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Diretor: Mário Ramires Conselheiro editorial: José António Saraiva Diretor Executivo: Vítor Rainho Diretor Executivo Adunto:

José Cabrita Saraiva Diretor de Arte: Francisco Alves

FORÇAS
NASCER DO

ARMADAS
ESTÃO EM
20 OUTUBRO 2023 | N.º 895 | 4 € | nascerdosol.pt

PROCESSO
OE 2024 deixa militares à beira
de um ataque de nervos. Falta
de meios é crítica nos três ramos
das Forças Armadas. Depois
do CEMA, também o CEMFA

DE FALÊNCIA
escreveu à ministra dizendo que
a Força Aérea já não tem meios
para assegurar as missões que lhe
estão confiadas. Mal-estar é geral
e respostas de Helena Carreiras
são insatisfatórias /20-21

MANUEL LEMOS / Álvaro Mendonça e Moura


Plano de combate Guerra Secretas
em alerta
Presidente da CAP

à pobreza é muito
insuficiente no Médio → Agentes
‘O que mais me
impressiona é a falta
Oriente
Pág. 22
monitorizam
elementos suspeitos
em Lisboa e na de ambição’ /14-17
MANUEL PIZARRO / divide Margem Sul /6-11
Despacho de
secretário de Estado Igreja Fátima Bonifácio

Católica
‘A conversa da
baralha sistema proporcionalidade
Pág. 23 não passa de
retórica vácua’ /9
→ São históricas as clivagens
LUÍS FILIPE MENEZES / entre jesuítas e franciscanos. / Mário Ramires: Forças desar-
‘Montenegro tem de Roma tenta agradar a judeus madas em tempo de guerra
e palestinianos. D. José / José António Saraiva:
se rodear de gente Ornelas fala em busca Um Orçamento popular
mais conhecida’ da convergência para a paz / Vítor Rainho: Os comentadores
Pág. 18 guerrilheiros do Hamas

No interior ÁFRICANEWS
ANGOLA: O¡ q%’?u{
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DINHEIRO PORTUGAL
AMANHÃ
Donde vem, como funciona
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PARLAMENTO
e por que desaparece CHOQUE FISCAL
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Especial ÊąÿąäīĀÊìąĀ³

CHUMBA
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SAÚDE EM
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DESTITUIÇÃO #ìĀêÒìĝą EM DEBATE


PORTUGAL DE LOURENÇO T#q'q?%
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ANDRÉ RIEU Carlos Lobo www.mantovani.pt
e João Leão
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O castelo do rei da valsa


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Pág. 40
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www.perspetivaatual.pt
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2 OPINIÃO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

➽ Mário Ramires
Forças desarmadas em tempo de guerra
de assinalar que os três tanques enviados por Portugal E é num estado lastimoso que se encontram as
para a Ucrânia foram todos abatidos em meia dúzia de Forças Armadas Portuguesas numa altura em que o
semanas. Mundo está à beirinha de uma Terceira Grande
A nossa Defesa bateu no fundo. Muito fundo. Guerra. Sim, podia lá haver pior momento para uma

T
brutal escalada da violência no Médio Oriente do que
erreno fértil para negociatas e grandes negócios, quando já é mais do que evidente que a guerra na
do roubo de armas à corrupção, no hospital Europa está muito longe de um fim.
militar, nas messes, nas fardas, nas munições, em Não obstante, e numa altura em que se discute o
todo o tipo de equipamento, ou aos documentos Orçamento do Estado para 2024, nem o Governo nem
secretos da NATO à venda na dark web… é tudo a Oposição estão preocupados com isso.
demasiado mau num meio em que só deviam primar os Antes pelo contrário. Aliás, o acento tónico é
HOJE ESCREVO EU mais nobres valores. colocado na «prudência» da proposta do Governo
tendo em consideração a imprevisibilidade dos efeitos
e consequências das guerras que abalam o mundo –
Com o mundo à beira de uma Terceira como assinalou o Presidente Marcelo, comandante
Grande Guerra, o Orçamento de Estado supremo das Forças Armadas.
para 2024 continua a fazer de conta que E o debate faz-se em torno das questões populares e
as nossas Forças Armadas não precisam eleitoralistas, como o aumento do rendimento
disponível por via da baixa dos impostos diretos, que
de investimento. É um erro grave. Mas a logo são compensados pelo aumento dos impostos
Defesa não dá votos nem Helena Carrei- indiretos, por forma a garantir o aumento das receitas
ras tem peso político que se veja. (e da carga fiscal) e, assim, não pôr em causa as contas

A
certas (apontando para um superavit que permita
abater na dívida pública).

quem importa se as Forças Armadas

D
estão em falência de recursos
humanos e de equipamento? E se o
Orçamento para 2024, uma vez mais,
á dó assistir às nossas paradas passa completamente ao lado dessa
militares, que mais parecem aqueles triste realidade?
cortejos de carros clássicos que já só Tirando aos chefes militares, a mais
servem para mostrar aos amigos – ninguém.
sim, é melhor que os inimigos nem Aliás, a ministra Helena Carreiras veio
saibam o que (não) temos. Porque não dizer que está em marcha a
temos nada. contratação de… praças. Como se
Como faz impressão visitar Tancos ou fosse o bastante para camuflar todos
Santa Margarida e a maioria das os problemas.
instalações de qualquer um dos três É o que temos.
ramos das Forças Armadas Já não se trata sequer de uma questão de soberania –
Portuguesas, de norte a sul do país, aí, na defesa como em tudo o resto, somos um Estado-
quase votadas ao abandono, tão pouca a atividade e -membro da União Europeia e da Aliança Atlântica.
tanta a falta de gente. Trata-se, desde logo, de uma questão de dignidade.
Há poucas décadas, era ver os mancebos na Das Forças Armadas e do Estado, que tem de saber
instrução, havia praças com fartura, a carreira militar honrar os seus compromissos, tanto para com o seu
era uma opção mesmo para jovens com boas povo e seus aliados como para com aqueles que dão
alternativas e não faltavam oficiais nem efetivos para corpo a tão nobre missão.
os justificar. Esses, os militares, se não merecem nem podem ser
O fim do serviço militar obrigatório, mas sobretudo esquecidos em tempos de paz, muito menos podem
anos demais de desinvestimento quase total nas Forças ficar desarmados em tempos de guerra, como os que
Armadas e a degradação da condição de militar correm.
desertificaram os quartéis e deixaram os três ramos na E pena é que os políticos portugueses só se lembrem
penúria. deles quando as coisas ficam negras – como na
Faltam recursos humanos e materiais. Só sobram pandemia e no processo de vacinação – ou quando se
oficiais, porque os comandados já não existem. tornam, eles próprios, uma ameaça política – como
Chegou-se ao ponto de se admitir a contratação de pode muito bem e a breve trecho vir a ser o caso e, por
estrangeiros para as Forças Armadas Portuguesas. prevenção, já vão sendo visíveis algumas manobras de
Uma ‘contradição nos termos’, como disse Santana bastidores. ●
Lopes em entrevista ao Nascer do SOL.
Dir-se-ia que atingimos o cúmulo quando vimos as mvramires@gmail.com
autoridades ucranianas a rejeitarem o material bélico
que nos propomos enviar-lhes com o argumento de
que são obsoletos ou inúteis.
Ou quando o porta-voz das tropas russas faz questão
ILUSTRACÃO CARLOS RIVAHERRERA
NotíciasFlix
4 OPINIÃO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

➽ José António Saraiva


Um Orçamento popular

POLÍTICA A SÉRIO

Como disse o socialista Paulo Pedroso,


‘o PS tem ganho eleições assim e por isso
não há muitos motivos para mudar’. É este
o grande problema da democracia. Nem

PATRÍCIA DE MELO MOREIRA/AFP


sempre o que agrada momentaneamente
à maioria é o melhor para o país.

N
↑ Um Orçamento não é uma Bíblia, e só vale a pena perceber que ideia esteve por detrás dele

ão tenho qualquer competência técni- rentório: haverá superavit, que servirá para reduzir Também não sou eu que o digo: o socialista Antó-
ca para discutir o Orçamento; mas te- a dívida pública, com o objetivo de a baixar dos nio Mendonça afirmou que o OE lhe lembra um saco
nho a competência política dada por 100% do PIB. onde se foram metendo medidas avulsas – uma re-
mais de 40 anos a escrever semanal- Não posso concordar mais com essa intenção, que já dução de impostos a uns, uns apoios às rendas a ou-
mente sobre a política portuguesa. E o aqui elogiei. tros, uns vales para o consumo de energia, etc. –
que esta me ensina é que não interessa Embora, atenção: a dívida tem sido reduzida apenas mas por detrás do qual não se percebe uma ideia
nada discutir um orçamento rubrica a em percentagem do PIB, pois em valor absoluto tem para o país.
rubrica: tanto para a Saúde, tanto para aumentado sempre. Tenho escrito à saciedade sobre este problema.

A
a Educação, tanto para a Cultura, tan- E o superavit é conseguido pelo aumento da receita e Não se vê na governação um desígnio, um objetivo a
to para aqui, tanto para ali... não pela redução da despesa, como seria curial. prazo, vê-se uma simples gestão do quotidiano.
E isto porque a execução do Orça- Sobre o 2.º ponto, a redução ou não de impostos,
mento, ao longo do ano, se vai afei- está tudo dito: reduzem-se os diretos, aumentam-se os ntónio Costa é um gestor do poder – fal-
çoando às necessidades do Governo. indiretos. ta-lhe ambição para ser um estadista.
Se houver folga, abre-se a torneira; se não houver, fe- Reduzem-se portagens mas aumenta-se o imposto de E este Orçamento é o espelho disso.
cha-se ou recorre-se a medidas extraordinárias. circulação; cresce o ordenado mínimo mas acaba o Um enormíssimo conjunto de medi-
O exemplo mais ilustrativo desta verdade foi o pri- IVA zero; baixa-se o IRS mas aumenta-se o imposto so- das soltas com o objetivo de satisfazer
meiro ano de Mário Centeno como ministro das Finan- bre combustíveis… o maior número de eleitores e ganhar
ças, depois da saída da troika e de quatro anos de Go- É o que se chama dar com uma mão e tirar com as votos.
verno PSD/CDS. duas, pois a receita fiscal total aumenta. É esta a forma de governar do pri-
A ‘geringonça’, liderada pelo PS, fez promessas à bru- Mas o expediente resulta, como se tem visto. meiro-ministro.
ta, devolveu rendimentos, promoveu desnacionaliza- Até porque a redução de impostos diretos é mais fá- Não há nada a fazer.
ções, reduziu horas de trabalho, etc., e a meio do ano o cil de explicar e propagandear. Mas como também disse Paulo Pe-
défice era gigantesco. Com a baixa do IRS em certos escalões, por exemplo, droso, «o PS tem ganho eleições as-
Centeno assustou-se. o Governo pode dizer que há mais dinheiro nos bolsos sim e por isso não há muitos motivos para mudar».
E lançou mão de todo o catálogo de medidas finan- das famílias, o que é sempre popular. O grande problema da democracia é este mesmo.

A
ceiras ao seu dispor: fez cativações sobre tudo o que Nem sempre o que agrada momentaneamente à
podia, lançou um plano de regularização fiscal para co- terceira questão é: que ideia está por detrás maioria é o melhor para o país.
brar impostos em falta, inventou novas taxas. deste Orçamento? Portugal, aliás, é a prova viva disso: o país definha,
O Orçamento não é, pois, uma Bíblia – é apenas uma Esta pergunta já foi parcialmente respondida mas o Governo mantém a popularidade.
orientação. atrás: conquistar votos. Por vezes, para lançar o futuro, são necessários sa-
Sendo assim, não interessa nada discuti-lo ao pormenor. Não sou eu que o digo: num canal televisivo, o crifícios, medidas impopulares.
Aquilo que valerá a pena debater, resume-se a três socialista Paulo Pedroso afirmou abertamente que o Só que Costa está nos antípodas desse tipo de fa-
pontos: Orçamento teve em conta ser um ano de eleições. zer política: quer o máximo de medidas que o
1 . Qual foi a ideia global que presidiu à elaboração do «Não é que seja eleitoralista – afirmou – mas é eleitoral». aguentem no poder.
Orçamento? De facto, não arranjou melhor palavra, e ficou Repito: não sou eu que o digo.
2. Há alívio ou agravamento fiscal? tudo dito. Os próprios socialistas já o vão vendo. ●
3. O Orçamento prevê défice ou superavit? Fora isso, por detrás deste Orçamento não há nenhu-
Quanto ao último ponto, Fernando Medina foi pe- ma ideia. jose.a.saraiva@nascerdosol.pt
FOCO/
Marcelo obrigado a mudar agenda em Bruxelas
O programa da visita de Estado do à capital belga na segunda-feira e da Bélgica, Marcelo foi informado der De Croo. Manteve-se a reu- ções, com uma visita à Universi-
Presidente da República à Bélgica nessa noite tinha um encontro do tiroteio e aconselhado a regres- nião com os representantes do Se- dade de Namur, seguida de um al-
teve de ser adaptado por razões com a comunidade portuguesa, sar de imediato ao hotel. nado e da Câmara dos Represen- moço no Palácio do Governador
de segurança, na sequência do num café de portugueses, onde A agenda para terça-feira também tantes, com o burgomestre Phi- da província, na região da Valónia.
ataque armado em Bruxelas que deveria assistir ao jogo de Portugal teve de ser reajustada e acabou lippe Close e com a federação das A visita terminou em Bruges, nes-
vitimou dois cidadãos suecos. com a Bósnia. No entanto, à saída por ser cancelado o encontro com empresas belgas. Na quarta-feira, ta quinta-feira. ●
Marcelo Rebelo de Sousa chegou de um jantar oferecido pelos Reis primeiro-ministro belga, Alexan- o programa decorreu sem altera- ➽ Joana Mourão Carvalho

BENOIT DOPPAGNE/BELGA/AFP

↑ O Presidente Marcelo foi recebido na terça-feira no Palácio Real, em Bruxelas, pelo Rei Philippe e pela Rainha Mathilde, da Bélgica
6 FOCO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

IGREJA
A Igreja Católica está
entre dois fogos em
relação ao conflito de
Israel: apoia o estado

O MURO
israelita ou condena
os ataques do
Hamas? Dentro da
instituição as vozes

DE ISRAEL
dividem-se, pois uns
querem dar mais
ênfase a Israel,
outros ao Hamas.

TEXTO Vítor Rainho

A
um de outubro de nho, talvez, ambíguo. Há aqui uma lada em violência e sofrimento de- um documento tão estéril tenha
1523, o fundador da dificuldade de posicionamento para vido ao prolongado conflito políti- sido assinado por pessoas de fé’, a
Companhia de Je- o Vaticano. Por um lado, há esta co e à lamentável ausência de justi- declaração fazia uma referência di-
sus, vulgo jesuítas, questão de condenar o terrorismo ça e respeito pelos direitos huma- reta a Pio XII e ao Holocausto, e às
era corrido da Ter- do Hamas, e desta ação absoluta- nos». A não existência de uma aparentes falhas dos católicos em
ra Santa pelos fran- mente execrável de matar e raptar declaração forte dos católicos, que aprender com a história do antisse-
ciscanos, numa cla- civis junto à Faixa de Gaza. Por ou- apenas afirmaram condenar «inequi- mitismo, e antijudaísmo. O próprio
ra divisão entre ca- tro lado, o Vaticano também está vocamente qualquer ato que vise ci- Pizzaballa emitiu então uma conde-
tólicos. 500 anos muito preocupado com aquilo que vis, independentemente da sua na- nação mais contundente do Hamas
depois, a história será a reação de Israel. E não nos po- cionalidade, etnia e fé», desagradou, em 11 de Outubro».
não se repete, mas demos esquecer que a maior parte e muito, ao Governo israelita, que No Consistório de 30 de setembro,
volta a demonstrar dos cristãos da Terra Santa são de dois dias depois, através da embaixa- em que o Papa nomeou vinte e um
que há diferentes sensibilidades den- origem árabe, são árabes, basica- da de Israel junto do Vaticano, fez novos cardeais, entre os quais D.
tro da Igreja que olham para o mun- mente. O Vaticano também não se chegar uma carta ao Papa onde dava Américo Aguiar, estava também o Pa-
do de formas diversas e, algumas ve- vai pronunciar de tal forma que crie conta do seu desagrado, condenan- triarca de Jerusalém, que assim au-
zes, antagónicas, e que os francisca- uma animosidade nos seus próximos do a «imoralidade de usar a ambi- mentou a responsabilidade do seu
nos e os jesuítas continuam em membros da Igreja Católica local, guidade linguística em tais circuns- cargo de Patriarca Latino de Jerusa-
campos opostos. Franciscanos que inclusive em Gaza, onde os cristãos tâncias». lém desde 2020, presidindo aos cató-
têm a custódia da Terra Santa e que que existem também são árabes», Continuemos a citar o texto de licos latinos em Israel, Palestina, Jor-
continuam a ser em muito maior nú- comenta ao Nascer do SOL um padre Faggioli. «Depois de observar que ‘é dãnia e Chipre.
mero que os jesuítas. Estes apenas com experiência no conflito. especialmente inacreditável que Acontece que, atendendo ao pas-
têm dez pessoas em Jerusalém e uma sado complicado entre católicos e
em Belém. Carta de católicos de Israel judeus, a nomeação de Pizzaballa
O conflito que opõe Israel aos pa- não refere ataque do Hamas não agradou a todos, até pelo me-
lestinianos, como já se percebeu, está Mas o caso mais grave nesta guerra Governo israelita lindre da questão, já que o Patriar-
a dividir a Igreja Católica e o uso da
palavra passou quase a ser sagrado
de palavras começou no próprio dia
do ataque do Hamas em pleno terri-
fez chegar carta ca de Jerusalém é auxiliado por seis
vigários, que atuam em seu nome e
para não se melindrar nenhuma das tório israelita, como escreveu Massi- ao Papa a que o podem substituir. Dos seis
partes. Se o Papa Francisco começou
por criticar abertamente os ataques
mo Faggioli, professor de Teologia e
uma voz considerada na Igreja. Se-
manifestar o seu ajudantes, três são bispos auxilia-
res, dois originários da Palestina e
do Hamas no passado dia 7, a verda- gundo Faggioli, os patriarcas e che- desagrado com um do Egipto. Os outros três padres
de é que depois foi ‘obrigado’ a falar
das vítimas palestinianas. «Houve
fes das Igrejas em Jerusalém fizeram
uma declaração conjunta dizendo
a declaração são um do Kuwait, um da Polónia e
outro do Brasil.
um primeiro momento um bocadi- que a cidade «está atualmente ato- dos católicos Voltemos a Faggioli. «O facto de o
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt FOCO 7

DREAMSTIME
Patriarca de Jerusalém ser agora um que abertamente o não cumprimen- ↑ A Igreja tem vido à complexidade da situação na remos é encontrar caminhos de
cardeal significa que haverá uma re- to dos dois Estados independentes, estatuto de Terra Santa». convergência para a paz. No que
lação mais forte entre Roma e Jeru- outros preferem não ‘atacar’ mais os isenção fiscal Sobre as relações entre o Vaticano todos estamos em uníssono é na
salém, e mais voz para a Igreja de Je- judeus do que o fizeram ao longo de em Israel, e o Estado israelita, voltamos a dar a crítica contra todas as formas de
rusalém, tanto em Roma como na mais de dois milénios. aponta Faggioli palavra a Faggioli. «É claro que a Igre- violência. Procuramos convergên-
Igreja global. Também assinala o de- Voltemos ao padre com experiên- ja Católica deve equilibrar as rela- cia para caminhos de paz, pratica-
sejo do Vaticano de desempenhar cia no conflito. «A Igreja pode criti- ções em constante ajustamento en- mente estando do lado daqueles
um papel mais ativo no Médio Orien- car moralmente o Estado de Israel tre religião e política onde quer que que sofrem e quem sofre. Há um
te. É claro que o que isso significa sem que isso seja percebido como esteja presente. Mas em Israel, o Va- provérbio africano que diz: ‘Quan-
exatamente agora – com Israel a de- um ataque frontal à identidade do ticano não desempenha apenas um do os elefantes lutam quem mais
clarar guerra ao Hamas após o seu povo hebreu, tendo em conta dois papel nos debates teológicos sobre sofre é o capim’, ou seja, os mais
ataque de 7 de Outubro – é questio- milénios de antijudaísmo? Essa é a a identidade de Israel e da Palesti- fracos. E seja, em nome do que for,
nável. A nomeação de Pizzaballa não grande dificuldade. Por outro lado, na; também possui terras significa- não há o direito de matar inocentes
poderia ter ocorrido em momento os cristãos da Terra Santa na sua tivas, especialmente na contestada deste modo. Quando são utilizadas
mais delicado». grande maioria, mesmo os católi- Jerusalém. Uma das maiores ten- armas poderosas como os mísseis
cos, são de língua árabe e a Igreja sões neste momento é se essas pro- e se vê edifícios inteiros, com as fa-
Agradar a judeus Católica é muito sensível a uma si- priedades conseguirão ou não man- mílias lá dentro, a caírem, a serem
e a palestinianos tuação que me parece de evidente ter o seu estatuto especial de isen- destruídos, como é que se pode fa-
Para se perceber um pouco melhor injustiça estrutural em relação a es- ção fiscal. A Igreja não quer levar a lar de uma guerra justa? Não, per-
a história, apanho a boleia de um teó- tas pessoas. A Europa, vamos dizer questão demasiado longe e, no res- de-se toda a razão!».
logo português: «Roma não pode per- assim, foi um bocadinho rápida caldo dos ataques, tem de agir com O presidente da Conferência Epis-
der o pé na Palestina, mas também quando exportou, em 1948, um pro- ainda mais leveza». copal Portuguesa vai mais longe:
não quer entrar em conflito com a blema para o Médio Oriente, tendo «Não se questiona quem tem razão
comunidade judaica». Isto é, não criado uma situação extremamente D. José Ornelas e como ou não, a não razão é claramente a
pode perder os católicos que tem na- complexa, e os atos terroristas do o Sínodo vê o conflito violência e a chacina indiscriminada
quela zona, nem os interesses de ou- Hamas não justificam as injustiças Presente no Sínodo que decorre no de inocentes. Para nós, esta área do
tra ordem, mas já lá vamos. O Vati- na Cisjordânia, e de o povo palesti- Vaticano, D. José Ornelas explica Médio Oriente tem referências fun-
cano defende o acordo de 1948, dos niano ser forçado a viver sob a lei como estão a viver este e outros damentais e não gostamos que as
dois Estados independentes com uma marcial há 75 anos. Basta dizer isto conflitos. «Dizer que os jesuítas es- coisas estejam a ser tratadas deste
capital única dividida e dirigida pela para que se perceba que há aqui tão de um lado e os mais conserva- jeito. Mas os agravos de um lado e do
ONU, mas nunca fala, oficialmente, qualquer coisa que não está a resul- dores estão de outro, é pura fanta- outro são muito graves. Isto é que é
em territórios ocupados. E isto não é tar. A Igreja não usa a palavra ocu- sia. Mesmo havendo bispos que se- dramático». ●
muito consensual na Igreja, pois se pação, como outros usam, por pu- jam mais críticos de Israel ou mais
há quem queira que o Vaticano criti- dor, por sensibilidade também e de- críticos do Hamas, o que todos que- vitor.rainho@nascerdosol.pt
8 FOCO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

➽ Vítor Rainho
Os comentadores
guerrilheiros do Hamas
foi sobre o facto de um trans ter
ganho o concurso de Miss Portugal.
Escreveu Joana Amaral Dias que a
vencedora nunca será mulher, pois
nasceu com os cromossomas XY,
sendo-lhe de todo impossível algum
dia ter os cromossomas XX. Mas isto
não é inquestionável? É impressio-
nante como antigamente as candida-
tas a miss eram eliminadas se se des-
À ESQUERDA E À DIREITA cobrisse que tinham feito alguma
cirurgia estética, nem que fosse

DR
botox, permitindo-se agora que os ↑ Embaixada de Israel em Lisboa: MAI confirmou reforço da segurança
Só lhes falta a fita verde concorrentes apareçam com cente-
na cabeça. Joana Amaral nas de operações estéticas, em nome
Dias escreve melhor
do que grita na televisão.
do politicamente correto. Qual a
razão para não se fazer um concurso Secretas em alerta
monitorizam suspeitos
de miss trans? Vamos ver se a moda
pega e nos próximos Jogos Olímpicos
vamos ver atletas trans a ganharem
medalhas atrás de medalhas porque
concorreram na categoria errada. em Lisboa e Margem Sul

1.
Ah! Joana Amaral Dias escreve bem
A guerra em Israel e na melhor do que grita na televisão.
Apelo à ‘guerra santa’ chegou tos como suspeitos de colaborarem

3.
Faixa de Gaza divide as
opiniões de uma forma Tinha de Alexandra Leitão às mesquitas ilegais da capital. com as autoridades portuguesas»,
radical, quase não uma excelente ideia, mas a Serviços de informações acrescentou a mesma fonte.
havendo espaço para entrevista que deu ao acionaram todos meios para A par do reforço das ações de vigi-
moderados. As televisões, que têm Observador arrefeceu-me o entu- a monitorização de elementos lância por agentes dos serviços de in-
de encher o espaço de horas com siasmo. Além de ser uma acérrima com ligações suspeitas. formações, e tal como o Nascer do SOL
diferentes comentadores, chegam defensora da geringonça, descul- noticiou na sua última edição, o Minis-
ao cúmulo de convidar verdadeiros pando as posições do PCP sobre a tério da Administração Interna inten-
defensores do Hamas, só lhes fal- Ucrânia e o Hamas, e algumas do TEXTO Vítor Rainho sificou também a segurança em todas
tando levar a fita verde à cabeça. BE, a deputada socialista também as instalações israelitas em território
Também é comum terem no deu a entender que defende Pedro nacional, designadamente a Embai-
mesmo programa ‘opinadores’ com Nuno Santos. Curiosamente, o seu Os Serviços Secretos portugueses es- xada e a residência do embaixador em
a mesma visão, não se preocupando camarada de partido ainda não tão em alerta desde os ataques terro- Lisboa. Este reforço de segurança foi,
em fazerem uma distribuição mais acertou com o registo do seu pro- ristas do Hamas em Israel, sobretu- aliás, confirmado esta semana pelo
razoável. Se ligamos a televisão a grama semanal, pois ao permitir do depois de terem tido conhecimen- próprio ministro José Luís Carneiro.
determinada hora podemos ficar que lhe façam três perguntas sobre to do apelo internacional à ‘guerra A comunidade judaica em Portugal
com a ideia que o pensamento o hipotético candidato do PSD às santa’, que chegou às mesquitas ile- está centrada em três zonas, haven-
sobre o conflito é único. E o que europeias é porque ainda não per- gais de Lisboa e da Margem Sul do Te- do várias fações de judeus. Lisboa,
dizer do major-general Agostinho cebeu o que está ali a fazer. jo. O Nascer do SOL apurou que as Cascais e Porto são os locais onde vi-

4.
Costa, que salta da CNN para a Secretas acionaram todos meios para vem mais portugueses de origem ju-
RTP3 sempre com a mesma lenga- O que dizer da definição do a monitorização de elementos com daica e os serviços secretos também
-lenga anti-americana primária? Governo de classe média? ligações consideradas suspeitas e po- desenvolveram um trabalho de inves-
Já as manifestações, um pouco Quem ganha 1300 euros ilí- tencialmente perigosas e que se en- tigação para passar essas informações
por todo o mundo, a favor do povo quidos faz parte da classe média? Só contram em território nacional, desi- à PSP e GNR, que tratarão de ter uma
palestiniano têm algumas coisas mesmo neste país que sonha com gnadamente na Grande Lisboa. atenção redobrada com essas comu-
verdadeiramente insólitas, como a um Estado onde o Estado está em Debaixo da mira das secretas por- nidades, para precaver ataques de hi-
presença de bandeiras LGBT. Mas todo o lado! Lembrem-se da URSS e tuguesas estão palestinianos radica- potéticos fundamentalistas.
será que esta rapaziada sabe o que da Venezuela, por exemplo. A pro- lizados e as autoridades têm tido a aju- Outra das preocupações das autori-
acontece aos homossexuais no pósito, se os EUA são o diabo, qual a da da comunidade muçulmana que dades portuguesas, embora não exis-
Médio Oriente? O mundo está louco. razão para milhões de pessoas que- nada se identifica com radicalismos. ta nenhum alarme ou sinal de que vá
«São eles que denunciam os radicais

2.
rerem entrar em terras do tio Sam à haver qualquer atentado, diz respeito
Joana Amaral Dias tem incen- procura de uma vida melhor? Já não que controlam a imigração ilegal e à localidade de Belmonte, um paraíso
diado as redes sociais com os há mais espaço, mas não posso dei- que lutam pelos dízimos oferecidos judaico em Portugal. «O seguro mor-
textos que publica no DN, xar de dizer que é escandaloso a his- nessas mesquitas», disse ao nosso jor- reu de velho, e Belmonte é um lugar
embora um deles tenha merecido tória do aumento do IUC para os nal fonte das secretas. «Os muçulma- histórico para os judeus portugueses
ataques engraçadíssimos. Eu gostei carros com mais de 17 anos. Só neste nos que vivem há muito em Portu- e por isso as autoridades estão aten-
particularmente do artigo sobre o fim país de gente mansa... ● gal, muitos dos quais nasceram já cá, tas a movimentos suspeitos». ●
do dinheiro físico, e estou totalmente têm de ir a esses locais de forma mais
de acordo com a articulista, e o outro vitor.rainho@newsplex.pt humilde, pois caso contrário são vis- vitor.rainho@nascerdosol.pt
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt FOCO 9

➽ Fátima Bonifácio
O futebol saiu da sua A ‘Proporcionalidade’
zona de conforto
O conflito entre Israel e o cias não demoraram. O presidente
Hamas atingiu o futebol. da Câmara de Nice, Christian Estro- inocentes. Sim: houve, aqui e ali,
Jogadores de origem muçul- si, exigiu um pedido de desculpas ao quem lembrasse a necessidade de
argelino. Mais tarde, seria o clube a proporcionalidade, aliás uma invo-
mana, como Benzema, defen-
suspender o jogador. Já Manor Solo- cação absurda visto que é a
dem os palestinianos, e há polí- mon acusou a Palestina na sequên- Ucrânia o país invadido e agredido.
ticos a pedir consequências. cia da explosão num hospital de Gaza. (Será que se pode defender despro-
«Mata o próprio povo e culpa Israel», porcionadamente ?!) Mas é a Israel
escreveu o jogador do Tottenham. a quem mais se exige proporciona-
TEXTO João Sena Os responsáveis do Bayern de Mu- lidade; quase não há comentador
nique têm entre mãos uma verdadei- que não relembre esta bondosa
ra ‘bomba’, com o regresso do guar- OPINIÃO necessidade.
A guerra de palavras começou com da-redes israelita Daniel Peretz e do Nas guerras, não há proporciona-
Karim Benzema, que não escondeu defesa marroquino Noussair Mazraoui. lidade, ponto. Se quiserem perce-
a sua origem muçulmana, e escreveu: O israelita solidarizou-se com o seu Como sempre, o ber melhor esta chocante heresia,
«Todas as nossas preces vão para os país depois dos ataques do grupo ter- alinhamento da extrema- leiam W. G. Sebald: The Natural
habitantes de Gaza, que voltaram a rorista Hamas: «O meu coração está -esquerda é determinado History of Destruction (já traduzi-
ser vítimas destes bombardeamen- com todas as pessoas. Mantenham- em função do posiciona- do em português). Em 1944, os
tos injustos, que não pouparam mu- -se fortes e cuidem-se. Vamos supe- civilizados aliados, muito preocu-
lheres e crianças». A mensagem não rar isto», escreveu Peretz nas redes
mento dos EUA. pados com a proporcionalidade,
passou despercebida ao antigo guar- sociais, enquanto Mazraoui usou o Ins- decidiram, quando a guerra já esta-
da-redes israelita, David Aouate, que, tagram, onde tem mais de 2,4 milhões va praticamente ganha, destruir e
em cinco línguas diferentes, insultou de seguidores, para dizer que o ataque arrasar completamente a belísssi-

H
Benzema por este apoiar a Palestina: terrorista a Israel foi «uma vitória dos ma cidade alemã de Dresden, ofe-
«És um grande filho da p...» A situa- irmãos oprimidos da Palestina». O á uma semana (escre- recendo aos enxames de moscas,
ção escalou com as acusações do mi- Bayern de Munique tomou posição e, vo a 14 de Outubro), o que de súbito apareceram, cadáve-
nistro do Interior francês, Gérald Dar- em comunicado, afirmou: «Expressá- Hamas perpetrou uma res humanos para se banquetea-
manin. «O senhor Benzema tem li- mos publicamente uma declaração incursão selvática em rem. Nem por isso – e bem – a opi-
gações evidentes ao grupo após o ataque terrorista contra Israel. Israel e capturou mais nião pública condenou as forças
Irmandade Muçulmana», disse o go- Preocupamo-nos com os nossos ami- de uma centena de reféns de todas aliadas: guerra é guerra.
vernante à televisão francesa CNews. gos de Israel, e desejamos uma coe- as idades – de bébés a octogená- Hoje em dia os tempos muda-
Em alguns países, nomeadamente xistência pacífica entre todos os po- rios. Alegadamente, estes reféns ram, sobretudo graças à influência
França, a Irmandade Muçulmana é vos do Médio Oriente». A declaração serviriam de moeda de troca para que a extrema-esquerda adquiriu
considerada uma organização terro- de Mazraoui levou o deputado do Par- que Israel libertasse as várias cen- sobretudo nas ruas. Esta extrema
rista. O advogado de Karim Benzema tido Democrata Cristão CDU, Johan- tenas de terroristas do Hamas que esquerda tratou, assim que o con-
já afirmou que o jogador vai apresen- nes Steineiger, a pedir a sua expulsão se encontram nas suas prisões. flito começou, de organizar mani-
tará queixa contra Gérald Darmanin. do clube e do país: «Caros responsá- Pelo caminho, houve logo incontá- festações a favor do Hamas, e con-
O caso não ficou por aqui. A senado- veis do Bayern, por favor, despeçam- veis mortes e feridos. Israel não denando a cruel desumanidade dos
ra do Partido Republicano Valérie -no imediatamente. O Estado deve podia convidar o Hamas para con- israelitas. Em Paris teve de intervir
Boyer pediu que fosse retirada a na- usar as possibilidades que tem para versações de paz à mesa de um a polícia de choque; em Portugal,
cionalidade francesa ao Bola de Ouro o expulsar da Alemanha». O neer- bule e chávenas de chá. Reagiu mais pindericamente, o Bloco de
de 2022. Ainda em França, o jogador landês de origem marroquina Anwar brutalmente – e o pior ainda está Esquerda conseguiu reunir uns
Youcef Atal, do Nice, publicou nas re- El Ghazi, que joga no Mainz 05, foi para vir – como não podia deixar centos inofensivos de manifestan-
des sociais uma mensagem de apoio suspenso após publicar nas redes so- de fazer. Quem com ferro mata, tes. Nem por isso é menos significa-
à Palestina e partilhou um vídeo de ciais uma frase usada por membros com ferro morre. tivo. Tenho a certeza de que nem
Mahmoud al-Hasanat a desejar um do Hamas: «Do rio ao mar, a Palesti- Desde as Nações Unidas até dez por cento dos manifestantes
dia negro aos judeus. As consequên- na será livre». ● vários governos europeus, levan- sabia o que é, porque nasceu e
tou-se logo um clamor exigindo como nasceu o Estado de Israel.
← Benzema que a retaliação de Israel fosse Mas os esquerdistas sabem uma
foi acusado ‘proporcional’; que a proporciona- coisa: que Israel é incondicional-
pelo lidade era um princípio básico do mente apoiado pelos Estados
ministro Direito Universal e do Direito da Unidos da América, esse santuá-
do Interior Guerra. Ou seja, Israel, brutalmen- rio do Capital, esse símbolo vivo
francês de te agredida pelo Hamas, tinha de do Capitalismo – uma besta a aba-
pertencer a retaliar com gentileza. ter. Por isso rezam pelo Hamas: o
um grupo A conversa da ‘proporcionalida- inimigo do meu inimigo meu ini-
considerado de’ não passa de retórica vácua. migo é. Por isso, para esta gente, o
terrorista Em nenhuma guerra ela é respeita- Hamas é o Bem e Israel é o Mal.
da. Vejam o caso da invasão da Como sempre, o alinhamento da
Ucrânia pela Rússia, que sistemati- extrema-esquerda é determinado
camente arrasa um país destruindo em função do posicionamento
edifícios onde habitavam civis dos EUA. ●
pacíficos, atingindo escolas e hos-
pitais; matando incontáveis civis Historiadora
10 PAÍS nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

PETRÓLEO
BARRIL PODE
DISPARAR
PARA CIMA DE
100 DÓLARES
TEXTO Daniela Soares Ferreira

Incerteza é a palavra de ordem no que diz


respeito ao preço do petróleo devido ao conflito
no Médio Oriente. Mas os especialistas não têm
DREAMSTIME

A
dúvidas: se a guerra se alastrar, será ainda pior.
guerra no Médio leo do Médio Oriente no consumo glo- Ucrânia, «a Europa e Portugal ainda ↑ Especialistas Já Henrique Tomé, analista da XTB,
Oriente traz várias bal, pela autossuficiência dos EUA, por são muito dependentes do petróleo» alertam para lembra que, embora «Israel não seja
ameaças à economia interesses geopolíticos entre países da –correspondendo o petróleo e o gás o impacto um player importante como produ-
global. Uma delas OPEP+ e Israel, e, sobretudo, porque natural a cerca de 70% da matriz ener- da guerra tor de petróleo, a região do conflito
está diretamente re- este embargo já está implicitamente a gética portuguesa. Neste cenário, que nos preços é importante a nível estratégico nas
lacionada com o pre- ser executado pelos países da OPEP+ considera «muito pouco provável, o do petróleo trocas comerciais, quer para impor-
ço da energia e desi- há mais de três anos». aumento das tensões entre as super- tações como para exportações de
gnadamente dos Neste conflito, frisa o economista, a potências aumentaria». petróleo e derivados».
combustíveis. Se o maior ameaça para a economia global E, no caso de uma eventual entrada O analista defende que o petróleo
conflito se alastar e reside sobretudo na obstrução do es- do Hezbollah no conflito, «elevaria o «tem reagido às tensões entre Israel
envolver outros paí- treito de Ormuz, o que contribuiria para atual patamar do conflito, podendo en- e a Palestina que ameaçam o comér-
ses, então as conse- a escassez mundial de petróleo. A volver oficialmente a Síria e o Líbano, cio internacional nessa região e os ris-
quências serão ainda maiores. Incerte- Bloomberg Economics estima, neste ce- impulsionando o preço do petróleo cos de existir uma escalada no confli-
za é a palavra do momento, segundo os nário, que o preço do petróleo poderia para os 100 dólares/barril, sendo tam- to pode envolver os países vizinhos,
especialistas ouvidos pelo Nascer do SOL. subir até aos 150 dólares por barril e o bém uma real ameaça a uma possível o que poderia trazer um novo dese-
Para o economista do Banco Carre- crescimento global cair para 1,7%, uma entrada direta do Irão no conflito». quilíbrio na oferta». E acrescenta que
gosa Paulo Rosa, o conflito entre Israel recessão que retiraria cerca de um bilião Lembrando que o executivo por- a reação do petróleo «reflete os re-
e o Hamas «poder-se-á agudizar e im- de dólares à produção mundial. tuguês antecipa no OE2024 uma co- ceios de que possam surgir novos pro-
pactar negativamente a economia glo- «Uma escalada dos preços para os tação do petróleo de 81 dólares por blemas na oferta, o que agravaria ain-
bal se passar de um conflito confina- 150 dólares poderia ser contrapro- barril em 2024, comparando com va- da mais o atual desequilíbrio entre a
do à faixa de Gaza a uma guerra regio- ducente para os países árabes pro- lores previstos de 83 dólares para oferta e a procura», lembrando que
nal gradualmente mais ampla, capaz dutores, contribuindo para acelerar 2023, Paulo Rosa diz que «um cená- os níveis de produção têm sido artifi-
de dificultar, desse modo, o transpor- a procura de energias alternativas, rio em que o preço do petróleo se si- cialmente limitados por vários mem-
te e escoamento do petróleo dos paí- tais como as renováveis», diz Paulo tue 20% acima do assumido no ce-
ses do golfo pérsico via estreito de Or- Rosa, lembrando que a economia eu- nário base, ou seja, um aumento para
muz». Paulo Rosa lembra que por este ropeia ainda é muito dependente dos perto dos 100 dólares, teria um efei-
estreito passam diariamente cerca de combustíveis fósseis importados e to negativo de 0,1 pontos percen-
21 milhões de barris de petróleo, cer- que, por isso, «seria consideravel- tuais no crescimento do PIB em ‘No atual conflito, a maior ameaça
ca de 20% do consumo diário global.
Num cenário de agravamento e esca-
mente afetada num cenário de guer-
ra direta entre Irão e Israel».
2024». E, no caso de uma eventual
escalada do preço do petróleo, com
para economia global reside
lada da guerra na região, Paulo Rosa con- O responsável destaca ainda que, a entrada direta do Irão no conflito, sobretudo na obstrução
sidera que «um embargo de petróleo apesar da intensificação do processo «o efeito no PIB português tenderia do estreito de Ormuz, o que
pelos países da OPEP teria, muito pro- de transição energética nos últimos a ser exponencial e dificilmente Por-
vavelmente, pouca eficácia, justifica- anos e da procura por segurança ener- tugal escaparia a uma recessão com contribuiria para a escassez
do pelo peso cada vez menor do petró- gética desde a eclosão da guerra na a cotação do crude nos 150 dólares». mundial de petróleo’
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt PAÍS 11

➽ Rui Moreira
Um pedido de desculpa
O que eu não sabia, quando escrevi o
artigo, porque não fora tornado público,
é que o anúncio feito por Santos Silva
decorria de um consenso encontrado em
reunião de líderes. Ou seja, por unanimi-
dade dos representantes dos partidos
com assento parlamentar.
Nem era de suspeitar que houvesse tal
consenso. É que logo no dia 5 de outubro, e
na sequência do anúncio de Moedas, o
PLENOS PODERES secretário-geral do PSD, Hugo Soares, clas-
sificaria a iniciativa como muito importan-
te, porque «não haveria democracia plena
Como é que o PS, o PSD, a IL e o sem o 25 de Novembro». André Ventura,
Chega acordaram uma coisa por seu turno, anunciava que o seu partido
em conferência de líderes e iria tentar «tornar solene» a celebração da
depois defenderam publica- data no Parlamento, enquanto o líder da IL,
Rui Rocha, saudava o executivo municipal
mente o seu contrário? de Lisboa e criticava a Comissão
Organizadora das comemorações por
«reescrever a história» e prestar um mau
serviço à democracia, ao «afastar» o 25/11.

