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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ

PSICOLOGIA

GIOVANNA GUEDES, JULIA FREIRE, MERIELLY NASCIMENTO, MONALISA


RIBERIO, STHEFANY SOUZA E YASMIN KAWANE.

RESENHA CRÍTICA FILME


“O BICHO DE SETE CABEÇAS”

SANTA CRUZ/RJ
2022
Filme dirigido por Laís Bodanzky, baseado em fatos “O Bicho de Sete Cabeças”
conta a história de Neto (Rodrigo Santoro), um adolescente que não tem perspectiva
de vida alguma, vivendo o ócio da juventude sem limites e que ao decorrer das
cenas se envolve com as drogas. Os pais ao descobrirem, o internam em um
hospital psiquiátrico sem o menor diálogo, preparo e informação, julgando e supondo
que o filho fosse viciado em drogas, e então assim se inicia o drama. Apesar de não
ser uma adaptação muito fiel ao livro "O Canto dos Malditos", no qual foi inspirado,
trouxe na época um assunto que era pouquíssimo comentado, fortalecendo muito o
Movimento Antimanicomial. Seu enredo, baseado em fatos, retrata com clareza a
situação da época, onde o manicômio era um lugar para os expurgados da
sociedade. Com muita emoção e realidade para mostrar as situações e os que eram
considerados loucos eram submetidos, levou o assunto para as telas de todo o
Brasil, trazendo à tona um assunto de extrema importância: A negligência como
eram tratados não só os loucos, mas todas as pessoas que tinham que por algum
motivo ser descartadas e a saúde mental. Os pacientes, diagnosticados com os
mais diversos quadros clínicos, eram tratados de forma hostil e padronizada e a eles
eram aplicados os mesmos tratamentos, como se o método utilizado para um fosse
suscetível aos demais.

O filme buscou retratar a realidade sobre as questões de abusos ocorridos nos


hospitais psiquiátricos no Brasil, com desenrolar da história, é possível perceber o
descaso em que são tratados os pacientes, o ambiente hostil que os cerca, em que
dependentes químicos recebiam o mesmo tratamento que os doentes mentais, e a
falta de estrutura familiar para lidar com tal situação, de forma chocante mostra a
dura realidade. Os manicômios eram locais insalubres, com péssimas condições de
instalação, higiene, profissionais despreparados que não sabiam lidar com os
pacientes bem como os maus tratos. Médicos que passam medicamentos sem ao
menos examinar o paciente. Superlotação das clínicas e o descaso das autoridades
e ausência do apoio de seus familiares que só se preocupavam em esconder o
problema por medo do preconceito alheio. Essa era a forma de atuação da
sociedade que ganhava força com o discurso médico psiquiátrico, uma vez que a
crença na medicina sustentava todo comportamento de "limpeza" social contra os
que não se encaixavam em padrões de saúde do momento discutido;
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2022
especialmente, por se ter como técnicas à época, apoiadas na ciência, utilizações
do considerado eficaz eletrochoque, e o interesse pela utilização de alguns tipos de
medicamentos fortes observado no filme, era para garantir um maior controle e
poder sobre os pacientes, levando-os a um estado de sedação, em que
comportamentos, por exemplo, de agressividade ficariam praticamente inviáveis. Em
momento algum o rapaz teve a oportunidade de ser ouvido, ou até mesmo de
expressar seus sentimentos. O único momento em que pôde expressar o que sentia,
foi quando em um ato desesperador, o jovem escreve uma carta ao pai. Dentro da
Clínica onde o personagem de Rodrigo Santoro estão todos os pacientes que são
classificados como controlados ou possuem o comportamento esperado, que na
verdade se encontram dopados e sob efeito de tranquilizantes. Se o “direitos
humanos” diz: “É direito do indivíduo não ser torturado e isso implica na eliminação
do direito de torturar”, este filme nos apresenta uma oposição a essa lei e a falta
desse direito, onde personagem apanha, é judiado em várias áreas, destacando a
psicológica, e recebendo medicações sem nenhuma avaliação prévia, e em algumas
vezes sendo jogado dentro de um quarto escuro sem o mínimo de condição de
sobrevivência, por ser um isolamento crucial e desumano, esse quarto se tornou o
pesadelo de qualquer paciente.

