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(1936-1960)
Resumo:
Abstract:
This text is going to focus on the discursive dynamic of the magazine Claridade (1936-1960)
that has constructed and delimited the Cape verdeans’ borders based on cultural criteria. The
strategies of intellectuals as Baltasar Lopes and Manual Lopes and Jorge Barbosa will be
considered as constituent of a common imaginary which has surrounded the Cape verdean
intellectuall field. On that period, Cape Verde used to hold a bigger specificity compared with
the rest of Africa because it has held larger connections in cultural and social parameters with
its Portuguese metropolis. Owners of a speech that was accomplice of the Portuguese
colonialist discourse, the “claridosos” intellectuals will materialize on the magazine their aims
of being a Portuguese cultural extension in the tropics. Therefore, it will be articulated a
separation and a selective deletion of the Cape verdean belonging to the African continent
*
Graduada em História pela UFMG e mestranda em História pela mesma instituição.
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which was displaced to the locus of exoticism and barbarism.
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que garantisse uma proximidade com a civilização superior, o grande império português. Os
“filhos da terra” tecem, então, um laço de cultura que envolve Cabo Verde, em sua
especificidade criada em relação à África, e Portugal, com toda a sua ideologia paternalista e
agregadora das “colônias do ultramar”. Esse discurso de pendor integracionista é
reorganizado pelos intelectuais cabo-verdianos durante a primeira metade do século XX e a
imagem colonial de Cabo Verde é realçada tanto no arquipélago como na metrópole,
sobretudo durante o Estado Novo salazarista.
Dentro das páginas da revista Claridade, portanto, percebe-se um jogo discursivo que
intenta o apagamento de uma multiplicidade, que poderia estar presente desde as diferenças
culturais entre as ilhas até os conflitos de grupos sociais distintos, para edificar e prezar por
uma unidade, uma comunidade imaginada (ANDERSON, 2008), ao mesmo tempo imagética
e discursiva que não é arbitrária, mas é construída como natural. Essa naturalização é feita
pela autoridade do discurso desses intelectuais, que possuem a autoridade do dizer, e que são
capazes de fazer Cabo Verde existir como digno de ser (BOURDIEU, 2007: 99). Para isso, os
aspectos e características do arquipélago e de seu povo são colocados numa categoria de
comparatividade com o continente africano, visto como algo longínquo cultural e socialmente
da realidade caboverdiana. Essa distinção e classificação, que é também uma desclassificação,
tanto do espaço social quanto do geográfico, é o que se procurará demonstrar e problematizar
no interior da revista Claridade, e quais os recursos foram despendidos para se formar esta
ideia. Cabo Verde pertence à África, mas não é africano. Onde ele está? É preciso considerar
“a constelação de regularidades práticas e discursivas que institui, faz ver e possibilita dizer”
o arquipélago (ALBUQUERQUE JR, 2006)
Há uma tentativa pouco explícita desses intelectuais claridosos de desinstituir ou
dessacralizar sua funcionalidade estritamente geográfica com relação a Portugal, de
arquipélago de referência e de aporto conveniente para navegações, para fundá-la num outro
lugar: o da cultura. José Carlos Gomes do Anjos, afirma que “os intelectuais cabo-verdianos
reapropriam-se dos discurso colonial português que concebe a província num papel geo-
estratégico entre Brasil, Europa e África” (ANJOS, 2004: 101), e o reapropriam em termos
culturais. Por isso, podemos atentar para, logo em seu primeiro número, a revista publicar o
ensaio de Manuel Lopes sobre o que vem procurar o europeu em Cabo Verde e não encontra:
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novo colheram, nenhum mistério desvendaram: não viram manipansos, não
assistiram sequer a uma seção de magia negra. O problema do caboverdiano é menos
de ordem tradicional e estático, que cultural e dinâmico. (LOPES, Claridade,
1936: 5)
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qual fala Bourdieu, que se busca em cada estudo, em cada publicação, em cada discurso que
cria a imagem de Cabo Verde tão distante da África e tão próximo à Europa. Há uma
apropriação claramente seletiva do patrimônio cultural cabo-verdiano que é socialmente
valorizado.
