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O NEO-INSTITUCIONALISMO E O VIÉS

ANTIPARTIDÁRIO NOS ESTUDOS LEGISLATIVOS

J. Cauby S. Monteiro*
M. C. Mira Cavalero Monteiro**
Tatiana Lobato de Lima***

RESUMO: O neo-institucionalismo na Ciência ações dos partidos e a relevância do papel que


Política vem exercendo significativa influência sobre exercem nas instituições legislativas são obliteradas,
os estudos legislativos, destacando-se na crítica às particularmente quando examinada a relação
análises enviesadas pelo antipartidismo em que as Executivo-Legislativo nos Estados brasileiros.

1 INTRODUÇÃO A ênfase nas investigações empíricas


sobre o funcionamento das instituições,
No Brasil, durante quase duas décadas
particularmente as legislativas, acentuou-se nos
desde o final dos anos sessenta, predominou na
anos noventa, ainda que os sistemas eleitoral e
Ciência Política uma significativa agenda de
partidário tenham se constituído em objetos de
pesquisas surgida a partir do conjunto da
análise desde a adoção das modernas
literatura acadêmica acerca de nossa
abordagens da Ciência Política no Brasil que
institucionalização política, pesquisas estas que
provavelmente remontam aos anos cinqüenta do
se voltavam para a investigação dos instrumentos
século XX. Esta perspectiva anteriormente
que poderiam aperfeiçoar e conferir estabilidade
negligenciada tem se fortalecido, como podemos
ao regime democrático brasileiro, mas que
observar na apresentação de resultados de
paradoxalmente prescindiram de seu exame
pesquisa nos GTs de estudos legislativos quando
sistemático. Na verdade, os fortes indícios
dos encontros anuais da Associação Nacional
apresentados por aqueles estudos de que a
de Pós-Graduação em Ciências Sociais
democracia não poderia viger, de alguma
(Anpocs) e nos bienais da Associação Brasileira
maneira acabaram por levar à atrofia das análises
de Ciência Política (ABCP). Predominaram,
empíricas sobre como o regime democrático
inicialmente, trabalhos sobre a relação entre
realmente funciona, embora, bem ou mal, e a
Congresso Nacional e Presidência da República.
despeito das restrições quanto ao seu exercício,
a democracia exista em nosso País há, pelo Nos principais programas brasileiros de
menos, quinze anos (Limongi, 2000, pp 103- pós-graduação em Ciência Política, surgem teses
104 e 143; Reis, 2000, pp 157-190).1 e dissertações que sinalizam claramente tanto o

*Professor do Departamento de Ciência Política (DECIP – CFCH/UFPA) e doutorando da UNICAMP em C. Sociais.


**Professora do Centro de Ciências Humanas e Educação (CCHE) da UNAMA e mestranda da UNICAMP em C. Política.
***Professora Substituta do DECIP/CFCH/UFPA e mestranda da UNB em C. Política.
1
Para os três critérios necessários ao perfilhamento de reformas políticas e econômicas ver Nelson (1994, p 7).
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Adcontar, Belém, v. 2, nº 1, p. 7-10, maio 2001
amadurecimento quanto à permanência desta 2 AGENDA DAS REFORMAS E OS
problemática na produção de conhecimento ESTUDOS LEGISLATIVOS
científico.2 Nos anos 90, sobretudo, começaram
a se destacar apresentações de resultados de A partir da década de 80, muitos governos
pesquisa da relação Executivo-Legislativo e do dos países então chamados “em desenvol-
comportamento parlamentar nas Assembléias vimento” ou “subdesenvolvidos”, em face da
Legislativas Estaduais (ALEs). As pesquisas crescente insatisfação pelos resultados socio-
sobre o comportamento dos congressistas, em econômicos do intervencionismo estatal,
geral, têm se voltado às questões pertinentes ao abandonaram estas intervenções de inspiração
sistema de governo, aos sistemas eleitorais - estruturalista para admitir mais fortemente a
como determinantes da dinâmica parlamentar -, atuação das forças de mercado na condução do
à maior ou menor disciplina, coesão e legislação desenvolvimento econômico (Colclough &
partidárias. Formas alternativas de alocação de Manor, 1994; Sola, 1993; Nelson, 1994). A
recursos públicos e também os desdobramentos adoção destas políticas passou a exigir, em países
da reforma do Estado foram alguns dos democráticos ou em processo de
fenômenos tratados pela literatura sob este ponto democratização, reformas constitucionais
de vista. Pouca ou nenhuma ênfase foi dada à (Sartori, 1996; Tsebelis, 1997) que viabilizassem
estrutura de organização do processo legislativo, os mecanismos de ajuste estrutural do Estado,
e, assim, deixou-se de mencioná-la como um quaisquer que fossem as teorias que
fator relevante nos incentivos para a tomada de fundamentam a condução destas reformas: a
decisão por parte dos representantes. neoliberal, a da sociologia institucional, da
O fenômeno legislativo nas unidades escolha racional ou do modelo principal-agente
federativas tem sido analisado a partir de (Pereira, 1997; Przeworski, 1998). As
categorias analíticas das teorias distributivista, instituições políticas viram-se, então, diante da
informacional e partidária, embora a maioria dos tarefa tanto de adaptar seu desenho institucional
estudiosos esteja de acordo que nenhuma destas a estes procedimentos quanto de efetivamente
teorias isoladamente permita a consecução de responder às demandas que a sociedade e a
uma análise satisfatória. Mesmo quando a economia apresentavam como constrangimentos
pesquisa está voltada para o estudo do à organização de suas atividades.
federalismo, tal approach não pode ser O Brasil foi um dos últimos países a adotar
prescindido. Talvez haja aqui um problema de medidas de ajuste. O longo período autoritário
desenho de pesquisa que mereça um exame mais (1964/1985) e os revezes que sucederam à
atento e que diz respeito, em primeiro lugar, à primeira eleição presidencial (1989) até a posse
conveniência ou não e aos limites do uso de de Fernando Henrique Cardoso (1994)
categorias analíticas para fenômenos contribuíram para adiar uma adesão mais
aparentemente semelhantes, porém, de explícita e inequívoca às políticas orientadas para
amplitudes diferentes. o mercado. O Executivo e o Legislativo

