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RESUMO
PALAVRAS-CHAVE
ABSTRACT
KEYWORDS
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uma análise através dessas temáticas abordadas nas músicas da cantora e compositora
Marília Mendonça. Como objetivo geral, buscamos analisar os imaginários sócio-
discursivos femininos em oito músicas selecionadas entre os anos de 2016 e 2021 de
Marília Mendonça. Especificamente, pretendemos verificar, nas referidas canções, os
imaginários sócio-discursivos relacionados ao empoderamento feminino por meio das
ideias de liberdade emocional e sexual e, ao mesmo tempo, pretendemos, também,
verificar os imaginários sócio-discursivos relacionados ao machismo por meio das ideias
relacionadas ao casamento, aos relacionamentos afetivos abusivos e à dependência
emocional das mulheres.
Pelo fato do sertanejo universitário ser, na atualidade, um gênero musical muito
difundido no país, destacamos que a música é entendida, por nós, como um importante
instrumento de significação, visto que, geralmente, ela proporciona aos indivíduos
reflexões sobre as múltiplas práticas sociais. No que tange as temáticas presentes nas
canções de Marília Mendonça, acreditamos que as mesmas proporcionam tanto a ruptura
quanto o reforço dos discursos machistas estruturais presentes na sociedade.
2. PERCURSOS TEÓRICOS
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instância da recepção) funcionam, adequadamente, para as situações de comunicação
factuais. Porém, no caso do nosso corpus em questão, ao abordarmos o gênero discursivo
música, a ficcionalidade se faz presente. Sendo assim, as autoras Machado e Mendes
(2013) propõem a adaptação dos sujeitos da linguagem de Charaudeau ([1983]2009) ao
acrescentarem dois sujeitos na referida teoria (um sujeito para a instância de produção –
Scriptor – e outro sujeito para a instância de recepção – Lector). A seguir, encontramos o
quadro dos sujeitos da linguagem proposto pelas autoras:
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2.2. A ficcionalidade e os sujeitos da linguagem na TS
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seja, o sujeito interpretante ouve as músicas da cantora acionando a tarefa de que tais
músicas tratam de uma simulação de um mundo possível e não de uma realidade factual.
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Mendonça, não estando em posição de autoridade, tem como propósito incitar o sujeito a
ouvir as suas músicas e a refletir sobre os discursos nelas contidos. Por isso, a artista usa
de estratégias relacionadas à persuasão ou a sedução, fazendo o ouvinte acreditar no que
o seu sujeito enunciador diz nas canções e, consequentemente, se identifique com o que
está sendo enunciado. Assim, tal gênero discursivo utiliza de contratos discursivos, ou
seja, regras para que a comunicação possa acontecer e de restrições discursivas e formais
para estruturação das músicas do gênero sertanejo universitário. Além disso, a estrutura
das canções desse gênero musical é composta por: introdução, versos com rimas, refrãos
e melodias. Geralmente, as músicas do gênero sertanejo universitário seguem o mesmo
padrão em relação à estrutura, o que podemos considerar como um contrato discursivo.
As restrições discursivas estão relacionadas ao modo como o sujeito enunciador da artista
irá usar suas estratégias para convencer o sujeito interpretante a ouvir as canções, de
acordo com os temas discursivos que se esperam de tal gênero musical tendo em vista
que se trata de um sujeito enunciador feminino.
Marília Mendonça, ao inaugurar com o movimento Feminejo (vozes femininas
para um gênero musical que é predominantemente masculino), busca, através de suas
composições e músicas, abordar temáticas que visem conquistar um público feminino
específico (geralmente, mulheres brancas, jovens e de classe média). Podemos observar,
assim, que, em seus discursos musicais, Marília Mendonça, como Eu enunciador (EUe),
ao relatar histórias ou situações que muitas mulheres vivenciam ou vivenciaram nos seus
relacionamentos amorosos, utiliza de recursos a partir dos modos textuais que os gêneros
discursivos estão relacionados, como os modos narrativo, descritivo e argumentativo.
Com isso, a cantora, como Eu enunciador (EUe), utiliza, em suas canções e composições,
palavras e expressões que visam a aproximação entre o TUd e o TUi, cabendo a esse
último escutar as músicas da referida cantora e se identificar com discursos apresentados,
conforme veremos nas análises das oito músicas selecionadas para o nosso estudo.
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simplificadora e generalizadora. Eles podem circular nos grupos sociais, ou seja, são
compartilhados por seus membros a partir de traços que possuem uma “suspeita” quanto
à verdade do que é dito pelos sujeitos. Desse modo, os estereótipos possuem, geralmente,
um caráter de fixação de uma verdade que não pode ser provada ou que pode ser falsa,
visto que ela depende do julgamento do sujeito, que, na maioria das vezes, sendo
negativo, não possibilita que possamos identificar se o que é dito tenha uma parte de
verdade e, que consequentemente, ocorre o apagamento da caracterização relacionada aos
sujeitos ou aos grupos sociais em questão.
Segundo Charaudeau (2017), os imaginários sócio-discursivos, diferentemente
dos estereótipos, se assenta sobre o sintoma da fala, ou seja, quando um sujeito enuncia
na sociedade um discurso que já se encontra construído socialmente. Com isso, podemos
dizer que os imaginários sócio-discursivos são uma fragmentação de discursos narrativos
e argumentativos, uma vez que tal noção propõe uma descrição e uma explicação dos
fenômenos e dos comportamentos dos sujeitos na sociedade. De acordo com Charaudeau
(p. 579, 2017):
(...) que são percebidos através de diversos imaginários, cujos sintomas são os
discursos produzidos a seu respeito, seja para descrevê-los, seja para qualificá-
los, seja imaginando suas intenções: imaginário de “morte ou de ameaça”,
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quando são negros (corvos) ou quando se precipitam sobre a carne fresca
(urubus); imaginário de “amor” (codornas) ou de “fidelidade” (pombos), mas
também de “luxúria” ou de “perversidade” (perdizes), quando não se deixam
ser pegos e enganam aqueles que tentam agarrá-los (...) (CHARAUDEAU, p.