D
Pelos vistos, não era só eu que desco-
epois do meu último artigo, nhecia a forma como a decisão, anunciada
em que abordei o apagamen- pelo presidente da Assembleia da
to do 25 de Novembro das República, fora tomada. E isso só ficou
comemorações do 25 de claro dois dias depois de ter escrito o arti-
Abril, o presidente da go, quando, no Parlamento, Santos Silva
Assembleia da República recorreu ao respondeu às duras críticas do líder da IL
direito de resposta para esclarecer que a (que o acusara de «cobardia política» e
decisão foi tomada por unanimidade, em de «hipocrisia» por decidir que o 25 de
bros da OPEP+ e um envolvimento de ses níveis, isto porque o euro em re- conferência de líderes. Resta-me pedir-lhe Novembro não seria assinalado nas come-
outros países vizinhos como Irão, «po- lação ao dólar americano tem conti- desculpa neste mesmo espaço de opinião. morações do 25 de Abril), revelando
deria ter um impacto significativo nos nuado a depreciar e porque pode ha- Tenho estima por Augusto Santos Silva, então que a decisão fora sustentada num
preços da matéria-prima». ver um aproveitamento de margens e consideração institucional pela consenso entre as diferentes bancadas
Sobre o facto de o conflito escalar de quem comercializa esse bem». Assembleia da República e pelo seu pre- parlamentares. Mais: Santos Silva expres-
para outras regiões, Henrique Tomé Questionado sobre se o Governo sidente. É importante assumir os erros, sou, inclusive, o desejo de que o PS come-
não tem dúvidas de que esse «é sem terá de manter o desconto nos subsí- particularmente no espaço mediático, more o 25 de Novembro, mesmo que a
dúvida o maior risco, sobretudo o dios, Henrique Tomé diz que essa po- mesmo quando são inadvertidos. É isso data não seja assinalada no Parlamento.
Irão, que é um importante produtor deria ser «uma boa decisão,» mas que aqui deixo registado. Ficámos com três boas notícias: Lisboa
de petróleo e que pode utilizar essa «deverá depender de como o preço Ainda assim, este erro tem atenuantes que vai comemorar o 25 de Novembro, como
posição como arma». E acrescenta do barril de petróleo evoluirá nos suscitam alguma perplexidade. Escrevi e tem sido feito por outros municípios. O PS
que recentemente o Irão apelou ao próximos meses», acrescentando que enviei o artigo para este jornal no dia 9 de irá seguir esse caminho, e há muitas vozes
embargo petrolífero e a outras san- a elevada carga fiscal em conjunto outubro. Poucos dias antes, Carlos Moedas do partido, como Ana Gomes, a exigirem
ções contra Israel, «o que eleva ain- com as pressões sobre os preços do anunciou, no seu discurso no 5 de Outubro, que a promessa seja cumprida. A extrema-
da mais as pressões sobre os preços petróleo «penalizam muito os agen- que o município de Lisboa iria celebrar con- -esquerda fica incomodada, o que é um
nos mercados internacionais». O ana- tes económicos, não só as famílias, dignamente o 25/11, aproveitando o vazio sinal da importância da comemoração da
lista detalha ainda dados do FMI se- mas também as empresas». E subli- deixado pelo programa oficial das comemo- data em que perdeu as suas prerrogativas
gundo os quais, se os conflitos se in- nha: «Para além disso, Portugal tem rações dos 50 anos do 25 de Abril. Como revolucionárias.
tensificarem no Médio Oriente, uma sido penalizado em termos de com- referi no meu texto, e mantenho, há uma Fico com a dúvida: como é que o PS, o
escalada no preço em 10% no petró- petitividade face aos outros países indesmentível diferença entre o que fora PSD, a IL e o Chega acordaram uma coisa
leo terá impacto num decréscimo de devido aos combustíveis mais altos». anunciado três dias antes por Santos Silva e em conferência de líderes e depois defen-
0,2% no PIB mundial e um aumento Para Portugal, o analista da XTB aquilo que anteriormente fora invocado deram publicamente o seu contrário?
inflacionário de 0,4%. «Neste cenário, avança que se espera que a inflação pelo Presidente da República e também pela Como sou ingénuo, acredito que seja
o impacto poderia levar o preço do continue em níveis acima dos 2%: «Pri- Comissária Executiva das comemorações. tudo por mera distração. ●
petróleo a ser negociado acima da meiro, pela via internacional inflacio-
marca dos 100$ novamente, o que nária e, segundo, porque olhando para
por sua vez suscitaria novas preocu- o OE entendemos que a política utili- Direito de retificação e no uso do direito de retificação que a Lei
pações sobre a inflação», avisa. zada vai impulsionar o consumo o que Em artigo publicado hoje [13-10-23] no seu jor- me confere, gostaria de esclarecer mais uma
E, caso o preço do petróleo ultra- provoca mais incentivos inflacioná- nal [Nascer do SOL], o Dr. Rui Moreira pronun- vez que tal decisão foi tomada por consenso
passe essa marca, «poderá ter um im- rios, se a isto acrescentarmos mais su- cia-se sobre o facto de a celebração do cinquen- na Conferência de Líderes, onde estão pre-
pacto significativo nos preços dos bidas nos preços dos combustíveis tenário do 25 de novembro em sessão solene sentes todos os partidos políticos parlamen-
combustíveis – o que poderá levar a está tudo alinhado para que a inflação não constar do programa de comemorações da tares. Isto é: foi tomada sem a oposição de
um aumento dos preços muito supe- perdure em território nacional». ● Assembleia da República, imputando-me uma nenhum partido. Nenhum.
rior ao registado da última vez que o responsabilidade pessoal por essa decisão. O Presidente da Assembleia da República
petróleo esteve a ser negociado nes- daniela.ferreira@nascerdosol.pt Pela consideração que me merece o autor, Augusto Santos Silva
12 PAÍS nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

OE 2024
ESQUECE
EMPRESAS
TEXTO Sónia Peres Pinto

Entidades patronais admitem que a proposta


apresentada pelo Governo em nada melhora a
vida das empresas, numa altura em que vão ser

O
pressionadas por novos aumentos dos salários.
IRC (imposto sobre lação aos apoios facultados ao tecido acrescentando que «sem as empresas ↑ Nas contas to administrativo, legal, judicial, fis-
as empresas) é um empresarial. «Há um discurso, mas capitalizadas não temos crescimento e da CIP, entre cal e garantia da sua previsibilidade.
dos impostos mais temos medidas contrárias a esse dis- mais emprego e as empresas são obri- o aumento do
elevados da Europa. curso, como a limitação no acesso a gadas a ter de recorrer a mais emprés- salário mínimo Gastos salariais pressionam
Pelos últimos dados programas comunitários para gran- timos, o que as prejudica, numa altura nacional e a Estes empreendedores admitem ainda
da Organização para des empresas», refere ao nosso jornal. em que todos sabemos a dificuldade em subida de 5% que o aumento do salário mínimo nacio-
a Cooperação e Des- Também o presidente da CIP – que re- fazer face a taxas de juro tão elevadas». nos outros nal em 60 euros, para 820 euros, e dos
envolvimento Eco- centemente recusou assinar o acordo de O responsável do turismo aponta para salários, haverá salários na generalidade em 5% repre-
nómico (OCDE), a rendimentos com o Governo, tendo sido a necessidade de avançar para uma ver- mais 4 700 sentam mais um encargo para as empre-
taxa pode chegar aos o único parceiro a rejeitá-lo – dá ‘cartão dadeira reforma fiscal: «Era necessário milhões só sas após um aumento dos custos de fi-
31,5%, sendo o se- vermelho’ ao Executivo, considerando para as empresas uma grande redução em ordenados nanciamento e um arrefecimento da ati-
gundo mais elevado que não existem medidas destinadas às do IRC, mas esta não está prevista. As fa- vidade económica.
entre os 38 países, e as empresas não empresas. Armindo Monteiro defende mílias irão pagar menos IRS, mas em Apesar de o presidente da AEP reco-
vão ser aliviadas no próximo ano, já que que seria «de elementar justiça» queo contrapartida vão pagar mais impos- nhecer que é necessário um aumento
a proposta de Orçamento do Estado cenário fosse mudado em sede de espe- tos indiretos, pelo que este Orçamento dos salários, defende que essa subida
pouco ou nada acrescenta em medidas cialidade. «As empresas precisam de dificilmente contribui para um maior deve ser sustentada pelo aumento da
a pensar no tecido empresarial, de acor- sentir que os seus esforços de investi- crescimento económico e não me pare- produtividade e competitividade do te-
do com as entidades empresariais con- mento fazem sentido. É importante que ce que garanta muito mais rendimen- cido empresarial português. E acres-
tactadas pelo Nascer do SOL. na fase de negociação, as empresas não to às pessoas». centa: «Os benefícios anunciados, para
«Este Orçamento do Estado não tem sejam ignoradas, porque sendo ignora- Também Luís Miguel Ribeiro ace- as empresas que aumentem os salá-
como prioridade as empresas, sendo das é natural que a capacidade de criar na com as várias propostas que apre- rios em 5%, são manifestamente insu-
que as medidas direcionadas para as postos de trabalho seja posta em cau- sentou ao Governo e que passavam ficientes relativamente ao aumento
mesmas são poucas e com reduzido sa», frisa ao Nascer do SOL. pela diminuição progressiva da taxa dos custos salariais respetivos e, nes-
impacto. Na atual conjuntura econó- Uma opinião partilhada por Francis- de IRC, para 17% até 2025, a elimina- se sentido, a AEP reforça, mais uma
mica, a AEP considera que as empre- co Calheiros, presidente da Confedera- ção da derrama estadual e a elimina- vez, a necessidade de uma diminuição
sas devem ser apoiadas de forma a cria- ção do Turismo de Portugal (CTP), para ção ou redução significativa das ta- da fiscalidade sobre as empresas e uma
rem mais riqueza, contudo registam- quem faltam neste Orçamento medidas xas de tributação autónomas, espe- otimização da relação entre as empre-
-se pouco incentivos, nomeadamente que permitam mais investimento priva- cialmente para os gastos normais e sas e a administração pública». Quan-
no que se refere ao investimento pri- do e mais crescimento. «Eram necessá- indispensáveis à atividade das em- to à adesão dos dos empresários a es-
vado», defende Luís Miguel Ribeiro. E rias mais medidas para capitalizar as presas. Quanto aos custos de contex- tes aumentos, acredita «que serão re-
considera que existe «uma certa con- empresas, através do investimento e da to, a AEP reforçou a necessidade de sultado de um forte comprometimento
tradição» por parte do Estado em re- competitividade fiscal», diz Calheiros, uma simplificação do enquadramen- dos mesmos para com os trabalhado-
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt PAÍS 13

➽ Carlos Carreiras
Não há saúde
sem saúde mental
mónica e segura.
Deste modo, entender a impor-
tância da estabilidade mental e a
sua intensa relação com o bem-
-estar é fundamental.
Possibilita, assim, a compreensão
da importância de utilizar a capaci-
dade individual para a perceção de
valores e virtudes inerentes à cons-
trução da coletividade.
VISTA PARA O ATLÂNTICO Em Cascais, com o programa
‘Cascais Mentalmente’ garantimos
a implementação eficaz e sustentá-
É fundamental garantir a vel de políticas, programas e ini-
implementação eficaz de ciativas estratégicas, que promo-
políticas que promovam a vem a saúde mental e previnem a
saúde mental e previnam doença mental, através da diversi-
ficação e da descentralização de
a doença mental. serviços para atender tanto crian-
ças, como jovens, adultos e idosos
que residam, estudem ou traba-
lhem no concelho.
Neste âmbito, há vários serviços
disponíveis, tais como: Unidade

N
Saúde +, Programa Incorpora
o Dia Mundial da Saúde Cascais, Consultas sem Paredes,
BRUNO GONÇALVES

Mental, assinalado a 10 Surf Therapy, Plataforma Saúde


de outubro, um pouco na Escola.
por todo o município de No âmbito da nossa intervenção,
Cascais desenvolveram- temos detetado uma grande fragi-
-se iniciativas para posicionar esta lidade nesta área da Saúde Mental
res e não pelos benefícios fiscais apre- tão importante temática no centro e este programa que estamos a
sentados pelo Governo». da discussão pública. implementar vem dar uma respos-
Já Francisco Calheiros refere que o Foram abordados tópicos como a ta diferenciadora, com alternati-
turismo é a atividade que mais tem au-
mentado salários em Portugal e, por isso, PS isolado na votação saúde mental na infância, adoles-
cência e família, bem-estar laboral
vas às respostas convencionais
que já tínhamos.
acredita que «no próximo ano é muito na idade ativa. Este tipo de iniciati- Ter uma boa saúde mental impli-
provável que, olhando para a lei da ofer- Sem surpresas, o PSD anunciou esta semana vas, espalhadas ao longo do Mês da ca não só estar livre de vários
ta e da procura, os trabalhadores ve- que vai votar contra a proposta de Orçamento Saúde Mental, são essenciais para transtornos mentais, mas também
nham a ter aumentos acima dos 5%». do Estado, cuja votação na generalidade está que este tema não se cinja apenas ter bem-estar emocional, psicológi-
Menos otimista está Armindo Mon- marcada para 31 de outubro. Montenegro acu- ao dia comemorativo. co e social.
teiro. «O aumento do salário mínimo e sou o Governo de alcançar contas certas «à cus- Tal como aponta a Organização A importância da saúde mental
os referenciais que são estabelecidos são ta do sofrimento das famílias e empresas», avi- Mundial de Saúde (OMS), o concei- reside no facto de que, na sua ausên-
mais 4 700 milhões de euros em salários. sando que «esta estratégia não é futuro para to de saúde é bem mais abrangente cia, a pessoa não consegue atuar de
Se a economia produzir mais 4 700 mi- Portugal». Um argumento que já tinha sido usa- que a simples ausência de doença: forma adequada na sociedade,
lhões está tudo bem, mas não está. Então do pela Iniciativa Liberal que, assim que conhe- é um completo estado de bem- inclusive no ambiente de trabalho.
de onde sai o dinheiro? Sai mais uma vez ceu o documento, afirmou que iria votar contra -estar físico, mental e social e, Também a sua ausência costuma
fragilizando as empresas, tornando-as por entender que é um Orçamento «que não dessa forma, merece atenção em comprometer a saúde física da pes-
mais vulneráveis mas há uma dada altu- põe o país a crescer». todas as suas vertentes. soa, gerando patologias e doenças
ra em que não dá para continuar assim». O Chega também vai votar contra, depois de An- Assim como a física, a saúde que podem se tornar crónicas.
O responsável da CIP estranha ainda dré Ventura o ter considerado «extraordinaria- mental é uma parte integrante e É fundamental prevenir trans-
o facto de a sua proposta em relação ao mente injusto» e de ser «o pior Orçamento de An- complementar à manutenção das tornos mentais e que as pessoas
15.º mês sem tributação ter causado tan- tónio Costa desde que entrou na governação». funções orgânicas. Nesse contexto, afetadas tenham acesso a trata-
ta polémica: «Se esta medida fosse pe- Também o PCP já tinha ido revelado que iria vo- a promoção da saúde mental é mentos adequados.
dida pelos sindicatos não haveria este tar contra a proposta que vai «piorar a vida» essencial para que o indivíduo E esse é um objetivo que
tipo de preocupação, mas como foi su- dos portugueses. O mesmo caminho foi seguido tenha a capacidade necessária de Cascais persegue em todas as
gerida por uma entidade patronal di- pelo Bloco de Esquerda, que acusa o Executivo executar as suas habilidades pes- suas dimensões. ●
zem que ‘quando a galinha é gorda o po- de «truques». Para já, o PAN ainda não adiantou soais e profissionais. O bom estado
bre desconfia’. Realmente, somos mui- o orientação de voto, enquanto Rui Tavares (do mental confere ao homem o amplo
to pobres, mas não precisamos de ser Livre) promete ser mais exigente na mesa das exercício dos seus direitos sociais e
tão desconfiados». ● negociações e não descarta votar contra se o de cidadania. Assegura ainda as
Governo não for mais longe na resposta à condições de interação social para
sonia.pinto@nascerdosol.pt «emergência social».● uma convivência familiar mais har-
14 PAÍS nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

‘Não vejo, nem neste


ÁLVARO
MENDONÇA
E MOURA

Orçamento, nem
Presidente
da CAP

no PRR, medidas
de fundo para encarar
o problema da água’
TEXTO Sónia Peres Pinto
FOTOGRAFIAS Bruno Gonçalves

O presidente da CAP afirma que a questão da água


será central para a agricultura. Quanto ao OE 2024,
diz que ‘é pouco ambicioso e pouco estimulante’

O
e que o Governo podia ter ido mais longe.
que acha das medi- outra. Há medidas positivas, mas com O setor da restauração já chamou a compiladas num site de acesso livre,
das apresentadas a inflação e com o aumento dos im- atenção que terá de subir o preço pois obrigaria a uma reflexão. Há ta-
no Orçamento do postos indiretos, o alívio que se sen- final se os distribuidores aumenta- xas muito antigas que já não têm qual-
Estado? Sente que te no IRS depois será contrabalança- rem os valores. quer sentido. É uma questão de sim-
as empresas fica- do pelos gastos das famílias no dia-a- Se os fatores aumentam, obviamen- plificação e do agente económico sa-
ram esquecidas? xx -dia com os impostos indiretos. te que o preço final aumenta tam- ber o que é que vai pagar e por que é
O Governo tem uma bém. Em última análise, acabará por que vai pagar. E o que poderia anti-
folga bastante gran- Ainda esta semana, a CAP pediu ao ter influência no consumo, porque gamente ser um trabalho hercúleo,
de e podia ter apro- Parlamento que trave a ‘gula fiscal’ haverá uma redução. Por tudo isto, é hoje em dia é muito fácil de fazer.
veitado esta conjun- do imposto sobre o álcool. Espera um Orçamento que vem na linha dos Uma pequena equipa faz este traba-
tura para ir mais lon- que haja alguma abertura? anteriores. Há melhorias, sim senhor, lho sem uma grande dificuldade.
ge em relação às O nosso comunicado é muito claro em em sede de IRS, mas há alguns au-
empresas. Quanto às famílias, há algu- relação a uma subida enorme de um im- mentos de impostos indiretos dos E em relação ao fim do IVA zero? A
mas medidas que são positivas e que posto indireto específico. Não faz senti- quais discordamos completamente. CAP sempre foi defensora de
saudamos, mas também aí podia ter do nenhum termos um IVA diferente. Em suma, pouco ambicioso, pouco apoios à produção…
ido mais longe. Há uma questão que Quando vai a um restaurante, paga um estimulante para a economia, uma A consequência vai ser, obviamente,
tem a ver com as empresas, que são as IVA em relação ao bife e depois paga um oportunidade que se perde dadas as a subida dos preços. O chamado acor-
baixas de IRS, mas não ajudam à reten- IVA diferente em relação à bebida. Tudo disponibilidades que temos neste do IVA zero, como ficou conhecido,
ção de talentos. Não foi uma surpresa isto são complicações e também tem a momento. foi um bom acordo. E os dados mos-
e insere-se na linha dos anteriores. É ver com a imagem dos nossos vinhos. É tram isso, porque não foi apenas não
claramente pouco ambicioso e podia uma questão de apoiar os produtores. Chegou a pedir a implementação ter subido os 6%. Foi mais do que isso.
ter aproveitado a folga fiscal que exis- Não faz sentido esta divisão e a subida de um Regime Geral de Taxas, afir- Houve uma descida superior aos 6%.
te no apoio e na criação de um clima do IABA [Imposto sobre o álcool, as be- mando que não era possível traba- E porquê? Porque houve apoios à
que favoreça a competitividade. bidas alcoólicas e as bebidas adicionadas lhar com 1200 taxas. Mas nada foi produção que não foi obrigada a re-
de açúcar] ainda menos. É uma subida alterado. percutir da mesma forma os seus pró-
O tão prometido alívio da carga absolutamente brutal e inexplicável, No Pacto Social foi criado um grupo prios custos. Isso foi bom para todos.
fiscal foi conseguido ou é uma ilu- mas que vai ao encontro – e é a única ex- de trabalho para a simplificação das O Governo optou por acabar com
são com a subida dos impostos in- plicação que encontro – desta ideia de obrigações coletivas e que se tornas- esse apoio e a consequência é que to-
diretos? diminuir o IRS e de ir buscar a receita sem mais transparentes. Gostávamos dos, produtores e distribuição, vão
É dar com uma mão e retirar com a aos impostos indiretos. muito que todas as taxas estivessem ter de repercutir isto no preço final.
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt PAÍS 15

justificação que ‘lança as bases de


uma redução da disparidade que o
setor agrícola português enfrenta
face ao espanhol, depois de um ano
terrível marcado por secas’.
Esse foi o motivo principal que nos
levou a assinar o acordo de rendimen-
tos e o Governo deu passos concre-
tos. O primeiro-ministro já tinha ma-
nifestado disponibilidade para rever
pontos essenciais da política agríco-
la, mas precisava de ser transladada
para o papel e foi o que ficou estabe-
lecido no acordo. E, como disse na al-
tura, é um acordo histórico, porque se
dá um passo muito importante no
sentido de reduzir a disparidade de
condições de competitividade. Ago-
ra, terá de ser aplicado.

Como moeda de troca foi dado


um apoio extraordinário para mi-
tigar o aumento do preço dos
combustíveis…
Há uma redução de 46 para 21 euros por
mililitros. É um apoio importante por-
que diminui o gap entre as condições
com que nos debatemos e as condições
com que os espanhóis se debatem.

Quando é que os agricultores terão


acesso a essa redução de preço?
Entra em vigor já em janeiro. Quan-
to às alterações do PEPAC [Plano Es-
tratégico da Política Agrícola Co-
mum], estamos, neste momento, em
debate com o Ministério da Agricul-
tura para que sejam apresentadas
este ano para entrarem em vigor no
próximo ano. Essas alterações vão
corrigir vários aspetos que nos pare-
ciam absolutamente errados. A cam-
Seria desejável manter ou, pelo ↑ Álvaro em 2023. Estamos perante circunstân- ‘Com o fim do IVA panha deste ano foi a pior de sempre,
menos, fazer alguns ajustes?
Nas circunstâncias que ainda estamos
Mendonça
e Moura afirma
cias anómalas, justifica-se plenamen-
te a intervenção do Estado. E há dois
zero, a consequência o que veio provar que tínhamos ra-
zão. Outras medidas passam ainda
a viver, fazia sentido prolongar o pro- que a ‘CAP, aspetos a considerar. Desde logo, as vai ser, obviamente, por uma discussão com a Comissão
grama. Não nos podemos esquecer de quando assina condições anómalas em que o opera- a subida dos preços’ Europeia, que terá de as autorizar.
que vivemos uma sequência de acon- um documento, dor económico e, neste caso, o produ-
tecimentos extraordinários que vie- cumpre-o tor tem de atuar. A outra diz respeito É uma luz ao fundo do túnel depois
ram alterar imensamente as condições religiosamente’ à seca, em que não tivemos nem pou- ‘Temos de dar de ter havido várias manifestações
por parte dos agricultores?
de produção em vários setores. Não
falo só da agricultura. Começou com a
co mais ou menos o tipo de apoio que
tiveram os produtores espanhóis, o que
aos agricultores Uma boa parte das razões que leva-
covid e assim que a ultrapassámos ti- introduz fatores de distorção de con- portugueses, ram às manifestações que a CAP fez e,
vemos a guerra da Ucrânia, que veio
afetar diretamente a energia e vários
corrência particularmente graves. Só
o apoio das comunidades autónomas
não é condições a meu ver, muito bem – participei na
primeira na minha região em Miran-
fatores de produção, como os fertili- espanholas foi superior ao apoio total preferenciais, dela – foi para defender estas altera-
zantes, os cereais, etc. Em princípio, recebido em Portugal. Temos de dar é condições ções ao PEPAC que o Governo veio
devemos deixar o mercado funcionar, aos agricultores portugueses, não é agora corrigir. Isso prova que a CAP ti-
mas estamos perante circunstâncias condições preferenciais, é condições de igualdade face nha razão, mas também mostra que o
extraordinárias e é obrigação do Esta- de igualdade face aos agricultores de aos agricultores Governo nos ouviu. Neste momento,
do intervir precisamente para o regu-
lar, porque ou não funciona por fato-
outros países, nomeadamente espa-
nhóis e franceses, porque são os nos-
de outros países, temos estes resultados para apresen-
tar e vamos trabalhar para que se tra-
res intrínsecos corretamente ou por sos concorrentes imediatos. Não po- nomeadamente duzam no rendimento dos agriculto-
fatores exógenos, como é o caso. Ha- demos resignar-nos a ter condições de espanhóis res. O nosso objetivo é dar-lhes con-
via claramente espaço para o Gover- produção diferentes daquelas de que dições de competitividade.
no atuar. Acresce que Portugal, como usufruem os agricultores espanhóis ou e franceses’
alguns outros países, mas não todos, franceses. Caso contrário, o nosso pro- Sente que o Governo ouviu a CAP
foi particularmente afetado por uma duto torna-se menos competitivo e, ou precisava da CAP para assinar o
gravíssima situação de seca e estou a obviamente, torna-se mais caro. acordo de rendimentos?
pensar em Espanha. Portugal foi dos Provavelmente, as duas. Na primeira
países mais afetados por uma seca gra- Quando assinou o acordo de rendi-

víssima em 2022 que depois se repete mentos com o Governo deu como PÁGINA SEGUINTE
16 PAÍS nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023


Ninguém tem Há obras que não O que mais me
uma autonomia estão efetuadas impressiona
estratégica se não e algumas foram em Portugal
tiver autonomia pensadas nos anos 60 é a falta de ambição.
alimentar, mas do século passado. Passei toda a minha
cada país tem de Desta vez, ao vida diplomática
dar o seu contributo contrário dos anos a lutar contra
60, 70, 80, não a falta de ambição
podemos dizer que
não temos dinheiro

ÁLVARO
MENDONÇA
E MOURA
Presidente
da CAP

☛ conversa que tive com o primeiro-mi- A seca tem-se traduzido em perdas Isso passa pela criação de mais temos de pensar no conjunto da Europa.
PÁGINA ANTERIOR
nistro fiquei claramente convencido significativas para os agricultores? barragens? A Europa tem dito que se quer tornar
de que estava disponível para rever Sobretudo nestes dois últimos anos, Isso passa por barragens, por alteamen- estrategicamente mais autónoma e isso
algumas políticas agrícolas e o resul- com repercussões imediatas. Por tos de barragens existentes e pela recu- passa por uma autonomia alimentar.
tado está aqui. exemplo, há um grande número de ex- peração de infraestruturas. Estamos Ninguém tem uma autonomia estraté-
plorações a vender gado por não terem com perdas, em alguns casos, superio- gica se não tiver autonomia alimentar.
A CIP não ter assinado o acordo rações para o alimentar face ao preço res a 30%. Não falo só da agricultura, em Temos de racionar a nível europeu, mas
não o torna mais frágil? incomportável. Isso representa um alguns municípios do interior os desper- cada país tem de dar o seu contributo.
A CIP não assinou, é um facto, mas o prejuízo muito grande e a questão da dícios são superiores a 80%. Isto signi- E Portugal tem obrigação de dar o seu
conjunto das confederações patro- água será central para a agricultura. fica que todos temos de olhar para o con- contributo para aumentar a soberania
nais, CIP incluída, apresentou em co- junto e não olhar apenas para o proble- alimentar na Europa. É uma obrigação
mum um pacote de 25 medidas ao O Governo elaborou um plano ... ma no Algarve ou no Alentejo e ver o que nossa. Vamo-nos contentar com a atual
Governo que eram as nossas reivindi- Quando falo de água não falo só de é que devemos fazer. Muitos destes tra- produção agrícola portuguesa?
cações. Depois, por razões que lhes regadio, falo de água em geral. Temos balhos são de grande envergadura, não
são próprias e das quais não me que- o regadio, mas temos o sequeiro e a se fazem num ano e deviam estar con- E o ideal seria ainda aumentar as
ro imiscuir, resolveu não assinar. Mas maior parte da agricultura portugue- templados no PRR. No PRR está previs- exportações...
o Conselho das Confederações tra- sa é feita em sequeiro. Não vejo, nem ta uma barragem relativamente peque- Aumentámos as exportações em 50%
balhou em conjunto e estivemos reu- neste Orçamento, nem no PRR, o que na em Ponte de Sor, a ligação do Poma- na década anterior, de 2010 a 2020.
nidos com o Governo para discutir ainda me preocupa mais, medidas de rão ao Algarve e a dessalinizadora no Esse é o caminho. Temos de aumentar
estas medidas. Depois, cada uma das fundo para encarar de frente a ques- Algarve. São três obras importantes. Mas a nossa capacidade produtiva e sermos
confederações, como é normal, tem tão da água no país. O PRR, lamenta- pergunto: ‘É só isto?’. Isto não tem di- ambiciosos. E para ser ambicioso é pre-
pontos específicos. velmente, tem pouquíssimas verbas mensão, temos de ter uma outra visão ciso água. Não podemos ficar conten-
destinadas à retenção de água. da água e pensar sobretudo em como é tes com o que atualmente produzimos.
Em troca, o salário mínimo subiu que a podemos reter. Há imensa água Temos de melhorar a nossa balança
para os 820 euros e há o compro- E o PRR quando foi desenhado já que corre para o mar sem qualquer apro- agroalimentar e é um caminho perfei-
misso em aumentar os outros orde- estávamos com estes problemas... veitamento e se se puder aproveitar al- tamente possível. É preciso levar as
nados em 5%. As alterações climáticas não começa- guma dessa água, por pequena que seja, pessoas a produzirem mais, com maior
A CAP, quando assina um documen- ram hoje, mas todos sabemos que vão faz uma diferença enorme. qualidade e de uma forma sustentável.
to, cumpre-o religiosamente. É um agravar-se. Hoje as previsões indicam No entanto, para sermos ambiciosos
esforço grande que compreendemos, que teremos precipitações mais con- Depois tem os ambientalistas à temos de ter um PRR – tenho um gran-
mas para algumas empresas será mui- centradas e porventura mais intensas, perna... de ceticismo em relação à nossa capa-
to difícil. Não só será aplicado como portanto, temos de reter água. Não é Ambientalista sou eu. Se não tiver char- cidade para utilizar as verbas tal como
insistiremos com todos os associados uma questão de dizer que não há água. cas, o que é que vai acontecer? Não vou estão indicadas, Deus queira que me
para a necessidade de seguir a linha Em certas regiões há esse problema, conseguir produzir e, se não conseguir, engane – para as grandes reformas.
do aumento dos 5%. Não nos pode- mas no conjunto do país, felizmente, deixo de ter sustentabilidade económi-
mos esquecer que há muitas peque- não tem o problema de Espanha e mui- ca e, se não tiver sustentabilidade eco- Houve agora uma reprogramação
nas empresas agrícolas que vivem to menos o de Marrocos. Há um dado nómica, vou-me embora e aí tenho de- do PRR, mas essas alterações não
com grandes dificuldades, mas é mais que é pouco conhecido, mas a água sertificação. Não tenho sustentabilida- foram contempladas…
uma razão para sermos muito exigen- que existe no norte do Tejo, cerca de de ambiental, nem biodiversidade e Havendo vontade política, esse não é o
tes na aplicação atempada dos di- 60% vem da chuva e 40% vem de Es- muito menos tenho sustentabilidade problema. Mas é preciso ter ambição
nheiros comunitários. panha. O que quero dizer com isto? O social. Tenho de ter sustentabilidade para depois ter vontade política para
país não está neste momento confron- económica para poder ter a sustenta- acompanhar essa ambição. Há obras
Nomeadamente o PRR? tado nem no futuro próximo com uma bilidade ambiental e social que quero. que não estão efetuadas e algumas fo-
Sim. É muito importante que os di- questão de não haver água. Estamos ram pensadas nos anos 60 do século
nheiros comunitários sejam atempa- confrontados com problemas de não E quando se diz que é necessário passado. Fala-se muito no aeroporto,
damente entregues para aquilo a que haver água quando é necessário em al- produzir cada vez mais ... mas há pequenas barragens, etc., que
se destinam. gumas regiões do país. Temos de ter uma visão mais ampla e são dos anos 60 e nunca saíram do pa-
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt PAÍS 17

A CAP pretendeu
censurar o acordo
Há um ponto que não
mudei e não tenciono ➽ Nuno Melo
na Madeira porque
envolveu um partido
mudar: é na ambição
que tive para o nosso
A comissão
que é contra país quando estive liquidatária do SNS
a agricultura fora e nas funções
e no fundo é contra que desempenhei XVIII governos constitucionais – a par
a sustentabilidade – e essa ambição de Francisco Ramos e Óscar Gaspar.
ambiental é a mesma que trago Por seu lado, António Costa é pri-
meiro-ministro desde 26/11/2015,
para a agricultura tendo tido como ministros da Saúde
Adalberto Campos Fernandes,
Marta Alexandra Simões, Marta
Temido e Manuel Pizarro (em fun-
ções), e como secretários de Estado
Fernando Araújo (atual CEO do
CARTAS DO CALDAS SNS), Francisco Ramos, Manuel
Delgado Rosa Valente de Matos,
Raquel Duarte, Jamila Madeira,
Manuel Pizarro soa mais a António Sales, Diogo Serras Lopes,
presidente de uma comis- Margarida Tavares e Ricardo Mestre.
são liquidatária do SNS do Significa que durante 22 anos conta-
pel. Mas, desta vez, ao contrário dos contra a agricultura e no fundo é con- que a ministro da Saúde. dos desde outubro de 1995, o PS teve
anos 60, 70, 80, não podemos dizer que tra a sustentabilidade ambiental. Com as maiorias, por vezes absolutas, os
não temos dinheiro. Por vezes, pensa- toda a franqueza, não vejo uma razão governantes, os meios e os recursos,
-se pequenino em Portugal. Quando se política, embora possa admitir que haja para implementar as políticas que
fez Alqueva muitos diziam dois enor- razões pessoais, para o que aconteceu reforçassem e tornassem sustentável o
mes disparates. Um era que Alqueva na Madeira. O PSD e o CDS não preci- SNS. Aliás, só António Costa, com

D
iria demorar décadas a encher e afinal savam desta aliança. Criticaremos sem- Manuel Pizarro em parte do percurso,
encheu rapidamente. Segundo, nunca pre quando tivermos de criticar, como esde que assumiu a leva já 8 anos à frente dos destinos do
seria utilizada toda a sua capacidade de elogiaremos quando tivermos de elo- pasta de ministro da país, com a saúde sempre em triste
rega e encheu. Alqueva transformou giar, seja o partido do Governo, seja o Saúde, Manuel Pizarro queda livre. Foram 8 anos desperdiça-
estruturalmente o Alentejo. Imagine o PSD, seja o CDS, seja a IL... já disse que a culpa do dos, com proclamações de ideologia
que seria o Alentejo e o país agrícola atual estado do SNS atiradas para cima dos hospitais, em
sem Alqueva. O que mais me impres- Menos o PAN... está nas «políticas de há 40 anos», vez de meios, profissionais de Saúde e
siona em Portugal é a falta de ambição. Criticamos ou elogiamos em função durante «os anos 80 e 90» e que o da dignificação das carreiras.
Passei toda a minha vida diplomática a das atitudes, das medidas concretas «Governo vai fazer um estudo para Em 8 anos e só a pensar em
lutar contra isso. Não somos piores do e não esquecemos quais são os par- perceber que rede hospitalar nacio- votos, este governo diminuiu em 5
que os outros e em muitas das nossas tidos que historicamente têm tido nal é desejável que Portugal tenha horas semanais o período normal
produções agrícolas somos excelentes. mais atenção com a agricultura. Es- em 2030». Se tivermos em conta o de trabalho dos profissionais de
pero com toda a franqueza que o Go- colapso que está à vista de todos em Saúde, com prejuízos para o fun-
Ainda não estava à frente da CAP, verno Regional não se deixe influen- 2023, a definição das prioridades é cionamento do SNS mais do que
mas a anterior direção declarou ciar de forma a prejudicar a agricul- verdadeiramente extraordinária. antecipáveis. Foi também o PS que
‘guerra’ à ministra da Agricultura. tura e os agricultores da Madeira. Talvez exista entre quem vota, que rescindiu parcerias público-priva-
É um capítulo que ficou para trás? vá nesta conversa, por razão de das que transformaram hospitais
A CAP bate-se por determinados Foi secretário-geral do Ministério dogma, ou fidelidade ao cartão. Ainda exemplarmente geridos em proble-
ideais, que são a defesa dos agricul- dos Negócios Estrangeiros, repre- assim, o que resulta surreal é que não mas financeiros, agravou as situa-
tores e da agricultura portuguesa. Cri- sentante permanente junto das se tenha em conta o óbvio, de uma ções de urgências fechadas, grávi-
ticámos e, a meu ver, muito bem os Nações Unidas, embaixador em cronologia que comprova que nos das sem atendimento, primeiras
erros que se fizeram em matéria agrí- Madrid, entre outros cargos e ago- últimos 30 anos, nenhum partido consultas que tardam anos, cirur-
cola e, hoje em dia, o Governo corri- ra lidera a CAP… governou tanto tempo como o PS. gias urgentes adiadas, falta de
giu várias dessas medidas. São trabalhos diferentes. Agora, há um António Guterres foi primeiro- capacidade de resposta em várias
ponto em que não mudei e não tencio- -ministro de 28/10/1995 até especialidades, 1 milhão e 600 mil
Mas as negociações são com o pri- no mudar: é na ambição que tive para o 06/04/2002, tendo como ministros portugueses sem médico de família
meiro-ministro… nosso país quando estive lá fora e nas fun- da Saúde Maria de Belém Roseira, (depois de António Costa ter garan-
Alterações desta dimensão como aque- ções que desempenhei – essa ambição Maria Manuela Costa e Adalberto tido em 2016 que todos os teriam
las que estão em curso têm de passar é a mesma que trago para a agricultura. Campos Fernandes e como secretá- em 2017) e filas matinais desuma-
pelo primeiro-ministro, porque esta- rios de Estado José Arcos dos Reis, nas em Centros de Saúde.
mos perante modificações do que era Mas deu-lhe experiência para ter Francisco Ramos, Arnaldo Silva, Retrocedendo aos anos 80, para
o paradigma da relação do Estado com maior jogo de cintura ou maior ca- Nélson Madeira Baltazar, José disfarçar a incapacidade do Governo
os agricultores. Alterações dessas têm pacidade para negociar… Miguel Boquinhas, Francisco e transferindo para 2030 resultados,
de passar pelo primeiro-ministro e pe- Passei toda a vida a negociar, muitas Ramos e Carmen Pignatelli. quando está em causa salvar o SNS
direi sempre sua a intervenção pessoal. vezes a negociar coisas que as pessoas José Sócrates foi primeiro-ministro em 2023, Manuel Pizarro deita a toa-
não acreditavam que fosse possível e de 12/03/2005 até 20/06/2011, tendo lha ao chão e soa mais a presidente
A CAP manifestou desacordo com que depois foi. Na agricultura é a mes- como ministros da Saúde António de uma comissão liquidatária do
entendimento entre PSD/Madeira ma coisa. Se formos ambiciosos, de- Correia de Campos e Ana Jorge, SNS, do que a ministro da Saúde. Isso
e PAN… terminados e organizados podemos dando-se o caso do próprio Manuel também é trágico. ●
A CAP pretendeu censurar esse acor- fazer uma mudança muito profunda Pizarro ter sido secretário de Estado da
do, porque envolve um partido que é na nossa agricultura. ● Saúde em ambos os executivos – XVII e Presidente do CDS/PP
18 PAÍS nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

