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Earle E.

Cairns
Avanços e Retrocessos nas Relações entre Igreja e Estado, 800-1054
Capítulo 20 - Reavivamento e divisão na Igreja

Embora a Igreja Ocidental tenha permanecido na sombra do Sacro Império Romano de Otto na
O Cristianismo através dos Séculos última parte do período entre 800 e 1054, ela experimentou um reaviva-mento interior que lhe
deu forças para competir com a interferência imperial. Nessa mesma era, a Igreja Oriental se
conscientizou das enormes diferenças entre ela e a Igreja Ocidental de modo que o período
terminou com um cisma que resultou na criação da Igreja Ortodoxa Grega no Oriente.

Uma história da Igreja Cristã I. Reavivamento no Ocidente


Embora na Igreja Ocidental o reavivamento nem sempre tenha sido espiritual, houve uma
renovação de forças que a ajudou em sua luta contra o Estado, representado pelo Sacro Império
Romano. Vários fatores contribuíram para o fortalecimento do poder eclesiástico do papa.

A. Os documentos de apoio ao papado


2ª ed. A Doação de Constantino (veja cap. 18, pág. 163) tornou-se a base legal para a propriedade de
terras em nome do papa. A maior doação de terras, em que esse documento foi usado como
justificativa, foi feita por Pepino em 756. Em 865, o papa Nicolau [, que foi papa de 858 a 867,
foi o primeiro a usar uma coleção dos decretos de vários pontífices de Roma. Essa coleção é
conhecida de variadas formas, como Falsas Decretais ou Decretais Pseudo-Isidorianas. O notável
documento incluía a Doação de Constantino, decretos ou decretais autênticos ou mesmo forjados
dos papas de Roma desde o tempo de Clemente de Roma, além de alguns cânones dos grandes
Concílios da Igreja. A coleção foi relacionada ao nome de Isidoro de Sevilha (c. 560-636), chefe
da Igreja Espanhola na primeira parte do século VII. Não se pode ser categórico sobre a autoria
das Decretais, mas é certo que a partir dos meados do século IX elas exerceram um importante
papel nas reivindicações do bispo romano à supremacia na Igreja.
A Doação de Constantino, primeiramente usada no século VIII, serviu para justificar as
solicitações papais de terra na Itália; as Decretais, no entanto, foram usadas