580, 2017).
Ao analisar esse exemplo apresentado por Charaudeau (2017), podemos entender que,
geralmente, o discurso é manifestado através dos imaginários sócio-discursivos, que, por
sua vez, podem ter um valor tanto positivo quanto negativo dependendo do domínio de
prática discursiva do sujeito na sociedade. Além disso, segundo Charaudeau (2017), os
imaginários sócio-discursivos são estruturados através dos tipos de saberes. Podemos
entender por saberes, a organização dos pensamentos dos sujeitos, que, por sua vez, se
manifestam por meio dos discursos.
Os saberes se realizam na produção dos discursos e podem ser classificados como
saberes de conhecimento e saberes de crença. Segundo Charaudeau (2017), os saberes de
conhecimento são aqueles que estabelecem uma verdade sobre os fenômenos do mundo.
Nessa perspectiva, o sujeito da enunciação (EUe) precisa mostrar uma imagem de
neutralidade, ou seja, em seu discurso, não podem ocorrer julgamentos, por isso, é
necessário que seja desprovido de subjetividade. Os saberes de conhecimento podem ser
subdividos em saber científico e saber de experiência.
Já os saberes de crença, possuem critérios que estão associados às avaliações,
apreciações e julgamentos que os sujeitos realizam a respeito dos fenômenos que estão
relacionados às práticas discursivas, sendo que tais saberes podem ser subdividos em
saber de revelação (podem ser relacionados as doutrinas e as ideologias) e saber de
opinião.
Relacionando o conceito de imaginários sócio-discursivos com o imaginário
sócio-discursivo feminino nas oito músicas de Marília Mendonça (1995-2021), podemos
constatar que as canções dessa cantora brasileira estão relacionadas com os saberes de
crença, mais especificamente, com os saberes de opinião. De acordo com Charaudeau
(2017), os saberes de opinião são classificados como um processo de avaliação. O sujeito
se posiciona através de sua opinião e se engaja em um julgamento que pode estar
relacionado com os fatos do mundo. Ainda em Charaudeau (2017), a opinião que sujeito
enuncia para sustentar seu julgamento é o resultado de um movimento de apropriação.
Assim, parte da opinião do sujeito é de um saber que está inserido entre os saberes que
circulam nos grupos sociais. No saber de opinião, o sujeito enunciador (EUe) é uma voz
que se encontra entre os outros sujeitos que se posicionam, quase sempre, no mesmo
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grupo social. Esse sujeito enunciador (EUe) representa uma voz coletiva que está
relacionada com seu posicionamento.
Podemos observar que Marília Mendonça, ao enunciar suas músicas enquanto
sujeito enunciador, geralmente, representa opiniões que estão relacionadas com
determinado grupo social. Sendo assim, a artista, ao reproduzir esses discursos em uma
forma materializada (letra das músicas), faz com que, muitas vezes, seu ouvinte acredite
e reproduza essas opiniões já que pertencem ao mesmo grupo social. Podemos observar
que, nas músicas selecionadas para compor a nossa pesquisa, existem imaginários sócio-
discursivos representados pela figura feminina através de discursos que estão estruturados
a partir do grupo social do qual a cantora pertence, ou seja, mulher branca que defende a
sua liberdade sexual e afetiva através do empoderamento feminino, no entanto, podemos
observar que tais imaginários sócio-discursivos vem acompanhados, ao mesmo tempo,
de outros imaginários sócio-discursivos discordantes, como o machismo, por exemplo.
Podemos, assim, observar que, nas músicas de Marília Mendonça, são
representados os imaginários sócio-discursivos relacionados com o empoderamento
feminino caracterizado pelo coletivo de mulheres brancas e de classe média. Com isso,
Marília Mendonça, em algumas músicas selecionadas para a pesquisa, representa a figura
feminina através da presença das ideias de liberdade sexual e emocional nos
relacionamentos afetivos. Além disso, podemos observar, que geralmente, em tais
canções, a cantora como sujeito enunciador (EUe), se apresenta aconselhando as
mulheres diante as decepções amorosas que elas vivenciam nos relacionamentos afetivos.
Sobre a temática do machismo, discurso cristalizado na sociedade (podendo ser
caracterizado como um discurso estrutural) é possível perceber, nos discursos da cantora,
a representação da mulher como dependente emocional dos relacionamentos afetivos
demonstrando certa fragilidade diante das relações amorosas. Outro aspecto que reforça
tal hipótese levantada por nós, seria que Marília Mendonça, como sujeito enunciador
(EUe), na maioria das músicas selecionadas, enfatiza a necessidade da figura feminina
em ter um relacionamento afetivo ou, até mesmo, a necessidade de um casamento. Desse
modo, o EUe da cantora em questão nos apresenta opiniões que, na maioria das vezes,
são compartilhadas por diversos grupos sociais e que, consequentemente, apresentam
julgamentos em relação à figura da mulher na sociedade contemporânea.
Como já foi dito anteriormente, os imaginários sócio-discursivos, nas músicas
selecionadas da cantora Marília Mendonça, podem estar relacionados tanto às ideias
ligadas ao empoderamento feminino quanto ao machismo. Embasando a nossa pesquisa
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sobre os conceitos de empoderamento feminino e machismo no livro Breve História do
Feminismo (2011) de Carla Cristina Garcia, entendemos, aqui, que o conceito de
empoderamento feminino está diretamente relacionado a outro conceito, que é o do
feminismo. De acordo com Garcia (2011), o feminismo ao longo de sua história foi alvo
de campanhas que faziam com que a população acreditasse que era um “inimigo” a se
combater. Com isso, muitos sujeitos reproduziam discursos que não eram condizentes
com os discursos defendidos pela vertente feminista. No decorrer da história, existiram e
existem muitos tipos de feminismo e todos eles tinham e tem como lema comum que era
e continua sendo o de lutar pelo reconhecimento dos direitos para as mulheres. Segundo
Garcia (2011), o termo feminismo foi primeiro empregado nos Estados Unidos, em 1911.
