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Sistema nervoso:
cerebelo e tronco
encefálico
Fabiana Martins Dias de Andrade
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
O cerebelo e o tronco encefálico são duas estruturas do sistema nervoso central
que desempenham funções imprescindíveis para a sobrevivência humana,
como a regulação de funções corporais e dos movimentos. Portanto, conhecer
a anatomia dessas estruturas, identificando suas regiões, seus núcleos e seus
pontos de referência, é essencial para a compreensão do desenvolvimento
humano, a avaliação de suas principais alterações e a diferenciação entre as
funções normais e patológicas observadas na prática clínica.
Neste capítulo, você vai conhecer as regiões e os núcleos do tronco en-
cefálico, bem como as principais áreas e os pontos de referência anatômicos
do cerebelo. Também vamos descrever disfunções cerebelares, que serão
exemplificadas com a apresentação de casos clínicos.
2 Sistema nervoso: cerebelo e tronco encefálico
Tálamo
Mesencéfalo
Ponte
Bulbo
Coluna espinal
Mesencéfalo
Primeira estrutura que compõe o tronco encefálico, o mesencéfalo é respon-
sável pelo controle do movimento dos olhos. Nessa estrutura estão presentes
o núcleo rubro, o núcleo do colículo inferior, o núcleo pré-tectal, o núcleo do
trato óptico, o núcleo olivar superior, o núcleo do corpo trapezoide e o núcleo
do lemnisco lateral (MENESES, 2015).
O núcleo rubro caracteriza-se pela sua coloração róseo-amarelada na
região mais central e pelo seu envoltório, que é constituído por fibras do
pedúnculo cerebelar superior. Já o núcleo do colículo inferior é constituído
de uma estrutura ovoide bem delimitada por substância cinzenta, estando
localizado na porção caudal do mesencéfalo. Esse núcleo pode ser dividido
em três partes: núcleo central, pericentral e externo. O colículo inferior é o
maior núcleo auditivo retransmissor do tronco encefálico, sendo responsá-
vel pela transmissão dos sinais recebidos do lemnisco lateral para o corpo
geniculado medial (MARTIN, 2013).
O núcleo pré-tectal, também conhecido como “área pré-tectal”, é uma re-
gião de limites pouco definidos. Localiza-se imediatamente rostral ao colículo
superior, nas proximidades da comissura posterior. Vários grupos distintos
de células são encontrados nessa região, e todos parecem relacionados
com o sistema visual. Alguns desses núcleos, mas não todos, recebem fibras
do trato óptico, do córtex visual e do corpo geniculado lateral. Por sua vez,
o núcleo do trato óptico consiste em uma base de células grandes ao longo do
bordo dorsolateral da área pré-tectal em sua junção com a pulvinar (MARTIN,
2013; MENESES, 2015).
O núcleo olivar pré-tectal, que forma um grupo de células bem delimitado
no nível das partes caudais da comissura posterior, recebe fibras cruzadas
e não cruzadas do trato óptico e projeta fibras bilateralmente para os nú-
cleos viscerais do complexo oculomotor que estão envolvidos nos reflexos
fotomotores direto e consensual (MENESES, 2015).
Além dos núcleos, está presente no mesencéfalo a substância negra,
ou nigra, que se situa dorsal ao pedúnculo cerebral e ventral ao tegmento,
estendendo-se longitudinalmente no mesencéfalo. A substância negra é
facilmente identificada pelo seu aspecto escuro, devido à concentração de
melanina, e se subdivide nas duas partes descritas a seguir (MARTIN, 2013).
Ponte
A ponte é a parte intermediária do tronco encefálico que, junto ao mesencéfalo,
responde pelo controle do movimento dos olhos. Nessa estrutura estão loca-
lizados quatro núcleos principais: o núcleo pontino, o núcleo olivar superior,
o núcleo do corpo trapezoide e o núcleo do lemnisco lateral.
Os núcleos pontinos compreendem pequenos amontoados de neurônios
que se encontram dispersos em toda a base da ponte. Esses núcleos são
responsáveis por receber projeções do córtex cerebral pelas fibras do trato
corticopontino e estão envolvidos na atividade motora. Por sua vez, os de-
mais núcleos (o olivar superior, o do corpo trapezoide e o lemnisco lateral)
estão ligados às vias auditivas e têm função relacionada com mecanismos
de proteção contra sons muito altos (MENESES, 2015).
Bulbo
Também conhecido como “medula oblonga”, o bulbo participa de funções
vitais do ser humano, como a regulação da pressão arterial e da respiração.
