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Universidade Católica de Moçambique

Instituto de Educação à Distância

Momentos da Literatura nas colónias portuguesa: Literatura Colonial e nacional

Macy Octávio Francisco – Código: 708200070


Nampula, Abril de 2023

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Universidade Católica de Moçambique
Instituto de Educação à Distância

Momentos da Literatura nas colónias portuguesa: Literatura Colonial e nacional

Macy Octávio Francisco – Código: 708200070

Trabalho de carácter avaliativo no


âmbito da cadeira de LALP, 4º ano de
frequência, curso de Licenciatura em
Ensino de Português, Turma “E”, 1a
cessão, leccionada pela,

MA:

Nampula, Abril de 2023

i
Índice

Considerações Iniciais................................................................................................................3

1. Percurso das literaturas africanas de expressão portuguesa e sua divisão..............................4

1.2. Literatura Colonial Vs Literatura Nacional.........................................................................5

1.2.1. Literatura colonial.............................................................................................................5

1.2.2. Literatura nacional............................................................................................................7

1.3. Divisão da Literatura Africana em Língua Portuguesa........................................................7

1.4. Razões da adopção do nome “Literatura Africana em Língua Portuguesa”........................9

1.5. Relação entre literatura Angolana com a Moçambicana...................................................10

1.6. Aspectos formais e temáticos dos textos literários de autores mais representativos em
Moçambique e Angola..............................................................................................................10

Considerações Finais................................................................................................................12

Bibliografia...............................................................................................................................13

ii
Considerações Iniciais

As Literaturas Africanas de Língua Portuguesa são ainda jovens, com aproximadamente, 160
anos de existência. Apesar de os primeiros textos datarem da segunda metade do século XIX,
só no século XX, na década de 30 em Cabo Verde (com Claridade), e nos anos 50 em Angola
(com Mensagem), é que essas literaturas começaram a adquirir maioridade, se descolando da
literatura portuguesa trazida como paradigma pelos colonizadores. Embora não se tenham
desenvolvido sempre em conjunto, devido aos seus respectivos contextos sócio-culturais
diferenciados, essas literaturas são, geralmente, estudadas, nos meios universitários
ocidentais, sob denominação abrangente que envolve a produção literária de Angola,
Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, ex-colónias de Portugal na
África. É neste contexto que o trabalho vai abordar o percurso da literatura Africana de
Expressão em Língua Portuguesa (Moçambique e Angola)

Obviamente, o trabalho possui dois tipos de objectivos: Geral e Específicos.

No que concerne ao objectivo geral, temos o seguinte:

 De forma clara e eficiente, pretende-se trazer o percurso das literaturas africanas de


expressão portuguesa.

E para que se garantisse o alcance deste objectivo foi necessário traçar-se alguns objectivos
específicos que se resumem nos seguintes:

 Distinguir a Literatura Colonial da Literatura Nacional;


 Relacionar a literatura Moçambicana da literatura Angolana;
 Analisar a problemática geral das literaturas africanas.

O trabalho é pertinente na medida em que traz conteúdos epistemológicos relacionados com a


questão da literatura colonial para o nosso aprimoramento e enriquecimento epistemológico
como académicos africanos e futuros desenvolvedores da literatura pós-colonial.

Quanto a metodologia, recorreu-se a consulta bibliográfica numa abordagem qualitativa e,


como técnica, fez-se uma leitura exaustiva, análise facial das fontes usadas e os dados foram
sintetizados de forma descritiva. O trabalho está estruturado da seguinte maneira: introdução,
desenvolvimento e inclui uma conclusão ao menos parcial, mediante a sua abordagem, inclui
igualmente uma bibliografia final da fonte usada. Como técnica, fez-se uma leitura exaustiva,
análise facial das fontes consultadas.

iii
1. Percurso das literaturas africanas de expressão portuguesa e sua divisão

Não se pode falar da literatura africana sem se falar da “Negritude”; aliás, esta última
constitui o tema fundamental da literatura africana.

A literatura africana de expressão portuguesa nasce de uma situação histórica originada no


século XV, época em que os portugueses (cronistas, poetas, historiadores, escritores de
viagens, homens de ciências e das grandes literaturas europeias) iniciaram a rota de África,
continuando depois pela Ásia, Oceânia e América1.