O objetivo das feministas estadunidenses era o equilíbrio nas necessidades de amor e de
realização tanto individual e quanto política. De acordo com Garcia (2011, p.13):
Desse modo, o feminismo pode ser definido como a tomada de consciência das
mulheres como coletivo humano, da opressão, dominação e exploração de que
foram e são objeto por parte do coletivo de homens no seio do patriarcado sob
suas diferentes fases históricas, que as move em busca da liberdade de seu sexo
e de todas as transformações da sociedade que sejam necessárias para este fim.
Partindo desse princípio, o feminismo se articula como filosofia política e, ao
mesmo tempo, como movimento social.
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conceito sexismo, por estar diretamente relacionado ao conceito do machismo. De acordo
com Garcia (2011), o sexismo está associado ao machismo por nos dizer que, na nossa
sociedade, existem discursos de desigualdades quando nos referimos à figura feminina e
à figura masculina, pois supõe que os homens são superiores as mulheres. O sexismo nos
propõe, ainda, que existem métodos que são empregados para manter a mulher em
situação de inferioridade, subordinação e exploração. Para Garcia (2011, p. 9): “Um
exemplo é a divisão da educação por sexos, constante na nossa sociedade e que tem
oscilado entre ensinar as meninas unicamente a costurar e a rezar até a proibição de
ingressarem na universidade ou exercerem certas profissões.” Com isso, a noção de
sexismo nos diz que a figura masculina defende uma ideologia de subordinação das
mulheres e de métodos que contribuem ainda mais para que essa desigualdade se
perpetue.
O imaginário sócio-discursivo do empoderamento feminino que é representado
nas músicas de Marília Mendonça é uma maneira de defender a liberdade sexual e
independência emocional das mulheres nos relacionamentos afetivos, mas, ao mesmo
tempo, a cantora Marília Mendonça como EUe nos apresenta discursos machistas que são
reproduzidos em nossa sociedade ao defender a necessidade do matrimônio para as
mulheres e ao representar a figura feminina sendo o “sexo frágil” do relacionamento
amoroso. Como podemos perceber, Marília Mendonça, enquanto sujeito discursivo,
oscila entre as ideias defendidas tanto pelo empoderamento feminino quanto pelo
machismo, fato este que se comprova em mais da metade das músicas selecionadas para
o nosso estudo.
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seja, uma ruptura dos discursos de empoderamento feminino, reforçando, muitas vezes,
os discursos machistas, que serão analisados no presente artigo.
O gênero musical Sertanejo se divide em quatro subgêneros: sertanejo raiz,
sertanejo romântico, sertanejo universitário e feminejo. O sertanejo raiz influenciou
bastante o movimento do Feminejo por apresentar muitas representantes femininas. Desse
modo, algumas cantoras femininas podem ser consideradas como precursoras para as
manifestações artísticas que viriam depois com as de Marília Mendonça, Maiara e
Maraisa e Naiara Azedo, dentre tantas outras.
As Irmãs Galvão (Mary e Marilene) iniciaram o sucesso no ano 1947 e
demonstravam, em suas letras, o valor, a dignidade e o respeito com que a música
sertaneja raiz deveria ter ao ser levada ao público, seja ele urbano ou rural. Além disso,
elas foram uma das primeiras vozes femininas a se destacarem em um ambiente
predominantemente masculino naquela época. Já, Inezita Barroso começa sua carreira
gravando a música Moda da Pinga em 1953, mas seu sucesso foi alcançado em 1955 com
gravação da música Viola Quebrada. Um aspecto que convém destacar sobre Inezita
Barroso é que a cantora desafiou o preconceito em sua época ao ter a viola e a música
caipira como fontes de seu trabalho. As Irmãs Barbosa (Dinah e Edna) ficaram
reconhecidas em 1979 quando conquistaram o segundo lugar no Festival Arizona,
promovido pela Rede Globo. Por fim, temos Roberta Miranda que começou seu sucesso
em meados dos anos de 1980 e ganhou o título de “Rainha Sertaneja”, por conquistar a
visibilidade em uma época que havia bastante predominância masculina nesse gênero
musical. Como podemos perceber, essas foram algumas das vozes femininas do sertanejo
raiz que influenciaram e influenciam as cantoras do movimento Feminejo.
Já, na presente pesquisa, tomando Marília Mendonça como descendente das
heranças deixadas por Roberta Miranda, Inezita Barroso e Irmãs Galvão, iremos analisar
os seguintes álbuns: Álbum Marília Mendonça – Ao vivo (2016), Álbum Realidade
(2017), Álbum Agora é Que São elas 2 (par. Maiara e Maraisa) (2018), Álbum Todos Os
Cantos – vol.1 (2019), Álbum Nosso Amor Envelheceu (2021) e Álbum Patroas 35%
(part. Maiara e Maraisa) (2021). O álbum Perfil (2018), não entrou na pesquisa por ter
músicas que Marília Mendonça já havia gravado nos anos de 2017 e 2016. Os álbuns
Todos Os Cantos vol. 2 e 3, não entraram para pesquisa por terem músicas repetidas e
também gravadas em anos anteriores. Em 2020, Marília Mendonça lançou somente EP’s
(EP’s não são álbuns, pois apresentam de quatro a seis músicas e o álbum sete ou mais.).
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Desse modo, EP’s e álbuns são gêneros discursivos diferentes, e, no nosso caso em
questão, optamos por analisar somente os álbuns da cantora Marília Mendonça.
