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O Concílio Vaticano II

e a Liturgia
Sacrosanctum Concilium
A liturgia um plano teológico
• A Sacrosanctum Concilium se coloca decididamente sobre um plano
teológico.
• O interesse do documento não é somente os ritosem si, mas sobre
conteúdos de fé que eles exprimem.
• Pela primeira vez um concílio trata a liturgia numa perspectiva teológica e
a resgata de um ritualismo banal.
Uma constituição sobre a liturgia
• Prólogo e 1º capítulo – (n. 5 – 13), um verdadeiro compêndio de teologia
litúrgica que constitui o fruto do movimento litúrgico. ]
Chave de leitura:

• A liturgia possui uma parte imutável identificada com o fator tradicional;


elemento de contato vivo com Cristo.
• Mas também possui uma parte suscetível de mudança proveniente das
diversas tradições acrescentadas com o passar do tempo.
• A conservação dessas tradições impediu que a liturgia se atualizasse para
o prejuízo da Tradição.
• De Trento em diante, temos uma visão da liturgia estático-jurídica; a
liturgia passou a ser um rito externamente cumprido segundo normas
rubricais.
• Estas duas visões de liturgia foram recusadas pela encíclica Mediator Dei
de Pio XII porque erma tidas como muito redutivas:
• A noção estética, que concebia a liturgia como forma exterior e sensível
do culto, ou seja, o conjunto de cerimônias e ritos da Igreja; e a noção
jurídica, que se concentrava exclusivamente sobre a liturgia enquanto
culto público, regulado pela autoridade hierárquica da Igreja. MD, 25.
• Sacrosanctum Concilium – o argumento litúrgico não aparece como
conclusão de um discurso sobre a natureza do culto em chave religiosa e
sobre formas da sua atuação.
• Coloca a liturgia no contexto da Revelação como história da salvação. A
obra da salvação continuada pela Igreja se realiza na liturgia, SC , 6.
• Liturgia – verdadeira tradição, isto é, transmissão do verdadeiro do
mistério salvífico de Cristo por meio de um rito de maneira sempre nova,
ao suceder-se dos tempos e lugares.
• Tradições litúrgicas – interpretações do rito condicionadas pelo tempo e
lugar onde surgiram.
• Visão estático-jurídica – é superada dando lugar a uma perspectiva
dinâmico-teológica da liturgia: a liturgia é acima de tudo ação do próprio
Cristo no seu Corpo que é a Igreja, SC 7. cristo é o agente principal no rito
e com o rito.
• Isso desemboca na linha sacramental da liturgia, que continua o mistério
de Cristo na forma do mistério cultual.
• O mistério de Cristo e a história da salvação não são realidades distintas,
mas uma coisa só.
• Toda a história da salvação é concentrada no mistério de Cristo e este
mistério é o centro da história da salvação.
Aspectos doutrinais sobre a natureza da
liturgia
• Ponto de partida – texto fundamental da Sacrosanctum Concilium, n. 7: “a
liturgia é tida como o exercício do sacerdócio de Jesus; nela, por meio dos
sinais sensíveis, é significada e, de modo a estes mesmos, realizada a
santificação do homem, e exercitado pelo Corpo Místico de Cristo, isto é,
da Cabeça e dos membros, o culto público integral.”
• Este conceito deve lido no contexto doutrinal mais amplo e em sintonia
com outros documentos do Vaticano II, como Lumen Gentium.
Dimensões doutrinais destacadas na SC
• Liturgia e economia sacramental da salvação – Origenes (+ 253)
organizou a visão do cristianismo em torno da noção central de mysterion.
Para ele, é uma realidade mediada, ou seja manifestada por meio de
símbolos.
• Cristo é o mistério primordial, pois n’Ele, a humanidade é sinal que
manifesta e comunica uma realidade divina.
• Do mistério de Cristo deriva a Igreja, sinal de salvação; o mistério cultual
que exprime a atividade salvífica de Cristo na Igreja.
• Séculos IV – V, este termo indica, na Igreja grega, toda atividade litúrgica
da Igreja: os ritos sacramentais (batismo, eucaristia, etc), e os outros ritos.
• Na Igreja latina exprime o mesmo significado, mysterion e em seguida
traduzido como sacramentum. Os padres latinos usam os termos como
sinônimos aplicados a mesma realidade: Cristo, Escritura, Igreja, ritos
sacramentais e cultuais em geral.
• Depois do século XII o termo sacramento foi usado somente para os sete
grandes sacramentos.
• A teologia já nos anos precedentes ao Vaticano II, retomou a preciosa visão dos
padres da Igreja. Os sacramentos propriamente ditos são considerados as formas
salientes de uma maior sacramentalidade da Igreja, em diversos modos.
• “Do lado aberto de Cristo morto sobre a cruz surgiu o admirável sacramento de
toda a Igreja.” SC, 5 e LG, 9, 48, 59.
• Os gestos, as palavras, os objetos, os elementos, as pessoas, os tempos e lugares
