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INTERPRETAÇÃO BÍBLICA

SEMINÁRIO ADVENTISTA LATINOAMERICANO DE TEOLOGIA

DISCIPLINA: INTERPRETAÇÃO DE ROMANOS

PROF.: WILSON H. ENDRUVEIT IAE - JAN. 1982

DIGITAÇÃO: ROBERTO BIAGINI

ÍNDICE

I - Edificação - alvo

II - Princípios gerais especiais para as Escrituras


1. O fator espiritual
2. O sobrenatural nas Escrituras
3. A unidade da Bíblia
4. O princípio de “Só a Bíblia”
5. A Bíblia como a sua própria interprete
6. A analogia da fé

III. Princípios gerais de interpretação


1. O principio do contexto
2. O princípio filológico (interpretação gramatical)
3. Princípio histórico (interpretação histórica)
4. Princípio doutrinário (interpretação teológica)

Bibliografia
Interpretação Bíblica (Endruveit) 2
I - EDIFICAÇÃO - ALVO.

O ministério adventista está baseado na Palavra de Deus. Embora o


ministério adventista compreende vários aspectos e não deve ser
considerado como consistindo unicamente da pregação, não resta dúvida
que ele alcança a sua expressão máxima na pregação da Palavra de Deus.
Se esta é a natureza do ministério adventista, então uma das
considerações mais importantes do ministério adventista deve ser o uso
correto da Palavra de Deus. Paulo admoesta Timóteo a manejar bem a
Palavra de Deus (II Tim. 2:15, Grego: orthotoroeo, cortar em linha reta,
dirigir a palavra da verdade ao longo de uma linha reta) . Um pecado
fundamental dos falsos ministros é que eles abusam (Kapeleno ser
mascate, adulterar) da Palavra de Deus (II Cor. 2:17).
A preocupação principal no uso correto da Palavra de Deus é a sua
interpretação apropriada. E a disciplina teológica que tem como alvo a
interpretação apropriada das Escrituras é a exegese ou hermenêutica.
Portanto, uma boa exegese ou hermenêutica é a aspiração do ministro da
Palavra de Deus.
Hermenêutica bíblica é o estudo dos princípios que se referem à
interpretação das Escrituras. A hermenêutica bíblica pode ser dividida
em geral e especial. A hermenêutica geral trata dos princípios que se
aplicam à Bíblia toda e a hermenêutica especial trata de princípios que se
aplicam ã partes literárias da Bíblia, tais como, profecias, parábolas, etc.
Exegese e pregação estão intimamente relacionados. A pregação
nasce pela exegese. Na exegese o pregador se concentra no significado
do texto. Ele não está primariamente interessado na aplicação do
significado do texto para os dias de hoje. Na pregação, o ministro está
interessado na aplicação e relevância do texto para hoje. Exegese sem
aplicação é acadêmica; e pregação sem exegese é superficial ou errônea.
Bíblia, exegese e pregação formara uma série continua. A Bíblia é a
fonte e a norma da pregação; exegese é a averiguação cientifica do
significado do texto; e, pregação é a proclamação relevante do
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significado do texto à congregação. A Bíblia é a Palavra de Deus escrita;
exegese é a Palavra de Deus compreendida; e pregação é a Palavra de
Deus feita relevante ao tempo e lugar.
Não pode haver separação entre exegese e pregação. Um dos
principais propósitos da Bíblia é produzir um efeito espiritual na vida
daquele que a lê (2Tim. 3:15 e 16). Isto quer dizer que o alvo de toda a
interpretação é produzir resultados espirituais nos ouvintes. A simples
exegese ou interpretação, não é suficiente. Ela não é um fim, mas um
meio. Seu uso deve fazer mais do que desenvolver o significado correto
do texto; deve desenvolver um relacionamento correto com Deus.
Se a Palavra de Deus é o centro do ministério, então o ministro deve
tratar o seu texto exegeticamente antes de tratá-lo homi-leticamente. E se
ele deseja ser um exegeta responsável, então ele deve ter uma teoria certa
sobre a hermenêutica bíblica.

II - PRINCÍPIOS GERAIS ESPECIAIS PARA AS ESCRITURAS

Sob certos pontos de vista, a Bíblia é igual a outra literatura. Ela é


escrita em linguagem comum (humana); ela usa formas literárias típicas;
ela trata de assuntos da experiência comum; e muito de sua história se
relaciona com as outras histórias. Em todos estes assuntos que a Bíblia
tem em comum com outra literatura a Bíblia pode ser interpretada como
a outra literatura. Mas, as Sagradas Escrituras tem certos aspectos
peculiares que exigem princípios gerais especiais de interpretação se
quisermos fazer justiça â interpretação das Escrituras.

