Você está na página 1de 7

UNIDADE CURRICULAR: Arte e Património religioso

CÓDIGO: 31009

DOCENTE: Pedro Flor

A preencher pelo estudante

NOME: Sónia Maria cachapa Meira Guerreiro

N.º DE ESTUDANTE: 1600254

CURSO: Unidade Curricular Isolada

DATA DE ENTREGA: 20/04/2023

Página 1 de 7
TRABALHO / RESOLUÇÃO: Segundo o pretendido para a resolução deste E-Fólio A
da unidade curricular, Arte e Património Religioso, a presença judaica em Portugal
remonta ao período anterior à formação do Reino. Tal presença em território peninsular
faz- se sentir após a expulsão de Jerusalém (nos primeiros séculos depois de Cristo) e no
exílio que se espalhou pela Europa, Ásia e África conhecido como diáspora. No período
de domínio Islâmico, existia uma coabitação pacífica das comunidades religiosas
muçulmana, cristã e judaica. Após a Reconquista e durante o reinado de D. Henrique e
das cruzadas vindas do norte, foi exercida por parte dos monarcas portugueses uma
política de proteção de minoria.

Na vila de Tomar, segundo Carlos Veloso da associação de amigos da sinagoga de Tomar,


o vestígio mais antigo de presença judaica é datado de 1384 quando D.João I, mestre de
Avis, doa a seu criado, João Rodrigues, os serviços gerais da comunidade judaica aí
residente. A partir de finais do século XIV, um aumento demográfico justificado por
migrações derivadas dos massacres de 1391 em países vizinhos, traz a Portugal judeus
provenientes de Navarra, Aragão e Castela. Alguns tinham descendência asquenaze de
judeus expulsos de Inglaterra, França e Alemanha. Segundo Maria José Ferro Tavares e
a sua obra, Judiaria de Tomar, estimava-se que a população judaica em Tomar rondasse
inicialmente os 150 a 200 indivíduos no inicio do século XV, 250 a 300 no final do século
após o édito de expulsão de 1492 e cerca de 737 após o primeiro numeramento da
população portuguesa em 1527. Ou seja, o seu número abrangia já cerca de 34% a 40 %
da população nabantina. A pequena judiaria existente na vila encontrava-se localizada na
rua direita (atual rua Dr. Joaquim Jacinto), perto da praça de São João (atual praça da
República) e da corredoura, principal centro socioeconómico do concelho. Como
comerciantes e artesãos terão estado ao serviço da ordem dos templários e mais tarde da
ordem de cristo. O importante contributo cientifico judaico à expansão ultramarina,
garantiu à comunidade nabantina a proteção dos vários monarcas envolvidos no projeto
dos descobrimentos. Sendo na sua maioria uma comunidade formada por comerciantes e
artesãos, esta gente da nação dedicava-se ao artesanato e a um pequeno comércio de tenda
aberta aliado à venda ambulante. Estes abrigavam-se sob as arcadas dos edifícios dos
Estaus (também conhecidos como Paços). Eram edifícios localizados na velha rua dos
arcos destinados à aposentadoria de dependentes do infante D. Henrique, de visitantes da
baixa nobreza e judeus que aí comercializavam.

Página 2 de 7
A construção da sinagoga em meados do século XV é feita com o objetivo de ser uma
casa de oração, escola, tribunal e local de câmara de vereação da comuna (Talmude).
Funcionaria apenas 40 ou 50 anos, tendo sido encerrada após o édito manuelino de 5 de
dezembro de 1496. A hipótese de casamento de D. Manuel com a sua prima Isabel de
Aragão e Castela, coloca no horizonte a unificação do reino peninsular sobre a égide
portuguesa. Uma das exigências do contrato seria precisamente a expulsão de todos
aqueles impuros de sangue, algo que o monarca português irá resolver com um certo
cálculolismo político e proclamação do édito de 1496.

A sinagoga de Tomar, tal como referido no enunciado do trabalho em questão, será o


