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Agrupamento de Escolas da Moita

171311
Sede – Escola Secundária da Moita

E S C O L A S E C U N D Á R I A D A M O I TA
Ficha de Leitura e Gramática

Leia o texto seguinte. Em caso de necessidade, consulte as notas apresentadas.

DISCURSO I — EM SESSÃO DE 9 DE OUTUBRO DE 1837

Três são as diversas posições em que pode colocar-se o homem público1, o homem chamado a pro-
nunciar sobre questões de gravidade e importância da que hoje aqui tratamos.
A primeira e a mais fácil é seguramente a daquele que nem por si a toma; que levado da torrente das
opiniões, e cuidando dirigir as turbas, quando não é senão empurrado por elas, imaginando-se forte só
5 porque se pôs do lado da força, vai com o Poder que reina, está pela potência que impera. Esta posição é,
como disse, a mais fácil, e para certos olhos (ainda bem que não para os meus!) a mais brilhante: os aplausos
estão em roda dela, as recompensas lhe chovem em cima; e coroado há de ser decerto quem a ocupa […].
Quase tão fácil é a segunda posição (fácil de tomar, entendo), aparentemente mais nobre, nem sempre
mais desinteressada; mas sem dúvida mais lisonjeira para o amor-próprio de quem a escolheu por sua; é a
10 daqueles que, aparentando (Deus sabe às vezes com que ânimo) integridades de Catão2, parecem pleitear3
justiça com os Céus, praz-lhes4 a causa vencida, só porque o é, defendem quanto está debaixo, só
porque o está; e justa ou injusta, é sua sempre a parte dos que se dizem oprimidos […]. Nela se formam
muitas vezes reputações que aliás fora impossível adquirir: também lhe sobejam aplausos; e lá está, mais
longe, sim, mas não mais incerta, a perspetiva da recompensa, a querida esperança do galardão!
15 A história de todas as revoluções nos apresenta, sempre e pelo mesmo modo, forte e numerosamente
ocupadas estas duas posições. Ambas são as da ambição; para elas vai, para elas forçosamente há de ir,
a máxima parte dos homens.
Terceira posição há — difícil, desgraçada e árdua, de poucos seguida, de poucos entendida, caluniada
dos muitos; pode-se quase dizer que desprezada de todos. Raros a ocupam, raros deixaram ainda de morrer
20 nela, sós como entraram, abandonados e malquistos5. Na peleja nem um voto os anima: os aplausos da
vitória não os têm, que não há vitória para eles; na desgraça nem simpatias, porque não dão esperanças;
na boa fortuna….Onde há boa fortuna para os justos e inteiros?
[…] Esta sim, esta última de que falo é a posição do homem inteiro, e independente deveras […].
E sólida, com efeito, e duramente arraigada em suas convicções é mister que esteja a alma do homem que
25 tal posição escolheu, onde nada o conforta e tudo o desampara. Detestado de inimigos, aos seus próprios
mal aceito, não lhe resta senão o testemunho de sua consciência — que muito é todavia, que é tudo para
almas assim temperadas! […]
Por esta posição optei, conhecendo-lhe bem os desaires. E os cárceres, os exílios, os degredos, as
vexações de toda a espécie, as calúnias de toda a parte, que há dezassete anos me tem custado, não pude-
30 ram ainda senão rebitar6 os pregos da cruz com que me abracei voluntário, e em que antes desejo morrer
escarnecido e vituperado7 do que merecer triunfos, do que ver decretada minha apoteose por quaisquer
dominadores da Terra.
Colocado nesta posição, não hei de nunca ser o homem de ninguém (bem sei), mas hei de sê-lo de
mim mesmo e da minha consciência.

JOÃO BAPTISTA DA SILVA LEITÃO DE ALMEIDA GARRETT, Discursos Parlamentares,


Lisboa, Publicações Europa-América, 1954, pp. 37-39 (com adaptações).

(1) homem público: pessoa que cumpre funções políticas.


(2) Catão: Catão, o Velho (234-149 a. C.), político romano conhecido pelo seu conservadorismo e gosto pela tradição. Antepassado de Catão, o
Jovem (95-46 a. C.), político romano seguidor do Estoicismo, conhecido pela sua integridade moral e pela crítica à corrupção.
(3) pleitear: discutir; contestar.
(4) praz-lhes: agrada-lhes.
(5) malquistos: malvistos; antipáticos.
(6) rebitar: virar a extremidade para cima.
(7) vituperado: insultado; difamado.
1. Para responder a cada um dos itens, de 1.1 a 1.7, selecione a opção correta. Escreva, na folha de respostas, o
número de cada item e a letra que identifica a opção escolhida.

1.1. Este texto pertence ao género textual


(A) artigo de divulgação científica.
(B) exposição sobre um tema.
(C) discurso político.
(D) apreciação crítica.

1.2. O título indica-nos


(A) o edifício em que o texto foi proferido.
(B) o contexto temporal e espacial em que o texto foi proferido.
(C) o público-alvo do texto.
(D) o movimento político a que o seu autor pertence.
1.3. A primeira posição em que o homem público se pode colocar caracteriza-se pela
(A) capacidade de enfrentar a opinião da multidão.
(B) capacidade de conduzir as multidões, utilizando argumentos racionais.
(C) defesa daquilo que multidões desejam.
(D) defesa da justiça e da verdade, mesmo que isso signifique receber críticas.
1.4. A primeira posição em que o homem público se pode colocar e a segunda têm em comum
(A) a defesa intransigente dos oprimidos e injustiçados.
(B) a defesa desinteressada dos princípios da verdade e da justiça.
(C) a adoção de um comportamento nobre e virtuoso.
(D) o desejo de receber elogios.
1.5. A maioria dos homens públicos
(A) é incapaz de seguir apenas a sua consciência.
(B) rejeita a recompensa, guiando-se unicamente pelo princípio da consciência.
(C) tem de enfrentar corajosamente a fúria da turba.
(D) adota comportamentos verdadeiramente nobres.
1.6. Com a expressão «não hei de nunca ser o homem de ninguém» (linha 33), o orador reitera que
(A) o bem público não constitui um tema que o preocupe verdadeiramente.
(B) o homem público deve respeitar a opinião da turba.
(C) segue um caminho original, com o fito nas recompensas e nos louros sociais.
(D) segue apenas as orientações da sua consciência, mesmo que isso tenha um preço elevado.
1.7. O texto apresentado pode enquadrar-se no género
(A) narrativo.
(B) descritivo.
(C) argumentativo.
(D) expositivo.

2. Responda aos itens apresentados.

2.1. Identifique a função sintática desempenhada pelos constituintes que se seguem.


a) «a mais fácil» (linha 6)
b) «do galardão» (linha 14)
2.2. Classifique as orações subordinadas que se apresentam.
a) «que aliás fora impossível adquirir» (linha 13)
b) «mas hei de sê-lo de mim mesmo e da minha consciência.» (linhas 33 e 34)
2.3. Classifique gramaticalmente a penúltima palavra do texto.

Cotações: 10 x 10 = 100 (x 2 = 200 pontos)

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