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PROGRAMA DOUTORAL EM MEDIA DIGITAIS

Jogos para Literacia Criativa:


Uma Framework para Cultivar a
Literacia Criativa através de Jogos
José Manuel da Conceição Raimundo

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2022

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PROGRAMA DOUTORAL EM MEDIA DIGITAIS

Jogos para Literacia Criativa:


Uma framework para cultivar a literacia
criativa através de jogos

Games for creative literacy:


A framework for cultivating creative literacy
through games

José Manuel da Conceição Raimundo | up201307174@fe.up.pt | janeiro 2022

Orientador
Pedro Cardoso, Departamento de Comunicação e Arte, Universidade de Aveiro
Coorientadores
Miguel Carvalhais, Faculdade Belas Artes da Universidade do Porto
António Coelho, Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto

Esta investigação foi desenvolvida com o apoio financeiro da Fundação para a Ciência e
Tecnologia (FCT), com a bolsa com referência: SFRH/BD/137169/2018.

iii
À luz…

iv
Agradecimentos

Pedro Cardoso, pela orientação, dedicação e apoio com que me auxiliou a guiar esta
investigação. Miguel Carvalhais, pela ajuda para distinguir a relevância dos assuntos
com que me defrontei. António Coelho, pela orientação com uma perspetiva distinta da
minha alma mater. Aos três agradeço as recomendações, a disponibilidade, e a liberdade
de ação para consolidar o meu desenvolvimento pessoal.

Camila Mangueira, Fabrício Fava, Maria Van Zeller, Liliana Santos, João Jacob, Rui
Rodrigues, Marisa Silva, Viviane Peçaibes, Abel Neto, Valter Abreu, Diana Marques,
Mariana Magalhães, Filipa Ramalho, Filipe Rodrigues, José Barboza. Teresa Matos, a
todos pelo apoio concedido que me permitiu levar a bom porto esta investigação.

Dedico este trabalho a meu pai, Joaquim Raimundo, cujas palavras sábias e apoio foram
centrais para levar esta jornada pessoal até ao fim. Maria da Conceição Maria, a minha
mãe, pelas palavras que me proporcionou neste trajeto.

Maria Eunice, a minha mentora eterna, pela paz que me trouxe nos momentos difíceis.

Julie por tudo e pelo recomeço!

v
Resumo

A criatividade é crucial para se ser bem-sucedido nos atuais contextos económico,


social e cultural. Este é um desafio que requer literacia criativa – a capacidade de
aumentar a criatividade – que depende de uma combinação de condições e
comportamentos favoráveis às práticas criativas. Jogar é uma atividade de várias
espécies para aprender a relacionar-se com o mundo e entre si, e que incita um estado
mental criativo nos jogadores, também proporcionando condições e estimulando
comportamentos para aumentar a sua criatividade.

Os jogos atraem jogadores desenvolvemos uma framework focada na criatividade para


analisar e conceber jogos. Esta consiste em três dimensões principais identificadas pelo
estado da arte e por trabalho laboratorial: mecânicas de jogo para a criatividade que
estão subjacentes a ações de jogo para a criatividade, e cuja articulação revela dimensões
da literacia criativa que o jogo analisado ou a conceber aponta para, permitindo assim
interpretar os respetivos contributos para aumentar a criatividade. Para efeitos de
análise, esta framework permite visualizar as áreas de influência das suas dimensões
em jogos para entender esses contributos. Para efeitos de conceção, estas dimensões
da framework podem ser articuladas de diversas formas para conceber jogos para
aumentar a criatividade dos seus jogadores.

Este trabalho não pretende apresentar um modelo universal, mas antes uma proposta
para que os jogos sejam considerados como artefactos com potencial para aumentar a
criatividade, sendo capazes de agilizar a geração de soluções, estimular a sinergia entre
jogadores, e expandir o vocabulário de design de jogos com foco na criatividade.

Palavras-chave: Criatividade, Design, Framework, Jogos, Literacia Criativa

vi
Abstract

Creativity is crucial to success in today’s economic, social and cultural contexts. This
challenge requires creative literacy – the ability to augment creativity – which depends
on a combination of conditions and behaviours favourable to creative practises. Playing
is an activity of several species to learn to relate to the world and each other, which
incites a creative state of mind in players, also providing conditions and stimulating
behaviours to augment their creativity.

This thesis thus intends to bridge the gap between the act of playing and increasing
creativity. To this end, we developed a framework focused on creativity to analyse and
design games. This framework consists of three main dimensions identified by the
state of the art and laboratory work: game mechanics for creativity that underlie
game actions for creativity, and whose articulation reveals dimensions of creative
literacy that the analysed or designed game points to, therefore allowing one to
interpret its respective contributions to augment creativity. For analysis purposes, this
framework enables visualising the areas of influence of its dimensions in games to
understand these contributions. For conception purposes, these dimensions can be
articulated in a variety of ways to design games to augment players’ creativity.

This work does not intend to present a universal model but rather a proposal for games
to be considered artefacts with the potential to augment creativity, speed up the
generation of solutions, stimulate synergy between players, and expand the design
vocabulary of games focused on creativity.

Keywords: Creativity, Creative Literacy, Design, Framework, Games

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Índice de Conteúdos

Resumo ................................................................................................................................... vi

Abstract ................................................................................................................................. vii

Índice de Conteúdos .............................................................................................................. ix

Índice de Figuras ................................................................................................................. xiii

Índice de Tabelas ............................................................................................................... xxiii

Introdução ................................................................................................................ 1

Contextualização Teórica e Delimitação do Objeto de Estudo .......................................... 1

Questões e Objetivos ............................................................................................................ 4

Abordagem Metodológica .................................................................................................... 5

Relevância ............................................................................................................................. 9

Motivação ............................................................................................................................. 10

Estrutura do Documento de Tese ...................................................................................... 11

Parte I - Estado da Arte .......................................................................................... 13

1. Criatividade: O que é a Criatividade e quais são os Fatores para que Ocorra? ............ 15

1.1. Criatividade como um Subproduto da Inteligência ................................................... 15

1.2. Criatividade através da Razão, Emoção e Expressão ................................................ 23

1.3. Criatividade como um Ato Ancorado na Cultura, Sociedade e Indivíduos ............. 28

1.4. Criar Sozinho? Criar em Conjunto ............................................................................. 32

1.5. Uma Definição de Criatividade ................................................................................... 39

2. Literacia Criativa: O que é Literacia Criativa e como pode ser Ensinada? .................. 42

2.1. Definições e Perspetivas da Literacia ........................................................................ 43

2.2. Condições para Ensinar o Indivíduo a ser Criativo ................................................... 51

2.3. Métodos para Ensinar o Indivíduo a ser Criativo ..................................................... 54

2.4. Instrumentos para Avaliar Criatividade ................................................................... 72

2.5. Uma Definição de Literacia Criativa .......................................................................... 85

3. Jogos para Literacia Criativa: Que Caraterísticas fazem dos Jogos Métodos e

ix
Instrumentos para Desenvolver a Criatividade? ............................................................... 88

3.1. Perspetivas sobre os Jogos para Desenvolver a Literacia Criativa .......................... 89

3.2. Metodologia e Procedimentos .................................................................................... 94

3.3. Caraterísticas de Jogos que Estimulam Atos Criativos ............................................ 96

3.4. Conclusões Preliminares ...........................................................................................156

Parte II - Trabalho Laboratorial e Análise ............................................................ 159

4. Análise de Casos ............................................................................................................. 160

4.1. Metodologia e procedimentos ................................................................................... 161

4.2. Estudos de Caso ......................................................................................................... 166

4.3. Resultados da Análise dos Casos ............................................................................. 205

5. Desenvolvimento Exploratório de Jogos .......................................................................214

5.1. Metodologia e Procedimentos ................................................................................... 215

5.2. Jogos Prototipados ..................................................................................................... 217

5.3. Análise Crítica dos Resultados ................................................................................. 255

Parte III - Desenvolvimento .................................................................................263

6. Discussão ........................................................................................................................ 265

6.1. Diálogo enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade. ............................. 269

6.2. Dialética enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade. ............................ 271

6.3. Tentativa-erro enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade. .................. 273

6.4. Sinergia enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade. ........................... 276

6.5. Conclusões ................................................................................................................. 277

7. A Infraestrutura ............................................................................................................. 280

7.1. Relações entre ações de jogo para a criatividade .................................................... 282

7.2. Estrutura .................................................................................................................... 283

7.3. Ferramenta de Análise .............................................................................................. 287

7.4 Ferramenta de conceção ............................................................................................ 296

Conclusões .......................................................................................................... 309

x
Considerações Finais.......................................................................................................... 309

Limitações do Estudo .......................................................................................................... 311

Trabalho Futuro .................................................................................................................. 314

Bibliografia .......................................................................................................... 319

Ludografia ............................................................................................................345

Apêndices ............................................................................................................ 349

Apêndice A: Conteúdos Relativos ao Capítulo 1................................................................ 351

Apêndice B: Lista das Publicações e seus Contributos para a Tese ............................... 352

Apêndice C: Toolkit do Protótipo Final ............................................................................ 357

Apêndice D: Extended Abstract ......................................................................................... 367

Introduction ...................................................................................................................... 369

Methodological framework and strategy ........................................................................ 371

Development ..................................................................................................................... 375

Conclusions ....................................................................................................................... 379

Acknowledgements .......................................................................................................... 388

Anexos ................................................................................................................ 389

Anexo A: Conteúdos de Autores Referenciados no Capítulo 1 ....................................... 390

Anexo B: Conteúdos de Autores Referenciados no Capítulo 2 ........................................ 391

Anexo C: Conteúdos de Autores Referenciados no Capítulo 7 ....................................... 394

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xii
Índice de Figuras

Figura I.1. Diagrama dos procedimentos da componente teórica .......................................... 6

Figura I.2. Diagrama dos procedimentos da componente prática ......................................... 7

Figura 1.1. A influência das emoções na criatividade (Ivcevic e Hoffman (2019) .............. 25

Figura 1.2. T.A. da ilustração do Modelo de Sistemas de Criatividade de Mihály


Csíkszentmihály (1998) ............................................................................................................ 28

Figura 1.3. T.A. dos Quatro P de James Melvin Rhodes (1961) ............................................... 30

Figura 1.4. Os cinco A e como se relacionam entre si (Glǎveanu 2013) ................................ 31

Figura 1.5. O esquema da Teoria dos Quatro C (Kaufman e Beghetto 2009) .......................33

Figura 1.6. Modelo Funcional da Personalidade Criativa (Feist 2019) ................................ 34

Figura 1.7. O Modelo Dinâmico Componencial da Criatividade e Inovação (Amabile e


Pratt 2016) ................................................................................................................................. 37

Figura 1.8. Uma nuvem dos conceitos-chave que compõem a nossa definição de
criatividade ................................................................................................................................ 40

Figura 2.1. Multiliteracias (New London Group 1996) .......................................................... 46

Figura 2.2.“Pedagogia como conhecimento em ação” (Kalantzis e Cope 2004) ............... 50

Figura 2.3. O processo de Synectics (Nolan e Williams 2010) .............................................. 59

Figura 2.4. Os três estados de jogo principais do Gamestorming (Gray et al. 2010) ......... 70

Figura 2.5. Uma proto-framework que ilustra o fluxo da literacia criativa ......................... 87

Figura 3.1. 9-11 Survivor (2003) .................................................................................................91

Figura 3.2. ModNation Racers (2010) ........................................................................................ 97

Figura 3.3. Fallout: New Vegas (2010) ....................................................................................... 98

Figura 3.4. Fallout Shelter (2015) .............................................................................................. 99

xiii
Figura 3.5. Quest For Glory IV (1993) ......................................................................................... 99

Figura 3.6. Tearaway (2013) ................................................................................................... 100

Figura 3.7. Civilization (2016) ..................................................................................................102

Figura 3.8. The Elder Scrolls V: Skyrim (2011) ...........................................................................102

Figura 3.9. Journey (2019) ....................................................................................................... 104

Figura 3.10. Terraria (2011) ..................................................................................................... 104

Figura 3.11. Factorio (2020)......................................................................................................105

Figura 3.12. Mario Kart 8 (2014) ............................................................................................. 106

Figura 3.14. Stair Dismount (2009) .......................................................................................... 107

Figura 3.15. The Witcher 3: Wild Hunt (2015) ........................................................................... 108

Figura 3.16. Xenoblade Chronicles 2 (2017) ............................................................................. 109

Figura 3.17. Minecraft (2009).................................................................................................. 109

Figura 3.18. MakeCode for Minecraft (s.d.)............................................................................... 110

Figura 3.19. Aurora Toolset (2020) ............................................................................................ 111

Figura 3.20. Teardown (2020) ................................................................................................. 112

Figura 3.21. Bioshock (2007) .................................................................................................... 114

Figura 3.22. Dyis4ia (2007) ...................................................................................................... 114

Figura 3.23. Keep me Occupied (2012) ...................................................................................... 115

Figura 3.24. Nova Alea (2016) .................................................................................................. 115

Figura 3.25. Tie: a game about depression (2108) .................................................................... 116

Figura 3.26. Gris (2018) ............................................................................................................ 116

Figura 3.27. The Stillness of the Wind (2019) ........................................................................... 117

Figura 3.28. Wolfanddotcom (2017) ......................................................................................... 117

xiv
Figura 3.29. Papers Please (2013) ............................................................................................ 118

Figura 3.30. Diablo II (2000) .................................................................................................... 119

Figura 3.31. This War of Mine: The little ones (2015) ................................................................120

Figura 3.32. Stardew Valley (2016) ........................................................................................... 121

Figura 3.33. Alien: Isolation (2014)........................................................................................... 123

Figura 3.34. I am Bread (2015) ................................................................................................. 123

Figura 3.35. Desperados III (2020) ...........................................................................................124

Figura 3.36. Miegakure (s.d.) ...................................................................................................124

Figura 3.37. Do Not Feed the Monkeys (2018) .......................................................................... 125

Figura 3.38. Thomas Was Alone (2012) .................................................................................... 127

Figura 3.39. Oxygen not included (2017) ..................................................................................128

Figura 3.40. Super Hexagon (2012) ........................................................................................128

Figura 3.41. Disk Room (2020) .................................................................................................129

Figura 3.42. Little Nightmares (2017) ......................................................................................129

Figura 3.43. KARDS (2020) ...................................................................................................... 131

Figura 3.44. Valiant Hearts: The Great War (2014) .................................................................. 131

Figura 3.45. Limbo (2010) ........................................................................................................ 131

Figura 3.46. Besiege (2020) ..................................................................................................... 132

Figura 3.47. Intùiti® Creative Cards (2013) .............................................................................. 135

Figura 3.48. Dreams (2020) ..................................................................................................... 136

Figura 3.49. Disney Infinity (2016) .......................................................................................... 136

Figura 3.50 Super Mario Maker 2 (2019) .................................................................................. 137

Figura 3.52. Mindshake Design Thinking Cards (2013)............................................................. 141

xv
Figura 3.52. Design (human) design (2017) .............................................................................142

Figura 3.53. Creative Whack Pack (1989) ................................................................................. 143

Figura 3.54. Patient 237 (2019) ............................................................................................... 144

Figura 3.55. Façade (2015) ...................................................................................................... 144

Figura 3.56. Umiro (2018) ........................................................................................................145

Figura 3.57. Baba Is You (2019) ............................................................................................... 146

Figura 3.58. Viewfinder (s.d.) .................................................................................................. 146

Figura 3.59. ikonikus (2013) ..................................................................................................... 147

Figura 3.60. Triggers (2016).................................................................................................... 149

Figura 3.61. Cards Against Humanity (2011)............................................................................ 149

Figura 3.62. Dark Ride: Disneyland (2020) ..............................................................................150

Figura 3.63. Threesixfive (2015) ............................................................................................... 151

Figura 3.64. BIG Ball of Whacks (2007) e X-Ball (s/ data) ...................................................... 152

Figura 3.65. Tabletop Simulator (2015) ................................................................................... 153

Figura 3.66. 75 Tools For Creative Thinking (2012)..................................................................154

Figura 4.1. Diagrama com o procedimento de pesquisa, filtragem e análise .................... 163

Figura 4.2. instruções e cartas do Jogo de Improviso (2020) ................................................167

Figura 4.3. Jogo de Improviso (2020), sequência comum do jogo ........................................167

Figura 4.4. Creative Emergency (2019) ................................................................................... 169

Figura 4.5. Cards GO (2016) ..................................................................................................... 172

Figura 4.6. Diagrama de fluxo de Why Are We Like This? (2020) .......................................... 174

Figura 4.7. Why Are We Like This? (2020) ................................................................................ 175

Figura 4.8. Gamers4Nature (2017) ........................................................................................... 177

xvi
Figura 4.9. Componentes de Gamers4Nature (2017) ............................................................. 178

Figura 4.10. O fenómeno low cost cosplay .............................................................................. 180

Figura 4.11. U Know Me!!! (2019) ............................................................................................. 181

Figura 4.12. IdeaChef (2018) ....................................................................................................182

Figura 4.13. IdeaChef (2018)..................................................................................................... 185

Figura 4.14. Loss of Identity (2018). 96 .................................................................................. 186

Figura 4.15. Masks and Reflections (2018) ............................................................................... 187

Figura 4.16. Estágios e tabuleiro digital de Tiles IOT Toolkit (2017) .................................... 189

Figura 4.17. Baralho de cartas Intùiti (2013) .......................................................................... 191

Figura 4.18. Captura de ecrã de Dreams (2020) .....................................................................192

Figura 4.19. Captura de ecrã de Astroneer (2016) .................................................................. 193

Figura 4.20. 75 Tools For Creative Thinking (2012)................................................................. 194

Figura 4.21. Fotografias das Mindshake Design Thinking Cards (2013) ................................ 196

Figura 4.22. Captura de ecrã de construção fictícia em Minecraft (2009 ...........................197

Figura 4.23. Captura de ecrã do website onde se pode jogar Lichenia (2019) ................... 199

Figura 4.24. Captura de ecrã de Baba is You (2019) ............................................................. 200

Figura 4.25. Tabletop Simulator (2015) .................................................................................. 202

Figura 4.26: Ecrãs de Word Out! (2014) ................................................................................. 203

Figura 4.27. Cards Against Humanity (2011) ........................................................................... 204

Figura 5.1. e 5.2 Research Quest (2017) ....................................................................................218

Figura 5.3. e 5.2 Research Quest II (2017) ................................................................................ 221

Figura 5.5. See, Hear, Feel no Evil (2018) ................................................................................ 223

Figura 5.6. Sessão de jogo e componentes de See, Hear, Feel no Evil (2018) ...................... 224

xvii
Figura 5.7. See, Hear, Feel no Evil (2018) em versão digital .................................................. 226

Figura 5.8. See, Hear, Feel no Evil (2018) em versão digital .................................................. 227

Figura 5.9. Polyomino & Amoebas (2018) ............................................................................... 228

Figura 5.10. Componentes de Polyomino & Amoebas (2018) ................................................ 229

Figura 5.11. Sessão de jogo de Polyomino & Amoebas (2018) ............................................ 230

Figura 5.12. Sessão de jogo e componentes de Salto Decisivo (2019) ................................... 231

Figura 5.13. Bully Who (2019) fotografia do jogo .................................................................. 233

Figura 5.14. Encalhado (2020), fotografia de sessão de jogo (versão analógica) .............. 235

Figura 5.15. Encalhado (2020), ecrã de sessão de jogo (versão digital). ........................... 236

Figura 5.16. Encalhado (2020) foto dos componentes do jogo ........................................... 236

Figura 5.17. Encalhado (2020) imagem e história de um resultado de jogo ..................... 238

Figura 5.18. GameStrok! (2019) fotografia e resultado de sessão de jogo .......................... 239

Figura 5.19. GameStrok! (2019) fotografia de componentes de jogo .................................. 239

Figura 5.20. Crearrative: Imagery, Keywords and Emotion (2019), componentes e sessão do
jogo ........................................................................................................................................... 240

Figura 5.21. Crearrative: Imagery, Keywords and Emotion (2019), versão em madeira ....... 242

Figura 5.22. Design e improvisação: Forma de Letra (2021) .................................................... 243

Figura 5.23. Componentes de Design e improvisação: Forma de Letra (2021) ...................... 243

Figura 5.24.Damas versus Conceção de Videojogos (2021) apresentando o slide 1 do GJB


com o jogo das damas alterado e post-its Propósito, Narrativa e Ação ............................... 245

Figura 5.25. Damas versus Conceção de Videojogos (2021) apresentando o slide 2 do GJB
com a Tela de conceção de jogos ........................................................................................... 246

Figura 5.26. Damas versus Conceção de Videojogos (2021) apresentando os dois slides de
jogo em GJB e respetivos componentes ................................................................................ 246

xviii
Figura 5.27. Damas versus Conceção de Videojogos (2021) apresentado o fluxo de regras de
jogo ........................................................................................................................................... 246

Figura 5.28. Jogo do Galo versus Grelha Editorial (2021) apresentando o 1º slide do GJB ... 248

Figura 5.29. Jogo do Galo versus Grelha Editorial (2021) apresentando o 1º slide do GJB ... 249

Figura 5.30. Jogo do Galo versus Grelha Editorial (2021) apresentando os 2 slides de GJB
do jogo e respetivos componentes ........................................................................................ 249

Figura 5.31. Batalha Naval versus Grelha Editorial (2021), apresentando a vista de um dos
jogadores ................................................................................................................................... 251

Figura 5.32. Batalha Naval versus Grelha Editorial (2021), apresentando a vista combinada
do campo dos jogadores no fim do jogo, com duas áreas para colocar texto e imagem .. 251

Figura 5.33. Batalha Naval versus Grelha Editorial (2021), apresentando os componentes
de jogo ....................................................................................................................................... 251

Figura 5.34. Pedra Papel Tesoura versus Conceção de Personagem de jogo (2021) ........ 253

Figura 5.35. Pedra Papel Tesoura versus Conceção de Personagem de jogo (2021): a) e b)
duas sessões de jogo com equipas de jogadores diferentes ................................................ 254

Figura 5.36. Pedra Papel Tesoura versus Conceção de Personagem de jogo (2021): a) e b)
resultados de duas sessões de jogo com equipas de jogadores diferentes ........................ 255

Figura 6.1. Diagrama básico da framework ilustrando como o ciclo de jogo ocorre entre
comportamentos e condições, e respetivos componentes .................................................. 265

Figura 6.2. Gráfico com o nível de investimento em categorias de mecânicas para cinco
jogos analisados ...................................................................................................................... 278

Figura 7.1. Diagrama com a relação cíclica das ações de jogo para a criatividade .............. 282

Figura 7.2. Baba is You (2019), ecrã de playthrough em que o jogador usa Sinergia, num
jogo a solo para estabelecer um diálogo inicial com o seu sistema .................................. 283

Figura 7.3. Baba is You (2019), ecrã de playthrough em que o jogador usa o diálogo, para
construir padrões para resolver desafios de jogo ........................................................... 284

Figura 7.4. Baba is You (2019), ecrã de playthrough em que o jogador usa tentativa-erro,
para arriscar a sorte com um padrão construído a partir do diálogo anterior.............. 285

xix
Figura 7.5. Baba is You (2019), ecrã de playthrough em que o jogador usa a dialética para
arriscar a sorte com um padrão construído a partir da tentativa-erro anterior ........... 285

Figura 7.6. Baba is You (2019), ecrã de playthrough em que ocorre a vitória do jogador .. 286

Figura 7.7. Diagrama de fluxo com as mecânicas de jogo para a criatividade


presentes nas ações de jogo para a criatividade, as dimensões para a literacia criativa que
trabalham, e os respetivos contributos para o aumento da literacia criativa em Baba is
You (2019) ................................................................................................................................. 286

Figura 7.8. Batalha Naval Versus Grelha Editorial (2021), ecrã de playthrough em que o
jogador estabelece um diálogo inicial com o sistema de jogo ............................................. 288

Figura 7.9. Batalha Naval Versus Grelha Editorial (2021), ecrã de playthrough em que o
jogador explora o campo de jogo por tentativa-erro ............................................................. 289

Figura 7.10. Batalha Naval Versus Grelha Editorial (2021), ecrã de playthrough em que o
jogador estabelece uma dialética com o sistema de jogo ..................................................... 290

Figura 7.11. Batalha Naval Versus Grelha Editorial (2021), ecrã de playthrough em que os
jogadores usam o jogo cooperativo para estabelecer uma sinergia e chegarem a uma
grelha consensual.....................................................................................................................291

Figura 7.12. Design e Improvisação: Forma de Letra (2021), ecrãs de playthrough em que o
jogador enceta o diálogo com o seu sistema ......................................................................... 292

Figura 7.13. Design e Improvisação: Forma de Letra (2021), ecrãs de playthrough em que
ocorre dialética entre jogador e sistema de jogo ................................................................... 293

Figura 7.14. Design e Improvisação: Forma de Letra (2021), ecrãs de playthrough em que
ocorre tentativa-erro entre jogador e sistema de jogo .......................................................... 293

Figura 7.15. Design e Improvisação: Forma de Letra (2021), ecrãs de playthrough em que
ocorre sinergia entre agentes de jogo ..................................................................................... 294

Figura 7.16. Diagrama de fluxo com as mecânicas de jogo para a criatividade


presentes nas ações de jogo para a criatividade, as dimensões para a literacia criativa que
trabalham, e os respetivos contributos para o aumento da literacia criativa em Batalha
Naval Versus Grelha Editorial (2021)......................................................................................... 295

xx
Figura 7.17. Diagrama de fluxo com as mecânicas de jogo para a criatividade
presentes nas ações de jogo para a criatividade, as dimensões para a literacia criativa que
trabalham, e os respetivos contributos para o aumento da literacia criativa em Design e
Improvisação: Forma de Letra (2021) ........................................................................................ 296

Figura 7.18. O Jogo para a Literacia Criativa (2022) apresentando sessão de jogo .............. 297

Figura 7.19. O Jogo para a Literacia Criativa (2022) apresentando componentes de jogo .. 298

Figura 7.20. Sessão com o Jogo para a Literacia Criativa (2022)........................................... 301

Figura 7.21. Vírus (2022), ilustração de playthrough em que o jogador: 1) corresponde


representações abstratas de vírus; 2) recebe informações sobre as caraterísticas do
vírus correspondido; 3) concebe uma contramedida para este vírus ................................. 301

Figura 7.22. Componentes de Vírus (2022) ........................................................................... 302

Figura 7.23. Vírus (2022), ilustração de playthrough que usa diálogo e sinergia em que o
jogador relaciona representações abstratas de vírus .......................................................... 303

Figura 7.24. Vírus (2022), ilustração de playthrough que usa diálogo: o jogador recebe
informações sobre as caraterísticas do vírus correspondido (esquerda) e concebe uma
contramedida para este vírus (direita) ................................................................................. 303

Figura 7.25. Diagrama de fluxo com as mecânicas de jogo para a criatividade


presentes nas ações de jogo para a criatividade, as dimensões para a literacia criativa que
trabalham, e os respetivos contributos para o aumento da literacia criativa em Vírus
(2022) ....................................................................................................................................... 304

Figura 7.26. O Jogo para Literacia Criativa (2022), ilustração de playthrough em que o
jogador articula uma mecânica de jogo para a criatividade (a) com uma dimensão
para a literacia criativa escolhida pelo adversário (b). A articulação é elaborada num
post-it pelo jogador em turno, sobre a ação de jogo para a criatividade: sinergia (c) a
integrar o conceito de jogo esperado. O adversário define ainda que esta fase de jogo é
jogada no início (d) .................................................................................................................. 306

Figura 7.27. O Jogo para a Literacia Criativa (2022), ilustração de playthrough em que o
jogador articula uma mecânica de jogo para a criatividade (a), com uma dimensão
para a literacia criativa escolhida pelo adversário (b). A articulação é elaborada num
post-it sobre a ação de jogo para a criatividade: diálogo (c), a integrar o conceito de jogo
esperado. O adversário define ainda que esta fase é jogada no decurso do jogo (d) ......... 306

xxi
Figura 7.28. O Jogo para a Literacia Criativa (2022), ilustração de playthrough em que o
jogador articula uma mecânica de jogo para a criatividade (a), com uma dimensão
para a literacia criativa escolhida pelo adversário (b). A articulação é elaborada num
post-it sobre a ação de jogo para a criatividade: diálogo (c), a integrar o conceito de jogo
esperado ................................................................................................................................... 307

Figura 7.29. Diagrama de fluxo com as mecânicas de jogo para a criatividade


presentes nas ações de jogo para a criatividade, as dimensões para a literacia criativa que
trabalham, e os respetivos contributos para o aumento da literacia criativa em O Jogo
para a Literacia Criativa (2022) ................................................................................................ 308

xxii
Índice de Tabelas

Tabela 2.1. Perspetiva de Nachmanovitch sobre Improvisação (1990) ............................... 56

Tabela 2.2. AUTA um modelo de transformações cognitivas e afetivas para tornar-se


mais criativo .............................................................................................................................. 60

Tabela 2.3. Dimensões do Modelo Tridimensional da Criatividade do Produto (Horn e


Salvendy 2009) .......................................................................................................................... 80

Tabela 3.1. Amostra de Pesquisa Quantitativa para Filtragem de Estudos de Caso ........... 80

Tabela 4.1. Lista ordenada de casos de estudo (jogos) e critérios de análise ................... 166

Tabela 4.2. Mecânicas identificadas nas leituras atentas................................................... 206

Tabela 4.3. Relação entre Jogos e Mecânicas ....................................................................... 207

Tabela 4.4. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Diálogo ....................................................................................................................210

Tabela 4.5. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Dialética ................................................................................................................... 211

Tabela 4.6. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Tentativa-erro ......................................................................................................... 212

Tabela 4.7. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Sinergia .................................................................................................................... 212

Tabela 5.1. - Mecânicas identificadas nos jogos ................................................................. 255

Tabela 5.2 - Relação entre protótipos e mecânicas ............................................................ 257

Tabela 5.3. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Diálogo ................................................................................................................... 260

Tabela 5.4. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Dialética ..................................................................................................................261

xxiii
Tabela 5.5. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Tentativa-erro .........................................................................................................261

Tabela 5.6. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Sinergia .................................................................................................................. 262

Tabela 6.1. Articulação entre as mecânicas de jogo para a criatividade, as ações de


jogo para a criatividade e as dimensões para a literacia criativa resultantes ........................ 267

Tabela 6.2. Diálogo enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade aliada às
mecânicas de jogo para a criatividade e respetivas dimensões para a literacia criativa
que trabalham .......................................................................................................................... 269

Tabela 6.3. Dialética enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade aliada às
mecânicas de jogo para a criatividade e respetivas dimensões para a literacia criativa
que trabalham .......................................................................................................................... 272

Tabela 6.4. Tentativa-erro enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade aliada às
mecânicas de jogo para a criatividade e respetivas dimensões para a literacia criativa
que trabalham .......................................................................................................................... 274

Tabela 6.5. Sinergia enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade aliada às
mecânicas de jogo para a criatividade e respetivas dimensões para a literacia criativa
que trabalham .......................................................................................................................... 276

xxiv
(página em branco)

xxv
(página em branco)

i
Introdução

Contextualização Teórica e Delimitação do Objeto de Estudo

Todos têm o direito de ser ouvidos, o direito de tentar persuadir os outros e o direito de
promover os seus interesses. (Boden 2004, 297)1

A criatividade é omnipresente em inúmeras atividades humanas, sendo fundamental


enquanto motor da civilização. Esta é a razão porque se estudam pessoas criativas, para
entender se suas caraterísticas se podem propagar a outros (Hennessey e Amabile
2010). Ainda, dado que a criatividade envolve produtos criativos e depende de perfis
psicológicos dos criadores e suas relações sociais (Csíkszentmihályi 1999), possui um
caráter de produto coletivo (Ribeiro 2018). Ou seja, a criatividade não é um dom, baseia-
se em esforços de aprendizagem e no conhecimento coletivo humano (Vygotsky 2004),
sendo difícil de medir e podendo ocorrer de forma inesperada e voluntária (Boden
2004). A criatividade pode ser aprendida e desenvolvida recorrendo a técnicas de
pensamento para libertarmo-nos do convencional e gerar ideias novas (de Bono 1993).
Dito isto, existe algum consenso sobre o que é central para que a criatividade ocorra.
E.g. qualidades, conhecimentos e aptidões pessoais fundamentadas num campo de
conhecimento, avaliadas por indivíduos dentro desse campo (Gardner 1993).

Tradicionalmente, literacia consiste em saber ler e escrever (Gee 2008). Porém, hoje
em dia, esta visão tradicional de literacia é insuficiente para dominar a linguagem para
aprender, trabalhar, ou refletir criticamente sobre questões sociais e políticas (Gee
1999). Ou seja, a literacia é hoje muito mais, é compreender o mundo por meio de
formas escritas ou orais e reescrevê-lo articulando experiência de vida pessoal,
raciocínio e práticas quotidianas (Freire 2005). Ser literado proporciona flexibilidade
aos indivíduos, o que, segundo Starko, é crucial para a economia e sociedade global de
hoje, sendo necessário de nutrir em sala de aula para reforçar a autonomia e o
pensamento criativo (2010), para que se tornem hábitos que contrariem a rigidificação
que ainda vigora na educação (Ribeiro 2018). Ser literado hoje é dominar diversos meios
para entender informação e comunicar ideias ou defender perspetivas. Isto exige
raciocínio crítico e o domínio de modos digitais ou analógicos para construir
significados (Beavis et al. 2009), usando múltiplas literacias, ou multiliteracias (Kaur
e Gnapathy 2011).2 Estas multiliteracias apoiam-se no domínio de duas dimensões: 1) a

1 T.A.: “Everyone has a right to be heard, a right to try to persuade others, and a right to further their interests.” (Boden 2004, 297).

2 Num exemplo, o design de jogos depende do domínio de incontáveis literacias, desde imagem em movimento, texto, som, e
componentes interativos, neurologia e psicologia dos jogadores, programação de motores de jogos, entre outros.

1
multiplicidade de línguas, ou multilingual, e 2) modos de comunicação, ou multimodal
(New London Group 1996; Kress 2005; Zagalo 2019).
Neste contexto, definimos literacia criativa como a capacidade de aumentar a
criatividade, uma combinação de aptidões, ideias e informação para usar em diversas
práticas criativas. E.g. ter ideias para escrever exige uma atitude curiosa, a vontade de
aprender factos sobre a realidade relacionando-os com materiais educacionais por meio
do raciocínio, da imaginação e da criatividade (Masie et al. 2017). A literacia criativa
exige raciocínio crítico para questionar textos literários e relacioná-los com a vida além
da escola (Healey 2015), edificar uma identidade própria e a agência e versatilidade para
responder a expectativas socioculturais, profissionais (Kiosses 2019) e agir em resposta
aos problemas mundiais (Bean 2018).

A nossa noção de literacia criativa está ligada ao conceito de Literacia Criativa através de
Jogos,3 porque o caráter interativo dos jogos permite ao jogador descodificar e aprender
de forma integrada. Esta aprendizagem, do lado do jogador, consiste em criar
ativamente caminhos para que o jogo se desenrole de formas diversas, e do lado do
designer, em conceber experiências de jogo relevantes que refletem situações atuais
(Zagalo 2010).

Os jogos atraem jogadores facultando experiências valiosas para pensar e interagir de


diversas maneiras (Juul 2013), e tanto o design como o ato de jogar exigem criatividade
e pensamento crítico, por isso os jogos podem facilitar o desenvolvimento do indivíduo:

O design de jogos e o ato de jogar jogos requerem que as pessoas estejam familiarizadas com
media e tecnologia, e também que as pessoas sejam criativas e pensadoras críticas, e por isso
tem um grande potencial para facilitar o desenvolvimento das aptidões dos alunos para o
século XXI (Qian e Clark. 2016, 51) 4

Ou seja, os jogos são bons para aprender (Gee 2004a), auxiliando os seus jogadores a
explorar a sua identidade, a sociedade e a tecnologia em currículos educacionais
(Weight 2008). Os jogos podem estimular o pensamento e a aprendizagem alternativos,
mas ainda carecem de bases sociais participativas para fazê-lo (Salen 2008).

Jogar é um meio criativo usado por várias espécies para aprender a relacionar-se com
o mundo e entre si (Sicart 2014),5 um valor aumentado ao incorporar assuntos nos seus
sistemas, e.g. para aprender sobre consumismo (Flanagan 2009), ou consciencializar

3 T.A.: Creative Game Literacy.

4 T.A.: “Game design and play require people to be familiar with media and technology, and it also requires people to be creative
and critical thinkers, so it has great potential to facilitate students’ 21st century skill development” (Qian e Clark. 2016, 51)

5 Jogar e criar não são exclusivos aos humanos nem ao seu intelecto, podendo até ser aumentados com o poder computacional
(Boden, 2004, 32) que tem vindo a crescer em potencial (Sautoy 2019, 11). Estas perspetivas, contudo, exigem outro estudo fora
do foco desta investigação que visa a experiência humana.

2
para práticas de extorsão (Bogost et al. 2010).

Assim, encaramos os jogos como meio privilegiado para aumentar a literacia criativa,
porque o seu carácter interativo permite aos jogadores conceber rapidamente traje-
tórias ou estados de jogo (Jackson e Alexander 2015) a partir de poucas regras (Adams
e Dormans 2012), o que amplia a resolução criativa de problemas (Meshkin 2018).

Para delimitar o foco da nossa investigação, a partir das definições de espaço de jogo
(Gray et al. 2010), interação (Costikyan 2015) e regras (Anthropy 2012), consideramos
que um jogo é:

Um espaço à parte da vida do quotidiano com regras que delimitam o que se pode fazer,
informação ou objetos para interagir, e objetivos a atingir. 6

Contudo, a realização do jogador não assenta necessariamente nos objetivos dos jogos,
mas nas descobertas da sua exploração (Gray et al. 2010).

A criatividade é uma aptidão essencial para sobreviver no mundo em constante


evolução e mudança, em todas as esferas da existência do indivíduo, e a larga escala,
enquanto motor económico e civilizacional, pelo que deve ser nutrida desde logo em
salas de aula.

Há evidências abundantes que sugerem que as estratégias que apoiam a criatividade – a


resolução de problemas, a exploração de múltiplas opções e investigação de aprendizagem –
também suportam a profundidade da compreensão. (…) Nas escolas, não estamos a operar
dispositivos; estamos a cultivar o conhecimento dos jovens. Na minha opinião, uma parte
essencial da preparação dos alunos para a vida é ajudá-los a ver que a vida é interessante e
cheia de potencial de alegria. Uma maneira de fazer isso é ajudá-los a experimentar a
criatividade (Starko 2010, 5).7

Neste sentido, a criatividade é uma componente natural da literacia pois segundo a


Unesco (2005) a última obtém-se por formação e cultivo de aptidões pessoais, o que
por sua vez, autonomiza o indivíduo para lidar com várias questões intelectuais e
suposições (Donnelly e Harper 2012). Contudo, a educação de hoje ainda rigidifica a
personalidade (Starko 2010), algo que pode ser contrariado estimulando um aumento
do número de atos criativos na pessoa, tornando-os um hábito desejável (Ribeiro 2018).

As novas literacias perpassam múltiplas disciplinas e modos de expressão permitindo


a criação de todo o tipo de significados (Kress 2005). Os jogos são uma ponte para novas

6 Neste estudo, optámos por nos debruçarmos sobre mecânicas e ações porque são aspetos centrais e transversais aos jogos.

7 T.A.: “There is abundant evidence to suggest that the strategies that support creativity—solving problems, exploring multiple
options, and learning inquiry—also support depth of understanding. (…) In schools, we aren’t punching out widgets; we are nurturing
young people. In my view, an essential part of preparing students for life is helping them see that life is interesting and filled with
the potential for joy. One way we do that is to help them experience creativity.” (Starko 2010, 5)

3
pedagogias, pois são capazes de complementar a educação destas literacias e a
construção de novos significados de forma sustentada e divertida (Gee 2004a).
Portanto, a literacia criativa alia a produção criativa com a educação em literacia dos
media (jogos incluídos) como bases para que os estudantes reflitam melhor e possam
desafiar convenções e compreender e transformar todo o tipo de textos.

Os trabalhos recentes sobre o envolvimento das crianças com jogos de computador têm, em
comum com o trabalho em outros meios de comunicação, estendido o foco da sua experiência
enquanto jogadores ao interesse pelas possibilidades de produção criativa. (...) A justificação
para esta estratégia é que a prática da produção cria uma ocasião para os jovens aprenderem,
adaptarem e transformarem convenções textuais, em vez de aprenderem sobre essas
convenções apenas através da desconstrução ou crítica textual. (Pelletier et al. 2010, 91)8

Questões e Objetivos
A problemática definida na secção anterior levou-nos à seguinte questão central:

Como podem os jogos ser usados para aumentar a literacia criativa, e como é que
podem ser concebidos para esse fim?

A nossa questão principal é seguida por uma lista de questões secundárias:

1. Que mecânicas de jogo ou articulações entre mecânicas de jogo conseguem


promover ações criativas?
2. Quais são as ações que proporcionam espaço para que a criatividade ocorra num
jogo?
3. Como traduzir mecânicas e ações em fluxos de jogo favoráveis à ocorrência da
criatividade?
4. Quais são as dimensões resultantes destes fluxos de jogo que podem ser
favoráveis para aumentar a literacia criativa? 9

As questões anteriores orientaram-nos para os seguintes objetivos:

1. Desenhar uma framework para analisar e conceber jogos que aumentem a


literacia criativa através:
a. De mecânicas de jogo que estimulam a execução de atos criativos por
jogadores;
b. De ações de jogo que estimulam comportamentos e/ou a adoção de
posturas criativas nos jogadores;

8 T.A.: “Recent work on children’s engagement with computer games has, in common with work on other media, extended from a
focus on their experience as players to an interest in the possibilities of creative production. (...) The rationale for this strategy is
that the practice of production creates an occasion for young people to learn, adapt and transform textual conventions, rathe r
than learning about such conventions only through textual deconstruction or critique.” (Pelletier et al. 2010, 91).

9 Este estudo foca-se em dimensões ligadas às mecânicas e ações de jogo, contudo, como se pode constatar na secção 1.2, as
dimensões do indivíduo desempenham um papel fulcral na facilitação e inibição da criatividade, algo que remetemos para um
estudo futuro.

4
c. De dimensões da literacia criativa emergem das mecânicas de jogo e das
ações de jogo;
2. Com recurso à framework, conceber e prototipar jogos que explorem o aumento
da literacia criativa.

Abordagem Metodológica
A abordagem metodológica que usamos para conceber jogos para aumentar a literacia
criativa é a pesquisa baseada em Design, 10 uma metodologia que faz a reciprocação
entre teoria e práticas visando usabilidade e adequação (Wang & Hannafin 2005).

A estratégia metodológica geral é similar à adotada por Pedro Cardoso (2016), em que
o investigador assume papéis consoante as tarefas a executar, o que ajuda a planear o
trabalho e a entender o objeto de estudo de múltiplas perspetivas:

• O jogador domina os jogos através da interação num processo similar a todas as


literacias;
• O desenvolvedor codifica protótipos de jogo a partir do feedback de jogadores,
observadores, facilitadores e comunicadores;
• O observador testa jogos e registra e codifica as suas experiências e as de outros
jogadores de formas objetivas, o que é fundamental para análise. O observador
está imerso num jogo crítica e conscientemente o que auxilia a obter dados da
experiência de jogar;
• O investigador analisa as experiências de jogo através de relatos de observação,
pesquisa teórica, e walkthroughs;
• O facilitador elabora informações claras e concisas a partir do trabalho dos
investigadores para guiar experiências de jogo, coordenando frequentemente
este papel com o de observador;
• O comunicador partilha os conhecimentos e a informação recolhida pelos papéis
anteriores através de palestras, aulas e workshops.

Esta estratégia foi escolhida porque a análise de jogos requer uma aproximação
multifacetada e exploratória. Contudo, esta aproximação pode não impedir que
sejam introduzidos viés nesta análise, apesar dos esforços para manter o seu rigor,
p.ex.:

• Quando o jogador não empenha tempo, esforço cognitivo e a postura crítica para
interagir e dominar o jogo, arrisca-se a entender de forma errada as convenções
que lhes estão subjacentes;

10 T.A.: “Design-Based Research”.

5
• O desenvolvedor precisa de planear adequadamente o desenvolvimento de
protótipos, caso contrário irá defrontar-se com tarefas que vão além das suas
forças e do tempo útil para as executar;
• O observador irá registar e codificar experiências de jogo de forma imprecisa se
não adotar a distância necessária para captar eventos que de outra forma não
chamariam a sua atenção;
• O facilitador pode elaborar instruções de jogo imprecisas ou complexas, o que
irá dificultar a adesão do jogador ao jogo;
• O comunicador pode elaborar apresentações difíceis de entender, e assim, levar
a sua audiência a perceber o trabalho de investigação de forma errada, e
portanto, minar a validação e o interesse sobre esta.

Componente Teórica

Figura I.1. Diagrama dos procedimentos da componente teórica.1

A componente teórica (Figura I.1.) focou-se na revisão de literatura incidindo sobre


conhecimentos subjacentes a duas áreas principais: criatividade e literacia criativa.
Estas áreas foram escolhidas pelo seu potencial em revelar aspetos para aumentar a
literacia criativa. Nesta revisão de literatura exploramos:

1. A complementaridade entre criatividade e inteligência, a influência da razão,


emoção e expressão no ato criativo, a ligação deste ato à cultura, sociedade e
indivíduos, e a criação a solo e em conjunto. Esta exploração tinha em vista
elaborar uma definição de criatividade no âmbito desta investigação, como base
para o ponto a seguir;
2. Definições e perspetivas sobre literacia, as condições e os métodos para ensinar
o indivíduo a ser criativo, e os instrumentos para avaliar a criatividade. Com
isto obteve-se uma definição de literacia criativa enquadrada no contexto desta
investigação. Este âmbito auxiliou a triar a exploração do estado da arte em
jogos sobre o qual nos debruçamos no ponto a seguir;
3. Perspetivas sobre jogos para desenvolver literacia criativa, e caraterísticas de
Jogos que estimulam atos criativos. Esta exploração permitiu-nos chegar a

6
algumas conclusões preliminares, ou seja, aspetos de jogo alinhados com as
questões e objetivos no âmbito deste projeto.
4. A amostra dos jogos coletada emergiu de pesquisas em motores de busca de
publicações académicas e em plataformas de venda de videojogos. As pesquisas
foram levadas a cabo usando palavras-chave que emergiram da revisão de
literatura e que combinamos com operadores booleanos.11 Para tal, seguimos a
adaptação da técnica das leituras atentas12 ao gameplay de jogos de Jim Bizzocchi
e Joshua Tanenbaum (2011) com o objetivo de procurar mecânicas de jogo com
potencial para estimular atos criativos.

Componente Prática

Figura I.2. Diagrama dos procedimentos da componente prática.2

A componente prática (Figura I.2.) envolveu procedimentos para pesquisa e análise de


estudos de caso,13 e um protocolo para o desenvolvimento de jogos e respetivo
procedimento para a sua análise. Para identificar estudos de caso pesquisamos por
termos-chave assinalados pela componente teórica em motores de busca académicos e
plataformas de venda de jogos. A estratégia geral para inspecionar casos de estudo por
mecânicas de jogos com potencial para estimular atos criativos envolveu o seguinte
procedimento:

11 As expressões de pesquisa e os seus resultados podem ser encontrados na tabela 3.1. na secção 3.2.2.

12 Close readings no original. Para mais detalhes sobre leituras atentas consultar o capítulo 4, secção 4.1.

13 Estudos de caso são estudos detalhados sobre um assunto específico, frequentemente envolvem métodos qualitativos, e têm como
objetivos clarificar aspetos da investigação, desafiar ou consolidar teorias, resolver questões ou informar oportunidades de
pesquisa, tendo por base a visão do todo de cada caso (McCombes, 2019).

7
1. JOGAR para experienciar jogos em primeira mão e OBSERVAR jogos a serem
jogados para anotar reações ou fenómenos provocados noutros jogadores;
2. IDENTIFICAR mecânicas de jogo para a criatividade14 a partir do ponto 1;
3. VERIFICAR se as mecânicas do ponto 2 eram recorrentes em jogos individuais
estudados, ou mesmo, se combinações destas mecânicas eram transversais à
amostra total de jogos estudada;
4. CORRELACIONAR os padrões do ponto 3 para distinguir ações de jogo para a
criatividade.

Por sua vez o desenvolvimento de jogos envolveu o seguinte protocolo:


1. Usar as mecânicas de jogo para a criatividade encontradas nos estudos de caso
como ponto de partida para elaborar conceitos e protótipos de jogo;
2. Prototipagem dos jogos em baixa fidelidade;
3. Melhoria dos protótipos referidos no ponto 2 com base nos resultados das
sessões de jogo realizadas, e elaboração das respetivas instruções de jogo;
4. Observar jogadores a jogar estes jogos para deles recolher feedback e proceder a
melhorias;
5. Retorno ao ponto 1 para elaborar novos jogos com outras mecânicas.

…e o respetivo procedimento de análise:


1. Conceber jogos a partir das mecânicas de jogo para a criatividade reveladas
durante a revisão da literatura e análise de estudos de caso;
2. Analisar a integração de mecânicas em cada jogo desenvolvido, e as dimensões
para a literacia criativa que podem fomentar;
3. Procurar correlações de mecânicas e os resultados que podem proporcionar
entre os jogos analisados.

Em suma, as nossas práticas pautaram-se por prototipagem de jogos integrando


mecânicas, ações e dimensões mencionadas nos procedimentos anteriores A maioria
destes jogos são protótipos analógicos de baixa fidelidade, uma escolha que fizemos
visando responder agilmente e em tempo útil às necessidades desta investigação. Esta
escolha assenta em entraves que identificámos, e que no nosso entender poderiam
dificultar a prototipagem.15

14 São empregues tipos de letras diferentes para facilitar a distinção entre componentes da nossa framework no decurso do texto
deste documento de tese (as variáveis a bold e os seus respetivos possíveis valores a regular), e.g.:
• Mecânicas de jogo para a criatividade e respetivos possíveis valores, como movimento em grelha,
reconhecimento de padrões ou arriscar a sorte;
• Ações de jogo para a criatividade e respetivos possíveis valores, como Tentativa-erro, Sinergia e Diálogo;
Dimensões para a literacia criativa e respetivos possíveis valores, como Pensamento divergente, Diálogo de pares ou
Espaço comum.

15 As razões desta escolha fundamentam-se ainda nas metodologias descritas na secção 4.1 e 5.1.

8
Ainda, o desenvolvimento destes protótipos assentou num processo iterativo que
decorreu tanto individualmente como em equipa, recorrendo frequentemente ao co-
design, porque como argumentam Phillip Gough et all.:

Co-design e abordagens participativas têm sido fundamentais para estabelecer o papel das
interações sociais e informar o papel e o conteúdo dos sistemas projetados por meio da
partilha de conhecimento de maneiras democráticas. (Gough et al. 2021)16

Facilitamos ainda workshops ligados a este desenvolvimento, colaborando com estu-


dantes e investigadores a trabalhar em áreas de conhecimento próximas das nossas.

Relevância
A criatividade é central para saber operar num mundo cada vez mais competitivo
(Safford e Barrs 2005), algo que exige a educação de novas mentalidades e habilidades
(Wells 2013), e operar novas tecnologias (Farrel e Corbel 2017) para gerar ideias
originais, surpreendentes e com valor (Boden 2004), um potencial de inovação que é
aumentado quando estamos conectados a outros indivíduos (Johnson 2011), o que por
sua vez nos permite responder ao apelo contínuo da modernização da civilização
(Bauman 2006).

O que torna [a sociedade que entra no século XXI] tão moderna quanto era há um século ou
mais é o que diferencia a modernidade de todas as outras formas históricas de coabitação
humana: a modernização compulsiva e obsessiva, contínua, imparável, sempre incompleta;
a sede avassaladora e inextinguível, insaciável de destruição criativa (ou de criatividade
destrutiva, conforme o caso: de ‘limpar o local’ em nome de um design ‘novo e melhorado’;
de ‘desmantelar’, ‘cortar’, ‘phasing out’, ‘mesclar’ ou ‘downsizing’, tudo em prol de uma
maior capacidade de fazer mais do mesmo no futuro - aumentando a produtividade ou a
competitividade). (Bauman 2006, 28)17

Desenvolver a criatividade tornou-se ainda mais urgente no contexto pandémico atual


dado que o seu impacto vai além da esfera da saúde, atingindo setores económicos e
culturais (UN News 2020). Este impacto exige a adaptação da vivência das pessoas às
novas circunstâncias, o que pode ser alavancado com o aumento da literacia criativa, o
que aponta para uma relevância acrescida deste estudo.

Criar é algo que todos fazemos em diversos momentos até certo ponto (Boden 2004).
Ainda, para nos sobrepormos à resistência à mudança, sem a qual a criatividade não é
possível, é necessário esforço contínuo ao longo da vida (Michalko 2003).

16 T.A: “Co-design and participatory approaches have been instrumental in establishing the role of social interactions and inform the
role and content of designed systems through sharing knowledge in democratic ways.” (Gough et al. 2021).

17 T.A.: “What makes [the society that enters the twenty-first century] as modern as it was a century or so ago is what sets modernity
apart from all other historical forms of human cohabitation: the compulsive and obsessive, continuous, unstoppable, forever
incomplete modernization; the overwhelming and ineradicable, unquenchable thirst for creative destruction (or of destructive
creativity, as the case might be: of ‘clearing the site’ in the name of a ‘new and improved’ design; of ‘dismantling’, ‘cutting out’,
‘phasing out’, ‘merging’ or ‘downsizing’, all for the sake of a greater capacity for doing more of the same in the future - enhancing
productivity or competitiveness).” (Bauman 2006, 28).

9
Paradoxalmente, a criatividade é simultaneamente gratificante no seu processo e
resultados, mesmo inesperados, é fonte de bem-estar e é central para uma vivência
plena, ainda que não o seja para todos (Csikszentmihalyi 2019).

Assim, o contexto pervasivo dos media digitais atual (no qual se incluem os jogos) é
benéfico para a descoberta casual de informações enquanto campo de oportunidades
criativas para os indivíduos explorarem (Melo 2018). Ou seja, os jogos podem motivar
e envolver as pessoas, pois são atividades prazerosas (Koster 2003), com potencial de
reflexão (Bogost 2007), e operar como espaços temáticos experimentais (Murray 2003).

As nossas práticas de investigação envolveram e acabaram por determinar os dois


públicos-alvo deste estudo: 1) Profissionais e investigadores a trabalhar na área do
Design, pois podem beneficiar do aumento da criatividade assente no meio dos jogos;
2) Estudantes do ensino superior, na maioria ligados a esta mesma área, pois o aumento
da literacia criativa pode auxiliar a enriquecer a respetiva formação vocacional.

Motivação

Estas experiências lembram-me porque é que eu crio, para ter alguém com quem me conectar
e que compreenda aquilo que concebi (Anthropy e Clark 2014, 10)18

A motivação para este estudo é ainda intrínseca ao investigador, dado que os jogos
tiveram um papel preponderante no seu desenvolvimento enquanto indivíduo
nomeadamente na esfera criativa. Esta experiência empírica, aliada a um medium que
como outras formas de arte é propenso à criatividade, sugeriu este como um processo
que pode beneficiar outras pessoas.

Esta investigação arranca com o objetivo de aumentar a literacia criativa com recurso a
jogos, a capacidade de aumentar a criatividade dos jogadores. 19 Dado que os jogos são
sistemas baseados em procedimentos (Bogost 2007), os jogadores podem explorar
procedimentos alternativos que estimulem ações criativas para aumentar a literacia
criativa. Esta possibilidade de experimentar com procedimentos pode melhorar a
capacidade dos jogadores em lidar com problemas de formas criativas e serendipitosas
(Melo 2018). Mais, muitos jogos são divertidos e integram significados profundos
alimentando a motivação do jogador (Koster 2003; Frasca 2007). A motivação, contudo,
assenta em esforço contínuo, na vontade de nos realizarmos através da criatividade,
algo que segundo Mihály Csíkszentmihályi pode ser gratificante no seu processo e

18 T.A: “Those experiences remind me why I create—to have someone connect with and understand the thing I have designed.”
(Anthropy e Clark 2014, 10).

19 A noção de criatividade adotada aqui é a de Margaret Boden “a capacidade de gerar ideias ou artefactos originais, surpreendentes
e com valor” (2004). T.A.: “Creativity is the ability to come up with ideas or artefacts that are new, surprising and valuable.”
(Boden 2004, 1)

10
resultados, e para alguns, fonte de bem-estar e vivência plena (2019).

Os videojogos comungam de tudo isto, é prazeroso dominarmos os seus desafios e


podemos recolher os benefícios de destreza física e reflexão mental inerentes à sua
ação, facto pelo qual os escolhemos para atingir os propósitos desta investigação. Daí
optarmos por desenvolver uma framework com caráter lúdico, porque como diz Ralph
Koster (2003), os jogos têm o potencial de fomentar a sinergia entre jogadores. As
relações interpessoais entre jogadores beneficiam do poder computacional do sistema
de jogos que se acrescenta às contribuições humanas semânticas e ontológicas (Boden
2004; Sautoy 2020). Portanto, a conectividade interpessoal sustentada por jogos deve
promover ambientes favoráveis à troca de informação, ambientes que, segundo Steven
Johnson (2010), são onde ocorre a inovação.

Estrutura do Documento de Tese


Este documento encontra-se dividido em 3 partes. Parte I - Estado da Arte, é
constituída por 3 capítulos dedicados a apresentar bases teóricas da investigação e
servir de porta de entrada para o leitor entender os assuntos apresentados na Parte II.

No Capítulo 1 definimos criatividade no âmbito desta investigação, relacionando-a com


inteligência, identificando as suas dimensões centrais, as condições intrínsecas e
extrínsecas para que ocorra, e a diferença de criar a solo e em conjunto.

No Capítulo 2 definimos literacia criativa no contexto da nossa investigação com base


em definições e perspetivas de literacia e a sua ligação ao ato criativo, condições e
métodos para ensinar a ser criativo, e instrumentos para avaliar a criatividade.

No Capítulo 3 debruçamo-nos sobre jogos existentes que possuem caraterísticas para


servir de métodos e instrumentos para desenvolver a criatividade.

A Parte II - Trabalho Laboratorial e Análise, consiste em 2 capítulos devotados analisar


os objetos de estudo na procura de variáveis relevantes para alavancar o propósito da
nossa investigação.

No Capítulo 4 procedemos à análise de estudos de caso segundo procedimentos de


pesquisa e análise estipulados, com a qual consolidamos as dimensões da framework
proposta enquanto bases para o trabalho nos capítulos seguintes.

No Capítulo 5 procedemos ao desenvolvimento exploratório de protótipos de jogo


dirigidos a aumentar a literacia criativa segundo um protocolo de desenvolvimento de
jogos e um procedimento para análise dos mesmos que estipulámos.

11
A Parte III - Desenvolvimento, é constituída por 2 capítulos.

No Capítulo 6 apresentamos a discussão crítica sobre os resultados das análises


anteriores, articulando os estudos de caso e aos protótipos de jogos desenvolvidos
prototipagem segundo as dimensões principais para desenvolver a literacia criativa.

No Capítulo 7 relacionamos as dimensões do capítulo anterior e apresentamos a


estrutura final da framework e como é operacionalizada para análise e conceção de jogos
para a literacia criativa.

Nas Conclusões e enunciamos considerações finais, as limitações do estudo, e abrimos


possibilidades para trabalho futuro.

12
Parte I - Estado da Arte

13
(página em branco)

14
1. Criatividade: O que é a Criatividade e quais são os Fatores para que
Ocorra?

1.1. Criatividade como um Subproduto da Inteligência


Começamos este capítulo definindo inteligência e criatividade para podermos
compreender em que diferem e como se influenciam uma à outra. Inteligência é a
capacidade do indivíduo de adaptar-se ao ambiente que o rodeia, e aprender através da
experiência (Sternberg e Detterman 1986) como forma de se capacitar para realizar
objetivos pessoais (Sternberg 2005). Tais capacidades permitem-nos criar produtos ou
problematizar assuntos como formas de aprender. Portanto, todos os indivíduos
possuem múltiplas inteligências (Gardner 2011)20 em graus diferentes e dirigidas a áreas
de conhecimento específicas que podem servir como bases para criar:

• A Linguística é explorada desde as origens da humanidade para comunicar ideias


a outros, podendo ser expressas além do trato vocal com fotografias, diagramas,
equações ou símbolos, pois segundo Howard Gardner, “[o] uso do símbolo tem
sido central na evolução da natureza humana, dando origem ao mito,
linguagem, arte e ciência; sendo ainda central às maiores realizações criativas
dos seres humanos, todas explorando faculdades simbólicas” (2011, 26); 21
• A Musical possui caraterísticas estéticas que se prestam à exploração lúdica com
outras inteligências e simbologias, pois segundo Gardner “[a] memória tonal
original [é] complementada com a lembrança de experiências emocionais e é
este ato do inconsciente criativo que produz algo maior que uma série acústica
de tons.” (2011, 109);22
• A Lógico-Matemática usa números, heurísticas e cálculos para reconhecer novos
problemas de lógica, e a partir destes realizar descobertas, ou nos termos de
Gardner, “[c]entral ao domínio da matemática está a capacidade de reconhecer
problemas significativos e depois resolvê-los. (...) O contexto da descoberta
permanece um mistério, embora (como na música) seja claro que alguns

20 Estas inteligências quando relacionadas com áreas do conhecimento podem atuar como bases para criar (Kaufman e Glăveanu
2019). Cada inteligência possui o seu próprio dispositivo computacional para processar as especificidades das suas atividades, e.g.,
tom e ritmo para a música (Gardner 2011). Gardner define múltiplas Inteligências como competências intelectuais, ao passo que
Kaufman e Glăveanu apenas usam o termo inteligências, optou-se pela terminologia de Gardner porque na base ambos os autores
se referem ao mesmo. A tradução do autor (T.A.) dos termos originais usados por Howard Gardner para designar as múltiplas
inteligências são: Linguistics, Musical, Logico-Mathematical, Spacial, Bodily-Kinesthetic e Personal (2011).

21 T.A.: “Symbol use has been key in the evolution of human nature, giving rise to myth, language, art, and science; it has also been
central in the highest creative achievements of human beings, all of which exploit the human symbolic faculty.” (Gardner 2011,
26).

22 T.A.: “The original tonal memory has been compounded with remembered emotional experiences and it is this act of the creative
unconscious which renders more than an acoustical series of tones” (Gardner 2011, 109).

15
indivíduos tecnicamente dotados são imediatamente atraídos para a descoberta
e têm um talento para isso, enquanto outros de igual (ou até maior) não o
fazem.” (2011, 151);23
• A Espacial é a capacidade de analisar um todo e distinguir nele padrões ou
detalhes que possam ser usados e que nos escapariam de outra forma, como
nota Gardner, dado que “(...) tal manipulação (aplicada a) objetos (pode
envolver) uma quantidade considerável de criatividade. De facto, o engenheiro,
o técnico, ou o inventor não usam apenas materiais de forma culturalmente
estabelecida, mas na verdade reorganizam materiais de forma a criar um objeto
mais bem-adaptado à tarefa que estão a enfrentar.” (2011, 215);24
• A Corporal-cinestésica explora o uso do corpo para responder à capacidade
expressiva da mente, e para produzir ou transformar objetos, ou nas palavras
de Gardner, “(...) central à inteligência espacial, [é o] contínuo desenvolvimento
ou talvez mesmo uma capacidade aumentada de apreciar o todo, para discernir
padrões mesmo quando certos detalhes ou pormenores diminutos podem ser
perdidos.” (2011, 245);25
• A Pessoal serve o autoconhecimento para entender o estado de humor interno e
agir em resposta, e o conhecimento interpessoal para entender as emoções dos
outros e poder influenciar os seus comportamentos porque segundo Gardner,
“Quanto menos uma pessoa entender os sentimentos, as respostas e o
comportamento dos outros, maior a probabilidade de interagir de forma
inapropriada com eles e, portanto, de não conseguir garantir o seu lugar dentro
da comunidade maior.” (2011, 269). Esta inteligência é ainda destacada por
Nicholas Humphrey que diz ser “(...) essencialmente a mesma inteligência que
criou os sistemas de pensamento científico e filosófico que floresceram nas
civilizações avançadas nos últimos quatro mil anos.” (1976, 312).26

As pessoas dão precedência ao que é quantificável, por isso a criatividade não é


considerada como estando ao mesmo nível da inteligência, pois não é fácil de medir
com testes. Ou seja, a dificuldade de medir um domínio como a criatividade tende a

23 T.A.: “At the center of mathematical prowess lies the ability to recognize significant problems and then to solve them. As for what
permits recognition of promising problems, mathematicians seem at a loss. The context of discovery remains a mystery, although
(as in music) it is clear that some technically gifted individuals are immediately drawn to discovery and have a flair for it, while
others of equal (or even greater) do not.” (Gardner 2011, 151)

24 T.A.: “(...) such manipulation [applied to] objects [may involve] a considerable amount of creativity. In fact, the engineer, the
technician, or the inventor not only use materials in a culturally established way, but actually rearrange materials in order to
create an object better suited to the task they are facing.” (Gardner 2011, 215).

25 T.A.: “(...) central in spatial intelligence, (is the) continuing or perhaps even an enhanced capacity to appreciate the whole, to
discern patterns even when certain details or fine points may be lost.” (Gardner 2011, 245).
26 T.A.: “The less a person understands his own feelings, the more he will fall prey to them. The less a person understands the feelings,
the responses, and the behavior of others, the more likely he will interact inappropriately with them and therefore fail to secure
his proper place within the larger community.” (Gardner 2011, 269), já que “essencialmente foi esta mesma inteligência que criou
os sistemas de pensamento filosófico e científico que floresceram em civilizações avançadas nos últimos quatro mil anos.”
(Humphrey 1976, 312).

16
levar-nos a ignorar esse mesmo domínio, como nos diz Mihaly Csíkszentmihályi:27

No clima histórico atual, um domínio onde a medição quantificável é possível toma


precedência sobre um que o não permite. Acreditamos que as coisas que podem ser medidas
são reais e ignoramos aquelas que não sabemos medir. Assim, as pessoas levam a inteligência
muito a sério, porque a capacidade mental que chamamos por esse nome pode ser medida
por testes; enquanto poucos se preocupam com o quão sensível, altruísta ou útil alguém é,
pois ainda não há uma boa maneira de o medir, e nós ignoramos o que não sabemos medir.
(Csíkszentmihályi 2007, 18)

Apesar de ser mais fácil de medir a inteligência com testes, estes apenas avaliam
potencial e não preveem sucesso criativo ou intelectual (Sternberg 1997), 28 pelo que
parece ser mais válido verificar o potencial das inteligências observando como as
pessoas exploram problemas “intrigantes” (Gardner 2011) do que com testes-padrão.29
As personalidades destas pessoas podem ser avaliadas com estes testes segundo um
fator de inteligência geral — g —,30 mas não para a criatividade geral porque os
criativos dedicam-se a atividades em domínios de conhecimento específicos (Sawyer
2006; Jensen 1992).

A criatividade permite-nos lidar com problemas o que faz dela o motor da civilização,
por isso procura-se entender as caraterísticas das pessoas criativas e verificar se outras
partilham traços semelhantes (Hennessey e Amabile 2010). Porque a criatividade pode
refletir múltiplas teorias e objetos, esta apela ao conhecimento do seu funcionamento
em contextos sociais e do que significa ser criativo ao longo da História (Pope 2005).

A criatividade é difícil de definir porque é vista por diferentes sociedades de forma


diferente, e porque o seu conceito evoluiu ao longo dos tempos (Glăveanu e Kaufman
2019),31 O foco do termo transitou até 1800 na sua origem divina para se centrar no
humano e culminar com a noção de génio no período do iluminismo e romantismo –
um termo que demarca a criatividade da influência externa, e.g. da inspiração divina

27 T.A.: “In the current historical climate, a domain where quantifiable measurement is possible takes precedence over one where it
does not. We believe that things that can be measured are real, and we ignore those that we don’t know how to measure. So
people take intelligence very seriously, because the mental ability we call by that name can be measured by tests; whereas few
bother about how sensitive, altruistic, or helpful someone is, because as yet there is no good way to measure that can be measured
are real, and we ignore those that we don’t know how to measure.” (Csíkszentmihályi 2007, 18)

28 Qualquer métrica de avaliação de inteligência deve ser ponderada pois as medições são feitas por pessoas, por humanos, e por isso
tendem a ser subjetivas independentemente da escala ou fatores utilizados. Portanto, correlacionar inteligência e criatividade é
difícil porque o que pode constituir uma ideia original depende dos indivíduos encarregues de a avaliar (Runco 2014), o que torna
difícil a conceção de testes que envolvam ambas (Sternberg e Wagner 1993).

29 Howard Gardner usa o termo intrigante para caracterizar problemas desafiantes usados para avaliar a criatividade pessoal que
argumenta serem melhores para este efeito do que testes de papel e lápis (2011).

30 g é o fator comum a testes padronizados de desempenho cognitivo, baseia-se na velocidade de processamento da informação sendo
uma variável para medir a eficiência neural. A eficiência neural é o tempo de reação e a eficiência do desempenho cognitivo e
depende de três variáveis: a) rapidez com que a informação é passada através das estruturas nervosas; b) variação nos tempos de
ativação de grupos de neurônios; c) permanência da informação codificada nas estruturas neurais quando consciente, i.e., a
retenção de informação na memória (Jensen 1992).

31 Nos anos de 1700, a noção de criatividade na sociedade ocidental assentava em inspiração divina, só mais tarde a natureza da
criatividade começou a fundamentar-se no pensamento racional e consciente, com origem no indivíduo (Sawyer 2006).

17
ou loucura, para passar a interna, a processos individuais que envolvem imaginação e
subconsciente (Pope 2005).

O conceito de génio foi perdendo força até 1850, devido ao desenvolvimento do


pensamento e emergência dos conceitos de psicologia e psicanálise. Assim, o conceito
de criar evolui, apoiado na genética das capacidades mentais, na expressão do
inconsciente e na capacidade de associar ideias diversas (Ribeiro 2018). Finda a segunda
guerra mundial, a criatividade é estudada com mais afinco equilibrando perspetivas
individuais e sociais. Com isso a sua noção muda lentamente para a ideia de que as
grandes criações resultam de ter grande inteligência, uma conceção que se alterou com
A Estrutura do Intelecto (Guilford 1950),32 um estudo de fatores de inteligência para o
pensamento produtivo até então desvalorizados, como raciocínio, conceção, criatividade,
planeamento e avaliação.

Dos anos 1950 aos 1970, psicólogos da personalidade tentaram sem sucesso encontrar
formas de medir a criatividade de trabalhos individuais através de várias técnicas, e.g.
recorrer a três especialistas para avaliar a criatividade de um trabalho. Isto, contudo,
era subjetivo, como saber se os especialistas eram bons a julgar a criatividade? Se
estivessem limitados por perspetivas velhas ou convencionais decerto seriam as
pessoas erradas para tal (Sawyer 2006). Em vista desta preocupação procurou-se medir
quantitativamente a originalidade de poemas, contando com programas de computador
palavras “não usuais”, e qualidades de obras de arte, perguntando a estudantes
universitários para avaliar estas segundo critérios como, “representativo da realidade”
e “de outro mundo” (Martindale 1990).33 Assim, sem uma definição rigorosa de
criatividade era difícil avançar com estudos fundamentados. Perante este insucesso, os
psicólogos convenceram-se que a criatividade era um termo para designar produtos
gerados através de processos mentais comuns a todas as pessoas (Sawyer 2006).

Assim, procurou-se uma relação entre inteligência e criatividade recorrendo a testes de


inteligência padrão e avaliação criativa, o que levou à Teoria do Limiar (Jauk et al. 2013).34
Esta teoria sustenta que a inteligência é altamente relevante para a criatividade, mas
não a garante (Runco 2014), pois a criatividade não aumenta além de um certo grau de
inteligência (Sawyer 2006). Foram ainda encontradas correlações de caraterísticas de

32 T.A.: The Structure of the Intellect. Uma teoria exposta por Joy Paul Guilford numa palestra em 1950 enquanto presidente da
Associação de Psicologia Americana.

33 T.A. dos termos usados por Colin Martindale: unusual, representative of reality e otherworldly (1990).

34 T.A.: Threshold Theory, a que se juntam os termos originais que relacionam caraterísticas de personalidade com inteligência e
criatividade: openness to experiences, imaginative, curious, conscientiousness, emotional instability (Jauk et al. 2013).

18
personalidade com inteligência e criatividade por (Jauk et al. 2013):35

• Ser aberto a experiências para aumentar o potencial criativo e sua realização;


• Ser curioso e imaginativo, pois é uma boa base para sustentar empreendimentos
criativos;
• Ser consciencioso para estimular a investigação criativa no domínio científico;
• Ser emocionalmente instável pode facilitar a apreciação e a expressão criativa de
emoções (Feist 1998; Batey e Furnham 2008).36

Estas características indicam o que é comum, e em que diferem a inteligência e a


criatividade - a última, além da cognição e uso do intelecto, abrange as características
listadas, ou seja, nas palavras de Feldhusen e Goh

É frequente definir a criatividade como um conceito paralelo à inteligência, só que a primeira


não se restringe à cognição ou operação intelectual. Em vez disso, envolve uma combinação
complexa de condições para motivação, fatores de personalidade, condições do ambiente,
fatores de sorte, e até produtos. (Feldhusen e Goh 1995, 232)37

Na década de 1960 foi encontrada uma distinção: a inteligência exige pensamento


convergente para encontrar uma resposta certa, enquanto a criatividade exige
pensamento divergente para gerar diversas respostas (Sawyer 2006). À medida que a
investigação evoluiu percebeu-se que os conceitos de inteligência e criatividade
correspondem a níveis de abstração diferentes, mas complementares, i.e. a criatividade
torna-se uma forma distinta de cognição que atua em conjunto com as faculdades
intelectuais (Wallach e Kogan 1965).

Uma definição de criatividade é a capacidade de trazer à existência algo “novo,


surpreendente e valioso” (Boden 2004, 1). Contudo, o que é novo para uma pessoa pode
não ser para outra, pelo que novo pode ser visto de duas maneiras: 1) Criatividade
Psicológica, quando uma ideia é valiosa e surpreendente para o indivíduo que a teve; e
2) Criatividade Histórica, quando uma ideia é nova em relação à história da humanidade.38
Neste contexto, ideias criativas surpreendentes revelam-se quando nos apercebemos que

35 T.A. dos termos usados (Jauk et al. 2013): openness to experiences, imaginative, curious, conscientiousness, neuroticism (emotional
instability)

36 O termo original empregue para designar estabilidade e instabilidade emocional é o neuroticismo (Jauk et al. 2013 e Batey e
Furnham 2008). Existem indícios que muita estabilidade emocional e neuroticismo (instabilidade) excessivo têm uma correlação
negativa e que algum neuroticismo tem uma correlação positiva com a criatividade individual (Gao, Zhang, Ma e Du 2020, 5)

37 T.A.: “Creativity is often defined as a parallel construct to intelligence, but it differs from intelligence in that it is not restricted
to cognitive or intellectual functioning or behavior. Instead, it is concerned with a complex mix of motivational conditions,
personality factors, environmental conditions, chance factors, and even products” (Feldhusen e Goh 1995, 232).

38 T.A. de criatividade histórica e psicológica: Historical and Psychological Creativity. A criatividade histórica implica criatividade
psicológica, seja porque depende de outras ideias ou porque o processo criativo começa com ideias indignas para a pessoa criativa.
Por exemplo, inicialmente, a noção de órbitas elípticas de Johannes Kepler foi descartada como criatividade psicológica, apenas
quando este reconhece a sua relevância é que ganha o estatuto de criatividade histórica (Boden 2004).

19
algo não é exatamente como pensamos que seria ou poderia ser, novas quando emergem
de combinações incomuns ou surpreendentes (Boden 2004), originais quando são
notáveis e não convencionais, e eficazes quando respondem a um propósito em concreto
(Runco e Jaeger 2012). A eficácia pode assumir a forma de valor económico, porque os
mercados definem valor e originalidade segundo os custos e benefícios de um produto
criativo não convencional (Guilford 1950). No entanto, a eficácia levanta a questão de
quem está à altura para julgar uma criação como aceitável e quais os critérios usados,
pelo que julgar é parte da definição de criatividade (Runco e Jaeger 2012).

A criatividade também tem qualidades estéticas, e.g. ser sensível à beleza, pode ajudar
criadores e espectadores a identificar padrões que levem a atos criativos que reflitam
autenticidade - os valores e crenças do seu autor - ou seja, nos termos de James Averill,
et al.:

Além de ser eficaz e inovadora, uma resposta criativa deve ser autêntica; isto é, um reflexo
dos próprios valores e crenças de um indivíduo (Averill et al. 2001, 172).39

Ainda, a criatividade depende da capacidade em conceber coisas novas e úteis e da


realização destas em artefactos atuais (Jauk et al. 2013).40 Mais, a criatividade pode
refletir uma multiplicidade de teorias porque (Pope 2005):41

• As pessoas extraordinárias ou comuns podem criar objetos de excelência ou


triviais;
• Gera produtos originais adequados a tarefas segundo avaliação social e cultural;
• É um processo mental gratificante que está subjacente à imaginação;
• Gera invenções com um carácter interventivo na vida atual;
• Depende da cooperação, trabalho conjunto que acomoda conhecimento e
diferenças;
• É um processo que reconcilia pensamento consciente com inspiração inconsciente;
• Depende do conhecimento de si e de outros para sinergizar forças para criar;
• É um processo de recriação para conceber coisas novas.

Para nós, criações extraordinárias resultam da articulação do pensamento de diferentes


indivíduos sobre coisas comuns, pois é nessa interseção que se revelam diversas
possibilidades criativas inexploradas. Para que as criações sejam consideradas extraor-

39 T.A.: In addition to being effective and novel, a creative response should be authentic; that is, a reflection of an individual’s own
values and beliefs (Averill et al. 2001).

40 Os artefactos resultantes podem ser avaliados com recurso a testes de pensamento divergentes ou pelo autor (Jauk et al. 2013).

41 T.A. dos termos empregues por Rob Pope para definir criatividade: extra/ordinary, original and fitting, full-filling, in(ter)ventive,
co-operative, un/conscious, fe<>male, re...creation (2005).

20
dinárias, os responsáveis pelas suas avaliações devem acordar que estas têm potencial
para introduzir formas de pensar e fazer para melhorar a sociedade, a cultura e a vida.

Em todo o caso, para uma ideia ser criativa não chega ser nova, pois estas podem ser
previsíveis quando resultam de regras generativas, ou seja, a partir de procedimentos
pré-estabelecidos. Isto leva-nos à questão sobre o que distingue as ideias novas das
ideias criativas originais, pois se estas não são geradas por procedimentos generativos
então como surgem? A resposta é clarificada por Margaret Boden:

Uma ideia meramente nova é uma ideia que pode ser descrita e/ou produzida pelo mesmo
conjunto de regras generativas como são outras ideias familiares. Uma ideia radicalmente
original, ou criativa, é uma ideia que o não pode ser. Para justificar que uma ideia possa ser
chamada criativa (num sentido não-combinatório), então, é preciso identificar os princípios
generativos em relação aos quais é impossível. (Boden 2004, 51)42

Com isto em mente, a criatividade pode tirar vantagem de outros potenciais criativos
ou intelectuais não-humanos. Computadores e Inteligência Artificial (IA) encaixam
nesta categoria, pois apesar do seu arbítrio limitado podem gerar formas de arte e
tornarem-se igualmente criadores. Introduzem-se aqui os computadores porque são
um substrato para os videojogos (Weizenbaum 1976; Galloway 2006; Boluk e Lemieux
2017), videojogos que por sua vez propomos que possam acrescentar conhecimento às
áreas da inteligência e criatividade ao:

• Revelar problemas e formas criativas de lhes dar resposta;


• Questionar assuntos como um todo para encontrar, simular e realizar ideias;
• Explorar a linguagem e música para conceber e sustentar experiências estéticas;
• Operar como experiências interativas para despoletar pensamento criativo e
atuação;
• Mediar e criar formas de descobrir necessidades sociais e resolver estas em
conjunto.

Esta ideia de que os videojogos permitem aumentar a inteligência e a criatividade é


sustentada pela noção de James Gee de videojogos como máquinas de aprendizagem que
pode ser despoletada como parte do divertimento. É nesse sentido que Gee formula
treze princípios para conceber jogos que aliem as duas vertentes (2004a):43

42 T.A.: “A merely novel idea is one which can be described and/or produced by the same set of generative rules as are other,
familiar, ideas. A radically original, or creative, idea is one which cannot. To justify calling an idea creative (in the non-
combinational sense), then, one must identify the generative principles with respect to which it is impossible.” (Boden 2004, 51).

43 T.A. Games as Learning Machines, cuja conceção pode ser sustentada pelos seguintes princípios: 1) Co-Design; 2) Customize; 3)
Identity; 4) Manipulation; 5) Well-Order Problems; 6) Pleasantly Frustrating; 7) Cycles of Expertize; 8) Information “On Demand”
and “Just in Time”; 9) Fish tanks; 10) Sandboxes; 11) Skills and Strategies; 12) System Thinking; 13) Meaning as action image (Gee,
2004a).

21
1. Co-Design, porque a aprendizagem assenta na agência dos alunos que assim
sentem que estão a produzir em vez de serem consumidores passivos;
2. Personalização, para que os alunos se sintam agentes e tomem decisões quando
aprendem é preciso ajustar os estilos da aprendizagem a cada caso;
3. Identidade, a aprendizagem é mais profunda quando as pessoas se identificam
com um personagem ou assunto que valorizam;
4. Manipulação, na cognição o entendimento e a ação estão ancorados a algo que
pode ser estendido com a operação precisa de ferramentas remotas;
5. Problemas bem ordenados, permitem que os alunos cresçam e se tornem
independentes em processos de aprendizagem futuros, difíceis e complexos;
6. Agradável e Frustrante, a aprendizagem flui melhor quando os desafios se
encontram no limite da competência dos alunos, i.e. são exequíveis para estes;
7. Ciclos de especialização, ocorrem com a prática de aptidões até ao seu domínio, o
que por sua vez despoleta novos desafios de maestria a atingir;
8. Informação "A Pedido" ou "Atempada", é melhor gerida quando os seres humanos,
respetivamente, necessitam dela ou a podem usar no momento.
9. Aquários de peixes, são metáforas para ecossistemas simples controlado por
poucas variáveis e interações, para que alunos aprendam a lidar com sistemas
complexos;
10. Caixas de areia permitem a alunos defrontar circunstâncias que parecem atuais,
mas onde o perigo é controlado e sentindo que aprendem algo autêntico e com
mérito;
11. Aptidões e Estratégias, as aptidões são obtidas pela prática em contexto, esta
relação é uma tática para dar valorizar o processo de aprendizagem aos olhos
de alunos;
12. Pensar como um sistema, as pessoas aprendem melhor quando conseguem
encaixar ideias aptidões e estratégias no todo coeso e relevante.
13. Significado como uma imagem dinâmica, pois as palavras só ganham significado
quando relacionados com as experiências das pessoas.

Assim, torna-se claro que a criatividade não opera sem inteligência, e que ambas se
tratam de formas de pensar distintas. 44
Esta natureza complementar é evidente na
Teoria Triangular da Criatividade (Sternberg 2018), que consiste em inteligência criativa,
estilo cognitivo, personalidade, atitude e motivação.45 Estilo cognitivo é uma preferência
de personalidade sobre como fazer, divide-se em legislativo, que dispensa a realização

44 Indivíduos inteligentes procuram frequentemente tarefas que lhes permitam desenvolver o pensamento criativo, como especular
sobre condições futuras (Sternberg 1997).

45 T.A.: A triangular Theory of Creativity, e os blocos em que consiste: creative intelligence, thinking styles, and personality/
attitudinal and motivational constructs (Sternberg 2018).

22
das ideias, e liberal, o gostar de fazer as coisas de forma diferente. Personalidade,
atitude e motivação são conceitos fundamentais para a criatividade, pois é preciso estar
disposto a correr riscos ponderados, tolerar a ambiguidade e ser autoeficaz (2018).
Autoeficácia é acreditar que se tem as aptidões necessárias para completar uma tarefa
ou resolver um problema (Siegle et al. 2020, 6), orientado por motivação intrínseca.
Motivação intrínseca, é ser impulsionado por uma tarefa que vale por si própria ou pela
sua execução (Phillips e Lindsay 2006, 71). Nesta teoria, Inteligência é dividida em
criativa para gerar ideias, analítica para avaliá-las, e prática para persuadir outros do seu
valor.

Estas três facetas, levaram por sua vez, à Teoria do investimento da criatividade (Sternberg
2018) que acrescenta blocos de construção que contribuem para que a criatividade
ocorra à teoria anterior: inteligência criativa, conhecimento, estilo de pensamento,
personalidade ou atitude, motivação e ambiente propenso à criatividade.46 Estes blocos
permitem clarificar qual a relação entre inteligência e criatividade dado que esta
alimenta-se da primeira. A inteligência serve para gerar ideias que não sejam
inovadoras, pois estas requerem uma base de conhecimento que não seja estanque e
que possa ser usada de forma flexível. Ainda, nem todos tenderão a gerar ideias
inovadoras, apenas os que exibem um modo legislativo de pensar, pois é um estilo que
não se foca nem na execução ou na avaliação, mas na reflexão. A pessoa será tão mais
criativa quanto mais aberta à experiência e disposta a tolerar ambiguidade. Finalmente
o ambiente que encoraja, suporta e recompensa a criatividade é também um fator de
propensão para que esta ocorra (2018).

Dada esta relação entre inteligência e criatividade podemos agora debruçar-nos sobre
o papel que a inteligência desempenha em processos criativos. Aparentemente, este
papel auxilia na realização de ideias, pelo que na secção seguinte verificamos como os
atos criativos são influenciados pela razão, emoções e expressão.

1.2. Criatividade através da Razão, Emoção e Expressão


Razão é a capacidade de raciocinar, alinhada com a noção de Jean Piaget de que o
indivíduo está continuamente a tentar fazer sentido do mundo construindo hipóteses e
gerando conhecimento sobre a natureza dos materiais, objetos e pessoas que o rodeiam
e como estes interagem uns com os outros (Gruber e Von&he 1979; Gardner 2011). A
razão é composta por subsistemas neurológicos que sustentam os processos de
pensamento que nos permitem fazer escolhas, regular as emoções e processar as
funções do corpo que sustentam a nossa sobrevivência, e por extensão, as nossas

46 T.A.: The Investment Theory of Creativity, e os blocos em que consiste: creative intelligence, knowledge, thinking styles,
personality and attitudinal constructs, motivation and environment (Sternberg 2018).

23
atitudes e criatividade (Damásio 1994). A criatividade pode ser ainda impulsionada por
sonhos ou visões de futuro, que nos energizam e dão coragem para procurar novas
realizações (Torrance 1983).

O pensamento criativo depende da curiosidade, colaboração, adaptabilidade e estar


recetivo ao esclarecimento de problemas ou à recolha de informação. Estas condições
podem ser despoletadas pela necessidade de fazer algo sobre o que parece incompleto
ou deslocado, por questionamento, manipulação de materiais ou proposição de soluções
(Torrance 1988). Os criadores distinguem-se por esta vontade de lidar com problemas,
olhando, refletindo e elaborando formas possíveis de os resolver, já que isto abre o seu
raciocínio a informação ou hipóteses que passam despercebidas a outros. Como tal,
gerar ideias de forma consistente exige esforço intelectual, persistir em pensamentos
criativos o tempo suficiente para descartar o comum e descobrir o extraordinário
(Michalko 2003).

O nosso cérebro está programado para estruturar experiências em padrões e estes por
seu turno, em rotinas para economizar tempo (Koster 2003). Contudo, a criatividade
exige modos de pensamento incomuns que parecem ilógicos, mas são úteis para
descobrir novos padrões. E.g. o pensamento lateral é um modo de raciocínio focado em
gerar ideias refletindo sobre perspetivas além das soluções familiares ou óbvias que se
nos deparam quando refletimos sobre um problema (de Bono 1993). Avanços ocorrem
por meio de associações entre diferentes domínios de conhecimento ou experiência
(Koestler 1964). É por isso que a inovação47 requer esforços criativos para gerar ideias
e pensamento crítico para avaliar se eles se encaixam em determinados contextos
(Vincent-Lancrin et al. 2019).

Ideias também podem emergir de processos inconscientes por meio de insights48


repentinos ou apostando na intuição para gerar ideias ou agitar processos criativos
estagnados. Perceber as influências do inconsciente para moldar ideias é a chave para
a criatividade, mas exige práticas introspetivas (Perkins 1994) ou psicologia compu-
tacional para identificar os mecanismos que lhe são subjacentes (Boden 2004).

A criatividade beneficia da sinergia de esforços intelectuais e do considerar perspetivas


diferentes, e mais ainda quando este conhecimento é tornado acessível pois permite
alargar a base de sustento do pensamento criativo a todos. Estas bases podem assumir
a forma de diários com registos comuns, ou processos computacionais que organizam

47 A inovação acontece por contaminação de pensamentos entre as pessoas, e em simultâneo se tem acesso a informação e tecnologias
adequadas (Johnson 2011).

48 Insight (definição do autor) é um estado de clarividência atingido por um indivíduo sobre um dado assunto, objeto ou circunstância,
sem razão ou origem aparente, mas que apesar disso faz sentido.

24
informação para preparar empreendimentos futuros (Johnson 2010).