2
Ver sobre isso as teses e dissertações sobre comportamento legislativo produzidas na última década nos cursos de Ciência Política do
IUPERJ, USP, UFMG, UNB.

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Adcontar, Belém, v. 2, nº 1, p. 7-10, maio 2001
enfrentaram o desafio de processar manifestam suas características básicas e
institucionalmente as transformações necessárias regulares de ação.
ao ajuste. Desde o início do processo constituinte Tendo em vista o contexto nacional de
(1986), o Congresso foi a instituição mais posta reforma do Estado, e como ela é adotada nas
à prova e responsabilizada pelo adiamento da unidades federativas, caberia uma agenda de
implementação de transformações estruturais no pesquisas que enfocasse as decisões sobre
Estado brasileiro. políticas de imposição de perdas quando se
A tramitação legislativa de determinados constituem peças importantes para o exercício
projetos do Executivo trouxe à tona aspectos dos mecanismos de governabilidade que bem se
importantes da relação entre os dois Poderes, expressam na noção de estabilidade política.
tais como: o papel dos partidos, a coesão e Estamos nos referindo às matérias acerca das
disciplina partidária, o papel dos líderes (tanto reformas dos sistemas estaduais de Previdência
de oposição quanto de situação) na condução do funcionalismo público, de privatização ou
das votações em plenário e na formação e mesmo extinção de órgãos estaduais, ou, do lado
funcionamento das comissões legislativas, além do Legislativo, tentativas de impeachment, ou
das dificuldades mais gerais de aprovação, num restrições orçamentárias e tributárias que afetam
processo de reforma, de medidas “politicamente a capacidade de obtenção de recursos por parte
inviáveis” (politically unfeasible policies) que do governo.
impõem a grandes grupos de eleitores perdas
certas e imediatas em troca de ganhos futuros,
difusos e incertos (Nelson 1994, p 9; Figueiredo 3 O NEO-INSTITUCIONALISMO NA
& Limongi, 1998, p 67). CIÊNCIA POLÍTICA
Por exemplo: as mudanças legislativas na
Previdência Social 3 se constituíram num tema O neo-institucionalismo surgiu a partir das
que desnudou o processo de implementação de críticas apresentadas pela teoria da escolha
ajustes, permitindo tanto o exame privilegiado racional aos modelos explicativos até então
das disputas interpartidárias, quanto o da busca dominantes na Ciência Política norte-americana:
do consenso, de negociações e compromissos. o comportamentalismo e o pluralismo, mas tam-
Deste modo, possibilitou a análise da razão de bém como reação à tradição estrutural-
existência e relevância dos partidos na arena funcionalista e à irrupção do marxismo acadêmico
legislativa, assim como do resultado de sua nas décadas de sessenta e setenta. Veio a
atuação em termos do padrão de relacionamento chamar-se institucionalismo porque, em con-
entre Executivo e Legislativo. A opinião pública traste com as teorias anteriores, o foco da
atribui aos partidos, no Legislativo, maior explicação deslocou-se das preferências para as
autonomia em face do controle que os eleitores instituições, que passaram a ser as variáveis
idealmente deveriam exercer sobre seus independentes mais relevantes. Recebeu também
representantes. O Legislativo, por outro lado, é o adjetivo novo porque era necessário distingui-
a instituição onde os partidos apresentam maior lo do “velho” institucionalismo dominante antes
transparência ao escrutínio público. Se é verdade da Segunda Guerra Mundial, isto é, aquele
que neste contexto os partidos parecem expor praticado até o advento da chamada revolução
seus piores traços de atuação, também comportamentalista (Limongi 1994, pp 3-4;
Immergut, 1996, p.17).

