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PROCESSO Nº : 12.

176-2/2011
INTERESSADO : PREFEITURA MUNICIPAL DE SINOP
ASSUNTO : CONSULTA
RELATOR : CONSELHEIRO WALDIR JULIO TEIS
PARECER Nº : 64/2011

Excelentíssimo Senhor Conselheiro,

Trata-se de consulta formulada pelo Senhor Juarez Costa, Prefeito Municipal de


Sinop, fls. 02-03 TCE, que requer esclarecimentos referentes ao nepotismo, nos
seguintes termos:

a) Havendo servidora nomeada para cargo comissionado (servidora


exclusivamente comissionada, ou seja, não efetiva), é possível nomear
seu cunhado, sendo este servidor efetivo, para cargo comissionado ou
função gratificada, considerando que não há relação de subordinação
hierárquica entre esses servidores (atuando em secretarias diferentes)?
b) Há nepotismo quando o início da união estável ou o casamento for
posterior ao tempo em que ambos os cônjuges ou companheiros já
estavam no exercício dos cargos exclusivamente comissionados? E se
houver relação de subordinação hierárquica entre esses servidores:
ambos na mesma secretaria, sendo um subordinado hierárquico do outro?
c) Há nepotismo quando dois servidores concursados, casados, passam a
assumir cargos em comissão mesmo não havendo relação de
subordinação hierárquica entre os mesmos, haja visto que estão lotados
em secretarias distintas?

O consulente não juntou aos autos outros documentos.


É o breve relatório.

1. DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE

Os pressupostos de admissibilidade da presente consulta, exigidos pelo art. 232


da Resolução 14/2007 (Regimento Interno do TCE/MT), foram preenchidos, pois a
consulta foi formulada em tese, por autoridade legítima, versa sobre matéria de
competência deste Tribunal e os quesitos foram formulados de forma precisa e objetiva.

Passa-se à análise, em tese, da consulta formulada.

2. DO MÉRITO

A presente consulta versa, em suma, acerca da proibição de nomeação de


parentes na Administração Pública inserta na Súmula Vinculante nº 13 do Supremo
Tribunal Federal, nos seguintes termos:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral


ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, de autoridade nomeante ou
de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção,
chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de
confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta
e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações
recíprocas, viola a Constituição Federal.

Sobre o assunto, este Tribunal de Contas já teve oportunidade de se manifestar,


respondendo a dois dos três questionamentos formulados pelo consulente, conforme será
exposto ao longo deste parecer e distribuídos em tópicos, de forma sequencial conforme
as dúvidas apresentadas.

2.1 Nomeação de cunhado quando não há relação de subordinação


hierárquica entre os servidores

Dúvida apresentada: a) Havendo servidora nomeada para cargo comissionado


(servidora exclusivamente comissionada, ou seja, não efetiva), é possível nomear seu
cunhado, sendo este servidor efetivo, para cargo comissionado ou função gratificada,
considerando que não há relação de subordinação hierárquica entre esses servidores
(atuando em secretarias diferentes)?

Este Tribunal de Contas possui prejulgado de que se enquadra na vedação


inserta na Súmula Vinculante nº 13 do STF a existência de servidores, na mesma pessoa
jurídica, com vínculo de parentesco exercendo função de direção, chefia ou
assessoramento. Vejamos a redação do prejulgado em comento:

Resolução de Consulta nº 23/2009 (DOE, 10/06/2009). Pessoal.


Nomeação de parente para cargos em comissão ou função
gratificada. Vedação.
A nomeação de cunhada é vedada nos casos em que a autoridade
nomeante, que tenha poder de designar sua nomeação, for seu parente,
ou ainda quando, na mesma pessoa jurídica, houver servidor com
vínculo de parentesco exercendo função de direção, chefia ou
assessoramento, na forma da Súmula Vinculante nº 13, do STF.
(grifos ausentes no original)

Em outra oportunidade decidiu o TCE que seria possível a nomeação de


servidores efetivos admitidos mediante concurso público, com vínculo de parentesco para
cargos de confiança ou função gratificada, desde que sejam observados os seguintes
requisitos:

Resolução de Consulta nº 34/2010 (DOE, 13/05/2010). Pessoal.