O filme também retrata uma questão muito comum na nossa sociedade: o


relacionamento tóxico no ciclo familiar. No filme, o Seu Wilson, pai de Neto, é
bastante autoritário, nota-se que o ambiente familiar não é aberto ao diálogo, é
cercado de insultos e cobranças excessivas. Esse ambiente tóxico e sem diálogo
leva o personagem principal a viver um tormento que não parece ter fim. O pai, ao
achar um baseado nas coisas do filho, arma uma enorme emboscada para levar o
filho a uma clínica de reabilitação, na esperança de tratar o filho viciado. Essa clínica
de reabilitação, na verdade é um manicômio, onde Neto sofre os mais terríveis
abusos. Neto era constantemente dopado, chegou a ser preso na solitária e ainda
recebeu uma terapia de eletrochoque. O eletrochoque envolve a estimulação elétrica
do cérebro, tratamento que provoca alterações na atividade elétrica do cérebro,
regulando os níveis dos neurotransmissores serotonina, dopamina, noradrenalina e
glutamato. Com o passar do tempo, é visível que os abusos sofridos geraram
enormes prejuízos mentais, o personagem vai perdendo o brilho da vida, fica com
aquele semblante estagnado, perdido, tirando a esperança de viver uma vida

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normal. O jovem chegou até atentar contra a própria vida, pois para ele, o tormento
de viver preso naquele lugar era pior do que a morte. Após a tentativa de suicídio, a
família resolve tirar ele da clínica, porém, a relação com o pai, encontra-se
totalmente destruída, a falta de compreensão e conhecimento contribuiu para que a
relação do pai com Neto piorasse, trazendo questionamentos imperdoáveis.

No fim, a família que deveria apoiar, instruir e jamais abandonar, não soube lidar
com algo que todos nós passamos, que é o período da adolescência, onde
enfrentamos diversas questões, onde temos curiosidade de experimentar e explorar
o mundo a nossa volta.

A fase da adolescência é considerada como uma das fases mais complexas, onde o
adolescente sofre em todos os aspectos, com dúvidas e incertezas sobre a vida. Por
conta dos hormônios aflorados, e também os questionamentos, o adolescente que
se encontra nesse processo de estar se modificando, ele acha que já sabe o que é
melhor, e que tem autonomia suficiente para fazer suas próprias decisões, e talvez o
fato de não escutar os pais é uma forma de mostrar essa independência, e provar
que pode sim tomar suas próprias decisões.

O adolescente vive em um misto de sentimentos e totalmente intenso. Se estiver


triste, esse sentimento se intensifica bem mais do que o normal. Entretanto,
entendemos que o adolescente também é movido pela emoção, tirando o peso da
responsabilidade, como por exemplo as drogas, enquanto isso é moda entre essa
faixa etária de idade, a vontade às vezes de ser aceito por um certo grupo, o
adolescente age pela emoção, desconsiderando os ricos que podem ocorrer diante
dessa escolha em experimentar. Acontece exatamente desse jeito com Neto, diante
dessa fase tão complexa, ele segue fazendo suas próprias decisões, saindo com
amigos que fumavam, bebiam, e saíam a hora que quisessem, entretanto, essas
escolhas dificultaram mais ainda a relação dele com seu pai. É de suma importância
que os pais saibam como educar e compreender cada fase de desenvolvimento de
seus filhos. Sendo assim, não ocasionará de acontecer, o que aconteceu com Neto
e seus pais.

Como o próprio nome do filme sugere, foi feito um bicho de sete cabeças, quando na
verdade, a família somente precisava entender que aquilo era uma fase e não uma
situação permanente.
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2022
O filme é lançado em um período importante para a saúde mental no Brasil.

Em 2001 quando o filme é lançado, e sancionada a lei da reforma psiquiatra


brasileira

A Reforma Psiquiátrica no Brasil teve como primeira fonte inspiradora as ideias e


práticas do psiquiatra Franco Basaglia, que revolucionou, a partir da década de
1960, as abordagens e terapias no tratamento de pessoas com transtornos mentais
nas cidades italianas de Trieste e Gorizia.

Especialmente em Trieste, onde dirigiu por anos um hospital psiquiátrico com mais
de 1,2 mil pacientes internados, Basaglia teve ampla liberdade para aplicar sua nova
abordagem libertária, rompendo muros culturais e físicos na forma como uma
sociedade deve lidar com seus “loucos” para reintegrá-los à sociedade.

Crítico da psiquiatria tradicional e da forma como operavam os hospícios, Basaglia


revolucionou o tratamento psiquiátrico, desenvolvendo uma abordagem de
reinserção territorial e cultural do paciente na comunidade. Isso em vez de isolá-lo
num manicômio à base de fortes medicações, vigilância ininterrupta, choques
elétricos e camisas de força.