Qualquer processo de tomada de decisão exige razão, mas também emoção (Damásio,
2000). As emoções podem influenciar a razão positivamente, dado que agimos,
assumimos riscos ou concentramo-nos melhor com objetos que nos fazem sentir bem
(Norman 2004). As emoções também podem afastar-nos do perigo mais rapidamente
do que o raciocínio, porque passam ao largo da consciência, como tal, podem ajudar a
resolver problemas, mas também podem conduzir a soluções erradas (Damásio 2003).

As emoções alimentam e despoletam o motor da criatividade, sendo mobilizadas ou


gastas no processo da criação e necessitando de regulação para o sustentar, e até
assumirem-se como subprodutos da criatividade. O efeito das emoções na criatividade
é delineado pelo Modelo da Criatividade e Emoção (Ivcevic e Hoffman 2019),49 ilustrado
na Figura 1.2. Este modelo é visto a partir da definição de criatividade enquanto
processo que começa com a decisão de ser criativo através da geração de ideias, a seguir
investindo em trabalho de projeto de longa duração, e culminando nos efeitos dos
produtos criativos nos seus criadores e audiências.

Figura 1.1. A influência das emoções na criatividade, T.A. do diagrama de Ivcevic e Hoffman (2019).3

O modelo envolve três níveis centrais que traduzimos e listamos a seguir:

1) Caraterísticas de personalidade criativa, propensões para sentir, pensar e agir que


ajudam a decidir o domínio da criatividade com o qual trabalhar e afetam o
número de atos criativos. A característica mais forte da personalidade criativa é

49 T.A.: “Creativity and Emotions Model” e os seus três níveis centrais: Traits of Creative Personality (e.g., open to experience),
Creative Processes (affected by valence, activation, regulatory focus, and discrete emotions, as well as emotional aptitudes),
Creative Product (influence on the emotions of the creator itself and its public). Ainda, o seu processo desenrola-se segundo: “a
creativity decision, a domain choice, and behaviour frequency achievement”, que acabam por estimular “emotions in the creator
and in the audience” (Ivcevic e Hoffman 2019). A ilustração do modelo original pode ser visualizada no Anexo A.

25
a abertura à experiência,50 a sentimentos, inconformismo, imaginação e auto-
regulação emocional.
2) Processos criativos são afetados por estados emocionais relativamente curtos que
variam em valência ou ativação positiva (e.g. alegria), ou negativa (e.g. fúria ou
medo) e foco em promover ou prevenir a regulação emocional do criador. Outra
influência no processo criativo são aptidões relacionadas com emoções, a
capacidade para refletir sobre e com emoções, para saber como estas podem
servir a criatividade;
3) Produtos criativos podem estimular o compromisso e satisfação de desenvolver
trabalho criativo, ou usar a criatividade para desencadear emoções no seu
público, ou podem ser um resultado per se, como estratégias criativas para
controlar emoções.

O modelo ilustra ainda influências entre estes níveis. A decisão de ser-se criativo requer
desafiar-se a si próprio, os outros, ou convenções da época, o que por sua vez requer
ser tolerante ao risco e ambiguidade. A selecção do domínio de trabalho criativo é
influenciada por caraterísticas de personalidade, e.g. os artistas tendem a ser
emocionalmente instáveis (neuroticismo) e a escolher domínios que permitam a
autoexpressão. Na extraversão por seu lado a escolha do domínio também se reflete de
volta nas caraterísticas de personalidade.

A frequência do comportamento criativo e sua realização está relacionada com a paixão que
os indivíduos criativos têm pelo seu trabalho, e com a sua motivação intrínseca, a
satisfação ou os desafios que decorrem das tarefas. Por fim temos os efeitos das emoções
no mundo atual: no criador e no público-alvo. As emoções podem auxiliar a prever
comportamento criativo e os estados emocionais dos criadores. Os artistas descrevem
a sua experiência criativa como um misto de satisfação e exaustão quando finalizam o
trabalho. Já os cientistas descrevem a experiência criativa finalizada como uma
combinação de satisfação e orgulho, e ansiedade na sua apresentação. É frequente as
emoções terem efeito no público-alvo, quer se trate da apreciação estética do processo
de uma obra para entender o seu significado, ou através de produtos ou instituições
com carácter inovador que induzem ao consumo.

As emoções podem ajudar-nos a pensar criativamente, e.g. feedback desfavorável sobre


trabalho criativo pode motivar o seu criador a procurar ideias mais originais e uma

50 De acordo com o Modelo dos Cinco Fatores (T.A.: The Five-FActor Model), o fator mais fiável para prever uma personalidade
criativa é a abertura à experiência (Openness). Esta disposição envolve sensibilidade e controlo de emoções, é alimentada por
interesses ou trabalho prazeroso e desafiante, e exige imaginação e reflexão crítica para encontrar alternativas ao cumprimento
de convenções. O controlo emocional é visível em processos criativos porque estes são afetados por estados de humor, seja por
ativação positiva ou negativa, excitação ou regulação, ou aptidões emocionais (Digman 1990; Feist 1998; McCrae e Costa 1995).
Aptidão emocional é a capacidade de agir e pensar com emoções, pois atividades e produtos criativos estimulam emoções de
orgulho e satisfação nos criadores, e emoções estéticas, ou sua regulação nos utilizadores (Ivcevic e Hoffman 2019).

26
compreensão completa destas, ou nas palavras de Van Kleef et al.:

As nossas descobertas têm uma série de implicações práticas importantes. Enquanto


indivíduos com baixa motivação epistémica se tornam menos criativos quando confrontados
com feedback hostil, os indivíduos com alta motivação epistémica beneficiam deste. (...)
Dependendo de investigação futura, concluímos que – em linha com as previsões derivadas
do modelo EASI – expressões hostis podem influenciar o desempenho criativo, potenciando
a criatividade entre indivíduos com elevada motivação epistémica e minando a criatividade
entre aqueles com baixa motivação epistémica. (2010, 1046-1047)51

… ou de Conner e Sílvia:

Na maioria dos casos, a ativação negativa não estava relacionada com a criatividade, com a
exceção de que (alta) ativação negativa (estados zangados, hostis, irritáveis, todos os estados
focados na promoção) estavam associadas a uma maior criatividade interpessoal. (2015,
466)52

Contudo, as ideias são de pouca utilidade se não as expressarmos, ou seja, usar ou


combinar modos de representação para transmitir ideias ou conhecimento em
situações diferentes (Kiosses 2019). Cada forma de representar transmite diferentes
expressões, i.e. os jogos permitem que os jogadores vivenciem as circunstâncias de
outros realizando ações e decisões que lhes estejam associadas (Anthropy 2012).
Uma maneira de decidir qual a expressão criativa a adotar é ilustrada pela metáfora do
Modelo de Criatividade do Parque de Diversões (Kaufman e Glǎveanu 2019),53 que começa
com Requisitos Iniciais, recursos ou condições para criar, seguida da escolha de uma ou
mais Áreas de Conhecimento Geral para explorar a criatividade, 54 decidir qual o Domínio
Criativo Geral de trabalho, e qual o respetivo Microdomínio. Contudo, a expressão criativa
pode ser afetada pela cultura, e.g. obrigando-nos a seguir os valores criativos de um
educador, ou a rebelar-nos contra convenções sociais (Sternberg 2018). Assim,
defender as próprias ideias exige força de ego e confiança (Runko 2014).

Quando convenções sociais e culturais se enraízam no pensamento de indivíduos


jovens, isso pode levar ao abandono de hábitos criativos quando estes se tornarem
adultos. Assim, devemos estar atentos a como estas restrições afetam a razão, emoção,

51 T.A.: “Our findings have a number of important practical implications. While individuals with low epistemic motivation become
less creative when confronted with angry feedback, individuals with high epistemic motivation benefit from it. (...) Pending future
research, we conclude that—in line with the predictions derived from the EASI model – expressions of anger can influence creative
performance, enhancing creativity among individuals with high epistemic motivation and undermining creativity among those with
low epistemic motivation.” (Van Kleef et al. 2010, 1046-1047). O acrónimo EASI: Building on the Emotions As Social Information, é
o modelo usado pelos autores para extrair as conclusões anteriores.

52 T.A.: “Negative Activation was mostly unrelated to creativity with the exception that (High) negative activation (angry, hostile,
irritable, all promotion-focused states) was associated with higher creativity at the between-person level.” (Conner e Silvia 2015,
466).

53 T.A.: The Amusement Park model of Creativity, e as dimensões metafóricas em que consiste: 1) initial requirements; 2) general
thematic area; 3) choose an actual park, a domain; 4) select a first ride, a microdomain. (Kaufman e Glǎveanu 2019, 29)

54 Estas áreas criativas podem apoiar-se em Inteligências Múltiplas enquanto domínios de trabalho (Gardner 2011).

27
expressão, e a criatividade (Bohm 1968). Contudo as ações criativas são impulsionadas
por crenças, perspetivas e expetativas pessoais, pelo que é provável que o nosso sistema
cognitivo rejeite o que não parece encaixar na realidade (Boden 2004).

Em suma, a razão e a emoção são a base dos processos de expressão criativa que se
realizam com ações. Como a vida cotidiana exige este realizar de coisas no mundo,
voltamos nossos olhos para como a cultura, a sociedade e os indivíduos podem
influenciar atos criativos.

1.3. Criatividade como um Ato Ancorado na Cultura, Sociedade e Indivíduos


Aumentar a consciência e o conhecimento pode estimular comportamentos criativos,
sendo comum criações emergirem de trabalho árduo conjunto, sendo afetadas pela
mudança do ambiente em torno do criador.55 Estas noções levam a três dimensões: a
criatividade deve ser enquadrada pelas regras dos contextos culturais, requer sistemas
simbólicos e suporte de contextos sociais que enaltecem a novidade, e comunidades em
que indivíduos podem fazer parte de processos criativos (Csíkszentmihály 2007).

Estas dimensões são organizadas no Modelo de Sistemas de Criatividade 56 (MSC) de


Csíkszentmihály (1998) como uma ecologia de fatores pessoais e externos para que
ocorra a criatividade como ilustrado na Figura 1.2. O MSC consiste num domínio cultural
estruturado por regras simbólicas e procedimentos, um campo de conhecimento
composto por aqueles que aprovam uma ideia como importante para um domínio, e de
indivíduos que precisam de aceder ao conhecimento para criar ou julgar criações.

Figura 1.2. T.A. da ilustração do Modelo de Sistemas de Criatividade de Mihály Csíkszentmihály (1998).4

55 Mihály Csíkszentmihály estudou pessoas criativas para entender melhor o que está por trás dos atos criativos, e argumenta que é
improvável que as criações surjam de uma mente ou momento eureca ou incitando pessoas a pensar criativamente.

56 T.A. The Systems Model of Creativity, consiste em três dimensões principais: a cultural domain, a field of knowledge within society,
and indivíduals with a certain personal background (Csíkszentmihály 1998).

28
Esta ecologia de fatores do MSC tem uma forte componente pessoal, dado que a
criatividade é realizada por meio de relações pessoa-produto, mentalmente esclarecida e
moldada por processos psicológicos, e depende de sistemas interativos pessoa-ambiente que
garantem acesso ao conhecimento e incentivos, impõem desafios e julgam criações
como adequadas a uma cultura (Ribeiro 2018).

A criatividade ocorre mudando memes,57 blocos de construção culturais centrais,


existindo maior probabilidade de emergirem coisas novas em sociedades recetivas à
sinergia entre ideias ou crenças (Dawkins 2018). É por isso que dar origem a ideias
raramente ocorre dentro de uma mente, pois os memes precisam ser avaliados
socialmente em termos de criatividade e originalidade. Tal avaliação pode ser
influenciada por convenções, regras, padrões ou restrições dos sistemas simbólicos de
uma cultura, como a linguagem, a álgebra e os seus respetivos sinais. Assim, a avaliação
é feita socialmente, é realizada em campos, por grupos de pessoas com profundo
conhecimento de um domínio de trabalho. Portanto, é melhor trabalhar ao nível dos
campos do que de pessoas para que criações possam ser reconhecidas mais facilmente
(Csíkszentmihály 1998).58

Ainda assim, as criações podem sofrer de um relaxamento do julgamento criativo dado


que a criatividade pode ser confundida com formas de criar que dispensam aptidões
técnicas adquiridas com esforço.59 Esta preocupação levou à procura de definições que
pudessem explicar a criatividade, o que levou à descoberta de vertentes inter-
relacionadas que convergiram na Infra-estrutura dos Quatro P (Rhodes 1961),60 que
ilustramos na Figura 1.3 e listamos a seguir:

57 Meme é um veículo de transmissão de unidade de conhecimento na cultura humana, i.e.uma unidade de imitação, e.g., se um
cientista ouve ou lê sobre uma boa ideia, passa esta a colega e estudantes.

58 Note-se que campos que não possuam capital financeiro podem ser economicamente ou criativamente pouco atraentes para
trabalhar, por outro lado, os campos podem atrair criadores ao permitir trabalho experimental, emocionante ou desafiante.

59 Estas formas de criar são aptidões comuns para argumentar rapidamente ou organizar informação de acordo com a relevância, criar
coisas que parecem originais, mas na verdade estão enraizadas em descobertas anteriores, ou a noção errada de que todos têm o
mesmo grau criativo (Rhodes 1961).

60 T.A., The Four P Framework, que consiste em: 1) Product; 2) Person; 3) Process; 4) Press (Rhodes 1961). Acrescentamos que, na
nossa opinião, a correlação entre os modelos dos Quatro P e MSC, reflete uma hipótese curiosa – apresentam dimensões similares
que se articulam na ecologia da criatividade. Esta hipótese é apresentada em maior detalhe acompanhada de ilustração no apêndice
A. Isto porque os Domínios podem ser influenciados por Produtos, e os Processos podem auxiliar a estruturar o pensamento criativo
de indivíduos, de pessoas com sensibilidade, flexibilidade e confiança para gerar ideias. Estes indivíduos podem desafiar e
convencer campos de conhecimento ou atividade criativa do valor do seu trabalho, ou fazendo parte destes campos ajuizar sobre
a criatividade de produtos. Finalmente a Prensa, o ambiente que envolve a Pessoa, o Produto e o Processo, pode influenciar a
formação ou transformação de produtos criativos, e até mudar o campo onde estes são desenvolvidos. Estas articulações são
ilustradas na Figura 1.4.

29
Figura 1.3. T.A. dos Quatro P e a sua relação entre si a partir do estudo de James Melvin Rhodes (1961).5

1. Os Produtos são ideias transformadas em formas tangíveis (Rhodes 1961) que


podem mudar domínios se forem considerados criativos (Csíkszentmihály
1998).61
2. As Pessoas com sensibilidade, flexibilidade e confiança são cruciais para lidar
com problemas e gerar ideias (Rhodes 1961), e julgar criações (Csíkszentmihály
1999);
3. Os Processos permitem estruturar o pensamento criativo (1961),62 mas para a
inovação ocorrer os criadores têm de desafiar convenções e convencer campos
do valor do seu trabalho (Csíkszentmihály 1999);
4. A Prensa é um termo metafórico para destacar que as criações também são
moldadas por influência do ambiente (1961), e.g. os campos que avaliam as
criações (1998);

Os Quatro P tornaram-se estruturais para estudos subsequentes (Glǎveanu 2013),


devido ao potencial para relacionar indivíduos criativos com ambientes favoráveis à
criatividade, para enquadrar criações numa classe de produtos, e para julgar sua
originalidade (Rhodes 1961). No entanto, o discurso da investigação em criatividade e
as suas pesquisas em psicologia são frequentemente limitados a estudos cognitivos não
contextuais que podem afetar a perceção e o desenvolvimento da criatividade noutros
domínios (Glǎveanu 2013).63

Os Quatro P fundamentaram a investigação sobre atos criativos, mas não considera os

61 A criatividade ocorre por meio da aceitação da novidade em domínios do conhecimento - áreas de trabalho ou disciplinas - por
aqueles que têm o direito de permitir mudanças - o campo. Às vezes, os campos não são tão receptivos às mudanças, pois as novas
formas de produção desafiam o status quo de indústrias e instituições (Csíkszentmihály 1999).

62 T.A. dos processos mentais: interesse, compreensão, aprendizagem, reflexão e transmissão de descobertas (Rhodes 1961), e foram
inspirados nas fases de pensamento de Graham Wallas (1926): preparação, incubação, iluminação e verificação.

63 Um discurso para a compreensão da criatividade numa área específica pode não ser claro para outras pessoas ou por culturas que
não conseguem reconhecer a criatividade nesses termos. Ainda, um discurso ininteligível envolvendo várias áreas pode tornar a
criatividade inacessível (Glǎveanu 2013).

30
insights de ciências cognitivas e disciplinas sociais, o que levou à Infraestrutura dos Cinco
A da Criatividade (Glǎveanu 2013), ilustrada na Figura 1.4 e cujos elementos listamos a
seguir:64

Figura 1.4. Os cinco A e como se relacionam entre si (Glǎveanu 2013, 72).6

1. Atores, pessoas cujo reconhecimento enquanto criadores cresce numa rede de


relações sociais, cabendo aos atores criativos dar sentido a informações,
escolher uma área de atuação que se possa tornar central e um ambiente
favorável à troca de conhecimentos (Glǎveanu 2013; Csikszentmihalyi 1999);
2. Audiências, onde ocorre a interação de pessoas e domínios de estudo, e onde as
criações são avaliadas como centrais numa cultura (Gardner 2011);
3. Artefactos e que expressam a interpretação de padrões culturais e de comporta-
mento materializados em objetos, conceitos, ações ou performances imateriais;
4. Ação criativa, um processo de desenvolvimento orientado por objetivos
coreografados pela mente, sentidos e músculos.65 Ações criativas são atividades
interpessoais que conferem significados a artefactos;66
5. Recursos materiais e socioculturais, referem-se a ciclos criativos envolvendo o
domínio de recursos em redor e respetiva transformação em novas criações;
As relações entre estes elementos e a ecologia de recursos socioculturais podem
influenciar a criação e análise de um artefacto,67 pois os atores precisam de
conhecimento ou aptidões para usar recursos para criar. Em suma: os atores existem
se houver um público, as ações criativas usam recursos materiais e socioculturais para
dar origem a artefactos que são julgados pelo público (Glǎveanu 2013).

Os Cinco A baseiam-se nas relações entre os Quatro P para refletir novos tipos de

64 T.A. The Five A Framework of Creativity (The Five A 's), consiste em: actor, audience, artifact, creative action, material and
sociocultural affordances (Glǎveanu 2013).

65 Desenvolvimento orientado por objetivos confere qualidade a obras de arte, e enriquecer as experiências de vida (Dewey 1980).

66 Artefatos têm um caráter sociocultural e participativo, pois aprendemos e adotamos modelos ou comportamentos culturais
internalizando (T.A. Internalizing), e interpretamos e expressamos o que foi aprendido externalizando (T.A. Externalizing).
Portanto, a criatividade resulta de longos períodos de internalização, de incubação de impressões recolhidas (Vygotsky 1967).
67 Os recursos materiais têm um caráter físico que influencia a configuração e a análise de artefactos, uma natureza que por sua vez
pode chamar a atenção sobre outros materiais ou refinamento imprevisto (Bruner 1962).

31
componentes e terminologias. O modelo desmistificou a criatividade como ocorrendo
apenas na mente do criador (Glǎveanu 2013) e está alinhado com a Tese da Mente
Estendida,68 que propõe a extensão dos processos mentais a todo o corpo por via da
cognição, e se manifestam em seu redor por meio da ação (Clark e Chalmers 2010).

Os modelos teóricos anteriores mostram que a criatividade acontece sempre durante o


curso da realização de ações, razão pela qual a criatividade só pode ser explicada por
processos criativos, ou seja, por uma teoria da ação (Sawyer 2006). Há várias teorias
que podem explicar os processos criativos, mas muitos teóricos concordam que estes
dependem de quatro estágios: 1) Preparação, a recolha inicial de dados, informações,
ideias e opiniões semelhantes; 2) Incubação, o tempo para estruturar e refinar estes
recursos; 3) Insight ou Iluminação, a experiência pessoal de ter uma ideia; 4) Verificação,
avaliar o valor das ideias e respetivas implementações (Wallas 1962; Sawyer 2006)

Os teóricos da ação argumentam que a execução é a chave para os processos criativos,


já que as ideias podem acontecer ao trabalhar com materiais, i.e. é a repensar ideias no
decurso desta execução que emergem resultados inesperados (Sawyer 2006). Assim,
inovadoras surgem em contacto com outros, ou nas palavras de Steven Johnson (2011):

Mas, como muitos críticos apontaram - mais recentemente o cientista da computação e


músico Jaron Lanier – grandes coletivos raramente são capazes de verdadeira criatividade ou
inovação (temos o termo “mentalidade de rebanho” por uma razão). Quando as primeiras
cidades mercantis surgiram na Itália, não criaram magicamente nenhuma consciência de
grupo de nível superior. Eles simplesmente ampliaram o âmbito de mentes que poderiam
sugerir e partilhar boas ideias. Esta não é a sabedoria da multidão, mas a sabedoria de alguém
dentro da multidão. Não é a rede que é inteligente, os indivíduos é que ficam mais inteligentes
porque estão conectados à rede (Johnson 2011, 58).69

Isto aponta para o ato de criar como tendo caráter coletivo, dado que as ideias emergem
a partir de uma base de conhecimento desenvolvido por outros. Dado este caráter de
conexão entre indivíduos para facilitar a ocorrência da criatividade, a seguir
debruçamo-nos sobre como esta é alavancada individualmente e em grupo.

1.4. Criar Sozinho? Criar em Conjunto


A criatividade pode ser alavancada de três maneiras cujos resultados correspondem a
uma ordem crescente de valor: 1) Criatividade combinatória, associar ideias familiares de
maneiras inesperadas; 2) Criatividade exploratória, procurar possibilidades em espaços
conceituais estruturados para revelar o que foi descoberto por outros; 3) Criatividade

68 T.A. The Thesis of the Extended Mind.


69 T.A.: “But as many critics pointed out – most recently the computer scientist and musician Jaron Lanier – large collectives are
rarely capable of true creativity or innovation (We have the term “herd mentality” for a reason). When the first market towns
emerged in Italy, they didn’t magically create some higher-level group consciousness. They simply widened the pool of minds that
could come up with and share good ideias. This is not the wisdom of the crowd, but the wisdom of someone in the crowd. It’s not
that the network is smarte, it’s that the individuals get smarter because they are connected to the network.” (Johnson 2011, 58).

32
transformacional para pensar além dos limites de um espaço conceitual de maneiras sem
precedentes. Portanto, o pensamento criativo varia no seu âmbito, desde quebrar
convenções a esticar limites e introduzir variação, mas todos estes graus requerem o
domínio das estruturas abstratas do campo de trabalho, e a motivação para executar
atos criativos (Boden 2004).

Como a criatividade é baseada em aptidões comuns a todos os indivíduos,70 pessoas


comuns podem criar coisas, ao passo que os criadores eminentes são elogiados por
inovar (Boden 2004), algo que depende de esforços colaborativos de desenvolvimento
com base no trabalho de outros (Vygotsky, 1967).

Assim, para distinguir níveis de capacidade criativa e respetiva relevância, e detalhar o


que é necessário ou se pode atingir, desenvolveu-se a Teoria dos Quatro C (Kaufman e
Beghetto 2009), ilustrada na Figura 1.5, e cujos níveis listamos a seguir:71

Figura 1.5. O esquema da Teoria dos Quatro C (Kaufman e Beghetto 2009, 7).7

• Mini-c são aspetos influentes para estudantes aprenderem a ser criativos, e


embora estas criações sejam relevantes para eles são facilmente descartadas por
avaliações (Beghetto e Kaufman 2007);
• Pequeno-c destaca a importância da criatividade quotidiana;
• Pro-C refere-se à experiência profissional criativa adquirida por meio de uma
intensa exploração de um domínio (Ericsson et al. 2007);
• Grande-C é trabalho de génio criativo que sobrevive à morte do criador e se torna

70 T.A. das “Aptidões comuns” de Margaret Boden: “perceber, lembrar, ver, falar, ouvir, compreender linguagem e reconhecer
analogias” (2004, 261).

71 T.A. dos termos do diagrama de Kaufman e Beghetto da sua Four C Theory (2009), que consiste em: Mini-c; Little-C (Pequeno-C);
Pro-C, e Big-C (Grande-C).

33
o seu legado (Kaufman e Beghetto 2009).

Os níveis dos Quatro C ilustram como as pessoas psicologicamente criativas podem


evoluir para historicamente criativas, pois refletem uma escala de proficiência de atos
criativos em direção à excelência e ao reconhecimento. Estes níveis também se
relacionam com estilos de criatividade, já que Mini-c e Pequeno-c estendem o
conhecimento para fazer combinações desconhecidas, Pro-C explora limites para ver o
que ainda está para ser visto e Grande-C repensa o impensável para o transformar em
possibilidades (Boden 2004; Sautoi 2019).

Os níveis de criatividade também dependem de fatores pessoais (Kaufman e Beghetto


2009), pelo que voltamos nossos olhos para o Modelo Funcional da Personalidade Criativa
(Feist 2019), ilustrado na Figura 1.6.

Figura 1.6. Modelo Funcional da Personalidade Criativa (Feist 2019, 365).8

34
Este modelo demonstra que o pensamento e o comportamento criativo baseiam-se em
seis variáveis:72

• As influências genéticas-epigenéticas, dado que a criatividade é uma qualidade


atraente para a seleção natural porque permite aumentar a nossa sobrevivência;
• As caraterísticas cerebrais refletem a estruturação do nosso sistema nervoso
central que nos pode tornar propensos a pensar criativamente para gerar e
selecionar ideias;
• As caraterísticas cognitivas da personalidade são formas de processar informação,
como ser recetivo a experiências ou ser curioso ou flexível ao avaliar ideias;
• As caraterísticas sociais da personalidade são predisposições de comportamento
para nos relacionarmos com outras pessoas, e.g. os indivíduos criativos tendem
a rejeitar as normas, e são introvertidos e autónomos;
• As caraterísticas afetivo-motivacionais da personalidade são propensões para criar
trabalhos orientados por recompensas, reconhecimento, por prazer, conhe-
cimento ou para autoexpressão;
• As caraterísticas clínicas/ Sub-clínicas (negativas) de personalidade, como pertur-
bações afetivas, estão aparentemente relacionadas a um desempenho criativo
de sucesso, nomeadamente nas artes;

O Pensamento ou Comportamento Criativo Benigno-Malevolente resultante deriva dos


limiares das caraterísticas anteriores, sendo mais provável de ocorrer em indivíduos
que as possuem em maior número, e.g. ser aberto a experiências parece estar
relacionado com a propensão para gerar ideias inovadoras e significativas. Estas
caraterísticas podem auxiliar a fazer ou reconhecer contribuições criativas mas não
garantem atos de criatividade, porque cientistas podem fazer descobertas ao encontrar
fenómenos inesperados, e contribuições artísticas podem ser feitas pintando de forma
irreal (Csikszentmihalyi 1998).

72 T.A. The Functional Model of Creative Personality de Gregory Feist (2019) e dos respectivos termos do diagrama original que
consiste em: Genetic-Epigenetic Influences, Brain Characteristics, Cognitive Personality Traits, Social Personality Traits,
Motivational-Affective Personality traits, Clinical/Sub-Clinical (Dark) Personality Traits, Benign-Malevolent Creative Thought or
Behavior.

35
Como estas caraterísticas não são suficientes para que a criatividade ocorra, recorremos
à Teoria do Investimento da Criatividade (Sternberg e Lubart 1991),73 que postula que a
criatividade ocorre na interação de quatro níveis:

• Na confluência da interação de recursos, ao associar recursos para atuar


criativamente;74
• Nas aptidões criativas em domínios específicos, que são desenvolvidas usando
recursos em contextos particulares;
• Em portfólios de projetos criativos, que consistem em produtos desenvolvidos com
as aptidões anteriores;
• Na avaliação dos produtos criativos, ao avaliar se os projetos anteriores são
criativos.

Aptidões criativas de domínio específico emergem usando os recursos anteriores em


confluência com outras coisas. Esta confluência justifica como componentes de outras
teorias, como Indivíduos na SMC ou Produtos nos Quatro P, se relacionam para gerar atos
criativos. Este relacionamento é visível na avaliação de produtos criativos, algo
subjetivo porque depende de quem avalia e das limitações do contexto em que vive.

Outro aspeto de grande influência para impedir ou estimular a criatividade é o con-


texto de educação e crescimento do indivíduo, pois segundo Csíkszentmihály (1999):

• Os indivíduos que nascem e vivem em contextos precários não têm energia para
ser curiosos ou perseguir interesses, o que prejudica o crescimento e o
pensamento criativo;
• Os grupos étnicos tendem a enfatizar as suas tradições focadas em domínios
específicos o que limita o âmbito das áreas de atividade onde os seus filhos se
podem destacar;
• A maestria depende de quão cedo se tem acesso a um domínio, treino e os
mentores certos, pois estes podem abrir oportunidades a futuros criadores;
• As pessoas talentosas podem superar provações, mas sem estimular o intelecto
é difícil dominar um domínio e sair do ciclo da pobreza. Ainda, pessoas criativas

73 T.A.: The Investment Theory of Creativity, A Teoria do Investimento da Criatividade (1991) é proposta como uma metáfora que
destaca que vários aspetos criativos são necessários para argumentar e convencer outros do valor de ideias novas ou impopulares
para obter recursos para próximos trabalhos, ou nas palavras de Sternberg e Lubart:

Scientists who create paradigm shifts ‘buy low’, advocating new and initially strange or unpopular ideas, and then are able to ‘sell
high’, often moving on to the next problem when others have bought into their point of view on the first problem. (1991, 2)

74 Estes recursos são: Processos intelectuais para redefinir ou resolver problemas; Conhecimento para se posicionar como criativo
numa área de trabalho; Estilo intelectual, competências usadas de forma pessoal para responder a tarefas ou situações;
Personalidade, caraterísticas para agir criativamente; Motivação, a razão que impulsiona a ação criativa usando os recursos
anteriores; Contexto ambiental que enquadre e torne a criatividade possível, estimulando a geração de ideias e fornecendo um
ambiente de apoio para que floresçam e meios para julgar sua relevância (Sternberg e Lubart 1991).

36
que cresceram como marginais têm maior probabilidade de mudar o seu status
quo do que aqueles que vivem confortavelmente.
Os modelos teóricos e argumentos anteriores consolidam a noção de que a criatividade
raramente ocorre numa única mente ou agindo sozinho (Vygotsky 1967;
Csíkszentmihály 1998), até porque o potencial de ação conjunta é claro no conceito de
excedente cognitivo (cognitive surplus), reunir boa vontade e tempo para desenvolver
coisas relevantes juntos (Shirky 2010).

A ideia de que os esforços conjuntos valem a pena em termos criativos é reforçada pela
constatação de que o futuro exige lidar com a incerteza, e que o bem-estar depende da
compreensão de interesses, necessidades ou comportamentos dos outros (OCDE 2018).
A interdependência social é evidente no Modelo Dinâmico Componencial da Criatividade e
inovação (Amabile e Pratt 2016),75 pois este demonstra que os processos de Criatividade
Individual, de Pequenos Grupos ou Inovação Organizacional têm estágios semelhantes
influenciados por um Ambiente Externo, como ilustrado na Figura 1.7.

Figura 1.7. O Modelo Dinâmico Componencial da Criatividade e Inovação (Amabile e Pratt 2016, 161).9

75 T.A. o “Dynamic Componential Model of Creativity and Innovation”, divide-se em duas circunstâncias similares onde a criatividade
pode ocorrer, na Inovação Organizacional e Criatividade individual ou de grupo, e ambas alimentam-se e influenciam-se uma à
outra. A Inovação Organizacional consiste em Motivação para Inovar, Aptidões em Gestão de Inovação, e em Recursos no Domínio
da Tarefa, sendo afetada pelo Ambiente Externo. A Criatividade individual ou de grupo, consiste em Motivação Intrínseca para
Executar a Tarefa, Processos Criativos Relevantes e Aptidões no Domínio da Tarefa (Amabile e Pratt 2016, 161).

37
O ambiente de trabalho de uma instituição afeta processos de criatividade individuais ou de
grupo, que alimentam o processo de inovação. Por sua vez, as tendências sociais e a
situação económica do ambiente externo à instituição ditam a relevância das tarefas e
afetam a criatividade dos trabalhadores (Amabile e Pratt 2016). Assim, como os estágios
e sequências dos processos criativos e de inovação são semelhantes, optamos por
simplificar, destacando o que têm em comum:

1. Propor a procura de soluções ou oportunidades alinhadas a perceções ou


interesses de trabalhadores, consumidores ou hierarquias, ou motivadas por
eventos externos;
2. Desenvolver conhecimentos e aptidões e reunir as pessoas e investigação
adequada para trabalhar num projeto ou objetivos intermédios;
3. Gerar ideias individualmente ou em grupos de trabalho para resolver problemas
ou atingir objetivos relevantes num contexto mais amplo;
4. Garantir que as ideias são adequadas às tarefas em curso ou para serem
implementadas para públicos-alvo, através do confronto destas com critérios,
como ter a capacidade de as executar;
5. Avaliar a motivação, aplicação, progresso ou fracasso das ideias para
redirecionar os processos criativos ou inovadores para fases adequadas à sua
maturação.

Com isto em mente, os processos de criatividade e inovação empregam componentes


semelhantes que podem ser combinados em fases, nomeadamente: o entendimento do
trabalho criativo por trabalhadores e sua orientação pelos líderes, o contexto externo e
as influências financeiras e socioculturais, os recursos disponíveis para realizar o
trabalho em vários estágios e a recompensa aos trabalhadores pelos seus esforços
criativos para motivá-los (Durkheim 1995). As relações entre estes componentes e as
fases anteriores deram origem a cinco princípios-chave para a criatividade (Amabile e
Pratt 2016):

● O princípio do progresso é avançar em trabalho com mais relevância que tarefas


diárias;
● Trabalho relevante em criatividade motiva o envolvimento em tarefas criativas
mesmo com contratempos, dado que estes podem ser mitigados pelos líderes
ou se os trabalhadores foram orientados para a criatividade;
● Influência e criatividade aponta para o efeito positivo que o trabalho criativo pode
ter sob forma de emoções que ampliam a capacidade dos trabalhadores em fazer
associações que alimentam ainda mais a sua criatividade;
● Motivação para a Criatividade, que pode ser intrínseca quando as tarefas a

38
desempenhar pelos trabalhadores são incentivadas pela sua realização, ou
extrínseca quando estimuladas pela organização;
● Dinamismo demonstra que a criatividade emerge dos processos criativos
independentemente de resultados positivos ou negativos, cujo feedback permite
aos trabalhadores alternar entre estágios.

Em suma, as semelhanças e influências entre os processos criativos individuais e os de


inovação organizacional apontam que tanto criar sozinho como em conjunto são
atividades que se complementam quando enquadradas por um propósito amplo. Ainda,
as ideias podem ser incubadas individualmente dependendo de traços pessoais, mas
sua relevância é aumentada se fundamentados em conhecimento anterior, troca de
perspetivas com outros, ou como os criadores são vistos no seu contexto sociocultural. 76
Tendo em mente estas e outras conclusões das seções anteriores apresentamos a seguir
uma definição criativa mais adequada ao nosso âmbito de pesquisa.

1.5. Uma Definição de Criatividade


Definimos criatividade como processos conduzidos por humanos (e máquinas) para
gerar formas originais de abordar questões em domínios específicos. Devido à sua
natureza elusiva, a criatividade só pode ser considerada como um processo que muda
dinamicamente para buscar algo específico num domínio criativo. Os seres humanos
podem criar, mas estão limitados a um repertório de aptidões e conhecimento subjetivo.
Portanto, criações mais ricas e relevantes dependem de esforço conjunto realizado por
diferentes indivíduos. Incluímos máquinas computacionais aqui porque podem
aumentar a criatividade de várias maneiras.77 A originalidade é vista aqui como um
termo que reflete soluções novas, inovadoras e surpreendentes em relação ao que existe
e não existe ainda. Além da originalidade, as criações precisam ser consideradas
adequadas para lidar com os problemas pretendidos. Originalidade e adequação são
assim dois critérios que precisam ser julgados por pares, indivíduos que trabalham no
mesmo domínio de criatividade ou atividade. Este julgamento pode ainda ser estendido
às máquinas que podem contribuir com critérios e perspetivas inesperadas.

Como existem tantas soluções para um problema quanto os processos criativos que lhes
dão origem, reunimos os componentes-chave da nossa definição na Figura 1.8., seguida
de uma explicação da sua relevância. Nesta figura os componentes são dispostos em
forma de nuvem, em torno da criatividade para aludir a que todos podem contribuir

76 Esta necessidade da criatividade nos apoiarmos no trabalho de outros foi já admitida por Sir Isaac Newton cujas realizações só
foram possíveis porque ele estava “sobre os ombros de gigantes” (citado por Runco 2014, 213).

77 O poder computacional das máquinas pode ajudar a gerir informação massiva na forma de múltiplas perspetivas ou processar tarefas
exigentes em cálculo.

39
para esta. Os componentes não possuem uma ordem de importância dado que para
propósitos criativos diferentes serão necessários conjuntos de componentes em
circunstâncias diferentes, pois como acontece com os elementos de uma tempestade,
estão em constante reciprocação, articulando-se de forma variável e alimentando e
guiando o processo criativo através da incerteza (Leski 2020).

Figura 1.8. Uma nuvem dos conceitos-chave que compõem a nossa definição de criatividade.10

Assim, podemos dizer que a criatividade não opera sem aptidões intelectuais (Guilford
1950), pelo que o processo de criar coisas e avaliá-las é influenciado por sistemas
simbólicos culturais, normas sociais e caraterísticas de personalidade (Csíkszentmihály
2007). Criar, como qualquer processo de tomada de decisão, requer ainda razão e emoção
(Damásio 2000), bem como, expressão para partilhar resultados com outras pessoas
(Kiosses 2019). Por isso, a criatividade tem grande valor para a sociedade porque dá
origem a objetos ou provocações que nos incitam a fazer melhor e impregnar novos
artefactos com cultura para desenvolver a própria cultura (Lubart et al. 2019) nas esferas
da arte, ciência, tecnologia ou política (Batey e Furnham 2008).

Esta identificação de contributos para a criatividade leva-nos à questão de como esta


pode ser ensinada. Mais precisamente, como é que o indivíduo pode aumentar a sua
literacia criativa, ou seja, como é que o seu conhecimento de processos criativos e a
própria criatividade podem ser melhorados. O problema, segundo Robert Sternberg,
reside na base literária sobre criatividade dos professores e respetivas práticas, pois o
sistema curricular desencoraja educadores e estudantes, ou nos seus termos:

Acredito que a maior barreira para ensinar para a criatividade é bastante simples: os
professores não sabem fazer e não têm incentivo para aprender. Não aprenderam a ensinar
para a criatividade em sua formação, e os testes padronizados dados aos alunos com base nos
quais os professores, e não apenas os alunos, são avaliados, não dão ênfase à criatividade. Se
queremos que os professores ensinem para a criatividade, temos que remover as barreiras.
Poderíamos começar ensinando aos professores como ensinar para a criatividade, então
poderíamos encorajar em vez de desencorajar a criatividade em testes padronizados.

40
(Sternberg 2019, 101)78

Por este motivo, no capítulo seguinte, exploramos o potencial de convergência entre


literacia e criatividade para aumentar a última.

78 T.A.: “I believe the largest barrier to teaching for creativity is quite simple: Teachers do not know how to do it and have no
incentive to learn, they have not learned how to teach for creativity in their training, and the standardized tests given to students
on the basis of which teachers, not just students, will be evaluated place no emphasis on creativity. If we want teachers to teach
for creativity, we have to remove the barriers. We could start by teaching teachers how to teach for creativity, then we could
encourage rather than discourage creativity on standardized tests.” (Sternberg 2019, 101).

41
(Página em Branco)

42
2. Literacia Criativa: O que é Literacia Criativa e como pode ser
Ensinada?

2.1. Definições e Perspetivas da Literacia


Literacia, tradicionalmente, é saber ler e escrever (Gee 2008), algo insuficiente hoje em
dia para dominar a linguagem para aprender, trabalhar, ou refletir criticamente sobre
questões sociais e políticas (Gee 1999). Num âmbito mais alargado, a literacia é
compreender o mundo por meio de formas escritas ou orais e reescrevê-lo de acordo
com a experiência de vida num ciclo contínuo que articula raciocínio com práticas
quotidianas (Freire 2005).

A literacia pode então ser definida como a capacidade de um indivíduo se “envolver


apropriadamente com textos” (Farrel e Corbel 2017, 10),79 em que envolver refere-se à
capacidade simultânea de consumir (ler) e produzir (escrever) textos; apropriadamente
quer dizer adequado às expectativas humanas, sociais ou de sistemas computacionais,
e os textos são meios para expressão dos indivíduos, usando sistemas simbólicos como
o alfabeto, números, fotos, áudio ou as suas combinações. Em última análise, uma vez
que a literacia suporta estes fatores, ela é uma das matérias-primas para edificar
espaços de trabalho.

Ser literado hoje em dia é conhecer e dominar diversos meios para entender
informação, comunicar as nossas ideias ou defender a nossa perspetiva. Isto exige
raciocínio crítico e o domínio de modos digitais ou analógicos para construir
significados (Beavis et al. 2009), ou seja, alavancar múltiplas literacias, ou
multiliteracias (Kaur e Gnapathy 2011).80

As multiliteracias apoiam-se no domínio de duas dimensões: 1) a multiplicidade de


línguas, ou multilingual, e 2) modos de comunicação, ou multimodal (New London Group
1996; Kress 2005; Zagalo 2019). Literacia multilingual refere-se à capacidade de
aprender línguas de grupos étnicos, profissionais, nacionalidades, subculturas e grupos
de afinidade. Literacia multimodal refere-se à capacidade de integrar numa mensagem
diversos modos de comunicação, e a práticas culturais necessárias para construir

79 T.A.: “We bring elements of all three strands to our understanding of literacy in Industry 4.0 [Material Studies of Literacy, Actor-
network Theory, and a strand of work that seeks to understand new alignments between alphabetic and non-alphabetic multimedia
texts and their associated ‘multiliteracies’]. When we talk about literacy in this paper, we use the term to mean appropriate
engagement with texts.” (Farrel e Corbel 2017, 10). Na nossa opinião a noção de literacia explorada por estes autores, embora
orientada para as práticas de literacia na indústria 4.0, pode ser aplicada facilmente, e de forma similar a outros ramos de atividade
ou disciplinas.

80 Num exemplo, o design de jogos depende do domínio de incontáveis literacias, desde imagem em movimento, texto, som, e
componentes interativos, neurologia e psicologia dos jogadores, programação de motores de jogos, entre outros.

43
significados embebidos neste. Comunicar com recurso a estas duas dimensões fez
emergir novas literacias integradas nas práticas sociais, seja para criar novas formas
de trabalhar, de participação cívica, e até forjar novas identidades e formas de
conhecimento, ou nos termos de Cope e Kalantzis:

Agora vivemos em um mundo de iPods, wikis, blogs e mensagens SMS. Sem sequer terem
nome uma década atrás, estes são apenas alguns dos novos espaços em que agora ocorre a
representação. Com estas novas práticas de comunicação, novas literacias surgiram. Estas
literacias estão incorporadas em novas práticas sociais - em formas transformadas ou novas
de trabalhar ou de emprego, novas formas de participar como cidadão em espaços públicos
e, talvez, até mesmo novas formas de identidade e personalidade. (Cope e Kalantzis 2009,
167)81

Em vista a este potencial da multimodalidade, as práticas sociais contemporâneas não


podem ser entendidas sem considerar a mudança acelerada pelo meio digital da
literacia tradicional para esta noção de multiliteracias. Abraçar esta mudança é crucial
para sustentar as necessidades da vida contemporânea, pois subsistem várias
preocupações. Um exemplo é a aparente abertura do controlo da distribuição de
informação,82 o maior recurso de produção e o principal bem de consumo nas novas
economias, ou nos termos de Gunther Kress:

Por outras palavras, as potencialidades destas tecnologias implicam uma mudança social
radical, uma redistribuição do poder de fazer e disseminar significados. Esta mudança torna-
se ainda mais potente hoje, quando as novas economias são cada vez mais economias em que
a informação é simultaneamente recurso de produção e o principal bem de consumo. (Kress
2005, 17)83

Esta redistribuição leva por sua vez à reconversão implícita de mão-de-obra devido à
volatilidade da indústria 4.0 (Bartodziej 2017).84 Ainda, as novas tecnologias criativas
enfatizam a necessidade de introduzir outros domínios do conhecimento nas escolas,
uma necessidade apontada por Henry Jenkins:

81 T.A.: “Now we live in a world of iPods, wikis, blogs and SMS messages. Not even nameable a decade ago, these are just a few of
the new spaces in which representation now occurs. With these new communication practices, new literacies have emerged. They
are embodied in new social practices—ways of working in new or transformed forms of employment, new ways of participating as
a citizen in public spaces, and even perhaps new forms of identity and personality.” (Cope e Kalantzis 2009, 167)

82 Este controlo é aparente pois segundo Gunther Kress “[e]sta é uma condição tecnológica, e existe apenas ‘em princípio’, pois se
no passado o controlo dos meios de divulgação da informação estava ligado aos poderes instituídos, não é provável que esse poder
seja cedido facilmente sem contestação por aqueles que o têm agora para aqueles que não têm esse poder”. T.A: “But this is a
technological condition, and exists ‘in principle’ only, for if, in the past, power attached to the control of the means for
dissemination of information, it does so still, and it is not likely that that power will be ceded easily and without contest by those
who have it now to those who do not have that power.” (Kress 2005, 17).

83 T.A.: “In other words, the potentials of these technologies imply a radical social change, a redistribution of semiotic power, the
power to make and disseminate meanings. This change becomes even more potent now, when the new economies are increasingly
economies in which information is both the major resource in production and the main commodity for consumption.” (Kress 2005,
17).

84 A indústria 4.0 é a noção de que a economia mundial está a passar por uma quarta revolução industrial, com mudanças como o
aumento de trabalho pontual apoiado em sistemas inteligentes. Consequentemente, a literacia na indústria é caracterizada pela
inovação de produtos o que exige o uso de processos aptidões criativas por parte dos trabalhadores (Amabile e Pratt 2016), e
também disrupção, a adoção de sistemas inteligentes e trabalho freelance mediado por plataformas online. Ambas as caraterísticas
tiveram grande influência nas práticas de literacia daqueles que precisam de mudar para empregos independentes ou online (Farrell
e Corbel 2017).

44
[A]s aptidões em literacia para o séc. XXI são aptidões que permitem a participação em novas
comunidades, que emergem dentro de uma sociedade em rede. Tais aptidões permitem aos
estudantes explorar novas ferramentas de simulação, equipamentos que operam com
informação e redes sociais; facilitar a troca de informação entre comunidades e a capacidade
de moverem-se facilmente através de plataformas media e redes sociais. (Jenkins et al. 2009,
55)85

Porque as novas tecnologias criativas estão apontadas a indivíduos sem conhecimentos


especiais, ou seja, crianças em contexto escolar, a análise crítica, analítica e as práticas
convencionais ensinadas devem ser complementadas com dimensões criativas para que
os estudantes possam expressar-se e comunicar entre si de novas maneiras, ou nos
termos de Zagalo e Branco:

Mais recentemente, Jenkins fala sobre a mudança da cultura produzida por alguns para servir
as massas, em cultura produzida por todos para servir a todos, [e esta é a razão porque ele
argumenta que] as tecnologias criativas defendem a necessidade imperiosa de abrir as
disciplinas de ensino, permitindo que diferentes domínios entrem nas escolas. Assim, as
novas tecnologias que estão a ser criadas destinam-se a principiantes, pessoas sem
conhecimento especial, o que assenta muito bem em crianças na escola. A ideia de passar de
alguns-para-um, para todos-para-todos está diretamente ligada à ideia de democratização
do conhecimento, e o contorno de autoridades criativas. (Zagalo e Branco 2015, 8)86

As multiliteracias também podem melhorar a aprendizagem porque permitem ir além


dos padrões convencionais a partir dos quais o conhecimento é construído e aprendido.
O afastar de convenções permite desenvolver novo conhecimento e currículos educa-
cionais por alunos e professores, e por sua vez, introduzir mudanças nas esferas
pública, profissional e social. Contudo, uma pedagogia de multiliteracias levanta
questões, tal como o que estudantes precisam aprender e como se pode esta pedagogia
realizar.87 Conceber pedagogias focadas em multiliteracias requer o uso de
metalinguagens, de elementos de Design para enquadrar e discutir modos de construir
significados e interações. Estes elementos dividem-se em seis áreas do Design: Design

85 T.A.: “Literacy skills for the twenty-first century are skills that enable participation in the new communities emerging within a
networked society. They enable students to exploit new simulation tools, information appliances, and social networks; they
facilitate the exchange of information between diverse communities and the ability to move easily across different media platforms
and social networks.” (Jenkins 2009, 55)

86 T.A.: “[M]ore recently Jenkins [2009] talks about the shift of culture produced by some to serve the masses, into culture produced
by all to serve all (...) [which is why he also argues that c]reative technologies strongly defend the need to open up the teaching
subjects, allowing different domains to enter schools. Thus new technologies being created are aimed at novices, people with no
special knowledge, which sits very well with children at school. The idea of moving from all-to-one to all-to-all is directly connected
with the idea of democratization of knowledge, shortcutting through creative authorities.”(Zagalo e Branco 2015, 8).

87 Os estudantes precisam aprender a apreciar designs de currículos antigos para os transformar de modo a estimular a aprendizagem
prática de vários assuntos. Este redesenhar é um reaproveitamento de materiais antigos e recursos semióticos, ouvindo, falando,
lendo e escrevendo através da própria perspetiva. Uma pedagogia de multiliteracias depende da operação das mentes dos alunos
em contextos sociais e de aprendizagem, e como isto é sustentado por educadores experientes. Esta aprendizagem ocorre por meio
da troca de conhecimento com outras pessoas em contextos culturais, sociais e físicos, por via da Prática Situada, Instrução Aberta,
Enquadramento Crítico e Prática Transformada (termos traduzidos do original em inglês). Prática situada envolve práticas
educacionais novas e existentes por comunidades de alunos. A instrução aberta alinha-se aos interesses de realização do aluno,
individualmente ou em comunidade para que este ganhe consciência e controlo de áreas de conhecimento. O Enquadramento
Crítico aumenta o domínio dos fatores anteriores, com alunos a desconstruir o que foi aprendido para que assuntos se tornem não-
familiares, forçando assim a conceção de maneiras de lidar com estes. Prática transformada é refletir e transferir o que é conhecido
para práticas alinhadas com objetivos individuais, pois pessoas que concebem significados relevantes também podem projetar seus
próprios futuros e estabelecer uma identidade e discurso distinto. Ainda assim, tal identidade precisa ser reconhecida e negociada
num mundo perpassado por diferentes valores, limites e desigualdades (New London Group 1996).

45
Linguístico, Design Sonoro, Design Visual, Design Espacial, Design Gestual e Design Multimodal
(New London Group 1996), conforme ilustrado na Figura 2.1.

Figura 2.1. Multiliteracias: algumas metalinguagens para descrever e interpretar elementos de design
enquanto modos de significado (New London Group 1996, 83).8811

O Design Multimodal possui uma ordem diferente dos outros cinco modos de significado,
dado que representa os padrões de interligação entre estes, por isso toda a produção de
significado, num sentido mais profundo, é de carácter multimodal (New London Group
1996).

O Design Linguístico usa a linguagem como um sistema de construção de significado para


gerar representações informadas por crítica e reflexão. A diversidade de representações
nos múltiplos domínios da vida e experiência individual são diferenciadas por
linguagens, discursos e tons que crescem em diversidade e se confundem à medida que
se sobrepõem. Por isso, a linguagem é um conjunto de significados em mudança
perpétua, enquanto meio de representação essencial para as economias e sociedades

88 A T.A. do diagrama original do New London Group (1996, 83) pode ser acedida no anexo B.

46
contemporâneas e futuras, ou nos termos do New London Group:

A noção de Design enfatiza o potencial produtivo e inovador da linguagem como um sistema


de construção de significado. Esta é uma ação, uma descrição generativa da linguagem como
meio de representação [orientado] para a sociedade e o texto [enquanto] exigência essencial
das economias e sociedades do presente e do futuro. (New London Group 1996, 79)89

O Design Sonoro foca-se na conceção de significados transmitidos por sons, podendo


conjugar outros modos, e.g. a fala combina design sonoro e linguístico. A música
popular é um exemplo de criatividade através da hibridização, o articular de práticas e
convenções estabelecidas com modos de significado de novas maneiras, como na
recombinação cultural de música africana com eletrónica (New London Group 1996). A
hibridização é visível na cultura sonora que emergiu recentemente, que assenta em
ouvir e em criar novas possibilidades com este modo de transmissão, ou nas palavras
de Cox e Warner:

Ao longo do último meio século, uma nova cultura do áudio emergiu, uma cultura de músicos,
compositores, artistas sonoros, académicos e ouvintes atentos à substância sónica, ao ato de
ouvir e às possibilidades criativas de gravação, reprodução e transmissão de som. (...)
Explorando estas tecnologias e redes, a cultura emergente do áudio alcançou um novo tipo
de literacia sonora, história e memória. (Cox e Warner 2004, xiii)90

O Design Espacial incide na leitura multimodal do significado da arquitetura e seus


elementos, como o posicionamento de sinalética, logos e luz em shoppings. O
McDonalds tem assentos duros para estimular o movimento dos consumidores. Os
casinos não têm relógios ou janelas para evitar que os seus clientes tenham uma noção
de passagem do tempo e neles permaneçam. A leitura destes significados espaciais e
arquiteturais é crucial para conceber outros espaços futuros (New London Group 1996).

O Design Gestual incide sobre conectar-se com o outro indivíduo. É uma aptidão crucial
num mundo atravessado por diversidade étnica, regional e sociocultural, permitindo
negociar relações entre pessoas, linguagem e objetos materiais, e mediar conflitos. Um
exemplo que evoca a interligação com outros modos são novelas televisivas, os seus
guiões não têm qualidade se os espectadores não sentirem os significados gestuais,
sonoros ou visuais únicos subjacentes (New London Group 1996).

O Design Visual é sobre compor de forma sistemática (ou não) texto e imagem para que
as prioridades da mensagem a transmitir sejam claras (Müller-Brockmann 1996).

89 T.A.: “[T]he Design notion emphasizes the productive and innovative potential of language as a meaning-making system. This is an
action, a generative description of language as a means of representation. As we have argued earlier in this article, such an
orientation to society and text will be an essential requirement of the economies and societies of the present and the future. (New
London Group 1996, 79)”

90 T.A.: “Over the past half-century, a new audio culture has emerged, a culture of musicians, composers, sound artists, scholars,
and listeners attentive to sonic substance, the act of listening, and the creative possibilities of sound recording, playback, and
transmission. (...) Exploiting these technologies and networks, the emergent audio culture has achieved a new kind of sonic literacy,
history, and memory.” (Cox e Warner 2004, xiii)

47
O design visual é intrínseco à escrita pois esta é visualmente desenhada e paginada,
pelo que um projeto escolar deve ser avaliado segundo ambos os modos (New London
Group 1996).

Assim, a possibilidade de usar diversas modalidades para comunicar uma mensagem,


além da escrita ou oralidade, pode acrescentar significado a representações e discursos,
o que indica que a linguística per se não define nem restringe o conceito de literacia. Por
isso, é importante para uma teoria da literacia considerar os princípios das
multimodalidades, pois estão ligadas a materialidades particulares que influenciam o
que a cultura pode fazer com estas, ou nos termos de Kress:

Os modos que ocorrem, juntos com os modos da linguagem escrita e oral, em páginas ou,
assentam em princípios diferentes dos da linguagem; a suas materialidades são diferentes; e
o trabalho que as culturas fizeram com elas é também diferente. (Kress 2005, 36)91

Estes princípios marcam a mudança da literacia em direção à semiótica, em transmitir


significados por meio de signos, como gesto, fala e imagem, uma mudança que nos
obriga a repensar o conceito de literacia (Kress 2005).

A literacia é assim sustentada pelo conceito de significado.92 Uma teoria de significado


não passa sem transformação – a operação de estruturas num modo – e transdução – a
mudança de conteúdo com significado entre modos. É comum que a criatividade ocorra
entre os dois processos de forma análoga à sinestesia,93 i.e. por estimulação de um
trajecto cognitivo que por sua vez despoleta experiências involuntárias num outro
caminho cognitivo. A transformação e a transdução são procedimentos de design para
inovar e criar, veja-se e.g. nas áreas da comunicação onde é crucial educar as pessoas
com estas competências (Kress 2005).

A multimodalidade possibilita complexidade e confere inúmeras qualidades a objetos


audiovisuais, daí a dificuldade em definir um vocabulário para lhes atribuir
significados. O poder da multimodalidade reside na representação baseada na ação, o
que permite aprender fazendo. Este carácter é evidente em videojogos, pois são
constituídos por modos simbólicos (texto), icónicos (visuais) e multimédia

91 T.A.: The modes which occur, together with the language-modes of speech and writing, on pages or screens, are constituted on
different principles to those of language; their materiality is different; and the work that cultures have done with them has differed
also.

92 O significado é construído externalizando signos, pensando em formas como ícones por meio de analogias ou metáforas, algo que
é impulsionado por motivos ou normas. A produção de signos está ligada à semiose, a comunicação de sinais por meio da escrita ou
leitura. A criação de significado pode mudar formas de trabalho e trabalhadores, porque um signo pode ser interpretado como uma
característica de algo na mente de uma pessoa que pode então conceber um signo mais sofisticado (Peirce 2011). Para reformular
recursos ou transcodificar materiais semióticos é necessária transformação ou transdução. Num exemplo, a transformação produz-
se analisando escrita ou sinais originais e a transdução transforma escrita gráfica em formas vocais e vice-versa (Kress 2005).

93 Sinestesia refere-se à transdução interna (psicológica) do indivíduo de modos de interpretação e tradução (Kress 2005), i.e.,
alternar entre modos para re-representar a mesma coisa de um modo para outro (Cope e Kalantzis 2009).

48
(interativos). A interação pode atrair jogadores para experiências de jogo intensas
capazes de mudar as suas perceções sobre assuntos relevantes, como decisões de vida
ou morte envolvendo protagonistas de jogo. Estas decisões podem mudar as atitudes
atuais dos jogadores, demonstrando que há diversas oportunidades para aprender num
jogo (Zagalo 2019).

Aprender ainda se apoia em educação tradicional e vocacional que, contudo, pode


beneficiar do uso de computadores ao permitir aos alunos interagir diretamente com
as aulas. Tais práticas educacionais dependem do desenho de uma arquitetura cur-
ricular moldada pela individualidade dos alunos e relações entre estes, professores e
sociedade. Aspetos-chave para conceber um curriculum são o grau de envolvimento, o
tempo disponível para tarefas, dinâmicas que estimulam ou minam a motivação, as
perspetivas que estudantes têm da vida e do mundo, e o ampliar de horizontes para
crescimento pessoal (Kalantzis e Cope 2004).

O envolvimento na aprendizagem ocorre se os estudantes sentirem que os seus


interesses se articulam com assuntos ensinados e se estes podem ser transformados,
pois isso pode suster a sua motivação. Ampliar horizontes depende da divisão da
aprendizagem em função das necessidades dos estudantes, ou seja, conceber desafios
alcançáveis enquanto preparação para problemas futuros (Gee 2004b). Contudo, muita
aprendizagem acontece no quotidiano, de forma fortuita e tácita, ao passo que a
aprendizagem formal ocorre com currículos concebidos para ensinar conhecimento ou
aptidões específicas. Assim, segundo Kalantzis e Cope (2004), aprender através do
Design requer processos dinâmicos, ou nos termos destes autores:

Este dinamismo manifesta-se de várias maneiras. Em primeiro lugar, ao contrário da


aprendizagem quotidiana no mundo atual, estes são movimentos ativos e explícitos –
conscientes, no mínimo, e mais ou menos planeados e sistemáticos. Estão orquestrados.
Segundo, não são coisas estáticas e claramente definidas. Têm uma dinâmica textual própria.
Cada movimento leva a outro. A pedagogia é composta, organizada, conduzida e executada
como um texto integral. Em terceiro lugar, cada movimento também tem uma dinâmica
interna. Tem a sua própria abertura, corpo e fecho. Esta dinâmica interna, ao que parece,
quase tem vida própria, conta que vem de algum lugar, e possivelmente, leva a outro lugar.
E este lugar é frequentemente outro processo de conhecimento ou movimento. (Kalantzis e
Cope 2004, 63)94

Alguns destes movimentos de conhecimento e respetivas ramificações, identificados

94 T.A.: “This dynamism manifests itself in several ways. First, unlike everyday learning in the life-world, these are active and explicit
moves – conscious at the very least, and also more or less planned and systematic. They are orchestrated. Second, they are not
static and clearly defined things. They have a textual dynamic designed into them. Each movement leads into another. Pedagogy
is composed, arranged, conducted, and performed as a whole text. Third, each movement also has an internal dynamic. It has its
own opening, body and close. This internal dynamic, it seems, almost has a life of its own, telling of having come from somewhere
and possibly leading somewhere. And that somewhere is often another knowledge process or movement.” (Kalantzis e Cope 2004,
63)

49
por Kalantzis e Cope (2004), são ilustrados na Figura 2.2. e descritos a seguir.

Figura 2.2.“Pedagogia como conhecimento em ação”.95 Tradução do autor de um diagrama de


Kalantzis e Cope (2004, 64), onde se representam processos de conhecimento assentes em design,
que combinados orientam o movimento – o desenvolvimento do conhecimento.12

Experienciar é um processo de aprendizagem assente na imersão no dia-dia do mundo


atual, dividindo-se numa forma inconsciente (experienciar o conhecido), ou sistema-
tica (experienciar o novo). Experienciar o Conhecido assenta nas experiências de vivência
atual do estudante e ocorre a partir de conhecimento prévio, experiência comunitária,
interesses e motivação pessoal, e do quotidiano e do familiar. Experienciar o Novo assenta
no envolvimento sistemático em experiências não-familiares para fazer sentido destas.
Ocorre se o estudante possuir um grau mínimo de familiaridade com os assuntos em
questão, e o processo tem de decorrer em graus crescentes de dificuldade.

Concetualizar é um processo de conhecimento que incide no desenvolvimento de


conceitos generalizados e abstratos, e posterior síntese e teorização a partir destes.
Ocorre por Nomeação, usando termos gerais que refletem e distinguem a essência de
coisas particulares, e por Teorização, relacionando conceitos com uma linguagem
genérica de forma sistemática, analítica e consciente para entender e descobrir o que
não é óbvio.

Analisar é um processo de exame dos elementos constituintes ou funcionais de algo para


interpretar as razões subjacentes à sua operação ou forma de ser. Ocorre questionando
a Funcionalidade de conhecimento, ação, objetos ou conceitos, ou interrogando estes
Criticamente através de uma perspetiva específica, sobre as suas origens, objetivos,
interesses subjacentes e as implicações de os usar.

95 T.A.: Pedagogy as knowing in action. O diagrama original pode ser encontrado no anexo B.

50
Aplicar é um processo de intervenção sobre o mundo natural e humano com conceitos,
experiências ou conhecimento crítico, e aprendendo com o seu retorno. Pode ocorrer
Adequadamente, através de atuações realizadas num contexto de forma previsível, em
função de expectativas e sem replicar o que existe, ou Criativamente, inspirando-se
numa situação familiar para resolver algo em circunstâncias desconhecidas (Kalantzis
e Cope 2004).

Na nossa opinião, e tendo em mente as definições e perspetivas anteriores, podemos


dizer que a literacia e a criatividade intersectam múltiplas áreas de conhecimento ou
atividade, geralmente apontadas para trabalhar algo em específico. Por esta razão, hoje
em dia, a criatividade baseia-se no conhecimento de domínios criativos, multiliteracias
e multimodalidade, para expandir campos conceptuais criativos. Tais campos são
espaços onde a influência pessoal (Boden 2004) pode revelar ideias para agir de forma
criativa, e, na nossa opinião, aumentar a criatividade.

Em suma, a criatividade pode ser orientada, e.g. por processos de Design que envolvam
multiliteracias e multimodalidade para criar soluções ajustadas a necessidades atuais e
para inovar. Assim, a seguir olhamos para instrumentos, métodos e práticas que
auxiliam a ensinar o indivíduo a melhorar a sua criatividade, a aumentar a sua literacia
criativa.

2.2. Condições para Ensinar o Indivíduo a ser Criativo


Ensinar para a criatividade requer a compreensão da sua natureza para expor os fatores
vinculados aos processos criativos, e atrasar julgamentos precoces, para procurar novas
explicações para problemas.96 Isto pode ser feito estimulando as pessoas a explorar
relações entre as suas experiências da vida atual e domínios do conhecimento (Rhodes
1961, 1963). Uma vez que os videojogos podem integrar diversos saberes e perspetivas,
também podem aumentar as associações entre estes e assim influenciar a vida atual do
jogador por meio do diálogo que estabelecem com este. Ou seja, através de associações
estimuladas por jogos, o jogador pode aprender a lidar criativamente e a refletir sobre
assuntos atuais, o que por sua vez pode informar o design de novos jogos.

Os educadores precisam acreditar no seu próprio potencial criativo para incitar os

96 Note-se que a criatividade não é governada por valores éticos ou morais, pelo que deve ser ensinada de forma a garantir que será
usada para o bem (Sternberg, 2019). Esta preocupação tem a ver com a propensão para ver a criatividade como intrinsecamente
positiva quando também pode ser usada para o mal, como terrorismo (Cropley et al. 2010). Mais, a criatividade pode ser muito
benéfica apenas para alguns, ou seja, existe sempre um grau negativo, pelo que é desejável equilibrar esta distribuição (Oli Mold
2018). Assim é necessária mais pesquisa para prevenir a malevolência criativa deliberada, algo justificado pelo crescimento do
crime online.

51
alunos a expressar-se de forma criativa. Segundo Beghetto, isto pode ser feito
acomodando aprendizagem vocacional e criativa, ou estimulando o comportamento
criativo por meio de instrução com atitudes exemplares (2019). 97 Portanto, o ensino da
criatividade assenta na dialética, na troca de argumentos sobre conteúdos instrucionais
e na expressão criativa por elas estimulada. Como todos os videojogos possuem uma
retórica, argumentam algo sobre os seus assuntos (Bogost 2008), isso pode preparar
jogadores a contra-argumentar por meio da interação crítica e criativa (Flanagan
2009), o que pode ser útil para enfrentar desafios do jogo, e na nossa opinião, usar o
conhecimento resultante para enfrentar desafios atuais. Aprender ou aumentar a
criatividade ocorre frequentemente de forma informal fora do contexto das aulas
porque requer, e.g, pensamento não convencional ou autonomia, o que pode ser difícil
de gerir numa turma inteira, ou nos termos de Marc Runco:

É muito mais fácil construir um currículo para, digamos, a matemática do que para a arte.
De um modo mais geral, a criatividade é intrinsecamente individualista, e a maioria dos
sistemas educativos envolvem grupos. Onde existe espaço para autoexpressão numa sala de
aula com 40 estudantes? (Runco 2014, 172)98

Assim, para ensinar criatividade99 é necessário considerar fatores intelectuais e


cognitivos dos estudantes e os seus interesses e caraterísticas emocionais. Assim, para
que os estudantes invistam no desenvolvimento de novos insights e na compreensão
dos assuntos, as atividades educacionais devem equilibrar a instrução com liberdade de
pensamento (Runco 2014). Por isso, pensamos que podem ocorrer atos criativos em
videojogos se se equilibrarem motivos extrínsecos, os desafios pré-determinados do
jogo, com motivações intrínsecas, as tarefas que permitem ao jogador a liberdade de
explorar seus interesses.

Criar coisas novas requer reforçar o sentido de autoeficácia e autoconfiança dos alunos
para que resistam a normas e possam perseguir ponderadamente os seus interesses
criativos (Beghetto 2006). Este reforço depende de ambientes que encorajam o
pensamento criativo, pois as pessoas tendem a aprender e a ser criativas em ambientes
seguros e permissivos em que se sintam apreciadas pelos seus esforços (Rogers 1961).
Esta apreciação aponta para a Teoria de Condicionamento Operante de B. F. Skinner

97 Os educadores também devem permanecer flexíveis e evitar rotinas de pensamento para evitar estagnar a sua compreensão à
medida que evoluem em experiência e conhecimento (Runco 2014).

98 T.A.: “It is much easier to build a curriculum for, say, mathematics than art. More generally, creativity is inherently individualistic,
and most educational systems involve groups. Where is there room for self-expression in a classroom with 40 students?” (Runco
2014, 172).

99 A criatividade pode ser educada estimulando o pensamento construtivo, e embora não haja garantias de que algo seja aprendido,
há fatores de pensamento que podem desencadear atos criativos (Guilford 1950). Vemos estes fatores como estágios de ideação,
processos capazes de gerar ideias, aqui alavancados por videojogos, dado que estes podem atuar como campos exploratórios onde
se pode direcionar o pensamento para encontros criativos. Estes fatores são: sensibilidade para detectar problemas, capacidade
de gerar ideias, de adaptar o próprio fio de raciocínio, de sintetizar e analisar assuntos, de reestruturar ou aprofundar uma visão
geral das ideias, e de verificar se têm valor.

52
(1968),100 que assenta na noção de que consequências de experiências educativas podem
estimular comportamentos criativos e aumentar a sua recorrência. Estas alterações de
comportamento são guiadas por estímulos positivos (reforço), ou negativos (estímulos
que aumentam a frequência de resposta), 101 relegando-se na teoria a importâncias das
emoções. Ainda, o insight, a clarividência para entender e resolver problemas
diferentes, pode surgir a partir da convergência de experiências anteriores, ou nos
termos de Skinner (1968):102

[Porque o estudante] entende o problema, pode calcular a área de um retângulo e sabe alguma
coisa sobre triângulos e como eles diferem em tamanho e forma. Ele terá mais probabilidade
de ter esse insight específico se tiver resolvido problemas similares cortando e organizando
pedaços de papel ou desenhando linhas para dividir as áreas em partes. No que diz respeito
ao pensamento produtivo, não importa se ele aprendeu tudo isso ou em um ambiente não
instrucional. Ele simplesmente não deve ter aprendido a solução particular em questão.
(Skinner 1968)

...sumarizados por Marc Runco (2014):

Na realidade, o insight é meramente uma nova combinação de aptidões básicas que foram
reforçadas e aprendidas num momento anterior. (Runco 2014, 195)103

Esta ideia de que os comportamentos podem ser moldados por reforço dos resultados
de experiências educativas, e que estas podem por sua vez despoletar insights criativos,
leva-nos a pensar que a criatividade pode ocorrer espontaneamente tanto em aulas
como fora delas. Um exemplo análogo, é a experiência de dominar desafios em
videojogos, cujos reforços podem alimentar a vontade dos jogadores de continuar a
investir neles (Gee 2004a), e até, na nossa opinião, estimular os jogadores a encontrar
novas maneiras de interagir com o jogo.104

100 T.A.: Theory of Operant Conditioning, também enunciada por Marc Runco como “Teoria Operante” – Operant Theory (2014).

101 O reforço positivo, é um estímulo que consolida um resultado desejável, como um bom elogio ou nota ou sentimentos de realização
em estudantes. O reforço negativo é um estímulo que aumenta a frequência de respostas (ao contrário da punição que as inibe).
Ambos os reforços são úteis para moldar e manter comportamentos (Skinner, B. F. 1968).

102 T.A.: “[Because the student] understands the problem, he can calculate the area of a rectangle, and he knows something about
triangles and how they differ in size and shape. He will be more likely to have this particular insight if he has solved comparable
problems by cutting and arranging pieces of paper or by drawing lines to divide areas into parts. So far as productive thinking goes,
it does not matter whether he has been taught all this or has learned it from a non-instructional environment. He must simply not
have learned the particular solution at issue.” (Skinner, B. F. 1968).

103 T.A.: “In actuality the insight is merely a new combination of those discrete skills that were reinforced and learned at an earlier
time” (Runco 2014, 195).

104 Novas formas de interagir serão tão mais possíveis quanto maior a abertura do jogo para tal, como numa sandbox – um videojogo
que dá aos jogadores um grau elevado de liberdade para ser explorado e para conceber maneiras alternativas de atingir objetivos
predeterminados, ou mesmo, autopropostos.

53
2.3. Métodos para Ensinar o Indivíduo a ser Criativo
Em contextos de sala de aula com crianças até aos 12 anos de idade existem, segundo
Ronald Beghetto (2019), pelo menos três maneiras de ensinar criatividade:

• Ensinar Sobre Criatividade foca-se em auxiliar estudantes a reconhecer o valor


desta na educação e ao longo da vida, o que é e não é criatividade, as suas
manifestações, e como pode ser desenvolvida. Esta maneira de ensinar requer
conhecimento sobre a natureza da criatividade, saber combiná-la com a
matéria lecionada, e torná-la acessível.105
• Ensinar Para a Criatividade incide em desenvolver o potencial criativo dos
estudantes em áreas académicas para que consigam realizar atos criativos.
• Ensinar Com Criatividade trata de ensinar matérias académicas de forma criativa,
ou seja, modelar comportamentos criativos a partir do exemplo do educador.

Estas três maneiras de ensinar estão restritas à dificuldade em combinar criatividade


com componentes curriculares convencionais e ao respetivo acompanhamento de cada
estudante num tempo e espaço de aula limitado. A par destas maneiras, existem
técnicas, estratégias ou táticas, segundo Sternberg (2019), que os educadores podem
usar para ensinar criatividade, que listamos a seguir:

• Os educadores devem estar atentos aos efeitos do conhecimento sobre um


domínio, pois isso pode sustentar o pensamento criativo;
• Alguns estudantes precisam ser encorajados a desafiar verdades consensuais, e
a identificar e superar a resistência às próprias ideias para que tenham uma
noção clara do seu valor e saber como justificá-lo. É por isso, que precisam de
ser elogiados pelos seus esforços, e de receber críticas construtivas para
aumentar a sua motivação e confiança nas suas capacidades criativas;
• Porque a criatividade costuma ser um processo lento, incerto e arriscado, é
necessário encontrar alegria para o sustentar, e ser prudente ao tomar decisões;
• Os estudantes necessitam de um ambiente que valorize e apoie os esforços
criativos, o que pode entrar em conflito com sistemas de educação formais. 106

Em suma: a criatividade acontece por meio da realização de trabalho árduo, sendo que
explicar a criatividade exige um foco nos processos criativos (Sawyer 2006). Alguns
processos criativos não são totalmente previsíveis nem planeáveis, pelo que envolvem

105 Um exemplo é convidar profissionais para apresentar o seu trabalho e a sua perspetiva enquanto modelos de expressão criativa
assentes em conhecimento académico. Sugere-se ainda que o conteúdo sobre criatividade e conhecimento disciplinar deve ser
ensinado simultaneamente (2019)

106 O confronto ocorre porque a aprendizagem formal ainda incide na preparação para testes em vez de desenvolver aptidões criativas
que requerem tempo e liberdade para pensar (Woods 2010; Bean 2018).

54
sempre um grau de improvisação (Nachmanovitch 1990).

2.3.1. Improvisação

A Improvisação é intrínseca à nossa forma de pensar, pois estamos constantemente a


formular hipóteses para enfrentar novos desafios. A improvisação não pode ser
totalmente planeada, pois novas situações frequentemente requerem novas respostas
(Ryle 1976). Assim, segundo Brenda Harger, improvisação é a capacidade de agir em
situações inesperadas para lidar com objetivos específicos segundo três princípios
básicos (2011):107

1. Usar informação limitada;


2. Usar o que está à nossa frente;
3. Estar presente.

Segundo Kyna Leski, a improvisação pode ser vista como uma das faculdades da
criatividade que permite lidar com crise e incerteza (2020). 108 A atuação de improviso
pode ainda ser encarada como uma técnica de expressão também usada em videojogos,
pois nivela a participação dos jogadores estimulando-os a atuarem em conjunto,
criativamente, e em tempo real, ou nas palavras de Brenda Harger (2011):

A atuação improvisada é um método de expressão através da performance que leva os


participantes a um ponto de partida comum, permitindo-lhes colocar os egos de lado e criar
em conjunto. Mais conhecido como um veículo de performance de comédia (Second City,
Upright Citizen’s Brigade, Who’s Line is it Anyway?). As técnicas de atuação de improviso também
são úteis noutras aplicações. Quem improvisa aprende por meio de jogos e exercícios a
desenvolver um conjunto de Hard Skills e Soft Skills que os ajudam a criar. (Harger 2011,
182)109

Ainda, segundo Nachmanovitch (1990), a improvisação pode ser considerada como um


método para executar atos criativos que refletem as caraterísticas de quem os executa.
O contexto do método aqui descrito assenta na perspetiva do trabalho deste autor no
domínio musical. O método é relevante em vários domínios além deste, onde seja
necessária atenção e prontidão para o indivíduo abraçar uma tarefa no seu todo e poder
criar algo, ou nas palavras do autor:

107 T.A. dos princípios de Harger: “1) Use small amounts of information; 2) Use what’s in front of you – you only have what has been
introduced in the scene or what has been named explicitly; 3.) You need to be present – observe, listen…and go slow” (2011).

108 Lesky aponta para outras faculdades da criatividade que atuam em complemento da improvisação, tal como a sensibilidade e
imaginação (2020).

109 T.A.: “Improvisational acting is a method of expression through performance which brings participants to a common starting place
enabling them to put aside egos and create together. Most famously known as a comedy performance vehicle (Second City, Upright
Citizen’s Brigade, Who’s Line is it Anyway?), improvisational acting techniques are also useful in other applications. Improvisers
learn through playing games and exercises to develop a set of hard skills and soft skills that help them to create.” (Harger 2011,
182). Hard skills são aptidões ou conhecimento específico necessário para desenvolvimento de tarefas e soft skills são as
caraterísticas de personalidade do indivíduo que influenciam positivamente este desenvolvimento (definições do autor).

55
Este livro é apontado para pessoas em qualquer área que desejem entrar em contato e
fortalecer seus próprios poderes criativos. As questões que vamos aprofundar dizem respeito
a como música intuitiva, ou inspiração de qualquer tipo, surge dentro de nós, como pode ser
bloqueada, desviada ou obscurecida por certos fatos inevitáveis da vida, e como é finalmente
libertada - como finalmente somos libertados - falar ou cantar, escrever ou pintar, com a
autenticidade da nossa própria voz. (Nachmanovitch 1990, 4)110

Este método pode assim ser visto como um caminho para guiar a criação espontânea
feita de momentos intercambiáveis. Estes momentos são perpassados por liberdade,
precisão e emoção, permitindo-nos descobrir pistas para a criação pessoal, razão pela
qual é crucial para a criatividade. Persistir em trabalho criativo requer saber como
navegar tais momentos que listamos a seguir (Nachmanovitch 1990), a partir dos quais
concebemos a ilustração na Tabela 2.1:111

1. As Fontes: estados mentais, emocionais e atitudes para suportar a improvisação;


2. O Trabalho: gestos, técnicas, instrumentos e métodos usados em improvisação;
3. Obstáculos e Aberturas: estados mentais, práticas ou táticas que afetam a
improvisação;
4. Os Frutos: estados mentais, práticas adquiridas e comportamentos desejáveis.

Tabela 2.1: Perspetiva de Nachmanovitch sobre Improvisação (1990)1

AS FONTES A OBRA OBSTÁCULOS E ABERTURAS OS FRUTOS


● Inspiração e Fluxo ● Sexo e violinos ● O Fim da Infância; ● Eros e Criação
de Tempo ● Prática ● Círculos Viciosos ● Qualidade
● O Veículo ● O Poder dos Limites ● O Espectro do Julgamento ● Arte pela
● A Corrente ● O Poder dos Erros ● Rendição ● Própria Vida
● A Musa ● Jogar em Conjunto ● Paciência ● Revelações do
● Mente a brincar ● Formas em ● Amadurecer Coração
● Desaparecer Desdobramento

As FONTES refletem o início do improviso, assente em Inspiração e Fluxo de Tempo


empregue pelo indivíduo enquanto Veículo da tarefa criativa. Este indivíduo, por sua
vez, dialoga com uma Corrente constante de padrões de informação, com a sua Musa, a
sua voz interior, e a sua Mente a Brincar. O brincar é intrínseco aos atos criativos que só
ocorrem se Desaparecermos, se nos envolvermos totalmente neles.

110 T.A.:“This book is directed toward people in any field who want to contact and strengthen their creative powers. (...) The questions
we will delve into concern how intuitive music, or inspiration of any kind, arises within us, how it may be blocked, derailed, or
obscured by certain unavoidable facts in life, and how it is finally liberated - how we are finally liberated - to speak or sing, write
or paint, with our own authentic voice.” (Nachmanovitch 1990, 4)

111 T.A. da lista dos termos originais de Nachmanovitch (1990):


● THE SOURCES: Inspiration and time flow, The Vehicle, The Stream, The Muse, Mind at Play, Disappearing;
● THE WORK: sex and violins, Practice, The Power of Limits, The Power of Mistakes, Playing Together, Form Unfolding;
● OBSTACLES AND OPENINGS: Childhood's End, Vicious Circles, The Judging Spectre, Surrender, Patience, Ripening;
● THE FRUITS: Eros and Creation, Quality, Art for Life’s Sake, Heartbreakthrough.

56
A OBRA emerge das FONTES e desenvolvendo-se com Sexo e Violinos, a combinação da
ação subtil e atenção plena, através da Prática em contexto. Esta prática é adaptada ao
Poder dos Limites internos e externos ao indivíduo, mas pode ser ampliada com o Poder
dos Erros, do que estes revelam.112 A prática do Jogar em conjunto permite aos jogadores
apoiarem-se uns nos outros para co-criar algo.113 A Forma em desdobramento é o
reciprocar de sucessivo de perguntas e respostas entre jogadores para dirigir o
improviso que leve a esse algo.

Os OBSTÁCULOS e ABERTURAS são oportunidades para sustentar a OBRA. As ilusões


perdidas com O Fim da Infância devem ser recuperadas para alimentar o improviso. Os
Círculos Viciosos têm de ser superados para evitar estagnar o improviso, bem como, O
Espetro do Julgamento, o medo da crítica que impede atos criativos. A Rendição permite
manter viva a inspiração para contrariar o medo, o que requer Paciência, o tempo para
Amadurecer a criatividade que ultrapassa limites de práticas e conhecimento.

Os FRUTOS do improviso resultam dos momentos anteriores e de outros por revelar.


Eros e criação é a combinação da energia criativa com o ímpeto de atuar, existente em
todos os indivíduos para que transcendam as suas Qualidades, caraterísticas que os
distinguem uns dos outros nas suas atuações originais.114 Esta distinção leva à noção de
Arte pela Própria Vida, que todos podem contribuir para um mundo onde se possa fazer
arte para e com os outros, algo aumentado com As Revelações do Coração, a libertação de
preconceitos para gerar o novo.

Em suma, os momentos anteriores permitem improvisar atos criativos infindáveis com


um começo, percurso e chegada diferentes, oscilando entre expetativa, execução e
abdicação. Ou seja, permitem adotar diferentes atitudes e formas alternativas de atuar
e pensar que fluem consoante o que o indivíduo pretende gerar. Porque esta visão da
improvisação é complexa, Nachmanovitch (1990) faz uso de metáforas e analogias, que
enquanto formas de pensar são o cerne do método descrito a seguir.

2.3.2. Synectics

Synectics115 é um modelo teórico-operacional criado por William J.J. Gordon que assenta

112 Esta informação reconhecida pode ter caráter serendipitivo. Serendipidade é um processo de descoberta inesperada de informações
úteis ou originais por meio de uma combinação de diferentes níveis de raciocínio e acaso. Ao usar intencionalmente a serendipidade,
pode-se esperar dar origem a um valor criativo emergente da natureza imprevisível da própria serendipidade (Melo 2018).

113 Além disso, jogar em conjunto permite a troca de informações por meio do diálogo para ajudar a orientar os caminhos da vida ou
desbloquear objetivos pessoais.

114 É frequente uma criação original apoiar-se noutros interesses que não os pessoais, dado que a inovação é atingida quando os
indivíduos são energizados e influenciados por ideias de outros (Johnson 2011).

115 É também um termo usado para descrever a prática da resolução de problemas em grupo de forma criativa, e o nome da companhia
que treina pessoas para usar esta prática (Nolan e Williams 2010).

57
na ideia de que o processo criativo pode ser ensinado e guiado usando técnicas de
pensamento analógico e metafórico (Gordon, 1961). Estas técnicas foram recolhidas a
partir das estratégias inconscientes usadas por pessoas criativas no seu trabalho e são
válidas para adultos e crianças (Davis e Rimm 1982), ou nos termos de Gordon (1961):116

As tentativas de synectics de iluminar o processo criativo resultaram em várias hipóteses de


trabalho que são úteis na prática e ampliaram significativamente a produção criativa de
indivíduos e grupos (...) Depois de anotar a prática de procurar e sustentar uma analogia nas
cassetes [de audio, esta] foi testada pelo uso de mecanismos conscientes e apresentou
resultados empolgantes. Várias formas de analogia, posteriormente substituídas pelo
conceito mais abrangente de metáfora, tornaram-se os mecanismos operacionais da
Synectics. (Gordon 1961, 42)

O método permite ensinar indivíduos e grupos a adotar hábitos de pensamento para


melhorar a formulação e a resolução de problemas, o que sugere outros usos
possíveis.117 Os hábitos aprendidos nunca são totalmente esquecidos (Gordon 1961, 163),
e segundo Vincent Nolan (2003), usado em contexto cooperativo evoca outros
benefícios:118

De qualquer forma, o grupo está envolvido num processo cooperativo em que todos ganham,
ao invés de um debate adversário em que todos perdem. E, nesta situação, Synectics evoluiu
para um modelo de resolução de conflitos, e modelo de invenção (Nolan 2003, 26).

Um uso atual foca-se em formular problemas e soluções em contextos técnicos e


empresariais em grupo (Gordon 1961). Soluções propostas neste contexto, podem ser
sujeitas a avaliação de grupo para encontrar formas de as melhorar, ou colocadas de
lado para que se possa reconhecer outras melhores (Nolan 2003).

O processo de Synectics, centra-se no cliente (ou superior hierárquico) com motivação


e poder para implementar uma solução, e a responsabilidade de tomar decisões-chave
no seu decurso. São ainda escolhidos indivíduos para formar grupos synectics (Nolan e
Williams 2010). O processo é ilustrado na Figura 2.3.

116 T.A.: “Synectics' attempts to illuminate the creative process have resulted in several working hypotheses which are useful in
practice and have increased markedly the creative output of both individuals and groups (...) After the practice of seeking a nd
sustaining an analogy was noted on [audio] tapes, it was tested by the use of conscious mechanisms, and it rendered exciting
results. Various forms of analogy, subsequently superseded by the more inclusive concept of metaphor, became the Synectics
operational mechanisms.” (Gordon 1961, 42).

117 Synectics pode ser integrado com outros métodos e técnicas, como fizeram Sakda Supap e Chantana Viriyavejakul (2019) para gerar
um método para uso em contexto de aula virtual remota – Adaptation of Collaborative Learning and Synectics Learning System for
the Development of a Virtual Classroom for Educational College Creative Thinking at Roi Et Rajabhat University (T.A.: “Adaptação
de Aprendizagem Colaborativa e Sistema de Aprendizagem Sinectics para o Desenvolvimento de uma Sala de Aula Virtual para
Pensamento Criativo Educacional na Universidade Roi Et Rajabhat”). O resultado deste método mostra evidências de aumento
dimensões do pensamento criativo como reflexão, fluência pensamento flexível, iniciativa e ponderação (T.A.: “thinking, fluency,
flexible thinking, initiative and thoughtful thinking”), bem como satisfação na autoavaliação e avaliação de pares, por estudantes
e instrutores envolvidos no estudo.

118 T.A.: “Either way, the group is engaged in a co-operative, win-win process, rather than an adversarial, win-lose debate. And, in
this situation, Synectics has evolved into a conflict resolution model as well as an invention model.” (Nolan 2003, 26).

58
Figura 2.3. O processo de Synectics (Nolan e Williams 2010, 41).11913

Na fase da Tarefa, os membros dos grupos estabelecem conexões entre o problema


apresentado pelo cliente, e as suas conjeturas pessoais e as dos outros anotando-as
enquanto contribuições. Todas as ideias são válidas, ainda que absurdas, o que requer
um clima de suporte.

Na fase da Exploração os membros dos grupos e o cliente geram trampolins,120 que são
pensamentos iniciais sobre alternativas de olhar o problema, desejos ou mesmo ideias
relevantes. Esta fase usa especulação, associações ou material que parece irrelevante.

Na fase de Selecção o cliente escolhe os trampolins segundo critérios como novidade,


apelo, caráter intrigante, ou praticabilidade. Estes trampolins são pontos de início para
mais exploração. Os trampolins que parecem ser becos sem saída são descartados.

Na fase do Desenvolvimento uma solução é escolhida pelo cliente para ser executada, e
este explica as razões de ser tão atrativa e o que será necessário para a tornar possível.
A geração de ideias dos grupos é direcionada para materializar este objetivo. Se não
houver solução em vista o cliente tenta indicar o que falta para suplantar o problema,
regressando-se à fase de exploração.121

Na fase do Planeamento da Ação, em vista de uma solução possível, é delineado um plano


em função desta incluindo todas as tarefas, responsabilidades e datas.

119 Tradução do autor dos termos principais do diagrama de Synectics: Tarefa, Explorar, Selecionar, Desenvolver, Solução Possível e
Plano de Ação.

120 T.A.: Springboards.

121 Se o cliente se vir na necessidade de maior envolvimento na sua causa pode submeter e pedir feedback a um grupo de avaliação
que se pronuncie sobre os mais e os menos da solução.