Gomes Eanes de Zurara, João de Barros, Diogo de Couto, Camões, Fernão Mendes
Pinto, Damião de Góis, Garcia de Orta, Duarte Pacheco Pereira são alguns nomes cujo
discurso é alimentado do "saber de experiência feito" alcançado a partir do século XV,
em declínio já no século XVII) esgotado no século XVIII. A obra de Gil Vicente
(século XVI) ou, embora escassamente, a de poetas do cancioneiros (séculos XIV e
XV) ao lado das "coisas de folgar", foram marcadas pela expansão ao longo dos
«bárbaros reinos». É uma literatura feita pelos portugueses, fruto da aventura no além-
mar, no período renascentista, a que se denominou de literatura dos descobrimentos
(Margarido, 1980, p. XIX).
Esta literatura, nascida de uma experiência planetária, nada tem a ver com a literatura africana
de língua portuguesa. Este registo serve apenas para contextualizar no passado factos
relacionados com o quadro cultural, político que século depois havia de surgir.

Com efeito, a partir do século XV, inicia-se o processo de colonização em África, o que
condiciona, séculos mais tarde, o aparecimento de nova literatura, a literatura colonial (1900-
1939).

Segundo Covane (2014),

As literaturas africanas em língua portuguesa tiveram seu desenvolvimento a partir da


secunda metade do século XIX, como não poderia deixar de ser, tratando-se de países
africano, dotados em sua maioria por culturas de tradições (embora não
exclusivamente). Diferentemente da produção colonial africana, mas as literaturas
africanas adoptaram um ponto de vista do colonizado, “de dentro para fora” (p. 5).
Ainda de acorde com este autor,

Marcadas pelo colonialismo português os conflitos e relações que esta forma


administrativa acarreta, foram com o passar do tempo, inspiração constante na
literatura das então colónias de Portugal, actuais países de Cabo Verde, São Tomé e
Príncipe, Guiné-Bissau, Angola e Moçambique. Por ter sido, o fazer literário nesses
países, muita das vezes, formas de resistências e militâncias, serão exactamente estas
nuances que marcam as relações colonizador e colonizado e as demais buscas de
afirmação identitária que elas acarretam. A literatura então passa a construir em forma
de militância política, de denúncia, de busca de uma identidade, a ideologia para a
independência e afirmação de identidades nestes países (Idem).

1
Cf. Santilli, Maria Aparecida. Africanidade. São Paulo: Ática, 1985, p.18.
iv
Com efeito, quatro anos mais tarde, após a instalação da imprensa em Angola, ocorre a
publicação do livro “Espontaneidade da minha alma” (1949) do angolano mestiço José da
Silva Maia Ferreira o primeiro livro impresso na África lusófona, mas não a mais antiga obra
do autor africano.

Por pesquisas que recentemente se levanta a cabo é anterior aquele, pelomenos, o


conhecimento do poemeto da cabo-verdiana Antónia Gertrudes Pusish, “Elegia à memória das
infelizes vítimas assassinadas por Francisco de Matos Lobo, na noite de 25 de Junho de
1844”, publicado em Lisboa no mesmo ano. Entretanto não será deslocado citar o tratado dos
reinos de Guiné escrito em 1594, da autoria do Cabo Verdiano Ander Alves de Almeida; e de
origem Cabo Verdiana supõem ser André Dornelas, autor do século XVI, que assina uma
descrição da Guiné.

Tal, porem, não se autoriza a remontar as origens da poesia angolana a tão recuados tempo,
como já, com alguma intemperanças se quer insinuar. Repondo, por isso, a questão com certa
objectividade pode afirmar-se que a literatura africana chama a si mais de um século de
existência. Este longo período de mais de um século de actividade literária está, porém,
contido em duas grandes linhas: a literatura colonial e a literatura africana de expressão
portuguesa.

1.2. Literatura Colonial Vs Literatura Nacional

A produção literária nos países africanos divide-se em duas fases: a da literatura colonial e a
das literaturas africanas.