São Paulo
Vida Nova
2008
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para aumentar a força do papa dentro da própria Igreja. As Decretais estabeleciam a supremacia O mosteiro de Cluny procedeu assim: Em 909, o duque William de Aquitaine, "para o bem"
do papa sobre todos os líderes eclesiásticos da Igreja e concediam a qualquer bispo o direito de de sua alma, autorizou a Berno,2 que já fora abade de outro mosteiro, fundar um novo mosteiro
apelar diretamente ao papa, ultrapassando o chefe de seu arcebispado. Reivindicava também o em Cluny na França oriental.3 Essa autorização estabelecia que o mosteiro seria isento de controle
direito da Igreja de ser livre do controle secular. Embora não seja certo que algum papa o tenha secular ou episcopal e exerceria a autogestão sob a proteção do papa. Berno e Odo, abades na
forjado, muitos papas usaram a coleção para apoiar suas alegações de poder dentro da Igreja. Os primeira metade do século IX, foram homens de grande competência e caráter que empreenderam
Dictatus de Gregório vu reforçaram, mais tarde, essas reivindicações. tão bem a sua missão que muitos mosteiros da ordem beneditina, inclusive o de Monte Cassino,
se reorganizaram à semelhança do de Cluny.
No velho sistema monástico, cada mosteiro tinha seu próprio abade e era independente dos
Β. A conversão da Escandinávia outros mosteiros da mesma ordem. O abade de Cluny, entretanto, indicava os abades dos novos
O poder do bispo romano foi fortalecido nesse período pela aceitação do evangelho pelos povos mosteiros fundados por ele ou por outros abades que deviam submissão ao de Cluny. Essa
escandinavos. Ansgar (801-865), natural de Flandres, merece receber o louvor por essa vitória. inovação criou uma ordem centralizada sob a direção de um chefe, o abade de Cluny, que
Quando o rei dinamarquês Haroldo solicitou um missionário em 826, Ansgar sentiu que trabalhava em íntima harmonia com o papado. No século xii, havia mais de 1100 mosteiros sob a
deveria responder à chamada e dedicou os 36 anos restantes de sua vida à obra missionária no liderança do abade de Cluny.
norte da Europa. A Dinamarca só foi conquistada de todo no século xi, nos dias de Canuto. O Os líderes cluniacenses demandavam reformas na vida clerical. Condenaram a simonia — a
cristianismo se estabeleceu em definitivo na Noruega em 1000 e, por essa mesma época, foi feito prática de comprar e vender cargos eclesiásticos por dinheiro — e o nepotismo — a prática de
a religião oficial da Suécia e da Islândia. A obra, iniciada por Ansgar,1 germinou tanto que favorecimento de parentes nas indicações para cargos. O celibato foi outro ponto de sua
fortaleceu o poder de Roma no norte europeu. plataforma. Os clérigos não deviam se casar nem ter concubinas, para que pudessem dedicar toda
a sua atenção aos assuntos eclesiásticos. Esses monges pensavam também que a Igreja não
C. A doutrina da missa deveria ser controlada temporalmente ou secularmente pelo rei, pelo imperador ou pelo duque.
Esse programa foi colocado em prática por uma série de papas reformistas com a ajuda dos
A controvérsia em torno da natureza da presença de Cristo na ceia agitou a Igreja Ocidental ainda mosteiros cluniacenses. Uma nova ênfase foi dada também à vida ascética.
no século VIII. A aceitação da ideia da ceia do Senhor como um sacrifício prestado através do O entusiasmo pela reforma do movimento cluniacense fez-se sentir em muitas outras áreas.
sacerdote era uma vitória para o papado, porque o papa dirigia a hierarquia de clérigos, que eram Os homens de Cluny criaram boas escolas monásticas, as quais ajudaram a tornar o latim a língua
os únicos que tinham o direito de ministrar o milagre da Missa. Por volta de 831, Pascásio comum da Idade Média. O movimento que resultou nas Cruzadas contra os muçulmanos na Terra
Radberto (c. 785-860), um monge do mosteiro de Corbie, próximo à cidade de Amiens, começou Santa deve muito aos monges dos mosteiros cluniacenses. Nas fronteiras do mundo civilizado,
a ensinar que, por milagre divino, a substância do pão e do vinho era imediatamente transformada esses mosteiros se tornaram os centros do esforço missionário. Em 1790, a ordem teve seu fim
em corpo e sangue de Cristo. Muito embora ele não chamasse essa transformação de legalmente decretado.
transubstanciação, seu ensino indicava claramente isso. Suas ideias foram defendidas num livro
intitulado De Corpore et Sanguine DominP (Do Corpo e do Sangue do Senhor). Essa doutrina
aumentava o poder do sacerdote e seu superior na hierarquia, o papa, apesar de que a Igreja E. Líderes capazes
Romana só a adotasse oficialmente em 1215, e a definisse plenamente só no Concilio de Trento Embora muitos dos papas do período entre 800 e 1054 fossem corruptos ou incompetentes, houve
em 1545. muitos líderes capazes que ajudaram a consolidar a obra de fortalecimento do papado. Nicolau 1,
papa de 858 a 867, foi um dos mais capazes desses homens. Ele sustentou por escrito e na prática
a supremacia do papa na Igreja, como alguém que era responsável pelo bem-estar dos fiéis, e
D. A reforma monástica sobre os governantes temporais em matéria de moral ou religião. As Decretais Pseudo-Isidorianas
As reformas monásticas produzidas pelos mosteiros cluniacenses nos séculos χ e xi deram uma eram geralmente mencionadas como prova dessa reivindicação.4
grande contribuição à supremacia do papado. No século x, os mosteiros tinham se tornado ricos Nicolau I foi bem-sucedido em demonstrar o seu poder sobre bispos e governantes temporais
e corruptos e necessitavam de reforma urgentemente. O primitivo ideal de serviço fora no caso de Lotário 11 de Lorraine. Lotário tinha se casado com Teutberga por razões basicamente
substituído pelo ideal de salvação pessoal combinado com uma vida confortável num mosteiro políticas. Ao se enamorar de Waldrada, abandonou sua esposa
rico. O próprio papado passou por um período de sério declínio entre Nicolau 1 e Leão IX (veja
pág. 178). O movimento de reforma
começado em Cluny foi o primeiro de vários movimentos sucessivos de reforma do
monasticismo romano. Ele teve efeitos de longo alcance.

