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EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CELIBATO

CLERICAL
Prof. Roberto do Amaral Silva
O celibato no Novo Testamento
Paulo fez opção pelo celibato para estar mais
disponível para o serviço do Evangelho (Co 7.7 e
9.5), mas não fez disso uma regra geral. As
prescrições no Novo Testamento referente ao
casamento de um ministro da Igreja são de Paulo: "E
necessário que o bispo seja irrepreensível, marido
de uma só mulher” (1Tm 3.2, NVI) e “É preciso que o
presbítero seja irrepreensível, marido de uma só
mulher” (Tt 1.6, NVI).
A tradição patrística interpreta essa passagem
como a proibição de conferir a ordenação a um
homem que se tenha casado duas vezes e como a
proibição de que um bispo/presbítero viúvo volte a
se casar. Alguns consideravam também que havia
a obrigação de o bispo casar-se.
Casamento e celibato nos três primeiros
séculos
Nenhuma lei, no Ocidente ou no Oriente, proíbe a
ordenação de homens casados, nem exige que os
sacerdotes casados se abstenham das relações
conjugais. Da mesma maneira, não parece ter
havido nenhuma objeção quanto ao fato de que um
sacerdote, celibatário no momento da ordenação, se
casasse em seguida.
Contudo, a valorização do ascetismo e da
virgindade favorece o pensamento de que seja mais
perfeito para um sacerdote permanecer celibatário
ou, se este for casado, abster-se das relações
conjugais.
O celibato no século IV
“Tanto no Oriente como no Ocidente, proíbe-se o casamento após
a ordenação. Aquele que é casado permanece nessa condição
após a ordenação. O celibatário igualmente permanece como tal.
Cada um deve ser fiel ao primeiro vínculo contratado, casamento ou
ordenação.
No início do século, a maioria dos clérigos faz uso de seus direitos
conjugais. No final do século, há uma inversão: os clérigos que se
abstêm das relações conjugais constituem a maioria. Encontra-se
uma dupla explicação: uma maior disponibilidade para Deus e a
incompatibilidade do exercício da sexualidade, que pertence ao
domínio do impuro, com a celebração cotidiana da Eucaristia.
No Ocidente (Espanha e Roma), alguns concílios exortam os
bispos, os sacerdotes e os diáconos à abstinência conjugal.”
COMBY, Jean. História da Igreja: das origens ao século XV. São Paulo: Editora Loyola, 1993, p.
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O celibato clerical no Sínodo de Elvira

No decreto publicado no Sínodo de


Elvira, em 25 de outubro de 304, lemos no
Cânon 33:

"Ficou plenamente decidido impor aos


bispos, aos presbíteros e aos diáconos,
como a todos os clérigos no exercício do
ministério, a seguinte proibição: que se
abstenham das suas esposas e não gerem
filhos; quem, porém, o fizer deve ser
afastado do estado clerical."
O celibato nos séculos V e VI
No Oriente, bispos, sacerdotes e diáconos poderiam se casar. No Ocidente, o
bispo de Roma exigiu que todas as Igrejas impusessem a abstinência conjugal
aos bispos, sacerdotes e diáconos, mas estes poderiam continuar a coabitar com
suas esposas.
No Oriente, a Igreja fixa definitivamente a sua disciplina relativa aos clérigos
e ao casamento (692). Trata-se da mesma em vigor nos dias de hoje:
— O homem casado, escolhido como bispo, deve separar-se de sua mulher.
Esta última deve deixar o domicílio conjugal e ir viver num mosteiro afastado. O
bispo deve prover as necessidades de sua esposa. Mas, cada vez mais,
escolhem-se os bispos entre os monges.
— Casados quando de sua ordenação, o sacerdote e o diácono nada mudam
em sua vida conjugal. A prática contrária chega mesmo a ser condenada.
No Ocidente, a abstinência conjugal dos clérigos é reforçada: um concílio
deseja introduzir um vigia no quarto dos clérigos. São aplicadas algumas sanções
contra aqueles que tiveram um filho depois da ordenação.
O celibato desde Carlos Magno ao século XI

