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todos os momentos, envolver os participantes da experiência na realização de um

projeto de trabalho coletivo em que ficou claramente posto o valor de cada


participação.
A desconsideração social imposta aos educadores hoje, representada pelos
baixos salários e precárias condições de trabalho, retira-Ihes a motivação para se UMA REVISÃO DA LITERATURA - PSICOLOGIA SOCIAL *
envolverem num projeto educativo que necessita ser, no mínimo, audacioso.
A realização bem sucedida de qualquer projeto s6 será possível se recupe-
rarmos a auto-estima, a confiança e a competência de nossos educadores. Para
S(LVIA T. M. LANE**
isso, é necessário tirarmos o professor de "entre os parênteses" em que está
hoje colocado para que ocupe um papel ativo, e dessa forma mais humano, nas
decisões sobre as questões educacionais.

RESUMO

A autora faz uma análise de seu livro Psicologia Social, inse-


REFER(:NCIAS BIBlIOGRAFICAS
rindo-o no contexto histórico-ideológico-metodológico. Uma
reflexão sobre o que se fazia, nos anos sessenta, em função das idéias
e autores que predominavam naquela década, é parte da sua
Almeida, N. V. F. O Psicólogo na Instituição Escolar: um estudo descritivo de sua prática proposta de trabalho, complementando-o com o que é possrveí
profissional. Dissertação apresentada ao Departamento de Psicologia da Universidade fazer nos dias atuais e o que é necessário projetar para o futuro _
Federal da Paraíba, 1982. principalmente em termos metodológicos.
Almeida, N. V. F. e Wanderley, L. M. A formaçaõ do educador: realimentando a discussão.
(mimeo).
Arrovo, M. (org.l Da Escola Carente à Escola Possível. São Paulo, Ed. Lovola, 1986.
Balzan, N. C. Perfil do Supervisor Necessário. Cadernos do CEDES, n.o 7, 1985. ABSTRACT
Freitag, B. Escola, Estado e Sociedade. São Paulo, Ed. Moraes, 1984.
Garcia, R. L. Orientação Educacional - afinal, a quem serve? Cadernos do CEDES, n.o 6, The author analvses her book Social Psychology inserting it in
1985. the historic-ideologic-methodological contexto A reflection of what
Lapassade, G. Grupos, Organizações e Instituições. Rio de Janeiro, Ed. Francisco Alves, was produced in the 60 's related to the ideas and authors that
1977. predominated in that decade is part of the proposal of the article.
Libâneo, J. C. Democratização da Escola Pública: a pedagogia crítico-social dos conteúdos. The author cornplernenrs this proposal with a reflection about what
São Paulo, Ed. Loyola, 1985. is possible to do in the presenr and what is necessary to project to
Mello, G. N. Magistério de Primeiro Grau: da competência técnica ao compromisso político. the futura - specially in what concerns methodology.
São Paulo, Cortez: Autores Associados, 1984.
Nosella, P. Compromisso político como horizonte da competência técnica. Educaçaõ e
Quando no Congresso da SIP no ano de 1976 em Miami, falava-se sobre a
Sociedade, 14, 1983.
crise da Psicologia Social - (Triandis) - esta era também a que vivíamos
Pimenta, S. G. Orientador educacional como trabalhador intelectual. Cadernos fio CEDES,
no Brasi I.
n.o 6,1985.
Rasia, J. M. Pedagogia e educação ou de como falar sobre o óbvio. Cadernos do CEDES,
Em 1965 ensinávamos a Psicologia Social de Lewin, de Allport, de
ano 1, n.o 2, 1980. Klineberq, de Asch, de Heider, de Newcomb, de Lindzey e Aronson, de
Saviani, D. Escola e Democracia. São Paulo, éortez / Autores Associados, São Paulo, 1984. Cartwright e Zander. Os temas eram Dinâmica dos grupos, Percepção Social,
Silva, T. R. N. Especialistas do ensino em questão. Cadernos do CEDES, n.? 6; 1985. Atitudes, Mudança de Atitudes, Socialização, Diferenças entre sexos, raças etc .

• Trabalho apresentado no XX Congresso Interam&ricano de Psicologia - Caracas -


Ju1./1986.
Professora da PUC / S. P.

