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Material Digital

do Professor
ENSINO MÉDIO
Elaborado por
José De Nicola
Lucas De Nicola
CC BY NC 4.0 International

Organização:
Mário de Andrade José De Nicola
Lucas De Nicola

PAULICEIA
DESVAIRADA Material disponibilizado em licença aberta do tipo Creative Commons – Atribuição não comercial (CC BY NC – 4.0 International).
Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros.
Lira Paulistana
1a edição – Rio de Janeiro/RJ – 2021

Material Digital do Professor


Ensino Médio

Elaboração: José De Nicola, Lucas De Nicola


Coordenação editorial: Nilcéia Esposito / Book Maker Composição Editorial
Edição: Daniel Orlando e Flavia Brandão
Assistência editorial: Paula Dias
Revisão: Book Maker Composição Editorial
Diagramação: Nany Produções Gráficas

Editora Arlecchino
Rua São Cristovão, 489, sala 303
São Cristovão - Rio de Janeiro/RJ
CEP: 20940-001

Produzido sob licença CC BY NC 4.0 International

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Sumário

Carta ao professor ......................................................................................4

Na ponta da língua ......................................................................................6

Proposta de atividades I

Ampliando horizontes.............................................................................. 18

Proposta de atividades II

Mergulhando na obra .............................................................................. 24

Aprofundamento

Novos caminhos ....................................................................................... 31

Referências complementares

Organizando a estante ........................................................................... 33

Bibliografia comentada

Material disponibilizado em licença aberta do tipo Creative Commons – Atribuição não comercial (CC BY NC – 4.0 International).
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Carta ao professor

Caro professor(a),
Pauliceia desvairada é uma leitura fundamental não só para se co-
nhecer a obra poética de Mário de Andrade, um dos maiores escritores
e intelectuais brasileiros, como para se entender o início da trajetó-
ria do modernismo brasileiro, cujas propostas estéticas e temáticas
se fizeram sentir ao longo do século XX e estão presentes ainda hoje.
Nesse sentido, através das impressões de um eu lírico que se entende
como “um tupi tangendo um alaúde”, o livro, partindo do contexto de
São Paulo do início da década de 1920, é uma efetiva reflexão sobre
o que é a cultura brasileira. A trajetória da obra, desde a sua primeira
redação até a publicação em forma de livro, evidencia um momento
de transformação da literatura e das artes brasileiras. Enquanto tex-
to de ruptura, Pauliceia desvairada foi um verdadeiro acontecimento,
uma realização que possui diversos elementos e camadas de sentido,
o que inclui a sua capa de losangos coloridos, sua provocativa dedi-
catória e seu irônico e inquieto “Prefácio interessantíssimo”, no qual
o autor apresenta algumas de suas reflexões sobre arte e literatura.
Esse é um dos elementos mais interessantes do livro: a leitura permite
compreender a forma como se dá a criação literária e os diversos fato-
res nela envolvidos. Além disso, Pauliceia desvairada possibilita uma
profunda reflexão crítica acerca do que é viver em uma grande cidade,
sobretudo uma cidade que passava por um intenso e acelerado pro-
cesso de crescimento econômico e populacional. Os poemas do livro
tratam de um ambiente diverso e conflituoso – “arlequinal”, segundo a
imagem elaborada por Mário de Andrade –, composto por pessoas dos
mais variados estratos sociais, origens nacionais e grupos étnicos.
Compreender como o autor transformou tudo isso em poesia é uma
forma de compreender algo de nossa própria vida cotidiana, de nos-
sas experiências e de nossa realidade – vivamos ou não em grandes
cidades.

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros.
Mais do que obras, Mário de Andrade, deixou um verdadeiro legado
para a literatura e a cultura brasileira, sendo um de seus maiores cria-
dores e intérpretes.
Boa leitura!

QUADRO RESUMO
Gênero Tema
Diálogos com a sociologia e
Poema antropologia
A obra de Mário de Andrade, Mário de Andrade, ao apresentar
organizada por Lucas e José a cidade de São Paulo ao
De Nicola, reúne poemas para leitor, apresenta também seus
apresentar a cidade de São Paulo meandros, seus modos de vida e
ao leitor. seus personagens.

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Na ponta da língua
Proposta de atividades I

DE OLHO NA BNCC
As atividades sugeridas nesta subseção contemplam as seguintes habilidades pro-
postas pela BNCC:
(EM13LGG103) Analisar o funcionamento das linguagens, para interpretar e produzir
criticamente discursos em textos de diversas semioses (visuais, verbais, sonoras, ges-
tuais).
(EM13LGG303) Debater questões polêmicas de relevância social, analisando diferen-
tes argumentos e opiniões, para formular, negociar e sustentar posições, frente à aná-
lise de perspectivas distintas.
(EM13LGG401) Analisar criticamente textos de modo a compreender e caracterizar as
línguas como fenômeno (geo)político, histórico, social, cultural, variável, heterogêneo
e sensível aos contextos de uso.
(EM13LGG602) Fruir e apreciar esteticamente diversas manifestações artísticas e cul-
turais, das locais às mundiais, assim como delas participar, de modo a aguçar conti-
nuamente a sensibilidade, a imaginação e a criatividade.
(EM13LGG604) Relacionar as práticas artísticas às diferentes dimensões da vida so-
cial, cultural, política e econômica e identificar o processo de construção histórica des-
sas práticas.
(EM13LP02) Estabelecer relações entre as partes do texto, tanto na produção como
na leitura/escuta, considerando a construção composicional e o estilo do gênero,
usando/reconhecendo adequadamente elementos e recursos coesivos diversos que
contribuam para a coerência, a continuidade do texto e sua progressão temática, e or-
ganizando informações, tendo em vista as condições de produção e as relações lógico-
-discursivas envolvidas (causa/efeito ou consequência; tese/argumentos; problema/
solução; definição/exemplos etc.).
(EM13LP06) Analisar efeitos de sentido decorrentes de usos expressivos da lingua-
gem, da escolha de determinadas palavras ou expressões e da ordenação, combinação
e contraposição de palavras, dentre outros, para ampliar as possibilidades de constru-
ção de sentidos e de uso crítico da língua.

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros.
(EM13LP07) Analisar, em textos de diferentes gêneros, marcas que expressam a posi-
ção do enunciador frente àquilo que é dito: uso de diferentes modalidades (epistêmica,
deôntica e apreciativa) e de diferentes recursos gramaticais que operam como modali-
zadores (verbos modais, tempos e modos verbais, expressões modais, adjetivos, locu-
ções ou orações adjetivas, advérbios, locuções ou orações adverbiais, entonação etc.),
uso de estratégias de impessoalização (uso de terceira pessoa e de voz passiva etc.),
com vistas ao incremento da compreensão e da criticidade e ao manejo adequado des-
ses elementos nos textos produzidos, considerando os contextos de produção.
(EM13LP08) Analisar elementos e aspectos da sintaxe do português, como a ordem
dos constituintes da sentença (e os efeito que causam sua inversão), a estrutura dos
sintagmas, as categorias sintáticas, os processos de coordenação e subordinação (e
os efeitos de seus usos) e a sintaxe de concordância e de regência, de modo a poten-
cializar os processos de compreensão e produção de textos e a possibilitar escolhas
adequadas à situação comunicativa.
(EM13LP13) Analisar, a partir de referências contextuais, estéticas e culturais, efeitos
de sentido decorrentes de escolhas de elementos sonoros (volume, timbre, intensida-
de, pausas, ritmo, efeitos sonoros, sincronização etc.) e de suas relações com o verbal,
levando-os em conta na produção de áudios, para ampliar as possibilidades de cons-
trução de sentidos e de apreciação.
(EM13LP31) Compreender criticamente textos de divulgação científica orais, escritos
e multissemióticos de diferentes áreas do conhecimento, identificando sua organiza-
ção tópica e a hierarquização das informações, identificando e descartando fontes não
confiáveis e problematizando enfoques tendenciosos ou superficiais.
(EM13LP46) Compartilhar sentidos construídos na leitura/escuta de textos literários,
percebendo diferenças e eventuais tensões entre as formas pessoais e as coletivas
de apreensão desses textos, para exercitar o diálogo cultural e aguçar a perspectiva
crítica.
(EM13LP47) Participar de eventos (saraus, competições orais, audições, mostras, fes-
tivais, feiras culturais e literárias, rodas e clubes de leitura, cooperativas culturais, jo-
grais, repentes, slams etc.), inclusive para socializar obras da própria autoria (poemas,
contos e suas variedades, roteiros e microrroteiros, videominutos, playlists comenta-
das de música etc.) e/ou interpretar obras de outros, inserindo-se nas diferentes práti-
cas culturais de seu tempo.