único templo hebraico pertencente ao período da proto Renascença existente em Portugal.
Isto acontece porque apesar da fachada do templo ter uma feição renascentista, a sua
construção é anterior ao século XVI. Este elemento arquitetónico de planta central e
quadrangular, possui uma cobertura abobadada assente em colunas e mísulas (fig. 1) com
influências orientais encrustadas nas paredes. As 12 mísulas existentes no espaço
simbolizam as 12 tribos de Israel e as 4 colunas representam as 4 matriarcas: Sara,
Rebeca, Léa e Raquel. Este edifício religioso terá um importante papel na preservação da
memória da comunidade judaica portuguesa durante a baixa idade média, pois é o
primeiro exemplo conhecido da reintrodução em Portugal de uma ordem clássica de
arquitetura, caída em desuso após a queda do Império Romano. Neste estilo de sinagoga,
a sala de orações é constituída por um espaço centralizado e unificado. O seu estilo
simplificado possui um pé de abóbada estreito mas alteado, sem recorrer a arcos em pedra
e onde o arranque das abóbadas de aresta se faz a partir de capiteis quadrados muito ao
jeito de tas-de-charge. A segmentação do espaço em 9 tramos quadrangulares apenas
existe num nível abstrato da planta, uma vez que as 4 colunas e abóbadas de igual altura
não originam uma divisão significativa do espaço interior. Todos estes elementos servem
para criar uma perceção unificada do espaço, levando o seu utilizador a concentrar-se no
tevak (suporte da Torak), ou na bimak (estrado ou púlpito quadrangular localizado na
zona central do templo) situada entre as 4 colunas onde o oficiante lia a Torak e entoava
cânticos (Fig. 2). A leveza da construção é acentuada pelo recurso ao tijolo como
elemento construtivo, dando a impressão da abóbada estar suspensa sobre 4 finas colunas,
rematadas por capitéis quadrados e achatados. A sua volumetria cúbica é alcançada
através dos seus 9,5 m de comprimento e pelos 8,2 m de largura. Tal configuração não é
percetível pelo exterior, só depois de se entrar no edifício é possível perceber que o

Página 3 de 7
pavimento foi rebaixado em relação à rua. Após o seu encerramento em 1496, o edifício
tornou-se em 1516 cadeia pública. Entre o final do século XVI e início do século seguinte
torna-se local de culto cristão – a ermida de São Bartolomeu. Uma possível profanação
assumida durante o início do século XIX, torna o edifício um palheiro e em 1920 adega
e armazém de mercearia. Em 1921 é classificado como monumento nacional e dois anos
depois é adquirido por Samuel Schwarz, (judeu polaco investigador da Cultura Hebraica)
e doado ao Estado português em 1939, sob condição do espaço ser transformado num
museu Luso-hebraico. Apesar de no século XVIII surgirem as primeiras políticas
articuladas de conservação e restauro patrimoniais em Portugal, este tipo de profanação
monumental poderá ser explicada pelo contexto politico e social da época1.

Em conclusão, apesar de todas as restrições à prática da religião hebraica, penso ser


possível afirmar que o contexto histórico ou cultural de vivência judaica em Tomar, e no
Portugal da baixa idade média, deriva maioritariamente de um problema económico e
cultural. O Infante D. Henrique, enquanto governador da ordem de Cristo no século XV,
terá sido o grande responsável pela fixação da comunidade judaica em Tomar. Embora a
presença hebraica nesta pequena vila esteja documentalmente assinalada desde o início
do século XIV, a sua fixação em Tomar faz com que D. Henrique utilize os
conhecimentos desta pequena comunidade no desenvolvimento da empresa dos
descobrimentos portugueses. A linguagem arquitetónica específica da sua sinagoga terá
resultado da adaptação das sinagogas existentes em Portugal às condições existentes em
cada época e lugar, por meio de desenvolvimento de edifícios mais reclusos, menos
evidentes por questões de segurança e devido ao comportamento não proselitista da
religião judaica. A classificação desta sinagoga como monumento nacional em 29 de
julho de 1921, faz deste edifício um dos poucos exemplos de templos judaicos que
manifesta a presença deste povo em Portugal em épocas anteriores à expulsão de 1496.
Á época, o espaço religioso judaico ficaria ligado a uma construção na vanguarda de
experimentação arquitetónica e de participação ativa na organização dos espaços urbanos
medievais europeus, muito por consequência da influência política e económica da igreja.
Em Tomar a criação do Tribunal do Santo Oficio em 1536 sob a responsabilidade de
D.João III, ficou associada a um período de repressão e ermamento de denuncias contra
os cristãos novos que provocou o despovoamento de vilas inteiras. Entre a junta dos
prelados criada em Maio de 1629, a criação de medidas discriminatórias contra cristãos
novos, o surgimento de textos satíricos que criticavam bispos, prelados da igreja e partilha

Página 4 de 7
de interesses de gentes da nação e gentes de sangue, apenas na segunda metade do século
XVIII se consegue o fim da distinção entre cristãos novos e cristãos velhos com Sebastião
José de Carvalho e Melo. Contudo a perseguição da junta dos prelados far-se-ia ainda
sentir até 1820.