1. O FATOR ESPIRITUAL

Não há nenhuma qualificação espiritual necessária para com-


preender as obras dos clássicos. Entretanto, o requisito espiritual é
central na interpretação das Escrituras. A Bíblia, sendo um livro
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espiritual, exige do seu intérprete um mínimo de qualificação espiritual
que não é exigido do interprete dos clássicos.
Foi Paulo que observou que a Palavra de Deus é espiritual e,
portanto, somente podia ser compreendida espiritualmente (I Cor. 2: 10,
14).
Há dois aspectos a serem considerados quanto à espiritualidade da
Palavra de Deus. Deus atua no homem através do Espírito Santo que
ilumina-lhe a mente e testifica-lhe a veracidade das verdades divinas.
Mas o homem sobre quem o Espírito Santo atua deve ser um participante
do Espírito na regeneração. As Escrituras serão mais provavelmente
entendidas, quando alguém convertido permite ao Espírito Santo
iluminar-lhe a mente ao interpretar as Escrituras. Porém, dependência do
Espírito não é substituto para o estudo.
Há os que procuram um critério exegético totalmente objetivo ou
cientifico e a função do Espirito Santo na exegese é rejeitada como
subjetivismo ou pietismo. Mas convém lembrar a estes que nenhum
erudito em outras áreas está completamente livre de disposição subjetiva,
e completamente livre de disposição emocional ou cultural. Não se pode
negar a influência do Espirito Santo sobre o intérprete e
consequentemente sobre sua exegese, mesmo que não seja possível ex-
plicar a ação do Espirito. A obra do Espirito Santo, embora intangível,
pode ser mais real do que todos os princípios científicos aplicados ao
texto.

2. O SOBRENATURAL NAS ESCRITURAS

O ministro adventista aceita o relato sobrenatural no texto. Desde o


tempo do estabelecimento da ciência moderna e da filosofia moderna, o
erudito secular tem rejeitado o supernaturalismo cristão. Para ele Deus
deixou de ser pessoal e transcendente, para se tornar numa força
impessoal que permeia toda a natureza e nela age por leis imanentes.
Desde o século XVIII muitos teólogos têm defendido a mesma posição.
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Em resultado disso todo o relato sobrenatural das Escrituras é rejeitado
sob alegação de que em culturas pré-criticismo, o sobrenatural está em
tudo. Portanto, afirmam eles, não é de admirar-se que o aspecto
sobrenatural abunde nas Escrituras, pois elas foram escritas nos tempos
pré-criticismo. O relato sobrenatural nas Escrituras é tratado como em
qualquer documento antigo que relata um acontecimento sobrenatural.
O ministro adventista crê que há uma diferença radical entre o
relato sobrenatural da Bíblia e de outra literatura. Quando confrontado
com o sobrenatural no texto bíblico, ele o aceita como um importante
elemento da revelação bíblica.

3. A UNIDADE DA BÍBLIA

A revelação progressiva defendida pelos protestantes leva â pratica


de enfatizar a diversidade entre os Testamentos a tal ponto, de destruir a
unidade entre eles. Segundo eles, há uma progressão (avanço) nas
Escrituras e a não ser que este princípio de desenvolvimento seja
reconhecido não haverá uma clara exegese das Escrituras.
Revelação progressiva significa que Deus toma o homem onde Ele
o encontra, com suas noções a respeito de Deus, com os seus princípios
éticos e procura desenvolvê-lo mais e mais. Revelação significa também
que ao chegarmos no NT, os propósitos de Deus tornam-se mais claros e
mais plenos. Inclui o desenvolvimento da ideia sobre Deus, a purificação
dos ideais éticos, a espiritualização do culto e progresso na redenção
divina. É por causa da revelação progressiva, dizem eles, que a Igreja
encontrou a revelação plena, sua doutrina suprema de Deus, seu clímax
da revelação e seus finais imperativos éticos no NT e não no VT
A revelação progressiva significa duas coisas ao intérprete. Se
houver qualquer tensão entre a mais velha revelação (VT) e a mais nova
(NT), a mais velha deve dar lugar à mais nova. Embora, o VT contem
material ético importante, a teologia cristã, deve consci-entemente
construir suas formulações éticas finais do NT. Além disso, significa que
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não há uma uniformidade de importância nas Escrituras. O lugar de um
texto nas Escrituras, determinará o método da exegese e o peso teológico
que se atribuirá a ele.
O ministro adventista aceita a unidade dentro dos Testamentos e
entre os testamentos Esta unidade é aceita devido à sua origem comum
em Deus, em Jesus Cristo, e na inspiração do Espírito Santo. Ambos os
Testamentos formam um todo inseparável, um dependendo do outro e
um iluminando o outro.

4. O PRINCÍPIO DE “SÓ A BÍBLIA”

Este princípio insiste no fato de que só as Escrituras são a norma de


caráter e de fé, e, exclui toda autoridade humana. Ele se baseia no
reconhecimento da inspiração da Bíblia, da sua unidade e canonicidade.
Quanto aos escritos de E. G. White, o ministro adventista aceita o
fato do Espírito Santo tê-los inspirado da mesma maneira que inspirou os
profetas bíblicos. Contudo, eles não substituem a Bíblia, nem são
qualquer acréscimo às Escrituras. Os escritos de E. G. White, têm um
papel subordinado ao da Bíblia e visam dar uma compreensão mais clara
dela, exaltá-la, atrair a mente do povo para ela, chamar a atenção para
verdades negligenciadas, fixar verdades inspiradas já reveladas.
Em virtude dos escritos de E. G. White serem um comentário
inspirado sobre a Bíblia e explicarem a sua aplicação â vida, o ministro
adventista afirma que eles têm uma autoridade superior a de outros
escritos, excetuando unicamente a Bíblia. Eles são para ele uma fonte
constante de informação e orientação na interpretação bíblica.