➽ Luís Filipe Menezes


Caos ou renascimento?
já deixava muito a desejar, se repetidos e desastrosos no vai reabastecendo o Grupo dos condicionantes comuns
agravou perigosamente. poder local, ainda tinha a pos- Parlamentar com as sucessivas acima referidos.
Iniciou-se então um processo sibilidade de ressuscitar à e naturais remodelações parla- Contudo, ao contrário da
de mediocrização acelerada na volta dos ex-governantes ‘pas- mentares e adubando a oferta situação atual do PSD, os ex-
barricada do poder, baseada na sistas’, muitos deles acantona- global com uma enorme panó- -assessores quando retornados
ascensão rápida e vertical de dos no Parlamento. plia de quadros jovens forma- ao Parlamento, a candidaturas
jovens assessores, recém-saí- Lá poderiam recuperar do dos no poder local. Também a autarquias ou ao mercado
dos do sistema educativo que, trauma da troika, reafirmar a tem tido a sabedoria de conso- civil, já trazem o certificado de
num ápice, passaram a chefes sua imagem pública e ser o lidar a renovação, ancorando-a ex-ministros, algum conheci-
de gabinete, logo de seguida a novo viveiro de personalidades em ‘veteranos’ experientes mento das manhas da adminis-
OPINIÃO secretários de Estado, desa- que rodeariam um líder candi- como Edite Estrela, João tração pública e dos instru-
guando em pouco meses em dato a primeiro-ministro (PM). Soares, ou Santos Silva. mentos europeus. Ou seja, têm
ministros da nação! Desse grupo deveriam ainda Assim o PSD, quando o seu essa mochila, esse efetivo
O candidato do PSD a Do outro lado da barricada sair credíveis candidatos à che- candidato a PM sai à rua, tem upgrade de credibilidade, por
PM tem grande dificul- caminhava-se igualmente para fia dos principais municípios. grande dificuldade de se rodear mais artificial e falacioso que
dade de se rodear de o abismo. Na área do centro e Seria assim se não tivesse de rostos que os portugueses ele seja, que ele é.
rostos que os portugue- da direita, única realista alter- havido quem, num ato de reconheçam e constituam mais Não lhes faltarão empregos e
nativa a um PS assim fortaleci- ‘vingança’ contra um partido valias na sua projeção. empregadores. Dentro e fora
ses reconheçam. do, criou-se o caldo de cultura que sempre detestou, tivesse O Hugo Soares, Pinto Luz, da vida política.
conducente ao descalabro da decidido o seu frio ‘genocídio’ Leitão Amaro, entre poucos Assim, só um golpe de asa
derrota sistemática. político. mais, são reais valores, mas genial, muito trabalho empenha-
A difícil governação de Rui Rio pegou na vassoura e também neste caso formam do e um aproveitamento humil-

A
Passos Coelho em tempo de não deixou pedra sobre pedra. uma manta curta para quem de de todos os recursos, aliado a
qualidade da troika, adicionada à implosão Logo no primeiro ato eleito- quer cimentar uma imagem de uma ‘economia de guerra’ – leia-
democracia está do CDS, transformado num ral saneou tudo que cheirasse quem quer convencer os seus -se a um esforço solidário e cole-
muito ligada à qua- partido unipessoal pela vaida- ao passado laranja, substituin- compatriotas de que tem um tivo sem marginalização de nin-
lificação dos qua- de e egocentrismo de Portas, do quadros já formados por largo grupo de credíveis futu- guém, salvará o PSD de um
dros políticos. abriu o espaço a um rearranjo jovens inexperientes que, pas- ros membros de governo. colapso nas eleições autárquicas
Bem ou mal, a alternância de partidário à direita. sados mais de quatro anos, Com este pano de fundo, não e depois nas legislativas.
poder PSD/PS foi alimentando Um horizonte de longo afas- continuam a ser uns ilustres estranho que as sondagens, que Cabe aos atuais dirigentes da
uma nivelação decrescente da tamento de poder conduziu à desconhecidos perante o país. valem o que valem, continuem cúpula partidária começar a cons-
partidocracia mas, ainda assim, deserção de quadros médios É verdade que ainda lá exis- a dar um PS a lutar pela reelei- truir o milagre. Difícil, mas possível.
nos limites do aceitável. locais para os braços do discur- tem talentos desaproveitados, ção. Julgo até que a situação É no entanto curioso que o
Este ciclo virtuoso de equilí- so assertivo de Ventura e para entre outros, Mota Pinto, João será ainda mais difícil quando sonho da ‘mexicanização’ do
brio começou a desmoronar-se uma moda ‘fina’, qual ‘bloco de ou Paulo Rios, mas constituem chegar o momento de escolher regime – leia-se hegemonia
a partir de 1995. esquerda’ de direita, protagoni- um curtíssimo núcleo de sobre- candidatos a autarcas. prolongada de um só partido –
Por múltiplas razões: porque zada pela ‘modernaça’ IL. vivência, sem hipóteses de ala- É verdade que o PS também alimentado por Mário Soares
a deserção e afastamento da Mas o pior estava para acon- vancar sozinho qualquer pro- tem problemas, mas ser poder por motivos nobres – receio da
vida pública dos melhores qua- tecer. cesso de recuperação. facilitará alguma capacidade reedição da instabilidade caóti-
dros da sociedade civil foi radi- O PSD, apesar dos desaires Entretanto, à esquerda, o PS de recrutamento, isto apesar ca da Primeira República –
cal – vencimentos indigentes e possa nascer, não desse tipo de
escrutínio pessoal completa- temida turbulência, mas da
mente desregrado, e até por decadência qualitativa extrema
isso inconsequente, foram as de todo o sistema partidário!
principais causas dessa irrever-
sível desertificação. P.S. – Não falei das eleições
Depois veio a concentração europeias propositadamente.
de poder num só partido. Considero-as irrelevantes seja
Desde 1995 o PS governou o qual for o resultado.
país 18 anos e, a partir de 2013 São sempre eleições de grande
tornou-se hegemónico no abstenção, de afirmação de
poder local. Esta conjugação ‘Tiriricas’ de circunstância,
prolongada e tão marcada onde o voto de protesto, quan-
nunca havia acontecido. do existe, se dispersa aleato-
Anteriormente, enquanto um riamente. Além de que mesmo
dos dois maiores políticos ama- um resultado positivo, em
durecia quadros no aparelho nada garante influenciar o que
de Estado, o outro projetava vem a seguir. Em 2008 Rangel
novas figuras na liderança das e o PSD venceram-nas, mas
grandes cidades. poucas semanas depois
Ora o PS não tinha obviamen- Ferreira Leite foi copiosamen-
te quadros para esta súbita ‘far- te derrotada por um Sócrates
FACEBOOK PSD

tura’. Daí a inevitabilidade do em fim de estação. ●


ciclo negativo em que a quali-
dade dos dirigentes líderes, que Ex-presidente do PSD
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt PAÍS 19

➽ Francisco Gonçalves
Os pobres de Gaza
e os pobres de Portugal
‘morte aos ricos’. Curiosamente em
nenhum se leu morte à pobreza. É
mais fácil agitar ódios e divisões do
que propor medidas reais para com-

BRUNO GONÇALVES
bater o problema.
MIGUEL SILVA

Na realidade, a geografia também


afeta a condição de quem é pobre. É
muito diferente ser pobre em Gaza,
↑ Santana Lopes e Marques Mendes posicionam-se na corrida a Belém sê-lo Portugal ou sê-lo na Alemanha
ou na Suécia. Mesmo em Portugal, a
POSFÁCIO situação muda com a morada.

Santana atira-se A geografia também


Veja-se o caso de Oeiras onde,
desde 1986, a habitação pública foi
considerada uma prioridade estra-

a ‘ordinarice’ afeta a condição de quem


é pobre. Mesmo em
Portugal, a situação
tégica para a comunidade, com
efeitos no bem-estar e qualidade
de vida das pessoas. Esta política

de Marques Mendes muda com a morada. tem continuidade ainda hoje, de tal
forma que mais de 10% do PRR
destinado à habitação está já con-
tratualizado com este Município.
Autarca não gostou ra dele. Tenha tino. Não repita», avi- Para além da política de habitação,

Q
sou o antigo primeiro-ministro. o Município tem aprovado um Fundo
da referência à Na semana passada, uma sondagem uem assistiu ao debate de Emergência Social para situações
Figueira da Foz do ICS/ISCTE para a SIC e o Expresso quinzenal da última de maior necessidade dos munícipes,
mostrava que, de uma lista de 17 nomes quarta-feira na desde há mais de 10 anos. Na
como uma terra ‘ali que reunem condições para suceder a Assembleia da Educação, para além dos apoios mais
ao lado de Coimbra’. Marcelo Rebelo de Sousa como próxi- República, ficou cer- conhecidos (ao longo de toda a vida
mo Presidente da República, Marques tamente impressionado com a bon- escolar), Oeiras está a universalizar o
TEXTO Joana Mourão Carvalho Mendes surgia em quarto lugar, com 3,5 dade e humanismo com que boa acesso ao ensino superior: todos os
pontos numa escala de 0 a 10, enquan- parte dos parlamentares portugue- jovens que queiram prosseguir os

A
to Santana Lopes se ficava pelos 2,6 pon- ses olham e criticam a situação de seus estudos universitários podem
inda longe de se disputarem as tos, em décimo quarto lugar. pobreza (miséria mesmo) da popu- fazê-lo com bolsa do município. Se
eleições presidenciais de 2026, Numa segunda publicação na mesma lação da Faixa de Gaza. em 2017 havia 34 bolsas para ensino
Pedro Santana Lopes e Luís rede social, Santana Lopes quis depois A situação da população da superior, em 2023 são já mais de
Marques Mendes, que já mani- deixar «bem claro» que o que escreveu Palestina é efetivamente aterradora. 900! Na saúde, a população idosa
festaram disponibilidade para «nada tem que ver com qualquer dis- Nada a dizer sobre isso. Qualquer carenciada tem, há quase década e
ponderarem uma eventual candidatu- puta pré- eleitoral», afastando-se de pessoa com o mínimo de sentimen- meia, a garantia do Município supor-
ra a Belém, protagonizaram esta sema- uma eventual corrida a Belém em 2026. tos tem de se condoer com o sofri- tar 50% da fatura da farmácia.
na um novo episódio de hostilidade. «Cada vez mais sei e sinto, no estado em mento dos povos da ‘Terra Santa’. Estes exemplos demonstram
Na origem do desentendimento, que está o mundo, que não quero par- Porém, o referido debate parla- como a geografia influencia a condi-
desta vez, esteve um comentário de ticipar nessa corrida. E estou também mentar teve lugar dia 18 de outu- ção da pobreza, não apenas de país
Marques Mendes no seu espaço de convencido de que o comentador da bro, um dia depois de ser invocado para país, mas também como o faz
análise política de domingo à noite, na SIC em questão [Marques Mendes] não o Dia Internacional para a dentro de um país ou de uma região.
SIC, em que se referiu à Figueira da Foz chegará a ser candidato», acrescentou. Erradicação da Pobreza, num país Estes apoios apenas são possíveis a
como uma terra «ali ao lado de Coim- O autarca da Figueira da Foz exigiu da União Europeia no qual 1,7 Oeiras, Município que não recebe
bra». O presidente da Câmara Muni- novamente um pedido de desculpas milhões de pessoas estão em risco transferências do Orçamento do
cipal da Figueira da Foz não gostou e de Marques Mendes, defendendo-se: de pobreza e onde quase metade Estado, porque foram seguidas políti-
respondeu com um pequeno texto de «Eu não fui incorreto com ninguém da população pobre está no merca- cas de crescimento e desenvolvimen-
indignação, intitulado «Ordinarice», nem provoquei ninguém». do de trabalho – isto é, ter emprego to económico que criaram os recursos
publicado na quarta-feira na rede so- Horas depois, a querela parecia já estar não é garantia de não ser pobre. para o investimento na coesão social.
cial Facebook. Classificando as pala- sanada,comSantanaLopesaconfidenciar O dia foi naturalmente invocado na Na realidade, é esse o cerne da
vras de Marques Mendes como «um emnovapublicaçãoqueMarquesMendes comunicação social, tendo o Governo questão: o debate do combate à
dito ordinário» e considerando que lhe endereçou um pedido de desculpa. esvaziado a data com a aprovação, pobreza tem desprezado a promo-
revelam que este está «incomodado «Teve a gentileza de me ligar e de dizer as alguns dias antes, do plano de ação ção do crescimento económico,
e nervoso», Santana exigiu ao comen- palavrasqueesperavadeumapessoacom 2022-2025 da Estratégia Nacional de sem o qual não haverá a efetiva
tador e antigo líder social-democrata aeducaçãoque,paraládemuitasdiferen- Combate à Pobreza. subida do rendimento dos portu-
«respeito total pela Figueira da Foz». ças e divergências, sempre lhe conheci. Se os discursos sobre Gaza são car- gueses – é por isso que o salário
«Até deu um salto grande nas son- Nãovoufalardomaisquepoderáfazer,ele regados de emoção, a verdade é que médio não cresce.
dagens manipuladas... Mas ele sabe saberá. Por mim, recebi as suas palavras o combate à pobreza em Portugal Até então, continuaremos a ouvir
que é falso, por isso a agitação [...] Não com satisfação», concluiu. ● não provoca o mesmo alvoroço. discursos encantadores sobre o com-
vou responder com a mesma moeda Nas recentes manifestações pela bate à pobreza alheia, mas que des-
e cometer a ordinarice de falar da ter- joana.carvalho@nascerdosol.pt habitação vimos cartazes que diziam respeitam os pobres portugueses. ●
20 PAÍS nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

➽ Filipa Chasqueira
‘Quem dorme a sesta Mal-estar
não dorme de noite’ nos quartéis
lar deixam simplesmente de dormir
a sesta. Convencionou-se – por falta salta para a
praça pública
de espaço, de equipamento ou para
a maximização do trabalho das edu-
cadoras e auxiliares – que a partir
dos três anos as crianças já não pre-
cisam de fazer uma pausa à tarde.
Aos dois anos, precisavam, mas, por
magia, com a mudança de sala no
ano seguinte, essa necessidade sim- Entre os que querem ta às responsabilidades acrescidas
FALAR BAIXINHO plesmente desaparece.
Ainda subsiste também o mito de
mais meios e os que entregues a este ramo das Forças Ar-
madas, nomeadamente o combate
que ‘quem dorme a sesta não dorme defendem que as FA aos incêndios, a capacidade de ciber-
Quanto mais velhas, mais à noite’, embora os pais e educado- precisam de mudar defesa e o sistema de armas KC-390.
difícil será as crianças res mais atentos percebam que isso Nas contas de Cartaxo Alves, «o nú-
fazerem a sesta, porque não é uma verdade generalizada. de vida, os três ramos mero de efetivos militares existentes
querem ficar acordadas A maioria das crianças de três vivem dias difíceis. no ramo situa-se francamente abai-
anos precisam de dormir a sesta, xo do previsto (...), antecipando-se
como os crescidos de aproveitar a inércia a seguir ao que no final de 2023 varie entre os

N
almoço não só para descansar o TEXTO Raquel Abecasis 1.632 militares abaixo do autorizado
corpo e a mente, mas também para pelo decreto lei Nº 6/2022 e os 2.292
consolidar todas as aprendizagens militares em falta, em relação às ne-

J
feitas. Ao contrário do que muitas o momento em cessidades reais identificadas».
á na barriga da mãe os vezes se ouve, se não dormirem que o mundo vive No documento de 12 páginas, dá-se
bebés têm os seus ritmos nessa altura, quando chegar a noite na incerteza do conta dos resultados de um estudo fei-
de sono, que muitas vezes estarão tão estimuladas e tão can- que poderá resul- to para identificar as razões que levam
conseguimos identificar sadas, que será muito mais difícil tar de mais um a um abandono cada vez mais significa-
através dos seus movi- adormecerem. Como acontece conflito no Médio tivo de efetivos da Força Aérea. Os bai-
mentos. Quando nascem e durante também com os adultos, aliás. Oriente, que amea- xos salários, a diminuição de apoios, a
os primeiros tempos de vida ainda Tal como fazemos com a fome e ça alastrar-se, em diminuição do prestígio social, o im-
dormem a maior parte do dia e, outras necessidades básicas, a sesta Portugal aumen- pacto na vida pessoal e familiar das es-
com o avançar do tempo, os pais devia ser respeitada e respondida de tam os sinais de pecificidades da carreira militar e a so-
têm a tarefa, muitas vezes hercúlea, acordo com a necessidade da criança. insatisfação vin- brecarga de trabalho são as principais
de adequarem os padrões de sono Pelo bem da sua saúde física e mental dos dos vários ra- razões que levam ao abandono de uma
do bebé aos seus, porque não seria e também pela dos outros. Uma crian- mos das Forças Armadas. carreira que é pouco atrativa e não tem
possível passarmos a noite acorda- ça pequena com sono fica rabugenta, Depois de na passada semana ter- capacidade para competir com a ofer-
dos e o dia a dormir. À medida que intolerante, irritável. Não só não apro- mos dado conta de vários sinais de ta privada.
vão crescendo é criada uma rotina veita o resto do dia plenamente – e desagrado no interior da Marinha, re- A divulgação pública deste docu-
organizadora de todos e as sestas essa falta poderá trazer repercussões lacionados, sobretudo, com falta de mento causou mal-estar e a Força Aé-
começam a fazer-se sempre no ao nível da atenção, aprendizagem, meios humanos e técnicos, saiu a pú- rea fez sair de imediato um comuni-
mesmo período. A necessidade de memória, regulação emocional e blico o conteúdo de um memorando cado garantindo que «a Força Aérea
dormir vai diminuindo e as sestas comportamento –, como dificultará a enviado pelo Chefe de Estado Maior Portuguesa, como tem sido o seu
também são alteradas em número e vida a quem a rodeia. Numa sala de da Força Aérea (CEMFA) à ministra timbre ao longo dos 71 anos da sua
duração, respeitando assim os rit- pré-escolar então, com 20 ou mais da Defesa, Helena Carreiras. existência, cumpre e continuará
mos do bebé. Esta transição é feita crianças rabugentas, prefiro nem ima- No documento, divulgado pela agên- sempre a cumprir a sua missão em-
sobretudo de acordo com a necessi- ginar o cenário. cia Lusa e a que o Nascer do SOL teve penhando todos os seus homens e
dade do bebé e não a nossa. Pela mesma razão que se deve dei- acesso, o general Cartaxo Alves alerta mulheres, bem como todos os seus
Quanto mais velhas, mais difícil xar dormir uma criança que tem sono, Helena Carreiras para o risco real de meios colocando-os ao serviço do
será as crianças fazerem a sesta, também se deve libertar da sesta aquele ramo das Forças Armadas po- país e dos portugueses».
porque querem ficar acordadas aquela que já não tem necessidade de der ficar sem capacidade para cumprir No mesmo comunicado é garanti-
como os crescidos, sentem que ir dormir à tarde, porque, aí sim, é possí- os compromissos assumidos pelo país. do o permanente diálogo com a mi-
para a cama é uma perda de tempo vel que à noite, quando os pais apaga- «Caso não sejam tomadas medidas nistra Helena Carreiras, no sentido
e também são mais persuasivas. É rem a luz, comece a festa no quarto. efetivas, que contribuam de forma ine- de encontrar soluções para os pro-
nessa altura que nós, adultos, deve- Ou seja, devemos deixar as crianças quívoca para a inversão do processo blemas existentes.
mos ter a sensatez de perceber se a que têm sono dormir. Não devemos de erosão dos efetivos militares, com-
criança não quer dormir porque não privá-las de uma necessidade tão prometer-se-á, irremediavelmente, a Um desânimo que não
lhe faz falta ou porque prefere estar básica que terá implicações diretas no capacidade operacional da Força Aé- se resolve sem reformas
a brincar, embora todos os indica- seu desenvolvimento e bem-estar. Da rea e qualquer ambição de edificação «O problema não se resolve com di-
dores nos mostrem que umas horas mesma forma que não negaríamos das novas capacidades atribuídas». nheiro, é precisa uma revolução den-
de descanso só lhe fariam bem. um prato de sopa a quem tem fome. ● No memorando enviado à minis- tro das Forças Armadas para poder
Infelizmente, em muitas escolas tra, o CEMFA indica como principal ter solução». O desabafo é de um an-
essa sensatez não existe e os meni- Psicóloga na ClinicaLab Rita de Botton fator para a crise na Força Aérea o dé- tigo responsável pela área da Defesa,
nos quando entram para o pré-esco- filipachasqueira@gmail.com fice de efetivos que possa dar respos- que não vê qualquer solução para o
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt PAÍS 21

➽ Edgar Clara
Israel ou Palestina?

estes países estilhaçados pelas tri-


bos, religiões, culturas, línguas,
hábitos completamente diferentes.
Sei alguma coisa da História de
Israel até à morte de Jesus e à
queda do Templo (ano 70 d.C.).
Porém, não tenho qualquer conhe-
cimento da história posterior. Nos
últimos dias comecei a ler a histó-
ria dos judeus nos últimos dois
NO MEIO DE NÓS séculos e tenho encontrado dados
incríveis que nos envergonham a
todos… todos… todos…
Admiro a cultura hebraica Não tinha a mínima ideia que no
e os judeus, e tenho uma início do século XIX os judeus, no
admiração enorme pelos reino da Prússia, eram considera-
árabes de onde provém dos apátridas, isto é, não tinham
nenhuma identidade nacional.
a maioria dos cristãos Eram uma espécie de nómadas.
Imaginemos, pois: um judeu ale-
mão, descendente de um judeu
nascido na Alemanha e neto de um

N
judeu também ele alemão, não lhe
JOÃO PORFÍRIO

os últimos anos, tenho era concedida nacionalidade – não


visitado a Terra Santa. tinham Pátria, imagine-se. Um
Têm sido experiências outro dado que me escandalizou é
maravilhosas de con- que qualquer judeu que vivesse
impasse que se vive nos três ramos te que devia ficar nos quartéis seja tra- ↑ F.A. em tactar diretamente com naqueles Estados estava proibido
das Forças Armadas enquanto a es- zido para a praça pública. situação as fontes das Sagradas Escrituras – de ocupar cargos públicos de
trutura militar mantiver uma organi- crítica: os locais, os edifícios, os ambien- representação ou de ensinar em
zação do século XX, herdada dos tem- Gouveia e Melo aposta na faltam tes, a cultura – mas também tenho escolas ou em universidades.
pos da guerra colonial. «A pirâmide Aldeia Naval para atrair jovens homens procurado conhecer a cultura con- Eu sempre admirei o número de
está invertida nos vários ramos». Não resolve, mas ajuda. A ideia é e meios temporânea: como vivem, hoje, os judeus que se converteu ao cristia-
Este responsável refere que o pro- aproveitar os terrenos no Alfeite, técnicos judeus? E os muçulmanos? Como nismo no século XIX, mas o que eu
blema da falta de atratividade das onde em tempos existiram os bairros vivem os judeus ateus (sim, que não sabia é que muitos deles o fize-
Forças Armadas nas novas gerações destinados a oficiais e sargentos, para também os há e muitos)? ram por questões meramente
não é um problema exclusivo do nos- contruir um conjunto de habitações Os Lugares Santos que se financeiras e de integração cultural
so país, mas, no nosso caso, agrava- destinadas aos jovens que queiram encontram no lado da Palestina e não partia propriamente de uma
-se porque «a estrutura militar não ingressar na Marinha. são absolutamente únicos: Belém adesão interior a Cristo.
aceita mudanças que permitam agi- Ao que apurámos, o projeto já está (que fica a oito quilómetros de Na primeira metade do século
lizar o sistema». em aprovação e a nova Aldeia Naval Jerusalém), o Rio Jordão, Jericó, XIX houve milhares de revoltas e
Em contraste com esta opinião, en- deverá incluir um conjunto de casas o Monte das Tentações, Hortus de perseguições públicas e popu-
tre vários grupos de oficiais nas re- pré-fabricadas em Madeira, «simples Conclusus (onde o Rei Salomão lares aos judeus que exigiram da
des sociais, circulam duas imagens mas condignas». A estes jovens, a Ma- escreveu o livro do Cântico dos polícia uma força musculada para
do Orçamento de Estado para 2024. rinha consegue, indiretamente, dar Cânticos), a casa onde o Rei evitar um derramamento de san-
Na primeira, destaca-se a verba um aumento de rendimento, já que David nasceu (onde hoje é um gue. Isto ainda me deixou mais
destinada à Igualdadesde Género: as casas se destinam aos que, não ten- convento Carmelita), o poço de perplexo… porque não estamos a
426M€. Na segunda, surge a verba do casa na zona de Lisboa, possam Jacob (outrora Sicar e, hoje, falar na Idade Média, mas no
destinada aos meios e equipamentos aceder a estas habitações durante os Nablus), o túmulo dos três século XIX – já depois das luzes
para as Forças Armadas em todos os primeiros anos, com rendas contro- Patriarcas – Abraão, Isaac e Jacob terem iluminado a razão na
domínios operacionais: 533M€. ladas. O projeto do almirante Gou- – e das três Matriarcas (Sara, Revolução Francesa.
À medida que o mal-estar se avolu- veia e Melo está em curso e a expeta- Rebeca e Lia). Tudo isto e muito Realmente, fico sempre muitíssi-
ma, são cada vez mais os que deposi- tiva é que possa aumentar significa- mais ficam na zona que hoje cha- mo dividido. Admiro com todo o
tam esperança na ação presidencial. tivamente a atratividade para o mamos Palestina. meu coração a cultura hebraica e
Afinal, o Presidente da República é o ingresso na Marinha. A ideia foi des- Para mim, visitar Israel é uma os judeus – aliás, sou um judeu que
Comandante Supremo das Forças Ar- de a primeira hora acarinhada pelos experiência maravilhosa. Vivendo, acredita na vida do Messias prome-
madas e já tem aproveitado para fa- diversos setores do ramo e é vista como vivo, em Portugal, não consi- tido a tantos judeus. Porém, tenho
zer alertas em momentos especiais, como uma «forma proativa» de lidar go sequer compreender o que se uma admiração enorme pelos ára-
como foi o caso do discurso no 25 de com os problemas. A questão é saber passa naquela zona do globo na bes de onde provém a maioria dos
Abril de 2022. Agora, o que muitos es- se as casas estarão prontas a tempo relação que existe entre aqueles cristãos que habitam na Terra
peram é que Marcelo Rebelo de Sou- de evitar situações de rotura. ● povos. Em Portugal temos uma só Santa. Isto faz-me muitas vezes
sa seja consistente com os alertas que língua, cultura e religião… e não encontrar entre a espada e a pare-
fez no passado, evitando que o deba- raquel.abecasis@nascerdosol.pt conseguimos imaginar como vivem de, entre Israel e a Palestina. ●
22 PAÍS nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

Mais do mesmo no combate à pobreza


Presidente das
Misericórdias, Manuel
Lemos alerta Governo
para falta de inovação
e ‘centralismo’ do
programa, enquanto
o ex-ministro Bagão
Félix diz que ‘um
plano tão abrangente
com 273 medidas é só
para português ver’.

S
TEXTO Inês Teotónio Pereira

e o Plano de Comba-
te à Pobreza não in-
cluir as instituições

BRUNO GONÇALVES
está comprometido
à partida, diz ao Nas-
cer do SOL o presi-
dente da UniãodasMi-
sericórdias, Manuel
Lemos, para quem o to dirigido para dentro, numa lógica de número mantém-se igual», lembra o defende, considerando que esta realida- ↑ Há 20 anos
programaapresentado que ‘nós é que sabemos’», é desta forma presidente da União da Misericórdias. de é que verdadeiramente tem de ser al- que os números
pelo Governo é «pou- que Manuel Lemos, presidente da União E adverte: «É bom que haja um plano, é terada para diminuir a pobreza. da pobreza são
co inovador» e «cen- das Misericórdias, comentou o Plano ao pena se não se aproveitar o que a socie- São seis os eixos de intervenção, 14 os os mesmos
tralizado». Também o ex-ministro An- Nascer do SOL. dade portuguesa tem para dar eficácia objetivos estratégicos e 273 atividades
tónio Bagão Félix ressalva a bondade Para Manuel Lemos, «o combate à po- ao plano». elencadas, é o Plano de Ação da Estraté-
da estratégia do Executivo, mas ques- breza é muito difícil, multidisciplinar, As considerações de Rita Valadas, pre- gia Nacional de Combate à Pobreza a ser
tiona os pressupostos: «Um Plano tão e é essencial estar junto dos pobres, por sidente da Cáritas, vão no mesmo senti- concretizado entre 2022 e 2025. Dois
abrangente com 273 medidas é para isso, deve qualquer coisa feita neste âm- do de envolvimento de quem está no anos depois de ter sido anunciada a Es-
português ver». bito tem de incluir as instituições de terreno: «A rede de aplicação deste Pla- tratégia Nacional Combate à Pobreza, em
Sobre o Plano Nacional de Combate à proximidade. Falta esse ponto». E ad- no tem de ser muito fina, deve ser feita 2022, o Governo publicou esta semana
Pobreza, Bagão Félix questiona os obje- verte: «Se nos tempos mais próximos com quem está muito perto e usar a com detalhe e exaustivamente as medi-
tivos quantitativos de redução para 10% não acontecer um encontro com as ins- rede que existe». Diz ainda que é neces- das para concretizar esse compromisso
da taxa de pobreza monetária e consi- tituições, com quem está junto dos mais sário ouvir e acolher todos os setores de de implementação. Os objetivos são am-
dera que seria fundamental saber qual pobres, o Plano está comprometido». uma forma ou de outra, não só o tercei- biciosos: reduzir para 10% a taxa de po-
a forma de escrutínio deste plano. Ao Apesar de o considerar «em linha com ro setor como as empresas que têm um breza monetária da população, ou seja,
Nascer do SOL, o ex-ministro assegura a estratégia de ação desenhada há cer- papel fundamental. «As pessoas estão menos 660 mil pessoas nesta situação;
que não quer questionar «a bondade dos ca de dois anos» e de o qualificar como desesperadas, não há creches suficien- redução para metade da pobreza mone-
intenções e o trabalho feito na sua ela- «simpático», aponta várias lacunas es- tes, somos um país pobre, e tudo aqui- tárianogrupodascrianças–retirar170mil
boração», salientando que «há aspetos senciais. Critica a falta de definição dos lo que se fizer no sentido de combater crianças da situação de pobreza; dimi-
positivos, mas Planos destes já se fize- compromissos: «Como serão feitas as a pobreza é bem-vindo». nuir também em 50% a taxa de pobreza
rem muitos». E lembra que algumas das articulações ministeriais? Quantos se- Também Bagão Félix critica a au- monetária dos trabalhadores pobres.
medidas anunciadas «já foram executa- rão os gestores dos pobres?». Estes e sência das instituições neste Plano. O Governo compromete-se, desta
das, anunciadas ou estão em curso, outros pontos são essenciais num pla- «Não encontrei uma vez a sigla IPSS, forma e novamente, em «fazer do com-
como as referentes às creches, a com- no que pretende combater uma luta que as palavras particular ou privado e bate à pobreza um desígnio nacional»
participação dos medicamentos ou a dura há anos demais: «Há mais de 20 apenas uma vez se referem às em- nos dois anos que tem pela frente para
majoração do abono de família». anos, o número de pessoas em situação presas». Ou seja, no seu entender, a a concretização das 273 medidas.
Quanto ao princípio-base e aos obje- de carência depois das prestações so- estratégia está centrada no Estado, As medidas, essas, de natureza di-
tivos do Plano, Bagão Félix critica o fato ciais, era de 20%, vinte anos depois, o «o que viola o princípio fundamen- versa são de várias amplitudes. Vão
de estes estarem assentes num concei- tal da subsidiariedade». desde a entrega de um cheque livro
to de pobreza «meramente quantitati- «O primeiro ponto para combater a atribuído a todos os jovens nascidos
vo, quando aquilo que se deve ter em pobreza é criar riqueza, Evita-la e não entre 2004/2005, à criação de um téc-
conta é o conceito qualitativo de pobre- ‘O plano é pouco apenas acompanhá-la. Aquilo que se exi- nico de referência às famílias em situa-
za: ser pobre não se define apenas pela
sua situação material, mas na relação inovador, muito ge à segurança social é excessivo em re-
lação ao que se pede à economia. A par-
ção de carência familiar. Grande par-
te delas não estão quantificadas ou já
com o mundo, estar ou sentir-se excluí- dirigido, numa cela do rendimento do trabalho repre- se encontram em vigor, como a tarifa
do da sociedade». Os 500 mil idosos que
vivem hoje em solidão estão incluídos lógica de ‘nós é senta uma parcela cada vez menor do
rendimento nacional e isto requer um
social de eletricidade e gás natural. ●

neste conceito. «É pouco inovador, mui- que sabemos’’ esforço brutal da segurança nacional», ines.pereira@nascerdosol.pt
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt PAÍS 23

Número
de abortos
Novas ULS criadas por
por opção da despacho um ano depois
mulher ainda Ao fim de mais de um
vai ser maior ano, as administrações
hospitalares
O ano 2022 foi o que registou o maior receberam o despacho
número de sempre de repetições onde conhecem a
de aborto por opção. Terceiros filhos estrutura das novas
têm duas vezes maior probabilidade
de serem abortados.
ULS e terão
apenas um mês
A Federação Portuguesa pela Vida (FPV) apon-
para cumprirem
ta falhas e inconsistências aos relatórios sobre as diretivas.
a IVG da Direção-Geral de Saúde e da Entida-

F
de Reguladora da Saúde. Denuncia que os rela- TEXTO Inês Teotónio Pereira
tórios da IGAS já não referem os resultados das
inspeções e deixaram de ter sido feitas análi-
ses relativas às complicações associadas à «in- oi nesta terça-feira envia-
terrupção de gravidez». do para as administrações
Sobre os números divulgados esta semana hospitalares o despacho
pelas duas entidades, DGS e ERS, a Federação referente ao Planeamen-
considera que o valor registado, de 15 870 abor- to e contratualização de
tos por opção da mulher no ano 2022, deve ser cuidados no Serviço Na-
revisto em alta como aconteceu nos outros cional de Saúde – Orien-
anos. 2022 foi o ano em que se registou o maior tações para o ano de
número de sempre de mulheres que interrom- 2024, assinado pelo se-
peram a gravidez três ou mais vezes por opção cretário de Estado da Saú-
(13 012), ressalvando que, «sendo o número de de, Ricardo Mestre. Ante-

DR
repetições declarado, pode ser conservador cipando a reorganização ↑ Administrações hospitalares a prazo têm um mês para cumprir reforma
face ao real». do SNS, que passa pela criação do mo-
Da análise feita aos dados divulgados, a FPV delo de prestação de cuidados em Uni- de gestão previstos para o próximo bém a conhecer a novidade da cria-
conclui que as mães grávidas a viver sozinhas dades Locais de Saúde (ULS), é a pri- ano». Ou seja, uma realidade que não ção dos termos de referência para a
têm seis vezes maior possibilidade de abortar meira vez que o mapa das futuras ULS existe. E é tendo em conta as novas ULS, contratualização de cuidados de saú-
(646 abortos por opção por mil nascimentos) é publicado num documento oficial. E das quais tiveram conhecimento oficial de para o próximo ano, que deverão
do que aquelas que vivem com o pai (96 abor- é assim que chega, pela primeira e de desta forma e que não são efetivamen- ser anunciados até hoje pela DE-SNS.
tos por mil nascimentos). Também os tercei- forma institucional, às administrações te ainda da sua competência, que os res- Assim, apesar de ter sido dado a co-
ros e seguintes filhos têm duas vezes mais pro- hospitalares. ponsáveis por cada unidade de saúde nhecer publicamente, no início de
babilidades de serem abortados (380 por mil Sabendo que esta reorganização vai irão concluir as suas propostas, para se- Setembro, o mapa das novas ULS e a
nascimentos, 4 150 na totalidade), do que os ser acompanhada de um novo mode- rem entregues até 27 de novembro. São sua estrutura, só agora é publicado
primeiro ou segundos (161 por mil nascimen- lo de gestão, informa-se, neste docu- elas as «Orientações estratégicas e ope- de forma oficial. E é desta forma que
tos, 11 760 no total). mento, que serão criados dois novos racionais; Principais carteiras de ser- chega ao conhecimento institucional
Quanto ao crescimento em 15% do número instrumentos de gestão previsional: viços; Mapa de pessoal; Plano de inves- das várias administrações a respeti-
de abortos realizados por opção, a FPV consi- o quadro global de referência do SNS timento anual e plurianual; Quadro de va dimensão, que unidades são inte-
dera este aumento «preocupante». «Ainda mais e o plano de desenvolvimento orga- atividade assistencial e níveis de res- gradas e onde. A nova estrutura do
preocupante é constatar que a taxa de abor- nizacional (PDO) das unidades de saú- posta no âmbito do acesso, qualidade e SNS passa a 43 unidades de saúde: 39
tos continua a aumentar, assim como as repe- de; os quais irão substituir os planos de eficiência; Demonstrações financeiras ULS, 3 Institutos Portugueses de On-
tições. Em Portugal, no ano de 2022, quase 1 atividade e orçamento (PAO) – até previsionais, nomeadamente balan- cologia (IPO) e o Hospital de Cascais.
em cada 5 gravidezes terminou em aborto, qua- agora aplicáveis às entidades do SNS. ços, demonstrações de resultados por Depois de mais de um ano à espe-
se 1 em cada 3 abortos foram uma repetição. O quadro global de referência do natureza e demonstrações de fluxos de ra que os novos estatutos da Direção
Estes números demonstram aquilo que a e as SNS será proposto pela DE-SNS e é caixa; Desempenho económico-finan- Executiva do SNS fossem aprovados
suas associadas verificam no terreno: a total onde estará definida a consolidação ceiro; Ganhos estimados e contributos e que a nova organização e compe-
ausência de políticas públicas de apoio às grá- orçamental de todas as unidades de para a sustentabilidade». tências fossem conhecidas pelos con-
vidas, sobretudo, às grávidas em situação eco- saúde do SNS. O PDO é elaborado por É neste documento que se dá tam- selhos de administração, é determi-
nómica e social mais frágil», lê-se no comunica- cada unidade de saúde do SNS, e é nado desta forma que se inicie uma
do. Sobre a possibilidade do fim do período de aqui que se encontram «as estraté- complexa reforma. Reforma essa que
reflexão (3 dias) e de outras alterações à lei, a gias locais e as medidas operacio- Mapa das novas ULS tem de estar concluída em apenas
Federação acusa o «aproveitamento das fragi- nais que concretizem as políticas de- um mês. Toda esta urgência tem ain-
lidades do SNS para atacar o direito à objeção finidas pelo Ministério da Saúde». surge pela primeira da uma agravante: a maioria dos con-
de consciência e forçar o alargamento dos pra- Determina o secretário de Estado que, vez num despacho selhos de administração dos hospi-
zos legais ao arrepio de tudo o que defende-
ram no referendo de 2007». ●
para a elaboração da proposta pelas uni-
dades de saúde, deve ser considerada a
do secretário tais não está na vigência do seu man-
dato, podendo ser substituídos a
I.T.P. «estrutura organizacional e o modelo de Estado da Saúde qualquer altura. ●
24 COCKTAIL nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

COCKTAIL
BENEFÍCIOS FISCAIS LIVRO LEITURAS

Um tiro no pé? Conversas com A preto


Miguel Caetano e branco

Por falar em Miguel Caetano, apresentou


o último livro de José Pedro Castanheira,
Já está nos escaparates o li- Os Últimos Do Estado Novo. Mas, inespe-
vro de conversas de Miguel radamente, o apresentador contestou a
Caetano com José António visão do autor. Disse o filho de Marcello
Saraiva, moderadas por José Caetano: «Nada a comentar quanto à im-
Cabrita Saraiva, sob o título: portância do 25 de Abril para a esmaga-
O 25 de Abril Visto do Outro dora maioria dos portugueses: o fim da
Lado. Uma primeira versão guerra colonial, o reencontro com a li-
destas conversas foi publica- berdade, o regresso à democracia e à
da no SOL, em 2021. O filho modernidade (apesar de tal não ser mui-
de Marcello Caetano fala de to claro antes do 25 de Novembro). Aca-
um modo muito aberto dos bou a guerra, a censura e a polícia políti-
tempos em que o seu pai foi ca. Agora quanto ao acesso ao desenvol-
Nuestros hermanos embandeiraram em arco com a decisão do Governo português de suspen- ministro de Salazar e depois vimento e a reintegração na comunidade
der os benefícios fiscais para estrangeiros. A medida foi criada em 2008, em plena crise do presidente do Conselho, das nações, contesto». E lembrou que an-
subprime, com o objetivo de atrair ‘pensionistas’ e pessoas ‘de alto valor acrescentado ao nível adiantando notas pessoais tes da revolução Portugal já fazia parte de
das profissões’. E constituiu um tal sucesso, que a vinda para cá de cidadãos de outros países sobre como era o ambiente várias organizações, como a NATO e a EF-
com elevado poder económico provocou uma inflação nos preços das casas, que subiram a pi- familiar nesse período. Nas TA, e estava em negociações com a CEE.
que. A ideia foi entretanto copiada por vários países europeus (embora com menos sucesso), vésperas das comemorações Quanto ao desenvolvimento, nas décadas
os quais esperam agora poder beneficiar da ‘desistência’ portuguesa. Mas são os espanhóis dos 50 anos do 25 de Abril, de 60 e princípios de 70 aproximámo-nos
que alimentam maiores expectativas – e os títulos dos jornais dizem tudo. este livro, publicado pela do PIB per capita da média europeia. A
Gradiva, antecipa-se… História não é a preto e branco.