59
Em suma, Synectics adapta-se a uma variedade de situações e sequências em contexto
empresarial, o que permite aumentar a eficácia de indivíduos e grupos na área da
invenção, bem como, a resolver conflitos. Subjacente aos seus processos está o enten-
dimento do que é feito por quem e porquê em cada momento. O entendimento sobre o
que se está a aprender e sobre os que facultam e comungam desta aprendizagem é
central para o desenvolvimento pessoal criativo, como sugerido pelo método seguinte.

2.3.3. AUTA

AUTA122 é um modelo taxonómico concebido por Gary A. Davis (1982) que propõe que o
processo de se tornar mais criativo, ou ensinar a desenvolver a criatividade, depende
de uma sequência de transformações cognitivas e afetivas do estudante ou educadores.
O modelo ilustrado na Tabela 2.2. descreve estes passos de mudança e as atividades
recomendadas para as consolidar (Davis 1982).

Tabela 2.2. AUTA um modelo de transformações cognitivas e afetivas para tornar-se mais criativo2

1.0. Consciencialização
1.1. Da Criatividade
1.2. Da Importância da Criatividade para a Sociedade
1.3. Da Importância da Criatividade para o Desenvolvimento Pessoal
2.0. Entendimento
2.1. Sobre Pessoas Criativas
2.2. Sobre Processo Criativos
2.3. Sobre Testes da Criatividade
2.4. Sobre aptidões Criativas
3.0. Técnicas
3.1. Pessoais
3.2. Convencionais
4.0. Autoatualização
4.1. Realizar o Potencial Individual
4.2. Autoaceitação e Saúde Mental
4.3. Automotivação
4.4. Vida Criativa

122 AUTA (Davis 1982), T.A., é um acrónimo dos termos Consciencialização (Awareness), Entendimento (Understanding), Técnicas
(Techniques) e Auto-Atualização (Self-Actualization). A tabela original (Davis 1982, 27) pode ser encontrada no anexo B.

60
1. Consciencialização é o primeiro passo para alguém tornar-se mais criativo ou
ensinar a desenvolver criatividade. Para isso é preciso que estudantes
reconheçam a importância do pensamento criativo no seu autodesenvol-
vimento, e da inovação criativa na história da civilização na resolução de
problemas sociais presentes e futuros. Estratégias para tal incluem:

1.1. Discussões sobre a importância das ideias e pessoas criativas na


sociedade moderna;
1.2. Exercícios sobre “O que aconteceria se” que apontam para o significado
da criatividade nas artes e Ciências;
1.3. Discussões sobre a influência do pensamento criativo e da resolução de
problemas nas carreiras profissionais de sucesso, ou em qualquer
ocupação ou profissão futura.

2. O Entendimento sobre as caraterísticas das pessoas criativas pode incitar estu-


dantes ou adultos a pensar, ou ser mais produtivos criativamente, através de:

2.1. O conhecimento sobre processos criativos, aprendendo e praticando


formas de resolver problemas;
2.2. Exercitar mudanças de perceção intrínsecas a estes processos, e.g.
observando algo e recolhendo novos significados, relações e
interpretações, ou recorrendo a exercícios criativos de teatro;
2.3. Fazer e discutir testes de criatividade ajuda a compreender pensamento
e pessoas criativas, e pode ser demonstrado com os Testes de Pensamento
Criativo de Torrance (Torrance 1976);123
2.4. Um entendimento mais profundo sobre a criatividade pode incluir
descrições sobre aptidões criativas e o seu significado;124

123 T.A.: The Torrance Tests of Creative Thinking (Torrance, 1976)

124 Algumas aptidões criativas relevantes são: fluência, flexibilidade, originalidade, elaboração, sensibilidade aos problemas,
capacidade de definir bem um problema, de visualizar, imaginar, regredir a um estado fantasioso mais infantil, capacidade de
pensar metaforicamente, capacidade analítica, de avaliação, de sintetizar e combinar, prever resultados, concentração e,
especialmente, a capacidade de resistir a encerrar o processo criativo de forma prematura (Davis 1981).

61
3. Tecnicas são esforços deliberados para pensar mais criativamente e envolver.se
em atividades criativas. Estas técnicas podem complementar a intuição dos
estudantes para conceber ideias e atos criativos. As técnicas dividem-se em:

3.1. Técnicas de Pensamento Criativo Pessoal, dado que cada um destes


indivíduos desenvolve um estilo e temas diferente. Estas são
desenvolvidas com o envolvimento em atividades que requerem
pensamento criativo e resolução de problemas, e através da instrução
de pessoas com reconhecida capacidade de produção criativa.
3.2. Técnicas de Pensamento Criativo Convencionais podem ser aprendidas
através de cursos e programas para treinar pensamento criativo. Em
contexto de aula podem ser praticadas em simultâneo com a resolução
de problemas curriculares.

4. A Atualização é o objetivo final, trata-se de desenvolver as capacidades e


talentos dos estudantes para que se tornem no que são capazes de se tornar.
Isto inclui a aceitação de si próprio, a preocupação com outros seres humanos,
aprendizagem autoinduzida, produtividade, naturalidade, simplicidade, ser
centrado no problema, ter sentimentos ocasionais de vivacidade ou admiração,
e uma abordagem flexível e criativa em todas as esferas da existência (Davis
1982; Maslow 1970).

O treino da criatividade será mais completo e eficaz se a instrução for organizada como
esta e incluir exercícios científicos e projetos de pesquisa apontados à resolução de
problemas e pensamento criativo. O treino beneficia ainda de prática, compreensão
holística da criatividade e da aprendizagem de técnicas de pensamento criativo.

Em suma, as fases deste modelo apontam para uma reflexão guiada e simultaneamente
autónoma para fundamentar a aprendizagem e o desenvolvimento criativo pessoal. Isto
sugere que a criatividade assenta em vários tipos de pensamento tão diversos quanto
os produtos e fenómenos criativos. É esta diversidade de formas de pensar que nos leva
ao método seguinte.

2.3.4. Pensamento Lateral

O Pensamento Lateral, é uma palavra cunhada por Edward de Bono (1985) que não
designa um método no sentido rigoroso do termo, mas um conjunto de técnicas que
inclui várias formas de pensar para explorar e percecionar assuntos de forma profunda
(ver também Ribeiro 2018). Este tipo de pensamento é incluído aqui porque os métodos
anteriores já sugeriam vários pensamentos como fundamentais para o processo da

62
criatividade. Ainda, algumas das suas técnicas são transversais aos métodos anteriores
e subsequentes descritos neste capítulo.

O pensamento lateral incide sobre a geração de ideias, distinguindo-se do pensamento


vertical (a lógica), tradicionalmente usado para encontrar uma solução para um
problema. As ideias, por seu turno, são a matéria-prima da mudança e do progresso
em todas as esferas da existência, pois segundo de Bono (1977):125

O pensamento lateral também está preocupado em escapar das prisões concetuais de velhas
idéias. Isso leva a mudanças de atitude e abordagem; a olhar de maneira diferente para coisas
que sempre foram vistas da mesma maneira. A libertação de velhas ideias e o estímulo de
novas são aspetos gémeos do pensamento lateral. (de Bono 1977, 11)

Ambas as formas de pensar complementam-se, dado que a eficácia do pensamento


vertical é aumentada ao tirar partido das opções de escolha geradas pelo pensamento
lateral. Metaforicamente, o pensamento vertical pode ser visto como o empilhamento
de cubos, ao passo que o pensamento lateral é a dispersão destes sobre um plano que
permite reconhecer padrões que não se notariam de outra forma. A criatividade tem
uma relação estreita com o pensamento lateral, que é um processo para criar que pode
ser ensinado, sobre a criatividade, somente os seus frutos podem ser apreciados. Ainda,
o pensamento lateral é simultaneamente uma atitude e um método deliberado de usar
informação para reestruturar padrões, tais como (1977):126

• A geração de Novas Ideias para organizar, executar ou apresentar algo;


• A Resolução de problemas subdividida em três tipos: os que requerem mais
informação ou melhores técnicas, os que requerem a reorganização da
informação existente, ou os não-problemas, a noção de que circunstâncias
podem ser melhoradas;
• A Mudança do Processo Percetual filtra através do pensamento lateral os padrões
que a mente recolhe para serem processados por métodos lógico-matemáticos;
• A Reavaliação Periódica refere-se a desafiar premissas tidas como garantidas;
• A Prevenção de Divisões Categóricas e Polarizadas usa o pensamento lateral como
uma atitude que contraria arrogância e rigidez.

Em todo o caso, o pensamento lateral é uma aptidão que só se desenvolve através da

125 T.A.:”Lateral thinking is also concerned with breaking out of the concept prisons of old ideas. This leads to changes in attitude and
approach; to looking in a different way at things which have always been looked at in the same way. Liberation from old ideas and
the stimulation of new ones are twin aspects of lateral thinking.” (de Bono 1977, 11)

126 T.A. dos termos originais de de Bono (1977): New Ideas; Problem Solving; Processing Perceptual Change; Periodic reassessment;
Prevention of Sharp Divisions and Polarizations.

63
prática e execução de técnicas, como as que listamos a seguir (1977):127

• Geração de Alternativas fixando uma quota mínima de possibilidades para tornar


o pensamento lateral numa rotina, praticar descrevendo padrões simples, como
figuras geométricas, fotografias ou material escrito; reformulando problemas
quotidianos ou emergentes de distúrbios relatados por fontes secundárias;
• Desafiar Premissas apenas para reestruturar o seu padrão, dado que por norma
as premissas escapam a processos de reestruturação;
• A Inovação é dirigida, como a criatividade, a pensar no futuro para construir algo
novo, já as técnicas anteriores assentam na retrospetiva, a partir do existente;
• A Suspensão do Julgamento permite erros no decurso do pensamento lateral até
se obter uma reestruturação adequada. Esta técnica inclui o Atrasar o Julgamento
para ver quanto uma ideia se sustém, ou que mais ideias surgem neste
prolongamento;
• O Design permite praticar os princípios do pensamento lateral e demonstrar que
existem várias maneiras de executar algo. Neste contexto importa comparar
como é uma função específica num projeto é tratada por diferentes designers.
• Ideias Dominantes e Fatores Cruciais são pontos rígidos de pensamento que urgem
identificar para se gerar padrões novos. Ideias dominantes são formas de olhar
para uma situação, Fatores Cruciais são sempre incluídos independentemente
da perspetiva sobre uma situação;
• O fracionamento serve para quebrar a unidade de um padrão fixo de uma situação
em frações de informação para provocar uma reestruturação do padrão original.
• O Método de Reversão é usado para escapar à necessidade imperiosa de ver uma
situação de forma convencional, para provocar o movimento em direção a
outras alternativas, estejam estas certas ou erradas;
• O Brainstorming para de Bono (1977) é um ambiente especial que encoraja o uso
do pensamento lateral em vez da lógica;
• A Analogia é uma história ou situação simples e familiar que é relacionada por
comparação a outra coisa, i.e. é um veículo para ligar e processar assuntos.
• A Escolha do Ponto de Entrada e da Área de Atenção é um mecanismo central da
mente para rentabilizar a memória limitada. Área de atenção é a parte de uma
situação ou problema focados, e Ponto de entrada é o primeiro foco de atenção.

127 T.A. dos termos originais de de Bono (1977): The Generation of Alternatives; Quota; Practice; Problems; Challenging Assumptions,
Innovation, Suspended Judgement, Design, Dominant Ideas and Crucial Factors, Fractionation, The Reversal Method, Brainstorming,
Analogies, Choice of Entry Point and Attention area, Entry Point, Attention area, Random Stimulation, Concepts, Divisions and
Polarization, The New Word Po, Blocked by Openness, Description, Problem Solving and Design.

64
• A Estimulação Aleatória é introduzir ruído, informação não relacionada, num
padrão original, para que daqui possa emergir uma reestruturação.
• Os Conceitos são construções feitas de elementos que impõem um olhar sobre
algo, as Divisões são necessárias para manter uma atenção coerente através das
partes separadas desse algo, e a Polarização acontece se um padrão novo se
aproxima de dois padrões ou conceitos estabelecidos opostos;
• A Nova Palavra PO é um dispositivo de linguagem cujo domínio permite o
rearranjo de informação e escapar ao processo de rejeição subjacente à lógica;
• Estar Bloqueado por Abertura ocorre por lacunas que obrigam à procura ou
geração de informação para as colmatar, obstáculos que obrigam ao esforço de
resolução para os superar, ou desimpedimentos que desviam a atenção de algo
importante;
• A Descrição é a maneira de mostrar e praticar, como algo pode ser visto de
diferentes ângulos, aqui preferencialmente de caráter visual, a Solução de
Problemas é a base da visão de futuro para ver o que se pode realizar para
progredir, e o Design é provocar estados desejados, colmatar falhas ou criar algo.

Nenhuma destas técnicas nem o conceito-base são novos em relação a conceitos


análogos desenvolvidos por outros autores através dos tempos. 128 O mérito de de Bono
parece residir na eficácia com que organizou e difundiu a sua visão e terminologia, pois
segundo Gilbert Burgh:

Uma visão alternativa de Sócrates é que o propósito de seu método de investigação filosófica
era mostrar às pessoas como pensar por si mesmas (...) uma outra crítica de Bono [é] que
embora ele tenha tido muito sucesso em ganhar a atenção de um público leitor amplo, as
suas contribuições não são particularmente originais no conteúdo substantivo, mas mais
reafirmações dos conceitos previamente desenvolvidos de “pensamento convergente” e
“pensamento divergente” sem atenção histórica ou académica dada a figuras-chave no
campo do pensamento crítico e da criatividade em que ele se situa. (Burgh 2014, 3)129

Em todo o caso, e na nossa opinião, a sistematização de técnicas e a linguagem que de


Bono usa para descrever formas de pensar é útil, dadas as evidências que são
transversais a outros métodos antigos ou modernos. Ainda, consideramos que os
aspetos que abordam continuam a ser uma boa base para estudos futuros para ensinar
a ser-se criativo. Esta é a razão porque incluímos a seguir outro método deste autor,
que pode ser usado em vários contextos criativos, nomeadamente nas práticas do

128 Por exemplo, Brainstorming para Runco (2014) e Sternberg (2019) é um método colaborativo para moldar ideias a partir de
contribuições individuais, que pode gerar ideias valiosas ou inúteis dado que não são avaliadas.

129 T.A.: “An alternative view of Socrates is that the purpose of his method of philosophical inquiry was to show people how to think
for themselves (...) a further criticism of de Bono [is] that while he has been highly successful in gaining the attention of a wide
readership, his contributions are not particularly original in substantive content but are restatements of the previously developed
concepts of “convergent thinking” and “divergent thinking” without historical or scholarly attention given to key figures in the
field of critical thinking and creativity in which he is situated.”(Burgh 2014, 3).

65
Design.130

2.3.5. Os Seis Chapéus do Pensamento

Os Seis Chapéus do Pensamento é uma técnica concebida por Edward de Bono (1985)
baseado na premissa de que se um indivíduo adotar a postura física de um pensador
então tornar-se-á um, ou nos termos do autor:

Quero que imagine aquela imagem tão usada – e superutilizada – do Pensador de Rodin. (...)
Assuma essa postura – fisicamente, não mentalmente – e tornar-se-á um pensador. Porquê?
Porque se fingir ser um pensador, tornar-se-á um. (de Bono 1985, 24) 131

Contudo, a confusão pode instalar-se na mente do pensador se o seu raciocínio não for
orientado, algo que se pode mitigar com técnicas para o direcionar. Estas técnicas
podem auxiliar a lidar com situações de forma faseada e adaptada, e assim ensinar algo
sobre o processo criativo. Estas fases refletem-se nos seis chapéus do pensamento de
de Bono, um processo deliberado em que cada chapéu determina um papel a
desempenhar por quem o usa, ou nos termos de de Bono (1985):132

Os seis chapéus do pensamento correspondem às diferentes cores usadas na impressão de


um mapa. Esse é o método que pretendo usar para direcionar a atenção. Portanto, não é
apenas uma questão de colocar um chapéu para pensar, mas também de escolher a cor do
que se vai usar. (de Bono 1985, 24)

A técnica tem dois propósitos-chave para o pensador: 1) simplificar o pensamento ao


lidar com lógica, informação, expectativas e criatividade separadamente; 2) permitir
variações no pensamento, afastarmo-nos de formas entrincheiradas de pensar. A téc-
nica proporciona ainda uma linguagem para solicitar maneiras de pensar precisas ou
refletir sobre quais as mais adequadas no momento. Como não se impõe ao ego ou
personalidade do pensador, é uma forma de soltar o pensamento de forma guiada.
Assim, a relevância da técnica assenta em cinco valores (Ribeiro 2018; de Bono 1985):

• Suplantar as defesas do ego que originam erros de pensamento, ao permitir

130 Algumas destas técnicas a solo ou combinadas são per se métodos de Design, como se pode constatar pela revisão destes por de
Bella Martin e Bruce Hanington (2019).
131 T.A.: I want you to imagine that much used - and overused - image of Rodin's The Thinker. (...) Throw yourself into that pose -
physically not mentally - and you will become a thinker. Why? Because if you playact being a thinker, you will become one. (De
Bono 1985, 24)

132 T.A.: “[T]he six thinking hats correspond to the different colors used in printing a map. That is the method I intend to use for
directing attention. So, it is not only a matter of putting on a thinking hat but also of choosing what color thinking hat you are
going to use.” (De Bono 1985, 24). Na prática, chamam-se os chapéus pelas cores pois assim o pensamento torna-se um jogo com
regras definidas, em vez de ser um conjunto de exortações e condenações. A seguir listamos o propósito de cada chapéu:
● O Chapéu branco foca-se em fatos e números objetivos;
● O Chapéu Vermelho proporciona o ponto de vista emocional sobre algo;
● O Chapéu preto debruça-se sobre por que algo não pode ser feito;
● O Chapéu Amarelo foca-se sobre esperança e pensamento positivo;
● O Chapéu Verde apela à criatividade e a gerar novas ideias;
● O Chapéu Azul controla e organiza o processo de pensamento, e o uso dos outros chapéus.

66
pensar e dizer algo que não poderíamos sem esta restrição;
• Direcionar a atenção do pensamento para que seja menos reativo e mais focado
em seis aspetos diferentes de um problema;
• O simbolismo diferente dos chapéus permite pedir a alguém (e ao próprio) de
uma maneira conveniente para mudar de modo de pensar;
• Influenciar padrões químicos de neurotransmissão conectados a cada modo de
pensar para desenlaçar o pensamento normal, que é influenciado pela emoção
ou oscila entre esta e a razão;
• Um dos meios mais eficazes de ensinar pessoas é aprender regras de jogo, neste
caso o jogo particular de mapear o pensamento.
Em suma, o que fica salientado por esta técnica é a ação deliberada de guiar o
pensamento através de determinados filtros e por vários participantes. Esta técnica
pode ser empregue em vários contextos e situações e desenrola-se de acordo com as
contribuições individuais dos participantes. Esta vertente de ensinar a pensar de forma
atuante e um modo de cada vez (Burgh, 2014) continuou a ser investigada por de Bono
dando origem ao curriculum pedagógico sobre o qual nos debruçamos a seguir.

2.3.6. O Cognitive Research Trust Thinking Program

O Cognitive Research Trust (CoRT) Thinking Program133 é um programa curricular


desenvolvido por Edward de Bono (2009) para ensinar estudantes a pensar de forma
crítica, autónoma e criativa, e para melhorar as suas capacidades de planeamento e
decisão (Sternberg 2019). Ao aplicar estratégias que guiam e reforçam a atenção, os
estudantes aplicam o pensamento em ação tornando-o mais eficaz.134 Este pensamento
tem de ser aprendido e praticado como acontece com a literacia ou a numeracia. As
estratégias CoRT auxiliam a evitar que aspetos de situações passem despercebidos antes
dos estudantes tomarem decisões sobre ideias. A seguir listamos as ferramentas usadas
por este currículo, uma vez por semana:135

• Mais, Menos, Interessante para decidir níveis de tratamento aplicado às ideias;


• Considerar todos os Fatores para obter informação sobre assuntos de forma holística;
• Regras a integrar nos projetos que facilitem e melhorem a vida de designers e
utilizadores;

133 O Cognitive Research Trust consiste em seis estágios para ensinar a pensar melhor: 1) Extensão para ampliar a perceção pessoal;
2) Organização para estruturar os pensamentos; 3) Interação para atuar com ideias ancoradas em evidências; 4) Criatividade para
romper com a familiaridade e ampliar perspetivas; 5) Informação e sentimentos para reunir, filtrar e avaliar as informações
necessárias e os respetivos valores e sentimentos que lhes são atribuídos; 6) Ação induzida para pensar sobre o signo como algo
que comunica significado (Sternberg 2019).

134 T.A.: “operacy”, é segundo Gilbert Burgh (2014), um termo cunhado por Edward de Bono que descreve pensamento em ação.

135 T.A. das ferramentas empregues pelo CoRT (de Bono 2009): Plus, Minus, Interesting; Considering All Factors; Rules; Consequences
and Sequel; Aims, Goals, Objectives; Planning; First Important Priorities; Alternatives, Possibilities, Choices; Decisions; Other Point
of View.

67
• Consequências e Sequência para prever e avaliar ideias;
• Propósitos, Metas e objetivos para descobrir qual o emprego a dar às ideias;
• Planear é pensar no futuro e especular sobre como executar as ideias;
• Primeiras prioridades para saber o que fazer no imediato;
• Alternativas, Possibilidades, Escolhas para considerar ideias criativas congéneres;
• Decisões para refletir crítica e ponderadamente sobre as ideias;
• Outro Ponto de Vista para ampliar a perceção e a exploração de ideias.

Esta variedade de ferramentas segue a mesma estrutura em aula, embora a forma como
são usadas, e.g. como currículo à parte ou integrado com conteúdo vocacional, possa
variar imenso. A estrutura segue a seguinte sequência:136
1. Introdução: é exemplificada uma das ferramentas anteriores;
2. Prática: assuntos são selecionados para praticar esta ferramenta;
3. Processo: as questões subjacentes a estes assuntos são discutidas abertamente
em aula;
4. Princípios: São facultados a grupos de estudantes cinco princípios básicos sobre
a ferramenta para discussão;
5. Projeto: são adicionados tópicos como trabalho de casa ou continuação da aula.

Segundo Joseph Hartnett (2016), os métodos de de Bono são criticados pela autopromo-
ção de resultados positivos sem se apoiar em bases académicas. Contudo, os seus méto-
dos têm o potencial de promover rotinas de uso de pensamento divergente, de motivar
estudantes, ou auxiliar a estruturar aulas em vários domínios disciplinares. Esta
conclusão deriva da investigação de Hartnett, focada em explorar práticas criativas de
literacia da informação por via do Pensamento Divergente (PD),137 ou nos seus termos:138

Esta investigação confirmou o que parecia claro à primeira vista: que os processos de de Bono
realmente têm o potencial de promover práticas reflexivas, exploratórias e criativas no
contexto da literacia da informação. Os estudantes que usaram uma diversidade das suas
ferramentas mostraram um aumento estatisticamente significativo em PD, uma capacidade
essencial para a criatividade. Portanto, parece que outras abordagens semelhantes
encontradas durante esta investigação também têm valor potencial na promoção de
disposições para PD e provavelmente no desenvolvimento de culturas de sala de aula mais

136 T.A. fases da estrutura-base de uma aula CoRT (de Bono 2009): Introduction, Practice, Process, Principles, Project.

137 A noção de Pensamento Divergente (PD) não é nova, e.g., Segundo Frank Barron e David M. Harrington (1981), Henry e Binet já
havia na década de 1900 desenvolvido testes abertos com múltiplas soluções do tipo designado hoje por (PD). A teorização e o
desenvolvimento de testes de PD avançam na década de 1940 com J.P. Guilford, sendo continuada por Ellis Paul Torrence,
materializando-se nos seus Testes de Pensamento Criativo de Torrence (1976). O pensamento divergente serve para gerar ideias,
opções, soluções possíveis e diferentes perspetivas. Inversamente, o pensamento convergente serve para reduzir pensamentos a
uma só ideia e avaliar os seus resultados (Basadur et al. 1999).

138 T.A.: “This investigation confirmed what appeared clear at face value: that de Bonoʼs processes do indeed have the potential to
promote thoughtful, exploratory, creative practices in the context of information literacy. Students presented with a range of his
tools showed a statistically significant increase in DT, which is an essential capacity in creativity. Therefore, it would appear that
other similar approaches encountered while engaging in this investigation also have potential value in promoting DT dispositions,
and likely in developing more active, creative, and reflective classroom cultures as opposed to those that promote one-size-fits-
all skills.” (Hartnett 2016)

68
ativas, criativas e reflexivas em oposição àquelas que promovem o ensino de aptidões de
forma igual para todos os estudantes. (Hartnett 2016)

Em suma, na nossa opinião, este método é útil para estimular processos criativos e
aumentar a criatividade dos indivíduos que neles participam, seja qual for o seu
domínio disciplinar. Isto porque o método é versátil, apenas é necessário combinar as
suas fases e ferramentas com conhecimento disciplinar. Este acaba por ser um dos
propósitos do método seguinte que usa o design de jogos para chegar a essa combinação
complementar, e o ato de os jogar para atingir os objetivos expetáveis.

2.3.7. Gamestorming

GameStorming (Gray et al. 2010) é um termo que mescla jogos e brainstorming para
designar um método que usa jogos para lidar com desafios de negócios. Neste contexto,
o trabalho deve ser consistente, repetível e com resultados previsíveis, o que
tradicionalmente é guiado por um processo de negócio,139 uma série de passos em cadeia
para chegar a um objetivo preciso. Contudo, quando se pretende criar algo novo, não
há uma maneira de estabelecer um objetivo preciso porque há demasiadas variáveis
desconhecidas. Ou seja, é necessário movermo-nos em direção a objetivos difusos.

O Gamestorming apresenta-se como uma alternativa ao processo de negócio e reflete


esta imprecisão e objetivos difusos. Em vez de criar uma cadeia de passos, cria uma
estrutura para explorar, experimentar por tentativa-erro, ou seja, um jogo. O caminho
não é preciso e o objetivo pode até mudar à medida que se aprende no decurso do seu
design ou execução, ou nos termos de Gray et al. (2010):

Gamestorming é sobre criar mundos de jogo especificamente para explorar e examinar


desafios de negócios, para melhorar a colaboração e para gerar novas perceções sobre a forma
como este mundo funciona e quais tipos de possibilidades podemos encontrar lá. Os mundos
dos jogos são realidades alternativas – universos paralelos que podemos criar e explorar,
limitados apenas pela nossa imaginação (...) Ao imaginar, criar e explorar mundos possíveis,
abre-se a porta para um pensamento revolucionário e inovação atual. (Gray et al. 2010, 4)140

Para definir um caminho difuso são necessários componentes Emocionais, Sensoriais e


Progressivos. Objetivos difusos precisam de estar alinhados com as paixões das pessoas,
serem emocionalmente atraentes. Os objetivos devem ser trabalhados por forma a

139 T.A.: Business Process.

140 T.A.: “Gamestorming is about creating game worlds specifically to explore and examine business challenges, to improve
collaboration, and to generate novel insights about the way the world works and what kinds of possibilities we might find there.
Game worlds are alternative realities – parallel universes that we can create and explore, limited only by our imagination (...) By
imagining, creating, and exploring possible worlds, you will open the door to breakthrough thinking and real innovation.” (Gray et
al. 2010, 4).

69
serem tangíveis, sensorialmente mais explícitos para partilhar e apresentar. Um
objetivo que muda é difuso e mover-se nessa direção é também um processo de
aprendizagem. À medida que se aprende e mudanças ocorrem, é importante parar e
reavaliar a situação, ajustando-se o caminho por “aproximação sucessiva”.141

Desenhar jogos que permitam aos jogadores ajustar objetivos e caminhos requerem que
se estabeleça um estado inicial, o que se sabe ou não sabe, quem faz parte da equipa e
que recursos dispomos, e um estado alvo, o que se consegue no final do jogo? o que
quer dizer vitória, qual a recompensa? Aqui a tangibilidade do objetivo é uma força
motivadora e no fim os jogadores sabem que criaram algo em conjunto. Estes jogos são
perpassados por três estados principais, podendo assumir diversas configurações a
partir de uma configuração base ilustrada na Figura 2.4.

Figura 2.4. Os três estados de jogo principais do Gamestorming num jogo (Gray et al. 2010, 12).14

Estes jogos são perpassados por três estados principais: ABERTURA das mentes dos
jogadores numa configuração de jogo e a explosão de ideias e oportunidades de forma
divergente; EXPLORAÇÃO das ideias que começam a fluir, trata-se de criar as condições
que permitam a serendipidade, a emergência de coisas inesperadas e fantásticas. O
FECHO é o ato convergente final, reduz-se o campo para selecionar o que é mais
promissor para o passo seguinte. Por fim, Gray, Brown e Macanufo compilaram 10
técnicas essenciais que permitem trabalhar a maior parte destes desafios (2010): 142

1) A Abertura e Fecho é um ponto de partida e um objetivo para a ideação;


2) A Ignição é o que despoleta a ideação;
3) Os Artefactos são materiais físicos ou digitais que transportam e permitem

141 T.A. Successive approximation

142 T.A. dos termos de Gray et al., que identificam as fases de Gamestorming: Opening and Closing, Fire starting, Artifacts, Node
Generation, Meaningful Space, Sketching and Modelmaking, Randomness Reversal and Reframing, Improvisation, Selection, Try
Something New (Gray et al. 2010).

70
rastrear informação;
4) A Geração de Nós é o posicionamento de um conjunto de elementos dentro de um
quadro de referência, e.g. post-its, para gerar múltiplas ideias;
5) O Espaço Relevante trata-se do território com regras para relacionar as partes
anteriores para conferir significado ao jogo, e.g. as peças e o tabuleiro de xadrez;
6) O Esquiçar e o Modelar são desenhos rápidos ou a forma inicial das ideias;
7) A Aleatoriedade, a Reversão e o Reenquadramento permite interromper a maneira
natural de ver algo para reordenar informação, revelar novos padrões e obter
novas visões;
8) O Improvisar é fazer à medida que a atividade se desenrola com os materiais e
recursos disponíveis sem seguir um plano;
9) A Seleção é hierarquizar ideias, reduzir o seu âmbito segundo critérios pois não
é possível perseguir tudo;
10) O Tentar Algo Novo pode ser importante, pois não se pode conceber novidades
sem falhar e correr riscos.

Em suma, este método demonstra como o ato de desenhar e jogar os jogos concebidos
para afetar o mundo atual podem melhorar a criatividade. Isto porque os jogos
desenhados estão ancorados a teorias da criatividade, como o PD de “quantas mais
possibilidades melhor”, em complemento de mecanismos de avaliação e fecho
adequados. Ainda, estes jogos são versáteis para gerar atos e conceitos criativos
originais desde o início do seu emprego.

2.3.8. Discussão

Os métodos anteriores mostram que meios para avaliar resultados integrados em


processos criativos, como Gamestorming (Gray et al. 2010), são fundamentais em jogos
para evitar ciclos viciosos, algo que pode deter Improvisação (Nachmanovitch, 1990), ou
auxiliar a triar ideias com valor no método Synectics (Gordon, 1961). Mais, ensinar a
tornar-se criativo, segundo o modelo AUTA, passa pela consciencialização sobre a
natureza e importância da criatividade, do entendimento sobre o que são pessoas
criativas, e da prática das técnicas para lá chegar, i.e é um propósito se estende ao longo
de toda a vida (Davis 1982). Segundo Joseph Hartnett, O Pensamento Lateral (PL) de de
Bono (1977), não é uma construção teórica ou conceito novo, mas uma forma de
parafrasear o PD (2014). Isto porque, segundo Frank Barron e David M. Harrington
(1981), a noção de PD existe desde 1900 com outras designações, e até antes de acordo
com Binet e Henri (1895). Na nossa opinião, o mérito de de Bono é a sistematização das
técnicas para praticar o PL, como o uso de analogias (1977), de curriculum pedagógicos

71
como o CoRT (2009) e do método complementar dos Seis Chapéus do Pensamento (1985).

Assim, consideramos que esta sistematização oferece uma visão holística de princípios
comuns a métodos para ensinar a tornar-se criativo. Podemos ainda encarar esta
sistematização como um índice para saber navegar em direção a este propósito. O
Gamestorming (Gray et al. 2010) pode ser dado como um exemplo de confluência de
teoria, métodos e técnicas congéneres às descritas anteriormente. Isto porque os jogos
de Gamestorming, tendencialmente abrem-se à conceção, avaliação e execução livre de
várias possibilidades para pensar criativamente e ensinar a ser-se criativo.

Com isto em mente, o processo criativo pode incidir na geração de diversas ideias, mas
deve possuir mecanismos apropriados para evitar ficar preso nelas. Isto é o que os
processos criativos comungam com os videojogos, a geração de várias possibilidades de
ação por jogadores no âmbito do seu design, avaliadas pelos seus sistemas. Como os
videojogos assentam em sistemas de computação, podem ajudar a reconhecer ideias
para ações criativas com um dado objetivo (Boden 2004). Em vista disto, pensamos que
os videojogos podem ser boas práticas para tornar-se criativo, e instrumentos para
avaliar a criatividade, sendo este o assunto que aprofundamos na secção seguinte.

2.4. Instrumentos para Avaliar Criatividade


A incerteza sobre os componentes-chave para a criatividade resulta em diversas
definições, conceitos e instrumentos para a avaliar, 143 que também são apontados a
necessidades criativas específicas (Feldhusen e Goh 1995).144 O predomínio de métodos
psicométricos para avaliar a criatividade decorre da disciplina (psicologia) que primeiro
estudou o fenómeno, incidindo em quatro categorias principais: Processos Criativos, A
Pessoa Criativa, Produtos Criativos e Ambientes Criativos (Plucker et al. 2019). Portanto, nas
subsecções seguintes iremos debruçar-nos sobre testes individuais de acordo com estas
categorias.

2.4.1. Os Processos Criativos

Os Processos Criativos, incluem a geração da ideia, o seu desenvolvimento, implemen-


tação e demonstração a outros que o seu resultado é funcional e relevante (Ribeiro

143 Instrumentos para avaliar a criatividade podem ser categorizados em: tipologias de teste, componentes medidos ou questões
intrínsecas ao teste. As tipologias de testes subdividem-se em: relatórios pessoais, inventários sobre a personalidade, ou o contexto
do seu uso. Os componentes medidos pelos relatórios são fatores como intuição, capacidade de explorar, gerar e avaliar ideias, ou
medir caraterísticas pessoais. As perguntas usadas nos inventários, por sua vez, podem ser sobre graus de criatividade pessoal,
caraterísticas, talento ou estilo, i.e. atitudes identificadas como criativas (Barbot 2011). Os fatores anteriores podem ser
combinados para desenvolver instrumentos com um âmbito de uso mais diverso, enriquecido e robusto.

144 A ausência de uma base teórica consensual sobre criatividade para conceber estes instrumentos reflete-se na diminuição da sua
capacidade de avaliar. Contudo, é aceite que a definição de criatividade envolve a combinação de múltiplos aspetos centrais,
desde o processamento de informação até traços de personalidade, motivação e influências emocionais, ou seja, a receita é sempre
variável e resulta num produto único (Barbot 2011).

72
2018).145 É frequente os processos criativos serem avaliados com Testes de Pensamento
Divergente (TdPD).146 Estes são tradicionalmente estruturados para estimular fluência
para gerar respostas em quantidade, flexibilidade para gerar facetas singulares sobre
ideias, originalidade para criar ideias únicas, e elaboração para descrever as ideias em
detalhe (Plucker et al. 2019).147

Existem muitos testes deste género, alguns sem esta nomenclatura, mas partilhando
as suas caraterísticas, como a Invenção de Frases e Manchas de Tinta revistos por Alfred
Henri e Victor Binet (1985). Contudo, os mais usados são as Baterias de testes do
Pensamento Divergente, como os de Guilford (1956)148 que emergem de aspetos da
Estrutura do Intelecto (EdI) 149 do mesmo autor, ou os Testes de Pensamento Criativo de
Torrence (Torrence 1976).150 Os testes mencionados anteriormente são ainda usados
devido ao seu contínuo refinamento e porque são referências para novas práticas de
avaliação (Plucker et al. 2019).

Contudo, o campo da avaliação da criatividade tem evoluído para incluir a quantidade


e a qualidade das variáveis resultantes de TdPD. Para tal contribui o conceito de
Quociente Criativo (QC) de Snyder et al. (2004), que relaciona a fluência e flexibilidade
do PD com a qualidade das respostas dos participantes (Plucker et al. 2019). Estudos
envolvendo o quociente criativo também demonstram que caraterísticas criativas
emergem do exercício, experiências criativas que tirem proveito da fantasia, sonho
acordado e devaneios. Ainda, a realização criativa está relacionada à experiência de
fazer associações em campos de trabalho criativo e o domínio de tarefas criativas (Lucas
et al. 2013).151

Em suma, os TdPD detêm quase a totalidade das atenções na investigação do processo

145 A crença de uma aprendizagem mais criativa baseia-se na replicação em aula de atividades ligadas a processos criativos usados no
mundo real, e.g., por cientistas (Sawyer 2015).

146 Ainda assim, não há consenso de que os TPD consigam prever o comportamento criativo, seja porque não refletem visões mais
contemporâneas de criatividade, ou porque as suas condições de administração, respetivo treino ou cálculos envolvidos podem
afetar suas pontuações. Além disso, o PD é apenas um aspeto dos processos criativos que se tornou predominante, levando à noção
de que a geração de ideias é mais importante do que a resolução de problemas.

147 T.A.: Divergent Thinking Tests, cujos fatores avaliados são: fluency, flexibility originality and elaboration.

148 T. A.: Divergent Thinking Batteries. Estes testes avaliam os fatores cognitivos para fazer descobertas e consistem em subtestes
verbais e figurativos. Estes subtestes têm como objetivo estimular a geração divergente de ideias em várias áreas, como a
semântica, ou classificar e detalhar figuras em grupos ou individualmente. Outros exemplos destes testes incluem Milgram (1990)
e Wallach and Kogan (1965). A palavra “Baterias” é usada dado que cada teste é um conjunto de tarefas e não uma só (Runco et
al. 2016).

149 T.A.: The Structure of the intellect (Guilford 1950).

150 T.A.: “Tests de Pensée Créative de Torrance” (Torrence 1976).

151 Os resultados do estudo de Lucas et al. mostram que cada ano de treino numa escola de design influencia positivamente o QC,
sugerindo que a criatividade avaliada pela tarefa de PD está sujeita a um treino orientado, pelo que a criatividade, não é uma
característica completamente estável. Além disso, a experiência criativa e a realização criativa tiveram uma associação positiva
com todas as medidas alternativas do QC (Lucas et al. 2013).

73
criativo. Embora a capacidade de gerar ideias seja um dos aspetos do processo criativo,
a sua predominância acaba por relegar o papel da criatividade na resolução de
problemas. Uma tendência que começa a desaparecer com uma preocupação com
qualidade, como na linha de investigação do QC que incide na qualidade de respostas
dos indivíduos (Plucker et al. 2019).

2.4.2. A Pessoa Criativa

Segundo Dennis Hocevar, avaliar a criatividade da Pessoa Criativa passa por perguntar-
lhe algo sobre as suas caraterísticas, atividades e realizações criativas usando auto-
relatos (1981). Para James C. Kaufman a avaliação criativa passa pela Autoavaliação da
Criatividade (AAC), autoreportar atitudes criativas do passado como indicador para
ocorrerem novamente e revelar algo sobre o processo criativo (2019). Já Gregory J. Feist
investigou personalidade e criatividade como um grupo, comparando caraterísticas de
artistas com de não artistas:

Pessoas criativas são mais autónomas, introvertidas, abertas a novas experiências, duvidam
das normas, confiam em si mesmas, aceitam-se a si mesmas, são motivadas, ambiciosas,
dominantes, hostis e impulsivas. Destes, as maiores influências estão na abertura,
consciencialização, autoaceitação, hostilidade e impulsividade. No entanto, as pessoas criativas
na arte e na ciência não partilham completamente os mesmos perfis de personalidade únicos:
os artistas distinguem-se mais pela sua instabilidade emocional, frieza e rejeição das normas
do grupo do que os cientistas. (Feist 1998, 299)152

Segundo Plucker et al. a criatividade depende de aptidões individuais com potencial


para estimular o comportamento criativo. As aptidões internas são intrínsecas ao
indivíduo, já as externas dependem de influências como o ambiente, e ambas podem
estimular ou minar a criatividade. Contudo, as aptidões por si só não garantem atos
criativos, pois estes dependem também da motivação e do temperamento pessoal.153
Assim, tendo em mente estas variáveis, para limitar a nossa revisão, optamos pelas
conclusões da revisão de Plucker et al., que subdivide instrumentos em três categorias
para avaliar a pessoa criativa: Escalas de Personalidade, Listas para Verificar
Atividades, e Atitudes em Relação à Criatividade (2019).

152 T.A.: “Creative people are more autonomous, introverted, open to new experiences, norm-doubting, self-confident, self-accepting,
driven, ambitious, dominant, hostile, and impulsive. Out of these, the largest effect sizes are on openness, conscientiousness, self-
acceptance, hostility, and impulsivity. Yet, creative people in art and science do not completely share the same unique personality
profiles: Artists are distinguished more by their emotional instability, coldness, and their rejecting group norms than are scientists.”
(Feist 1998, 299).

153 As aptidões ou caraterísticas pessoais são fatores de grande influência para a criatividade, por isso são frequentemente integradas
em testes baseados na EdI. Estas competências são: Sensibilidade para identificar problemas, a facilidade de mudar a nossa
perspetiva para descobrir problemas num assunto; Fluência para gerar muitas ideias; capacidade para conceber Ideias Inovadoras,
respostas incomuns ou associações inesperadas; a Flexibilidade para mudar a própria maneira de pensar; Síntese para relacionar
ideias em padrões e organizar estes em estruturas simbólicas; Reorganizar e redefinir, transformar informações em estruturas de
conhecimento, e Complexidade para desenvolver estruturas concetuais intrincadas (Guilford 1950).T.A. dos termos usados por
Guilford para identificar fatores de pensamento criativo: Sensitivity to problems, Fluency, Novel ideas, Flexibility, Synthesizing
ability, Analyzing ability, Reorganization or redefinition and Complexity.

74
As Escalas de Personalidade154 são categorias de testes que procuram estudar cara-
terísticas comuns aos indivíduos criativos e que possam ser correlacionadas com outros
indivíduos para prever os comportamentos criativos destes. A importância deste tipo
de teste reside na inteligência, que permite agarrar novas oportunidades e enfrentar
novas preocupações ao permitir explorar opções para improvisar além dos caminhos
conhecidos. Sequências de pensamentos e processos internos que levam a soluções
improvisadas ou descobertas raramente são reproduzíveis ou previsíveis porque é
comum não se estar atento a estes pensamentos e processos (Plucker et al. 2019).
Portanto, estar consciente do que está a acontecer na nossa mente pode ajudar a
perceber o que é necessário para desenvolver coisas novas (Ryle 1976).

A Avaliação da Criatividade Potencial (Barbot 2011)155 é uma bateria de testes modulares e


multifacetados, orientada para ser usada em contextos específicos e destilar perfis
pessoais com potencial criativo. Permite a educadores e investigadores capturar o
potencial criativo de crianças, analisando o seu pensamento exploratório-divergente e
integrativo-convergente.156 Ambos os processos de pensamento exploram combinações
de fatores tradicionais e caraterísticas pessoais para desenvolver produtos ou soluções
novas.

Os Inventários de Grupo para Descobrir Interesses (IGDI) I e II (Davis e Rimm 1982),157 em


que o IGDI I é dirigido aos estudantes do ensino básico, e o IGDI I aos estudantes do
ensino médio usam formulários com sessenta itens avaliados numa uma escala de cinco
valores: Não, Até um Pequeno Grau, Mediano, Acima da Média, Definitivamente.158 Os IGDI I
e II são usados em conjunto com o Inventários de Grupo para Descobrir Talento Criativo
(IGDTC) de Sylvia Rimm (1980).159 A avaliação envolve tarefas de escrita, desenho e o
IGDTC, de forma individual para cada aluno e combinando-se os resultados das três
tarefas, sendo feita por professores e avaliadores treinados. A relevância do IGDI I e II
e IGDTC, assenta na robustez dos resultados para encontrar potencial criativo pessoal,
podendo ser aplicado a estudantes em níveis de ensino diferentes, independentemente

154 T.A.: Personality Scales.

155 T.A.: Evaluation of Potential Creativity.

156 O modo de pensamento exploratório-divergente (T.A.: divergent-exploratory), serve para expandir o âmbito de soluções criativas
na resolução de problemas, o pensamento integrativo-convergente (T.A.: convergent-integrated), para combinar elementos de
novas formas.

157 T.A.: “[The] Group Inventory For Finding Interests I, was designed for the middle/junior high school level, grades 6 through 9.
[The] Group Inventory for Finding Interests II was created for high school students in grades 9 through 12.” (Davis e Rimm 1982,
50).

158 T.A. dos níveis da escala: “No, To a Small Extent, Average, More than Average, and Definitely.”

159 T.A.: Group Inventory for Finding Creative Talent. É eficaz a identificar crianças criativas no ensino elementar, em populações
com dificuldades em aprender, com baixo estatuto socioeconómico, minorias, ou dotadas intelectualmente (Davis e Rimm 1982).

75
da sua faixa socioeconómica, étnica e cultural.

As Listas para Verificar Atividades160 consistem em auto-relatos biográficos ou


inventários de atividades sobre comportamentos criativos individuais para verificar a
propensão para estes. Distinguem-se por usar perguntas diretas para identificar
pessoas criativas, em vez de usar aspetos assumidamente correlacionáveis com a
criatividade (Hocevar 1981).

O Inventário do Comportamento Criativo de Hocevar (1979)161 é composto por formulários


com noventa itens. Os seus testes revelam alguma robustez, e é reconhecido que seriam
necessárias modificações para acomodar-se a populações diferentes, mas o seu método
no geral é aplicável a uma grande diversidade de situações.

O Questionário da Realização Criativa (Carson et al. 2011)162 avalia a criatividade de quem


responde em que medida é que itens estabelecidos descrevem as suas realizações
criativas em áreas específicas. O teste assenta no seguinte: 1) identificar domínios
específicos de realização e servir de indicador desta em vários domínios; 2) servir como
indicador de treino em domínios de realização criativa; 3) a validação é feita por um
grupo de especialistas; 4) quanto maior o grupo de especialistas maior o nível de reali-
zação; 5) Os poucos indivíduos que atingem altos níveis de realização são mais recon-
hecidos. Por fim, os resultados do estudo com o teste demonstram que este é fiável.

A Escala de Comportamento de Ideação de Runco (Runco et al. 2001)163 foi desenvolvida para
encontrar um critério para avaliar e prever atos criativos com TPD. Runco considerou
que a ideação seria o critério mais apropriado, usar apreciar e a aptidão para gerar
ideias. O teste parece ser fiável para ser usado com grupos e indivíduos, contudo a sua
estruturação não está totalmente validada.

A Escala Kaufman de Domínios de Criatividade (Kaufman 2012; 2019)164 consiste num


formulário de autorelato com cinquenta itens que medem a criatividade em cinco
grandes domínios: Pessoal e Quotidiano, Escolar, Desempenho, Mecânico, Científico e
Artístico.165 Os participantes classificam-se a si próprios numa escala Likert de 1 (muito

160 T.A.: Activity Checklists.

161 T.A.: Creative Behavior Inventory.

162 T.A.: Creativity Achievement Questionnaire.

163 T.A.: Runco’s Ideational Behavior Scale.

164 T.A.: The Kaufman Domains of Creativity Scale.

165 T.A. dos domínios do teste: “Self / Everyday, Scholarly, Performance (involving writing and music), Mechanical / Scientific and
Artistic”.

76
menos criativo) a 5 (muito mais criativo) em relação a comportamentos criativos. O
teste está associado a fiabilidade e consistência interna e re-teste aceitáveis, contudo a
sua administração pode não ser logisticamente viável com todos os grupos, como
crianças. Um estudo recente por McKay et al. (2017) revela que a criatividade auto-
relatada deste instrumento relaciona-se com realização criativa nos seus domínios, de
forma similar ao Questionário de Realização Criativa de Carson et al. (2011).

As Atitudes em Relação à Criatividade166 medem a tendência pessoal, para inovar,


adaptar e atrair outros a participarem em empreendimentos criativos, e autoeficácia, a
crença pessoal de que se tem o que é preciso para agir criativamente. No âmbito das
atitudes, o que pode ser mais eficaz para motivar atos criativos é discutível, podendo
dever-se a: interesses ou preferências intrínsecas, ou recompensas ou tarefas
extrínsecas (Johansson 2006; Ribeiro 2018). Segundo Csíkszentmihály (2007), a
criatividade floresce idealmente num clima de serenidade, mas também pode ocorrer
em condições de risco de vida ou de prisão, portanto, pode ser impulsionada tanto por
motivação intrínseca como extrínseca. No entanto, é consensual que as pessoas
criativas, independentemente do seu domínio de trabalho, tornam as tarefas em algo
intrinsecamente recompensador ao as executarem de certa forma.

Por isso, a motivação intrínseca pode sustentar empreendimentos criativos, auxiliar a


adaptarmo-nos a situações desequilibradas e assimilar as existentes (Piaget 1976). A
motivação para ser criativo também é influenciada pela educação, pois as crianças
crescem interagindo com sua família, o que por sua vez depende de valores culturais
(Runco 2014).

As Atitudes e Valores Criativos (Runco et al. 2017) é uma escala para medir a atitude dos
estudantes do ensino médio em relação ao PD. É constituído por dez itens, cada um
com cinco respostas possíveis, desde Nunca a Sempre.167Cada um dos itens foi
identificado através de revisões de literatura sobre atitudes e valores enquanto
influências na criatividade. O teste parece ser fiável tendo sido encontradas relações
entre atitudes e valores dos estudantes com PD.

Ambas de Maciej Karwowski (2014), A Escala das Formas Criativas de Pensar (EFCP), avalia
a crença dos participantes sobre o carácter estável VS maleável da natureza da
criatividade, e A Escala Reduzida do “Eu“ Criativo (EREC), a perceção do indivíduo sobre a
sua autoeficácia e identidade criativa.168 A EFCP é constituída por dez itens e a EREC por

166 T.A.: Attitudes.

167 T.A. dos níveis de avaliação e respetiva pontuação: “Never (0), Rarely (1), Sometimes (2), Mostly (3), and Always (4)”.

168 T.A. respetivamente: the Creative Mindset Scale e The Creative Mindset Scale.

77
onze itens, ambas os materiais foram respondidos online e medidos com recurso a uma
escala de cinco pontos num âmbito entre definitivamente não, e definitivamente sim. A
EFCP e a EREC foram relacionadas em três momentos num estudo cujos resultados
apresentam evidências de confiabilidade. Ainda, o estudo clarifica que as mentalidades
criativas fixas VS maleáveis possuem um potencial e papel importante na motivação
para atuar criativamente (2014).

Em suma, a atuação criativa das pessoas propulsionada por processos, personalidade e


atitudes é algo já indiciado pela Infraestrutura dos Quatro P (Rhodes 1961) e pela Infraes-
trutura dos Cinco A da Criatividade (Glǎveanu 2013), ambas revistas na secção 1.3. As
escalas anteriores e estas construções teóricas apontam para a importância da realiza-
ção, de artefactos ou produtos criativos, cuja avaliação é o tema da subsecção seguinte.

2.4.3. Os Produtos Criativos

A avaliação de produtos criativos, segundo Plucker et al. (2019), é uma capacidade


crucial para empresas, pois avaliar as facetas criativas do design de um produto pode
traduzir-se em lucro, e evitar alocar recursos a designs pouco criativos. A avaliação de
produtos criativos é, segundo Baer et al. (2004), a avaliação mais apropriada da
criatividade, sendo apontada por vários investigadores como o padrão de ouro desta,
ou nos termos de Plucker et al. (2019):

Esta lógica é convincente: Se um dos objetivos da criatividade psicométrica é prever quem é


mais propenso a produzir obras criativas no futuro, ser capaz de criar tais produtos no passado
ou no presente é um indicador chave. (Plucker et al. 2019, 54)169

A Escala Semântica do Produto Criativo de e Basemer e O’Quin (1981; 1986)170 visa dar uma
apreciação global sobre um produto, sem responder aos porquês de um ser avaliado
como mais funcional ou surpreendente que o outro. Em complemento de outras
técnicas parece ter potencial para verificar a criatividade dos programas de marketing,
prever as intenções de compra dos consumidores e ajudar equipas de desenvolvimento
a melhorar e apresentar produtos. Na continuação do estudo deste instrumento, O’Quin
e Basemer (2006), concluíram que as respostas permitem considerar dimensões dos
produtos que seriam relegadas não intencionalmente e que podem contribuir para a
criatividade do produto no seu todo. Mais, o teste pode evitar eliminar precocemente

169 T.A.:” This logic is compelling: If one goal of creativity psychometrics is to predict who is most likely to produce creative works in
the future, being able to create such products in the past or present is a key indicator.” (Plucker et al. 2019, 54). Ou seja, para
avaliar produtos criativos ou para medir realizações criativas na vida atual são usados indicadores criativos, e.g. relatórios de
comportamento criativo no passado indicam uma propensão para a continuidade deste no futuro (Feldhusen e Goh 1995) o que se
reflete de maneira similar na propensão de criar produtos criativos.

170 T.A.: The Creative Product Semantic Scale (Basemer e O'Quin 2006), classifica nove subescalas para produtos criativos:
Surpreendente (Surprizing), Original, Lógico (Logical), Útil (Useful), Valioso (Valuable), Inteligível (Understandable), Orgânico
(Organic), Bem feito (Well-done) e elegante (Elegant).

78
produtos com potencial criativo, ou auxiliar a encontrar uma ideia para um produto
minimamente viável (2006).

O Formulário de Avaliação de Produto do Aluno171 de Renzulli et al. (2003) avalia de forma


qualitativa opiniões, histórico, experiência e o acompanhamento do desenvolvimento
de produtos para revelar a evolução do aluno em currículos pedagógicos enrique-
cedores. O formulário é composto por quinze itens destinados a avaliar os aspetos
criativos do aluno e a qualidade criativa dos seus produtos. Pode ainda ser usado por
diversas pessoas e contextos, como professores, especialistas ou secções de recursos
humanos. São considerados três princípios centrais no seu uso (Renzulli et al.2003):

• Quem avalia deve aprender a confiar em julgamento assente em valores e


opiniões subjetivas e caraterísticas de qualidade, estética, utilidade e função
para avaliar produtos complexos;
• O valor individual de um produto é diferente pois resulta da idade e nível do
estudante, dos contextos desvantajosos do qual sejam oriundos, experiências
educativas, oportunidades e acesso a recursos;
• O instrumento deve ser usado para guiar estudantes em direção ao seu
crescimento e empoderamento. Como tal deve servir para discutir o
planeamento inicial de um projeto, e para que os estudantes entendam as bases
sobre as quais serão avaliados.
A Técnica de Avaliação Consensual (Amabile 1982)172 avalia os níveis de criatividade em
produtos em domínios específicos (Kaufman 2019), como qualidades técnicas ou
estéticas. A técnica assenta no pressuposto de que é possível avaliar a criatividade de
um produto de forma fiável e consensual por um painel de especialistas. Para tal é
solicitado a estes juízes pontuar individualmente vários produtos resultantes da mesma
tarefa através de uma escala de Likert,173 entre “1 – nada criativo”, a “7– extremamente
criativo”. As pontuações dadas por cada juiz contribuem para a convergência de uma
mesma qualidade subjetiva numa avaliação (Barbot 2011).

171 T.A.: The Student Product Assessment Form. Mais informações podem ser obtidas no site do Renzulli Center for Creativity, Gifted
Education and Talent Development, acedido a 31 de dezembro de 2020 em: https://gifted.uconn.edu/schoolwide-enrichment-
model/spaftext/#

172 T.A.: Consensual Assessment Technique. O seu uso pode ser impraticável em contextos de tempo limitado, pois decidir sobre
tarefas e ter acesso a juízes para proceder a avaliação e análise pode levar muito tempo.

173 A escala de Likert (Likert 1932) é a escala psicométrica mais frequentemente usada para avaliar investigação sustentada em
questionários.

79
O Modelo Tridimensional da Criatividade do Produto (Horn e Salvendy 2009)174 assenta em
dimensões que surgiram questionando critérios de design usados para identificar
produtos criativos. O modelo avalia três dimensões centrais: Influência, Importância e
Novidade do produto, e subdivide-se ainda em quatorze subdimensões, como ilustrado
na tabela 2.3.175

Tabela 2.3. Dimensões do Modelo Tridimensional da Criatividade do Produto (Horn e Salvendy


2009, 234)3

Dimensões da Criatividade do Produto Itens de Medição da Criatividade do Produto

Influência • Estimulado-Irritado;
• Satisfeito-Insatisfeito;
• Encantado-Horrorizado;
• Apelado-Revolto;
• Atraente-Não Atraente;
• Favorável-Desfavorável;
• Atraente-Desagradável;
• Desejável-Indesejável;
• Ideal-Inadequado.

Importância • Relevante-Irrelevante;
• Importante-Não Importante;
• Crucial-Insignificante.

Novidade • Não Frequente-Frequente;


• Raro-Padrão

Os resultados do estudo deste teste revelam que é válido e robusto, permitindo inclusive
investigar outras variáveis que influenciam produtos criativos, e.g. factores do
ambiente. Por fim, os designers beneficiam do entendimento sobre as dimensões
identificadas para as incorporar como qualidades no desenvolvimento de produtos de
consumo atraentes.

Em suma, Pessoa, Processo e Produto são variáveis que são reciprocadas quando se trata
de avaliar e desenvolver um produto criativo. Estas variáveis sugerem outra de carácter
externo, que as envolve e influencia: o ambiente. O ambiente é uma variável-chave
refletida no MSC de Csíkszentmihály (1998), na Infraestrutura dos Quatro P (Rhodes 1961)
e na Infraestrutura dos Cinco A da Criatividade (Glǎveanu 2013), todas revistas na secção
1.3. Assim, de seguida debruçamo-nos sobre instrumentos para avaliar o papel do
ambiente na criatividade.

174 T.A.: The Three-dimensional model (Affect, Importance, and Novelty). O desenvolvimento deste modelo passou por vários estágios,
sendo inicialmente baseado num estudo anterior de Besemer e Treffinger (1981) que levou à Matriz de Análise de Produto de
Criatividade (T.A. Creative product Analysis Matrix), que avalia Novidade (originalidade), Resolução (a finalidade pretendida),
Síntese e Elaboração (a preferência por um estilo ou estética criativa específica). Este último instrumento levanta ainda questões
sobre como os produtos são julgados, pois a novidade e o estilo de um produto são mais fáceis de determinar do que sua resolução
(Horn e Salvendy 2009; Plucker et al. 2019).

175 A tabela original (Horn e Salvendy 2009, 234) é apresentada no anexo B.

80
2.4.4. Os Ambientes Criativos

A criatividade, segundo Silvia et al. (2017), ocorre nas práticas quotidianas em diversos
contextos sistemáticos no mundo atual.176 Sistemáticos porque refletem em grande
parte a influência das pessoas, e.g. um espaço de trabalho reflete as personalidades das
pessoas que lá trabalham. Portanto, é avaliando repetidamente este quotidiano das
pessoas que se pode revelar que aspetos do seu ambiente influenciam o que pensam e
fazem. Ainda, António Ribeiro (2018) diz que a criatividade não ocorre num vazio, sendo
fundamentais “as relações do indivíduo em desenvolvimento com os seus contextos de
vida, sobretudo na família, mas também fora dela” (Ribeiro 2018, 122).

O KEYS: Avaliação do Clima para a Criatividade (Amabile et al. 1996),177 é um auto-relato


concebido para analisar a perceção de colaboradores sobre aspetos do seu ambiente de
trabalho que podem influenciar o trabalho criativo especialmente em equipa. Este
instrumento está ainda associado a evidências de fiabilidade e validade e é amplamente
utilizado na investigação sobre trabalho criativo (Amabile et al. 1996; Plucker et al.
2019; Mathisen e Einarsen 2004). Os resultados do seu uso demonstram um potencial
de aplicação amplo nas organizações, podendo servir para diagnosticar o grau de
promoção de criatividade e a melhoria do ambiente criativo nas organizações. A
evidência mais importante para gestores é que como o ambiente de trabalho é
percecionado numa empresa influencia o seu nível de criatividade. Assim, a promoção
da criatividade organizacional passa não só pelo recrutamento de indivíduos com
aptidões e caraterísticas criativas, mas também em criar os ambientes adequados a
estes indivíduos (Amabile et al. 1996).

Pesquisas anteriores sobre as influências sociais-ambientais nas organizações revelaram


aspetos do ambiente de trabalho ao nível da organização, da gestão de projetos e do próprio
grupo de trabalho. Embora as influências nas perceções do ambiente de trabalho possam surgir
a vários níveis diferentes dentro de uma organização, KEYS e o seu modelo teórico focam-se
na perceção dos indivíduos e na influência dessas perceções sobre a criatividade do seu
trabalho. O pressuposto é que as respostas de auto relatório sobre um questionário de ambiente
de trabalho revelam a perceção dos inquiridos – o significado psicológico que os inquiridos
atribuem aos eventos nas suas organizações, nas suas unidades organizacionais e nos seus
grupos de trabalho. Assim, o nível a que a fonte de influência opera é menos importante do

176 As evidências apontam para a criatividade não ser uma aptidão universal, razão pela qual os testes para a avaliar em ambientes
criativos são estruturados dentro de um âmbito de aspetos em domínios específicos. Contudo também apontam que todos os
esforços criativos podem ser relacionados a três domínios temáticos genéricos: 1) criatividade em empatia e comunicação, ou seja,
interpessoal relacionamento, comunicação, resolução de problemas pessoais ou escrita; 2) Criatividade "prática", em arte,
artesanato, corporal ou física; 3) Criatividade em matemática e ciências (Baer e Kaufman 2005).

177 T.A.: KEYS: Assessing the Climate for Creativity.

81
que as próprias perceções e a sua relação com a criatividade. (Amabile et al. 1996, 1157)178

O Levantamento Anónimo sobre o Ambiente de Trabalho desenvolvido por Forbes e Domm


(2004),179 destina-se a avaliar a capacidade dos ambientes em fomentar o sucesso de
projetos criativos através da perceção dos trabalhadores.180 Para tal, foi solicitado aos
participantes avaliar a importância de itens em relação a um trabalho criativo que
levaram a cabo com sucesso. Os itens são os seguintes: envolvimento mental, motivação
intrínseca, restrições de tempo e recursos, motivação extrínseca, controlo externo, gestão de
equipas, criatividade e produtividade.181 Os resultados apontam para as seguintes
dimensões-chave para gerar um ambiente de trabalho favorável à criatividade e
produtividade:182

• Desafio, dado que especialistas prosperam em tarefas alinhadas com as suas


capacidades;
• Liberdade e Propriedade, permitir a trabalhadores o controlo da operação do seu
trabalho;
• Relevância de fundo, convencer os trabalhadores que os resultados do seu
trabalho são importantes para o sucesso da empresa e do seu percurso
profissional individual;
• Escolher e Recrutar as Pessoas Certas, pois os trabalhadores devem estar à altura
dos projetos, assumir um compromisso com estes, e estar intrinsecamente
motivados.

A lista anterior resume os requisitos para um ambiente de trabalho criativo, que embora
possa levar a resultados positivos também fomenta um envolvimento viciante. Este
envolvimento deve ser equilibrado para deixar energia para outras esferas da vida. Isto
porque a medida para ser bem-sucedido pode não assentar na profissão. como nos diz

178 T.A.: “Previous creativity research on social-environmental influences in organizations has uncovered aspects of the work
environment at the level of the organization, the level of project management, and the level of the work group itself. Although
influences on work environment perceptions can arise at several different levels within an organization, KEYS and the model
underlying it focus on individuals' perceptions and the influence of those perceptions on the creativity of their work. The underlying
assumption is that self-report responses on a work environment questionnaire reveal respondents' perceptions—the psychological
meaning that respondents attach to events in their organizations, their organizational units, and their work groups. Thus, the level
at which the source of influence operates is less important than the perceptions themselves and their relation to creativity.”
(Amabile et al. 1996, 1157).

179 Este teste baseia-se na investigação sobre Criatividade Organizacional de Amabile et al. (1996) e no conceito de Fluxo de
Csikszentmihalyi (1997), cuja característica de envolvimento mental é central para o aspeto de motivação intrínseca da avaliação.

180 A amostra de participantes neste teste é constituída por cento e cinquenta e oito engenheiros e cientistas, em grande parte
empregados de grandes empresas internacionais que investem em investigação e desenvolvimento.

181 T.A.:”Six factors emerged from the data: mental involvement, intrinsic motivation, time and resource constraints, extrinsic
motivation, external control, and team management.” (Forbes and Domm 2004, 8).

182 T.A.:“Challenge, Freedom and Ownership, Bottom-line Relevance, Pick the Right People and Get Them to Sign-on” (Forbes e Domm
2004, 11).

82
Csikszentmihalyi (1997):

Independentemente da satisfação, o trabalho por si só pode não tornar uma vida completa. A
maioria dos indivíduos criativos que entrevistamos disse que as suas famílias eram mais
importantes para eles do que suas carreiras - embora seus hábitos reais muitas vezes
desmintam estes sentimentos. Quando questionados sobre quais as realizações na vida de
que mais se orgulhavam, uma das respostas mais típicas ecoou na do físico Freeman Dyson:
"Suponho que seja apenas ter criado seis filhos, e pelo que pude ver até agora, todos como
pessoas interessantes.” (Csikszentmihalyi 1997, 62)183

O Inventário de Ambiente de Equipa (IAE)184 é um teste explicitamente orientado para


avaliar o ambiente de trabalho ao nível das equipas. Existem várias versões, sendo que
a versão com trinta e oito itens é a mais usada e fácil de administrar. De seguida
apresentamos as dimensões centrais tratadas pelo teste (Anderson e West, 1996):185

• Visão, o nível de clareza na definição, partilha e valorização dos objetivos e


visões da equipa. Esta dimensão divide-se na Clareza das Subescalas, no Carácter
Visionário, na Obtenção e Partilha;
• Segurança na participação da equipa, o nível de participação da equipa nos
processos de tomada de decisão, e se ambiente é visto como interpessoal e não
ameaçador para que seja seguro apresentar ideias novas e formas melhores de
fazer as coisas. Esta dimensão está dividida na subescala de Partilha de
Informação, Segurança, Influência e Frequência de interação;
• Orientação da tarefa, preocupação da equipa sobre a excelência do desempenho
da tarefa quando comparada com a visão partilhada, ou com resultados de
avaliações, modificações, sistemas de controlo e avaliações críticas. Esta
dimensão divide-se na subescala Excelência, Avaliação e Ideia.
• Apoio à inovação, expectativas, aprovação e apoio prático às tentativas de
introduzir formas novas ou melhores de fazer as coisas no ambiente de
trabalho. A dimensão consiste no apoio articulado das Expectativas e Aprovação e
Apoio Facultado.

Os resultados indicam que este teste possui uma estrutura e fiabilidade aceitáveis.
Ainda, segundo a Mathisen e Einarsen (2004) o IEA pode ainda ser usado para edificar
equipas, portanto é adequado tanto para uso prático como comercial.

183 T.A: “No matter how satisfying, work alone cannot make a life complete. Most creative individuals we interviewed said that their
families were more important: to them than their careers - even though their actual habits ... often belied these sentiments. When
asked what accomplishments in life they were moSt proud of, one of the most typical responses echoed that of the physicist
Freeman Dyson: "I suppose it is just to have raised six kids, and brought them up, as far as one can see, all to be interesting people.”
(Csikszentmihalyi 1997, 62)

184 T.A: The Team Climate Inventory (Anderson & West, 1996).

185 As dimensões teóricas deste teste foram compostas numa tabela por Mathisen e Einarsen (2004), a partir do estudo de Anderson e
West (1996), que pode ser visualizada no anexo B.

83
Em suma: o ambiente propício para a criatividade emerge não só da gestão, mas
também das caraterísticas dos indivíduos que nele trabalham. O carácter dos testes
usados revela uma maneira de obter os indícios para edificar tal ambiente: perguntar
diretamente aos profissionais sobre a sua perceção do que existe e do que pode ser
melhorado. Em todo o caso, um ambiente propício à criatividade parece sustentar-se
em dois pólos essenciais: envolvimento e liberdade. Por fim, a futura inclusão de outras
dimensões nestes testes pode auxiliar mais a especificar as áreas de um grupo ou
organização que funcionam bem e quais precisam ser refinadas, e ajudar consultores e
gestores a identificar rumos de ação.

2.4.5. Discussão

A execução e o desenvolvimento de instrumentos para avaliar a criatividade depende


das definições de criatividade dos seus investigadores (Barbot 2011). Assim, torna-se
crucial debater as caraterísticas dos instrumentos para identificar em que medida
geram imprecisões e o que precisa ser revisto (Plucker et al. 2019). E.g. o pensamento
divergente tinha inicialmente um peso considerável nos estudos da criatividade e
portanto na noção de processo criativo, ou seja, estes consistiam em gerar ideias em
quantidade. Entretanto esta noção de processo criativo focada em quantidade evoluiu
para incidir sobre a qualidade das ideias (Plucker et al. 2019).

Para avaliar a qualidade usam-se critérios que assentam em múltiplas variáveis que
influenciam o processo criativo. Estas variáveis estão relacionadas com as caraterísticas
dos participantes, como os resultados são moldados e como o ambiente onde o processo
criativo ocorre é edificado. A forma como tais variáveis se relacionam entre si são
indiciadas pelas teorias dos Quatro P (Rhodes 1961), do Modelo de Sistemas de Criatividade
(Csíkszentmihály 1998), e dos Cinco A (Glǎveanu 2013).

Tendo em mente esta visão geral das condições, influências, e fatores necessários,
concluímos que ensinar alguém a ser criativo depende das caraterísticas dos indivíduos
e do clima do ambiente em que trabalham, e de como estes indivíduos se relacionam
entre si. Como a criatividade se manifesta no quotidiano e nas criações eminentes,
ensiná-la deve também incidir sobre melhorar o grau criativo de cada indivíduo. Ou
seja, é necessário definir uma literacia criativa para responder às necessidades pessoais
sobre criatividade. Portanto, é sobre esta definição que nos debruçamos a seguir, algo
que também nos permite enquadrar melhor os nossos propósitos de investigação.

84
2.5. Uma Definição de Literacia Criativa
A literacia criativa pode ser definida como a capacidade de aumentar a criatividade. Esta
definição herda a falta de uma base consensual fundamental para a criatividade, que
também é onde reside sua beleza e fascínio. Como tal, não estamos a propor uma receita
universal que garanta um comportamento criativo em todas as esferas da existência,
apenas a possibilidade de melhorar esse potencial em certos contextos. Ainda assim, a
nossa definição é baseada noutras definições que, embora voltadas para domínios
específicos, também tratam de aumentar a criatividade. Portanto, de seguida, revemos
estas definições para verificar como podem sustentar a nossa.

Literacia criativa é uma combinação de capacidades, ideias e informações para usar em


todos os tipos de práticas criativas,186 como compreender e escrever textos complexos.
Ter ideias para escrever exige uma atitude curiosa, a vontade de aprender fatos sobre a
realidade relacionando-os com materiais educacionais por meio do raciocínio, da
imaginação e da criatividade (Masie et al. 2017).

Literacia criativa exige raciocínio crítico para questionar textos literários e relacioná-
los com a vida além da escola (Healey 2015), construir uma identidade própria, agência
e versatilidade para satisfazer expectativas socioculturais, profissionais (Kiosses 2019)
e agir em resposta aos problemas mundiais, pois segundo os termos de Thomas Bean:

Em conclusão, mais do que nunca, precisamos de cidadãos criativos que possam arriscar
muito além dos fatos limitados e começar a abordar as nossas maiores questões, incluindo
as alterações climáticas, a poluição, as violações dos direitos humanos, a fome, a paz, a
pobreza e uma série de outros assuntos. Mais importante, ao demonstrar este processo
através da aprendizagem baseada em projetos e artes multimodais, podemos ampliar este
efeito sobre professores e estudantes. (Bean 2018, 19)187

A literacia criativa pavimenta a mudança pessoal, o enriquecimento e a capacitação. A


mudança pessoal ocorre ao descobrir os aspetos da própria identidade do indivíduo
através da leitura de livros, pois isso ajuda a refletir sobre atitudes pessoais, limites e
valores diversos.188 O enriquecimento é alcançado imaginando histórias que relacionam
culturas e conhecimentos. Aqui a capacitação significa construir a própria voz por meio
da leitura crítica, já que relacionar as nossas emoções com o que está escrito pode ajudar

186 A literacia criativa visa interpretar informações obscuras e desenvolver uma consciência crítica para apreciar culturas, ideologias,
propósitos e origens de textos e ser capaz de responder criativamente a estes. As atividades criativas ajudam a compreender os
significados do texto e os mecanismos usados para gerá-los. Essas atividades requerem modos de representação alternativos para
fortalecer o raciocínio crítico (Kiosses 2019).

187 T.A.: “In conclusion, more than ever before we need creative, risk-taking citizens that can move well beyond narrow factoids and
begin to tackle our biggest questions including climate change, pollution, human rights violations, hunger, peace, poverty, and a
host of other issues. Most importantly, by demonstrating this process through project based learning and multimodal arts, we can
have an impact that magnifies the effect on multiple teachers and their students.” (Bean 2018, 19).

188 As evidências para isto são encontradas em estudos envolvendo crianças bilíngues provenientes de uma cultura onde as histórias
eram passadas de boca a boca através das gerações. O costume de imaginar e contar histórias permitiu que as crianças
relacionassem a casa, a escola e combinar diferentes formas de conhecimento (Woods et al. 1999).

85
a construir um vocabulário de experiências para a autoexpressão (Woods 1999).
A literacia criativa significa aprender a linguagem das artes para aumentar os atos
criativos e a participação social para que a sociedade se desenvolva nas esferas da
criatividade e inovação. Os atos criativos e a participação social diminuíram à medida
que aumentava o fosso entre as disciplinas devido à especialização exigida por uma
sociedade que se torna cada vez mais complexa. Portanto, precisamos de criatividade e
conhecimento de design artístico para unir disciplinas e sustentar avanços sociais e
científicos. Estas pontes podem ajudar-nos a ver juntos o que passa despercebido e a
identificar as influências de situações ou relações 189 para inovar (Bast 2015). Como o
Design permite criar representações surpreendentes de uma ideia e transmitir estas,
estabelece uma ponte com a educação pois esta também envolve compreender e fazer
(Archer 1979). Neste sentido, a literacia criativa pode ser vista como um método
educacional ancorado no design e destinado a desenvolver o pensamento criativo
(Sperb et al. 2018).

Com esta revisão de literatura anterior em mente, a nossa definição de literacia criativa
depende da adoção de comportamentos que, por sua vez, dependem de condições. Os
comportamentos podem ser definidos como a forma como uma pessoa age ou se
comporta, e emergem da interação entre Atitudes, maneiras de pensar ou sentir sobre
as coisas ou ambientes que afetam o modo de agir,190 e Competências, aptidões que nos
permitem executar certas ações.191 As condições consistem numa ecologia de fatores
contextuais, frequentemente ligados às circunstâncias ou configuração do ambiente
onde ocorrem atos criativos, e que por isso, afetam a maneira como uma pessoa se
comporta. As condições consistem em Recursos, meios físicos, digitais ou de
conhecimento disponíveis para explorar e experimentar para desenvolver habilidades
para agir, e Procedimentos, formas de fazer ou agir. As dimensões anteriores foram
categorizadas numa proto-framework (Raimundo et al. 2020), ilustrada na Figura 2.5.

189 Este papel social ativo também pode ser identificado na pedagogia apoiada em multiliteracias de Cope e Kalantzis (2009), à medida
que os alunos gerenciam seu processo de aprendizagem e contribuições para e entre profissionais, bairros e grupos associativos ou
outros grupos de afinidade.

190 As atitudes vão desde a vontade de aprender, trocar informações, colaborar e desenvolver raciocínio crítico para avaliar ideias.
Tais posturas podem ampliar os nossos horizontes, pois estimulam-nos a aprender competências e aceder a recursos para gerar
associações entre assuntos para enfrentar circunstâncias ou para inovar.

191 As competências podem ser a sensibilidade para identificar coisas importantes para os processos criativos usando modos específicos
de raciocínio, como pensamento metafórico e divergente, ou expressar as nossas opiniões ou os significados que encontramos ao
interagir com o mundo atual e digital.

86
Figura 2.5. Uma proto-framework que ilustra o fluxo da literacia criativa.15

Em suma, pode-se dizer que literacia criativa é o desenvolvimento do conhecimento da


criatividade, sendo que não existe um conhecimento uno sobre esta, mas vários. De
forma similar, este desenvolvimento aparenta assentar em diversas combinações de
condições e métodos, cujos resultados são também avaliados de formas distintas. Em
todo o caso, como foi demonstrado, parece apoiar-se no equilíbrio entre compreensão
e liberdade para fazer, num exercício que parece ser um jogo.

Por último, na nossa opinião, a nossa noção de literacia criativa está ligada aos jogos,
à Literacia Criativa Através de Jogos (Zagalo 2010). 192
Isto porque a natureza interativa
deste medium permite decodificar e aprender o conhecimento de forma integrada. Esta
aprendizagem, do lado do jogador, consiste em criar ativamente caminhos para que o
jogo se desenrole de formas diversas, e do lado do designer, em projetar experiências
de jogo relevantes que refletem as perspetivas da atualidade, ou nos termos de Nelson
Zagalo (2010):

Consequentemente, dada a interatividade como um aspeto singular dos jogos e com as


dificuldades em criar uma linguagem ou código, os alunos aprendem fazendo, tentando,
experimentando e misturando diferentes conhecimentos. Isto está no cerne da literacia
criativa através de jogos, que é fundamentada num processo de design transdisciplinar. Com
o poder da interatividade traduzido em cognição situada e evitando o reducionismo para
qualquer outro medium, a experiência por meio da simulação pode imprimir sensações
somáticas no corpo e na mente do estudante, gerando assim uma nova cultura de
aprendizagem baseada na elaboração de simulações de mundo como espelhos da maneira
como entendemos a realidade. (Zagalo 2010, 66)193

Por esta razão os instrumentos que escolhemos para desenvolver o conhecimento em


literacia criativa são os jogos. Assim no capítulo seguinte iremos debruçar-nos sobre
uma revisão de jogos que lidam com criatividade e literacia criativa, que justifica a
nossa escolha em profundidade.

192 T.A.: Creative Game Literacy.

193 T.A.: “Hence with interactivity as a singularity of games, and with the difficulties in creating a language or code, learners learn by
doing, by trying, by experimenting, and by mixing different sets of knowledge. And this is at the heart of creative game literacy,
strongly grounded in a transdisciplinary design process. With the power of interactivity translated into situated cognition, and
avoiding reductionism to any other media, experience through simulation can imprint somatic sensations onto the learner’s body
and mind, thus generating a new culture of learning based on the crafting of world simulations as mirrors of the way we understand
reality.” (Zagalo 2010, 66).

87
(Página em Branco)

88
3. Jogos para Literacia Criativa: Que Caraterísticas fazem dos Jogos
Métodos e Instrumentos para Desenvolver a Criatividade?

3.1. Perspetivas sobre os Jogos para Desenvolver a Literacia Criativa


O propósito desta investigação é formular uma framework para conceber jogos que
permitam desenvolver literacia criativa, ou seja, aumentar o conhecimento da
criatividade em domínios específicos através de jogos concebidos para tal. O ato de jogar
videojogos é uma tentativa de antecipar o inesperado, uma forma de encorajar a
criatividade, ou segundo Linda Jackson e Alexander Games:

Jogar videojogos deverá aumentar a criatividade, direta ou indiretamente, mediada por


efeitos benéficos cognitivos, sociais, emocionais e motivacionais. Considere a ação de jogar
um videojogo. As decisões devem ser tomadas não apenas de forma rápida, mas também
criativa. Os jogos são projetados para garantir que o movimento óbvio seja o incorreto. É a
capacidade de antecipar o imprevisto que leva ao sucesso nos videojogos. Em suma, os
videojogos estimulam a criatividade. (Jackson e Games 2015, 30)194

Antecipar o inesperado requer explorar os caminhos revelados pelo sistema de regras


do jogo através da ação do jogador, ou segundo Ernest Adams e Joris Dormans:

Quando falamos do caminho que os jogadores percorrem nos estados possíveis de um jogo -
o seu espaço de probabilidades - às vezes descrevemos esse caminho como uma trajetória.
Os possíveis estados e trajetórias de jogo ao longo de um jogo são propriedades emergentes
do sistema de regras do jogo. Jogos que permitem muitas trajetórias diferentes e
interessantes, sem dúvida, têm mais jogabilidade do que jogos que geram menos trajetórias
ou menos interessantes. (Adams e Dormans 2012, 27)195

Este carácter singular da interação dos videojogos (Zagalo 2010), permite assim ampliar
as oportunidades para a resolução criativa de problemas (Meshkin 2018), e ainda, na
nossa opinião, gerar possibilidades para o desenvolvimento da literacia criativa.

As perspetivas sobre videojogos variam consoante estes são olhados como artefactos
com uma retórica procedimental (Bogost 2007), ancorados em narrativas (Zagalo 2019;
Meskin 2018), em dimensões de ação (Cardoso 2016), enquanto meio para criticar
(Flanagan 2009), para evocar emoções dos jogadores (Isbister 2017), cuja atuação
reflete a forma primordial de nos relacionarmos e fazer sentido do mundo (Sicart 2014),

194 T.A.: “Video game playing should increase creativity, directly or indirectly, mediated by its beneficial cognitive, social, emotional
and motivational effects. Consider the play by play action in a video game. Decisions have to be made not only quickly but
creatively. The games are designed to assure that the obvious move is the incorrect one. It's the ability to anticipate the
unanticipated that leads to success in video games. Simply put, video games encourage creativity.” (Jackson e Alexander Games
2015, 30).

195 T.A.: “When we speak of the path players take through the possible states of a game—its probability space—we sometimes describe
this path as a trajectory. The possible game states and play trajectories through a game are emergent properties of the game rule
system. Games that allow many different, interesting trajectories arguably have more gameplay than games that generate fewer
trajectories or less interesting ones.” (Adams e Dormans 2012, 27).

89
ou como objetos culturais massificados com carácter político (Galloway 2006). Na nossa
opinião, estes diversos olhares evidenciam áreas de conhecimento onde os videojogos
podem operar enquanto instrumentos para desenvolver literacia criativa, e.g. conceber
histórias, argumentar algo, pensar em ações criativas e formas de despoletar emoções
nos jogadores, ou que contribuam ou critiquem a ordem política. Assim, estas valências
apontam para desenvolver criatividades com os videojogos, sendo que a literacia é o
subproduto, o conhecimento destas criatividades alavancado com videojogos.

Muitos jogadores apreciam jogos emocionalmente desafiantes envolvendo situações


ambíguas. Muitos jogos desenvolvidos de forma independente focam-se em desafios
emocionais para uma maior imersão e intensidade,196 ao invés dos convencionais que
se focam em desafios cognitivos ou físicos (Bopp et al. 2018). É comum tais desafios
emocionais recorrerem a design abusivo, uma atitude focada em criar uma dialética
entre designer e jogador, centrada na forma como se relacionam. Para tal estes jogos
forçam os jogadores a sair das suas expectativas para entenderem o design que está
subjacente ao jogo, não o seu sistema (Wilson e Sicart 2010).

Em todo o caso, existem muitas facetas nos jogos que favorecem atos criativos, como a
personalização e criação de conteúdo por parte do jogador ou o design do espaço de jogo
propício a atos criativos (Hall et al. 2020). Daí que jogar 197
e desenhar videojogos198
sejam atividades criativas complementares como veremos a seguir.

3.1.1. Jogar

Jogar implica a compreensão, a descodificação da ficção do jogo para nele progredir, e


porque este é atuado pelo jogador pode ser percecionado como uma experiência atual.
Um jogo pode, se isso interessar ao jogador, ser um polo de reflexão a partir do qual se
comparam os seus assuntos com episódios da vida atual. Pode ser um espaço mental
para conceber atos que possam ser manifestados dentro e fora dele, e.g. como é evocado
em 9-11 Survivor (2003), ilustrado na Figura 3.1., e comentado por Ian Bogost:

196 Jogos independentes tendencialmente confrontam os jogadores com desafios emocionais. O valor destes reside na novidade,
intensidade e qualidade da experiência emocional recorrendo a controlos e regras simples e design abusivo.

197 Os jogos não existem sem o jogar, um acto primordial para entendermos e conectarmo-nos com o mundo, e para nos expressarmos
em espaços de jogo limitados por regras e afinidades, com outros jogadores ou com o sistema de jogo. O jogar está entre o criar e
o destruir já que os jogadores podem progredir sem quebrarem as suas regras (Sicart 2014).

198 Um jogo é um medium para jogar voluntariamente, onde as ações são limitadas por regras e onde oponentes tentam ganhar
vantagens uns sobre os outros (Avedon e Sutton-Smith 1971). Os videojogos têm a capacidade de puxar a mente dos jogadores para
dentro dos seus sistemas interativos (Fullerton, Swain e Hoffman 2008) para ultrapassar desafios viáveis (Costikyan 2002).

90
Ao criar uma representação aleatória do destino de um trabalhador do World Trade Center, 9-
11 Survivor [2003] oferece uma das poucas representações do papel entrelaçado do acaso e do
caos naquela manhã fatídica. (...) que convida a refletir sobre todas as potenciais armadilhas e
fugas nos nossos locais de trabalho, casas, shoppings e espaços públicos - para considerar a
mudança no relacionamento que temos com esses espaços desde o 11 de setembro. (Bogost
2007, 129)199

Figura 3.1. 9-11 Survivor (2003) apresentando ecrãs (esquerda para a direita), sobre uma hipótese de
fuga durante o ataque, e que evoca as armadilhas dos espaços que frequentamos no quotidiano.20016

Os jogadores codificam experiências de jogo em Teorias de Sistema (TdS),201 modelos


mentais para inferir algo sobre os mecanismos do jogo por forma a progredir nele, e
até, refletir em noções para além deste (Carvalhais e Cardoso 2021). A formação de TdS
e os momentos de descoberta dependem da empatia dos jogadores para com o sistema
de jogo,202 i.e., como os jogadores apreciam a experiência do jogo e como esta influencia
a sua atuação (Lanzoni 2018). Apreciar neste contexto é estabelecer uma relação
empática com o jogo, é fazer sentido do significado do jogo através da construção de
TdS respetivos e atuar no jogo em conformidade com estes. A codificação das
experiências dos jogadores em TdS e os seus atos permitem conceber formas de
comunicar novo conhecimento entre si, que é a base de qualquer literacia:

[o] principal objetivo de qualquer nova literacia deve ser a capacidade de aumentar o
conhecimento, uma compreensão mais eficiente do mundo. E para criar essa possibilidade,
primeiro precisamos ser capazes de apresentar um código que define a forma como os

199 T.A.: “By creating an aleatory representation of the fate of a World Trade Center worker, 9-11 Survivor [2003] offers one of the
few representations of the intertwined role of chance and chaos on that fateful morning (...) it invites us to reflect on all the
potential traps and escapes in our workplaces, homes, shopping malls, and public spaces – to consider our changed relationship
with such spaces since 9/11.” (Bogost 2007, 129). O 9-11 Survivor (2003) é uma modificação do jogo Unreal Tournament (2003).

200 Este conjunto de ecrãs é uma montagem feita pelo autor a partir de imagens de terceiros nos seguintes links acedidos a 10 de
dezembro de 2021 em:
https://cdn2.vox-cdn.com/uploads/chorus_asset/file/697294/9-11-Survivor-02-600x450.0.jpg
https://cdn3.whatculture.com/images/2014/10/911-survivor-kinematic.jpg
https://www.gameclassification.com/files/games/9-11-Survivor.jpg

201 Teorias de Sistema (TdS) são modelos mentais construídos pelo jogador para compreender como o sistema de jogo funciona. TdS
são construídos interagindo com entradas e saídas disponíveis e visíveis, bem como com ações e dinâmicas desencadeadas pelas
anteriores. Como com outros artefactos esta construção mental é feita através da empatia, da conexão com o sistema de jogo
através de uma perspetiva humana (Carvalhais e Cardoso 2021).

202 Empatia é intrínseca ao processo cognitivo humano, é a forma natural que os humanos têm para mapear uma noção do mundo ao
seu redor e como este opera, o que se estende a outros artefactos (Lanzoni 2018).