A partir da época de Carlos


Magno, ainda são ordenados
homens casados que mantém a
abstinência conjugal numa
coabitação possível.
Contudo jovens clérigos
celibatários formados em
escolas são ordenados sem
serem casados. Apesar da
proibição, existem os que se
casam após a ordenação. Essa
é a situação encontrada por
Gregório VII em 1073.
A reforma gregoriana e o celibato do clero
Gregório VII, em 1074, não distingue mais
entre sacerdotes casados antes ou depois da
ordenação.
Toda coabitação é proibida sob pena do não
exercício do ministério. Daí terem surgido
algumas resistências contra a decisão pontifical:
“Essa lei é insuportável e despropositada ”; “Sem
o auxílio de mãos femininas, pereceremos de frio
e de desnudamento...”.
Alguns consideram essa lei como uma
novidade em relação à tradição. Contudo, ainda
que ilícito, o casamento dos padres é considerado
como válido.
O segundo concílio de Latrão (1139)e o celibato
O segundo concílio de Latrão decide que o
casamento dos sacerdotes é inválido. Em 1170, o papa
Alexandre Ill exige que a esposa do homem casado que
é ordenado ao sacerdócio tenha dado o seu
consentimento de antemão e faça, por sua vez, voto de
castidade.
Por conseguinte, de direito sempre é possível
ordenar um homem casado que se separa de sua
mulher. Concretamente, tal coisa é bastante difícil, o
sacerdócio é, portanto, praticamente limitado aos
celibatários e aos viúvos.
Somente no Código de Direito Canônico de 1917 é
dito que o casamento constitui um impedimento para o
ingresso nas ordens, sendo, portanto, imposta, de
maneira explícita, a lei do celibato eclesiástico.
O celibato clerical no Brasil
“Em virtude do fenômeno conhecido como padroado, no período
colonial e no Império, a Igreja Católica brasileira foi fortemente controlada
pelo Estado, recebendo relativamente pouca influência de Roma. Os papas
tiveram muita dificuldade em aplicar no Brasil as normas da lei canônica,
inclusive no que se refere ao celibato dos sacerdotes. Essa restrição, aliada
ao ambiente cultural permissivo dos trópicos, contribuiu para que muitos
padres ‘seculares’ (isto é, não filiados a ordens religiosas) tivessem suas
companheiras e filhos, não somente nas cidades, mas também no
ambiente patriarcal dos engenhos de açúcar. Preocupado com essa
situação constrangedora, Diogo Antônio Feijó, um sacerdote liberal que
ocupou altos cargos na administração do Império na década de 1830,
quando deputado em São Paulo chegou a propor que aquela província
autorizasse o casamento clerical e escreveu um tratado sobre essa
questão.”
MATOS, Alderi Souza. Caminhada Cristã na História. Viçosa (MG), Ultimato, 2005, p.53,54
O clero brasileiro à margem do celibato
“No longo pontificado de Pio IX (1846-1878), Roma foi assumindo
gradativamente um maior grau de controle sobre a Igreja brasileira.
Todavia, por um bom tempo uma parcela do clero secular continuou
arredia à aceitação do celibato. É muito interessante a esse respeito o
testemunho do Rev. John Boyle, um missionário presbiteriano pioneiro
que trabalhou por cerca de dez anos no Triângulo Mineiro e em Goiás.
Em 1888, ele esteve em uma cidade goiana no dia em que se casou
a filha do padre local. O missionário soube que o casamento foi
oficiado pelo vigário vizinho e que os dois velhos sacerdotes sempre
batizavam e casavam os filhos um do outro. E esse caso não era
excepcional. Em toda a região e em todo o país multiplicavam-se os
casos de padres amancebados, variando a atitude dos bispos em
relação aos mesmos.”

MATOS, Alderi Souza. Caminhada Cristã na História. Viçosa (MG), Ultimato, 2005, p.53,54
O celibato do clero após a República
“Foi somente algumas décadas após a Proclamação da
República, com a revitalização da Igreja Católica brasileira e
sua maior submissão a Roma, que o celibato clerical passou a
ser amplamente exigido e observado. Isso agravou um
problema: o número relativamente pequeno de vocações para
o sacerdócio, visto que não muitos jovens estavam dispostos a
abrir mão da possibilidade de se casarem. Essa foi uma das
razões pelas quais sempre houve no Brasil, ‘o maior país
católico do mundo’, um número desproporcional de
sacerdotes estrangeiros.”
MATOS, Alderi Souza. Caminhada Cristã na História. Viçosa (MG), Ultimato, 2005,
p.54,55

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