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SOCIEDADE E ESPAÇO URBANO

Conflitos urbanos: violência e privatização do espaço público

“[...] resultado de pesquisa realizada pelo Centro Brasileiro de Estudos Latino-


Americanos da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Cebela/Flacso) –,
78,6% dos cidadãos brasileiros, especialmente os que vivem nas grandes cidades,
afirmam ter muito medo de serem assassinados. Não são cidadãos que trabalham
como policiais ou em atividades de risco (o que poderia justificar esse medo), mas
trabalhadores urbanos. [...]” (página 315).

“[...] Ao estudar esses fenômenos, a Sociologia contribui para explicar a violência da


vida moderna ao compará-la com a de outras sociedades e momentos históricos,
assim como avalia suas consequências nas cidades ao desvendar determinadas
relações causais e permitir a construção de alternativas que não reproduzam seus
efeitos perversos, como a segregação social e o estabelecimento de uma cultura do
medo. [...]” (pagina 315).

“[...] Sabemos que a violência acontece tanto no campo quanto nas cidades, e tanto
nas cidades grandes como nas pequenas. Assim, é importante entender o destaque
alcançado pela expressão ‘violência urbana’ a partir do final dos anos 1970, termo que
qualifica no senso comum a violência nas cidades, mas que também se relaciona com
os conceitos sociológicos de ‘criminalidade’, ‘segregação’ e ‘exclusão’. [...]” (página
316).

“[...] Segundo a antropóloga carioca Alba Zaluar, o crescimento da violência (medido


especialmente pela taxa de homicídios, isto é, o número de assassinatos por 100 mil
habitantes) é um fenômeno internacional e foi constatado em países desenvolvidos,
como França e Estados Unidos, a partir dos anos 1960. No Brasil, foi constatado
apenas 10 anos mais tarde. [...]” (página 316).

“[...] Ao longo do século XX, a Sociologia desenvolveu diferentes teorias para analisar
a situação de violência nas cidades – em especial entre jovens, faixa etária em que se
concentra a maioria das vítimas –, entre as quais estão: a da “Desorganização Social”,
de matriz evolucionista; a da “Frustração”, que atribuía à desigualdade de
oportunidades o envolvimento com a criminalidade; a do “Rótulo”, que criticava as
anteriores e atribuía às instituições governamentais uma ação discriminatória contra
jovens de minorias étnicas e pobres; e a “Crítica”, que apontava para a necessidade
de reforma do sistema penal, acabando com a própria ideia de prisão, a qual se
resume apenas [...]” (página 316).

“[...] Todas essas teorias, no entanto, eram incapazes de explicar como percentuais
tão significativos de pobres, negros e demais indivíduos pertencentes a minorias
étnicas seguiam uma carreira criminosa ou se dedicavam a práticas violentas. [...]”
(página 316).

“[...] Surgiram, então, teorias mais comprometidas com a explicação dos processos de
escolhas individuais, que atribuíam aos jovens comportamentos específicos, como se
a faixa etária tivesse características comuns, como o romantismo (o gosto pelo
imediato, à importância da experiência e da sensação) e o conformismo com o grupo
(no que diz respeito à socialização sexual, musical, de comportamento), além do
desvio tolerado diante de orientações contraditórias das gerações anteriores. [...]”
(página 317).

“[...] Os jovens das classes operárias europeias eram identificados nos anos 1960 pela
homogeneização de comportamentos por meio das roupas, da música, da sexualidade
e do uso de drogas. A partir de então, um conjunto de transformações culturais,
políticas e econômicas modificou o perfil dessa juventude, que, sem perder a ligação
com sua origem de classe, adquiriu múltiplas formas de expressão e contestação [...]”
(página 317).

“[...] Para entender o aumento dos casos de violência que acontecem no espaço
urbano e as mudanças da sua intensidade e letalidade, é necessário levar em conta os
meios pelos quais se constrói a coesão social, os valores que determinam os
comportamentos considerados desviantes e as possibilidades concretas disponíveis
para levar movimentos violentos às últimas consequências. [...]” (página 317).

Segregação socioespacial

“[...] Nos anos 1970 e 1980, os estudos sobre violência urbana se diversificaram e se
renovaram, buscando demonstrar que a “violência urbana” não se restringe aos
comportamentos contra a população mais pobre. A teoria da dominação, inspirada no
marxismo e em Weber, foi recuperada para pensar essas formas de violência
institucional. [...]” (página 318).

“[...] Ao estudar os conflitos urbanos ocorridos na França, na Grã-Bretanha e nos


Estados Unidos, o sociólogo francês Loïc Wacquant distingue dois tipos de violência
nas cidades contemporâneas desviantes, mas é também uma violência do Estado e
das classes dominantes: a “violência vinda de baixo” – explosões de revolta que
envolve, principalmente, jovem das áreas pobres da cidade; e a “violência vinda de
cima” – traduzida no impacto das políticas econômicas e sociais, ou da ausência
delas, sobre as condições de vida das populações. [...]” (página 318).

“[...] As diferenças que marcam nossas cidades são gritantes quando observamos os
bairros diversos, as formas de moradia e sua população, o grau de conservação dos
equipamentos públicos e de acesso aos meios de transporte. É possível ver nessas
diferenças um importante aspecto territorial do processo da formação social brasileira:
a segregação espacial urbana. [...]” (página 318).

“[...] A segregação, nesse sentido, consiste, em especial, na concentração de


determinadas classes ou camadas sociais em certas regiões ou bairros da cidade. No
Brasil, como em outros países capitalistas, são segregados dessa forma
principalmente os pobres (embora os ricos também possam segregar-se em
condomínios fechados, por exemplo). Como podemos ver no quadro sobre
equipamentos públicos e na foto abaixo, as classes populares ocupam as regiões mais
afastadas e com menor número de equipamentos públicos, ou seja, têm menores
acesso a direitos como saneamento, saúde, lazer, educação e, além disso, moram
distante dos seus locais de trabalho. [...]” (página 319).
“[...] Em 2005, quando eclodiram conflitos nas periferias francesas que duraram três
meses, Sarkozy, então ministro do Interior, chamou de “ralé” os jovens das periferias,
inflando os ânimos dos revoltosos. [...]” (página 320).

“[...] O estopim dos confrontos foi à morte de Moushin, 15, e Larami, 16, que estavam
em uma moto quando se chocaram com um carro de polícia. [...]” (página 320).

“[...] As crianças e os jovens que nunca saem dos espaços nos quais foram criados,
sejam os bairros populares suburbanos, sejam os condomínios fechados das elites,
podem ser levadas a ver como naturais às distinções de classe socialmente
constituídas, o que pode impedir o surgimento de uma geração de cidadãos críticos
das desigualdades e dispostos a se esforçarem para combatê-las. [...]” (página 321).

“[...] Há ainda outra forma de segregação, relacionada às atividades urbanas isoladas


em zonas específicas da cidade. Há áreas especialmente destinadas a atividades
comerciais, industriais, de lazer, assim como zonas residenciais. Trata-se de um
modelo característico de cidades planejadas, como Brasília, no Distrito Federal. [...]”
(página 321).

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