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ANÁLISE DAS PLATAFORMAS REIVINDICATIVAS DA UGT E CGTP

2022 E 2023

ANDRÉ MONTEIRO PIRES


108739

UC RELAÇÕES DE TRABALHO E SINDICALISMO

MESTRADO EM ECONOMIA E POLÍTICAS PÚBLICAS

Este trabalho visa fazer uma análise crítica às reivindicações das confederações sindicais
CGTP e UGT. A análise é feita sob o ponto vista da necessidade de aplicação de medidas
que façam face a estas reivindicações, aplicação e consequências que essa aplicação
teria na vida dos trabalhadores, na economia e a importância que teriam para o
desenvolvimento económico.

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PLATAFORMA REIVINDICATIVA CGTP 2022

No seu Enquadramento das “PRIORIDADES DA POLÍTICA REIVINDICATIVA DA


CGTP-IN PARA 2022” a confederação sindical faz referência a um conjunto de
necessidades e problemas que toma como importantes e prioritários para a ação do
governo.

A situação económica e social é descrita pela CGTP como degradante e explica


essa degradação com a exploração dos trabalhadores e o aumento das desigualdades e
da pobreza, baseados nos baixos salários e na desregulação dos horários de trabalho. A
CGTP acusa ainda o Governo de estar amarrado às imposições da UE e de promover uma
legislação laboral que penaliza os trabalhadores para favorecimento do Capital (as
entidades patronais), legislação essa que foi aprovada em 2019 com o apoio dos
partidos que por norma se posicionam na defesa do capital (PSD e CDS) e da UGT,
notando-se assim uma divergência de posições entre confederações sindicais nesta
matéria.

A CGTP faz um diagnóstico de degradação da situação económica e social


referindo-se à pandemia como uma das causas dessa degradação, mas não deixa de
salientar que esta mesma degradação da social e económica é um corolário das políticas
adotadas nas últimas décadas, com políticas que fomentam a exploração, os baixos
salários e um sistema fiscal injusto que penaliza quem trabalha e que beneficia quem
detém o capital.

No diagnóstico que faz da situação económica e social, a Confederação Geral dos


Trabalhadores Portugueses fala ainda na utilização de banco de horas, e de turnos de
trabalho que não respeitam os direitos dos trabalhadores e acusa ainda a falta de ação
na luta contra a precariedade por parte do governo.

A CGTP, na sua análise da situação económica e social apresenta-se, assim, com


uma posição fortemente crítica do sistema económico instalado, mas diria mais – do
neoliberalismo materializado em políticas de desregulação e desproteção do
trabalhadores, perpetuadas por sucessivos governos, com diferentes orientações
partidárias mas não tão diferentes orientações políticas do ponto de vista prático.

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A CGTP refere ainda algo muito importante relativamente ao progresso
tecnológico e a forma como os seus resultados são distribuídos. A Intersindical Nacional
alerta para que os avanços científicos e tecnológicos que permitem a utilização de novas
técnicas de produção estão a ser usados com o objetivo de aumentar ainda mais as
desigualdades e a exploração dos trabalhadores e para intensificar os ritmos de
trabalho. Esta análise que a CGTP faz da distribuição dos resultados destas inovações faz
sentido e pode ser corroborada factualmente com os dados relativos à evolução da
produtividade do trabalho comparativamente com a evolução dos salários a estes
pagos. Ao longo dos últimos anos o aumento da produtividade do trabalho tem sido
superior ao aumento dos salários. Tal significa que o contributo que os trabalhadores
dão para a criação adicional de riqueza decorrente dessa produtividade não é
compensada por uma remuneração justa, que faça jus a essa criação de riqueza. Por
outras palavras, pode dizer-se que existe uma apropriação do rendimento gerado pelos
trabalhadores por parte do capital.

A apropriação que é feita dessa criação adicional de riqueza decorrente do


aumento de produtividade do trabalho poderia ser corrigida através do aumento dos
salários dos trabalhadores, uma vez que estes são a remuneração que assegura que os
trabalhadores têm uma retribuição pelo trabalho realizado e pelo contributo que deram
para a criação da riqueza.