1.2.1. Literatura colonial

A literatura colonial, define-se essencialmente pelo facto de o centro de universo narrativo ou


poético se vincular ao homem europeu e não ao homem africano. exalta o homem europeu
como o herói mítico, desbravador das terras inóspitas, portador de uma cultura superior.

No contexto da literatura colonial, por décadas exaltadas, o homem negro aparece


como que por acidente, por vezes visto paternalistamente e, quando tal acontece, é já
um avanço, porque a norma é a sua animalização ou coisificação (reconhecimento
erróneo ou não reconhecimento). O branco é levado a categoria de Herói mítico, o
desbravador das terras inóspitas, o portador de uma cultura superior. Por exemplo: “o
único país que pode explorar seriamente África é Portugal” (prefácio de Manuel
pinheiro chagas a “Os Sertões d’África, 1880, de Alfredo de Sarmenro onde alias se
pode ler sobre o negro: “é um homem na forma mas os instintos são de fera”, p. 87).
Paradoxalmente o branco é eleito como o grande sacrificado (Covane, 2014, p. 6).

v
A aplicação do ponto de vista colonialista tem no europeu o agente dinâmico e não o
opressor: “fiel aos nossos deveres de dominador, grata ao nosso orgulho, útil às populações”
escrevia um homem anti-fascista, Augusto Casimiro (nova largada, 1929).

Enquanto a literatura dos descobrimentos se baseava no relato de viagens feito por


navegadores, escritores, comerciantes, etc.., e narrava factos ocorridos ao longo dessas
viagens, a literatura colonial retrata a vivência dos portugueses no além-mar. Nesta literatura,
o centro do universo narrativo e poético é o homem europeu e não o homem africano.

De acordo com Secco (2003):

Era uma literatura profundamente racista, onde predominavam as ideias de


inferioridade do homem negro, que teóricos racistas, como Gobineau, haviam
derramado, e para as quais teria contribuído o filósofo Lévy Bruhl com a sua tese de
mentalidade pré-lógica. Importa dizer ainda que, nesta literatura, a África era vista
apenas como uma linda paisagem, ou um paraíso, e o protagonista dessa paisagem era
o homem europeu. Trata-se, pois, de uma literatura caracterizada fundamentalmente
pela exploração do homem pelo homem (Secco, 2003, p. 31).
Predominavam então as ideias de inferioridade do homem negro, que teóricos racistas, Como
Gobineau, haviam derramado e para as quais teria contribuído o filósofo Lévy-Bruhl com a
sua tese de mentalidade pré-lógica, sendo certo, embora, que a renunciou pouco antes de
morrer.

Laranjeira (1993) acrescenta que, “é preciso dizer que estes discursos racistas eram fruto da
mentalidade da época, no ponto de vista político-social. Todavia, houve alguns escritores
como João de Lemos (Almas Negras) e José Osório de Oliveira (“Roteiro de África”) que
tentaram entender a mentalidade do homem negro, pois há nas suas obras uma intenção
humanística. São precisamente as duras e condenáveis características da literatura colonial”.

Logo no último quartel do século XIX encontram os pioneiros desta literatura. Mas é
no período 20/30 que ela vai atingir o ponto mais alto, na quantidade, na marca
colonialista, na aceitação do público que esgota algumas edições, com certeza
motivado pelo exótico. Ai se destaca um naipe todo ele incapaz de apreender o
homem africano no seu contexto real e na sua complexa personalidade. É certo que
justo será destacar pela qualidade de sua escrita João de Lemos, “almas negras”, 1937,
porque nele, apesar de uma deficiente visão, se denota um mérito esforço de análise e
intenção humanística. Mas escritor português, manietado pela distanciação
colonialista, por norma, dá ao seu discurso um sentido racista, hoje de inconcebível
aceitação (COVANE, 2014, p. 7).
O tempo histórico, o tempo cultural, para quem ideologicamente, era incapaz de se furtar à
insidiosa instauração do fascismo em Portugal e à inscrição legal do assimilacionismo (aí
vinha já o celebre acto colonial, de 1930), não permitia ou não ajudava a uma tarefa de tal
norma, que rejeita meros propósitos e exige uma reformulação da mentalidade do europeu.
vi
Hoje não há lugar para dúvidas: muitas dessas obras estão condenadas ao esquecimento,
salvando-se aquelas que, apesar de prejudicadas pelas contingências de uma época e de uma
mentalidade colonial, evidenciam, contudo, um esforço humanístico e uma real qualidade
estética. Mas, no conjunto, a história vai ser de uma severidade implacável e arrumará a quase
totalidade desta literatura no discurso da acção colonizadora ou no nacionalismo imperial,
saudosista e deslumbrado.

