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A ESCOLA CIDADÂ INTEGRAL DE ENSINO MÉDIO NA PARAÍBA: UM

ESTUDO ACERDA DA SUA IMPLANTAÇÃO E O PAPEL DO(A)


PROFESSOR(A) DE GEOGRAFIA

Maria Beatriz Figueiredo de Lima


Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
beatrizlima9909@gmail.com

Maria Carolina Gomes Monteiro


Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
maria.carolina6@academico.ufpb.br

Maria Adailza Martins de Albuquerque


Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
dadaufpb@hotmail.com

INTRODUÇÃO

Este trabalho apresenta uma compilação dos resultados obtidos em dois projetos
de PIBIC desenvolvidos ao longo de dois anos na Universidade Federal da Paraíba. O
primeiro, denominado A implantação da Escola Cidadã na Paraíba e o papel do(a)
professor(a) de Geografia: compreender a escola real para formar professore(a)s (2019
– 20) e o segundo, A implementação da Escola Cidadã de Ensino Médio na Paraíba: a
relação entre professore(a)s e aluno(a)s e a interface com a disciplina escolar Geografia
(2020 – 21).
Os projetos visaram compreender, no contexto das reformas educacionais
neoliberais implementadas no Brasil ao longo dos últimos anos, as transformações
provenientes da instalação de escolas de ensino médio de tempo integral no estado da
Paraíba, denominadas Escola Cidadã Integral - ECI e Escola Cidadã Integral Técnica –
ECIT, e suas implicações para o trabalho do(a)s educadore(a)s da disciplina Geografia,
bem como o papel reservado a este(a)s nesse processo, além também de abordar a relação
entre o(a)s professore(a)s de Geografia e seus/suas aluno(a)s nessas instituições,

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objetivando assim, conhecer e fazer conhecida essa “nova” escola, e portanto a partir da
difusão das informações obtidas contribuir para a formação do(a)s futuro(a)s
professore(a)s que irão lecionar nesses espaços.

OBJETIVOS
• PIBIC (2019 - 2020)
Compreender como estava ocorrendo a implementação das Escolas Cidadãs Integrais,
qual o papel que o(a) professor(a) de Geografia vinha desempenhando nessas instituições;
comparar o Currículo adotado com o que se efetiva nas escolas; comparar as atividades
do(a)s professore(a)s de Geografia nas diversas escolas.
• PIBIC (2020-2021)
Estudar os fundamentos teóricos que embasam o projeto de criação das Escolas Cidadãs,
visando compreender o papel estabelecido nelas para a relação entre professore(a)s e
aluno(a)s; identificar as ações que estimulam as relações entre professore(a)s e aluno(a)s
nas escolas cidadãs a partir do acompanhamento das praticas escolares.

METODOLOGIA

No primeiro ano de pesquisa, nosso aporte teórico era composto por autores
cujos enfoques giram em torno de temáticas como a escola de tempo integral, o ambiente
escolar e a criação, pelas mãos das grandes corporações, de conexões cada vez mais
expressivas e influentes entre a educação e trabalho flexível, destacamos neste sentido a
leitura de Bittencourt (2005), Kuenzer (2017) e Rego (2017).

As orientações primárias acerca da instalação das ECI e das ECIT se deu pela
análise dos documentos e legislações que delineiam o projeto de escola integral
implementado no nosso estado, como a Reforma do Ensino Médio - REM (BRASIL,
2017), o decreto 36.408 (PARAÍBA, 2015) que cria as escolas cidadãs na Paraíba, a
Medida Provisória 267 (PARAÍBA, 2018) que modifica alguns pontos do decreto de 2015
e a Base Nacional Comum Curricular - BNCC (BRASIL, 2017).