91
sujeitos irão se comunicar, ler e escrever a mensagem. (Zagalo 2010, 61)203

Assim, no nosso entender, a literacia criativa beneficia da abertura das regras do jogo
e da capacidade criativa dos jogadores de associarem objetos ou elementos no jogo que
ampliem as ações dos jogadores. As ações criativas resultantes destas associações feitas
no decurso do jogo são também um meio para praticar criatividade, como acontece com
o ato de brincar com Legos segundo Ian Bogost:

O recurso fundamental para a "criatividade" dos Legos é na verdade a lógica do seu


acoplamento físico: Legos individuais podem ser reconfigurados de muitas maneiras
diferentes para criar novos objetos ou sistemas, de acordo com regras simples de montagem.
(Bogost 2007, 256)204

Em suma, os videojogos exigem domínio em multiliteracias para entender e refletir


sobre os conteúdos dos mesmos. Esta reflexão abre portas para atos criativos do jogador
dentro do jogo, bem como atos criativos por parte do designer para conceber variantes
de um jogo. Portanto, o aumentar a criatividade estende-se do ato de jogar ao de
desenhar jogos, e até fazer com que ambos se tornem complementares:

A segunda questão refere-se à ideia do que se pode aprender com o uso de videojogos
comerciais. James Paul Gee (2007) responde a essa pergunta quando diz “Bons videojogos
são bons para sua alma” quando são jogados com reflexão e envolvimento com o mundo ao
seu redor. Os jogos podem ser ferramentas para ensinar e aprender a pensar quando os
participantes se concentram no jogo e descobrem as suas regras, neste contexto atuando
como “designers de videojogos”. De acordo com Gee, os jogadores são coautores dos jogos
ao jogá-los, porque se um jogador não interagir com o jogo fazendo escolhas sobre o que vai
acontecer, nenhuma jogada acontece. (Lacasa et al. 2008, 86)205

203 T.A.: “The alphabet code represents basic abstract units which are meaningless alone. This atomization of the language, of the
communication process, allowed us to build a system capable of creating and preserving new knowledge. With the preservation of
ideas assured by that code, we freed our brains to invest more time in the innovation of ideas and less in having to remember.
Thus the main goal for any new literacy must be the capacity to increase knowledge, a more efficient understanding of the world.
And to create this possibility, we first need to be able to present a code that defines the way subjects will communicate, read and
write the message.” (Zagalo 2010, 61)

204 T.A.: “The feature fundamental to Legos’ “creativity” is in fact the logic of their physical coupling: individual Legos can be
reconfigured in many different ways to create new objects or systems, according to simple rules of assembly.” (Bogost 2007, 256).

205 T.A.: “The second question refers to the idea of what can be learned from using commercial videogames. James Paul Gee (2007)
answers this question when he says “Good video games are good for your soul” when they are played with thought, reflection, and
engagement with the world around them. Games can be tools for teaching and learning to think when participants focus on the
game and discover its rules; in this respect they are acting as “videogame designers”. According to Gee, players co-author games
by playing them, because if a player does not interact with the game by making choices about what will happen, no play takes
place.” (Lacasa et al. 2008, 86).

92
Em suma, o ato de jogar requer simultaneamente um ato de coautoria, porque: a) as
execuções de alguns jogos assentam nos atos de múltiplos jogadores; b) o design de
jogos depende das contribuições e esforços conjuntos entre jogadores, designers e
desenvolvedores; c) um jogo que provoque fascínio nos seus jogadores pode suscitar
ideias e levar à vontade de agregar esforços para melhorar ou desenhar jogos, como
vemos a seguir. 206

3.1.2. Desenhar jogos

Para efeitos da nossa investigação, desenhar jogos requer ao designer entender o que
pode ser um videojogo, como estes são articulados pelos jogadores com situações reais,
e, das formas de os desenhar e codificar para estimular o ato criativo dos jogadores, ou
seja:

A variável criativa é baseada nestes dois componentes do jogo - design e programação. O


design de um jogo é considerado o elemento central. Isso é reconhecido pela indústria, ao
contrário do filme em que o autor é chamado de diretor. Nos jogos, o autor é o designer (ex.
Shigeru Miyamoto ou Peter Molyneux). O autor é a pessoa por trás da ideia principal, da
estrutura do jogo e, portanto, precisa pensar logicamente. Dito isto, um designer de jogos
deve ser capaz de desenhar uma estrutura de jogo para estabelecer suas regras, obstáculos e
escolhas, e deve ser capaz de colocá-la a funcionar. (Zagalo 2010, 66)207

Muitos videojogos são desenhados com intenções para serem jogados de uma maneira
particular, o que não implica que o sejam dessa maneira, dado que:

Os jogos são sistemas complexos que podem produzir resultados imprevisíveis, mas devem
oferecer uma experiência de utilizador bem desenhada e natural. Para conseguir isto, os
designers de jogos devem entender a natureza do comportamento emergente em geral e do
seu jogo em particular. Consideramos as múltiplas partes ativas e interconectadas, feedback
loops e diferentes escalas como qualidades estruturais do jogo enquanto sistema. Nos jogos,
estas qualidades estruturais desempenham um papel vital na criação da jogabilidade
emergente. O estudo da mecânica do jogo irá revelar estas (e outras) estruturas com muito
mais detalhes. (Adams e Dormans 2012, 57)208

Em suma, a possibilidade dos jogadores se desviarem das intenções dos designers com
resultados imprevisíveis sugere que a perceção dos jogadores nunca é unânime. Esta

206 Como ocorreu p.ex., com várias gerações de jogadores do Xadrez,

207 T.A: “The creative variable is grounded in these two game components – design and programming. The design of a game is
considered to be the core element. This is recognized by the industry, as opposed to film where the author is called a director. In
games, the author is the designer (ex. Shigeru Miyamoto or Peter Molyneux). The author is the person behind the main idea, the
structure of the game and thus needs to think logically. That said, a game designer must be able to draw up a game structure to
establish its rules, obstacles, and choices, and must be able to put it to work.” (Zagalo 2010, 66).
208 T.A.: “Games are complex systems that can produce unpredictable results but must deliver a well-designed, natural user
experience. To achieve this, game designers must under- stand the nature of emergent behaviour in general and of their game in
particular. We regard the many active and interconnected parts, feedback loops, and different scales as structural qualities of the
game as a system. In games, these structural qualities play a vital role in the creation of emergent gameplay. Studying game
mechanics will reveal these (and other) structures in much more detail.” (Adams e Dormans 2012, 57).

93
possibilidade é comum hoje porque se deixa frequentemente espaço nos videojogos
para serem interpretados subjetivamente pelos seus jogadores (Denisova et al. 2020). 209

3.2. Metodologia e Procedimentos


Procuramos para este capítulo obter uma amostra significativa e diversa de jogos com
potencial para estimular atos criativos. Para tal, procedemos a uma pesquisa
exploratória envolvendo diversas vias para procurar jogos.

3.2.1. Pesquisa

Pesquisamos então por jogos em publicações académicas apontadas às temáticas desta


investigação, artigos de opinião, ou sugeridos por investigadores a trabalhar em áreas
congéneres à nossa investigação. Usamos palavras-chave que refletem aspetos,
características ou dimensões da criatividade evidenciados pela revisão bibliográfica:
Criatividade; Criativo; Literacia, Jogos; Videojogos; Explorar; Experiência; Colaborar;
Reinterpretar; Design; Idear.210 Estas palavras-chave foram usadas com combinações de
operadores booleanos (AND e OR) no Scopus, no Semantic Scholar, e no Google
Académico, bem como plataformas de venda de jogos que gozam de popularidade como
o STEAM e Itch.io. 211

3.2.2. Filtrar resultados

Os jogos considerados para a amostra, independentemente da sua origem, foram sendo


filtrados segundo o seguinte critério de inclusão: os jogos encontrados (digitais ou
analógicos)212 deveriam estimular o jogador a criar ou a aprender a criar algo para um contexto
específico. Assim, debruçamo-nos apenas sobre os jogos que se encaixam neste critério.

209 Esta apreciação subjetiva levou ao desenvolvimento da Escala de Desafios que Emergem da Interação com Jogos (T.A.: Challenge
Originating from Recent Gameplay Interaction Scale), uma ferramenta sistemática e robusta para avaliar o nível de perceção de
desafios por parte de jogadores. O instrumento necessita de maior validação dado que está limitado a géneros de jogo e audiências
(Denisova et al. 2020).

210 T.A.: Creativity; Creative; Literacy, Videogames; Games; Explore; Experience; Collaborate; Reinterpret; Design; Ideate.

211 O STEAM foi escolhido pelo seu histórico, sendo uma plataforma que entrou em funcionamento em 2003, por incluir uma enorme
quantidade de jogos para serem executados em diversos tipos de hardware, e por proporcionar acesso fácil a imagens e artigos de
opinião dos títulos que disponibiliza, desde produções Triple-A a Indie. O Itch.io foi escolhido porque, embora não possua o volume
de jogos do STEAM, é de fácil acesso a desenvolvedores e designers em várias etapas e esferas de produção, desde desenvolvimento
independente, a géneros como artgames, edutainment, jogos sérios, entre outros, portanto útil para quem está a iniciar estas
atividades, quem não têm financiamento e procura disseminar o seu trabalho.

212 Muitos destes jogos são de natureza analógica, jogos de tabuleiro que incluímos porque são orientados para auxiliar processos
criativos, e portanto úteis para fins de design. Tais jogos estão muito em linha com as Estratégias Oblíquas (1970), e possuem ainda
potencial para serem transcodificados em formas digitais.

94
Note-se que a nossa pesquisa teria de ter sempre um caráter qualitativo para podermos
triar os estudos de caso para esta investigação, ou seja, jogos que refletissem o âmbito
da nossa definição de criatividade. Para tal, usamos expressões de pesquisa em motores
de busca de publicações académicas, e, em plataformas de venda de videojogos.213 Estas
expressões e respetivos resultados são apresentados na tabela 3.1.

Tabela 3.1. Expressões de pesquisa de estudos de caso e respetivos resultados

Motor de Expressão de Pesquisa Data Resultados Resultados


Busca filtrados

Scopus Videojogos AND Creative AND Literacy 15.03.2021 43 7

Videojogos AND Creative AND Design 22.06.2021 59 7

Videojogos AND Colaboração 6.05.2021 69 2

Semantic Videojogos AND Criatividade 20.03.2021 59000 2


Scholar
Videojogos AND Creative AND Literacy 18.03.2021 2030 5

Jogos AND ideação 20.04.2021 342000 3

Google Videojogos AND Creative AND Literacy 20.05.2021 47400 5

Google Videojogos AND experiência 15.07.2021 1910 6


scholar

Videojogos AND reinterpretar 17.07.2021 33 2

STEAM Criatividade 27.06.2021 2448 10

Criativo AND Design 10.04.2021 1009 2

Itch.io … … … …

3.2.3. Análise

O procedimento para analisar os jogos obtidos foi o seguinte:

1. JOGAR e OBSERVAR: Sempre que possível jogámos diretamente os jogos para os


experienciar em primeira mão, com o objetivo de perceber o que estava
subjacente aos fenómenos e respostas por eles evocadas. Também recorremos
neste ponto a observação de sessões destes jogos por outros jogadores. Quando
não era possível interagir de todo com o jogo procuramos outras fontes de

213 O procedimento de pesquisa e triagem é aprofundado na secção 3.2.1.

95
informação, como instruções, artigos de opinião e vídeos da execução do jogo.
2. IDENTIFICAR: A informação recolhida no ponto anterior permitiu-nos
identificar caraterísticas centrais aos jogos e ordená-los em categorias que
estimulam atos criativos. E.g. a personalização, o espaço de possibilidades e de
reflexão que proporcionam ao jogador.
3. APROFUNDAR: Procurou-se sustentar cada categoria referida no ponto anterior
com estudos que lhe pudessem estar relacionados, e exemplificar estas
categorias com jogos diferentes. Por sua vez, cada jogo seria analisado sobre a
sua operação para expor aspetos que poderiam contribuir para a criatividade do
jogador.
4. HIPOTETIZAR: Exploraram-se os aspetos identificados no ponto anterior por
padrões que se revelassem centrais enquanto componentes da framework. Estes
componentes serviriam para triar estudos de caso e enquanto lentes de análise
para a fase de trabalho laboratorial seguinte.

3.3. Caraterísticas de Jogos que Estimulam Atos Criativos


Os videojogos são únicos pelo seu caráter interativo (Zagalo 2010) e capacidade em
facultar ao jogador espaços digitais lúdicos similares a situações do mundo real.
Contudo, o espaço de jogo distingue-se do quotidiano porque as ações do jogador não
têm penalizações nem as consequências associadas à vida real (Gee 2003; Bowman et
al. 2015). É por isso que Raph Koster (2003) argumenta que os videojogos são formas
de aprendizagem criativas, dado que progredir neles exige ao jogador saber realizar
atividades e associações abstratas no espaço digital do jogo.
Contudo, estas atividades e associações não podem ser familiares ao jogador para que
estimulem atos criativos. Isto porque, no nosso entender, a natureza da criatividade
destes atos alinha-se com a noção de criatividade de Margaret Boden (2004). 214 Com
esta noção em mente, é frequente conceber-se videojogos que promovem experiências
familiares, sendo por isso confortáveis, contudo:

Isto promove um ciclo de feedback positivo guiado pelo prazer de navegar em experiências
familiares, um ciclo que limita a criatividade dos designers de jogos, ao mesmo tempo que
aliena a capacidade dos jogadores de refletir e desvendar novos significados. (Carvalhais et
al. 2019, 2)215

Por outro lado, jogos que promovem experiências novas agem frequentemente fora da
zona de conforto dos jogadores (Cardoso et al. 2019), i.e. fora do seu espaço conceptual

214 A noção da criatividade de Boden pode ser consultada na secção 1.1.

215 T.A.: “This promotes a positive feedback loop guided by the pleasure of navigating familiar experiences, a loop that limits the
creativity of game designers while alienating players’ ability to reflect and to unravel new meanings.” (Carvalhais et al. 2019, 2).

96
– a forma comum de pensarem (Boden 2004, 4).216

Com isto em mente, quebrar este ciclo significa procurar formas alternativas de ser
expressivo e comunicativo através dos jogos, mas também desenhar para algo que não seja
prazer, para algo mesmo além do desconforto. É através do atrito estético que os designers
de jogos serão capazes de quebrar o ciclo hedónico e incentivar a reflexão sobre a experiência
do jogo. (Cardoso et al. 2019)217

Por isso pensamos que é ao nos distanciarmos da nossa forma comum de pensar através
dos jogos que podemos criar outros e ponderar sobre estes.

3.3.1. Personalizar

A ação é a característica central que distingue os jogos de outros media (Cardoso 2016),
no sentido que permite ao jogador alterar o estado do jogo. Esta alteração de estados
pode propagar-se à narrativa, à transformação do mundo de jogo e dos seus
personagens jogáveis, e aos limites de exploração. Ação, segundo Peter Nelson, é ainda
o que permite dar significado aos elementos num jogo, recriar a sua experiência, o seu
assunto, e até alterar as suas regras (2017).

Um exemplo é patente na simulação de condução de ModNation Racers (2010), onde os


jogadores podem criar com grande detalhe as suas personagens jogáveis e veículos. Os
personagens podem ser vestidos, aplicada cor na sua pele, autocolantes e até cabelo. Os
veículos podem ser pintados com motivos a gosto. As pistas de corrida e terreno podem
ser criadas de raiz pelo jogador e complementadas com itens e obstáculos gerados pelo
sistema de jogo (Figura 3.2.).

Figura 3.2. ModNation Racers (2010) apresentando ecrãs do jogo em multijogador (esquerda), a

216 Espaços concetuais são estilos estruturados de pensamento (...) em suma, são qualquer forma disciplinada de pensar que seja
familiar (e valorizada por) um determinado grupo social. T.A.: “Conceptual spaces are structured styles of thought. (...) in short,
any disciplined way of thinking that is familiar to (and valued by) a certain social group.” (Boden 2004, 4).

217 T.A.: “With that in mind, breaking this loop means to seek for alternative ways to be expressive and communicative through games,
but also to design for something other than pleasure, for something even beyond discomfort. It is through aesthetic friction, that
game designers will be able to break the hedonistic loop and encourage reflection on the experience of play.” (Cardoso et al.
2019).

97
personalização de um veículo (em cima à direita), e de um personagem (em baixo à direita).218 17

Outro exemplo assenta no âmbito de ações do jogador que se estende ao uso de estações
de trabalho espalhadas pelo mundo de Fallout: New Vegas (2010). As estações dividem-
se em tipos de tarefas que podem executar: reparar, transformar ou construir armas de
raiz; conceber munições com novas facetas; construir armaduras; preparar comida. A
personalização destes itens nestas estações permite aumentar as hipóteses de progredir
no jogo, como ilustrado Figura 3.3.

Figura 3.3. Fallout: New Vegas (2010) apresentando ecrãs das estações de trabalho: uma para conceber
munições com facetas especiais e respetivo interface (esquerda e direita).21918

Já Fallout Shelter (2015), ilustrado na Figura 3.4. e inserido no mesmo franchise do jogo
anterior permite vários graus de personalização criativa:
• O treino de capacidades dos personagens para melhorar a sua performance em
tarefas para as quais sejam designados, como força ou agilidade;
• A possibilidade de constante reconfiguração da topologia do abrigo que afeta o
movimento no seu interior;
• A desconstrução de objetos para obter recursos especiais para construir armas
e proteção.
• A combinação de personagens em equipas para enfrentar desafios no exterior.

218 Esta montagem de ecrãs é feita a partir de imagens consultadas a 19 de dezembro de 2021 nos seguintes links:
https://hardcoregamer.com/features/articles/opinion/modnation-racers-the-forgotten-gem/265243/
https://ambrosia.com.br/games/resenha-modnation-racers/

219 Vídeo com a estação de trabalho para alterar munições, e outro com a estação de trabalho para reparar e transformar armas,
ambos acedidos a 10 de dezembro de 2021

98
Figura 3.4. Fallout Shelter (2015) apresentando um ecrã de criação de topologia do abrigo, decisão das
secções a ampliar e caraterísticas a aumentar nos personagens jogáveis.19

Ainda a personalização do personagem jogável no início de Quest for Glory IV (1993), em


que o jogador opta por um perfil de lutador, utilizador de magia ou ladrão, determina
as suas aptidões iniciais. Estas aptidões definem uma forma preferencial de resolver
desafios e um desenrolar narrativo particular. Outras aptidões podem ser exercitadas
no decurso do jogo até um determinado nível, se existirem formas de as exercitar. Ou
seja, a personalização da personagem jogável abre novas hipóteses de narrativas de
jogo e de resolução de problemas (Figura 3.5).

Figura 3.5. Quest For Glory IV (1993) apresentando ecrãs nos quais se pode escolher um perfil de
conduta (esquerda) e a personalizar as respetivas aptidões do personagem jogável (centro), o que
determina ações possíveis e percursos no jogo, como ter força para erguer a lápide ou fazê-la levitar
por magia (direita).22020

Já no mundo de papel de Tearaway (2013) o jogador pode personalizar a personagem


jogável e outros personagens através do hardware e interfaces adequados.221 Isto

220 Esta montagem de ecrãs de Quest For Glory IV (1993) foi concebida a partir de imagens acedidas a 15 de dezembro de 2021 em:
https://www.old-games.com/download/1525/quest-for-glory-4-shadows

221 O jogo foi desenvolvido para tirar máximo partido das funcionalidades da consola de jogo Playstation Vita, dotada de acelerómetros,
câmaras digitais, ecrãs de toque, etc.

99
permite aos jogadores cortar, colar e introduzir cor em papel digital para produzir
adereços a aplicar nos personagens do jogo. Estes atos de personalização são mais
realistas porque os gestos e imagens do jogador no mundo físico, refletem-se no ato
de moldar materiais no mundo virtual do jogo (Figura 3.6).

Figura 3.6. Tearaway (2013) apresentando um ecrã que conjuga personalização e imagens reais.22221

Em suma, a personalização num jogo pode ampliar tanto as ações criativas e as


implicações destas no jogo como estimular a reflexão dos seus assuntos num contexto
real. Esta ampliação da estrutura do pensamento do jogador está patente no conceito
de espaços concetuais de Margaret Boden (2004), formas de pensar disciplinadas que
ao serem ampliadas permitem atingir criações de eminência.

Os casos mais profundos de criatividade envolvem alguém que pensa sobre algo que, no que
diz respeito aos espaços concetuais em suas mentes, eles não poderiam ter pensado antes. A
ideia supostamente impossível pode surgir apenas se o criador alterar o estilo pré-existente
de alguma forma. Deve ser ajustado, ou mesmo radicalmente transformado, de modo que
agora sejam possíveis pensamentos que antes (dentro do espaço não transformado) eram
literalmente inconcebíveis. (Boden 2004, 6)223

Portanto o espaço concetual de um jogador pode ser aumentado pelo que pode ser feito
no espaço de um jogo, o seu espaço de probabilidades no qual nos debruçamos a seguir.

3.3.2. Espaço de probabilidades

Adams e Dormans definem “espaço de probabilidades” (2012), como o número de


estados de jogo possíveis. Este espaço de probabilidades compreende diversos estados

222 Este ecrã de Tearaway (2013) foi acedido a 15 de dezembro de 2021 em:
http://www.theaveragegamer.com/2013/11/20/tearaway-review-vita/

223 T.A.: “The deepest cases of creativity involve someone’s thinking something which, with respect to the conceptual spaces in their
minds, they couldn’t have thought before. The supposedly impossible idea can come about only if the creator changes the pre-
existing style in some way. It must be tweaked, or even radically transformed, so that thoughts are now possible which previously
(within the untransformed space) were literally inconceivable.” (Boden 2004, 6).

100
de jogo, envolvendo exploração do seu território e ações de personagens controladas
pelo jogador e sistema de jogo. O espaço de probabilidades pode ser amplo ou profundo.
É amplo quando há muitos estados possíveis de jogo que ramificam a partir do estado
atual. É profundo quando há muitos estados diferentes que são despoletados a partir de
escolhas sucessivas.224

Quando falamos do caminho que os jogadores percorrem nos estados possíveis de um jogo -
seu espaço de probabilidade - às vezes descrevemos esse caminho como uma trajetória.
(Adams e Dormans 2012, 27)225

Um vasto espaço de probabilidades encontra-se na série Civilization (2016), que permite


criar uma variedade infinita de sociedades com níveis de evolução diferentes a partir de
um conjunto limitado de regras. Esta vasta variedade leva-nos ao conceito de processo
generativo.

Ao discutir a criatividade – sua natureza e seus mecanismos – às vezes teremos que os


distinguir. Um foca as possibilidades estruturais definidas por "regras generativas"
consideradas como descrições abstratas. O outro foca as possibilidades inerentes às "regras
generativas" consideradas como processos computacionais. (Boden 2004, 49)226

Tal como fórmulas matemáticas podem gerar com poucas regras inúmeros resultados,
os programas de computador podem descrever recursivamente estruturas diferentes. A
qualquer momento, uma destas estruturas que nunca foi gerada antes pode emergir
destes programas (Boden 2004, 49). Portanto, qualquer instância deste jogo pode criar
uma civilização que nunca foi gerada antes, numa trajetória que também é assistida
pelos comportamentos do jogador (Figura 3.7.).

O comportamento é gerado à medida que as probabilidades de um grande número de


comportamentos [que] são continuamente submetidos a uma série de funções de transfor-
mação simples que se presume ter realidade física no sistema nervoso (Epstein 1990, 116).227

224 T.A: “The probability space can be described as having a wide or a deep shape. When the shape of the space is wide, there are
many different states that can be reached from the current state: Usually this means that players have many options. if the shape
is deep, there are many different states that can be reached after many subsequent choices.” (Adams e Dormans 2012, 27).

225 T.A.: “When we speak of the path players take through the possible states of a game—its probability space—we sometimes describe
this path as a trajectory.” (Adams e Dormans 2012, 27)

226 T.A.: “In discussing creativity – its nature and its mechanisms – we shall sometimes have to distinguish between them. One focuses
on the structural possibilities defined by ‘generative rules’ considered as abstract descriptions. The other focuses on the
possibilities inherent in ‘generative rules’ considered as computational processes.” (Boden 2004, 49).

227 T.A.: “ongoing behaviour is generated as the probabilities of a large number of behaviors [that] are continuously subjected to a
number of simple transformation functions which are presumed to have physical reality in the nervous system” (Epstein 1990, 116).

101
Figura 3.7. Civilization (2016) apresentando um ecrã de uma civilização Espartana.22822

No caso da experiência de jogo em The Elder Scrolls V: Skyrim (2011) o jogador explora ao
seu ritmo a diversidade de territórios do mundo de jogo, lutando contra oponentes e
interagindo com personagens de raças e estratos socioeconómicos distintos. Esta
exploração estende-se à escolha de missões onde se busca por tesouros na companhia
de outros aventureiros. Esta exploração pode ser muito envolvente pois fomenta uma
sensação de liberdade e de livre-arbítrio sobre as ações a tomar no jogo (Figura 3.8).

Géneros [de jogo] relatados para proporcionar jogos envolventes são RPGs de mundo aberto,
"jogos sandbox"229 como a série Grand Theft Auto, aventuras, jogos de simulação e MMORPGs
de jogos solitários. (...) Os espaços livres, abertos e exploráveis de jogos de mundo aberto ou
sandbox, a exploração de personagens alternativos e cursos de ação, a liberdade de escolher
objetivos para perseguir e diferentes estratégias para persegui-los em jogos de simulação
foram relatados como proporcionando uma sensação desejada de grande agência pessoal e
autonomia, e as restrições à liberdade de ação relatadas como experiências altamente
negativas. (Deterding 2013, 257)230

Figura 3.8. The Elder Scrolls V: Skyrim (2011) apresentando um ecrã com uma sequência de luta
(esquerda), outro com a exploração de um povoado (centro), e outro território dos múltiplos
existentes (direita).23123

228 Este ecrã de Civilization (2016) foi acedido a 11 de dezembro de 2021 em:
https://cdn.wccftech.com/wp-content/uploads/2016/11/Civilization-VI-03-Sparta.jpg
229 Open-world é um termo em inglês que designa mundos de jogo com território infinito a explorar. Já sandbox é um termo que se
refere a um mundo que proporciona liberdade criativa para atingir objetivos pré-estabelecidos pelo jogo ou autopropostos pelos
jogadores. O Minecraft (2009) tornou-se uma norma em termos de espaço de criação e de aprendizagem nas dimensões
mencionadas. Ainda, o seu valor não reside somente na liberdade para criar, mas também na funcionalidade do que é criado, e
portanto é usado como complemento pedagógico em sala de aula (Zagalo 2019).

230 T.A.: “[Game] genres that were reported affording engrossing gaming are open-world RPGs, ‘sandbox games’ like the Grand Theft
Auto series, adventures, simulation games, and MMORPGs gamed solitarily. (...) The free, open, explorable spaces of open-world
or sandbox games, the exploration of alternative characters and courses of action, the freedom to choose goals to pursue and
different strategies to pursue them in simulation games were reported as providing a desired sense of high personal agency and
autonomy, and constraints on one’s freedom of action were reported as highly negative experiences.” (Deterding 2013, 257).

231 Estes ecrãns de The Elder Scrolls V: Skyrim (2011) foram consultados a 13 de dezembro de 2021 em:
https://store.steampowered.com/app/72850/The_Elder_Scrolls_V_Skyrim/

102
Explorando outro caso, a comunicação restrita aos gestos dos personagens controlados
pelos jogadores232 em Journey (2019) apresenta um espaço de probabilidade que os
obriga a encontrar formas de entendimento para desbravar o jogo em conjunto (Zagalo
2019). Ou seja, as restrições condicionam a procura de soluções alternativas mediante
o que Brian Upton chama de Horizonte de Ação, todos os estados de jogo que um jogador
pode atingir num futuro próximo a partir do seu estado atual (definido por restrições
externas exercidas pelo sistema de jogo), e Horizonte de Intenção, todos os estados de
jogo que o jogador acredita serem válidos, alcançáveis e desejáveis no futuro próximo
(definido pelas restrições internas atuais do jogador). Para ambos os horizontes, o
estado atual do jogo serve de base às regras do mesmo para gerar estados do jogo
futuros num ciclo contínuo.

O horizonte da intenção é um produto do jogo conforme entendido, ao passo que o horizonte


da ação é um produto do jogo conforme encontrado [ambos pelo jogador] (Upton 2015, 48)233
Upton argumenta ainda que um bom jogo é aquele que gera estes horizontes de forma
consistente e interessante para os jogadores, algo que diz ser sustentado por seis
heurísticas (2015), que pensamos estarem integradas em Journey (2019) para que este
se constitua como um espaço de possibilidades (Figura 3.9.):

Escolha os Horizontes oferecem uma gama de ações possíveis.


Variação os Horizontes não se repetem.
Consequência as Ações produzem resultados.
Previsibilidade os Resultados podem ser antecipados.
Incerteza os Resultados não são predeterminados.
Satisfação os Resultados desejáveis são alcançáveis. (Upton 2015, 51)234

232 T.A.: Playable characters. Personagens controlados pelo jogador e não pelo sistema de jogo.
233 T.A.: “The horizon of intent is a product of the game as understood, whereas the horizon of action is a product of the game as
encountered [, both by players]” (Upton 2015 ,48).

234 T.A.: “We can think of a game as an engine for generating horizons of intent. A good game is one that consistently generates
interesting horizons. But What does it mean for a horizon to be "interesting"? What specific properties distinguish a good horizon
from a bad one? In this chapter, we will try to answer these questions. Step by step, we Will build up a framework of six general
heuristics that describe the characteristics of a good horizon of intent:

Choice Horizons offer a range of possible actions.


Variety Horizons aren't repeated.
Consequence Actions have outcomes.
Predictability Outcomes can be anticipated.
Uncertainty Outcomes aren't predetermined.
Satisfaction Desirable outcomes are attainable.” (Upton 2015, 51).

103
Figura 3.9. Journey (2019) apresentando um ecrã com dois jogadores fazem uma jornada juntos.23524

Por outro lado, espaços de probabilidades amplos que se podem navegar e explorar
livremente permitem exprimir os valores ou o estilo de jogo do jogador, além de abrir
possibilidades criativas para a sua travessia. Isto ocorre em Terraria (2011),236 que
permite minerar e escavar o terreno do mundo de forma livre, para dele extrair recursos
vegetais ou minerais para criar itens, abrigos, ou estruturas surpreendentes.

A possibilidade de moldar o terreno livremente também permite abrir caminhos que


não existiam para se poder progredir ou evitar oponentes no jogo (Figura 3.10).

Figura 3.10. Terraria (2011) apresentando um ecrã com terreno modificado.23725

235 Este ecrã de Journey (2019) foi consultado a 13 de dezembro de 2021 em:
https://www.odingaming.com/wp-content/uploads/2016/05/game-journey-4-2200x1022-1440x669.jpg

236 Jogos como Strider (1989), Metroid (1986) ou Megaman (1987) distinguem-se de Terraria (2011) pois neste a topologia do espaço
de jogo não é fixa, podendo o jogador transformá-la livremente para abrir outros caminhos para progredir, para criar novas formas
de resolver os desafios com que se depara.

237 Este ecrã de Terraria (2011) foi consultado a 13 de dezembro de 2021 em: https://i.redd.it/16n6b7mxrjg41.png

104
Os casos de Satisfactory (2020) ou Factorio (2020) são similares, o primeiro é um jogo
em perspetiva bidimensional e o segundo tridimensional. Ambos incidem sobre
exploração e processamento de recursos de terreno do mundo de jogo para montar um
vasto número de mecanismos. Estes mecanismos servem vários propósitos, da
produção de energia a processamento de matérias-primas, a tapetes mecanizados ou
braços mecânicos para as transportar ou armazenar. Estas cadeias de produção e
distribuição são concebidas livremente de acordo com limitações de terreno, tecnologia
disponível, ou objetivos a atingir em cada nível. Ou seja, constituem-se como um
espaço de probabilidades porque faculta a liberdade de edificação, podendo o jogador
focar-se em padrões de eficácia, estética pessoal, ou até ineficácia (Figura 3.11.).238

Figura 3.11. Factorio (2020), um ecrã apresentando uma configuração de mineração de recursos.26

Pode-se ainda tirar partido do espaço de probabilidades encarando as ações e as


respetivas consequências a partir de uma perspetiva que tira partido de um “potencial
contra-afetivo” provocado pelo jogo,239 como afirma Ruberg:

Então, por que continuo a jogar um jogo tão difícil quando sei que nunca vou ganhar? Porque
eu não quero vencer. Eu quero falhar. Quero sentir frustração, aborrecimento, deceção,
dominação e dor. Quero uma experiência de jogo, que estranhamente, não é divertida. (...)
Vamos brincar com o que dói. Vamos jogar de maneiras tão diferentes e estranhas quanto os
jogadores. E vamos agarrar essa dor, modelada pela personificação da jogabilidade, e

238 A liberdade de organização de meios de produção neste jogo pode ainda estimular a dialética com uma preocupação atual, o debate
sobre os recursos naturais limitados do nosso planeta.

239 Um jogo, pode, portanto, precipitar emoções no jogador, como o êxtase despoletado pela possibilidade de autodestruição durante
a sua exploração criativa que vai além das intenções dos designers (Ruberg 2015), já que as emoções nos jogos são importantes
pois são formas mais intensas de entendermos e nos relacionarmos com o mundo (Isbister 2017).

105
carregá-la connosco para além do jogo, levando-nos a encontrar outros locais lúdicos,
poderosos e esquecidos de potencial contra afetivo nas nossas vidas, tanto dentro do ecrã
como fora dele (Ruberg 2015, 122)240

Neste sentido, um exemplo será quando o jogador opta por se desviar do percurso da
corrida em Mario Kart 8 (2014) para vaguear pelo espaço de possibilidades do jogo, e.g.
levando o personagem jogável a cair em areia movediça (Figura 3.12). Esta atitude
transgressiva pode levar alguns jogadores à emoção não convencional do êxtase da
autodestruição.

Estou a jogar Mario Kart 8 (Nintendo, 2014), escolhi perder e adoro isso. (...) Estou distraído
pela alegria transgressiva de um modo de jogo que me permite romper os limites normais do
curso, e vaguear pela paisagem do nível à vontade (...) Paro para me maravilhar com um poço
rodopiante de areia movediça: um obstáculo de pista de corrida particularmente assustador
concebido para ser evitado a todo o custo. Alegremente, dirijo o meu kart para o abismo [de
c]ada vez que o meu personagem reaparece. Uma espécie de êxtase emerge - o êxtase da
autodestruição - e repito minha façanha de desafio até que todas as minhas vidas sejam
perdidas. (Ruberg 2015, 109)241

Figura 3.12. Mario Kart 8 (2014), ecrãs apresentando uma vista convencional do jogo (esquerda), e o um
obstáculo perigoso a que Ruberg se refere (centro e direita).24227

Contrariamente, The Suicide Game (2007) explora intencionalmente a possibilidade do


desvio de comportamentos e emoções convencionais no espaço de jogo (ver Figura 3.13).
O jogo é colaborativo, envolvendo dois jogadores que se revezam a controlar o
personagem jogável. O objetivo é provocar voluntariamente a morte do personagem
jogável, através do uso de veneno e armas brancas espalhados no espaço de jogo. Esta
exploração da temática do suicídio através do espaço de jogo pode provocar diversas
respostas emocionais nos jogadores.

240 T.A.: “So why do I keep playing such a difficult game when I know I will never win? Because I don’t want to win. I want to fail. I
want to feel frustration, annoyance, disappointment, domination, and pain. I want a play experience that is, queerly enough, no
fun. (...) Let us play what hurts. Let us play in ways that are just as different and just as queer as we are as players. And let us
take that hurt, modeled by the embodiment of gameplay, and carry it with us beyond the game, driving us to find other playful,
powerful, and overlooked sites of counter-affective potential in our lives both on-screen and off” (Ruberg 2015, 122).

241 T.A.: “I am playing Mario Kart 8 (Nintendo, 2014), I have chosen to lose, and I love it. (...) I’m blissfully distracted by the
transgressive glee of a play mode that allows me to breach the normal boundaries of the course, and I roam the level’s landscape
at will (...) I stop to marvel at a sucking, swirling pit of quicksand: a particularly frightening race-course obstacle designed to be
avoided at all costs. Joyfully contrarian, I drive my cart into the abyss. Each time mydriver respawns, I do it again. A kind of ecstasy
takes over—the ecstasy of self-destruction—and I repeat my feat of defiance until all my lives are lost.” (Ruberg 2015, 109)

242 Ecrãs acedidos a 13 de Dezembro de 2021 nos seguintes links: vista do jogo, obstáculo, pormenor do obstáculo.

106
No geral, os jogadores expressaram vários níveis de desconforto com o assunto do jogo. Ter
que matar o personagem do jogador era um pouco desconfortável, mas também uma fonte
de interesse devido à sua natureza transgressora. (...) Um jogador expressou o que
interpretamos como uma experiência alegre a partir do objeto da transgressão do jogo. "Isto
é incrível. Vocês são doentes." (Juul et al. 2007)243

Figura 3.13. The Suicide Game (2001), ecrãs apresentando o ambiente de jogo e o interface (esquerda,) a
condição de derrota (centro) e a condição de vitória (direita). Ecrãs de extraídos de (Juul et al. 2007)

Esta possibilidade desviante é visível também em Stair Dismount (2009), em que um


boneco articulado é atirado escada abaixo (ou de outros cenários perigosos) com o
intuito de provocar-lhe o máximo dano possível. O interface proporciona uma visão
interna das partes do esqueleto que são quebradas e uma pontuação associada. O jogo
adquire ainda o caráter de divertimento doloroso que Ruberg refere, quando este
enquanto jogador, cola uma fotografia da sua cara na do boneco (Figura 3.14).

Figura 3.14. Stair Dismount (2009), ecrãs apresentando o boneco a ser sujeito a (da esquerda para a
direita): quedas em escadas, acidentes usando uma bicicleta estática, ou numa pista de salto em
esquis.24428

Em suma, o espaço de probabilidades de um jogo pode materializar-se e envolver de


várias formas e facetas para produzir diversos estados de jogo. Estes estados podem
e.g. ser desafios emocionais num jogo, que segundo Bopp et al. (2018), podem
enriquecer e tornar a experiência dos jogadores mais relevantes ao estimularem nestes
um âmbito alargado de emoções. Mais, “quando um jogo consegue criar um número

243 T.A: “Overall, players expressed varying levels of discomfort with the subject matter of the game. Having to kill the player
character was somewhat uncomfortable, but also a source of of interest due to its transgressive nature. (...) One player expressed
what we interpret as a joyful experience from the transgression subject matter of the game. "This is awesome. You guys are sick."”
(juul et al. 2007).

244 Ecrãs acedidos a 13 de dezembro de 2021 em: https://apkpure.com/stair-dismount/com.secretexit.dismount

107
vasto de estados possíveis sem usar muitas regras, torna-se mais acessível aos seus
jogadores” (Adams e Dormans 2012, 27),245 e é esta plasticidade conferida pelas regras
do jogo sobre a qual nos iremos debruçar a seguir.

3.3.3. Plasticidade

Plasticidade refere-se à amplitude do campo de possibilidades de usar e/ou de adaptar


elementos de jogo de modos e para fins diversos que um jogo oferece ao seu jogador.246
Esta capacidade de adaptação pode ainda emergir da vontade e reflexão do jogador,
ancorando-se no pensamento divergente, no “e se?” (Hartnett 2016; Barron e
Harrington 1981; Torrence 1976; Guilford 1940). Este questionar o porquê das ações,
elementos e sistema de jogo operarem de certa forma, pode levar o jogador a alterar as
suas ações de forma criativa e assim obter resultados surpreendentes.
Assim, novas ações de jogo podem ser concebidas se o mundo de jogo proporcionar a
plasticidade para ser explorado pelo jogador. E.g. à medida que se progride nos vários
territórios do mundo de The Witcher 3: Wild Hunt (2015), o personagem jogável ganha
pontos de experiência que permitem aumentar as suas aptidões de combate, magia e
construção de artefactos. O mundo do jogo é dividido em várias regiões com economias
e territórios diferentes, que podem ser explorados livremente ou através de missões.
Existe um vasto número de itens para descobrir neste mundo, como armas ou poções.
A plasticidade deste jogo estende-se à sua narrativa que pode resultar em três finais
diferentes mediante as decisões e ações do jogador (Figura 3.15).

Figura 3.15. The Witcher 3: Wild Hunt (2015) apresentando ecrãs com um cenário de combate (esquerda),
travessia de barco (centro) e exploração a cavalo (direita).24729

Outro exemplo similar é Xenoblade Chronicles 2 (2017), cuja plasticidade assenta na


combinação de armas e equipamento nas personagens jogáveis. O mundo de jogo possui
ainda diversos territórios, que ampliam a variedade de itens a encontrar e portanto, a
combinar. Estas combinações podem então ser usadas pelos jogadores para levar a cabo

245 T.A.: “In addition, when a game can create a large number of possible states without using many rules, the game will be more
accessible to players.” (Adams e Dormans 2012, 27).

246 StarCraft (1998) pode ser usado para treinar plasticidade cognitiva, pois força os jogadores a gerirem simultaneamente uma
multiplicidade de fontes de informação em constante actualização (Glass, Maddox e Love, 2013).
247 Ecrãs consultados a 12 de dezembro de 2021 em: https://thewitcher.com/en/witcher3

108
missões, algumas em equipa com outros jogadores (Figura 3.16).

Figura 3.16. Xenoblade Chronicles 2 (2017) apresentando um ecrã com o cenário de combate (esquerda)
e a exploração do mundo de jogo (direita).24830

Aprender a negociar e a colaborar entre jogadores são duas das possibilidades


proporcionadas pela combinação de open-world e sandbox que podemos encontrar em
Minecraft (2009), o que permite que recursos de jogo possam ser moldados por
jogadores em conjunto, o que se traduz num grau aumentado de plasticidade, como
ilustrado na Figura 3.17.

Figura 3.17. Minecraft (2009) apresentando um ecrã com uma representação de um Macintosh
integrado na paisagem do jogo.24931

Este jogo é ainda mais plástico quando os jogadores recorrem a programação para
desenvolver e atribuir comportamentos a determinados objetos dentro do espaço do

248 Ecrãs consultados a 12 de dezembro de 2021 em:


https://gameranx.com/wp-content/uploads/2017/12/Xenoblade-Chronicles-2-Battle.jpg
https://www.nintendo-insider.com/wp-content/uploads/2017/06/xenoblade-chronicles-2-e3-2017-screenshot-3.jpeg
249 Imagem acedida a 8 de dezembro de 2021 em: https://i.insider.com/54d4f90edd0895ed248b45fc?width=1200

109
jogo. Isto permite aos jogadores alterarem em tempo real o que os personagens jogáveis
e não jogáveis podem fazer, como minerar recursos mais rapidamente, deixar um rasto
de flores ou saltar muito alto. Ou seja, por meio de uma programação acessível, 250 o
jogador aproxima-se do papel de designer de jogo (Figura 3.18).

Figura 3.18. MakeCode for Minecraft (202) apresentando um ecrã com o interface de programação
(esquerda) a escavação de terreno acelerada com código (em cima à direita), e uma modificação que
permite a um personagem de jogo deixar um rastro de flores (em baixo à direita).25132

Em vez de pensar que estão a programar, os estudantes estão a jogar um jogo, estão a
construir o seu próximo superpoder. Minecraft é um jogo [que se] encaixa na experiência de
codificação do próprio jogo. (...) A capacidade de escrever código e ver imediatamente os
resultados no Minecraft, como avatares que podem saltar 100 blocos de altura, cavar
montanhas e fazer chover galinhas, fez com que os meus estudantes corressem pela sala de
aula de ecrã em ecrã para ver o que seus colegas faziam e gritando os endereços IP de seus
servidores pela sala. (de Halleux, 2017)252

Nesta sequência, a plasticidade do jogo pode ser ainda incrementada com recurso a
editores de jogo que permitem edificar mundos originais de raiz. Um exemplo com uma
operação muito intuitiva é The Aurora Toolset (2002), o editor de Neverwinter Nights
(2002), ambos ilustrados na Figura 3.19. O editor permite criar histórias e aventuras
para serem jogadas neste jogo. Permite ainda a utilizadores avançados a criação de
comportamentos complexos e mudanças drásticas nas regras de cada história.

250 Linguagens de programação por objetos são mais acessíveis, dado que a programação é feita combinando blocos de código sob
forma visual como em MakeCode for Minecraft (2021), por isso é usado em aulas de introdução à programação.

251 Ecrãs consultados a 19 de dezembro de 2021 em:


https://minecraft.makecode.com/examples/super-powers https://minecraft.makecode.com/

252 T.A.: “Instead of thinking they are coding, students are playing a game, they are building their next superpower. Minecraft is a
game. fits the coding experience into the game itself. (...) The ability to write code and immediately see the results in Minecraft,
such as avatars that can jump 100 blocks high, dig through mountains and make it rain chickens, sent my students running around
the classroom from screen to screen to see what their classmates did and shouting the IP addresses of their servers across the
room.” (de Halleux, 2017).

110
Figura 3.19. Aurora Toolset (2020) apresentando um ecrã do editor (topo) e Neverwinter Nights: Enhanced
Edition (2020) apresentando um ecrã de luta no decurso do jogo.25333
Já Teardown (2020) explora a plasticidade de uma maneira contrária, através de formas
criativas de destruir o seu mundo. Ou seja, em vez de usar recursos para criar algo,
trata-se de demolir terrenos, estruturas, ou esconder objetos debaixo de água ou
escombros no mundo de jogo. Para tal o jogador encarna um perito que acorda missões
de destruição específicas com personagens controladas pelo computador. As ações de
destruição são levadas a cabo pelo jogador com meios à sua disposição, como marretas,
guindastes, ou veículos pesados, na ordem e local preciso que entender, como ilustrado
na Figura 3.20.

253 Ecrãs consultados a 16 de dezembro de 2021 em:


https://jonathanliaw.files.wordpress.com/2008/11/nwn_aurora_01.jpg
https://store.steampowered.com/app/704450/Neverwinter_Nights_Enhanced_Edition/

111
Figura 3.20. Teardown (2020) apresentando um ecrã com as missões a levar a cabo (esquerda) e duas
cenas de demolição no decurso do jogo (direita em cima e em baixo).25434

Em suma, quanto maior a plasticidade num jogo maior a extensão e o âmbito de facetas
que se podem explorar neste, algumas até de forma totalmente imprevisível.

Uma das qualidades maravilhosas dos espaços de jogos digitais é sua plasticidade e
flexibilidade. A ênfase nos últimos anos em espaços de jogos 3D foto realistas e logicamente
consistentes evitou abordagens experimentais para design de espaço em favor de espaços
cada vez mais "realistas". No entanto, ao explorar a flexibilidade do meio do computador, o
espaço pode ser uma ferramenta narrativa poderosa. (Salen e Zimmerman 2004, 21)255

Assim, lidar com a plasticidade de um jogo estimula a reflexão para lidar criativamente
com os seus assuntos, e até encontrar correlações destes com questões no mundo físico
real. Por isso, a seguir debruçamo-nos sobre o potencial da reflexão em jogos.

3.3.4. Reflexão

Por reflexão entendemos a capacidade de nos focarmos no jogo como um todo, e na


experiência estética que este proporciona para pensar em situações reais. A reflexão
pode ser facilitada pelo caráter expressivo dos jogos, que segundo Ian Bogost (2007)
assenta em retórica, procedimentalidade e crítica. A retórica refere-se à persuasão
expressa de forma efetiva, a procedimentalidade refere-se a formas de criar, explicar
ou entender processos que definem como as coisas operam.

A retórica procedimental, é portanto, a prática de utilização persuasiva de processos. Mais


especificamente, a retórica procedimental é a prática de persuadir através de processos em
geral e processos computacionais em particular. (...) A retórica procedimental é uma técnica

254 Ecrãs consultados a 16 de dezembro de 2021 em: https://store.steampowered.com/app/1167630/Teardown/

255 T.A.: “One of the wonderful qualities of digital game spaces is their plasticity and flexibility. The emphasis in recent years on
photorealistic, logically consistent 3D game spaces has eschewed experimental approaches to space design in favor of increasingly
"realistic" ones. Yet by exploiting the flexibility of the computer medium, space can be a powerful narrative tool. (...) [This because
the] emergent narratives [from Atari’s 2600 Game Adventure (1980)] are ensconced within the larger fairytale context of the game
and are made possible by the way that the simple yet structurally intricate space of Adventure frames and enables game action.
The formal game elements become narratively meaningful within the story context that the game provides.” (Salen e Zimmerman
2004, 21).

112
para argumentar com sistemas computacionais e para deslindar argumentos computacionais
que outros criaram. (Bogost 2007, 3)256

A retórica, acrescenta Gonzalo Frasca (2007), tem um papel predominante enquanto


elemento de análise para que o jogador construa significados num jogo.

Se tivesse de resumir a minha abordagem à retórica em palavras simples, diria que a minha
principal preocupação é o jogo como uma atividade de compreensão do mundo. A retórica do
jogo ajudar-nos-á a compreender este processo como um processo comunicacional, e
portanto, social. Este processo tem sempre uma dimensão estética e política e é por isso que
vou prestar especial atenção a estes dois elementos no modelo retórico que [sugeri]. (Frasca
2007, 3)257

Assim, os jogos podem ser concebidos com propósitos artísticos, políticos, ou de crítica
ou intervenção social, como forma de entender questões culturais e os próprios jogos
(Flanagan 2009, 2).

Jogos críticos criticam as convenções do ato de jogar, expectativas dos jogadores e a miríade
de entidades e relações que definem jogos digitais. Isto inclui a sua relação com as sociedades
em que [tais relações] existem. Fazem-no proporcionando novas experiências de jogo que
questionam o status quo ou enfatizam os seus pressupostos. (...) Os jogos críticos usam a
crítica como premissa de design de jogo. Têm um objetivo – [fazer] comentários críticos
através da jogabilidade. (Grace 2014, 2)258

Isto é visível em jogos como Bioshock (2007), ilustrado na Figura 3.21, que usa a sua
narrativa para guiar e apresentar ao jogador questões sociais, ideológicas e políticas.
E.g. as decisões de carácter ético do jogador, como poupar a vida a personagens não
jogáveis afetam o desenrolar da narrativa, podendo determinar fins de jogo diferentes.

256 T.A.: “Procedural rhetoric, then, is a practice of using processes persuasively. More specifically, procedural rhetoric is the practice
of persuading through processes in general and computational processes in particular. (...) Procedural rhetoric is a technique for
making arguments with computational systems and for unpacking computational arguments others have created.” (Bogost 2007,
3).

257 A.T.: “If I had to sum up my approach to rhetoric in simple words, I would state that my main concern is with play as an activity
for understanding the world. Play rhetoric will help us to understand this process as a communicational – and therefore, social –
one. This process always carries an aesthetical and political dimension and that is why I will pay particular attention to these two
elements in the rhetorical model that I [suggested].” (Frasca 2007, 3)

258 A.T.: “Critical games critique conventions of gameplay, player expectations, and the myriad of entities and relationships that
define digital games. This includes their relationship to the societies in which they exist. They do so by providing new game
experiences that question the status quo or emphasise the assumptions in it. (...) Critical games use critique as their game design
premise. They have one goal – critical commentary through gameplay.” (Grace 2014, 2).

113
[o] jogo de atirador em primeira pessoa BioShock [2007] examina a noção de uma sociedade
distópica fundada na moral objetivista apresentada no famoso Atlas Shrugged de Ayn Rand
[1957]. (...) Como tal, um argumento forte é que os designers de BioShock pretendiam que seu
jogo fosse considerado de uma maneira semelhante à forma como Atlas Shrugged era conside-
rado normalmente: como uma reflexão sobre as relações entre liberdade individual, interesse
próprio e poder. (Jurgensen 2018, 64)259

Figura 3.21. Bioshock (2007) apresentando um ecrã com a publicidade no mundo de jogo que evoca
questões sociais, ideológicas e políticas (esquerda), e duas cenas que têm a ver com relações de poder
entre personagens não jogáveis e personagem jogável (centro e direita).26035

Em outro exemplo, a reflexão pode ser incitada pela estética dos jogos, como puzzles
constituídos por imagens abstratas em Dys4ia (2012), com o intuito de ilustrar a
experiência transgénero de Anthropy. Algumas ações e imagens evocam e.g. o
desencaixe em relação a comportamento convencional, ou interações não desejadas,
como ilustrado na Figura 3.22.

Figura 3.22. Dyis4ia (2007) apresentando um ecrã que evoca desencaixe em relação ao próprio corpo
(esquerda) e outro desencaixe em relação às normas de comportamento de género (direita).26136

No caso de Keep me Occupied (2012) os jogadores revezam-se a ocupar interruptores no


jogo para manter o caminho aberto aos seguintes, numa alusão à cooperação para
atingir um objetivo comum. Este jogo foi um dos títulos executados pelo OAK-U-TRON
201X, uma arcade móvel construída pela RPM Collective. A arcade foi usada pelo
movimento “Occupy Oakland” em 28 de janeiro de 2012, para promover a

259 A.T.: “For instance the first-person shooter BioShock [2007] examines the notion of a dystopian society founded on objectivist
morals featured in Ayn Rand's famous Atlas Shrugged [1957]. (...). As such, a strong case could be made that the designers of
BioShock intended for their game to be regarded in a manner similar to the way Atlas Shrugged was standardly regarded: as a
reflection on the relationships between individual freedom, self-interest, and power.” (Jurgensen 2018, 64).

260 Ecrãs consultados a 16 de dezembro de 2021 em: https://store.steampowered.com/app/7670/BioShock/

261 Ecrãs consultados a 18 de dezembro de 2021 em: https://www.digiart21.org/art/dys4ia

114
transformação de um edifício abandonado num centro comunitário (Cocke 2012), como
ilustrado na Figura 3.25.

Figura 3.23. Keep me Occupied (2012) apresentando um ecrã do jogo (esquerda), a arcade móvel OAK-
U-TRON 201X (centro) e uma fotografia do uso desta na manifestação (direita).26237

Um jogo pode servir para refletir e instigar atitudes criativas para mitigar problemas
atuais, ao envolver ações cujo risco e consequências parecem reais. Um exemplo é a
especulação imobiliária e respetivas implicações evidentes em Nova Alea (2016),
ilustrada na Figura 3.24.

Figura 3.24. Nova Alea (2016) apresentando um ecrã com edifícios abstratos para interagir com ações
de especulação imobiliária.38

Outro exemplo de instigação à reflexão sobre uma problemática atual, são os sintomas
da depressão refletidos no ambiente de Tie: a game about depression (2108). O ambiente
é estilizado com tons de cinza para evocar o estado emocional do personagem jogável,

262 Montagenm de ecrãs consultados a 18 de dezembro de 2021 em:


https://www.polygon.com/2012/10/29/3572852/the-occupy-movements-rolling-arcade-debuts-amidst-roiling-riots
https://www.engadget.com/2012-04-09-occupy-the-joystick-oak-u-tron-201x-and-keep-me-occupied-take-d.html

115
o que é complementado com glitching263 para evocar como as emoções se refletem na
cognição em estados de depressão. (Figura 3.25).

Figura 3.25. Tie: a game about depression (2108) apresentando dois ecrãs com a ambiência do jogo.26439

Nos jogos, as metáforas podem estimular reflexão no jogador, e.g. as estátuas


fragmentadas em Gris (2018) apontam para a reconstrução da vida da personagem
jogável. Os poderes que se vão ganhando ao progredir nos puzzles do jogo refletem
estes passos de reconstrução. Estes poderes mudam a forma do vestido da personagem,
em forma de cubo, para ancorar-se ao terreno ou demolir plataformas, estendendo-se
como asas para planar ou nadar. Ou seja, estas ações evocam a autoconfiança ganha e
adaptação ao meio como forma de recuperar o que foi perdido que é deixado à
interpretação do jogador (Figura 3.26).

Figura 3.26. Gris (2018) apresentando dois ecrãs com a ambiência do jogo.26540

Já The Stillness of the Wind (2019) é uma metáfora sobre solidão e perda através das ações
da personagem jogável num local remoto. A solidão reflete-se nas rotinas do quotidiano

263 O Glitching a que nos referimos não são ações de aproveitamento do jogo usado por jogadores em competição, mas falhas ou
distorções visuais introduzidos propositadamente pelo designer para evocar sintomas de depressão.

264 Ecrãs consultados a 19 de dezembro de 2021 em: https://tonynowak.itch.io/agameaboutdepression

265 Ecrãs consultados a 19 de dezembro de 2021 em: https://store.steampowered.com/app/683320/GRIS/

116
determinadas pelo jogador. A perda traduz-se em saber sobre os que morreram ou
foram para outras paragens. A perda é revelada pela personagem jogável enquanto
explora o mundo de jogo, ou por uma personagem não jogável – um vendedor
ambulante – com quem troca produtos e recebe correio de familiares (Figura 3.27)

Figura 3.27. The Stillness of the Wind (2019) apresentando um ecrã com tarefas do quotidiano
(esquerda) e outro ecrã com um momento raro de interação com outro personagem.26641

A metáfora em Wolfanddotcom (2017) reside em algo partilhado por lobos e humanos -


ambos são seres sociais que procuram estabelecer ligações inter-espécie. Os processos
e ficheiros executados pelo sistema computacional do jogo geram um mundo abstrato.
Este mundo é percorrido por lobos virtuais controlados por jogadores. Os jogadores
montam figuras de lobos construídas em tubo metálico, cujas orelhas permitem
controlar os lobos virtuais no jogo (Figura 3.28).

Figura 3.28. Wolfanddotcom (2017) apresentando um ecrã com a instalação e os jogadores a operarem a
interface e o jogo (esquerda) e uma visão geral do ecrã do mundo de jogo (direita).26742

Papers Please (2013) faz alusão à balança de poder nas mãos de um agente alfandegário
em contexto de fronteiras em guerra. O jogador assume este papel no jogo tendo de
filtrar a entrada de pessoas adversas ao regime do seu lado da fronteira, com base na

266 Ecrãs consultados a 19 de dezembro de 2021 em: https://memoryofgod.itch.io/

267 Ecrãs consultados a 19 de dezembro de 2021 em: https://www.andre-sier.com/wolfanddotcom/Wolfanddotcom/

117
análise de vistos de entrada e até raios-x. Acontece que facultar a passagem pode ser
uma ação errada ou propositada, pois o jogador ainda tem de gerar dinheiro para
sustentar a sua família, como ilustrado na Figura 3.29.

Figura 3.29. Papers Please (2013) apresentando um ecrã com o posto de trabalho do jogador mostrando
o uma das pessoas que tenta passar a fronteira e respetivos documentos de identificação.26843

Em suma, a reflexão pode ser estimulada por uma variedade de situações fictícias ou
representações simuladas de algo no jogo com as quais o jogador seja confrontado. Ou
seja, a elaboração de novos significados através do pensamento para lidar com o não
familiar ou o desconfortável é central aos jogos

Vivenciar algo novo e desconhecido causa desconforto e atrito na experiência do jogar. O que
apresenta novos campos de possibilidades e contextos aos jogadores, fazendo-os produzir
novos significados a partir dessas novas experiências, é o objetivo do que chamamos de atrito
estético. Neste paradigma, o ônus da vivência do jogar passa da diversão para a priorização
da construção de significado. Isto não significa que os jogos regidos pela fricção estética não
possam ser divertidos. Isto significa que essa diversão será inevitavelmente afetada por
algum atrito. (Cardoso et al. 2019, 2)269

Estes significados assentam na capacidade do jogador em recombinar elementos de


jogo entre si para criar novas ideias e ações de jogo. Portanto, a seguir, debruçamo-nos

268 Papers Please (2013), ecrã acedido a 22 de outubro de 2021, em:


https://www.newgamenetwork.com/images/uploads/gallery/PapersPlease/papersplease_04.jpg

269 T.A.: “Experiencing something new and unfamiliar causes discomfort and friction in the experience of play. Presenting new fields
of possibilities and contexts to players, making them produce new meanings from these new experiences, is the goal of what we
call aes- thetic friction. In this paradigm, the onus of the experience of play shifts from fun to prioritising the construction of
meaning. This does not mean that games governed by aesthetic friction cannot be fun. It means that such fun will inevitably be
affected by some friction.” (Cardoso et al. 2019, 2).

118
sobre o potencial da recombinação em jogos.

3.3.5. Recombinar

A recombinação é um algo intrínseco à criatividade, e refere-se a aptidões para se poder


combinar conhecimentos e executar produtos originais em várias esferas da vida
(Bulatova 2020). Nachmanovitch afirma que “o trabalho criativo é brincar; é
especulação livre usando os materiais de uma forma escolhida. A mente criativa brinca
com os objetos que ama, os artistas brincam com as cores e os espaços.” (1990, 42).270
O objetivo da recombinação estipula o seu tempo de vida, pois é uma solução com
caraterísticas singulares e é contingente a uma situação (Chatterjee 2017).

A recombinação de itens recolhidos no mundo de Diablo II (2010) é feita a partir de um


interface próprio, uma caixa onde itens são reunidos para dar origem a algo diferente.
Este processo denominado no jogo por transmutação permite criar ou melhorar armas,
equipamentos ou poções que auxiliem a ultrapassar os desafios do jogo, como ilustrado
na Figura 3.30.

Figura 3.30. Diablo II (2000) apresentando um ecrã com o interface para recombinação: a caixa para
transmutar itens (esquerda), e o inventário de objetos carregados e usados pelo jogador (direita).27144

Algumas recombinações são apenas possíveis se houver negociação de informação e

270 T.A.: “Creative work is play; it is free speculation using the materials of one chosen form. The creative mind plays with the objects
it loves, Artists play with colour and spaces. Musicians play with sound and silence. Eros plays with lovers. Gods play with the
universe. Children play with everything they can get their hands on.” (Nachmanovitch, 1990, 42).

271 Diablo II (2000), ecrã acedido a 22 de outubro de 2021, em: https://i.ytimg.com/vi/6Sx9z1lkzCc/maxresdefault.jpg

119
itens entre personagem jogável e personagens não-jogador, como no cenário de guerra
de This War of Mine: The little ones (2015). Esta negociação permite obter coisas que de
outra forma não se teriam acesso e ampliar hipóteses de recombinação além da
subsistência, que permitem manter a esperança das personagens-crianças do mundo
de jogo (Figura 3.31).272

Figura 3.31. This War of Mine: The little ones (2015) apresentando um ecrã em que o personagem jogável
improvisa um brinquedo para manter o moral da criança a seu cargo.27345

A recombinação pode ser desvalorizada se os itens criados não são tão eficazes face ao
uso que o jogador tem em vista em Stardew Valley (2016), como receitas que geram itens
não comestíveis, ilustrado na Figura 3.32.

272 Acrescentam-se outros exemplos que se constituem como pólos de reflexão porque são dilemas relacionados com a realidade
(Bjørkelo 2018), de novo dilemas éticos em Life is Strange (2015), decisões sobre vida ou morte em Mass Effect (2007) e
reminiscências da vivência do designer atuadas de forma criativa em abstrato em Under the Sky (sem data).

273 Ecrã acedido a 22 de outubro de 2021, em: https://tlo.thiswarofmine.com/ita/images/screens/twom_tlo_05.jpg

120
Figura 3.32. Stardew Valley (2016) apresentando um ecrã com a interface que permite criar itens a
partir dos disponíveis no inventário do jogador.27446

Em suma, as possibilidades de recombinação num jogo podem ampliar a interação do


jogador a vários níveis, e portanto gerar formas criativas de realizar a travessia de um
jogo. Os resultados de uma recombinação podem ser dados como adquiridos se existir
um padrão de receita de jogo que devolva elementos expectáveis. Contudo, é na
incerteza destes resultados que a experiência de jogo se torna mais real, e portanto
atraente, porque está mais próxima da realidade do mundo físico.

Ao lado do envolvimento, a inteligibilidade é o segundo componente da experiência da


realidade. Quando atividades ou eventos se tornam ininteligíveis, quando alguém ‘descobre
que nenhum quadro particular é imediatamente aplicável’, então a experiência ‘destinada a
se estabelecer em uma forma mesmo enquanto está começando, não encontra forma e,
portanto, nenhuma experiência.’ (Goffman 1986: 380) (...) Ao mesmo tempo, [essa incerteza]
é tão fascinante existencialmente que gera um envolvimento profundo. Portanto, nós
procuramos ativamente esta incerteza nos bolsos protegidos da media e performances
ficcionais. (Deterding 2013, 69)275

Daqui concluímos que a incerteza é central à experiência dos jogadores, sendo o assunto
sobre o qual nos debruçamos a seguir.

3.3.6. Incerteza

A incerteza refere-se ao conhecimento sobre situações que envolvem informação

274 Ecrã acedido a 22 de outubro de 2021, em:


https://interfaceingame.com/wp-content/uploads/stardew-valley/stardew-valley-craft-1920x1080.png

275 T.A.: “Next to involvement, intelligibility is the second component of the experience of reality. When activities or events become
unintelligible, when one ‘finds that no particular frame is immediately applicable’, then experience ‘meant to settle into a form
even while it is beginning, finds no form and therefore no experience. (Goffman 1986: 380) (...) At the same time, [this uncertainty]
is so existentially fascinating that it generates deep involvement. Hence, we actively seek it out it in the safely couched pockets
of fictional media and performances.” (Deterding 2013, 69).

121
incompleta ou desconhecida. A incerteza é central aos jogos encontrando-se nos
caminhos traçados por jogadores, na forma como estes lidam com desafios de jogo, e
nas surpresas que estes escondem. Greg Costikyan argumenta que “Na conceção de
jogos, um grau de incerteza é essencial. (...) Os jogos devem ser, em certo sentido,
‘difíceis de usar’ ou, pelo menos, não triviais de ganhar.” (2015, 16).276 Assim, antes de
criar soluções para lidar com incerteza é necessário entender bem o seu âmbito, que
pode variar imenso.

A incerteza pode assumir várias formas, e.g. em Alien: Isolation (2014), o jogador dispõe
de um vasto número de itens para criar armas, mas isso não assegura que estas sejam
eficazes na luta contra o alienígena (o seu oponente) no jogo. Estamos perante uma
dinâmica de jogo provocada pela incerteza da funcionalidade e eficácia das armas
criadas pelo jogador. Esta dinâmica auxilia a colocar o próprio jogador em permanente
estado de alerta no jogo, e estimula atos criativos por parte deste para tentar conceber
meios de luta eficazes (Figura 3.33).

276 T.A.: “In designing games a degree of uncertainty is essential. (...) Games are supposed to be, in some sense, “hard to use”, or at
least, nontrivial to win.” (Costikyan 2015, 16).

122
Assim, pode ser uma combinação da variedade de ferramentas e da sua eficácia que é
fundamental para facilitar o comportamento criativo, e.g. pode ter-se uma grande quantidade
de utensílios [participante masculino com 35 anos] mas nenhuma delas importa realmente em
termos de progressão no jogo). (Hall et al. 2020, 873)277

Figura 3.33. Alien: Isolation (2014) apresentando um ecrã como interface para criar itens a partir do que
é encontrado no mundo de jogo (esquerda), e outro com um artefacto criado (direita)27847

A incerteza pode decorrer também da forma desafiante e incomum de controlar o


personagem jogável de jogo, como em I am Bread (2015). O personagem jogável é uma
fatia de pão em que o jogador controla todos os seus quatro cantos, num ambiente que
é uma simulação virtual de física. A dificuldade reside na operação simultânea, por
parte do jogador, de controlos dedicados a partes específicas do personagem jogável,
sendo possível adquirir a maestria para fazer as acrobacias necessárias para atravessar
o mundo de jogo, e atingir um objetivo: e.g. tornar-se uma tosta (Figura 3.34.).

Figura 3.34. I am Bread (2015) apresentando um ecrã de um dos ambientes a atravessar (esquerda), e
outro com o personagem jogável em movimento (direita)27948

Ainda, ultrapassar a incerteza das forças que se opõem ao jogador num jogo pode
requerer esforços de equipa, a sinergia entre personagens jogáveis com capacidades
diferentes, como em Brothers: A Tale of Two Sons (2013), em Commandos (2006), ou na

277 T.A.: “This was illustrated by one participant’s screenshot of: “you have all these tools, but very few of them actually work on the
most dangerous thing in the game” (male, 35). Thus, it may be a combination of the variety of tools and their effectiveness that is
key to facilitating creative Behavior (e.g., you can have a large amount of “gimmick” (male, 35) tools but none of them actually
matter in terms of progressing in the game).” (Hall et al. 2020, 873).

278 Ecrãs consultados a 19 de outubro de 2021, em:


https://www.ign.com/wikis/alien-isolation/Items_and_Weapons
https://oyster.ignimgs.com/mediawiki/apis.ign.com/alien-isolation/d/d0/Aiextra35.png?width=640

279 Ecrãs consultados a 22 de dezembro de 2021, em: http://www.iambreadgame.com/overview/

123
sua sequela Desperados III (2020), ilustrada na Figura 3.35.

Figura 3.35. Desperados III (2020), apresentando quatro ecrãs que mostram o potencial criativo da
articulação dos personagens jogáveis para progredir no jogo: a) Cooper coloca um inimigo
inconsciente; b) McCoy deixa um rasto de pegadas para atrair a atenção; c) Isabelle amarra os
inimigos inconscientes; d) Hector procura esconderijo na vegetação e fica prestes a atacar o posto de
vigia.28049

Mais, ao destruir fontes de luz artificial em The Darkness II (2012), o jogador altera a sua
visibilidade no mundo de jogo, o que pode limitar o que os oponentes fazem contra si,
pois embora seja incerto, já que o não conseguem ver tão facilmente. Existem jogos que
assentam ativamente na incerteza da travessia como Miegakure (s.d.). Este jogo
computa e simula simultaneamente quatro dimensões espaciais diferentes, contudo
apenas conseguimos visualizar três dimensões de cada vez, sendo que podemos viajar
entre os vários universos tridimensionais que constituem o universo, como ilustrado
na Figura 3.36.

Figura 3.36. Miegakure (s.d.) apresentando ecrãs que mostram a transição entre múltiplas dimensões
de jogo que o jogador pode atravessar para progredir.28150

A incerteza pode existir num jogo para uma vez ultrapassada, permitir ao jogador

280 Ecrãs extraídos de um vídeo acedido a 22 de outubro de 2021, em: https://youtu.be/gcb4kFtfhCQ

281 Este jogo ainda não foi publicado, contudo, já está anunciado em website próprio e na plataforma STEAM. Os ecrãs foram extraídos
de um vídeo consultado a 22 de Outubro de 2021, em: https://thumbs.gfycat.com/BelatedThornyGoat-mobile.mp4

124
testemunhar uma variedade de consequências, ou até promover consciencialização
para situações bem reais. E.g. em Do Not Feed the Monkeys (2018), o jogador está limitado
a reportar resultados de videovigilância à empresa que lhe paga para exercer essa
tarefa, como ilustrado na Figura 3.37. Contudo, ele pode furar limites de ética, tentando
extorquir dinheiro aos sujeitos vigiados sob a ameaça de revelar algo que não querem
ver divulgado, ou apenas denunciar abusos. Ao romper com estes limites, o personagem
jogável pode sofrer consequências incertas, desde ver as suas tentativas de extorsão ou
denúncia goradas a enfrentar problemas contratuais.

Figura 3.37. Do Not Feed the Monkeys (2018) apresentando um ecrã com o posto de trabalho do jogador
mostrando o monitor com os vários cenários de videovigilância.28251

Assim, a incerteza num jogo estimula o jogador a procurar formas de obter a


informação em falta para o resolver o jogo. Assim, a seguir, debruçamo-nos o papel da
informação num jogo e as várias formas que pode tomar.

3.3.7. Informação

Para os humanos é difícil lidar com muita informação porque temos uma capacidade
mental limitada para a processar. Ainda, para percebermos como as coisas funcionam
precisamos de experiências empíricas sobre o assunto que versam.

Um fato inerente à vida mental de crianças e adultos é que há uma capacidade limitada de
processamento de informação - a nossa amplitude, como é chamada, pode compreender seis
ou sete itens não relacionados simultaneamente. (...) [Portanto] é fundamental que, antes de
ser exposta a uma variedade de materiais sobre um assunto, a criança tenha primeiro uma
ideia geral de como e onde as coisas se encaixam. Muitas vezes, o desenvolvimento da ideia
geral vem de uma primeira ronda de experiência com incorporações concretas de ideias que

282 Ecrã consultado a 22 de outubro de 2021, em: https://store.steampowered.com/app/658850/Do_Not_Feed_the_Monkeys/

125
estão próximas da vida de uma criança. (Bruner 1979, 123)283

Com isto em mente, segundo James Paul Gee (2004a), apresentar informação
necessária e de forma atempada são dois princípios essenciais num design de jogo, seja
para aprender a sua operação ou para usá-lo como veículo de transmissão de
conhecimento. Ainda, aprender exige “um envolvimento ativo com o mundo através de
ações, diálogo, produção de conhecimento e mudar-nos a nós próprios e ao mundo”
(Gee 2008, 65).284

O conhecimento surge apenas por meio de invenção e reinvenção, por meio da investigação
inquieta, impaciente, contínua e esperançosa que os seres humanos procuram no mundo,
com o mundo e uns com os outros (Freire 2005, 72)285

O princípio de informação atempada de Gee (2004a) e a reinvenção do conhecimento


através da articulação entre indivíduos de Freire (2005) são demonstrados por jogos. É
o caso do jogo Thomas Was Alone (2012) cujos personagens jogáveis possuem aptidões e
configurações retangulares diferentes, mas só surgem em momentos-chave para
serem usados em conjunto para ultrapassar desafios. Ou seja, o jogador faz agir estas
personagens em combinações e sequências adequadas em resposta a desafios de jogo
(Figura 3.38).

283 T.A.: “The binding fact of mental life in child and adult alike is that there is a limited capacity for processing information—our
span, as it is called, can comprise six or seven unrelated items simultaneously. (...) [So] it is essential that, before being exposed
to a wide range of material on a topic, the child first have a general idea of how and where things fit. It is often the case that the
development of the general idea comes from a first round of experience with concrete embodiments of ideas that are close to a
child’s life.” (Brunner 1979, 123).

284 T.A.: “Learning involves an active engagement with the world, with words, and with other people. It is not just about information.
It is about actions, dialogue, producing knowledge, and changing ourselves and the world, as well.” (Gee 2008, 65).

285 T.A.: “Knowledge emerges only through invention and re-invention, through the restless, impatient, continuing, hopeful inquiry
human beings pursue in the world, with the world, and with each other.” (Freire 2005, 72).

126
Figura 3.38. Thomas Was Alone (2012) apresentando um ecrã com Thomas (o rectângulo vermelho)
auxiliado por Claire (o quadrado azul) a fazer a travessia de poças de água tóxica.28652

Já em Oxygen not included (2017) assenta em usar informação sobre o que é necessário
para prover necessidades humanas. A partir desta base de informação o jogador cria e
reestrutura o mundo para garantir a sobrevivência dos personagens, construindo
instalações de repouso e esgotos, e produzindo alimentos e oxigénio. As necessidades
vão crescendo em complexidade em simultâneo com o evoluir da tecnologia ao dispor
dos jogadores, o que permite construir estruturas mais avançadas, como laboratórios
de pesquisa no jogo. O jogo combina criatividade com estratégia. Criatividade ao escavar
o asteroide para otimizar a exploração de recursos, e estratégia na priorização de tarefas
para manter as condições de habitabilidade do asteroide (Figura 3.39.).

286 Ecrã consultado a 22 de outubro de 2021, em:


http://quovx4d83tr2hp1r22mgwa1m.wpengine.netdna-cdn.com/wp-content/uploads/2015/01/thomas-was-alone-story.jpg

127
Figura 3.39. Oxygen not included (2017) apresentando um ecrã que mostra uma de entre múltiplas
configurações de instalações a criar pelos jogadores, enquanto forma de evoluir e progredir no jogo.28753

Os dois jogos seguintes são de perícia, o que neste caso quer dizer lidar com informação
muito rapidamente. No caso de Super Hexagon (2012), a informação é apresentada ao
jogador num ritmo frenético desde o primeiro minuto de jogo. Esta informação tem a
forma de figuras geométricas simples que variam e se aproximam do personagem
jogável – uma forma triangular – durante o jogo. Para evitar de colidir com estas
figuras, o jogador tem de rodar rapidamente sobre o centro do ecrã para conseguir
navegar entre arestas abertas, como ilustrado na Figura 3.40.

Figura 3.40. Super Hexagon (2012) apresentando uma sequência de ecrãs (de 1 a 6) que reflete a
evasão constante para progredir no jogo.28854

287 Ecrã de Oxygen not included (2017) consultado a 22 de outubro de 2021, em:
https://store.steampowered.com/app/457140/Oxygen_Not_Included/

288 Ecrã de Oxygen not included (2017) consultado a 22 de outubro de 2021, em:
https://store.steampowered.com/app/457140/Oxygen_Not_Included/

128
No caso de Disk Room (2020) trata-se de lidar com uma avalanche de informação visual
na forma de vagas de diversos tipos discos de corte numa sala fechada. Estes discos
causam a morte ao personagem controlado pelo jogador, e este tem de os evitar durante
um tempo predeterminado até que a fuga seja permitida para outra sala. Ao progredir
de sala em sala acrescentam-se ao perigo dos discos outros desafios que envolvem
informação de outros tipos, como resolver puzzles simultaneamente, navegar
armadilhas no chão ou projéteis atirados sobre o personagem (Figura 3.41.).

Figura 3.41. Disk Room (2020) apresentando um ecrã com o personagem jogável (o boneco amarelo
com a capa vermelha).28955

Ao excesso de informação rápida do jogo anterior sucede-se o ambiente a incerteza


tenebrosa de Little Nightmares (2017). Aqui, a informação tem de ser destilada pelo
jogador a partir dos cenários e dos objetos com os quais o personagem jogável pode
interagir. Isto porque o jogo disponibiliza pouca informação textual ou verbal. Esta
interação é o que permite ao jogador ultrapassar obstáculos e progredir, e.g. arrastando
uma cadeira para conseguir abrir uma porta (Figura 3.42.).

Figura 3.42. Little Nightmares (2017) apresentando um ecrã com o personagem jogável a abrir uma

289 Ecrã de Disk Room (2020) consultado a 28 de dezembro de 2021, em: https://store.steampowered.com/app/1229580/Disc_Room/

129
porta.29056
Em suma, todos os jogos, à sua maneira, obrigam o jogador a lidar com informação,
como é visível em Little Nightmares (2017), Disk Room (2020) e Super Hexagon (2012). Por
isso, obrigam também o jogador a lidar com o insucesso, a falhar muitas vezes para
aprender a usar a informação disponibilizada pelo jogo em seu favor. É justamente
sobre o insucesso nos jogos enquanto ingrediente para criar que nos debruçamos a
seguir.

3.3.8. Insucesso

Por insucesso subentende-se algum tipo de perda que resulta do falhar. O falhar em
jogos resulta frequentemente em várias formas de punição: remoção de energia ou vida,
término abrupto do jogo, ou retorno do jogador ao seu início. Em todo o caso, nenhum
jogador gosta de perder nem de ganhar sem mérito, sem ser responsável pelos
insucessos que o levam à vitória.

Mais importante é que o insucesso ou falhar, ou ser bem-sucedido e vencer, é mais que
um contraste entre polos opostos. Falhar é per se, um fator central à experiência
profunda de jogos, e portanto à melhoria de aptidões já que “[n]a verdade, o falhar
adiciona conteúdo ao fazer o jogador ver novas nuances no jogo.” (Juul 2010, 237).291
Para que jogadores consigam tirar partido do seu insucesso num jogo têm de aprender
com os seus erros para melhorar as suas aptidões, ou saber o que abdicar para atingir
objetivos, ou seja “é um processo contínuo de progresso pessoal” (Juul 2013, 87).

Isto acontece em KARDS (2010) um jogo de guerra para dois jogadores na forma de
baralhos de cartas. O baralho de cada facção contém cartas com unidades de infantaria,
blindados, aviões ou eventos. Cada carta tem um número de pontos para atacar e outro
que reflete o dano que pode receber. Cabe ao jogador aprender a estratégia da facção
com que se debate (ao falhar) para saber usar melhor as cartas retiradas do seu baralho
(Figura 3.43). Os baralhos podem ser personalizados com cartas com combinações de
pontos não usuais, o que amplia as possibilidades que ocorram falhanços.

290 Ecrã de Little Nightmares (2017) consultado a 28 de dezembro de 2021, em:


https://store.steampowered.com/app/424840/Little_Nightmares/

291 T.A.: “In effect, failure adds content by making the player see new nuances in the game.”(Juul 2009, 237).

130
Figura 3.43. KARDS (2020) apresentando um ecrã de jogo (esquerda) e uma condição de derrota
(direita).57

Insucesso e sacrifícios são cruciais para aprender a atuar de forma criativa para
sobreviver, o que é visível em atuações dos personagens jogáveis em Valiant Hearts: The
Great War (2014), como Anna a tentar curar feridos de guerra, ou Emille a escavar
caminho entre trincheiras procurando evitar minas e inimigos (Figura 3.44.).

Figura 3.44. Valiant Hearts: The Great War (2014) apresentando um ecrã com Anna a tentar curar uma
menina, cujo estado se reflete no monitor cardíaco integrado (esquerda) e Emille a escavar um
caminho nas trincheiras (direita).29258

O insucesso é ainda incontornável em Limbo (2010) devido aos desafios multifacetados


que apresenta ao jogador, como inimigos diferentes, obstáculos imprevisíveis, terreno
adverso e entidades não jogáveis que invertem os controlos ao jogador. Isto obriga o
jogador a cometer erros para aprender a adaptar-se continuamente a circunstâncias
diferentes, e assim progredir (Figura 3.45.).

Figura 3.45. Limbo (2010) apresentando um ecrã com um inimigo escondido (esquerda) e uma
entidade agarrada à cabeça do personagem jogável que introduz descontrolo no seu movimento

292 Ecrãs de Valiant Hearts: The Great War (2014) consultados a 28 de Dezembro de 2021, em:
http://www.capsulecomputers.com.au/wp-content/uploads/2014/05/Valiant-Hearts-Screen-03-600x337.jpg
https://youtu.be/AqSIgCJpkOE

131
(direita).29359

Já Besiege (2020) é um jogo que permite ao jogador conceber com um grau elevado de
liberdade máquinas de guerra medievais para destruir ou derrotar oponentes. Esta
liberdade sugere que não há uma única forma de resolver os desafios, ou falhar perante
estes. É o tipo de jogo que permite ao jogador perguntar-se: “de quantas maneiras é
que esta solução pode falhar” permitindo a este aprender e proceder a refinamentos
sucessivos das máquinas lançadas no campo de batalha do jogo (Figura 3.46.).

Figura 3.46. Besiege (2020) apresentando ecrãs com: 1) a oficina de construção das máquinas de
guerra; 2) a máquina concluída lançada contra as defesas do nível de jogo.29460

Enquadrar devidamente o que entendemos como insucesso permite-nos aprender a dar


a volta não só a problemas nos videojogos como em contextos de vida física real. Mais
importante, o insucesso estimula o diálogo entre jogadores e jogador e jogo para
descobrir onde é que assenta a origem dos erros que levaram ao falhanço no jogo. Isto
é demonstrado por um estudo de Anderson et al. (2018) sobre aprendizagem com
recurso a videojogos. Os resultados revelam que o falhanço em jogos estimula o diálogo
sobre estes entre estudantes para aprender com os seus erros enquanto jogadores, e
para tentar perceber em conjunto as mecânicas de aprendizagem embebidas no jogo.

Em primeiro lugar, [os resultados do estudo] sugerem que as falhas antes de obter sucesso
em um nível pela primeira vez ajudam os estudantes a alcançar os objetivos de aprendizagem
básicos do jogo. (...) Os estudantes têm a oportunidade de descobrir onde estão os seus
equívocos e incapacidades e trabalhar para modificá-los para ter sucesso. Em segundo lugar,
os alunos mostram uma ligação entre esse fracasso e o discurso colaborativo focado na

293 Ecrãs de Limbo (2010) consultados a 28 de Dezembro de 2021, em: https://store.steampowered.com/app/48000/LIMBO/

294 Ecrãs de Besiege (2020) acedidos a 28 de dezembro de 2021, em: https://store.steampowered.com/app/346010/Besiege/

132
mecânica de aprendizagem embutida no jogo. (Anderson et al. 2018, 7)295

Dado este potencial do falhanço em promover o diálogo entre agentes de jogo, de


seguida debruçamo-nos sobre este tópico. 296

3.3.9. Conversação

A conversação é a troca de informação entre agentes de jogo para mudar ou manter


estados de jogo, usando códigos que o permitam, como verbais, visuais, sonoros ou
outros. O grau de conversação de um videojogo pode permitir aos jogadores recriar os
seus conteúdos de forma surpreendente, da estética a conteúdos ou narrativas, ou
segundo Clark e Anthropy:

Usamos o vocabulário da linguagem escrita e falada para nos comunicarmos com outras
pessoas. O vocabulário dos jogos permite que nos expressemos de maneiras muito poderosas,
dizendo coisas com sistemas de uma forma que as palavras não conseguem transmitir.
Permite-nos criar diferentes tipos de diálogo uns com os outros. Temos sorte de viver numa
época em que sistemas expressivos – outra maneira de pensar sobre jogos – estão a ser
explorados por criadores e jogadores de todas as maneiras, para conversar e refletir sobre
todas as ideias. (2014, 112)297

Esta ação de ter um diálogo com alguém, no caso dos jogos, são as ações que o jogador
executa no jogo e às quais este responde mudando o seu estado, respondendo assim de
volta ao jogador. Esta mudança de estado é visível em ações que o jogo interpõe, que
variam entre o opor e o complementar as ações do jogador. Por isso, os jogos podem
ser usados como espaços de conversação para trocar informação e perspetivas sobre
assuntos específicos.

Tiles IOT Toolkit (2019) consiste num conjunto de cartas para serem usadas por vários
jogadores para co-criar objetos ligados à Internet298 que respondam aos Objetivos de

295 T.A.: “First, they suggest that failures before succeeding at a level for the first time supports students reaching the underlying
learning goals of the game. (...) Students are given opportunities to discover where their misconceptions and inabilities lie and
work towards modifying them to succeed. Second, students show a link between this failure and collaborative discourse focused
on the learning-embedded mechanics within the game.” (Anderson 2018, 7)

296 Nas secções seguintes debruçamo-nos sobre jogos que dão espaço aos jogadores para executar atos criativos, para que possam
desenvolver literacia criativa ou que mostrem evidências para tal, como ensinar ou auxiliar a executar algo em termos de
criatividade, como desbloquear ou orientar processos de design. O jogo torna-se assim um espaço favorável aos atos criativos, e
portanto, ao aumento da literacia criativa.

297 T.A.: “We use the vocabulary of written and spoken language to communicate with other people. The vocabulary of games allows
us to express ourselves in tremendously powerful ways, saying things with systems in ways that words can't. It lets us create
different kinds of dialogue with each other. We're lucky to live in a time when expressive systems—another way of thinking about
games—are being explored by creators and players in all sorts of new ways, to converse about and reflect on our every idea.”
(Clarke e Anthropy 2014, 112)

298 A Internet das coisas (IDC), em inglês original Internet-of-Thing (IOT), refere-se à conexão entre objetos físicos e a internet, sendo
uma extensão natural desta. Trata-se de objetos dotados de sensores que uma vez ligados à rede podem transmitir e receber dados,
e que por isso, levantam grandes desafios sociais e técnicos.

133
Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas.299 O jogo foi concebido para ser usado
em workshops para facilitar o diálogo e a colaboração criativa entre jogadores. Consiste
num tabuleiro com instruções e 7 baralhos de cartas: 1) Coisas do quotidiano que podem
ser aumentadas com tecnologia; 2) Ações humanas que despoletam estes objetos; 3)
Feedback que indica como o objeto comunica de volta com o utilizador; 4) Ligações são
operações lógicas que conectam vários objetos destes concertadamente; 5) Canais de
Dados são os serviços de internet que facultam informação extra aos objetos; 6) Temas
que incitam o pensamento criativo dos jogadores para conferir aspetos de design
atraentes aos objetos; 7) Critérios para avaliar as ideias geradas com os pontos
anteriores.

Um workshop com este jogo segue a seguinte sequência: 1) escolha de contexto e


público-alvo; 2) iterar soluções tecnológicas; 3) esboçar um storyboard da ideia; 4)
refinar a ideia de acordo com critérios; 5) preparar uma comunicação do tipo elevator
pitch – uma apresentação da equipa, histórico de trabalho, mais-valias e objetivos com
duração entre 30 a 60 segundos (Mora et al., 2017).300

Já o Lego Serious Play (2014) é uma metodologia que recupera o brincar de criança para
criar novos negócios ou produtos. Podemos ver estes exemplos como um diálogo
metafórico assente no ato de manipular peças lego e conceber algo com estas. 301 Esta
conversa é encetada por equipas de jogadores que se revezam a jogar com as peças para
criar algo com um objetivo em mente.

Por sua vez, Fábula (2016) é uma framework sob forma de baralho de cartas que serve
para apoiar o desenvolvimento da escrita criativa. Ou seja, é um meio para gerar
conversas entre personagens fictícios para conceber uma narrativa e consiste em: 11
Cartas-Elementos, os ingredientes principais; 18 Cartas de Jornada, os passos do herói;302
e 11 Cartas de Edição para ordenar eventos. Estas cartas são distribuídas livremente pelo
jogador para estruturar uma narrativa-base. As ideias para eventos inspirados por esta
estrutura são elaboradas em post-its nas proximidades. Por fim, os eventos são de novo
ordenados como se da edição de um filme se tratasse.

Tal como Fábula (2016), Cícero (2017) é outra framework na forma de baralho de cartas,

299 Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável fazem parte de uma agenda alargada redigida em 2030 pelas Nações Unidas que
aborda várias dimensões do desenvolvimento sustentável, socioeconómico, e ambiental, e que promove a paz, a justiça e
instituições eficazes. Informação consultada a 4 de janeiro de 2022 em: https://unric.org/pt/objetivos-de-desenvolvimento-
sustentavel/

300 O jogo é um dos nossos casos de estudo que aprofundamos na secção 4.2.9.

301 Esta metodologia ancora-se no construcionismo (Papert 1993) e usa três processos da imaginação: Recriar coisas de uma perspetiva
diferente, Especular sobre o que não existe e Negar tudo para criar do zero.

