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COMUNITÁRIOi
INTRODUÇÃO
O psicólogo comunitário na sua prática profissional, assim como em outras áreas próximas a
Psicologia, dispõe de uma série de instrumentos de trabalho que viabilizam suas intervenções. O presente
capítulo objetiva apresentar uma discussão sobre duas técnicas de ação profissional: a entrevista
importante de investigação científica (Bleger, 1998; Laville & Dionne, 1999). Quando concebida como
método científico de levantamento de informações, a entrevista necessita que o entrevistador possua alguns
conhecimentos teóricos e práticos sobre a comunicação interpessoal, os quais devem ser levados em conta
no momento das intervenções. Desta forma, pode-se definir a entrevista como um processo no qual
interagem duas ou mais pessoas através da comunicação, geralmente oral, em que se estabelecem papéis
assimétricos: entrevistador e entrevistado. Considerando que a pessoa se constitui como um ser em relação,
meio (Martínez, 1992). Desta forma, a entrevista é sempre uma conversação com um propósito definido
(Rodríguez Sutil, 1994). Além disso, sabe-se também que o que ocorre na entrevista é determinado em
grande parte pela natureza da relação que se estabelece entre o entrevistado e o entrevistador; neste
sentido, a capacidade empática e de acolhimento da demanda por parte do entrevistador são fundamentais
e acessível, através de perguntas concretas, breves e situadas no tempo, respeitando a liberdade de resposta
do entrevistado (Rodríguez Sutil, 1994). Desta forma, o psicólogo ou demais profissionais da saúde, ao
atuar na comunidade, deverá estar sensível ao ambiente, à pessoa entrevistada, ao tema, e ao momento e
lugar onde esta acontece (Martínez, 1992). Assim, torna-se essencial o aprofundamento dos conteúdos que
são trazidos pelo entrevistado, uma vez que desta forma é possível conhecer suas representações, crenças,
valores, sentimentos e opiniões. O conteúdo implica em algo mais que o puro significado da narrativa do
entrevistado, uma vez que refere-se à outras manifestações relacionadas ao momento da intervenção e da
faz-se necessário refletir sobre o campo da Psicologia Comunitária. Segundo Kelly (1992), a Psicologia
Comunitária se caracteriza pela ênfase nas relações de interdependência entre as pessoas, o meio ambiente,
os recursos individuais e coletivos, a ação social e a prevenção. Portanto, na entrevista comunitária todas
essas dimensões devem ser contempladas, já que são muito significativas para o bom andamento de todo o
processo.
A entrevista pode ser usada para compreender o significado de um fenômeno específico para uma
determinada comunidade. Essa compreensão permite que o movimento inicial seja sempre de aprensão da
comunidade deve ser motivadora para que se siga neste movimento em busca de uma maior
instrumentalização de recursos. Desta forma, fica clara a ampliação da função do psicólogo e dos demais
profissionais da saúde: o foco não se reduz exclusivamente identificar os possíveis problemas e transtornos
psicológicos do indivíduo, mas sim trabalhar numa perspectiva de potencialização dos aspectos saudáveis
significado que uma situação tem para as pessoas de determinada comunidade. Tal concepção aproxima-se
o qual inclui a interação da mesma com os contextos em que está inserida, tais como a escola, a família, a
Partindo destes conceitos, observa-se que a entrevista na comunidade deve ser realizada de tal
forma que as características específicas de cada contexto sejam respeitadas e consideradas. Além disso,
pode ser realizada de forma individual ou grupal, podendo ser efetiva mesmo quando fora de um setting
específico.
entrevistador, um aspecto importante a ser considerado refere-se a sua postura facilitadora, nuncan
dependência com a figura do entrevistador, mas sim que os entrevistados sejam capazes de construir e
A entrevista em grupo aparece como uma ferramenta em que o profissional inclui-se efetivamente
que um maior número de pessoas possa beneficiar-se com seu trabalho. No entanto, Bezerra (2001)
ressalta que a técnica de grupo não pode ser a opção eleita exclusivamente em função da escassez de
recursos financeiros ou como uma possibilidade de atenção maior da demanda, já que estes critérios
poderiam não considerar as motivações particulares de cada entrevistado ou de cada comunidade. Quando
não levado em conta, este aspecto pode ser o responsável pelo fracasso de muitos dos grupos propostos
nas comunidades.