2
' C. Robinson, The Conversion of Europe (Londres, Longmans, 1917), 437-84. Noreen Hunt, Cluny Under Saint Hugh (Notre Dame, Ind., University Press, 1968), 18, η. 1.
3
Frederic A. Ogg, A Source Book of Medieval History (Nova York, American, 1907), 247-49.
4
Kidd, Documents, 3.92.
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legal. Ele convocou um sínodo em que os bispos lhe concederam o divórcio de Teutberga. As II. A origem da Igreja Ortodoxa grega
facções em litígio apelaram para Nicolau e, nesse ínterim, Lotário se casou com Waldrada. A Igreja no Oriente jamais conseguiu ser independente como era a do Ocidente, primeiro porque
Determinado a subjugar os bispos que tinham agido à revelia de seu controle e a disciplinar estava diante dos olhos do Imperador e, segundo, porque tinha de competir com a tradição grego-
Lotário por imoralidade, o papa obrigou Lotário a abandonar Waldrada e receber Teutberga romana da cultura que fora preservada no Oriente ao tempo em que o Ocidente atravessava o
novamente no seu palácio como legítima esposa. caos cultural da Idade das Trevas. Após a queda do Império Romano, a Igreja no Ocidente não
Nicolau conseguiu ainda manter o direito de um bispo apelar diretamente ao papa. Quando enfrentou nenhum grande rival político no trono imperial e ainda cresceu na luta que travou
Hincmar, arcebispo de Rheims, transferiu Rothad, bispo de Soissons, Nicolau reverteu a decisão contra os problemas relacionados ao caos cultural que sucedeu a queda do Império.
de Rincmar, obrigando-o a devolver o arcebispado a Rothad.
Nicolau tentou até colocar sob sua autoridade o patriarca e o imperador oriental em A. Diferenças e causas da separação do Ocidente e Oriente
Constantinopla. O Imperador Miguel, que fora corrompido pelo seu tio Bardas, depôs o patriarca Ao transferir sua capital para Constantinopla em 330, Constantino pavimentou a estrada da
Inácio quando este se recusou a ministrar a ceia a Bardas e em 858 indicou o erudito Fócio em separação política e, depois, eclesiástica da Igreja em duas grandes seções. Teodósio deu a
seu lugar. Inácio pediu ajuda a Nicolau. Este declarou Fócio deposto, mas um sínodo dirigido por administração das porções oriental e ocidental do Império a diferentes chefes em 395. Com o
Fócio acusou a Igreja Ocidental de heresia por acrescentar ao credo a afirmação de que o Espírito colapso do Império Romano no Ocidente na última parte do século v, essa divisão se realizou
procede tanto do Filho como do Pai.5 O mal-estar entre as duas metades da Igreja aumentou, e completamente. A Igreja no Oriente esteve sob a jurisdição do Imperador, mas o papa em Roma
Nicolau, tão bem-sucedido na afirmação de sua supremacia sobre os governos temporal e estava longe de ser submetido ao seu controle. Na ausência de controle político efetivo no
eclesiástico do Ocidente, fracassou no Oriente. Ocidente, o papa tornou-se o líder temporal e espiritual em tempos de crise. Os imperadores
Entre os pontificados de Nicolau ‫ ז‬e Leão IX houve poucos bons líderes no trono papal. Ε isso eram quase papas no Oriente, e no Ocidente os papas eram quase imperadores. Isso deu às duas
não foi por falta de papas porque mais de 40 papas ocuparam a cadeira episcopal de Roma nesse igrejas uma perspectiva inteiramente diferente em relação ao poder temporal.
período. Um rumoroso escândalo teve lugar em meados do século xi. Bento IX, papa indigno, foi O perfil intelectual do Ocidente também diferia do perfil do Oriente. O Ocidente latino era
expulso de Roma, e Silvestre 111 assumiu o trono papal. Bento voltou a Roma e vendeu o trono mais inclinado à consideração de assuntos práticos de administração e teve poucos problemas na