3
Trata-se da tramitação da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que tramitou entre 1994 e 1998 no Congresso Nacional.
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Adcontar, Belém, v. 2, nº 1, p. 7-10, maio 2001
A percepção de que as instituições estrutura a informação, que ações podem ser
capacitam ou restringem em grande medida as tomadas, em que seqüência, e como ações
ações individuais ou de grupos de indivíduos, individuais serão agregadas e transformadas em
influenciando os resultados e alterando seus decisões coletivas (Kiser & Ostrom, 1982, p
objetivos, levou alguns autores a adotar as 179). As instituições têm sido entendidas como
instituições como variáveis independentes na regras formais, procedimentos de observância
análise das ações políticas. Para terem destas regras e práticas regulares e operativas
efetividade, as instituições precisam de que estruturam o relacionamento entre indivíduos
capacidade para estimular ou desestimular e as várias unidades do sistema político e da
comportamentos e atividades de recolher, economia, tanto como regras formais, quanto
acumular e distribuir recursos e implementar constrangimentos informais, meios de assegurar
meios para alcançar determinados fins; tudo isto seu cumprimento (North, 1990, p 386), ou ainda
implica o uso da força ou de meios de persuasão. como “investimentos”.
Enquanto a força pretende tornar o Uma instituição pode se caracterizar pela
comportamento indesejável mais dispendioso, a capacidade de delimitar escolhas e possuir
indução funciona incentivando o comportamento mecanismos de tomada de decisões. As
desejável (Elster, 1993, pp 147-149). instituições reduzem certos custos de transação,
Ainda que o termo neo-institucionalismo isto é, os de fazer e manter um contrato, mas ao
passasse a ser reivindicado por aqueles que se mesmo tempo engendram outros custos. Elas
opunham ao individualismo metodológico, o diminuem o grau de incerteza proveniente de
rótulo tendeu a ser associado aos seguidores do comportamentos imprevisíveis e,
institucionalismo proposto por March e Olsen conseqüentemente, facilitam a identificação de
(1984) ou por aqueles que aceitaram o convite parceiros adequados para as transações e a
de Sckopol (1985) e colaboradores para “trazer elaboração de contratos, levando em conta o
o Estado de volta” às suas análises. Para estes maior número possível de eventualidades. No
autores, talvez pudéssemos indicar uma filiação entanto, as instituições podem aumentar os custos
a algum tipo de institucionalismo histórico de uma transação ao elevar, por exemplo, o
(Immergut, 1994) em contraste com a análise número de parceiros na barganha e interação.
da teoria da escolha racional. Não obstante todas De qualquer maneira que sejam definidas, a
essas ressalvas, reconhecemos que hoje há uma ênfase estará nas regras que regulam
tendência que, feliz ou infelizmente, reforça a idéia comportamentos recorrentes (North, 1990,
da existência de um “paradigma neo- 1991).
institucionalista” (Lane & Ersson, 2000). A ênfase nas regras implica averiguar em
Talvez não baste apenas propor que as que consiste uma instituição e não somente o que
instituições sejam a chave para o entendimento ela faz. Nem por isso esta caracterização deixa
da “política” (no sentido simultâneo de polity, de obliterar distinções cruciais entre instituições
policy e politics), mas também defini-las, ainda e outros arranjos responsáveis pela agregação
que provisoriamente, como ponto de partida de comportamentos individuais. Em particular, a
metodológico para um desenho de pesquisa. É linha que divide uma instituição e uma norma
possível, por exemplo, enfatizar as regras como torna-se extremamente tênue se somente a
características que definem os arranjos natureza da regra for considerada. Há quem não
institucionais, em particular aquelas utilizadas por considere proveitosa a distinção entre instituição
indivíduos para determinar quem e o quê está e norma. No entanto, o linguajar comum tem
incluído em situações de decisão, como se bons motivos para distingui-las. Embora os dois
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fenômenos tendam a se reforçar mutuamente, sistema eleitoral. Para os autores identificados
tratá-los como se fossem o mesmo ofusca com esta corrente, os congressistas são guiados
algumas questões analíticas cruciais (Levi, 1990). pela lógica eleitoral e estarão interessados, quase
Existe certamente uma tendência de se impor que exclusivamente, em aprovar intervenções de
sanções contra aqueles que quebram normas, cunho clientelista.
porém os mais importantes incentivos para Para a versão informacional, as
obedecê-las parecem ser muito mais cognitivos instituições devem atender à necessidade do
e sociais (Elster, 1993, p 123). Instituições, por Poder Legislativo de decidir com base no maior
outro lado, contêm um aspecto legal e repousam volume de informação disponível. O Congresso,
numa estrutura relativamente clara de portanto, deve ser capaz de motivar os
implementação de decisões (Levi, 1990, pp 403- congressistas para que se tornem especialistas
404). em certas áreas e usem as informações de que
Em relação à escolha de instituições, o dispõem para o bem de todos. O foco é
foco analítico deixa de ser seu impacto sobre a transferido para a tentativa de promover políticas
interação política e passa a ser como elas públicas bem informadas por meio da redução
delimitam as possibilidades de escolha de novas da incerteza.
instituições. As constituições nacionais são A perspectiva partidária questiona as
freqüentemente citadas como exemplos premissas anteriores de que os partidos não
paradigmáticos de instituições que “duram” – são contam e que os interesses individuais dos
“à prova de renegociação” e exigem “robustez”. congressistas é que são relevantes, chamando a
Mesmo elas, porém, podem e algumas vezes atenção para a importância dos partidos como
devem ser mudadas. No final do século XX, elementos estruturadores da atividade legislativa
muitas constituições foram mudadas sob regimes (Patrício & Santos, 1996). A necessidade de
democráticos para que a organização do Estado reforçar sua imagem junto ao eleitorado torna-
pudesse contar com “uma estrutura de se um fator explicativo importante e a organização
recompensas e penalidades para mantê-la [a legislativa é entendida como expressão e forma
organização do Estado] em seu rumo – ‘bons’ de controle dos partidos sobre a ação
incentivos e desestímulos que espantem” (Sartori, parlamentar. Em comum, as três perspectivas
1996, p 216). possuem a referência ao indivíduo legislador
como unidade de análise, e a preocupação em
comprovar a veracidade de seus modelos por
4 O NEO-INSTITUCIONALISMO E OS intermédio do exame da gênese e dinâmica de
ESTUDOS LEGISLATIVOS funcionamento das comissões permanentes do
Congresso.
A principal diferença entre as três grandes Em alguns modelos interpretativos do
correntes que analisam o Poder Legislativo diz papel da estrutura institucional, a variável
respeito aos motivos pelos quais as instituições dependente é o potencial para a mudança de
de organização do processo decisório são política (policy) em contextos distintos, embora
criadas.4 esta possibilidade, destituída de outros fatores,
Na teoria distributivista, a ênfase recai não garanta que alguma mudança venha a
sobre as motivações resultantes da natureza do ocorrer. A estabilidade nas políticas (policies)

