Você está na página 1de 5

IIº CONGRESSO ARQUIDIOCESANO DOS CATEQUISTAS – 2022

Tema: Mistagogia

Louvado seja o nosso Senhor Jesus Cristo…

INTRODUÇÃO

Ao chegarmos na quinta e última reflexão do nosso segundo congresso


arquidiocesano dos catequistas centrado na catequese com estilo catecumenal, impõem-
se iniciarmos a nossa reflexão lembrando os temas abordados e reflectidos até aqui.

Iniciamos as nossas exposições com o tema “A Iniciação Cristã”. Antes mesmo


de lançar-se no mundo como fruto e semente da conversão, a todo o cristão é oferecido
um caminho de formação que o deve preparar para toda a vida de fé e os seus desafios
dentro e fora da Igreja, a esta formação de educação da fé chamamos iniciação cristã, a
mesma materializa-se por meio de uma catequese sistemática, organizada, a que
chamamos Catecumenado e que compreende quatro etapas efectivas.

O segundo painel expunha a primeira etapa da iniciação cristã, a “Primeira


Evangelização”. O ponto de partida para toda uma vida de fé é o contacto com o
kerigma, o primeiro anúncio. É portanto esta a etapa da catequese kerigmática que se
apresenta como porta de entrada para o aprofundamento dos mistérios e da vida de
comunhão com Deus.

O terceiro tema foi sobre a etapa do “Catecumenado”. Por ser a mais densa etapa
deste caminho de iniciação, sua abordagem centrou-se no valor extensivo dos rituais de
iniciação que, em qualquer cultura ou povo, dão significado a vida e existência dos
povos. O catecumenado é, portanto, um marco no caminho de construção do homem
novo em Cristo.

Por fim, nos precedendo, reflectimos sobre a etapa de “Iluminação e


Purificação”. Esta tem, tradicionalmente, uma ligação prática com o tempo quaresmal e
marca o tempo de preparação espiritual e imediata para os sacramentos de iniciação
cristã. Tal preparação baseia-se, já no tempo quaresmal, nos ritos de inscrição ou eleição
ao primeiro domingo e três escrutínios que marcam para os eleitos os domingos da
água, da luz e da vida segundo a liturgia quaresmal do ciclo A.

Para completar a nossa partilha e reflexão este último painel nos apresenta a
etapa da MISTAGOGIA.

“Mestre onde moras?... Vinde e vede”


IIº CONGRESSO ARQUIDIOCESANO DOS CATEQUISTAS – 2022

MISTAGOGIA

Esta é uma palavra de origem grega. Na sua etimologia é formada por dois
vocábulos Místic = mistério e alogos = introdução. Ainda na antiga Grécia a expressão
já se aplicava ao campo religioso como um estudo profundo do sagrado. Mistagogia
significa, portanto, introdução no mistério, «o percurso do ser humano para o fim além
de si mesmo… amadurecimento último e ulterior do ser que envolve todo o ser na
experiência com o que é Santo, com o Outro»1.

Na iniciação cristã a Mistagogia vai manter o seu valor semântico para ser, neste
caminho de formação, o tempo propício para a construção do homem altruísta, do
cristão que alcançou a compreensão do «teocentrismo» da Igreja e da urgência do servir.
Assim sendo, o homem entende que existe mais do que para si mesmo, existe para
Cristo, existe para a Igreja e existe para os outros.

Dentro da dinâmica da catequese no estilo catecumenal que, como podemos


perceber, vem das raízes do cristianismo uma vez que do século IIº nos chegam
referências da prática do ensino e dos ritos catecumenais destacando-se nomes como o
de S. Justino e Tertuliano, no séc. III Hipólito de Roma, no séc. IV, grande período das
catequeses mistagógicas, temos Cirilo de Jerusalém, João Crisóstomo e Ambrósio de
Milão. A Mistagogia «é o tempo último da iniciação cujo objectivo é fazer com que os
novos membros da Igreja obtenham um conhecimento mais completo dos sacramentos
recebidos…»2.

A sistematização deste estilo de catequese, compreende um desenvolvimento


gradual da fé, aonde cada etapa representa uma evolução na educação da fé dos
candidatos. A Mistagogia como última fase tem como objectivo o Amadurecimento da
Fé, a Iluminação e Purificação propõem-se a Profissão e testemunho da fé, a fase do
catecumenado o Aprofundamento da Fé e a Primeira Evangelização o Despertar a Fé.

A tradição catecumenal e o RICA3 estabelecem os 50 dias do tempo pascal como


o tempo ordinário da Mistagogia, cabendo ao catequista a responsabilidade de inserir os
neófitos na vida da Igreja a que, a partir dos sacramentos recebidos na noite de Vigília
Pascal, agora pertencem. Contudo, a dinâmica pastoral dos dias de hoje pede-nos uma
1
Heber Zunun in Dicionário Iinformal, 2010
2
Pe. Renato Quezini in Pedagogia da Iniciação Cristã 2013
3
Ritual de Iniciação Cristã para Adultos

“Mestre onde moras?... Vinde e vede”


IIº CONGRESSO ARQUIDIOCESANO DOS CATEQUISTAS – 2022

constante adaptação das práticas catecumenais e nas nossas comunidades o tempo da


Mistagogia é vivido ao longo do catecumenado crismal, ou seja, depois da recepção do
baptismo e da eucaristia e durante a preparação para a crisma.

PROPÓSITOS DAS CATEQUESES MISTAGÓGICAS

A Mistagogia tem como objectivos o amadurecimento da fé e a inserção dos


candidatos na vida da Igreja. A maturidade da fé manifesta-se no compromisso,
enquanto a vida da Igreja centra-se na celebração dos mistérios de Cristo.

