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Nesta fase da história da Igreja, catequese e liturgia, como iniciação nos costumes cristãos,
tinham por objetivo criar no convertido uma atitude pascal, mediante o conhecimento do
mistério de Cristo e o apoio da celebração litúrgica da Páscoa, fonte de toda vida cristã.
2 - A época apostólica
Os elementos do Novo Testamento sobre a iniciação cristã são escassos. Mesmo não
encontrando um autêntico e determinado ritual de iniciação, são freqüentes os textos que se
referem a uma preparação e a um discernimento anterior à celebração do batismo.
de modo que a instrução deve preceder ao menos como condição. Cristo uniu o batismo ao
anúncio e o conhecimento da Palavra e à iniciação na vida e nos costumes cristãos.26 Os
primeiros cristãos agiram como Jesus tinha mandado. Pregaram e batizaram a partir do
Pentecostes.27 O livro dos Atos dos Apóstolos revela a ligação entre a catequese e a liturgia:
reuniam-se para ouvir a Palavra, partir o pão e tomar parte da vida comunitária e praticar a
caridade.28 O evangelista Lucas, no relato dos discípulos de Emaús, amplia o quadro e
apresenta um paradigma de integração: a realidade da vida29 a Palavra iluminadora;30 a
celebração (fração do pão)31 e a missão.32 As comunidades implantadas e organizadas pelos
apóstolos sabiam distinguir entre catequese e liturgia. Pois, o Senhor havia enviado os
apóstolos para ensinar e batizar e fazer todos seus discípulos.33 Portanto, alguém se torna
discípulo de Jesus na Igreja através da ação litúrgica e da ação evangelizadora da catequese.
Isto mostra que, na Igreja apostólica, liturgia e catequese estavam intimamente ligadas entre
si na iniciação cristã.
3 - O antigo catecumenato
O catecumenato, no século I, ainda não existe como instituição codificada; o que existe,
certamente, é o “processo catecumenal como verdade vivida”.34 O que havia era desde os
primeiros tempos da Igreja o firme propósito de discernir a autenticidade dos candidatos ao
batismo com a ajuda dos padrinhos e de uma catequese adequada.35 A Igreja vive, no início,
uma situação de perseguição em um ambiente pagão e hostil; tem dificuldade de manter a fé,
sente a urgência de aprofundar a conversão e de conservar a unidade eclesial. Consciente de
que tudo isto exige preparação e discernimento sérios, estabelece um processo catecumenal
por etapas em vista de uma conversão sincera e da transformação total de vida.
Na segunda metade do século II, a comunidade cristã começa a fazer maiores exigências aos
candidatos ao Batismo. Temos, portanto, um ambiente propício para o desenvolvimento do
catecumenato, como instituição seriamente organizada. “Os séculos seguintes irão
desenvolver, até a perfeição, a instituição do catecumenato, que encontramos no fim do
século II”.38 A elaboração de um ritual orgânico e completo começa, portanto, a delinear-se
nesta fase e passa a ser um fato no século III, pois a Igreja, diante das heresias,39 se obriga
a precisar melhor sua doutrina em fórmulas definitivas e fazer maiores exigências aos
candidatos ao Batismo. Na Didaqué, fala-se do batismo, depois de ter sido apresentada a
doutrina dos “dois caminhos”,40 há um nexo entre o ensinamento ou catequese e Batismo,
que é precedido pelo jejum.41 Segue-se, após o tema do Batismo o do Pai Nosso e da
Eucaristia,42 o que poderia ser já um indício do itinerário da iniciação cristã. O mesmo
itinerário encontra-se na Apologia I de Justino, em que a relação entre catequese e banho
batismal é mais clara. Na descrição de Justino, já se pode entrever um esboço do
catecumenato.43 Consideração maior, porém, é a Tradição apostólica, 44 da primeira metade
do século III, pois oferece um ritual completo da iniciação cristã. Pela importância desta obra
para a compreensão da iniciação cristã nesse período e sua referência na reforma do RICA
vamos aqui a ela nos ater mais detalhadamente, sem deixar de fazer referência a outras,
identificando a estrutura do catecumenato, composta por cinco etapas:
O período do catecumenato
a) Os “eleitos” A outra forma de catequese estava reservada aos eleitos, que estavam
próximos de receber os sacramentos de iniciação. Esta etapa do catecumenato se iniciava
com uma compreensão mais sistemática das verdades reveladas. A Igreja, durante a época
patrística, lhes proporcionava ritos litúrgicos, especialmente à medida que se aproximava o
batismo.