Nepotismo. Contratação temporária e servidores efetivos. Súmula
Vinculante nº 13, do STF. Aplicabilidade e extensão.
1. Uma lei local estabelecerá os casos de contratação por tempo
determinado para atender à necessidade temporária de excepcional
interesse público, sendo obrigatória a previsão legal para a realização de
processo seletivo simplificado para contratação, com vistas a afastar a
possibilidade de escolha tendenciosa e, com isso, inibir a tipificação de
prática de nepotismo na administração pública, uma vez aprovados, nesse
certame, servidores com vínculo de parentesco.
2. A nomeação para cargo em comissão de servidores efetivos
admitidos mediante concurso público, com vínculo de parentesco, é
possível, observados os requisitos de escolaridade do cargo de
origem e a complexidade inerente ao cargo em comissão, além da
qualificação profissional do servidor, sendo vedada, neste caso, a
subordinação hierárquica. (grifos ausentes no original)
Infere-se que a Resolução de Consulta nº 23/2009 trata das situações em que um
dos servidores, ou ambos, não são efetivos, enquanto que a Resolução nº 34/2010 versa
sobre a nomeação para cargos em comissão quando ambos servidores forem efetivos,
não existindo conflitos entre os prejulgados.

Desta forma, entende-se que a Resolução de Consulta nº 23/2009 responde à


dúvida proposta, no sentido de que é vedada a nomeação de cônjuge, companheiro ou
parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, de
autoridade nomeante ou de servidor, efetivo ou não, da mesma pessoa jurídica investido
em cargo de direção, chefia ou assessoramento, na forma da Súmula Vinculante nº 13,
do STF.

2.2 Relação de parentesco posterior à nomeação de servidor ou nepotismo


superveniente

A dúvida foi elaborada nos seguintes termos:

b) Há nepotismo quando o início da união estável ou o casamento for


posterior ao tempo em que ambos os cônjuges ou companheiros já
estavam no exercício dos cargos exclusivamente comissionados? E se
houver relação de subordinação hierárquica entre esses servidores:
ambos na mesma secretaria, sendo um subordinado hierárquico do outro?

É salutar relembrar que a vedação à prática do nepotismo, estabelecida na


Súmula Vinculante nº 13, tem por objetivo prestigiar o princípio da eficiência, moralidade,
impessoalidade e igualdade, evitando que servidores sejam admitidos no serviço
simplesmente pela existência de vínculo de parentesco, sem a devida qualificação ou
sem o necessário comprometimento com a atividade pública.

Em relação ao princípio da eficiência, importante colacionar trecho do voto do


Ministro Carlos Britto ao conceder a liminar proferida no julgamento da Ação Declaratória
de Constitucionalidade nº 12 - STF, Acórdão, DJ 01.09.2006:
“O princípio da eficiência, a postular o recrutamento de mão-de-obra
qualificada para as atividades públicas, sobretudo em termos de
capacitação técnica, vocação para as atividades estatais, disposição para
fazer do trabalho um fiel compromisso com a assiduidade e uma
constante oportunidade de manifestação de espírito gregário, real
compreensão de que o servidor público é, em verdade, servidor público.
Também estes conceitos passam a experimentar bem mais difícil
possibilidade de transporte para o mundo das realidades empíricas, se
praticadas num ambiente de projeção do doméstico na intimidade das
repartições estatais, a começar pela óbvia razão de que já não se tem a
necessária isenção, em regra, quando se vai avaliar a capacitação
profissional de um parente ou familiar. Quando se vai cobrar assiduidade
e pontualidade no comparecimento do trabalho. Mais, ainda, quando se é
preciso punir exemplarmente o servidor faltoso (como castigar na devida
medida um pai, a própria mãe, um filho, um (a) esposo (a), um (a)
sobrinho, enfim, com quem eventualmente se trabalhe na posição
hierárquica superior? E como impedir que os colegas não-parentes ou
não-familiares se sintam em posição de menos obsequioso tratamento
funcional? Em suma, como desconhecer que a sobrevinda de uma
enfermidade mais séria, um trauma psico-físico ou um transe existencial
de membros de uma mesma família tenda a repercutir negativamente na
rotina de um trabalho que é comum a todos? O que já significa a
paroquial fusão do ambiente caseiro com o especo público. Pra não dizer
a confusão mesma entre tomar posse nos cargos e tomar posse dos
cargos, na contra-mão do insuperável conceito de que “administrar não é
atividade de quem é senhor de coisa própria, mas gestor de coisa
alheia”(Rui Cirne Lima).”