GOLOS

Agora é que Ronaldo


não vai descansar RECORDES

Por qué no se callam?


Em conversa há dias com Ronaldo, o presi-
GOLFE
dente do FC Porto desafiou-o a chegar aos mil Os jornalistas que comentam em direto os jogos de fu-
Gigi Cup anima Quinta do Lago golos. Como ainda faltam 141, CR7 terá de dar tebol enganam-se com frequência. Assim uma vez mais
ao pedal. Assim, mesmo em jogos sem impor- aconteceu no Portugal-Eslováquia, Depois do 2.º golo
Já é um clássico da Quinta do Lago e os residentes, principal- tância – como contra a Bósnia, em que podia português, António Tadeia afirmou que se seguiriam
mente os irlandeses, fazem questão que nada lhes estrague a fes- ser poupado (já vai nos 38 anos) –, Ronaldo mais alguns, e adiantou: «Diz-se que um resultado de
ta. Apesar da chuva persistente, todos quiseram marcar presen- quer jogar e mostra-se cada vez mais indivi- 2-0 é perigoso, porque a outra equipa marca um golo
ça na entrega de prémios da Gigi Cup, um torneio de golfe que já dualista, rematando de qualquer maneira. e fica tudo em aberto. Mas aqui isso não vai acontecer,
vai quase nos 15 anos, e almoçaram as iguarias, também clássi- Sabendo-se a atração de Ronaldo pelos re- dada a diferença de qualidade entre as duas equipas».
cas, do restaurante do Gigi. Os guarda-sóis foram transformados cordes, o desafio de Pinto da Costa era bem Pois bem: a Eslováquia marcaria 2 golos e só não empa-
em guarda-chuvas e a animação foi uma constante. Ganhou uma escusado… tou porque Portugal, entre um e outro, fez um golo soli-
irlandesa, na foto a receber o troféu, que é uma verdadeira prova tário. Apetece dizer: «Por qué no se callam?».
de vida, pois ultrapassou dois cancros e nunca desistiu de lutar
pela vida. E ali festejou-se precisamente à vida.
26 FRASES nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

EXCITAÇÕES
MARIA CERQUEIRA GOMES

Não vejo com


Apresentadora,
Caras, 18/10

bons olhos que


o cargo de Presidente
da República seja Adoraria casar-me.
Só ainda não me casei
porque acho que

ocupado por um militar. tem de ser para a vida.

ALEXANDRA LUCAS COELHO


Jornalista e escritora,
Público, 14/10

O unanimismo é um grande risco para


os partidos. É uma tentação quando
há maioria absoluta, mas é um grande
risco para os partidos. Começa por ser
um risco para o próprio partido.
O Hamas não é o ISIS
ou a Al-Qaeda.
ALEXANDRA LEITÃO Nem anti-semita.
Deputada do PS, Observador, 13/10

ANTÓNIO COSTA SILVA


ANTÓNIO BARRETO DIOGO PRATES JOÃO CARLOS ESPADA Ministro da Economia e do Mar,
Sociólogo, Público, 14/10 Militante da IL, Público, 15/10 Diretor e fundador do Instituto Negócios/Antena 1, 16/10
Toda a Europa, além de A IL não é um partido li- de Estudos Políticos da
outros países, está à bei- beral, é um partido mui- Universidade Católica
ra de conhecer e de viver to pouco liberal e direi Portuguesa, Observador, 16/10
episódios perigosos de até mesmo antiliberal. Não existe qualquer equi-
conflitos raciais, cultu- valência moral entre o ata-
rais, religiosos e políti- VICENTE FERREIRA que terrorista do Hamas e
cos diretamente ligados DA SILVA a legítima retaliação, com
com as migrações des- Cofundador da IL, Público, pré-aviso, de Israel.
controladas. 15/10
O nível de democratici- JOÃO MIGUEL TAVARES
RUI ROCHA dade interna tem vindo a Jornalista, Público, 14/10
Líder da IL, 15/10
Não nos revemos num
diminuir e não é expectá-
vel que essa tendência se
O PS está a vender o me-
lhor do seu passado em tro-
O PSD tem um excelente
primeiro-ministro que, inverta. Num partido li- ca de um prato de lentilhas líder parlamentar,
sistematicamente, age beral é expectável haver de esquerda. Não querem que tem propostas
como um mendigo, sem- respeito pela pluralidade também embrulhar o re-
pre à espera das esmolas de ideias, na IL parece trato de Mário soares e en- que parecem válidas.
de Bruxelas. ser um sacrilégio. viá-lo para a sede do PCP?
INTERVALO/
O longo banquete servido por Martin Scorsese
EUA, década de 1920. Expulsos seus jatos a 20 e 30 metros de Guerra e regressa, doente, para índia, como fizeram outros dição, ou uma ‘epidemia de
das suas férteis pastagens no altura. Os índios, anteriormen- trabalhar com o tio, William brancos sem escrúpulos. Os azar’. E não há quem consiga
Kansas, os índios Osage acaba- te no limiar da miséria, tornam- Hale (De Niro). Hale, a quem desejos do rei são uma ordem, descortinar a autoria dos cri-
ram por ter de se radicar numa -se o povo mais rico do mundo. todos tratam por ‘rei’ (inclusi- e Burckhart une os seus desti- mes. Até que entra em cena
região estéril e acidentada do Assassinos da Lua das Flores, ve o sobrinho) é o verdadeiro nos aos de Mollie. uma equipa do recém-criado
atual estado do Oklahoma. Mas, que acaba de se estrear nas sa- patrão: amigo dos índios, filan- Entretanto, os Osage começam FBI. Scorsese adoptou o livro
ironia das ironias, essa terra las portuguesas, conta a histó- tropo, controla os aconteci- a morrer em circunstâncias homónimo de David Grann,
que ninguém queria revelou-se, ria vista pelos olhos de Ernest mentos a partir da sua próspe- suspeitas – incluindo as três ir- num filme com grandes inter-
afinal, rica em petróleo, que Burckhart (DiCaprio), um jo- ra fazenda. E encoraja mãs de Mollie – como se sobre pretações e perto de 3h30. ●
brotava do chão e lançava os vem que combateu na Grande Burckhart a casar-se com uma eles se tivesse abatido uma mal- ➽ José Cabrita Saraiva

COURTESY OF APPLE

↑ Burckhart (DiCaprio), Mollie (Lily Gladstone) e o ‘rei’ Hale (De Niro) à mesa, sob o olhar do realizador
28 INTERVALO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

Marco Oliveira A vida a bordo


das naus dos

Borges
Descobrimentos
estava cheia de riscos
e de incómodos.
‘A presença Por causa da dureza
das condições, boa
de mulheres parte dos marinheiros
‘desertava e ficava

e de sodomitas a servir os inimigos


de Portugal’,

estava associada
revela o historiador.

a maus presságios’
TEXTO José Cabrita Saraiva

U
m calor tórrido nos trópicos; um frio dição social pouco tinham a perder e arriscavam a via- mais bem acomodados, tinham uma alimentação mais
glacial ao largo da costa africana, a pon- gem para a Índia em busca de uma vida melhor e até de rica e melhores condições durante a viagem do que a gen-
to de nevar. Dias de tédio contrastan- riqueza, grande parte das vezes iludidos com promessas te de baixa condição social, muita dela tendo que dormir
do com períodos de esforço hercúleo. ou informações e boatos que se espalhavam em Lisboa. no convés, estando mais exposta ao frio e ao calor.
Febres, fome, enjoos e um desconforto Em outras situações, porém, eram embarcados de for-
constante. De tudo isto se fazia a vida a ma forçada, especialmente para servirem como solda- A probabilidade de não regressar vivo de uma viagem
bordo dos navios da carreira da Índia, dos e marinheiros. De um modo geral, muitos não faziam à Índia era alta?
como descreve Marco Oliveira Borges, ideia da dura realidade que iriam encontrar nos navios e Sim, sem dúvida. E, nos casos mais críticos, chegou a mor-
especialista em História Marítima e já na Ásia. À chegada à Índia, encontrando-se na miséria, rer quase metade das pessoas da armada que era envia-
membro efetivo da Academia de Mari- boa parte deles desertava e ficava a servir os inimigos de da anualmente à Índia. De acordo com o cronista Diogo
nha, em Entre o Céu e o Inferno – Vida Portugal, chegando a converter-se ao islamismo. do Couto, 1571 foi dos anos mais mortíferos. Dos 4.000
e Morte nos Navios da Expansão Portu- Existia igualmente um universo feminino a bordo dos homens enviados, só 2.000 é que lá chegaram. Na nau
guesa (1497-1655) (ed. Crítica). Ao Nascer do SOL, o autor navios, mas formado por um reduzido número de mu- em que ia embarcado, entre 900 homens, morreram mais
explica quem eram os marinheiros dos Descobrimentos, lheres: órfãs vindas do recolhimento do castelo de Lis- de 450. Era uma altura em que Lisboa ainda não se ha-
como viviam e como enfrentavam a adversidade. boa, fidalgas, aventureiras, vivandeiras, degredadas, es- via livrado totalmente do surto de peste que tinha tido
cravas, prostitutas. grande impacto no ano anterior, pelo que isso terá aju-
Qual era o tipo de homens que embarcava nestas via- dado a uma mortandade tão elevada entre os homens
gens de longo curso? De que meio social procediam As embarcações evoluíram muito neste período entre que embarcaram no Tejo. Mas, em caso de naufrágio, ain-
maioritariamente? Eram, de uma forma geral, pessoas c. 1500 e 1655? Houve progressos em termos de segu- da poderiam ocorrer muitas mais mortes, por vezes to-
que tinham pouco a perder? rança e de conforto, por exemplo? dos ou quase todos os que vinham a bordo.
Como se pode imaginar, entre fidalgos, funcionários ré- Os navios foram progressivamente aumentando de to-
gios, missionários, comerciantes, escravos, soldados, ma- nelagem para terem maior capacidade de transporte de O espaço no interior do navio era muito acanhado?
rinheiros, etc., embarcavam homens de todos os estra- mercadorias, mantimentos e pessoas. Mas isso trouxe Era uma das queixas mais frequentes. O espaço era de-
tos sociais. É claro que, entre cerca de 500 pessoas em- vários desafios e perigos à navegação, levando a uma dis- masiado exíguo para centenas de pessoas embarcadas,
barcadas em cada navio ou até mais, se destacava a gente cussão baseada em prós e contras que se foi prolongan- daí também surgirem conflitos com grande frequência.
de baixa condição social, muitas vezes sendo igualmen- do no tempo. As queixas sobre a falta de segurança e a Se as mercadorias já ocupavam grande parte da área útil
te composta por criminosos de delito comum saídos das incomodidade vivida a bordo foram constantes ao lon- dos navios, tudo piorava com tanta gente e, sobretudo,
prisões, mobilizados para servirem como soldados na go do período estudado no livro, pelo que não se pode di- quando eram embarcados escravos, especialmente em
Ásia. Devido à miséria que passavam em Lisboa e em ou- zer que houve progressos em termos de segurança e de Moçambique e Angola. São frequentes as referências ao
tras partes do reino, muitos destes homens de baixa con- conforto. No entanto, os privilegiados viajavam sempre carregamento de 200 ou 300 escravos. O espaço que
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt INTERVALO 29

ocupavam era de tal modo apertado que os escravos, vin- mentação das pessoas, que teriam de ingerir os alimen- do, embora também tenha chegado a ser transportada
do algemados, não conseguiam esticar as pernas. A sua tos em cru. Como se pode calcular, isso tinha rápidos re- água-ardente. Quanto ao vinho, era distribuído diaria-
presença a bordo acabava também por dificultar a cir- flexos negativos no seu estado de saúde. mente, mas de modo controlado. O de melhor qualidade
culação das pessoas pelos navios. A isto acrescia a corrupção que existia em todo o cir- tendia a ser para a minoria privilegiada, englobando ca-
cuito da carreira da Índia e que, começando desde logo pitães, mestres, outros oficiais, fidalgos e certas pessoas
Que equipamento científico levavam a bordo? em Lisboa, fazia com que dos armazéns da Guiné e Índia importantes que fossem a bordo. Contrariamente, o res-
Mapas, cartas náuticas, astrolábios, quadrantes. não fossem providas as quantidades de comida e de água to das pessoas, que era a esmagadora maioria, tinha de
suficientes para toda a viagem. Alguns capitães e mes- se contentar com vinho muito ácido e sujo com o qual se
A alimentação é um aspeto fundamental da vida (a bor- tres acabavam por conseguir comprar espaços nos na- molhava o biscoito, muitas vezes podre.
do e não só). De que ia abastecido o navio quando partia? vios que eram destinados a esses alimentos, mas para Em momentos de festa, como era o caso da celebra-
O que comiam os marinheiros dos Descobrimentos? transportarem produtos seus (mel, vinho e azeite) des- ção da festa do Imperador do Espírito Santo, poderia
Os navios partiam do Tejo abastecidos com biscoito, di- tinados a ser vendidos em Moçambique ou na Índia. haver um maior consumo de álcool, facto que tendia a
ferentes tipos de carne e de peixe, ameixas passadas, levar a problemas. Por um lado, rapidamente poderia es-
amêndoas, açúcar, alhos, cebolas, farinha, grão, lenti- Há relatos de fome, mas fica a dúvida: não podiam poletar conflitos entre os homens, além de lhes retirar
lhas, mel, mostarda, azeite, vinagre, água e vinho. Além pescar? a sobriedade indispensável para as tarefas da navega-
disso, iam embarcados animais para serem abatidos ao De modo complementar, os marinheiros e outras pes- ção. Por outro, o excessivo consumo de vinho poderia
longo da viagem. Porém, entre todos estes alimentos, soas podiam capturar aves e peixe ao longo das viagens, fazer com que no resto da viagem as doses diárias fos-
apenas a água e o vinho eram dados diariamente, enquan- visando tentar contornar uma alimentação bastante pre- sem bastante curtas ou até insuficientes para o resto
to os restantes se distribuíam mensalmente e em cru. cária. A pesca era uma atividade frequente, mas os na- do percurso até à Índia.
De um modo geral, as pessoas de baixa condição quei- vios passavam largo tempo em alto mar e era mais perto
xavam-se bastante do estado da comida: a carne vinha de terra que se podiam obter bons resultados, junto das Com os homens, viajavam também animais (além dos
demasiado salgada, o biscoito podre ou assim se tornava plataformas marítimas, onde havia mais peixe. Além dis- ratos)?
e o vinho era vinagre que fazia arder o estômago. Além so, em momentos de tempestade não se pescava, pelo Sim. Galinhas, perus, coelhos, vitelas, cabras e carneiros
disso, as horas de espera no fogão sucediam-se, haven- que durante vários dias consecutivos as cordas e os anzóis para serem consumidos durante a viagem. Também há
do um horário a cumprir, e muitas não conseguiam co- poderiam não ser largados ao mar. Mas existiam casos registo de terem embarcado cães e gatos e, perante a
zer individualmente, entre centenas de pessoas, os ali- em que peixes-voadores entravam nos navios e eram cap- fome que se passava, de terem servido de refeição. No
mentos que lhes eram dados todos os meses. Acrescia turados, fazendo-se grandes banquetes. regresso a Portugal, chegaram a vir embarcados animais
que, por questões de segurança, durante as tempestades
os fogões não eram acesos, pelo que uma tormenta que E o álcool? Corria livremente?

durasse vários dias iria ter graves repercussões na ali- Não. À partida, o vinho era a única bebida alcoólica a bor- PÁGINA SEGUINTE
30 INTERVALO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

‘Durante as tempestades
os fogões não eram acesos,
pelo que as pessoas tinham
de ingerir os alimentos em cru’

‘Existiam casos em que


peixes-voadores entravam
nos navios e eram capturados,
fazendo-se grandes banquetes’

‘Havia a ideia de que se podia


curar os enjoos com caldos
de galinha. As galinhas
atingiam preços exorbitantes’

‘Hoje vemos surfistas que


enfrentam ondas de mais
de 20 metros na Nazaré.
Naquela altura, as naus
enfrentavam ondas
igualmente grandes,
mas porque, quando
estas surgiam, não havia
forma de escapar’

☛ na Nazaré. Naquela altura, as naus enfrentavam ondas travessia. Ficou célebre o antigo adágio: ‘Se queres saber
PÁGINA ANTERIOR
igualmente grandes, mas porque, quando estas surgiam, a Deus orar, entra no mar’.
não havia forma de escapar. Consequentemente, muitos
de grande porte, como cavalos, rinocerontes e elefantes. navios portugueses naufragaram nas imediações do cabo As escalas eram uma parte importante da viagem?
A isso juntavam-se os habituais ratos, insetos como ba- da Boa Esperança e da costa do Natal. Sim, sem dúvida. De um modo geral, serviam para abaste-
ratas, percevejos, pulgas e até piolhos, alastrando-se a cimento, descanso e reparo dos navios. Na viagem de ida, a
bordo devido à falta de higiene. Temos conhecimento de muitas superstições associa- escala mais importante era a ilha de Moçambique. No entan-
das ao mar? to, desde sempre revelou problemas de abastecimento, fal-
Os enjoos já eram motivo de queixa na época. Hoje te- Várias. Por exemplo, acreditava-se que todas as pessoas tando alimentos e água doce em quantidade. E se fossem
mos comprimidos contra o enjoo. Na altura já havia al- a bordo tinham de ir confessadas, inclusivamente os es- vários navios a fazer escala ali, então iriam surgir muitos
gum truque para o evitar? cravos, caso contrário surgiriam obstáculos à navegação, problemas, pois não haveria comida e água para todos. Além
Dizia-se que a melhor coisa a fazer para evitar os enjoos nomeadamente tempestades. A presença de mulheres disso, muitas pessoas adoeciam em Moçambique, sobretu-
era estar ocupado em alguma atividade. Quando alguém (sobretudo solteiras) e de sodomitas masculinos tam- do com febres associadas à malária, não esquecendo que
já estava enjoado, normalmente tentava-se curar este bém estava associada a maus presságios, crendo-se que esta era uma área muito perigosa para a navegação, com as
problema com o descanso, mas existem testemunhos que poderia ser a causa de naufrágios, de incêndios e de ou- restingas locais a serem um autêntico risco para os navios.
indicam que as pessoas ainda ficavam pior indo deita- tros acidentes. No regresso a Portugal, fazia-se novamente escala em
das. Na época tornou-se recorrente a ideia de que se po- Moçambique, mas também na ilha de Santa Helena e na
dia curar mais facilmente os doentes enjoados com cal- E a fé? Havia padre e missas no navio? ilha Terceira. Santa Helena era um autêntico paraíso no
dos de galinha. O problema é que as galinhas chegavam Havia sempre um capelão a bordo. Mas ao longo da his- meio do oceano, com frutas e animais de todos os tipos in-
a ser vendidas a preços exorbitantes, não estando ao al- tória da carreira da Índia foram embarcando missioná- troduzidos ali pelos portugueses, e água fresca em gran-
cance de todos. rios de diferentes ordens religiosas para servirem na des quantidades. Os vários dias que se costumavam pas-
Ásia, destacando-se os jesuítas, tendo tido um papel es- sar em Santa Helena ajudavam a descansar e a recupe-
Havia zonas, partes do trajeto especialmente temidas? sencial no desempenho das práticas religiosas dos em- rar a saúde de muitos dos doentes.
Sim. O cabo da Boa Esperança e a costa do Natal, locais barcados. Essas práticas consistiam em missas, orações, Na ilha Terceira existia a provedoria das armadas, es-
onde ocorriam as maiores tempestades e surgiam ondas sermões, comemorações de santos, confissões e procis- trutura fundamental de apoio aos navios vindos das par-
enormes, algumas com mais de 20 metros. Daí que se sões. É claro que nem todos os embarcados eram cren- tes ultramarinas que existia, pelo menos, desde 1527.
chegasse a dizer que, quando as naus subiam à crista da tes, e até ocorreram queixas sobre o largo tempo que as Contudo, nem sempre os abastecimentos fornecidos
onda, parecia que alcançavam o céu, para, logo depois, atividades chegavam a demorar, mas muitos, perante o eram de qualidade e em quantidade suficiente.●
descerem ao inferno. Hoje em dia, vemos surfistas que, medo do desconhecido e as imprevisibilidades da imen-
de livre vontade, enfrentam ondas de mais de 20 metros sidão oceânica, abraçavam as práticas cristãs em plena O autor respondeu às perguntas do Nascer do SOL por escrito
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt INTERVALO 31

➽ João Paulo André SUDOKUS

As danças do Nobel
SUDOKU 1

res anos em tempos recentes foi nomeadamente a descodificação


2021: apenas uma mulher foi dis- da dança das abelhas, que ocorre
tinguida (Nobel da Paz). O pró- quando uma delas regressa à col-
prio secretário-geral da Academia meia e, com o corpo e as asas, faz
Sueca lamentou na ocasião o às colegas uma descrição da sua
reduzido número de mulheres viagem até ao local onde encon-
nobelizadas, mas descartou a trou pólen e néctar, incluindo
criação de quotas, destacando a indicações sobre a direção e a
importância da escolha dos lau- distância.
reados com base nos seus feitos e Nem mesmo a Física escapou à
QUINTA ESSÊNCIA não em género ou etnia. atração pela arte da expressão
Falando de dança, é curiosa a corporal com movimentos ritma-
recorrência da sua associação ao dos. Em 1963, o Nobel (partilha-
Nem mesmo a Física Nobel. E nem me refiro ao baile do) distinguiu a germano-ameri-
escapou à atração que, a 10 de dezembro (dia da cana Maria Goeppert Mayer pela SUDOKU 2
pela arte da expressão morte de Alfred Nobel, criador sua contribuição para o modelo
corporal com movimentos do prémio), tem lugar na Câmara nuclear de camadas, que conce-
Municipal de Estocolmo após o be o núcleo do átomo como uma
ritmados. banquete da cerimónia de entre- série de camadas de energia
ga dos prémios. Comece-se por crescente, nas quais protões
2005, ano em que o Nobel da neutrões se distribuem de acor-
Química foi concedido a três do com princípios análogos aos

A
investigadores pelo desenvolvi- que regem as camadas eletróni-
cada início de outu- mento de novos catalisadores de cas. Para explicar isso numa lin-
bro, a Academia Real metais como ruténio ou molibdé- guagem que todos entendessem,
das Ciências da Suécia nio, capazes de atuar como ‘ins- a cientista comparou as camadas
anuncia os nomes dos trutores de dança’ que promo- nucleares aos círculos descritos
galardoados com o vem rearranjos entre os mem- por pares de bailarinos que val-
prémio mais ambicionado do bros dos ‘pares dançantes’, ou sam em volta de um salão
mundo. O processo de seleção seja, em alcenos (compostos com enquanto giram, ora para a direi-
lembra a dança das cadeiras, mas ligações C=C), formando novos ta, ora para a esquerda.
ao contrário, pois neste jogo há pares. Foi assim que as reações Goeppert Mayer foi a segunda
apenas um perdedor. Acresce que de metátese (’mudança de lugar’) nobelizada na Física; a primeira,
os nomes dos nomeados não lau- foram explicadas ao grande 60 anos antes, foi Marie Curie SUDOKU 3
reados com o Nobel só serão público. Interessante a analogia, (prémio também partilhado),
conhecidos daqui a meio século. mas ainda mais fascinante foi o pela sua investigação da radioa-
Este ano, seguindo uma tendên- trabalho que valeu ao alemão- tividade. Não se sabe se era dada
cia que vem desde 1901, quando -austríaco Karl Ritter von Frisch às danças, mas conhecia uma
foram pela primeira vez atribuí- o Nobel da Fisiologia ou Medicina bailarina: Loïe Fuller. As coreo-
dos, os prémios, excetuando os em 1973. Tratou-se do estudo da grafias desta norte-americana,
que de seguida se elencam, foram comunicação entre insetos, como a ‘dança serpentina’ (foto),
maioritariamente concedidos ao bem como as técnicas de ilumi-
género masculino. O da Física, nação que concebeu e patenteou,
partilhado, foi para a franco- levaram ao rubro as plateias do
-sueca Anne L’Huillier, pela cria- parisiense Folies Bergère. Com
ção de pulsos de luz de atosegun- um genuíno interesse pela ciên-
dos para o estudo da dinâmica cia, Fuller inspirou-se na desco-
dos eletrões na matéria (1 atose- berta da radioatividade para a
gundo = 0,000 000 000 000 ‘dança do rádio’. Ansiava possuir
000 001 s). O da Fisiologia ou um pouco desse elemento para
Medicina, também partilhado, foi aplicar nas vestes que usava em
para a húngara Katalin Karikó, cena, confiando que a sua radio-
pela investigação que levou ao luminescência esverdeada inten-
desenvolvimento de vacinas sificasse o impacto da perfor-
ARNm para a covid-19. O da mance. Para isso contactou os
Economia distinguiu Claudia seus descobridores. Marie Curie
Goldin, norte-americana, pelo recebeu-a, explicando que pos-
seu estudo das desigualdades de suía apenas uma quantidade
género nos rendimentos. Por fim, minúscula do elemento, destina- SOLUÇÕES
o da Paz foi para a ativista irania- da a aplicações na medicina.
na Narges Mohammadi pela sua Fuller não saiu de mãos a aba-
luta contra a opressão das mulhe- nar: tinha acabado de criar uma
res no Irão. Feitas as contas: qua- amizade com a cientista. ●
tro mulheres em onze nobeli-
zad@s. Ainda assim, um dos pio- Químico
32 INTERVALO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

➽ Afonso de Melo
Não se dizia não
a David Fyodorovich Oistrakh
nasceu em Odessa, junto ao Mar Ele queria sair do palco mas,
Negro, em Setembro de 1908. pura e simplesmente, não conse-
Fantástica Odessa! Quem ainda lá guia. Era continuamente obrigado O velho Lusitânia
não foi também não sabe o que
perde. Lugar de exílio do poeta
a regressar porque a chuva de
aplausos não havia forma de parar.
vai receber amanhã
Pushkin. Cenário de Eisenstein. A No chão, as flores e os chapéus o Benfica para a Taça
história russa é fascinante, com espalhavam-se a torto e a direito. de Portugal, mas tem
toda a sua panóplia de enormes David curvava-se, acenava, mas
grandezas e gigantescas misérias. uma espécie de imã mantinha-o de mudar de ilha.
Filho de judeus, David Kolker e agarrado a um público absoluta-
O MUNDO EM CALÇÕES Isabella Beyle, já tocava violino mente rendido à forma como

A
com três anos de idade. Em segui- dominava as cordas do seu violino. TEXTO Afonso de Melo
da veio, naturalmente, o conser- Finalmente, por momentos, pôde
O maior violinista do seu vatório já no tempo de uma União descansar. Ainda assim, o seu
tempo recusou-se a todos Soviética que valorizava imenso a camarote era constantemente H! O tempo... Como
os compromissos – tinha música clássica como uma prova invadido por conhecidos e desco- ele passa. Até nos
de ir à Luz, ver Eusébio! de superioridade intelectual em nhecidos que queriam agraciá-lo e pormenores, que
relação ao Ocidente. Depois conhecê-lo. neste caso até era um
Moscovo, a amizade com o com- No fim da romaria, David pormaior, como di-
positor Shostakovitch, as suas Fyodorovich reuniu-se com o seu ria o Carlos Pinhão.
inesquecíveis interpretações de empresário para decidir a agenda Vamos, por exemplo,
Bach, Tchaikovski, Mozart... O dos dias que se seguiam. Foi-lhe até Março de 1964,

D
nome de David Fyodorovich posto à frente, para ele assinar, um dia 7. O Sport Club
avid Fyodorovich Oistrakh tornou-se grande demais contrato que previa participar Lusitânia, mais po-
Oistrakh estava nervo- para Odessa. numa palestra no dia 9 de Maio. pularmente chama-
so. Chegara nesse Em Lisboa, no Império, David Então, depois daquela noite plena do de Lusitânia dos
mesmo dia a Lisboa e Oistrakh encantou os espectadores de emoções, Oistrakh perdeu a Açores, esse mesmo que hoje pelas
iria tocar no Império, à até à beira de uma saudável loucura. compostura. Direi mesmo mais: quatro e meia da tarde defronta o Ben-
noite, algumas das obras mais David Oistrach foi ele próprio: enor- perdeu as estribeiras. Pelos corre- fica na terceira ronda da Taça de Por-
famosas do seu repertório. Os jor- me como só David Oistrakh sabia dores do Império ouviu-se a sua tugal (por causa das exigências tem de
nais estavam num sino com a sua ser. Dessa noite brotaram elogios voz sonora de barítono: saltar da sua ilha, a Terceira, para jogar
presença entre nós. Escreveram: como gipsofilas em campos de erva - NÃO! NÃO! ABSOLUTAMENTE no Estádio João Paulo II, em São Mi-
«DAVID OISTRAKH– O MAIOR descomposta: «A arte de David NÃO! guel), tinha acabado de obter uma vi-
VIOLINISTA DA ACTUALIDADE Oistrakh dispensa adjectivos. Eles De pouco serviram os argumen- tória de estadão sobre o campeão mo-
(assim mesmo, em letras garra- ficariam quase esvaziados de senti- tos do agente, já de olhos postos çambicano, o Ferroviário de Louren-
fais!). Nascido em Odessa, na do pois teriam de ser empregados – em mais um punhado de dólares. E ço Marques, no Estádio Municipal de
URSS. Professor do Conservatório a bem dizer: constantemente – no David teimando: Angra do Heroísmo – 3-1. Contemos a
de Moscovo. Amigo e criador de grau superlativo. É que David - Nem é bom pensar nisso! Vou ver história como deve ser para que não
obras de célebres compositores Oistrakh atinge as regiões mais ele- jogar o Benfica! É uma oportuni- se ofereça a confusões. Nessa altura,
soviéticos como Prokofiev, vadas da interpretação nos estilos e dade que não posso perder. Nunca Portugal podia andar por aí a armar
Katchakurian, Kabacewski e tan- nas obras mais diversas». Palavras tive a hipótese de ver o Eusébio aos cucos deitando da boca para fora
tos outros. Acompanhado ao do crítico Nuno Barreiros. jogar ao vivo e não vou desperdi- o salazarento discurso de império úni-
piano por Frieda-Bauer. Programa çá-la logo neste preciso momento co e indivisível do Minho a Timor mas
com obras de Bach, Prokofiev, em que cá estou e o Benfica jogará já ninguém engolia a patranha. A Ín-
Beethoven e Tartini. Pelas 18H30 para a Taça dos Campeões dia Portuguesa tinha sido invadida por
no Império. Representante artísti- Europeus! Nem sequer ouse voltar essa figura apresentada como sinistra
co: Sequeira Costa». David não era a falar-me de qualquer outro tipo que dava pelo complicado nome de
nenhum menino. Já mostrara o seu de compromissos! Jawaharlal Nehru, o Pandita, e no que
talento infinito por todos os palcos Não se contrariava David respeitava ao futebol havia, como se-
do mundo. O fim da II Grande Fyodorovich Oistrakh, o maior violi- ria de esperar, súbditos de primeira,
Guerra foi a libertação da arte de nista do seu tempo. No dia 9 de Maio de segunda e de terceira classe. As
Oistrakh, abriu-lhe os portões do ocupou o seu assento no Estádio da equipas dos Açores, por exemplo, fi-
universo e permitiu que por toda a Luz e viu o Benfica atropelar a cavam-se pelo campeonato regional
parte se ouvisse o som mágico do Juventus, vencendo por 2-0. Um dos e era um pau. Não tinham acesso a me-
seu violino, para lá dos portões de golos foi de José Torres. O outro, ine- direm-se com as da Metrópole excep-
ferro da União Soviética que se tor- vitavelmente, de Eusébio. De pé, to numa situação caricata inventada
nara para ele, como para tantos, com um sorriso de alegria nas faces à medida de engrampar o parolo: a par-
uma prisão sinistra. vermelhas, David batia palmas com tir dos quartos-de-final criou-se uma
Era o dia 7 de Maio de 1968 e vigor. As mãos que dominavam os eliminatória especial na qual se de-
toda a gente em Lisboa falava de Stradivarius saudavam um artista frontavam os vencedores de um cam-
David Oistrakh, mesmo aqueles tão grande quanto ele. ● peonato que juntava os campeões das
que nada sabiam da vida de David colónias africanas e o vencedor de um
Oistrakh. Ficaram a saber. David afonso.melo@nascerdosol.pt confronto entre o vencedor do Regio-
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt INTERVALO 33

Nascidos em casa de
o campeão moçambicano (e das co-
lónias africanas) e saíram do campo
convencidas de que iriam defrontar
o FC Porto na meia-final. Por seu lado,

Dona Violante do Campo


os rapazes de Lourenço Marques não
se davam por vencidos: «Temos to-
das as possibilidades de virar o re-
sultado na segunda mão», avisava o
ponta-de-lança O’Neill.
Vamos e venhamos: se estas elimi-
natórias da Taça de Portugal já ti-
nham muito que se lhe diga, ainda
mais haveria para dizer se se acres-
centar que a malta das colónias não
tinha hipótese de se defender nos
seus próprios campos. Era o que fal-
tava ir agora o Lusitânia até às bordas
do Pacífico defender os dois golos de
vantagem em Lourenço Marques! A
révanche ficou macada para a Tapa-
dinha e foi um pau. Sem ritmo para
muito mais, o assunto ficou-se por
um 2-2 que apurou os angrenses. Mo-
mento histórico, sem dúvida. Afinal
uma meia-final da Taça de Portugal
não é nada para deitar fora, pois não?
E, como é hábito no futebol em
Portugal, deu-se a tranquibérnia: se
o FC Porto deveria jogar a primeira
mão nos Açores, deu-se a contrarie-
dade de não encontrar voos para o
dia marcado. E agora? Que fazer? Os
angrenses não ficaram muito aflitos.
Talvez já esperassem por uma das
← O Lusitânia habituais goleadas. A Federação Por-
GHFGH

dos anos-60 tuguesa de Futebol meteu-se ao ba-


rulho e não fez mais do que a sua
obrigação. Ouviu uma parte e ouviu
a outra. E recebeu da parte dos diri-
gentes do Lusitânia uma proposta
tão conveniente que foi um encan-
to: os açorianos predispunham-se a
desistir das meias-finais da Taça de
Portugal se quem mandava no FC
Porto se responsabilizasse pela com-
pensação exigida – um encontro par-
ticular marcado para Angra do He-
roísmo mal as ligações entre o conti-
nente e a ilha fossem restabelecidas.
Não houve grande heroísmo na ati-
tude, é preciso dizê-lo, mas o fute-
bol é mesmo assim, pratos de lenti-
lhas servem de moeda para muitos
negócios.
A meia-final entre Lusitânia e FC
↑ Defrontando nal da Madeira e do Regional dos Aço- assim que o assunto se resolveu. Os Porto não existiu. O que não deu
o Sporting res. Ora tubérculos para a tafularia. golos de Eduardo Martins, Teófilo e grande vantagem aos portistas, pe-
em Angra Andavam os outros a dar o coiro, se Airosa (contra o de Mombaca) davam los vistos, batidos sem apelo nem
do Heroísmo me permitem a expressão, enquanto uma vantagem confortável para a se- agravo na final, por 2-6, pelo Benfi-
os das colónias (as ilhas eram uma es- gunda mão e a rapaziada da Casa de ca. O momento, esse, ficou guardado
↑ A casa de pécie de colónias no meio do mar) Dona Violante do Campo, o lugar na memória de um clube já centená-
Dona Violante num embate a dois jogos garantiam onde nascera o Lusitânia, em 1922, rio que prepara a festa, em ilha
uma das meias-finais. É evidente que indo, curiosamente, buscar o nome alheia, para receber o campeão na-
→ Porta a debilidade das equipas ultramarinas ao avião com que Gago Coutinho e cional, o Benfica. Quem sabe? Quem
principal da era tão vincada que para o outro semi- Sacadura Cabral iniciaram a sua tra- sabe se vai ainda a tempo? Ah! Esse
sede do clube -finalista limitava-se a um pró-forma. vessia do Atlântico Sul, estava otimis-maldito tempo que nunca pára para
ta. Como 14.ª delegação do Sporting fazer as pazes com o Destino e as con-
Ganhar e desistir! Clube de Portugal, tinha sido fácil tas com a História. Seja lá como for,
Quase parece uma das frases bom- adotar um equipamento às riscas ver- o país voltou a ouvir falar do Lusitâ-
básticas do Manuel João Vieira quan- des e brancas. nia. Só isso é uma vitória. ●
do lhe dá na mona concorrer à Presi- Nessa tarde de Março, quatro mil
dência da República mas foi mesmo pessoas foram assistir ao embate com afonso.melo@nascerdosol.pt
34 INTERVALO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

Maior controlo
no futebol
O Sindicato dos Jogadores Profissio-
nais de Futebol (SJPF) e a Polícia Ju-
diciária (PJ) apresentaram o docu-
mento Dossiê: Tráfico Humano, que
visa combater o tráfico humano, imi-
gração ilegal e burla. O presidente do
SJPF, Joaquim Evangelista, anunciou
ainda o lançamento, na próxima épo-
ca, de um manual de entrada e acolhi-
mento para jogadores provenientes
do Brasil, que será posteriormente
replicável a outras nacionalidades, e

Portugal no Euro 2024 a criação em breve de uma platafor-


ma digital destinada à partilha de no-

só com vitórias tícias, informação, legislação e juris-


prudência e mecanismos de denún-
cia ou respostas sociais. Joaquim
Finalmente, Portugal ganhou ra parte frente à Eslováquia e no jogo Evangelista mostrou-se confiante de
e jogou bem. O apuramento

WSL
com a Bósnia, justificam-se as ambi- que estas medidas possam resolver
abre portas ao sonho europeu. ções de alguns jogadores que, sem me- um o eterno problema de articulação

A seleção nacional caprichou nos jo-


dos, querem voltar a fazer história no
Euro 2024, como é o caso de Bernar-
entre as várias instituições para que
as situações de tráfico humano no fu-
Frederico Morais reentra
gos frente à Eslováquia (3-2) e Bósnia do Silva. «Queremos lutar por um tí- tebol sejam detetadas e resolvidas na elite do surf mundial
e Herzegovina (5-0) e garantiu o es- tulo», disse o jogador do Manchester em tempo útil, evitando casos como
perado apuramento para o Campeo- City. O selecionador Roberto Martí- a que aconteceu este ano com a em- Ao garantir um lugar nos oitavos de final da etapa de Sa-
nato da Europa, que se realiza na Ale- nez também não afastou essa ideia: presa BSports, que foi acusada de vio- quarema, no Brasil, Frederico Morais assegurou a pre-
manha, entre 14 de junho e 14 de ju- «O talento de Portugal é de alto ní- lência e de tráfico de seres humanos sença no World Championship Tour em 2024. Portugal
lho de 2024. A principal ideia a retirar vel. É um grupo de jogadores com um com cerca de 100 jovens que viaja- volta a ter um surfista a competir no circuito mundial,
da dupla jornada é que Portugal ga- sonho coletivo». A seleção nacional ram para Portugal . «O mais impor- onde só entram os melhores. É a terceira vez que Kikas,
nhou com um futebol de qualidade. fecha a fase de apuramento com o Lie- tante são as vítimas. É importante como é conhecido, vai estar entre a elite do surf mun-
É isso que se espera de uma equipa chtenstein e a Islândia, a 16 e 19 de no- que, quando vão bater à porta do sin- diual. «Esta é para Portugal! Estamos de volta e é para fi-
com muito talento à solta, e onde o jo- vembro. A 2 de dezembro, Portugal dicato, da federação ou do Estado, car», disse o surfista de Cascais, que admitiu: «Honesta-
vem João Neves foi o mais recente re- conhece as seleções que vai defron- tenham a mesma resposta e que se- mente, não fazia ideia de que se passasse esta bateria
forço. Depois do que se viu na primei- tar no Europeu do próximo ano. jam ajudados», declarou. estava qualificado. Ate foi melhor assim».