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Para o desenvolvimento da pesquisa de campo, no primeiro projeto selecionamos
oito ECI e ECIT, que se encontravam localizadas em bairros com diferentes condições
socioeconômicas na Cidade de João Pessoa – PB e possuíam tempos distintos de ingresso
no modelo integral, de modo a garantir uma ampla diversidade de informações durante a
coleta dos dados e assim evidenciar melhor as especificidades desse modelo de educação
e de como ele vem se estabelecendo ao longo do tempo. As escolas selecionadas foram:
ECIT Francisca Ascensão Cunha, ECIT Escritor Horácio de Almeida, ECI Professora
Liliosa de Paiva, ECI Liceu Paraibano, ECIT Manoel Lisboa de Moura, ECI Professor
Olívio Pinto, ECIT Pastor João Pereira Gomes Filho e ECIT Monsenhor Pedro Anísio
Bezerra Dantas.

Para a fase dessa pesquisa de campo, elaboramos um roteiro de entrevista para ser
feita com o(a)s professore(a)s de Geografia e um roteiro de catalogação de dados que
estava estruturado em tópicos cujos objetivos eram conhecer, sob diversos enfoques, o
trabalho e formação do(a)s professore(a)s, bem como as escolas, sua infraestrutura,
funcionamento e gerenciamento. Para tanto, coletamos os documentos destinados a reger
a base diversificada e a disciplina de Geografia, observamos a rotina escolar focando nos
problemas e melhorias existentes nesses ambientes e obtivemos informações gerais
acerca da infraestrutura. Diante da coleta e sistematização dos dados fizemos as análises
dos resultados.

A motivação para darmos continuidade às investigações nas Escolas Cidadãs por


mais um ano se deu em função de ainda durante o PIBIC (2019-2020) termos identificado
um estreita relação entre o(a)s professore(a)s e o(a)s aluno(a)s das escolas onde
desenvolvemos a pesquisa aquela pesquisa, fato que não era vivenciado por nós nas
escolas de ensino regular onde cursamos o ensino médio. Portanto, a partir desse
questionamento definimos que no PIBIC (2020-2021) pretenderíamos compreender se tal
observação empírica se evidenciava ou não, e, se sim, se elas estavam orientadas por
regras estabelecidas ou estimuladas nos documentos que regem as ECI e as ECIT, além
disso, pretendíamos saber se essa relação estaria contribuindo para uma visão positiva dos

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alunos acerca da disciplina Geografia e, por conseguinte agindo na melhoria da
aprendizagem dos saberes geográficos.

No segundo ano de trabalho ampliamos as leituras para o desenvolvimento da


pesquisa e buscamos autores que nos ajudassem a compreender as relações entre
professores e alunos, sobre o papel da escola enquanto um espaço de produção de
conhecimento, além de outros que discorressem sobre a escola de tempo integral, neste
sentido destacamos as leituras de Cavaliere (2007), Moreira e Candau (2007), Pessoa
(2007), Rodrigues (2018) e Henry (2011).

No segundo projeto, devido a dificuldades decorrentes dos múltiplos efeitos da


pandemia do COVID – 19, foi necessária uma redução na quantidade de escolas onde
seriam desenvolvidos os trabalhos de campo, passando de oito para quatro escolas,
respectivamente, ECIT Escritor Horácio de Almeida, ECIT Pastor João Pereira Gomes
Filho, ECI Professor Olívio Pinto e ECI Lyceu Paraibano.

Visando alcançar os objetivos pré-estabelecidos, foram feitas inicialmente, com


enfoque para interação entre professore(a)s e aluno(a)s, análises dos documentos
nacionais, Base Nacional Comum Curricular - BNCC (BRASIL, 2017) e Reforma do
Ensino Médio - REM (BRASIL, 2017), analisamos os documentos estaduais, lei n°
11.100 de abril de 2018 (PARAÍBA, 2018), lei n° 11.314 de 06 de abril de 2019
(PARAÍBA, 2019), Diretrizes de funcionamento das Escolas Cidadãs Integrais - ECI e
Escolas Cidadãs Integrais Técnicas - ECIT da Paraíba (PARAÍBA, 2019), análises dos
oito Cadernos do modelo de Escola da Escolha do Instituto de Corresponsabilidade pela
Educação (ICE, 2016) e análises dos documentos elaborados pelas quatro escolas alvo da
nossa pesquisa que se referiam aos Projetos Político Pedagógicos, Guias de
Aprendizagem e Projetos de Vida.