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Rev. de Psicologia, Fortaleza, 6 (1): 111-122, Jan.jJun., 1988
Estudando o problema de linguagem revimos Piaget e Vigotski, este último
Nossos cursos eram organizados em teóricos (revisão da literatura) e práticos nos indicando a questão da consciência, produto da interação da linguagem e
(confronto entre experimentos e pesquisas e pequenos estudos de campo, obser-
pensamento. E teríamos então a possibilidade de uma análise da con~ciência
vações, experimentos).
alienada, fragmentada (onde a ideologia se apresentava concretizada no discurso,
O confronto entre teoria e prática nos mostrava que se podia tanto afirmar individual) então, a consciência clara, produto de um pensamento crítico, onde
quanto negar as teorias e, como dizemos no Brasil, poder-se-ia afirmar o sim e o
as significações traz idas pela linguagem se confrontam com a realidade em si.
naõ e muito pelo contrário ... Da escola de Genebra, Malrieu propõe uma análise da formação das repre-
Um artigo de Brunno, Poitou e outros nos chamou a atenção: "Psicologia sentações sociais em crianças, demonstrando a mediaçaõ social necessária para
Social uma Utopia em Crise", publicado em La Nouvelle Critique e, logo depois,
seu desenvolvimento.
um prefácio de Serge Moscovici, fazendo uma análise crítica dos pressupostos da Uma outra vertente de pesquisas que também surgia como fundamental foi
Psicologia Social, nos fizeram rever algumas teorias como a de Lewin e, princi- a questão da identidade social. Questão formu lada por George Mead, que
palmente, a de George Politzer. Também Blêger com sua análise dialética da apontava para o caráter essencial do grupo social e de suas intersções simbólicas
Psicanálise foi revisto. Nesta direção os trabalhos de Merani foram lidos com para a constituição da identidade individual.
avidez, assim como os franceses Poitou, Pecheux e outros. Retomam-se as teorias de Sarbin, Scheibe, Goffman e outros, procurando
Mas, nosso problema central era fazer pesquisas psicossociais em nossa esclarecer a questão central da psicologia da individualização, a unidade de
realidade - e todos estes autores faziam teorias mas sem qualquer indicação cada pessoa.
de como investigar nossa própria realidade.
Tínhamos, também, o problema do comportamento - ou seja da, conduta,
Em 1979 (SIP) sentimos que o mesmo problema ocorria em outros países da acão. da atuação. Caminhávamos desde comportamentos "micro"-fragmen-
da América Latina. Em alguns se buscavam soluções na Sociologia, em outros tário~, para algo tão amplo como a noção de campos de forças (Lewin), para o
na literatura indigenista local e, em outros, na História, etc. Mas o problema drama de Politzer, e, de qual seria a dimensão necessária da ação humana para se
permanecia. Caminhávamos entre ensaios-e-erros, investigando os temas que compreender o mais essencial do homem, suas ações concretas que transformam
considerávamos os mais consistentes: os pequenos grupos sociais, a Psicologia da a natureza, as relações sociais, e, que o transformam também.
linguagem, a socialização e a aprendizagem, tentando não fragmentar o ser Ao mesmo tempo em que estas questões teóricas eram analisadas, deba-
humano, e sim compreendê-Io em sua inserção social - em seu macro? em sua tiam-se os problemas metodológicos - admitíamos a validade de estudos esta-
gestalt? tísticos, dos "survevs", enquanto eram pesquisas que nos descreviam uma reali-
No estudo de pequenos grupos passamos por Lewin, que com sua dinâmica dade, e ao fazê-to, tornava-a estática; o que queríamos era o processo, a história
poderia ser promissor, se esta ficasse clara como processo - "é real o que tem dos fatos - o movimento que os gerava e que os transformava. Negávamos a
efeito". Goffman foi um outro desafio e foi um avanço para nós com sua neutralidade científica, mas era necessário registrar o empírico para que a
observação-participante. Foi quando nos propusemos, com nossos estudantes, análise pudesse, partindo dele (do ernpfrico}, chegar ao movimento histórico e
a fazer observações que envolveriam os grupos, em seu processo histórico e, retornar a ele com uma nova dimensão do empírico.
através de análises, tentar encontrar, no processo, as contradições que movem Do positivismo tínhamos que resgatar o respeito ao empírico, ao seu regis-
o grupo. tro, porém sem fragmentá-Io. A questão da unidade do evento era central - o
Por outro lado, a linguagem nos parecia algo fundamental para a sujeito tinha que ser caracterizado no conjunto de suas relações sociais, na
compreensão das relações sociais. Era para mim uma questão antiga, que me história de seus grupos sociais, de sua classe, de sua sociedade (e neste aspecto
levou a fazer minha tese de doutorado com o Diferencial Semântico de Osgood, recorríamos aos estudos sociológicos, econômico-políticos, antropológicos).
dado seu caráter afetivo, pleno de valores presentes nas palavras enquanto A estratégia de pesquisa mudava seu eixo dos procedimentos experimentais
significantes (o denotativo era o de um dado código social). e de registro para o da análise do empt'rico a fim de se aproximar do concreto-
Por outro lado, os estudos sobre Representações Sociais mostravam-se ricos histórico.
para a compreensão de como os indivíduos, em suas posições particu lares, orga- Com todos estes desafios diante de nós, nos defrontamos com a obra de
nizavam e atuavam em seu mundo social. Alex Leontiev: primeiro "O desenvolvimento do psiquisrno" e depois
Na teoria de Representação havia lugar para a ideologia, para os valores "Consciência, Atividade e Personalidade".
sociais-individuais. A questão da ideologia necessariamente passava pela lingua- Com sua obra se esclareceu a questão epistemológica das categorias do
gem e pelas representações sociais - portanto, eram mediações fundamentadas conhecimento psicológico - e não seria por coincidência que ele proporia para
para a compreensão do indivíduo, compreendido no conjunto de suas relações a Psicologia três categorias fundamentais - a consciência e suas mediações pela
sociais.