PORTUGAL 9ª jornada ESPANHA 10ª jornada INGLATERRA 9ª jornada ITÁLIA 9ª jornada FRANÇA 9ª jornada

1 Arouca-Moreirense 27/10 (20h15) 2 Osasuna-Granada Hoje (20h) 1 Liverpool-Everton 21/10 (12h30) 2 Verona-Nápoles 21/10 (14h) 4 Le Havre-Lens Hoje (20h)
1 Portimonense-Estoril 28/10 (15h30) 2 Real Sociedad-Maiorca 21/10 (13h) 1 Man. City-Brighton 21/10 (15h) 2 Torino-Inter 21/10 (17h) 5 PSG-Estrasburgo 21/10 (16h)
1 V. Guimarães-Chaves 28/10 (18h) 2 Getafe-Bétis 21/10 (15h15) 2 Newcastle-Crystal Palace 21/10 (15h) 2 Sassuolo-Lazio 21/10 (19h45) 3 Nice-Marselha 21/10 (20h)
2 Sevilha-Real Madrid 21/10 (17h30) 1 Nottingham F.-Luton Town 21/10 (15h) 2 Roma-Monza 22/10 (11h30)
1 Benfica-Casa Pia
BTV1 ELEVEN SPORTS 28/10 (18h) 1 Lorient-Rennes 22/10 (12h)
1 Celta Vigo-At. Madrid 21/10 (20h) 2 Brentford-Burnley 21/10 (15h) 2 Bolonha-Frosinone 22/10 (14h)
1 Gil Vicente-Sp. Braga 28/10 (20h30) 1 Lille-Brest 22/10 (14h)
5 Las Palmas-Rayo Vallecano 22/10 (13h) 1 Bournemouth-Wolverhampton 21/10 (15h) 2 Salernitana-Cagliari 22/10 (14h)
1 Rio Ave-Farense 29/10 (15h30) 5 Girona-Almería 22/10 (15h15) 1 Chelsea-Arsenal 21/10 (17h30) 1 Atalanta-Génova 22/10 (17h) 6 Nantes-Montpellier 22/10 (14h)
1 E. Amadora-Famalicão 29/10 (18h) 5 Villarreal-Alavés 22/10 (20h) 1 Sheffield Utd-Man. Utd 21/10 (20h) 2 AC Milan-Juventus 22/10 (19h45) 4 Toulouse-Reims 22/10 (14h)
1 Vizela-FC Porto 29/10 (20h30) 2 Barcelona-At. Bilbao 22/10 (20h) 1 Aston Villa-West Ham 22/10 (16h30) 1 Udinese-Lecce 23/10 (17h30) 4 Mónaco-Metz 22/10 (16h05)
1 Boavista-Sporting 30/10 (20h15) 1 Valência-Cádiz 23/10 (20h) 1 Tottenham-Fulham 23/10 (20h) 1 Fiorentina-Empoli 23/10 (19h45) 2 Lyon-Clermont 22/10 (19h45)

Classificação Classificação Classificação Classificação Classificação


J V E D G P J V E D G P J V E D G P J V E D G P J V E D G P
1 Sporting 8 7 1 0 17-7 22 1 Real Madrid 9 8 0 1 20-6 24 1 Tottenham 8 6 2 0 18-8 20 1 AC Milan 8 7 0 1 16-8 21 1 Mónaco 8 5 2 1 21-11 17
2 Benfica 8 7 0 1 18-7 21 2 Girona 9 7 1 1 19-11 22 2 Arsenal 8 6 2 0 16-6 20 2 Inter 8 6 1 1 21-5 19 2 Nice 8 4 4 0 9-4 16
3 FC Porto 8 6 1 1 11-6 19 3 Barcelona 9 6 3 0 21-10 21 3 Manchester City 8 6 0 2 17-6 18 3 Juventus 8 5 2 1 14-6 17
3 PSG 8 4 3 1 17-7 15
4 At. Madrid 8 6 1 1 20-8 19 4 Liverpool 8 5 2 1 18-9 17 4 Fiorentina 8 5 2 1 18-11 17
4 Sp. Braga 8 5 1 2 20-14 16 4 Brest 8 4 3 1 9-7 15
5 At. Bilbao 9 5 2 2 16-9 17 5 Aston Villa 8 5 1 2 19-12 16 5 Nápoles 8 4 2 2 17-9 14
5 V. Guimarães 8 5 1 2 12-10 16 5 Reims 8 4 1 3 14-11 13
6 Real Sociedad 9 4 3 2 17-12 15 6 Brighton 8 5 1 2 21-16 16 6 Atalanta 8 4 1 3 13-8 13
6 Boavista 8 4 3 1 18-13 15 7 Rayo Vallecano 9 3 4 2 11-13 13 7 West Ham 8 4 2 2 15-12 14 7 Monza 8 3 3 2 8-7 12 6 Marselha 8 3 3 2 12-11 12
7 Famalicão 8 3 3 2 8-8 12 8 Betis 9 3 4 2 11-13 13 8 Newcastle 8 4 1 3 20-9 13 8 Frosinone 8 3 3 2 11-11 12 7 Lille 8 3 3 2 11-10 12
8 Moreirense 8 3 2 3 11-10 11 9 Valência 9 3 2 4 10-11 11 9 Crystal Palace 8 3 3 2 7-7 12 9 Lecce 8 3 3 2 9-10 12 8 Rennes 8 2 5 1 14-10 11
9 Gil Vicente 8 3 0 5 18-15 9 10 Las Palmas 9 3 2 4 6-8 11 10 Manchester Utd 8 4 0 4 9-12 12 10 Roma 8 3 2 3 19-12 11 9 Nantes 8 3 2 3 14-15 11
10 Casa Pia 8 2 3 3 7-7 9 11 Getafe 9 2 4 3 12-15 10 11 Chelsea 8 3 2 3 11-7 11 11 Bolonha 8 2 5 1 8-6 11 10 Toulouse 8 2 4 2 10-9 10
11 E. Amadora 8 2 2 4 8-12 8 12 Osasuna 9 3 1 5 9-14 10 12 Fulham 8 3 2 3 8-13 11 12 Sassuolo 8 3 1 4 12-14 10 11 Estrasburgo 8 3 1 4 8-11 10
12 Portimonense 8 2 2 4 9-18 8 13 Cádiz 9 2 3 4 8-12 9 13 Nottingham F. 8 2 3 3 8-10 9 13 Lazio 8 3 1 4 10-12 10 12 Montpellier 7 2 3 2 12-9 9
14 Sevilha 8 2 2 4 13-12 8 14 Wolverhampton 8 2 2 4 9-14 8 14 Torino 8 2 3 3 6-9 9
13 Farense 8 2 1 5 11-11 7 13 Le Havre 8 2 3 3 10-12 9
15 Mallorca 9 1 5 3 12-15 8 15 Brentford 8 1 4 3 11-12 7 15 Génova 8 2 2 4 10-12 8
14 Chaves 8 2 1 5 12-21 7 14 Lens 8 2 2 4 8-13 8
16 Villarreal 9 2 2 5 11-15 8 16 Everton 8 2 1 5 9-12 7 16 Verona 8 2 2 4 5-8 8
15 Vizela 8 1 3 4 10-14 6 17 Alavés 9 2 2 5 7-13 8 17 Luton Town 8 1 1 6 6-15 4 17 Udinese 8 0 5 3 4-12 5 15 Metz 8 2 2 4 7-14 8
16 Arouca 8 1 3 4 9-13 6 18 Celta de Vigo 9 1 3 5 10-15 6 18 Burnley 8 1 1 6 7-20 4 18 Empoli 8 1 1 6 1-16 4 16 Lorient 8 1 4 3 13-18 7
17 Rio Ave 8 1 2 5 6-14 5 19 Granada 9 1 3 5 15-23 6 19 Bournemouth 8 0 3 5 5-18 3 19 Salernitana 8 0 3 5 4-17 3 17 Lyon 8 0 3 5 6-16 3
18 Estoril 8 1 1 6 14-19 4 20 Almería 9 0 3 6 11-24 3 20 Sheffield United 8 0 1 7 6-22 1 20 Cagliari 8 0 2 6 3-16 2 18 Clermont 7 0 2 5 5-12 2
Liga dos Campeões Playoff Liga dos Campeões Liga Europa Playoff Liga Europa Descem de divisão Playoff descida de divisão Transm. Televisivas: SportTV ElevenSports Benfica TV BTV1
MUNDO/
Guterres e Putin na China: ‘There was no meeting’
Na semana em que o mundo qua- mundiais, entre os quais o Presi- trar a capacidade e influência da e o Hamas, Xi e Putin aproveita- vamento da situação no Médio
se incendiou com o ataque ao dente russo, que se deslocou à China para pôr em marcha o seu ram o encontro de Pequim para Oriente. Esperava-se que tives-
Hospital Al-Ahli em Gaza, Antó- China apesar do mandado de plano para dinamizar novas rela- mostrar a «excelente fase» da se aproveitado a ocasião para
nio Guterres, Xi Jinping e Vladi- captura internacional que impen- ções comerciais no mundo. relação entre os dois. um encontro com Putin, mas a
mir Putin juntaram-se em Pe- de sobre si. Indiferente e, aparen- Enquanto os Estados Unidos se Quem também esteve presente resposta do seu gabiente foi cla-
quim. O motivo foi o Fórum das temente, distante da situação desdobravam em contactos foi o secretário-geral das Nações ra: «There was no meeting»
Novas Rotas da Seda, que juntou tensa que se vive no Médio Orien- para tentar evitar o pior no de- Unidas, António Guterres, que (‘Não houve encontro’). ●
na capital chinesa 130 líderes te, Xi Jinping fez questão de mos- senrolar do conflito entre Israel reagiu a partir da China ao agra- ➽ Raquel Abecasis

PEDRO PARDO/AFP

↑ O secretário-geral da ONU encontrou-se com Xi Jinping à margem do Fórum da Iniciativa Faixa e Rota
36 MUNDO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

SEMANAS
EM QUE
ACONTECEM
DÉCADAS
L
TEXTO Teresa Nogueira Pinto

Lenine, ainda no exílio e em preparação com o envio de por- Sachs prevê uma subida para os 105 Médio Oriente. Depois de Israel ter
antes da revolução de ta-aviões e caças para o Mediterrâneo dólares por barril, e a Bloomberg aceitado a abertura de um corredor
1917, terá dito que há dé- e com um grupo de soldados da ma- aponta para os 150 dólares. humanitário, Biden deslocou-se ao
cadas em que nada acon- rinha pronto para ser enviado para o país, e esteve com Nethanyahu. Mas
tece e semanas em que Médio Oriente. No quadro geoeconó- Biden em Israel a visita à região falhou um dos objeti-
acontecem décadas. Um mico, este terceiro cenário levaria ao Washington esforça-se por mediar o vos principais: a cimeira com os líde-
século depois, também aumento significativo do preço do pe- conflito, mas a Administração Biden res árabes foi cancelada na sequên-
vivemos tempos em que tróleo, afetando ainda mais a já fragi- pode estar a pagar o preço de ter ig- cia da explosão no Hospital Al-Ahli
a história se precipita ao lizada economia global. A Goldman norado a prioridade estratégica do em Gaza. Joe Biden afirmou, no en-
ritmo a que se desfazem
consensos e ilusões.xxxx MAPA DE CONFLITOS
Pode ser um ponto de in-
flexão no Médio Oriente. A escalada
do conflito israelo-palestiniano amea-
ça o já conturbado status quo da re-
gião, com consequências geopolíti-
cas e geoeconómicas. Neste momen-
to, existem três cenários possíveis: o
primeiro é o de uma contenção que, Ucrânia Rússia
Sérvia
ainda assim, comporta enormes cus- Kosovo Arménia
EUA
tos humanos. Trabalham-se soluções (Irão) Turquia Azerbaijão
Curdos
para mitigar esses custos, nomeada- Israel Síria Irão Paquistão
Palestina (EUA)
mente a criação de corredores hu- China
Sudão Taiwan
manitários, mas mantem-se a recu- Índia
Mali Mar
sa perentória, do Egito e da Jordânia, Iémen
China
Mianmar
em receber refugiados palestinianos. Camarões
Merdidional
Etiópia
O segundo cenário, cada vez mais
provável, é o do alastrar do conflito
Rep. Dem.
para a Cisjordânia, o que poderia ra- Congo
pidamente materializar-se no tercei-
ro cenário, com o envolvimento di-
reto do Líbano, Síria e Jordânia, numa CONFLITOS REGIONAIS/INTERNACIONAIS
vitória geopolítica para o Irão. A DECORRER
Fonte: Foreign
Os EUA seriam forçados a envolver- POTENCIAL CONFLITO Relations Council,
GUERRAS CIVIS E INSURGÊNCIAS Statista
-se diretamente, processo que já está
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt MUNDO 37

Os conflitos
acumulam-se
e a Europa
esforça-se por
manter a sua
influência
num mundo
em que está
cada vez mais
encurralada
pela guerra a
leste, a sul
e, agora,
a oriente.

BRENDAN SMIALOWSKI/AFP
contro com o primeiro-ministro is- ↑ Depois configurações geopolíticas e políti- terrorismo volta a ser notícia na Europa. gonismo, formam-se novas alianças, de
raelita, que o ataque foi da autoria «da do ataque cas, muito além do Médio Oriente. Em Arras, um professor foi morto à faca- uma geometria variável que escapa às
outra equipa». Este encontro acon- ao Hospital em O conflito toca feridas antigas e apro- da por um homem gritando Allah certezas do fim da História, e num con-
teceu numa altura em que Israel pre- Gaza, a visita de funda e suscita emoções, reações, e ali- Ahkbar. Durante a semana, na sequên- texto em que a hegemonia americana
para a fase final da ofensiva terrestre Biden falhou um nhamentos não apenas no mundo ára- cia de ameaças de bomba, o Louvre, o deixou de ser certa. Esta semana, em Ria-
em Gaza. Em declarações ao Politico, dos objetivos be, mas também em outras latitudes. Palácio de Versalhes e seis aeroportos de, o Príncipe Mohammed bin Salman
David Petraeus, que comandou as in- principais: a Na Europa, o ataque do Hamas vol- franceses foram evacuados. Em Bruxe- deixou o secretário de Estado Anthony
tervenções norte-americanas no Afe- cimeira com os tou a expor vulnerabilidades. Primei- las, um ataque terrorista por outro ‘lobo Blinken à espera durante horas, num ges-
ganistão e no Iraque, disse que esta líderes árabes ro, numa sucessão de declarações con- solitário’ originou a morte de dois cida- to que foi interpretado como uma forma
ofensiva poderia «rapidamente trans- foi cancelada traditórias, que começariam com um dãos suecos. Em entrevista à Euronews, de ‘humilhação’. Ao mesmo tempo, sur-
formar-se num Mogadíscio em este- anúncio da suspensão da ajuda à Pa- Claude Moniquet, especialista em terro- gem novas potências de escala mundial
roides». Em 1993, 18 soldados ameri- lestina, para terminar com a promes- rismo, referiu que «haverá um choque ou regional pouco alinhadas com os di-
canos ficaram encurralados e foram sa de triplicar a ajuda atual. Num tem- terrorista que acompanhará o que se tames do liberalismo internacional. Em
mortos na capital somali, e os seus po implacável que exige convicções passa no Médio Oriente». Pequim, Viktor Órban encontrou-se pes-
corpos posteriormente arrastados pe- enraizadas, declarações firmes e so- E voltaram a ouvir-se cânticos antisse- soalmente com Vladimir Putin, que foi
las ruas. A elevadíssima densidade po- luções rápidas, a UE falhou em conde- mitas nas praças e avenidas das cidades recebido com honras e distinção por Xi
pulacional em terreno urbano, a ex- nar, a uma só voz, o ataque do Hamas. europeias. Em Berlim, foram arremes- Jinping no âmbito da celebração do dé-
tensão de túneis do Hamas e o facto Isto não resulta apenas da ausência de sados coquetéis molotov para uma si- cimo aniversário da Nova Rota da Seda.
de manterem centenas de reféns tor- chão e posição comum, mas também nagoga e casas habitadas por judeus fo- O evento reuniu, nesta semana em que
nam esta operação particularmente da consciência de que uma condena- ram marcadas com a Estrela de David. se passam décadas, vários líderes inter-
perigosa para o exército israelita, pou- ção forte e inequívoca poderia ter con- nacionais na capital chinesa.
co treinado em guerrilha urbana. sequências no espaço europeu. Um mundo que já mudou Atores como a ONU, tidos como ali-
Por agora, o quadro de risco e vola- Khaled Meshaal, ex-líder do Hamas, Os conflitos e tensões acumulam-se. A cerces da ordem internacional liberal,
tilidade reflete poucas (e velhas) cer- apelou à população dos países vizi- situação na Ucrânia denuncia o cansa- são confrontados com bloqueios cons-
tezas. Como refere Jose Miguel Alon- nhos para que se juntasse na luta con- ço provocado por um conflito sem fim à tantes que denunciam uma crescente
so-Trabanco num artigo publicado na tra Israel, e à realização de um dia de vista. No Nagorno-Karabakh há receios irrelevância. A União Europeia, a bra-
Geopolitical Monitor, a da ausência protestos, na sexta-feira dia 13, nas de uma limpeza étnica. No norte do Ko- ços com uma crise económica e novas
de uma ordem assente em regras, a ruas dos países árabes e muçulmanos. sovo continuam sintomas de velhas ten- clivagens políticas, esforça-se por man-
de que as variáveis da guerra são in- E declarou a todos os que ensinam e sões que não desapareceram. A violên- ter influência num mundo que volta a
termináveis e a de que a geografia é aprendem a jihad: «Este é o momen- cia crónica reivindica cada vez mais vidas falar a linguagem do poder duro e onde
fio condutor do conflito. E, como na- to para a aplicação das teorias». e oportunidades no Sahel. E, a Oriente, a geografia continua a importar. E arris-
quele 28 de junho de 1914, os ataques De Paris a Londres, de Berlim a Lisboa, Pequim permanece determinada no de- ca-se a ficar isolada entre a guerra a les-
do dia 7 de outubro de 2023, e as rea- houve manifestações de apoio à Palesti- sígnio de uma só China, pairando sem- te, a sul e, agora, a oriente. ●
ções em cadeia que continuam a pro- na e, em alguns casos, confrontos com a pre a ameaça de um ataque a Taiwan.
vocar, poderão levar a profundas re- Polícia. Ao mesmo tempo, a ameaça do Neste quadro de volatilidade e anta- teresa.pinto@nascerdosol.pt
38 MUNDO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

MAHMUD HAMS/AFP
DIÁRIO DE UM KIBBUTZ

O meu desejo, como o de muita gente por


todo o mundo, é que isto acabe depressa

N
ota para os leitores: os errada, mas não serei eu a partilhar tos planos para o futuro, sem saber
eventos aqui reporta- essas histórias. onde estamos, por quanto tempo,
dos são baseados numa No entanto, o meu foco (e particu- com ou sem trabalho... Agora que as
experiência e opiniões larmente o da minha mulher, que forças de segurança estão nos seus
pessoais, não uma durante anos trabalhou com as postos e coordenadas, o sentimento
expressão pública de qualquer comunidades adjacentes à Faixa de de segurança é um pouco maior do
organização ou país. O objetivo Gaza) tem sido o prestar apoio emo- que no fatídico fim-de-semana de 7
deste artigo não é o de injuriar ou cional a estas pessoas, que sobrevi- e 8 de Outubro. O impasse sobre o
de julgar ninguém, mas o simples veram como que ‘por milagre’, que envolvimento do Hezbollah deixa
relatar da minha experiência deixaram para trás as suas casas, os ansiedade, mas também tem permi-
enquanto residente em Israel- Mário Fernandes seus animais, as suas plantações e tido um regressar à (nova) ‘rotina’, o
-Palestina. PORTUGUÊS EM ISRAEL alguns dos seus familiares e amigos. que para mim é um pouco estranho.
Assim que iniciei este texto, admi- Não há consolo possível para a dor O meu desejo pessoal, como o de
to ter sido difícil lembrar-me quando que trazem nos seus corações, e tal muita gente por todo o mundo, é que
é que esta ‘semana’ começou. O dor e trauma não desaparecerão tão tudo isto acabe depressa, que a paz e
tempo avança em câmara lenta. A cedo. De momento, encontram-se a cordialidade imperem na região,
perceção de cada momento é alojadas em sítios mais centrais do que as pessoas inocentes de toda a
aumentada pela atenção a cada des foram sendo raptados, tortura- país, muitas delas onde ainda nem região saiam ilesas e que tenham
movimento das forças armadas, a dos, assassinados, violados, decapi- uma sirene soou, procurando encon- acesso aos bens essenciais à vida
cada sinal sonoro que chega das tados, degolados… Houve pessoas trar a paz interior para seguir viven- humana. É triste haver tantas pes-
notícias, a cada notícia ou atualiza- que apenas poderam sair dos seus do e encontrar uma nova ‘casa’ tem- soas a sofrer as consequências das
ção que nos chega aos ecrãs e aos bunkers passados três (!!!) dias com- porariamente. Também nós tivemos ideologias e dos atos militares de
rádios. Portanto, isto não é um relato pletos, 72 horas fechados num de abandonar o nosso kibbutz (e os alguns, de ambos os lados. Chega de
do dia-a-dia, mas um resumo geral. mesmo compartimento, tentando nossos gatos) por tempo indetermi- terror! A história deste território é
Para quem se encontra num impedir a entrada de indivíduos nado para evitarmos ao máximo pôr um ciclo interminável de violência e
ambiente de guerra pela primeira armados que estavam lá para lhes em risco as nossas vidas. Mas nós trauma. Palestinianos e Israelitas,
vez, como eu, tarda um pouco em tirar a vida. Ouvem-se por estes dias fazê-mo-lo em medida preventiva, Muçulmanos, Judeus, Cristãos,
perceber as ‘regras do jogo’ (se há inúmeros relatos horrendos das sem nunca ter tido de passar por Beduínos, Druze, Ba’hai e todos os
realmente como perceber tal coisa, estratégias mais macabras utilizadas algo remotamente semelhante a tal restantes tem o direito de viver aqui,
ou mesmo as metáforas de ‘regras’ e para infringir dor e pânico ao povo carnificina. E, por outro lado, ir nenhuns sobre os demais. A questão
de ‘jogo’). E a dimensão de tal inves- israelita – algumas documentadas estando em contacto com a nossa mantém-se sobre se há a intenção e a
tida foi tão grande, absurda e sur- nos livretos ou nos planos de ataque família e amigos, que ou estão envol- capacidade de dialogar e estabelecer
preendente, que as próprias forças que o Hamas dispôs aos seus milita- vidos em combate, ou residem em um Estado seguro e adaptado às
militares israelitas tardaram um res –, como mais de um milhar de zonas de conflito. necessidades de todos. ●
bom par de horas até chegarem aos pessoas inocentes a terem sido víti- O novo ‘normal’ é feito de viver
locais onde os civis de todas as ida- mas de estar no lugar errado à hora um dia de cada vez, sem fazer mui- opiniao@nascerdosol.pt
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt MUNDO 39

Hipótese de ‘geringonça’
na Polónia alivia Bruxelas
Afinal, a democracia
não estava em risco –
ou o partido no poder,
o PiS, que foi o mais
votado mas sem
maioria parlamentar,
não perderia para
a Plataforma Cívica,
Rússia insiste
liberal e pró-UE. na destruição
do que não

O
TEXTO Teresa Nogueira Pinto

partido conserva-
lhe pertence

WOJTEK RADWANSKI/AFP
dor e soberanista
Lei e Justiça (PiS), Passaram 20 meses, a contraofensiva
no poder desde ucraniana perdeu força, mas o modus
2015, procurava operandi dos russos é o mesmo
manter a maioria de sempre: bombardear zonas
parlamentar. A Pla- residenciais e causar vítimas civis.
taforma Cívica, li- ↑ Donald Tusk deverá ser convidado a formar Governo
beral e pró-integra-
ção europeia, tinha ção de uma maioria parlamentar está -membros, a perspetiva da oposição Fortemente apoiado pelo Ocidente e galvaniza-
como objetivo im- nas mãos da Coligação Cívica. E, num formar governo traz alívio a Bruxe- do pelo Presidente Volodymyr Zelensky, o exér-
pedir essa maioria. cenário de fragmentação política, o las e preocupação a Budapeste, que cito ucraniano continua a resistir à agressão rus-
E conseguiu. Seguem-se agora as ne- terceiro lugar foi determinante. vê o grupo de Visegrado enfraque- sa, depois de mais de ano e meio de conflito. Na
gociações para uma grande coligação. Neste caso, havia três atores rele- cido. Com o PiS na oposição, torna- frente de batalha não houve avanços significati-
vantes. A Terceira Via, uma coligação -se mais provável o dissipar de ten- vos de qualquer dos lados. A contraofensiva ucra-
Dois homens e duas Polónias centrista que integra o Partido do Povo sões com a UE e o desbloqueio de niana, iniciada em junho, deparou com uma fe-
As eleições foram também sobre o (um partido rural e conservador) e o cerca de 35 mil milhões dos fundos roz resistência russa que travou o avanço de Kiev
embate entre dois inimigos políticos, movimento Polónia 2050, liderado de recuperação. Anunciados os re- nas regiões de Donetsk, Zaporijia e Kupiansk, ou
Jaroslaw Kaczyński, vice-primeiro- por uma estrela de televisão; a Esquer- sultados, Manfred Weber, presiden- seja, o caminho para libertar a Crimeia começa
-ministro e presidente do Lei e Justi- da, uma coligação socialista e progres- te do EPP, declarava que «a Polónia a ficar mais difícil. Apesar disso, Zelensky pediu
ça, e Donald Tusk, ex-presidente do sista, e a Confederação, um partido li- está de volta». aos compatriotas e aliados que continuem uni-
Conselho Europeu. Partilhando as bertário, identitário e pró-Russo. Os Mas pode ser que se aplique aqui a dos. «Todos os dias temos de fazer esforços para
mesmas origens na luta anticomunis- dois primeiros, por se tratar de coliga- velha máxima de que é preciso que al- garantir que o futuro da Ucrânia pertence ex-
ta a partir do movimento Solidarie- ções, precisavam de ultrapassar a bar- gumas coisas mudem para que (qua- clusivamente aos ucranianos. Sem dúvida que
dade, três décadas depois represen- reira dos 8 por cento. E a sua perfor- se) tudo fique na mesma. A coligação venceremos», disse o Presidente ucraniano ao as-
tam duas visões opostas, e irreconci- mance foi determinante para construir que se poderá formar como alternati- sinalar os 600 dias de guerra.
liáveis, sobre o futuro da Polónia: uma maioria a partir da oposição. va é negativa, isto é, unida apenas pelo A nível militar, os Estados Unidos entrega-
uma soberana e conservadora; outra Segundo os resultados divulgados, objetivo de afastar o PiS, e muito he- ram à Ucrânia os mísseis de longo alcance
progressista e pró União Europeia. a Coligação Cívica, a Terceira Via e Es- terogénea (juntando desde conserva- ATACMS (Army Tactical Missile System), capa-
A votação foi concorrida, renhida e querda reúnem 248 dos 460 votos que dores à esquerda progressista). Para zes de atingir alvos a 165 quilómetros de dis-
antecedida por uma campanha quen- compõem o Sejm. Cabe agora ao Pre- além disso, fica aquém da maioria de tância, e que podem contribuir para acelerar
te, marcada por insultos, acusações e sidente Andrzej Duda convocar o lí- três quintos no Sejm, e por isso algu- a estagnada contraofensiva de Kiev. Os primei-
ameaças de morte nas redes sociais. der do partido mais votado, ou do se- mas iniciativas legislativas poderão ser ros efeitos foram devastadores para os russos.
Kaczyński acusou Tusk de querer ven- gundo partido mais votado, a tentar bloqueadas pelo veto presidencial. Dois aeródromos localizados próximos das ci-
der a Polónia a interesses estrangeiros formar Governo. Sendo improvável A posição cética relativamente à imi- dades ocupadas de Berdiansk e Lugansk foram
e aniquilar as raízes cristãs e a identi- que o PiS consiga formar um governo gração, bem como o alinhamento face atingidos por estes mísseis, causando a morte
dade nacional polacas. Já Tusk acu- minoritário, seguir-se-á um processo à guerra na Ucrânia não deverão ser al- de 200 soldados russos. O Presidente Vladimir
sou Kaczyński, e o PiS, de quererem que poderá durar várias semanas com terados. E a Polónia deverá continuar Putin reagiu aos mísseis entregues pelos Esta-
destruir a democracia liberal na Poló- vista à formação de um executivo li- a reforçar, ao contrário de outros Esta- dos Unidos com mais uma ameaça: «Apenas
nia. Em campanha, deixou um aviso: derado pela Coligação Cívica. dos europeus, a sua capacidade mili- vão prolongar a agonia deste país». O que não
«É a nossa democracia e o nosso lu- tar. As relações entre Varsóvia e a Ber- mudou foram os ataques diários com drones
gar na Europa que estão em jogo». Deslocação do eixo lim podem melhorar, mas a pressão russos, como aconteceu contra edifícios resi-
Nestas eleições também se jogava o para a deslocalização do eixo de poder denciais nas cidades de Zaporíjia e Dniprope-
‘Geringonça’ polaca futuro da União Europeia. Depois de europeu para leste deverá continuar. trovsk, que provocaram seis mortos. ●
Embora o PiS tenha sido o partido uma sucessão de derrotas nos resul- Ainda assim, Bruxelas tem motivos
mais votado, a chave para a constru- tados das eleições dos Estados- para celebrar. ● joao.sena@nascerdosol.pt
40 ÁFRICA nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

Angola Autarquias à espera


Parlamento rejeita do Parlamento
destituição do PR Processo de criação das autar-
quias só está dependente
ta há anos, embora para a aprovação
dessas leis não seja exigida a maioria
qualificada de dois terços dos votos
da decisão do Parlamento,
garantiu João Lourenço, dos deputados, bastando para tal que
acolham o voto favorável de uma
na sua mensagem sobre
maioria absoluta dos votos dos depu-
o estado da Nação. tados», disse o Presidente angolano.
João Lourenço aproveitou para re-
O Executivo angolano aguarda a deci- velar as acções em curso para acer-
são do Parlamento para avançar com a ca do poder autárquico. Anunciou
institucionalização das autarquias nos que estão concluídas as primeiras
moldes em que vier a ser negociado pe- duas infraestruturas administrativas
los deputados à Assembleia Nacional. A e autárquicas, outras seis estão em
institucionalização das autarquias é construção, assim como 34 comple-
uma questão há muito reclamada pela xos residenciais administrativos para
oposição. O Presidente João Lourenço facilitar a colocação de quadros nos
esclareceu, esta semana, na sua men- municípios, além de 32 assembleias
sagem sobre o estado da Nação, no Par- municipais. O Presidente angolano
lamento, que há muito que o Executi- garantiu que os municípios, hoje,
vo cumpriu a sua parte, elaborando e exercem mais competências, estão a
apresentando à Assembleia Nacional melhorar a capacidade institucional
as propostas de leis que conformam o e estão a arrecadar mais receita lo-
pacote legislativo autárquico. cal. João Lourenço disse que os re-
«Sabemos que se está à procura do sultados incentivam a continuar a
maior consenso possível à volta des- transferir cada vez mais competên-
ta matéria de interesse nacional, si- cias da administração central para a
tuação que, como sabemos, se arras- administração local. ●

Rácio da dívida cai 70 %


JULIO PACHECO NTELA/AFP

em dois anos
O rácio da dívida pública liões de kwanzas e uma despesa fis-
angolana em relação cal de 12,8 biliões. O saldo primário
↑ João Lourenço foi esta semana ao Parlamento ao Produto Interno Bruto foi igualmente positivo, de 5,3 por
passou de 139,6% em 2020 cento. O saldo primário não petrolí-
para 69.9% em 2022. fero foi de 9 por cento do PIB.
Proposta teve votos contra para analisar o diploma, que preen- Na sua mensagem sobre o estado
da bancada do MPLA, que chia os requisitos legais de ser subs- da Nação, na segunda-feira, por oca-
tem a maioria, e a abstenção crito por mais de um terço dos de- O rácio da divida pública angolana sião da abertura do Ano Parlamentar,
dos deputados do PRS. putados em funções. O projeto de em relação ao Produto Interno Bru- João Lourenço destacou a necessida-
lei da Unita tinha mais de 100 pági- to (PIB) passou de 139,6 , em 2020, de de continuar a transformação es-
nas e 200 artigos. para 69,9% no ano passado, uma re- trutural da economia angolana, para
Numa sessão bastante tensa e tu- A maioria do MPLA rejeitou a cons- dução de 70 pontos percentuais, fru- que seja mais forte, menos dependen-
multuosa, no passado sábado, a As- tituição da referida Comissão Tem- to da aplicação da Lei da Sustentabi- te e vulnerável do exterior e capaz de
sembleia Nacional de Angola, reu- porária, o que implica a rejeição da lidade das Finanças Públicas. suportar choques externos adversos.
nida em Sessão Extraordinária, re- proposta. Registe-se que a iniciativa De acordo com o Presidente João Num país com extensas terras ará-
jeitou a moção de destituição do não conseguiu tão-pouco unir toda Lourenço, o Executivo está a fazer veis e clima favorável, o Presidente
Presidente da República, João Lou- a oposição, na medida em que o Par- um endividamento público respon- disse ser preciso aumentar a produ-
renço, proposta pela Unita. tido da Renovação Social (PRS) se sável e sustentado, direcionado para ção interna e diminuir a dependên-
A iniciativa tinha sido anunciada absteve na votação do diploma. o investimento público gerador de ri- cia externa de produtos que o país
em Julho e foi formalmente entre- Nos termos do Artigo 129 da Cons- queza. Aprovada em 2020, a Lei da tem potencial e capacidade de pro-
gue no Parlamento na quinta-feira. tituição angolana, o Presidente da Sustentabilidade das Finanças Públi- duzir para satisfazer as necessidades
Dada a importância do tema, a pre- República só pode ser destituído cas estabelece o objectivo de redu- internas e aumentar o volume e di-
sidente da Assembleia Nacional, por crimes de traição e espionagem, zir consistente e sistematicamente, versidade dos produtos a exportar.
Carolina Cerqueira, convocou para suborno, peculato e incapacidade no longo prazo, o rácio da dívida pú- Apontou o apoio financeiro ao se-
o dia seguinte a Comissão Perma- permanente para o exercício das blica em relação ao PIB para um va- tor empresarial para o aumento da
nente, que, por sua vez, agendou funções. lor igual ou inferior a 60 por cento. produção nacional, simplificação e
para sábado uma Sessão Extraordi- O Presidente João Lourenço par- O Orçamento Geral do Estado de alívio tributário e melhoria do am-
nária com um único ponto na or- ticipou nesta semana na Assembleia 2022 apresentou um saldo fiscal glo- biente de negócios como medidas em
dem de trabalhos: a eventual cria- Nacional no debate anual do Esta- bal positivo de 1,02 por cento do PIB, curso para estimular a dinamização
ção de uma Comissão Temporária do da Nação. ● resultado de uma receita de 13,3 bi- da economia nacional. ●
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt ÁFRICA 41

Gabão A FECHAR
Família Bongo a contas Dez mil crianças
com a justiça em risco de vida
SUDÃO A Organização Mundial de Saú-
de (OMS) fez um alerta dramático sobre
Sucessor de Omar Bongo, que esteve detida em residência desco- a situação no Sudão. Segundo a OMS,
presidiu ao Gabão desde 1967, nhecida em Libreville, «para sua pro- cerca de 10 mil crianças podem morrer
Ali Bongo foi deposto após a teção», até ser esta semana levada este ano em consequência do conflito
sua reeleição em agosto e a para a Prisão Central de Libreville, entre as forças do Governo e os parami-
família é agora chamada a res- sob as mesmas acusações. Este esta- litares, que dura há seis meses. «Cerca
ponder por vários crimes. belecimento prisional tem uma sinis- de 5,8 milhões de pessoas, 2,5 milhões
tra reputação e está sobrelotado. Ali são crianças, foram recentemente desa-

O
Bongo sofreu um AVC em 2018 que lojados e estão em trânsito, sem aces-
Gabão foi dirigido pela família o deixou muito diminuído. so a comida, água potável e um ambien-
Bongo desde 1967. Omar Bon- Em processo iniciado em 2007, te limpo e saudável, » lê-se se num co-
go, primeiro, até à sua morte nove filhos de Ali Bongo estão acu- municado conjunto da OMS e UNICEF.
em 2009, e o seu filho Ali, de- sados em França de aí terem conse-
pois, até 30 de Agosto. Horas guido fraudulentamente um patri-
depois do anúncio de nova reeleição mónio imobiliário superior a 85 mi-
de Ali Bongo, as forças armadas che- lhões de euros, em que a origem dos
fiadas pelo general Brice Oligui Ngue- fundos será de reservas nacionais
ma (antigo ajudante de campo do desviadas do Gabão.
Presidente Omar Bongo) derruba- O auto-proclamado Presidente in-
ram o Governo. Três semanas de- terino, autor do golpe, convocou 200
pois do golpe de Estado, o seu filho a 300 empresários e altos funcioná-
mais velho, Noureddin Bongo Va- rios para os intimidar a devolverem ao
lentin, e membros do gabinete do Estado o que sobrefaturaram duran-
ex-Presidente foram colocados em te décadas. «Têm 48 horas para essas
prisão preventiva e acusados de devoluções voluntárias, ou vamos
«alta traição, desvio de fundos, atrás de quem prevaricou e verão
corrupção ativa, tráfego de estupe- como será bem mais desagradável».
facientes e falsificação da assinatu- Segundo o Banco Mundial, o Gabão
ra do Presidente!». é o terceiro país mais rico de África Mali acusa a ONU e a França de ‘traição’
Se Ali Bongo foi entretanto liberta- em PIB per capita graças ao petróleo,
do e autorizado a viajar para o estran- mas um em cada três habitantes vive RETIRADA A ONU vai deixar o país a 31 de dezembro deste ano e a junta
geiro, algo que rejeitou, a sua mulher, abaixo do limiar de pobreza, com me- no poder considerou esta decisão «mais uma traição», acusando a Fran-
Sylvia Bongo Valentin, com 60 anos, nos de dois euros por dia. ● ça de tentar acelerar esta retirada para favorecer os grupos jihadistas.