Por fim, utilizamos as informações descritas no relatório fruto dos estudos das
fontes primárias supracitadas para construção de entrevistas destinadas aos Professore(a)s
e questionários destinados aos aluno(a)s, as entrevistas com o(a)s professore(a)s

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buscavam entender o trabalho dele(a)s na conjuntura de aulas remotas, juntamente com
possíveis fatores presentes na ministração da aula de Geografia ou das aulas da Base
Diversificada que pudessem explicar o fenômeno observado. Já o questionário foi
destinado aos aluno(a)s, e aplicado via Google forms dado o fato de que a amostragem
seria maior do que a dos(a)s Professore(a)s, e objetivava trazer à luz da mesma forma que
as entrevistas, as possíveis motivações que estivessem influenciando positivamente a
interação aluno(a)/Professor(a), para isso os questionários possuíam dois tópicos que
juntos totalizavam vinte e sete perguntas, o primeiro possuía perguntas direcionadas para
todos o(a)s aluno(a)s que cursavam a disciplina Geografia e o segundo tópico se destinava
apenas aos aluno(a)s que cursaram as Tutorias, os Projeto de Vida e as Eletivas com o(a)s
professore(a)s de Geografia que vínhamos acompanhando desde o desenvolvimento do
primeiro projeto.

RESULTADOS

No PIBIC (2019-2020) naquilo que concerne aos aspectos estruturais das


escolas, fator de grande influência para o trabalho docente, identificamos uma boa
infraestrutura das ECI e ECIT quando comparada com a das escolas estaduais de ensino
regular da Paraíba. Boa parte das Escolas Cidadãs pesquisadas estavam equipadas com
bibliotecas, laboratórios, quadras esportivas, sala de professore(a), infraestrutura para
refeição e acesso à internet, contudo não identificamos um padrão de infraestrutura
estabelecido para todas as escolas da rede, o que evidencia distinção entre elas.

Constatamos também a falta de funcionários especializados para as salas de


Atendimento Especial Especializado - AEE, assim como também a inexistência dessas
em algumas escolas. Das oito escolas analisadas, três não possuem esses funcionários e
apenas uma das cinco demais escolas tinha mais de um funcionário de AEE no quadro de
contratados, número muito baixo quando nos referimos a escolas que possuem em média
300 aluno(a)s matriculados, o que vai na contramão da lei 13.146 (BRASIL, 2015, p. 7 -
8) que garante obrigatoriedade das escolas receberem aluno(a)s com deficiência,

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dificultando e podendo impossibilitar o trabalho do(a)s professore(a)s com esse(a)s
estudantes.

Após coleta dos documentos e análises das informações elencamos os projetos


que eram implantados nas escolas (Projeto Político Pedagógico, Plano de Ação da Escola,
Programa de Ação, Projeto de Vida, Guias de Aprendizagem e Agenda Bimestral). Dentre
estes destacamos o Plano de Ação que discorre sobre diagnósticos, definições e
premissas, objetivos, planejamento, estratégias, avaliação de resultados, indicadores e
metas a serem alcançadas, e expõe já na sua estrutura suas proposições neoliberais tirando
do corpo escolar a autonomia, onde este passa a atender definições e estratégias
empresariais, comprovando o que diz (REGO, 2012, p.149).