Fig.1 – Mísula Jónica, Sinagoga de Tomar, In: AFONSO; Urbano Luís – As sinagogas portuguesas e o tardo –
gótico despojado – [em linha], documento pdf. Texto de apoio à unidade curricular de Arte e Património
religioso, 2023 UAB, acessivel na plataforma de E-learning da Universidade Aberta, p. 133

Fig. 2 – Sinagoga de Tomar: imagem do tevak (suporte da Torak), ou na bimak (estrado ou púlpito
quadrangular localizado na zona central do templo) situada entre 4 colunas, in: eserafad artículos [em linha],
SINAGOGA DE TOMAR INAUGURA MUSEU E NÚCLEO INTERPRETATIVO - eSefarad, 2023.

Página 5 de 7
1
Segundo Jorge Custódio e o seu artigo , de Alexandre Herculano à Carta de Veneza (1837- 1964),a sociedade
portuguesa do pós liberalismo, resultante da rutura de instituições pré-estabelecidas até ao início da primeira
metade do século XIX (instituições eclesiásticas e monárquicas), procura estabelecer novas estruturas culturais
que iriam ao encontro de novos interesses e anseios de coletividade. A liquidação dos bens das ordens religiosas,
expropriação dos tesouros de culto, bibliotecas e objetos de arte, pintura e escultura aconteceu em grande escala.
É possível afirmar que a consciência da presença de um património cultural e a necessidade da sua salvaguarda
surge em Portugal durante o século XIX. A aquisição deste tipo de consciência traduz-se num movimento de
afirmação da sociedade liberal e romântica gerado em ambiente de intervenção pública e de intelectualidade
próprio da época. Tal estruturação necessita do reconhecimento de um conjunto de valores patrimoniais
(monumentais, históricos e nacionais) que importa transmitir às gerações futuras como testemunho da herança
do passado. Neste movimento teve papel pioneiro Alexandre Herculano devido à sua intervenção pública na
valorização do património cultural português. In: CUSTÓDIO, Jorge – De Alexandre Herculano à Carta de
Veneza (1837 – 1964) – [em linha] documento pdf. Texto de apoio à unidade Curricular de Salvaguarda do
Património construído em portugal. 2022 UAB, 1º ciclo de História, acessivel na plataforma de E-Learning da
Universidade aberta, 00.014 - SPCP - Biblioteca - Texto D.pdf

Webgrafia:
AFONSO, Luís Urbano– As sinagogas portuguesas e o tardo – gótico despojado
– [em linha], documento pdf. Texto de apoio à unidade curricular de Arte e
Património religioso, 2023 UAB, acessivel na plataforma de E-learning da
Universidade Aberta, In: HJCVS_Parte II.pdf (uab.pt), consultado de
[07/04/2023 a 20/04/2023]

CUSTÓDIO, Jorge – De Alexandre Herculano à Carta de Veneza (1837 – 1964)


– [em linha] documento pdf. Texto de apoio à unidade Curricular de Salvaguarda
do Património construído em portugal, 2022, UAB, 1º ciclo de História, acessivel
na plataforma de E-Learning da Universidade Aberta, , In: 00.014 - SPCP -
Biblioteca - Texto D.pdf, consultado de [07/04/2023 a 20/04/2023]

EKERMAN, Sergio Kopinski - Sinagogas e o processo de renovação da


arquitetura ligada ao judaísmo – [em linha], texto de apoio à unidade curricular
de Arte e Património Religioso, revista Arquitextos, nº 085.01 – ano 8, 2007,
acessível na plataforma de E-Learning da Universidade Aberta, In: 31009_22_01:
Texto - Sinagogas e o processo de renovação (Sérgio Ekerman) (uab.pt),
consultado de [07/04/2023 a 20/04/2023]

Página 6 de 7
Câmara Municipal de Tomar - Sinagoga e Judiaria – [em linha], 2022, Sinagoga
e núcleo interpretativo da Sinagoga de Tomar, Tomar, acessível na plataforma de
E-learning – E.Folio A, In: CM Tomar - Sinagoga (cm-tomar.pt), consultado de
[07/04/2023 a 20/04/2023]

Sinagoga de Tomar inaugura museu e núcleo interpretativo – [em linha], Esefarad


Noticias del mundo sefaradí, 2020, In: SINAGOGA DE TOMAR INAUGURA
MUSEU E NÚCLEO INTERPRETATIVO - eSefarad, consultado de
[18/04/2023 a 20/04/2023]

VELOSO, Carlos – Os Judeus em Tomar – [em linha], 2004, AAST – Associação


dos Amigos da Sinagoga de Tomar, Tomar, In: Os Judeus em Tomar - AAST
(ipt.pt), consultado de [07/04/2023 a 20/04/2023]

Página 7 de 7

Você também pode gostar