Imundações deixam Eleições não


cidades submersas são prioridade
GANA Quase 26 mil pessoas fo- BURKINA FASO O Presidente
ram forçadas a deixar as suas ca- Ibrahim Traoré anunciou que as
STEEVE JORDAN/AFP

sas no leste do Gana devido a eleições marcadas para julho de


inundações causadas por vários 2024 não vão realizar-se, uma vez
dias de fortes chuvas. Há várias que a segurança do país continua
cidades submersas e os agricul- a ser a principal prioridade. O
tores viram os seus campos com- Burkina Faso é frequentamente
↑Ali Bongo foi deposto após a sua reeleição a 30 de agosto pletamente destruídos. atacado por jihadistas islâmicos.
42 OBITUÁRIO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

C
TEXTO Diogo Vaz Pinto

Hubert Reeves
turo, a humanidade não viesse a
fazer parte, e que podem bem vir
omo os explorado- a ser os vírus e as bactérias a her-
res dos séculos dar o planeta. Assim, para aque-

Fez do cosmos
passados cujas as les que gostam de negar os efei-
crónicas lia fasci- tos do desastre climático que
nado quando era atravessamos, há sempre a pos-

o romance do futuro
só um miúdo, Hu- sibilidade de lembrar que o futu-
bert Reeves decorou esse retra- ro até parece risonho, dependen-
to que em tempos chegou a ser do do ponto de vista. «A questão
muito comum, o das crianças é o futuro do ser humano. Possi-
que colecionavam mapas e es- velmente, mais tarde, outra es-
tampas, que partiam dos seus pécie animal poderá desenvol-
anseios e apetites para desenvol- ver inteligência. Há poucos mi-
ver escalas sobre a vastidão do lhões de anos, uma espécie
universo, que atacavam os livros recebeu um dom da natureza e 1932-2023 O ‘poeta das estrelas’ fez da ciência um género best-seller
de divulgação científica e esses uma inteligência fantástica e é
projetos fenomenais do conheci- hoje em dia este dom que ajuda
mento que foram as grandes enci- estas pessoas a viver num am-
clopédias em busca de alimento biente hostil. Mesmo que a hu-
para compor os seus devaneios à manidade desapareça, ninguém
volta do quarto. sabe o que pode acontecer den-
Começava cedo esse desejo de tro de 100 milhões de anos».

A
percorrer o mundo, lançar redes
sobre o além, e este astrofísico pesar do seu esfor-
franco-canadiano veio provar ço para alertar para
como é através do olhar que o is- os problemas am-
co da imensidade nos agarra: «À bientais e a crise cli-
noite o sol desce no horizonte e, mática, havia no
no braseiro de cores que se acen- tom de Reeves uma capacidade
de a ocidente, o seu lugar exato de relativizar as nossas noções
torna-se presente […]. A obscu- sobre o que se segue. Em Já não
ridade abre-nos o céu. O alcan- terei tempo, Reeves afirma que
ce do nosso olhar estende-se por a astronomia e a ecologia po-
milhares, mesmo milhões de dem ser vistas como as duas fa-
anos-luz. O vasto universo entra ces do mesmo tema: a nossa
no nosso campo visual». Pela for- existência. «A astronomia, ao
ma como sempre buscou apoiar- contar-nos a história do Uni-
-se no ímpeto de invenção e nas verso, diz-nos de onde viemos
poderosas intuições dos poetas e como chegámos até aqui. A
no seu esforço de tornar com- ecologia, ao dar-nos a conhe-
preensíveis as descobertas feitas cer as ameaças ao nosso futuro,
no campo da ciência, Hubert Ree- tem como objetivo dizer-nos
ves, que morreu a 13 de outubro, como nos mantermos nele». Ao
aos 91 anos, ficou conhecido invés de recair enfaticamente
como o «poeta das estrelas». no drama, encarava todos os fe-
Nos últimos anos, apesar do seu nómenos com curiosidade mais
otimismo radiante, reconhecia do que propriamente com um
que a beleza do mundo estava sentido de urgência desgastan-
LOIC VENANCE/AFP

ameaçada pelo sexto episódio de te, talvez por estar convencido


extinção em massa na Terra, e via de que o que virá a acontecer
uma «pulsão de morte» que ti- não depende da nossa vontade.
nha tomado conta do comporta- O que este astrofísico se recu-
mento da atual civilização, que sava era a embarcar nos delírios
estava a alterar profundamente da potência humana, deixando
a configuração da vida no plane- as artes divinatórias para mentes nos constituem, como o carbo- sica teórica, que estudou primei- particularmente interessado em
ta. E, no entanto, recusava-se a mais esotéricas e desavergonha- no, o oxigénio e o azoto, provêm ro em Montreal e depois nos EUA, três elementos leves – lítio, be-
assumir um diagnóstico apoca- das, preferindo firmar o seu per- diretamente das fornalhas este- na Universidade de Cornell, no rílio e boro – demasiado grandes
líptico, preferindo uma certa re- curso no campo das matérias lares», regista o diário francês. Estado de Nova Iorque, onde, re- para terem sido criados na altu-
serva, como se nota na entrevis- prováveis, e traçando assim esse Nascido em Montreal, a maior corda, «se encontravam os fun- ra do Big Bang, mas demasiado
ta que deu ao Público em 2014: retrato acolhedor que o Le Mon- cidade da província de Quebec, dadores da astrofísica nuclear. frágeis para terem sido concebi-
«O futuro é desconhecido. Não de recupera ao falar num avô que no Canadá, a 13 de julho de 1932, Havia a magia das grandes uni- dos no fogo termonuclear das es-
acredito que os seres humanos nos contava histórias deslum- Reeves gostava de regressar à sua versidades americanas, onde trelas». No início dos anos 60,
possam exterminar a vida. Ela é brantes e, simultaneamente, um infância, ao encanto que os seus nos sentimos capazes de fazer dava aulas em Montreal e tornou-
muito robusta, muito mais adap- feiticeiro que misturava os ingre- pais incutiram nele pelas ciên- grandes coisas. Havia uma cria- -se conselheiro científico da NA-
tável do que pensávamos antes. dientes do universo num caldei- cias naturais, pela observação do tividade contagiante que nos SA, tendo sido responsável por
Encontramos sempre novas for- rão. «Um litro de Via Láctea, um céu à noite, e foi esse o balanço dava asas». O Le Monde regista a formar toda uma geração que vi-
mas de vida que são muito mais extrato de Lua, alguns grãos mis- que lhe permitiu depois aprovei- forma como Reeves mergulhou ria a dinamizar os departamen-
resistentes do que pensávamos teriosos de matéria negra... Ex- tar-se do seu entusiasmo pela ma- no passado do Universo, dando- tos de ciências espaciais que es-
e por isso ela continuará». Ad- plicou-nos que éramos todos fei- temática, como uma linguagem -se conta de que ser astrofísico tavam a surgir por todo o lado nas
mitia, contudo, que era possível tos de poeira estelar, pois a invulnerável à subjetividade, era tornar-se o historiador do universidades norte-americanas,
conjeturar que, desses mesmo fu- maior parte dos elementos que para trilhar um caminho pela fí- cosmos e da matéria. «Estava isto numa altura em que uma das
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt OBITUÁRIO 43

EM PAZ

Charles Feeney
principais frentes na rivalidade
entre as grandes potências no pe-
ríodo da Guerra Fria era a con-
quista do espaço. Contudo, Ree-

Morreu o ‘James Bond


ves nunca teve grande paciência Louise Glück
para as mesquinhezes do regime 1943. Poeta
competitivo entre as nações, e

da filantropia’
desejava retomar um espírito de A poeta norte-americana, galar-
colaboração, desejando chegar à doada com o Nobel em 2020,

E
Europa. morreu de cancro aos 80 anos,
deixando uma obra que podia ser
m 1964, tirou uma desapiedada e cruel, mas capaz
licença sabática e também de transformar o pensa-
ensinou física nu- mento em prece, e de louvar a
clear na Universida- existência sem a reduzir às mais 1931-2023 Escolheu viver uma vida modesta
de Livre de Bruxe- banais aspirações de conforto e
las, e não demoraria otimismo. Desde muito cedo,
muito para ser convidado a par- Glück virou-se para os livros, e
tilhar os seus conhecimentos não demorou muito a interessar-
em França. Este foi um ponto de -se por poesia, mas o que veio a
viragem na sua vida, acabando ser decisivo na sua formação foi
por se tornar diretor para a in- a anorexia nervosa, que a levou
vestigação do Centro Nacional ao ponto de quase morrer à
para a Investigação Científica fome. A partir dos 16 anos a sua
de França. Depois vieram os li- escolaridade tornou-se bastan-
vros, e o seu empenho em trans- te irregular, e passou sete anos
mitir o entusiasmo pela ciência em sessões de psicanálise de for-
que cultivaram nele os seus ma a livrar-se da doença. Dema-
pais. Esta sua segunda vida, nas- siado frágil para frequentar a fa-
ceu através do incentivo que re- culdade, Glück assistiu a aulas
cebeu de tantos amigos, que no Sarah Lawrence College e na
gostavam de o ouvir discorrer Universidade de Columbia, e
ao longo de horas sobre os mis- dois poetas que ali davam aulas
térios do cosmos, e foi dessa vieram a tornar-se mentores fun-
forma que surgiu um primeiro damentais, Léonie Adams e Stan-
esboço do livro Patience dans ley Kunitz. No entender do seu
l’azur, cujo título é um verso de amigo e crítico literário Dan
Paul Valéry (na edição portugue- Chiasson, «a anorexia parece ter

TWETTER
sa), publicada pela Gradiva na sido uma forma inicial e desa-
coleção orientada por Carlos Fio- jeitada de escrever poesia, cen-
lhais, tomou-se a liberdade de ir trada exclusivamente, e por isso
buscar a Mário Sá-Carneiro o ver- tragicamente, na forma». Os

E
so Um Pouco Mais de Azul. Na al- avanços que foi fazendo na psi- TEXTO Diogo Vaz Pinto em Elizabeth, e que não queria e vivia desde há muito num mo-
tura, aquele primeiro manuscrito canálise terão permitido substi- desligar-se dos vizinhos e ami- desto apartamento arrendado,
foi enviado a uma trintena de edi- tuir a anorexia através desse exa- ste não se ficou pela gos da infância. Se gozou à gran- em São Francisco. A sua morte
tores, e todos se recusaram a pu- me implacável das suas circuns- pregação aos pei- de e provou todas as iguarias e foi anunciada pela Atlantic Phi-
blicá-lo, por considerarem que a tâncias pessoais, ensinando-a a xes, nem ensaiou luxos desses paraísos que fazem lanthropies, um grupo de funda-
astronomia não interessava a lidar com a sua necessidade de nenhuma forma de de tantos homens monstros de ções que criou e financiou desde
ninguém. Quando Reeves já não controlar o efeito que o mundo proselitismo ou de indiferença, depois de ter ex- o início dos anos 1980. Em de-
via outro destino para o seu livro tinha sobre ela. ostentação das suas plorado o horizonte dos multi- zembro de 2016, com a doação
que não a gaveta, o físico Jean- virtudes morais, mas soube ser o milionários, comprando casas de 7 milhões de dólares à sua
-Marc Lévy-Leblond, que dirige a mais discretamente enfático ao nos lugares mais exclusivos, fos- alma mater, a Universidade de
coleção ‘Science ouverte’ das doar uma fortuna de milhares se em Nova Iorque, Londres ou Cornell, para o trabalho de ser-
Editions du Seuil, sugeriu-lhe que EFEMÉRIDE de milhões, tendo optado por vi- Paris, refúgios espantosos em viço comunitário dos estudan-
escrevesse um livro. Da gaveta ver uma vida mais modesta. Honolulu ou na Riviera France- tes, Feeney esvaziou oficial-
para os prelos foi um salto, e a Charles F. Feeney, um pioneiro sa, frequentando as melhores mente as contas da Atlantic
edição chegava aos escaparates das lojas duty-free e um investi- festas com a nata da nata, en- Philanthropies. Guardou apenas
em 1981, tendo os franceses aco- Julgamento de dor astuto em start-ups tecnoló- joou. Decidiu mudar de vida, e 2 milhões de dólares para o que
lhido aquela obra em que, em vez
de uma dissecação árida do cos-
Saddam Hussein gicas, colheu os frutos do seu
trabalho e, até aos 52 anos, des-
fê-lo sem trocar um tipo de os-
tentação e vícios de ordem eco-
chamou de provisões decentes,
de modo a garantir que os seus
mos, servia dele uma perspetiva 2005 Há 18 anos começava forrou-se das suas origens hu- nómica pelos de natureza mo- cinco filhos adultos tinham uma
enredante que tornava a sua ex- um julgamento repleto mildes, vivendo uma vida de ral. Doou quase toda a sua boa almofada, e tudo o resto que
ploração algo tão incitante como de controvérsia luxo. Mas, tendo nascido no seio fortuna de 8 mil milhões de dó- acumulou ao longo de seis déca-
a sensação de se ler um bom ro- de uma família irlandesa que vi- lares a instituições de caridade, das de negócios, acabou por ser
mance. «Disseram-me que teria Cerca de 677 dias após a sua cap- via em Nova Jérsia, nos EUA, posto à disposição de uma série
sorte se vendesse três mil exem- tura pelas forças dos EUA, um dos como recordou o The New York de causas e instituições de bene-
plares. Atualmente, vendemos ditadores mais famosos do sécu- Times, a partir de certa altura, ficiência em vários países, sendo
mais de um milhão de exempla- lo XX começou a ser julgado em não conseguia conciliar a fortu- Doou 8 mil milhões que Feeney tudo fez para escon-
res e está traduzido em mais de Bagdad. Tinha sido encontrado na e ostentação com os valores de dólares der a sua identidade, riqueza e
trinta línguas», declarava Reeves escondido num buraco em Ad que recebera na infância, sendo filantropia. Por essa razão, foi
ao Le Monde em 2002. Seguiram- Dawr, próximo de Tikrit, no no- filho de uma enfermeira e de um a instituições apelidado pela revista Forbes de
-se mais trinta livros. ● roeste do Iraque. operador de seguros, nascido de caridade ‘James Bond da filantropia’. ●
44 OPINIÃO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

➽ João Cerqueira ➽ Diogo Pacheco


The Legendary de Amorim
Meritocracy Man Hamas, ou o regresso da selva
cer as explicações, as justificações,
Além desta grande líder política o ‘sim, mas…’, os paralelismos for-
e deste grande cantor, e mesmo çados, as simetrias assimétricas. A
tendo em conta que Portugal é um culpa, não podendo ser atribuída
país de cunhas e padrinhos, a maio- ‘ao Passos’, recuou até Moisés e até
ria dos homens e mulheres que ao próprio Adão. Tudo serviu para
alcançam lugares de topo nas justificar o injustificável.
empresas consegue-o por terem De todas as falsas simetrias, a
dado provas de merecerem o cargo mais hipócrita funda-se na falsa
que ocupam. Se assim não fosse, as equiparação entre o exército israe-
empresas iriam à falência. E o CORTAR A DIREITO lita e os terroristas do Hamas, com
BRUXEDOS mesmo se verifica em todas as ati- estes promovidos a ‘combatentes’.
vidades onde os cidadãos compe- E falsa porque as Forças israelitas
tem pelo melhor lugar. O desporto Crianças decapitadas, as- combatem à frente dos civis, ser-
O mérito nada pode con- é um bom exemplo. Ronaldo, João sassinados de seguida, são vindo-lhes de escudo. Os terroris-
tra dois vilões: a interven- Sousa, Patrícia Mamona, entre a imagem mais forte das tas, esses combatem atrás dos
ção do Estado na econo- outros, conseguiram os resultados
muitas que nos chegaram civis, com estes a servir-lhes de
mia e a nomeação para e os proventos de que usufruem escudo. Toda uma ética os separa.
(sobretudo os dois primeiros) gra-
do avanço do Hamas so- Ouvindo hoje, no Parlamento, as
cargos políticos ças às suas qualidades e ao seu tra- bre o povo de Israel vozes do PCP e do BE, esses ecos da
balho. Graças ao mérito. extrema-esquerda global, e refletin-
Dito isto, o mérito nada pode contra do nas ‘linhas vermelhas’ que quase
dois vilões: a intervenção do Estado toda aquela santa gente ali sentada

M T
na economia e a nomeação para car- coloca ao Chega enquanto abre ser-
ariana Mortágua e gos políticos. Assim como a gravidade enho o hábito de pac- vilmente, de par em par, as portas
outros dirigentes do distorce o espaço e o tempo, estas tuar, e o estrito dever de aos estalinistas e aos troskistas que
BE consideram que a práticas distorcem a possibilidade de fazê-lo, com divergên- ali estavam na minha frente a tentar
meritocracia, ou os cidadãos subirem na vida graças ao cias de opinião, diferen- justificar o injustificável, pela pri-
seja, os cidadãos seu esforço. O elevador social é substi- ças de sensibilidade, meira vez temi seriamente pelo
alcançarem determinado estatuto tuído pelo elevador vermelho, rosa ou visões distintas do mundo e da futuro do mundo que herdámos.
na sociedade devido ao seu valor e laranja e, neste, só entra quem tiver o vida. Não posso, nem quero aceitar Esse mundo que reagia em uníssono
ao seu trabalho, é um mito. Afinado cartão do partido. Neste sistema, boys qualquer pacto, por ténue que seja, contra o holocausto e o Holodomor
pelo mesmo diapasão, o cantor e girls que nunca trabalharam, sem a com a inumanidade quimicamente e outros mais limitados surtos de
Paulo Furtado – The Legendary menor experiência profissional, per- pura, a ferocidade primeva. Em barbáries episódicas em uníssono e
Tigerman – declarou numa entre- feitos nabos e nabiças, podem ser suma, pactuar com o regresso da ‘sem mas nem meios mas’.
vista à revista Mutante que a meri- nomeados diretores de empresas selva ancestral ao próprio coração Tendo em conta o observável
tocracia era uma mentira. estatais, secretários de Estado, minis- do ecossistema humano. nestes dias decisivos, temo que esse
Fiquei baralhado. tros, videntes, ou outro cargo qual- Crianças decapitadas diante dos mundo se dissolva na paisagem.
Porque, na minha ingenuidade quer com um salário nunca inferior a pais, assassinados de seguida, são a Não sei se a selva amazónica está,
supus que o facto de Mariana 4 mil euros. imagem mais forte das muitas que ou não, em recuo. Mas sei, isso sim,
Mortágua ter chegado a czarina do Para mim, esta realidade nacional nos chegaram do avanço do Hamas que ela avança, imparável e som-
BE se deveu às suas qualidades e ao é uma desgraça. Jamais farei parte sobre o povo de Israel. O símbolo bria, pelos bairros in das metrópo-
seu esforço para promover o de um partido, não sei cantar, não perfeito desse regresso da selva les onde dormem aqueles que
Comunismo caviar, tendo por isso conseguiria vencer João Sousa nem primitiva. Isto seria já por si só comandam as grandes corporações
mesmo passado a perna a outros que ele jogasse com uma raquete de aterrador. Se por aí ficasse, poderia globais; que ela sobe pelos arranha-
candidatos menos competentes. matar moscas; e as únicas ativida- ser levado à conta de um fenómeno -céus onde nasce a informação que
De igual modo, o reconhecimento des que desempenho razoavelmen- localizado, um tumor encapsulado se distribui pela sombra daquilo
como músico de The Legendary te não dão grandes rendimentos. cirurgicamente extirpável. Mas que em tempos idos já foi uma forte
Tigerman deveu-se também ao seu Resta-me, pois, trocar as tintas e não. E o que nos faz temer pelo ruir e pujante classe média; que se
talento vocal, ao domínio dos ins- começar a desancar o mérito. das bases da nossa cultura euro- espraia pelos solenes palácios onde
trumentos e à sua mestria na elabo- Afinal, ao contrário de Mortágua e peia e da nossa civilização ociden- – pelo menos aparentemente – se
ração das letras; há muitos canto- Furtado, tenho boas razões para me tal é a indiferença com que isto foi desenham os destinos das nações.
res, mas raros atingem o nível de queixar. Na sequência desta vira- recebido no mundo sofisticado e Entre essas metrópoles e nas suas
Paulo Furtado. Ora, como Mariana gem de casaca, junto-me à próxima envernizado das falsas elites das periferias, vivem os ‘deploráveis’.
Mortágua e Paulo Furtado não se manifestação conjunta contra as capitais do mundo. Algumas horas Os que não foram desconstruídos
tornaram famosos e bem-sucedi- alterações climáticas, a habitação e após a descrição dos horrores vivi- pela Escola de Frankfurt. Que
dos devido a uma herança, por per- a discriminação dos Pokémones e dos, os grandes meios de comuni- casam e têm filhos que educam.
tencerem à Maçonaria ou à Opus desato também a vandalizar mon- cação e a ala esquerda política, a Com seguro bom senso, mesmo
Dei, ou por qualquer outra influên- tras capitalistas. de fora e a de dentro, apenas se que, tantas vezes, sem sombra de
cia secreta, apenas posso concluir Por fim, poderíamos fazer um trio preocupavam com o que poderia bom gosto. Neles, a selva não avan-
que eles próprios desmentem as de rua: o Furtado canta, a Mariana vir a acontecer aos terroristas, as ça. E serão eles que a farão regredir
suas afirmações. Mortágua e dança e eu parto janelas. ● exações que iriam ser cometidas ao ponto de partida. ●
Furtado são, por muito que lhes pelos ‘genocidas’ israelitas.
custe, a prova viva da meritocracia. www.joaocerqueira.com Rapidamente começaram a flores- Deputado do Chega
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt OPINIÃO 45

➽ Cláudia A. Nunes ➽ Eduardo B. Correia


Emergência climática – A O OE do sim porque sim
face luxuosa do marxismo e do não porque não
Europeia partilha este sentido de processos e na lógica de funciona-
urgência chegando a afirmar que: «É mento e estrutura da administração
preciso mais dinheiro para o clima» publica burocrática. Essas reformas
quando questionada sobre uma legisla- exigem um conjunto de reflexões,
ção que visa ‘taxar os lucros excessivos’ conhecimento e talento que, infeliz-
das empresas produtoras de energia. mente, não está ao alcance do gene-
A nível nacional, ou a nível mun- ralizado fraco nível de talento huma-
dial, a premissa é a mesma: não exis- no presente no Governo;
te dinheiro público. Existe dinheiro 4. Mantem a lógica da prepotência
que foi retirado aos contribuintes e fiscal contribuindo para a despromo-
OPINIÃO que não tiveram qualquer hipótese A PONTA DO ICEBERG ção dos incentivos à criação de
de escolha no seu destino. riqueza o que naturalmente conti-
Em 2021, em Portugal o peso dos nuará a desincentivar a promoção
Algumas das metas a que impostos com relevância ambiental no Este Orçamento poderia do mérito e a retenção dos melhores;
se propõe o Pacto Ecológi- total das receitas de impostos e contri- perfeitamente ter sido 5. Este Orçamento poderia perfei-
co Europeu dificilmente buições sociais correspondeu a 6,6% apresentado pelo Gover- tamente ter sido apresentado pelo
podem ser implementadas sendo mais do que a média Europeia. no de Passos Coelho... Governo de Passos Coelho e, sendo
Se observarmos algumas das metas essas as circunstâncias, o então
a que se propõe o Pacto Ecológico líder parlamentar, atual presidente
Europeu, depreendemos que dificil- do PSD, teria defendido de forma
mente podem ser implementadas sem energética o documento proposto;
que haja um aumento de preço para o 6. Não se entende a posição de

D A
consumidor final, já que impõem uma PSD, não por não ser legitima, mas
e forma nacional e glo- serie de restrições e imposições a s várias argumentações apenas porque entrou na fase do
bal temos assistido a um diversos níveis e em vários setores. que por um lado são fei- não porque não, sim porque sim e
fenómeno que parece E continuamos a pagar. Mas nunca tas ao Orçamento, e as ultimamente com recurso a voca-
fazer pouco sentido, chega. E os alertas continuam: O fim diversas críticas por bulário impróprio para quem deve-
especialmente na reali- está próximo. outro, são em minha ria estar a construir uma alternati-
dade nacional, num país que recen- E de repente, ‘os jovens’ sentem opinião demonstrativas dos obstácu- va de visão estratégica uma alter-
temente se pode dizer mais pobre ‘ansiedade climática’ – uma nova los que considero estarem na base nativa de reformas, uma alternati-
que a Roménia. condição que os isenta de qualquer do impasse em que a sociedade por- va de Orçamento e uma alternativa
Se isto deveria ser matéria de refle- tipo de responsabilidade e tudo justi- tuguesa se encontra e que me levam de governo. Deste modo, dificil-
xão profunda, preocupação e ansie- fica. Basicamente todo e qualquer a tecer as seguintes considerações: mente a social democracia merito-
dade em jovens e menos jovens, con- atentado a pessoas e propriedades é 1. O Orçamento apresenta diversos crática chegará à governação.
siderando que é quase certo que os olhado com uma preocupante con- aspetos cuja lógica ostenta consistência Por fim, é também relevante cha-
jovens portugueses têm o seu futuro descendência social. na elaboração o que, para minha sur- mar a atenção para a discrepância
traçado: Pobreza, ou imigração. O seu objetivo é claro e transcende presa, me leva a concluir que Fernando entre o discurso e as ações do atual
Parece que há algo que se sobrepõe a a mera preocupação ambiental: anti- Medina está melhor na pasta das finan- presidente da Câmara de Lisboa. A
este medo de futuro hipotecado, ou -capitalismo. Estes ‘ativistas’, que ças do que esteve enquanto presidente cidade está cada vez mais agressiva e
até a uma reflexão racional sobre ter- claramente têm o privilégio de não da Câmara de Lisboa; caótica no que ao trânsito, segurança,
mos chegado aqui: sentir as consequências financeiras 2. Apresenta, na boa tradição de limpeza, transportes públicos e quali-
A emergência climática. das políticas que defendem são tam- gente séria, contas certas, o que é dade dos jardins diz respeito, bem
«Acabou a Era do aquecimento glo- bém anti-capitalistas. muito pertinente permitindo a como o foco e respeito que os serviços
bal e começou a da ebulição global», Os ‘ativistas climáticos’ querem diminuição gradual do nível de administrativos demonstram pelo
garante António Guterres que ocasio- impor um modelo de sociedade sem endividamento que efetivamente cidadão. Desde junho que aguardo
nalmente, como um cavaleiro do apo- consumo, e sem liberdade (dos estrangula a economia portuguesa, que me sejam entregues umas plantas,
calipse nos relembra que o fim está outros), em que a preocupação com particular relevância numa que se encontram digitalizadas, de um
próximo, e estamos em cima do prazo. ambiental é apenas um belo candela- fase de aumento de taxas de juro; apartamento de que sou proprietário.
Este discurso parece ser ampliado por bro que esconde a verdade sobre 3. Este Orçamento é também Não se notam diferenças qualitativas
todos os decisores mundiais. este modelo: Marxismo. demonstrativo da incapacidade do positivas nem na cidade nem da quali-
A questão fundamental sobre o Ignorando que apenas o ser huma- Governo em apresentar qualquer dade do serviço administrativo e buro-
poder é que quem o tem, pretende no com recurso a capital e tecnolo- reforma de fundo no que à maior efi- crático provenientes deste mandato. A
mantê-lo. E ainda que a ação huma- gia, pode evoluir para soluções que ciência na gestão de recursos públi- boa gestão faz-se com boas ações não
na possa ser um dos fatores a consi- visem a conservação. cos respeita ou ainda no modo como tanto com boas palavras. É no fazer
derar quando se fala de alterações Mas isto nunca foi sobre conservação, visionamos, estrategicamente, o bem feito que as fragilidades de gestão
climáticas, não é sensato abordar ambientalismo, ou sobre sustentabili- crescimento da economia portugue- em Portugal se fazem notar e dura-
esta questão sem referir o interesse dade. Isto é sobre a imposição de um sa – a lógica de pedinte à Europa tem mente duas das principais instituições
na existência deste medo. ‘novo modelo de sociedade’ – Sem con- estado demasiado enraizada nos publicas, o Governo e a Câmara
Se existir medo, existe recetivida- sumo, sem posses, sem classes, sem lei: sucessivos governos dos últimos 20 Municipal de Lisboa não mostram
de à aceitação de medidas, geral- Marxismo. ● anos e não se vislumbra nem neste exemplo de mudança do paradigma.
mente restritivas da liberdade indivi- Orçamento, nem neste governo, Big problem! ●
dual para levar a cabo ‘a salvação’. Coordenação Ladies qualquer indicio de mudança no que
Também a presidente da Comissão of Liberty Alliance – Portugal de tão mal feito está montado nos CEO do Taguspark, Professor universitário
46 OPINIÃO nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

➽ António Manuel de Paula Saraiva


Da necessidade da Paz
– o pulmão da Terra – encolhe que outras nações as viessem a América do Norte, da Europa o aquecimento global –, é outro
de ano para ano. O número e produzir. (incluindo a Rússia), o Japão, e evidente exemplo de um pro-
variedade de animais dimi- Mas o estado de guerra já até, recentemente, a China – blema que afeta todos os países
nuem – um problema recente é provocou danos muito graves a defrontam-se com o problema e que só pode ter algum suces-
a redução do número de abe- esse tratado. Além dos ‘cinco de terem uma taxa de mortali- so se ‘todos cumprirem’.
lhas, que têm um papel único magníficos’, Israel, Índia e dade inferior à de nascimentos. E a substituição das formas
na polinização das flores de Paquistão já possuem armas Ora, como quem sustenta os tradicionais de energia (ener-
muitas das plantas cultivadas, e nucleares. E a eles juntou-se a reformados é quem trabalha, gias fósseis, nomeadamente o
na consequente formação dos Coreia do Norte. As armas fica cada vez mais difícil asse- petróleo e o gás natural) por
frutos. Os barcos rapam os nucleares começam a ser vistas gurar uma reforma digna para energias ‘limpas’ tem custos
OPINIÃO oceanos com sofisticados não como uma gravíssima aqueles que toda a vida traba- elevadíssimos.
métodos de pesca, pondo em ameaça a toda a Humanidade, lharam. E se aumentarmos a Outras questões. Sendo os
risco pescas futuras. Mas, mais mas como um ‘seguro de vida’: percentagem do PIB destinada problemas referidos os mais
Quanto mais um Estado uma vez, se um ou mais países quem delas disponha não pode ao armamento, só iremos pio- prementes, outros há que só
se sentir em risco (real ou estão lutando por ganhar uma ser atacado, pois poderá usá- rar a situação. poderão ser resolvidos ou
imaginário) de ser ataca- guerra, ou foram postos fora da -las na resposta. Assim, quanto Relacionados com esta ques- minorados com um ‘clima de
do, mais vontade tem de comunidade das Nações, esta- mais um estado for considera- tão, estão os custos de saúde. paz’ a nível do planeta.
rão muito interessados em do ‘pária’ – e, por isso, mais em Vivendo as pessoas mais Exemplos são a troca de
usar armas nucleares. manter as quotas de pesca? risco (real ou suposto) de ser tempo, e tratando a medicina conhecimentos científicos
A Paz e a proliferação das armas atacado –, mais vontade tem de de cada vez mais doenças, os geradora de progresso (recor-
nucleares. Após um período em as ter; são exemplos a União gastos com a saúde não deixa- de-se a necessidade da trans-
que as novas (à época) armas Soviética (que se sentia amea- rão de aumentar. ferência de dados fiáveis sobre

T
atómicas foram testadas livre- çada, nos tempos de Estaline, O mesmo se passa com a edu- as pandemias e outras doen-
em-se falado muito mente em desertos ou pequenas pelos Estados Unidos), Israel cação. Sendo as sociedades ças), os crimes informáticos e
de guerra, justiça, ilhotas no alto mar, houve uma (ameaçada pelo conjunto dos cada vez mais complexas, o o terrorismo internacional.
vingança. Mas … não consciencialização dos riscos países árabes), a África do Sul tempo dedicado aos estudos Todos Diferentes, todos
teremos de falar de das radiações provenientes des- (ostracizada nos tempos do aumenta. No Estado Novo afir- Iguais, todos Irmãos. Estes
Paz? ses ensaios para a saúde das apartheid, e que por pouco não mava-se que ‘ler, escrever e factos de todos conhecidos
Falar de paz nos dias de hoje futuras gerações, e em 1963 pas- as obteve), a Coreia do Norte, o contar bastam para a maioria evidenciam bem que os pro-
significa, antes de mais, querer sou-se às experiências no subso- Irão, que as tenta obter… Estes dos portugueses’. Daí passou- blemas graves que o mundo
parar o sofrimento e a destrui- lo. Mas também estas tinham ris- exemplos mostram o perigo da -se aos 6 anos obrigatórios, atravessa só poderão resolver-
ção das populações dos países cos, e em 1996 foram banidas. E existência de um ‘clima de depois aos nove, estando agora -se num clima de paz, e com
em guerra. Mas a nós, aos mais: as nações possuidoras guerra’, e dos riscos de existi- nos doze. E atualmente, mesmo imensas somas de dinheiro,
demais cidadãos do mundo que desse tipo de armas (Estados rem ‘estados pária’. E o facto depois de ‘licenciados’, muitos pelo que os gastos numa corri-
estão longe do campo de bata- Unidos, França, Inglaterra, da Rússia, já durante a guerra profissionais têm de frequentar da armamentista agravam tre-
lha, interessa a paz? China e União Soviética) assina- na Ucrânia, ter transferido ‘cursos de formação’. Isso é mendamente a solução desses
A Paz e os migrantes. Um dos ram em 1970 o Tratado de Não armas nucleares para a compatível com um ‘estado de problemas.
problemas mais prementes do Proliferação Nuclear. Segundo Bielorrússia. a somar às recen- guerra’, com o aumento das E a finalizar recordarei a
mundo atual é o dos muitos este, as nações subscritoras tes declarações deste país de verbas destinadas eufemistica- Declaração Universal dos
milhões de habitantes da metade comprometiam-se a não passar que poderia sair do Tratado mente à ‘defesa’? Direitos do Homem na qual,
Sul do nosso planeta que querem a outras nações a tecnologia que proíbe os ensaios nuclea- A Paz e o aquecimento global. logo no Artigo Primeiro, está
chegar à ‘rica’ metade Norte, em para o fabrico dessas armas, a res são um mau presságio. O controlo da taxa de anidrido escrito: «Todos os seres huma-
ondas de proporções bíblicas. não as transferir para os ‘paí- A Paz e a Segurança Social. As carbónico no ar – gás cujo nos nascem livres e iguais em
Esse fluxo deve-se a uma ses não nucleares’, e a obstar a sociedades mais evoluídas – da aumento tem vindo a provocar dignidade e direitos. São dota-
causa mais profunda: o grande dos de razão e consciência e
fosso entre países ricos e países devem agir em relação uns aos
pobres. E é evidente que a ele- outros com espírito de frater-
vação da qualidade de vida dos nidade». E já no Prólogo a esta
habitantes desse ‘Sul pobre’ Declaração se afirmava «ser
exigirá um imenso esforço essencial promover o desen-
financeiro, ou seja, sacrifícios volvimento de relações amis-
por parte dos países mais ricos. tosas entre as nações». Sim,
Mas… haverá dinheiro para isso cada homem, cada mulher, é
quando as mentes e as finanças diferente dos demais pelo seu
estão focados na guerra? código genético, pela civiliza-
A Paz e a exploração sustentá- ção em que veio à luz, e pelas
vel dos recursos do Planeta. suas histórias pessoais. Mas
Num planeta finito, a ação do sim, todos iguais em
Homem sobre os meios natu- Dignidade, e todos Irmãos,
rais – a Terra, o Ar, o Mar, as ligados pelos ensinamentos
Plantas, os Animais – não pode dos homens bons, e, em nossos
continuar a aumentar. Em mui- dias, para o bem e para o mal,
tas cidades, o ar é irrespirável, pela globalização. ●
os plásticos envenenam os
mares, a floresta do Amazonas Arquiteto paisagista
20 OUTUBRO 2023 nascerdosol.pt OPINIÃO 47

F
➽ Luís oi recentemente aprovada pelo
Parlamento a alteração ao
disciplinares, privando assim os
Advogados o direito ao julgamento pelos
os tradicionais actos próprios da profis-
são de Advogado passarão a ser atribuí-

Menezes Leitão Estatuto da Ordem Profissionais,


bem como uma nova Lei dos
seus pares. Finalmente é instituído um
Conselho de Supervisão, maioritaria-
dos a entidades sem quaisquer compe-
tências para o efeito, deixando os cida-

As alterações Actos Próprios dos Advogados e


Solicitadores. As alterações foram impos-
mente composto por pessoas estranhas à
profissão, com amplas competências, o
dãos altamente lesados. Mas ao mesmo
tempo a profissão de Advogado ficará

ao Estatuto da OA tas pelo PS a toda a velocidade, sem prati-


camente debate algum, a pretexto de que
qual se destina mais uma vez a vigiar os
órgãos eleitos pelos Advogados. Podemos
altamente desvalorizada, com a retirada
de grande parte das competências exclu-
não se poderiam perder verbas do PRR, dizer que, com estas alterações, deixou sivas que até agora possuía.
que teriam sido condicionadas à aprovação de existir democracia na Ordem dos Marcello Caetano escreveu que o
desta lei. Não houve qualquer explicação Advogados, uma vez que os Advogados Direito Público não é senão a limitação
sobre qual o montante em euros que esta- perderam o direito de eleger quem efec- jurídica do poder político e que essa
ria dependente de serem aprovada estas tivamente os represente. limitação só pode resultar da existência
leis, mas suspeitamos que esse valor não A situação dos Advogados é ainda de outros poderes na sociedade para
deve andar muito distante dos trinta especialmente agravada com a retirada além do poder político. Este Governo e
dinheiros de que falam as escrituras. da maior parte dos actos próprios da sua este Parlamento, com a complacência
A legislação aprovada tem como único profissão, que fica praticamente reduzi- do Tribunal Constitucional, destruíram
objectivo colocar a Ordem dos da ao mandato forense. Efectivamente a a tradicional independência que a
Advogados debaixo do controlo do poder consulta jurídica passa a poder ser reali- Ordem dos Advogados sempre teve,
EXAME PRÉVIO político. Por esse motivo é instituído um zada por simples licenciados em direito. incluindo durante o Estado Novo. Exige-
Provedor dos Clientes para vigiar a actua- A elaboração de contratos passa igual- -se por isso que esta legislação aberran-
ção dos órgãos da Ordem dos Advogados, mente a poder ser praticada, não só por te seja rapidamente revogada. Quando
A legislação aprovada tem uma espécie de Diácono Remédios, licenciados em direito, mas também por fizer cem anos, a Ordem dos Advogados
como único objectivo colocar a estranho à Advocacia e que por tudo e sociedades comerciais, como sua activi- terá que ser a mesma instituição criada
Ordem dos Advogados debaixo por nada aparecerá a censurar as deci- dade acessória. E a negociação tendente pelo Decreto 11.725, de 12 de Junho de
do controlo do poder político. sões dos órgãos democraticamente elei- à cobrança de créditos pode ser efectua- 1926, onde nunca poderão ter lugar pro-
tos pelos Advogados. Da mesma forma da por sociedades comerciais com esse vedores e outras entidades externas
são colocadas pessoas estranhas às objecto, sendo assim ressuscitado o céle- destinadas a policiar os órgãos eleitos
Ordem dos Advogados nos seus órgãos bre cobrador do fraque. Com tudo isto pelos Advogados. ●

A
Comissão Europeia avisa sua plataforma continental, tem em mar Registe-se quando protestamos contra
➽Virgílio Portugal. Ameaça para o 20 vezes a superfície politica terrestre. mais minas ou plataformas marítimas para

Machado Tribunal de Justiça.