5. A BÍBLIA COMO A SUA PRÓPRIA INTERPRETE

Isto significa que a Escritura toda interpreta parte da Escritura e


consequentemente nenhuma parte das Escrituras pode ser interpretada de
tal maneira que venha deformar o ensino da Escritura toda. Em outras
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palavras este princípio quer dizer que a Escritura toda é o contexto e guia
para a compreensão de passagens isoladas da Escritura. Assim,
passagens secundárias ou obscuras não podem ser usadas como pilares
da verdade.
Este principio também tem sido chamado de "círculo herme-
nêutico", A Escritura toda pode ser aprendida somente pela interpretação
de parte por parte. Contudo, nenhuma parte pode estar isolada do todo.
De maneira que o intérprete deve seguir o círculo: da parte ao todo e do
todo à parte.
O princípio de auto-interpretação da Escritura foi usado por Jesus
(Luc. 24:27), recomendado por Paulo (I Cor. 2:13) e Pedro (2Ped. 1:20).
E. G. White repete insistentemente o fato de que a Bíblia explica-se por
si mesma. "A Bíblia explica-se por si mesma. Textos devem ser
comparados com textos. O estudante deve aprender a ver a palavra como
um todo, e, bem assim, a relação de suas partes." (Educação, pg. 189).

6. A ANALOGIA DA FÉ

Usa-se este conceito de analogia da fé para exprimir a ideia da


constante e perpétua harmonia da Escritura nos pontos fundamen-tais de
fé e prática deduzidos daquelas passagens onde eles são discutidos pelos
autores inspirados de maneira direta ou explícita, e em linguagem clara,
plena e inteligível.
A suposição básica aqui é de que há uma cadeia de verdades na
Na Escritura e por isso todas as doutrinas devem estar combinadas,
ou estar ligadas uma a outra. Isto quer dizer que a interpretação de
passagens específicas não pode contradizer o ensino geral da Escritura
sobre um ponto. É o mesmo que dizer que a Escritura interpreta a si
mesma. Também sobrepõe-se ao princípio da unidade da Escritura.
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III. PRINCÍPIOS GERAIS DE INTERPRETAÇÃO

1. O PRINCIPIO DO CONTEXTO

Há porções da Escritura em que o contexto não fornece nenhuma


ajuda ao intérprete para chegar ao significado. Mas, de um modo geral, o
contexto deve ser rigorosamente considerado.
a. A primazia do contexto. A negligência do contexto é uma das
causas comuns da interpretação errônea e da aplicação irrelevante. O
contexto é básico porque força o intérprete a examinar a total linha de
pensamento do escritor. O contexto é importante porque o pensamento é
geralmente expresso numa série de ideias relacionadas. Às vezes, a
pessoa muda radicalmente o seu pensamento da direção que vinha vindo.
Outras vezes os pensamentos estão ligados vagamente por um tema
geral. Mas mesmo nesses casos, o significado é quase sempre controlado
pelo que precede e pelo que segue.
b. Variedades de situações de contexto.
(1) Contexto imediato
A primeira responsabilidade de cada intérprete é notar cui-
dadosamente o que precede e o que segue qualquer palavra, verso, ou
unidade maior a qual ele esteja interpretando. Isto implica em voltar ou
adiantar dois ou três parágrafos. A divisão de capítulos nem sempre
serve como linha divisória. Talvez seja preciso, retroceder-se ou
adiantar-se um capítulo para se obter o contexto verdadeiro.
Procurando observar o que precede e o que segue uma palavra,
texto, ou unidades maiores, o intérprete terá uma oportunidade melhor
para ver o que o escritor estava procurando transmitir aos seus leitores.
(2) Contexto no mesmo livro
Material paralelo pode ser encontrado no mesmo livro. Material
paralelo significa as palavras ou ideias idênticas num contexto diferente
ao que se está estudando. Quando o paralelo é encontrado em outro lugar
do mesmo livro, deve-se estar atento para ver se a apresentação mais
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completa do assunto nos diferentes contextos ajuda a esclarecer o
significado em qualquer um dos contextos.
(3) Contexto em outros livros (a Bíblia como um todo)
Material paralelo em outros livros, embora de autores diferentes,
espera-se que tenham alguma semelhança de significado. Isto é
especialmente verdade nas Escrituras, pelo fato dos vários autores serem
membros da mesma comunidade e guiados pelo Espirito Santo.
Este tipo de estudo comparativo de contexto exige um trabalho
árduo e cuidadoso. Mas é compensador. Necessário é também dar uma
palavra de alerta. Na busca do significado de palavras ou ideais idênticas
pelo método comparativo de contexto, o intérprete não deve presumir
que a fé e a prática bíblicas, sejam idênticas às das culturas adjacentes.
Um escritor bíblico pode empregar palavras ou ideias usadas por estas
culturas e religiões adjacentes, dando-lhes, porém, ura significado típico
à compreensão e fé bíblicas e um novo significado estranho ao
pensamento não hebraico. Outras vezes as culturas adjacentes podem ter
sido influenciadas pelo pensamento hebraico, mas, usam conceitos
hebraicos com novos significados ou degenerados.
0 significado de palavras ou expressões emprestadas pelo escritor
bíblico será determinado pelo contexto bíblico.
(4) Ausência de contexto. Muito de Provérbios e Eclesiastes
consiste de unidades individuais que são completos em si mesmos. Nos
Evangelhos encontramos declarações de Jesus cujo contexto imediato
não ajuda muito o intérprete. 0 contexto imediato não lhe fornece a
informação que lhe daria uma compreensão mais profunda do
significado (Luc. 12:49-59).
Neste caso, onde o contexto imediato é de pouco ou nenhum valor,
o intérprete deve procurar paralelos genuínos do mesmo período ou do
mesmo tempo (Ex.: A parábola do rico e Lázaro).
c. Conclusão:
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Para que o intérprete possa fazer uso apropriado do contexto, ele
deve conhecer o conteúdo bíblico. Resumidamente o princípio do
contexto significa:
(1) Observar cuidadosamente o contexto imediato - aquele que
precede e segue à palavra ou passagem em estudo.
(2) Observar cuidadosamente, no mesmo livro, a existência de
material paralelo ao que se está interpretando. 0 intérprete deve estar
atento ao propósito, e desenvolvimento do pensamento no livro.
(3) Observar cuidadosamente qualquer material paralelo no outro
livro pelo mesmo autor ou em outros livros de autores diferentes. Deve
ser considerado o propósito e desenvolvimento do pen-samento nesses
livros.
(4) Onde o contexto imediato é de pouco ou nenhum valor, deve o
intérprete, procurar paralelos genuínos do mesmo período ou do mesmo
tempo.
(5) Deve-se ter em mente, que quanto menor a quantidade de
material a ser interpretado, maior é o perigo de se ignorar o contexto.
Nenhuma máxima é mais conhecida e mais desobedecida do que esta:
"Um texto sem contexto é apenas um pretexto."

