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JEAN COPANS MAURICE GODELIER SERGE TORNAV CATHERINE BACKÈS-

CLÉMENT. ANTROPOLOGIA CIÊNCIA DAS SOCIEDADES PRIMITIVAS?

Situação da Antropologia
● Frei Bartolomeu de las Casas - denuncia a tirania contra os povos indígenas.
● Sociedade Ocidental - ponto de encontro da violência e da ciência.
● “A heterogeneidade da vida em sociedade tornou-se progressivamente
manifesta no decorrer do descobrimento e da ocupação colonial das
sociedades não europeias” - estas sociedades são submetidas a reflexão
filosófica ou política, em seguida, com o desenvolvimento da ciência -
particularmente dos embriões das Ciências Sociais no séc. XIX - são também
tomadas como objeto da ciência.
● “Mas é difícil, a princípio, separar a abordagem científica da abordagem
ideológica, ou moral desse fenômeno. A reação instintiva do Ocidente face
aos povos exóticos é o etnocentrismo (...)”.
● Distinção entre sociedades europeias e «não europeias».
● “As transformações econômicas, políticas e sociais das primeiras,
provocadas pelas segundas, tornara arbitrária uma distinção científica, cuja
razão de ser surge claramente como ideológica: era preciso que o bom
selvagem fosse considerado diferente e distinto para que se tornasse
possível defini-lo como objeto de conhecimento e... de exploração”.
● “(...) necessidade científica: a explicação do funcionamento das sociedades
europeias e «não europeias», passadas e atuais, não pode ser elaborada
senão dentro de um mesmo conjunto teórico”.

Origens da Antropologia
● “Esbocemos, pois, rapidamente, as grandes tendências desta inquirição
sobre os outros que se instaura a partir da Antiguidade: to grego Heródoto
(século V a. C) quem desempenha o papel ambíguo do herói mítico, fundador
da História, da Geografia Comparada e da Etnologia” - “nós” = gregos, “não
gregos” = bárbaros.
● “A Idade Média dá uma nova forma a esse duplo aspecto do discurso sobre
os outros: cristãos e não cristãos. É, aliás, em nome desta diferença que se
justificarão as primeiras conquistas e explorações coloniais do
Renascimento”.
● “Apenas nos fins do século XIX as duas disciplinas se apresentam como
duas fases complementares de um mesmo projeto: coleta dos documentos e
descrição (etnografia), e depois síntese comparativa (etnologia)”.

Do projeto teórico ao trabalho de campo


Domínio etnológico - “(...) O primeiro campo empírico a tomar forma é o da evolução
natural da espécie humana. A pesquisa das origens conduz às classificações
biológicas das raças e à sua descrição racional: a antropologia física. Mas a
pesquisa das origens conduz igualmente à paleontologia e à pré-história, descrição
dos estádios anteriores da espécie humana como espécie social (fabricação de
utensílios, etc.). É a distinção cada vez mais acentuada entre a origem e a evolução
do ser humano como espécie natural e como ser social que explica a constituição
de disciplinas científicas autônomas”.

“É com o desaparecimento da cisão entre as duas funções — colecta de


documentos e interpretação e prática do trabalho de campa — que a etnologia
adquire a sua originalidade. É entre 1880 e 1915 que «nasce» o trabalho de campo,
com Franz Boas e Bronislaw Malinowski, entre outros, e é este nascimento que
explica o prodigioso desenvolvimento da etnologia a partir de 1900”.

Panorama de um itinerário teórico


“O século XIX é evolucionista”: “(...) Decalcando o modelo do evolucionismo
biológico, buscam-se os estádios da evolução humana e, em consequência, as
sociedades primitivas aparecem como os antepassados naturais das sociedades
ocidentais atuais. Trata-se de um evolucionismo Unilinear, quer dizer, tal sucessão
de estádios é necessária e obrigatória: por uma série de transformações passa-se
do inferior ao superior”. Principal expoente: o americano Lewis H. Morgan (1818-
1881).

“Franz Boas (1858-1942), alemão naturalizado americano, é o primeiro que de


modo consequente põe em causa o evolucionismo. Formado em Ciências Exatas e
em Geografia Física, rejeita qualquer espécie de síntese. Especialista de
antropologia física, de linguística e da mitologia dos índios da América do Norte,
consagra-se ao registro de fatos e às correlações limitadas e controladas. Pratica
um verdadeiro ceticismo teórico e anti histórico”.