b) A inscrição do nome
Dentro de oito dias restituireis o que recebestes hoje. Os vossos pais, que vos acolhem hão
de ensinar-vos também, para que estejais preparados, e o modo como haveis de permanecer
em vigília até o canto do galo, para as orações que aqui celebrais. Começamos a apresentar-
vos aqui o Símbolo, para que o aprendais com cuidado; mas ninguém tenha medo; o medo
não deve impedir ninguém de o recitar. Tende confiança: nós somos vossos pais, não temos a
palmatória nem as varas do mestre da escola. Se alguém se enganar numa palavra, não erre
na fé
As catequeses não são mero ensino intelectual e, menos ainda, exercício escolar. Integram-se
na celebração. Geralmente, o comentário do Credo é seguido da explicação do Pater, que
será também objeto de uma traditio e de uma redditio.70 A catequese era acompanhada por
uma série de exorcismos, com imposição das mãos. Essas cerimônias eram designadas pelo
nome de escrutínios, para mostrar que os candidatos recebiam a ação transformadora de Deus
em sua luta contra o mal. Em certo sentido, tudo isto fazia parte do processo chamado
catequese, “que não se dava como um simples ensinamento em forma de aula, mas que se
fazia conjuntamente com os ritos litúrgicos”.
A iniciação sacramental
O ponto culminante do período de instrução catequética e formação espiritual se dava na
celebração pascal do batismo, da confirmação e da sagrada Eucaristia. O Cristo Ressuscitado
é o centro da vida de fé, do ensinamento, da liturgia e da vida comunitária, que faz a Igreja
ser uma comunidade de fé, de culto e de caridade. As festas pascais são consideradas o
tempo mais oportuno para a celebração da iniciação. Tertuliano afirma expressamente: “o
dia mais solene para o batismo é por excelência o dia da Páscoa, em que é consumada a
paixão do Senhor, na qual somos batizados”,72 de modo que liturgia e catequese se
coordenavam, e o batismo se apresentava como participação na Ressurreição de Cristo. Esta
iniciação sacramental consta de diversos momentos:73 a) três dias antes do batismo, na
quinta-feira anterior à Páscoa, os eleitos tomam um banho; b) na sexta-feira começam o
jejum; c) no sábado se reúnem com o Bispo, que lhes impõe as mãos exorcizando-os, sopra-
lhes no rosto e marca-os na fronte, nos ouvidos e nas narinas e, d) durante a noite inteira faz-
se vigília, rezando e ouvindo a Palavra de Deus. No decorrer da vigília pascal celebra-se o rito
sacramental propriamente dito:74 a) Enquanto os batizandos se preparam para o rito,
despojando-se dos seus trajes, o bispo consagra os óleos (o do exorcismo e o da ação de
graças, que correspondem aos nossos óleos dos catecúmenos e o santo crisma). b) Cada
candidato pronuncia a renúncia a Satanás e, em seguida, o presbítero o unge com óleo do
exorcismo. c) Segue-se o Batismo, com três imersões, correspondentes à profissão de fé
dialogada nas três pessoas da Trindade. d) Depois do batismo o neófito é ungido com o óleo
de ação de graças. e) Em seguida, os recém-batizados, tendo vestido as suas vestes brancas,
se apresentam à comunidade reunida. Neste ponto o bispo cumpre alguns ritos que
correspondem ao sacramento da confirmação: imposição das mãos, unção com o óleo de ação
de graças, sinal da cruz na fronte, e o beijo de paz ao neófito. f) Após, os neófitos rezam com
todo o povo e participam da Eucaristia.