2. O PRINCÍPIO FILOLÓGICO (INTERPRETAÇÃO GRAMATICAL)

O método filológico consiste no estudo técnico e comparativo das


palavras. é usado aqui como sinônimo de linguística. É também chamado
às vezes de método gramático ou gramático-histórico, e inclui além de
linguística, história, cultura adjacente e criticismo literário. Não estamos
usando-o neste sentido.
O intérprete pode proceder de duas maneiras. Ele pode iniciar com
a frase (sentença), com a expressão do pensamento do autor como um
todo, e então prosseguir para os pormenores, para a interpretação de
palavras e conceitos separadamente. Ou, ele pode começar com o estudo
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de palavras em separado e prosseguir a considerar a frase, o pensamento
como um todo.
Seguiremos a última ordem por motivos práticos.
a. Estudo de palavras.
A hermenêutica geralmente começa com o estudo de palavras
porque a palavra é o menor elemento de comunicação. E ao estudar a
palavra, estuda-se primeiro o seu significado literal. Este é um principio
fundamental de exegese: tomar a palavra sempre no sentido literal,a
menos que haja indicações bastante claras para fazer o contrário.
As palavras podem ser estudadas de várias maneiras:
(1) Palavras podem ser estudadas etimologicamente. Isto significa,
que o intérprete, procurará compreender os componentes que formam a
palavra. A palavra pode ter prefixos sufixos e outras vezes ela é
resultado de uma combinação de palavras. A palavras bispo é derivada
de episkopos. É uma combinação de epi que significa "sobre", e skopeo
que significa olhar. Daí significar supervisor/ superintendente.
A análise etimológica das palavras é de valor limitado, e não é
aconselhável que o intérprete se dedique muito em investigações
etimológicas.
(2) Palavras podem ser estudadas comparativamente.
Mais importante do que o significado etimológico, é descobrir o
sentido em que o autor bíblico usou a palavra. Embora seja difícil a
tarefa, o intérprete pode consegui-la pelo método indutivo:
(a) averiguar, com o auxílio de concordâncias, onde é encontrada a
palavra.
(b) determinar o significado da palavra em cada instância onde ela
ocorre. (Exemplos: as palavras alma e espírito).
Outro aspecto de estudo comparativo de palavras é o estudo de
sinônimos e antônimos. Ao notar que palavra o escritor considera como
um sinônimo ou antônimo para outra palavra, dá ao intérprete uma ideia
(dica) sobre que significado o escritor atribui à primeira palavra.
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O estudo dos quatro evangelhos do ponto de vista de expressões
sinônimas é muito compensador. Dentre muitos exemplos, citaremos
três: (Mt. 20:21 e Marcos 10:37 - "em seu reino" e "em sua glória são
usadas como sinônimos. Igualmente, as expressões "reino de Deus" e
"reino dos céus" em Mat. 19:23 e 24; e "entrares na vida" e "entrar no
reino de Deus" em Mat. 18:9 e Marcos 9:47, são expressões que
significam a mesma coisa.
(3) Palavras podem ser estudadas historicamente (usus loquendi).
No estudo de palavras isoladas, o mais importante não é o seu
significado etimológico, nem os vários significados que ela adquiriu
gradualmente. O essencial é o seu significado na sequência em que elas
ocorrem num determinado texto. O intérprete deverá determinar se as
palavras são usadas no seu sentido geral ou especial, se no sentido literal
ou figurado. O contexto no qual a palavra é usada, deve determinar o
sentido dela.
O estudo histórico de palavras sempre inclui pesquisa em línguas
cognatas e em grandes versões antigas do VT e Novo Testamento.
Temos um exemplo clássico deste tipo de pesquisa no famoso
Theological Dictionary of the New Testament de Kittel. Uma palavra é
estudada no seu uso do grego clássico; depois no hebraico bíblico;
depois na Septuaginta; depois no período interbíblico com especial
referência ao aramaico; depois de maneira extensa no grego do N.T.; e
em alguns casos, na literatura patrística antiga.