Uma mudança na qual algumas competências docentes podem ser


desvalorizadas, por exemplo, a experiência, para abrir espaço a entrada de novas
valorizações expressas por rótulos pouco específicos, como “inovação” e
"empreendedorismo”, que funcionam como palavras de ordem "neutras" para
implantação de novas práticas gerenciais que replicam no âmbito escolar a
mentalidade vigente nas relações de gerentes com subordinados.

Nesses ambientes existe também a prática de estimular a competitividade entre


colegas, bem como um monitoramento constante do trabalho do(a)s professore(a)s por
parte da Comissão de Avaliação que pressiona o(a)s docentes a cumprirem metas mesmo
com a redução do tempo destinado às atividades fora da sala, estabelecida pela Medida
Provisória 267 (PARAÍBA, 2018), que desconsidera diversos fatores tais como o acúmulo
de atividades demandadas por esta mesma medida. Os mecanismos de fiscalização
também estavam dispostos na função de Coordenador de Área que assume o papel de
vigilância e controle, e o fazem, muitas vezes de forma inconsciente. Controlam seus
colegas de área em nome da produtividade, escrevem relatórios que são entregues aos
avaliadores institucionais. Ao realizar tal tarefa, são colocados em situação de delatores,
o que prejudica as relações entre os pares.

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Nossas análises sobre os cursos técnicos disponíveis nas ECIT, demonstram que
eles objetivam formar os estudantes para setores de serviços e comércio, a partir de cursos
como, Cozinha, Vendas, Logística, Segurança do Trabalho e Eventos, servindo assim
como mão de obra pouco qualificada para o mercado neoliberal, a partir da atuação em
profissões que não estimulam o pensamento crítico, com baixa remuneração e com
pouquíssima qualidade/dignidade de trabalho

A partir da entrevista feita com os professores de Geografia discutimos o


desenvolvimento desta disciplina e dos projetos coordenados por estes professores. O
Projeto de Vida, por exemplo, componente que compõe a base diversificada nas Escolas
Cidadãs é ministrado por professore(a)s de diversas disciplinas, que para assumi-la
passam por formação para atuar como orientador(a). A estrutura dessas aulas se
assemelha muito com o trabalho feito pelos coachings motivacionais, circundando
questões relacionadas à produtividade e empreendedorismo. No documentos e nas nossas
visitas às escolas observamos que os projetos de vida objetivam a “formação do ser
autônomo, solidário e competente” e promovem habilidades de determinação, iniciativa
e autonomia que giram em torno da ideia de sermos empreendedores de nós mesmos, de
modo que as vidas dos sujeitos escolares devem ser geridas como uma empresa.
Observamos ainda este mesmo “apelo” no componente Protagonismo juvenil.

Com a referida entrevista questionamos sobre o tempo de trabalho do(a)


professor(a) de Geografia que, de acordo com os dados coletados, não se encerram nas
40 horas semanais estabelecida no Decreto n°36.408 (PARAÍBA, 2015, p.1), pois a carga
horária de funcionamento dessas escolas – atualmente se iniciando às 7h30min da manhã
e encerram às 17h00min – correspondendo a 9 horas e 30 minutos diárias para aquele(a)s
professore(a)s que permanecem na instituição no horário de almoço. Este horário de
almoço oficialmente não é contabilizado como de trabalho mas, em função de residirem
longe do ambiente de trabalho, permanecem na escola, quando assumem atividades
docentes como orientações, já que não estão em sala de aula. Por isto entendemos que os
horários de intervalo pela manhã e à tarde, além do horário de almoço, devem ser

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considerados hora de trabalho, já que a própria Escola Cidadã os entende como momentos
coletivos de aprendizagem. Por tanto, na realidade o(a)s docentes dessas escolas cumprem
uma carga horária de 46 horas e 50 minutos semanais de trabalho e, no entanto, recebem
a mesma remuneração que o(a)s professore(a)s das escolas regulares, acrescida de um
abono que não é incorporado ao seu salário.