A luz destes objectivos apresento resumidamente quatro propósitos das


catequeses mistagógicas:

- Profunda compreensão dos sacramentos recebidos

- Concreta vida litúrgica e sacramental

- Evangelização

- Moral cristã

 Profunda compreensão dos sacramentos recebidos

Tertuliano, grande demolidor de heresias do séc. II, num dos seus textos mais
célebres, referindo-se aos sacramentos de iniciação cristã afirma:

[…] lava-se a carne, para que a alma seja purificada; unge-se a carne para que
a alma seja consagrada; cerca-se a carne para que a alma seja protegida; a
carne recebe a imposição das mãos, para que a alma seja iluminada pelo
Espírito; a carne se nutre do corpo e do sangue de Cristo, para que a alma se
alimente de Deus.4

Esta sublime catequese sobre os sacramentos de iniciação cristã, manifesta o


mais profundo e real sentido dos mesmos, tal como devem ser comunicados a
todos quanto os tenham recebido a partir de uma confissão de fé pessoal, com
primazia aos neófitos. Tais sacramentos são a porta que nos insere na vida de
comunhão com Deus, sendo que, para viver com Ele, todo o nosso ser, carne e

4
In Pedagogia da Iniciação Cristã, 5 p.18: Os Sacramentos; Teologia e história da Celebração

“Mestre onde moras?... Vinde e vede”


IIº CONGRESSO ARQUIDIOCESANO DOS CATEQUISTAS – 2022

alma, é circundado pelos dons da salvação que nos são comunicados pelos
sacramentos.

 Concreta vida litúrgica e sacramental

No nº 64 da Sacramentum Caritatis, o papa Bento XVI, abordando sobre a


catequese mistagógica afirma:

Essa tarefa é particularmente urgente numa época acentuadamente tecnológica


como a actual, que corre o risco de perder a capacidade de perceber os sinais e
os símbolos. Mais do que informar, a catequese mistagógica deverá despertar e
educar a sensibilidade dos fiéis para a linguagem dos sinais e dos gestos que,
unidos a palavra constituem o rito.

A eucaristia, fonte e ápice de toda a vida cristã 5, centro da nossa liturgia, para ser
perfeitamente celebrada e concretamente vivida deve antes de tudo ser bem
compreendida. Conduzir os neófitos a essa compreensão é tarefa do mistagogo e
este deve fazê-lo acima de tudo pelo testemunho do bem viver e celebrar na
liturgia. No mesmo número da Sacramentum Caritatis, Bento XVI afirma que a
melhor catequese sobre a Eucaristia é a própria Eucaristia bem celebrada.

Assim a participação litúrgica de todo fiel baptizado, confirmado e comungante


deve ser VIVA (assídua, pontual, presente…), ACTIVA (vivida com gestos,
orações e respostas), EFICAZ (que receba e comunique a graça, que seja lição
para o outro), CONSCIENTE (saber o que celebrar, por que celebrar e como
celebrar) e FRUTUOSA (que seja transformadora, que nos converta).

A impressão dos valores da liturgia na vida do cristão acontece, portanto,


mediante a prática dos sacramentos e fidelidade aos seus compromissos.

 Evangelização

Uma vez inseridos nos mistérios da fé professada e na vida da Igreja que os


acolheu, os novos membros são chamados ao serviço. E no centro de todo
serviço pastoral da Igreja está a evangelização.

5
Lumen Gentium 11

“Mestre onde moras?... Vinde e vede”


IIº CONGRESSO ARQUIDIOCESANO DOS CATEQUISTAS – 2022

Na Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi o papa Paulo VI nos diz que a


pedra de toque de todo o processo de evangelização é: “aquele que foi
evangelizado passa a evangelizar”6. Assim, a Mistagogia deve promover a
consciência do serviço continuado da evangelização. Os neófitos não se
entendam como mais um, mas sim como novos protagonistas da evangelização
que se vai manifestar na diversidade pastoral da Igreja. São todos chamados a
integrar e dedicar-se activamente nos grupos e movimentos apostólicos, na
constituição de famílias que sejam verdadeiras Igrejas Domésticas, a abrirem-se
ao chamado vocacional para o sacerdócio e a vida consagrada e ao serviço da
própria catequese.

 Moral Cristã

À moral cristã, que parte do decálogo, nós somos muito mistagogicamente


orientados por São Paulo em todos os seus escritos. O apóstolo dos gentios é um
mistagogo por excelência e é da sua carta aos Gálatas que sublinho os versículos
13 a 26 do capítulo 5: «caminhai no Espírito, e não realizareis os apetites
carnais. Porque a carne deseja o que é contrário ao Espírito, e o Espírito o que
é contrário a carne…»

Todo cristão é chamado a conformar a sua vida e conduta ao evangelho. Todo


caminho catecumenal é uma formação para a santidade, para a correcção de
vida. Contudo, não é fácil viver as exigências do evangelho, por isso fomos
fortalecidos pelo Espírito a fim de que não estejamos sob o domínio da lei. A
nossa vida deve ser o mais belo testemunho da fé que professamos.

Finalmente, a luz do que aqui foi exposto, a Mistagogia mais do que ser o ponto
de chegada do caminho de formação do cristão, é o ponto de partida para a construção
da comunidade cristã.

Por Hipólito de Carvalho, catequista

6
PAULO VI, Evangelii Nuntiandi, nº 24

“Mestre onde moras?... Vinde e vede”

Você também pode gostar