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros. 7
(EM13LP48) Identificar assimilações, rupturas e permanências no processo de consti-
tuição da literatura brasileira e ao longo de sua trajetória, por meio da leitura e análise
de obras fundamentais do cânone ocidental, em especial da literatura portuguesa, para
perceber a historicidade de matrizes e procedimentos estéticos.
(EM13LP49) Perceber as peculiaridades estruturais e estilísticas de diferentes gêneros
literários (a apreensão pessoal do cotidiano nas crônicas, a manifestação livre e subje-
tiva do eu lírico diante do mundo nos poemas, a múltipla perspectiva da vida humana e
social dos romances, a dimensão política e social de textos da literatura marginal e da
periferia etc.) para experimentar os diferentes ângulos de apreensão do indivíduo e do
mundo pela literatura.
(EM13LP50) Analisar relações intertextuais e interdiscursivas entre obras de diferen-
tes autores e gêneros literários de um mesmo momento histórico e de momentos his-
tóricos diversos, explorando os modos como a literatura e as artes em geral se consti-
tuem, dialogam e se retroalimentam.
(EM13LP52) Analisar obras significativas das literaturas brasileiras e de outros países
e povos, em especial a portuguesa, a indígena, a africana e a latino-americana, com
base em ferramentas da crítica literária (estrutura da composição, estilo, aspectos dis-
cursivos) ou outros critérios relacionados a diferentes matrizes culturais, consideran-
do o contexto de produção (visões de mundo, diálogos com outros textos, inserções
em movimentos estéticos e culturais etc.) e o modo como dialogam com o presente.

Sobre o trabalho com textos no campo artístico-literário, diz a BNCC:


No campo artístico-literário, buscam-se a ampliação do contato e a
análise mais fundamentada de manifestações culturais e artísticas em
geral. Está em jogo a continuidade da formação do leitor literário e do
desenvolvimento da fruição. A análise contextualizada de produções
artísticas e dos textos literários, com destaque para os clássicos,
intensifica-se no Ensino Médio. Gêneros e formas diversas de produções
vinculadas à apreciação de obras artísticas e produções culturais
(resenhas, vlogs e podcasts literários, culturais etc.) ou a formas de
apropriação do texto literário, de produções cinematográficas e teatrais
e de outras manifestações artísticas (remidiações, paródias, estilizações,
videominutos, fanfics etc.) continuam a ser considerados associados a
habilidades técnicas e estéticas mais refinadas.

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros.
A escrita literária, por sua vez, ainda que não seja o foco central
do componente de Língua Portuguesa, também se mostra rica em
possibilidades expressivas. Já exercitada no Ensino Fundamental, pode
ser ampliada e aprofundada no Ensino Médio, aproveitando o interesse
de muitos jovens por manifestações esteticamente organizadas comuns
às culturas juvenis.
O que está em questão nesse tipo de escrita não é informar, ensinar
ou simplesmente comunicar. O exercício literário inclui também a função
de produzir certos níveis de reconhecimento, empatia e solidariedade e
envolve reinventar, questionar e descobrir-se. Sendo assim, ele é uma
função importante em termos de elaboração da subjetividade e das
inter-relações pessoais. Nesse sentido, o desenvolvimento de textos
construídos esteticamente – no âmbito dos mais diferentes gêneros –
pode propiciar a exploração de emoções, sentimentos e ideias que não
encontram lugar em outros gêneros não literários (e que, por isso, devem
ser explorados).
(BNCC – versão completa. p. 503-4)

1. Métrica é a medida de um verso, definida pelo número de sílabas


poéticas. A sílaba poética nem sempre corresponde a uma sílaba gra-
matical, pois a divisão silábica de um verso leva em conta as emissões
de voz do verso como um todo; além disso, conta-se até a última sílaba
tônica do verso, desprezando-se as sílabas pós-tônicas da última pa-
lavra. Assim, fundem-se vogais átonas ou uma vogal átona funde-se a
uma vogal tônica; via de regra, os hiatos não se fundem. Por exemplo:

São Paulo! Comoção de minha vida...


Galicismo a berrar nos desertos da América!

São / Pau / lo! / Co / mo / ção / de / mi / nha / vi [da...]


1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

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Ga / li / cis / mo a / be / rrar / nos / de / ser / tos / da A / mé [rica!

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

No primeiro verso, as sílabas poéticas coincidem com as sílabas


gramaticais e apenas a última sílaba não é contada porque a palavra
“vida” é paroxítona. No segundo verso, em “mo a” temos a fusão das
sílabas pois as vogais são átonas; o mesmo ocorre em “da A”; como a
última palavra do verso é proparoxítona, as duas sílabas pós-tônicas
são desprezadas. Assim, no primeiro verso reproduzido, Mário de An-
drade empregou a métrica decassílaba e no segundo, a métrica dode-
cassílaba (o verso de 12 sílabas poéticas é chamado de alexandrino) .
No “Prefácio interessantíssimo”, o agora modernista Mário de An-
drade, que não faz versos rimados e metrificados, diz que “perto de
dez anos metrifiquei, rimei. Exemplo?”, e mostrando que domina as
técnicas, apresenta um soneto metrificado e rimado.
Pedir para os estudantes fazerem a escansão (ou seja, decompor
as sílabas de um verso) do último terceto do soneto e comentar o es-
quema de rimas:

Artista
O meu desejo é ser pintor – Lionardo,
cujo ideal em piedades se acrisola;
fazendo abrir-se ao mundo a ampla corola
do sonho ilustre que em meu peito guardo...

Meu anseio é, trazendo ao fundo pardo


da vida, a cor da veneziana escola,
dar tons de rosa e de ouro, por esmola,
a quanto houver de penedia ou cardo.

Quando encontrar o manancial das tintas


e os pincéis exaltados com que pintas,
Veronese! teus quadros e teus frisos,

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros.
irei morar onde as Desgraças moram;
e viverei de colorir sorrisos
nos lábios dos que imprecam ou que choram!