Ainda em 2020, Marília Mendonça lançou o projeto Patroas EP’s 1, 2 e 3 com
participação especial da dupla Maiara e Maraisa. O referido projeto não foi selecionado
para a presente pesquisa, pois havia somente EP’s, sendo a maioria regravações de
músicas de outras duplas sertanejas. Sendo assim, as músicas para compor a pesquisa
foram selecionadas a partir da análise das letras através do critério das temáticas do
empoderamento feminino e do machismo. Sendo selecionadas duas músicas em cada
álbum e cada uma delas apresentando a ambiguidade temática presente nas letras
(empoderamento feminino e machismo) e totalizando oito músicas. Desse modo, as
análises serão pautadas em versos das músicas da cantora Marília Mendonça e as letras
completas se encontram ao final do artigo na secção “Anexos”.
No Álbum Marília Mendonça – Ao vivo (2016), na música Como Faz Com Ela,
nos versos: “Vai te preparando; Que eu não vou ter paciência; Se acha que eu não sei;
O que aprontou na minha ausência” é apresentado por Marília Mendonça, como EUe, o
reforço do discurso de empoderamento feminino. No verso “Vai te preparando”, notamos
a presença do pronome pessoal oblíquo átono “te” como uma maneira do EUe direcionar
seu discurso para o homem do relacionamento afetivo. Já, nos versos: “Que eu não vou
ter paciência, Não vou deixar barato; Não vou fingir que não vi”, temos como ideia
semântica uma mulher que não aceita traição e que não vai se sujeitar a continuar nesse
relacionamento, além de demonstrar que a figura feminina é a voz ativa no
relacionamento amoroso. Como materialidade linguística temos a repetição do advérbio
de negação “não” e do verbo “vou”, o que reafirma ainda mais a ideia semântica que
explicamos anteriormente.
Já, no reforço do discurso machista, na mesma música, temos os versos: “O que
realmente me interessa; É saber se você faz amor comigo; Como faz com ela”. A ideia
semântica nesses versos se baseia na rivalidade feminina, quando o EUe descreve
mulheres que são boas de cama e mulheres que não são, mulheres que agradam
sexualmente os seus parceiros e a representação da mulher como sendo frágil. Não
sabemos se o EUe é a amante ou a esposa, mas temos a ideia do homem que tem mais de
uma mulher e que isso é aceitável, sendo este um aspecto “instintivo” da figura masculina
na sociedade. Como materialidade linguística, temos uso do advérbio de afirmação
“realmente” que demonstra que o EUe não está preocupada se os dois estão aproveitando
e sim em uma comparação de qual mulher é a melhor do desempenho sexual. Nos versos
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selecionados, notamos também a alternância das frases “como faz com ela, como faz
comigo, como faz com ela”, assim os versos se repetem nos finais das estrofes com
alternância das expressões “com ela”, “comigo”, “com ela”. Temos uso da preposição
“como”, que apresenta a ideia de comparação entre as mulheres, reforçando o discurso de
rivalidade feminina.
No Álbum Realidade (2017), na música Amante Não Tem Lar, Marília Mendonça,
como EUe, enuncia os seguintes versos: “Eu não vou demorar; Você vai me odiar; Mas
eu vim te contar; Eu me meti no meio do seu lar” que nos apresenta como ideia semântica
o EUe (amante) que, nesse caso, parece se colocar no lugar da outra mulher (esposa), se
desculpando pelas traições. Podemos relacionar, ainda, esse discurso como uma tentativa
do EUe de não criar uma rivalidade feminina entre as duas mulheres do relacionamento
amoroso. Como materialidade linguística, temos verbo “odiar” que reforça ainda mais a
rivalidade feminina, ou seja, a mulher, normalmente, odeia a amante e não o marido que
possui um relacionamento com ela e que a traiu dentro da relação afetiva estabelecida.
Além disso, temos a repetição dos pronomes pessoais da primeira pessoa “eu”
evidenciando a figura da amante como o centro do discurso, logo, por consequência,
também no centro do acontecimento, assumindo assim a culpa da traição.
Já, no discurso relacionado à temática do machismo, Marília Mendonça, como
EUe, reforça tal discurso nos seguintes versos: “Eu nunca tive isso na vida; E se eu
continuar assim; Eu sei que não vou ter”; E o preço que eu pago; É nunca ser amada de
verdade; Ninguém me respeita nessa cidade; Amante não tem lar; Amante nunca vai
casar; E o preço que eu pago; É nunca ser amada de verdade; Ninguém me respeita
nessa cidade; Amante não vai ser fiel; Amante não usa aliança e véu”. Temos como ideia
semântica, especificamente, no verso: “Ninguém me respeita nessa cidade”; “É nunca ser
amada de verdade” e “E o preço que eu pago”, a ideia de punição cristã, pecado mortal,
ou seja, ela não será punida somente pelo ato da traição, mas será julgada por toda a
sociedade mostrando que a amante sofre, ao mesmo tempo, uma punição social e uma
punição através de sua consciência atrelada à ideia de culpa pessoal. Assim, notamos
também que a amante já está vivendo essa punição no presente por utilizar o tempo verbal
do presente do indicativo: “me respeita”. Além disso, o verso “Amante nunca vai casar”
apresenta a ideia de que a amante vai ser punida para a eternidade.
Temos ainda a ideia social do reforço da culpabilização da amante pela traição do
marido à esposa e a responsabilidade da mesma de resolver essa situação, juntamente,
com a ideia de que a amante nunca terá uma família, ou seja, dentro do discurso machista,
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existem “mulheres para casar” (merece ser amada de verdade) e “mulheres para se
divertir”. Na materialidade linguística, temos, no início da música, a repetição do
pronome pessoal “eu” lançando o olhar do leitor para a responsabilização da amante pela
traição acompanhada pelas expressões “eu sei, eu vou resolver, eu pago”. Além disso, a
repetição do adjetivo “amante” acompanhado do advérbio de negação: “amante não”
revela o reforço do discurso machista ao negar esse tipo de comportamento.
Ainda no Álbum Realidade (2017) na música Se Ame Mais, Marília Mendonça
como EUe, enuncia os seguintes versos relacionados ao empoderamento feminino: “Que
ela é nova e inteligente”; “Tem tudo pela frente” e “Você tem que seguir em frente”.