O psicólogo comunitário sempre deve sempre estar atento para atender a demanda daqueles que
o solicitam, assumindo uma postura de inclusão e ampliação de sua rede de apoio. Cabe ressaltar que
atender a demanda não significa dar conta de todas as necessidades, mas sim capacitá-los para a busca de
recursos. Muitas vezes, a alternativa mais eficaz é encaminhar as pessoas outros profissionais da rede
(psicólogo, assistente social, psiquiatra, terapeuta ocupacional, entre outros), vinculando-os assim a centro
comunidade, de uma rede social que facilite a comunicação com diferentes profissionais e com diferentes
âmbitos, tais como o juizado, conselhos tutelares, organizações não governamentais (ONGs), entre outros.
Esses encaminhamentos devem propiciar a dinamização da rede de apoio para permitir que a comunidade
Dentro desta perspectiva mais integrativa a entrevistas na comunidade podem ser realizadas pelo
acima de tudo, objetivando uma compreensão mais global dos fenômenos. Cabe ressaltar que para o bom
funcionamento e eficácia dos serviços prestados, o trabalho com outros profissionais exige que cada um
proposto por Porto e Almeida (2002), o qual caracteriza a possibilidade de produção de conhecimento
Almeida Filho (1997) define a multidisciplinariedade como o conjunto de disciplinas que agrupam-se
caracteriza-se pela reunião de diferentes disciplinas ao redor de uma mesma temática, onde outros
profissionais trabalham ainda de maneira fragmentada, mas compreendem a pessoa como única, tendo a
Assim, percebe-se que não somente a entrevista na comunidade, como também outras formas de
intervenção dos profissionais da saúde, como por exemplo a prática da visita domiciliar, descrita a seguir,
A visita domiciliar
A visita domiciliar é mais uma forma de trabalho em equipe nas comunidades dentro das
comunidades. Não trata-se de uma prática específica dos psicólogos, já que um dos primeiros profissionais
que realizaram esta atividade foram os assistentes sociais. Atualmente, além destes, outros profissionais da
área da saúde também trabalham com esta modalidade de atendimento. Evidencia-se, assim, a importância
do psicólogo estar aberto a outras possibilidades interventivas, as quais podem ter sua origem em novas
práticas profissionais e podem propiciar uma compreensão mais ampla dos fenômenos e uma maior
A visita domiciliar se caracteriza por ser uma intervenção eminentemente em equipe. Neste
sentido, é interessante que o psicólogo busque neste espaço o desenvolvimento de uma prática integrada
com pacientes, familiares e comunidade, facilitando, desta maneira, a tão desejada transdiciplinariedade.
No Brasil, a visita domiciliar não é uma prática tão consolidada no âmbito da Psicologia,
especialmente em termos dos serviços públicos de saúde, apesar de existir um importante movimento e
crescimento neste sentido. Henley (1999) salienta a importância da aproximação dos profissionais da saúde
com a realidade social com a qual trabalham. A intervenção direta no contexto possibilita uma
compreensão mais profunda do comportamento das pessoas que vivem na comunidade, seus hábitos e
atitudes, e favorece, também, uma aproximação entre as unidades de saúde e a comunidade (Patterson &
Mulley, 1999).