4
São elas: a distributivista, a informacional e a partidária. Na verdade, estas últimas são dissensões da visão distributivista, que é a
perspectiva dominante (Limongi, 1994, p 4).
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estaria inversamente relacionada com a que nenhum apoio recíproco fosse possível. No
estabilidade política, isto é, produziria entanto, cada parlamentar teria que trocar a
instabilidade no regime ou no governo em geral. aprovação de seu projeto individual pelo seu
O conceito central nessas análises é o de veto apoio a projetos de, pelo menos, metade dos
player, definido como um ator coletivo ou membros do Legislativo, já que cada parlamentar
individual cuja aquiescência é necessária para representa um voto.5 Os legisladores, portanto,
uma decisão. Os atores com poder de veto se deparam recorrentemente com a possibilidade
podem ser divididos em duas categorias: de seus pares não honrarem compromissos de
partidários (os partidos) ou institucionais apoio recíproco (logrolling), o que levaria o
(Presidente, Casas do Congresso). A Congresso à paralisia decisória, pois não seria
estabilidade nas políticas aumentaria com: 1) o possível a formação de coalizões vencedoras
número de atores com poder de veto; 2) sua para cada projeto (Melo, 1997, p 76).
incongruência (a diferença em seus A solução histórica para esse tipo de
posicionamentos); 3) a coesão interna desses problema de ação coletiva foi a formação de
atores. Assim, democracias que mostram comissões e subcomissões especializadas que
dominância de um só partido ou governo de detêm “direitos de propriedade” sobre o
minoria de partido único apresentariam apenas tratamento exclusivo das questões acerca de seus
um ator com poder de veto, enquanto sistemas distritos eleitorais (constituencies). Os membros
presidencialistas, federativos ou parlamentaristas dessas comissões tipicamente representariam de
de coalizão exibiriam múltiplos atores com poder forma mais intensa os interesses setoriais e
de veto (Tsebelis, 1997). Outros estudos, localistas, e tomariam decisões, superando assim
entretanto, apontam continuidade e estabilidade um problema de ação coletiva. Os membros de
nos programas sociais mesmo em países com uma comissão especializada, por se auto-
significativas diferenças institucionais (Figueiredo selecionarem, são os representantes mais
& Limongi, 1999, p 194). identificados com interesses setoriais relativos a
Parlamentares possuem preferências que esta comissão. Em suma, o sistema de comissões
são primariamente a reeleição, e secunda- e subcomissões representa um arranjo específico
riamente o aumento de seu prestígio e patrimônio que permite a mediação entre interesses sociais
(à medida que o primeiro determina estes e decisões legislativas. Os partidos disciplinados
últimos). A busca da reeleição leva o parlamentar também são citados como formas de superação
médio a favorecer projetos que tragam do chamado dilema do “segredo eficiente”: a
benefícios concentrados (espacialmente) para superação de interesses localistas por interesses
seus distritos e/ou para os grupos de interesse universalistas programáticos. A direção dos
que os apóiam (setorialmente). Os projetos cujos partidos responde a uma estrutura de incentivos
benefícios são difusos tendem a ser distinta daquela com que se depara o parlamentar
“subproduzidos”. Os parlamentares interagem médio. Tal estrutura associada à disciplina
numa arena sujeita à regra majoritária, ou seja, partidária permite que um espectro mais amplo
os projetos devem contar com a aprovação da de interesses seja contemplado (Shepsle &
maioria dos seus membros. Assim, teoricamente, Weingast, 1981).
os membros do Congresso se engajariam em um Enfim, a teoria distributiva da organização
processo de trocas mutuamente vantajosas até legislativa tem sido contestada fundamentalmente