Como ideia semântica temos o EUe aconselhando a outra mulher para o amor próprio e
para aumentar sua auto estima em relação ao relacionamento amoroso. Já, na
materialidade linguística, temos, entretanto, o uso do adjetivo “nova” sendo um elemento
relacionado ao discurso conservador, pois limita a mulher à juventude quando se trata do
relacionamento afetivo. Já, o adjetivo “inteligente” se relaciona, diretamente, com o
empoderamento feminino, uma vez que convoca essa outra mulher a reagir em relação à
figura masculina e a situação que o relacionamento afetivo se encontra sendo dona do seu
destino e de suas escolhas. A locução verbal “tem que” apresenta a obrigatoriedade da
mulher em seguir em frente e não sofrer por esse relacionamento amoroso.
Já os versos que Marília Mendonça como EUe enuncia em reforço ao discurso
machista são: “Não aguento mais te ver sofrer; Ela “tá” acabando com você; Isso porque
ela se acha na obrigação de te cobrar; Um relacionamento que acabou já faz um tempo;
Ela não suporta a gente junto; Aí ela desconta em todo mundo; E não enxerga que é
culpada; Se esse amor não foi além; Essa porque não era amor; Não é problema de
ninguém; Não estou jogando na sua cara não; Não quero confusão e Hoje eu “tô” tão
na paz”. Temos como ideia semântica a rivalidade feminina que o EUe proporciona ao
criticar, julgar e tentar menosprezar outra mulher. Como materialidade linguística, a
repetição do advérbio de negação “não” e do pronome pessoal “ela”, ressaltando ainda
mais a preocupação de julgar a outra mulher. Além disso, o uso da abreviação “tô” no
verso “Hoje eu “tô” tão na paz” e o “tá” no verso “ela tá acabando”, Marília Mendonça
como EUe demonstra uma despreocupação ao julgar a outra mulher, ao utilizar essas
abreviações.
No Álbum Agora é Que São Elas 2 – participação de Maiara e Maraisa – (2018),
na música A Culpa é Dele, Marília Mendonça, como EUe, enuncia os seguintes versos
que estão relacionados ao empoderamento feminino: “Ei amiga, senta aqui, que cara é
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essa aí?; Será que alguém morreu?; O que aconteceu?; O que quer me dizer?; Por que cê
tá chorando?; Eu não tô entendo, cê tá me assustando”. Como ideia semântica, temos a
ideia do EUe aconselhar outra mulher para não se sentir culpada por ter se relacionado
com o mesmo homem do EUe. Nesses versos, ainda, podemos perceber uma tentativa de
não criar uma rivalidade feminina entre as mulheres por causa de um homem. Como
materialidade linguística, temos o uso da interjeição “Ei” e do adjetivo “amiga”, além do
verbo “senta” e do advérbio de lugar “aqui”, que nos proporciona uma aproximação do
EUe com a outra mulher da história que está sendo narrada. Além disso, percebemos o
uso dos pronomes pessoais e das abreviações de determinadas palavras como sendo uma
estratégia do EUe para proporcionar uma aproximação com a outra mulher ou, até mesmo,
uma intimidade, não criando, assim, uma rivalidade feminina. Além disso, a repetição das
perguntas para tentar entender o que aconteceu, com destaque para a pergunta “será que
alguém morreu?” revela que alguém morrer é um fato que merece atenção, mas o fato
que ela descreve logo depois, não merece tanta preocupação ou brigas.
Já para o reforço do discurso machista, temos o seguinte verso: “Mulher que deixa
de ser amiga da outra por causa de macho, vale menos que o macho, é verdade ou não
é?”. Nesse discurso da cantora, a ideia semântica está relacionada à ideia de um de
julgamento de outra mulher. Como materialidade linguística, temos no verso: “Mulher
que deixa de ser amiga da outra por causa de macho”, a preposição “que”, os verbos
“deixa” e “ser” e o adjetivo “amiga” demonstram que essa relação se baseia pelo
julgamento. No verso: “vale menos que o macho”, temos o uso do advérbio superlativo
“menos” que enfatiza ainda mais esse julgamento do EUe por outra mulher. Vale ressaltar
ainda que a pergunta no final do verso: “é verdade ou não é?” se caracteriza como uma
pergunta retórica, visto que demonstra certa preocupação do EUe em, novamente, julgar
a outra mulher.
No Álbum Todos os cantos – vol.1 (2019), na música Bem Pior Que Eu, Marília
Mendonça, como EUe, evoca o discurso do empoderamento feminino nos versos: “Eu
nem conheço ela, mas me sinto culpada; Segundo cê não tinha que ligar pra mim, Bem
pior que eu, você; Que não deixa ela, e nem deixa de me ver; Desconta sua raiva em duas
horas de prazer; Eu venho porque eu não tenho nada a perder, já você...”. Como ideia
semântica, o EUe utiliza expressões que vão contra a rivalidade feminina, tentando se
colocar no lugar da outra mulher do relacionamento afetivo pelas atitudes do homem em
se relacionar com as duas ao mesmo tempo. Entretanto, o EUe apresenta um reforço do
discurso machista no verso: “Eu venho porque eu não tenho nada a perder, já você...”,
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enfatizando que o homem poderia perder o casamento, a família e o amor, mais uma vez,
reproduzindo o discurso da importância do casamento para a mulher. Além disso, no
verso: “Desconta sua raiva em duas horas de prazer”, em que enfatiza a mulher sendo
um objeto sexual do homem. Como materialidade linguística, temos o uso de pronomes
pessoais “eu”, “ela”, “você”, “me”, que são usados pelo EUe na tentativa de direcionar
seu discurso para o homem desse relacionamento afetivo e de enfatizar o relacionamento
entre as três pessoas. Temos ainda, o uso da abreviação “cê”, que se caracteriza como
uma tentativa do EUe em demonstrar essa aproximação com o homem que estava se
relacionando com outras mulheres. Um detalhe importante é o uso da conjunção “que”
nos versos: “Primeiro que eu nem devia tá aqui” “Segundo cê não tinha que ligar pra
mim” “Bem pior que eu, você” “Que não deixa ela, e nem deixa de me ver” como uma
tentativa do EUe em fazer uma ligação entre diferentes elementos dos versos, frisando
ainda mais essa necessidade de não criar uma rivalidade feminina. Ainda temos a
repetição do verso: “Bem pior que eu, você”, em que EUe afirma, em seu discurso, que
bem pior que ela, seria o homem que mantem essa relação com as duas mulheres. O uso
das reticências no final da música deixa o final aberto para que o ouvinte faça a
interpretação de acordo com os subentendidos deixados pela cantora durante a história
descrita na música.
