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PROPÓSITO
A temática da feminização do cuidado é importante para a formação do profissional
da saúde, pois traz reflexões e problematiza aspectos relativos à saúde da
população no âmbito das questões de gênero que devem ser reproduzidas na
prática profissional.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
Distinguir os conceitos de masculinidade e feminilidade e seus contrastes com os
conceitos de machismo e feminismo
MÓDULO 2
Relacionar o contexto histórico da conceituação de feminização com a construção
do cuidado em saúde
MÓDULO 3
Analisar o cuidado em saúde com base nas conexões entre gênero, etnia e classe
INTRODUÇÃO
Desde o nascimento, aprendemos que homens e mulheres têm papéis diferentes na
sociedade, começando pelas diferenças sexuais. Acredita-se que o homem possa
exercer uma relação de poder sobre as mulheres, a chamada dominação masculina,
a depender da cultura. Quando um bebê nasce, dependendo do sexo, a sociedade
estipula que ele deverá se vestir com determinada cor. Meninas desde cedo são
orientadas a comportar-se e pensar de maneira diferente, reproduzindo fragilidades,
dependências e submissão. Meninos são incentivados a serem independentes,
fortes e valentes, sem expor sentimentos e emoções.
Dizemos então que as relações de gênero são socialmente construídas, mas não
são imutáveis; ao contrário, elas podem se modificar de acordo com a sociedade e
com o tempo. Na nossa sociedade, por exemplo, é visível que muitas mudanças
estão acontecendo e, para entendermos essas transformações, precisamos
compreender as relações de gênero e poder existentes nos diferentes contextos
sociais, sem deixarmos de considerar as questões de raça, classe e etnia,
apresentando um olhar diferenciado para as mulheres negras e indígenas, que
vivem situações de vulnerabilidade social e estão sempre à margem do sistema de
saúde.
MÓDULO 1
Distinguir os conceitos de masculinidade e feminilidade e seus contrastes
com os conceitos de machismo e feminismo
CONCEITUAÇÃO DE MASCULINIDADE
E FEMINILIDADE E AS
CONTRAPOSIÇÕES COM CONCEITOS
DE MACHISMO E FEMINISMO
Tanto a masculinidade quanto a feminilidade são construídos de forma sociocultural.
A sociedade estabelece atributos, comportamentos e papéis dos homens e das
mulheres.
EXEMPLO
A maioria dos cargos de alto escalão executivo é ocupado por homens e, quando
assumidos por mulheres, o salário é visivelmente menor.
COMENTÁRIO
Podemos dizer que as transformações da sociedade implicam a evolução dos
conceitos de masculinidade e feminilidade, como é o caso da transição da
sociedade medieval para a moderna.
O Período Medieval, ou Idade das Trevas, como nomeado por muitos historiadores,
caracterizou-se por uma sociedade estática e hierarquizada, com pouca mobilidade
social, ou seja, o sistema era definido por camadas sociais, e os indivíduos
dificilmente conseguiam alcançar uma posição mais elevada.
MULHER
A mulher, por sua vez, é simbolizada nas figuras bíblicas de Eva (mulher pecadora),
e Virgem Maria (mulher pura), e nesse período essa dualidade é bem visível. Eva é
considerada um ser demoníaco, e desobediente, enquanto Maria é virtuosa, casta,
de natureza perfeita. Uma (Eva) é a mulher; a outra (Maria) é o que a mulher
deveria ser ou a figura idealizada da mãe.
Percebe-se que toda essa construção social contribuiu para estipular padrões na
sociedade e estabelecer uma inferioridade do corpo feminino, considerando o
feminino subalterno.
Com base no que já estudamos até aqui, podemos dizer que a masculinidade e a
feminilidade dizem respeito a um conjunto de códigos sociais construídos por
meio de exigências, padrões e práticas adquiridas ao longo dos anos, que
sofrem um processo de diferenciação, dependendo do local, do tempo e da
cultura de cada sociedade.
MAS O QUE DIFERE A MASCULINIDADE DO
MACHISMO E A FEMINILIDADE DO
FEMINISMO?
Cuidado! Não devemos confundir os termos. Como vimos, a masculinidade e a
feminilidade são padrões estipulados pela sociedade para definir as características
do ser homem e do ser mulher.
Os termos machismo e feminismo surgiram justamente por conta dessa imposição
da sociedade. A origem do pensamento machista tem suas raízes na consolidação
da masculinidade. Como já falamos, os códigos sociais atribuídos ao homem e à
mulher criam uma superioridade entre os indivíduos, tratando-se então de uma
dominação de poder dos homens sobre as mulheres.
