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All content following this page was uploaded by Letícia Bettio on 21 May 2020.
1
Os conceitos humanizadores são relativos à qualidade ambiental do projeto em habitação coletiva,
utilizados a partir da definição de Barros e Pina no artigo Uma abordagem de inspiração humanizadora para o
projeto de habitação coletiva mais sustentável (2010).
Morar é um direito de todos. No entanto, esse direito é garantido por lei há muito
pouco tempo quando analisamos o histórico das políticas públicas habitacionais; apenas
a partir de 1948 o direito à moradia passou a ser considerado um direito fundamental pela
Declaração Universal dos Direitos Humanos, por exemplo. No Brasil, mais
especificamente, a partir da promulgação da Constituição Cidadã de 1988 que essa
temática começou a receber sua devida atenção no âmbito legislativo e finalmente
tornar-se direito constitucional em 2000.
Os espaços de moradia vão ficando cada vez mais rarefeitos; a população pobre
é afastada dos centros das cidades; suas casas vão ficando cada vez mais enxutas.
Assim, passamos a ter habitáculos afastados dos lares que antes tinham matriz em
iniciativas privadas ou financiamento público de fundos previdenciários, porém, agora,
oferecidos pelo Estado. De um modo geral, o que isso tudo representa?
1. Antes, a moradia popular era ofertada basicamente por uma iniciativa conjunta, de
trabalhadores do setor primário que se organizaram em grandes mútuas
financeiras para construírem coletivamente seus espaços de morar. Por iniciativa
patronal, eram comprados terrenos em grandes loteamentos, onde não apenas
casas, mas toda infraestrutura urbana básica era construída: a escola dos filhos, o
mercado para o rancho, a farmácia, a igreja, as associações condominiais. Era
uma moradia inserida em um sistema de cidade, porém de aluguel.
2. Posteriormente, quando o Estado assume a responsabilidade sobre as questões
habitacionais, temos a expulsão dos trabalhadores de locais de centralidade,
construção de conjuntos habitacionais verticalizados, muito densificados, com
metragens mínimas e sem espaços de convivência. A casa passa a ser um local
para apenas realizar atividades básicas; não há espaços para as pessoas se
encontrarem, as ruas são para os carros. A casa é própria, porém na periferia das
cidades.
O que podemos depreender disto é que, as iniciativas de 1930 até 1964 - que
surgiam de cooperativas e pequenas mútuas - atendiam às demandas habitacionais,
focando-se em necessidades locais. Por outro lado, quando a responsabilidade sobre a
habitação passou para o âmbito nacional - como no caso do BNH e do PMCMV - a
produção passa a ser massificada, caracterizando um padrão tipo-morfológico sem
adequar-se à diversidade de conformações familiares, e influenciando na configuração de
cidades esparsas.
2
Para Howlett e Ramesh (2013), existem cinco fases do ciclo de políticas públicas: formação da agenda,
formulação da política, tomada de decisão, implementação e avaliação. Na prática os estágios não são
sequenciais ou obrigatórios em sua plenitude. Tudo vai depender da situação política e econômica.
3
O termo urbanidade pode ser extremamente amplo e de difícil definição, envolvendo critérios como a
qualidade do ambiente construído pelo homem (CASTELLO, 2017), caráter urbano e conjunto de qualidades,
boas ou más, que constituem a cidade (AGUIAR, 2012) ou um conceito humanizador contemporâneo descrito
como um senso de urbanidade (sintetizando as necessidades dos usuários, requisitos técnicos e geográficos
Mesmo sendo segregada do tecido urbano, a Vila Maria Zélia não distanciava
seus moradores do acesso à infraestrutura urbana e todos os equipamentos necessários
para - de acordo com Bonduki - “o desenvolvimento de todas as atividades do tempo do
‘não’ trabalho”. Era considerada uma Vila de empresa, devido a forma de financiamento e
construção, mas nos anos 40 foi adquirida pelo IAPI de São Paulo, por ser considerada
uma referência e precursora daquilo que o Instituto pretendia com seus conjuntos
residenciais4. Tanto a Vila Maria Zélia quanto a Vila Economizadora são consolidadas até
hoje no tecido urbano de São Paulo5; ambas se configuram como pequenos sistemas de
infraestrutura urbana, abastecendo diferentes tipos de casas unifamiliares: isoladas nos
lotes, geminadas, com pátios comuns ou privados (figura 4).
4
As iniciativas em habitação social, fomentadas pelos IAPs, FCP ou DHP eram designadas como conjuntos
residenciais. Promovida pelo BNH, esta produção assumiu a designação de conjuntos habitacionais [...].
(SANVITTO, 2010, p 5).
5
Ambas são tombadas pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico
(CONDEPHAAT) e o Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da
Cidade de São Paulo (CONPRESP).
legenda: modelos 3D e diagramas produzidos pela autora (MACHADO, 2018) e imagens atuais do
Google Street View
6
A Cidade Jardim é um modelo de cidade concebido por Ebenezer Howard, no final do século XIX,
consistindo em uma comunidade autônoma cercada por um cinturão verde num meio-termo entre campo e
cidade.
legenda: modelos 3D e diagramas produzidos pela autora (MACHADO, 2018) e imagens atuais do
Google Street View
legenda: modelos 3D e diagramas produzidos pela autora (MACHADO, 2018) e imagens históricas
do Google Earth
7
O Direito à cidade é uma ideia que foi primeiramente propostA por Henri Lefebvre em seu livro de 1968 Le
Droit à la ville. Lefebvre resume as ideias como uma "demanda...[por] um acesso renovado e transformado à
vida urbana". David Harvey, por sua vez, descreveu-o como muito mais que a liberdade individual para
acessar os recursos urbanos: é o direito de mudar a si mesmos por mudar a cidade. É, sobretudo, um direito
coletivo, ao invés de individual, pois esta transformação inevitavelmente depende do exercício de um poder
coletivo para dar nova forma ao processo de urbanização
5 Conclusões
8
O senso de habitabilidade, por sua vez, se embasa na relação entre a implantação e a unidade habitacional,
focando na apropriação para realizar atividades domésticas; um sentido de habitar que atenda às
necessidades de refúgio, isolamento, convivência, ordem e variedade. O senso de urbanidade, já descrito
anteriormente neste trabalho, somado ao senso de habitabilidade descrevem os conceitos humanizadores,
utilizados por BARROS e PINA, 2011 para analisar projetos de habitação coletiva.
Referências
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