Com relação ao discurso machista, encontramos os seguintes versos: “Mas você
ligou e eu atendi; Eu penso não, mas falo sim”. Como ideia semântica, o EUe nos
apresenta uma mulher frágil pelo fato de sempre ceder aos chamados e desejos do homem,
como por exemplo, “Mas você ligou e eu atendi”. O mesmo acontece em “Eu penso não,
mas falo sim”, posto que, mais uma vez, temos uma comprovação dessa fragilidade
feminina através do consentimento das investidas do homem. Como materialidade
linguística, temos a repetição dos pronomes pessoal “eu” e do pronome pessoal “você”
para uma aproximação do EUe com o homem retratado na música. O verbo “penso”
demonstra o caráter de racionalidade em não ligar para o homem e o verbo “fala” está
relacionado à ação da mulher que é gerada pela emoção.
No Álbum Nosso Amor Envelheceu (2021), na música Troca de Calçada, Marília
Mendonça, como EUe, reforça o discurso de empoderamento feminino através dos
versos: “Se alguém passar por ela fique em silêncio; Não aponte o dedo, não julgue tão
cedo; Isso é preconceito; Pra ter o corpo quente; Eu congelei meu coração; Pra esconder
a tristeza” e “Hoje você me vê assim e troca de calçada; Mas se soubesse um terço da
história; Me abraçava e não me apedrejava”. Na ideia semântica, vemos o EUe
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evidenciando, em seu discurso, a necessidade de não fazer julgamentos ou, até mesmo,
ter preconceito com as mulheres que possuem a liberdade sexual nos relacionamentos
afetivos. Observamos também a necessidade de acolher essas mulheres, ao invés de fazer
comentários pejorativos e julgamentos. Como materialidade linguística, temos o uso do
pronome pessoal “ela” e “me” para indicar que o EUe enfatiza essa necessidade de não
fazer julgamentos com as mulheres que possuem liberdade sexual. Além disso, no verso:
“Isso é preconceito”, temos o uso do pronome demonstrativo “isso” que retoma, mais
uma vez, para essa questão do julgamento. Temos ainda o verbo “congelei” e o adjetivo
“prova d’água” que estão relacionados à ideia de não conseguir ter acesso de imediato à
mulher, ou seja, do homem não conseguir se relacionar amorosamente de imediato a
mulher.
Com relação ao discurso machista, temos os seguintes versos: “É claro que ela já
sonhou em se casar um dia; Não estava nos planos ser vergonha pra família; Cada um
que passou levou um pouco da sua vida; E o resto que sobrou ela vende na esquina”.
Como ideia semântica, vemos que o EUe afirma, em seu discurso, sobre a importância do
matrimônio para as mulheres acompanhada da ideia de julgamento: “vergonha pra
família” caracterizando como vergonha (desonra, rebaixamento, demérito) as mulheres
que tem a liberdade sexual de se relacionar com quem elas quiserem. Na materialidade
linguística, temos nos versos “É claro que ela já sonhou em se casar um dia” e “Não estava
nos planos ser vergonha pra família” o uso do pronome pessoal “ela” e do advérbio de
negação “não”, frisando a necessidade do matrimônio para as mulheres. Ainda temos o
uso do adjetivo “claro”: ideia do óbvio, que remete socialmente a ideia de que é algo que
não tem dúvidas, que é da “naturalidade feminina” querer casar.
No Álbum Patroas 35% - participação de Maiara e Maraisa - (2021), na música
Eu Não Vou Namorar, Marília Mendonça, como EUe, reforça o discurso de
empoderamento feminino nos versos: “Eu tive um amor na minha vida que não foi pra
frente; Depois disso aí desisti de papinho de pra sempre; Daquele dia em diante eu jurei
pra Deus; Calma aí coração não se anima!; Um block resolve a nossa vida!; Eu não vou;
Eu não vou namorar, ah”. Na ideia semântica, o EUe evidencia uma mulher que não
acredita em relacionamentos clichês, do tipo “conto de fadas” com os versos: “Eu tive um
amor na minha vida que não foi pra frente” e “Depois disso aí desisti de papinho de pra
sempre”. O EUe ainda evidencia uma mulher que não se recai nos relacionamentos
amorosos: “Um block resolve a nossa vida!” (a expressão block significa bloquear outra
pessoa, mais especificamente, não ter mais contato com a pessoa nas redes sociais) e que
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não vai namorar “Eu não vou namorar”. Como materialidade linguística, o uso de
pronomes pessoais “eu” e “nossa” enfatiza a aproximação do EUe com o relacionamento
amoroso, uma vez que direciona o seu discurso para o homem. A repetição dos versos
“Eu não vou”, nos reforça repetidamente a ideia de que o EUe sendo uma mulher, não
quer namorar e não irá recair em namorar novamente, tal repetição nos alerta também
para uma possibilidade de tentativa de se lembrar o tempo todo do que ela se decidiu
sobre os relacionamentos amorosos.