1.2.2. Literatura nacional

A literatura nacional constitui-se inversamente a da literatura colonial, pois nela o mundo


africano passa a ser narrado por outra óptica. O negro é privilegiado e tratado com
solidariedade no espaço material e linguístico do texto, embora não sejam excluídas as
personagens europeias (de características negativas ou positivas). É o africano que
normalmente preenche os apelos da enunciação e é ele quase exclusivamente, enquanto
personagem ficcional ou poético, o sujeito do enunciado.

Os cuidados e os esmeros do sujeito enunciador são os de organicamente moldar o


enunciado com os ingredientes significativos e representativos da especificidade
africana. Se colocados lado a lado dois textos, um de literatura colonial e outro de
literatura africana, é como se procedêssemos a uma justaposição de brusco contraste
(Ferreira, 1987, p. 13-14).
Diante disso, pode-se dizer que o universo literário e cultural dos naturais da terra, nas
literaturas africanas, é valorizado e explorado significativamente, pois, quando os autores
negam a legitimidade do colonialismo no discurso literário, fazem da revelação e valorização
do mundo africano a raiz primordial tanto na ficção quanto na poesia, que, inicialmente,
foram registadas em jornais ou folhetins.

As literaturas africanas de língua portuguesa, do ponto de vista linguístico, contam com


numerosos termos, expressões, provérbios oriundos das línguas faladas nos vários grupos
étnicos em Angola e Moçambique, enquanto em Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Guiné-
Bissau se usam duas línguas: a portuguesa e a crioula (SANTILLI, 1985).

1.3. Divisão da Literatura Africana em Língua Portuguesa

Para Covane (2014, p. 7), o percurso da literatura de expressão portuguesa divide-se em 5


momentos.

No primeiro momento, o escritor esta quase em estado absoluto de alienação,


inteiramente absolvido pela cultura colonizadora, reproduzindo seus ideias. Os seus

vii
textos poderiam ter sido reproduzidos em qualquer outra parte do mundo: é o
menosprezo e a alienação cultural.
O segundo momento corresponde à fase em que o escritor ganha a percepção da
realidade, apontando distinções geográficas, sociais, etc. em relação à metrópole. O
seu discurso revela influência do meio, bem como os primeiros sinais de sentimento
nacional: é a dor de ser negro; o negrismo e o indigenismo.
O terceiro momento é aquele em que o escritor adquire a consciência nacional de
colonizado. Liberta-se, promovendo um pensamento dialéctico entre raízes profundas
e coibição de sujeição colonial: a prática literária enraíza-se no meio sócio cultural e
geográfico: é a fase da descolonização e o discurso da revolta.
O quarto momento corresponde à fase histórica da independência nacional, quando se
dá a reconstituição da individualidade plena do escritor africano: é a fase da produção
do texto em liberdade, da criatividade.
Finalmente, o quinto momento é marcado pela despreocupação, em valorizar-te
excessivamente a Africanidade: as fragilidades humanas, as vulnerabilidades é que
são, agora enfatizadas.

Numa perspectiva mais historicista, Chabal (1994) refere-se ao relacionamento do escritor


africano com a oralidade e propõe quatro fases abrangentes das literaturas africanas de língua
portuguesa.

 Primeira fase: Assimilação

A primeira é denominada assimilação, e nela se incluem os escritores africanos que produzem


textos literários imitando, sobretudo, modelos de escrita europeus.

 Segunda fase: A resistência.

Nessa fase o escritor africano assume a responsabilidade de construtor, arauto e defensor da


cultura africana. É a fase do rompimento com os moldes europeus e da conscientização
definitiva do valor do homem africano. Essa fase coincide com a conscientização da
Africanidade, sob a influência da Negritude de Aimé Césaire, Léon Damas e Léopold
Senghor.