Para Campanini e Luppi (1996) o principal objetivo da intervenção feita no domicílio é a busca
e Mulley (1999) ressaltam que em 80% dos casos, familiares e amigos também estão presentes durante a
entrevista, podendo contribuir com os profissionais que a realizam. Através dessa prática, outros aspectos
mostram-se relevantes, tais como: fortalecimento do vínculo entre a comunidade e a equipe técnica,
solicitado pelo Juizado de Menores e Conselhos Tutelares, assim como a possibilidade de intervir
preventivamente. Sendo assim, a visita domiciliar propicia uma maior compreensão dos processos de
Segundo Oliveira e Berger (1996), durante a visita domiciliar o paciente ou a família visitada
percebe o entrevistador como uma grande fonte de ajuda. No entanto, existem casos nos quais esta
confiança não se estabelece de forma imediata; assim, o êxito da entrevista dependerá muito da habilidade
Dentro desta perspecticva, entende-se o psicólogo como um dos profissionais mais aptos para a
realização destas práticas, devido a habilidade técnica para o trabalho em relações humanas e sensibilidade
para estabelecer vínculos saudáveis, os quais favorecerão a integração com as pessoas e as comunidades.
Boyce, Cook, Jump e Roggman (2001) comentam alguns cuidados fundamentais nas visitas
domiciliares: evitar a troca dos profissionais que realizam as visitas, a forma como esta visita se estrutura e a
qualidade das intervenções durante o processo. Variações referentes à efetividade dos profissionais na
utilização de interações e de estratégias para envolver famílias, parecem estar relacionadas à percepção que
comunidade, pode mobilizar a equipe como um todo. Por isso, é importante considerar o significado da
solicitação da visita e da demanda, assim como analisar as implicações para quem a solicitou. Deve ser
considerado se o pedido de visita é o primeiro contato com a família, se foi feito diretamente pelo sujeito,
por outra pessoa ou por uma instituição, e também se foi por impossibilidade da pessoa de locomover-se
até o serviço de atendimento. A solicitação deve ser avaliada pelo profissional que atenderá o caso,
podendo ser redefinidas questões como o momento e a modalidade da visita (Campanini & Luppi, 1996,
É muito importante que os integrantes de uma equipe de saúde, que durante uma visita domiciliar
invadem, de certa forma, o espaço privado das pessoas, realizem permanentemente um questionamento
ético acerca do lugar de poder que ocupam frente a estas comunidades, já que, no Brasil, os programas de
saúde relacionados ao cuidado da família orientam-se na maioria das vezes à população marginalizada. Os
questionamentos de ordem ética devem ser contemplados para que a intervenção possa promover de fato a
Patterson e Mulley (1999) salientam alguns aspectos controvertidos em relação à visita domiciliar,
como por exemplo a duração ideal para a realização da entrevista, quais profissionais devem estar
presentes, o quanto as visitas podem influenciar a qualidade de vida, os aspectos psicológicos e a remissão
de doenças das pessoas. Segundo os autores, nem todos os pacientes ou famílias beneficiam-se deste tipo
de atendimento e portanto tal prática deve ser analisada com cuidado e atenção.
Baseado nestes conhecimentos, pode-se dizer que tanto na visita domiciliar como na entrevista
participativa ou de grupo, o papel que o profissional ocupa frente à comunidade deve ser de agente
promotor da saúde, já que o mesmo é parte e não o centro do processo. Assim, a visita domiciliar é
considerada um instrumento de intervenção muito eficaz para psicólogos e outros profissionais da saúde,
sendo de grande importância a observação das relações e a compreensão de como estão ocorrendo num
determinado momento. Além disso, pode estimular-se que outras pessoas, as quais não sejam foco central
do atendimento, busquem participar mais ativamente na comunidade, podendo funcionar como uma
estratégia de inclusão.
Observa-se, ainda, que no campo da Psicologia Comunitária, existe uma carência de materiais
teóricos e metodológicos de qualidade referentes a tais técnicas de intervenção. Isto ocorre, em grande
parte, pela ênfase dada à intervenção na singularidade de cada contexto, já que é a vivência na comunidade
que orientará o trabalho. Entretanto, enfatiza-se a importância de mais produções científicas neste sentido,
com a finalidade de fundamentar as atividades que o psicólogo vem realizando neste âmbito, assim como
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iTradução do texto das autoras publicado como: “La entrevista y la visita domiciliaria en la práctica del psicólogo comunitario”.
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