Neste poema, Mário de Andrade trabalhou versos decassílabos,


considerada pelos renascentistas como a “métrica perfeita, a medida
certa”, sendo muito empregada nos sonetos em língua portuguesa
desde a produção poética de Camões. Comentar que os dois pintores
citados – Leonardo da Vinci (1452-1519) e Paolo Veronese (1528-
1588) – são renascentistas italianos.
O esquema de rimas é ABBA ABBA CCD EDE.
A escansão do último terceto fica assim:

I / rei / mo / rar / on / de as / Des / gra / ças / mo [ram;]


e / vi / ve / rei / de / co / lo / rir / so / rri [sos]
nos / lá / bios / dos / que im / pre / cam / ou / que / cho [ram!]

2. Refrão ou estribilho é um verso (ou agrupamento de versos)


que se repete ao final das estrofes. O refrão é responsável pelo ritmo
marcado que o poema assume e, ao mesmo tempo, enfatiza uma de-
terminada ideia.
Pedir para os estudantes selecionarem um poema do livro que
apresenta refrão e comentarem a ênfase dada por esse recurso no
poema selecionado.
Poema que apresenta refrão: “Domingo”.
O poema aborda, de forma crítica, certos rituais de um domingo
qualquer da elite paulistana. Na primeira estrofe, as famílias na missa,
mais para cumprir uma obrigação social (roupas finas, troca de olha-
res) na então elegante e elitizada igreja de Santa Cecília do que um ato
religioso de fé, Cristo pregando nos desertos e os frequentadores no
“confiteor”, ou seja, uma confissão pública feita antes da comunhão.

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A segunda estrofe aborda outra distração domingueira: o jogo de
futebol, no elitizado bairro do Jardim américa. A terceira estrofe trata
do ritual do fim da tarde de domingo: o corso, geralmente feito na tam-
bém elitizada avenida Paulista. Na quarta estrofe, fechando o domin-
go, a sessão de cinema no luxuoso cine Central, com filmes de caubói
e dramas amorosos que despertam desejos nas moças virgens.
Fechando todas as estrofes, o refrão que associa esses rituais às
futilidades da dita civilização, no caso, da cidade que se urbaniza ace-
leradamente: “Futilidade, civilização”.

3. Sugerir aos estudantes um sarau em que cada um lê um poema


curto (o fato de serem poemas curtos facilita a realização do sarau)
; ou seja, excluir dessa leitura “As enfibraturas do Ipiranga”. Antes da
leitura, retomar o seguinte trecho do “Prefácio interessantíssimo”:
Aliás versos não se escrevem para leitura de olhos mudos. Versos
cantam-se, urram-se, choram-se. Quem não souber cantar não leia
“Paisagem nº 1”. Quem não souber urrar não leia “Ode do burguês”. Quem
não souber rezar, não leia “Religião”. Desprezar: “A escalada”. Sofrer:
“Colloque sentimental”. Perdoar: a cantiga do berço, um dos solos de
Minha Loucura, das “Enfibraturas do Ipiranga”. Não continuo. Repugna-
me dar a chave de meu livro. Quem for como eu tem essa chave.

Após a leitura, a sugestão é discutir mais detalhadamente alguns


poemas para que os estudantes percebam tanto o trabalho formal
como as ideias de Mário de Andrade. Seria interessante que os estu-
dantes selecionassem os poemas para essa discussão; da parte do(a)
professor(a), fica a sugestão de trabalhar os poemas relacionados na
atividade a seguir.

4. Propor um trabalho de intertextualidade com os poemas “Ode


ao burguês”, do livro Pauliceia desvairada, e “Moça linda bem trata-
da”, do livro Lira paulistana (a última produção de Mário de Andrade,
com poemas escritos no início da década de 1940; o livro foi publi-
cado postumamente).

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Ode ao burguês
Eu insulto o burguês! O burguês-níquel,
o burguês-burguês!
A digestão bem feita de São Paulo!
O homem-curva! o homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,
é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!

Eu insulto as aristocracias cautelosas!


Os barões lampeões! os condes Joões! os duques zurros!
que vivem dentro de muros sem pulos;
e gemem sangues de alguns mil-réis fracos
para dizerem que as filhas da senhora falam o francês
e tocam o “Printemps” com as unhas!

Eu insulto o burguês-funesto!
O indigesto feijão com toucinho, dono das tradições!
Fora os que algarismam os amanhãs!
Olha a vida dos nossos setembros!
Fará Sol? Choverá? Arlequinal!
Mas à chuva dos rosais
o êxtase fará sempre Sol!

Morte à gordura!
Morte às adiposidades cerebrais!
Morte ao burguês-mensal!
ao burguês-cinema! ao burguês-tílburi!
Padaria Suíça! Morte viva ao Adriano!
“– Ai, filha, que te darei pelos teus anos?
– Um colar... – Conto e quinhentos!!!
Mas nós morremos de fome!”

Come! Come-te a ti mesmo, oh! gelatina pasma!


Oh! purée de batatas morais!
Oh! cabelos nas ventas! oh! carecas!
Ódio aos temperamentos regulares!

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Ódio aos relógios musculares! Morte e infâmia!
Ódio à soma! Ódio aos secos e molhados!
Ódio aos sem desfalecimentos nem arrependimentos,
sempiternamente as mesmices convencionais!
De mãos nas costas! Marco eu o compasso! Eia!
Dois a dois! Primeira posição! Marcha!
Todos para a Central do meu rancor inebriante!

Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio!


Morte ao burguês de giolhos,
cheirando religião e que não crê em Deus!
Ódio vermelho! Ódio fecundo! Ódio cíclico!
Ódio fundamento, sem perdão!

Fora! Fú! Fora o bom burguês!...

*******************
Moça linda bem tratada,
Três séculos de família,
Burra como uma porta:
Um amor.

Grã-fino do despudor,
Esporte, ignorância e sexo,
Burro como uma porta:
Um coió.

Mulher gordaça, filó


De ouro por todos os poros,
Burra como uma porta:
Paciência...

Plutocrata sem consciência,


Nada porta, terremoto
Que a porta do pobre arromba:
Uma bomba.

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Sobre “Ode ao burguês”, comentar os poemas do livro Pauliceia
desvairada foram escritos entre 1920 e 1921 (o livro foi publicado
em 1922, depois da realização da Semana de Arte Moderna), em um
momento de ruptura de paradigmas e marcante influência dos movi-
mentos de vanguarda do início do século XX. “Ode ao burguês” pode,
inclusive, ser considerado o poema do livro que mais se aproxima da
estética futurista, com a valorização dos substantivos em detrimento
dos adjetivos e advérbios; comentar os casos em que Mário de Andra-
de empregou substantivos como adjetivos, sendo que, em algumas
imagens, empregou substantivos compostos, com o segundo ele-
mento sendo um substantivo funcionando como adjetivo. Destacar os
seguintes exemplos: Barões lampiões, condes Joões, duques zurros,
ódio fundamento; Burguês-níquel, burguês-cinema, burguês-tílburi,
homem-curva, homem-nádegas. Na reiteração burguês-burguês é
possível entender o segundo elemento como substantivo ou como ad-
jetivo.
Comentar que ode é uma poesia entusiástica, de exaltação, mas,
no decorrer do poema, Mário de Andrade faz a “brincadeira” passando
a insultar o burguês e as aristocracias cautelosas, com a palavra ode
transformando-se em ódio.
Comentar que em dois momentos da ode o poeta caracteriza as
“filhas”: primeiro, as filhas da aristocracia; depois, as da burguesia. A
filha da aristocracia é educada para o casamento (a moça prendada
toca piano, fala francês); a filha da burguesia está preocupada com a
ostentação (escolhe o colar pelo preço).
Espera-se que os estudantes percebam que, nas várias referên-
cias feitas ao burguês, predomina a preocupação dele com o mundo
dos negócios e com o mundo das aparências, com o dinheiro. O verso
“Fora os que algarismam os amanhãs!” sintetiza essa ideia, já que al-
garismar seria transformar tudo em algarismos, números, cifras, valo-
res. Esse verso seria uma crítica à excessiva preocupação da burgue-
sia em acumular capital.