Vale lembrar que a existência de normas disciplinando quais situações se


enquadram ou não na prática do nepotismo esbarra nas dificuldades fáticas de se prever
todas as hipóteses de favorecimento ilícito à nomeação no serviço público, bem como na
dificuldade maior de se comprovar ou descaracterizar tal prática.
Nessa esteira, tem-se disciplinado com cautela a descaracterização do
nepotismo quando a relação de parentesco for posterior à nomeação de ambos os
cônjuges, tendo em vista a possibilidade sempre existente de burla à vedação inserta na
Súmula Vinculante nº 13 do STF.

Desta forma, o Conselho Nacional de Justiça, por meio do Enunciado


Administrativo nº 1, assim disciplinou para o âmbito do Poder Judiciário:

Enunciado Administrativo nº 1 - Nepotismo


c) As vedações previstas no art. 2º da Resolução nº 07, de 18 de outubro
de 2005, não se aplicam quando a designação ou a nomeação do servidor
tido como parente para a ocupação de cargo comissionado ou de função
gratificada foram anteriores ao ingresso do magistrado ou do servidor
gerador da incompatibilidade, bem como quando o início da união estável
ou o casamento forem posteriores ao tempo em que ambos os cônjuges
ou companheiros já estavam no exercício das funções/cargos, em situação
que não caracterize ajuste prévio para burlar a proibição geral de prática
de nepotismo, ressalvada a vedação prevista no § 1º, in fine, do art. 2º da
referida Resolução. (Nova redação da Alínea C aprovada na 17ª Sessão
Ordinária realizada em 25 de abril de 2006).

Por sua vez, consta do art. 2º da Resolução nº 07/2005 do Conselho Nacional


de Justiça, a seguinte redação:

Art. 2° Constituem práticas de nepotismo, dentre outras:


1 - o exercício de cargo de provimento em comissão ou de função
gratificada, no âmbito da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo, por cônjuge,
companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o
terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juízes vinculados; II -
o exercício, em Tribunais ou Juízos diversos, de cargos de provimento em
comissão, ou de funções gratificadas, por cônjuges, companheiros ou
parentes em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau,
inclusive, de dois ou mais magistrados, ou de servidores investidos em
cargos de direção ou de assessoramento, em circunstâncias que
caracterizem ajuste para burlar a regra do inciso anterior mediante
reciprocidade nas nomeações ou designações;
III - o exercício de cargo de provimento em comissão ou de função
gratificada, no âmbito da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo, por cônjuge,
companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o
terceiro grau, inclusive, de qualquer servidor investido em cargo de direção
ou de assessoramento;
...
§ 1° Ficam excepcionadas, nas hipóteses dos incisos I, II e III deste artigo,
as nomeações ou designações de servidores ocupantes de cargo de
provimento efetivo das carreiras judiciárias, admitidos por concurso
público, observada a compatibilidade do grau de escolaridade do cargo de
origem, ou a compatibilidade da atividade que lhe seja afeta e a
complexidade inerente ao cargo em comissão a ser exercido, além da
qualificação profissional do servidor, vedada, em qualquer caso, a
nomeação ou designação para servir subordinado ao magistrado ou
servidor determinante da incompatibilidade. (Redação dada pela
Resolução nº 21/2006).

No mesmo sentido, o Decreto nº 7.203/2010 regulamentou no âmbito do Poder


Executivo Federal que as nomeações realizadas anteriormente ao vínculo familiar não se
incluem na prática do nepotismo. Vejamos o dispositivo em comento:

Art. 4º Não se incluem nas vedações deste Decreto as nomeações,


designações ou contratações:
...
III - realizadas anteriormente ao início do vínculo familiar entre o agente
público e o nomeado, designado ou contratado, desde que não se
caracterize ajuste prévio para burlar a vedação do nepotismo;

Parágrafo único. Em qualquer caso, é vedada a manutenção de familiar
ocupante de cargo em comissão ou função de confiança sob subordinação
direta do agente público.
Ainda que tais normas não se apliquem às demais esferas da Federação ou a
outros Poderes, podem ser utilizadas como parâmetro para regulamentação por estes
entes e para orientação, por este Tribunal de Contas, aos jurisdicionados submetidos a
este órgão de controle externo.