Incumprem-se planos de ges-
Surpreenda-se. A França, com exten-
sões no Pacífico, Nova Caledónia e
exploração petrolífera.
A geopolítica é climática. A economia

Geopolítica tão das bacias hidrográficas e


de riscos de inundações. A água é o ativo
Polinésia é o maior país marítimo do
mundo. Com Portugal e Dinamarca ocu-
que melhor protege a Terra é a circular.
Conhecermos o impacto poluidor do

da água: geopolítico português mais precioso.


Conjunto de litorais marítimos, áreas flu-
pam a lista dos 20 primeiros. Consórcios
e economias de escala a realizar em tec-
consumo e mitigá-lo com consumos
moderados ou reciclagens sustentáveis.

colapso viais, bacias hidrográficas, lençóis freáti-


cos, nos estuários de cidades ou na deli-
nologia, industria e energias renováveis
off-shore no mar oceânico com estes paí-
A geopolítica propõe um caminho: socie-
dades planeadas, organizadas e informa-

ou esperança? mitação de municípios. Preocupados,


ouvimos o aviso. Com secas, incêndios,
ses da União Europeia? O potencial da
economia azul é incomensurável.
das no seu domínio público, explorando
matérias-primas para produção de ener-
ondas de calor, inundações, abeirar-nos- Portugal necessita de uma estratégia gias/produtos permitirão base sólida
-emos de um colapso geopolítico da água? geopolítica de recursos naturais da água para bens públicos. Para defender direi-
A sua estabilidade para uso doméstico ou que providencie, com inteligência, tos como habitação, saúde, justiça, edu-
industrial, produção de energia, suporte ali- incluindo diplomática, designadamente, cação, precisamos produção. Com o
mentar agrícola e pesqueiro devia ser foco a exploração eficiente do mar, combinan- ativo fundamental da água ao seu servi-
das politicas públicas. Cartografia, mapas do esse recurso fundamental com ener- ço. Veja-se o Fundo Petrolífero da
de riscos, medição de reservas, incluindo gias intermitentes (exemplos: sol, marés, Noruega, pais marítimo e insuspeito em
algorítmicas, assegurariam o controlo e ventos), reciclando usos (exemplos: água ambiente. Inspire-se para Portugal.
direção de fluxos aquíferos possibilitando do mar potável, aguas residuais), redu- O mar, para prospeção de energia (petró-
segurança de populações e atividades eco- zindo dependência energética e afirman- leo, gás, metais raros) na ZEE e extensão da
nómicas. Soberania significa controlar do-se geopoliticamente no mundo. plataforma continental off-shore, para
recursos estratégicos sobre domínios públi- Vivem-se tempos de protesto climático. investigação da vida biológica e marinha e
OPINIÃO cos, incluindo, captação da água e regular Contra Injustiças distributivas do capitalis- de recursos pesqueiros é um mundo neces-
suas capacidades de carga e utilização. mo ou seu modo de vida? Estarão os ativis- sitado de cartografia, planeamento, gestão
97% da água do planeta está no mar. tas cientes do impacto físico dos telemó- de usos e mapa de riscos. Não é um filão ou
Vivem-se tempos de protesto Quanto tempo nos resta para a dessalinizar veis, digitalização e energias renováveis? E um Eldorado. É um recurso geopolítico.
climático. Contra injustiças para uso potável? 71% das superfícies do da brutal produção de energia para sua Que a sociedade e o Estado português nele
distributivas do capitalismo planeta são marítimas. Segundo o World satisfação? De baterias elétricas e metais trabalhem afincadamente e com inteligên-
ou seu modo de vida? Atlas, Portugal é o 20.º país do mundo em raros como componentes? Saberão como cia. Também artificial. ●
extensão marítima de zona económica cinicamente o mundo ocidental exporta a
exclusiva (ZEE). Com uma área de dois sua poluição mineira para a China ou des- Professor e autor de Portugal Geopolítico –
milhões de km2 e potencial extensão da peja o e-lixo em países pobres de África? História de Uma Identidade

FICHA TÉCNICA: Diretor: Mário Ramires; Diretor Executivo: Vítor Rainho; Diretor Executivo Adjunto: José Cabrita Saraiva; Diretor de Arte: Francisco Alves; Conselheiro Editorial: José António Saraiva; Conselho
de Administração: José Saldanha Bento, Luís Santos e Pedro Vargas David; Fiscal Único: Vítor Vale; Departamento Financeiro: Conceição Salvador (TOC); Redação e sede do proprietário/Editor: Newsplex, S.A.;
Taguspark. Núcleo Central, sala 371, 2740-122 Porto Salvo, Oeiras; NIPC: 513766073, Matriculada na CRC de Lisboa sob o n.º 513766073, Capital Social 755.020 euros, Detentor de 98,21% do capital: Sunny
Meridian - Unipessoal, Lda.; Registo ERC 223939; Telefone Redação 211 976 146; Email geral@newsplex.pt; Edição Online www.nascerdosol.pt; Emails opiniao@nascerdosol.pt; cartasaodirector@nascerdo-
sol.pt. O estatuto editorial do Nascer do SOL encontra-se disponível em: https://sol.sapo.pt/estatico/estatutoeditorial; Impressão: Sogapal Distribuição VASP; Depósito legal 247835/06; Registo ERC 125004;
Tiragem média no mês de setembro: 25.000 exemplares
SOL
00895
NASCERDO

5 607727 125013

2023/10/20 6ªFeira

ROBERTO MARTÍNEZ
Continua sem reunir o consenso entre
os comentadores (há quem não lhe per-
doe ter nascido em Espanha), mas o fac-
to é que conseguiu um apuramento bri-
lhante para o Euro-2024, com algumas
exibições de alto nível. Oito jogos, oito
vitórias, 32 golos marcados, dois sofri-

Álvaro Siza dá nome


dos. Parece fácil, mas não é.

a nova ala de Serralves


JOSÉ LUÍS CARNEIRO
António Costa Museu de Serralves, de 1999, com o
qual Siza tem mantido uma colabora-
Com o fim do calor e a época dos in-
cêndios florestais oficialmente fecha-
e Adão e Silva ção estreita) mostra que aos 90 anos o da, é justo que se diga que este foi um
inauguraram o novo arquiteto continua sem medo de ino-
var. Os jogos geométricos, seja no te-
dos melhores anos de que há memó-
ria no que respeita a esse flagelo. E as
espaço do museu. to, seja nas janelas e aberturas triangu- condições meteorológicas – um ve-
lares (na foto) do átrio, mostram uma rão quente, seco e muito prolongado

A
linguagem menos depurada do que o – nem ajudaram. O ministro está de
os 24 anos, o Museu de Serral- habitual. A relação com o jardim é uma parabéns.
ves continua a crescer. A insti- constante.
tuição portuense tem um novo O espaço estende-se a poente do mu-
espaço, que foi inaugurado on-
tem pelo primeiro-ministro,
pelo ministro da Cultura e pelo presi-
seu, tem 4200 metros quadrados e di-
vide-se por três pisos com diferentes
funções – um para as reservas, outro
SOMBRA
dente da Câmara, Rui Moreira, com para expor a coleção permanente e ou-

FILIPE BRAGA
Ana Pinho como anfitriã. tro dedicado à arquitetura de Siza. A pri-
A Ala Álvaro Siza, cuja designação meira exposição da nova ala está previs-
homenageia o autor do projeto (e do ta para 2024.

Pinto Luz escreve carta aberta a António Costa CARLOS CORTES


O novo bastonário dos médicos diz

M
pouco mais do que lugares-comuns –
iguel Pinto Luz acusou o primeiro- Em carta aberta, o ex-secretário de Estado tirando a proposta, difícil de com-
-ministro de prestar «falsas decla- das Infraestruturas no segundo Governo de Pas- preender, de reduzir o horário sema-
rações» no Parlamento sobre a TAP. sos Coelho e atual vice.presidente do PSD diz nal de 40 para 35 horas, quando o pro-
Em causa estão as declarações de que «o primeiro-ministro tem o direito de ser blema é a falta de profissionais. Não
António Costa no debate quinzenal habilidoso e ardiloso», mas «não tem o direi- fala bem como um bastonário, mas
segundo as quais, em 2015, «um Governo, já to de caluniar e adulterar a verdade». mais como um sindicalista. Não está
demitido, assinou uma carta de conforto que Miguel Pinto Luz escreve ainda que «prefe- a começar bem.
é um verdadeiro escândalo nacional», assen- ria» que António Costa «corrigisse as suas pa-
te na ideia de que o Estado iria assumir as dí- lavras» no «formato que entender», «nem que
vidas já depois da gestão do privado – «Foi seja às três da manhã», acrescentando que só
isso que Miguel Pinto Luz assinou irrespon- «a necessidade política justifica as acusações
savelmente às três da manhã». que (o primeiro-ministro) fez».

ANTÓNIO COSTA
Reprivatização da TAP é Novo CEO para Banco Crescimento do PIB O primeiro-ministro diz uma coisa e o
‘pelo país’, diz Galamba Português de Fomento entre 1,2% a 1,6% seu contrário com uma descontração
impressionante. Esta semana ouvimo-
PORTUGAL «A decisão de reprivatiza- PORTUGAL Bruno Filipe Rodrigues é o PORTUGAL O Fórum para a Competiti- -lo reconhecer que afinal não foi Bruxe-
ção da TAP é uma decisão pelo país, nome apontado para administrador exe- vidade estima um abrandamento do cres- las que exigiu a privatização da TAP. «Ex-
pela economia, pela soberania nacio- cutivo do Banco Português de Fomento cimento da economia portuguesa, de 6,8% pressei-me mal», disse. O problema não
nal face à posição estratégica da compa- com o pelouro financeiro. Atualmente, é em 2022 para entre 2% e 2,2% este ano e foi ter-se expressado mal, foi ter tentado
nhia aérea», afirmou o ministro João administrador executivo da COSEC e con- entre 1,2% e 1,6% em 2024. No que diz res- enganar os portugueses e atirar para a
Galamba, juntando que o processo de ta com mais de 20 anos de experiência no peito à inflação, prevê um abrandamen- Europa o ónus da privatização. Nunca é
reprivatização «não será como o pro- setor bancário e segurador, exercendo to de 7,8% em 2022 para entre 4,6% e 5% nada com ele...
cesso danoso de 2015, à porta fechada». funções em Portugal e Reino Unido. em 2023 e 2,8% e 3,6% em 2024. José Cabrita Saraiva
Amanhã
Portugal
DIRETOR
Luís Ferreira Lopes

www.amanha.pt
20.10.2023
Semanal
Ano 1
Nº 6

Choque
Fiscal
Baixar
impostos
e cortar
despesa
Critical Software 12 SUCESSO.PT

2 SIM OU NÃO
Tecnológica quer Critical Software fatura cer-
ca de 100M€ e tem 1300 co-
“O OE 2024 tem um cresci- duplicar volume laboradores. A tecnológica,
mento substancial da carga de negócios nascida em Coimbra, atua
fiscal e isso tem sido contínuo em áreas como a Aeronáuti-
nos últimos anos”, critica ca, Espaço, Ferrovia ou Tele-
o fiscalista Carlos Lobo. comunicações. João Carrei-
João Leão, ex-ministro das ra, CEO da empresa, revela a
Finanças, afirma que tem havido sua estratégia de liderança e
uma redução dos impostos e que como superou os desafios.
“Portugal é praticamente o
único país que está a reduzir
significativamente os impostos
no próximo ano. Somos dos pou-
Empresas
cos países da Europa em que no A rábula do Certificado de PME
salário mínimo não se cobra
IRS”, acrescenta. 6 OPINIÃO/PODCAST
Afinal, há ou não margem para Rafael Campos Pereira, mem-
um choque fiscal, por exemplo, bro da Comissão Executiva da
de 50% no IRC? O ex-secretário CIP, critica “a carga burocráti-
de Estados dos Assuntos Fiscais, ca e as redundâncias” para a
Carlos Lobo, defende que “tem obtenção do Certificado de
de haver um choque, mas um PME, ilustrando com um exem-
choque que, para terminar na plo concreto os “detalhes qua-
área fiscal, tem de começar na se anedóticos” deste processo.
área da despesa”.
Quanto à despesa, o ex-ministro
e ex-secretário de Estado do Finanças 16 CAUSA PÚBLICA
Orçamento, João Leão, avisa
que a “tendência de envelheci-
Públicas António Ramalho, economista
e presidente do Conselho de
mento da população vai sobre- Crescimento Administração da Fundação
carregar muito a despesa” e e sair da média Batalha de Aljubarrota, reflete
acrescenta que Portugal é um sobre a evolução do país que
dos países que mais vai envelhe- deve ser o afirma estar “acomodado, de-
cer nos próximos anos. desígnio coletivo sistido e mesmo anestesiado”.
Veja o vídeo do debate completo Leia a crónica e oiça o podcast
e oiça o podcast em amanha.pt Pensar Amanhã em amanha.pt
50 PORTUGAL AMANHÃ amanha.pt 20 OUTUBRO 2023

➽ Luís Ferreira Lopes


Choque fiscal e o
desígnio do crescimento
tinua independente e até crítico
deste governo) a responderem à
pergunta desta edição do “Sim ou
Não”: é possível um choque fiscal
para estimular o crescimento eco-
nómico, aliviando o esforço sobre
empresas e o que resta da classe
média? Há ou não margem para
baixar impostos, se a prioridade
deve ser crescer, pelo menos, 2%
BÚSSOLA ao ano, num cenário sombrio para
Portugal, a Europa e o mundo, nos
próximos anos?
Reduzir impostos e cortar
na despesa pública é
No debate – que pode ver, ouvir e
ler em multiplataforma no Portugal
CARLOS
essencial para estimular o
crescimento económico.
Amanhã –, Carlos Lobo considera
que “a revogação do regime dos
LOBO
residentes não habituais é o aspeto
Ex-secretário de Estado
dos Assuntos Fiscais
mais negativo da proposta de OE” e
deixa outra nota negativa: “para
um jovem qualificado, os primeiros

H
á mais vida para além
escalões de IRS são altamente
punitivos.” Quanto aos jovens e sua “Temos um crescimento
substancial da carga fiscal”
do orçamento”, afir- retenção no país, João Leão avisa:

A
mava, em abril de “é preciso garantir que Portugal
2003, o antigo aumenta muito a produtividade
Presidente Jorge nos próximos anos e que isso pro-
Sampaio que coabitava com o XV voque um aumento dos salários”, questão do choque fis- como também de toda uma série de ins-
governo (PSD/PP), liderado por até porque, salienta o ex-ministro, cal, a meu ver, é clara. trumentos que estão relacionados com
Durão Barroso e com Manuela “nos próximos 10 a 20 anos, vamos Nós, neste momento, te- o IRC, mas também falamos de tributa-
Ferreira Leite na pasta das ficar com um mercado de trabalho mos efetivamente um ções autónomas, de contribuições ex-
Finanças. Vinte anos depois, todos mais qualificado do que a média choque fiscal, mas é con- traordinárias sobre o setor energético
estamos de acordo que é crucial europeia.” tra nós, ou seja, temos de ou sobre o farmacêutico, taxas de segu-
ter finanças públicas saudáveis, A propósito de quadros qualifica- facto um crescimento rança alimentar mais.
controlar o défice orçamental (de dos, esse já é caso da Critical exponencial da carga fis- Há toda uma miríade de outras contri-
preferência, alcançar superavit) e Software, a empresa que analisa- cal ano após ano.------- buições que para maquilhar uma não su-
reduzir a elevada dívida pública mos no Sucesso.pt, com forte apos- Mesmo este ano, de bida do IRC têm sido sectorialmente cria-
abaixo dos 100% do PIB. Porquê? ta em engenheiros que, a partir de acordo com os mapas do das, tendo como alvo algum sectores que
Porque estes são sinais vitais de Coimbra ou de Lisboa, trabalham orçamento do Estado são apelidados de “ricos”, no sentido de
credibilidade junto dos mercados para multinacionais da indústria para 2024, temos um crescimento subs- não subindo a taxa do imposto, arrecadar
– que emprestam dinheiro ao automóvel e aeronáutica e garan- tancial da carga fiscal, e isso tem sido con- mais receita das empresas.
Estado português. E porque geram tem o crescimento da empresa. tínuo nos últimos anos. Isso destrói a harmonia do sistema e cria
confiança junto dos agentes eco- Fundada e co-liderada por Gonçalo Se Portugal se quer manter competiti- um modelo de desagregação, de incerte-
nómicos e contribuintes portu- Quadros e João Carreira, a Critical vo, tem de se tornar mais eficiente e a efi- za e de complexidade que não é desejável.
gueses – que suportam uma enor- Software prevê duplicar a fatura- ciência traduz-se na redução necessária Por isso, quando nós dizemos que a nos-
me carga fiscal. ção. É uma entrevista que pode do encargo fiscal, porque o encargo fiscal sa taxa de IRC é de 21, etc., isso não é ver-
Apresentado o OE 2024 – que ver em vídeo, ouvir em podcast e em si mesmo gera uma ineficiência na es- dade, porque depois ainda temos a derra-
traz algum alívio no IRS, mas ler aqui no jornal e também no site trutura produtiva. ma estadual, ainda temos toda uma série
aumenta impostos indirectos e não amanha.pt Por essas razões, e tendo em considera- de sobretaxas e de contribuições que po-
mexe no IRC, nem traz novidades Destaque final para as crónicas e ção a acérrima concorrência internacio- dem fazer com que a tributação efetiva
para as empresas – desafiámos conversas em podcast de Rafael nal com o nosso país enfrenta, temos de duplique ou mais do que duplique a taxa
João Leão (ex-ministro das Campos Pereira e de António repensar o nosso sistema fiscal de uma for- nominal de IRC.
Finanças de António Costa) e Ramalho. ● ma séria e isso passa por um choque, mas Por isso, a questão de um choque fiscal na
Carlos Lobo (fiscalista e ex-secretá- um choque que para terminar na área taxa de IRC até poderia não ter efeito por-
rio de Estados dos Assuntos Fiscais luis.ferreira.lopes@newsplex.pt fiscal tem de começar na área da despe- que de facto a receita lateral que é alcança-
de um governo socialista, mas con- Oiça o podcast Bússola em amanha.pt sa e esse parece-me ser o ponto de par- da supera ou compensa esse modelo. ●
tida para uma discussão sobre a carga
fiscal em Portugal.
Ficha Técnica. Diretor: Luís Ferreira Lopes; Diretor de Arte: Francisco Alves; Redação: A tributação das empresas vai muito
Diana Gomes; Colaboradores: Fátima Ferrão, Palmira Simões; Dir. Comercial/Branded para além do IRC e das questões da taxa
Content: Luís Correia – luis.correia@newsplex.pt; Contactos: amanha.pt@newsplex.pt;
relacionada com o IRC. Ou seja, hoje em
Telefone geral, redação e comercial: 211 976 146; Site: sol.sapo.pt/amanha; Proprietário
/Editor: Newsplex, S.A; Sede: Taguspark, Núcleo Central, sala 362, 2740-122 Porto Salvo, dia quando nós falamos da tributação
Oeiras, Portugal; Registo da publicação na ERC 127966 das empresas falamos não só do IRC
20 OUTUBRO 2023 PORTUGAL AMANHÃ amanha.pt 51

CHOQUE FISCAL:
IRC PODE
BAIXAR 50%? JOÃO
LEÃO
Economista e Ex-ministro
das Finanças

“Houve alguma redução


SIM OU NÃO dos impostos em Portugal”

É
importante enquadrarmo- çamental bastante melhor ao nível do dé-

O desafio do país é crescer nos -nos nos desafios que o país


enfrenta. Ao longo dos últi-
fice. Portugal é dos poucos países da Eu-
ropa que tem excedente orçamental, saiu

próximos anos, se não quiser mos anos, e aqui deixe-me


discordar um pouco, houve
da pandemia com uma situação financei-
ra, do ponto de vista do défice, muito po-

continuar na cauda da Europa. aqui alguma redução dos im-


postos em Portugal. Os nú-
sitiva, mas ainda tem uma dívida pública
muito elevada. Mesmo assim, pela pri-

Há ou não margem para um meros, estatisticamente, são


afetados pelo facto de ter ha-
meira vez, Portugal vai este ano sair do
grupo dos países mais endividados. Ou-

choque fiscal, por exemplo, vido, não podemos esquecer,


uma revolução no mercado
tro sinal positivo, é que queremos ter uma
dívida já ligeiramente abaixo de 100%,

de 50% no IRC? Carlos Lobo,


de trabalho, ou seja, há mais que é uma condicionante também na di-
1 milhão de trabalhadores agora do que mensão fiscal.

fiscalista e ex-secretário de
havia em 2015, são mais 20%, e quando o Penso que ainda existe alguma mar-
peso dos trabalhadores aumenta no PIB, o gem para reduzir os impostos, mas tam-

Estado dos Assuntos Fiscais,


peso da massa salarial aumenta no PIB por bém devemos ter alguma humildade na
causa dos trabalhadores, há mais contri- ideia de que uma redução de impostos
buições para a Segurança Social, há mais provoca efeitos potenciais sobre o cres-
enfrenta João Leão, ex-ministro impostos, e isso parece aumentar a carga
fiscal mas os impostos em si diminuíram,
cimento. Depende se for acompanhado
de uma redução da despesa ou não, caso
das Finanças e ex-secretário diminuíram sobretudo ao nível do IRS.
Esta proposta do orçamento tem uma
contrário é insustentável. Depende de
quão eficiente é essa despesa a ser redu-
de Estado do Orçamento, num redução bastante significativa do IRS, são
quase 10% das receitas do IRS que, de um
zida em áreas em que melhora a eficiên-
cia do país ou não.
debate sobre a carga fiscal. ano só e que são reduzidas. Queria cha-
mar a atenção que não há praticamente
Portugal é dos países que mais vai enve-
lhecer nos próximos 10-20 anos e há aqui
nenhum país da Europa a fazer isto nesta desafios muito grandes relacionados com
situação, não é fácil reduzir os impostos, al- o sistema de pensões e com o Serviço Na-
guns até estão agora a aumentar alguns im- cional de Saúde. Por outro lado, Portugal
TEXTOS Luís Ferreira Lopes FOTOGRAFIAS LC Photography postos temporários que tinham reduzido é dos países onde se paga menos IRS em
e que agora estão a repor. percentagem do PIB na Europa, excetuan-
Portugal é praticamente o único país do os países de Leste. ●
que está a reduzir significativamente os
☛ impostos no próximo ano. É verdade que Veja o debate
PÁGINA
SEGUINTE Portugal, contrário dos outros países eu- completo no site
ropeus, parte nesta fase numa situação or- e na Euronews
52 PORTUGAL AMANHÃ amanha.pt 20 OUTUBRO 2023

☛ modelos de caixa que foram introdu- mos uma task force, que é a forma de
PÁGINA ANTERIOR
zidas em Portugal por Napoleão. Se criarmos, não destruindo a estrutura
um tabelião de Napoleão ou um deve- do Estado, uma estrutura matricial
dor da fazenda napoleónico entras- para resolvermos aquele problema.

Carlos Lobo: “Ainda temos um se hoje no Ministério das Finanças,


ele conseguia a gerir perfeitamente
Resolvemos o problema e somos
eficientes nisso, sempre: grandes

sistema de gestão das finanças as nossas contas públicas, ou seja, o


que significa algo que está mal quan-
obras, problemas da covid, criamos
sempre esta task force e resolvemos.

públicas do séc. XIX”


do estamos a caminho do século XXII. Quando tudo termina, o que é que
Neste momento, o bom gestor pú- acontece? Não fazemos a reestrutu-
blico é aquele que no dia 31 de de- ração de toda a máquina em função

A
zembro conseguiu gastar a sua dota- daquilo, mas voltamos ao modelo do
ção, ultrapassando o máximo possí- século e XIX e fica tudo na mesma.
vel as cativações, como o ministro Obviamente que isto cria um las-
carga fiscal e o seu Temos a bola da dívida e essa bola das Finanças tentou ao nível da es- tro de despesa que torna quase im-
peso nas empre- está muito gorda e tem de ir enco- trutura orçamental e se possível con- possível, tendo em consideração esta
sas, isso pode aju- lhendo e isso é nossa prioridade crí- seguir uma garantia de ter um incre- manipulação das bolas, nós mexer-
dar ou não na com- tica, tendo em consideração o au- mento do orçamento no ano seguin- mos na parte da receita porque te-
petitividade das mento da taxa de juro que nos obri- te e a autorização para contratação mos uma estrutura: eu porque tenho
mesmas?------ ga a despender bastante. de novos trabalhadores. Isto é o pa- as outras duas bolas, a pesada da dí-
CL – É um malaba- Por isso, estas duas bolas ficam ali radigma. vida e a neutra do orçamento, nunca
rismo com quatro reservadas e que não se podem ma- Sobre a avaliação da qualidade de vou conseguir baixar estruturalmen-
bolas e há duas bo- nipular. Depois temos a bola da des- serviço, a avaliação dos funcionários, te a receita enquanto não fizer este
las que estão pre- pesa e da receita e temos de ter a ha- a verificação de desempenho, unida- choque do lado da despesa. ●
sas. A primeira bilidade de gerir isto. Ou seja, estas des de serviço público criadas, isso
bola é a bola do dé- são as duas bolas no âmbito da nos- nem nada é considerado nos modelos
fice, ou seja, nós temos restrições ao sa política orçamental. Dentro da de atribuição da verba orçamental
nível do défice e temos de ter um bola da despesa, qual é o nosso pro- àquele serviço. Por isso, nós conti-
modelo de estabilidade: zero défi- blema? Ainda há pouco falou da li- nuamos a ter um Estado organizado
ce. Concordo em absoluto com o nha ferroviária do século XIX, nós ain- nos modelos do século XIX que ca-
que está na proposta [OE 2024], ex- da temos um sistema de gestão das minha para o século XXI.
cedente é ótimo, temos uma péssi- Finanças Públicas do século XIX, isto Outra coisa, quando nós temos um
ma fama ao nível internacional de é, o nosso modelo de gestão orçamen- problema grave que temos de resol-
apresentar excedentes, é ótimo. tal e de tesouraria ainda assenta em ver, o que é que nós fazemos? Cria-

JL: “Envelhecimento da
população sobrecarrega
muito a despesa”

P
ara haver uma redução de que os da média da União Europeia. “A revogação
impostos em teoria teria de
haver uma redução da des-
Claro que aqui há diferentes regiões:
há o leste da Europa, que tem taxas
do regime dos
pesa. Onde é que seria pos- mais baixas, e depois a Europa Oci- residentes não
sível cortar a despesa, e pela dental, que tem taxas mais altas do habituais é o aspeto
sua experiência também que Portugal. Por que é que os im-
como ex-ministro das Finanças? postos diretos pesam menos no PIB mais negativo da
JL — Esta tendência de envelheci- do que no resto da Europa? É sobre- proposta de OE”
mento da população sobrecarrega tudo por causa do imposto sobre o
muito a despesa, representa parte rendimento, não tanto o imposto so- CARLOS LOBO
importante da nossa despesa: pen- bre das empresas, que é mais volá-
sões e saúde, e outras prestações so- til. Portugal tem taxas que podem
ciais, quase 50% da nossa despesa é ser mais altas, mas há muitas em-
para os mais velhos, portanto, eles presas que não pagam impostos e há
têm um peso muito grande no orça- empresas muito pequenas que pa-
mento de Estado, é preciso perce- gam poucos impostos; os impostos
ber que é um desafio muito grande. estão dirigidos a um determinado
Mas aqui na parte dos impostos que- grupo de empresas.
ria só chamar a atenção para o fac- Ao nível do IRS é importante perce-
to de os dados objetivos que temos ber que, face a alguns países, as taxas
dizerem que ao nível dos impostos começammais cedo a subir. Isto em
diretos estes são cerca de um terço parte decorre do facto de sermos um
mais baixos (dados da Eurostat) do país com salários mais baixos. ●
20 OUTUBRO 2023 PORTUGAL AMANHÃ amanha.pt 53

A
João Leão: estrutura do IRS tem de se
adaptar à estrutura dos salá-
viamente é um grande sucesso em
Portugal, e que esses países da Euro-
CL – Oferecemos. Temos um regi-
me que foi um choque fiscal, o regi-

“Somos dos poucos rios existente, senão cobra


poucos impostos.. Além dis-
pa do Leste não têm tanto como nós,
na atração de empresas de serviços
me dos residentes não habituais foi
introduzido em 2009, quando era se-

países da Europa
so, nós somos dos poucos na área de trabalhos qualificados, nas cretário do Estado. Pela primeira vez,
países da Europa em que no salário TIC [Tecnologias da Informação e Co- Portugal teve um regime de compe-
mínimo não se cobra IRS, enquanto municação], nas empresas de supor- titividade em que ofereceu estabili-
em que no salário em muitos países europeus, que têm
salários mínimos mais elevados, já
te para toda a Europa. Conhecemos
muito jovens que trabalham em mul-
dade por 10 anos, um regime fiscal
altamente atrativo em diversas ver-

mínimo não se contribuem para o IRS, com taxas


baixas, mas contribuem. Portugal
tinacionais em Portugal, em Lisboa,
para vender serviços de suporte
tentes.
O senhor primeiro-ministro anun-

cobra IRS” tem uma estrutura de impostos em


que os impostos diretos são mais
baixos do que a média europeia, so-
para a Europa toda, seja na área fi-
nanceira ou na área tecnológica.
Agora, nessa dimensão nós não es-
ciou a revogação do regime dos resi-
dentes não habituais porque, alegada-
mente, isso tem um efeito pernicio-
bretudo por causa do IRS, e tem im- tamos a competir propriamente so na habitação. Durante 14 anos,
postos mais altos que a média euro- com esses países, estamos a compe- fizemos um esforço enorme em criar
peia nos impostos indiretos. tir porque somos um país atrativo, os canais, o regime português era re-
Deveria ou não haver algum estí- um país com jovens qualificados, um conhecidamente o mais competitivo
“Os nossos impostos mulo fiscal e, obviamente, uma rees- país onde muitas pessoas de vários da União Europeia ao nível de atra-
diretos são cerca truturação do sistema olhando so-
bretudo para os países com quem
países querem viver.
Conheço muitos empresários que
ção destes profissionais de alto valor
acrescentado e numa penada é extin-
de um terço mais nós estamos a competir na cauda da dizem que uma das atrações que Por- to. Para mim, é o aspeto mais negati-
baixos do que Europa, correndo o risco nos próxi- tugal tem é o facto de ser um país aber- vo desta proposta do orçamento do
mos anos sermos ultrapassados? to, tolerante e estável, ao contrário dos Estado porque aquela experiência de
os da média da UE” JL – Na verdade, nós competimos países de leste, que não são. Nós não choque fiscal que estava a ter suces-
JOÃO LEÃO com toda a Europa e com o resto do estamos só competir com eles, esta- so foi inevitavelmente abalada por
mundo. Em determinadas indús- mos a competir com a Europa e com esta decisão.
trias com salários mais baixos nós o mundo e estamos a crescer mais do Na questão da demográfica e do en-
competimos com a Europa, mas não que a Europa nos últimos anos. velhecimento da população nós não
nos queremos posicionar só nessa – Oferecemos segurança, sol, podemos estar à espera que seja a ca-
dimensão. praia, mas do ponto de vista orça- pacidade de regeneração natural dos
Portugal até tem tido bastante su- mental ou fiscal, não há margem portugueses que venha resolver o
cesso, para além do Turismo, que ob- para isso? problema da natalidade. ●

CL: “Para um jovem qualificado, os primeiros


escalões de IRS são altamente punitivos”

T
emos uita gente a sair de atração de migrantes ativas e não mitir que a oferta se ajuste.. E o que é
do país...--------------- estarmos a bloquear entradas ao ní- a oferta? É produção de habitação pú-
JL — Nos próximos vel do SEF [Serviço de Estrangeiros blica, com arrendamento público.
10-20 anos a minha e Fronteiras], tratar aqueles que nos Portugal tem 2%, a Alemanha tem 20%
geração vai-se refor- procuram da melhor forma possível e a Holanda tem 40% de arrendamen-
mar e vamos ficar com para virem eles e as suas famílias, ou to público de oferta de habitação. Por
o mercado de traba- seja, de uma forma totalmente inte- isso, o que temos de fazer é também
lho essencialmente grada, fazer com que o talento que uma revisitação de todo o nosso pro-
mais qualificado do venha para Portugal seja do mais qua- cesso administrativo de aprovação de
que a média europeia. lificado possível. prédios, de áreas urbanas, de acabar-
IPortugal fez uma mu- Mas também temos de reter talento… mos com o fim do mito da construção
dança muito acelera- CL — E temos de reter talento, te- em altura, da incapacidade que uma
da ao nível das qualificações e essa mos de jogar nos dois lados. Para um cidade tem se expandir.
mudança tem de ser aproveitada no jovem qualificado, devido à nossa es- Como ministro das Finanças con-
sentido de garantir que uma parte trutura fiscal, os primeiros escalões seguiu perceber qual é o património
desses jovens qualificados ficam cá, de IRS são altamente punitivos, to- do Estado?
que outros venham e que isto moti- mando em consideração os nossos JL — Há uma capacidade enorme
ve um forte aumento da produtivida- países mais concorrentes, nomeada- a explorar no património do Esta-
de que permita sustentar salários mente do centro da Europa. do. A zona ribeirinha a sul do Te-
mais elevados. Depois, outra coisa, atraindo essas jo, que vai desde Cacilhas até qua-
CL — Completamente de acordo pessoas eleva-se o preço da habita- se ao Seixal, é uma zona em que se
com o João. Nós temos de ver o nos- ção… Ora, o problema da habitação podem construir milhares fogos ha-
so país como um player num jogo glo- em Portugal é real, mas é um proble- bitacionais. Teria um impacto es-
bal, e temos que tentar atrair os me- ma de oferta, não de procura. Haver trutural muito maior do que peque-
lhores. Isso significa o quê? Políticas procura não é mau, temos é de per- nas reabilitações. ●
54 PORTUGAL AMANHÃ amanha.pt 20 OUTUBRO 2023

➽ Rafael Campos Pereira


A rábula do Certificado de PME
um exemplo concreto, que não mo público as mesmas infor- PME” obtido no ano anterior CIP que tive a oportunidade de
resisto à tentação de definir mações que declarara anterior- perderá de imediato a validade. integrar, a segunda figura do
como a rábula do Certificado mente a uma outra autoridade. E caso o projecto de candidatu- estado português confessou
de PME. Entretanto, se essa empresa ra a fundos da União Europeia ter feito parte de dois governos
Tal como é sabido, todas as se encontrar envolvida em em que a empresa está envolvi- em cujos Conselhos de
empresas portuguesas estão algum projecto de candidatura da tenha sido apresentado em Ministros fora decidido proibir
obrigadas a submeter anual- a fundos da União Europeia, conjunto com mais 50 ou 100 que qualquer organismo públi-
mente no Portal das Finanças a estará obrigada a dar sequência outras empresas e entidades, o co pedisse ou exigisse às
respectiva IES – Informação à saga. Nessa eventualidade, processo fica bloqueado para empresas privadas informa-
Empresarial Simplificada, a terá ainda de se dirigir ao cha- todas elas. O que atrasa investi- ções que se encontrassem já na
qual contém todas as informa- mado “Balcão dos Fundos” (o mentos, gera ineficiências, disponibilidade de outra
OPINIÃO ções essenciais e relevantes antigo Balcão 2020), gerido compromete a execução de entidade do estado.
relativas à sua actividade. também pelo estado português, fundos europeus e leva ao Se assim foi, como não tenho
Naturalmente, da simples e aí actualizar o “Certificado de desespero empresários, gesto- qualquer dúvida de que o
Quando toca a análise da IES resulta de forma PME” com base na atribuição res e trabalhadores. tenha sido, é caso para dizer
burocracia, nem com cristalina e linear se a empresa desse mesmo estatuto por parte Como se tudo o que antecede que, quando toca a burocracia
duas leis iguais o Esta- é ou não uma Pequena e Média do IAPMEI, o qual fora concedi- fosse pouco, acresce ainda que e vacuidades, nem com duas
do arrepia caminho. Empresa (PME). Ainda assim, do, recorde-se, com origem os dados de referência que o leis iguais e sucessivas o estado
para que lhe seja formalmente exactamente nos mesmos IAPMEI observa para o reco- português arrepia caminho.
reconhecida essa definição de dados que constam da IES e nhecimento de uma empresa Quando se fala na baixa produ-
PME, com as consequências, as estão na posse da Autoridade como PME são diferentes dos tividade do país, uma parte
obrigações e os direitos previs- Tributária e Aduaneira. que a Autoridade Tributária e significativa da explicação está
tos na lei, a empresa terá em Constata-se assim que cada Aduaneira considera para o precisamente na soma de mui-

A
seguida de se dirigir ao site do empresa é obrigada a eviden- mesmo efeito. tos detalhes quase anedóticos
proposta de Pacto IAPMEI, onde deverá introdu- ciar três vezes em igual número Donde decorre que, para como este.
Social apresentada zir uma parte dos mesmos de diferentes organismos públi- além de obrigarem as empresas A proposta de Pacto Social da
pela CIP – dados que já fez constar da IES. cos que é uma PME, despen- a repetirem procedimentos e CIP visa ajudar a economia
Confederação E apenas dessa forma, se res- dendo horas de trabalho abso- triplicarem diligências, os orga- também neste domínio. Não há
Empresarial de peitar esta redundância abso- lutamente improdutivas e inú- nismos públicos não se enten- nenhuma explicação lógica
Portugal, à sociedade portu- lutamente inútil, poderá a teis que deveriam ser canaliza- dem entre si quanto às conclu- para que ainda não tenha sido
guesa (que o governo até ao empresa manter ou obter o seu das para tarefas de efectivo sões a extrair de factos absolu- aceite. ●
momento ainda não aceitou “Certificado de PME”. O que valor acrescentado. tamente iguais.
subscrever), é constituída por 3 significa que, para poder ser Mas infelizmente a rábula Não violarei qualquer obri- Vice-Presidente Executivo da AIMMAP
eixos estruturantes, um deles reconhecida pelo estado portu- não fica por aqui. Com efeito, gação de sigilo se aqui escrever e Membro da Comissão
composto por medidas que guês como aquilo que efectiva- se a empresa apresentar a IES e que, em audiência recente- Executiva da CIP
visam a redução da burocracia mente é segundo as leis da em simultâneo não actualizar mente concedida pelo
e a eliminação das inutilidades República, a empresa terá de os seus dados no site do Presidente da Assembleia Oiça o podcast Pensar
administrativas na relação prestar a um segundo organis- IAPMEI, o seu “Certificado de República a uma delegação da Amanhã em amanha.pt
entre as empresas e o estado.
Em concreto, a Medida 3 do
Eixo da Simplificação propõe
exactamente o seguinte:
“Consagração da IES como
meio privilegiado para o forne-
cimento de toda a informação
para fins estatísticos e fiscais
pelas empresas.”
Os mais distraídos poderão
tender a negligenciar a real
importância desta pretensão
da CIP. E aparentemente o pró-
prio governo, pelo menos até
ao momento, tem estado bas-
tante desatento nessa matéria.
Todavia, a carga burocrática
e as redundâncias geram cons-
trangimentos, causam prejuí-
zos e contribuem de forma
determinante para reduzir não
só a produtividade das empre-
sas como também a eficiência
dos serviços públicos. Pelo que
é vital enfrentar este problema.
DREAMSTIME