5
No caso brasileiro, esse número seria de 257 parlamentares.
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porque, ao enfatizar o sistema de comissões, por interesses escusos e inconfessáveis. Como
prescinde do papel dos partidos, dos ganhos prova dessa crença, argumenta-se que os
coletivos produzidos pelo sistema de comissões partidos brasileiros não exibem continuidade
especializadas – redução dos custos de obtenção histórica, não representam interesses de classes
de informação por não-especialistas –, do sociais, não possuem coerência programática,
aprendizado social resultante, ou ainda por não e, quando estão no poder, suas ações vão de
considerar os ganhos de eficiência (pela encontro às demandas de seus eleitores, além
diminuição dos custos de agente-principal) do que seus membros, quando detentores de
gerados pela delegação de atribuições a cargos eletivos ou de nomeação, abandonam
comissões (Krehbiel, 1991; Kiewiet & qualquer fidelidade ao programa partidário e se
Mccubbins, 1991; Limongi, 1994; Melo, 1997). transformam em trânsfugas, ao sabor das
Todas estas abordagens, entretanto, precisam circunstâncias de manutenção do poder.
passar por um teste empírico do funcionamento O primeiro traço constitutivo desta visão
das instituições legislativas nacionais pois, como está relacionado com a crença de que os partidos
já ressaltaram alguns pesquisadores brasileiros, devem manter uma estreita relação com as
a principal lição a ser extraída destes estudos classes sociais para que possam ser
diz respeito, sobretudo, ao foco de análise. Os considerados organizações autênticas e válidas.
resultados das investigações institucionalistas nos Este argumento, entretanto, não pode ser aceito
mostram que variáveis organizacionais sem reservas: evocaremos, em primeiro lugar, a
específicas à organização dos trabalhos principal restrição ao chamado modelo classista
legislativos podem e devem ser tomadas como de análise partidária por sua excessiva tendência
variáveis independentes com grande poder a reduzir os partidos a sua base social,
explicativo. Estas contribuições tenderam a ser “descuidando do efeito constitutivo que a própria
ignoradas por estudos comparativos estrutura do Estado, e portanto da arena
preocupados com o destino de governos decisória, tem sobre eles” (Souza, 1976, p 40).
presidencialistas: os aspectos institucionais da A análise das relações entre partidos e
organização dos trabalhos legislativos foram classes, além de ser bastante complexa no que
negligenciados e, implicitamente, portanto, diz respeito à correspondência e à representação
assumidos como irrelevantes. “Inferências sobre de interesses sócioeconômicos e ideológicos, ao
os efeitos de governos baseados na separação apoio de bases eleitorais classistas aos
de poderes tenderam a deixar na sombra um dos candidatos e aos resultados efetivos de defesa
poderes em questão” (Figueiredo & Limongi, dos interesses de classe pelos partidos, não pode
1997, p 2). subestimar o peso específico que a estrutura
estatal exerce sobre o sistema partidário. O
perigo do reducionismo societal (ou em outras
palavras, a redução da vida partidária à sua base
5 O ANTIPARTIDISMO E O MODELO social) no estudo da constituição dos partidos,
DE ANÁLISE DOS PARTIDOS NO não deve ser colocado em segundo plano, sob
BRASIL pena de não se apreender corretamente seu
comportamento e desempenho nos Poderes
Há no Brasil uma visão muito difundida Executivo e Legislativo. Vários resultados de
de que os partidos, de um modo geral, pesquisa têm levado alguns analistas a repensar
ressalvadas as raras exceções, são organizações a exigência de que um partido deva representar
artificiais manipuladas pelo Poder Executivo ou a tradução necessária e suficiente de uma classe
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ou grupo social (Balbachevsky, 1992, pp 161- pesquisas apontam a fragilidade desses
162). pressupostos. Não corresponde à realidade
Esta crença e a busca de um “verdadeiro afirmar que projetos propriamente partidários
partido” tão presente na opinião pública, na não encontrem espaço para se implantar entre
mídia, no senso comum e na cultura política os eleitores. A debilidade do sistema partidário
nacional, dificultam a compreensão do papel que é um dado empírico que não podemos refutar,
os partidos desempenham e da função que todavia a responsabilidade por essa fraqueza não
exercem no interior das instituições. deve ser imputada a alguma idiossincrasia
Diferentemente do que seria esperado como específica do eleitorado. Não basta dizer que
conseqüência desta visão distorcida acerca da no Brasil não existem partidos porque o povo
vida partidária nacional, os partidos na Câmara não vota em partidos, na verdade, guardadas as
do Deputados de 1989 a 1994 (período de diferenças de situação, o que podemos ver é que:
relações entre Executivo e Legislativo
particularmente tensas no Brasil), não tiveram um o padrão de comportamento do eleitorado
comportamento parlamentar caótico e brasileiro nessa dimensão não é muito
diferente daquele que se observa em países cujo
indisciplinado. Algumas pesquisas têm insistido sistema partidário tem uma história muito mais
em apontar a fragilidade da estrutura partidária longa. (...) Se neste país os partidos são frágeis,
brasileira e, direta ou indiretamente, atribuem a as causas devem ser buscadas em outras searas
esta estrutura uma das causas dos problemas (Balbachevsky, 1992, pp 161-162).6
enfrentados pelo País. Partidos,
conseqüentemente, não passariam de Talvez o elã que impulsiona os mais
agrupamentos frouxos, nos quais deputados se mirabolantes projetos de reforma do sistema
reuniriam em função dos seus interesses político no Brasil e as constantes propostas de
conjunturais. A crescente fragmentação engenharia institucional para o aprimoramento
partidária, de acordo com esta explicação, deste sistema não atentem, em seu excessivo
resultante também dos interesses individuais dos formalismo, para a dinâmica da realidade política
deputados, tornaria impossível esperar qualquer que viceja sob o presidencialismo e os sistemas
comportamento previsível e estruturado dos eleitoral e partidário nacionais. Por isto parte
legisladores. O comportamento do parlamentar destas propostas se apresenta a alguns analistas
não guardaria nenhuma relação com sua filiação como máscaras do velho liberalismo oligárquico
partidária. “A fragmentação partidária nominal brasileiro em seu recôndito desejo de regresso
esconderia uma fragmentação real que seria ao passado de exclusão e de cidadania quase
ainda maior. (...) os julgamentos apresentados inexistente. Tanto o número de partidos efetivos,
acima são infundados” (Figueiredo & Limongi, quanto o de candidatos por posto são
1995, p 497). compatíveis com a heterogeneidade de interesses
Acredita-se que, para a maioria do e a densidade eleitoral do País. É aceitável,
eleitorado, o que realmente importa é o contudo, que eleitorados gigantescos optando
candidato e não o partido ao qual pertence, entre significativo número de competidores eleva
todavia os resultados da pesquisa sobre a a imprevisibilidade dos resultados.
motivação dos eleitores ao escolher um candidato Considerando-se ainda que o encontro entre
também contrariam esta crença. Resultados de eleitores e partidos, como fenômeno recente em