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Essas discussões pretendem levar os estudantes a perceber parte
do intenso e moderno trabalho que Mário de Andrade realiza com a lin-
guagem. Comente que algarismam é a forma verbal da terceira pessoa
do plural do presente do indicativo do verbo algarismar, derivado do
substantivo algarismo. Esse verbo não está dicionarizado; trata-se de
um neologismo criado pelo poeta.
Sobre “Moça linda bem tratada”, espera-se que os estudantes per-
cebam que cada estrofe refere-se a um membro da pequena família.
Primeira estrofe: a filha de uma família tradicional, bonitinha, mas bur-
ra. Segunda estrofe: o filho preocupado com esporte e sexo, também
burro. Terceira estrofe: a mãe, gorda, rica e, também, burra. Quarta es-
trofe: o pai, homem rico que vive de explorar os pobres.
O plutocrata (de pluto = “riqueza” + cracia = “poder, domínio, gover-
no”), “pessoa influente e preponderante pelo seu dinheiro” não é nada
burro (destacar o terceiro verso de cada estrofe). Nas três primeiras
estrofes, “porta” aparece como termo de comparação: burro como uma
porta, surdo como uma porta etc., significa excessivamente burro, sur-
do etc. Na última estrofe, “porta” está empregada em sentido denotati-
vo: o plutocrata arromba a porta do pobre.
Finalmente, no trabalho de intertextualidade, espera-se que os es-
tudantes percebam que são dois poemas de vertente social, com críti-
cas à burguesia paulistana que, com a industrialização, com o comér-
cio, com os serviços exigidos por uma cidade grande, assumia cada
vez mais uma posição de destaque na sociedade. Em relação ao estilo
dos dois poemas, percebe-se como se alterou a postura de Mário de
Andrade dos anos revolucionários do início da década de 1920 para
o homem maduro e um tanto desiludido do início dos anos de 1940.

5. Apresentar aos alunos o trecho abaixo; é um diálogo entre um


sapateiro e o diabo, da peça Auto da barca do Inferno, de Gil Vicente
(início do século XVI). A seguir, pedir para os alunos relacionarem com
uma passagem de “Ode ao burguês” na qual Mário de Andrade faz uma
crítica semelhante, comentando o teor de ambas as críticas.

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros.
Sapateiro — Quantas missas eu ouvi,
não me hão elas de prestar?
Diabo — Ouvir missa, então roubar,
é caminho para aqui.

Espera-se que os alunos relacionem com a seguinte passagem: “...


burguês de giolhos, / cheirando religião e que não crê em Deus!” (de
giolhos = de joelhos). Tanto Gil Vicente como Mário de Andrade (que
era profundamente religioso) criticam o comportamento de falsos
cristãos, que comparecem à missa mais por obrigação social do que
por fé e que, na prática cotidiana, têm atitudes que podem ser con-
sideradas anticristãs. Relacionar também com a primeira estrofe do
poema “Domingo”, com crítica do mesmo teor.

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Ampliando horizontes
Proposta de atividades II

DE OLHO NA BNCC
As atividades sugeridas nesta subseção contemplam as seguintes habilidades pro-
postas pela BNCC:
(EM13LGG103) Analisar o funcionamento das linguagens, para interpretar e produzir
criticamente discursos em textos de diversas semioses (visuais, verbais, sonoras, ges-
tuais).
(EM13LGG202) Analisar interesses, relações de poder e perspectivas de mundo nos
discursos das diversas práticas de linguagem (artísticas, corporais e verbais), com-
preendendo criticamente o modo como circulam, constituem-se e (re)produzem signi-
ficação e ideologias.
(EM13LGG203) Analisar os diálogos e os processos de disputa por legitimidade nas
práticas de linguagem e em suas produções (artísticas, corporais e verbais).
(EM13LGG303) Debater questões polêmicas de relevância social, analisando diferen-
tes argumentos e opiniões, para formular, negociar e sustentar posições, frente à aná-
lise de perspectivas distintas.
(EM13LGG401) Analisar criticamente textos de modo a compreender e caracterizar as
línguas como fenômeno (geo)político, histórico, social, cultural, variável, heterogêneo
e sensível aos contextos de uso.
(EM13LGG602) Fruir e apreciar esteticamente diversas manifestações artísticas e cul-
turais, das locais às mundiais, assim como delas participar, de modo a aguçar conti-
nuamente a sensibilidade, a imaginação e a criatividade.
(EM13LP01) Relacionar o texto, tanto na produção como na leitura/ escuta, com suas
condições de produção e seu contexto sócio-histórico de circulação (leitor/audiência
previstos, objetivos, pontos de vista e perspectivas, papel social do autor, época, gêne-
ro do discurso etc.), de forma a ampliar as possibilidades de construção de sentidos e
de análise crítica e produzir textos adequados a diferentes situações.
(EM13LP01) Relacionar o texto, tanto na produção como na leitura/ escuta, com suas
condições de produção e seu contexto sócio-histórico de circulação (leitor/audiência

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros.
previstos, objetivos, pontos de vista e perspectivas, papel social do autor, época, gêne-
ro do discurso etc.), de forma a ampliar as possibilidades de construção de sentidos e
de análise crítica e produzir textos adequados a diferentes situações.
(EM13LP02) Estabelecer relações entre as partes do texto, tanto na produção como
na leitura/escuta, considerando a construção composicional e o estilo do gênero,
usando/reconhecendo adequadamente elementos e recursos coesivos diversos que
contribuam para a coerência, a continuidade do texto e sua progressão temática, e or-
ganizando informações, tendo em vista as condições de produção e as relações lógico-
-discursivas envolvidas (causa/efeito ou consequência; tese/argumentos; problema/
solução; definição/exemplos etc.).
(EM13LP03) Analisar relações de intertextualidade e interdiscursividade que permi-
tam a explicitação de relações dialógicas, a identificação de posicionamentos ou de
perspectivas, a compreensão de paráfrases, paródias e estilizações, entre outras pos-
sibilidades.
(EM13LP04) Estabelecer relações de interdiscursividade e intertextualidade para ex-
plicitar, sustentar e conferir consistência a posicionamentos e para construir e corrobo-
rar explicações e relatos, fazendo uso de citações e paráfrases devidamente marcadas.
(EM13LP05) Analisar, em textos argumentativos, os posicionamentos assumidos, os
movimentos argumentativos (sustentação, refutação/ contra-argumentação e nego-
ciação) e os argumentos utilizados para sustentá-los, para avaliar sua força e eficácia,
e posicionar-se criticamente diante da questão discutida e/ou dos argumentos utiliza-
dos, recorrendo aos mecanismos linguísticos necessários.
(EM13LP06) Analisar efeitos de sentido decorrentes de usos expressivos da lingua-
gem, da escolha de determinadas palavras ou expressões e da ordenação, combinação
e contraposição de palavras, dentre outros, para ampliar as possibilidades de constru-
ção de sentidos e de uso crítico da língua.
(EM13LP07) Analisar, em textos de diferentes gêneros, marcas que expressam a posi-
ção do enunciador frente àquilo que é dito: uso de diferentes modalidades (epistêmica,
deôntica e apreciativa) e de diferentes recursos gramaticais que operam como modali-
zadores (verbos modais, tempos e modos verbais, expressões modais, adjetivos, locu-
ções ou orações adjetivas, advérbios, locuções ou orações adverbiais, entonação etc.),
uso de estratégias de impessoalização (uso de terceira pessoa e de voz passiva etc.),
com vistas ao incremento da compreensão e da criticidade e ao manejo adequado des-
ses elementos nos textos produzidos, considerando os contextos de produção.