302 Estas cartas baseiam-se no trabalho académico sobre a jornada do herói (Vogler 1998; Campbell 1949; Propp 1928).

134
para analisar, organizar e criar a retórica de um discurso público. É um meio para
consolidar um argumento de uma conversação. O baralho divide-se em cartas para
Fundamentar e para Construir um discurso. As cartas Fundamento são compostas por três
Pontos Principais: Frase-Chave, o conceito a comunicar, Factos que o suportam e a
Transição entre pontos. As cartas Construção dividem-se em formas de Atrair a atenção
da audiência, em Introduzir algo que ainda não consideraram, mas sustentado pelos
Pontos Principais, e a Conclusão que recapitula o mais importante do discurso.

Já Intùiti (2013) é um método lúdico que opera confrontando os interesses pessoais dos
jogadores com ilustrações de arquétipos culturais (Figura 3.49). Este confronto serve
para saber o que importa ao jogador perseguir em termos criativos e não ser
influenciado por convenções sociais e culturais (Pascuale e Mazzuchelli 2017). Ou seja,
é um método para pensamento criativo assente em associações imaginárias e visuais.
Não possui regras podendo ser jogado de forma livre, para tal baralham-se as cartas,
escolhe-se uma e gera-se uma associação apoiada na sua ilustração ou texto.
Segundo o website do jogo,303 este é uma ferramenta acessível para automelhoramento
pessoal e criativo, e para incentivar a geração de ideias em sessões de brainstorming
mantendo o foco em objetivos pretendidos e assim maximizar os resultados de cada
participante.

Figura 3.47. Intùiti® Creative Cards (2013) apresentando fotografias: a) das cartas do baralho principal;
b) das cartas do baralho secundário; e 3) do conteúdo visual e textual de uma das cartas.30461

As possibilidades criativas da conversação em videojogos estendem-se a casos que são


simultaneamente ferramentas de criação de jogos, motores de jogo onde os executar e
rede social partilhar como Dreams (2020) Nesta plataforma os jogadores podem
apropriar-se de conteúdo de jogos incluídos, conceber regras, itens gráficos ou sonoros
para modificar ou conceber jogos completos (ver Figura 3.48.). Ao usar este vocabulário
para modificar ou criar jogos, os jogadores podem expressar-se, comunicar algo de si

303 Informações consultadas a 3 de janeiro de 2022 em: https://intuiti.it/

304 Montagem feita a partir de fotografias consultadas a 22 de outubro de 2021 em: https://intuiti.it/, onde também pode ser
visualizado um vídeo exemplificativo da operação do jogo.

135
ou como vêm o mundo a outros jogadores.

Figura 3.48. Dreams (2020) apresentando um ecrã com uma criação de um jogador.30562

Tal como o jogo anterior Disney Infinity (2016), é uma plataforma que permite jogar,
criar e disseminar jogos de aventura com personagens e objetos do universo Disney
(ver Figura 3.49). O desenvolvimento de jogos é levado a cabo num mundo de jogo
aberto, Toy Box mode (T.A.: Modo de Caixa de Brinquedos). Este modo pode ser visto
como um diálogo entre sistema de jogo e jogadores em que estes combinam armas,
personagens e itens para criar novas aventuras. Operado por múltiplos jogadores as
combinações estendem-se aos itens dos outros, de diferentes universos Disney.

Figura 3.49. Disney Infinity (2016) apresentando um ecrã em modo de criação de terreno (esquerda) e
outro para criar uma pista de corridas (direita).30663

Há mais jogos que como os dois anteriores possuem múltiplas facetas, pois estão na
intersecção de plataforma de criação, de disseminação de jogo, motor de jogo e jogo per
se. Estas facetas desmultiplicam-se em diferentes diálogos, e.g. entre jogadores

305 Ecrã consultado a 22 de outubro de 2021, em: https://www.mediamolecule.com/blog/article/dreamview_weekly_roundup_11

306 Ecrã consultado a 29 de dezembro de 2021, em: https://youtu.be/mm7pGDJldZI

136
enquanto designers. A diferença entre este tipo de jogos é que podem estar limitados a
um tema como em Super Mario Maker 2 (2019), ilustrado na Figura 3.50.

Figura 3.50 Super Mario Maker 2 (2019) apresentando um ecrã em modo de criação partilhado por dois
jogadores, representados por luvas com contorno verde e vermelho.30764

Ainda, estes híbridos plataforma de criação, disseminação, motor e jogo, podem usar
elementos com um estilo visual mais amplo, permitindo criar universos de jogo não
predeterminados como em Roblox (2006), ilustrado na Figura 3.51.

307 Este jogo permite a dois jogadores criarem novos jogos em simultâneo. Ecrã consultado a 29 de dezembro de 2021, em:
https://supermariomaker.nintendo.com/make/

137
Figura 3.51. Roblox (2006) apresentando um ecrã do seu editor – Roblox Studio.308

Portanto, conceber espaços de jogo que reflitam de forma criativa valores ou


experiências dos designers depende do conhecimento que têm de programação 309 e, do
entendimento que destilam dos jogos existentes (Zagalo 2010; Anthropy 2012). Os
exemplos híbridos de plataforma de criação, disseminação, motor e jogo, são uma ponte
acessível para que jogadores criem jogos que expressem os seus pontos de vista. Estas
expressões permitem estabelecer diferentes diálogos entre jogos criados e jogadores, e
entre jogadores enquanto designers de jogos. E são estes diálogos que podem levar a
uma dialética, uma troca de argumentos que permita gerar jogos surpreendentes.

As conversações que ocorrem nos jogos apresentados nesta subseção são formas de
reciprocar informação entre jogadores e sistema de jogo, formas que podem estimular
atos criativos no jogo. Para que esta reciprocação se torne mais rica, segundo Anna
Anthropy e Naomi Clark (2014), é necessário estimular uma visão holística que
considere os papéis e interesses do jogador e do designer de jogos.

308 Roblox (2006) disponibiliza aos seus jogadores um motor próprio para que criem jogos. Estes são codificados por programação por
objetos usando a linguagem Lua. tudo quanto é criado no jogo pode ser comprado dentro da plataforma usando a respetiva moeda
(Robux), que pode ser adquirida com moeda real. A maior parte do conteúdo é produzido por menores. Tal como Minecraft (2011)
pode ser usado como meio de aprendizagem em sala de aula. Ecrãs de Roblox (2006) consultados a 29 de dezembro de 2021, em:
https://kubadownload.com/site/assets/files/3855/90935926b4d66f550958386a930c4ac79dc49ba4_2_1024x576.jpeg
https://vignette.wikia.nocookie.net/foxipeida/images/1/1a/Screenshot_20191201-
105207.png/revision/latest?cb=20191201192245

309 Para auxiliar a conceção podem ser usadas linguagens de programação acessíveis, como Scratch (2017) onde se podem criar
histórias, jogos e animações interativas (Peppler e Kafai, 2007).

138
Para aprofundar nossa prática de jogos, temos que pensar sobre nosso próprio papel em
moldar o que acontece - e entender como nosso papel como designers de jogos se cruza e se
confunde com as escolhas dos jogadores. (Anthropy e Clark 2014, 109)310

Ou seja, a conversação requer ser complementada com a argumentação que permite


contrapor diferentes posições de jogadores, sistemas e designers de jogo, sendo isto o
foco da secção seguinte.

3.3.10. Argumentação

A argumentação é vista aqui como tendo essencialmente um caráter dialético, como diz
Pedro Cardoso “onde o jogador e o sistema de jogo atuam como forças em oposição”
(2016, 72).311 Ou seja, baseia-se na premissa que o conflito é central aos jogos pois
independentemente da forma como os conflitos são apresentados se não existirem não
há interação no jogo (Crawford 1997).

De qualquer forma, ao fornecer ao jogador uma infinidade de escolhas, muitas vezes


questionando os seus pontos de vista morais ou as suas capacidades de julgamento, podemos
ainda considerar o sistema como uma força oposta ao do jogador - mesmo quando essas
situações são implícitas. As escolhas que o jogador faz podem mudar dramaticamente o
desenrolar dos eventos e, consequentemente, a sua experiência. Este é um tipo de conflito
que o sistema de jogo apresenta constantemente ao jogador, através de vários meios e
nuances. (Cardoso 2016, 75)312

A argumentação pode ser ainda resultar da conversação num sentido mais próximo da
dialética, pois segundo Anna Anthropy e Naomi Clark (2014), os jogadores tanto podem
opor resistência entre si e ao sistema de jogo, como unir forças para atingir algo.

As conversas são sobre empurrar e puxar: uma pessoa diz algo, e a outra ouve e responde. Às
vezes, desafiamo-nos uns aos outros e, outras vezes, permitimos que o pensamento de outra
pessoa seja explorado e desenvolvido. Uma boa conversa também não é necessariamente
conduzida por uma pessoa: alguns ou todos os participantes têm maneiras de expressar suas
próprias opiniões sobre o ritmo e os objetivos da conversa (Anthropy e Clarke 2014, 118).313

A dialética por seu turno ancora-se ainda no conceito de retórica procedimental de Ian
Bogost (2007) que aprofundamos na secção 3.2.4. Trata-se de usar processos de jogo

310 T.A.: “To deepen our practice of playing games, we have to think about our own role in shaping what happens – and understand
how our role as game designers intersects and tangles with the choices of players.” (Anthropy e Clark 2014, 109).

311 T.A.: “where the player and the system act as opposing forces” (Cardoso 2016, 72)

312 T.A.: “In any way, by providing the player with a plethora of choices, often questioning her moral standpoints or her judgmental
capabilities, we may still consider the system as an opposing force to that of the player – even when these situations are implicit.
The choices the player makes can dramatically change the unfolding of events and, consequently, her experience. This is a kind of
conflict the game system constantly presents to the player, through various means and nuances.” (Cardoso 2016, 75).

313 T.A.: “When we think about games as a conversation, we can discover many potential ways of looking at games (...) Conversations
are about push and pull: one person says something, and the other person listens and responds. At times we challenge each other,
and at other times we allow another’s thoughts to explore and develop. A good conversation isn’t necessarily led by one person
either: some or all participants have ways to voice their own input about the pace and goals of the conversation.” (Anthropy e
Clarke 2014, 118).

139
como uma retórica, para persuadir e argumentar sobre algo. Esta retórica pode ser
usada para estimular agentes de jogo314 (jogadores e sistema de jogo) a elaborar críticas
e perspetivas próprias para debater entre si um âmbito vasto de tópicos.

Assim, a argumentação pode emergir de decisões a tomar quando o jogador é


confrontado com diferenças culturais entre personagens na série de jogos Quest for Glory
(1989). Isto porque lidar com estas diferenças obriga o jogador a desenvolver aptidões
do seu personagem jogável num determinado sentido, como força para levantar
obstáculos. Portanto, neste caso, a força da argumentação do jogador reside na
personalização do personagem jogável (consultar secção 3.2.1).

O Design Thinking (DT)315 por sua vez, pode ser visto como uma argumentação entre o
objetivo de criar algo e as limitações para o fazer. Educar conhecimento para tal pode
ser feito usando The Mindshake Thinking Cards (2015), um baralho de cartas que pode
auxiliar a criar ou mapear caminhos para vários objetivos (Figura 3.52). Este baralho
consiste em cartas dirigidas a quatro fases do DT: 1) Emergência para questionar o
problema; 2) Experimentar para iterar e explorar hipóteses; 3) Elaborar para prototipar;
4) Expor para comunicar as soluções encontradas. Estas cartas podem atuar como pistas
organizadas em mapas visuais para guiar iteração, serem usadas em diferentes
sequências, ou adaptadas para fins específicos, o que aumenta suas possibilidades
criativas, ou seja:316

1. Organizadas cuidadosamente, ou misturadas aleatoriamente, enquanto fontes


de informação e técnicas para aprender métodos de DT;
2. Espalhadas e usadas para inspirar equipas a planear o seu processo criativo.
3. Fixas na parede para auxiliar o processo criativo e a execução de tarefas de
inovação, indicadas pelas fases E6.317
4. Usadas para procurar pares, compostos por uma técnica e uma fotografia que

314 Definimos agentes de jogo como todas as entidades que agem dentro do âmbito do jogo, como jogadores e sistemas de jogos.

315 Design Thinking (DT) é um conjunto de ferramentas ou processos que podem ser usados em sequência ou não, para melhorar ou
conceber serviços ou produtos, envolvendo: a) Descoberta ou Inspiração, oportunidades para encontrar soluções por meio da
observação, questionamento, empatia e análise de dados; b) Ideação, gerar soluções a partir de ideias, prototipagem e testes; c)
Implementação das ideias finalizados para o mercado (Benson e Dresdow 2015). Ainda, há evidências que o DT serve para
desenvolver e a melhorar a criação nos setores de negócios e é capaz de promover a colaboração (Chasanidou et al. 2015). No
entanto, há quem critique a trivialização do processo, que o torna simplista e incapaz de estimular o pensamento crítico
(Hernández-Ramírez 2018).

316 T.A. a partir do website Mindshake: “The cards can be used in various ways: 1) Carefully arranged, or randomly shuffled, as a
source of information, and learning technique of DT methods; 2) Scattered about, and used to inspire the team to devise their own
creative process; 3) Fixed to the wall to help the creative process and the execution of innovation tasks, indicated by the E6 phases;
4) You can also search for pairs, composed by one technique and one photograph which represent the technique in action; 5) In
teams looking for pairs suitable for each Ephase of the model.

317 E6 é um termo que designa as fases do Modelo Evolução6² de inovação e Pensamento em Design Mindshake (T.A.: “Mindshake’s
Innovation & Design Thinking Model Evolution 6²). O modelo foi desenvolvido por Katja Tschimmel a partir de 2012 e é usado para
treinar e mentorar projetos de inovação públicos e privados, start ups (programas de aceleração e arranque de empresas),
empreendedorismo, educação, aulas para especialistas e projetos de investigação.

140
representam a técnica em ação.
5. Em equipas que procuram pares que se enquadrem para cada fase E6.

Figura 3.52. Fotografias ilustrando as várias formas de uso das Mindshake Design Thinking Cards (2013):
1) organizadamente; 2) aleatoriamente; 3) fixas na parede para orientar o processo de design; 4)
correlacionados pares de cartas; 5) como no ponto anterior, mas em equipa. Fotografias consultadas a
22 de outubro de 2021 em: https://www.mindshake.pt/en/design-thinking/65

Já Design (Human) Design (2017) é um método para auxiliar jogadores a guiar processos
de design sob forma de baralho de cartas e website (ver Figura 3.52).318 A argumentação
ocorre entre o jogador e o algoritmo do método, sobre as variáveis e os critérios para
criar algo. O formato de website usa algoritmos computacionais para acrescentar
informação obtida através da internet ao seu processo criativo. Esta informação pode
aumentar as hipóteses de ocorrerem associações serendipitivas, e assim, aumentar as
hipóteses de gerar ideias originais.

Tanto a versão física como virtual deste baralho é dividida em cinco categorias que
podem ser usadas em sequências diversas: 1) Tipos de artefactos, maneiras de
implementar algo; 2) Atributos, padrões, formas ou aspetos de design de produtos ou
experiências; 3) Fontes de inspiração, termos ou experiências fascinantes que
despoletam novos designs; 4) Adjetivos de experiência, termos que refletem os atributos
do design trabalhado; 5) Tipos de mídia, diversos media ou combinações destas para
obter resultados surpreendentes. As cartas são reveladas por turnos para conceber
artefactos que operam a partir de estímulos, ou, desenhar atividades a partir de

318 O site original da versão digital deixou de existir, mas existe uma versão a que acedemos a 12 de abril de 2021 em:
https://web.archive.org/web/20190214215829/http://reframe.media.mit.edu/

141
conhecimentos, processos ou ferramentas (Mothersill e Bove 2017). 319

Figura 3.52. Fotografias dos dois formatos de Design (human) design (2017), um baralho de cartas físico
(esquerda), e o website (direita).32066

Por seu lado, Creative Whack Pack (1989) é um método sob forma de baralho de cartas
que estimula a argumentação entre perspetivas de jogadores sobre um assunto para
que em equipa cheguem a consenso sobre o que é necessário a um processo criativo
(Figura 3.53). O jogo tem a forma de um baralho de cartas e consiste em quatro tipos de
cartas: Explorador, para perceber o problema; Artista, para criar ideias; Juíz, para
escolher ou melhorar ideias, e Guerreiro para implementar soluções. O jogo pode ser
usado de várias maneiras, uma maneira genérica para obter e validar diferentes
soluções usa a seguinte sequência: 1) estabelece-se uma decisão e a razão desta, algo
que tem de ser aceite por todos os jogadores; 2) dividem-se os jogadores por pares mais
um grupo de três se o número total for ímpar; 3) cada grupo recebe três cartas sem ver
o seu conteúdo; 4) cada jogador lê por turnos uma carta discutindo-se entre todos como
é que se aplica à decisão; 5) O processo repete-se até todas as cartas forem discutidas;
6) finalmente os resultados de todas as iterações são discutidos pelos jogadores para
formular decisões alternativas.

319 Já o sistema de Oblique Strategies (1975), outro método similar baseado em baralho de cartas, opera sob o princípio de obrigar a
olhar para situações de outras perspetivas, introduzindo serendipidade para desbloquear ou refinar processos de design.

320 Fotografias extraídas do estudo de Philippa Mothersill e Michael Bove Jr. (2017).

142
Figura 3.53. Fotografia das cartas e caixa do baralho Creative Whack Pack (1989).32167

Os argumentos apresentados pelo jogo podem ser vistos como o que James Gee (2004b)
diz ser o enquadramento que o designer do jogo criou para o jogador. Para o jogador
progredir no jogo segundo este enquadramento, é necessário que aprenda a usar os
recursos de jogo de forma criativa, e até atuar de forma não prevista pelo designer,
usando glitching322

Gee (2004b) argumentou que, o jogador, ao participar num jogo precisa de se orientar, adotar
e aprender os enquadramentos que o designer do jogo construiu. No entanto, para participar
com competência, o jogador também precisa aprender a usar os recursos do jogo de forma
criativa para progredir no jogo. Além disso, o jogador pode fazer coisas no jogo que não foram
previstas pelo designer (como, e.g. a prática de glitching ou upload de vídeos Let’s Play no
YouTube) (Arnseth et al. 2018)323

A argumentação ocorre ainda entre expectativas de sistema de jogo e jogadores em


Patient 237 (2019),324 um simulador de sessão de psicoterapia que pretende trazer
equilíbrio ao personagem jogável (paciente), mas que pode desenrolar-se de outras
formas dependendo das interações entre agentes de jogo (Figura 3.54).

321 Fotografias extraídas do estudo de Philippa Mothersill e Michael Bove Jr. (2017).

322 Glitching é a prática de usar falhas do sistema de jogo para atingir algo que não foi originalmente concebido pelos designers de
jogo.

323 T.A.: “Gee (2004) has argued that, when participating in a game, you need to orient toward, adopt, and learn the frames that the
designer of the game has constructed for you. However, to participate competently, you also need to learn how to use the resources
in the game creatively to move forward in the game. In addition, the player can do things in the game that were unanticipated by
the designer (as, for instance, seen in the practice of glitching or uploading Let’s Play videos on YouTube).” (Arnseth et al. 2018).

324 A ideia do jogo é trazer equilíbrio a um paciente (des)controlado por IA, pois a postura física e as perguntas do jogador podem
incitar reações adversas. Isto expõe a mais-valia criativa das conversações mediadas por jogos e os seus atores.

143
Figura 3.54. Ecrã de Patient 237 (2019) apresentando hipóteses de interação entre agentes de jogo.68

A argumentação é clara em Façade (2005) um jogo em torno das problemáticas das


relações íntimas interpessoais. O jogador interage escrevendo frases para “falar” com
um casal de personagens não jogáveis controlados por IA. O jogador pode tentar apoiar
este casal nos seus problemas, procurar afastá-los um do outro, ou levá-los ao ponto
em que é expulso do apartamento para o qual foi convidado. Ou seja, é um jogo em que
se experimenta manter vivas convenções sociais sobre relações, o que pode resultar em
várias dialéticas, e portanto, narrativas e desfechos inesperados (Figura 3.55).

Figura 3.55. Ecrãs de Façade (2015) apresentando hipóteses de interação entre agentes de jogo.32569

A argumentação entre jogador e jogo pode assumir outras formas como em Umiro
(2018), onde o jogador desenha percursos para dois personagens jogáveis. Estes
percursos devem articular-se entre si de forma que o objetivo comum e individual de
cada personagem seja atingido. Os percursos são vistos aqui como argumentos que se
colocam ao jogo e que este a seguir simula para verificar se são adequados aos objetivos

325 Ecrã extraídos de um vídeo consultado a 29 de dezembro de 2021, em: https://www.playablstudios.com/facade

144
(Figura 3.59).

Figura 3.56. Ecrã de Umiro (2018) apresentando um território onde se simulam percursos.32670

A argumentação com o sistema de jogo pode estimular a criação de novas formas de


interagir,327 se o jogador tiver liberdade para experimentar mudar as regras do jogo
durante a sua execução, ou nas palavras de Peters et al. “pensando através do fazer”
(2020, 2).328 Isto é visível na combinação de ações e elementos de jogo em Baba Is You
(2019), cujos resultados imprevistos podem levar a novas noções do que é ganhar ou
perder (Figura 3.57). Isto porque a realização num jogo não passa por ganhar, antes,
decorre das descobertas no seu decurso:

[Para] sentir satisfação em alcançar um resultado desejável, o resultado deve ser algo que
estamos a tentar alcançar. Uma vitória abrupta e sem mérito não é muito agradável - a
satisfação não vem de ter vencido, mas de ter chegado ao resultado pretendido. A existência
de condições explícitas de vitória e falha em jogos baseados em regras dá-nos um destino
claro para seguir em frente ao navegar entre as restrições do sistema de jogo. Contudo, a
função de objetivos predeterminados como restrições globais rompe-se quando olhamos para
outras experiências estéticas. (Upton 2015, 183)329

326 Ecrã consultado a 29 de dezembro de 2021, em: https://store.steampowered.com/app/727760/Umiro/

327 Incluímos aqui aplicações que privilegiam a abertura à experiência e criatividade para que o jogador possa conceber o progresso e
objetivos num jogo, como Toca Boca Hair (2013) que simula cortes de cabelo, ou Toca Boca Lab (2013), que permite experimentar
com química. Esta liberdade criativa apoia-se em tentativa-erro, permitindo aos jogadores estabelecer eles próprios o valor do que
é criado e redefinir níveis de sucesso.

328 T.A.: “Thinking through Making”, refere-se a um tipo de método exploratório frequentemente usado em Design com o intuito de
estimular o pensamento criativo, o ato de brincar com materiais físicos com caráter abstrato e ambíguo para descobrir formas de
os articular (Peters et al. 2020, 2).

329 T.A.; “[In] order to feel satisfaction in achieving a desirable outcome, the outcome should be something we were trying to achieve.
An abrupt and unheard victory isn’t very enjoyable – satisfaction comes not from having won, but from having arrived at the result
we were aiming for. The existence of explicit victory and failure conditions in rule-based games gives us a clear destination to work
forward as we navigate their system constraints. But the function of predetermined goals as global constraints breaks down when
we look at other varieties of aesthetic experiences.” (Upton 2015, 183).

145
Figura 3.57. Ecrã de Baba Is You (2019) apresentando uma configuração de ações que alteram paredes
para se moverem como o personagem jogável.71

A argumentação com um sistema de jogo pode também ocorrer quando nos


apropriamos do cenário do jogo enquanto matéria-prima para modificar o próprio
cenário do jogo. E.g. ao explorar a ambiguidade da perceção de objetos em SuperLiminal
(2019) e ao introduzir objetos que adquirem escalas diferentes consoante o seu
posicionamento, ou usar uma câmara instantânea de Viewfinder (s.d.), produz
elementos tridimensionais que acrescentam novos caminhos ao seu mundo de jogo,
como ilustrado na Figura 3.58.

Figura 3.58. Viewfinder (s.d.) apresentando com o ato de tirar uma foto no jogo (esquerda, e a

146
aplicação da foto enquanto modelo 3D sobre o cenário para chegar mais alto no jogo (direita).33072

Visões criativas podem ser reveladas pela argumentação entre vários jogadores em
torno das cartas de ikonikus (2013). Os jogadores recebem 3 cartas de mão no início do
jogo, escolhendo uma que vá ao encontro de uma situação emocional proposta pelo
jogador em turno. Ou seja, cada jogador entrega ao proponente da situação uma carta
que representa sua interpretação visual e argumento sobre esta. O jogador em turno
recebe, baralha e revela as cartas uma a uma, relacionando o que interpreta do seu
conteúdo visual com o tópico lançado. No fim do seu turno escolhe o vencedor segundo
o que considera ser a melhor associação entre tópico e cartas, passando a vez a este
jogador (ver Figura 3.59.).

Figura 3.59. ikonikus (2013) apresentando fotos dos seus componentes (esquerda) e instruções
(direita).33173

Ou seja, a argumentação é essencial para refrescar um diálogo através de uma dialética


de jogo, ao introduzir-lhe visões próprias e distintas. Portanto a argumentação pode
ser dinamizada pelos jogos devido ao seu caráter interativo e enquanto suporte das
contribuições dos vários agentes de jogo. A argumentação pode operar a vários níveis
num jogo, envolvendo todos os seus agentes na geração de associações criativas em
torno dos assuntos de jogo.

Isto sugere que os argumentos do jogo alimentam as questões do jogador sobre como
o resolver. Ou seja, a argumentação entre agentes de jogo pode permitir a conciliação
das suas posições, o que faz do questionamento o meio que os jogadores usam perante
os argumentos de jogo para progredir neste. Assim, é sobre o questionamento provo-

330 A data de lançamento do jogo ainda está por anunciar, contudo o desenvolvimento do jogo já está a ser divulgado em site próprio.
Ecrãs extraídos de um vídeo consultado a 22 de outubro de 2021 em: https://viewfinder-game.com

331 Fotos consultadas a 29 de dezembro de 2021 em: https://boardgamegeek.com/image/3037955/ikonikus

147
cado pelo jogo que nos iremos debruçar a seguir.

3.3.11. Questionamento

O questionamento é uma força motora importante para aprender a pensar (Peirce 2013;
Starko 2010) e algo central aos jogos pois segundo Anthropy e Clark os jogos podem
colocar-nos opções abertas e pedir-nos para pensar sobre estas, para responder a
circunstâncias difíceis ou restritas, ou criar novas estratégias para lidar com estas.

Os jogos podem apresentar-nos escolhas abertas e perguntar-nos o que pensamos - como


um interrogador exigindo respostas ou um amigo fazendo perguntas para nos ajudar a
perceber como nos sentimos. O que farias em uma situação difícil? Que tipo de escolha farias
ao deparares-te com recursos limitados? Também podemos criar espaços mais amplos
dentro dos jogos, onde convidamos os jogadores a criarem as suas próprias estratégias,
reações e explorações em territórios que talvez nunca tivéssemos previsto como criadores do
vocabulário do jogo. Ou podemos limitar esses espaços e pedir aos jogadores que ouçam -
para entender que nem todo o sistema [de jogo] está aberto para ser mudado pela agência
dos jogadores, nem toda a história pode ser desviada para um final feliz e nem todo desafio
difícil pode ser dominado e conquistado. (Anthropy e Clark 2014, 115)332

Portanto, aumentar a literacia criativa requer uma atitude de questionamento contínuo


para gerar várias associações sobre o que somos confrontados. Este questionamento
pode ser incitado usando Triggers (2016), um método que usa uma tipologia de baralhos
de cartas com questões do tipo “e se?” para estimular o pensamento divergente do
jogador em diversas direções e acelerar a geração de ideias (Masferrer 2016). Esta
tipologia existe hoje também na forma de aplicação digital, Triggers+ (2021). Ambas as
versões podem ser usadas para fins distintos, como interação remota, previsão do
futuro, uso em hackathons, ou gerar ideias para publicidade ou imagem de marca (ver
figura 3.60). Os baralhos operam numa sequência de passos gerais similares,
independentemente do objetivo pretendido (trytriggers website, 5 de maio de 2021): “1)
Definir o desafio, brief ou projeto que se deseja resolver numa só pergunta; 2) Tirar uma
carta do baralho, ler em voz alta, e pensar na questão por segundos; 3) Pensar nas
maneiras de resolver o brief com a sugestão da carta, procurando gerar tantas ideias
quantas forem possíveis.”333

332 T.A.: “Games can present us with overt choices and ask us what we think – like an interrogator demanding answers or a friend
posing questions to help us understand how we feel. What would you do in a difficult situation? What kinds of choices would you
make when faced with limited resources? We can also create wider spaces within games where we invite players to come up with
their own strategies, reactions, and explorations into territories that we might never have anticipated as the creators of the game
vocabulary. Or we can limit those spaces and ask players to listen – to understand that not every system is open to being changed
through the agency of players, not every story can be diverted toward a happy ending, and not every difficult challenge can be
mastered and conquered.” (Anthropy e Clark 2014, 115)

333 T.A.: “1) Define the challenge, brief or project you want to solve. We advise summarising it into a question; 2) Pick one card from
the deck. Read it out loud and take some seconds to think about the question; 3) Think of ways of solving the brief with the
suggestion on the card. Generate as many ideas per card as you can.” (trytriggers website, 5 de maio de 2021).

148
Figura 3.60. Triggers (2016) fotografia do protótipo das cartas físicas (esquerda), e Triggers+ (2021)
ecrãs da aplicação digital (direita).33474

Por seu turno, Cards Against Humanity (2011) é um jogo por turnos em que os jogadores
geram associações entre dois baralhos compostos por cartas diferentes. O objetivo do
jogo é que estas associações vão ao encontro do gosto do jogador encarregue de as
avaliar e que muda a cada turno de jogo. O jogo incita os jogadores a questionar excessos
que ocorrem na sociedade, e pensar em como associar os conteúdos das cartas no
âmbito da crítica à humanidade. Ao lidar com estes assuntos, o jogo pode servir para
que os jogadores reflitam profundamente sobre os males da sociedade. O jogo faz parte
da nossa análise de casos, pelo que pode ser consultado com mais detalhe no capítulo
4, secção 4.2.20 (ver Figura 3.61).

Figura 3.61. Cards Against Humanity (2011) ecrã do website do jogo com uma demonstração do jogo
consultado a 3 de janeiro de 2022 em: https://www.cardsagainsthumanity.com/75
Já Dark Ride: Disneyland (2020) é um jogo de realidade aumentada para dispositivos
móveis que estimula a reflexão crítica e criativa de jogadores e designers sobre as as
contradições entre media, cultura e sociedade. O jogo opera desencadeando dialéticas
entre jogo e jogador em localizações precisas dos parques Disney para estimular a
contestação da conceção original dos parques e a geração de alternativas para lidar com
problemáticas em torno destes. Para tal os jogadores percorrem o parque interagindo
com minijogos que examinam como é que a cultura e a história levaram a esta noção

334 Fotografias consultadas nos websites: https://www.trytriggers.com/


https://medium.com/@alemasferrer/introducing-triggers-the-story-beyond-the-cards-89aa041f9e38

149
(Thevenin 2020), como ilustrado na Figura 3.62.

Figura 3.62. Dark Ride: Disneyland (2020) apresentando: 1 e 2) ecrãs com diálogos com personagens de
jogo; 3) ecrã com um puzzle; 4) fotografia de visitantes do parque a usar a aplicação.335 76

O questionamento pode ainda manifestar-se em jogos que confrontam o jogador com


personagens que vivem com problemas de saúde crónica, para o levar a pensar em
maneiras de lidar com estas situações. Exemplos são Threesixfive (2015), Rise (2017) e
The Denouement (2018), descritos pelo seu autor Dakoda Barker (2018) como:

Threesixfive retrata minha experiência pessoal de manter uma programação regular de


obrigações diárias enquanto lida com dor, fadiga e falta de motivação causada por condições
crónicas de saúde; Rise representa a natureza desafiadora das tarefas cotidianas que se
originam da dor crônica e da fadiga; e The Denouement explora o ajuste e a aceitação de novos
estilos de vida à medida que deficiência visual, dor, perda de membro e trauma tornam-se
condições crónicas. (Barker 2018, 28)336

Threesixfive (2015) usa uma interface textual que descreve ao jogador a situação do
personagem jogável e as ações que permitem o desenrolar do jogo (Figura 3.63.).

335 Ecrãs consultados a 4 de abril de 2021 em: https://web.archive.org/web/20180804192400/http://darkridegame.com/

336 T.A.: “Threesixfive portrays my personal experience of keeping a regular schedule of daily obligations while dealing with pain,
fatigue, and a lack of motivation brought on by [Chronic Health Conditions]; Rise represents the challenging nature of quotidian
tasks that stem from chronic pain and fatigue; and The Denouement explores the adjustment to and acceptance of new lifestyles
as vision impairment, pain, loss of limb, and trauma become chronic conditions.” (Barker 2018, 27)

150
Figura 3.63. Threesixfive (2015) apresentando o ecrã do website onde foi implementado o jogo,
consultado a 3 de janeiro de 2022 em: https://dakodabarker.com/threesixfive77

Já as metáforas visuais em Gris (2018), descrito na secção 3.2.4., levam os jogadores a


questionarem-se sobre como reconstruir o papel e origens da personagem jogável e a
razão de ser do mundo fragmentado que a envolve.

Em suma, segundo os resultados de um estudo por Elisa Mekler et al. (2018), o


questionamento do jogador sobre um jogo pode permitir que o jogador faça sentido
deste, bem como, levantar hipóteses que aumentem a sua performance no jogo.

Especificamente, os jogadores forneceram descrições reflexivas, nas quais avaliaram seu


desempenho no jogo, ou envolveram-se na reflexão dialógica, onde revisitaram conscien-
temente as suas experiências anteriores de jogo para hipotetizar como resolver puzzles ou
considerar o que poderiam ter feito de forma diferente. (Mekler et al. 2018)337

Ou seja, o questionamento serve de base a uma reflexão sobre as alternativas criativas


da característica definidora do medium dos videojogos – a interação – sobre a qual nos
iremos debruçar na secção seguinte.

3.3.12. Interação

Interação é o reciprocar de atos entre sistema de jogo e jogadores que molda a


experiência de jogo e a sua perceção por jogadores, ou como diz Pedro Cardoso (2016):

Durante a travessia de um jogo, a experiência pessoal do jogador emerge das suas interações
com o sistema de jogo. É essa relação que determina o curso dos acontecimentos, que faz
emergir o andamento do jogo e a narrativa, moldando a experiência pessoal do jogador.
(Cardoso 2016, 262)338

337 T.A.: “Specifically, players provided reflective descriptions, where they evaluated their in-game performance, or engaged in
dialogic reflection, where they consciously revisited their past gameplay experiences to hypothesise how to solve puzzles or
consider what they could have done differently.” (Mekler et al. 2018).

338 T.A: “While journeying through a game, the player’s personal experience emerges from her interactions with the game system. It
is this relationship that determines the course of events, that makes the game progress and narrative emerge, shaping the player’s
personal experience.” (Cardoso 2016, 262).

151
Por isso, a interação é ancorada à agência que Janet Murray define como “[o] poder da
satisfação de tomar medidas relevantes e ver os resultados de nossas decisões e
escolhas” (2003, 127).339

A interação dos jogadores com objetos do mundo real pode introduzir novidade em
processos criativos ou de design, como o BIG Ball of Whacks (2007), cujas 30 pirâmides
rômbicas conectáveis magneticamente permitem prototipar formas além da original.
Já X-Ball (s/ data) opera de forma similar, mas as caraterísticas dos seus elementos são
mais adequadas para criar estruturas (ver Figura 3.67). Incluímos estes exemplos aqui
porque embora não se trate de jogos per se, existe uma fronteira ténue entre brinquedos
e jogos. Os brinquedos podem ser complementados por regras e operar como jogos ou
vice-versa. Ainda, ambos podem ser reapropriados, interagindo com eles para fins
criativos além do seu propósito original (Sicart 2014; Flanagan 2009).

Figura 3.64. Fotografias de: a) BIG Ball of Whacks (2007) e uma construção possível com os seus
elementos; b) X-Ball (s/ data) e uma construção possível com os seus elementos. Fotografias
consultadas a 3 de janeiro de 2022 em: https://creativewhack.com/home.php78

A interação manifesta-se também no corpo dos jogadores, já que posturas corporais ou


gestos dos jogadores podem ser usados em jogos de Gamestorming (Gray et al., 2010)
para apoiar as fases distintas de processos criativos para os quais são orientados. Estes
jogos foram apresentados em profundidade na secção 2.3.7.

Ainda, transcodificar jogos de tabuleiro em formato digital é um desafio que se


acrescenta ao potencial criativo nativo destes, e que pode ser trabalhado por interação
em Tabletop Simulator (2015), ilustrado na Figura 3.65, um sistema de simulação de
física aberto que permite ampliar a simbologia e significado de jogos analógicos, e
recuperar o seu carácter de interação social para o meio digital (Micael 2020).

339 T.A.: “Agency is the satisfying power to take meaningful action and see the results of our decisions and choices” (Murray 200 3,
127).

152
Figura 3.65. Captura de ecrã de Tabletop Simulator (2015), acedido a 22 de outubro de 2021, em:
https://store.steampowered.com/app/286160/Tabletop_Simulator/79

Esta interação social é onde assenta o potencial para inovar que depende da agregação
cognitiva de múltiplos indivíduos dispostos a trocar informação entre si (Shirky 2010),
o que aumenta a capacidade criativa de cada um, ou como diz Steven Johnson (2010):

Quando as primeiras cidades mercantis surgiram na Itália, elas não criaram mágicamente
algum grupo de nível superior de consciência. Eles simplesmente ampliaram o leque de
mentes que poderiam ter e compartilhar boas ideias. Esta não é a sabedoria da multidão, mas
a sabedoria de alguém na multidão. Não é que a rede seja inteligente, é que os indivíduos
ficam mais inteligentes porque estão conectados à rede. (Johnson 2010, 58)340

Portanto, a interação entre indivíduos é o que possibilita a emergência da inovação


(Johnson 2010) mais, as interações entre jogador e designer mediadas pelo jogo podem
ser vistas como um ato de cocriação porque o primeiro joga a experiência concebida
pelo segundo e este apoia-se no feedback do primeiro (Hunicke et. al. 2004). Assim a
seguir debruçamo-nos sobre a cocriação usando jogos, e como forma colaborativa de
os conceber.

3.3.13. Co-criação

A cocriação ancora-se na nova teoria da ação (Varela et al. 1993),341 são atos criativos
que emergem da interação improvisada em tempo-real entre vários indivíduos e o
ambiente onde estes se inserem (Davis et al. 2015).

340 T.A.: “When the first market towns emerged in Italy, they didn't magically create some higher-level group of consciousness. They
simply widened the pool of minds that could come up with and share good ideas. This is not the wisdom of the crowd but the
wisdom of someone in the crowd. It’s not that the network is smart, it's that the individuals get smarter because they’re connected
to the network.” (Johnson 2010, 58).

341 T.A.: “The new theory of enaction claims that cognition and creativity always emerge through a real-time and improvised interaction
with the environment and other agents in that environment (Varela et al. 1993).”, citado por Davis et al. (2015, 110).

153
Embora as teorias [de ação] tradicionais possam trabalhar para incorporar esse ciclo de
feedback de perceção-ação para modelar a interação improvisada contínua, a teoria da enação
começa com a suposição de que toda cognição é baseada neste princípio de interações
improvisadas guiadas por feedback do ambiente. (Davis et al. 2015, 110)342

Jogos que estimulem o pensamento criativo e cocriação sobre temas diversos devem ter
várias categorias e ser claros na sua instrução. Este é o caso de 75 Tools For Creative
Thinking (2012), ilustrado na Figura 3.66. Este consiste num baralho de cartas com
instruções para gerar coisas úteis composto por cinco categorias: a) Iniciar, obter uma
noção rápida do tópico a trabalhar; b) Olhar em redor, inspirar-se e identificar
necessidades das pessoas envolvidas no contexto anterior; c) compartimentar, organizar
informação; d) libertar-se, gerar ideias a parte do conhecimento profundo do assunto;
e) avaliar e selecionar, triar as melhores ideias de acordo com critérios. 343 Já as IDEO
Method Cards (IDEO 2013) é uma ferramenta de ideação e cocriação para inspirar novos
designs em contextos profissionais ou educacionais. Divide-se em quatro categorias:
Aprender, Ver, Perguntar e Experimentar. Cada carta contém um método com instruções
de uso dirigido a um estágio de design em específico. Este conjunto de jogos permite
aos participantes alternarem entre os estágios do projeto sem perderem o foco dos seus
objetivos.344

Figura 3.66. 75 Tools For Creative Thinking (2012) apresentando fotografias do produto (esquerda) e de
uma sessão de jogo (centro e esquerda). 80

Recentemente a cocriação, segundo John Banks (2010), tem ganho maior impulso com

342 T.A.: “While traditional [action] theories could work to incorporate this perception-action feedback loop to model continuous
improvised interaction, the enaction theory begins with the assumption that all cognition is based on this principle of improvised
interactions guided by feedback from the environment.” (Davis et al. (2015, 110).

343 75 Tools For Creative Thinking (2012) é uma das nossas análises atentas que será mais desenvolvida no capítulo seguinte.

344 Tanto 75 Tools For Creative Thinking (2012) como as IDEO Method Cards (2013) existem sob forma de baralhos físicos e aplicações
digitais.

154
novos tipos de jogos como Spore (2008) em que o jogador controla a evolução de uma
espécie desde a sua origem até ser capaz de explorar o universo estelar. LittleBigPlanet
(2008) é um jogo multijogador de puzzle e plataforma. Ambos os jogos proporcionam
editores integrados para criar conteúdo para os próprios jogos, bem como, redes para
a partilha de tais criações entre jogadores.

O recente sucesso comercial do Spore desenvolvido pela Maxis e publicado pela Electronic
Arts, e.g. depende fortemente do conteúdo gerado pelo usuário. O [jogo] LittleBigPlanet de
plataforma e puzzle, desenvolvido pela Media Molecule e lançado em outubro de 2008 para a
consola PlayStation 3, também depende muito de conteúdo criado pelo usuário. Os jogadores
usam ferramentas de edição integradas no jogo para criar e editar novos níveis e objetos,
podendo então partilhar essas criações com outros jogadores por meio do serviço online
Playstation Network. O significado particular de títulos como Spore e LittleBigPlanet é que agora
eles integram a prática da co-criatividade como uma parte central da experiência de jogo e
do negócio dos videojogos. A máxima de LittleBigPlanet ‘Jogar, criar, partilhar’ enfatiza a
importância destas práticas co-criativas. (Banks 2010, 254)345

A colaboração criativa entre jogadores permite-lhes ainda debater os valores pessoais


que cada jogador traz e que afetam o jogo, a troca de feedback sobre algo criado no jogo,
e o consenso sobre a estética que deve envolver esse algo para sinergizar esforços de
conceção.346 Estas variáveis todas influenciam o desenrolar de Quest Atlantis’s
Architecture Unit (2011), um espaço digital onde jogadores criam edifícios virtuais em
conjunto segundo dois fluxos arquitetónicos: 1) construcionista social; 2) criativa
individual (Peppler e Solomou 2011).

Em suma, a investigação recente tem apontado que nós não aprendemos somente a
jogar jogos, mas também a concebê-los (Arnab et al. 2017; Cucinelli et al. 2016), e cada
vez mais em cocriação segundo Romero et al. (2018):

Dada a evolução observada de uma abordagem de consumo de tecnologias digitais para uma
abordagem co-criativa, notamos duas alavancas importantes: a evolução tecnológica e a
difusão da abordagem participativa na educação. Em primeiro lugar, a evolução das
tecnologias popularizou as plataformas de motor de jogo e o surgimento de plataformas de
programação visual como Scratch, levando à criação de jogos básicos do estilo arcade, jogos
do estilo indie ou mesmo jogos baseados em padrões (...). Em segundo lugar, em pesquisas e
estudos de media, tem havido uma tendência de considerar o participante como um agente
criativo dentro de um processo de criação coletiva compartilhada, ao invés de um usuário
final que estará envolvido como um consumidor que interage com um produto desenvolvido

345 T.A.: “The recent commercial success of the Maxis-developed and Electronic Arts-published Spore, for example, relies heavily on
user-generated content. The puzzle-platformer LittleBigPlanet, developed by Media Molecule and released in October 2008 for
the PlayStation3 console, also relies heavily on user-created content. Players use editor tools embedded throughout the game to
create and edit new levels and objects. They then can share these creations with other gamers through the Playstation Network
online service. The particular significance of titles such as Spore and LittleBigPlanet is that they now integrate the practice of co-
creativity as a core part of the gaming experience and the videogame business. LittleBigPlanet’s tag ‘Play, Create, Share’
foregrounds the centrality of these co-creative practices.” (Banks 2010, 254).

346 Ainda, a ampliação do pensamento criativo nem sempre reside na sinergia de interesses, pois empatizar e refletir sobre outras
perspetivas também permite gerar atos criativos.

155
profissionalmente. (Romero et al. 2018)347

3.4. Conclusões Preliminares


A revisão de literatura revelou diversos aspetos alinhadas com as questões, objetivos e
âmbito deste projeto. Durante a revisão de jogos reparámos que estes aspetos se
relacionam com ações de jogo, podendo assim ser agrupados em categorias de ações de
jogo para a criatividade. Estas categorias podem auxiliar a conceber e analisar videojogos
para desenvolver literacia criativa, algo que detalhamos nas secções seguintes.

3.4.1. Ações de Jogo para a Criatividade: Diálogo

Um jogo pode ser visto como uma conversação entre os seus agentes, jogadores e
sistema de jogo, pelo que atos criativos num jogo requerem diálogo, comportamentos
para entender e responder aos seus assuntos. Ou seja, competências cognitivas e
atitudes abertas ao risco para jogar, e aptidões em processos de design para conceber
um jogo que vá ao encontro das expectativas dos jogadores. O domínio destas aptidões,
bem como de ferramentas de edição ou motores de jogo estreitam o diálogo entre
sistema de jogo e jogador para que este conceba novas formas de jogar. 348 Conceber
jogos requer processos criativos que podem ser apoiados em ferramentas especial-
zadas, ou simplesmente nos componentes de jogos pré-existentes.

Em suma: diálogo ocorre entre interagir, as ações usadas pelo jogador para entender e
lidar com o jogo, e conceber, os processos criativos do designer para conceber jogos.

3.4.2. Ações de Jogo para a Criatividade: Dialética

O diálogo pode suster uma dialética de jogo, procedimentos que permitam aos jogadores
questionar ou criticar a ética ou retórica de jogo, individualmente ou entre si, em
contextos de jogo que reflitam tais preocupações.

A dialética requer condições para reciprocar recursos de pensamento, e.g. no confronto


entre perspetivas culturais dos jogadores e as que o sistema de jogo apresenta, e nas
respostas que imprimem caraterísticas ao personagem jogável para ultrapassar tais
oposições.

347 T.A.: “Given the observed evolution from a consumer approach of digital technologies towards a co-creative approach, we notice
two important levers: the technological evolution and the spread of the participatory approach in education. Firstly, the evolution
of technologies has popularised game engine platforms, and the emerging of visual programming platforms such as Scratch, leading
to the creation of basic arcade-style games, indie-style games or even pattern-based games (...). Secondly, within research and
media studies, there has been a tendency to consider the participant as a creative agent within a shared collective creation process,
rather than as an end-user who will be engaged as an interactive consumer of a professionally-developed product.” (Romero et al.
2018).

348 Um motor de jogo, game engine em inglês, é uma estrutura de software dotada de funcionalidades para desenvolvimento de
videojogos como o Mission Maker 1 (2010; Buckingham e Burn, 2007), o Unreal (1998) ou o Unity (2005).

156
A dialética pode ter apenas caráter reflexivo, desenvolvendo-se na mente dos jogadores
para além do jogo, a partir da vivência dos personagens, de metáforas de reconstrução
ou de consequências para práticas capitalistas subjacentes.

Em suma, a dialética emerge do diálogo entre os argumentos que o jogo usa para
convencer jogadores sobre o valor dos seus assuntos (a sua retórica), e a crítica, o
questionar dos jogadores sobre tal perspetiva.

3.4.3. Ações de Jogo para a Criatividade: Tentativa-erro

O diálogo e a dialética ocorrem com a introdução de alterações nos estados de jogo pelos
seus agentes. Assim, são precisas sucessivas ações de tentativa-erro para alterar estados
de jogo e suster o diálogo que visa entender as necessidades deste, e especular sobre
ações futuras dos jogadores, ou suster uma dialética para gerir expectativas do
subsistema de inteligência artificial do jogo para o poder prolongar.

Tentativa-erro é intrínseca a processos criativos, pois requerem esforço, sensibilidade,


plasticidade e risco. Tentativa-erro é visível no recombinar de recursos por jogadores, e.g
na transformação criativa do território de jogo para progredir, quando este o permite.

Sucessões de ações diferentes podem levar a estratégias criativas para vencer, o que
geralmente depende de aprendizagem prévia, através de múltiplas perdas enquanto
preparação para lidar com o jogo.

Em suma: tentativa-erro349 é crucial para negociar e sustentar a dialética entre estados de


jogo, como realizar, as ações que suplantam a oposição do jogo, e arriscar, através do
qual o jogador progride e adquire competências.

3.4.4. Ações de Jogo para a Criatividade: Sinergia

O diálogo e a dialética assentes em tentativa-erro podem gerar sinergia entre agentes de


jogo, a convergência de interesses necessária para jogar, no qual os personagens
jogáveis por mão dos jogadores sincronizam esforços para suplantar desafios e
oponentes. Por vezes os modos que permitem estabelecer esta sincronia são limitados
obrigando a criar formas de comunicação dentro do âmbito do jogo que permita a
progressão em conjunto.

Ainda, a convergência não aliena interesses, argumentos, estéticas ou valores pessoais


dos jogadores, o que pode dar origem a atos ou resultados surpreendentes e relevantes.

349 Em vez de iteração optámos por tentativa-erro dado que não aponta para repetição, mas para a sucessão e reciprocação de processos
diferentes com vista a desbravar descobertas, novas soluções, ou a reinvenção do jogo.

157
Em suma: a sinergia emerge do atrito que opõem agentes numa dialética, a diferença
entre interesse individual, objetivos e valores dos agentes num jogo ou processo
criativo, e colaboração, o sinergizar forças para criar conjuntamente.

158
Parte II - Trabalho Laboratorial e Análise

159
(Página em Branco)

160
4. Análise de Casos

Neste capítulo debruçamo-nos sobre os estudos de caso que pesquisamos no decurso


deste projeto com o auxílio da revisão de literatura dos capítulos 1 e 2, e a revisão de
jogos do capítulo 3. Esta pesquisa permitiu-nos filtrar progressivamente os casos
relevantes para o âmbito desta investigação, que se encontram ancorados nas ações de
jogo para a criatividade propostas no capítulo 3. Assim, nas secções seguintes
apresentamos os métodos e procedimentos que usamos para encontrar e filtrar estes
casos, e dissertamos sobre como é que cada pode ser usado para aumentar a
criatividade, quais os seus aspetos que podem favoráveis a este fim, com base numa
análise crítica. No final, apresentamos as conclusões que daí retiramos.

4.1. Metodologia e procedimentos


O design de videojogos envolve múltiplos aspetos e, segundo James paul Gee (2004a),
é ainda mais exigente quando o seu objetivo vai além do entretenimento. Conseguir
distinguir estes aspetos requer uma análise similar às leituras atentas,350 um tipo de
análise literária a aplicar com o intuito de extrair significados examinando como a
linguagem é usada em textos complexos (Snow e O’Connor 2013), e que se usa aqui
para analisar videojogos (Bizzocchi e Tanenbaum 2011). No contexto desta investigação
a leitura atenta envolve jogar para inspecionar mecânicas de jogos351 com potencial para
estimular atos criativos. Assim, escolhemos analisar tanto jogos analógicos como
digitais. Jogos analógicos porque:

• São jogos que nos acompanham desde os primórdios da humanidade (Sousa 2019),
e possuem um caráter de socialização entre jogadores, que pode ser observada em
tempo real e de forma mais direta durante sessões de jogo;
• Os jogos analógicos foram refinados durante mais tempo que os seus congéneres

350 O termo leitura atenta é uma Tradução do Autor (T.A.) do termo original em inglês close readings, que nos estudos literários
identifica um tipo de análise literária centrado no funcionamento linguístico e estilístico de textos. A leitura atenta, na nossa
investigação, é aplicada a videojogos que vemos como um texto interativo. A análise processa-se do seguinte modo: 1) jogar o jogo
uma vez tendo em mente uma questão formulada no contexto da investigação. À medida que se lê, tentar encontrar momentos,
aspetos, condições regras ou dinâmicas de jogo que se relacionem com essa pergunta, ou que aportam assuntos relevantes; 2) jogar
de novo desta vez focando o que se revelou importante no passo anterior, anotando com maior exatidão porque são relevantes; 3)
examinar estes aspetos atentamente, que padrões ou ideias emergem? Neste passo podem ser revelados aspetos literais ou
metafóricos, bem como uma diversidade de perspetivas; 4) baseado nestas descobertas elaborar uma resposta à questão inicial,
que deve refletir as deduções e especulação pessoal, e a capacidade de focar um assunto particular no todo em que consiste o
jogo; 5) elaborar um ensaio em torno desta resposta, usando o que se revelou importante para a sustentar. Uma análise aprofundada
sobre poucos tópicos possui mais força que vários tópicos observados superficialmente (Ceia 2009).

351 Casos de estudo fazem parte do trabalho de campo que conduzimos para clarificar aspetos da investigação, desafiar ou consolidar
teorias, resolver questões ou informar oportunidades de pesquisa, tendo por base a visão de todo de cada protótipo (McCombes
2019; Hanington e Martin 2019).

161
digitais, e por isso são boas referências para desenvolver rapidamente protótipos
de baixa fidelidade (analógicos), que por sua vez, sirvam de base à prototipagem de
alta fidelidade (digitais).

Por sua vez, escolhemos analisar também jogos digitais porque esta investigação visa
o desenvolvimento de jogos para serem jogados no contexto pervasivo dos media
digitais. Contudo, esta análise apresentou os seguintes desafios:

• Os videojogos enquanto medium computacional interativo podem levar o jogador a


perder-se numa infinidade de possibilidades de ação que dificulta a compreensão
do seu próprio sistema:

Ainda sentimos que a conclusão, mesmo em media computacionais, é fundamental. Podemos


desejar voltar a experimentar sistemas, reencenar narrativas, repetir jogos, estar envolvidos
em múltiplas variações e mutações formais aparentemente infinitas de uma obra, mas sem
algo parecido com a resolução, sempre que interagirmos com um sistema aberto estaremos
perdidos na incompreensão. (Carvalhais 2021, 8) 352

• Os sistemas dos jogos analógicos, estão expostos ao jogador e não escondidos em


código, sendo assim úteis no estudo de design de jogos. Ainda, é difícil entender a
natureza de um videojogo sem perceber o seu sistema de regras, e nem sempre o
seu código é disponibilizado para análise, ou nas palavras de Greg Costikyan (2011):

Os jogos digitais podem ser muito mais complicados em termos dos algoritmos e do número
de elementos que usam do que os jogos de tabuleiro, mas são controlados, em última análise,
por algoritmos que, como os dos jogos de que usam, criam ciclos de jogabilidade, facultam
reforços positivos ou negativos e apresentam desafios que os jogadores devem trabalhar para
superar. Noutras palavras, independentemente do interesse do indivíduo incidir nos próprios
jogos de tabuleiro, no design de jogos como disciplina, ou na evolução histórica da forma, os
jogos de tabuleiro são dignos de estudo. (Costikyan 2011, 14)353

• O investigador não possui conhecimento sobre programação, pelo que, em conjunto


com as razões anteriores, optou-se por estudar videojogos à luz das mecânicas de
jogos analógicos.

A validação dos protótipos por sua vez, só poderia ser feita depois de conceber a
framework (o nosso objetivo principal),354 pelo que percebemos que seria difícil

352 T.A.: “We still feel closure to be fundamental, even in computational media. We may wish to re-experience systems, re-enact
narratives, replay games, be involved in multiple variations and seemingly endless formal mutations of a work, but without
something akin to closure, whenever we interact with an open-ended system we will always be lost in incomprehension” (Carvalhais
2021, 8).

353 T.A.: “Digital games can be far more complicated, in terms of the algorithms they use and the number of elements in play than
tabletop games, but they are controlled, in a final analysis, by algorithms that, like those of tabletop games, create gameplay
loops, provide positive or negative reinforcement, and pose challenges to players they must work to overcome. In other words,
whether your interest is in tabletop games themselves, in game design as a discipline, or in the historical evolution of the form,
tabletop games are worthy of study.” (Costikyan 2011, 14). Costikyan refere-se a jogos de tabuleiro cuja natureza se integra na
nossa noção de jogos analógicos, que se estende a todas as formas de jogo que não se apoiam em sistemas computacionais.

354 Ver a subsecção Questões e Objetivos na Introdução da Tese.

162
conciliar ambas as tarefas no tempo útil previsível para desenvolver este estudo. Ou
seja, esta foi a razão pela qual optámos por remeter a avaliação mais fortemente para
trabalho futuro. Contudo, avaliámos alguns protótipos porque o seu grau de
refinamento o justificava e porque estavam reunidas as condições para proceder a
testes com envergadura. Estes testes envolveram várias equipas de jogadores com
perfis diversos, ambos em contexto de sala de aula e recorrendo a questionários da
Google para recolher as perceções dos jogadores.355

Na secção seguinte, apresentamos os estágios que usamos para escolher a amostra de


jogos a estudar.

4.1.1. Pesquisa

Os procedimentos que usamos para encontrar jogos para analisar são similares aos que
expusemos na secção 3.2. Porém, neste capítulo, reforçamos a importância do propósito
da investigação com um critério de inclusão extra: os jogos deverão ser orientados para
contextos de uso criativo, com implicações reais para a criatividade, ou que se apresentem como
sistemas criativos sofisticados por si, ou seja jogos com características para aumentar a
criatividade. E.g. jogos usados na disciplina do Design para desbloquear ou guiar
processos criativos para responder a fins específicos.

A pesquisa por estes jogos resultou nos 20 jogos que são objeto da análise neste
capítulo. De seguida, apresentamos um diagrama na Figura 4.1. que ilustra como
filtramos e analisamos esta amostra.

Figura 4.1. Diagrama com o procedimento de pesquisa, filtragem de resultados e análise.81

355 Os testes destes protótipos envolveram várias equipas de jogadores com perfis diversos, e ambos ocorreram em contexto de sala
de aula. Após o teste foram usados questionários da Google para recolher as perceções dos jogadores. Por exemplo, Damas versus
Conceção de Videojogos (2021) foi testado e avaliado numa aula da unidade curricular de Jogos digitais a 27 de março de 2021, e,
Pedra, Papel Tesoura versus Conceção de Personagem de jogo (2021), no mesmo formato numa aula da unidade curricular de
Sistemas Gráficos e Animação 3D, a 29 de abril de 2020. Estas unidades curriculares fazem parte do plano curricular do Mestrado
Multimédia da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto FEUP.

163
4.1.2. Filtragem de Resultados

Para obter uma amostra mais relevante, filtramos os resultados da pesquisa segundo o
seguinte procedimento e critérios:

1. Focamos a pesquisa dos jogos para a amostra em artigos académicos e de


opinião. Recorremos ainda às plataformas de venda de jogos STEAM e Itch.io,
para obter sugestões de jogos.
2. Verificamos se os títulos e resumos dos artigos académicos ou os artigos de
opinião se relacionavam com os termos de pesquisa;
3. Conferimos se os artigos mencionados no critério anterior exploram videojogos
ou artefactos congéneres para criar algo ou auxiliar em processos criativos; 356
4. Verificámos se efetivamente se tratava de jogos orientados para contextos de
uso criativo, com implicações reais para a criatividade, ou se se apresentavam
como sistemas criativos sofisticados per se.
5. Verificámos se poderíamos ter acesso direto aos jogos para os poder jogar, ou
ver jogar os jogos da amostra resultante do critério anterior. Em alternativa,
verificámos se conseguiríamos ter acesso aos seus criadores ou poder aceder a
documentos multimédia sobre estes jogos.

4.1.3. Procedimento da Análise

Para analisar os jogos obtidos no ponto anterior seguimos um procedimento com


passos similares ao da secção 3.2.3:

1. JOGAR e OBSERVAR: Sempre que possível jogámos diretamente os jogos para os


experienciar em primeira mão, com o objetivo de entender os fenómenos e
respostas por eles evocadas, as dimensões criativas que proporcionam, as
mecânicas ou dinâmicas que lhes estão subjacentes.

Em complemento, observámos357 jogos a serem jogados para anotar as reações


ou fenómenos que provocam noutros jogadores, nomeadamente atos

356 Por artefactos congéneres entendemos jogos analógicos, videojogos ou processos gamificados vocacionados para criar ou aprender
a criar coisas aplicáveis dentro ou fora dos jogos,

357 A observação enquanto método qualitativo permite perceber aspetos da operação de artefactos e as perceções e comportamentos
por eles suscitados (Hanington e Martin 2019), ou seja, permite entender, descrever e avaliar em profundidade aspetos favoráveis
ao propósito deste projeto. Contudo, também recolhemos dados quantitativos para reforçar descobertas e obter uma visão mais
completa sobre o caso ou protótipo visado.

164
criativos.358 Isto permitiu obter informação sobre a operação do jogo por outras
perspetivas de jogador que não a do investigador, como tempo e qualidade de
resposta ao que o jogo apresenta e os comportamentos por ele provocados.

A observação foi ainda usada quando não era possível interagir diretamente com
o jogo. Nesses casos, recorreu-se a outras fontes de informação, como artigos
académicos que se debruçam sobre o jogo, que o usam como exemplo, caso de
estudo ou enquanto resultado de uma investigação. Outras fontes de informação
incluíram instruções, artigos de opinião e vídeos da execução do jogo.

2. IDENTIFICAR: A informação recolhida no ponto anterior permitiu-nos


identificar mecânicas que refletem aspetos centrais em cada jogo ou o que estes
aspetos podem produzir para efeitos de análise. Estas mecânicas foram
reveladas por comparação com 182 mecânicas de jogos de tabuleiro listadas no
website Board Game Geek;359

3. VERIFICAR: Verificaram-se se as mecânicas, ou combinações de mecânicas


reveladas no ponto anterior eram identificadas na amostra de jogos estudados.
Reparámos que algumas das mecânicas eram recorrentes em diferentes jogos,
o que sugere que são relevantes para que ocorram atos criativos nestes. Por isso
ordenamos as mecânicas de acordo com o seu número de ocorrências na
amostra de jogos.360

De seguida, verificaram-se como é que estas mecânicas foram implementadas


nos jogos.361 Fizemos isto identificando dinâmicas que as mecânicas
despoletaram em cada jogo. Isto permitiu-nos ter uma visão global e sintética
de padrões de mecânicas e da sua integração em cada jogo.

4. CORRELACIONAR: Procuramos por correlações entre padrões entre os jogos


estudados. Estas correlações permitiram-nos distinguir cinco aspetos
importantes para conceber jogos para aumentar a literacia criativa.

358 A observação enquanto método qualitativo permite entender, descrever e avaliar em profundidade artefactos (O’Grady 2006) como
aspetos favoráveis ao propósito deste projeto. Também recolhemos dados quantitativos para reforçar descobertas e obter uma
visão mais completa sobre o caso ou protótipo visado.
359 Este website foi escolhido porque é classificado por outros websites como sendo uma referência no âmbito dos jogos de tabuleiro
e de cartas. Ainda, apresenta uma grande quantidade deste tipo de jogos, opiniões, e uma lista ampla e estruturada sobre as
mecânicas que utilizam. O website foi acedido a 6 de julho de 2021 em: https://boardgamegeek.com/browse/boardgamemechanic

360 Esta informação foi estruturada na Tabela 4.2, que contém uma descrição sumária das mecânicas identificadas e dos jogos onde
são reconhecidas, e listadas segundo o número total de ocorrências.

361 Esta informação foi estruturada na Tabela 4.3, que contém um resumo de como foram implementadas para cada jogo.

165
4.2. Estudos de Caso
A pesquisa anterior permitiu-nos escolher jogos que dividimos em duas categorias –
resultantes de investigação, Triple-A ou desenvolvidos de forma independente
(indie),362 por sua vez divididos em propósitos generalistas ou específicos, e listados
cronologicamente na tabela 4.1.

Nas subsecções seguintes, descrevemos e analisamos estes jogos, um a um. Cada


subseção descreve sucintamente um jogo, apresentando os seus constituintes e as
instruções da sua operação numa caixa de texto à parte do corpo de texto, sendo de
seguida apresentada a crítica ao jogo e uma análise das mecânicas identificadas.

Tabela 4.1. Lista ordenada de casos de estudo (jogos) e respetivos critérios de análise.4

Origem Propósito nº Nome

Resultantes de O âmbito destes jogos 1 Jogo de Improviso (2020)


investigação é orientado para
2 Creative Emergency (2019)
contextos criativos
generalistas 3 Cards Go (2019)

O âmbito destes jogos é 4 Why are We like This (2020)


apontado para criar algo 5 Gamers4Nature Toolkit (2020)
para contextos
6 U Know Me!!! (2019)
específicos
7 Ideachef (2018)
8 Jogos Resultantes das Aulas de Metodologias de
Projeto (2018)
9 Tiles Iot Toolkit (2017)
10 Intuìti (2013)

Jogos Triple-A ou O caráter destes jogos é 11 Dreams (2020)


indie experimental, podendo 12 Astroneer (2016)
ser apontados a
13 75 Tools For Creative Thinking (2013)
diferentes processos
criativos 14 Mindshake Thinking Cards (2011)
15 Minecraft (2009)

Estes jogos são 16 Lichenia (2019)


apontados a processos 17 Baba is You (2019)
criativos com um foco
18 Tabletop Simulator (2015)
em concreto
19 Word Out! (2014)
20 Cards Against Humanity (2011)

362 Os jogos Triple-A são geralmente equivalentes a sucessos de bilheteira no cinema. Envolvem equipas numerosas que trabalham
meses ou anos para finalizar um produto num grande estúdio, que depois é comercializado por uma editora de jogos de renome.
Por oposição os jogos indie são produzidos e financiados de forma independente por pequenas equipas. Por estas razões, os jogos
indie têm um custo menor, são menos exigentes em termos de hardware gráfico e são comumente distribuídos apenas digitalmente.
Apesar disso, podem atingir fama como é o caso de Minecraft (2011) ou Stardew Valley (2016).

166
4.2.1. Jogo de Improviso

Jogo de Improviso (2020) é um jogo para ultrapassar problemas de comunicação de


equipas envolvidas em processos criativos (ver Figura 4.2).363 É ainda um exercício onde
os jogadores fazem associações entre conteúdos de cultura popular presentes no
baralho de cartas em que consiste.

Figura 4.2. (esquerda para a direita), instruções e cartas do Jogo de Improviso (2020).82

Figura 4.3. Jogo de Improviso (2020), sequência comum do jogo com 2 jogadores (1 a 5).83

Componentes
1 Baralho de cartas com imagens representando protagonistas de séries televisivas,
filmes, ou livros de banda desenhada. Cada carta é complementada com termos ou
frases relacionadas com o que é representado nas próprias cartas.

Sequência (ver figura 4.3)


• O primeiro jogador retira uma carta do baralho (1) e improvisa uma frase com
base no seu conteúdo (2) do baralho;
• O jogador seguinte retira outra carta do baralho (3) e improvisa uma frase com
base no seu conteúdo, combinando-a com a contribuição do jogador anterior
(4);
• Os turnos de jogador sucedem-se com cada jogador a acrescentar a sua
combinação às contribuições anteriores (4).

363 O jogo de Improviso (2020) foi concebido no Curso de Especialização em Design para Interação, Web and Jogos (iX), que decorre
na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto desde 2018. O contexto desta especialização é uma parceria entre a
Faculdade de Belas Artes e a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, e o UPTEC, o parque de Ciência e Tecnologia da
Universidade do Porto. O curso visa desenvolver capacidades em design para desenvolver media interativos. O mote para o projeto
foi dado por nós e pelo investigador Post-Doc Fabrício Fava, e a mentoria foi dada em colaboração com os professores do curso.

167
Fim do jogo
O jogo termina quando um dos jogadores não conseguir fazer a sua contribuição em
sequência e em sintonia com as combinações anteriores.

O Jogo de Improviso (2020) serve essencialmente para estimular a sinergia e cultivar


capacidades de comunicação entre jogadores. Contudo, considera-se que a informação
das suas cartas é em demasia, o que pode enviesar e limitar as associações criativas. A
sua relevância para esta investigação reside assim nos erros do seu desenvolvimento
pois também aprendemos com eles.364 Estas falhas que não ocorrem em jogos similares,
como Cards against Humanity (2011) ou What do you Meme (2016),365 que mesmo que
possam produzir resultados efémeros não facultam tanta informação aos jogadores, o
que permite variar nas suas associações. Ou seja, a sua relevância consiste nas suas
falhas, nos seus erros com os quais aprendemos que tornam evidente o que é impor-
tante num jogo deste tipo: variar a informação nas cartas, não revelar tudo, deixar
espaço para o jogador refletir e permitir a introdução de cartas novas, como de forma
similar ao jogo Cards Go (2020).366 Concluindo, trata-se de um jogo com carácter de ice-
breaker, e que no seu limite fora do seu foco pode gerar resultados serendipitivos.

O jogo possui a mecânica de início variável consoante a primeira carta retirada do


baralho pelo primeiro jogador. Os jogadores geram associações, cooperando no jogo
para desenvolver storytelling, transmitindo as suas contribuições individuais uns
aos outros numa ordem de turnos progressiva para conceber uma narrativa.

4.2.2. Creative Emergency

Creative Emergency (2019) é um kit de quatro jogos desenvolvido durante o Curso de


Especialização em Design de Interação, Web e Jogos,367 e que pode ser usado em diversas
sequências e por vários jogadores de acordo com objetivos em mente. O kit almeja

364 A pesquisa teórica para fundamentar o jogo limitou-se a entrevistas dos estudantes com profissionais em áreas onde o jogo pudesse
ser útil, como diretores de teatro, designers e psicólogos, pelo que não tem grande fundamentação teórica. Acrescenta-se ainda
que o contexto pandémico da COVID-19 impediu a concretização de algumas entrevistas. Mais, o jogo não possui mecanismos de
voto para validar contribuições como os existentes em Cards Against Humanity (2011) ou What do You Meme (2016), o que poderia
conciliar opiniões distintas.

365 Cards against Humanity (2011) é analisado em pormenor na secção 4.2.20. What do you Meme (2016) é um jogo similar a Cards
against Humanity só que as suas associações são feitas entre conteúdo textual e visual.

366 Cards Go (2020) é analisado em pormenor na secção 4.2.3.

367
Este curso visa o desenvolvimento de aptidões e conhecimento em design para meios interativos e metodologias do design centrado
em humanos. Resulta de uma parceria entre a Faculdade de Belas Artes e Engenharia da Universidade do Porto, e, o Parque de
Ciência e Tecnologia da Universidade do Porto.

168
ultrapassar bloqueios criativos ao estimular a imaginação e a espontaneidade. 368 O seu
desenvolvimento surge de contribuições entre indivíduos com conhecimento em áreas
díspares. As suas sessões de criação e de jogo restringiram-se a designers, mentores e
jogadores ocasionais. A sua simplicidade, versatilidade e a possibilidade de cocriação
permitem práticas de prototipagem menos complexas (Figura 4.4).

Figura 4.4. Creative Emergency (2019) opera em quatro fases do processo criativo com quatro jogos: 1)
Exploração com Low Cost Creative, 2) Especulação com Dor-Decaedro, 3) Introspeção com Simplex, e 4)
Avaliação com Contra-Senso.84

FASE 1. Low Cost Creative

Componentes
Uma figura abstrata de um humano, papel para elaborar baralhos de cartas no início do
jogo, e um dado numerado com seis lados comum.

Objetivos
Explorar a criação de conteúdo visual através da apropriação de materiais do quotidiano.

Regras
1. Antes da sessão de jogo, cada jogador elabora cartas de jogo usando nomes,
advérbios, adjetivos, verbos, ou outras formas. Este conteúdo deve representar 2
personagens (a incluir no baralho objetivos), 2 adereços (a incluir no baralho
obrigações), e 2 restrições (a incluir no baralho restrições);
2. Quem inicia retira uma carta de cada baralho para guiar a caracterização da figura;
3. O dado é lançado para determinar a quantidade máxima de adereços a aplicar à
figura;
4. Findo os passos anteriores o jogador tem 2 minutos para adicionar os adereços e
representar a personagem. Os restantes jogadores têm 1 minuto para adivinhar a
personagem representada.

Condições de vitória e derrota


Dependem da pontuação de cada jogador. O jogador que conseguir caraterizar a
personagem respeitando todas as restrições ganha 2 pontos. O jogador que adivinhar qual
é a personagem representada na figura ganha 1 ponto.

368 A maioria destes jogos visa desbloquear a criatividade usando processos simples similares aos Thoughts Behind the Thoughts (1970)
ou Oblique Strategies (1974).

169
FASE 2. Dor-decaedro

Componentes
6 dados sob forma de dodecaedros: 4 com fotomontagens impressas nas suas faces, 1
com pictogramas que caracterizam uma ação, e 1 com setas que indicam uma direção.

Objetivos
Especular sobre limites de problemas com recurso a tentativa-erro, entre construção e
desconstrução.

Regras
1. O jogo processa-se por turnos de jogadores que cada um contribui com um excerto
de narrativa para elaborar uma história. O primeiro jogador lança o dado com os
pictogramas que caracterizam uma ação. Mediante essa ação o jogador descreve
uma situação que a implique;
2. O jogador seguinte lança o dado com as fotomontagens e continua a narrativa. O
processo repete-se com o jogador seguinte até terminarem os dados com
fotomontagens;
3. O jogador seguinte lança o dado das setas para alterar o curso da história que
interpreta de forma livre, podendo impor-lhe de um limite a uma simplificação;
4. Em cada turno o jogador tem 20 segundos para teatralizar a ação e desenvolver um
excerto da história.

Finalização
Quando não existirem mais dados para lançar os jogadores decidem em conjunto se
alteram a ordem de lançamento dos mesmos e continuam a divergir a história, ou se
esta irá começar a ser simplificada.

FASE 3. Simplex

Componentes
Folhas A4 brancas e instrumentos riscadores.

Objetivos
Usar a introspeção do jogador para distinguir o desnecessário num trabalho criativo.

Regras
1. O turno começa com o jogador a representar um problema através de um desenho
numa folha de papel tendo 1 minuto para o fazer. A folha pode ser logo de início
dobrada se o jogador entender;
2. O jogador seguinte representa o mesmo problema numa folha com metade do
tamanho da anterior e em metade do tempo, tendo em mente simplificar o desenho.
3. Os turnos de jogadores desenrolam-se reduzindo-se sucessivamente o tamanho da
folha e o tempo disponível para proceder à representação.

Finalização
O jogo termina quando o(s) jogador(es) excede(m) o tempo disponível.

170
FASE 4. Contra-senso

Componentes
Diversas cartas e dados com temáticas diferentes.

Objetivos
Gerar e avaliar possibilidades de resposta a um problema

Preparação
Os jogadores definem um objetivo inicial para o jogo, como validar conceitos, criar
uma narrativa, definir um sentimento ou representar algo absurdo ou espontâneo. É
eleito o jogador que joga primeiro e a ordem dos jogadores seguintes.

Regras
• O jogo joga-se em equipa por turnos. Cada jogador, na sua vez, retira uma
carta e lança uma vez o dado, gerando uma associação entre estes em 10
segundos;
• As associações do jogador podem ser absurdas ou não, se for bem-sucedido
ganha 1 ponto. Caso o jogador não consiga cumprir o tempo, ou se desistir
perde o turno e deixa de contribuir para a geração de conteúdo.

Condições de vitória e empate


• O último jogador em jogo ganha o turno e 1 ponto podendo iniciar um novo,
para tal lança o dado e retira nova carta.
• No caso de um empate ninguém pontua, elegendo-se novo jogador a iniciar,
que lança o dado, mas mantém a última carta retirada. Os restantes jogadores
começam normalmente.

Em suma, este kit usa mecânicas que obrigam os jogadores a lidar com restrições, mas
com um âmbito de liberdade para operar dentro delas para focar ou divergir o seu
raciocínio. Pode ser jogado em cooperação ou a solo e permite registar a iteração de
soluções com papel e lápis. O seu início é variável sendo usada a ferramenta ou
sequências de ferramentas adequadas ao estágio criativo em jogo. Ainda, pode servir
para estimular a introspeção para decidir ou desbloquear algo num processo criativo.

4.2.3. Cards Go

Cards Go (2019) é um jogo de cartas que incita os jogadores a abraçar o imprevisto e o


aleatório enquanto ingredientes favoráveis à emergência de atos criativos e
imaginativos (Fava et al. 2021). Para isso guia a atenção para objetivos tangíveis e
relevantes que os próprios jogadores criam no seu decurso. Para tal os jogadores
produzem baralhos de cartas e associam os seus conteúdos.

171
A forma como se joga estimula a abertura à surpresa e à colaboração para gerar novos
conceitos criativos (Figura 4.5).369

Cards GO foi criado em 2016 para um workshop no FuturePlaces Media Lab.370Na época,
pretendia-se subverter o jogo e o fenómeno cultural do Pokémon GO (2016), transformando
o que é uma atividade passiva em que se vagueia no espaço real prestando atenção ao ecrã de
um telemóvel para capturar criaturas virtuais, numa atividade reativa, criativa e
transformadora, onde a tangibilidade do mundo físico circundante retroalimenta o
observador. 371 (Fava et al. 2021, 214)

Figura 4.5. Cards GO (2016) apresentando registos de sessões do jogo: construção do baralho de cartas
(esquerda), escolha das cartas a usar (centro), e planificação de uma das soluções (direita).85

Componentes
• Folhas em branco para criar 5 baralhos de cartas divididos nas seguintes
categorias: verbos; substantivos; adjetivos, wildcards e cartas disruptivas;
• Blocos de notas, folhas em branco, post-its e instrumentos riscadores para
anotar ideias ou associações no decurso de jogo;
• Dependendo do contexto de uso e objetivo podem ser usados telas de
conceção que estruturam os aspetos do que se pretende desenvolver (ver
Figura 4.5. à direita);

Objetivos
O objetivo varia de acordo com o contexto e o artefacto que se pretende criar, o que se
pode estender a várias disciplinas e atividades.

Estágios
A versão original é jogada em quatro estágios:

1. Início, em que os jogadores criam em conjunto cinco baralhos de cartas: 1 com

369 Este jogo foi alvo de duas publicações, um artigo intitulado CARDS GO: A Card-based game for game design and creativity (Fava et
al. 2020), e um capítulo de livro intitulado Play to Design with Cards GO: A Card-Based Game for Game Design and Creativity (Fava
et al. 2021).

370 Para mais informação aceder ao website: http://futureplaces.org

371 T.A.: “Cards GO was created in 2016 for a workshop at the FuturePlaces Media Lab. At the time, it aimed to subvert the game and
the cultural phenomenon of Pokémon GO (2016), transforming what is a passive activity of roaming while paying attention at a
mobile phone’s screen to capture virtual creatures into an active, reactive, creative, and transformative activity, where the
tangibility of the surrounding physical world feedbacks at the observer.” (Fava et al. 2021, 214).

172
verbos, 1 com substantivos, 1 com adjetivos, 1 com wildcards (qualquer conteúdo), e 1
com elementos disruptivos, com tarefas para executar no decurso da criação;
2. Contexto, em que equipas de jogadores recebem três destas cartas, que
acrescentam por turnos a um conjunto comum até alguém gritar “Vai!”;
3. Ir e Criar, em que as equipas geram algo inspiradas por este conjunto. A equipa que
gritou “Vai!” tem de usar todas as cartas presentes na mesa, sendo que as restantes
equipas escolhem as cartas que mais lhes convier. É atribuído um ponto para cada
articulação de cartas bem-sucedido, três pontos para a equipa que gritar “Vai!” ou
apenas metade se tal emprego não for bem visto pelos outros. Cada carta disruptiva
dobra a pontuação, sendo que as tarefas indicadas por estas devem ser processadas
em articulação com o desenvolvimento para evitar penalizações, que reduz a
pontuação da equipa a metade. O jogo pode voltar ao estágio 1 ou 2 se necessitar de
transformações ou melhoramentos.
4. Ir e Apresentar, em que as equipas apresentam os resultados da ideação às
restantes num prazo de tempo para validação e pontuação. Esta validação pode ser
usada para determinar uma equipa vencedora, ou seja, as condições de vitória são
acordadas entre todas as equipas.

Foram conduzidos workshops para testar a sua aplicabilidade em gerar conceitos de


jogos,372 aplicações ou outro conteúdo media.373 Conclui-se que tem potencial para gerar
ideias para narrativas, ficção, e formas de interação para diversos contextos. Contudo
só funciona se os jogadores estiverem descontraídos e dispostos a largar as suas pré-
conceções durante o jogo e a aderir abertamente à experiência.

Em suma, o jogo usa mecânicas de início variável porque os jogadores constroem o


seu baralho com papel e lápis para conceber algo. Os membros das equipas cooperam
e negociam entre si o desenvolvimento de um conceito em competição com outras
equipas. O jogo inclui role-playing de eventos, e o vencedor é determinado por
pontos de vitória atribuídos por votação de outros jogadores, segundo a adequação
das formulações feitas. Os conceitos são registrados com papel e lápis e são
desenvolvidos numa ordem de turnos progressivos, pelo que subsiste uma memória
do processo de jogo e cartas usadas. Há ainda um momento de diálogo para trocar
impressões sobre o trabalho uns dos outros com vista à sua melhoria em sessões de

372 Note-se que jogos cooperativos e colaborativos, como Pandemic (2008) e Cards Go (2018) podem sofrer com o jogador alfa, um
jogador que tenta manipular os outros para orientar o jogo segundo os seus interesses. Cards Go não tem mecanismos para evitar
este comportamento, que é de evitar num jogo cuja natureza é incontrolável e criativa.

373 WorkShock (2018) foram uma série de workshops visando processos de design aplicados a jogos usando o Cards Go (2018). Alguns
destes workshops tiveram lugar em contexto de aula e outros adotaram uma forma independente. Pretendia-se auxiliar alunos
através da componente lúdica do jogo a pensar crítica e criativamente sobre como gerar, discutir e analisar em grupo conceitos
para jogos, ou para outras temáticas alinhadas com as aulas. As conclusões foram obtidas a partir de observações e registos dos
investigadores, de questionários dirigidos aos participantes, e das opiniões de especialistas nos domínios de de conhecimento onde
foram facilitados, nomeadamente para o design de jogos.

173
jogo seguintes.

4.2.4. Why Are We Like This?

Why Are We Like This? (2020) é um jogo digital em formato de website que recorre a IA
para inspirar e auxiliar os seus dois jogadores a criarem uma história. Segundo os seus
autores, Max Kreminski et al. (2020), isto ocorre quando os jogadores fazem uso dos
jogos enquanto parceiros para contar histórias, recriando tais narrativas através da
dialética jogador-sistema de jogo, ilustrado no seu diagrama de fluxo na Figura 4.6.

Figura 4.6. Diagrama de fluxo de Why Are We Like This? (2020) extraído de (Kreminski et al. 2020).37486

O contexto inicial de Why Are We Like This? (2020) é o de uma pequena comunidade de
investigadores presos numa conferência remota. As histórias andam em torno de
conflitos que emergem entre personagens devido a mal-entendidos (Kreminski et al.
2020). O jogo integra o story sifting,375 um módulo computacional no seu sistema de jogo,
que simula durante a sua execução todo um mundo de história e eventos que sirvam de
base à atuação dos jogadores para consolidar uma narrativa (Ryan 2018).

Abordagens de story sifting para narrativas emergentes tentam abordar os desafios da geração
de narrativas por meio da curadoria: permitindo que um mundo de histórias simulado seja

374 Tratando-se de um projeto de investigação em curso, não temos nem acesso à experiência do jogo, nem ao seu interface visual,
apenas ao seu diagrama de fluxo.

375 O Story sifting é um termo cunhado por James Ryan para definir “um módulo que examina o material simulado acumulado capturado
numa crónica para peneirar o material narrativo bruto a partir do qual uma história real pode ser construída. (...) Para peneirar,
este módulo deve fazer uso de cursos de ação que codificam o conhecimento sobre o que faz de um material ser narrativamente
potente.” (2018, 236).

T.A.: “The story sifter is a module that sifts through the accumulated simulated material captured in a chronicle to excavate raw
narrative material out of which an actual story may be constructed. (...) To sift, this module must make use of policies that encode
knowledge about what material makes for narratively potent material.” (Ryan 2018, 236).

174
executado, gerando uma crónica massiva de eventos simulados e na maioria desinteressantes
e, em seguida, pesquisando nesta crónica por padrões de eventos narrativamente
convincentes, é possível fornecer aos jogadores histórias ou micro histórias atraentes sem
acumular conhecimento de como contar uma história atraente diretamente no próprio
mecanismo de simulação. (Kreminski et al. 2020)376

Figura 4.7. Why Are We Like This? (2020) ecrã com a interface do jogo sob forma de página web.37787

Componentes
O ecrã deste jogo digital divide-se em 3 áreas (ver Figura 4.7): a) onde se procede à
interação com o jogo e se elabora a história; b) onde se escolhem os personagens que
participam na história; c) onde se escolhem eventos gerados por IA;

Objetivo
Criar uma história em conjunto o sistema de jogo

Estágios de jogo
1. A cada sessão, o jogo gera um cenário geral, um elenco de personagens
jogáveis com historiais diferentes e vários eventos simples em que estes
podem participar.
2. Baseando-se nestas opções os jogadores escolhem os personagens e
eventos que vão participar na história, e de seguida descrevem em
profundidade o que ocorre nestes eventos. As escolhas dos personagens e
eventos, bem como a descrição elaborada pelos jogadores são registradas

376 T.A.: “Story sifting approaches to emergent narrative attempt to address the challenges of narrative generation through curation:
by allowing a simulated storyworld to run, generating a massive chronicle of mostly-uninteresting simulated events, and then
searching within this chronicle for patterns of narratively compelling events, it is possible to provide players with compelling stories
or microstories without baking knowledge of how to tell a compelling story directly into the simulation engine itself.” (Kreminski
et al. 2020).

377 Este ecrã é uma versão funcional de Why Are We Like This? (2020), executada e consultada a 19 de dezembro de 2021 a partir de:
https://github.com/ItsProbablyFine

175
pelo sistema numa caixa de texto editável pelos jogadores (a). Em todo o
momento os jogadores podem consultar mais sobre o que o sistema
elaborou sobre os personagens e mundo de jogo, para tomar decisões mais
informadas;
3. A partir destas decisões, o sistema de jogo sugere aos jogadores outro leque
de eventos para os personagens participarem. O processo repete-se até a
história ser dada como finalizada pelos jogadores.

Os padrões de design que emergem da dialética entre sistema de jogo e jogadores


permitem a estes contornar barreiras da criatividade como a tela em branco, o
bloqueio do escritor, o perfeccionismo e o medo de julgamento (Kreminski e Wardrip-
Fruin 2019).

Também descobrimos que esses elementos de design, em conjunto, parecem assistir os


jogadores envolvidos na atividade criativa, potencialmente permitindo-lhes mitigar os
efeitos ou contornar várias barreiras da criatividade. Estes elementos de design cor-
respondem aproximadamente às principais caraterísticas dos "jogos de jardinagem" - uma
classe de jogos generativos recentemente identificados por Kreminski e Wardrip-Fruin - e
sua presença num jogo pode ajudar a atrair jogadores que procuram contar histórias com
base nas suas experiências de jogo em certos jogos e em detrimento de outros (Kreminski e
Wardrip-Fruin 2019).378

A tela em branco ocorre quando o jogo fornece elementos ao jogador para criar algo e
este se vê incapaz de dar resposta a este objetivo. Já o bloqueio do escritor pode ocorrer
em qualquer momento do processo criativo e deixar o jogador preso sem saber como
prosseguir. O perfeccionismo é a incapacidade do jogador de tolerar falhas, o que pode
paralisar os seus atos criativos. Para lidar com os três problemas anteriores, jogos que
se abrem à expressão criativa têm de integrar maneiras de baixar as expectativas e
diminuir os riscos percecionados pelos seus jogadores.

O medo de julgamento é o medo da crítica ou outra avaliação negativa de coisas criadas


pelo jogador impedindo-o de se expressar como desejaria. Isto pode ser mitigado por
se os jogadores puderem justificar o seu fracasso com base nas limitações ou objetivos
aparentemente ridículos (e, portanto, divertidos) de jogo.

Em suma, o jogo apresenta eventos simples ligados às personagens do mundo de jogo


que podem auxiliar a desbloquear a criatividade do jogador. Portanto, é aqui que assenta

378 T.A.: “We also found that these design elements, taken together, seem to provide assistance to players engaged in creative activity,
potentially enabling them to mitigate the effects of or outright circumvent several identified barriers to creativity. These design
elements correspond closely to the key features of “gardening games”– a class of generative games recently identified by Kreminski
and Wardrip-Fruin – and their presence in a game may help attract players who seek to tell stories based on their play experiences
to certain games over others.” (Kreminski e Wardrip-Fruin 2019).

176
o seu potencial criativo do jogo para estimular a geração de associações por jogadores.
Contudo, é também aqui que pode assentar a fragilidade do jogo, porque os eventos
gerados pelo seu sistema têm um carácter muito simples que podem deixar jogadores
sem saber o que escrever exatamente e dificultar a elaboração da história.