6
Sobre as inclinações ideológicas nas decisões de voto do eleitorado, ver também Singer (2000).
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nossa história, torna plausível antecipar a também contribuem para a manutenção destes
permanência de certa instabilidade no sistema mesmos padrões negativos que se expressam nos
partidário, em especial no de legendas. Também seguintes traços (Kinzo, 1993, p 5): 1) intensa
tendem a ser oscilantes as taxas de renovação desagregação do jogo político-partidário; 2)
parlamentar em todos os níveis. Nada disso excessiva heterogeneidade e fragmentação
indica morbidez da estrutura política brasileira. interna dos partidos; 3) falta de comprome-
Ao contrário, tratam-se de: timento programático; 4) escasso compromisso
de uma parcela considerável da elites brasileiras
sintomas de repulsão ao nosso secular sistema com as instituições partidárias; 5) facilidade com
oligárquico e da compreensível hesitação que se troca de partido e; 6) desrespeito pela
sobre os rumos a tomar. Uns pretendem fazer
refluir a competição para canais
relação representante-partido-representado. É
oligarquizantes – voto majoritário, exclusão necessário, em primeiro lugar, aceitar o fato de
de partidos –, ou mesmo cortar o fluxo de que, para o bem ou para o mal, os partidos no
conversão (tornando o voto facultativo) Brasil existem e devem ser entendidos como
(Santos, 1994, p 64).7 organizações que atuam no mercado de votos e
como agentes que de algum modo interferem no
As opiniões até aqui refutadas, não só por processo decisório governamental. Finalmente,
corresponderem a traços arraigados da assim é necessário, também, no caso brasileiro, seguir
chamada cultura política brasileira, mas as regras de como contar o número de
sobretudo por serem parcial e escandalosamente partidos, levando-se em consideração sua
verdadeiras, têm mantido sua força na mídia, nas potencialidade de coalizão (Regra nº 1) ou de
elites e até mesmo entre alguns estudiosos do chantagem (Regra nº 2). Os que não têm essas
sistema partidário. Talvez se possa atribuir estas características são irrelevantes e não devem ser
opiniões ao antipartidismo “como norma vigorosa levados em conta, portanto, é enganoso contar
e assaz enraizada no pensamento político nominalmente todos os partidos de um
brasileiro” (Souza, 1976, p 30). Antipartidismo determinado sistema; a verdade é que
este que, para uma melhor avaliação do quadro encontraremos partidos que não fazem diferença:
partidário brasileiro, exige uma análise de seus podem aparecer ou desaparecer sem que sejam
antecedentes históricos. Esses antecedentes se notados (Sartori, 1996, pp 46-47; 1982, pp
compõem de dois fatores básicos: de um lado, 145-148, 330-334; Kinzo, 1993, p 1).
uma experiência que não incentivava o
fortalecimento de partidos; e de outro, uma
estrutura institucional que também afetou 6 A RELEVÂNCIA DOS PARTIDOS
negativamente o desenvolvimento do sistema NO LEGISLATIVO BRASILEIRO
partidário (Kinzo, 1993, p 5).
Tanto do lado da experiência brasileira, Quando, a partir de 1985, no início do
que não incentiva o fortalecimento dos partidos, primeiro governo civil, o Legislativo brasileiro
quanto da estrutura institucional que cria adquiriu maior importância com o processo de
obstáculos ao desenvolvimento do sistema democratização, a relevância dos partidos pôde
partidário, têm-se fatores inibidores que não ser melhor detectada, como já havia ocorrido,
apenas explicam a existência de certos padrões por exemplo, na própria eleição via colégio
de comportamento antipartidário arraigados, mas eleitoral, que não elegeu Paulo Maluf, o candidato