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(EM13LP08) Analisar elementos e aspectos da sintaxe do português, como a ordem
dos constituintes da sentença (e os efeito que causam sua inversão), a estrutura dos
sintagmas, as categorias sintáticas, os processos de coordenação e subordinação (e
os efeitos de seus usos) e a sintaxe de concordância e de regência, de modo a poten-
cializar os processos de compreensão e produção de textos e a possibilitar escolhas
adequadas à situação comunicativa.
(EM13LP11) Fazer curadoria de informação, tendo em vista diferentes propósitos e
projetos discursivos.
(EM13LP13) Analisar, a partir de referências contextuais, estéticas e culturais, efeitos
de sentido decorrentes de escolhas de elementos sonoros (volume, timbre, intensida-
de, pausas, ritmo, efeitos sonoros, sincronização etc.) e de suas relações com o verbal,
levando-os em conta na produção de áudios, para ampliar as possibilidades de cons-
trução de sentidos e de apreciação.
(EM13LP48) Identificar assimilações, rupturas e permanências no processo de consti-
tuição da literatura brasileira e ao longo de sua trajetória, por meio da leitura e análise
de obras fundamentais do cânone ocidental, em especial da literatura portuguesa, para
perceber a historicidade de matrizes e procedimentos estéticos.
(EM13LP49) Perceber as peculiaridades estruturais e estilísticas de diferentes gêneros
literários (a apreensão pessoal do cotidiano nas crônicas, a manifestação livre e subje-
tiva do eu lírico diante do mundo nos poemas, a múltipla perspectiva da vida humana e
social dos romances, a dimensão política e social de textos da literatura marginal e da
periferia etc.) para experimentar os diferentes ângulos de apreensão do indivíduo e do
mundo pela literatura.
(EM13LP50) Analisar relações intertextuais e interdiscursivas entre obras de diferen-
tes autores e gêneros literários de um mesmo momento histórico e de momentos his-
tóricos diversos, explorando os modos como a literatura e as artes em geral se consti-
tuem, dialogam e se retroalimentam.

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros.
6. No oratório profano “As enfibraturas do Ipiranga”, temos quatro
vozes coletivas, cada uma representando um segmento da socieda-
de, e uma voz individual – Minha Loucura. As vozes coletivas têm as
seguintes representações: as Juvenilidades Auriverdes (“todos os ra-
pazes da Semana de Arte Moderna”), Os Orientalismos Convencionais
(poetas que produzem obras no então estilo dominante, que os “rapa-
zes” da Semana de Arte Moderna criticavam); As Senectudes Tremuli-
nas (milionários e burgueses); Os Sandapilários Indiferentes (opera-
riado, gente pobre).
Pedir para os alunos pesquisarem qual era o estilo poético domi-
nante no início do século XX e qual era a proposta dos jovens moder-
nistas. Espera-se que os alunos identifiquem o estilo dominante como
o Parnasianismo, estilo poético que marcou a elite literária brasileira
do final do século XIX e as duas primeiras décadas do século XX (entre
os fundadores da Academia Brasileira de Letras, em 1897, a maioria
absoluta dos poetas se filiava ao Parnasianismo, de nítida influência
francesa). Entre as principais características da poesia parnasiana é
possível citar:

• A poética parnasiana baseia-se no binômio objetividade temáti-


ca/culto da forma, numa postura totalmente antirromântica.
• Perfeição formal: forma fixa dos sonetos, a métrica dos versos ale-
xandrinos (12 sílabas poéticas) e decassílabos perfeitos, a rima
rica, rara e perfeita.
• A objetividade temática surge como negação ao sentimentalismo
romântico, numa tentativa de atingir a impassibilidade e a impes-
soalidade.
• Opõe ao subjetivismo decadente o universalismo – daí resultar
numa poesia carregada de descrições objetivas e impessoais.
• Retomada dos conceitos da Antiguidade Clássica: racionalismo e
formas perfeitas.
• Poesia de meditação; filosófica, mas artificial.

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Entre os poetas parnasianos, o destaque ficava para Olavo Bilac,
Alberto de Oliveira e Raimundo Correia.
Os jovens modernistas combatiam essa poesia preocupada com a
objetividade e com o rigor formal. O evento marcante do início do mo-
dernismo brasileiro foi a realização da Semana de Arte Moderna, em
fevereiro de 1922, no Theatro Municipal de São Paulo, um centro de
entretenimento da elite cafeeira. O período de 1922 a 1930 é o mais
radical do movimento modernista, justamente em consequência da
necessidade de definições e do rompimento com todas as estruturas
do passado. Daí o caráter anárquico dessa primeira fase e seu forte
sentido destruidor, assim definido por Mário de Andrade: "se alastrou
pelo Brasil o espírito destruidor do movimento modernista. Isto é, o
seu sentido verdadeiramente específico. Porque, embora lançando
inúmeros processos e ideias novas, o movimento modernista foi es-
sencialmente destruidor. [...]".
Ao mesmo tempo que se buscava o moderno, o original e o polê-
mico, o nacionalismo se manifestava em suas múltiplas facetas: volta
às origens, pesquisa de fontes quinhentistas, procura de uma “língua
brasileira” (a língua falada pelo povo nas ruas), paródias – numa ten-
tativa de repensar a história e a literatura brasileiras – e valorização do
índio verdadeiramente brasileiro.

7. Após a pesquisa, pedir para os alunos analisarem temática e for-


malmente a primeira fala das Juvenilidades Auriverdes e a primeira
fala dos Orientalismos Convencionais.
Na sua primeira fala, “pianíssimo”, as Juvenilidades se identificam
com a fauna e a flora nacionais, citando bananeiras, araras, sabiás,
jandaias, abacaxis, mangas, cajus, num excesso de tropicalismo au-
riverde; se identificam como “as forças vivas do torrão natal”; ironica-
mente se classificam como as “ignorâncias iluminadas” e os “novos
sóis luscofuscolares” (a criação de neologismos, como “luscofusco-
lares”, é outra caraterística dos modernistas). Os versos não apresen-
tam uma métrica fixa nem rima; são, portanto, versos livres.

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Em nítida oposição, os Orientalismos Convencionais defendem
que “os alicerces não devem cair mais!”, amam “as chatezas horizon-
tais”, odeiam “as matinadas arlequinais” e defendem o ritmo e as ri-
mas que se repetem à exaustão: “Temos nossos coros só no tom de
dó!” e “Glória aos Iguais”. Formalmente, as falas dos Orientalismos
Convencionais são estrofes regulares, com versos metrificados e uma
mesma rima se repetindo em toda a estrofe, o que produz um eco que
se torne desagradável.

