o
movimento dos preços. Esse padrão pode ser a tendência ou a
lateralização na qual os preços respeitam suportes e resistências. Mas
o comportamento dos preços pode também não apresentar nenhum
tipo de padrão reconhecível, pode ser tão errático e desordenado que
não conseguimos identificar um viés, direção ou lógica no
movimento. Nesse caso é melhor ficar fora do mercado.

Essa dupla, ordem x desordem, ou padrão x errático, varia em


proporção dependendo de várias coisas como o momento político-
econômico do país, a situação dos fundamentos da empresa ou do
ativo, o cenário internacional, a quantidade de capital alocado no ativo
por um grande fundo, etc. E não há nenhuma evidencia, matemática
ou lógica, que sugira que certos timeframes possuem mais
frequentemente um ou outro elemento dessa dupla.

Poderíamos supor que pela Lei dos Grandes Números timeframes


maiores, como 1 semana ou 1 mês, apresentariam padrões de ordem
mais recorrentes. Mas isso não acontece, pelo menos não em função
da lei de Bernoilli, pois ela diz apenas que quanto mais eventos
observados, mais próximos ficamos da probabilidade calculada.

Quando calculamos a probabilidade de que uma moeda jogada ao ar


tem 50% de chance de dar cara, esse cálculo se baseia na quantidade
de possibilidades que existem para o evento. Assim, quanto mais
vezes jogarmos a moeda, mais próximo o resultado ficará do valor
calculado de 50%. Se usarmos essa lógica no mercado, só poderemos
dizer que existe 50% de chance do mercado subir e 50% dele cair. Ou
seja, o óbvio. A Lei dos Grandes Números diria que numa quantidade
grande de operações nos aproximaríamos desses 50%. Esta é uma
verdade estatística demonstrável. Basta analisarmos o movimento do
Ibov ao longo de um tempo razoavelmente longo, 9 anos por exemplo.
Veja:
O primeiro gráfico mostra a variação do Ibov de 2007 a 2015. A alta
volatilidade na parte esquerda do gráfico se deve à crise de 2008. Mas
mesmo com a grande queda nos preços desse ano, ainda assim, as
variações transitaram em torno do zero. Ou seja, temos uma
quantidade semelhante de altas e baixas. De fato, dos 2203 dias
analisados, tivemos 1123, ou seja, 50,98% de alta, enquanto tivemos
1080, ou 49,02% de baixa. Assim, quanto maior a quantidade de
dados analisados, mais próximos ficamos do cálculo da probabilidade.
A distribuição dos retornos é uma curva Gaussiana quase perfeita.

Isso não significa que quem operou no mercado de 2007 a 2015


acabou no zero a zero. O cálculo aqui se refere à frequência de altas e
baixas, não ao lucro aferido em operações. Um método é exatamente
uma maneira eficiente de navegar em todos esses cenários do
mercado.

Dessa forma, dentro dos 50% de probabilidade de chance do mercado


subir ou descer que se confirma estatisticamente, isso não nos diz nada
sobre haver mais ou menos aleatoriedade em prazos maiores, ou mais
ou menos tendências/lateralizações. Qualquer previsão de
probabilidade que vá além disso só pode ser demonstrada
estatisticamente, ou seja, após os eventos terem acontecido.

Se imaginarmos 1 ano de negociações, no qual aconteceram 100


milhões de negócios, e dividirmos todas essas negociações em pacotes
de 1 dia ou de 1 hora, desde que tenhamos liquidez suficiente, isso não
fará nenhuma diferença estatística nos resultados. Muito menos diria
algo sobre nos aproximarmos mais ou menos de alguma ordem que o
mercado possa apresentar nesse período. Essa análise da frequência da
dupla ordem/aleatoriedade só pode ser aferida estatisticamente. Não
podemos quantificá-la a priori.

De qualquer forma, parece evidente que o mercado apresenta


momentos de ordem. Observamos padrões, por exemplo, quando um
ativo está em tendência definida, ou numa lateralização com suportes
e resistências claras. Usar o setup IFR2 é justamente se basear nessa
lógica lateral.

Esses momentos de ordem que o mercado apresenta, é o que faz com


que modelos baseados no Random Walk não pareçam ser boas
abordagens para operar. Mais sobre o Random Walk em artigos
futuros.

Assim, o fato do prazo ser maior ou menor, não faz, em princípio,


com que a tendência (ou melhor, a não aleatoriedade), seja mais
frequente. A única maneira de demonstrar isso seria através de uma
análise de um período de pelo menos 5 anos de vários ativos em várias
periodicidades. Essa seria uma demonstração de que, por exemplo, em
prazos maiores o mercado apresentaria mais tendências. Mas acredito
que os tempos gráficos guardam uma relação fractal entre si, ou seja,
todos eles apresentam um comportamento muito semelhante.

É claro que se tomarmos um ativo desenvolvendo uma tendência forte


ao longo de um mês, então, dentro desse mês, lá no intraday, iremos
observar muito mais ruído do que se olharmos o gráfico semanal, ou
seja, nesse caso, teremos mais aleatoriedade comparando o timeframe
horário com o semanal. Mas, o fato é que um ativo pode apresentar
uma tendência definida e clara no timeframe horário, e ser lateral, ou
até errático, no diário.

Dessa forma, sua escolha entre operar day trade, swing trade ou
position deve se basear principalmente em seu perfil e em estatísticas
que demonstrem que aquela estratégia específica apresentou e vem
apresentando resultados consistentes.

No próximo artigo veremos como determinar os momentos em que o


mercado apresenta ordem. Como descobrir a tendência do mercado.

José Gaspar

*publicado em 30/08/2017

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