que intervém na ação litúrgica são ligados à sacramentalidade da Igreja.
Liturgia e Mistério Pascal
• Consequências do enquadramento da liturgia na economia sacramental da
salvação: forte relevância ao mistério pascal – o culto cristão foi iniciado
por Cristo na sua vida mortal, levou a seu estágio definitivo com a morte e
ressurreição e prolonga na Igreja como cabeça. SC 5 – 6.
• SC 5, ao descrever os diversos tempos da revelação do desígnio salvífico
de Deus, reconhece em Cristo o cumprimento concreto deste desígnio.
• A redenção-salvação dos homens é iniciada no AT, concretizada na
Encarnação do Filho de Deus e se cumpre no momento da morte-
ressureição-ascensão de Cristo.
• A Encarnação – evento progressivo,. Não consiste só no Natal. Inicia no
seio da Virgem Maria , continua durante toda a vida de Jesus, sua morte na
cruz e sua Ressurreição.
• Por isso, Cristo Gloriosos é o centro de todo o plano criativo do Pai.
• Com o mistério pascal da sua bem-aventurada Paixão, Ressurreição da
morte e gloriosa ascensão, (SC 5) A Pascoa de Cristo é colocada no centro
das história da salvação, mas sobretudo no centro da liturgia da Igreja.
• A história da salvação concretizada no mistério de Cristo, encontra seu
cumprimento na Páscoa não somente como momento histórico mas
acontecimento ritual daquele histórico. (SC, 6)
Liturgia e Igreja
• A liturgia é “obra de Cristo sacerdote e do seu Corpo, que é a Igreja”.
• O Movimento Litúrgico havia definido a liturgia como “culto da Igreja”.
• Também nos documentos magistrais precedentes ao Vaticano II, como
Mystici Corporis e Mediator Dei, liturgia e eclesiologia são inseparáveis.
• Problema: a eclesiologia destes documentos apresenta a Igreja como
sociedade perfeita.
• Eclesiologia do Vaticano II – eclesiologia de comunhão, destaca a
natureza da Igreja como comunhão ontológica, sobrenatural e sacramental
da vida divina. Isso se verifica também na Lumen Gentium, Gaudium et
Spes e Presbiterorum Ordinis.
• A SC 26 afirma: “ as ações litúrgicas não são ações privadas, mas
celebrações da Igreja, que é sacramento de unidade, ou seja, povo santo
reunido e ordenado sob a guia dos bispos.”
• O relacionamento que se poe entre liturgia e Igreja quer superar a relação
dominante até então, entre liturgia e Igreja hierárquica.
• A Igreja povo de Deus é o lugar onde Cristo atualiza o seu sacerdócio, isto
é, meio eficaz da íntima união do homem com Deus.
Liturgia e escatologia
• A ação de Cristo na Igreja é orientada para a plenitude escatológica. SC, 8.
• Se mete em relevo a ideia da contemporaneidade do eterno no presente e
da comunhão entre Igreja peregrina e aquela celeste, mas numa dimensão
de esperança. A ligação é feita através da presença do Senhor: ele é
presente na sua Igreja, de modo especial nas ações litúrgicas (SC 7), mas
deve vir na glória!
• A Lumen Gentium no capítulo sobre a índole escatológica da Igreja
peregrinante e sua união com a Igreja celeste, vai às fontes da Revelação e
à vida da Igreja expressa pela liturgia.
• O destaque é colocado aobre o aspecto de comunhão e o inicio desta vida
futura já aqui nesta terra, como garantia da participação na comunhão dos
santos, a Igreja celeste.
• O lugar desta participação e comunhão é sempre a liturgia, especialmente
a eucarística.
A reforma litúrgica promovida pelo vaticano
II
• Fruto de uma maturidade e caminho eclesial, cujo porta-voz foi o
Movimento Litúrgico.
• O pontificado de Pio XII (1939 – 1958) foi o início mesmo que de forma
tímida.
• Mas foi a promulgação da Sacrosanctum Concilium que a reforma se
tornou uma realidade na Igreja.
Os critérios da reforma
• Entre os números 21 – 40 a SC enfrenta a problemática da reforma da
liturgia.
• Os critérios se apoiam sobre um dado de ordem teológica e reforçado pelo
estudo da evolução histórica das formas cultuais: “A liturgia consta de
uma parte imutável, porque de instituição divina, e de partes suscetíveis
de mudança...” SC, 21.
• Dito isto, o documento passa a indicar os critérios que devem guiar a
implementação da reforma.
Inteligibilidade dos textos e ritos por parte
dos fieis
• Este principio deve ser conjugado ao dado revelado, ou seja a Palavra de
Deus.
• Na prática: concessão à língua falada, abundancia da Sagrada Escritura,
simplicidade e linearidade da celebração, funcionalidade do ambiente
onde se desenvolve a ação litúrgica e adequada iniciação ao sinal litúrgico.
Correspondência entre tradição e progresso
• Esta requer uma contínua transformação, “que as novas formas tenham
origem de maneira orgânica das já existentes.” SC 23
• A Igreja não inventa novos ritos mas os renova e os busca no sulco da
tradição.