7
Sobre as conseqüências do fim do voto obrigatório ver Elkins (2000).
105
Adcontar, Belém, v. 2, nº 1, p. 7-10, maio 2001
apoiado oficialmente pelos membros do agilidade ao desafio que a crise econômica se
Executivo, mas Tancredo Neves, o candidato lhes apresentava. O funcionamento do Con-
articulado por uma ampla coalizão de oposição gresso Nacional, tanto hoje quanto no período
moderada ao regime militar. Esta relevância dos anterior à transição do autoritarismo para
partidos na arena legislativa ganhou naturalmente democracia, assim como nas arenas partidária e
maior transparência e efetividade durante o eleitoral, apresenta aspectos importantes em
processo constituinte de 1986 a 1988. Foi relação ao desenvolvimento dos partidos (Kinzo,
constatado, por exemplo, para este período, uma 1990; Figueiredo & Limongi, 1995a e 1994).
maior definição ideológica e programática dos O Legislativo destacou-se no período inicial da
partidos em sua atuação para elaborar a nova implantação do regime democrático pela
Carta Constitucional. Embora não seja fácil dinâmica da Assembléia Constituinte, estabele-
vislumbrar uma situação em que o sistema cida para definir, na nova Constituição, o pacto
partidário brasileiro de fato se estabilize e se social substantivo e seus procedimentos de
consolide, isso não significa que os partidos não implantação que as negociações da transição
desempenhem um papel importante, como democrática não foram capazes de produzir
ocorreu, por exemplo, no processo de transição (Figueiredo & Limongi, 1995), e isto ocorreu
democrática e o trabalho por eles desenvolvido logo após ter participado das negociações da
na Assembléia Nacional Constituinte. Apesar das passagem para o governo civil que se iniciaria a
inúmeras vezes que a composição das bancadas partir de março de 1985. A atuação dos parla-
foi alterada em conseqüência das reformulações mentares em torno de questões políticas, sociais
do quadro partidário, a definição de posições e econômicas contribuiu para a identificação de
razoavelmente claras, separando os partidos em tendências substantivas definidas e expressas
questões relevantes pode ser o prenúncio da através de posicionamentos e da formação de
formação de clivagens mais duradouras. Não é blocos e dissensões partidárias, e possibilitou aos
demais lembrar, contudo, que a consolidação do parlamentares o uso de recursos reais de
sistema partidário no Brasil, nos termos de representação, através, por exemplo, das práti-
Sartori, só ocorrerá com a confluência de fatores cas de negociação entre interesses conflitantes.
que permitam a continuidade da experiência Pôde-se observar por meio da dinâmica
democrática (Kinzo, 1990, p 127). dos trabalhos da Constituinte a presença de
Após dez anos da promulgação da importantes elementos próprios ao funciona-
Constituição, já realizadas três eleições mento partidário, como níveis importantes de
presidenciais diretas (1989, 1994, 1998), três coesão e de diferenciação programática entre
para governadores e deputados (estaduais e as agremiações (Kinzo, 1990). Com o marco
federais, 1990, 1994, 1998), para senadores, constitucional de 1988, a arena congressual foi
prefeitos e vereadores, da adoção dos institutos alterada pela recuperação de sua capacidade de
constitucionais de eleições em dois turnos e no intervenção, que lhe fora retirada durante o
último pleito (1998), do instituto da reeleição, regime militar. A despeito da manutenção de um
do equacionamento da crise do impeachment instrumento em alguns aspectos semelhante ao
e renúncia de Collor: os partidos e o Congresso decreto-lei que dota a Presidência da República
Nacional, envolvidos na gestão do Plano Real e de poder de agenda sobre o funcionamento do
nas reformas constitucionais funcionaram Legislativo – estamos nos referindo à medida
institucionalmente e com relativa regularidade e provisória8 –, a investigação do comportamento
8
Carey e Shugart (1998) afirmam que a prática dos decretos do Executivo em si não significa necessariamente que as legislaturas sejam
marginalizadas na produção das políticas.
106
Adcontar, Belém, v. 2, nº 1, p. 7-10, maio 2001
partidário no Congresso a partir da promulgação Os principais estudos sobre o tema, no
da Constituição de 1988, revela uma dinâmica entanto, concluem que os efeitos esperados da
na qual se definem importantes alterações no legislação eleitoral e da forma de governo sobre
perfil dos partidos, possibilitando seu as relações entre os poderes Executivo e
fortalecimento. Algumas pesquisas apontam, por Legislativo e sobre o comportamento dos
exemplo, que o comportamento partidário no parlamentares no Brasil não são respaldados
Congresso vem indicando positivamente a empiricamente (Figueiredo & Limongi, 1995a).
definição de perfis político-ideológicos mais Não foi encontrada indisciplina partidária e
consistentes, através inclusive da identificação de tampouco um Congresso que agisse como um
um padrão ideológico de alianças (Figueiredo ator com poder de veto (veto player). Os dados
& Limongi, 1994). Acreditamos que esta analisados mostram fortemente a preponderância
situação partidária possui uma relevância do Executivo sobre um Congresso que se dispõe
específica para o Congresso Nacional, de tal a cooperar e vota de maneira disciplinada de tal
modo que informa de maneira substantiva o modo que “em média, 86% do plenário vota de
processo de tomada de decisão e que, portanto, acordo com a orientação de seu líder, taxa
constitui-se numa característica fundamental para suficiente para predizer com acerto 90% das
o entendimento do comportamento partidário no votações nominais” (Figueiredo & Limongi,
Congresso Brasileiro. 1997, p 1).10
Não basta detectar esta ação partidária
nas comissões e procedimentos de votação, mas
principalmente na atuação do colégio de líderes 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
e no poder que eles exercem na condução dos
trabalhos legislativos. A existência constitucional Os estudos sobre os legislativos estaduais
de um poder de decreto - medida provisória9 -, têm se caracterizado por adotar basicamente três
além da prerrogativa do Executivo de proposição perspectivas que privilegiam: 1) o
legislativa (inclusive em matéria constitucional), “ultrapresidencialismo” estadual marcando a
e a possibilidade de veto presidencial cuja relação entre Executivo e Legislativo como um
revogação pelo Legislativo exige quorum dos componentes do federalismo brasileiro
qualificado de três quintos, fazem com que a (Abrucio; Teixeira & Costa, 2000); 2) ou os
principal especificidade do caso brasileiro, aspectos endógenos do funcionamento e
comparando-se com os EUA, resida no poder organização do Legislativo (Santos, 1998); 3)
muito maior que o Executivo detém no Brasil, ou, sob forte influência da abordagem
na sua produção jurídica, que pode passar ao informacional, num modelo em que as
largo do Legislativo e o torna ator decisivo na Assembléias Legislativas são compreendidas
troca de votos. Enquanto no Brasil os trabalhos como um conjunto complexo de resultantes de
legislativos são centralizados e ancorados na constrangimentos dos sistemas eleitorais e
ação dos partidos, nos Estados Unidos, eles são partidários, mudanças, regras, estrutura e
descentralizados e estruturados a partir das funcionamento institucionais (Anastasia, 2000).
comissões e da ação individual dos parlamentares Um primeiro passo para avançar nesta
(Figueiredo & Limongi, 1997). direção seria a adoção de estudos comparativos