As soluções apresentadas pela CGTP para a resolução destes problemas são de


variada ordem, mas requerem uma atuação direcionada essencialmente para a
alteração da legislação laboral e fiscal e mais política social e investimento público.

De uma forma genérica, a CGTP traça um rumo de resposta a estes problemas


baseado na “valorização do trabalho e dos trabalhadores” tendo também como objetivo
o de proporcionar um “forte impulso à recuperação da atividade económica”.

Uma primeira medida proposta pela CGTP seria a de “aumento geral dos
salários”, nomeadamente o SMN e a “valorização das profissões e carreiras”. Esta
medida serviria para que as famílias pudessem fazer face às suas necessidades. No
mesmo plano a CGTP acrescenta que não aceita que “em pleno século XXI, subsistam
situações de pobreza que afetam quem trabalha e trabalhou”

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No mesmo documento afirma-se ainda que a resolução destes problemas não
passa apenas pelo aumento da produção de riqueza, mas também (e principalmente)
por uma mais justa redistribuição da mesma.

Apesar de nem a CGTP nem a UGT dizerem isto, pelo menos de forma clara, é
importante que se diga – e seria muito importante que ambas as confederações o
dissessem – que na verdade é perfeitamente possível conseguir ter um modelo
económico socialista, que defenda os direitos dos trabalhadores e que coloque fim a
exploração do homem pelo homem e às desigualdades gritantes que se assistem, sem
que o modelo-base de economia de mercado (capitalismo) seja abolido. A isto se chama
o socialismo de mercado, que mais tarde evoluiu para a social democracia.

A confederação sindical não termina o seu enquadramento sem reiterar a


necessidade de redução do limite máximo de trabalho para 35 horas por semana, que
tem vindo a defender ao longo dos anos; bem como a importância de um sistema fiscal
mais justo, com uma redução das receitas fiscais com origem nos rendimentos do
trabalho e maior taxação sobre o capital.

A reforma do sistema fiscal português, a ser feita de acordo com estas


reivindicações da CGTP, proporcionaria uma mais justa redistribuição da riqueza,
proporcionando um maior equilíbrio entre os ganhos do capital e do trabalho e
reduzindo as injustiças sociais associadas à distribuição primária da riqueza, como a
existência de trabalhadores pobres.

No que aos salários diz respeito, a CGTP dá ênfase à tendência de aumento do


número de trabalhadores a auferir o Salário Mínimo Nacional na última década, como
pode ser observado no seguinte gráfico, fazendo também referência ao facto de os
trabalhadores da função administração pública terem tido uma atualização de apenas
0,3% dos seus salários, o que se traduz num perca real de rendimento muito significativa
(tendo em conta a existência de uma inflação francamente superior a esta atualização).

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Fontes: CGTP-IN com base dados DGERT e GEP; trabal. abrangidos pelo SMN no eixo da direita; o aumento salarial de
2021 refere-se ao 1º semestre

Ainda na questão salarial, a CGTP fala dos aumentos dos salários como
instrumento essencial para impulsionar as qualificações dos trabalhadores e dos mais
jovens em particular, não deixando de salientar o importante papel que este aumento
da remuneração dos trabalhadores deve ter também na redução das desigualdades. A
mesma confederação fala ainda na importância do aumento dos salários para a
promoção do emprego mediante a dinamização da economia.

Sob o ponto de vista mais concreto, relativamente à questão da valorização


salarial, a CGTP apresenta 3 propostas concretas:

- O aumento geral dos salários em todos os sectores de atividade e a valorização das


profissões e carreiras. Em cada sector ou empresa, tanto no privado, como no público,
no âmbito da contratação coletiva ou de ações reivindicativas de empresa, deverão ser
estabelecidos objetivos salariais que tenham como referência um aumento de 90€ por
trabalhador;

- O fim da política injusta e discriminatória dos trabalhadores da Administração Pública


com o aumento geral e real dos salários a partir de 1 de janeiro de 2022, a reposição e
efetiva valorização das carreiras, dos seus conteúdos profissionais específicos e a
revogação do atual sistema de avaliação do desempenho (SIADAP), incluindo os
sistemas específicos nele baseados;

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- O aumento do salário mínimo nacional para 850€ a curto prazo

Esta última proposta é sempre geradora de polémica e alguma euforia por parte
dos representardes do capital, no âmbito político e económico. Mas na verdade, o
aumento do SMN já em 2022 seria uma medida absolutamente razoável sob o ponto de
vista da portabilidade de gastos para as empresas.