Dimensão eclesial da celebração
• “As ações litúrgicas não são ações privadas, mas celebrações da Igreja, que é
sacramento de unidade, isto é, povo santo reunido e ordenado sob a guia dos
bispos.” SC 26
• Deste caráter comunitário-hierárquico da liturgia, ou mesmo do fato que esta é
sempre celebrada no seio de uma comunidade local concreta, derivam diversos
aspectos para a implementação da reforma:
• Preferencia pela celebração comunitária; exigência de uma participação plena,
ativa e consciente dos fieis; necessária adaptação da liturgia, não só às tradições
dos povos, mas às circunstancias de cada assembleia.
Competência da hierarquia na reforma
• A SC estabelece que ficam demandados vários poderes às conferências
episcopais e aos bispos em particular. SC 22.
• É uma volta ao que se vivia antes de Trento onde os bispos tinham a
responsabilidade pela celebração, desde o seu ordenamento à sua
animação.
A implementação da reforma
• Foi implementada passando por três fases principais:
• A passagem gradual do latim à língua falada (1965-1966), que teve um
espaço maior do que se previa em SC, 36;
• A revisão dos livros litúrgicos e progressiva publicação dos novos e
relativa tradução em 1969;
• Adaptação dos ritos, confiada às conferências episcopais, sob a guia dos
dicastérios da Santa Sé. Essa é a mais complexa e delicada, iniciada e não
terminada até agora.
• A tudo isto se acrescente o empenho e aprofundamento e divulgação por
parte de revistas especializadas, associações que ajudaram a comunidade
eclesial a compreender e favorecer a aplicação da reforma.
A assembleia litúrgica: sujeito da
celebração

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