Para que melhor se com-


preenda a dimensão e o ridícu-
lo da questão, ilustremo-la com
20 OUTUBRO 2023 PORTUGAL AMANHÃ amanha.pt 55

Planear o ciclo de vida financeira:


Da poupança à reforma
Garantir a segurança força Alfredo Falcão que, acrescenta:
financeira nas “a diversificação envolve a distribui-
ção do investimento em diferentes ti-
diferentes fases pos de ativos e produtos financeiros
da vida deve ser para reduzir o risco”. Nesta fase, os
horizontes temporais de investimen-
uma preocupação to são mais longos, tornando possível
de todos. Para fazê-lo, considerar instrumentos com maior
risco, como as ações, que é o instru-
poupança e mento favorito dos investidores de
investimento têm longo prazo. A escolha de produtos
que ser adaptados às financeiros deve ter em considera-
ção o perfil de risco e os objetivos in-
distintas necessidades dividuais.
que surgem
Reduzir o risco e planear
em cada etapa. a desacumulação
À medida que a reforma se aproxima,
é aconselhável reduzir gradualmen-
te o risco dos investimentos. Os pro-

A
dutos financeiros escolhidos devem
ser capazes de fornecer um comple-
mento à renda após a reforma. A pro-
o longo da vida é posta de Alfredo Falcão vai para a
natural que exis- aposta em produtos que ofereçam
tam diferentes de- reembolsos programados, permitin-
safios financeiros e do que os investidores recebam ren-

DREAMSTIME
projetos e necessi- dimentos mensais, trimestrais, se-
dades distintos. É mestrais ou anuais.
por isso que, como A escolha do horizonte temporal e
explica Alfredo Fal- do valor dos reembolsos programa-
cão, “é fundamen- balho que a poupança deve tornar- tes temporais de investimento de ↑ A poupança dos é flexível e pode ser ajustada de
tal que a gestão dos -se uma prioridade. Uma prática in- cada pessoa. ao longo acordo com as necessidades pessoais.
recursos financei- teressante é direcionar uma parte do da vida deve “É importante ter em mente que, à
ros seja planeada salário para a poupança, por exem- Adotar um pouco mais de risco ser planeada medida que envelhecemos, as ne-
de forma diferenciada consoante a plo, 10%. Esta abordagem ajuda a À medida que as carreiras estabili- cessidades de saúde podem aumen-
idade, na fase ativa, mas também criar uma disciplina de economia des- zam e que as pessoas atingem os seus tar, exigindo uma reserva financei-
após a reforma.” O especialista, da de o início da carreira. Outra dica im- objetivos de curto prazo, é possível ra adicional para lidar com despe-
Direção Geral Negócio Vida da Fi- portante é estabelecer um débito au- começar a considerar investimentos sas imprevistas”, alerta.
delidade, alerta igualmente para a tomático que transfira uma parte do mais arriscados com foco no rendi- Nunca é demais recordar que o ciclo
necessidade de distinguir entre for- salário para a poupança, garantindo mento. Neste ponto, a poupança de vida financeira é uma jornada que
mas de poupança, e o posterior in- um processo simples e evitando gas- transforma-se em investimento, “e a exige planeamento, disciplina e adap-
vestimento destes recursos, com o tos indesejados. diversificação é fundamental”, re- tação ao longo dos anos. Estabelecer
objetivo de rentabilização e de mul- hábitos de poupança desde cedo, fo-
tiplicação. Explorar produtos car em metas de curto prazo na juven-
de poupança por objetivos tude, adotar investimentos mais arris-
Hábitos de Poupança Quando as pessoas começam a cons- cados na fase intermédia, e planear a
No início da vida financeira, muitos truir as suas carreiras, geralmente desacumulação na reforma são ele-
jovens enfrentam desafios relaciona- têm rendimentos mais baixos e des- mentos-chave para uma gestão finan-
dos com a poupança. Antes de entra- pesas básicas a serem cobertas. Nes- ceira bem-sucedida ao longo da vida.
rem no mercado de trabalho, a maio- ta fase, a poupança é frequentemen- A diversificação e a escolha de produ-
ria não possui economias substan- te direcionada para dar resposta a tos financeiros adequados a cada fase
ciais. Nesta fase, o foco deverá ser, objetivos de curto prazo, como a en- “É fundamental que a gestão são fundamentais para alcançar segu-
como recomenda Alfredo Falcão, em
estabelecer hábitos de poupança sau-
trada para uma casa, viajar ou inves-
tir em educação.
dos recursos financeiros rança financeira em todas as etapas do
ciclo de vida. Acima de tudo, sublinha
dáveis. “Embora não seja comum Os produtos de poupança por ob- seja planeada de forma Alfredo Falcão, “é importante que as
acumular uma poupança significa- jetivos são ideais para esta fase pois diferenciada consoante pessoas estejam cientes das opções
tiva neste período, pequenas econo- permitem a definição de metas es- disponíveis e procurem orientação fi-
mias, como presentes de aniversá- pecíficas e incentivam a que as pes- a idade, na fase ativa, nanceira, se necessário, para tomar
rio ou dinheiro de avós, podem con- soas economizem para alcançá-las. mas também após a reforma” decisões informadas sobre os seus in-
tribuir para ensinar a importância Além disso, estes produtos podem vestimentos.” ●
da poupança”, salienta. ter níveis de risco diferentes, depen- ALFREDO FALCÃO
É durante os primeiros anos de tra- dendo das preferências e horizon- Direção Geral Negócio Vida da Fidelidade Conteúdo patrocinado
56 PORTUGAL AMANHÃ nascerdosol.pt 20 OUTUBRO 2023

Sazonalidade
vai diminuir, mas
faltam apoios
do Governo
Fazer turismo fora da época alta é uma
tendência futura, mas Francisco Madelino,
presidente do INATEL, afirma que o Estado
deve atuar e criar procura. França e Espanha
são exemplos a seguir.

A
TEXTO Diana Gomes
A pandemia da Covid-19 também
contribuiu para isso..
chamada época alta A recuperação da pandemia seguiu
do turismo – que duas fases. O ano passado sobretudo
atinge o pico no ve- através do turismo interno e este ano
rão – pode estar muito por turismo externo. Os dados
emvias de extinção. macroeconómicos também mostram
Segundo Francisco isso. O segundo trimestre deste ano
Madelino, presiden- cresceu sobretudo pelo setor turísti-
te da Fundação INA- co. Ainda não é um trimestre em alta,
TEL, a tendência é mas é mais uma manifestação de que
que no futuro haja a sazonalidade do setor turístico está
cada vez mais uma a diminuir.
diluição das épocas
baixa e alta, reduzindo a sazonalida- Esta redução da sazonalidade de-
de do setor. verá ser uma tendência a manter-se não têm acesso ao turismo, ainda cer- uma atividade económica que con- ↑ Francisco
no futuro? ca de metade dos portugueses não trarie a desertificação. Caneira
Em novembro de 2022, de acordo É uma tendência futura e seria bom passam férias. O Estado tem de atuar, Em França, nos descontos que as Madelino
com os dados do INE, as dormidas se se expandisse para o interior do por razões de saúde ou por razões so- pessoas fazem para a segurança so- é economista
atingiram as 743 mil, uma subida de país. Com as alterações demográfi- ciais, e criar procura, apoiar e pagar cial, há depois uma componente de e professor
14,1% face ao mês homólogo de 2021. cas e a desertificação, essa capaci- uma parte significativa da estadia. apoio do Governo que são os chèques- universitário
Podemos estar a assistir a uma re- dade de levar o setor turístico para o Por exemplo, se for a Espanha ou -vacances, ou seja, dão cheques para
dução da sazonalidade do turismo? interior e baixar a sazonalidade é im- França, há políticas públicas muito passar férias e podem restringi-los
Francisco Madelino - O turismo portante para ser uma atividade ren- “agressivas”, no bom sentido, de nas zonas onde o fazer.
tem vindo nos últimos anos a redu- tável e até combater esta desertifica- apoiar a utilização das termas ou de É apenas um apoio ao motor de ar-
zir a sazonalidade. Os meses altos ção. É muito difícil ter rentabilidade determinado tipo de infraestruturas ranque para este tipo de atividade se
eram os de julho e agosto e digamos no setor turístico apenas com base no interior. Por um lado, para que um desenvolva porque o ideal é que as
que este pico, esta curva, começou a em dois ou três meses. conjunto de pessoas tenha acesso à pessoas tenham todas dinheiro para
alargar-se para meses de junho e se- A sazonalidade tem vindo a baixar, atividade turística, mas sobretudo passar férias e fazer atividade turís-
tembro. o que tem feito com que surjam no- para que regiões do interior tenham tica e que os hotéis funcionem regu-
As alterações climáticas também vos investimentos turísticos em áreas larmente em mercado.
ajudam, mas sobretudo ajuda o cres- como a Serra da Estrela, mas é deter-
cimento e o facto de Portugal ter ga- minante que ela passe para o interior O aumento dos preços na época
nho um conjunto de prémios e ser re- do país e que seja o próprio Estado a alta associado ao crescente custo de
conhecido a nível internacional. promover a procura desses setores. ‘Ainda cerca vista e da inflação, não poderá levar
Este fenómeno começou pela área
de Lisboa, depois passou para a área Como é que se pode incentivar o
de metade muitos portugueses a não passarem
férias cá dentro?
do Porto e também para o Algarve e turismo em época baixa e combater dos portugueses É verdade que o setor turístico foi dos
depois começou a extravasar para a sazonalidade e o desemprego? A não faz férias. que mais aumentou - cerca de 100% em
outros pontos do país e mesmo para Fundação Inatel teve o programa Tu- alguns casos -, mas isso não é necessaria-
outras épocas. A ocupação em Lis- rismo Sénior, por exemplo… O Estado tem de mente mau. O que é mau é que os portu-
boa e no Porto começou a subir fora Sim, é um programa que existiu atuar e criar procura” gueses não possam passar férias e a ativi-
dos meses que vão entre junho e ou- através dos programas comunitários dade económica não gere rendimentos
tubro, que já tinham tido um alarga- e que se espera que venha a existir. FRANCISCO MADELINO para essas pessoas que não podem pas-
mento. Sabemos que há muitas pessoas que Presidente da Fundação INATEL sar férias nem cá dentro nem lá fora. ●
58 PORTUGAL AMANHÃ amanha.pt 20 OUTUBRO 2023

ALIMENTE-SE
Uma boa alimentação tem um
impacto profundo do dia a dia
dos seniores. Ela influencia a
saúde física, mental, emocional e

COM EQUILÍBRIO
social, permitindo que usufruam
de uma vida mais saudável,
autónoma e satisfatória. Políticas
e programas que promovam

E ENVELHEÇA
uma nutrição adequada são
cruciais para garantir um
envelhecimento
digno e ativo.

COM QUALIDADE

O
envelhecimento mentar, tornando a nutrição uma
da população por- parte vital da saúde dos idosos.
tuguesa é uma rea- Além disso, um regime alimentar
lidade crescente e saudável contribui para o controlo
incontornável. De do peso, prevenindo a obesidade,
acordo com dados um problema que tende a agravar-
do Instituto Nacio- -se com a idade.
nal de Estatística,
em 2021, a percen- Como vencer os desafios
tagem de idosos da idade
com 65 anos ou As pessoas mais velhas enfrentam
mais já representa- com frequência desafios únicos quan-
va 23,4% da população, enquanto os do se trata de alimentação. A dimi-
jovens até aos 14 anos eram apenas nuição do apetite é uma ocorrência
12,9%. Esta realidade demográfica comum com o envelhecimento, o que
coloca em destaque a importância pode resultar numa ingestão insufi-
crucial de uma alimentação adequa- ciente de nutrientes benéficos. Con-
da para garantir um envelhecimen- dições de saúde, como doenças cró-
to com qualidade. nicas, podem, por sua vez, tornar o
ato de comer uma tarefa árdua.
Nutrição e envelhecimento Também as dificuldades de masti-
saudável gação, por exemplo, podem influen-
À medida que a idade avança, o nos- ciar as escolhas alimentares, redu-
so corpo passa por mudanças subs- zindo o consumo de frutas e vegetais,
tanciais. Neste contexto, uma ali- sobretudo crus, e conduzindo a ca-
mentação equilibrada e rica ganha rências de fibras e de vitaminas.
ainda mais relevância para garan- Todos estes fatores podem contri-
tir o bem-estar integral dos idosos. buir para a desnutrição e enfraque-
A ingestão adequada de nutrientes cer o sistema imunitário, tornando
essenciais, como proteínas, vitami- os idosos mais suscetíveis a doenças.
nas e minerais, desempenha um pa- “Para superar essas limitações, é
pel importante na prevenção de essencial adaptar a dieta, oferecen-
doenças e na vitalidade geral. O ↑ A iniciativa do teatro “ITAU Canal”, em parceria com o Bairro dos Livros, continua a animar do opções mais suaves, pastosas e
tempo passa e as necessidades nu- os utentes de várias instituições do norte do país, trazendo momentos de convívio líquidas, enriquecidas para aumen-
tricionais específicas podem au- dinâmicos e divertidos tar a densidade de nutrientes”,
20 OUTUBRO 2023 PORTUGAL AMANHÃ amanha.pt 59

aconselha Carla Marques da Costa, da e rica em nutrientes ajuda a man- acesso a refeições saudáveis e refei- ↑ A ingestão
Diretora de Qualidade, Ambiente e ter a saúde física, reduzindo o risco ções equilibradas. Programas de re- adequada
Segurança do ITAU. de quedas, fraturas ósseas e doenças feições equilibradas são desenvolvi- de nutrientes
Um regime alimentar equilibrado crónicas. dos com o objetivo de fornecer ali- essenciais
fornece, assim, os nutrientes neces- Saúde mental e cognitiva: alimen- mentos ricos em nutrientes essenciais, desempenha
sários para garantir um envelheci- tos como peixes, nozes e sementes adaptados às necessidades das pes- um papel
mento saudável e uma boa qualida- preservam a função cerebral, preve- soas mais velhas. Além disso, oferece importante
de de vida. Por isso, revela-se funda- nindo distúrbios cognitivos. orientação nutricional personaliza- na prevenção
mental envidar esforços para que os Qualidade do sono: alimentos ricos da, capacitando os idosos para me- de doenças
seniores tenham acesso a esse equi- em triptofano, como leite, aveia e ba- lhor compreenderem a importância e na vitalidade
líbrio e riqueza de nutrientes, bem nanas, promovem um sono tranquilo. das escolhas alimentares saudáveis em geral
como, em alguns casos específicos, a Autonomia e independência: uma e ajudando-os a superar desafios nu-
suplementação nutricional para sa- alimentação saudável mantém a mo- tricionais específicos.
tisfazer as suas necessidades. bilidade e a capacidade de ativida- Para promover um envelhecimento
Esta abordagem ajuda a prevenir des diárias independentes. ativo e de alta qualidade, o ITAU inves-
doenças, como a osteoporose, a ane- Bem-estar emocional: alimentos te também em atividades dinâmicas
mia e outras, além de manter a saúde nutritivos reduzem a fadiga, promo- (de que são exemplo o ‘ITAU Canal’ e
mental e cognitiva em ótimas condi- “No processo vendo a vitalidade e uma atitude ‘Hoje o Chef Sou Eu’) e em programas
ções. A hidratação adequada também
é fundamental para evitar problemas
de envelhecimento mental positiva.
Relações sociais: partilhar refei-
de exercícios adaptados à idade. Essas
iniciativas visam não apenas melhorar
de saúde, como a desidratação, mui- do ser humano, que ções com amigos e familiares com- a saúde física dos idosos, mas também
to comum entre os mais velhos. passa por ser natural, bate a solidão. estimular o bem-estar mental e emo-
A Roda dos Alimentos constitui uma Gestão do stress: vitaminas do cional, contribuindo para uma vida ple-
excelente fonte de orientação sobre ocorre um declínio complexo B, presentes em vegetais na na terceira idade.
quais os alimentos consumir e em que das funções de folhas verdes e grãos inteiros, aju- Numa sociedade em rápida trans-
quantidades para garantir o equilíbrio
nutricional geral.
fisiológicas. Por isso, dam a reduzir o stress e a ansiedade. formação demográfica, é imperativo
reconhecer o papel essencial daquilo
é fundamental a O papel transformador do ITAU que comemos e os seus impactos na
Impactos positivos sensibilização para O ITAU (Instituto Técnico de Alimen- saúde. Assegurar que os idosos tenham
Já concluímos que uma alimentação tação Humana) é uma empresa do acesso a uma alimentação equilibra-
adequada, apesar de crucial em todas uma alimentação Grupo Trivalor e desempenha um pa- da e a apoio nutricional é fundamen-
as fases da vida, se torna particularmen- e hidratação pel vital na promoção da nutrição sé- tal para o bem-estar desta crescente
te relevante à medida que envelhece-
mos. Vejamos concretamente porquê.
conscientes nior em Portugal. Através de inicia-
tivas inovadoras, o ITAU esforça-se
parcela da população portuguesa. ●

Saúde física: uma dieta equilibra- e saudáveis” para assegurar que os idosos tenham Conteúdo patrocinado
60 PORTUGAL AMANHÃ amanha.pt 20 OUTUBRO 2023

Critical Software:
JOÃO
CARREIRA
CEO da Critical

Tecnológica quer
Software

duplicar faturação
TEXTO Luís Ferreira Lopes
FOTOGRAFIAS Critical Software

SUCESSO.PT com a BMW), foi este espírito que nos


levou a criar um fundo de investimen-
to em start-ups, como temos hoje, a
Critical Ventures. Portanto, é uma

Tecnológica de Coimbra fatura marca de identidade muito forte da


Critical nos leva a fazer coisas.

cerca de 100M€ e trabalha com Um outro aspecto que também é


importante, e que às vezes não é tão

clientes como a BMW, a Airbus visível, é a forma como nós vimos a


empresa, como nós pensamos a em-

e até a NASA. João Carreira, presa no longo prazo. Temos uma vi-
são de longo prazo, sempre tivemos.

CEO da Critical Software, revela Costumo dizer que nós vimos a em-
presa assumindo que ela vai estar

a sua estratégia de liderança


aqui daqui a 100 anos e estar aqui da-
qui a 100 anos, se pensar nisso, muda

e como superou os desafios.


a perspetiva sobre muitas coisas.
Não se gere uma empresa para es-
tar aqui daqui a 100 anos da mesma
forma que uma empresa que se quer
vender amanhã ou fazer algo desse

A
género a muito curto prazo. Isso mar-
cou também muito a identidade da
empresa, mas enfim, isto tudo se re-
Critical Software trabalho de qualidade. Esse foi o pri- sume a uma coisa que são as pessoas. Talvez nesse aspecto não seguimos
foi criada há cerca meiro aspecto distintivo da Critical, Aquilo que verdadeiramente faz a di- o percurso de testar o nosso produ-
de 25 anos. Vamos que nos levou a trabalhar com esse ferença na Critical, que é uma em- to e serviço no mercado nacional e
falar de futuro, mas tipo de clientes. presa de talento, são as pessoas e nós depois ir lá para fora, o tal processo de
olhando para trás, Um segundo aspeto é a persistên- sabemos que uma equipa animada internacionalização. Mas começá-
quais são as suas cia e o espírito empreendedor que para uma cultura forte, para um con- mos no mercado internacional des-
grandes marcas? sempre tivemos na empresa. Ainda junto de valores partilhados e para de o dia 0 e hoje 85%-90% do nosso
João Carreira – Nas- hoje, somos 1300 pessoas na Critical um propósito comum consegue fa- negócio é com clientes internacio-
cemos em 1998, em Software, mas quem olhar à volta vê zer coisas extraordinárias. nais e isso marca a nossa identidade
Coimbra, e de facto muito um espírito de startup e man- É isso que a nossa equipa é, que a claramente.
são alguns os fa- ter esse espírito é importante porque nossa equipa faz todos os dias, faz coi- Os nossos mercados-alvo, estraté-
tores importantes nós queremos que as nossas equipas sas extraordinárias com este contex- gicos, por assim dizer, estão na Euro-
que nos trouxeram até aqui nestes 25 sejam capazes de correr riscos, en- to de cultura, valores e propósito. pa (Alemanha e Inglaterra) e depois
anos e que nos permitiram fazer este frentar desafios, errar, aprender, ten- os Estados Unidos. São estes merca-
percurso. tar outra vez, e esse ciclo é extrema- —Essas pessoas trabalham em di- dos do Hemisfério Norte que nós en-
O primeiro talvez seja a qualidade mente importante para nós. versas áreas, porque as vossas áreas dereçamos, que são mercados obvia-
da nossa engenharia. Gostamos de de negócio vão desde a área aeroes- mente exigentes, cada um à sua ma-
desafios difíceis, complexos, e isso le- — Mas no total do grupo são 3000 pacial a áreas mais específicas, como neira.
vou-nos a trabalhar com clientes exi- colaboradores… a informática ou tecnologias de in- O dos Estados Unidos é muito com-
gentes e muito desafiantes por todo JC — No total do grupo somos mais formação, então é um leque muito, petitivo, o da Alemanha muito exigen-
o mundo, como a BMW, a Airbus, a 3000 colaboradores, principalmen- muito vasto, e ainda por cima em vá- te pela qualidade, e por aí adiante.
Alstom, e isso obrigou-nos a pôr a fas- te engenheiros, na Critical Software rios mercados muito exigentes,
Veja vídeo quia da qualidade muito alta. somos 1300, mais ou menos. E tenta- como a Alemanha o os EUA.. Isto im- — A exportação, na verdade, re-
no site Isto para uma empresa que sai de mos manter este espírito porque é plica um esforço muito maior do presenta quase 90%...
e na Euronews Portugal onde, na altura, não havia este espírito que nos impele a fazer ponto de vista da gestão, imagino. JC — 85-90%, anda normalmente
tradição de engenharia (hoje feliz- coisas diferentes. Foi este espírito que JC — Sim, os nossos mercados são por aí. Temos cliente nacionais com
mente já há) era preciso pôr a fasquia nos impeliu a criar empresas spin- maioritariamente internacionais, muito orgulho. Temos alguns, mas de
da qualidade muito alta e a nossa uma -offs, foi este espírito nos levou a criar portanto nós começámos a trabalhar facto a grande maioria, o grande vo-
reputação era de que fazíamos um joint-ventures (como a que temos para o mercado internacional. lume de negócios da empresa vem do
20 OUTUBRO 2023 PORTUGAL AMANHÃ amanha.pt 61

Sim, conseguimos
- Qual a maior diversidade e como
é que foi superada?
JC — Ao longo destes 25 anos,
como deve imaginar, tivemos imen-
sas dificuldades e imenso momen-
tos em que lutámos para conseguir
ultrapassar essas dificuldades.
Talvez fale naquilo que está mais
presente e que é mais recente, que
foram as dificuldades relacionadas
com a covid e os hábitos de traba-
lho remoto que se instalaram de-
pois. Foi muito difícil para nós por-
que, como dizia há pouco, um fator
fundamental diferenciador da Criti-
cal são as pessoas e a cultura das
pessoas, são os valores partilhados,
são o propósito, e obviamente que
não acreditamos que estando em
remoto seja possível manter essa
cultura.
Por momentos limitados no tempo,
toda a gente consegue trabalhar
em full remoto. Mas a empresa
como um todo precisa desse con-
tacto humano. Somos uma empresa
baseada em equipas,.
Sentimos que a cultura estava a so-
frer e que podia haver consequên-
cias muito negativas na empresa. Ti-
vemos dúvidas se de facto conse-
guiríamos sobreviver a esse choque
e tomámos recentemente a decisão
de estabelecer dois dias presen-
ciais, por semana, no mínimo, obri-
gatórios na empresa.

↑ Na Critical mercado internacional, destes três muitas dificuldades. Foi preciso mui-
desde 1998, mercados em particular. ta persistência, ir bater muitas por-
João Carreira tas que se fecharam a seguir porque,
À minha maneira (à esquerda) foi — E ao longo destas duas décadas de facto, na altura, se se pensar nis-
o primeiro CEO e meia, e com uma forte componen- so, Portugal não tinha muitas refe-
— Quais é que são alguns dados acontece naturalmente. da empresa, te de exportação desde o início, e rências em termos de tecnologia, hoje
que podem definir o João como sediada em com dimensão internacional, algu- temos alguns unicórnios, temos em-
gestor, como pessoa, e também, — Gosta de ouvir as opiniões, fun- Coimbra ma vez houve o estigma, o rótulo, de presas que são conhecidas lá fora,
sobretudo, no estilo de gestão e cionam muito em open space… ser português, ainda por cima em que dão cartas lá fora, e me deixam
de liderança. JC — Não tenho gabinete, até a áreas de tecnologias de informação superorgulhoso, mas na altura não
JC — Não há estilos de liderança esse nível sou transparente. Faze- que agora, sim, é reconhecido, mas havia, de maneira que os clientes
certos, cada um tem o seu próprio mos reuniões gerais trimestrais em se calhar há uns anos talvez houves- olhavam com desconfiança para Por-
estilo. Tenho um mantra que costu- que temos um open book sobre as se algumas dificuldades? tugal.
mo utilizar aqui na Critical e que as nossas contas, sobre o que esta- JC — Claro, houve até por várias Foi um caminho que foi sendo
pessoas conhecem, que diz assim: mos a vender, o que estamos a ga- razões e não era só ser de Portugal, construído, construir uma reputa-
Transparency creates trust, trust nhar, onde é que há problemas. como ser de dentro de Portugal, pois ção, ganhar confiança pouco a pou-
creates collaboration, collaboration Somos extremamente transparen- tínhamos criado a empresa em Coim- co até chegarmos a situações como
creates creativity, efficiency, resilien- tes com as nossas equipas, que bra, imagine. Criar uma empresa na as que temos hoje, em que a BMW
ce, success. acompanham a evolução da empre- província, naquela altura, eramos o confia em nós para construir uma
Acredito que tudo começa com a sa, e isso cria confiança e depois a underdog completo. Sentíamos que parte central do que são os carros da
transparência. Se formos transpa- confiança cria espaço para as pes- estávamos a fazer algo improvável. BMW, ou a Airbus que confia em nós
rentes, as equipas confiam e com soas colaborarem, as coisas estão As pessoas perguntavam: mas como para construir partes centrais daqui-
base na confiança já se pode cons- ligadas. é que em Coimbra agora surge uma lo que são os aviões da Airbus, e por
truir outra coisa que é a colabora- Por isso, nós valorizamos tanto este empresa de software. Isso, curiosa- aí adiante.
ção. Quando temos equipas a cola- princípio da transparência que se mente, deu-nos a força da energia
borarem, coisas extraordinárias reflete na ausência de gabinete, para tentar provar que éramos capa- — Como há muitos anos, em que
acontecem. As equipas são mais efi- mas é muito mais do que isso. zes e, portanto, teve um efeito impor- a Critical ficou conhecida, há cerca
cientes, são mais criativas, as equi- tante de motivação. ☛
pas são mais resilientes e o sucesso Mas lá fora, claro, passámos por PÁGINA SEGUINTE
62 PORTUGAL AMANHÃ amanha.pt 20 OUTUBRO 2023

JOÃO
CARREIRA
CEO da Critical
Software

→ Critical
Software
faz parte
do programa
Artemis
da NASA, em
colaboração
com a ESA

☛ de 20 anos, por ter fornecido deter- lhar um mercado espacial”. Um boca- tivação. Falando por mim e pelos — Hoje estamos a falar de que vo-
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minados materiais para a NASA, por dinho irracional, mas com uma ener- meus sócios, algo que nos movia era lume de negócios?
exemplo. gia muito forte. esse desejo de provar que nós somos JC — Este ano, vamos fechar perto
JC — Exatamente, começámos por capazes. dos 100 milhões.
aí. Também um bocadinho imprová- — Percebeu-se que havia, de fac- Nós não somos melhores ou piores
vel, porque, lá está, como éramos to, oportunidades, e que havia tam- do que nenhum outro engenheiro — E isso significa aumento em re-
uma empresa em Portugal, e nessa bém, por um lado, tecnologia, e, do noutro ponto do mundo. Consegui- lação aos anos anteriores, por exem-
altura, no país, não havia mercados ponto de vista dos recursos huma- mos estar ao nível dos melhores e isso plo, em relação a anos de pandemia?
espacial, nem havia tradição, nem ha- nos portugueses, gente capaz de en- deu-nos uma grande energia para fa- Imagino que tenham sofrido.
via players, e nós começámos a dizer, tregar, de investigar. zemos todo este percurso, sem dúvi- JC — Sim, houve um ano da pan-
todos entusiasmados, “vamos traba- JC — Sim, isso foi uma grande mo- da. demia em que nós basicamente não
20 OUTUBRO 2023 PORTUGAL AMANHÃ amanha.pt 63

❢ PORTUGAL 2043
“Precisamos de mais
100 empreendedores”’

O
Milhões de euros
de receita lhando para o futuro - Mas olha-se com desconfiança
daqui a 20 anos, para quem é empresário ou in-

10
como é que o João vestidor por uma questão às ve-
imagina, para já, este zes política ou ideológica ou por
negócio ? algum motivo cultural atávico?
JC — É difícil fazer projeções a 20 JC — Penso que é um pouco das
anos, ou a 100 anos. O nosso plano duas coisas. Há um aspecto cultu-
indústrias para os próximos três anos é du- ral importante em alguém que sai
plicar o volume de negócios. Esta- da universidade com o objetivo

1300
mos nos 100 milhões e o objetivo número um de encontrar um em-
é passarmos para os 200 milhões prego a trabalhar por conta de ou-
em 2026. trem. São muito poucos aqueles
É essa a nossa visão para os pró- que pensam em criar o seu pró-
ximos três anos, mas queremos prio projeto e com esse projeto
colaboradores continuar a crescer numa linha criar empregos bem pagos e criar
orientadora baseada num ecossis- um negócio produtivo e contribuir
tema. Isto é, somos a Critical para a economia.
Software, mas somos uma joint- Penso que há muito pouca gen-
-venture com clientes, somos um te a questionar-se dessa forma. O
fundo, somos startups, somos objectivo é encontrar um empre-
spin-offs, e ter consciência, com go por conta outrem e se há 25
base nesse ecossistema, que va- anos, quando a Critical apareceu,
mos conseguir crescer de uma for- esses empregos estavam cá, agora
ma muito mais rápida e mais sus- há empregos mais bem pagos lá
tentável. fora, portanto, não é surpreen-
Daqui a 20 anos tenho a visão dente que os jovens licenciados
de um ecossistema saudável, com saiam do país para ir procurar sa-
a Critical Software no centro a lários maiores a trabalhar por con-
crescer sustentável, lucrativa, e a ta de outrem.
ter um impacto no mundo positi- Penso que há muito espaço e há
vo tal como acredito que tivemos muita oportunidade para muitos
até agora. desses jovens pensarem de forma
crescemos. Ficámos flat, mas des- ↑ João adora extraordinárias, de fazer coisas que um pouco diferente e tentarem fa-
de o início que temos uma pledge viajar e já muitas vezes não acreditam que são — E olhando para o país? A per- zer algo por Portugal.
de crescer 20% ao ano e, em geral, viveu na capazes de fazer, é preciso muita li- gunta é mais como cidadão…
temos conseguido sempre atingir Holanda, derança, gestão emuito trabalho de JC — Como cidadão, acho que — E também foram formados em
esse objetivo, portanto, temos cres- no Reino criação de uma cultura forte. É preci- o país tem muitas coisas boas, mas Portugal, houve um investimento
cido a 20%. Unido e nos so ter as pessoas identificadas com tem problemas ao nível da econo- neles, não é?
Estados valores comuns, com propósito, por- mia, da geração de riqueza, todos JC — Exatamente. Por vezes fala-
— E suportado mais em que mer- Unidos que isso no fim do dia vai fazer a di- sabemos dos problemas de produ- -se naquilo que o país não faz para
cado? Alemanha? ferença. tividade. Penso que esses proble- reter estes jovens, mas penso que
JC — Na Alemanha, em Inglaterra Temos conseguido fazer isso, ape- mas só se resolvem com empre- se devia falar também daquilo que
e nos Estados Unidos, mas a Alema- sar das dificuldades que têm havido sas, com iniciativa privada e com o país faz, que foi oferecer uma
nha no topo, sem dúvida. neste mercado. empreendedores. educação gratuita.
Há uma grande procura de enge- Se queremos fazer crescer eco- Eu tive uma educação gratuita.
— Neste caso estamos nas vossas nheiros informáticos, não temos nomia, se queremos aumentar a Formei-me em Engenharia, fiz um
instalações em Lisboa, mas obvia- sentido, de facto, uma dificuldade produtividade, precisamos de em- doutoramento, foi tudo pago pelos
mente que têm instalações onde extrema em contratar pessoas por- preendedores. A economia não meus concidadãos, todos nós. Es-
tudo começou, em Coimbra. Qual que a marca Critical tem essa di- vai arrancar se não for com pes- tou grato por isso e tenho uma dí-
é neste momento o maior desafio mensão. soas com convicção, com ambi- vida para com o país por isso. Po-
do ponto de vista da gestão do pro- As pessoas olham para a Critical ção, com capacidade de correr ris- dia não ter sido assim, não ter tido
jeto, mas, sobretudo, da gestão das como uma marca com uma cultura cos e que se lancem em aventuras uma educação totalmente paga
pessoas? muito forte, uma cultura muito espe- empresariais. pelos meus concidadãos, como de
JC — Somos uma empresa talen- cial. Olham para a Critical como sen- Sinto que aí temos muito a fazer resto há muitos países que não o
to, o que nós fazemos são recursos do uma escola de Engenharia, isto é, ainda. Não sinto, enquanto país, fazem.
humanos. Isso é central, as pessoas um sítio onde se aprende com os me- que tenhamos criado um ambien- Nos Estados Unidos, se eu qui-
aqui fazem verdadeiramente a di- lhores, com os desafios mais com- te conducente a que as pessoas ser ter esse nível de estudos tenho
ferença. plexos, e isso tem sido um alicerce, corram riscos e que as pessoas de pedir um empréstimo, supor-
Para manter uma equipa motiva- provavelmente sólido do nosso cres- criem empresas e estabeleçam os tar os custos e depois pagar uma
da, inspirada, capaz de fazer coisas cimento. ● seus próprios negócios. [prestação ao banco]. ●
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➽ António Ramalho
Em busca do nosso desígnio coletivo
competitividade internacional, dado, parece desistido, parece gência com a média europeia muitas, as convicções são
não será certamente um bom mesmo anestesiado. foi o mote. Garantir um nível demais, os consensos difíceis
presságio que o 11º País em Ora, quando um colectivo, de vida em média com os con- de conseguir. Depois, um
população da União seja hoje o seja empresa, família ou géneres europeus era o desí- desígnio não traz resultados
19º no indicador de convergên- Estado, entra em modo de resi- gnio. Este quarto de século imediatos, exige consistência,
cia do PIB/per capita em PPP. E gnação, tal se deve geralmente demonstra o falhanço rotundo perseverança, coragem conti-
que em breve possa ser o 21º. à falta de objectivos comuns, à desse objectivo. Os factos com- nuada. Mas um País como o
O que parece indesmentível falta de sentido de propósito ou provam-no. nosso, à beira dos 900 anos
é que o nosso percurso colecti- de forma mais vulgar à falta de Só que talvez Portugal não de história tem o dever de
vo em termos de crescimento desígnio. E se pensarmos alto, seja dotado para a mediana. procurar o que o distingue até
durante um quarto deste sécu- talvez seja esse uma das mais Talvez estar na média não nos porque as razões pelas quais
CAUSA PÚBLICA lo é, em termos relativos na graves omissões que enfrenta- satisfaça colectivamente. E um País existe não são as mes-
Europa, pouco mais que desas- mos. Não temos nós mais e quando nos aproximamos dos mas pelas quais um País
troso. Atendendo aos Fundos melhores academias? Não 900 anos de história colectiva, se preserva.
Portugal enquanto en- transferidos da própria União, temos nós mais e melhor quando olhamos o nosso passa- E ao fim de um quarto de
tidade colectiva parece à aparente evolução das capa- conhecimento? Não temos nós do, tudo parece indicar que o século relativamente desperdi-
acomodado, desistido, cidades humanas instaladas e mais e melhores infraestrutu- que nos motiva é a diferença, o çado já é altura de procurar
mesmo anestesiado. ao enquadramento estável do ras? Então onde reside esta que nos preserva é a originali- objetivos comuns suscetíveis
nosso posicionamento geoes- fraca produtividade, esta inca- dade. Assim foi na forma como de nos afastar deste fado da
tratégico, estes factos deveriam pacidade de competir em mer- apostamos no mar, assim foi Média. Mesmo que para isso
ter merecido uma longa lista de cados mais amplos? quando nos cruzamos na multi- seja preciso um outro quarto
comentários, uma sensação Mas se refletirmos bem, culturalidade, assim foi quando do século. Por que tal como
colectiva de desagrado. Portugal apostou tudo na sua nos sacrificamos na diáspora, uma família, ou uma empresa,

F
Desenganem-se. O reconhe- inserção Europeia. Obteve para assim é quando competimos também um País não sobrevive
iquei impressionado cimento de um quarto de sécu- isso um consenso interno notá- fora do nosso conforto. sem um Propósito.
com o ensaio/artigo lo de fraca performance colec- vel, garantiu meios financeiros Portugal parece não caber em
de Abel Mateus num tiva não mereceu mais do que relevantes, arriscou-se na pri- si próprio. Portugal é europeu, Economista e Presidente do Conselho
dos últimos referências secundárias. A meira linha da integração, mas não se consegue resumir à de Administração da Fundação Batalha
Amanhã.pt. Nesse medição do insucesso nem nomeadamente numa corajosa Europa. de Aljubarrota
ensaio, Abel Mateus apresenta muito interessa, nem mesmo adesão ao Euro. Para isso apos- Assegurar e consensualizar
em quadros detalhados as evo- ensina. Portugal enquanto enti- tou tudo no objectivo da um desígnio não é fácil em Oiça o podcast Pensar
luções comparativas para dade colectiva parece acomo- MÉDIA. Conseguir a conver- democracia. As opiniões são Amanhã em amanha.pt
diversos períodos do cresci-
mento médio do PIB potencial
dos 27 Países da União a que
acrescenta a evolução do nível
de convergência.
Os números falam por si. E os
resultados não podiam ser mais
desanimadores.
Portugal entre 2000 e 2024
ocupa o antepenúltimo lugar
do “ranking” do crescimento
médio com um valor de 0.9%
de crescimento médio anual do
PIB potencial. Atrás de nós,
neste quarto de século só a
Grécia e a Itália. E ao nível da
convergência a situação não é
mais positiva estando o nosso
PIB/per capita a 79,8% da
média Europeia enquanto em
2000 o mesmo indicador esta-
va a 85,2% dessa mesma média.
Se quisermos comparar a nossa
performance no período com
os 6 países da nossa dimensão
(entre 9 e 12 milhões de resi-
dentes) reparamos que o nosso
crescimento potencial se situa
a metade da média simples dos
restantes (mesmo incluído a
Grécia).
FOTO AUTOR

Ainda que o sucesso de um


País não se possa medir exclu-
sivamente pelo seu grau de

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