Para além destas propostas a CGTP reivindica ainda a introdução de 25 dias de


férias bem como o combate ao trabalho temporário e ao outsorcing, que é um
instrumento que retira direitos e rendimento aos trabalhadores, pretendendo que este
tipo de trabalho seja substituído por vínculos efetivos nas empresas. A Confederação
pretende ainda que o governo reforce os meios de fiscalização (SEF, ACT, etc.) por forma
a combater as violações dos direitos humanos para estrangeiros e nacionais.

Existem ainda algumas reivindicações relacionadas com a formação contínua dos


trabalhadores nas empresas, o reforço dos direitos dos trabalhadores em casos de
insolvência ou o enquadramento da legislação laboral vigente no trabalho para as
plataformas digitais e quem se encontra em teletrabalho, bem como o reforço de meios
e exigências quanto à promoção da saúde no trabalho.

Contratação Coletiva:

A CGTP reivindica a eliminação da caducidade das convenções de contratação


coletiva, que existe desde 2003, e que são um entrave aos direitos coletivos dos
trabalhadores e ao progresso social. A confederação fala na necessidade de recolocar
no código do trabalho o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador, que é a
parte mais fraca das relações laborais.

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Fonte: CGTP-IN a partir de dados da DGERT e do GEP (QP); os valores dos QP para 2019 e 2020 são estimados com
base na evolução dos trabalhadores por conta de outrem (INE, Inquérito ao Emprego).

Com este gráfico acima apresentado, a CGTP mostra a tendência de crescimento


negativa da cobertura de contratos por contratação coletiva nas últimas duas décadas.

Desta forma, a CGTP defende uma reformulação do Código do Trabalho, com


alterações que reestabeleçam direitos aos trabalhadores que foram perdidos e retirados
do Código ao longo do tempo, nomeadamente esta questão da contratação coletiva.

Por fim, a CGTP faz um apelo ao desenvolvimento e investimento nos serviços


públicos e nas funções sociais do Estado, nomeadamente pela defesa de um sistema de
segurança social universal e solidário – para o qual apresenta medidas de caracter
exógeno como a promoção de emprego e de melhores salários, que proporcionam mais
receita para a segurança social; o Reforço do SNS – através da contratação de mais
profissionais, maior investimento e salários maiores, que possam atrair o melhores
profissionais para o SNS; O investimento e promoção de uma escola pública universal,
que garanta a igualdade e a promoção da cultura – através de medidas de maior
investimento, valorização dos profissionais de educação e reforço dos apoios no âmbito
da Ação Social Escolar e a garantia de gratuitidade da educação e ensino; a efetivação
do direito à habitação – através de maior construção de habitação pública com a criação
de um Programa Nacional de Habitação ou o alargamento do parque público de
habitação bem como outro tipo de apoios e a regulamentação da lei de bases da
habitação; por ultimo reivindica ainda uma mais justiça fiscal, com uma maior

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progressividade nos impostos e a eliminação de todos os regimes de paraíso fiscal, não
esquecendo de referir que a grande parte dos benefícios fiscais existentes a nível de IRC
são absorvidos pelas grandes empresas, havendo a necessidade de apoiar mais as
pequenas e médias empresas e taxar mais as grandes empresas, ou pelo menos não
conceder este conjunto atual de benefícios fiscais.

A Plataforma reivindicativa da CGTP para 2023 é idêntica à de 2022.

A Plataforma reivindicativa da UGT para 2022 não é muito diferente da da CGTP


apesar de se poderem salientar algumas diferenças. Como tem sido hábito, a UGT é
menos ambiciosa quanto ao valor do salário mínimo a propor em sede de concertação
social, tendo este sido, para 2022 de 715 euros (+50€), mantendo-se o compromisso
com o governo de até 2023 esse valor ser de 750€ e até final da legislatura ser de 1000€.