Aqui vai uma palavra de alerta. O estudo de palavras idênticas em
outras línguas exige uma cuidadosa discriminação e nem sempre ajuda o
intérprete a fixar o exato significado de uma palavra bíblica, pois,
palavras correspondentes em línguas diferentes nem sempre tem
exatamente a mesma origem e significados. Além disso, não é seguro
sempre concluir do significado de uma palavra no grego clássico o seu
significado no NT, pois, o cristianismo tem, em muitos casos, dado às
palavras um novo conteúdo. E isto também diz respeito ao VT.
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É preciso cuidado para não se ler, no conteúdo bíblico, o conteúdo
de cultura e religiões não-bíblicas, pois, isso resultará inevitável-mente
em distorções e erros de interpretação. Isto pode ser evitado pela
investigação minuciosa das semelhanças e diferenças que existem em
palavras idênticas das línguas bíblicas e cognatas. E é o contexto bíblico
que irá determinar qual o novo conteúdo do significado da palavra nos
escritos bíblicos.
Seria irrealístico esperar de um pastor distrital fazer uma pesquisa
extensa em palavras bíblicas nas línguas originais. Mas há coisas que ele
pode fazer para compensar isto. Ele pode desenvolver um gosto por
palavras bíblicas traduzidas ao português ou inglês e fazer uso de
dicionários. Ele pode usar léxicos que classificam a maioria dos usos
(significados) das palavras hebraicas e gregas.
b. O estudo de frases (sentenças).
O estudo de palavras é útil, mas limitado. Por isso, da in-
terpretação de palavras isoladas, o intérprete, prossegue ao de palavras
em seu relacionamento mútuo, ou o pensamento. Sintaxe é um estudo
do relacionamento das palavras, frases e cláusulas. A compreensão do
relacionamento das palavras, frases e cláusulas afeta a compreensão do
pensamento. De maneira que o intérprete precisa conhecer as categorias
de sintaxe para penetrar mais fundo no pensamento do texto.
Não é possível e nem necessário discutir aqui a gramática das
línguas bíblicas. Mas apenas destacar:
(1) O intérprete da Bíblia deve ter à sua disposição gramáticas
anotadas para consulta.
(2) O intérprete deve ter um conhecimento dos elementos básicos
de sintaxe: substantivos, verbos e cláusulas, etc.
(3) O estudo de frases envolve atenção estrita ao contexto.
(a) O contexto de qualquer passagem bíblica é a Escritura toda.
(b) O segundo contexto de qualquer passagem é o Testamento onde
ela se encontra (VT ou NT).
Interpretação Bíblica (Endruveit) 14
(c) O terceiro contexto de qualquer passagem é o livro onde ela se
encontra.
(d) O quarto contexto de qualquer passagem é o material imedia-
tamente antes dela e imediatamente depois dela.
(4) O estudo de frases leva em conta os paralelismos. Este princípio
é quase o mesmo que o estudo de palavras sinônimas, apenas trata com
porções maiores. Os paralelismos podem ser:
(a) Verbais: Neste caso há uma concordância de expressões onde o
conteúdo ou a ideia e a mesma em dois textos. Por exemplo, estudar
todas as passagens que contêm a ideia do "Filho do Homem" Ou
examinar todos os textos em que Paulo usa a ideia de sarx (carne).
(b) Conceituais: (assuntos, temas) Os conceitos são idênticos nos
textos e não necessariamente as palavras. Romanos 3 e Hebreus 10,
ambos discutem a expiação. Apocalipse 20 e I Cor. 15 tratam do mesmo
assunto da ressurreição dos mortos.
(c) Complementares: Quando dois ou mais livros bíblicos
descrevem os mesmos eventos, para ter a visão completa, o intérprete
precisa primeiro comparar estes relatórios paralelos. (Ex.: Jesus humano
e divino)
(5) O estudo de frases considera as expressões idiomáticas e as
figuras de linguagem.
(6) O estudo de séries de frases ou unidades literárias considera
ainda, segundo muitos interpretes, os elementos históricos e culturais, e,
o criticismo da forma literária. Não é do nosso interesse discutir aqui a
metodologia do "form geschichte", hoje tão amplamente aplicada nos
estudos do NT e VT pelos liberais .