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Depois de mais de 20 anos de estudos e pesquisas em Psicologia Social, hoje
linguagem e o pensamento, a atividade, constitu ída por ações e operações, rela- me sinto segura, assim como meus companheiros, de que estamos fazendo uma
cionada com necessidades, motivos e objetivos finais; e a personalidade, como ciência que não apenas responde à questão de quem é o homem - sujeito de sua
características dinâmicas, próprias da individualidade. história, como também dá sua contribuição à sociologia, à antropologia, à
Além disto, Leontiev embasava sua teoria em pesquisas empíricas e siste- história constituindo-se no núcleo essencial das ciências humanas.
rnáticas, No entanto, estas categorias se apresentavam como estruturas vazias que Entretanto, é necessário continuar pesquisando, mais e mais, encontrando
só teriam substâncias se localizassem o indivíduo em sua realidade histórico- e aperfeiçoando técnicas de registro e de análise, definindo-se as categorias - das
social. Deste modo se tornava, mais do que nunca, necessário fazer mais e mais mais gerais às mais específicas de cada situação onde atua o psiquismo humano.
pesquisas, com dados e análises que se acumulassem, para um conhecimento das Portanto, nosso próximo desafio é a problemática metodológica e as
propriedades categoriais de nossos sujeitos. soluções e entraves que estamos encontrando.
Tudo nos indicava que estávamos na direção certa - nossas pesquisas resul-
tavam em intervenções, de início involuntárias ou indiretas para, em seguida, REFERI:NCIAS BIBLlOGRAF ICAS
privilegiar a pesquisa - ação, a pesquisa - intervenção. Por outro lado,
tornava-se necessária uma sistematização teórica, que teria que partir de uma Allport, F. H. - Social Psvcholoqv, Houghton Miffin, Boston, 1924.
Asch, S. E. - Social Psvcholoqv. Prentice - Hall, N. York, 1952.
explicitação de nossa concepção do Homem.
Bleger, J. - Psicoanalisis y dialectica materialista, Paidos, Buenos Aires, 1958.
O indivíduo que estudávamos só existe em suas relações com os outros.
Bruno, Poitou e outros - Psychologie Sociale: Une Utopie en Crise in La Nouvelle Critique,
Toda sua existência ocorre em grupos sociais como a família, os pares, os grupos
1973, n.os 62-63.
de trabalho, de lazer. Só poderíamos entender seu comportamento se entendida Cartwright, D. e Zander, A. (Eds) - Group dynamics: research and rheorv, Row Peterson,
sua inserção nos grupos que formavam sua história pessoal e com os quais desen- Illinois, 1953.
volvia suas atividades e se transformava enquanto indivíduo. Goffman, E. - The presentation of Self in everyday life. Doubledav, N. York, 1959.
Como ser biológico, ele é dotado de sentimentos, de potencial para ação e Heider, F. - The psychology of interpersonat relations. Wiley, N. York, 1958.
de pensamentos - mas sua concretização só ocorre através de suas relações com Klineberg, O. - Social Psychology. Henry Halt, N. York, 1940.
os demais indivíduos em um contexto histórico-social, onde a linguagem tem Lane, S. T. M. e Codo, W. (Orgs) - Psicologia Social - O Homem em Movimento. Ed.