8. Realizada a atividade anterior, que provavelmente vai levantar


outras questões interpretativas do poema e do que representam os
coros, sugerir aos estudantes uma leitura coletiva do oratório profano
“As enfibraturas do Ipiranga”, dividindo a turma para os coros e um(a)
aluno(a) para representar a Minha Loucura. Discutir como Mário de
Andrade propôs a distribuição dos coros pela esplanada do Municipal
e, se possível nas dependências da escola, fazer uma distribuição se-
melhante. Se for em um ambiente fechado, sugerir espalhar praticá-
veis para que os coros fiquem em diferentes posições.

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Mergulhando na obra
Aprofundamento

Ao chegar ao Ensino Médio, é necessário que os estudantes se


aprofundem na compreensão das múltiplas linguagens e, sobretudo,
da linguagem literária. Em relação à literatura, a BNCC traz as seguintes
considerações:
Em relação à literatura, a leitura do texto literário, que ocupa o centro
do trabalho no Ensino Fundamental, deve permanecer nuclear também
no Ensino Médio. Por força de certa simplificação didática, as biografias
de autores, as características de épocas, os resumos e outros gêneros
artísticos substitutivos, como o cinema e as HQs, têm relegado o texto
literário a um plano secundário do ensino. Assim, é importante não só
(re)colocá-lo como ponto de partida para o trabalho com a literatura,
como intensificar seu convívio com os estudantes.
Como linguagem artisticamente organizada, a literatura enriquece
nossa percepção e nossa visão de mundo. Mediante arranjos especiais
das palavras, ela cria um universo que nos permite aumentar nossa
capacidade de ver e sentir. Nesse sentido, a literatura possibilita uma
ampliação da nossa visão do mundo, ajuda-nos não só a ver mais, mas a
colocar em questão muito do que estamos vendo e vivenciando.
Em comparação com o Ensino Fundamental, a BNCC de Língua
Portuguesa para o Ensino Médio define a progressão das aprendizagens
e habilidades levando em conta:
• a complexidade das práticas de linguagens e dos fenômenos sociais
que repercutem nos usos da linguagem (como a pós--verdade e o
efeito bolha);
• a consolidação do domínio de gêneros do discurso/gêneros textuais
já contemplados anteriormente e a ampliação do repertório de
gêneros, sobretudo dos que supõem um grau maior de análise, síntese
e reflexão;

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros.
• o aumento da complexidade dos textos lidos e produzidos em termos
de temática, estruturação sintática, vocabulário, recursos estilísticos,
orquestração de vozes e semioses;
• o foco maior nas habilidades envolvidas na reflexão sobre textos
e práticas (análise, avaliação, apreciação ética, estética e política,
valoração, validação crítica, demonstração etc.), já que as habilidades
requeridas por processos de recuperação de informação (identificação,
reconhecimento, organização) e por processos de compreensão
(comparação, distinção, estabelecimento de relações e inferência) já
foram desenvolvidas no Ensino Fundamental.
(BNCC – versão completa. p. 499)

Nesta seção, desenvolvemos um trabalho de aprofundamento


que, em diálogo com a formação continuada de professores, oferece
subsídios para a abordagem do texto literário.

A trajetória de Mário de Andrade


Em agosto de 1917, quando a Primeira Guerra Mundial tornava-se
mais violenta e o Brasil acabava de mandar seus soldados para a Eu-
ropa, é lançado em São Paulo um livro de poemas de sentido pacifista,
assinado por um autor que se confessava medroso e humilde. O livro:
Há uma gota de sangue em cada poema; o autor: Mário Sobral. Mais
tarde, a revelação: o autor daqueles poemas, ainda presos à estética
do final do século XIX, era, na verdade, o tímido Mário de Andrade. Mas
1917 seria um ano decisivo para as origens do modernismo brasilei-
ro por dois outros fatos. Em novembro, no Conservatório Dramático e
Musical de São Paulo acontece uma palestra do Secretário da Justiça
de São Paulo, para tratar da guerra, e a apresentação do orador é feita
por Mário de Andrade, então professor do Conservatório; Oswald de An-
drade, jornalista, vai cobrir o evento, entusiasma-se com o discurso de
Mário e resolve publicá-lo; daí nasce a amizade entre os dois Andrades
que, durante dez anos, foram o corpo e a alma do movimento moder-

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nista de São Paulo; duas figuras de personalidades opostas, mas com-
plementares. No mês seguinte, outro acontecimento fundamental: era
inaugurada a exposição de arte moderna da jovem pintora Anita Mal-
fatti; as telas de tendência expressionista encantaram os jovens que
buscavam novas orientações artísticas e formou-se um grupo com
Mário, Oswald, Di Cavalcanti, Guilherme de Almeida, entre outros. Nos
anos que se seguiram os jovens modernistas intensificaram suas crí-
ticas ao parnasianismo, que, nas primeiras décadas do século XX, era
o estilo dominante na poética brasileira.
Em dezembro de 1920, Mário de Andrade inicia a escrita dos poe-
mas que formariam Pauliceia desvairada e os declama para um pe-
queno grupo de amigos. Em maio de 1921, Oswald de Andrade, ainda
atuando na imprensa, publica um artigo com o título “O meu poeta fu-
turista” e fala, sem citar o nome, de um jovem poeta, professor do Con-
servatório, que escrevia poemas na linha futurista de Marinetti; foi um
escândalo. Mário de Andrade responde, assinando com pseudônimo,
que o jovem poeta citado não era “futurista”. Mas, meses depois, Mário
de Andrade publica uma série de artigos com o título de “Mestres do
passado”, em que critica os principais poetas do parnasianismo, entre
eles, o consagrado Olavo Bilac.
Ao findar o ano de 1921, o clima já estava criado para explodir no
evento que foi a Semana de Arte Moderna, em fevereiro de 1922, con-
siderado o marco inicial do modernismo brasileiro, sempre tendo Mário
e Oswald como principais representantes. No meio do ano, Mário lança
Pauliceia desvairada, com seus poemas revolucionários e um prefácio
que era um verdadeiro manifesto modernista. Ainda em 1922, é lança-
da em São Paulo a revista Klaxon.
As ideias sobre a estética modernista, já manifestadas nos artigos
sobre os mestres do passado e em sua fala durante a Semana de Arte
Moderna, aparecem sistematizadas em 1925 no livro de ensaios A es-
crava que não é Isaura. Sua produção literária intensifica-se com a publi-
cação de livros de poesia, de contos e os romances Amar, verbo intran-
sitivo, em 1927, e Macunaíma, o herói sem nenhum caráter, em 1928.

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros.
Ao lado de sua produção literária, Mário de Andrade se dedicou à
pesquisa da música e do folclore brasileiros, foi diretor do Departa-
mento de Cultura da Prefeitura de São Paulo e participou da organi-
zação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Em sua
estada no Rio de Janeiro, lecionou estética na Universidade do Distrito
Federal.
Lira paulistana foi sua última obra, sendo publicada postumamente.