O jogo é configurado proceduralmente por IA, que concebe os eventos, as personagens


jogáveis e o mundo com um início variável. É jogado numa sequência de turnos
progressivos envolvendo ações de jogadores que cooperam, negociando as decisões a
seu cargo, e simulações de IA, que influenciam o jogo. Ainda, as decisões dos jogadores
envolvem arriscar a sorte porque a informação é facultada apenas parcialmente pelo
sistema de jogo. Como os jogadores têm de decidir com base em informação limitada,
os resultados de ações de jogo são sempre incertos e imprevisíveis. A história vai sendo
registrada no sistema de jogo, e apresentada simultaneamente numa página web.

4.2.5. Gamers4Nature Toolkit

Gamers4Nature Toolkit (2020) é um kit de ferramentas para criar jogos dirigido

a estudantes do ensino secundário e superior, e educadores. Pretende ser um polo


colaborativo para conceber narrativas dirigidas a desafios ou preocupações ambientais
e biodiversidade, que por sua vez possam ser convertidas em jogos mobile (Figura 4.8).

Figura 4.8. Gamers4Nature (2017) fotografia acedida a 27 de outubro de 2021 em:


https://gamers4nature.web.ua.pt88

177
Figura 4.9. Componentes de Gamers4Nature (2017), imagens acedidas a 27 de outubro de 2021
em: https://gamers4nature.web.ua.pt89

Componentes (Figura 4.9)


1. 1 Documento de Design Rápido de Jogo (T.A.: Rapid Game Design Document), que serve
de tabuleiro de jogo. Tem a forma de uma folha A3 com instruções e uma estrutura de
elementos narrativos a preencher pelos jogadores;
2. 1 Baralho de Construção de Jogo (T.A.: Game Construction Cards Set) composto por 12
cartas que clarificam e exemplificam os aspetos constituintes de um jogo e da sua
narrativa. O baralho é dividido nas seguintes categorias:
i. Premissa, o início da história; História, como se desenrola a narrativa de jogo;
Personagens que constituem a ponte emocional entre o jogador e o jogo;
ii. Jogador, o agente principal de jogo; Desafio, o nível de dificuldade e a relevância
dos objetivos para manter o interesse dos jogadores;
iii. Arco dramático, para criar tensão na narrativa;
iv. Objetivos, o que se quer atingir com o jogo;
v. Recursos, o que o jogador possui no jogo para atingir objetivos;
vi. Ações, O âmbito de interações que o jogo proporciona;
vii. Regras, as limitações e possibilidades;
viii. Conflitos, os obstáculos a ultrapassar;
ix. Desfecho, como termina o jogo.
3. 20 cartas Temáticas sobre o ciclo de vida dos microplásticos e o seu impacto na
biodiversidade do planeta;

Regras
• O jogo pode ser jogado a solo ou preferencialmente em equipa para aumentar
a dinâmica de troca e geração de ideias. Os jogadores jogam ao mesmo tempo
de forma similar ao que ocorre numa atividade de brainstorming, ou seja, sem
uma sequência de vez de jogador ou uso de cartas construção, ou tempo
predeterminados;

178
• Com base nas instruções do tabuleiro e conteúdo das cartas do baralho
Construção, a equipa de jogadores elabora os aspetos da narrativa de jogo no
próprio tabuleiro ou em folhas à parte;
• A forma como os jogadores chegam a consenso sobre a narrativa a elaborar
fica também a cargo destes, não existindo pontuação nem formas de avaliar
pré-estabelecidas;

Fim
Quando os jogadores tiverem dado como concluída a história pretendida.

Não pudemos assistir a sessões de jogo pelo que só podemos inferir informação a partir
do artigo académico dos seus designers (Beça et al. 2020) e do website do toolkit. É
incluído aqui mesmo não se tratando de um jogo porque faculta aos seus jogadores
elementos e um procedimento estruturado lúdico para criar jogos com propósitos
relevantes. Ou seja, a sua execução é próxima da jogabilidade que distingue um jogo,
faltando apenas consolidar aspetos, como regras, do estipular tempos para ações aos
jogadores que nelas participam, a condições de vitória e derrota. Assim, a sua inclusão
justifica-se porque se enquadra nos propósitos desta investigação dirigida à conceção
de jogos para criar algo e assim aumentar a literacia criativa.

O jogo é visto como um polo de diálogo para convergir as ideias de um grupo de


jogadores em storytelling, numa narrativa de jogo focada em preocupações
ambientais. As cartas são usadas pelos jogadores para formular associações com o seu
conteúdo numa ordem de turnos progressiva. é um jogo cooperativo em que os
jogadores negociam a articulação das suas contribuições, que por sua vez são
registradas com papel e lápis no documento de conceito de jogo.

4.2.6. U Know Me!!!

U Know Me!!! (2019) é um jogo cujo objetivo como o título indica, incide sobre conceber
trajes que possam ser executados de forma económica para uso do jogador enquanto
cosplayer.379 O título em si designa também este tipo de práticas nas quais Anucha “Cha”
Saengchart, conhecido por “Low Cost Cosplay” se distingue (Cheema, 2019), como
ilustrado na Figura 4.10.

379 Cosplayer (definição) é uma abreviatura de costume play, alguém que trajado assume a identidade dos seus personagens fictícios
favoritos da cultura pop.

179
Figura 4.10. O fenómeno low cost cosplay protagonizado por Anucha “Cha” Saengchart.380 90

O jogo implica conhecimento da cultura pop para conhecer o personagem que se quer
representar. O jogo é um exercício de abstração para refletir sobre como reapropriar os
seus materiais simples para realizar a aparência de um personagem por vezes complexa
no mundo real (Figura 4.11), ou segundo a autora do jogo:

380 Os resultados nesta fotografia não decorrem do uso do jogo U Know Me!!! (2019), são iniciativas de Anucha “Cha” Saengchart. A
fotografia foi consultada a 23 de Dezembro de 2021 em: https://sea.mashable.com/entertainment/2342/the-lowcost-cosplay-guy-
is-back-and-his-creations-are-even-funnier-this-time

180
A meu ver o Low Cost Cosplay, essencialmente representa apenas as caraterísticas principais
que permitem identificar uma personagem. Dito isto, penso que o jogo ajuda o cosplayer a
sintetizar a personagem e a desconstruir as suas formas. Este exercício de abstração pode
ajudar então a largar um preconceito sobre a personagem e proporciona um pensamento
mais livre sobre a mesma!

Depois é necessário um segundo momento de criatividade/exploração do meio em que o


cosplayer se encontra: encontrar objetos que, à escala humana, cumpram a mesma função
das formas básicas que o jogo oferece. E.g. enquanto que no jogo as orelhas do rato Mickey
são dois círculos, na "vida real" podem ser dois pratos pretos ou dois discos de vinil. Penso
que ambas as fases precisam de criatividade para existir! (Silva, 2019)381

Figura 4.11. Resultados de diversas sessões com o U Know Me!!! (2019).91

Este jogo possui peças de feltro com diversas formas e baralhos de cartas com
personagens de cultura pop divididos nas categorias: Filmes, Anime, Animação, Banda-
desenhada ou Videojogos. O caráter simples dos elementos que constituem este jogo
pode evocar materiais comuns e configurações económicas para representar um
personagem desejado.

Os jogadores retiram uma carta de um dos baralhos com o nome de uma personagem,
e procuram combinar as peças de feltro numa forma que a represente. Assim, o jogo
divide-se num exercício de abstração para sintetizar o personagem, com as peças de
feltro, e uma exploração de objetos ao alcance do cosplayer, evocados pela abstração,
para executar o traje.

Em suma, o jogo é sobre representar personagens, i.e. conceber trajes económicos para
cosplay. Para tal, usam-se mecânicas para simular e fazer o reconhecimento de
padrões que caracterizam tais personagens com os componentes de jogo. É ainda um
jogo para se jogar a solo, com um início variável e que comporta o arriscar a
sorte no uso dos seus componentes.

381 Extraído de conversa por email com a autora sobre a perceção do seu jogo, a 14 de Maio de 2019.

181
4.2.7. IdeaChef

IdeaChef (2018) é um jogo para 4 a 6 jogadores que cumpre o papel de uma ferramenta
guiada por metáforas de culinária para o design de serviços (Figura 4.12). O jogo é um
dos resultados da investigação de Rui Patrício (2019) sobre o papel da gamificação 382 e
DT383 na inovação de serviços. Trata-se de um jogo para equipas de quatro elementos
que procedem à cocriação usando o estágio de ideação do DT (Patrício 2018).

Os principais objetivos desta tese são em primeiro lugar conceptualizar a utilização da


gamificação na fase inicial do processo de inovação, em segundo lugar investigar através de
estudos empíricos como é que o processo de inovação pode ser melhorado através desta
abordagem e em terceiro lugar explorar de que forma é que a gamificação pode apoiar e
melhorar o design thinking. (Patrício 2019)

Figura 4.12. Componentes e sessão de jogo de IdeaChef (2018). 92

Componentes
• 1 Tabuleiro central;
• Tabuleiros Menu pessoais;
• Tabuleiros de aquisição e pontuação pessoais;
• 1 Baralho Questões;
• 1 Baralho Poder;
• Post-its;
• Contadores das contribuições pessoais dos jogadores;
• Caderno pessoal para cada jogador tomar notas;
• Marcadores;

382 Gamificação (definição) é um processo de transformar atividades para que adquiram o carácter de jogo para motivar e envolver
utilizadores em tarefas difíceis e complexas (Deterding, et al. 2011; Werbach, 2014). A gamificação é um meio de combater a
desconexão do trabalho e a resistência à mudança, podendo ser usado para ampliar o campo criativo conceitual e estimular a
cocriação (van Amstel e Garde, 2016), pois é uma forma segura de interagir e entender problemas e prioridades dos jogadores
(Ramaswamy e Gouillart, 2010).

383 A definição de Design Thinking pode ser consultada na secção 3.3.2.

182
• 1 Cronómetro para controlar o tempo de cada ação do jogo;
• 1 Livro de receitas contendo um método para facilitar a geração de ideias.

Objetivos
Desenvolver um conceito minimamente viável ou um protótipo inicial de um serviço.

Fase I
• O cliente ou gerente lança um desafio, uma ideia, e designa os membros da
equipe de trabalho.
• A partir desta os membros da equipa contribuem com as suas perspetivas,
discutindo e avaliando-as entre si.
• Os jogadores recebem um tabuleiro Menu para preencher individualmente e
30€ em moeda de jogo.

Fase II
• Determina-se o jogador que controla os tempos e ajuíza soluções e o jogador
que joga primeiro. O último lança dois dados para saber de que baralho retira
uma carta: Gourmet, Menu, Sabor e Textura, Ingredientes, Ingrediente Secreto ou
Prato Principal.
• Baseado nesta carta, este primeiro jogador, e cada um dos outros que se
seguirem na sua vez, tem dois minutos para elaborar uma contribuição num
post-it que cola na sua secção do Tabuleiro Central. Cada jogador tem ainda um
minuto para apresentar sua ideia, que é avaliada pelo jogador encarregue
disso num intervalo de 15 minutos.
• Após três turnos, os jogadores podem comprar uma carta Poder para solicitar
feedback e ideias a outros jogadores.

Fase III
A terceira fase é o objetivo do jogo. Trata-se de convergir uma solução final num relatório
a apresentar ao cliente, gerente e outros interessados, que é por sua vez
complementado com o feedback destes.

Condições de vitória e derrota


O vencedor é o jogador ou equipa de jogadores que se distinguir com a melhor ideia.
Este julgamento é feito pelo gerente ou cliente anfitrião do jogo, com base no relatório
final de cada jogador ou equipa.

O jogo possui uma base teórica e instrução sólida, requerendo jogadores interessados
no seu propósito e com tempo para jogar. É difícil entrar no jogo e dele tirar resultados
sem uma ideia inicial ligada ao seu objetivo que seja interessante para os jogadores. 384

384 O potencial do jogo para outros fins criativos foi testado a solo com ideias apontadas além de serviços. Como foi mencionado,
revelou-se difícil gerar associações para artefactos sem ligação ao propósito original do jogo. Foi testado também com estudantes
de iX, na tentativa de os auxiliar a conceber o seu Creative Emergency (2019), mas não resultou pela mesma razão, porque o seu
âmbito está dirigido para o design de serviços.

183
Aliás, este interesse é central para associar metáforas e a ideia em tempo útil.

Em suma, é um jogo em que os jogadores em que ocorre negociação entre jogadores


para gerar ideias para serviços, e em que a melhor ideia é determinada pelo cliente. Por
vezes, é também um jogo cooperativo em que os jogadores se debatem entre si para
gerar ideias para serviços. O conceito para um serviço é desenvolvido a partir de um
início variável, numa ordem de turnos progressivos, arriscando a sorte em
construir padrões, ideias que emergem ao longo do jogo que vão sendo anotadas com
papel e lápis (em post-its), sendo o resultado final apresentado sob forma de um
relatório.

4.2.8. Jogos Resultantes de Aulas de Metodologias de Projeto

Estes jogos foram desenvolvidos enquanto projetos dos estudantes da Licenciatura de


Design de Comunicação da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. 385 A
realização destes projetos ocorreu em formato de workshop em 2018. O âmbito deste
workshop enquadra-se na tese de doutoramento desenvolvida por Abhishek Chatterjee
(2017) que se pontua por alavancar criatividade em circunstâncias restritivas, ou nas
palavras de Chatteerjee:

O exercício MagDash foi realizado em abril de 2016, com os alunos de Design de Comunicação
da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, em conjunto com o Prof. Pedro
Cardoso. O cerne do workshop gira em torno da reinterpretação das caraterísticas físicas e
materiais dos recursos disponíveis para a obtenção de uma solução criativa, em uma situação
simulada de escassez de recursos. Neste caso, revistas antigas foram escolhidas como o
material central, cujos vários atributos tiveram que ser explorados pelos participantes para
atingir uma solução criativa predefinida - objetos de várias naturezas. (Chatterjee 2017,
147).386

Assim, o workshop em 2018 deu continuidade ao estudo de Chatterjee (2017), mas com
um objetivo diferente: o desenvolvimento de jogos por grupos de estudantes usando
jornais ou revistas como materiais-base. Estes materiais podiam ser modificados
usando tesouras, x-atos ou cola. Ou seja, circunstâncias restritivas similares usadas
por Chatterjee nos workshops durante o seu estudo:

385 O desenvolvimento ocorreu em formato de workshop durante as aulas da unidade curricular de Metodologias de Projeto do professor
Bruno Giesteira, em conjunto com o Professor Pedro Cardoso, a estudante do Doutoramento em Design na Faculdade de Belas Artes
da Universidade do Porto, Viviane Peçaibes, e nós próprios como observador sem intervenção. O workshop teve lugar nas instalações
da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto em novembro de 2018.

386 T.A.: “The MagDash exercise was conducted in April 2016, with the students of Communication Design from the Faculty of Fine
Arts, University of Porto, in conjunction with Prof. Pedro Cardoso. The crux of the project lay around reinterpretation of physical
and material characteristics of available resources for attaining a creative solution, while in a simulated situation of resource
paucity. In this case, old magazines were chosen as the core material whose various attributes had to be explored by the
participants for attaining a predefined creative solution – objects of various nature.” (Chatterjee 2017, 147).

184
O workshop foi conduzido como um exercício de grupo em que era requerido aos estudantes
que neles participavam trazer três revistas velhas, com espessura de média a alta. Uma vez
que o exercício envolveu papel de revista como material de base, apenas tesouras ou lâminas
e cola foram permitidos para modificação, bem como, tabuleiros de corte para fins de
construção. (Chatterjee 2017, 147)387

Pudemos essencialmente testemunhar a apresentação e demonstração dos jogos que já


se encontravam numa fase avançada de desenvolvimento para adquirir uma noção dos
assuntos a que eram dirigidos. Alguns destes jogos não apresentam contributos para a
criatividade pelo que não são aqui apresentados. Ainda, dado que estes jogos foram
produzidos no mesmo contexto, nesta subseção são descritos e analisados em grupo.

Cooperative Clutter (2018) é um jogo sobre a persistência de vestígios de passagem, ou


seja, o que permanece a partir das ações dos jogadores. O jogo permite um número de
5 jogadores que tentam edificar uma construção colectiva com pegadas (cubos
coloridos) deixadas a cada turno. Estas pegadas são manipuladas com auxílio de
utensílios frágeis também de papel (Figura 4.13).

Figura 4.13. Cooperative Clutter (2018) apresentando fotografia de sessão de jogo. 93

Componentes
O jogo consiste num conjunto de vários cubos de papel coloridos que são os vestígios, 1
dado utensílios que determina os instrumentos a usar, e.g. um salazar ou uma unha
comprida (todos feitos de papel e, portanto, frágeis), e 1 dado normal numerado de 1 a
6 para gerar o número de vestígios para cada turno de jogador, e 2 tabuleiros de papel

387 T.A.: “The workshop was conducted as a group exercise where in the participating students were required to bring three old
magazines each of medium to thick width. Since the exercise involved magazine paper as the base material, only scissors or cutters
and glue were allowed for modification, along with cutting mats for construction purposes.” (Chatterjee 2017, 147).

185
para empilhar os vestígios.

Objetivos
Manipular os cubos a partir de onde estão depositados, empilhando-os em cima de um
tabuleiro.

Regras
• o jogador que começa lança o dado normal para saber o número de cubos que
tem de manipular e o dado utensílios para saber que instrumento vai usar. A
seguir manipula o número de cubos com os instrumentos estipulados
empilhando-os num dos tabuleiros a tal destinados;
• Os jogadores seguintes, no seu turno, repetem o processo do ponto anterior
empilhando os seus cubos sobre os do jogador que os precedeu.

Condições de derrota e vitória


Os jogadores que deixarem cair cubos são eliminados do jogo, o último a permanecer
ganha o jogo.

A noção de que a criatividade se alimenta de várias contribuições anónimas (Vygotsky


1967) está presente em Loss of Identity (2018), onde os jogadores usam palavras para
conceber uma narrativa colectiva por turnos. A validação da contribuição de cada
jogador é colectiva e anónima, usando-se capuzes para não influenciar o juízo (Figura
4.14.).

Figura 4.14. (esquerda para a direita), palavras cuja sequência informa a narrativa e duas fotos dos
jogadores com os capuzes para assegurar o seu anonimato em Loss of Identity (2018). 94

Componentes
O jogo consiste num conjunto de palavras-chave recortadas de jornais e máscaras

186
também em papel para esconder a identidade do jogador.

Objetivos
Conceber uma narrativa coletiva em tempo real entre 5 jogadores.

Regras
• Os jogadores, por turnos, escolhem 5 palavras-chave e procuram verbalizar
uma pequena frase que aparente ser verossímil enquanto contributo para a
narrativa;
• Cada jogador no seu turno procura dar continuidade à narrativa encetada sem
se esquecer de nenhuma contribuição anterior;
• A contribuição de cada jogador é validada pelos restantes jogadores, o que
determina a sua permanência ou não no jogo;
• no seu seguinte procura dar continuidade à narrativa encetada.
Condições de derrota e vitória
Os jogadores que não conseguirem dar continuidade à narrativa são eliminados do jogo,
o último a permanecer ganha o jogo.

Masks and Reflections (2018) é um jogo sobre gerar associações entre celebridades
apontadas por lançamentos de dados e as palavras-chave de um baralho contexto.388
Aqui a criatividade reside no burlesco das associações que libertam os jogadores sobre
convenções, abrindo caminho a expressões surpreendentes (Figura 4.15). Este caráter
libertador dos jogos que estimula a expressão dos jogadores é reconhecido por Miguel
Sicart que diz que “[o]s jogos são um exemplo de comportamento carnavalesco que
leva à libertação festiva em busca de liberdade, expressão e verdade” (2014, 11). 389

Figura 4.15. Masks and Reflections (2018) apresentando fotografias do tabuleiro principal (esquerda) e
uma associação feita no decurso de sessão de jogo (direita).95

388 Durante a sessão de jogo surgiram ideias mais radicais, como usar o jogo para gerar notícias, ou implicar uma consciencializa ção
sobre o que é ser uma celebridade com uma imagem negativa.

389 T.A.: “Games are an example of carnivalesque behavior that leads to festive liberation in search for freedom, expression and truth”
(Sicart 2014, 11).

187
Componentes
O jogo consiste num tabuleiro com uma montagem de recortes de fotos de celebridades,
um marcador e um conjunto de palavras-chave recortadas de jornais e revistas.

Objetivos
Caricaturar uma celebridade elaborando uma situação na qual estivesse envolvida.

Regra
O jogo processa-se por turnos, cada jogador atira o marcador sobre o tabuleiro para
determinar a personagem com a qual irá jogar, a seguir escolhe pelo menos duas
palavras-chaves e tenta elaborar uma circunstância a partir destas na qual o
personagem também estivesse envolvido.

Condição de vitória e derrota


Não há condições estabelecidas para vitória ou derrota, o jogo é um ice-breaker.

Cooperative Clutter (2018) revelou uma faceta criativa inesperada, a fragilidade dos seus
utensílios levou os jogadores a criarem formas surpreendentes de os usar. Durante a
sessão de jogo de Masks and Reflections (2018) surgiu a ideia de obrigar os jogadores a
teatralizar as suas contribuições, o que acrescenta performance criativa ao jogo.
Em suma, o exercício de destreza de Cooperative Clutter (2018) usa mecânicas em que os
jogadores arriscam a sorte na manipulação criativa para empilhar e balancear os
seus componentes, enquanto as contribuições dos jogadores para o storytelling, (as
narrativas) de Masks and Reflections (2018) e Loss of Identity (2018) são feitas por
turnos progressivos e em cooperação entre jogadores, através da liberdade de uso
dos componentes de jogo.

4.2.9. Tiles IOT Toolkit

Tiles IOT Toolkit (2017) é um jogo para jogar sozinho ou em equipa sob forma de
workshop, dirigido para criar soluções de Internet das Coisas (IDC)390 em resposta aos
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas (Mora et al.
2019),391 como ilustrado na Figura 4.16.

390 T.A.: Internet of Things. Para a definição ver Capítulo 3, nota de rodapé 120

391 Sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas ver Capítulo 3, nota de rodapé 121

188
Figura 4.16. Estágios e tabuleiro digital de Tiles IOT Toolkit (2017). Imagem consultada a 27 de outubro
de 2021 em: https://www.tilestoolkit.io/96

Componentes
O jogo consiste num baralho de mais de 120 cartas e 1 tabuleiro com instruções. O
baralho divide-se nas categorias: a) objetos do quotidiano não-tecnológicos; b) ações
humanas para despoletar ações no objeto; c) feedback, a resposta do objeto aos
estímulos do utilizador; d) ligações, operadores lógicos que definem o funcionamento de
objetos; e) canais de dados, serviços online e sistemas de sensores; f) temas, doze
desafios; g) critérios para refletir e avaliar as ideias.
Objetivos
Conceber um dispositivo IDC.

Estágios de jogo
• Selecionar um público, um contexto e um ODS para trabalhar;
• Definir um ou mais objetos a aumentar com IOT para este contexto;
• Determinar como se dá a interação entre pessoas e objetos;
• Perceber como os objetos IOT respondem de volta;
• Esboçar como o objeto é usado e qual o valor deste para os utilizadores num
Storyboard;
• Divergir e expandir o esboço mencionado no ponto anterior, enquanto ideia
inicial;
• Usar critérios para avaliar o potencial e as lacunas da ideia entre todos os
participantes;
• Elaborar um pitch para apresentar a ideia final.

Regras

189
As cartas podem ser usadas na sequência mais adequada para o objetivo que se está a
tentar atingir, procurando sempre que os passos de jogo sejam operados e discutidos
por todos, e.g. introduzindo urgência como regra para envolver os participantes.

É um jogo cooperativo em que os jogadores negociam as cartas para desenvolver um


dispositivo IOT, simulando a sua operação num contexto e em resposta a um objetivo.
Para tal, elaboram-se também esboços deste dispositivo em papel e lápis. Os facilita-
dores do jogo asseguram que todos os jogadores participam das decisões. Por fim, a
validação das soluções é feita com critérios integrados no jogo.

4.2.10. Intùiti

Intùiti (2013) é um baralho de cartas que procura orientar melhor a criatividade dos
jogadores, levando-os além das suas ideias iniciais. O jogo opera confrontando os
interesses pessoais dos jogadores com ilustrações de arquétipos culturais (Figura 4.17).
As associações resultantes apontam para o que pode ser trabalho criativo e relevante
para o jogador (Pascuale e Mazzuchelli 2017).

190
O baralho oferece uma série de sugestões direcionadas a partir dos arquétipos dos antigos
tarôs, uma coleção de padrões de pensamento ancorados na nossa cultura e usados com
sucesso por séculos: do conceito de Princípio ao relacionamento com a Autoridade, o momento
em que encontramos a Crise para aquele quando entramos no mundo adulto. As imagens de
Intùiti representam esses modelos e foram criadas com os Princípios da Gestalt em mente,
permitindo que o significado seja compreendido mesmo sem uma base teórica. Os contos e
conselhos – doravante referidos como imperativos – desenvolveram-se diretamente a partir
do arquétipo correspondente. Podemos afirmar que imagem, conto e imperativo expressam o
mesmo conceito em três linguagens diferentes. (Pascuale e Mazzuchelli, 2017)392

Figura 4.17. Baralho de cartas Intùiti (2013), apresentando fotografias do produto (esquerda) e uma
carta com o respetivo conto no verso (direita), consultadas a 26 de outubro de 2021 em
https://www.intuiti.it/97

Componentes
O jogo consiste em 78 cartas com ilustrações na face frontal e um conto no seu verso,
que evocam modos de operar e arquétipos culturais. As cartas dividem-se em 22
primárias, cujo conteúdo pretende despoletar ideias no jogador, e 56 secundárias, que
visam especificar algo mais das ideias que tenham surgido.

Objetivos
Saber distinguir o que realmente importa perseguir em termos criativos e pessoais sem
ser influenciado por convenções sociais.

Regras
• Baralhar as cartas, escolher uma, e deixar-se inspirar pela sua visão e pelo
conto que a complementa, para através da imaginação e intuição gerar
associações que despoletem processos criativos relevantes para o jogador.
• O jogo pode ser mediado por um especialista.

Condição de vitória
Definir uma tarefa ou propósito criativo para o próprio jogador.

O jogo é um exercício de introspeção para entender onde estamos e para onde nos
devemos dirigir, evitando cair em pré-conceções. A versão analógica não possui

392 T.A.: “The deck offers a series of targeted suggestions derived from the archetypes old ancient tarots, which are a collection of
thought patterns firmly rooted in our culture and successfully used for centuries: from the concept of Beginning, to the relationship
with Authority, the moment in which we encounter Crisis to the one when we enter the Adult World. Inttuti’s images represent
these models and were crafted with Gestalt Principles in mind, allowing for meaning to be understood even if lacking theoretical
basis. The tales and advice – hereinafter referred to as imperatives – develop directly from the corresponding archetype. We can
claim that image, tale and imperative express the same concept in three different languages.” (Pascuale e Mazzuchelli, 2017).

191
mecanismos de registro do seu processo dado que os detalhes das associações feitas
permanecem na mente do jogador. A versão digital de demonstração regista a ordem
de escolha das cartas e oferece uma interpretação destas, pelo que um mecanismo para
editar este texto poderia revelar-se útil para efeitos de memória e plano de ação.
É um jogo a solo com início variável dado que o jogador pode escolher as cartas com
que começa de acordo com os seus interesses. Cada carta é um evento para inspirar ou
despoletar processos criativos, são convites para simular na mente do jogador algo que
este pretenda criar.

4.2.11. Dreams

Dreams (2020) é um motor de jogo e rede social/loja para promover os jogos criados
com esse mesmo motor de jogo. No modo Criativo, os jogadores podem conceber de raiz
todos os aspetos do seu jogo, desde regras, arte visual, banda e efeitos sonoros, ou usar
conteúdo já existente do próprio jogo ou externo. Para tal, os jogadores têm interfaces
específicas dirigidos a cada aspeto, conforme ilustrado na Figura 4.18.

Este caso é incluído nesta amostra porque proporciona uma forma lúdica e acessível ao
jogador para criar jogos. Como se encontra no limiar de um jogo e de uma ferramenta
com propósitos criativos pode informar sobre o que é necessário para conceber jogos
para aumentar a criatividade.

Figura 4.18. Captura de ecrã de Dreams (2020), no modo criativo, onde se pode ver o avatar a verde e
parte do interface para conceber novos jogos dentro do jogo, acedido a 27 de outubro de 2021 em
https://www.playstation.com/en-us/games/dreams/98

Em termos de mecânicas trata-se de um jogo a solo enquanto ferramenta que o


jogador pode usar para conceber videojogos. Ainda, este jogo tem um caráter de jogo

192
cooperativo pois o diálogo e dialética entre jogador e sistema de jogo é que permite
materializar novos jogos. Os jogos criados ficam registrados na plataforma do jogo, o
que também permite a partilha destes com outros jogadores.

4.2.12. Astroneer

Astroneer (2016) é um jogo multijogador digital de exploração espacial situado num


futuro próximo. Nele os jogadores exploram recursos em corpos celestes para
terraformar o seu território e edificar novas bases e veículos. (Figura 4.19).

Figura 4.19. Captura de ecrã de Astroneer (2016), onde se pode ver o avatar do jogador a carregar a
ferramenta de terraformação, o ambiente e dois veículos, acedida a 26 de outubro de 2021 em:
https://astroneer.space/99

Componentes
Os componentes de Astroneer (2016) vão evoluindo consoante as ações do jogador e o
grau de evolução tecnológica que este atingiu no jogo, desde personagens jogáveis, a
vários tipos de veículos e equipamento de impressão 3D e de terraformação.

Objetivos
O objetivo é colonizar corpos celestes, e construir veículos que levem os jogadores a
outros mundos. Além destes objetivos predefinidos a exploração do jogo é livre.

Regras
• O jogo pode ser jogado a solo ou em cooperação (em modo de multijogador);
• O jogador deve explorar recursos do mundo de jogo para o personagem
jogável sobreviver, terraformar o mundo e desenvolver tecnologia ao seu
alcance para construir veículos e bases de lançamento para outros mundos;
• Existem perigos nos mundos onde o personagem jogável se encontra que

193
devem ser evitados para que o jogador não perca a vida no jogo, alguns sob
forma de eventos.

Condições de vitória e derrota


As vitórias sucedem-se à medida que o jogador transita de mundo, as derrotas quando
perde a vida.

Em suma, é um jogo a solo ou cooperativo em que os jogadores tentam evitar perigo


sob forma de eventos de jogo, e procuram obter pontos de vitória (recursos) para
construir padrões sofisticados (veículos espaciais, etc.) para progredir no jogo.

4.2.13. 75 Tools for Creative Thinking

75 Tools for Creative Thinking (2013) é um baralho de cartas para desbloquear processos
criativos. Cada carta é autónoma, fornecendo um conjunto de instruções sumárias para
o seu uso. As cartas podem ser usadas a solo ou em equipa, dependendo dos resultados
pretendidos o baralho pode ser usado por inteiro, parcialmente, ou nas sequências que
se entenderem. Uma sessão de jogo é ilustrada na Figura 4.20.

Figura 4.20. 75 Tools For Creative Thinking (2012) apresentado fotografias da caixa do produto
(esquerda), de algumas categorias de cartas (centro), e do verso de uma carta com instruções e
resultados esperados. 100

Componentes
1 baralho que consiste em 75 cartas com instruções e exemplos de uso prático para
guiar o pensamento criativo, subdividindo-se em cinco categorias:
5. Começar, para entender e explorar a situação pretendida;
6. Inspecionar em Redor, obter informação de pessoas inseridas nesta situação;
7. Compartimentar, para organizar e associar descobertas do foro social ou interativo da
situação;
8. Libertar, tendo conhecimento da situação gerar ideias;
9. Avaliar e Selecionar, estabelecer critérios para avaliar ideias.

194
Objetivos
Os objetivos variam de acordo com os resultados expectáveis inscritos na carta
escolhida.

Regras
As regras são instruídas em cada carta de acordo com a faceta do pensamento criativo
à qual se dirige.

Em termos de mecânicas, é um jogo a solo ou cooperativo de cartas que podem ser


usadas como eventos para despoletar ou agilizar estágios do processo criativo. Os
jogadores podem escolher as cartas que mais lhes convier para gerar, avaliar e simular
mentalmente ideias no âmbito da tarefa. Os resultados são registrados com papel e
lápis, e podem ser avaliados com auxílio das próprias cartas.

4.2.14. Mindshake Thinking Cards

Este baralho de cartas com caráter de jogo serve para guiar e ensinar DT a equipas de
jogadores que trabalham em diversos domínios de conhecimento (ver Figura 4.21.). As
cartas contêm instruções para auxiliar a guiar os 6 estágios de design que compõem o
Modelo de Evolução 6², como auxiliar a resolver problemas de várias ordens, mapear uma
visão geral destes, simular técnicas, ideias ou aplicações, ou obter inspiração para
trabalho criativo (Tschimmel, 2018 e 2021).393

Não sendo um jogo, é um método lúdico que incluímos aqui por proporcionar aos seus
jogadores instruções e um método estruturado para tirar partido do DT em atividades
criativas, o que se pode refletir em jogos dirigidos para aumentar a literacia criativa.

393 Uma aplicação durante o desenvolvimento das Mindshake Thinking Cards (2018) foi a biblioterapia, que envolve o leitor emocional
e intelectualmente em leituras para confrontar as experiências dos personagens por forma a identificar benefícios vivenciais e
profissionais para si. A biblioterapia divide-se em quatro estágios: 1) Identificação, com personagens para entender os próprios
conflitos; 2) Catarse, o acompanhamento da resolução do problema do personagem pelo leitor; 3) Discernimento, verificar
sobreposições entre a experiência da personagem do livro e do leitor; 4) Universalização, articular as experiências do personagem
com a vida do leitor (Nobre e Tschimmel, 2018).

195
Figura 4.21. Fotografias das Mindshake Design Thinking Cards (2013) consultadas a 22 de outubro de
2021 em: https://www.mindshake.pt/en/design-thinking/101

Componentes
1 baralho que consiste em 78 cartas com instruções e exemplos de uso prático, divididos
nos 6 estágios de design do Modelo Evolução 6²: 1) Emergência, descobrir e
contextualizar um desafio; 2) Empatia, entender o problema; 3) Experimentação, gerar,
iterar e experimentar várias ideias; 4) Elaboração, prototipar as ideias anteriores; 5)
Exposição, comunicar estas soluções; 6) Extensão, implementar as soluções, e ver como
podem evoluir.

Objetivos
Guiar e ensinar DT aos jogadores.

Usos
• Ordenadas ou baralhadas como fonte de informação e técnica de
aprendizagem de métodos de DT;
• Dispersas para inspirar equipas a organizarem o seu próprio processo criativo;
• Fixas à parede para auxiliar a executar processos ou tarefas criativas segundo
o modelo 6²:
• Procurar combinações de cartas com instruções e cartas com fotografias para
representar uma técnica em ação;
• Procurar pares de cartas que representam os estágios do modelo 6².

Regra
As cartas podem ser usadas na sequência mais adequada para responder a desafios de
design, não existindo condições de derrota.

Não pudemos observar sessões deste jogo em equipa, apenas conduzimos testes a solo,
pelo a nossa noção baseia-se na investigação teórica subjacente ao jogo. O relatório
desta investigação não é perentório sobre a eficácia das cartas, mas permitiu extrair
perceções que associamos a mecânicas de jogo e seus resultados.

196
As cartas visam responder a necessidades de utilizadores, o que implica inícios
variáveis de jogo. Este é um jogo de cooperação394 para negociar e sinergizar as
práticas multidisciplinares dos jogadores para que atinjam objetivos relevantes. O jogo
requer atitudes otimistas e experimentais, e.g. estar aberto a arriscar a sorte para
errar e aprender com práticas de prototipagem. Este caráter de tentativa-erro permite
gerar várias soluções a partir de diferentes sequências de uso de componentes de jogo
e turnos aleatórios dos jogadores. O processo de jogo fica ainda registrado em papel
e lápis (post-its) para memória, validação ou melhoria.

4.2.15. Minecraft

Minecraft (2009) é um jogo sandbox em 3D, cujo mundo é construído e alterado


proceduralmente pelo seu sistema, sendo constituído por vários tipos de blocos. Cada
bloco é uma célula cúbica com um metro de aresta que podem ser minerados como
recursos. O jogo permite diferentes experiências, e.g. o modo de criação permite
explorar o terreno livremente e criar um vasto âmbito de construções como na Figura
4.22, e no modo de sobrevivência procura-se agregar recursos suficientes para
defendermo-nos de inimigos.

Figura 4.22. Captura de ecrã de construção fictícia em Minecraft (2009), acedida a 27 de outubro de
2021 em: https://www.minecraft.net/pt-pt/article/city-bridge102

394 Este estudo de caso procura entender as necessidades de utilizadores através da empatia. A definição de empatia é difícil de
estabelecer, à primeira vista é algo com carácter instrumental e individual para estender o conhecimento de si à arte, artefactos
ou designs para entender e acomodar o mundo à sua imagem. O termo combina emoções, raciocínio e imaginação para se conectar
a outros indivíduos, animais, objetos de arte ou o mundo, exigindo, portanto, conhecimento sobre si mesmo e saber abdicar deste
em certas circunstâncias (Lanzoni 2018, 280).

197
Componentes
Sistema computacional de suporte ao jogo, no qual é executada continuamente uma
simulação física de um mundo constituído por vários tipos de blocos. Os blocos
representam recursos que podem ser minerados para alimento dos personagens
jogáveis, para construir novos itens ou simplesmente para remodelar o território como
na Figura 4.22.

Objetivos
• No modo de sobrevivência, manter os personagens jogáveis alimentados, e
construir defesas e habitações que os obriguem de oponentes não jogáveis;
• No modo de aventura é similar ao modo de sobrevivência, mas como num
jogo de RPG há uma sequência de desafios e itens a recolher por parte dos
jogadores de acordo com mapas predefinidos;
• No modo criativo não é necessidade prover a subsistência, ficando o mundo
de jogo aberto à sua exploração por recursos para criar o que os jogadores
desejarem;

Regras
• Os jogadores podem minerar recursos livremente e processá-los para criar
meios de subsistência, negociar trocas com outros jogadores ou personagens
não-jogáveis e construir estruturas dentor do jogo funcionais ou puramente
estéticas.
• Os personagens jogáveis possuem um inventário que limita os itens que
podem carregar consigo. Se perderem a vida têm 5 minutos para voltar à
localização onde morreram para os recuperar
• Em modo multijogador os Jogadores podem interagir de diversas maneiras
dependendo dos limites impostos pelo servidor que aloja mundos de jogo.

Condições de vitória e derrota


Só são aplicadas a modos de sobrevivência ou aventura quer jogado a solo ou em
multijogador. As vitórias são pequenos sucessos sequenciais que decorrem da resposta
às necessidades de alimentação, defesa e evolução dos personagens jogáveis. As
condições de derrota aplicam-se a casos em que perder a vida não permite ao jogador
voltar a aceder ao mesmo mundo de jogo.

Dado o seu caráter colaborativo e potencial para lidar com vários temas tem vindo a ser
cada vez mais usado em sala de aula. Existe uma edição própria para este fim com
alguns planos de lição incluídos, que se estendem das áreas da programação a outras
disciplinas, bem como add-ons que facilitam estes propósitos.

Em suma, pode ser um jogo a solo ou cooperativo entre jogadores, em que pode
ocorrer competição, mas também negociação de esforços para suplantar desafios ou
atingir objetivos. A simulação de jogo tem um início variável, e permite a

198
construção de padrões (artefactos de jogo) com os próprios componentes do jogo.

4.2.16. Lichenia

Lichenia (2019) é um videojogo de simulação, uma sandbox em grelha isométrica onde


se pode (re)construir cidades humanas no meio do caos climático (Figura 4.23). É uma
crítica às práticas capitalistas e à noção errada de que as cidades são construídas de raiz
como na série SimCity (1989-2014).

Figura 4.23. Captura de ecrã do website onde se pode jogar Lichenia (2019) acedido a 22 de outubro de
2021 em: https://molleindustria.org/lichenia103

Componentes
Sistema computacional de suporte ao jogo, no qual é executada continuamente uma
simulação de um território abstrato. Este território é constituído por cinco tipos de
blocos representando água, vegetação e três tipos de construção humana.

Objetivos
Manter a viabilidade da coexistência humana e ecossistema do território de jogo que
representa um mundo devastado.
Regras
• Em qualquer momento o jogador pode recuperar ruínas, reflorestar, gerir
cursos de água tentando gerir um ecossistema instável. Isto é feito
sobrepondo à matriz de blocos do terreno existente outros blocos disponíveis,
ou seja, introduzindo transformações na topologia do terreno.
• Não há condições de vitória porque o jogo é uma luta incessante para evitar
catástrofes num ecossistema instável.

199
O caráter rarefeito dos blocos com que se opera transformações no terreno do jogo
dificulta o entendimento sobre as mecânicas subjacentes à simulação. Assim, o jogo
assenta sobre a atenção às dinâmicas que resultam da aplicação dos cinco tipos de
recursos sobre o terreno. No decurso do jogo o jogador é confrontado com desastres
inesperados bem como dicas para auxiliar a perceber o que se passa no mundo do jogo.
O jogo não possui objetivos, nem fim. Foca-se na transformação criativa perpétua do
território do jogo através das ações do jogador e sistema de jogo.

Em suma: as mecânicas são ocultas, o que leva ao desenvolvimento de uma Teoria do


Sistema, um modelo mental de como o sistema de jogo funciona (Carvalhais e Cardoso
2021), para saber como equilibrar o seu ecossistema precário. É um jogo a solo que faz
a simulação de um ecossistema perpassado por eventos despoletados pelo sistema de
jogo, ações dos jogadores ou pela combinação de ambos. Para equilibrar o ecossistema
de jogo, o jogador tem de arriscar a sorte e posicionar recursos no seu território sem
saber as consequências que daí advém.

4.2.17. Baba is You

Baba is You (2019) é um jogo de puzzle que permite ao jogador manipular as suas regras
em tempo real, e.g. mudar o personagem jogável do jogador (Baba) para o campo de
jogo, que a partir daí se move em conformidade com o input do jogador (Figura 4.24).

Figura 4.24. Captura de ecrã de Baba is You (2019) acedido a 27 de outubro de 2021 em:
https://assets.rockpapershotgun.com/images/2019/03/02_baba_is_you.jpg104

Componentes
Sistema computacional de suporte ao jogo, no qual são apresentados: substantivos

200
(itens), operadores (condições antes de uma frase ou entre substantivos, como “é”, “e” e
“não”), propriedades de itens (como direções, movimentos ou outras ações), e
colecionáveis (como esporos ou flores).

Objetivos
Combinar os itens de jogo por forma a atingir a condição de vitória de cada nível e assim
progredir para os seguintes que compõem o mundo de jogo.

Regras
• As regras são visíveis textualmente enquanto substantivos, operadores,
propriedades e colecionáveis do jogo. Estes itens ao serem empurrados pelo
personagem jogável e ficando adjacentes uns aos outros alteram a operação
das próprias regras, e.g. dois itens (substantivos) separados por um “é”
transformam um item no outro ou fazem o segundo adquirir as propriedades
do primeiro . Isto inclui o personagem jogável que pode tomar formas e
adquirir comportamentos que não os seus e assim manipular todos os itens
de jogo.
• Ao agregar um determinado número de colecionáveis podem se abrir portas
para outras zonas do mundo que não se abririam de outra forma.

Condições de vitória
As condições de vitória dependem dos objetivos de cada nível e dos itens operadores e
propriedades disponíveis.

As combinações dos itens de jogo podem gerar comportamentos e interações de jogo


surpreendentes para o jogador, e mais, promover a contínua geração de uma Teoria do
Sistema (ver secção 3.1.1.) para cada nível do jogo (inclusive quando este não está a ser
executado) por parte do jogador.

Em suma, este jogo a solo permite ao jogador o reconhecimento de padrões de regras


do jogo para construir padrões de regras transformadas, o que resulta em eventos
que alteram o estado do jogo. Estas combinações podem apenas ser úteis se o jogador
arriscar a sorte fazendo o inesperado.

4.2.18. Tabletop Simulator

Tabletop Simulator (2015) é um motor de jogo, uma framework cujo sistema de simulação
de física computacional 3D permite aos jogadores recriar digitalmente jogos analógicos,
ou conceber novos de raiz. Para tal, o jogo disponibiliza uma vasta biblioteca de compo-
nentes comuns de jogos tradicionais, como baralhos de cartas, dados, figuras, etc., cuja

201
aparência e comportamentos podem ser totalmente customizados (Figura 4.25.).

Figura 4.25. Captura de ecrã de alguns componentes disponíveis em Tabletop Simulator (2015), acedido
a 27 de outubro de 2021 em: https://www.tabletopsimulator.com/about105

Componentes
Uma vasta gama de elementos de jogos analógicos, como marcadores, cartas,
tabuleiros, dados figuras, terrenos etc. aos quais se podem acrescentar elementos
novos ou personalizar os existentes.

Objetivos
Criar ou recriar jogos de tabuleiro existentes.

Regras
Não existem regras estipuladas, apenas aquelas que os jogadores considerarem úteis
para incorporar no jogo criado. Acrescente-se que como todo o jogo é uma simulação
digital 3D até o tabuleiro pode ser virado ao contrário.

Condições de vitória e derrota


Não há condições de vitória ou derrota no que concerne a criação de jogos. Os jogos
propriamente ditos podem ter essas condições definidas pelos jogadores.

A liberdade de criação total também pode tornar-se rapidamente um campo de batalha


entre jogadores usando os componentes de formas inesperadas só pelo divertimento.
Ou seja, os jogadores podem facilmente afastar-se do foco do jogo criado. Contudo, isto
não é necessariamente uma coisa negativa porque pode levar a outras criações.

Em suma, trata-se de um jogo a solo que permite aos jogadores simular jogos
tradicionais ou conceber novos de raiz, e a liberdade para construir padrões de jogo
com os seus componentes, e.g. a construção de baralhos de jogo. Os jogos
desenvolvidos são ainda partilháveis na própria plataforma de jogo.

202
4.2.19. Word Out!

Word Out! (2014) é um jogo para fomentar o pensamento criativo e a resolução de


problemas em crianças dos 4 aos 7 anos através de interação corporal (Figura 4.26). É
um jogo que explora a aprendizagem criativa e coordenação motora, tendo como base
as letras do alfabeto, em colaboração com outros jogadores (Paul et al. 2015).395

Figura 4.26: Ecrãs de Word Out! (2014), (a) (b) ‘P’ e‘F’ formado com auxílio dos pais. (c) (d) ‘M’ and
‘O’ formado com unindo as mãos. Nas restantes imagens são apresentadas poses colaborativas.
Imagens extraídas de Paul et al. (2015). 106

Componentes
Em termos de hardware, o jogo consiste em um Microsoft Kinect para a detecção das
posturas corporais, um ecrã ou projector de vídeo, e um sistema computacional de
suporte ao jogo. O interface consiste numa ecrã inicial, outro para selecionar palavras,
outro para as confirmar, e outra para jogar.

Objetivos
Usar posturas corporais para formar a silhueta de letras que sejam reconhecidas pelo
sistema de jogo.

Regras
• O jogo começa com a seleção de uma palavra pelo jogador a partir de uma
lista;
• Dois ou mais jogadores soletram cada letra da palavra sucessivamente,
combinando posturas dos seus corpos para que reflitam uma silhueta da
respetiva letra;
• As silhuetas são reconhecidas como uma letra com um contorno a verde
visualiza-do no ecrã de jogo. Os contornos não reconhecidos são delineados a
vermelho. É apresentada uma roda amarela no ecrã quando se passa para a

395 O seu sistema usa o Microsoft Kinect para detectar silhuetas dos jogadores. O objetivo do jogo é que os jogadores adotem posturas
físicas para compor formas coincidentes com as letras do alfabeto apresentadas num ecrã. Cada letra pode ser reconhecida por
pelo menos três poses individuais e quatro colaborativas.

203
letra seguinte.

Condições de vitória e derrota


Para vencer a silhueta combinada dos corpos dos jogadores deve ser reconhecida como
uma letra pelo sistema. Para tal, os jogadores devem permanecer na posição adotada
por um tempo determinado. A falha destas condições leva à derrota.

Este jogo foi instalado no Museu de Arte e Ciência de Singapura, e no Museu Nacional
de Singapura, sendo testado com crianças dos 4 aos 7 anos. uma das conclusões da
investigação que lhe serve de base, é que estas crianças optam com frequência por
selecionar letras com que já haviam jogado, ou jogadas por outros jogadores para
verificar se o sistema reconhecia poses alternativas, ou seja o jogo incentiva a
criatividade. Ainda, dado que assenta nas posturas dos jogadores para gerar formas
reconhecíveis pelo seu sistema é um jogo que pode ser apropriado para fins criativos
noutras áreas.

O início é variável com uma ordem de turnos progressiva, segundo a sequência


de leitura das letras nas palavras facultadas pelo sistema de jogo. Pode ser um jogo a
solo ou cooperativo, em que os jogadores arriscam a sorte na escolha das letras e
negociam a forma como adotam posturas ou colaboram uns com os outros.

4.2.20. Cards Against Humanity

Cards Against Humanity (2011) é um jogo de cartas para ser jogado por turnos por vários
jogadores. O objetivo do jogo é associar o conteúdo das cartas por forma a ir ao encontro
do gosto do jogador encarregue de avaliar as associações, e assim pontuar. Os gostos
são subjetivos, por isso ir ao encontro do gosto desse jogador depende das associações
feitas (ver Figura 4.27).

Figura 4.27. Imagens do website oficial de Cards Against Humanity (2011), caixa do produto (esquerda)
e exemplo de turno de jogo (direita) acedido a 22 de outubro de 2021 em:
https://www.cardsagainsthumanity.com/107

204
Componentes
O jogo consiste em dois baralhos de cartas, pretas e brancas, cujos conteúdos versam
sobre sexo, cultura pop e política. As cartas pretas contêm frases incompletas, as cartas
brancas permitem ao jogador completar as frases das cartas pretas de forma diversa.

Objetivos
Associar o conteúdo das cartas por forma a ir ao encontro do gosto do jogador
encarregue de avaliar as associações, denominado o Card Czar,396 e assim pontuar.
Regras
Cada jogador retira 10 cartas brancas, exceto o escolhido como Card Czar, que lê em voz
alta a frase a completar de uma carta preta retirada do respetivo baralho. Cada um dos
restantes jogadores entrega uma carta branca voltada para baixo ao Card Czar com o
conteúdo que associa à carta preta proferida.

Condições de vitória e derrota


O Card Czar lê em voz alta todas as associações e escolhe a vencedora, a que para si é a
melhor. Quem submete a associação vencedora ganha um ponto. O jogo recomeça com
outro jogador a assumir o papel de Card Czar e os restantes repõem o seu jogo de mão
de dez cartas brancas.

O conteúdo provocador das cartas composto por assuntos de índole moral e


preocupações atuais permite aos jogadores conceber associações surpreendentes,
pertinentes, perversas ou divertidas. O jogo tem carácter efémero pelo que não tem
mecânicas para registar associações.

O início é variável pois depende das cartas em jogo e os jogadores competem pela
geração da associação mais divertida segundo o parecer do Card Czar. Esta avaliação é
incerta pelo que todas as combinações implicam arriscar a sorte. Os pontos de
vitória são obtidos numa ordem de turnos progressivos e a sua soma dita o
vencedor.

4.3. Resultados da Análise dos Casos


Na Tabela 4.2 apresentamos as mecânicas que identificámos a partir dos estudos de
caso, ordenadas segundo o número total de ocorrências na amostra. A ordenação foi
feita assim porque a frequência das mecânicas na amostra de casos sugere a sua
relevância para estimular atos criativos. Ou seja, trata-se de identificar os aspetos-

396 No original em inglês o Card Czar.

205
chave que relacionam mecânicas e jogos que aumentem a literacia criativa.397

Tabela 4.2 - Mecânicas identificadas nas leituras atentas5


Mecânicas Descrição Jogos Frequência
Dreams (2020); Jogo de Improviso (2020); Why Are We
Like This? (2020); Creative Emergency (2019);
As ações são IdeaChef (2018); Jogos Resultantes de Aulas de
coordenadas entre Metodologias de Projeto (2018); Tiles IOT Toolkit
jogadores, que ganham (2017); Astroneer (2016); Word Out! (2014); 75 Tools
Jogo ou perdem em for Creative Thinking (2013); Mindshake Thinking
cooperativo conjunto Cards (2013); Minecraft (2009) 13
Dreams (2020); Baba is You (2019); Creative
Jogar sozinho contra o Emergency (2019); Lichenia (2019); U Know Me!!!
sistema de jogos, ou (2019); Astroneer (2016); Tabletop Simulator (2015);
num modo de jogo Word Out! (2014); 75 Tools for Creative Thinking
Jogo a solo individual (2013); Intùiti (2013); Minecraft (2009) 11
Jogo de Improviso (2020); Why Are We Like This?
(2020); Cards Go! (2019); U Know Me!!! (2019);
IdeaChef (2018); Word Out! (2014); Intùiti (2013);
O início do jogo varia Mindshake Thinking Cards (2013); Cards Against
Início variável de sessão para sessão Humanity (2011); Minecraft (2009) 10
Why Are We Like This? (2020); Lichenia (2019); U
Know Me!!! (2019); Tiles IOT Toolkit (2017); Tabletop
Jogo que representa Simulator (2015); 75 Tools for Creative Thinking
Simulação uma circunstância atual (2013); Intùiti (2013); Minecraft (2009) 9
Why Are We Like This? (2020); Baba is You (2019);
Lichenia (2019); U Know Me!!! (2019); IdeaChef
(2018); Jogos Resultantes de Aulas de Metodologias de
Arriscar a Decidir até onde Projeto (2018); Word Out! (2014); Mindshake Thinking
sorte arriscar e esticar a sorte Cards (2013); Cards Against Humanity (2011) 9
Usar caneta e papel
para registar as Gamers4Nature Toolkit (2020); Cards Go! (2019);
contribuições dos Creative Emergency (2019); IdeaChef (2018); Tiles IOT
jogadores, que Toolkit (2017); 75 Tools for Creative Thinking (2013);
Papel e lápis influenciam o jogo Mindshake Thinking Cards (2013) 7
Ações que mudam o
estado do jogo sem Why Are We Like This? (2020); Baba is You (2019);
intervenção dos Cards Go! (2019); Lichenia (2019); Astroneer (2016);
Eventos jogadores 75 Tools for Creative Thinking (2013); Intùiti (2013) 7
Os turnos dos Jogo de Improviso (2020); Why Are We Like This?
jogadores sucedem-se (2020); Cards Go! (2019); IdeaChef (2018); Jogos
numa ordem, p.ex. na Resultantes de Aulas de Metodologias de Projeto
Ordem de Turnos direção dos ponteiros (2018); Word Out! (2014); Cards Against Humanity
progressiva do relógio (2011) 7
Os jogadores acordam Gamers4Nature Toolkit (2020); Why Are We Like This?
nas ações que farão (2020); Cards Go! (2019); Tiles IOT Toolkit (2017);
Negociação durante uma jogada Word Out! (2014); Mindshake Thinking Cards (2013) 5
Os jogadores recebem Gamers4Nature Toolkit (2020); Jogo de Improviso
estímulos para (2020); Why Are We Like This? (2020); Jogos
Storytelling conceber uma história Resultantes de Aulas de Metodologias de Projeto (2018) 4
Configurar elementos
Construir em padrões Baba is You (2019); IdeaChef (2018); Astroneer (2016);
padrões sofisticados Tabletop Simulator (2015); Minecraft (2009) 4

397 Estes aspetos-chave serão, portanto, aqueles que serão mais explorados na conceção e desenvolvimento exploratório de protótipos
de jogos para aumentar a literacia criativa no capítulo 5.

206
reconhecer padrões de
Reconhecimento carácter abstrato ou
de padrões relevante U Know Me!!! (2019); Baba is You (2019); 2
Pontos ou recursos
que dão aos
Pontos de jogadores que ganham Cards Go! (2019); Astroneer (2016); Cards Against
Vitória a vitória Humanity (2011) 3
Peças de jogo ou
jogadores são
escolhidos de forma
Turnos aleatória para jogar a Gamers4Nature Toolkit (2020); Word Out! (2014);
aleatórios cada turno Mindshake Thinking Cards (2013) 3
Os jogadores
Construção de constroem baralhos de
baralhos jogo Cards Go! (2019); Tabletop Simulator (2015); 2
Empilhar e Empilhar e equilibrar Jogos Resultantes de Aulas de Metodologias de Projeto
Balancear peças físicas (2018) 1
Os jogadores param o
jogo para alterar o seu
estado e como se
Interrupção desenrola Cards Go! (2019) 1
Os jogadores votam
sobre a execução de
Votação ações. Cards Go! (2019) 1

A Tabela 4.3 relaciona os jogos com as mecânicas apresentadas na Tabela 4.2. A Tabela
4.3 reúne informação sobre a correlação das mecânicas em cada jogo, a fim de obtermos
um entendimento sobre como foram integradas, como operam entre si e em que
sequências, e que ações estimulam em termos criativos. Ao reunir uma noção
abrangente sobre como podem ser integradas em jogos, bem como os seus resultados
expectáveis, será mais fácil guiar a conceção e desenvolvimento de jogos segundo os
propósitos desta investigação.

Tabela 4.3 - Relação entre Jogos e Mecânicas6

Jogos Mecânicas

Jogo de Este jogo de cooperação tem um início variável e os jogadores cooperam


Improviso entre si para elaborar storytelling,uma narrativa que mantém a sequência da ordem de
(2020) turnos progressivos pela qual as associações são formuladas.

Creative É um jogo cooperativo ou a solo para desbloquear processos criativos de design, com
Emergency um início variável consoante o problema a solucionar e permite alguns registos com
(2019) papel e lápis.
Os jogadores constroem o seu baralho com papel e lápis, por isso o jogo tem
um início variável. É jogado em equipas cujos membros cooperam e negociam
entre si pelo melhor conceito numa ordem de turnos progressivos. O jogo inclui
Cards Go role-playing de eventos, e o vencedor é determinado por pontos de vitória
(2019) atribuídos por votação de outros jogadores, segundo a adequação das formulações feitas.
O início é variável pois o mundo de jogo é gerado por IA. É jogado numa
sequência de turnos progressivos que alterna entre ações de jogadores que
Why Are We cooperam, negociando as decisões a tomar, e a simulação destas influências pela IA
Like This? do jogo. As ações dos jogadores envolvem arriscar a sorte pois estes não dispõem de
(2020) informação completa. A história é registrada no sistema de jogo

207
É dirigido para desenvolver storytelling,uma narrativa de jogo cooperativo
Gamers4 que sirva de guião a um videojogo. Os aspetos de jogo são negociados pelos jogadores e
Nature Toolkit registados com papel e lápis num documento de conceito de jogo. As contribuições
(2020) dos jogadores processam-se numa ordem de turnos progressiva.
É um jogo a solo para conceber um traje para simular e fazer o reconhecimento
de padrões que caracterizam um personagem para atividades de Cosplay usando as
U Know Me!!! peças físicas de jogo. O jogo tem ainda um início variável segundo o personagem
(2019) pretendido, o que comporta o arriscar a sorte no uso dos seus componentes.
É um jogo competitivo (e por vezes) um jogo cooperativo em que ocorre
negociação entre jogadores para gerar ideias para serviços. O conceito para um serviço
é desenvolvido a partir de um início variável, arriscando a sorte em
construir padrões, ideias que emergem ao longo do jogo que vão sendo anotadas com
IdeaChef (2018) papel e lápis.
É um exercício criativo sobre Empilhar e Balancear os seus componentes dada a
fragilidade dos instrumentos com que se realiza essa operação. Tem um início
Cooperative variável que depende das ações dos jogadores, e permite liberdade no uso dos
Clutter (2018) instrumentos, segundo turnos progressivos.
É dirigido para conceber storytelling,narrativas que mantêm o anonimato dos co-
Loss of Identity autores. Tem um início variável e os jogadores têm liberdade para elaborar a
(2018) narrativa segundo uma ordem de turnos progressivos.
Assenta na crítica fictícia de personalidades famosas envolvidas em situações burlescas.
Masks and Tem um início variável segundo a sorte ditada por lançamento de dados, e faculta a
Reflections liberdade para os jogadores criarem neste jogo cooperativo storytelling,i.e.
(2018) narrativas fictícias segundo uma ordem de turnos progressivos.
É um jogo cooperativo em que jogadores negociam as cartas a usar para
desenvolver um dispositivo internet-das-coisas, simulando o seu contexto para que
Tiles IOT responda a um determinado objetivo. Para tal elaboram-se também esboços deste dispositivo
Toolkit (2017) em papel e lápis.
É um jogo a solo com início variável, dado que o jogador pode escolher as cartas
com que começa de acordo com os seus interesses. As cartas são eventos para inspirar a
simulação de tarefas criativas na mente do jogador, e se estas se adequam ao que
Intùiti (2013) realmente é importante para si.
Trata-se de um jogo a solo enquanto ferramenta que o jogador pode usar para conceber
videojogos. Ainda, este jogo tem um caráter de jogo cooperativo pois o diálogo e
dialética entre jogador e sistema de jogo é que permite materializar novos jogos. Os jogos
criados ficam registrados na plataforma do jogo, que também permite a partilha destes com
Dreams (2020) outros jogadores.
É um jogo a solo ou cooperativo em que os jogadores tentam evitar perigo sob
Astroneer forma de eventos de jogo, e procuram obter pontos de vitória (recursos) para
(2016) construir padrões sofisticados (veículos espaciais, etc) para progredir no jogo.
É um jogo a solo ou cooperativo que usa cartas enquanto eventos para alavancar
75 Tools for estágios de processos criativos. Os jogadores podem escolher as cartas que mais lhes convier
Creative para gerar, avaliar e simular mentalmente ideias para os seus objetivos. Os resultados são
Thinking (2013) registrados com papel e lápis, e avaliados com o auxílio das próprias cartas.
Trata-se de um jogo de cooperação e negociação entre os estados de design em que
Mindshake consiste, e em que os jogadores arriscam a sorte de avançar com hipóteses
Thinking Cards inverossímeis em turnos aleatórios. Tem ainda inícios variáveis consoante
(2013) os objetivos traçados, e o seu processo é registado com papel e lápis.

Minecraft Este pode ser um jogo a solo ou de cooperação entre jogadores, em que pode ocorrer
(2009) competição, mas também negociação de esforços para suplantar desafios ou atingir

208
objetivos. A simulação de jogo tem um início variável, e permite a construção
de padrões (artefactos de jogo) com os próprios componentes do jogo.
É um jogo a solo que faz a simulação de um ecossistema perpassado por eventos
despoletados pelo sistema de jogo, ações do jogador e combinações de ambos. O jogador
Lichenia procura equilibrar o ecossistema ao arriscar a sorte, posicionando recursos no campo
(2019) de jogo.
Este jogo a solo permite ao jogador o reconhecimento de padrões de regras do
jogo, para construir padrões de regras transformadas, o que resulta em eventos que
Baba is You alteram o estado do jogo. As combinações podem apenas ser úteis se o jogador arriscar
(2019) a sorte fazendo o inesperado.
É um jogo a solo que faz uma simulação de física real que permite aos jogadores
Tabletop transcodificar jogos de tabuleiro existentes ou construir padrões (novos jogos
Simulator sofisticados), e.g. com a construção de baralhos de jogo. Os jogos desenvolvidos são
(2015) ainda partilháveis no próprio jogo.
O início é variável com uma ordem de turnos progressivos segundo a
sequência de leitura das letras nas palavras facultadas pelo sistema de jogo. Pode ser um
Word Out! jogo a solo ou cooperativo, em que os jogadores arriscam a sorte na escolha
(2014) das letras e negociam a forma como adotam posturas ou colaboram uns com os outros.
O início é variável segundo as cartas em jogo, os jogadores competem pela geração
Cards Against da associação mais divertida segundo o parecer do Card Czar, algo que implica arriscar
Humanity a sorte. Os pontos de vitória são obtidos numa ordem de turnos
(2011) progressivos, e a sua soma dita o vencedor.

Todavia, como observámos no capítulo 3, um maior número de mecânicas não


corresponde necessariamente a uma maior propensão para ocorrerem atos criativos.
Assim, com base nas observações registradas nas tabelas anteriores pudemos distinguir
4 categorias compostos por mecânicas ou combinações de mecânicas relevantes para
aumentar a literacia criativa que emergem da nossa observação em confronto as
mecânicas de jogos de tabuleiro listadas no website Board Game Geek.

Reparamos que as mecânicas de jogo para a criatividade aqui reveladas se alinham


com as ações de jogo para a criatividade avançadas na secção 3.4. Assim, na secção
seguinte justificamos como é que as mecânicas emergem a partir de correlações entre
casos de estudo e como se podem enquadrar nas categorias do capítulo 3.

4.3.1. Mecânicas de Jogo para a Criatividade aliadas à Ação de Jogo para a


Criatividade: Diálogo

O início variável permite abrir múltiplas portas de entrada para o diálogo com o jogo
para que o jogador possa perscrutar e descobrir formas de interagir com este segundo
os seus interesses. E.g. estas portas de conversações são visíveis na geração
procedimental do território de Lichenia (2019), na construção de baralhos e na ordem
de turnos progressivos que permitem variar a conceção dos artefactos para o qual
Cards Go (2019) esteja dirigido, como a construção de padrões em IdeaChef (2018)

209
permite desenvolver um serviço inovador. Assim, de seguida, apresentamos a Tabela
4.4. com as mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Diálogo.

Tabela 4.4. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Diálogo 7
Ordem de turnos progressiva
Turnos aleatórios
Início variável
Construção de baralhos
Construir Padrões

4.3.2. Mecânicas de Jogo para a Criatividade aliadas à Ação de Jogo para a


Criatividade: Dialética

A negociação é algo implícito na argumentação, na Dialética dos processos de decisão


em Mindshake Thinking Cards (2018), na simulação de jogos e storytelling para estes
em Gamers4Nature Toolkit (2020) ou Tiles IOT Toolkit (2017), ou eventos que decorrem
da retórica procedimental em Lichenia (2019). Noutros casos a negociação existe
apenas entre jogadores e sistema de jogo como através do reconhecimento de padrões
de personagens em U Know Me!!! (2019).

A negociação implica uma avaliação das ações a executar num jogo, o que pode ser
feito tanto por jogadores como por sistema de jogo. Neste sentido, nem todos os jogos
se propõem a avaliar com critérios a relevância dos resultados, sendo que muitos
deixam que essa faceta seja resolvida informal e subjetivamente, como o faz o Card Czar
em Cards Against Humanity (2011). Noutros casos, as ideias são avaliadas através de
mecânicas de votação das equipas envolvidas em Cards Go (2019), ou através de diálogo
informal quando os jogos são partilhados nas redes sociais de Dreams (2020) ou Tabletop
Simulator (2015), ou quando a adequação do resultado de um jogo é avaliada com base
em critérios definidos nas cartas de jogo de Tiles IOT Toolkit (2017). Em todos os casos,
é o diálogo e a dialética entre agentes de jogo que sustentam a negociação, o que por sua
vez estimulam o jogo cooperativo e até competitivo. Ou seja, nos termos de Pedro
Cardoso um jogo implica relações dialógicas e dialéticas:

Os videojogos dependem de uma relação cibernética entre o jogador e o sistema computa-


cional, na qual um feedback loop comunicacional é estabelecido, e onde cada ação desenrola a
narrativa, levando o jogador ao sucesso ou ao final. (...) usamos o termo dialética para ilustrar
o fato de que o jogador e o sistema de jogo agem em oposição um ao outro. Esta situação é
muito evidente em videojogos mais antigos, onde o jogador é constantemente desafiado pela
presença de inimigos que povoam o mundo do jogo o que contribui para uma topografia de

210
mundo do jogo difícil de atravessar. (Cardoso 2016, 72)398

Assim, de seguida, apresentamos a Tabela 4.5. com as mecânicas de jogo para a

criatividade aliadas à ação de jogo para a criatividade: Dialética.

Tabela 4.5. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Dialética8
Eventos
Reconhecimento de Padrões
Simulação
Negociação
Votação
Storytelling

4.3.3. Mecânicas de jogo para a Criatividade aliadas à Ação de Jogo para a


Criatividade: Tentativa-erro

Uma forte componente Tentativa-erro, de experimentação criativa para apoiar a


conceção de algo que opere num dado contexto pode ser encontrada ao arriscar a
sorte para gerar e dar corpo a ideias de serviços em IdeaChef (2018) e registrando com
papel e lápis a forma como se desenrolam. O arriscar a sorte é visível nas
combinações de regras para progredir em Baba is You (2019), na escolha de personagens
para guiar uma narrativa em Why Are We Like This? (2020), ou no uso diferente das
Mindshake Thinking Cards (2013) para responder a etapas de DT. Outros jogos permitem
outros tipos de experimentação como fazer associações burlescas para obter pontos de
vitória em Cards Against Humanity (2011), ou confrontar a introspeção do jogador com
pré conceções sociais em Intùiti (2013). Aprender algo em profundidade é contingente à
tentativa-erro que requer arriscar a sorte em ações e recursos em torno desse algo. O
arriscar a sorte encaixa melhor numa noção de jogos enquanto ambientes onde as
ações dos jogadores não têm consequências reais (na generalidade). Estes ambientes
de jogo permitem aos jogadores experimentar ações de forma segura e portanto mais
livre do que no mundo físico, para encontrar respostas criativas aos desafios de jogo.
E.g. o jogador pode arriscar a sorte em jogadas audaciosas sem ter a certeza que o
personagem que controla está à altura de desafios, e nessa sequência provocar-lhe a
morte, perder itens de jogo que custaram tempo e esforço a obter, ou executar ações

398 T.A.: “Video games depend on a cybernetic relationship between the player and the computational system, in which a
communicational feedback loop is established, and where every action unfolds the narrative, eventually leading the player to
success or to closure. (...) we use the term dialectical to illustrate the fact that the player and the game system act in opposition
to each other. This situation is very evident in older video games where the player is constantly challenged by the presence of
enemies that populate the game world and that contribute to a game world topography that is challenging to traverse.” (Cardoso
2016, 72).

211
perigosas. Assim, de seguida, apresentamos a Tabela 4.6. com as mecânicas de jogo
para a criatividade aliadas à ação de jogo para a criatividade: Tentativa-erro.

Tabela 4.6. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Tentativa-erro 9
Arriscar a sorte
Pontos de vitória
Papel e lápis

4.3.4. Mecânicas de Jogo para a Criatividade aliadas à Ação de jogo para a


Criatividade: Sinergia

Alguns jogos são desenvolvidos como um jogo a solo pois o seu objetivo é fornecer
resultados a um só jogador, ou porque este interage com o jogo individualmente, como
no storytelling coletivo em U Know Me!!! (2019), Creative Emergency (2019), Baba is You
(2019) ou Minecraft (2009), na introspeção de Intuit (2013), na reflexão crítica em
Lichenia (2019), no desenvolvimento de jogos em Dreams (2020) e em Tabletop Simulator
(2015), ou na resolução de problemas com 75 Tools for Creative Thinking (2013). O jogo
cooperativo e, portanto, a sinergia entre jogadores, é central para que estes atinjam
soluções em conjunto, como dinamizar a geração de ideias em IdeaChef (2018) e em
Cards Go (2019) - não se alienando outras mecânicas que levaram à realização destas
ideias - ou para apelar à criação da combinação de posturas corporais de múltiplos
jogadores em Word Out! (2014), pois estes podem acrescentar as suas perspetivas ao
jogo e para dele extrair mais resultados surpreendentes. Assim, de seguida,
apresentamos a Tabela 4.7. com as mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à
ação de jogo para a criatividade: Sinergia.

Tabela 4.7. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Sinergia 10
Jogo Cooperativo
Jogo a Solo
4.3.5. Conclusões

Tendo em mente as mecânicas analisadas, podemos apontar como se relacionam para


consolidar as categorias propostas no capítulo 3. O diálogo e a dialética entre agentes de
jogo é central para negociar uma trajetória num jogo cooperativo para encetar e
estimular a conversação entre jogadores ou jogadores e sistema de jogo, ou
negociação, para trocar visões entre jogadores e sistema de jogo que enriquecem o jogo
com ações criativas. Também a sinergia é central num jogo cooperativo, para

212
dinamizar a troca de conhecimento entre jogadores, para que estes suportem os
esforços uns dos outros e assim aumentar as ações criativas possíveis num jogo. Por
fim, a tentativa-erro é essencialmente sobre arriscar a sorte em ações diferentes num
jogo para descobrir novas maneiras criativas para a realização deste. Em todo o caso,
notamos ainda que podem ocorrer sobreposições de mecânicas de jogo para a
criatividade, ou seja, que estas podem estar aliadas a mais que uma ação de jogo para
a criatividade.

213
(Página em Branco)

214
5. Desenvolvimento Exploratório de Jogos

Neste capítulo debruçamo-nos sobre os protótipos de jogos concebidos no decurso


deste projeto em paralelo com a revisão de literatura dos capítulos 1 e 2, a revisão de
jogos do capítulo 3 e a análise de casos do capítulo 4. Esta realização em paralelo
permitiu refinar progressivamente o foco destes jogos no âmbito desta investigação,
ancorando-os em bases teóricas e empíricas. Estas bases permitiram-nos perceber
quais as mecânicas de jogo relevantes para estimular atos criativos, e como as integrar
em jogos que contribuam para a literacia criativa. Assim nas secções seguintes focamo-
nos na metodologia que usamos para conceber estes jogos, no seu desenvolvimento
individual e análise crítica, e nas conclusões que daí retiramos.

5.1. Metodologia e Procedimentos


As revisões de jogos no capítulo 3 e análises de casos no capítulo 4 envolveram
publicações científicas, artigos de opinião e sessões de jogo ou a sua observação para
comparar mecânicas de jogos e fenómenos deles resultantes. Isto permitiu-nos ter uma
noção de quais as mecânicas de jogos poderiam contribuir para o aumento da
criatividade. Com estas mecânicas em mente, concebemos jogos para serem avaliados
pelo investigador, e por designers e jogadores. Para tal, desenvolvemos um protocolo
de desenvolvimento e outro de análise que apresentamos a seguir.

5.1.1. Protocolo do Desenvolvimento de Jogos

Por motivos de exequibilidade, desenvolvemos protótipos apontados à nossa disciplina,


o Design. Assim, a metodologia do desenvolvimento dos protótipos segue o seguinte
protocolo:

1. Baseamo-nos nas mecânicas encontradas na revisão de jogos e análise de


estudos de caso para elaborar ideias para os nossos protótipos. Para tal, usamos
o desenho enquanto método de design, pois “[o] desenho é uma ferramenta tão
familiar e integral ao processo de design que muitos o ignoram como um
método per se. Os desenhos ocorrem como uma função natural de esboçar
observações, pensamentos e ideias; desenhos e renderizações conceituais;
mapas e diagramas explicativos; e desenhos técnicos.” (Hanington e Martin

215
2019, 92).399 Ou seja, usamos o desenho enquanto método para esboçar
combinações de mecânicas e a sua implementação em conceitos de jogos;
2. Tendo em mente estas ideias iniciais, desenvolvemos implementações de baixa
fidelidade – protótipos de papel e lápis - para num primeiro momento testar o
potencial da sua jogabilidade;
3. Ao operar com os objetos físicos dos protótipos analógicos e jogando com eles
surgiram-nos ideias de melhorar os jogos para que pudessem ser
testados/jogados por outros.400 Foi aqui também que procurámos sintetizar as
instruções para facilitar as sessões de jogo;
4. Observamos sessões de jogo com estes jogos e recolhemos o feedback dos
jogadores em conversas informais com o intuito de melhorar o design do jogo,
que, em ciclo iterativo, foi sendo melhorado até se chegar a uma experiência
jogável e capaz de estimular atos criativos;
5. A partir daqui concebemos jogos envolvendo outras mecânicas relevantes,
informadas pela revisão de literatura no capítulo 2 e de jogos nos capítulos 3 e
4, retornando assim de novo ao ponto 1 deste procedimento;

5.1.2. Procedimento da Análise dos Jogos Desenvolvidos

1. Para analisar os jogos desenvolvidos foram consultadas as mecânicas de jogo


evidenciadas pelos estudos de caso no capítulo 4, e pelas descobertas ocorrentes
no decurso do desenvolvimento exploratório de jogos vigentes neste capítulo
(cuja lista pode ser consultadas na Tabela 5.1). Estas evidências facultam-nos
uma noção geral das mecânicas relevantes para aumentar a literacia criativa;
2. De seguida, analisamos como estas mecânicas são integradas e operam em cada
jogo, e como vão ao encontro dos seus contributos expectáveis em termos
criativos. A análise é clarificada individualmente para cada jogo na secção 5.2,
e é sintetizada e resumida na Tabela 5.2. (secção 5.3).
3. Por fim, procuramos correlações entre os resultados das análises de cada jogo
para verificar se as mecânicas ou combinações de mecânicas identificadas
possuem afinidades, e portanto sustentam as ações de jogo para a criatividade e
as mecânicas de jogo para a criatividade propostas no capítulo 3 e 4, e

399 T.A.: “Drawing is a tool so familiar and integral to the design process that many would overlook it as a considered method. Drawings
occur as a natural function of sketching observations, thoughts, and ideas; concept drawings and renderings; explanatory maps and
diagrams; and technical drawings.” (Hanington e Martin 2019, 92).

400 É ao operar com os objetos físicos dos protótipos analógicos objetos que nos surgem novas ideias de componentes e regras de jogo,
num processo similar ao Lego Serious Play (2014) que aprofundamos na secção 3.3.1, pois “[o] recurso fundamental para a
"criatividade" dos Legos é na verdade a lógica do seu acoplamento físico (...)” (Bogost 2007, 256).

216
como. Ao fazer verificamos que estas prefiguram-se como ingredientes-chave
da framework pretendida por esta investigação.

5.2. Jogos Prototipados


Prototipamos vários jogos, a maioria analógicos, pelo seu caráter socializador, que
permite captar mais facilmente as experiências de jogadores e ações criativas. Optámos
por desenvolver protótipos de baixa-fidelidade para sermos mais céleres e ágeis.
Contudo, dada a quantidade de protótipos produzidos, por motivos de tempo, e,
portanto, praticabilidade, restringimos a análise aos que foram finalizados, no sentido
de: serem jogáveis; terem sido experimentados/jogados em sessões de jogo
programadas e mediadas por nós; e estarem focados em contribuir para a literacia
criativa. Notou-se ainda que a simplicidade e o foco em poucos aspetos ou mecânicas,
seria central para efeitos de jogabilidade e para ir ao encontro dos objetivos da
investigação em tempo útil.

Assim, cada subsecção seguinte apresenta uma descrição e análise sumária de um jogo
desenvolvido, as suas respetivas instruções. A ordem pela qual estes protótipos são
apresentados neste capítulo é a ordem pela qual foram concebidos no decurso da
investigação, uma vez que esta ordem ilustra como a esta tarefa de desenvolvimento
evoluiu, sendo que os jogos iam tornando-se progressivamente menos complexos e
fáceis de jogar, e mais dirigidos e focados no âmbito desta investigação, à medida que
fomos avançando no tempo.

5.2.1. Research Quest

Research Quest I (2017) é um jogo multijogador para quatro jogadores, desenvolvido


como protótipo de baixa fidelidade e que pretende auxiliar estudantes a traçar o seu
caminho académico. Para ser jogado os jogadores devem ter algum conhecimento
disciplinar prévio que sustente a interação com o jogo e a colaboração entre jogadores.
O jogo é um campo exploratório para debater a relevância e combinação de tópicos
pessoais com áreas de estudo. Ou seja, o jogo articula estágios da metodologia de Design
Thinking401 com experiência de vida e conhecimento dos jogadores. O jogo requer pelo

401 Sobre a metodologia de Design Thinking, ver capítulo 4, secção 4.2.7 nota de rodapé 31.

217
menos quatro jogadores para explorar diversas perspetivas e hipóteses (Figura 5.1.).

Figura 5.1. Research Quest (2017) apresentando fotografias do jogo (esquerda) e resultados de uma
sessão de jogo (direita).108

Figura 5.2. Research Quest (2017) apresentando fotografia dos componentes do jogo, e divisões
do tabuleiro principal. 109

Componentes (Figura 5.2.)


O jogo é constituído por: a) 1 tabuleiro principal; b) cartões para identificar
combinações; c) cartões para identificar jogadores; d) 2 baralhos construídos pelos
jogadores, 1 com cartas conceitos, e 1 com cartas referências (bibliográficas,
ludográficas, etc.), e um dado com 6 lados (Figura 5.2.).

Objetivo
Auxiliar estudantes a traçar o seu caminho académico.

Preparação
Cada jogador elabora quatro cartas referência no âmbito de um tema acordado por
todos, e 8 cartas conceito de tema livre. As cartas são incorporadas nos respetivos
baralhos e numeradas no verso. O jogo joga-se na sequência de estágios seguintes:

Ronda
Os jogadores jogam em simultâneo segundo o seguinte procedimento durante 2
minutos. Cada jogador tira uma carta do baralho referência (d1), colocando-a num dos

218
4 espaços do tabuleiro para tal (a1). A seguir recebe 5 cartas conceito que oculta dos
outros jogadores, escolhe uma que se relacione com o máximo de cartas referência, e
deposita-a na sua área individual no tabuleiro virada para baixo (c1). Por fim, deposita
ao lado desta carta (b1) um cartão com o número de referências relacionadas com a
sua carta conceito.

Painel científico
Após a ronda as cartas conceito são reveladas e os resultados são revistos e avaliados
pelos restantes jogadores. Para tal, cada jogador vota numa combinação entre
conceitos e referências, depositando um cartão com o número que identifica o jogador
e as suas combinações na tabela dos jogadores integrada no tabuleiro (a2). Se uma
combinação tiver um só voto será trabalhada numa fase posterior de forma individual,
se tiver mais do que um, será trabalhada em equipa pelos jogadores que nela votaram.

Incubação
Cada jogador lança duas vezes um dado de jogo para determinar o caráter do trabalho
a desempenhar a seguir. O primeiro lançamento determina o tipo de abordagem (a3):
exploração, caso de estudo, especulação ou utopia. O segundo lançamento determina
o tipo de objeto pretendido (a4): mapa mental, esboço, objeto, produto. As equipas ou
jogadores individuais deverão formular um procedimento em dois minutos
envolvendo os resultados anteriores, e.g. usar o conceito jogos persuasivos, as
referências We the Giants (2009), The Art of Game Design (Schell 2008) e o desenho de
cadáver esquisito,402 para explorar um esboço de novo jogo.

Brainstorm, Ideação e Produção


Os jogadores desenvolvem este procedimento com papel e lápis durante 5 minutos.

Elevator pitch e Revisão de Pares


Os jogadores têm 1 minuto para preparar e 1 minuto para apresentar a ideia
resultante, e assim receber feedback dos restantes jogadores. O feedback é dado
individualmente segundo critérios acordados por todos os jogadores, e.g. a adequação
ou exequibilidade do resultado, ou o que é claro ou obscuro. O feedback é registrado
nas mesmas folhas onde as ideias foram desenvolvidas para uma memória completa
do processo.

O futuro...
O feedback dos jogadores pode levar a uma dialética que abra novos horizontes para
refinamento dos resultados.

Research Quest I (2017) estimula o olhar dos jogadores sobre assuntos a partir de diversas
perspetivas para os ajudar a criar um plano de ação para a sua investigação académica.

402 Cadáver esquisito é um jogo de desenho colaborativo em que partes de corpos são desenhadas numa folha de papel dobrada para
esconder esse resultado do próximo jogador. Este apenas tem acesso aos pontos que delimitam onde acaba o desenho anterior para
continuar. É um jogo de desenho colaborativo inventado em 1925 em Paris pelos surrealistas Yves Tanguy, Jacques Prévert, André
Breton e Marcel Duchamp.

219
Para tal, o jogo força o jogador a confrontar o que pensa ser adequado para si em termos
de percurso de investigação com alternativas de estudo em diferentes áreas de
conhecimento.

Na prática, o jogo solicita aos jogadores que produzam 2 baralhos de cartas, 1 com
conceitos e 1 com referências, obrigando os jogadores a gerarem associações entre os dois
tipos de cartas. O jogo integra ainda momentos de discussão entre jogadores sobre as
associações geradas, para verificar se têm uma razão de ser ou fundamentação teórica.

Contudo, trata-se de um jogo difícil de jogar pois os jogadores têm de lidar com muita
informação e conhecimento simultaneamente, e têm ainda que os relacionar entre si
mediante degraus de Design Thinking,403 que são integrados em fases de jogo, num
tempo reduzido.

Portanto, em termos de mecânicas, os jogadores procedem à construção de baralhos


para construir e reconhecer padrões, associações entre conceitos e referências. O
jogo é jogado numa ordem de turnos progressivos, e tem um início variável
consoante as cartas retiradas dos baralhos. O jogo é ainda uma simulação de um
processo de design destinado a descobrir um percurso académico adequado ao jogador.
Esta simulação é registrada com recurso a papel e lápis e recorre à votação dos
jogadores para orientar as fases de jogo subsequentes.

5.2.2. Research Quest II

Research Quest II (2017)404 é uma nova versão de Research Quest I (2017), que incorpora
uma componente de role-play405 num mundo de jogo baseado na ilustração Isle of
Research,406 para maior envolvimento dos jogadores e abrangência dos temas a abordar.
A ilha torna-se assim o tabuleiro de jogo cujos percursos e locais são simultaneamente
fases de jogo e de investigação científica a explorar pelos jogadores. À medida que os

403 A definição de Design Thinking pode ser consultada na secção 3.3.2.

404 Research Quest I (2017), e a sua sequela, Research Quest II (2017) foram co-criados com estudantes de mestrado no decurso de
aulas do Programa Doutoral em Design da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (FBAUP) no Parque de Ciência e
Tecnologia da Universidade do Porto, centro de Pré-Incubação (UPTEC PINC), respetivamente a 3 e a 10 de novembro de 2017.
Research Quest II (2017) usa um percurso similar ao Jogo do Ganso (Unknown) baseado nas fases da ilustração da Ilha da Investigação
(Ernest Harburg e William Brudon, 1966). Os estágios da ilha operam de forma metafórica como com o Modelo do Parque de
Divertimento (Kaufman e Glǎveanu 2019), para auxiliar a delinear um caminho académico, p.ex. a baía da literatura da ilustração
refere-se à revisão bibliográfica.

405 Role-play é simultaneamente uma mecânica, atividade e tipo de jogo, em que os jogadores expressam coisas enquanto fingem
passar por uma outra personagem em circunstâncias particulares.

406 Esta ilustração de 1960 foi feita por William Brudon com base no estudo de Ernest Harburg. É um mapa alegórico sobre os passos
difíceis da investigação científica refletida nos seus percursos e localizações fictícias e metafóricas como a Cidade da Esperança e
Mina da Serendipidade até ao Monte de Hipóteses Descartadas e o Grande Deserto sem Fundos. A ilustração foi consultada a 11 de
janeiro de 2022 em: https://digital.library.cornell.edu/catalog/ss:19343399

220
jogadores progridem nestes percursos os seus marcos são posicionados refletindo as
fases do percurso de investigação onde se encontram (Figura 5.3.).

Figura 5.3. Research Quest II (2017) apresentando imagem do tabuleiro de jogo adaptado a partir da
ilustração de William Brudon, a partir do estudo de Ernest Harburg (1966), consultada a 11 de janeiro
de 2022 em: https://digital.library.cornell.edu/catalog/ss:19343399110

Figura 5.4. Research Quest II (2017) apresentando uma imagem de parte do tabuleiro de jogo, a
zona de desembarque com a Cidade da Esperança. 111

Componentes
O jogo é constituído por: 1 tabuleiro principal; b) Marcadores para identificar os quatro
jogadores; c) 1 baralho com cartas referências construídas pelos jogadores, 1 com
cartas conceitos, e outro com cartas referências (bibliográficas, ludográficas, etc.), e um
dado normal com 6 lados (Figura 5.4.).

Objetivo
Auxiliar estudantes a traçar o seu caminho académico.

221
Baía da Literatura
Esta é a fase de preparação, onde o jogador escolhe qual a “zona” da Cidade da
Esperança (1) onde inicia a exploração. Cada “zona” da cidade corresponde a uma área
de conhecimento como Artes, Ciências Naturais, etc.

Cidade da Esperança (1)


O jogador pesquisa quatro referências relacionadas com a área disciplinar escolhida na
fase anterior tendo dois minutos para o fazer.

Rio das Palavras


Os jogadores registam em cartas como é que as referências da fase anterior se
articulam com a área disciplinar escolhida. As cartas são identificadas escrevendo o
número do jogador que as elaborou no seu verso, e depositadas nos locais que
identificam o jogador no tabuleiro.

Selva da Autoridade (2)


Cada jogador na sua vez verbaliza a sua articulação área-referências em 1 minuto. Os
restantes jogadores reúnem-se coletivamente sobre esta proposta enquanto painéis
científicos.
A articulação é votada como adequada, em que o jogador ganha 1 ponto, ou
inadequada, em que o jogador perde 1 ponto.
Condições de progressão
A soma total de pontos de cada jogador ao fim de cada estágio de jogo, determina
como progride (ou não) para outros locais da ilha em que decorrem outras atividades
(por definir).

Research Quest II (2017), baseia-se no percurso da investigação refletido na ilustração da


Ilha da Investigação (Harburg e Brudon, 1966), um percurso de jogo em que o jogador
ausculta rumos alternativos de carreira de investigador. O jogo é mais simples de jogar
do que Research Quest I (2017), contudo, os tempos para realizar as tarefas de jogo são
muito reduzidos e envolvem gerar associações ou ajuizar sobre tópicos disciplinares
complexos, em função das matérias que os jogadores trazem para o jogo.