3. PRINCÍPIO HISTÓRICO (INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA)

Embora a interpretação gramatical e histórica estão intimamente


relacionadas e não podem ser completamente separadas, é, não somente
possível, como também desejável separá-las neste estudo.
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Interpretação histórica, segundo é entendido aqui, não deve ser
confundida com o método-histórico-crítico de interpretação usado pelos
liberais. O termo aqui é usado para significar o estudo das Escrituras à
luz daquelas circunstâncias históricas que põem o seu selo nos diferentes
livros da Bíblia. Para diferenciar da interpretação gramatical que se
refere ao estudo das línguas originais da Bíblia, a interpretação histórica
se ocupa com os elementos histórico-culturais do texto, tais como,
referências a pessoas, acontecimentos, costumes sociais, assuntos de
geografia (cidades, rios, montanhas, etc), flora e fauna. Inclui também a
tentativa de recompor o contexto político-social do passado, a
compreensão dos autores, seus livros e ouvintes da época.
a. O autor
Na interpretação histórica de um livro é natural que se pergunte
antes de tudo sobre o autor do livro. Porém, o interesse desta indagação
não consiste na descoberta do nome do autor, e, sim na busca de uma
familiaridade com o autor, isto é, um interesse de conhecer sua
personalidade, seu pensamento, etc.
A melhor maneira de se compreender os escritores bíblicos é
através do estudo diligente dos seus escritos. Aquele que deseja conhecer
Moisés, deve estudar o Pentatêuco, especialmente os últimos quatro
livros. Para conhecer Paulo será necessário ler a sua história, conforme
descrita por Lucas em Atos e também estudar suas epístolas.
A familiaridade com o autor do livro irá facilitar a compreensão
apropriada do livro.
b. Circunstâncias históricas do autor.
Em seu esforço para compreender a mensagem do autor, o in-
térprete deve familiarizar-se com as circunstâncias históricas em que
viveu o autor. Elas são de um caráter geral, mas são essenciais para se
obter o conhecimento do ambiente cultural da época sem o qual a
interpretação será prejudicada. As circunstâncias políticas, sociais e
religiosas devem ser objeto de estudo do intérprete.
c. Circunstâncias peculiares aos livros.
Interpretação Bíblica (Endruveit) 16
Além das circunstâncias gerais da vida do autor, há outras mais de
caráter especial que influíram os seus escritos diretamente. Interpretação
apropriada dos livros, naturalmente, requer que se de importância a eles.
(1) Os leitores e ouvintes originais.
Para uma interpretação apropriada de um livro é de importância
saber para quem ele foi dirigido. A condição dos leitores não somente
determina o caráter geral do livro, como também explica muitas de suas
particularidades. A familiaridade com os leitores originais iluminará
muitas vezes, as páginas de um livro.
(2) O propósito do autor. É importante também saber o motivo que
levou o escritor bíblico a escrever o livro. Quais os propósitos do autor
em escrever o livro? Por que foi ele escrito?
d. Outros elementos básicos
(1) O intérprete deve estudar a geografia bíblica. O intérprete
precisa conhecer as informações sobre montanhas, rios, planícies,
colheita, flora, fauna, estações e clima. Não é preciso elaborar este
ponto, mas, apenas salientar que cada evento na Escritura tem o seu local
geográfico.
(2) O Intérprete precisa estudar a história bíblica.
Cada evento na Escritura não só tem uma referência geográfica
como também uma referência histórica.
(3) O intérprete deve estudar a "cultura bíblica".
A palavra cultura é aqui empregada no sentido estritamente
antropológico. Os antropologistas dividem a cultura de um povo em
cultura material e social. A cultura material refere-se às coisas:
ferramentas, objetos, armas, casas, vestes, etc. A cultura social refere-se
aos costumeis, práticas, ritos, etc. de uma sociedade.
Exemplos de cultura material encontramos em Atos 1:13 (subiram
ao cenáculo - sala superior), João 13-23-24 (móveis para reclinar); Mt.
6:30 (o pão era feito sobre bandejas com erva); Mat. 25:1-13(as
lâmpadas); etc.
e. Conclusão.
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Os principais recursos para a interpretação histórica da Escritura
são encontrados na Escritura mesma. Distinta de todas as outras fontes, a
Escritura contêm a verdade, e, por isso a sua informação merece a
preferência. Este lembrete não é supérfluo em vista do fato de que
muitos hoje estão inclinados a dar mais crédito aos autores seculares do
que a Palavra de Deus. O consciencioso e reverente intérprete verá em
primeiro lugar o que a Bíblia tem a dizer.
Novamente deve-se concordar que é impossível para o pastor
distrital pesquisar sobre todos estes assuntos apresentados até aqui. O
melhor recurso para ele são os comentários. Um bom comentário
preocupa-se com todas as coisas que mencionamos aqui. Dar-lhe-á uma
introdução ao livro, discutirá as palavras de maior importância e detalhes
vitais de gramática. Também lhe fornecerá um bom material histórico.
Contudo, devem ser usados com discrição. O leitor ao consultá-los não
pode supor que são infalíveis e corretos em tudo. Uma avaliação da
qualidade dos comentários exige uma grande habilidade e muito
conhecimento técnico. Muito cuidado deve ele ter ao consultar os
comentários escritos nos moldes da metodologia liberal. Talvez, melhor
seria não perder tempo no manuseio de tais comentários. Por que não
buscar, antes de todos os outros, os comentários dos livros do Espírito de
Profecia sobre as mensagens da Bíblia?