Ele apresenta formato de cone, e sua extremidade inferior está conectada à
medula espinal. Não existe uma demarcação nítida entre o bulbo e a medula
espinal, mas se considera que a demarcação entre essas estruturas esteja
localizada em um plano horizontal logo acima do filamento radicular mais
cranial do primeiro nervo cervical, o que corresponde ao nível do forame
magno do osso occipital (MARTIN, 2013).
O bulbo se divide em três níveis:
Regula a
Cerebelo
função motora
Coordena o
movimento voluntário
Postura, equilíbrio,
coordenação e fala
cerebral direit
rtex o Corpo
Lobo Có caloso
anterior
Superior
Pedúnculos
cerebelares
Meio Árvore
Inferior da vida
Córtex
cerebelar
Ponte Cerebelo
Bulbo
Plexo coroide do
quarto ventrículo
Lobo posterior Vista lateral
Constituição do cerebelo
O cerebelo apresenta uma substância branca central, o corpo medular do
cerebelo, de onde irradiam as lâminas brancas para a superfície cortical
(córtex cerebelar) e os pedúnculos cerebelares superior, médio e inferior,
por onde transitam as fibras aferentes e eferentes cerebelares. No interior
da substância branca, existem três pares de núcleos de substância cinzenta,
os núcleos centrais do cerebelo (MENESES, 2015):
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Hemisfério
cerebelar esquerdo Hemisfério cerebelar direito
Disfunções cerebelares
As disfunções ou distúrbios cerebelares são alterações patológicas em que
ocorre degradação dos neurônios do cerebelo, acarretando diversos compro-
metimentos, relacionados principalmente com a manutenção do equilíbrio,
função primordial dessa estrutura. Dentre as principais disfunções cerebelares,
destacam-se as ataxias, um sinal neurológico caracterizado por incoorde-
nação de movimentos voluntários, considerado a principal manifestação de
doença cerebelar e que está associada aos distúrbios de postura, marcha,
movimentos oculares, tônus muscular, destreza manual e fala (MARIOTTI;
FANCELLU; DI DONATO, 2005).
As principais causas das ataxias cerebelares vão desde degenerações
hereditárias, crônicas e progressivas, até lesões agudas, que podem ser
causadas por isquemia, edema e hemorragias (PEDROSO et al., 2019).
Existem seis tipos distintos de ataxias cerebelares (BARSOTTINI et al., 2014):
ataxia congênita;
ataxias mitocondriais;
ataxias cerebelares ligadas ao X;
ataxia adquirida ou aguda.
Caso clínico 1
Identificação
P. S. A., sexo masculino, 56 anos, branco, aposentado por invalidez, divorciado,
natural e proveniente de Governador Valadares, Minas Gerais.
História da doença
O paciente relata que, na fase adulta, por volta dos 24 anos de idade, já
apresentava alguma dificuldade na marcha, com progressão lenta e pouco
perceptível. Após os 45 anos, passou a apresentar dificuldade progressiva
e rápida na marcha, diplopia, incapacidade de coordenar os movimentos
musculares e parestesias nos membros inferiores, com necessidade de uso
de dispositivo auxiliar (cadeira de rodas).
Exame físico
O paciente apresenta função intelectual normal, grave dislalia e sialorreia
constante. Há presença de protrusão ocular, movimentos oculares lentos
(sacádicos) e distúrbio do olhar voluntário para cima e para baixo, não sendo
observado nistagmo. Também há presença de fasciculações da língua, fraqueza
muscular geral moderada, com presença de atrofia, ausência de reflexos
tendinosos e presença de sinais bilaterais de Babinski. Há sensibilidade
cinético-postural profunda e coordenação prejudicada. Há presença de tremor
estático constante nas mãos.
História familiar
O paciente relata que seu pai e seu avô paterno, assim como sua irmã e o
filho dela, também apresentaram sintomas semelhantes aos seus, com início
também na idade adulta.
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Exames de imagem
A ressonância magnética (RM) cerebral revela atrofia dos folhetos cerebelares.
Discussão do caso
P. S. A. apresentou uma disfunção de início insidioso e progressão gradual,
marcada por dificuldades de marcha e posteriormente diagnosticada como
ataxia.
O diagnóstico mais provável para o caso apresentado é a degeneração
cerebelar autossômica dominante, sendo provavelmente uma ataxia espi-
nocerebelar tipo 3 (SCA-3), a ser confirmado por exame molecular. Segundo
Martins Jr. (2021), a ataxia espinocerebelar tipo 3 (SCA-3) é o principal tipo que
acomete pessoas nascidas no Brasil e em Portugal. Suas principais caracte-
rísticas incluem ataxia, disartria, diplopia, nistagmo, parkinsonismo, distonia,
sinais de amiotrofia, neuropatia e retração de pálpebra.