SAIBA MAIS
Quando falamos em machismo, estamos tratando das atitudes baseadas na
discriminação feminina, que desqualifica e inferioriza a mulher ou o sexo
feminino.
Assim, o machismo pode ser visto como um sistema que comporta dois núcleos, o
dominante e o dominado, baseado no argumento do sexo. O homem no papel de
dominante exerce o poder sobre a mulher, o núcleo dominado.
Mulheres não servem para dirigir automóveis, apenas para dirigir fogões.
Ela conseguiu um cargo melhor na empresa? Deve estar saindo com o chefe!
VOCÊ SABIA
Vale destacar que o feminismo tem várias vertentes, ou seja, não existe apenas um
tipo de feminismo. Porém, todos eles congregam para o mesmo objetivo, não sendo
eles, portanto, movimentos divergentes.
Vamos pensar assim: mulheres são diferentes umas das outras, agem de forma
diferente, têm visões diversas e, para abranger o complexo mundo feminino, é
necessário que haja uma doutrina plural, a fim produzir transformações políticas,
sociais e ideológicas na sociedade. Portanto, é assim que devemos pensar o
feminismo.
O DIREITO À EDUCAÇÃO
Com a imposição dos padrões sociais, as mulheres ficaram mais especificamente
vinculadas ao trabalho e ao cuidado da família. Essa feminização do cuidado era
visível, e a sociedade limitava a educação apenas ao gênero masculino. Em 1827,
as brasileiras conseguiram a autorização para estudar, graças às bandeiras
levantadas por Nísia Floresta, autora do livro Direitos das mulheres e injustiça dos
homens (1989), sendo considerada então a primeira feminista do Brasil.
DIREITO AO VOTO FEMININO
MASCULINIDADE E FEMINILIDADE, E
AS CONTRAPOSIÇÕES COM
MACHISMO E FEMINISMO
A especialista Ana Isabella Sousa Almeida reflete sobre os conceitos de
masculinidade e feminilidade, e as contraposições com conceitos de machismo e
feminismo.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
MÓDULO 2
COMENTÁRIO
Isso nos leva a refletir que, mesmo considerando que as concepções de cuidado
variam com a cultura e com o local, há fatos maiores que podem influenciar a
comunidade; neste caso, a rápida difusão do capitalismo no mercado de trabalho
mundial.
A FEMINIZAÇÃO NA POLÍTICA
Ainda hoje o processo de feminização na política segue de forma lenta e gradual;
ainda não há uma partilha de poder igualitária entre homens e mulheres. Há
inúmeras tentativas de inserção das mulheres na política, com campanhas de
incentivo à participação feminina na política e com a criação de estratégias e leis
que garantam a igualdade de gênero na política, porém ainda há muito no que se
avançar.
A FEMINIZAÇÃO NO MAGISTÉRIO
Culturalmente, após a inserção da mulher no mercado de trabalho, muitas delas
migraram para a docência; no entanto, trouxeram estereótipos característicos da
feminilidade, atribuindo significados femininos às atividades docentes.
A FEMINIZAÇÃO DA POBREZA
O conceito de feminização da pobreza foi introduzido por Diane Pearce em 1978
(NOVELLINO, 2004). Podemos dizer que a feminização da pobreza perpassa a
evolução da pobreza. Por exemplo, se temos um declínio exponencial na pobreza
do gênero masculino e apenas um declínio discreto na pobreza do feminino,
podemos inferir que ali a feminização da pobreza se constrói. Em outras palavras,
interessa aqui conhecer quais são as consequências econômicas e sociais de ser
mulher e que conduzem à pobreza.
DIANE PEARCE
Essa autora destacou como o número de lares em que só a mulher ficava
responsável pelo sustento de filhos menores de idade estava aumentando naquela
época. Mas aqui temos que ter cuidado, pois esse conceito tem caráter
diferenciado; ele não se refere ao quantitativo de mulheres mais pobres na
sociedade comparadas a homens ou às alterações nos níveis de pobreza em
domicílios que são chefiados por mulheres.
Esse período foi marcado pelo reforço da feminilidade, à medida que tais
instituições associavam a figura da mulher mãe ao papel de cuidadora.
Posteriormente, outras profissões de cunho “cuidativo”, como Psicologia, Nutrição,
Fisioterapia e Serviço Social emergiram no campo da saúde e foram caracterizadas
pela presença da divisão sexual no trabalho, em decorrência de essa prática
“cuidativa” ser vista como algo próprio ou natural do gênero feminino.
COMENTÁRIO
Ainda é visível, entretanto, a opressão sobre as mulheres médicas associadas à
discriminação de gênero, principalmente quando elas optam por especialidades com
maior quantitativo de homens médicos.