4. PRINCÍPIO DOUTRINÁRIO (INTERPRETAÇÃO TEOLÓGICA)

A interpretação doutrinária começa onde a interpretação gramatical


termina. O princípio ou interpretação doutrinária é caracterizado por:
(1) uma extensão do significado gramatical para descobrir o
significado mais completo da Escritura; e
(2) um apanhado de todos os dados bíblicos sobre um determina-do
assunto.
A justificação para a interpretação doutrinária é o reclamo da
Escritura de ser a revelação de Deus. Se houve uma revelação de
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proposições (Deus se revelando a Si mesmo, coisas, ensinos), como
cremos, então a interpretação doutrinária (ou interpretação teológica) é
possível. A crença na revelação genuína de Deus na Escritura, então,
leva-nos a crer na possibilidade da interpretação doutrinária da Escritura.
O Senhor Jesus Cristo destacou o ensino como um dos grandes
itens da Sua comissão (Mt. 28:19-20). Ele mesmo foi, no Seu ministério,
um pregador de doutrinas. O povo maravilhava-se de Sua doutrina (Mt.
7:28). Ele alegava ser a Sua doutrina de Deus (João 7: 16-17).
Paulo fala de se obedecer de coração à doutrina (Rom. 6:17) e
adverte contra as falsas doutrinas (Efé. 4:14). Ele aconselha Timóteo a
cuidar da sã doutrina, e faz pelo menos doze referências à doutrina nos
livros a Timóteo. Em 2Tim. 3:16-17, o primeiro benefício da Escritura
mencionado é ensino (doutrina).
Doutrina dá à fé cristã a forma e o conteúdo. Os princípios que
governam os estudos doutrinários da Escritura são:
a. O intérprete ou teólogo deve ter experimentado o novo
nascimento e permanecer no círculo da revelação divina. Ele vai à
Escritura não como um especulador religioso, mas, como um homem
sério, reverente e interessado no mais profundo significa-do da
revelação. Ele procura, através do estudo da Bíblia, um relacionamento
pessoal com Deus. A interpretação doutrinária deve ser empreendida
dentro deste círculo de fé e entrega, e não como uma investigação
objetiva, abstrata e impessoal.
b. O intérprete considera a Bíblia como uma unidade e procura
entendê-la como um todo.
O objetivo supremo da interpretação bíblica é não somente
compreender as palavras, frases, o livro, mas também compre-ender o
propósito e a vontade de Deus na Bíblia como um todo. E a primeira
pergunta que confronta o intérprete diz respeito ao relacionamento dos
Testamentos.
(1) A relação entre o VT e o NT
Interpretação Bíblica (Endruveit) 19
Pelo fato da tendência de enfatizar a descontinuidade entre os
testamentos que leva a se conceber o VT como inferior ao NT, não é
supérfluo chamar-se a atenção para o fato de que eles devem ser
interpretados como uma unidade. Deus é o autor de ambos. Ambos
contêm a mesma doutrina de salvação, pregam o mesmo Cristo e exigem
do homem os mesmos deveres religiosos e éticos. Por isso, afirmamos
que o VT e NT constituem uma unidade, e, estão tão intimamente
relacionados um ao outro que o NT não pode ser compreendido sem o
VT e nem o VT pode ser completamente compreendido sem o NT
Apenas quando for conhecida e mantida esta relação recíproca entre
os Testamentos, quando o VT e NT forem vistos como um todo
inseparável de igual importância, é que o intérprete poderá compreender
a profundeza de significado contida na Escritura.
(2) O significado dos diferentes livros da Bíblia no organismo da
Escritura.
A pergunta que vem em seguida é: como cada livro se relaciona
com a Bíblia como um todo.
A Palavra de Deus é uma produção orgânica e consequentemente os
diversos livros que formam a Bíblia estão organicamente rela- cionados
um ao outro. O Espírito Santo dirigiu de tal maneira os autores ao
escreverem os Livros da Bíblia que seus escritos são mutuamente
complementares. É perfeitamente correto respeitar os diversos aspectos e
ênfases apresentados pelos autores bíblicos porque Deus em Sua
providência revelou a estes homens inspirados verdades e aspectos de
verdade como achou por bem fazer.
Desta maneira cada escritor contribuiu com a sua forma exclusiva e
completa, tal como Deus o desejou, para que a Sua verdade fosse revela-
da na Bíblia. Embora cada um deles apresentar ênfases variadas, os seus
pontos de vista teológicos são complementares. Negligenciar qualquer
um deles representa perda para a perspecti-va total do que se encontra
revelado na Escritura.
Interpretação Bíblica (Endruveit) 20
Se o intérprete, que estuda a Bíblia, tem isto em mente, ele será
ajudado a ver, por exemplo, que Paulo e Tiago, não ensinavam doutrinas
conflitantes, mas simplesmente consideram a mesma verdade de ângulos
diferentes, e, são portanto, mutuamente complementares.
(c) A preocupação do intérprete deve consistir na interpretação
literal da Bíblia. A interpretação que ignora este princípio controlador
leva ao confuso labirinto da exegese patrística e medieval.
(d) O intérprete deve ter em mente que exegese precede doutrina ou
teologia.
Podemos conhecer a verdade de Deus somente por uma correta
exegese da Escritura. Por isso, exegese precede doutrina ou teologia.
Uma interpretação válida da mensagem bíblica precisa averiguar
primeiro o que ela quer dizer. Os recursos usados para se chegar a isto
não devem ser externos (lógica, filosofia, ciência), mas apenas na base
duma metodologia intrínseca, isto é, a da auto-interpretação da Bíblia,
com sua ênfase sobre o significado literal do texto e do reconhecimento
de que o contexto é toda a Bíblia. O uso de principio externo de
interpretação resultará numa distorção da mensagem bíblica.
(e). O intérprete ou teólogo não deve desenvolver sua compreen-são
além da evidência bíblica.
Muitos dos problemas teológicos ou doutrinários são oriundos do
fato de teólogos terem ido além da informação bíblica e terem feito
perguntas para as quais a revelação não dá respostas.
"É a obra prima dos enganos de Satanás conservar o espírito
humano a pesquisar e conjecturar com relação aquilo que Deus não
tornou conhecido, e que não é desígnio Seu que compreendamos."
(Conflito dos Séculos, p. 566).