Desta forma, considera-se que, salvo ajuste prévio para burlar a proibição
geral da prática do nepotismo, as nomeações realizadas anteriormente ao início do
vínculo de parentesco entre os servidores não se incluem na prática do nepotismo.

Situação diversa ocorre quando há subordinação hierárquica entre os


servidores, tendo em vista que já não se terá a necessária isenção para avaliar o
desempenho de um profissional parente ou familiar, conforme bem apontou o Ministro
Carlos Britto no voto citado anteriormente e conforme a regulamentação proposta pelo
CNJ, por meio da Resolução nº 07/2005.

Assim, considera-se vedada a permanência de profissional parente ou familiar


quando houver subordinação hierárquica, ainda que a nomeação tenha ocorrido antes do
início do vínculo familiar.

2.3 Nomeação para o cargo em comissão de servidores efetivos com


vínculos de parentesco. Inexistência de subordinação hierárquica

Tal tópico refere-se à seguinte dúvida:

c) Há nepotismo quando dois servidores concursados, casados, passam a


assumir cargos em comissão mesmo não havendo relação de
subordinação hierárquica entre os mesmos, haja visto que estão lotados
em secretarias distintas?

Tal indagação também já foi enfrentada por este Tribunal de Contas, que publicou
o seguinte prejulgado:
Resolução de Consulta nº 34/2010 (DOE, 13/05/2010). Pessoal.
Nepotismo. Contratação temporária e servidores efetivos. Súmula
Vinculante nº 13, do STF. Aplicabilidade e extensão.
1. Uma lei local estabelecerá os casos de contratação por tempo
determinado para atender à necessidade temporária de excepcional
interesse público, sendo obrigatória a previsão legal para a realização de
processo seletivo simplificado para contratação, com vistas a afastar a
possibilidade de escolha tendenciosa e, com isso, inibir a tipificação de
prática de nepotismo na administração pública, uma vez aprovados, nesse
certame, servidores com vínculo de parentesco.
2. A nomeação para cargo em comissão de servidores efetivos
admitidos mediante concurso público, com vínculo de parentesco, é
possível, observados os requisitos de escolaridade do cargo de
origem e a complexidade inerente ao cargo em comissão, além da
qualificação profissional do servidor, sendo vedada, neste caso, a
subordinação hierárquica. (grifos ausentes no original)

Desta forma, é possível a nomeação de servidores efetivos, com vínculo de


parentesco, em cargos comissionados, desde que sejam observados os requisitos de
escolaridade do cargo de origem e a complexidade inerente ao cargo em comissão, além
da qualificação profissional do servidor, sendo vedada, neste caso, a subordinação
hierárquica.

3. CONCLUSÃO

Considera-se que este Tribunal já possui prejulgados que respondem


integralmente as dúvidas constantes da letra a e c que correspondem, respectivamente,
às Resoluções de Consulta nºs 23/2009 e 34/2010.

Quanto à indagação constante da letra b, considerando que não existe prejulgado


neste Tribunal sobre o assunto em tela, ao julgar o presente processo e concordando este
Egrégio Tribunal Pleno com o entendimento delineado no presente parecer, sugere-se a
seguinte ementa (art. 234, § 1º, da Resolução n° 14/2007):

Resolução de Consulta nº ___/2011. Pessoal. Nepotismo.


Relação de parentesco posterior à nomeação de servidor.
Possibilidade, salvo se houver subordinação hierárquica ou
quando caracterizar ajuste prévio para burlar a proibição geral
da prática de nepotismo.
As nomeações de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta,
colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, de autoridade
nomeante ou de servidor investido em cargo de direção, chefia ou
assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de
confiança ou, ainda, de função gratificada realizadas antes do
início do vínculo de parentesco entre os servidores não se
incluem na prática do nepotismo prevista pela Súmula Vinculante nº
13 do STF, salvo se houver subordinação hierárquica ou quando
caracterizar ajuste prévio para burlar a proibição geral da prática de
nepotismo.

Cuiabá, 27 de julho de 2011.

Bruna Zimmer Edicarlos Lima Silva Ronaldo Ribeiro de Oliveira


Técnica de Controle Público Externo Consultor de Estudos e Normas Secretário-Chefe da Consultoria Técnica

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