 Terceira fase: fase das literaturas africanas de língua portuguesa

A terceira fase das literaturas africanas de língua portuguesa coincide com o tempo da
afirmação do escritor africano como tal e, segundo o teórico, verifica-se depois da

viii
independência. Nela o escritor procura marcar o seu lugar na sociedade e definir a sua posição
nas sociedades pós-coloniais em que vive.

 Quarta fase: actualidade (corpus literário universal)

A quarta fase, da actualidade, é a da consolidação do trabalho que se fez em termos literários,


momento em que os escritores procuram traçar os novos rumos para o futuro da literatura
dentro das coordenadas de cada país, ao mesmo tempo em que se esforçam por garantir, para
essas literaturas nacionais, o lugar que lhes compete no corpus literário universal.

Se quisermos ter uma visão de conjunto das literaturas africanas de língua portuguesa, torna-
se necessário considerar essas fases da produção do texto mas também os grandes momentos
de ruptura com os códigos estabelecidos. A crítica e os historiadores concordam que os
fundamentos desses momentos caracterizam-se pelo surgimento de movimentos literários
significativos ou de obras importantes para o desenvolvimento das literaturas, entre os quais
podem ser citados:

a) em Cabo Verde, a publicação da revista Claridade (1936-1960);


b) em São Tomé e Príncipe, a publicação do livro de poemas Ilha de nome santo (1942),
de Francisco José Tenreiro;
c) em Angola, o movimento “Vamos descobrir Angola” (1948) e a publicação da revista
Mensagem (1951-1952);
d) em Moçambique, a publicação da revista Msaho (1952);
e) na Guiné-Bissau, a publicação da antologia Mantenhas para quem luta! (1977), pelo
Conselho Nacional de Cultura.

A esses momentos é importante acrescentar outros que abarquem, também, a narrativa e a


produção mais recente dos diferentes países, em prosa e poesia.

1.4. Razões da adopção do nome “Literatura Africana em Língua Portuguesa”

A literatura africana, como um conjunto de obras literárias que traduzem uma certa
Africanidade, toma esta designação porque a África é o motivo da sua mensagem ao mundo,
porque os processos técnicos da sua escrita se erguem contra o modismo europeu e
europeizante. John chamou-a de literatura Neo-africana por ser escrita em línguas europeias e
para diferenciá-la da literatura oral produzida em língua africana. Nesta literatura, o centro do
universo deixa de ser o homem europeu e passa a ser o homem africano.

ix
É necessário frisar que este tipo de literatura, chamada literatura africana de expressão
portuguesa, ganha uma nova especialização, tomando a designação de literatura de raiz
africana. Esta literatura teve a sua origem através do confronto, da rebelião literária,
linguística e ideológica, da tomada de consciência revolucionária a partir da década de 40
(século XIX). Importa referir que era uma literatura dirigida particularmente aos africanos e
escrita em línguas locais em mistura com o “português”, pois o propósito era tornar a escrita
inacessível aos europeus, isto é, não permitir ao homem branco descodificar as suas
mensagens. Daí a introdução nas obras de poetas angolanos (Agostinho Neto, António
Jacinto, Pinto de Andrade, Luandino Vieira, etc.) de palavras e frase idiomáticas em
quimbundo e umbundo, e em muitos outros autores africanos como Mutimati Bernabé João
(Moçambicano).

A literatura africana combate o exotismo sob todas as formas, quer se apresente recuperando
narrativas tradicionais, quer utilize ritmos significantes emprestados das culturas populares.

1.5. Relação entre literatura Angolana com a Moçambicana

A literatura angolana assim como a literatura moçambicana relacionam-se na medida em que


ambas lutavam contra as marcas imperialistas em África, sobre tudo a contestação do
imperialismo português nas terras africana. De igual modo relacionam-se com suas escritas
revolucionárias em que os seus autores contribuíam para que o discurso oficial hegemónico se
esvazia-se e perdesse a sua aura, reiterando, de forma dramática, a urgência de uma
reinterpretação da História.

É comum, na maioria das obras das literaturas africanas de expressão portuguesa, exprimir o
valor cultural da oralidade, defendendo, inclusive, a sua importância, fazendo, assim, com que
o leitor reflicta sobre a tradição oral africana.