papal por uma grande soma de dinheiro em 1045 a um homem que se tornou Gregório vi. Em formulação de uma teologia ortodoxa. A mente grega do Oriente se interessava mais pela solução
meio aos fatos, entretanto, Bento se recusou a abdicar do papado. Havia, então, três papas, cada de problemas teológicos em termos filosóficos. A maioria das controvérsias teológicas entre 325
qual alegando ser o papa legítimo. Henrique 111, Imperador do Sacro Império Romano, convocou e 451 surgiu no Oriente, mas os mesmos problemas provocaram poucas dificuldades em muitos
então um sínodo em Sutri em 1046. Bento e Silvestre foram depostos, e Gregório foi obrigado a casos no Ocidente.
renunciar em favor de Clemente 11. Clemente morreu logo, e seu sucessor, outro indicado por Outra diferença entre as duas Igrejas gira em torno do celibato. O casamento dos clérigos
Henrique, também teve vida curta. Mais tarde, Henrique indicou seu próprio primo, Bruno, abaixo da posição de bispo era permitido no Oriente, mas no Ocidente os clérigos não podiam
depois papa Leão IX. contrair casamento. Os mesmos problemas surgiram em algumas ocasiões em relação ao uso de
Com a ascensão de Leão IX, teve fim a longa era de papas medíocres, porque ele e seus barba. No Ocidente, o sacerdote podia raspar a barba, mas no Oriente os clérigos tinham de
sucessores eram homens dignos e estavam interessados em reforma nos termos do programa de mantê-la. Além disso, o Ocidente destacava o uso do latim, enquanto as igrejas do Oriente
Cluny. O sínodo de Sutri marcou, então, o momento mais baixo do poder do papado na Idade usavam o grego. Isso ocasionalmente resultou em desentendimentos. Embora esses problemas e
Média. Com Nicolau 11, ajudado por Humberto e pelo competente Hildebrando, depois Gregório outros semelhantes possam parecer irrelevantes agora, foram de grande importância para as duas
vu, a eleição do papa saiu das mãos da turba romana para o controle dos líderes eclesiásticos no metades da Igreja.
Colégio dos Cardeais em 1059. Desde essa época até quando o papado alcançou seu apogeu com As duas Igrejas diferiam ainda em matérias teológicas. Em 867, Fócio, o patriarca no Oriente,
Inocêncio 111, houve um avanço cada vez maior da influência do papado na política europeia. acusou Nicolau 1 e a Igreja do Ocidente de heresia, porque o Ocidente colocara a cláusula
A Igreja no Oriente, fustigada pela luta para expulsar os muçulmanos do Império Oriental, filioque no texto do Credo Niceno. No Ocidente, os teólogos aceitavam a procedência do Espírito
enfraquecida pelo controle de sua vida pelo Imperador desse Império e frustrada pela estagnação Santo como vindo do Filho. O Oriente não aceitava essa interpretação.
teológica que se seguiu à obra de João Damasceno, não esteve em condições de oferecer grande Então uma série de controvérsias exasperou as relações entre o Oriente e o Ocidente. Com
oposição ao surgimento do poder temporal e espiritual do bispo de Roma. O crescente cada disputa, a hostilidade se acentuava.
antagonismo entre as duas metades da Igreja, com raízes já bem antigas, redundou numa ruptura Em meados do século 11, o problema da data da celebração da Páscoa contribuiu para
em 1054. Com essa cisão, surgiram duas grandes divisões da religião cristã, as quais desde então prejudicar as relações entre as duas metades da Igreja (veja cap. 8, pág. 88). Diferenças de
têm mantido poucos contatos de ordem oficial. opinião em relação a essa questão sempre tornaram difíceis as relações entre os dois grupos.