Outra questão problemática que diz respeito a Tutoriais e a falta de um limite


máximo e mínimo de aluno(a)s para cada professor(a) orientar. A grande demanda
sobrecarrega aqueles que lecionam em escolas grandes, com mais aluno(a)s e pouco(a)s
professore(a)s ou mesmo nas escolas pequenas onde o número de professore(a)s é
reduzido. Nas oito escolas onde fizemos a pesquisa, trabalhando com as médias podemos
afirmar que cada professor(a) orienta entre 17 e 18 aluno(a)s (Quadro 2), o que
corresponde a um número elevado para um atividade que requer aproximação pessoal,
conhecimento do outro, acompanhamento de desempenho intelectual, de aprendizagem,
entre outros aspectos que uma relação como esta vai estabelecendo entre pessoas ao longo
do tempo. Porém, como se verifica no Quadro 1, apesar dessa média, há escolas onde esta
média se mostra mais elevada, saltando de 17 para 22, 23 aluno(a)s por professor(a).

Quadro 1: Número de Docentes e Discentes nas escolas pesquisadas.

Fonte: Pesquisa de Campo, 2020. Elaborado a partir do Roteiro de Observação.

No nosso segundo ano de pesquisa PIBIC (2020-2021), como mencionado na


metodologia, fizemos análises de documentos levando em consideração a presença ou
ausência de orientações/normatizações, posições teóricas/políticas acerca da relação entre
professore(a)s e aluno(a)s das ECI e ECIT.

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Destacamos que foram poucos os documentos com menções diretas ou indiretas
sobre o tema, como é o exemplo a BNCC (BRASIL, 2017) e a REM (BRASIL, 2016),
documentos de âmbito nacional referentes à educação e que contraditoriamente não
possuem menção a um fator tão relevante na construção do conhecimento potencial das
crianças e jovens, como é o caso da interação entre aluno(a)s e professore(a)s.

Pudemos identificar uma das poucas proposições sobre o tema em tela, na lei
11,100 como Artigo 6° parágrafo II, que define que o desenvolvimento integral envolve
as dimensões sociais, emocionais, cognitivas e culturais do(a)s estudantes. Portanto, para
a execução plena de uma educação integral, fica normatizado através dessa legislação,
que a socialização do(a)s educando(a)s, o vínculo emocional que se é criado pelo convívio
entre professore(a)s e aluno(a)s, a construção dos saberes escolares e a valorização dos
saberes culturais do(a)s discentes, são pilares da Escola Cidadã Integral. Contudo, no
decorrer dos estudos percebemos que na realidade esse estímulo a afetividade destina-se
a tornar o(a) professor(a) uma espécie de “psicólogo(a)” (sem formação) dos(a) seus
aluno(a)s, demonstrando uma apropriação de conceitos pedagógicos humanísticos,
inadequadamente transformados para caberem nas proposições neoliberais de educação.
Fazem assim, da Escola Cidadã um ambiente assistencialista focado no
multissetorialismo, tendo como centralidade as funções de acolhimento e formação
técnica para o trabalho, retirando da escola a sua função de difusora de conhecimentos.

Já na fase de pesquisa de campo desse segundo ano, analisamos os dados


coletados a partir do relatório de observação e das entrevistas com o(a)s professore(a)s e
questionários com o(a)s aluno(a)s. Um dado que buscamos obter foi referente às
disciplinas da Base Diversificada ofertada pelo(a)s docentes, este nos possibilitou
observar acuradamente o objetivo do trabalho.

Tabela 1: Componentes Curriculares e disciplinas da base diversificada


coordenadas pelo(a)s professore(a)s de Geografia

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Fonte: Pesquisa de Campo, 2021. Elaborado a partir de Entrevista.

Com a Tabela 1 observamos que o(a)s docentes entrevistados lecionam mais de


um componente curricular, em comum, a Geografia e a Tutoria. Deles, 2 são responsáveis
por mais disciplinas, Eletiva e Estudo Orientado e somente um(a) coordena Projeto de
Vida. Apesar de todo(a)s o(a)s professore(a)s trabalharem com a sua disciplina específica
e de orientarem o(a)s discentes na Tutoria.