Mário e a cidade de São Paulo


Para entendermos a Semana de Arte Moderna e o modernismo dos
anos 1920, um bom caminho é pensar em três fatos: o melhor palco
para a Semana, indiscutivelmente, era a cidade de São Paulo; dentro
da cidade, o melhor local era o Theatro Municipal, e o evento não pode-
ria acontecer nem em 1921, nem em 1923 – necessariamente teria
de ser em 1922.
O ano é fácil de entender: comemorava-se o primeiro centenário da
Independência; uma independência política e não econômica e muito
menos cultural. O Theatro Municipal, inaugurado em 1911, idealizado
para as grandes apresentações de óperas, era o orgulho da elite pau-
listana. E por que São Paulo?
Mário de Andrade, na conferência “O movimento modernista”, pro-
nunciada em 1942, explicava que só mesmo São Paulo, uma cidade
grande e provinciana, reunia as condições para fazer o movimento
modernista e objetivá-lo na Semana. Dizia ainda:
São Paulo era espiritualmente muito mais moderna, porém, fruto
necessário da economia do café e do industrialismo consequente.
São Paulo estava, ao mesmo tempo, pela sua atualidade comercial e
sua industrialização, em contato mais espiritual e mais técnico com a
atualidade do mundo.
ANDRADE, Mário de. O movimento modernista.
Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1942. p. 27.

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De fato, a cidade era constituída de tipos muito diversos; nem mes-
mo o operariado formava um grupo completamente homogêneo. A São
Paulo do início do século XX era uma cidade multifacetada, fruto da in-
dustrialização, da eletricidade, da modernidade e da imigração. Assim,
poderíamos encontrar pela cidade, andando na mesma calçada do
bairro dos Campos Elíseos, um “barão do café”, um operário anarquis-
ta, um padre, um burguês, um nordestino, um professor, um negro, um
comerciante, um advogado, um militar... realmente, uma “pauliceia
desvairada”, palco ideal para a realização de um evento que mostras-
se uma arte inovadora, rompendo com velhas estruturas.
Se em Pauliceia desvairada a relação do poeta com a sua cidade é
mais neurótica, nervosa, por vezes agressiva, em Lira paulistana, com
o distanciamento de vinte anos de uma obra para outra, o eu lírico tem
uma identificação maior com a sua cidade, em uma relação mais afe-
tuosa, embora às vezes com tons melancólicos.

O subjetivismo de Pauliceia desvairada


O gênero lírico é caracterizado por centrar-se na subjetividade e,
por esse critério, se opõe ao gênero épico, centrado na objetividade.
Se a poesia épica é uma narrativa em que o enunciador mantém dis-
tância do fato narrado, a lírica é a manifestação do mundo interior, que,
para os antigos, se fazia pelo canto suave e era mais do que expressar
emoções, era uma possibilidade de despertá-las, com um menor dis-
tanciamento entre o enunciador e o objeto cantado.
Assim, segundo o crítico Yves Stalloni:
No sentido moderno do termo, o lirismo será definido como a
expressão pessoal de uma emoção demonstrada por vias ritmadas
e musicais. [...] Mas convém acrescentar a essa particularidade uma
outra: o lirismo é a emanação de um eu – que o romantismo gostava de
confundir com a pessoa do poeta, mas que pode se apagar por detrás de
uma de suas personagens.
STALLONI, Yves. Os gêneros literários. Rio de Janeiro: Difel, 2001. p. 151.

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Por isso, reafirmamos uma ideia básica: não podemos confundir
o enunciador de um poema (o eu poético, ser ficcional) com o próprio
poeta (o autor, ser empírico). Há casos evidentes em que a voz do
enunciador não mantém ponto de contato com o poeta, como ocor-
re, por exemplo, na tradição lusitana das cantigas de amigo em que
a autoria é masculina mas o eu lírico é feminino (no caso da MPB, por
exemplo, há várias canções de Chico Buarque que seguem o modelo
das cantigas de amigo, como “Tatuagem”, “Atrás da porta”, “Com açú-
car e com afeto”).
Na poética de Mário de Andrade, no entanto, o eu lírico é, na maior
parte de seus poemas, uma projeção do poeta, com o emprego exces-
sivo da primeira pessoa, seja nas formas verbais, seja nos pronomes
possessivos, eliminando o distanciamento entre o objeto poético e o
enunciador

A intertextualidade
O círculo que envolve a interação pela linguagem se constrói apoia-
do no já dito, no já lido e no já conhecido, podendo reiterá-los, reafir-
má-los, reformulá-los, refutá-los.
É muito difícil pensar na produção de um texto totalmente inédito,
criado a partir do nada. É como se todo texto fosse um hipertexto que
possui links explícitos ou implícitos com outros. O termo intertextua-
lidade foi cunhado, na década de 1960, no âmbito da teoria literária
por Julia Kristeva e, nessa concepção, trata do universo dos textos
literários e do diálogo entre esses textos ao longo da história da lite-
ratura. Quando a intertextualidade se dá entre dois textos literários
efetivamente escritos e se manifesta de forma direta, clara, explícita,
podemos dizer que se trata de intertextualidade em sentido mais res-
trito. Na literatura brasileira temos um exemplo significativo. O poeta
romântico Gonçalves Dias escreveu, em meados do século XIX, a fa-
mosa Canção do exílio; desde então, vários outros poetas produziram
intertextos, ou por simples imitação, ou para repensá-la.
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O conhecimento das relações entre os textos – e dos textos utiliza-
dos como intertexto – é um poderoso recurso de produção e apreen-
são de significados. Quando um determinado autor recorre a vários
textos para compor os próprios, certamente tem um motivo muito cla-
ro – por exemplo fazer uma crítica, uma reflexão ou uma releitura des-
ses textos. Percorrer o caminho inverso, ou seja, buscar esse motivo e
reconstruir o processo de produção leva a desvendar os significados
específicos do texto produzido, já que os textos se completam, lançam
luz uns sobre os outros.
Esse conhecimento, porém, não se dá por acaso nem por obra da
intuição, mas por meio de um trabalho bastante específico: o exercí-
cio da leitura. Quanto mais experiente for o leitor (entenda-se como
leitor experiente aquele que leu muito e bem) mais possibilidades
terá de compreender os caminhos percorridos (e os textos visita-
dos) por um outro autor em sua produção e de percorrer o próprio
caminho em suas criações.
Portanto, nossos processos de leitura podem ser mais proveitosos
quanto mais caminhos de leitura tivermos percorrido. Nossas produ-
ções podem aprimorar-se na medida em que incorporamos essas lei-
turas a nossos textos. E não é exagero dizer que esses procedimentos
ampliam-se de tal forma que atingem uma outra área, bem mais ampla
– a que diz respeito à própria leitura do mundo.

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Novos caminhos
Referências complementares

FONSECA, Maria Augusta. Por que ler Mário de Andrade. São Paulo:
Globo, 2011.
• A autora comenta a vida e obra de Mário de Andrade, revelando
suas múltiplas facetas e sua participação no movimento moder-
nista brasileiro, ao longo das décadas de 1910 a 1940.

Casa Mário de Andrade. http://www.casamariodeandrade.org.br/home


• Na antiga casa do escritor, na rua Lopes Chaves, em São Paulo, o
público pode visitar a exposição permanente “A Morada do Cora-
ção Perdido”, que conta com objetos pessoais de Mário e móveis
originais da casa, além de participar de atividades de formação e
difusão cultural.

Coleção Mário de Andrade – Artes Plásticas. Organização: Marta Ros-


setti Batista e Yone Soares de Lima. 2ª ed., São Paulo: Instituto de Estu-
dos Brasileiros, Universidade de São Paulo, 1998.
• A publicação é o catálogo da coleção de obras de Mário de Andrade,
que pertencem ao Instituto de Estudos Brasileiros (IEB/USP); são
reproduzidas 667 obras, com destaque para as telas e desenhos
de Anita Malfatti e Tarsila do Amaral.