“No entanto, é funcionalismo anglo-saxônico que mais consequente e


duradouramente refuta o evolucionismo. Bronislaw Malinowski, de origem polaca
(1881-1942), é o teórico mais sistemático da corrente funcionalista, e sem dúvida
domina o período que decorre entre as duas guerras: Todo o elemento (instituição)
de uma cultura desempenha uma função neste conjunto e reflete uma necessidade
biológica”.

“Culturalismo” - “Nos E. U. A, no período que medeia entre as duas guerras,


desenvolve-se uma tendência bastante diferente do funcionalismo anglo-saxônico.
Com E. Sapir, M. Mead, R. Benedict, e depois A. Kardiner e R. Linton, assiste-se a
uma associação das pesquisas etnológicas, psicológicas e psicanalíticas. Trata-se
essencialmente de referenciar e de construir os modelos, os princípios ou as
configurações culturais (pattern) que fazem a originalidade dos indivíduos e das
culturas”.
Etnologia francesa - “(...) Todavia, o verdadeiro fundador teórico da etnologia é
Marcel Mauss: a magia, a religião, o parentesco, a economia (Essai sur le dom;
1923), dão origem a sínteses e a uma pesquisa das leis de funcionamento
profundas e invisíveis. É Claude Lévi I Strauss, sob a influência da fonologia e da
linguística estrutural (N.-S. Troubetzkoy, R. Jakobson), quem vai elaborar estes
princípios de maneira rigorosa a partir de 1945”.

II - Investigação Antropológica

● “A etnologia é a busca eternamente renovada de um objeto que se escapa,


porque não pode ser definido senão excluindo a priori a problematicização da
relação não científica que o produziu. A etnologia atribui-se corno objeto um
produto ideológico”.

“Para ultrapassar o etnocentrismo ideológico, conceptual e metodológico, é preciso


dar nova forma as questões dirigidas a estas sociedades, isto é, demonstrar o
vínculo entre a ilusão do método etnológico e o objeto da ilusão etnológica. O
exame crítico (e evidentemente sumário) do objeto, do método e das técnicas da
investigação etnológica, vai permitir-nos definir as condições dessa mudança de
perspectiva. A antropologia enquanto ciência aparece, pois, primeiramente como
uma articulação consciente da teoria com as práticas, como uma crítica do contexto
histórico ideológico e teórico que a torna possível”.

O Objeto
● “O objeto, como vimos, identifica-se em primeiro lugar com o domínio
empírico que a expansão europeia constitui ao longo do seu desenvolvimento
histórico”.
● “A primeira operação científica consiste em definir o objeto em relação ao
propósito da disciplina: propósito metodológico (estrutura); propósito
totalizante (cultura, sociedade, fato social total); propósito parcelar (domínio
circunscrito do real: parentesco, economia, etc.)”.
● “Este processo de expansão e de diversificação do interesse antropológico
corresponde ao reconhecimento progressivo do campo - real desta disciplina:
«As propriedades gerais da vida social»”.

O método e as técnicas
“Uma dupla ilusão preside ao desenvolvimento do método etnológico ainda
considerado como o modelo ideológico e formal da prática antropológica. Esta dupla
ilusão é um subproduto natural das condições de descobrimento das sociedades
«exóticas», pela Europa. Por um lado, o olhar alienígena é dotado de objetividade.
Por outro, essas sociedades não excedem a capacidade do olhar individual dotado
de objetividade: a sua grandeza é diminuta e a sua forma elementar geralmente de
natureza comunitária (rural ou outra)”.
III - Tendências atuais da Antropologia

“Cada disciplina científica possui uma consciência de si própria historicamente


determinada em cada etapa da sua evolução”. (pg. 14)

“Do ponto de vista da epistemologia científica, a necessidade histórica toma muitas


vezes a forma de uma configuração teórica precisa e é quase sempre uma questão
que se impõe por si naturalmente. Tal aparecimento «natural» dissimula
frequentemente o processo que está em ação e impede a comunidade científica,
apenas durante um certo tempo, de tomar consciência da nova situação teórica e
prática em que se encontra”. (pg. 15)

Responsabilidade sociais e políticas da Antropologia


“A história da etnologia é também a história das relações entre as sociedades
europeias e as sociedades não europeias. Logo desde o princípio, a etnologia
participa de um certo contexto político. [...] A ideologia colonial e a etnologia fazem
parte de uma mesma configuração. Esta dialética entre o contexto da prática e a
função objetiva da disciplina manifesta-se ainda hoje no caso da antropologia”.

Para uma Antropologia Geral


● “Qualquer ciência tem necessidade de definir prioridades na investigação”
(pg. 19).

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