Considerando estes dados observamos que os professores passam mais tempo com
seus alunos, o que possibilita uma relação mais próxima entre estes sujeitos nessas
escolas. Isto nos leva à questão central da pesquisa: essa aproximação pode despertar
no(a)s aluno(a)s maior interesse pela disciplina Geografia? Esta questão será discutida ao
longo deste texto.

Em um movimento que visa compreender a percepção do(a)s professore(a)s


acerca da visão do(a)s discentes sobre a Geografia, os dados da (Tabela 2) a seguir
indicam que o(a)s professore(a)s acreditam que o(a)s aluno(a)s gostam de estudar
Geografia e percebem que os temas mais próximos do cotidiano dele(a)s melhora o
interesse pela disciplina.

Tabela 2: Componente Curricular Geografia.


Escola 1 Escola 2 Escola 3 Escola 4
O(a)s seus/suas aluno(a)s Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não
gostam de estudar Geografia? x x x x
Você acredita que os temas Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não
mais próximos do cotidiano, x x x x
melhoram o interesse dele(a)s
pela Geografia?

Fonte: Pesquisa de Campo, 2021. Elaborado a partir da entrevista.

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Quando consultados sobre se o(a)s discentes mostravam mais interesse pelo
componente Geografia ou pelos projetos/eletivas, dos quatro professore(a)s que
acompanhamos, três responderam Projetos e Eletivas.

Uma outra pergunta questionava o(a)s docentes acerca das disciplinas da base
diversifica e sua importância para a formação do(a)s jovens, além de outras temáticas. As
respostas positivas foram unânimes, na concepção dele(a)s as disciplinas da Base
Diversificada contribuem para a formação do(a)s seus aluno(a)s. Ao serem
questionado(a)s sobre a relação entre as Tutorias e a conscientização do(a)s discentes
sobre as suas condições da vida escolar e pessoal, alguns descrevem seu trabalho:

O(a)s aluno(a)s chegam meio perdidos então a gente os ajuda nesse


direcionamento na questão de qual Curso eles vão querer fazer, na questão de
mercado de trabalho, já os estudos orientados, ajudam eles a se disciplinarem.
(Professor(a))

Uma questão que podia nos ajudar a compreender as interações entre aluno(a)s e
professore(a)s e suas contribuições para um olhar mais positivo para a Geografia, diz
respeito a consciência do(a)s discentes sobre o tipo de escola onde estudam. Para
compreender suas posições, propusemos uma comparação entre a escola de tempo
integral e a escola regular, tendo em vista que 88% dele(a)s já estudaram em escolas
regulares e 12% somente em escolas de tempo integral. Na comparação 38%
evidenciaram que a principal diferença é o tempo mais prolongado nas escolas, que
possibilita o(a)s professore(a)s conhecerem melhor o(a)s aluno(a)s e isto facilita o ensino
e a aprendizagem, 29% responderam que a diferença é apenas o tempo a mais na escola,
17% por ter mais atividades esportivas e culturais, 12% o ensino ser melhor por passar
mais tempo na escola e 4% que a alimentação é melhor.
Seguimos indagando a(o)s aluno(a)s sobre o mesmo questionamento feito a(o)s
seus professore(a)s, acerca das possibilidades de interação nas disciplinas diversificadas.
Cerca de 95% deles entenderam que elas possibilitam o(a)s professore(a)s lhes
conhecerem melhor e apenas 5% responderam que não possibilita. Assim, confirmando a

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posição docente. Perguntamos ainda que disciplinas lecionadas pelo(a) professor(a) de
Geografia possibilitavam maior interação com o(a) professor(a), respostas a seguir,
Gráfico 1:
Gráfico 1 - Interação com o(a) Professor(a) de Geografia

Fonte: Pesquisa de Campo, 2021. Elaborado a partir dos questionários.