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros. 31
Macunaíma. Roteiro e direção de Joaquim Pedro de Andrade, 108 min,
1969.
• Adaptação para a linguagem cinematográfica de Macunaíma, o
herói sem nenhum caráter, romance fundamental do modernis-
mo brasileiro, publicado em 1928. No elenco, Grande Otelo, Paulo
José, Dina Sfat e Jardel Filho.

Lição de amor. Direção de Eduardo Escorel, 1975.


• Adaptação do romance Amar, verbo intransitivo, de Mário de An-
drade. O filme, todo ambientado em uma casa da alta burguesia
paulistana da década de 1920, mostra o drama de uma governanta
alemã que é contratada para, disfarçadamente, introduzir o filho
homem adolescente nas práticas sexuais. O tratamento dado ao
tema e o excelente trabalho de fotografia dão ao filme um toque
poético. No elenco estão Lilian Lemmertz, Rogério Froes, Irene Ra-
vache e Marcos Taquechel.

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros.
Organizando a estante
Bibliografia comentada

ANDRADE, Mário de. Cartas a Anita Malfatti. Organização de Marta


Rossetti Batista. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989.
• Cartas trocadas entre Mário de Andrade e Anita Malfatti, sobretudo
nos anos em que a pintora viveu em Paris, como bolsista pelo Pen-
sionato Artístico do Estado de São Paulo. Os documentos são funda-
mentais para conhecer tanto os personagens quanto os meandros
do modernismo brasileiro.

ANDRADE, Mário de. Lira paulistana seguida de O carro da miséria. São


Paulo: Livraria Martins Editora, s/d.
• Primeira edição de Lira paulistana, publicação póstuma que, apesar
de não trazer a data expressa, apareceu em 1945, meses após a
morte do poeta.

ANDRADE, Mário de. Pauliceia desvairada. São Paulo: Casa Mayença,


1922.
• Primeira edição de Pauliceia desvairada, publicada em julho de
1922, ainda sob o impacto da realização da Semana de Arte Mo-
derna. Além dos poemas, o livro traz o “Prefácio interessantíssimo”,
com importantes reflexões sobre a proposta poética do modernis-
mo brasileiro.

ANDRADE, Mário de. O movimento modernista. Rio de Janeiro: Casa do


Estudante do Brasil, 1942.
• Reprodução da seminal palestra feita por Mário de Andrade em abril
de 1942, no salão de conferências da biblioteca do palácio do Ita-
maraty, no Rio de Janeiro. Vinte anos depois da Semana de Arte Mo-
derna, o escritor realizou um balanço bastante crítico do movimento
modernista brasileiro.

Material disponibilizado em licença aberta do tipo Creative Commons – Atribuição não comercial (CC BY NC – 4.0 International).
Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros. 33
ANDRADE, Mário de. Poesias completas. 2 volumes. Edição organizada
por Telê Porto Ancona Lopez e Tatiana Longo Figueiredo. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 2013.
• Reunião das poesias completas de Mário de Andrade, feita a partir
do cuidadoso trabalho de duas pesquisadoras especializadas na
obra do autor.

ANDRADE, Mário de. São Paulo! Comoção de minha vida.... . Seleta


organizada por Telê Ancona Lopez e Tatiana Longo Figueiredo. São
Paulo: Editora da Unesp, Prefeitura Municipal de São Paulo e Imprensa
Oficial do Estado de São Paulo, 2012.
• Reunião de poemas de Mário de Andrade que tratam da cidade de
São Paulo. Além de evidenciar a profunda relação que o poeta man-
tinha com sua cidade natal, sendo isso um fator determinante em
sua literatura, o volume é acompanhado de notas que ajudam a es-
clarecer referências que podem soar distantes para os leitores de
hoje.

ANDRADE, Oswald de. Estética e política. Organização de Maria Eugenia


Boaventura. São Paulo: Globo, 1992.
• Reunião de artigos escritos por Oswald de Andrade, dentre eles o
polêmico “Meu poeta futurista”, publicado em maio de 1921, no
qual um poema de Pauliceia desvairada foi apresentado ao grande
público.

BRITO, Mário da Silva. História do modernismo brasileiro. 1.


Antecedentes da Semana de Arte Moderna. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1978.
• Obra seminal sobre a história da formação do grupo modernista
que realizaria a Semana de Arte Moderna. Além da análise e inter-
pretação do autor, o livro conta com a reprodução de importantes
documentos, tais como o artigo “Futurista?!” e a série “Mestres do
Passado”, de Mário de Andrade.

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Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros.
GUASTINI, Mário. A hora futurista que passou e outros escritos.
Organização, apresentação e notas de Nelson Schapochnik. São Paulo:
Boitempo Editorial, 2006.
• Coletânea de artigos feita pelo jornalista e diretor do Jornal do Co-
mércio Mário Guastini. Apesar de ser um grande amigo de Oswald
de Andrade e abrir as portas do jornal para publicações de autores
modernistas, seria um dos grandes opositores das inovações pro-
postas por aqueles a quem tratava por “futuristas”.

JARDIM, Eduardo. Mário de Andrade: Eu sou trezentos: vida e obra. Rio


de Janeiro: Edições de Janeiro, 2015.
• Nesse livro, o filósofo Eduardo Jardim faz uma instigante e sucinta
leitura da vida e da obra de Mário de Andrade. Um livro oportuno
para quem procura uma forma de conhecer melhor o escritor, mas
que não abre da profundidade de análise.

MORAES, Marcos Antonio de. (org.) Correspondência de Mário de


Andrade & Manuel Bandeira. Organização de Marcos Antonio de
Moraes. São Paulo: Edusp; IEB, 2001.
• Reunião de toda a correspondência trocada entre Mário de Andrade
e Manuel Bandeira, ao longo de mais de vinte anos de amizade. As
cartas são documentos fundamentais para se conhecer as formas
de criação, as ideias e as opiniões dessas duas grandes figuras do
modernismo brasileiro.

PICCHIA, Menotti del. Menotti del Picchia: o Gedeão do modernismo


(1920-22). Organização de Yoshie Sakiyama Barreirinhas. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira; São Paulo: Secretaria de Estado da
Cultura, 1983.
• Reunião de artigos publicados por Menotti del Picchia, sob o pseu-
dônimo de Hélios, no Correio Paulistano, entre 1920 e 1922. O con-
junto de textos forma uma documentação fundamental para quem
deseja entender a formação do grupo modernista de São Paulo e as
polêmicas nas quais seus membros estiveram envolvidos.

Material disponibilizado em licença aberta do tipo Creative Commons – Atribuição não comercial (CC BY NC – 4.0 International).
Permitida a criação de obra derivada com fins não comerciais, desde que seja atribuído crédito autoral e as criações sejam licenciadas sob os mesmos parâmetros. 35
SOBRAL, Mário (Mário de Andrade). Há uma gota de sangue em cada
poema. São Paulo: Pocai & Companhia, 1917.
• Primeiro livro publicado por Mário de Andrade, sob o pseudônimo de
Mário Sobral, é um documento importante para se conhecer o iní-
cio da produção poética do autor, assim como as mudanças pelas
quais ele passaria até a realização de Pauliceia desvairada.

TÉRCIO, Jason. Em busca da alma brasileira: biografia de Mário de


Andrade. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2019.
• Ampla biografia de Mário de Andrade, esse é um livro de grande im-
portância para quem deseja conhecer a trajetória do escritor e o seu
envolvimento com as polêmicas e conflitos de seu tempo.

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