Assim, o jogo faculta mecânicas para os jogadores procederem à construção de


baralhos para construir e reconhecer padrões, o associar de áreas de estudo a
referências, e à votação sobre a qualidade das últimas para orientar as fases de jogo
seguintes. Ainda, o jogo é jogado numa ordem de turnos progressivos, e tem um
início variável consoante as áreas disciplinares escolhidas no seu começo. O jogo
simula o percurso de investigação científica para ajudar o jogador a definir a sua
própria investigação. As associações geradas nesta simulação são registradas com
recurso a papel e lápis.

222
5.2.3. See, Hear, Feel no Evil

See, Hear, Feel no Evil (2018), versão analógica, é um jogo por turnos para três jogadores
cujos personagens se movem, atacam, defendem e vêm de forma única o ambiente
inóspito em redor. (Figura 5.5). Esta distinção de perceções obriga à sinergia entre
jogadores – algo inspirado em Lord of the Rings (2000), onde não se sobrevive sem se
sacrificar pela equipa (Jacklin 2011).407

O movimento do jogador é realizado ao longo dos eixos X e Y dependendo das coordenadas


resultantes de lançamentos de dados [a,b]. Existem três tipos de jogadores e um inimigo
representados em peças de cartaz [c-f]. Cada jogador pode perceber em seu redor de acordo
com uma modalidade sensorial, restrita em direção e alcance. Visão perceciona em frente [c],
Audição lateralmente [d], e Toque em ambas as direções [e]. Os inimigos podem sentir ao redor
em todas as direções dentro de um raio de três células, atacando sempre quando detetam
alguém nessa área [f]. (Raimundo et al. 2018, 190)408

Figura 5.5. See, Hear, Feel no Evil (2018) apresentando fotografia do tabuleiro principal e movimento
dos personagens (a), dado (b) e imagens das direções de perceção dos personagens (c a e). 112

407 Este jogo foi alvo de uma publicação, um artigo intitulado: “Building creative literacy skills through cooperative and competitive
gameplay (the case of See, Hear, Touch no Evil” (Raimundo et al. 2018).

408 T.A.: “Player movement is carried along the X and Y axis depending on coordinates resulting from dice rolls ([a,b]. There are three
types of players and one enemy represented in billboard pieces [c-f]. Each player can perceive their surroundings according to only
one sensorial modality, which is constrained in direction and range. Sight senses ahead [c], Hearing sideways [d] and Touch in both
directions [e]. Enemies can sense around in all directions within a three-cell radius and they always attack when sensing someone
with that area [g].” (Raimundo et al. 2018, 190).

223
Figura 5.6. Sessão de jogo e componentes: a) tabuleiro principal; b) personagens jogáveis; c)
inimigo; d) contador de tempo; e) inventário de energia; f) reserva de oxigénio; g) dado para
estabelecer ações e movimentos. 113

Componentes
A versão analógica do jogo (Figura 5.6), decorre num tabuleiro composto por uma matriz
de seis por seis células hexagonais numeradas, com um ponto de entrada e um de saída
(a). Uma folha de papel anexa ao tabuleiro é usada para registar o tempo para completar
o nível de jogo (d), os níveis de energia (e) e o oxigénio que cada jogador dispõe em
tempo real (f). O lançamento de um dado personalizado (g) despoleta eventos e afeta o
movimento das personagens dos jogadores (g).

Regras
• Neste jogo cada jogador controla um personagem jogável diferente, sendo que
um apenas vê, outro apenas ouve, e outro apenas tateia. No início do jogo a
energia dos personagens jogáveis está a zero e o oxigénio e o tempo estão no
máximo (5 pontos). Recolher energia permite aos jogadores defenderem-se e
ativarem a saída, que é o objetivo principal. O oxigénio reduz-se a cada turno
(1 ponto). Um jogador sem oxigénio não morre, mas não pode agir, a menos
que receba uma doação de oxigénio de outro jogador.
• Os jogadores jogam por turnos segundo o seu tipo de perceção, primeiro o
que vê, a seguir o que ouve, e finalmente o que tateia. Todos os personagens
podem disparar, tentar defender-se ou avisar os outros de perigo próximo. A
base do personagem contém detalhes destas ações, e.g. ao alcance normal de
movimento é acrescentado um valor do lançamento do dado.
• Um jogador pode jogar primeiro se estiver em perigo iminente. No início de
cada turno, é lançado o dado para despoletar eventos, o dado é lançado três
vezes para determinar seu tipo e posição. O tipo de eventos varia entre
presença de inimigos, escombros, fontes de oxigénio ou de energia.
• Só há um tipo de inimigo. Este vê num raio de 3 células a partir da sua posição,
podendo atacar de imediato um jogador nas proximidades. Para verificar se
um ataque é bem-sucedido, o que é válido também para os jogadores, é
lançado o dado. Ataques bem-sucedidos da parte do inimigo resultam em
perda de energia ao jogador, ou na sua ausência diminuir o nível de oxigénio.
Ataques bem-sucedidos do jogador permitem-lhe recolher um ponto de
energia.
• A saída pode ser ativada estando o jogador nas suas proximidades e tendo o
máximo de energia. O sucesso da sua abertura é ditado pelo lançamento de
um dado. O jogador pode escolher sair sozinho ou manter a porta aberta para

224
que os outros o sigam para o nível seguinte (que não chegou a ser concluído.
De forma similar, um jogador que tente escapar sozinho pode não o conseguir
se esta ação for sabotada por outro jogador.

Condições de Vitória e Derrota


A condição de vitória é conseguir transitar de nível pela porta de saída, o que pode ser
feito individualmente ou em conjunto. A condição de derrota ocorre apenas se o jogador
ficar preso no nível devido à falta de oxigénio que lhe permita mover-se.

O potencial criativo de See, Hear, Feel no Evil (2018) está na forma como os jogadores se
coordenam entre si a cada turno. Contudo, a variedade de ações e a imprevisibilidade
da sua eficácia pode tanto compensar como minar esforços e desmotivar os jogadores.

Em termos de mecânicas trata-se de um jogo cooperativo ou a solo no qual os


jogadores têm liberdade de movimento em grelha, e de negociação. As ações acarretam
sempre arriscar a sorte, o que se pode traduzir em ganhos ou perdas. O jogo tem um
início variável segundo uma ordem de turnos progressivo ou turnos aleatórios
em função dos eventos e estado do jogo.

A versão digital de See, Hear, Feel no Evil (2018), 409 ilustrada na Figura 5.7., foi
programada em Unity,410 e difere da versão analógica em vários aspetos que elaboramos
a seguir.

409 Este jogo foi concebido como parte do projeto na Unidade Curricular do Laboratório Multimédia da Faculdade de Engenharia da
Universidade do Porto. Uma sessão de jogo pode ser visualizada aqui: https://vimeo.com/39704802. Como não tínhamos
conhecimento em todas as áreas necessárias à produção de um jogo digital, este protótipo foi desenvolvido com o auxílio na parte
de programação do professor João Jacob (Ph.D.), e do som com o estudante Valter Abreu do Mestrado Multimédia da FEUP que foi
orientado pelo professor Eduardo Magalhães (Ph.D.). A nossa contribuição, além do design residiu em fornecer os modelos 3D
necessários a integrar no jogo.

410 Unity (2021) é um motor de jogo, uma estrutura de software dotada de funcionalidades para desenvolvimento de videojogos.

225
Figura 5.7. See, Hear, Feel no Evil (2018) em versão digital apresentando ecrãs em que o jogador Toque
ataca um oponente (esquerda), e outro em que recolhe uma bateria (direita). 114

As diferenças começam no estilo visual do mundo, itens e personagens de jogo 411 para
um aspeto pixelado em sintonia com a nostalgia do seu tema e com a banda sonora de
8 bits que reflete por aceleração e abrandamento de ritmo o nível de saúde do jogador.

A demo do jogo tem uma atmosfera muito profunda e sombria que sugeria um efeito
semelhante em termos de música, que foi o tipo de abordagem usada neste projeto. (...) A
ideia de ter um campo de visão muito limitado influenciou essa abordagem de usar sons
misteriosos e sinistros, que podem ajudar a aumentar a imersão do jogo. As regras e
mecânicas do jogo possuem algum nível de complexidade, o que permitiu a possibilidade de
compor pelo menos dois loops para a música. (Abreu 2018, 31)412

O suporte computacional do jogo retirou ao jogador o trabalho de calcular movimentos,


gerar eventos aleatórios e opções para lidar com eles, gerindo a informação visível e
oculta necessária para cada jogador.

Ao assumir estes cálculos o sistema de jogo acelerou o próprio jogo, o que por sua vez
ampliou o alcance dos movimentos do jogador, algo que se tentou mitigar ampliando o
campo de jogo em relação ao tamanho original do jogo analógico. A ampliação do campo
implicou que os jogadores deixassem de ter uma visão total deste, mas foi aproveitada
para incitar a sensação de desconhecido e fomentar a colaboração entre jogadores.
Nesta sequência a perspetiva do jogo passa a focar-se no jogador em turno que muda
automaticamente. Ainda, os controles passam a ser os mesmos para todos os jogadores,
ou seja, o mesmo rato.

411 Os modelos 3D dos personagens jogáveis e inimigos podem ser consultados em https://vimeo.com/272239953. Estes modelos foram
desenvolvidos e animados com detalhe suficiente para se adaptarem a diversas implementações e dispositivos digitais.

412 T.A.: “The game demo resembles a very deep and dark atmosphere that would suggest a similar effect music-wise, which was the
kind of approach used in this project. (...) The idea of having a very limited field of view influenced this approach of using
mysterious and eerie sounds, which can help enhance the immersion of the game. The game rules and mechanics have some level
of complexity, which allowed the possibility to compose at least two loops for the song.” (Abreu 2018, 31).

226
Figura 5.8. See, Hear, Feel no Evil (2018) em versão digital apresentando ecrãs em que o jogador
Toque está prestes a abrir a porta de saída (esquerda), e outro com o jogador Audição no campo do
jogo (direita). 115

Componentes
Os componentes são constituídos por vários modelos 3D mediados pelo sistema de
jogo, como personagens jogáveis (a), inimigos, portas(b), baterias, entulho, garrafas de
oxigénio, etc. (Figura 5.8).

Controlo
O jogo corre em sistemas PC e é controlado com rato. Ao sobrepor o cursor do rato
sobre personagens ou itens de jogo é apresentado um texto com opções de ações a
executar pelo jogador. Várias ações podem ser escolhidas com o botão direito do rato e
executadas com o esquerdo. O posicionamento e o movimento, e.g. são feitos colocando
o cursor em qualquer lugar dentro do alcance da personagem para executar o
posicionamento e a orientação finais deste.

Interface de utilizador
Inicialmente pensou-se num estilo minimalista para evitar que as informações de estado
obstruíssem a visão do mundo do jogo. Como tal, optamos por uma abordagem
semelhante ao Dead Space (2008), integrando indicadores visuais de níveis de oxigênio
e energia no próprio traje. Com um o estilo visual pixelizado, ficou claro que estes
detalhes não seriam visíveis, portanto optou-se por adicionar contadores de texto
numéricos pairando sobre o avatar.

Regras
Procurou-se manter as mesmas regras da versão analógica, fazendo ajustes necessários
decorrentes do aumento do tamanho do campo.

Condições de vitória e derrota


Mantiveram-se as mesmas condições da versão analógica

O protótipo digital acelera imenso a interação e o movimento, desencadeando todos os


tipos de desequilíbrios. E.g. permitir que os jogadores alcancem os limites do campo de
jogo em um único movimento, ou não ocorrerem eventos suficientes o que dificulta a
capacidade de sobrevivência dos jogadores. O aumento do tamanho do campo de jogo

227
introduziu desorientação, porque os jogadores deixam de ter pontos de referência para
auxiliar a navegação. Os movimentos de câmara abruptos ao mudarem de jogador
ampliam ainda mais esta desorientação. Tentou integrar-se um mini mapa executado
em tempo real em simultâneo com o jogo para minimizar este problema, mas sem
grandes resultados. As mecânicas de jogo empregues são as mesmas da versão
analógica.

5.2.4. Polyomino & Amoebas

Polyomino & Amoebas (2018) é um jogo sobre a importância da sinergia de esforços entre
jogadores, e sobre o equilíbrio entre interesse individual e coletivo. As peças
(poliominós) podem ser combinadas de inúmeras formas dada a sua morfologia,
permitindo ampliar e criar movimentos em que ambos os jogadores pontuam,
colecionando fichas que emergem no tabuleiro. Pontuar é essencial dado que a cada
turno a pontuação reduz-se, o que força a sinergia entre jogadores para não perderem
(Figura. 5.9.).413

Figura 5.9. Polyomino & Amoebas (2018) apresentando fotografia do jogo (esquerda), e de uma sessão
de jogo (direita). 116

413 Este jogo foi alvo de uma publicação, um poster intitulado POLYOMINOES & AMOEBAS: A collaborative-competitive game (Raimundo
et al. 2018).

228
Figura 5.10. Polyomino & Amoebas (2018) Fotografia com componentes de jogo. 117

Componentes de Jogo
O jogo consiste em (Figura 5.10): a) tabuleiro principal dividido numa matriz de
células quadradas de 9x6; b) peças de jogador (marcos) com a forma de um poliominó
de 4 células; c) fichas; d) instruções; e) 1 tabuleiro para registar pontuação e mostrar o
progresso de cada jogador.

Objetivo
O objetivo individual de cada jogador é ganhar cinco fichas que vão surgindo no
tabuleiro.

Regras
• Os jogadores movem-se ao longo do eixo x ou y no tabuleiro principal rodando
as suas peças (poliominós) livremente, mas em movimentos discretos
alinhados com a matriz. Os poliominós rodam em torno do ponto marcado em
cada e, se necessário, podem mover-se para além da área de jogo, mas esse
ponto (o centro de rotação) deve estar dentro da área de jogo. Mover, girar ou
‘colar-se’ a outro jogador contam como uma ação.
• Cada jogador começa com uma ficha e perde se ficar sem nenhuma. As fichas
são ganhas sobrepondo a área do poliominó do jogador sobre estas. Os
jogadores que não apanharem uma ficha no seu turno perdem uma ganha.
Com uma pontuação de duas fichas podem mover-se duas vezes por turno
incluindo rodar.
• O jogo permite a presença de uma única ficha no tabuleiro a cada turno, uma
nova é gerada numa posição aleatória quando a primeira é apanhada. Os
jogadores colaboram juntando seus poliominó num maior com uma
configuração diferente. Este poliominó combinado só pode mover-se uma
célula em qualquer direção, mas pode rodar em torno de um dos seus dois
centros, como ilustrado na Figura 5.11.

Em cada turno, separados ou combinados, os jogadores são encorajados a negociar as


ações a tomar. Os jogadores param de colaborar separando e afastando o seu

229
poliominó do outro jogador, e retomando assim um jogo a solo.

Figura 5.11. Os jogadores combinam os seus poliominós numa forma que permite apanhar a
ficha numa só jogada, revertendo a pontuação para ambos. 118

Condições de vitória e derrota


A vitória ou empate, ocorre quando um dos jogadores ou ambos, ganham 5 fichas. A
derrota ocorre para o jogador que não atingir este objetivo (o que pode também
acontecer para ambos).

Sessões de jogo revelaram o seu potencial em sustentar sinergia e assegurar que nenhum
jogador perde desde que ambos se comprometam com este comportamento.

O jogo usa mecânicas de movimento em grelha, numa ordem de turnos progressivos


ou turnos aleatórios dependendo como os jogadores manipulam as peças para se
entreajudarem ou não. O início é variável em função da disposição aleatória das
peças. Pode ser um jogo cooperativo e também um jogo a solo, onde também ocorre
negociação entre jogadores para construir padrões e para o reconhecimento de
padrões, para combinar as peças de jogadores. O jogo envolve ainda arriscar a sorte
nestas combinações, porque podem não ser retribuídas dependendo da sinergia entre
jogadores, e obter pontos de vitória para permanecer no jogo.

5.2.5. Salto Decisivo

Salto Decisivo (2019) é um jogo para conceber formas em conjunto por 4 jogadores, que
vão registrando os seus turnos até ao resultado final (Figura 5.12.).

230
Figura 5.12. Sessão de jogo e componentes de Salto Decisivo (2019): a) tabuleiro rotativo
quadrado; b) fragmentos de papel; c) dado; e quatro tabuleiros Modificadores d) construir; e) tirar;
f) acrescentar; d) destruir. 119

Componentes
O jogo é constituído por: a) um tabuleiro rotativo quadrado; b) um dado cujo lançamento
indica o número de fragmentos a usar ou a rotação a imprimir ao tabuleiro; d-g) quatro
tabuleiros Modificadores. Cada modificador tem uma ação que os jogadores podem
escolher para influenciar a forma em construção: d) construir, edificar uma forma a
priori; e) tirar ou acrescentar-lhe algo à forma; g) destruir parte ou a totalidade desta.
Estes tabuleiros permitem ainda registar a interpretação, razões e propósitos dos
jogadores sobre as ações que executam.

Objetivo
Co-criar uma forma.

Regras
• O jogo processa-se numa sequência de turnos começando com o jogador mais
novo a que se sucedem os restantes na direção dos ponteiros de um relógio.
• A cada turno são dados quatro fragmentos de papel ao jogador a que se
acrescenta o número que sair de lançamento do dado.
• De seguida o jogador escolhe uma carta modificador e dispõe os seus
fragmentos no tabuleiro quadrado, justificando nesta carta os detalhes da
ação escolhida.

Fim
O jogo termina quando os jogadores acordam que a forma está finalizada.

O jogo explora as contribuições de diferentes jogadores que reinventam a forma central


ao jogo numa lógica similar à da cocriação em Design Thinking, pois “[esta] fala sobre a
ascensão da cultura de design faça-você-mesmo e uma base de consumidores capaz

231
que procura usar produtos existentes para novos propósitos” (Lupton 2012, 96).414
Numa lógica em que jogadores têm aptidões e históricos diferentes, podemos ver o jogo
como um espaço de cowork, que lhes permite apoiar-se e inspirar-se mutuamente.

Os espaços de coworking hospedam uma comunidade diversificada de empreendedores com


ideias semelhantes num ambiente heterogéneo, onde os membros da comunidade podem
encontrar novas inspirações, fazer novas combinações, construir novas parcerias,
desenvolver novas experiências e iniciar novos empreendimentos. Relacionamentos e
confiança funcionais e sustentáveis só são possíveis se um nível adequado de diversidade
estiver presente na comunidade. (Clifton et al. 2012, 23)415

Como a construção da forma central no jogo está sempre em aberto, este estimula o
risco, o questionar “porque não?” (Hunter 2012, 112),416 abrindo-se à serendipidade, a
experiências sem um guião para permitir descobertas surpreendentes (Melo 2018), algo
assegurado pela introdução de aleatoriedade na forma das ações incertas do jogador
seguinte (Costikyan 2015, 827). Ainda, o jogo oferece um espaço de risco controlado
sem consequências para as contribuições dos jogadores, permitindo-lhes largar pré-
conceções para ampliar as possibilidades do jogo de uma forma similar ao tabuleiro de
inspiração do D-THink Toolkit (Tschimmel et al. 2018).
O jogo desenrola-se numa ordem de turnos progressivos em que cada jogador ganha
recursos lançando o dado. O dado pode ainda despoletar eventos que alteram a
operação do jogo. Os recursos são manipulados livremente pelos jogadores, podendo a
forma central do jogo adquirir um aspeto imprevisto. Os jogadores registram no seu
turno, a papel e lápis, e na carta que escolheram, como construir padrões, ou seja,
como a forma central do jogo vai evoluindo no seu decorrer.

5.2.6. Bully Who

Bully Who (2019) é um jogo de tabuleiro por turnos para oito jogadores explorarem e
teatralizarem papéis de vítima e agressor no contexto do fenómeno para o qual remete.
O seu objetivo é facultar um espaço para refletir e explorar ações criativas para mitigar

414 T.A.: “Co-creation speaks to the rise of do-it-yourself design culture and an empowered consumer base that seeks to use existing
products for new purposes” (Lupton 2012, 96).

415 T.A.: “Co-working spaces host a diverse community of likeminded entrepreneurs in a heterogeneous environment where community
members can find new inspiration, make new combinations, build new partnership, develop new experience and start new ventures.
Functioning and sustainable relationships and trust are possible only if a suitable level of diversity is present in the community.”
(Clifton et al. 2012, 23).

416 T.A.: “Adults rarely test the boundaries of their realities and tend to stay within the familiarity of the status quo. As children we
had the ability to use fantasy to escape reality and create new comfortable realities that we like to dwell within, but we tend to
lose this ability as we become adults. We tend to utilize our imagination for destructive purposes like creating reasons ‘why
something should not be done’ rather than ‘why not’ – building a sense of risk aversion within us.” (Hunter 2012, 112).

232
as circunstâncias da temática (Figura 5.13.).417

Pensando nisso, desenvolvemos o Bully Who? um protótipo de jogo analógico para que
os jogadores aprendam a lidar com o bullying de forma criativa, atuando como palco
para encarnar os papéis de agressores e vítimas, consciencializando os jogadores sobre
as suas emoções e consequências envolvidas. (Raimundo et al. 2019, 347)418

Figura 5.13. Bully Who (2019) apresentando fotografia do jogo. 120

Componentes
O jogo é inspirado no Jogo do Ganso. Consiste num tabuleiro principal com um percurso
circular dividido em células que representam as 12 horas diurnas. Este percurso está
dividido em momentos de aula, recreio e refeições. Uma folha complementar regista o
estado de saúde, o nível de estudo e tendência do jogador para atos de bullying. Quatro
baralhos determinam eventos ou ações de quatro tipos: Ataque, Socialização e Evasão, e
Recreio ou Cantina, a usar quando os jogadores estão nestas zonas.419

Objetivo
Consciencializar para o fenómeno do bullying através de role-playing.

Regras
• Determina-se a ordem dos turnos de jogo durante os quais os jogadores

417 Este jogo foi alvo de uma publicação, um artigo intitulado Bully Who? Theatrical Play and Vicarious Experiences of Doing and Acting
with Emotions (Raimundo et al. 2019).

418 T.A.: “With this in mind, we developed Bully Who? an analogue game prototype for players to learn to deal with bullying in a
creative way, by acting as a stage for embodying the roles of aggressors and victims, making players aware of their emotions and
consequences involved.” (Raimundo et al. 2019, 347)

419 Atacar ou socializar é mais fácil quando os jogadores estão próximos. A evasão é usada para se distanciar dos outros no recreio ou
para sair da classe, ou seja, uma estratégia para evitar se tornar um alvo fácil.

233
lançam os dados para definir o alcance dos seus movimentos. Após este
movimento, no seu turno, cada jogador retira uma carta ação de um dos
baralhos disponíveis e atua em conformidade. Estas cartas podem forçar
ações, trazer benefícios ou provocar danos;
• Há lugares especiais no tabuleiro como o Gabinete do Diretor, onde os
agressores obtêm medidas corretivas, ou o Gabinete de Reabilitação, onde
estes recebem trabalho voluntário, e às vítimas são atribuídas tarefas para as
capacitar a enfrentar os agressores. No lago, acessível durante o intervalo do
almoço, pode tanto ocorrer agressão como socialização;
• No final do seu turno, o jogador é movido para o início da próxima hora e
acrescenta um ponto ao seu nível de estudo. O processo repete-se até à hora
de saída no jogo (19h), podendo o jogo terminar aqui ou continuar no dia
seguinte. Para continuar o jogo, os jogadores retirariam uma carta de um
baralho descanso (por desenvolver) que introduziria alterações aos níveis de
estudo, saúde e tendência para bullying;
• A pontuação dos níveis socialização, estudo e bullying determina o caráter da
personagem, e é daqui que emerge a teatralização, uma performance que
representa o estado do jogador.

Fim
O jogo não tem um fim per se, dado que está orientado para a consciencialização da sua
temática. Pode ser jogado numa só ronda (o dia escolar representado no jogo) ou em
vários dias no tempo do jogo. Ou seja, enquanto as teatralizações dos jogadores e as
dinâmicas de jogo mantiveram os jogadores interessados.

A agência deste protótipo é limitada pelo que as cartas recolhidas e os dados lançados
ditam, o que reduz o significado do jogo. O potencial para aumentar a literacia criativa
com o jogo reside nos diálogos informais suscitados pelos conteúdos das cartas ou
ações, que estimulam a reflexão sobre novas ações e dinâmicas a integrar. Ou seja, o
jogo é um exercício criativo e de inteligência emocional para lidar com a sua temática.

O jogo é uma simulação do fenómeno do bullying em que o jogador faz role-playing


teatralizando papéis ligados a esta temática. Para tal, cada jogador deve arriscar a
sorte no recolher de cartas e no lançar dados que o podem posicionar favoravelmente
ou desfavoravelmente face a outros jogadores. O jogo decorre numa ordem de turnos
progressivos durante os quais podem ganhar pontos de vitória que se traduzem
num perfil de personalidade no fim.

234
5.2.7. Encalhado

Encalhado (2020)420 é um jogo para quatro jogadores, cujas regras, dinâmicas e caráter
abstrato dos seus componentes pretendem estimular a exploração de temas e hipóteses
para criar histórias. O jogo existe em versão analógica (Figura 5.15.), e versão digital
(Figura 5.16.).421

Figura 5.14. Encalhado (2020), apresentando uma fotografia de sessão de jogo (versão analógica). 121

420 Não há grandes diferenças entre as versões analógica e digital, além do medium de suporte – um Google Jam Board – as regras são
as mesmas e a interação é similar. Na versão analógica as peças são manipuladas fisicamente e a história é escrita em folhas
apropriadas, na digital são manipuladas peças digitais num ecrã com recurso a um rato e a história é elaborada num formulário
google.

421 Este jogo foi alvo de uma publicação, um artigo intitulado ENCALHADO: Especular, simular e criar num jogo abstrato (Raimundo
et al. 2020).

235
Figura 5.15. Encalhado (2020), apresentando um ecrã de sessão de jogo (versão digital). 122

Figura 5.16. Encalhado (2020) apresentando foto dos componentes do jogo. 123

Componentes
a. 1 tabuleiro extra com um inventário com peças para usar e identificar o
jogador que as escolheu no decurso do jogo;
b. 1 baralho peças que consiste em 12 cartas com componentes abstratos
distintos;
c. 1 figura retangular;
d. 1 baralho terreno que consiste em 32 cartas castanhas divididas em 22 com
o verso em branco, representando terreno sem nada, e 10 com uma cruz,
com peças por descobrir;
e. 1 baralho encalhar que consiste em cartas pretas quadradas para atolar a
figura;
f. quadrados numerados que identificam os jogadores, as suas escolhas e
posição;

236
g. 1 dado de 6 faces personalizadas para gerar o número de ações e cartas
encalhar para cada jogador;
h. folhas complementares para listar ideias e elaborar uma história por cada
jogador na segunda fase do jogo e apresentá-la na terceira fase para obter
feedback de outros jogadores.

Objetivo
Explorar as peças de jogo para fazer storytelling.

Preparação
O campo de jogo é montado por cartas de um baralho terreno dispostas numa matriz de
6x7 em redor de uma figura retangular, por sua vez dividida numa matriz de 2x5 células
vazias. A figura é posicionada na matriz das cartas terreno a partir do meio do topo
superior do terreno. O jogo joga-se em três fases: 1) explorar o terreno para construir
uma figura; 2) gerar ideias, um título, e elaborar uma estória a partir da fase anterior; 3)
obter opiniões sobre o trabalho individual e escolher a melhor estória.

Fase 1
Os jogadores são posicionados nos quatro cantos do terreno para procurar peças e
construir coletivamente uma figura. Os jogadores jogam por turnos lançando o dado
para obterem o número de ações possíveis e cartas encalhar – devendo as últimas ser
posicionadas distantes do jogador, mas na periferia da figura. As ações do jogador são
mover-se segundo o eixo X ou Y, ou dependendo da sua posição e decisão, sondar o
terreno ou remover cartas encalhar. A cada ação subtrai-se um ponto ao total obtido
com o dado. No fim do turno as peças descobertas são escolhidas do tabuleiro de
componentes e posicionadas livremente por cada jogador sobre a figura. Os turnos
sucedem-se até a figura estar preenchida ou até ficar encalhada, quando as cartas
pretas rodeiam o seu perímetro na totalidade.

Fase 2
Nesta fase, o objetivo é gerar ideias. Cada jogador interpreta o que está representado
na figura e regista o seu raciocínio respondendo às seguintes perguntas nas folhas
complementares: 1) pensar sobre o que a figura e as peças que a constituem sugerem,
listando as ideias que surgirem, como situações comportamentos ou caraterísticas; 2)
dar um título à figura; 3) criar uma história a partir das ideias e do título.

Fase 3
Os jogadores apresentam, à vez, as suas histórias para receber opiniões ou sugestões
dos outros sobre fragilidades, refinamentos, etc. De seguida, procede-se a uma
avaliação conjunta para decidir qual será a melhor história segundo critérios
consensuais estabelecidos pelos jogadores, e.g. interpretação literal ou metafórica da
figura, usar a figura como base para uma sequência narrativa, ou para relatar que ideias
inspira.

237
As sessões de jogo envolveram públicos diferentes, mas incidiram mais em designers e
artistas. No decurso destas sessões obteve-se feedback sobre as versões analógica e
digital do jogo. O jogo promove a geração de ideias (ver Figura 5.18.) contudo, os
jogadores não sentiram uma ligação clara entre a 1ª fase e as restantes, embora
entendessem que se tratava de um gatilho para estas. Um jogador considerou o jogo
mais como uma dinâmica de grupo com gamificação do que um jogo em si, o que pode
dever-se à experiência livre que não está apontada a um objetivo ou tema específico.

Figura 5.17. Encalhado (2020) apresentando imagem e história de um resultado de jogo. 124

Em termos de mecânicas empregues, o jogo tem um início variável pois a posição


inicial das peças escondidas varia com a sessão de jogo. É um jogo cooperativo ou a
solo em que os jogadores usam Movimento em Grelha numa ordem de turnos
progressivos, e têm de arriscar a sorte para revelar peças escondidas no terreno do
jogo. Os jogadores ganham pontos de vitória sob forma de peças para construir um
padrão em conjunto (caracterizar a figura central de jogo). Esta figura serve de
inspiração para o reconhecimento de padrões que dão lugar a storytelling, histórias
elaboradas por cada jogador.

5.2.8. GameStrok!

GameStrok! (2019) é um jogo que facilitamos em formato de workshop, que tinha como
objetivo de estimular a reflexão dos jogadores sobre como influenciar comportamentos
através de jogos (Figura 5.19.)422

422 Este jogo foi concebido como parte de um workshop levado a cabo na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da
Universidade do Porto a 28 de outubro de 2019.

238
Figura 5.18. GameStrok! (2019) apresentando fotografia de sessão de jogo (esquerda) e resultado
(direita). 125

Figura 5.19. GameStrok! (2019) apresentando fotografia de componentes de jogo. 126

Componentes
O jogo consiste em: a) 1 baralho de cartas atitude em cujos versos estão termos-chave
que descrevem comportamentos; b-d) cartas regra, estética e ação; e) folhas para
elaborar a história individual e coletiva. São ainda necessários post-its e canetas para
registar associações entre os componentes anteriores (Figura 5.20).

Objetivo
Estimular a reflexão dos jogadores sobre como influenciar comportamentos criativos.

Regras
• Numa 1ª fase os participantes começam por fazer uma primeira exploração
sobre como se podem incitar atitudes. Para tal são dispersos sobre uma mesa
cartas atitude (a) com o verso voltado para baixo;
• Cada jogador, à vez, vai virando as cartas, e opta por um cujo termo é deixado
visível. Os restantes cartões são virados de novo para baixo. Quando todos
fizerem a sua opção terão um conjunto de atitudes reveladas numa sequência;
• É elaborada uma narrativa em equipa em vinte minutos a partir do que
sugerem os termos-chave nesta mesma sequência;
• Numa segunda fase, cada jogador escolhe uma das três cartas componentes:
b) regras; c) ações; d) estéticas. De seguida e elabora em 15 minutos uma
pequena história relacionando a carta com um aspeto de jogo num post-it, e.g.:
uma regra, uma restrição que estimule uma atitude num jogo; circunstâncias e
contextos que podem despoletar ações num jogo; estéticas de jogo que levam
jogadores a adotarem atitudes num jogo;

239
• Os jogadores apresentam a sua história individual à vez, explicando as
associações que fizeram entre esta e aspetos de jogo. As restantes equipas
pronunciam-se à vez sobre os resultados, identificando fragilidades e
sugerindo melhorias. No total, este momento de discussão deverá durar 15
minutos.

Fim do jogo
O jogo termina com os registros da história coletiva e individual.

O jogo tem algum potencial para criar narrativas e associações inesperadas sobre como
despoletar comportamentos de jogo. Contudo, esta criação de narrativas e associações
pode tornar-se difícil dada o âmbito vasto de assuntos que os jogadores podem escolher
como ponto de partida, mesmo que obrigatoriamente enquadrados por regras, ações e
estéticas.
O jogo processa-se numa ordem de turnos progressiva com início variável que
deriva do arriscar a sorte em revelar cartas atitude. O jogo depende da construção
de padrões, regras, ações e estéticas relacionados pelos jogadores com aspetos de jogos
registados em papel e lápis (post-its), e da negociação entre jogadores sobre estas
relações para elaborar storytelling, narrativas de jogo em folhas apropriadas.

5.2.9. Crearrative: Imagery, Keywords and Emotion

Crearrative: Imagery, Keywords and Emotion (2019) é um jogo por turnos para vários
jogadores para criar narrativas através da associação de emoções com imagéticas
(Figura 5.21.).

Figura 5.20. Crearrative: Imagery, Keywords and Emotion (2019), fotografia de componentes e
sessão do jogo 127

Componentes
O jogo consiste em: a) 2 baralhos de cartas, um com ilustrações e outro com linhas
pautadas e uma palavra-chave; b) 1 dado com 6 lados com naipes vulgares, 4 das faces

240
do dado têm naipes fixos e as restantes faces permitem escolher um naipe livremente.

Regras
• Os naipes do dado correspondem a emoções: Paus é agressão; Diamantes é
ganância; Copas é afeição; Espadas é curiosidade;
• O jogo desenrola-se por turnos, o primeiro jogador começa tirando uma carta
do baralho de ilustração e outra do baralho de palavras-chave. As ilustrações
são colocadas acima da carta com a palavra-chave, ambas voltadas para cima;
• O dado é lançado para saber qual emoção base que serve para associar ambas
as cartas. Estas associações são elaboradas de forma livre pelo jogador em
turno, nas linhas pautadas da carta palavra-chave;
• As associações subsequentes nos turnos dos outros jogadores devem
encadear-se umas nas outras por forma a constituírem uma narrativa com
sentido.

Fim do jogo
O jogo termina quando todas as cartas forem usadas.423

O jogo pode auxiliar a gerar narrativas criativas, contudo, as histórias têm tendência a
ser pouco concretas, algo que pode ser mitigado propondo um tópico no início, como
um relato da vida emocional de um personagem. Uma melhoria seria usar ilustrações
autocolantes sobre uma grelha editorial para produzir um livro em tempo real. Ainda,
substituir os naipes na face do dado por emoções escritas simplificaria a jogabilidade.

Em termos de mecânicas, trata-se de um jogo cooperativo onde os jogadores


elaboram storytelling, uma narrativa numa ordem de turnos progressivos que é
registada nas cartas de jogo, em papel e lápis.

5.2.10. Design e improvisação: Forma de Letra

Design e improvisação: Forma de Letra (2021) é um jogo para conceber caracteres em


conjunto e estimular o pensamento criativo. Além de ser dirigido para trabalhar
tipografia, o jogo permite largar as convenções sobre desenvolvimento tipográfico para
conceber letras originais, o que foi visível nas sessões de jogo com designers e makers.
Nas sessões de jogo com jogadores com históricos e idades diversas, o diálogo entre
estes foi crucial para acordar um propósito comum a atingir.

Componentes

423 O jogo foi jogado por estudantes do Curso de Especialização em Design para Interação, Web and Jogos (iX), que decorreu na
Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto em 2019. Este protótipo usa ilustrações inspiradas no conto O soldadinho de
Chumbo de Hans Christian Andersen (1838). As palavras-chave são inspiradas nas metáforas culinárias do IdeaChef (2018), um jogo
e ferramenta para desenvolver serviços. O significado destas metáforas foi convertido neste jogo em emoções genéricas que
pudessem ser usadas num âmbito narrativo alargado.

241
Consiste num tabuleiro para iterar caracteres rodeado de um percurso para registar o
progresso dos jogadores, um dado normal determina o número de peças e outro
personalizado determina as facetas das letras a trabalhar (Figura 5.21).

Figura 5.21. Versão 2 do jogo em madeira: 1) Tabuleiro principal; 2) dado normal; 3) dado
facetas; 4) identificadores de jogador; 5) peças-unidades para construir a letra. 128

Regras
• O jogo joga-se por turnos iniciando-se com o jogador mais novo e seguido
pelos restantes segundo a ordem dos ponteiros de um relógio;
• Cada jogador lança o dado normal para obter o número de peças a trabalhar,
e de seguida o dado customizado três vezes para escolher uma faceta de letras
operar: a) Forma Básica da letra; b) Peso, robustez ou fragilidade; c) Tamanho,
área ocupada; d) Equilíbrio, simetria ou assimetria; d) Imprevisibilidade, faceta
autoproposta;
• O nº de peças é manipulado pelo jogador para construir ou transformar letras,
símbolos ou números de acordo com a faceta escolhida. Os jogadores
trabalham sobre as contribuições uns dos outros, adicionando, subtraindo,
rodando ou sobrepondo peças;
• A pontuação de cada jogador é incrementada a cada turno somando nº de
peças obtido com o lançamento do 1º dado ao valor da faceta escolhida do 2º,
o valor somado permite posicionar o identificador do jogador no percurso.

Condições de Vitória
Os turnos sucedem-se até um dos jogadores chegar ao término do percurso, ou se o
resultado já for satisfatório para todos os jogadores. Se não, os jogadores voltam à
casa número um e continuam a transformar a forma da letra obtida em novas sessões.

As sessões com o jogo revelaram que os jogadores tendiam a ser mais audazes nas suas
ações a partir das primeiras rondas, gerando dinâmicas e resultados inesperados. O
jogo revela-se divertido dado o seu caráter livre e informal e adequado para predispor
os jogadores para a criatividade, i.e. operar como quebra-gelo e libertar o jogador de
preconceções (ver figura 5.22.).

242
Figura 5.22. Design e improvisação: Forma de Letra (2021 apresentando 2 sequências de fotografias de
sessões de jogo na versão de papel, que é idêntica à jogabilidade da versão em madeira. 129

Em termos de mecânicas, ganham-se pontos de vitória para construir e recon-


hecer padrões, letras ou famílias de letras, através de uma ordem de turnos progres-
sivos e com início variável. O jogo é dinamizado por eventos despoletados por
dados que inspiram os jogadores a agir, alternado entre um jogo a solo e momentos de
sinergia de esforços entre si, durante os quais torna-se um jogo cooperativo.

5.2.11. Design e Improvisação: Azulejos

Design e Improvisação: Azulejos (2021) é um jogo por turnos para quatro jogadores cujo
objetivo é desenvolver literacia criativa para criar em conjunto padrões de cor. O tema
pode ser estabelecido no início ou emergir durante o jogo, e a forma do padrão pode ser
irregular (Figura 5.23).

Figura 5.23. Componentes de jogo: 1) jogo de ‘mão’ dos jogadores; 2) marcadores para pontuar;
3) área de jogo; 4) saco de azulejos. 130

Componentes
O jogo consiste num saco com 64 azulejos quadrados coloridos, divididos em grupos

243
de 4 com a mesma cor e respetivos marcadores para pontuar (Figura 5.20.).

Objetivo
Co-criar padrões de cor.

Regras
• As regras são baseadas no jogo de cartas da Pesca (n/d), mas em vez de
agrupar cartas por naipes, agrupam-se quatro azulejos com a mesma cor que
se designam por paletas;
• Os jogadores posicionam-se à volta da área de jogo (aprox. 1m2), cada um
retira 7 azulejos do saco, escondendo-os dos outros jogadores;
• O primeiro jogador (o mais novo) pede azulejos iguais a um que tenha na mão,
que os outros jogadores entregam se tiverem. Se ninguém tiver azulejos iguais
ao pedido pelo jogador, este retira outro azulejo do saco. Se este azulejo for da
cor pedida continua a jogar, se não, é a vez do jogador seguinte;
• Quando um jogador reúne uma paleta, pode dispô-la livremente sobre a área
de jogo, e combiná-la com outras paletas existentes. O jogador pontua
colocando um marcador da mesma cor da paleta implantada.
• Se o jogador ficar sem azulejos na mão tira 7 do saco, se não houver mais
azulejos está fora do jogo.
• O jogo acaba quando todas as paletas estiverem aplicadas na área de jogo.

Condições de vitória e derrota


O jogador que tiver mais marcadores ganha o jogo, em caso de haver mais do que um
com a mesma pontuação há empate.

A pontuação foi incluída para envolver os jogadores, mas a verdadeira realização está
na execução do processo do jogo. O diálogo ou atrito que emerge deste processo pode
ocorrer apenas por interação, e.g. a sobreposição ou transformação do estado do jogo.

O aumento da literacia criativa reside na cocriação de um padrão colorido com um


significado, lidar com a incerteza do seu desenvolvimento, sustentar este processo
através de analogias ou metáforas, e predispor jogadores a arriscar e a abrirem-se à
surpresa e a outros objetivos.
Em termos de mecânicas de jogo, ganham-se pontos de vitória (recursos) para
construir e reconhecer padrões de cor em contínua transformação, por uma ordem
de turnos progressivos. Os recursos ganhos determinam o vencedor.

244
5.2.12. Damas versus Conceção de Videojogos

Damas versus Conceção de Videojogos (2021)424 é um protótipo que usa o ato de ganhar
peças do jogo das damas para despoletar a ideação cooperativa de novos jogos,
formulando associações numa plataforma digital existente, o Google Jam Board (GJB),
uma tela de conceção multi-utilizador, servindo simultaneamente de espaço
colaborativo para conceber videojogos e jogá-los (Figuras 5.24. e 5.25.).

Figura 5.24. Damas versus Conceção de Videojogos (2021) apresentando o slide 1 do GJB com o jogo das
damas alterado e post-its Propósito, Narrativa e Ação. 131

424 Os protótipos anteriores integram aspetos para a criatividade, e.g., sinergia, mas além de apelarem para a respetiva importância,
não estão apontados a gerar algo em concreto. Damas versus Conceção de Videojogos (2021) marca a mudança definitiva das
práticas de prototipagem para um misto de sessões de cocriação, jogo e crítica com designers e jogadores. Em virtude da pandemia
covid 19, estas sessões passaram a ser conduzidas remotamente usando uma tela virtual, o Google Jam Board (GJB), para conceção,
implementação e sessões de jogo.

245
Figura 5.25. Damas versus Conceção de Videojogos (2021) apresentando o slide 2 do GJB com a Tela de
conceção de jogos. 132

Figura 5.26. Damas versus Conceção de Videojogos (2021) apresentando os dois slides de jogo em
GJB e respetivos componentes. 133

Componentes
a. Jogo das damas com o tabuleiro tradicional reduzido para uma grelha de
7x7;
b. Post-its ação;
c. Post-its narrativa;
d. Post-its propósito;
e. Tela de conceção de jogos;

Figura 5.27. Damas versus Conceção de Videojogos (2021) apresentado o fluxo de regras de jogo.
134

Objetivo
Co-criar um conceito de jogo.

Regras
a) e b) Os adversários dos jogadores que ganham peças no jogo das damas
escolhem post-its para os segundos associarem a aspetos de jogo. A cada
peça ganha é escolhido 1 post-it e a cada dama 2 (Figura 5.21.);
c) Os aspetos a associar aos post-its são determinados por um gerador

246
aleatório online.425 As associações devem ser breves, uma vez que o tempo
é indicado por este gerador sob forma de uma linha que se vai consumindo
em 2 minutos;
d) Os termos dos post-its são associados com aspetos numa Tela de conceção
de jogos (Figura 5.22.), pelo jogador que ganhou peças. Assim, e à vez, os
jogadores preenchem a tela de conceção de jogos até o jogo das damas
terminar;
e) No fim, a tela deve ter todos os campos preenchidos, para servir de base
aos jogadores para redigirem um documento de conceito de um novo jogo
em conjunto.

Fim do Jogo
As equipas de jogadores devem preencher na totalidade a tela de conceção de jogos e
redigir o respetivo documento de conceito de jogo.

Este protótipo demonstra que o design de jogos requer a maestria de multiliteracias


para interpretar e desenhar diversos conteúdos (New London Group 1996; Zagalo
2019), e ainda aptidões sobre multimodalidade, que permitam expressar assuntos de
forma mais profunda e poderosa com vários media (Kress 2005). Esta expressão
consiste nas associações dos conteúdos, literacias e modos relevantes para jogadores
ou designers atuarem criativamente (Gee 1999; Freire 2005). As associações envolvem
esforço em aprender e o prazer em criar algo, ambas caraterísticas de um bom design
de jogo (Gee 2004a). Finalmente, reflete ainda a situação do jogador enquanto designer,
o desenvolver de conhecimento e gosto pela criatividade através do acto de jogar, para
que o jogador ganhe interesse em conceber jogos (Anthropy 2012).

As sessões de jogo426 sugerem que este é um jogo fácil de instruir e jogar, e bem dirigido
para desenvolver conhecimento em criatividade para conceber videojogos, ou para
desbloquear o respetivo processo.

O movimento em grelha das peças do jogo a solo das damas dá a ganhar aos jogadores
pontos de vitória para construir padrões e fazer o reconhecimento de padrões de

425 Devem ser ignorados aspetos repetidos pelo gerador pois pretende-se preencher o maior número de aspetos da tela de conceção
de jogos. Este gerador pode ser acedido em: https://openprocessing.org/sketch/1129750

426 Estas sessões envolveram grupos de estudantes de Design e Engenharia na Unidade Curricular (UC) de Jogos Digitais da Faculdade
de Engenharia da Universidade do Porto, com o objetivo de gerar ideias para o projeto desta UC. Foi pedido aos alunos para
responder a um questionário que devolveu 19 respostas: 13 estudantes acharam as instruções fáceis de perceber, 14 o jogo fácil
de jogar, e 16 que formular associações não foi difícil. As opiniões dos estudantes divergem sobre a utilidade do jogo em inspirar
ideias para o projeto na UC, mas foi reconhecido mérito em auxiliar a ampliar ou consolidar aspetos, a pensar em opções
alternativas ou a desbloquear ideias. Em alguns casos a dialética entre perspetivas opostas dos elementos das equipas, dificultou
o acordo sobre as associações formuladas no jogo.

247
aspetos de jogos para conceber um jogo. Os aspetos agregados na tela de conceção de
jogos são sujeitos à negociação entre jogadores num jogo cooperativo, ficando regis-
trados num documento de conceito do jogo de forma similar ao uso de papel e lápis.

5.2.13. Jogo do Galo versus Grelha Editorial

Jogo do Galo versus Grelha Editorial (2021) baseia-se no jogo do galo tradicional e tem
como objetivo auxiliar a conceber uma grelha editorial de raiz (Figura 5.28 e 5.29).

Figura 5.28. Jogo do Galo versus Grelha Editorial (2021) apresentando o 1º slide do GJB. 135

248
Figura 5.29. Jogo do Galo versus Grelha Editorial (2021) apresentando o 1º slide do GJB. 136

Figura 5.30. Jogo do Galo versus Grelha Editorial (2021) apresentando os 2 slides de GJB do jogo e
respetivos componentes. 137

Componentes
a. 1 tabuleiro que expande a grelha do jogo original para 5x5 para aumentar
o número de jogadas e ações criativas;
b. 1 categoria de post-it: Elementos tipográficos;
c. 1 baralho de post-its com Caraterísticas de elementos tipográficos;
d. 1 baralho de post-its com Mutações que transformam as caraterísticas dos
elementos tipográficos anteriores;
e. 1 tabuleiro extra para aplicar Elementos tipográficos com determinadas
caraterísticas que podem sofrer mutações.

Objetivo

249
Auxiliar a conceber uma grelha editorial de raiz.

Regras
1. Tal como no jogo tradicional do Jogo do Galo, os jogadores vencem fazendo
linhas ortogonais e diagonais compostas por três das suas peças – ver
figura 5.25 (1);
2. Quando um jogador fizer uma destas linhas escolhe um dos post-its para
que o seu oponente o associe a um aspeto da grelha – ver figura 5.25 (2);
3. A construção da grelha editorial é cumulativa a partir das contribuições
dos jogadores sempre que atingirem a condição da 1ª regra.

Final do jogo
O jogo termina quando não houver mais hipóteses de ação ao jogo do galo, ou se os
jogadores chegarem a acordo sobre a adequação da grelha editorial que estão a edificar.

O procedimento do jogo permite compor uma grelha editorial de forma livre e fazê-lo
de formas inesperadas. Contudo, o jogo não possui mecânicas de diálogo para negociar
a elaboração de uma grelha editorial em coordenação entre jogadores, a menos que os
jogadores discutam isso informalmente.

O movimento em grelha do jogo do galo dá a ganhar aos jogadores pontos de vitória


para construir padrões sofisticados, numa ordem de turnos progressivos, sob
forma de grelhas editoriais. O início é variável segundo a constituição de linhas
horizontais ou ortogonais pelos jogadores no tabuleiro do jogo do galo no 1º slide do
GJB. A composição da grelha fica registrada no 2º slide do GJB.

5.2.14. Batalha Naval versus Grelha Editorial

Batalha Naval versus Grelha Editorial (2021) é um protótipo baseado no jogo tradicional
da batalha naval para dois jogadores, cujo objetivo é compor uma grelha editorial
suíça.427 O jogo está implementado em GJB (ver Figura 5.31 e 5.32).

427 Para informação sobre grelhas editoriais suíças ver Müller-Brockmann (1996).

250
Figura 5.31. Batalha Naval versus Grelha Editorial (2021), apresentando a vista de um dos jogadores.138

Figura 5.32. Batalha Naval versus Grelha Editorial (2021), apresentando a vista combinada do campo dos
jogadores no fim do jogo, com duas áreas para colocar texto e imagem. 139

Figura 5.33. Batalha Naval versus Grelha Editorial (2021), apresentando os componentes de jogo.

251
140

Componentes
a. Marcos para dispor tiros certeiros, falhados e uma bomba;
b. Grelha-campo do jogador;
c. Navio montado com 2 das peças navios disponíveis. Cada jogador possui 1
vocabulário de peças distintas para montar navios, mais 3 submarinos para
dispor na sua grelha individual.
d. Grelha-campo do adversário;

Objetivo
Conceber uma grelha editorial suíça

Regras
• Cada navio é configurado por cada jogador com 2 das peças disponíveis para
ser difícil de reconhecer, e portanto, de afundar. São montados e posicionados
7 navios e 3 submarinos nas grelhas individuais.
• Cada jogador tem um número ilimitado de disparos que afetam uma célula da
grelha, e 1 bomba, cujo lançamento sobre uma célula tem um alcance de 3x3
células em redor.
• A batalha acaba com o afundamento de todos os navios e submarinos. No fim,
os jogadores replicam as suas grelhas no terceiro slide do GJB que contém
post-its com elementos tipográficos, decidindo quais aplicam nas áreas
afundadas;
• Quem afunda navios estipula o que é aplicado nas respetivas áreas, podendo
inclusive modificá-las ligeiramente, mas deve ouvir o adversário sobre
alternativas.

Fim
O jogo termina quando os jogadores chegarem a acordo que a grelha tipográfica está
finalizada.

Foram facilitadas sessões de cocriação que deram origem ao jogo tirando partido da
interação e crítica em tempo real entre designers.428 As sessões de jogo com jogadores
subsequentes demonstram potencial para o objetivo pretendido com o jogo.

A fase da batalha estimula o conhecimento criativo para construir um padrão de jogo


oculto difícil de deduzir pelos adversários, o que faz com que o jogo tenha um início
variável. Revelar esta informação oculta apela à elaboração de uma Teoria de Sistema

428 Estas sessões decorreram a 31.03.2021 com a Mestre em ilustração Beatriz Girão, e a 01.04.2021 com o colega do Programa doutoral
em Media Digitais Abel Neto, e a colega do Programa Doutoral em Design Viviane Peçaibes.

252
de jogo (Carvalhais e Cardoso 2021), através do arriscar a sorte nas ações dos
jogadores numa ordem de turnos progressivos. E.g. usar uma bomba, uma
habilidade conseguida uma vez por jogo para revelar informação escondida.

O fim da batalha permite aumentar a criatividade com o reconhecimento de padrões,


através da simulação mental de áreas afundadas que se adaptem à aplicação de
elementos tipográficos. A divergência de opiniões sobre esta aplicação nesta fase pode
levar, como acontece no improviso musical (Nachmanovitch 2014), ao jogo coope-
rativo e negociação entre jogadores para compor e registar uma paginação final.

5.2.15. Pedra, Papel Tesoura versus Conceção de Personagem de jogo

Pedra, Papel Tesoura versus Conceção de Personagem de jogo (2021) baseia-se na mecânica
com o mesmo nome para despoletar ações para conceber personagens de jogo, como
ilustrado na Figura 5.34.

Figura 5.34. Pedra Papel Tesoura versus Conceção de Personagem de jogo (2021). 141

253
Figura 5.35. Pedra Papel Tesoura versus Conceção de Personagem de jogo (2021): a) e b) duas sessões
de jogo com equipas de jogadores diferentes. 142

Componentes
1. Painel de controlo do GJB, com instrumentos e formas para desenhar o
personagem;
2. Instruções;
3. Marcos do jogador relacionados com simbologia para papel, pedra e tesoura;
4. Post-its que auxiliam a caraterizar as ações dos jogadores;
5. Campo de desenho do jogo.

Objetivo
Conceber um personagem de jogo.

Regras
• Os jogadores verbalizam um de três símbolos: Pedra (círculo), Papel
(quadrado) ou Tesoura (triângulo), repetindo o processo até um deles vencer;
• O jogador que ganhou esboça uma personagem na área do GJB para esse
efeito, usando as respetivas ferramentas de desenho;
• O esboço baseia-se em associações entre o símbolo com o qual se ganhou e
um post-it escolhido pelo adversário.
• O esboço inicia-se aplicando e escalando o símbolo ganho na área de desenho
enquanto base para uma figura ou aspetos desta, e permanece como parte
integrante desta;
• Os jogadores repetem este processo transformando a figura por turnos, como
num exercício de cadáver esquisito, até que se atinja um resultado aceitável
para ambos.

Fim do jogo
O jogo termina quando os jogadores chegam a acordo sobre um personagem de jogo

254
finalizado.

O jogo foi concebido em cocriação e jogado em contexto de sala de aula para auxiliar
estudantes a gerarem ideias para os seus projetos de jogo.429 As sessões de jogo revelam
que este tem potencial para quebrar gelo entre jogadores para que estes ultrapassem
bloqueios criativos, e para estimular a geração de ideias no seu âmbito (Figura 5.36.).

Figura 5.36. Pedra Papel Tesoura versus Conceção de Personagem de jogo (2021): a) e b) resultados de duas
sessões de jogo com equipas de jogadores diferentes. 143

O jogo usa a mecânica do pedra-papel-tesoura para determinar símbolos que sirvam


de base e qual o jogador a desenhar com estes, o que implica um início variável. O
desenho tem por base associações entre os símbolos e os post-its escolhidos pelo
adversário do jogador em turno. A personagem é consolidada em turnos aleatórios a
partir dos desenhos cumulativos dos jogadores com as ferramentas de jogo, que são
similares ao papel e lápis.

5.3. Análise Crítica dos Resultados


De seguida, apresentamos a Tabela 1 com as mecânicas identificadas no capítulo 4, às
quais acrescentamos outras que emergem dos casos de estudo. A tabela apresenta
terminologia para identificar a mecânica, a respetiva descrição, e o número de vezes
que ocorre nos casos analisados. A ordem da tabela é ditada pelo número total de
ocorrências na amostra.

Tabela 5.1. - Mecânicas identificadas nos jogos11


Mecânicas Descrição Jogos Frequência
Os turnos dos Research Quest I (2017); Research Quest II (2017);
jogadores sucedem- See Hear Feel no Evil (2018); Polyomino &
se numa ordem, p.ex. Amoebas (2018); Salto Decisivo (2019); Bully Who
Ordem de Turnos na direção dos (2019); Encalhado (2020); GameStrok! (2019);
progressiva ponteiros do relógio Design e improvisação: Forma de Letra (2021); 12

429 Esta sessão de jogo ocorreu no contexto de ideação do projeto da Unidade Curricular de Sistemas Gráficos e Animação 3D da
Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto.

255
Design e Improvisação: Azulejos (2020); Jogo do
Galo versus Grelha Editorial (2021); Batalha Naval
versus Grelha Editorial (2021)
Research Quest I (2017); Research Quest II (2017);
Polyomino & Amoebas (2018); Encalhado (2020);
GameStrok! (2019); Design e improvisação: Forma
de Letra (2021); Design e Improvisação: Azulejos
(2020); Damas versus Conceção de Videojogos
Configurar elementos (2021); Jogo do Galo versus Grelha Editorial
Construir em padrões (2021); Batalha Naval versus Grelha Editorial
padrões sofisticados (2021) 10
Research Quest I (2017); Research Quest II (2017);
See Hear Feel no Evil (2018); Polyomino &
Amoebas (2018); Encalhado (2020); GameStrok!
(2019); Design e improvisação: Forma de Letra
(2021); Jogo do Galo versus Grelha Editorial
O início do jogo (2021); Batalha Naval versus Grelha Editorial
varia de sessão para (2021); Pedra Papel Tesoura versus Conceção de
Início variável sessão Personagem de jogo (2021); 10
Research Quest I (2017); Research Quest II (2017);
Polyomino & Amoebas (2018); Encalhado (2020);
Design e improvisação: Forma de Letra (2021);
Reconhecer padrões Design e Improvisação: Azulejos (2020); Batalha
Reconhecimento de carácter abstrato Naval versus Grelha Editorial (2021); Damas versus
de padrões ou relevante Conceção de Videojogos (2021) 8
Research Quest I (2017); Research Quest II (2017);
Usar caneta e papel Salto Decisivo (2019); GameStrok! (2019);
para registar as Crearrative: Imagery, Keywords and Emotion
contribuições dos (2019); Pedra Papel Tesoura versus Conceção de
jogadores, que Personagem de jogo (2021); Damas versus Conceção
Papel e lápis influenciam o jogo de Videojogos (2021) 7
Bully Who (2019); Encalhado (2020); Design e
improvisação: Forma de Letra (2021); Design e
Pontos ou recursos Improvisação: Azulejos (2020); Damas versus
que dão aos Conceção de Videojogos (2021); Jogo do Galo
Pontos de jogadores que versus Grelha Editorial (2021); Polyomino &
Vitória ganham a vitória Amoebas (2018) 7
See Hear Feel no Evil (2018); Polyomino &
As ações são Amoebas (2018); Encalhado (2020); Crearrative:
coordenadas entre Imagery, Keywords and Emotion (2019); Design e
jogadores, que improvisação: Forma de Letra (2021); Batalha
ganham ou perdem Naval versus Grelha Editorial (2021); Damas versus
Jogo cooperativo em conjunto Conceção de Videojogos (2021); 7
See Hear Feel no Evil (2018); Polyomino &
Decidir até onde Amoebas (2018); Bully Who (2019); Encalhado
arriscar e esticar a (2020); GameStrok! (2019); Batalha Naval versus
Arriscar a sorte sorte Grelha Editorial (2021) 6
Os jogadores See Hear Feel no Evil (2018); Polyomino &
acordam nas ações Amoebas (2018); GameStrok! (2019); Damas versus
que farão durante Conceção de Videojogos (2021); Batalha Naval
Negociação uma jogada versus Grelha Editorial (2021) 5
Quando os agentes See Hear Feel no Evil (2018); Polyomino &
de jogo se movem Amoebas (2018); Encalhado (2020); Damas versus
Movimento em numa grelha em Conceção de Videojogos (2021); Jogo do Galo
Grelha várias direções versus Grelha Editorial (2021) 5
Jogar sozinho contra See Hear Feel no Evil (2018); Polyomino &
o sistema de jogos, Amoebas (2018); Encalhado (2020); Damas versus
ou num modo de Conceção de Videojogos (2021); Design e
Jogo a solo jogo individual improvisação: Forma de Letra (2021) 5

256
Jogo que representa Research Quest I (2017); Research Quest II (2017);
uma circunstância Bully Who (2019); Batalha Naval versus Grelha
Simulação atual Editorial (2021) 3
Ações que mudam o
estado do jogo sem
intervenção dos See Hear Feel no Evil (2018); Salto Decisivo (2019);
Eventos jogadores Design e improvisação: Forma de Letra (2021) 3
Os jogadores
recebem estímulos
para conceber uma Encalhado (2020); GameStrok! (2019); Crearrative:
Storytelling história Imagery, Keywords and Emotion (2019) 3
Peças de jogo ou
jogadores são
escolhidos de forma See Hear Feel no Evil (2018); Polyomino &
Turnos aleatória para jogar a Amoebas (2018); Pedra Papel Tesoura versus
aleatórios cada turno Conceção de Personagem de jogo (2021) 3
Os jogadores
Construção de constroem baralhos
baralhos de jogo Research Quest I (2017); Research Quest II (2017) 2
Os jogadores votam
sobre a execução de
Votação ações. Research Quest I (2017); Research Quest II (2017) 2
Jogo com três
estados que são
Pedra-Papel- ciclicamente Pedra Papel Tesoura versus Conceção de
Tesoura superiores aos outros Personagem de jogo (2021) 1
Assumir um papel ou
personagem que
Role Playing evolui com o tempo Bully Who (2019) 1
Habilidades A ação pode ser
conseguidas uma usada uma única vez
vez por jogo durante o jogo Batalha Naval versus Grelha Editorial (2021) 1

A Tabela 5.2 relaciona os jogos com as mecânicas apresentadas na Tabela 5.1. A Tabela
5.2 reúne informação sobre a correlação das mecânicas em cada protótipo de jogo, para
adquirirmos uma noção sobre como foram integradas, como operam entre si e em que
sequências, e que ações estimulam em termos criativos. Ao obter uma noção ampla
sobre como estas mecânicas podem ser integradas em jogos, e sobre os seus resultados
expectáveis, será mais fácil conceber e desenvolver jogos para os propósitos desta
investigação.

Tabela 5.2 - Relação entre protótipos e mecânicas12

Jogos Mecânicas

Os jogadores procedem à construção de baralhos para construir e


reconhecer padrões, no decurso do jogo. O jogo é jogado numa ordem de
turnos progressivos, e tem um início variável consoante as cartas
retiradas dos baralhos. O jogo é ainda uma simulação de um processo de design
destinado a descobrir um percurso académico adequado ao jogador. Esta simulação é
Research Quest I registrada com recurso a papel e lápis e recorre à votação dos jogadores para
(2017) orientar as fases de jogo subsequentes.

257
Os jogadores procedem à construção de baralhos para construir
padrões e para o reconhecimento destes padrões, o associar de áreas
de estudo a referências, e à votação sobre a qualidade das últimas para orientar as
fases de jogo seguintes. Ainda, o jogo é jogado numa ordem de turnos
progressivos, e tem um início variável consoante as áreas disciplinares
escolhidas no seu começo. O jogo simula o percurso de investigação científica
Research Quest II para ajudar o jogador a definir a sua própria investigação. As associações geradas
(2017) nesta simulação são registradas com recurso a papel e lápis.
É um jogo cooperativo ou a solo no qual os jogadores têm liberdade de
movimento em grelha, e de negociação. As ações acarretam sempre
arriscar a sorte, o que se pode traduzir em ganhos ou perdas. O jogo tem um
See, Hear, Feel no início variável segundo uma ordem de turnos progressiva ou
Evil (2018) turnos aleatórios em função dos eventos e estado do jogo.
O jogo usa mecânicas de movimento em grelha, numa ordem de turnos
progressivos ou turnos aleatórios dependendo como os jogadores
manipulam as peças para se entreajudarem ou não. O início é variável em
função da disposição aleatória das peças. Pode ser um jogo cooperativo e
também um jogo a solo, onde também ocorre negociação entre jogadores
para construir padrões e ocorrer o reconhecimento de padrões, a
combinação de peças de jogadores. O jogo envolve ainda arriscar a sorte
Polyomino & Amoebas nestas combinações, porque podem não ser retribuídas dependendo da sinergia entre
(2018) jogadores, bem como, obter pontos de vitória para permanecer no jogo.
O jogo desenrola-se numa ordem de turnos progressivos em que cada
jogador ganha recursos lançando o dado. O dado pode ainda despoletar eventos
que alteram a operação do jogo. Os jogadores registram no seu turno, a papel e
lápis, como construir padrões, ou seja, como transformaram a forma central do
Salto Decisivo (2019) jogo.
O jogo é uma simulação do fenómeno do bullying em que o jogador faz role-
playing teatralizando papéis ligados a esta temática. Para tal, cada jogador deve
arriscar a sorte às cartas dados que o podem posicionar favoravelmente ou
desfavoravelmente face a outros jogadores. O jogo decorre numa ordem de
turnos progressivos durante os quais os jogadores podem ganhar pontos
Bully Who (2019) de vitória.
É um jogo cooperativo ou a solo com início variável em que os
jogadores usam movimento em grelha numa ordem de turnos
progressivos, e têm de arriscar a sorte para revelar peças escondidas
no terreno do jogo. Os jogadores ganham pontos de vitória sob forma de
peças para construir padrões em conjunto (caracterizar a figura central de
jogo). Esta figura serve de inspiração para o reconhecimento de padrões
Encalhado (2020) que dão lugar a storytelling, histórias elaboradas por cada jogador.
O jogo segue uma ordem de turnos progressiva com início
variável que deriva do arriscar a sorte em revelar cartas, construir
padrões, articulações feitas pelos jogadores registados em papel e lápis, e da
negociação entre jogadores sobre estas relações para elaborar
GameStrok! (2019) storytelling, narrativas de jogo.

Crearrative: Imagery, Em termos de mecânicas, trata-se de um jogo cooperativo onde os jogadores


Keywords and elaboram storytelling, uma narrativa numa ordem de turnos progressivos que
Emotion (2019) é registada nas cartas de jogo, em papel e lápis.
Em termos de mecânicas, ganham-se pontos de vitória para construir e
Design e reconhecer padrões, letras ou famílias de letras, através de uma ordem de
improvisação: Forma turnos progressivos e com início variável. O jogo é dinamizado por
de Letra (2021) eventos despoletados por dados que inspiram os jogadores a agir, alternado entre

258
um jogo a solo e momentos de sinergia de esforços entre si, durante os quais se
torna um jogo cooperativo.

Design e Em termos de mecânicas de jogo, ganham-se pontos de vitória (recursos)


Improvisação: para construir e reconhecer padrões de cor por uma ordem de
Azulejos (2021) turnos progressivos. Os recursos ganhos determinam o vencedor.
O movimento em grelha das peças do jogo a solo das damas dá a ganhar
aos jogadores pontos de vitória para construir padrões e fazer o
reconhecimento de padrões de aspetos de jogos para conceber um jogo. Os
Damas versus aspetos agregados na tela de conceção de jogos são sujeitos à negociação entre
Conceção de jogadores num jogo cooperativo, ficando registrados num documento de
Videojogos (2021) conceito do jogo de forma similar ao uso de papel e lápis.
O movimento em grelha do jogo do galo dá a ganhar aos jogadores pontos
de vitória para construir padrões sofisticados sob forma de grelhas
Jogo do Galo versus editoriais numa ordem de turnos progressivos. O início é
Grelha Editorial variável segundo a constituição de linhas horizontais ou ortogonais pelos
(2021) jogadores no jogo do galo.
A batalha foca-se em construir um padrão de jogo oculto dos adversários, o
que faz com que o jogo tenha um início variável. Revelar esta informação
apela ao arriscar a sorte nas ações dos jogadores numa ordem de turnos
progressiva. e.g. usar uma bomba, uma habilidade conseguida uma
vez por jogo para revelar informação escondida. O fim da batalha permite
aumentar a criatividade com o reconhecimento de padrões, através da
simulação mental de áreas afundadas que se adaptem à aplicação de elementos
Batalha Naval versus tipográficos. A divergência de opiniões sobre esta aplicação pode levar ao jogo
Grelha Editorial cooperativo e negociação entre jogadores para compor uma paginação
(2021) final.
O jogo usa a mecânica do pedra-papel-tesoura para determinar símbolos
Pedra, Papel Tesoura que sirvam de base e qual o jogador a desenhar com estes, o que implica um
versus Conceção de início variável. A personagem é consolidada em turnos aleatórios
Personagem de jogo a partir dos desenhos cumulativos dos jogadores com as ferramentas de jogo, que são
(2021) similares ao papel e lápis.

Contudo, como observámos no capítulo 3 e no capítulo 4, o número de mecânicas não


corresponde a uma maior propensão para ocorrerem atos criativos, apenas que há mais
informação e possibilidades para explorar. Ou seja, a propensão para atos criativos
depende da forma como se conjugam as mecânicas, algo fundamentado nas conclusões
da nossa análise de casos na secção 4.3.4. Estas conclusões apontam para a existência
de diferentes combinações de mecânicas de jogo para a criatividade capazes de
sustentar a mesma ação de jogo para a criatividade.

Assim, na secção seguinte procuramos consolidar este argumento identificando as


mecânicas com potencial para aumentar a literacia criativa que emergem de correlações
entre protótipos de jogos, e como se enquadram nas ações de jogo para a criatividade.

259
5.3.1. Mecânicas de Jogo para a Criatividade aliadas à Ação de Jogo para a
Criatividade: Diálogo

A interação dos agentes num âmbito de jogo, o diálogo que encetam com este, determina
o tipo de experiência, como o movimento em grelha no cenário distópico em See, Hear,
Feel no Evil (2018), a construção de padrões de design em Batalha Naval versus Grelha
Editorial (2021), ou de associações para conceber um conceito em Damas versus Conceção
de Videojogos (2021). A conceção de designs decorre ainda da reciprocação do diálogo
num jogo com início variável envolvendo a construção de baralhos, a construção
de padrões em ordem de turnos progressivos ou por turnos aleatórios de joga-
dores, como em Research Quest I (2017) e Research Quest II (2017). É por isso que dizemos
que a interação e conceção ocorrem durante o diálogo entre jogo e agentes de jogo.

Tabela 5.3. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Diálogo13
Movimento em Grelha
Ordem de turnos progressiva
Turnos aleatórios
Início variável
Construção de baralhos
Construir Padrões

5.3.2. Mecânicas de Jogo para a Criatividade aliadas à Ação de Jogo para a


Criatividade: Dialética

Todos os jogos argumentam algo sobre os seus assuntos, a simulação de fenómenos


reais, e o role-playing,em Bully Who (2019) que argumenta que o jogador pode ser
vítima e agressor, cabendo-lhe usar a razão crítica para navegar estes estados. Em
Design e improvisação: Forma de Letra (2021) são as transformações impostas por uma
sucessão de jogadores e eventos que permitem o reconhecimento de padrões (novas
letras), o que requer reflexão crítica, o questionar da pertinência das ações para
conceber algo no jogo.

Assim, a dialética de jogo, as possibilidades de crítica e argumentação, dependem do


âmbito que este faculta, que embora limitado para GameStrok! (2019) ou Crearrative:
Imagery, Keywords and Emotion (2019), permite gerar storytelling, narrativas criativas
dentro dos seus enquadramentos. Aferir ações adequadas ao propósito de um jogo pode
ser conseguida através da votação dos jogadores sobre hipóteses de investigação em
Research Quest I (2017), ou através da negociação sobre o uso das peças dos jogadores
em Polyomino & Amoebas (2018), ou sobre perspetivas de aspetos de jogo em Damas
versus Conceção de Videojogos (2021). O diálogo emerge ainda em Bully Who (2019).

260
Tabela 5.4. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Dialética14
Eventos
Reconhecimento de Padrões
Simulação
Negociação
Votação
Storytelling
Role-Playing

5.3.3. Mecânicas de Jogo para a Criatividade aliadas à Ação de Jogo para a


Criatividade: Tentativa-erro

O que pode levar o jogador por novos caminhos de pensamento é a tentativa-erro, e.g. ao
arriscar a sorte em ações para aprender a lidar com desconhecido em Encalhado
(2020), usando pedra-papel-tesoura para mudar o raciocínio, o simulacro de desenho
feito com papel e lápis para alterar os estados de Pedra, Papel Tesoura versus Conceção
de Personagem de jogo (2021), ou gerando associações para realizar storytelling em
GameStrok! (2019). A noção de realização num jogo, por seu turno, está ligada à
obtenção de pontos de vitória enquanto recursos para nele progredir como em Design
e Improvisação: Azulejos (2020) e Design e improvisação: Forma de Letra (2021), ou em
habilidades conseguidas uma vez por jogo, na forma de uma bomba com alcance
ampliado em Batalha Naval versus Grelha Editorial (2021).

Tabela 5.5. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Tentativa-erro 15
Habilidades conseguidas uma vez por jogo
Arriscar a sorte
Pedra-Papel-Tesoura
Pontos de vitória
Papel e lápis

5.3.4. Mecânicas de Jogo para a Criatividade aliadas à Ação de Jogo para a


Criatividade: Sinergia

Alguns destes jogos exigem a acomodação de diferentes perspetivas de agentes de jogo


para determinar se este é atuado como jogo a solo, ou como jogo cooperativo que
amplia o alcance dos jogadores em Polyomino & Amoebas (2018), que converge
contributos criativos em Design e improvisação: Forma de Letra (2021), ou a alternância

261
na união de forças para atingir objetivos em Encalhado (2020). O jogo a solo tende a
reduzir as possibilidades criativas, porque se limita geralmente a interações de um
sistema finito, sem o apoio de outros jogadores.

Tabela 5.6. Mecânicas de jogo para a criatividade aliadas à ação de jogo para a
criatividade: Sinergia 16
Jogo cooperativo
Jogo a Solo

5.3.5. Conclusões

Esta análise consolida as correlações entre as ações de jogo para a criatividade


desenvolvidas no capítulo 4, secção 4.3.4: o diálogo com o jogo e entre jogadores pode
levar a uma dialética envolvendo questões críticas e tomadas de posição que enriquecem
processos criativos. Este enriquecimento é complementado por diferentes níveis de
sinergia entre jogadores, para que possam ir mais longe no jogo e aumentar a

criatividade, para a qual também contribui a execução e o falhanço da tentativa-erro. Ou

seja, a complementaridade entre estas ações de jogo para a criatividade rompe e


atravessa o âmbito umas das outras para que possam coexistir de forma diversa em
jogos com propósitos criativos diferentes. Mais, as mecânicas de jogos para a criatividade
que lhes estão subjacentes seguem esse mesmo padrão: podem ser usadas em
complemento umas das outras em jogos para sustentar dimensões para a literacia
criativa.

262
Parte III - Desenvolvimento

263
(página em branco)

264
6. Discussão

Os estudos de caso do capítulo 4 e o trabalho laboratorial do capítulo 5 consolidam as


categorias de ação de jogo para a criatividade formuladas no capítulo 3: diálogo, dialética,
sinergia e tentativa-erro. Vemos estas áreas como categorias de ações de jogo para a
criatividade, categorias privilegiadas identificadas pelo trabalho laboratorial, que se
articulam com as dimensões para a literacia criativa, que emergem da proto-framework
detalhada na secção 2.5.

A proto-framework assenta em condições para suster comportamentos que são


fundamentais para aumentar a literacia criativa. Comportamentos são posturas que
emergem da interação entre atitudes (formas de pensar e sentir que influenciam as
nossas ações) e competências (aptidões que as permitem executar). Condições são a
ecologia de fatores que define as circunstâncias do indivíduo afetando a sua ação.
Condições dividem-se em recursos para explorar com os quais os agentes de jogo
desenvolvem aptidões para agir, e procedimentos, que são formas de fazer (Raimundo
et al. 2020).

O caráter unidirecional desta proto-framework limitava a articulação dos seus


componentes, bem como a execução de estados de jogos para propósitos diferentes.
Estimular comportamentos para aumentar a literacia criativa beneficia assim da
convergência multidirecional destas categorias, o que nos levou à estrutura cíclica
ilustrada na Figura 6.1.

Figura 6.1. Diagrama básico da framework ilustrando como o ciclo de jogo ocorre entre
comportamentos e condições, e respetivos componentes. 144

265
Diálogo e dialética são vistas aqui como categorias privilegiadas da dimensão
comportamentos, já tentativa-erro e sinergia são associadas a condições. Estas categorias
são úteis para analisar as ações que ocorrem num jogo em função destas mecânicas, e
assim distinguir as mais relevantes ou necessárias para conceber jogos para aumentar
a literacia criativa. Diálogo é o tratamento de significados que se trocam numa
conversação entre agentes de jogo,430 a análise do seu sistema de comunicação que
requer competências dos jogadores. Dialética analisa a qualidade das comunicações
opostas que resultam da interação das atitudes de agentes de jogo. Tentativa-erro é um
procedimento para conceber e refinar respostas a desafios. Sinergia é a concertação de
esforços entre recursos, materiais analógicos ou digitais, dos quais os agentes de jogo
fazem parte, que sustentam as interações num jogo para gerar ideias ou atos criativos.

Em suma, os jogos tendem a reciprocar esta multiplicidade de dimensões e categorias


numa diversidade de processos e sequências que se retroalimentam. E.g. os
comportamentos para aumentar a literacia criativa em jogos cooperativos podem ser
gerados entre personagens-jogáveis com as categorias de ações diálogo e dialética em
See, Hear, Feel no Evil (2018) e em Polyomino & Amoebas (2018). Estes comportamentos
são ainda limitados por condições ao arriscar a sorte através de procedimentos de
tentativa-erro e usando recursos de jogo em sinergia em Design e improvisação: Forma de
Letra (2021) e em Batalha Naval versus Grelha Editorial (2021). Em suma, estas categorias
consistem em mecânicas de jogos para a criatividade identificadas pelo trabalho
laboratorial, que articulamos à teoria da proto-framework, i.e. as dimensões para a
literacia criativa na Tabela 6.1.

430 Agentes de Jogo, ver capítulo 3, secção 3.2.10.

266
Tabela 6.1. Articulação entre as mecânicas de jogo para a criatividade, as ações de jogo
para a criatividade e as dimensões para a literacia criativa resultantes. 17
Dimensões para Condições Comportamentos
a literacia
criativa431 Procedimentos Recursos Competências Atitudes

• Criatividade • Espaço Comum • Auto-Adaptação • Aberta ao


Destrutiva • Poder • Pensamento Risco
• Sorte e Computacional Empático • Dialogante
Serendipidade • Conhecimento • Pensamento • Confiante
• Iteração Colectivo Paralelo e • Colaborativa
• Questionamen • Protótipos Lateral
• Inquisitiva
to Aberto • Representações • Pensamento
Metafórico e
• Atenta
• Diálogo de • Memória
Pares Analógico • Lúdica

• Sinergia • Pensamento • Resiliente


Divergente e • Intuitiva
Convergente • Subversiva

Ações de jogo Tentativa-erro Sinergia Diálogo Dialética


para a
criatividade432

Mecânicas de • Habilidades • Jogo • Movimento em • Eventos


jogo para a conseguidas uma cooperativo Grelha • Reconhecimen
criatividade433 vez por jogo • Jogo a Solo • Ordem de -to de
• Arriscar a Turnos Padrões
sorte progressiva • Simulação
• Pedra-Papel- • Turnos • Negociação
Tesoura aleatórios • Votação
• Pontos de • Início • Storytelling
vitória variável
• Role-playing
• Papel e lápis • Construção de
baralhos
• Construir
Padrões

Esta tabela lista os componentes da framework que propomos e como se relacionam: a


traço contínuo estão as dimensões da proto-framework e os respetivos aspetos, e a traço
interrompido e nas mesmas colunas situam-se as variáveis privilegiadas, as mecânicas
de jogo para a criatividade que lhes correspondem.

Todas as subcategorias da tabela têm potencial para se relacionarem entre si, e.g.
procedimentos relacionam-se com tentativa-erro, dado que arriscar a sorte é uma
mecânica recorrente em alguns jogos (um total de 14 ocorrências em 35 jogos).
Tentativa-erro pode envolver: arriscar a sorte, agir de forma calculada para revelar

431 Identificadas no capítulo 2.

432 Identificadas no capítulo 3.

433 Identificadas nos capítulos 4 e 5.

267
algo; usar sistemas aleatórios, como Pedra-Papel-Tesoura; decidir quando usar
habilidades conseguidas uma vez por jogo; validar o jogo através de pontos de
vitória; registar o resultado mais tangível ou o processo de jogo com papel e lápis.

Associamos recursos com sinergia porque são estados que relacionam os jogadores e
sistema de jogo, o que aumenta a possibilidade de gerar ideias. Sinergia envolve: o jogo
cooperativo para tirar partido de esforços conjuntos pontuais ou para uma entreajuda
mais duradoura, ou o jogo a solo para testar os limites e vantagens dos estados
anteriores, e como estes se podem manifestar mesmo não sendo implícitos no jogo.

Relacionamos competências a diálogo porque, tal como a criatividade requer um mínimo


de inteligência, e também porque a descodificação do conteúdo de um jogo e a sua
interação exigem um mínimo de aptidões de dialógicas jogador-jogo. Diálogo envolve:
a limitação da movimentação dos jogadores, como encontramos na mecânica
movimentos em grelha; tirar partido de múltiplas contribuições para criar algo em
conjunto ou refletir sobre o uso de peças de jogo numa ordem de turnos progressiva;
dinamizar o jogo com turnos aleatórios determinados por contribuições relevantes;
pontos de partida ou chegada diferentes mediante um início variável; usar a
construção de baralhos de jogo como forma primordial da interação; construir
padrões de jogo para o reinventar.

Finalmente, conectamos atitudes com dialética porque a primeira pode determinar


posturas dos jogadores no jogo para reciprocar argumentos entre jogadores e jogo, e
entre jogadores. A dialética envolve: lidar com a serendipidade e aleatoriedade de
eventos que introduzem novos estados no jogo; fazer o reconhecimento de padrões
construídos por jogadores ou sistema de jogo para os consolidar ou transformar;
verificar o que pode ocorrer na simulação de um jogo para poder criticar o que está
bem ou mal, e alimentar o diálogo com novos argumentos; proceder à negociação entre
argumentos de jogo e jogadores e à votação sobre a relevância destas posições; gerar
storytelling, conceber narrativas em processos coletivos influenciados por diversos
jogadores; e fazer role-playing, encarnar um personagem para ver o mundo de forma
diferente.434

Estas mecânicas podem ser aplicadas mediante o resultado pretendido com o jogo,
conforme se aproximarem mais ou menos de determinadas categorias, e.g. no jogo
Batalha Naval versus Grelha Editorial (2021), a categoria diálogo envolve o construir

434 Um glossário destas mecânicas pode ser encontrado no capítulo 5, tabela 5.1, secção 5.3.

268
padrões na interação e conceção do resultado final.

Com isto em mente, iremos demonstrar as articulações entre mecânicas de jogos para
a criatividade com dimensões para a literacia criativa, através de cinco jogos que
vimos como exemplificativos e diversos para o efeito: Polyomino & Amoebas (2018), por
ter 9 mecânicas, mas manter a sua simplicidade apontada ao aumento da flexibilidade
do pensamento criativo; Baba is You (2019), por ser incomum de operar e abrir-se à sua
própria transformação com apenas 3 mecânicas; Ideachef (2018), por agir como sistema
de ideação e avaliação de ideias dirigidos a um contexto específico; U Know Me!!! (2019),
por conjugar imagética pessoal, cultural e abstração; e Damas versus Conceção de
Videojogos (2021), por reapropriar um sistema de tradicional de jogo para desenvolver
outros designs de jogos, e porque a sua conceção foi realizada em cocriação.

6.1. Diálogo enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade.


Diálogo é uma conversa entre agentes de jogo (Crawford 2003) cujos estágios são formas
de conversação dirigidas a objetivos específicos da literacia criativa. Diálogo ocorre entre
as ações usadas pelo jogador para entender e lidar com o jogo, e o processo criativo do
designer para gerar jogos para os jogadores, ou algo criado por estes no decurso do
jogo. As mecânicas que apresentamos na Tabela 6.1 podem sustentar estas ações e
processos criativos. O critério para o âmbito de mecânicas depende do seu uso em cada
jogo. A Tabela 6.2 ilustra a influência destas em jogos, e os contextos do aumento da
literacia criativa a que se dirigem.

Tabela 6.2. Diálogo enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade aliada às
mecânicas de jogo para a criatividade e respetivas dimensões para a literacia criativa
que trabalham. 18
DIMENSÕES Encontrar Transformar Encontrar Representar Associar e
PARA A hipóteses no um âmbito de informação que algo com estruturar
LITERACIA jogo para ações para acrescente formas simples aspetos para
CRIATIVA articular resolver relevância a um e abstratas conceber um
esforços entre problemas projeto design
jogadores

Damas versus
Polyomino & Baba is You U Know Me!!! Conceção de
Diálogo Ideachef (2018)
Amoebas (2018) (2019) (2019) Videojogos
(2021)

Movimento em
X X
Grelha

Ordem de
turnos X X
progressiva

Turnos
X X
aleatórios

269
Início
X X X X
variável

Construção
de baralhos

Construir
X X X X X
Padrões

Em Polyomino & Amoebas (2018) os jogadores interagem numa ordem de turnos


progressiva ou turnos aleatórios consoante o movimento em grelha das suas peças.
O jogo tem um início variável dependendo da disposição das peças do jogador na
grelha. A operação conjunta requer construir padrões, peças de jogo que combinam
as dos jogadores individuais. Aqui o aumento da literacia criativa reside na reflexão
sobre hipóteses que estendam o âmbito das ações pré-estabelecidas do jogo, em
interpretar e adaptar regras para usufruto de jogadores, pois não foi concebido para ser
jogado apenas de uma maneira (Cruickshank et al. 2017).

Baba is You (2019) foca-se em construir padrões, combinações entre recursos de jogo
para progredir neste. Ou seja, trata-se de conceber novas maneiras de manipular o jogo
criando novas regras em tempo real. Aqui o aumento da literacia criativa assenta na
multiplicação de combinações de ações para ampliar o seu reportório num dado con-
texto. Isto requer conhecimento profundo do que já existe e capacidade de fazer as-
sociações não usuais mas válidas (Boden 2010), para resolver desafios progressivamen-
te mais complexos, pois só se tem a ganhar em questionar experimentando com todas
as hipóteses (Hunter 2012).

Em Ideachef (2018) a interação entre jogadores e sistema de jogo tem um início


variável consoante o objetivo definido, de resto desenrola-se por numa ordem de
turnos progressivos em que os jogadores contribuem com ideias ou aumentam as dos
outros numa sequência de ideação, para construir padrões sofisticados, ideias de
serviços inovadores. O aumento da literacia assenta no conhecimento profundo do
espaço concetual trabalhado, aqui empreendedorismo, e ser capaz de alterar
radicalmente os pilares deste espaço. Isto porque não se consegue ver o que ainda não
foi visto e executar algo inovador sem agitar estes pilares (Boden 2010).

Já a interação entre jogadores e sistema de jogo em U Know Me!!! (2019) tem um início
variável conforme a aparência do personagem designado pelo jogador, que procura
construir padrões com peças de jogo para imitar este personagem. A contribuição
para a literacia criativa é o exercício de representar algo complexo com formas
abstratas, que seja reconhecível por uma audiência específica. Ou seja, a construção,

270
desconstrução e reconstrução de significados no enquadramento social e operacional
do indivíduo através de multiliteracias (Kiosses 2019).

Em Damas versus Conceção de Videojogos (2021) os jogadores manipulam por movimento


em grelha peças em turnos aleatórios do jogo das damas, para ganhar pontos de
vitória para construir padrões sofisticados, os aspetos a integrar num conceito de
um novo jogo.

Em termos de literacia, assume-se como um exercício para gerar associações entre


assuntos que alimentem um design complexo, conceber elementos e a sua operação em
conjunto num sistema para produzir uma experiência de jogo (Fullerton et al. 2008).435

Em suma, o diálogo é mediado por jogos, ocorrendo entre o jogador que explora ações
para entender e lidar com desafios do jogo, e o designer, que recolhe informação deste
para conceber uma experiência de acordo com as suas expectativas. Assim, o diálogo
amplia o repertório criativo do jogador para discutir com o jogo os argumentos que
sustentam os seus assuntos de uma forma crítica. Conceber jogos assenta na análise
desta discussão pelo designer, que lhe permite aumentar o seu campo criativo e gerar
ou refinar jogos com melhores argumentos para serem debatidos pelo jogador numa
dialética de jogo.

6.2. Dialética enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade.


A Dialética emerge do diálogo entre a retórica, os argumentos que os jogos usam para
convencer jogadores sobre o valor dos seus assuntos, e a crítica, uma forma atuante
dos jogadores questionarem ou concordarem tal perspetiva apoiada na razão. Tal como
com o diálogo, a dialética pode sustentar-se em diversas mecânicas consoante o jogo,
pelo que consideramos a influência destas em alguns exemplos na Tabela 6.3.

435 Um exercício similar e holístico é, como lhe chama Kees van der Heijden, a análise de cenários de negócios, o campo de jogo
interno e externo à empresa onde aspetos, intervenientes e implicações são envolvidos em conversas estratégicas. Estes diálogos
auxiliam a reformular imagens de empresas, gerar protótipos e estabelecer novos cenários de negócios (Heijden 2005).