1.6. Aspectos formais e temáticos dos textos literários de autores mais representativos
em Moçambique e Angola

Temos, neste âmbito, dentro do panorama africano de língua portuguesa, uma fissura entre a
produção literária de Moçambique e a de Angola: aquela, representada por expressivos
autores como Paulina Chiziane, Ungulani Ba Ka Khosa e Mia Couto, enseja a tradição oral
em suas narrativas, ressignifica o mítico e o sagrado e revela, em seu substrato ideológico, o
desejo de (re)construir uma identidade local. Esta, por sua vez, viceja o tema da modernidade,
através de suas narrativas urbanas e de tom cosmopolita (principalmente com autores como
José Eduardo Agualusa e Ondjaki).
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A literatura moçambicana segue os mesmos carris tais como seguia Angola: Pré-colonial e
colonial, afro-cêntrica e luso-tropicalista, nacional e pós-colonial.

No que respeita ao aspecto temático, há, contudo, uma insistência na reivindicação de


valores culturais outros, especialmente em Moçambique, de que a tradição oral e suas
formas fazem eco. Práticas e crenças animistas, dimensões mítico-mágicas do universo,
costumes e posturas sociais (Leite, 2012).
As questões temáticas seguidas em Moçambique assim como em Angola são: escravatura,
raça, crítica à civilização ocidental, vitalismo, sensualidade, revalorização da tradição negra,
culto da natureza, animização, etc., com recursos aos modelos de Black Renaissance,
Negritude e neo-realismo, no intuito de construir uma identidade poética africana.

xi
Considerações Finais

A literatura africana de expressão portuguesa nasce de uma situação histórica originada no


século XV, época em que os portugueses (cronistas, poetas, historiadores, escritores de
viagens, homens de ciências e das grandes literaturas europeias) iniciaram a rota de África,
continuando depois pela Ásia, Oceânia e América.

A literatura colonial, define-se essencialmente pelo facto de o centro de universo narrativo ou


poético se vincular ao homem europeu e não ao homem africano. Exalta o homem europeu
como o herói mítico, desbravador das terras inóspitas, portador de uma cultura superior.Era
uma literatura profundamente racista, onde predominavam as ideias de inferioridade do
homem negro, que teóricos racistas, como Gobineau, haviam derramado, e para as quais teria
contribuído o filósofo Lévy Bruhl com a sua tese de mentalidade pré-lógica.

Importa dizer ainda que, nesta literatura, a África era vista apenas como uma linda paisagem,
ou um paraíso, e o protagonista dessa paisagem era o homem europeu. Trata-se, pois, de uma
literatura caracterizada fundamentalmente pela exploração do homem pelo homem. A
literatura nacional constitui-se inversamente a da literatura colonial, pois nela o mundo
africano passa a ser narrado por outra óptica. O negro é privilegiado e tratado com
solidariedade no espaço material e linguístico do texto, embora não sejam excluídas as
personagens europeias (de características negativas ou positivas). É o africano que
normalmente preenche os apelos da enunciação e é ele quase exclusivamente, enquanto
personagem ficcional ou poético, o sujeito do enunciado.

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Bibliografia

Chabal, P. (1994). Vozes moçambicanas: literatura e nacionalidade. Lisboa: Veja.

Covane, L. (2014). Didáctica de literatura. Beira, Moçambique.

Ferreira, M. (1987). Literaturas africanas de expressão portuguesa. São Paulo: Ática.

Laranjeira, P. (1993). De letra em riste. Porto: Afrontamento.

Leite, A. M. (2012). Nação e narrativa pós-colonial II: Angola e Moçambique – entrevistas,


Lisboa, PT: Colibri.

Margarido, A. (1980). Estudos sobre literaturas das nações africanas de língua portuguesa.
Lisboa: A Regra do Jogo.

Santilli, M. A. (1985). Africanidade. São Paulo: Ática

Secco, C. L. T.R. (2003). A magia das letras africanas: ensaios escolhidos sobre literaturas
de Angola, Moçambique e alguns outros diálogos. Rio de Janeiro: ABE Graph.

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