O aprofundamento de sua metodologia e o retorno à vida social conseguido com


milhares de ex-internos em Trieste levou a prefeitura local, com o passar dos anos, a
fechar o hospital psiquiátrico, optando gradualmente pela abertura de novos centros
terapêuticos territoriais, como os concebidos por Basaglia.

Devido aos resultados positivos que alcançou na Itália, a abordagem de Basaglia


passou a ser recomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) a partir de
1973. A posição da OMS tornou o debate mundial e a discussão chegou ao Brasil.

Em 1978, na Divisão Nacional de Saúde Mental (Dinsam), órgão vinculado ao


Ministério da Saúde, profissionais denunciaram as condições de profunda
degradação humana em que operava a maioria dos hospitais psiquiátricos no país.
A crise, em pleno regime militar, levou à demissão da maioria dos denunciantes.

Em 1979, foi criado o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM) e em


1987, o movimento antimanicomial, dando continuidade à luta pela nova psiquiatria.

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O projeto de reforma psiquiátrica foi apresentado em 1989 pelo então deputado
Paulo Delgado (MG). Após 12 anos, o texto foi aprovado e sancionado como Lei nº
10.216/2001, ficando conhecida como Lei da Reforma Psiquiátrica, Lei
Antimanicomial e Lei Paulo Delgado.

A Reforma teve como marca registrada o fechamento gradual de manicômios e


hospícios que proliferavam país afora. A lei que promoveu a reforma, tem como
diretriz principal a internação do paciente somente se o tratamento fora do hospital
se mostrar ineficaz.

Em substituição aos hospitais psiquiátricos, o Ministério da Saúde determinou, em


2002, a criação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs) em todo o país. Os
CAPs são espaços para o acolhimento de pacientes com transtornos mentais, em
tratamento não-hospitalar. Sua função é prestar assistência psicológica e médica,
visando a reintegração dos doentes à sociedade.

Segundo dados de 2020 do Ministério da Saúde, o SUS conta com 2661 CAPs
espalhados por todo o país. Os centros, em suas diferentes modalidades, são
pontos de atenção estratégicos da Raps: serviços de saúde de caráter aberto e
comunitário, constituído por equipe multiprofissional e que atua sob a ótica
interdisciplinar, realizando, prioritariamente, atendimento às pessoas com sofrimento
ou transtorno mental, incluindo aquelas com necessidades decorrentes do uso de
álcool e outras drogas, seja em situações de crise ou em processos de reabilitação
psicossocial.

Mas Antes disso, por anos, o país conviveu com o chamado "holocausto brasileiro".

Foi assim que ficou conhecido o horror enfrentado pelos pacientes do Hospital
Colônia de Barbacena, no interior de Minas Gerais. No manicômio morreram 60 mil
pacientes, após décadas de aprisionamentos, de forma compulsória e sem critério.

Pessoas eram submetidas a maus-tratos, muitas internadas pela própria família. Era
o caso de mulheres indesejadas pelos maridos e parentes que tinham algum tipo de
deficiência, transtorno ou distúrbio, como Síndrome de Down, autismo ou dislexia.

As pessoas que eram enviadas para o hospital, a maioria à força, nem precisavam
ser diagnosticadas com algum transtorno mental. Mais de 70% dos pacientes não
sofriam com nenhuma doença do tipo. Eram crianças rejeitadas pelos pais por mau
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comportamento ou algum tipo de deficiência; filhos tidos fora do casamento;
mulheres estupradas pelo patrão ou algum homem importante na época, com
dinheiro suficiente para esconder o crime; epiléticos; alcoólatras; homossexuais.
Tudo era motivo para enviar pessoas ao hospital.

Muitos elementos nessa história lembram o que acontecia com as vítimas do


Nazismo. Um deles é o fato de as pessoas eram enviadas para o hospital em um
trem de carga, assim como os judeus eram levados para os campos de
concentração durante a Segunda Guerra. O trem que os levava para o Colônia ficou
conhecido como “trem de doido”.

Hoje, em 2022 ainda vemos em alguns filmes, séries e novelas, como é o exemplo
da série americana Riverdale. Em um episódio é retratada a tentativa frustrante de
uma família que, ao descobrir que a filha tem um relacionamento homoafetivo, a leva
para um hospício para promover a "cura" da mesma.

Apesar de termos provas cientificas de que os meios usados pelos manicômios no


passado, são ineficazes, encontramos quem discorde.

Mas seguimos na luta antimanicomial.

SANTA CRUZ/RJ
2022

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