Com base em tudo que estudamos até aqui, podemos dizer que a feminização do
cuidado foi fruto de uma construção histórica, social e cultural que reverencia a
cultura machista e o sistema patriarcal, e que ainda se encontra em processo de
constante evolução.
1
O campo da saúde vem sofrendo feminização ao longo dos anos.
3
Quando falamos em feminização do cuidado, estamos nos referindo às
transformações sociais e históricas nas relações de gênero dentro da ciência do
cuidado.
5
As práticas médicas vêm sofrendo transformações ao longo dos anos, porém ainda
é visível a segregação entre homens e mulheres.
A FEMINIZAÇÃO DO CUIDADO COMO
UMA CONSTRUÇÃO HISTÓRICA,
SOCIAL E CULTURAL
A especialista Ana Isabella Sousa Almeida fala sobre como a feminização do
cuidado foi fruto de uma construção histórica, social e cultural e suas implicações.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
MÓDULO 3
Analisar o cuidado em saúde com base nas conexões entre gênero, etnia e
classe
O contexto social é um importante fator que deve ser considerado, pois são visíveis
as vulnerabilidades existentes em nossa sociedade, e não se pode pensar a saúde
pública sem refletir sobre essa realidade.
que executam.
lar.
A pandemia da covid-19
SAIBA MAIS
Essa dificuldade está relacionada à herança histórica de escravidão do povo
indígena e à invisibilidade desse grupo. A própria imposição da cultura branca e
europeia trouxe impactos futuros para a representatividade desse grupo em relação
ao cuidado em saúde.
As mulheres que saem de suas comunidades e vão vivenciar outros cenários, seja
em busca de educação ou de espaço no mercado de trabalho, sofrem intensas
discriminações, e isso impacta consideravelmente no cuidado em saúde.
O Ministério da saúde (2009) afirma que mulheres indígenas são grupos bastante
vulneráveis a doenças de âmbito nutricional, pois apresentam carências nutricionais
em função das alterações fisiológicas e hormonais que ocorrem ao longo do tempo.
Porém, as ações de saúde tanto em âmbito assistencial quanto preventivo voltadas
a esse grupo específico ainda são insuficientes.
A violência obstétrica
O termo refere-se aos abusos obstétricos sofridos por mulheres nos serviços de
saúde durante a gravidez, parto e pós-parto. Como já pontuamos, pessoas negras
têm mais dificuldade de acesso aos serviços de saúde. Em vista disso, mulheres
negras também têm menos acesso ao pré-natal e às informações inerentes à
gestação.
VOCÊ SABIA
Evidenciando o racismo e reproduzindo o machismo, mulheres negras são mais
frequentemente violentadas; isso nos mostra que os resquícios do sistema
escravagista e colonialista reproduziram na sociedade a ideia de que as mulheres
negras são mais fortes e tolerantes à dor do que as brancas, ditas frágeis. Nesse
sentido, temos a representação das categorias gênero e raça apontando as
disparidades no cuidado em saúde.
Por fim, ao concluirmos, não podemos esquecer que as articulações entre gênero,
raça/etnia e classe social são categorias importantes e expressam a amplitude do
campo da saúde. Por meio dessas interseções, podemos construir políticas públicas
que contemplem os grupos mais vulneráveis e promovam mudanças no espaço
social e nos serviços de saúde.
PRÁTICAS DISCRIMINATÓRIAS E
SEGREGAÇÃO RACIAL E ÉTNICA NA
ASSISTÊNCIA À SAÚDE
A especialista Ana Isabella Sousa Almeida aborda práticas discriminatórias e
segregação racial e étnica na assistência à saúde.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como vimos, a feminização do cuidado foi construída histórica e culturalmente. A
feminização do cuidado emergiu quando a feminilidade imposta pela sociedade
determinou que as funções femininas deveriam estar direcionadas especificamente
para o cuidado do lar e dos filhos.
PODCAST
Agora, a especialista Ana Isabella Sousa Almeida encerra o tema falando sobre a
interrelação do cuidado e saúde com as categorias gênero, raça e etnia e seus
antecedentes históricos.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
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manifesto. 1. ed. São Paulo, SP: Boitempo, 2019.
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saúde. Estudos avançados, v. 34, n. 99, 225-243, 2020.
EXPLORE+
Para saber mais sobre os assuntos explorados neste conteúdo:
veja como Bell Hooks, uma das mais importantes feministas negras da
atualidade, oferece uma visão mais ampla das lutas de mulheres e apresenta as
CONTEUDISTA
Ana Isabella Sousa Almeida