9
Constituição Federal Art. 22. Sobre o poder executivo de decreto veja Carey e Shugart (1998).
10
Os dados de Marcos Melo mostraram, todavia, que no caso da Previdência, os resultados das votações abalaram estas convicções
sobre sua previsibilidade e a disciplina partidária (Melo, 1997a).
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entre as diversas assembléias estaduais do País, CAREY, John; SHUGART, Matthew. Poder
ou ao menos de uma região. Tal procedimento Executivo de Decreto: Chamando os tanques ou
permitiria ressaltar características típicas de usando a Caneta. Revista Brasileira de
como esses subsistemas se diferenciam do Ciências Sociais, v. 13, n. 37, jun., 1998.
sistema nacional.11 Se acrescentarmos a estas
singularidades das ALEs o contexto de uma COLCLOUGH, Christopher, MANOR, James
região como a Amazônia, estaremos desenhando (Comp.). Estados o Mercados? El
instituições legislativas obrigadas a processar Neoliberalismo y el Debate Sobre las
produtos decorrentes de estruturas Políticas de Desarrollo. México: Fondo de
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marcados por fatores econômicos e societais
resultantes das características de graus de ELKINS, Zachary. Quem iria votar?
desenvolvimento (econômico, social e político) Conhecendo as conseqüências do voto
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