Encontramos o discurso o machista nos versos: “Eu tive um amor na minha vida
que não foi pra frente; Depois disso aí desisti de papinho de pra sempre; Daquele dia em
diante eu jurei pra Deus; Que dentro de um ano namoro nenhum pegava eu; Mas eu não
contava que a sua boca ia vir de encontro a minha; E querer me arrastar pra sua vida
com a língua” “Eu tô babando ouvindo um áudio sorrindo pro celular; Tô de plantão
nos seus stories; Sondando onde cê tá; Tá na hora de te bloquear; Eu não vou namorar”.
Na ideia semântica, o EUe evidencia uma mulher frágil em relação ao relacionamento
reforçando a ideia da necessidade feminina de se ter um relacionamento amoroso. Nos
versos: “Que dentro de um ano namoro nenhum pegava eu” “Mas eu não contava que a
sua boca ia vir de encontro a minha” “E querer me arrastar pra sua vida com a língua”,
encontramos a questão da fragilidade feminina em se ceder nos relacionamentos afetivos.
Temos ainda nos versos: “Eu tô babando ouvindo um áudio sorrindo pro celular” “Tô
de plantão nos seus stories” “Sondando onde cê tá”, a descrição da fragilidade da mulher
no relacionamento, uma vez que o EUe retrata uma mulher dependente do
relacionamento. Como materialidade linguística, observamos o uso de pronomes pessoais
“eu”, “cê”, “tô”, através do uso de abreviações evidenciando uma tentativa de intimidade
e de direcionamento do discurso para o homem envolvido no relacionamento amoroso.
Ainda no Álbum Patroas 35% - participação de Maiara e Maraisa - (2021), na
música Presepada, Marília Mendonça, como EUe, reforça o discurso empoderamento
feminino nos versos: “E se eu te disse que você tá perdendo o amor da sua vida; Você
beberia mais uma?; Você não vai ganhar nada com isso; Não tem ninguém achando isso
bonito; Cadê a sua responsabilidade?; No seu lugar eu teria vergonha; Por mim, ela
teria te deixado; Então aproveita que ela nem sonha quem você é;” “Vive numa busca
incessante; Pra achar alguém interessante; Sem enxergar que ela é brilhante; Que ela é
rara”. Como ideia semântica, o EUe, em seu discurso, deixa claro que não aprova essas
atitudes do homem no relacionamento amoroso através dos versos: “Você não vai ganhar
nada com isso”, “Não tem ninguém achando isso bonito”, “No seu lugar eu teria
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vergonha” e “Cadê a sua responsabilidade?”. Temos ainda um discurso de apoio a outra
mulher, de sororidade feminina como em: “Sem enxergar que ela é brilhante” “Que ela
é rara”. Como materialidade linguística, temos o uso dos pronomes pessoais “você”,
“ela”, “te”, “sua” demonstrando um direcionamento da fala do EUe em não aprovar as
atitudes do homem nesse relacionamento amoroso e ainda mostrar um apoio à figura
feminina, elogiando a outra mulher com os adjetivos “brilhante” e “rara”.
Quanto ao discurso machista, temos os seguintes versos: “Enquanto finaliza a
saideira; Destrói os sonhos de uma vida inteira; Você curtindo o auge dos seus trinta e
poucos anos; E ela te esperando acordada fazendo planos; Enquanto finaliza a saideira;
Destrói os sonhos de uma vida inteira” “É hora de parar com a presepada; Respeita a
sua namorada; Agarra essa mulher e casa; Agarra ela e casa; Essa sua busca incessante;
Pra achar alguém interessante; Terminaria se enxergasse; O que tem dentro de casa”.
Como ideia semântica, o EUe, usa o discurso machista atrelado à ideia da figura feminina
como frágil. Já em: “E ela te esperando acordada fazendo planos”, notamos o reforço da
ideia do romance “clichê” enfatizando a necessidade do matrimônio para a mulher:
“Destrói os sonhos de uma vida inteira”, “Agarra essa mulher e casa” e “Agarra ela e
casa”. No verso: “O que tem dentro de casa”, o EUe reproduz uma ideia machista de que
a mulher precisa ficar em casa, servindo o lar e o marido. Como materialidade linguística,
temos o uso do pronome pessoal “ela” pelo EUe. O uso desse pronome pessoal pode estar
relacionado como se Marília Mendonça tivesse presenciado a história narrada e com isso,
relata essa história direcionando o seu discurso para o homem do relacionamento
amoroso. A repetição da expressão “agarra ela e casa”, proporciona uma ideia de posse
com o uso do verbo “agarra” e ressalta mais uma vez a necessidade do matrimônio com
o uso da palavra “casa”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Como falamos ao longo do artigo, o Feminejo é um movimento que evidencia a
perspectiva feminina em um ambiente que é predominantemente masculino, o do
sertanejo universitário. Porém, Marília Mendonça, mesmo enunciando discursos que
trazem a perspectiva feminina nos relacionamentos amorosos, esses mesmos discursos
não podem ser relacionados as ideias do empoderamento feminino, pois em uma mesma
música nos é apresentado ideias machistas.
As nossas análises das oito músicas da Marília Mendonça, mais especificamente,
aquelas relacionadas ao empoderamento feminino, foram pautadas em uma vertente de
feminismo que se chama feminismo branco. Essa vertente se encontra relacionada nos
pensamentos das autoras Beauvoir (1949), Friedan (1970) e Badinter (1980), por
exemplo, por trazer uma visão particular do feminismo e não abranger a todo o coletivo
de mulheres que existem em nossa sociedade, como as mulheres negras, indígenas,
transexuais, etc. Além disso, ao analisarmos as oito músicas da Marília Mendonça,
concluímos que a cantora nos apresenta ideias que são relacionadas à liberdade sexual e
emocional das mulheres nos relacionamentos amorosos, o que evidencia os princípios
básicos da vertente do feminismo branco.