Como pode ser observado a maioria do(a)s aluno(a)s tem uma interação melhor
com o(a) professor(a) de Geografia nas aulas de Geografia e nas eletivas dadas por ele(a)s.
Então, nós questionamentos aos aluno(a)s se pelo fato do(a) Professor(a) conhece-lo(a)s
melhor podia influenciar o ensino e os seus estudos positivamente, 213 aluno(a)s
responderam que influencia e 20 responderam que não influencia.

Chegamos em uma das principais perguntas da nossa pesquisa, esse


questionamento é para entendermos se essa interação/relação dos aluno(a)s com o(a)
professor(a) de Geografia influencia de forma positiva a sua relação com a disciplina
Geografia. Perguntamos se pelo fato do(a) Professor(a) de Geografia ser também seu/sua
professor(a) de outra disciplina (Eletivas, Projeto de vida, Tutorias e Estudos Orientados),
influenciava os seus estudos na componente Geografia, obtivemos as seguintes respostas,
100 alunos responderam que sim, 136 responderam que não influenciava em seus estudos.

O(a)s aluno(a)s foram ainda questionados sobre as Eletivas e Tutoriais do(a)s


professore(a)s de Geografia. Inicialmente perguntamos sobre a escolha do(a) professo(a)r
de Geografia para ser tutor(a) do(a)s aluno(a)s, 46% dele(a)s escolheram pela facilidade
do diálogo com o(a) professor(a), 44% porque se identificam com o(a) professor(a) e 10%
porque se identifica com a disciplina Geografia.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao final desses dois anos de investigação nas Escolas Cidadãs, onde buscamos
conhecer e fazer conhecidos aspectos do funcionamento dessas escolas e do trabalho
do(a)s professore(a)s de Geografia nelas, de modo a contribuir com a formação do(a)s
graduando de Geografia que lecionarão nessas instituições a partir do entendimento de
como tais proposições podem impactar positiva e/ou negativamente na vida docente e
discente.
Com o que observamos podemos destacar que existem diversas impossibilidades
referentes ao que está previsto em lei e ao que de fato é desenvolvido nesses ambientes.
Falta uma infraestrutura que realmente possa comportar a estadia integral do corpo
docente e discente de modo adequado e ficou evidente que a educação prescrita e
executada nessa escola contemporânea está carregada de intenções ideológicas que
atendem aos interesses do setor privado, expressando assim suas concepções e objetivos
que tornam este um modelo que não pode ser considerada de escola integral, apenas de
tempo Integral como debate Kuenzer (2017).
Por meio do acompanhamento e diálogo com o(a)s professore(a)s, percebemos
que estes introjetaram um discurso sobre a escola de tempo integral já destacado no texto
de Cavaliere (2007), sobre a visão assistencialista que esta instituição assume, assim
entendem a Escola Cidadã como uma instituição que substitui a família e, onde o mais
relevante não é a difusão e construção do conhecimento, mas sim, a ocupação do tempo
e a socialização primária. Observamos mesmo um deslumbramento dos professores em
relação ao projeto e ausência de uma análise crítica sobre o seu papel nessas instituições.
No trato da relação entre professore(a)s e aluno(a)s constatamos poucas
orientações acerca de normatizações que pudessem sobre o tema. No que diz respeito a
influência dessa interação mais próxima, que havíamos observado empiricamente no
primeiro projeto, entre professore(a)s e aluno(a)s, constatamos que esta não interfere no
interesse dos segundos para com a disciplina Geografia e tão pouco no processo de
ensino/aprendizagem dos professore(a)s e aluno(a)s. O que os dados demonstraram é que

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possivelmente esse fenômeno se deve pelo fato da extensão de permanência nas escolas
que pode propiciar maior aproximação entre as pessoas.

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