Hâ muitos pontos teológicos sobre os quais não temos um
pronunciamento decisivo porque a Escritura silencia sobre eles. Por
exemplo: Qual o exato relacionamento entre as duas naturezas de Jesus
na cruz, ao morrer? Até que ponto foi o Seu sofrimento na cruz?
Interpretação Bíblica (Endruveit) 21
Perguntas idênticas poderíamos fazer sobre a Encarnação e a
Trindade. Tão necessitados de informação somos sobre estes pontos que
muitas das nossas afirmações teológicas são feitas por negação. Isto é,
não sabemos exatamente o que a verdade é, mas sabemos o que a
verdade não é.
Muitas são as perguntas sobre o Céu; Comeremos no Céu? Ves-tir-
nos-emos? Reconhecer-nos-emos no Céu? Lembrar-nos-emos dos
queridos não-salvos? Viveremos em família? Veremos a Trindade ou
apenas a Jesus? As crianças que morrem se salvarão? Quais? Que língua
falaremos?
A melhor resposta não será aquela que for a mais inteligente, nem
aquela que apele mais aos sentimentos, mas, será a que estiver dentro
dos limites da informação bíblica sobre estes assuntos. Sobre o que a
Escritura nada fala, seremos sábios sendo silentes. Deut. 29:29 deve ser
o nosso princípio nestes assuntos.
f. Na busca do significado implícito da Bíblia, o intérprete deve
permitir que o escritor inspirado apenas funcione.
A Palavra de Deus contêm uma profundeza e riqueza de pensa-
mento que é insondável. Isto é evidente, não apenas dos fatos, tipos,
símbolos e profecias que a Bíblia registra, mas também do que a Bíblia
contêm implícito. Mesmo no caso de composições humanas nós
distinguimos entre aquilo que é explícito e o que é implícito.
E como o homem conhece apenas em parte, nem sempre ele vê as
implicações do que ele diz ou escreve.
Não assim no caso de Deus na Escritura. O conhecimento de Deus é
onisciente, e sempre é um conhecimento consciente. Ao dar Sua Palavra
aos homens pelos profetas, Deus estava perfeitamente cônscio, não
apenas de tudo o que era dito, como também o que estava implícito. E o
Revelador não apenas sabia o que os homens iam deduzir por inferência,
mas também planejou que assim fizessem.
É preciso dar ênfase aos seguintes pontos com respeito ao
significado implícito:
Interpretação Bíblica (Endruveit) 22
(1) O significado implícito nada tem a ver com o método alegórico
de exegese.
(2) Não se pode presumir que todo o texto em si possui um
significado implícito.
(3) O sentido implícito que Deus pretendia transmitir por
intermédio de um escritor bíblico é desvendado por outro escritor
inspirado. Isto quer dizer que a inspiração é o orientador seguro para se
chegar ao significado implícito de qualquer parte da Escritura. Isto
também quer dizer que não há lugar para qualquer subjetividade da parte
do intérprete da Bíblia.
(4) O sentido implícito e o sentido explícito dura texto bíblico segue
geralmente a característica da homogeneidade. Como exemplo podemos
citar a frase de Heb. 1:5: "Tu és Meu Filho, Eu hoje Te gerei". Estas
palavras são tomadas emprestadas de Sal. 2:7 e embora fossem usadas
nas cerimônias de entronização dos reis de Israel (2Sam. 7:14), elas
também se referem ao Rei Jesus Cristo como pode ser mais claramente
visto pela carta aos Hebreus e Atos 13:33, o qual pela ressurreição
assumiu o status de Rei (Rom. 1:14; 8:29; Atos 13:33). Também é de se
notar a homogeneidade entre as palavras literais do salmista e o seu
cumprimento em Jesus Cristo.
A expressão bíblica "primogênito" é um outro exemplo para este
verso. Ela é usada na Bíblia no sentido cronológico, o primeiro nascido
(Gên. 25:25; Núm. 18:15), e também é usado no sentido de status, como
alguém que tem os direitos e privilégios do primogênito, embora no
tempo não seja ele o primeiro nascido. Assim é que o caçula na Bíblia é
chamado de primogênito (Jer. 31:9 comp. Gên. 41: 50-52; Heb. 11:17 -
Isaque não foi nem o unigênito e nem o primogênito) .
g. O intérprete não deve construir doutrina sobre textos obscuros.
h. O intérprete teológico deve conservar em mente a natureza
prática da Bíblia.
A Escritura não é uma enciclopédia de todo o conhecimento. Nem
reclama ser um livro que contêm todo o conhecimento. O propósito da
Interpretação Bíblica (Endruveit) 23
Escritura é dar ao homem o conhecimento da salvação (2Tim. 3:15) e
aquilo que seja necessário para a sua vida cristã (2Tim. 3:16-17).
Muito do que o apetite especulativo deseja não está na Escritura. A
Bíblia não trata de todos os assuntos porque o Seu conteúdo é controlado
pelo Seu propósito principal, o plano da Salvação. A curiosidade humana
pede mais do que isto. Quer saber, por exemplo, onde Caim obteve a sua
mulher. Mas, nenhuma história e exaustiva. Toda história é seletiva e o
princípio de seleção é estabelecido pelo historiador. Isto explica porque a
existência de história da música, história da teologia, história da arte, etc.
A história bíblica é então aquela seleção especial que de uma ou outra
maneira, muito ou pouco, contribui para a história da salvação.
i. O intérprete teológico deve reconhecer sua responsabilidade para
com a igreja.
Se por um lado é verdadeiro o princípio de que a Bíblia deve ser
lida e interpretada pelo próprio crente para si mesmo e que não existe
ninguém como seu intérprete oficial da Bíblia, também, não é menos
verdadeiro o fato de que além de se comparar pessoal-mente a Escritura
com a Escritura, deva-se também prestar grande deferência à Igreja.
Se a Escritura é um livro inteligível e o Espírito Santo exerce a
função de um Mestre de todos os filhos de Deus, então,
consequentemente deve haver uma interpretação harmoniosa entre todos
os filhos de Deus nos assuntos essenciais da Bíblia. Disto se deduz,
que, se um indivíduo diverge dos seus irmãos espirituais e idôneos, é
provável que ele também diverge da Escritura.

Bibliografia
1. Em Português: Hasel, Gerhard F. “Interpretação Bíblica:
Princípios Gerais.” Instituto Bíblico, IAE, Divisão Sul
Americana, 1979.
2. Em Inglês, 10 livros sobre Interpretação da Bíblia, não
mencionados neste e-book.

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