O sertanejo universitário, mais especificamente, o movimento do Feminejo,
apresenta também características discursivas relacionadas a machismo, ao defender ideias
associadas à figura feminina ao sexo frágil, à dependência emocional do relacionamento
amoroso e à necessidade do matrimônio. Assim, pudemos demonstrar que Marília
Mendonça, enquanto referência feminina dentro do movimento Feminejo, apresenta
discursos com ideias machistas mesmo quando esses sujeito enunciador é uma mulher.
Com isso, é necessário rever alguns discursos e posicionamentos citados em muitas
músicas sertanejas, uma vez que elas reforçam a disseminação dos discursos machistas e
heteropatriarcais que subalternam, inferiorizam e diminuem o grupo social feminino.
REFERÊNCIAS
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Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de
Janeiro. Rio de Janeiro, Volume 10, Dezembro, 2011.
CHARAUDEAU, Patrick. Os estereótipos, muito bem. Os imaginários, ainda melhor.
Traduzido por André Luiz Silva e Rafael Magalhães Angrisano. Entrepalavras, Fortaleza,
v. 7, p. 571-591, jan./jun. 2017.
FRIEDAN, Betty. The feminine Mystique. Londres: W.W. Norton & Company, 1970.
GARCIA, Carla Cristina. O que é feminismo?. In: Breve História do Feminismo. São
Paulo: Editora Claridade, 2011. p. 11-25.
MACHADO, I. Lucia; MENDES, Emília. (2013). A análise semiolinguística: seu
percurso e sua efetiva tropicalização. Revista Latinoamericana De Estudios Del
Discurso, 13(2), 7–20. Recuperado a partir de
https://periodicos.unb.br/index.php/raled/article/view/33381. Acesso em 10/04/2023.
MACHADO, I. Lucia; MELLO, Renato de. Visadas discursivas, gêneros situacionais e
construção textual. Gêneros e reflexões em análise do discurso. Belo Horizonte,
Nad/Fale-UFMG, 2004.
MENDES, Emília. Contribuições ao Estudo do Conceito de Ficcionalidade e de suas
Configurações Discursivas. Tese de Doutorado em Estudos Linguísticos. Faculdade de
Letras, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2004.
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ANEXOS
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Álbum Realidade (2017) – Música: Amante não tem lar
Só vim me desculpar
Ela “tá” acabando com você Se esse amor não foi além
Isso porque ela se acha na obrigação de Essa porque não era amor
te cobrar
Não é problema de ninguém
Um relacionamento que acabou já faz
um tempo Eu queria dizer pra ela
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Merece ser feliz como a gente
Mas ela “tá” fazendo diferente Que história é essa que aconteceu?
Não estou jogando na sua cara não Nem fica preocupada, a gente resolve
mais tarde
Não quero confusão
Se quem tava comigo era ele, a culpa
Hoje eu “tô” tão na paz dele
Porque não faz o mesmo que a gente faz Quem fez essa bagunça na nossa
amizade é ele
Gente feliz não atrapalha os outros
casais Eu não vou deixar de ser sua amiga por
causa de um qualquer
Então se ame mais
Que não respeita uma mulher
Não é culpa minha
Álbum Todos os cantos – vol.1 (2019)
Se ele não quer mais
– Música:Bem pior que eu
Álbum Agora é que são elas 2 (par.
Maiara e Maraisa) (2018) – Música: Mente que vai dar uma volta e vem me
A culpa é dele feat. Maiara e ver
Maraisa
Entre uma briga e outra de vocês
Ei amiga, senta aqui, que cara é essa aí?
Eu nem conheço ela mas me sinto
Será que alguém morreu? O que culpada
aconteceu?
Primeiro que eu nem devia tá aqui
O que quer me dizer? Por que cê tá
Segundo cê não tinha que ligar pra mim
chorando?
Mas você ligou e eu atendi
Eu não tô entendo, cê tá me assustando
Eu penso não, mas falo sim
Lembro da noite, sim, que a gente saiu
Bem pior que eu, você
Cê disse que ia ali, logo depois sumiu
Que não deixa ela, e nem deixa de me
Aonde você tava, como assim vou ficar
ver
brava?
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Bem pior que eu, você Hoje você me vê assim e troca de
Não aponte o dedo, não julgue tão cedo Hoje você me vê assim e troca de
calçada
Ela tem motivos pra estar desse jeito
Mas se soubesse um terço da história
Isso é preconceito
Me abraçava e não me apedrejava
Viveu tanto desprezo
Álbum Patroas 35% (part. Maiara e
Que até Deus duvida e chora lá de cima
Maraisa) (2021) – Música: Eu não
Era só uma menina
vou namorar feat. Maiara e Maraisa
Que dedicou a vida a amores de quinta
Eu tive um amor na minha vida que não
É claro que ela já sonhou em se casar foi pra frente
um dia
Depois disso aí desisti de papinho de
Não estava nos planos ser vergonha pra pra sempre
família
Daquele dia em diante eu jurei pra Deus
Cada um que passou levou um pouco da
sua vida Que dentro de um ano namoro nenhum
pegava eu
E o resto que sobrou ela vende na
esquina Mas eu não contava que a sua boca ia
vir de encontro a minha
Pra ter o corpo quente
E querer me arrastar pra sua vida com a
Eu congelei meu coração língua
Pra esconder a tristeza Calma aí coração não se anima!
Maquiagem à prova d'água Um block resolve a nossa vida!
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Eu tô babando ouvindo um áudio Você curtindo o auge dos seus trinta e
sorrindo pro celular poucos anos
Eu não vou,
É hora de parar com a presepada
Eu não vou,
Respeita a sua namorada
Eu não vou namorar, ah
Agarra essa mulher e casa
Álbum Patroas 35% (part. Maiara e Agarra ela e casa
Maraisa) (2021) – Música: Presepada
Vive numa busca incessante
feat. Maiara e Maraisa
Pra achar alguém interessante
Vem cá
Sem enxergar que ela é brilhante
E se eu te disse que você tá perdendo o
amor da sua vida Que ela é rara
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O que tem dentro de casa
Tá aí do seu lado
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