Esta primeira participação eucarística é marcada por um rito especial: além do pão e do
vinho, os neófitos recebem uma mistura de leite e mel. Como recém-nascidos, abandonaram
o Egito da escravidão para habitar “numa terra onde corre leite e mel”.75 A iniciação cristã,
na teologia dos Padres, visa a inserção do candidato adulto na comunidade eclesial. O
candidato é acolhido como novo membro com a recepção dos três sacramentos da iniciação
cristã: batismo, confirmação e eucaristia. Todo aquele que tenha recebido a fé e a tenha
confirmado pode aproximar-se do banquete eucarístico. Os processos posteriores de
preparação para a confirmação e a recepção da eucaristia, como fazemos hoje, não são
concebíveis pela teologia dos Padres.
A catequese mistagógica
Mesmo que os candidatos ignorassem ainda o total significado e detalhes dos ritos litúrgicos,
se consideravam preparados espiritual e moralmente. Durante os oito dias seguintes à
celebração, se reuniam ao redor do bispo para revisar a experiência da noite de Páscoa e
discernir sobre novos pensamentos doutrinais e espirituais
Era preciso ser batizado para ter acesso ao mistério do batismo e dos demais sacramentos,
pois o mistério tem que ser experimentado antes de poder ser interpretado. E isso não tanto
por respeito à lei do arcano, que proibia comunicar os divinos mistérios aos pagãos, mas,
sobretudo por causa da convicção de que os sacramentos eram acontecimentos, não noções.
Tinha-se por princípio que “a explicação prévia iria tirar do batizando a receptividade para o
evento e, conseqüentemente, a experiência do mistério”.79 Era preciso vivê-los primeiro; a
explicação vinha depois 80. É o que nos confirma São Cirilo de Jerusalém:
Desde há muito tempo desejava falar-vos, filhos legítimos e muitos amados da Igreja, sobre
estes espirituais e celestes mistérios. Mas como sei bem que a vista é mais fiel que o ouvido,
esperei a ocasião presente, para encontrar-vos, depois desta grande noite, mais preparados
para compreender o que se vos fala e levar-vos pelas mãos ao prado luminoso e fragrante
deste paraíso.
É preciso levar em conta que, para os Padres, os sacramentos não se explicam antes de serem
recebidos. Os mistérios primeiro se vivem e somente depois se entendem. Tal concepção é de
grande importância para a atividade pastoral, pois permite dar continuidade ao primeiro
anúncio e ao catecumenato.82 Certamente vislumbra-se aqui um pensamento comum aos
Padres da Igreja, segundo o qual o rito tem um valor propedêutico, isto é, prepara o fiel para
um ensinamento mais completo. Não se trata, pois, exclusivamente, de ensinar e de “saber”
coisas sobre a fé, mas transmitir o conteúdo da fé da Igreja e, desta maneira, ajudar a mudar
de vida, de acordo com a fé, e de conduzir as pessoas às portas do encontro com Jesus Cristo,
que vem ao encontro delas pelos sacramentos. À explicação dos mistérios dá-se o nome de
catequese mistagógica, pois mistagogia quer dizer, exatamente, “iniciação aos mistérios” ou
sacramentos recémcelebrados. A catequese mistagógica83 da semana pascal introduz os
neófitos na seqüência do rito ao mistério, à compreensão do que experimentaram na Vigília
Pascal. Hipólito observa que, se algo deve ser lembrado aos que tiverem recebido o batismo,
o bispo, o fará em segredo, para que os não-fiéis não sejam informados, a não ser depois que
o houverem também recebido.84 Dentre as catequeses mistagógicas deste período, tomamos
como referência as de Cirilo de Jerusalém. 85 Nas suas cinco últimas catequeses, oferece uma
explicação dos ritos do batismo, da confirmação e da eucaristia. Portanto, nesta época,
adquirem grande importância as catequeses patrísticas86 sobre a iniciação cristã. Os neófitos
mantinham-se de veste branca e completavam a sua instrução sacramental pelas catequeses
mistagógicas até o segundo domingo da Páscoa “in albis deponendis” (quando as vestes
brancas são depostas). Era assim que terminava a catequese de iniciação na comunidade
cristã. Enquanto não acontece todo este processo, não se pode dizer que um cristão tenha
completado a iniciação cristã.