5
Ibid., 3.86-91. 2 Beresford J. Kidd, Documents Illustrative of the History of the Church (Londres, SPCK, 3 vols. 1920-1941) op.
cit., 3.82-84.
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tenha sido justificado por razões morais (veja pág. 178). Apesar de malsucedido, sua
interferência intensificou as más relações entre as duas Igrejas, uma vez que muitos no Oriente
achavam ser isso um assunto exclusivo do Oriente, intensificando assim as disputas entre as
duas igrejas.
B. O cisma de 1054
Em 1054, todas essas diferenças e todos esses antagonismos centralizaram-se em torno daquilo
que parecia ser um problema menor. Miguel Cerulário, patriarca de Constantinopla de 1043 a
1059, condenou a Igreja do Ocidente pelo uso de pão não-levedado na Eucaristia. Esse uso era
uma prática que se disseminara no Ocidente a partir do século IX. O papa Leão IX enviou o
cardeal Humberto e dois outros legados ao Oriente para pôr fim à polêmica. Quando as
discussões terminaram, as diferenças de opinião eram ainda maiores. No dia 16 de julho de 1054,
os legados romanos colocaram no altar superior da catedral de Santa Sofia um decreto de
excomunhão do patriarca e de seus seguidores.6 O patriarca não tardou em responder e
anatematizou o papa de Roma e seus seguidores. Foi esse o primeiro grande cisma no
cristianismo a romper com a unidade da Igreja. A partir de então, a Igreja Católica Romana e a
Igreja Ortodoxa Grega têm seguido caminhos diferentes. Essa mútua excomunhão só foi
removida em 7 de dezembro de 1965 por Paulo vi e Atenágoras.
C. Consequências do cisma
Qualquer movimento ecumênico se tornou muito difícil depois dos amargos acontecimentos que
separaram a Igreja do Oriente e a Igreja do Ocidente. O movimento ecumênico moderno que visa
à reunião das igrejas da Cristandade não tem apoio da Igreja Católica Romana e apenas um
pequeno apoio da Igreja Ortodoxa Grega. O movimento tem sido fundamentalmente protestante.
Nenhuma das duas igrejas deseja nenhuma igreja ecumênica exceto em seus próprios termos,
embora a Igreja do Oriente tenha se disposto a conferenciar com as Igrejas protestantes acerca da
reconciliação.
A separação excluiu a Igreja do Oriente de muitas das influências revitalizantes que
fortaleceram a Igreja no Ocidente. O surgimento de cidades, nações e da classe média, afora os
movimentos culturais da Renascença e a Reforma, não atingiram a Igreja no Oriente, enquanto a
A controvérsia iconoclasta na Igreja Oriental nos séculos VIII e IX provocou muitos Igreja Católica Romana do Ocidente esteve sujeita a essas influências e se fortaleceu, ou pela
sentimentos hostis. Em 726, Leão m, como Imperador do Oriente, proibiu qualquer genuflexão assimilação dos quadros favoráveis ou pela reação contra aquilo que parecia um perigo para
diante de esculturas ou imagens, e em 739 ordenou que tudo, exceto a Bíblia, ‫ ׳‬fosse removido Roma.
das igrejas e destruído para limitar o poder dos monges e para refutar as acusações de idolatria A Igreja no Oriente engajou-se, porém, em algum tipo de esforço missionário nesse período.
feitas pelos muçulmanos. Essa tentativa de reavivamento laico ‫ י‬na Igreja Oriental gerou a clara Bóris, o rei búlgaro, adotou a fé baseada em Constantinopla em 864. Apesar de terem sido Cirilo
oposição entre o clero paroquial e o clero monástico. No Ocidente, o papa e até mesmo o e Metódio os responsáveis pela conversão dos morávios ao cristianismo, estes no final das contas
Imperador Carlos Magno colocaram-se a favor do , uso de símbolos visíveis da realidade divina. passaram para debaixo da jurisdição romana. O patriarca obteve mais sucesso com a obra
Essa interferência do Ocidente nos negócios da Igreja do Oriente aumentou o antagonismo entre missionária na Rússia. Uma princesa chamada Olga aceitou o cristianismo em 955 e influenciou
as duas facções. A Igreja no , Ocidente continuou a usar imagens e esculturas no culto; a Igreja seu neto Vladimir (956-1015), que também se converteu em 988. Esse evento marcou o início do
no Oriente, entretanto, eliminou as esculturas, mas conservou os ícones, geralmente imagens de triunfo do cristianismo oriental na Rússia. A Rússia e a maior parte das regiões do leste e do
Cristo as quais se deveria reverenciar mas não cultuar, atitude que se deve a Deus somente. ‫י‬ centro da Europa seguiram o patriarca de Constantinopla.7 Os magiares também foram
O povo do Oriente ressentiu-se bastante da tentativa do papa Nicolau 1 em meados do século convertidos.
IX de interferir na nomeação do patriarca da Igreja no Oriente, embora

6
180 7
Ibid., 3.115-17.
Veja Robinson, Conversion, capítulo 19, para um interessante relato da conquista da Rússia para o Cristianismo.
O Cisma de 1054

O choque do islamismo no século VII e a perda de gente e de terras para os muçulmanos,


junto com os dois séculos de desavenças quanto ao uso de imagens, es-tagnaram o cristianismo
no Oriente. Pouco mudou na Igreja em termos de ritual, administração ou teologia dessa época
para cá. Por isso, ela não tem tido a influência sobre o mundo que teve o cristianismo no
Ocidente, muito embora no antigo período da história da Igreja tenha sido ela a líder na
formulação teológica.
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