As ataxias espinocerebelares são doenças de herança autossômica domi-
nante que se caracterizam por apresentar exames de neuroimagem compatí-
veis com sinais de atrofia cerebelar, podendo haver também atrofia de tronco
encefálico e medula cervical, além de fenotipagem similar. As manifestações
clínicas desse grupo de doenças incluem dismetria, disdiadococinesia de
membros, tremor intencional, marcha em base alargada, disartria, nistagmo,
oftalmoplegia, disfagia, sinais piramidais, síndrome do neurônio motor inferior,
disfunção cognitiva, epilepsia, distúrbios visuais e distúrbios do movimento
(parkinsonismo, distonia, mioclonia e coreia). A presença desses sinais e
sintomas está associada ao tipo de ataxia (TOY, 2014).
Caso clínico 2
Identificação
E. M. S., sexo feminino, 76 anos, parda, aposentada, viúva, natural e proveniente
de Piracicaba, São Paulo.
Queixa
A paciente chega à unidade de pronto atendimento (UPA) de sua cidade,
acompanhada pela filha, por volta das 10 h. Relata que se levantou para
tomar remédio para a dor de cabeça, mas, quando foi pegar o copo, sentiu
fraqueza no membro superior direito, tontura e escurecimento da vista. Além
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Exame físico
A paciente se apresenta alerta e responsiva, havendo presença de desvio da
comissura labial para a esquerda e paralisia unilateral da face. Há redução de
força no membro superior direito, que, segundos após ser erguido, apresenta
queda. A força em membros inferiores está preservada. Nas provas índex-
-nariz e índex-joelho, a paciente apresenta erros na manobra indicativos de
comprometimento cerebelar.
História familiar
A paciente informa que o pai e a mãe eram hipertensos. A mãe faleceu de
infarto agudo do miocárdio (IAM), e o pai teve acidente vascular encefálico
(AVE). Dois irmãos da paciente também já tiveram IAM.
Exames de imagem
A tomografia cerebral sem contraste mostra lesão hiperdensa no hemisfério
cerebral direito, com compressão ventricular e desvio de estruturas da linha
média.
Discussão do caso
E. M. S. apresentou fraqueza, tontura e alteração visual e do equilíbrio.
A paciente foi atendida na UPA e encaminhada para a internação hospitalar,
em que foi confirmado o diagnóstico de AVE do tipo hemorrágico, uma das
causas de ataxia cerebelar adquirida ou aguda.
O AVE é uma doença cerebrovascular, considerada uma das principais
causas de óbito no Brasil e no mundo. O acidente vascular cerebral (AVC)
hemorrágico ocorre quando há rompimento de um vaso cerebral, provocando
hemorragia, que pode extravasar para o tecido cerebral ou para a superfície
entre o cérebro e as meninges. É responsável por 15% de todos os casos de
AVC, sendo mais letal do que o AVC isquêmico (BRASIL, 2022).
Como vimos neste capítulo, o cerebelo é uma estrutura que atua na ma-
nutenção dos movimentos e do equilíbrio do corpo humano, e, por meio da
análise de casos clínicos, pudemos compreender sua importância, bem como
o impacto das disfunções cerebelares, sejam elas hereditárias ou adquiridas.
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Referências
BARSOTTINI, O. G. et al. Adult onset sporadic ataxias: a diagnostic challenge. Arquivos
de Neuro-Psiquiatria, v. 72, n. 3, p. 232-40, 2014. Disponível em: https://www.scielo.br/j/
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Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/a/avc. Acesso
em: 27 set. 2022.
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www.ufrgs.br/neuroanatomia/atlas-de-neuroanatomia/cerebelo/cerebelo_4/. Acesso
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2014.
MARIOTTI, C.; FANCELLU, R.; DI DONATO, S. An overview of the patient with ataxia.
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MARTINS JR., C. R. Neurologia de A-Z: um compêndio de doenças incomuns. Rio de
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MENESES, M. S. Neuroanatomia aplicada. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015.
OLIVEIRA, A. S. B.; PINTO JÚNIOR, G. D.; RODRIGUES, I. M. I. Neuroanatomia na prática:
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PEDROSO, J. L. et al. Acute cerebellar ataxia: differential diagnosis and clinical approach.
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RUBIN, M.; SAFDIEH, J. E.; NETTER, F. H. Neuroanatomia essencial. Boston: Elsevier, 2008.
TOY, E. C. Casos clínicos em neurologia. 2. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014.