Outra estratégia de inserção de Cabo Verde no mundo europeu português foi a
inauguração do discurso da mestiçagem dentro do pensamento dos intelectuais claridosos. A
oposição entre cidadãos portugueses e indigenato africano abriu a fenda para que o discurso
do mestiço ganhasse força em território cabo-verdiano. Estabelecer a cultura essencialmente
mestiça significava fundamentalmente escapar da categoria política de exclusão, que é a do
indígena; e ao mesmo tempo galgar alguns degraus na subida “evolucionista” rumo à
cidadania portuguesa. De novo de acordo com os termos do escritor Manuel Lopes, o
problema de Cabo Verde “é menos de ordem tradicional e estático, que cultural e dinâmico”
(LOPES, Claridade, 1936: 05-06). A problemática do indígena é da ordem do tradicional e
do estático. O mestiço já se encontra na ordem da cultura. Na verdade, sob essa formulação da
problemática cabo-verdiana os intelectuais do arquipélago não fazem mais do que corroborar
com o discurso ideológico do fascismo português”. As demoradas ênfases nas características
culturais, defendidas tanto por portugueses quanto por cabo-verdianos, muitas vezes se
mostram eufemismos para um questão rácica e, claro, hierarquizante que envolve sempre o
colonizador e o colonizado. Um ideólogo do colonialismo português, contra as acusações de
racismo, defende-se através da liberdade concedida pelo governo português quanto a
assimilação.
Partimos do princípio – não tomando em consideração as diferenças rácicas – que
todos os habitantes das nossas províncias ultramarinas são cidadãos potenciais
portugueses. Como a nossa tradição não obriga o indivíduo a aceitar a nossa
cultura, todavia aguardamos que lentamente os próprios se assimilarão, aceitando a
nossa cultura livremente. Os legislados consideram a população como formada de
duas classes jurídicas: de cidadãos e de indígenas (CVC, março, 1959,p.13. Apud
ANJOS, 2004: 96)
Esse engodo democrático presente no discurso colonialista acaba por angariar ouvintes
e entusiastas no “ultramar” e os claridosos, ansiosos por um posto maior do que o último, que
ocupa o colonizado, mostram-se um grupo vocacionado para esta nomeação: o mestiço. Ao
subtraírem de suas terras o estigma no indígena bárbaro e sem cultura, os intelectuais cabo-
verdianos se mostram como intermediadores entre os indígenas atrasados na escala
assimilacionista e os portugueses civilizados presentes em território isleno.
José Carlos Gomes dos Anjos ainda argumenta que várias vezes os intelectuais da
Claridade repetirão colocações como a de Osório de Oliveira (“Não pensem os homens do
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progresso que o cabo-verdiano lhes é inferior. O homem dessas ilhas tão cruelmente tratadas
pelo destino tem todas as virtudes da inteligência, do sentimento, da sensibilidade”) que, ao
enaltecer a capacidade intelectual cabo-verdiana, reforça o princípio hierárquico da distância
entre nativos e metropolitanos (ANJOS, 2004: 100).
Portanto, é possível perceber como a construção da cabo-verdianidade, que se situa
entre a lusitanidade, a mestiçagem e a herança afro-negra, evidencia-se uma convivência
difícil e também como é travado um fértil diálogo pelos claridosos com os discursos
colonialistas portugueses da primeira metade do século XX e quais os artifícios disponíveis e
criados na e pela cultura cabo-verdiana esses intelectuais selecionaram para se relacionarem e
reivindicarem um lugar ao lado de Portugal. Voltando ao ponto de partida deste artigo, os
claridosos partem de uma situação no presente, selecionam aspectos culturais plausíveis de
identificação e os inscrevem num passado legitimador do espaço que se quer. Assim, a
espacialidade geográfica mostra-se descontínua nas mãos dos protagonistas de discursos
legitimidadores: Cabo Verde é português, ainda que esteja posicionado em águas africanas. É,
na verdade, a prática discursiva que faz também posição imagético social de Cabo Verde. O
espaço é terreno e objeto de práticas e se mostra também um alvo e uma arma de poder.
Bibliografia
3- ANJOS, José Carlos Gomes dos. Intelectuais, literatura e poder em Cabo Verde: lutas de
definição da identidade nacional. Porto Alegre: Editora da UFRGS; Cabo Verde: Instituto
Nacional de Investigação Promoção e Patrimônio Culturais – INIPC, 2004
4- APPIAH, Anthony. Na casa de meu pai: a África na filosofia da cultura. Rio de Janeiro:
Contraponto, 1997
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7- FERNANDES, Gabriel. A diluição da África: uma interpretação da saga identitária cabo-
verdiana no panorama político (pós)colonial.Florianópolis: Editora da UFSC, 2002
8- FERREIRA, Manuel. A aventura crioula ou Cabo Verde : uma sintese cultural e étnica. 2.
ed. aum. Lisboa: Platano, 1973.
11- LOPES DA SILVA, Baltasar. O dialecto crioulo de Cabo Verde. [Lisboa]: Imprensa
Nacional: Casa da Moeda, 1984.
13-TORGAL, Luís Reis; PIMENTA, Fernando Tavares; SOUSA, Julião Soares (orgs.)
Comunidades Imaginadas: nação e nacionalismo em África. Coimbra: Editora da
Universidade de Coimbra, 2008†