uma função primordial como mediação histórica - que permite uma visão de Brasiliense, S. Paulo, 1984.
Leontiev, A. - Actividad, Conciencia y Personalidad, Editorial Ciencias dei Hombre,
mundo, a subjetivação da realidade social.
B. Aires, 1978.
A partir deste ponto torna-se necessário comunicar o que produzíamos -
___ - O Desenvolvimento do Psiquismo, Livros Horizonte, Lisboa, 1978.
foi assim que editamos nossa "Psicologia Social - o Homem em Movimento" Lewin, K. - Field Theory in Social Science. Harper and Row, N. York, 1951.
- produto de um grupo -de trabalho com as mesmas preocupações e objetivos. Lindzev, G. e Aronson, E. - The Handbook of Social Psvcholoqv. 2nd. Ed. Addison -
Chamamos o livro de Psicologia Social, mas de fato era nossa intenção Wesley Pub. Co., Londres, 1969.
propor uma revisão de toda a Psicologia - fragmentá-Ia também poderia ser tão Malrieu, P. - Lenguaje y Representacion in La Genesis dei lenguaje - su aprendizage y
ideológico tanto quanto a fragmentação das ciências humanas e sociais. desarollo. Pablo dei Rio Editor, Madrid, 1978.
Assim era necessário, ao propor nossa concepção de Homem, esclarecer Mead, G. H. - Mind, Self and Societv, Univ. of Chicago Press, Chicago, 1934.
também nossa posição epistemológica de como compreendíamos a dialética Merani, A. l. - Psicologia e Pedagogia, Editorial Notícias, Lisboa, 1977.

materialista histórica como uma metodologia de pesquisa :::ientífica. Moscovici, S. - Prefácio in Psvcholoçie Sociale - Une Science en Mouvement, D. Jodelet et
col. (Eds] , Mouton, Paris, 1970.
Na segunda parte, discutimos os estudos em relação às categorias funda-
Newcomb, T. M., Turner, R. H. e Converse, P. E. - Social Psychology. Holf, Rinehart
mentais: a questão da linguagem, do pensamento e das representações; sua
+ Winston, N. York, 1964.
mediação em relação à questão da consciência/alienação; o fazer e sua embri-
Piaget, J. - Le language et Ia Pensée. Delachaux e Niestle, Neuchatel, 1923.
cação com a consciência e a produção da identidade.
Politzer, G. - Crítica dos Fundamentos da Psic.ologia (2 vol.}, Editorial Presença, Lisboa,
Na terceira parte, analisamos o indivíduo em sua inserção social: o processo
1973.
grupal enquanto atividade e movimento da consciência; a família e os aspectos ___ - Psicologia Concreta, Jorge Alvarez Editor, Buenos Aires, 1965.
emocionais e ideológicos; a escola no processo de socialização e, por fim, as Osgood, C., Suei, G. J. + Tannenbaum, P. - The Measurement of Meaning, Univ. of Illinois
relações de trabalho e a transformação social. Press, Illinois, 1957.
A quarta parte é dedicada à praxis do psicólogo é provocativa, questiona- Sarbin, T. R., Scheibe, K. - Role Theory in G. Lindzey + E. Aronson - The Handbook
dora, repensando se o que faz o psicólogo educacional, o clínico, o psicólogo do of Social Psychology, 2nd Ed., Addison-Wesley Pub. Co., Londres, 1969.
trabalho e, por último, o que consideramos o maior desafio - o psicólogo na Vigostki, l. S. - Pensamento e Linguagem. Ed. Antídoto, Lisboa, 1979.

comunidade.
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126 Rev. de Psicologia, Fortaleza, 6 (1): 123-127, Jan.jJun., 1988

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