Na sua plataforma reivindicativa a UGT faz uma análise mais económica da


situação, procurando referir que em Portugal a carga fiscal sobre o trabalho é superior
à média europeia e a necessidade de uma reforma fiscal para uma fiscalidade mais justa
para com o trabalhador. Uma proposta concreta neste âmbito é a redução do IVA dos
bens essenciais para a taxa mínima de 6%.

Entre outras reivindicações a UGT fala ainda do aumento geral das pensões, mas
sem referir um número concreto.

A UGT propõe, a nível salarial, um aumento dos salários nos setores público e
privado entre 2% e 4% garantindo um aumento não inferior a 50€ para todos os
trabalhadores em 2022.

Sob uma perspetiva de resultados, podemos observar que a grande maioria das
reivindicações da CGTP e UGT não foram concretizadas pelo governo, apear de existir
algum aumento salarial os trabalhadores do público e do privado, mas que será inferior
à inflação verificada, o que significa uma perda de poder de compra e uma perda de
salário real.

Quanto às perspetivas para 2023, as medidas revindicadas por ambas as


confederações não apresentam grandes diferenças para as que foram apresentadas em
2022, notando-se, no entanto, uma convergência entre a UGT e o governo devido ao

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acordo assinado, com outras associações representantes dos patrões e o governo. A
CGTP não assinou este cordo e distancia-se da posição de UGT que é claramente
condescendente com os interesses do capital e não valoriza da mesma forma a luta dos
trabalhadores.

Em suma, as reivindicações da UGT e da CGTP são relativamente parecidas a nível


de conteúdo, mas nota-se uma maior aproximação da UGT às políticas do governo e
uma maior convergência de posições. A CGTP apresenta uma plataforma reivindicativa
mais ambiciosa e convergente com outras forças políticas mais à esquerda, assumindo
uma defesa dos direitos dos trabalhadores mais reforçada e exigente.

Sob uma perspetiva mais crítica, podemos afirmar que a UGT, contrariamente à
CGTP não assume uma posição de rotura com o sistema capitalista e com as políticas
neoliberais perpetradas por sucessivos governos nas últimas décadas. Há, aliás, alguma
tendência de convergência com esta confederação sindical e muitos dos governos. Esta
posição é perfeitamente criticável, uma vez que se pode considerar que a mesma como
conformista, colocando em causa a verdadeira defesa dos direitos dos trabalhadores.
Por outro lado, esta mesma forma de atuar da UGT pode ser considerada responsável e
cautelosa, se tivermos em conta que, contrariamente ao que acontece com a CGTP, a
UGT colherá mais frutos do diálogo com o governo e os representes dos patrões, uma
vez que o seu grau de abertura para cedências e negociação poderá considerar-se
superior. Nesta mesmo lógica, uma crítica que pode ser feita à CGTP pelos setores mais
centristas, será a de que esta confederação não tem interesse a chegar a acordos com
o governo e os patrões – uma vez que isso significaria interromper a luta de classes – e
uma vez que a CGTP se caracteriza politicamente por integrar um vasto conjunto de
marxistas, comunistas e socialistas, tal fará sentido. Mas a crítica fara sentido. Afinal, se
o objetivo da concertação social e das negociações será encontrar um consenso ou pelo
menos tentar aproximar posições para que o governo tome decisões o mais consensuais
ou o menos fraturantes possíveis, uma posição considerada mais radical de forte
inconformismo ou de indisponibilidade para fazer cedências será contraproducente com
os objetivos a atingir. A verdadeira questão é saber se essa crítica é realista – ou seja, se
a posição da CGTP é de facto radical e demasiado inconformista tendo em vista a
continuação da luta de classes cega e não o consenso – ou se essa crítica não fará

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sentido, e nesse caso a CGTP estará a fazer um bom trabalho, sendo intransigente com
a imposição contínua de políticas que prejudicam os trabalhadores e que criam
injustiças sociais.

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BIBLIOGRAFIA

“PRIORIDADES DA POLÍTICA REIVINDICATIVA DA CGTP-IN PARA 2022”;

“PRIORIDADES DA POLÍTICA REIVINDICATIVA DA CGTP-IN PARA 2023”;

“Política Reivindicativa UGT 2021-2022”;

“Política Reivindicativa UGT 2022-2022”

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