271
Tabela 6.3. Dialética enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade aliada às
mecânicas de jogo para a criatividade e respetivas dimensões para a literacia criativa
que trabalham.19
DIMENSÕES Gerar modelos Ampliar o Considerar Alternar entre Associar e
PARA A mentais de potencial de aspetos pensamento estruturar
LITERACIA ações e avaliar ações despercebidos divergente e aspetos para
CRIATIVA o seu potencial limitadas para estruturar e convergente conceber um
no jogo executando-as argumentar para obter uma design
em conjunto ideias síntese inesperado

Damas versus
Polyomino & Baba is You U Know Me!!! Conceção de
Diálética Ideachef (2018)
Amoebas (2018) (2019) (2019) Videojogos
(2021)

Eventos X

Reconheci-
mento de X X X X
Padrões

Negociação X X X X

A Dialética em Polyomino & Amoebas (2018) assenta no reconhecimento de padrões de


movimento e combinação de peças-jogáveis no modelo mental de jogo de cada jogador
para questionar possíveis jogadas e negociar esforços conjuntos com o oponente. Em
termos criativos, trata-se de gerar modelos mentais de ações executadas no mundo do
jogo para pensar sobre o melhor uso a dar-lhe, reduzir a sua complexidade para
permitir ao cérebro armazenar apreciar, e transformar o que é atual, por oposição ao
que é virtual (Schell 2008), e simular ações para distinguir as eficazes na caixa branca
que este jogo constitui (Carvalhais e Cardoso 2010).436

Baba is You (2019) argumenta na sua Dialética de jogo que as suas regras de operação
podem ser alvo de reconhecimento de padrões pelos jogadores para que simulem
mentalmente hipóteses de os combinar noutros para negociar com o jogo outras
alternativas para progredir. A literacia criativa aqui assenta no entendimento de como
ampliar as ações limitadas de jogo combinando-as criativamente entre si (Boden 2010).

Em Ideachef (2018) a Dialética de jogo reside na troca de hipótese para conceber serviços,
cujas ideias são foco de negociação entre jogadores. O aumento da literacia criativa
aqui assenta no conhecimento profundo do espaço conceitual trabalhado, aqui

436 Caixa branca é um sistema cuja operação é visível e fácil de apreender. A definição original aponta para a perceção de obras de
arte computacionais (nas quais os videojogos se inserem) são descodificados por leitores (jogadores). Optamos por esta terminologia
porque embora não sejam sinônimos, a sua proximidade com o nosso estudo pode facilitar o entendimento. Mais, uma caixa branca
pode tornar-se uma caixa negra se a quantidade de interações que nela ocorrerem tornarem a sua cognição no seu todo impossível
para o jogador (Carvalhais e Cardoso 2010).

272
empreendedorismo, e ser capaz de alterar radicalmente os pilares deste espaço. Isto
porque não se consegue ver o que ainda não foi visto e executar algo inovador sem
agitar estes pilares (Boden 2010). Com isto em mente, o jogo permite tirar partido da
sabedoria coletiva, pois a inovação emerge da conexão com os outros (Johnson 2011).
Deste confronto de ideias pode emergir serendipidade, quando algo que não é procurado
intencionalmente passa despercebido, mas que no fundo pode servir para conectar
ideias inusuais e relevantes (Melo 2018).

A Dialética em U Know Me!!! (2019) estimula a representação de um personagem de


cosplay com peças de jogo disponíveis, i.e. com caráter abstrato e em baixa resolução
que permita o reconhecimento de padrões do personagem. O aumento da literacia
criativa traduz-se da Estrutura do Intelecto (Guilford 1956) para jogos, alternando entre
pensamento convergente, o descobrir da peça certa no momento certo, e pensamento
divergente, o expandir do horizonte criativo do jogador com a diversidade de
informação que se deduz das peças para fazer uma descoberta serendipitosa (Melo
2018), uma forma de representar sintetizada.

Já com Damas Versus Conceção de Videojogos (2021) a dialética assenta no uso de peças
ganhas às damas para despoletar a negociação de aspetos a integrar num conceito de
jogo e fazer o reconhecimento de padrões destes aspetos para que o jogo seja visto
como funcional. Em termos de atos criativos a fase de conceção do jogo comunga da
natureza caótica, confusa, exigente e questionável do processo criativo, pois trata-se
de intuir e imaginar aos poucos um design que só se materializa no futuro (Lesky 2015).

Em suma, os argumentos dos jogos estimulam uma dialética com o jogador, o que evoca
o caráter retórico e crítico dos jogos: o primeiro procura convencer alguém sobre o valor
de um ponto de vista, o segundo em questionar perspetivas. Questionar estes
argumentos estimula o pensamento criativo do jogador para desenvolver formas de
atuar num jogo. Como o jogador debate os argumentos de jogo lançados por designers,
realizar ou falhar perante esta argumentação são dois estados de jogo. Saber como os
jogadores gerem estes estados aumenta o repertório de argumentos criativos do
designer para conceber novos jogos.

6.3. Tentativa-erro enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade.


Tentativa-erro437 é crucial para negociar e sustentar diálogo e dialética e ocorre entre ações
que permitam suplantar a oposição do jogo e processos através dos quais o jogador

437 Iteração aponta para o repetir de um processo de jogo, o que pode não se traduzir em progresso no jogo, ou troca de argumentos
diferentes e por agentes diferentes numa dialética ou diálogo de jogo. Com isto em mente optámos por tentativa-erro dado que
aponta para a reciprocação de argumentos diferentes com vista a desbravar descobertas, novas soluções, ou a reinvenção do
processo de jogo.

273
progride falhando para adquirir competências pessoais (Juul 2013). Falhar é o processo
natural através do qual se aprende a lidar com diversas situações, um trampolim
metafórico para suplantar bloqueios nos estágios de processos criativos, como a
exploração, especulação, introspeção e avaliação. Arriscar é a condição para conceber
algo, pois falhar sem tentar de novo põe fim a um processo criativo e à respetiva
realização. Assim, ilustramos na Tabela 6.4 a influência desta categoria em alguns
exemplos de jogos.

Tabela 6.4. Tentativa-erro enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade aliada às
mecânicas de jogo para a criatividade e respetivas dimensões para a literacia criativa
que trabalham.20
DIMENSÕES Usar o arriscar Adquirir Considerar Imprimir Gerar
PARA A para perceber conhecimento aspetos que imagéticas a associações
LITERACIA formas de empírico para passam peças abstratas surpreendentes
CRIATIVA progressão e fazer o melhor despercebidos para entre assuntos
como em para estruturar e representar um ou aspetos de
estabelecer circunstâncias argumentar todo de jogo
alianças e com ações ideias maneira original
restritas

Damas versus
Polyomino & Baba is You U Know Me!!! Conceção de
Tentativa-erro Ideachef (2018)
Amoebas (2018) (2019) (2019) Videojogos
(2021)

Arriscar a
X X X X
sorte

Pontos de
X X
vitória

Papel e
X
lápis

Em Polyomino & Amoebas (2018) os jogadores arriscam a sorte para movimentar e


rodar as suas peças numa tentativa-erro de ganhar pontos de vitória para continuar a
jogar. Em termos de literacia criativa, o jogo permite liberdade para arriscar ações para
perceber como progredir, através de movimento ou estabelecendo alianças. Arriscar
justifica-se porque é a ameaça de falhar no jogo que nos move para ganhar
competências (Juul 2013) e isto só pode ser alcançado afastando-nos do que é familiar
e olhando para as incertezas (Bean 2018).

Devido ao seu caráter exploratório, Baba is You (2019) tem uma vertente forte para
arriscar a sorte em diversas combinações de regras que alteram a operação do jogo

para progredir, ou seja, abre-se à tentativa-erro. Em termos de aumento da literacia

criativa o jogo é perpassado por prioridades que instigam formas de improvisar para
lidar com necessidades particulares através de ações restritas (Chatterjee 2017).

274
Em Ideachef (2018) os jogadores arriscam a sorte em avançar com ideias para serviços

de negócios por tentativa-erro, para que possam ser considerados realizáveis por um

cliente. A inovação, ações e atitudes criativas resultantes do jogo não são inteiramente
previsíveis, o que demonstra que a serendipidade tem influência em trazer à tona o que
passa despercebido e pode servir sustentar a criatividade e portanto estruturar e
argumentar ideias (Runco 2014).

A descoberta geralmente envolve algum tipo de busca ativa. Mas e quanto às coisas que são
encontradas quando o explorador não está a procurar ativamente? Estas coisas são melhor
rotuladas como serendipitosas (Runco 2014, 410).438

O arriscar a sorte em U Know Me!!! (2019), ou seja, aqui a prática da tentativa-erro, é

mitigada porque trata-se de uma exploração das peças de jogo para conceber um traje
credível e económico de uma personagem-alvo para cosplay. A literacia criativa
trabalhada aqui trata de se experienciar uma imagética fictícia ligada aos arquétipos de
que os personagens são frequentemente imbuídos para melhor os representar (Jung
2002).439

Já com Damas versus Conceção de Videojogos (2021), a tentativa-erro traduz-se em pontos


de vitória (damas), pois quem ganha tem de conceber associações entre aspetos
designados pelo oponente para realizar o registro de um conceito de jogo com papel e
lápis. Em termos de literacia criativa isto apela de novo ao conceito de criatividade
transformadora (Boden 2004), pois só questionando e abalando os pilares convencionais
sobre os quais assentam aspetos de jogo se consegue conceber um realmente inovador

Em suma, a dialética entre jogador-designer pressupõe realizar argumentos de jogo, o


que requer tentativa-erro. Ações de tentativa-erro são intrínsecas a processos criativos
e a jogos, pois os desafios suplantam-se com esforço, sensibilidade e risco. Para
conceber estes desafios, o designer precisa de analisar as formas subjetivas que os
jogadores usaram para navegar o jogo, os seus interesses, estilos de atuação ou
preferências estéticas. Para entender as interações dos jogadores é necessária a
colaboração destes em reportar as suas experiências de jogo ao Designer.

438 T.A.: “Discovery usually involves an active search of some sort. What of things that are found when the discoverer is not actively
searching? These are best labeled serendipitous” (Runco 2014, 410).

439 Por imagética subentende-se todas as formas simbólicas culturais criadas por necessidade de iluminar obstáculos. Ainda, a vivência
intensa de imagéticas pode não ser um perigo fictício, mas bem real ao sucumbir-se ao fascínio de arquétipos, com os indivíduos a
infligir-se danos a si próprios sob esta influência (Jung 2002).

275
6.4. Sinergia enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade.
Sinergia é o alinhar das forças de agentes de jogo num jogo cooperativo quando é
necessário criar algo além do alcance de um jogador num jogo a solo, motivado por
interesses, objetivos ou valores individuais.440 A Tabela 6.5 descreve a influência destas
intersecções com exemplos de trabalho laboratorial, e os contextos da literacia criativa
que trabalham.
Tabela 6.5. Sinergia enquanto categoria de ações de jogo para a criatividade aliada às
mecânicas de jogo para a criatividade e respetivas dimensões para a literacia criativa
que trabalham. 21
DIMENSÕES Entender em Aprender a Saber tirar Aprender a Ser arrojado a
PARA A que colaborar com partido de trabalhar associar, mas
LITERACIA circunstâncias o sistema de momentos de dentro de garantir que
CRIATIVA refletir e agir jogo através da auxílio limitados restrições para isso não limita
sozinho ou competição e esporádicos obter uma dada demais o que
quando representação se quer
estabelecer conceber
parcerias

Damas versus
Polyomino & Baba is You U Know Me!!! Conceção de
Sinergia Ideachef (2018)
Amoebas (2018) (2019) (2019) Videojogos
(2021)

Jogo
X X X X
cooperativo

Jogo a Solo X X X X

Em Polyomino & Amoebas (2018) os jogadores podem alternar em qualquer momento


por um jogo cooperativo ou um jogo a solo, dado que ao cooperar tiram vantagens
da ação conjunta ao unir as suas peças jogáveis. Em termos de literacia criativa isto
apela à noção de dar e receber, ao dar ou assumir a execução de atos em favor do outro
estamos não só a auxiliar este, mas também a adquirir conhecimentos que pavimentam
o ser bem sucedido mais tarde (Grant 2014).

Baba is You (2019) é um jogo a solo, pois só há um jogador humano que procura revelar
como combinações de componentes de jogo alteram as regras da sua operação. Aqui, a
literacia criativa assenta na ideia de que o propósito da competição não é vencer, mas
sim desenvolver as capacidades do jogador, o que acoplado ao design e jogo adequado
transforma competição em cooperação, o aproximar o jogador do jogo para que
concebam em conjunto regras para progredir (Nguyen 2016).

A maior parte do tempo, Ideachef (2018) é jogado a solo por turnos em clara competição

440 Atuar só ou colaborar são atitudes que se opõem, resistem ou compatibilizam, produzindo o atrito social necessário para se
distinguir algo novo. Este Atrito pode emergir apenas do conflito de interesses individuais, entre pré-conceções, ideais a atingir
ancorados em circunstâncias culturais externas, e o que realmente interessa a título pessoal. Conseguir focar esta motivação
pessoal requer uma introspeção sobre a nossa intuição e emoções, algo crucial para persistir em processos criativos.

276
pela melhor solução de serviço, no entanto, há momentos que roçam o jogo
cooperativo, em que é pedido a outros jogadores para auxiliarem a ultrapassar
desafios de jogo. Aqui a literacia criativa assenta em saber tirar partido de momentos
de auxílio limitado e esporádico de outros jogadores designados neste jogo como
mentores.

U Know Me!!! (2019) é puramente um jogo a solo sobre a exploração individual do


jogador para obter uma dada representação de personagem. Em termos de literacia
criativa, trabalhar dentro das suas restrições força-nos a mudar os nossos limites
usando o próprio medium para nos transcendermos (Nachmanovitch 1990).

Damas versus Conceção de Videojogos (2021) processa-se em duas fases, a primeira é jogo
a solo com os jogadores a competirem entre si para ganharem peças ao jogo tradicional
das damas, e assim obrigar o oponente a gerar uma associação entre aspetos de jogo e
dimensões de um quadro de conceito de jogo. Na fase seguinte torna-se um jogo
cooperativo entre jogadores que se auxiliam mutuamente para consolidarem as
associações geradas na primeira fase num novo conceito de jogo. Em termos de literacia
criativa, Damas versus Conceção de Videojogos (2021) pretende ser um jogo com uma
abordagem similar às práticas desenvolvidas em Gamestorming, em que se cria em
pequenos passos na direção de um conceito por definir sem recear descartar o que já
não é necessário (Gray et al. 2010).

Em suma, a diferença de perspetivas entre agentes de jogo pode gerar comportamentos


antagónicos e assinergia, mas pode também levar ao alinhamento de interesses e de
forças dos jogadores para progredir no jogo, ou sinergia. Isto porque as diferenças entre

ambas podem incitar diálogo entre jogadores e designers para descobrir lacunas ou

intersecções enquanto nichos de ação para jogar ou para conceber, e assim melhorar a
criatividade de ambos.

6.5. Conclusões
Olhando de novo para os exemplos de jogos na Figura 6.2. podemos encontrar alguns
padrões de influência e operação ligados às categorias de ações de jogo para a
criatividade, ou seja, as tabelas não representam o sucesso de cada jogo, mas permite-
nos saber em que categorias este investe mais.

277
Figura 6.2. Gráfico com o nível de investimento em categorias de mecânicas para cinco jogos
analisados. 145

Embora as categorias estejam presentes na totalidade em todos os jogos desta amostra,


Polyomino & Amoebas (2018) tem uma forte componente de diálogo visto aqui como a
agência do jogador segundo a definição de Janet Murray (2003), 441 dado que as ações
tomadas pelos jogadores afetam o jogo individual de cada um, ou o jogo que possam
traçar em conjunto, sendo que os seus resultados são imediatamente visíveis. Quanto
às restantes categorias do jogo apresentam-se algo niveladas, no questionar a dialética
de jogo, e na tentativa-erro para o alavancar de ações, e na sinergia para cooperar na
conceção de melhores argumentos para permanecer no jogo. Ideachef (2018) e Damas
versus Conceção de Videojogos (2021), têm níveis de diálogo inferiores ao jogo anterior,
nomeadamente na tentativa-erro em Ideachef (2018), dado que este assenta menos em
debater e questionar os argumentos do jogo e mais em elaborar uma ideia sustentável
em resposta ao seu jogo. Baba is You (2019) e U Know Me!!! (2019) possuem níveis baixo
similares no emprego das categorias, acrescenta-se uma redução na dialética, no
questionamento crítico, pois o seu resultado é um argumento-base que não é avaliado
por terceiros.

Em suma, não basta que os jogos sejam dirigidos para conceber algo em específico, pois
é necessário saber que mecânicas empregar e como devem ser integradas em jogos para
atingirem esse fim. Ainda, a agência para experimentar com ações possíveis é central
para ocorrerem atos criativos, contudo, é também fulcral saber usar mecânicas para
evitar a geração de resultados que possam ser pouco relevantes no âmbito do jogo. Não
é necessário um grande número de mecânicas para se poder aumentar a literacia
criativa. Isto tornou-se claro no decurso do nosso processo de prototipagem, em que
os jogos com menos mecânicas eram mais fáceis de operar e portanto de gerar
resultados. Esta simplicidade é visível no trabalho de Reiner Knizia, um designer
prolífico de jogos cujo conhecimento matemático confere uma estética abstrata aos
mesmos, e que mesmo sendo dotados de regras simples estimulam a ponderação dos

441 Ver definição no capítulo 3, secção 3.3.4.

278
jogadores sobre os seus temas (Jacklin 2011).442 por fim, o aumento da criatividade
parece florescer quando num mesmo jogo há momentos para conceber a solo, em
conjunto, e para confrontar e avaliar o que foi executado ou gerado.

442 Exemplos destes jogos concebidos por Knizia são: Modern Art (2009), a simulação de leilões de arte em que cada jogador traz um
pouco da sua personalidade fazendo deste jogo uma atividade social; Lord of The Rings (2000) que recria a missão de Frodo e os
seus companheiros contra Sauron, além de replicar o tema e ambiência, demonstra que a luta e o sacrifício individual é crucial
para o bem da missão; e Keltis (2018) um jogo de tabuleiro para vários jogadores em que estes jogam combinações de cartas para
avançar a ficha do jogador ao longo de um caminho.

279
(Página em Branco)

280
7. A Infraestrutura

Este capítulo não procura analisar jogos ou operacionalizar a framework proposta numa
tentativa de provar que é um modelo universal infalível para aumentar a literacia
criativa. Isso seria falacioso pois é dificílimo provar nesta fase a sua infalibilidade ou
aplicabilidade transversal a múltiplos cenários. O que se tenta explicar aqui é, tal como
aquilo que acontece um pouco com o pensamento divergente, que existem múltiplas
formas de incorporar mecânicas de jogo para que estas estimulem ações criativas. Ou
seja, não há uma solução única para um mesmo resultado pretendido, apenas uma
tendência para mecânicas combinadas de certa forma produzirem certos efeitos.

Esta é a razão pela qual demonstramos a estruturação da framework com um caso de


estudo, e a sua aplicação em áreas criativas diferentes com três exemplos desenvolvidos
por nós. Estes jogos têm algumas mecânicas comuns, mas o seu fluxo de operação
inicia-se, materializa-se e resulta em formas diferentes. Portanto, para os jogos que se
pretendem analisar ou conceber com auxílio desta framework são tão importantes as
mecânicas de jogo para a criatividade aliadas a ações de jogo para a criatividade,
quanto o fluxo do jogo que nelas assenta para estimular dimensões para a literacia
criativa. Ou seja, é da reciprocidade entre as mecânicas e as dimensões por via do fluxo
de jogo que podem emergir ações criativas que aumentem a literacia criativa. Este
capítulo assim está focado em demonstrar o âmbito de aplicabilidade geral da
framework e os respetivos resultados expectáveis. Ou seja, a operação e análise básica
facultada por este modelo com base em mecânicas que podem ser acionadas para
estimular comportamentos criativos, e portanto aumentar a literacia criativa.

As categorias das mecânicas apresentadas nos capítulos 5 e 6 podem auxiliar a


conceber ou a analisar jogos para aumentar literacia criativa em contextos criativos
concretos, como nas práticas do Design. Isto emerge logo na revisão no capítulo 3 e na
análise no capítulo 4, que indicam que os jogos podem empregar mais do que uma
categoria de ações de jogo para a criatividade. Ou seja, os jogos podem usar estas
categorias para aumentar a literacia criativa nas suas múltiplas vertentes. E.g.
Polyomino & Amoebas (2018) promove sinergia entre 2 jogadores com recurso à dialética
num ambiente competitivo, pois para que estes consigam permanecer em jogo
individualmente, por vezes é preciso articular-se e aliar-se ao seu oponente. Assim, a
conceção de jogos pode beneficiar do emprego de várias categorias, até porque elas
relacionam-se naturalmente entre si, como iremos ver na secção seguinte.

281
7.1. Relações entre ações de jogo para a criatividade
Diálogo e dialética complementam-se porque a contra-argumentação precisa de um
veículo, ou seja, a conversa entre jogadores ou entre estes e sistema de jogo. 443 Já
tentativa-erro pode auxiliar a resolver antagonismos em dialética pois é na intersecção de
visões que se podem vislumbrar novas ações criativas para jogar ou nichos criativos a
trabalhar. Este debate pode ainda incitar jogadores à sinergia interesses e forças
individuais para vencer o jogo, e até aproximar jogadores e designers para clarificar e
acomodar interesses em novos jogos, melhorando assim a literacia criativa de ambos.
Estas categorias operam ciclicamente conforme ilustrado no diagrama da Figura 7.1.

Figura 7.1. Diagrama com a relação cíclica das ações de jogo para a criatividade. 146

Neste diagrama: 1) o jogo enceta um diálogo com o jogador, uma conversa que pode ir
além dos assuntos do próprio jogo; 2) um jogo comunica uma posição sobre assuntos,
uma retórica ou crítica, o que tende a levar à troca de argumentos numa dialética, na
interação do jogador com o jogo; 3) esta interação, no ponto anterior, é dinamizada
entre agentes de jogo por tentativa-erro o que origina estados entre arriscar e realizar;
4) e é no atrito gerado pelos interesses de jogadores e jogo que se podem encontrar
possibilidades de sinergia criativa entre jogadores, designers e jogo. Este ciclo pode não
seguir esta ordem podendo alternar entre dimensões consoante o objetivo da literacia
criativa do jogo, como e.g. usar este para conceber novos jogos.

443 A sua relação é de complementaridade pois o diálogo envolve argumentos sobre perspetivas díspares que são debatidas entre
interlocutores. É nesta troca e até no atrito que ocorre entre visões diferentes que podem surgir ideias que levem à vontade de
colaborar para descobrir ou edificar algo inédito.

282
7.2. Estrutura
Tendo em vista a relação geral entre ações de jogo para a criatividade apresentado na
secção 7.2, de seguida procuramos estruturar como se relacionam com as mecânicas
de jogo para a criatividade, com as dimensões para a literacia criativa, e como todas
convergem em contributos para a literacia criativa. Para obter esta estrutura
escolhemos analisar o jogo Baba is You (2013) porque assenta no princípio da alteração
das próprias regras, ou seja, influencia todas as dimensões anteriores. Baba is You (2019)
é um jogo de puzzle em que o jogador manipular as suas regras em tempo real,
permitindo e.g. trocar o controle personagem jogável para elementos de jogo com
outras caraterísticas para resolver os seus desafios.444

Em Baba is You (2013) a sinergia pauta-se pelo jogo a solo jogado em diálogo com o
próprio sistema de jogo.445 A sinergia assenta em condições de espaço comum entre
agentes e componentes de jogo e o poder computacional que o sustenta. O jogador
relaciona significados aos componentes a partir das representações e memória
(imagética) que adquiriu para combinar componentes de jogo. Assim, o aumento da
literacia criativa estimulada pela sinergia advém da ampliação dos significados e
funcionalidades que artefactos podem adquirir num jogo (Figura 7.2).

Figura 7.2. Baba is You (2019), ecrã de playthrough446 em que o jogador usa Sinergia, num jogo a solo
para estabelecer um diálogo inicial com o seu sistema. 147

444 Baba is You (2019) é analisado e descrito em profundidade na secção 4.2.17.

445 A sinergia num jogo está subjacente à interdependência e à competição, pois os seus elementos, agentes de jogo, etc., dependem
uns dos outros para equilibrar o ecossistema de jogo. Isto é similar ao que acontece com sistemas naturais, em que “As máquinas
de sobrevivência de espécies diferentes influenciam-se mutuamente de várias maneiras. Poderão ser predadores ou presas,
parasitas ou hospedeiros, ou competidores por algum recurso escasso. Poderão ser explorados de formas especiais como, por
exemplo, quando as abelhas são usadas pelas flores como transportadoras de pólen” (Dawkins 2018, 114). Máquina de sobrevivência
é o termo usado por Richard Dawkins para referir a forma como os organismos são constituídos por genes com o intuito de sobreviver
(2018, 55).

446 T.A.: Ecrãs de execução do jogo. Ecrãs consultados a 18 de janeiro de 2022 em: https://youtu.be/SYJKmAaSv4w

283
O diálogo assenta na construção de padrões, conceber combinações de peças e agentes
de jogo e transformar as regras do próprio jogo. O diálogo do jogo apela a competências
de auto-adaptação, usar os recursos limitados do jogo para alterar as suas regras. Desta
forma, o jogador tem de estabelecer empatia com o jogo para entender o que pode
funcionar. Para tal recorre a pensamento paralelo e lateral para considerar novas
combinações, pensamento metafórico e analógico para relacionar a simbologia das
peças do jogo com ações possíveis, e pensamento divergente e convergente para abrir
novas hipóteses e focá-las no que seja mais eficaz. Assim, o aumento da literacia
criativa estimulada pelo diálogo advém do articular de soluções usando metáforas e
analogias, alternado entre o abrir e o foco do pensamento (Figura 7.3).

Figura 7.3. Baba is You (2019), ecrã de playthrough em que o jogador usa o diálogo, para construir
padrões para resolver desafios de jogo. 148

A tentativa-erro assenta no arriscar a sorte em usar estes padrões para progredir no jogo
através da dialética. A tentativa-erro envolve condições de criatividade destrutiva para
descartar pré-conceções sobre o que o jogo faz para se poder criar regras novas. Existe
também uma componente de serendipidade que emerge da anterior que permite ao
jogador ver soluções que não viu num primeiro momento. E finalmente questionamento
aberto para o jogador se permitir ver componentes de jogo de outras perspetivas.
Assim, o aumento da literacia criativa estimulada pela tentativa-erro advém do
questionamento e o deixar-se levar por ocorrências serendipitivas para revelar o que
passou despercebido (Figura 7.4).

284
Figura 7.4. Baba is You (2019), ecrã de playthrough em que o jogador usa tentativa-erro, para arriscar a
sorte com um padrão construído a partir do diálogo anterior. 149

Na dialética a agência no jogo é simulada mentalmente pelo jogador para reconhecer


padrões de ação enquanto formas de argumentar com o jogo para progredir ou falhar.
A dialética permite ainda ao sistema de jogo considerar se os padrões propostos
permitem a progressão no jogo, com o retorno à tentativa-erro, ao arriscar a sorte, ou
ao falhanço, o que retorna ao diálogo, à construção de padrões, novas hipóteses de
regras. Por fim, a dialética apoia-se em atitudes inquisitivas e abertas ao risco, para
negociar formas de usar componentes de maneiras inesperadas, e uma atitude intuitiva
que subverta ou substitua o âmbito de operação de tais componentes. Todas estas
atitudes beneficiam de uma postura lúdica em relação ao jogo, pois é a melhor forma
de lidar com o desconhecido do jogo. Assim, o aumento da literacia criativa estimulada
pela dialética advém da possibilidade de subverter o significado de artefactos para
ampliar a sua operação (Figura 7.5).

Figura 7.5. Baba is You (2019), ecrã de playthrough em que o jogador usa a dialética para arriscar a
sorte com um padrão construído a partir da tentativa-erro anterior. 150

O ciclo do jogo repete-se até se dar a condição de vitória (Figura 7.6).

285
Figura 7.6. Baba is You (2019), ecrã de playthrough em que ocorre a vitória do jogador. 151

Tendo em mente a análise anterior, e conforme as evidências recolhidas no capítulo 6,


os jogos podem operar com vários fluxos de ações de jogo para a criatividade, pelo que
articulá-las num mesmo diagrama permite ter uma visão geral das dimensões da
literacia criativa a que podem responder.

Assim, optou-se por estruturar as mecânicas de jogo para a criatividade num


diagrama de arco (Tufte 1990), que representa o fluxo de utilização destas no curso de
um jogo. Os arcos refletem ligações com um determinado sentido, podendo divergir ou
convergir nas mecânicas de jogo para a criatividade, nas ações de jogo para a
criatividade e nas dimensões para a literacia criativa, relacionando-as para apontar para
certos contributos para a literacia criativa, como se poderá observar na Figura 7.7.

Figura 7.7. Diagrama de fluxo com as mecânicas de jogo para a criatividade presentes nas ações de
jogo para a criatividade, as dimensões para a literacia criativa que trabalham, e os respetivos

286
contributos para o aumento da literacia criativa em Baba is You (2019). 152

Em suma, o diagrama na Figura 7.7 assume-se como uma framework para auxiliar a
visualizar as dimensões relevantes para a criatividade para conceber e analisar jogos
para aumentar literacia criativa. De seguida, na secção seguinte, aplicam-se estas
visualizações a exemplos de trabalho laboratorial para demonstrar como auxiliaram a
revelar lacunas ou refinar videojogos para a investigação.

7.3. Ferramenta de Análise


Nesta secção confrontamos os dados recolhidos a partir dos jogos prototipados no
capítulo 5, com as variáveis centrais da nossa framework: mecânicas de jogo para a
criatividade, ações de jogo para a criatividade, e dimensões para a literacia criativa.
Este confronto permite-nos identificar mecânicas nestes jogos, regras que lhe estão
subjacentes, e subsequentemente, as ações suscitadas por estas mecânicas em 4
vetores de fluxo de jogo: diálogo, dialética, tentativa-erro e sinergia. Por fim, estes vetores
apontam as dimensões para a literacia criativa com as quais é possível traçar
contributos para aumentar a literacia criativa. Esta framework é útil para analisar
qualquer jogo existente segundo estes componentes, ou, usado de forma inversa, como
ferramenta para discriminar o que é necessário para conceber um jogo. Assim, a seguir
demonstramos como a framework pode ser usada na prática, analisando 2 dos nossos
protótipos.

7.3.1. Batalha Naval Versus Grelha Editorial

Para exemplificar a operacionalização da análise escolhemos Batalha Naval Versus Grelha


Editorial (2021) pois foi um dos protótipos concebidos em cocriação, um processo que
per si, usa os valores de uma das variáveis centrais à framework, as ações de jogo para a
criatividade. Trata-se de um protótipo baseado no jogo tradicional da batalha naval para
2 jogadores, cujo objetivo é compor uma grelha editorial suíça. 447

Em termos de diálogo, a mecânica inicial neste jogo é construir padrões,


configurações ocultas do posicionamento de navios (elementos de jogo), pelo que todas
as sessões têm um início variável. O diálogo apela ao pensamento empático do
jogador para com o jogo, para que imagine uma auto-adaptação ao que está escondido.
Para tal, o jogador recorre a pensamento divergente e convergente para abrir novas

447 Batalha Naval Versus Grelha Editorial (2021) é analisado e descrito em profundidade na secção 5.2.14.

287
hipóteses e focá-las no que seja mais eficaz. No final, recorre a pensamento metafórico
e analógico para relacionar o que é descoberto com elementos tipográficos a aplicar na
grelha editorial (Figura 7.8). Em termos de aumento de literacia criativa, o jogo amplia
as possibilidades de gerar e reconhecer padrões inovadores, para melhor interagir e
realizar o objetivo do jogo.

Figura 7.8. Batalha Naval Versus Grelha Editorial (2021), ecrã de playthrough em que o jogador estabelece
um diálogo inicial com o sistema de jogo. 153
Em termos de tentativa-erro, o arriscar a sorte permite explorar o campo de jogo
oculto pelo oponente passo a passo, ou usando criteriosamente uma habilidade
conseguida uma vez por jogo. O jogo realiza-se revelando algo do jogo do oponente, o
que se traduz em oportunidades para posicionar elementos tipográficos. A tentativa-erro
envolve condições de criatividade destrutiva pois é necessário limpar o terreno através
de iterações sucessivas que introduzem alterações no artefacto final (Bauman 2006). A
revelação do terreno depende das interações jogo-jogador que também podem ocorrer
por sorte e serendipidade (Figura 7.9). Aqui o contributo para o aumento da literacia
criativa reside na ampliação da noção do que significa ganhar um jogo, bem como, o
valor do registo do processo de jogo para que este possa ser melhorado.

288
Figura 7.9. Batalha Naval Versus Grelha Editorial (2021), ecrã de playthrough em que o jogador explora o
campo de jogo por tentativa-erro. 154

A dialética alimenta-se do reconhecimento de padrões ocultos do jogo do oponente


através da geração de um modelo mental do jogo para simular jogadas reveladoras. A
crítica surge na composição final, dado que pode ocorrer divergência de opiniões sobre
como a compor, o que por seu turno requer negociação. A dialética divide-se na
intuição, o que o jogador infere sobre o que é revelado, na sua atenção sobre estes
fragmentos de informação, e numa postura lúdica e relaxada para poder considerar uma
variedade de oportunidades. Por último, a composição da grelha apoia-se em atitudes
inquisitivas, sobre o que pode funcionar melhor, e eventualmente atitudes
colaborativas, pois o artefacto final é fruto das decisões dos dois jogadores. O aumento
da literacia criativa com a dialética traduz-se em descobrir argumentos que passem
despercebidos para estruturar uma grelha suíça e em refletir em conjunto criticamente
sobre modos alternativos de a compor (Figura 7.10).

289
Figura 7.10. Batalha Naval Versus Grelha Editorial (2021), ecrã de playthrough em que o jogador estabelece
uma dialética com o sistema de jogo. 155

Em termos de sinergia, não se trata de um jogo a solo pois envolve um oponente


humano. O início do jogo carateriza-se por competir pelo reconhecimento do jogo
oculto do adversário. Assim, o jogo cooperativo ocorre findo este reconhecimento na
fase de implementação dos elementos tipográficos para criar a grelha editorial. A

sinergia assenta em condições de espaço comum, onde agentes operam com o seu
poder computacional os componentes de jogo. O jogador relaciona o que é revelado a
partir da memória que tem dos componentes e das representações que estes podem
assumir, para ter uma perceção do que está escondido. No fim, são estas revelações que
permitem prototipar a grelha editorial (Figura 7.11.). Assim, o aumento da literacia
criativa obtida com a sinergia dá-se com os jogadores experienciando duas atitudes
opostas, competir e cooperar, sendo a última adotada consensualmente.

290
Figura 7.11. Batalha Naval Versus Grelha Editorial (2021), ecrã de playthrough em que os jogadores usam o
jogo cooperativo para estabelecer uma sinergia e chegarem a uma grelha consensual. 156

Em suma, o diálogo em Batalha Naval Versus Grelha Editorial (2021) permite construir e
reconhecer padrões que acrescentam relevância a um projeto, a dialética permite
descobrir argumentos que passam despercebidos e refletir criticamente sobre modos
de reestruturação, a tentativa-erro permite ampliar o significado do sucesso e do valor
do registo do processos para melhorar artefactos, e a sinergia permite perceber quando
podem ser mais úteis momentos de competição ou cooperação num processo de jogo
criativo e em que condições.

7.3.2. Design e Improvisação: Forma de Letra

Na continuação da exemplificação da operacionalização desta framework escolhemos


Design e improvisação: Forma de Letra (2021), um jogo para co-criar caracteres e incitar
o pensamento criativo.448 Foi escolhido porque é um protótipo com regras simples que
revelou potencial para os seus jogadores criarem múltiplas variações de artefactos
concretos – letras ou famílias de letra – sendo portanto considerado um jogo para
aumentar a literacia criativa neste âmbito

Em termos de diálogo, o jogo tem um início variável com o objetivo de construir


padrões – formas de letra – que emerge segundo o que cada jogador pretender fazer
numa ordem de turnos progressiva. No diálogo com o jogo são estimuladas
competências em que o jogador em turno procede à auto-adaptação sobre o resultado
no turno anterior usando pensamento metafórico e analógico e pensamento divergente
e convergente, para criar um novo resultado (Figura 7.12). Em termos de contributos
para o aumento de literacia criativa, o jogo amplia as possibilidades da criação
tipográfica com novos artefactos – letras ou famílias de letras.

448 Design e improvisação: Forma de Letra (2021) é analisado e descrito em profundidade na secção 5.2.10.

291
Figura 7.12. Design e Improvisação: Forma de Letra (2021), ecrãs de playthrough em que o jogador enceta
o diálogo com o seu sistema. 157

A dialética alimenta-se do reconhecimento de padrões, ou seja, da dedução de novos


padrões de letra a partir do resultado do turno anterior. Esta dedução é feita com base
no modelo mental do jogador que auxilia a simular as próprias jogadas antes de as
executar. A dialética estimula ainda uma atitude intuitiva, para que o jogador possa
inferir nova jogada a partir da anterior, e por vezes, uma atitude colaborativa, se
acrescentarem algo em vez de a destruir o resultado, ou atitude subversiva, se a este
resultado for impresso um significado oposto ao inicial. Em qualquer destes casos,
estão ainda implícitas uma atitude lúdica e uma atitude aberta ao risco num jogo
divertido e em contínua transformação. O aumento da literacia criativa com a dialética
traduz-se em reconhecer o que pode constituir uma nova criação tipográfica a solo ou
em cooperação, i.e. o redefinir do que é uma forma de letra (Figura 7.13).

292
Figura 7.13. Design e Improvisação: Forma de Letra (2021), ecrãs de playthrough em que ocorre dialética
entre jogador e sistema de jogo. 158

A tentativa-erro assenta em obter pontos de vitória, que se traduzem na progressão


direta no jogo e nos recursos necessários para tal e para criar – em peças de jogo. A
tentativa-erro envolve procedimentos de questionamento aberto e criatividade destrutiva
para descartar o que foi feito na jogada anterior, e sorte e serendipidade que decorre do
lançamento de dados, para o jogador ver o que pode fazer a partir daí (Figura 7.14). O
aumento da literacia criativa assenta em obter recursos com os dados para através de
tentativa-erro, gerar letras e progredir no jogo.

Figura 7.14. Design e Improvisação: Forma de Letra (2021), ecrãs de playthrough em que ocorre tentativa-
erro entre jogador e sistema de jogo. 159

Em termos de sinergia e em princípio é um jogo a solo, contudo pode ocorrer jogo


cooperativo por ser mais fácil edificar novas hipóteses a partir dos resultados dos
turnos anteriores. A sinergia assenta em recursos de espaço comum onde os jogadores
interagem com o sistema de jogo e outros jogadores. As hipóteses de letras lançadas
apoiam-se em recursos de memória e de representação dos jogadores, nas imagens que
possuem das formas das letras, e no poder computacional de cada jogador em articular
hipóteses de ação no espaço comum de jogo, a partir do lançamento dos dados e destas
mesmas imagens (Figura 7.15.). Assim, o aumento da literacia criativa estimulada pela
sinergia ocorre na intersecção entre jogar sozinho e em cooperação com outros
jogadores, e que dinamiza as ações de jogo.

293
Figura 7.15. Design e Improvisação: Forma de Letra (2021), ecrãs de playthrough em que ocorre sinergia
entre agentes de jogo. 160

Em suma, o diálogo em Batalha Naval Versus Grelha Editorial (2021) permite ampliar o
âmbito da criação tipográfica com novos artefactos, a dialética permite reconhecer o que
podem ser novas criações tipográficas, a tentativa-erro permite obter recursos para
progredir na geração de novos artefactos, e a sinergia estimula a cocriação num contexto
lúdico, permitindo unir os esforços e mais-valias de diferentes jogadores.

7.3.3. Conclusões sobre a ferramenta de análise

Identificadas nas secções 7.3.1 e 7.3.2, as mecânicas de jogos para a criatividade, as


respetivas ações de jogo para a criatividade, como ambas se refletem em dimensões para
a literacia criativa e em contributos para o aumento da literacia criativa no jogo Batalha
Naval Versus Grelha Editorial (2021), correlacionamos estes resultados num diagrama de
fluxo de jogo ilustrado na Figura 7.16.

294
Figura 7.16. Diagrama de fluxo com as mecânicas de jogo para a criatividade presentes nas ações
de jogo para a criatividade, as dimensões para a literacia criativa que trabalham, e os respetivos
contributos para o aumento da literacia criativa em Batalha Naval Versus Grelha Editorial (2021). 161

Em suma: 1) a comunicação inicia-se com a disposição de peças escondidas por cada


jogador em diálogo; 2) o jogo processa-se por troca de argumentos sobre estas posições
de jogo por tentativa-erro, na interação dos dois jogador com o jogo um do outro; 3) esta
interação, no ponto anterior, é dinamizada entre agentes de jogo por negociação e
reconhecimento de padrões através da dialética; 4) e é no atrito gerado pelos interesses
de jogadores e jogo que se podem encontrar possibilidades de sinergia criativa entre
jogadores, o consenso entre estes sobre a grelha final.
De seguida, apresentamos para Design e improvisação: Forma de Letra (2021), um
diagrama de fluxo na Figura 7.17., que relaciona mecânicas de jogos para a
criatividade,as respetivas categorias de ações de jogo para a criatividade, e como
ambas se refletem em dimensões para a literacia criativa.

295
Figura 7.17. Diagrama de fluxo com as mecânicas de jogo para a criatividade presentes nas ações
de jogo para a criatividade, as dimensões para a literacia criativa que trabalham, e os respetivos
contributos para o aumento da literacia criativa em Design e Improvisação: Forma de Letra (2021). 162

Em suma: 1) o jogo inicia-se na sinergia entre o jogo a solo e jogo cooperativo para
dinamizar as suas ações; 2) o diálogo de jogo pauta-se pela conversação com um início
variável e o construir padrões de acordo com os interesses do jogador, estendendo-
se aos outros jogadores numa ordem de turnos progressivos, para ampliar esforços
de cocriação; 3) cada jogador no seu turno procede ao reconhecimento de padrões de
novos artefactos de jogo em dialética; 4) este reconhecimento permite ganhar por
tentativa-erro pontos de vitória com os quais se retorna ao ponto 1.

7.4 Ferramenta de conceção


Demonstrada a operacionalização da framework na secção 7.3., propomos de seguida
uma ferramenta, um protótipo de jogo para idear jogos, O jogo para a Literacia Criativa
(2022).449 Este jogo é uma implementação prática da framework que permite usar os
seus componentes como elementos de jogo para gerar novos jogos que aumentam a
literacia criativa em áreas de interesse concretas.

449 Os componentes deste jogo podem ser encontrados no Anexo D.

296
Resumidamente, este jogo requer aos jogadores gerar associações, enquadradas em
ações de jogo para a criatividade. Estas ações são articuladas a partir de mecânicas de
jogo para a criatividade e dimensões para a literacia criativa. Ainda, são decididos
como e quando decorrem estas ações no fluxo de jogo pretendido, organizando-as nos
campos de uma tela conceptual de jogo, um documento que permite aos jogadores
convergir os múltiplos aspetos do seu conceito de jogo final. Uma sessão de jogo é
ilustrada na Figura 7.18. e o seu funcionamento é explanado na secção seguinte.

Figura 7.18. O Jogo para a Literacia Criativa (2022) apresentando sessão de jogo. 163

297
7.4.1. Funcionamento e regras

Figura 7.19. O Jogo para a Literacia Criativa (2022) apresentando componentes de jogo. 164

Componentes de jogo
a) 4 baralhos de cartas com mecânicas de jogo para a criatividade;
b) 4 tabuleiros ações de jogo para a criatividade: Diálogo, Dialética, Tentativa-erro e
Sinergia;
c) Posição das cartas mecânica de jogo para a criatividade;
d) Post-its;
e) Posição das cartas dimensão para a literacia criativa;
f) Baralhos com cartas dimensões para a literacia criativa: Condições e
Comportamentos;
g) Marcadores: Início, durante e fim;
h) 1 tela de conceção de jogos.450

Preparação
Baralham-se os baralhos com as mecânicas de jogo para a criatividade
individualmente, que depois se colocam de face voltada para baixo alinhados com a
lateral esquerda do tabuleiro (a). As cartas dos restantes baralhos com as dimensões

450 Esta tela conceptual de design de jogos foi criada por Nalin Sharma (s.d.), que traduzimos para português para efeitos de uso no
âmbito desta proposta de protótipo. Esta tela foi escolhida porque das telas consultadas até ao momento era a mais completa
relacionado várias dimensões empregues num jogo, e incluía instruções para facilitar o preenchimento de cada campo/ aspeto de
jogo. A versão original pode ser encontrada no Anexo C. O seu uso pauta-se pelo Creative Commons Attribution – No Derivatives
4.0 International License. A tela foi acedida a 21 de janeiro de 2022 em http://1pgd.com/download/

298
para a literacia criativa são posicionadas com o seu conteúdo visível, alinhadas com a
lateral direita do respetivo tabuleiro (f).

Objetivo
Conceber jogos para aumentar a literacia criativa.

Regras
1. O jogo desenrola-se por turnos de jogadores no sentido dos ponteiros do
relógio. Também pode ser jogado a solo;
2. Cada jogador no seu turno retira uma carta dos baralhos mecânicas de
jogo para a criatividade (a), colocando-a com o seu conteúdo visível na
lateral esquerda do tabuleiro ações de jogo para a criatividade respetivo (c);
3. De seguida, se estiver a jogar só, escolhe uma carta das dimensões para a
literacia criativa para associar com a carta anterior (f), colocando-a na
lateral direita do mesmo tabuleiro (e). Se estiver a jogar com mais
jogadores, é o jogador seguinte que escolhe esta carta para o primeiro
jogador;
4. De seguida, o jogador em turno elabora num post-it uma associação para
um aspeto de jogo que faça a convergência entre os dois assuntos das
cartas. A associação é uma explicação concreta de como uma contribui para
a outra num contexto de jogo. O post-it é depositado entre as duas cartas
no mesmo tabuleiro (d);
5. Os turnos sucedem-se na sequência prevista a partir da regra 2, podendo
estender-se a outros tabuleiros, conforme as cartas mecânicas de jogo
para a criatividade forem reveladas;
6. Em qualquer momento um jogador pode definir uma das associações como
a atividade inicial do jogo, ou a sua condição de vitória/término. Para tal,
deposita neste tabuleiro o respetivo marcador (g);
7. O número mínimo de tabuleiros a preencher com estas combinações é dois,
podendo haver mais tabuleiros em jogo com cartas que lhes estejam
relacionadas, mas isso aumenta a complexidade do jogo final, o que é de
evitar;
8. O jogo é dado por terminado quando os jogadores considerarem ter
associações e fases de jogo adequadas para poderem elaborar um conceito
de jogo numa tela de conceção de jogos (h). Nesta fase os jogadores
procuram elaborar nesta tela aspetos do jogo a partir das associações
feitas.

Fim do jogo

299
O jogo termina quando os jogadores acordarem entre si que têm associações suficientes
para avançar para a elaboração final de um conceito de jogo.

300
7.4.2. Caso de Uso

Sabendo como operacionalizar O jogo para a Literacia Criativa (2022), realizamos uma
sessão de jogo com esta ferramenta (Figura 7.20.) que reportamos em detalhe a seguir.

Figura 7.20. Sessão com o Jogo para a Literacia Criativa (2022). 165

O jogo resultante desta sessão – Vírus (2022) – compreende apenas 2 ações de jogo para
a criatividade: sinergia e diálogo (a e b). Determinou-se ainda quando estas ações ocorrem
durante o jogo concebido (c). As associações feitas pelos jogadores são vertidas na tela
de conceção de jogos, detalhando-se cada aspeto de jogo integrado (d). O jogo produz
representações de vírus com certas caraterísticas, tendo os jogadores de criar
contramedidas em resposta, conforme ilustrado na Figura 7.21.

Figura 7.21. Vírus (2022), ilustração de playthrough em que o jogador: 1) corresponde representações
abstratas de vírus; 2) recebe informações sobre as caraterísticas do vírus correspondido; 3) concebe
uma contramedida para este vírus. 166

301
Figura 7.22. Componentes de Vírus (2022). 167

Componentes de jogo
1) Sistemas computacionais;
2) Representações de vírus;
3) Caraterísticas de vírus;
4) Contramedidas a aplicar aos vírus.

Objetivo
Conceber contramedidas a aplicar aos vírus.

Regras
• O jogador procura fazer uma correspondência entre padrões abstratos de
vírus (2);
• O sistema de jogo gera caraterísticas para uma correspondência encontrada
(3);
• O jogador procura gerar uma contramedida para aplicar ao vírus que lhe foi
designado (4), pontuando em conformidade;
• O jogo regressa ao ponto inicial, acrescentando-se pontuação para cada
contramedida eficaz.

Término do jogo
O jogo tem um caráter casual, pelo que termina quando o jogador estiver satisfeito
com a sessão.

7.4.3. Análise ao Caso de Uso

A sinergia desenvolve-se num jogo a solo em que o jogador procura corresponder


representações de vírus posicionadas aleatoriamente no ecrã de jogo pelo respetivo
sistema. Estas correspondências permitem ao jogador progredir. A sinergia envolve
espaço comum e poder computacional para a representação dos vírus e adaptação das

302
respetivas contramedidas, e memória para os poder corresponder. A literacia criativa é
aumentada ao ampliar-se formas de representar e reconhecer artefactos (Figura 7.23.).

Figura 7.23. Vírus (2022), ilustração de playthrough que usa diálogo e sinergia em que o jogador relaciona
representações abstratas de vírus. 168

No diálogo encetado com a sinergia, e após o jogador ter encontrado uma relação entre
representações, o sistema de jogo retoma o diálogo construindo um padrão sobre o
vírus resultante, ou seja, determina as suas caraterísticas. Com base nestas
caraterísticas o jogador responde construindo um padrão em resposta, i.e., contra-
medidas que mitiguem a ação do vírus. O processo de jogo desenrola-se assim com um
início variável e numa ordem de turnos progressivos. O diálogo envolve auto-
adaptação para fazer correspondências e pensamento divergente e convergente para
responder aos desafios do sistema de jogo. A literacia criativa é aumentada em termos
da geração de adaptações a artefactos com configurações inesperadas (Figura 7.24.).

Figura 7.24. Vírus (2022), ilustração de playthrough que usa diálogo: o jogador recebe informações sobre
as caraterísticas do vírus correspondido (esquerda) e concebe uma contramedida para este vírus
(direita). 169

Identificadas na análise anterior, as mecânicas de jogos para a criatividade, as


respetivas categorias de ações de jogo para a criatividade, e como ambas se refletem em
dimensões para a literacia criativa, e em contributos para o aumento da literacia

303
criativa de Vírus (2022), elaboramos na Figura 7.25. o respetivo diagrama de fluxo.

Figura 7.25. Diagrama de fluxo com as mecânicas de jogo para a criatividade presentes nas ações
de jogo para a criatividade, as dimensões para a literacia criativa que trabalham, e os respetivos
contributos para o aumento da literacia criativa em Vírus (2022). 170

O fluxo do jogo inicia-se com a disposição aleatória de elementos de jogo (vírus) pelo
sistema de jogo em diálogo. O diálogo prolonga-se nesta conversa de jogo a solo em
que o jogador procura relações entre elementos de jogo para distinguir um deles. O
sistema de jogo continua o diálogo revelando as caraterísticas destes elementos, após o
que o jogador cria novos elementos de forma a anular a influência dos primeiros. O jogo
é cíclico e incrementa a sua dificuldade com o número de ciclos.

A razão para contemplar apenas 2 ações de jogo para a criatividade em Vírus (2022), foi
procurar evitar complexificar o jogo. Isto porque em virtude das evidências encontradas
no capítulo 5 e 6, quanto mais simples o jogo for maior a probabilidade de ser jogável
e produzir resultados rapidamente, como ocorre num jogo casual. Ainda, a
complexidade num jogo, embora também possa produzir resultados, exige tempo em
preparação e instrução, o que não é atraente para todos os públicos de jogadores. Um
jogo simples, por seu lado, tenderá a atrair jogadores que pretendam usar os jogos para
aumentar a literacia criativa para responder a situações concretas, e.g. em contextos de
aula e disciplinas específicas.

304
Em suma, o jogo tem potencial para criar jogos que aumentem a literacia criativa para
que os jogadores ampliem formas de representar e reconhecer artefactos, e adaptem
ações a artefactos com configurações inesperadas.

7.4.4. Análise e conclusões sobre a ferramenta de conceção

A ferramenta de conceção materializada no Jogo para Literacia Criativa (2022), é um


meta-jogo que permite desenvolver ideias de jogos alinhadas com os interesses dos
seus jogadores. Estes interesses refletem-se em mecânicas de jogos para a
criatividade, e subsequentemente, nas ações de jogo para a criatividade. É a partir das
articulações geradas entre estes dois componentes que se percebem quais as dimensões
da literacia criativa que o jogo resultante aponta, e quais os seus contributos para
aumentar a literacia criativa.

Embora o objetivo da ferramenta (o meta-jogo) seja construir jogos que aumentem a


literacia criativa, não nos foi possível construir e analisar mais jogos. Ainda assim,
aproveitamos para fazer uma ponte para uma vertente poiética futura da framework e
portanto desta ferramenta de conceção. A ferramenta tem o potencial para conceber
jogos além do âmbito desta investigação, mas é algo que carece necessariamente de
estudos futuros de carácter longitudinal. Por isso, procedemos a uma análise do próprio
meta-jogo enquanto ferramenta para desenvolver o caso de uso da secção anterior,
como forma de abrir a porta para estudos futuros.

No meta-jogo a sinergia desenvolve-se num jogo a solo em que o jogador relaciona as


cartas que revela com as cartas que escolher, o que pode ser aumentado por escolhas
de outros jogadores num jogo cooperativo que ocorre em alternância e cujos
resultados vertem sobre um conceito de jogo final. A sinergia envolve recursos como
espaço comum em que os jogadores articulam os conteúdos das cartas, com auxílio das
representações e memória interna individual (Figura 7.26.). A literacia criativa é
aumentada ao alternar esforços de cocriação e criação a solo para atingir um objetivo
complexo, um conceito de jogo.

305
Figura 7.26. O Jogo para Literacia Criativa (2022), ilustração de playthrough em que o jogador articula
uma mecânica de jogo para a criatividade (a) com uma dimensão para a literacia criativa escolhida
pelo adversário (b). A articulação é elaborada num post-it pelo jogador em turno, sobre a ação de jogo
para a criatividade: sinergia (c) a integrar o conceito de jogo esperado. O adversário define ainda que
esta fase de jogo é jogada no início (d). 171

Em termos de diálogo, a mecânica central é construir padrões, relações entre cartas


de mecânicas de jogo para a criatividade com cartas dimensões para a literacia
criativa, o que implica que as sessões de jogo tenham todas um início variável. O
diálogo apela ainda a competências de auto-adaptação ao conteúdo das cartas a associar
e usar pensamento divergente e convergente para as articular (Figura 7.27). Com o
diálogo, o jogo pode ampliar as possibilidades de gerar e redefinir o que é um jogo,
estendendo o seu propósito ao aumento da literacia criativa nesse âmbito.

Figura 7.27. O Jogo para a Literacia Criativa (2022), ilustração de playthrough em que o jogador articula
uma mecânica de jogo para a criatividade (a), com uma dimensão para a literacia criativa
escolhida pelo adversário (b). A articulação é elaborada num post-it sobre a ação de jogo para a
criatividade: diálogo (c), a integrar o conceito de jogo esperado. O adversário define ainda que esta fase
é jogada no decurso do jogo (d). 172

Em termos de dialética, a mecânica central é construir padrões, relações entre cartas


de mecânicas de jogo para a criatividade com cartas dimensões para a literacia
criativa, o que implica que as sessões de jogo tenham todas um início variável. A
dialética ancora-se numa atitude atenta, o conhecimento lúcido sobre o âmbito das
cartas, e uma atitude lúdica, uma postura relaxada estimulada pelo fluxo de jogo, o que

306
é também expectável ser refletido no seu resultado. O aumento da literacia criativa a
partir da dialética reside no reconhecimento de combinações de mecânicas de jogo para
a criatividade adequadas para integrar em conceitos de jogo.

A tentativa-erro assenta em arriscar a sorte em revelar cartas de mecânicas de jogo


para a criatividade, escolher cartas dimensões para a literacia criativa que lhes
correspondam, e posicionar ambas em tabuleiros ações de jogo para a criatividade. De
seguida, a partir destas relações, elaborar como se articulam entre si em post-its, i.e.
em papel e lápis. A tentativa-erro envolve procedimentos de sorte e serendipidade no
revelar e escolha das cartas e no questionamento aberto sobre como as articular. O
aumento da literacia criativa assenta em executar esta articulação organizando aspetos
concretos de jogo nos post-its e na tela de conceção de jogos (figura 7.28).451

Figura 7.28. O Jogo para a Literacia Criativa (2022), ilustração de playthrough em que o jogador articula
uma mecânica de jogo para a criatividade (a), com uma dimensão para a literacia criativa
escolhida pelo adversário (b). A articulação é elaborada num post-it sobre a ação de jogo para a
criatividade: diálogo (c), a integrar o conceito de jogo esperado. 173

Tendo em mente a análise anterior, e identificadas as mecânicas de jogos para a


criatividade, as respetivas categorias de ações de jogo para a criatividade, e como
ambas se refletem em dimensões para a literacia criativa e contributos para aumentar
a literacia criativa, elaboramos na Figura 7.29. o diagrama de fluxo de O Jogo para a
Literacia Criativa (2022).

451 Nesta sessão baseada no caso de uso a dialética e a tentativa-erro não fazem parte do jogo resultante – Vírus (2022) – apenas da
operação do meta-jogo. Assim, optámos por designar o tabuleiro como Fluxo de ações de jogo para a criatividade, i.e. o fluxo
genérico para qualquer valor das variáveis ações de jogo para a criatividade na Figura 7.28.

307
Figura 7.29. Diagrama de fluxo com as mecânicas de jogo para a criatividade presentes nas ações
de jogo para a criatividade, as dimensões para a literacia criativa que trabalham, e os respetivos
contributos para o aumento da literacia criativa em O Jogo para a Literacia Criativa (2022). 174

Assim, a sinergia em O Jogo para a Literacia Criativa (2022) exercita o alternar esforços de
cocriação e criação a solo para atingir um objetivo complexo, o diálogo permite ampliar
as possibilidades de gerar e redefinir o que é um jogo e estender o seu propósito para
aumentar a literacia criativa, a dialética permite reconhecer combinações de mecânicas
de jogo para a criatividade e como se integram em conceitos de jogo, e a tentativa-
erro permite relacionar conteúdos e aspetos de jogo registrando-os de forma
organizada.

Apesar do jogo constituir uma estrutura funcional, há ainda muito a ser refinado, e.g.
simplificar a identificação do tipo de cartas de jogo usando símbolos em vez de texto,
para evitar pré-conceções iniciais e abrir o pensamento dos jogadores. Outra hipótese
será permitir que ações de jogo para a criatividade e dimensões para a literacia criativa
aplicadas nos tabuleiros possam ser substituídas ou acrescentadas umas às outras de
acordo com o fluxo de jogo pretendido.

Em suma, o jogo tem potencial para criar jogos que aumentem a literacia criativa dado
que permite reciprocar argumentos entre jogo e jogadores, tornando-os coadjuvantes
na criação de problemas e respostas para assuntos em concreto.

308
Conclusões
Um jogador literado não seria necessariamente um jogador mais desgastado e desdenhoso
(já temos muitos deles), mas poderia ser um jogador mais atento, que fosse mais recetivo a
ideias mais estranhas (Anthropy e Clark 2014, 9)452

Considerações Finais

A framework desenvolvida é a resposta que damos ao primeiro objetivo da investigação:


conceber uma framework para analisar e conceber jogos que aumentem a literacia criativa.
Para efeitos de análise, esta framework permite visualizar uma área de influência que
perpassa um conjunto de dimensões: mecânicas de jogos para a criatividade, que
estão subjacentes a ações de jogo para a criatividade, que ao serem articuladas entre si
permitem revelar as dimensões da literacia criativa que o jogo analisado aponta, e
subsequentemente, interpretar os respetivos contributos para aumentar a literacia
criativa. Para efeitos de conceção de jogos, embora se tenha atingido uma síntese com
as dimensões da framework elas não deixam de ser complexas, pelo que transmitir como
operam e se articulam umas com as outras não é algo de resolução imediata. Contudo,
isto é compensado pela versatilidade que as dimensões possuem para operar sozinhas
ou em número reduzido. Esta versatilidade traduz-se assim em simplicidade para
alavancar a conceção de jogos. Assim, prevê-se que a continuação do uso da framework
permitirá conceber jogos com contribuições mais refinadas para aumentar a literacia
criativa.

Da revisão da literatura e de trabalho laboratorial inicial emergiram definições de


criatividade e literacia criativa e jogos que nos permitiram desenvolver uma proto-
framework,453 uma versão preliminar da framework. Esta framework assenta num
conjunto de dimensões mais focado que sintetiza o âmbito vasto da proto-framework.
Uma destas dimensões identificadas através de análise e trabalho laboratorial são ações
de jogo para a criatividade divididas nas categorias: diálogo, dialética, tentativa-erro e
sinergia. Quando estas categorias são combinadas e integradas num jogo refletem-se no
seu decorrer em contribuições para o aumento da literacia criativa.

Com estas categorias em mente, pudemos alcançar o objetivo 1.a no decurso do nosso
trabalho laboratorial, o estímulo à execução de atos e a adoção de posturas criativas por

452 T.A.: “A literate player wouldn’t necessarily be a more jaded and dismissive one (we have plenty of those already) but could be a
more attentive one, one who was more receptive to weirder ideas.” (Anthropy e Clark 2014, 9).

453 Esta proto-framework é detalhada no capítulo 2, secção 2.5.

309
jogadores e designers. Tais atos e posturas ancoram-se na categoria diálogo, no estímulo
que advém da conversação entre agentes de jogo. O objetivo 1.b é atingido através da
dialética já que esta estimula a argumentação e reflexão crítica de assuntos de jogo que
preparem os jogadores para executar atos criativos dentro e fora do jogo. Por sua vez, o
objetivo 1.c assenta na sinergia, o fomentar da colaboração entre jogadores com históricos e
personalidades diversas para ampliar possibilidades criativas. A tentativa-erro complementa
as restantes categorias em todos os objetivos secundários, ao permitir experimentar e
reciprocar ideias em conversação entre jogadores, submetê-las a contra-argumentação
ou a refinamentos em colaboração. Por fim, estas categorias são visíveis nos resultados
facultados por vários dos protótipos de jogo concebidos, como é o caso de Design e
Improvisação: Forma de Letra (2021) que amplia as possibilidades de gerar e reconhecer
padrões inovadores, para melhor interagir e realizar o objetivo do jogo.454

O uso da framework reside na ligação entre criatividade e ações de jogo do jogador.

Tenho argumentado que existe uma ligação estreita entre o jogar videojogos e a criatividade.
Para a maioria dos géneros de videojogos, a criatividade do jogador é típica ou padrão. Isto
decorre da centralidade da resolução de problemas nestes géneros. (Meskin 2018, 108)455

Tendo em mente esta ligação, poderá ser interessante articular os componentes da


framework com os princípios de design de jogo de James Paul Gee (2004a)456 para a
conceção de jogos para educação, o que, segundo ele, acarreta certos custos.

Costuma-se dizer que o que impede os jogos de se espalharem para a área educacional é o
custo, dado que as pessoas costumam ter em mente o maravilhoso “atrativo visual” em que
os jogos se tornaram. Mas eu sugeriria que é o custo para implementar os princípios acima
que é a verdadeira barreira. E o custo aqui não é apenas monetário. É o custo, também, de
mudar a opinião das pessoas sobre a aprendizagem – como e onde isso é feito. Isso também
pode mudar a opinião de algumas pessoas sobre jogos de computador e videojogos. (Gee
2004a, 23)457

Conseguir mudar esta mentalidade sobre o que os jogos podem fazer obriga a debater
o assunto, o que requer uma gramática de design de jogo para o efeito. Com isto em
mente, a nossa framework apresenta potencial para expandir a gramática de design de
jogos de Anna Anthropy e Naomi Clark (2014) ampliando a visão de um jogo como algo

454 Este e outros protótipos são apresentados em detalhe no capítulo 5, secção 5.2.

455 T.A.: “I have argued that there is a close connection between videogame play and creativity. For most genres of videogames,
player creativity is typical or standard. This stems from the centrality of problem solving in those genres.” (Meskin 2018, 108).

456 James Paul Gee (2004a) apresenta 13 princípios para conceber videojogos para aprendizagem (termos originais em EN): 1) Co-
design; 2) Customise; 3) Identity; 4) Manipulation; 5) Well-Order Problems; 6) Pleasantly Frustrating; 7) Cycles of Expertise; 8)
Information “On Demand” and “Just in Time”; 9) Fish tanks; 10) Sandboxes; 11) Skills as Strategies; 12) System Thinking; 13)
Meaning as action image.

457 T.A.: “It is often said that what stops games from spreading to educational sites is their cost, where people usually have in mind
the wonderful “eye candy” that games have become. But I would suggest that it is the cost to implement the above principles that
is the real barrier. And the cost here is not just monetary. It is the cost, as well, of changing people’s minds about learning—how
and where it is done. This may also change some people’s minds about computer and video games, as well.” (Gee 2004a, 23)

310
holístico que vai além da soma das suas partes, dado que as componentes da nossa
framework são articuladas entre si para auxiliar a conceção de jogos.

Os termos em que pensamos sobre videojogos são retirados de Relatórios de Consumo – análises
de estilos de jogos. (...) Mas a aparência de um jogo não tem relação com a forma como ele
joga? A maneira como as coisas se movem em um jogo não diz muito sobre como o jogo é
controlado? Os sons não caracterizam as interações que acompanham? O desafio do jogo não
afeta a experiência do jogo – o “fator de diversão”? (...) Somos treinados para pensar em todas
essas partes de um jogo isoladamente. (Anthropy e Clark 2014, 7)458

Ou seja, as mecânicas para a criatividade ampliam o vocabulário permitindo


repensar o que pode ser um jogo, as ações para a criatividade permitem gerar uma
diversidade de jogos além dos convencionais, e as dimensões para a literacia criativa
enriquecem o valor cultural de um jogo com o que ele pode trazer em termos de
discussão criativa.

A linguagem que usamos para falar sobre jogos restringe a maneira como pensamos sobre
eles. Não temos um vocabulário que possa se encaixar em jogos tão diversos quanto, digamos,
um jogo sobre terapia de reposição hormonal que relacione eventos que realmente
aconteceram comigo e não seja uma luta pela vitória ou domínio. E assim a linguagem dos
jogos é uma linguagem de exclusão. O vocabulário da cultura do jogo enquadra as discussões
de forma a perpetuar os valores e ideias existentes dessa cultura, o que é problemático quando
essa cultura é tão insular para começar. (Anthropy e Clark 2014, 8)459

Limitações do Estudo

A framework não é algo fechado nem tão pouco infalível, pois depende de como os jogos
desenvolvidos com o seu auxílio são encarados pelos jogadores, pois aumentar a
literacia criativa exige esforço e compromisso da parte destes. O interesse individual do
jogador é a motivação central para embarcar na experiência de jogar para aumentar a
sua literacia criativa. Por isso, estes jogos só atingem o seu propósito se integrarem
mecanismos para facilitar formas de conversação para acordar interesses partilhados
entre os jogadores.

Assim, as limitações atuais emergem do objetivo principal da investigação: Desenhar


uma framework para analisar e conceber jogos que aumentem a literacia criativa. Ou seja,
criar respostas para problemas diferentes num domínio de conhecimento ou trabalho

458 T.A.: “The terms we think about videogames in are taken from Consumer Reports –style reviews of games. (...) Doesn’t the way a
game looks have a relationship to how it plays, though? Don’t the way things move in a game tell you a lot about how the game
controls? Don’t sounds characterize the interactions that they accompany? Doesn’t the challenge of the game affect what the
experience of the game is—the “fun factor”? (...) We’re trained to think of all these parts of a game in isolation.” (Anthropy e
Clark 2014, 7).

459 T.A.: “The language that we use to talk about games constrains the way we think about them. We don’t have a vocabulary that can
fit games that are as diverse as, say, a game about hormone replacement therapy that relates events that really happened to me
and isn’t a struggle for victory or dominance. And so the language of games is a language of exclusion. Game culture’s vocabulary
frames discussions in such a way as to perpetuate the existing values and ideas of that culture, which is problematic when that
culture is so insular to begin with.” (Anthropy e Clark 2014, 8)

311
pontual. É neste sentido que o uso atual da framework fica circunscrito a públicos e
disciplinas que tirem partido de forma direta e expedita do aumento da literacia
criativa.

Âmbito de Uso
Para que o seu uso no mundo real constitua um benefício direto, os jogos produzidos
com a framework não podem estar focados somente em divertimento (embora essa seja
uma faceta desejável para reter o interesse e estimular os jogadores). Devem sim estar
apontados a responder a tarefas criativas ou encontrar formas de executar algo de
forma distinta do que já existe. Isto assenta nas evidências recolhidas de que os jogos
devem ser simples na instrução e jogabilidade, mas capazes de gerar resultados
complexos.

Com isto em mente, os jogos gerados com esta framework têm tendencialmente um uso
pontual com sessões de jogo e objetivos bem dirigidos, e uma duração limitada. Caso se
destinem a responder a projetos criativos de grande envergadura, a framework é útil
para gerar jogos individuais alocados a diferentes etapas de trabalho, desde o seu início
até à sua conclusão. Se forem usados para complementar currículos pedagógicos com
literacia criativa, podem auxiliar educadores a estimularem a criatividade nos seus
alunos, fomentando as construções e ações criativas destes. Contudo, esta hipótese
requer um estudo subsequente envolvendo instituições escolares, estudantes e
educadores.

Complexidade
As dimensões que compõem a framework resultante têm ainda por revelar o seu pleno
potencial. Embora cada dimensão tenha sido analisada, o objetivo principal desta
investigação foi essencialmente cumprido ao revelá-las e ao correlacioná-las. Cada
dimensão é ampla e profunda, e a sua complexidade é a razão pela qual merecem um
estudo eventualmente mais individualizado e assim mais circunscrito.

Os jogos complexos podem constituir uma limitação por exigirem muito do jogador, o
que para alguns será pouco atrativo e minar a vontade de jogar. A complexidade é visível
em alguns dos nossos protótipos iniciais que além da pretensão de fomentar dimensões
da literacia criativa eram guiados por temas que se sobrepunham a este objetivo. Isto
tornou claro que a prototipagem teria de ser cada vez mais simples para conseguir focar
os jogadores no aumento da literacia criativa. Ainda, um maior foco assenta na ligação
dos jogos a situações atuais concretas com recurso a mecânicas de jogo para a
criatividade e no estímulo de ações de jogo para a criatividade, para através do diálogo,

312
dialética, sinergia e tentativa-erro tirar partido das diversas perspetivas individuais dos
jogadores para aumentar a literacia criativa. Este foco no jogador remete-nos ainda
para que tipos de jogadores é a literacia criativa relevante.

Público-alvo
A framework resulta de estudos teóricos e práticas de observação e experimentação de
sistemas de jogos para gerar atos criativos para perceber como conceber jogos para
aumentar a literacia criativa, e inicialmente com a ambição de ser abrangente em
termos de públicos. Contudo, depressa se verificou que uma framework com carácter
universal seria difícil de desenvolver porque os fluxos de jogo concebidos podem ter
portas de entrada, progressão e saída diferentes consoante a visão do investigador,
jogador ou designer. Assim, o significado que se retira destes jogos, e portanto o seu
benefício para o aumento da literacia criativa, depende da forma como são encarados.

Com isto em mente, o âmbito da framework foi restringindo a contextos de uso que
pudessem ser usados por designers, pois é a disciplina do investigador, e uma das que
pode beneficiar mais diretamente dos contributos da investigação. Neste sentido,
alguns protótipos foram usados por estudantes e profissionais de Design, mostrando
potencial para estes dois públicos. Daí que só com estudos mais abrangentes e
transversais se poderá identificar com maior exatidão o valor dos contributos desta
investigação no contexto de outras atividades ou disciplinas.

SARS-Covid 19
Durante a investigação deparámo-nos com restrições impostas pela pandemia SARS-
Covid 19, que exigiu adaptar o plano de trabalhos estipulado para que fosse cumprido.
Estas restrições ocorreram numa altura do plano em que tínhamos protótipos de jogo
e sessões estruturadas para que os jogadores pudessem jogar presencialmente. Isto
ocorreu também com workshops projetados para este formato presencial. As imposições
de distanciamento social impediram a sua realização nos moldes previstos, pelo que
tivemos que converter estes workshops para formatos online, à distância.

Isto não afetou na prática o plano de trabalhos porque fizemos um esforço adicional
para levar a cabo sessões de jogo com protótipos em baixa fidelidade. Este esforço
estendeu-se à investigação em si pois havia agora necessidade de estruturar sessões de
cocriação de jogos por via remota. Em suma:
1. Em sessões de jogo foi necessário recorrer a software de videoconferência e
converter os jogos para que pudessem ser jogados através de plataformas
digitais multiutilizador;

313
2. Para os workshops, além do ponto 1, foi necessário estruturá-los para operar via
remota integrados em contextos de aula, com o objetivo de auxiliar equipas de
estudantes a idear resultados para os seus projetos;460
3. O caso das sessões de cocriação foi mais simples porque envolveu especialistas
em Design e em Estudos e Design de jogos. A preparação dos protótipos de jogos
de baixa fidelidade e das instruções de jogo recorreu ao mesmo software de
videoconferência e plataformas digitais referidos no ponto 1.

Estranhamente, estas restrições revelaram-se até oportunas porque aceleraram a


conceção de jogos e instruções simples para assegurar a sua jogabilidade e
inteligibilidade por via remota. Ou seja, a prototipagem tornou-se mais rápida, simples
e objetiva no âmbito da literacia criativa a que se destinava.

Trabalho Futuro

A continuidade da experimentação com jogos orientados para aumentar a literacia


criativa permitirá melhorar e aprimorar a nossa framework. Portanto, tendo em mente
o âmbito da investigação que delimitamos na secção anterior propomos a seguir linhas
de estudo que se ramificam a partir destes limites.

Estudar o Impacto do Uso desta Framework na Vida dos Jogadores


Este estudo tem de novo caráter longitudinal porque se trata de averiguar o impacto do
aumento da literacia criativa na vida académica e profissional dos jogadores. Dito isto,
também se pode analisar este impacto em jogadores e contextos alternativos aos
estudados no âmbito da tese, pois embora difícil de comprovar, os jogos podem atuar
na vertente em que os jogadores opõem resistência. A dificuldade em comprovar a
oposição de resistência a um assunto de jogo pode ocorrer porque o que é atrativo para
um jogador pode não ser para outro. E.g. será interessante analisar se há diferenças na
recetividade e uso da framework por parte de designers em início de carreira, ou
profissionais já com carreira de longa data. Ainda, a framework pode ser testada em
contextos profissionais por forma a estimular a edificação de equipas de trabalho dado
o seu carácter de cocriação. Isto dependerá da área de atividade e da contribuição da
literacia criativa para os seus objetivos.

Em todo o caso, dada a crescente importância dos jogos enquanto instrumentos para

460 Estes workshops envolveram equipas de estudantes na Unidade Curricular de Sistemas Gráficos e Animação 3D com Pedra Papel
Tesoura versus Conceção de Personagem de jogo (2021), e na Unidade Curricular de Jogos Digitais com Damas versus Conceção de
Videojogos (2021), ambos decorreram na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. A operação de Damas Vs Conceção de
Videojogos (2021) pode ser consultada em detalhe no capítulo 5 secção 5.2.12. Pedra Papel Tesoura Vs Conceção de Personagem
de jogo (2021) pode ser consultada no capítulo 5 secção 5.2.15.

314
dinamizar a criatividade, como evidenciado nos nossos estudos de caso, prevê-se que
a framework possa trazer benefícios a nichos profissionais que dela necessitem, tais
como incubadoras de empresas, em startups, empreendedores a título individual, ou
mesmo laboratórios de investigação ligados à academia ou indústria ou servindo de
interface entre ambas.

Analisar Modelos Mentais de Jogo


Os jogadores procuram interpretar as intenções do designer à luz da sua própria
experiência e emoções, e com isso edificar um modelo mental simulado do jogo com o
qual interagem, algo que Carvalhais e Cardoso chamam de Teoria do Sistema (2021).461

Ao desenvolver modelos e simulações do sistema da obra, vamos expandir o seu campo dos
três níveis originais de Mecânica, Dinâmica e Estética (Hunicke, LeBlanc, e Zubek 2004) para
dois novos níveis para além da obra e internos ao leitor: uma Dinâmica Simulada e uma
Mecânica Simulada. Estes dois níveis aumentam, em muito, a complexidade do sistema,
gerando também um papel ativo para os leitores humanos no processo da obra —
independentemente de esta ser ou não interativa. Estes dois novos níveis expandem o que
entendemos por obra. Permitem-nos descolar da sua subfície, replicando os seus processos
em nós, usando a nossa mente para instanciar novas ocorrências que partem para viver
connosco. Replicamos a obra e fazemo-la evoluir através da criação de uma meta-subfície.
Em suma: deixamos que a obra se exprima através de nós. (Carvalhais e Cardoso 2021, 148)

Da mesma forma que estas simulações brotam dos modelos mentais dos jogadores,
estes também podem simular mecânicas de jogo para a criatividade, ações de jogo
para a criatividade e dimensões para a literacia criativa alternativas, que de outra forma
o designer não se daria conta. Isto porque as simulações mentais permitem-nos
articular formas alternativas de usar estas dimensões a partir do gameplay de jogos
existentes e da questão “e se?”. Gerar um modelo mental permite-nos tirar partido de
um processo de análise consciente (Carvalhais e Cardoso, 2021), o que aplicado a um
jogo desenvolvido com a nossa framework permite-nos gerar ideias de jogos que não
nos surgiriam de outra forma.

A TdM é desenvolvida de forma largamente subconsciente, embora o seu esforço de


construção possa ser suportado reflexivamente, através da análise consciente de
comportamentos ou da psicologia de terceiros. Aquilo que propomos é que na nossa relação
com obras computacionais, a análise da sua superfície é usada para a construção de uma
Teoria do Sistema (TdS) que é também desenvolvida primariamente de forma subconsciente.
(Carvalhais e Cardoso 2021, 146)

461 A interpretação da teoria do sistema é análoga ao processo da teoria da mente das ciências cognitivas (Ramachandran 2012), trata-
se de criar modelos mentais dos pensamentos e intenções de outras pessoas como forma de prever (ou manipular) os seus
comportamentos (Carvalhais e Cardoso 2021, 40).

315
Estudar Entraves ao Aumento da Literacia Criativa Oriundos do Design do Jogo
No decurso da investigação procuramos aspetos de jogos que pudessem estimular o
aumento da literacia criativa, e deparámo-nos com outros que podem minar este
objetivo. Assim, tornar-se-á igualmente importante estudar o que não funciona, como:

• Jogos demasiado complexos ou com instruções pouco claras;


• Jogos que dão primazia à solução ou a demasiado foco, e que por isso impedem
o jogador de abrir-se à sua experiência ou divertir-se no seu processo;
• Jogos que desmotivam o jogador a voltar a tentar, que alimentam ideias pré-
concebidas, ou que se limitam a formas de atuar convencionadas;
• Jogos concebidos com um vocabulário de design limitado que impede a
inovação.

Expandir Vocabulários de Design de Jogo


Os vocabulários de jogo são vistos aqui como as bases de uma linguagem própria para
discursar sobre novos designs de jogo, ou nos termos de Anna Anthropy e Naomi Clark:

Ao criarmos um verdadeiro discurso sobre o design do jogo, não estamos apenas a ajudar os
criadores de jogos existentes a tornarem-se mais eficazes, mas também estamos a capacitar
novos criadores de jogos com um vocabulário para começar a pensar e a planear o design.
Estamos a facultar aos criadores estabelecidos um meio de comunicar ideias sobre o design
a uma nova geração, estamos a permitir que todos os criadores comuniquem entre si e
melhorem uns aos outros. (Anthropy e Clark 2014, 9)462

Se um vocabulário criativo e diversificado permite aos jogadores lidar melhor com


problemas inesperados do jogo, então expandir estes vocabulários assenta na
articulação de cada dimensão da framework com vivências do jogador. E.g. a tentativa-
erro permite fazer associações inesperadas, que se acrescentam ao vocabulário criativo
do jogador, ao passo que a sinergia permite co-criar vocabulários através da confluência
de diversas perspetivas dos jogadores sobre o jogo. Já usar vocabulários para criar novos
designs de jogo, depende de comportamentos e condições que emergem do diálogo e
dialética, que por sua vez são sustentados por tentativa-erro e sinergia. Isto sugere uma
linha de estudo que usa a framework como forma de consolidar e expandir os
vocabulários de jogo disponíveis para o seu design.

Desenvolver e Estudar o Jogo para a Literacia Criativa


Esta framework pode ser vista como um método de Design para conceber jogos com
caráter colaborativo, participativo e centrado no jogador. Esta afirmação assenta no

462 T.A: “By creating a real discourse on game design, we are not only helping existing game creators become sharper, but empowering
new game makers with a vocabulary with which to start thinking about and planning design. We’re actually giving established
creators a means of communicating ideas about design to a newer generation, we’re enabling all creators to communicate with
and improve each other.” (Anthropy e Clark 2014, 9).

316
desenvolvimento do Jogo para a Literacia Criativa (2022).463 Embora este meta-jogo (um
jogo para criar jogos) já tenha demonstrado potencial através da análise de um caso de
uso, ainda se encontra num estado embrionário. Este meta-jogo requer que os jogado-
res combinem mecânicas de jogo que resultem em ações de jogo criativas, que por sua
vez, se reflitam em dimensões e num fluxo de jogo para aumentar a literacia criativa.

Em suma, apresentado o jogo e identificado o seu potencial, falta demonstrar a sua


eficácia enquanto método de design de jogos, daí a necessidade de um estudo longitu-
dinal envolvendo desenvolvedores, designers e estudantes a trabalhar nesta área.

Estudar Eventuais Efeitos Divergentes Resultantes da Transcodificação de Jogos


Analógicos para Digitais
O processo de prototipagem focou-se maioritariamente no desenvolvimento de jogos
analógicos porque: 1) não sabíamos programar; 2) o desenvolvimento de protótipos
digitais consome mais tempo do que o desenvolvimento de protótipos de baixa
fidelidade e em papel; e 3) necessitamos de agilidade para conseguir explorar, testar e
reformular os protótipos. Contudo, os princípios revelados pela investigação na forma
da framework continuam válidos para formatos digitais. Isto foi evidenciado no caso de
See, Hear, Touch no Evil (2018), que desenvolvemos nos dois formatos e que apesar de
serem governados pelas mesmas mecânicas proporcionam experiências distintas. 464
Com isto em mente, esta transcodificação é outra linha de estudo que pode consolidar
a relevância da framework enquanto instrumento para gerar jogos que operem em
media diferentes e averiguar eventuais efeitos divergentes.

Estudar Mais Casos de Jogos que Recorram a Inteligência Artificial


Esta linha de estudo debruçar-se-ia sobre como é que a IA pode melhorar um jogo cujo
objetivo é aumentar a literacia criativa do jogador. Ao estudar estes jogos, poderemos
perceber melhor a influência da IA em mecânicas de jogo para a criatividade, e
subsequentemente as ações de jogo para a criatividade que despoletam, e por fim as
dimensões para a literacia criativa que aumentam, ou seja, ao usar IA em complemento
das dimensões da framework podemos conceber protótipos de jogos com outras
capacidades para aumentar a literacia criativa.

Criar Jogos com Dimensões da Framework Mediadas por Inteligência Artificial


Esta linha de estudo é a exploração de uma hipótese: como aproveitar a IA para mediar a
capacidade da nossa framework em conceber jogos para aumentar a literacia criativa? Uma

463 Este sistema de cartas - Jogo para Literacia Criativa (2022) - é detalhado na secção 7.4.4.

464 See, Hear, Feel no Evil (2018) pode ser consultado em detalhe no capítulo 5, secção 5.2.3.

317
possibilidade seria os jogadores humanos serem coadjuvados por IA, com esta
assumindo a operação de componentes da framework integradas em jogos. E.g. a IA
determinaria as mecânicas de jogo para a criatividade, ou categorias de ações para
a criatividade a empregar pelo jogo para diversificar as dimensões para a literacia
criativa que emergem deste. Esta mediação ocorre de forma similar em Why Are We Like
This? (2020),465 um jogo cujo objetivo é elaborar narrativas e em que a IA medeia como
certos aspetos desta história evoluem em coadjuvância com os seus jogadores.

465 O jogo Why Are We Like This? (2020) pode ser consultado no capítulo 4, secção 4.2.4.

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SimCity. 1989. Will Wright.

SOD. 1999. JODI.

Stardew Valley. 2016. ConcernedApe.

Strider. 1989. Capcom.

Super Hexagon. 2012. Terry Cavanagh and Chipzel.

Super Mario Maker 1 e 2. 2015, 2019. Nintendo EAD.

Superliminal. 2119, Pillow Castle Games.

Tabletop Simulator. 2015. Jason Henry, Kimiko, Henrique Lopes, Lawrence Steele.

Terraria. 2011. Re-Logic.

The Darkness II. 2012. Digital Extremes.

The Mindshake Thinking Cards. 2015. Tschimmel et al.

The Ungame. 1973. Rhea Zakich.

The Witcher 3: Wild Hunt. 2015. CD Projekt Red.

This War of Mine: The little Ones. 2016. 11 bit studios.

347
Thomas Was Alone. 2012. Bithell Games.

Tie: a game about depression. 2018. TonyNowak

Tiles IOT Toolkit. 2017. Simone Mora, Francesco Gianni e Monica Divitini.

Trigger Cards. 2016. Alejandro Masferrer

U Know Me!!!. 2019. Inês Silva.

Umiro. 2018. Diceroll Studios

Under the Sky. (s/d). Tony Nowak.

Unreal Tournament. 2021. A collaboration between gamers, developers and Epic Games

Valiant Hearts: The Great War. 2014. Ubisoft Montpellier.

Viewfinder. TBA. Matt Stark.

We the Giants. 2009. Peter Groeneweg

What do you Meme. 2016. What do you Meme.

Why Are We Like This?. 2020. Max Kreminski, Melanie Dickinson, Michael Mateas, e
Noah Wardrip-Fruin.

Wolfenstein 3D. 1992. id Software

Word Out!. 2014. Felicia Clare Paul, Christabel Goh, Kelly Yap.

X-Ball. s/ data. Roger von Oech.

Xenoblade Chronicles 2. 2017. Monolith Soft.

Y-Ball. s/ data. Roger von Oech.

348
Apêndices

349
(Página em branco)

350
Apêndice A: Conteúdos Relativos ao Capítulo 1

Na nossa opinião, a correlação entre os modelos dos Quatro P e do MSC, reflete uma
hipótese curiosa – apresentam dimensões similares que se articulam na ecologia da
criatividade. Esta hipótese é apresentada em maior detalhe na ilustração AP.1

Figura AP.1. Articulação das dimensões do MSC (esquerda) com os Quatro P (direita)

Os Domínios podem ser influenciados por Produtos, e os Processos podem auxiliar a


estruturar o pensamento criativo de indivíduos, de pessoas com sensibilidade,
flexibilidade e confiança para gerar ideias. Estes indivíduos podem desafiar e convencer
campos de conhecimento ou atividade criativa do valor do seu trabalho, ou fazendo
parte destes campos ajuizar sobre a criatividade de produtos. Finalmente a Prensa, o
ambiente que envolve a Pessoa, o Produto e o Processo, pode influenciar a formação ou
transformação de produtos criativos, e até mudar o campo onde estes são
desenvolvidos.

351
Apêndice B: Lista das Publicações e seus Contributos para a Tese

1. Fava, Fabrício, Pedro Cardoso, Ricardo Melo, José Raimundo, e Camila Mangueira. 2021.
“Play to Design with Cards GO: A Card-Based Game for Game Design and Creativity.”
Perspectives on Design and Digital Communication, 8:211–26. Springer.
https://doi.org/10.1007/978-3-030-49647-0_4.

Esta publicação foi integrada num capítulo de livro sobre as áreas do Design e
Comunicação, visto como favorável para apresentar um design de jogo de cartas para
auxiliar a conceber jogos e desbloquear a criatividade. O jogo foi objeto de estudo de
caso e a sua evolução e resultados contribuíram para consolidar as práticas e a teoria
da nossa investigação (ver secção 4.2.3).

Resumo – Design thinking refere-se a uma abordagem criativa para lidar com problemas
complexos em contextos de design. Originalmente usado por designers, está hoje ao alcance
de todos, para ser aprendido e empregue nas suas práticas. Para torná-lo acessível e tangível
para quem não é designer, uma série de ferramentas começou a ser desenvolvida e
sistematizada. Entre eles, destacamos um conjunto de ferramentas baseadas em cartas, que
permitem aos indivíduos desenvolver a sua criatividade e gerar conceitos de design
inovadores. Para explorar essas ferramentas e fornecer um cenário para ideias criativas,
desenvolvemos um jogo baseado em cartas – Cards GO – e realizamos sessões de jogo para
avaliar a aplicabilidade deste em conceber outros conceitos de jogos. Avaliamos os resultados
destas sessões a partir de três pontos de vista: (1) dos pesquisadores, por meio da observação
direta; (2) a dos participantes, por meio de um questionário sobre sua motivação intrínseca;
(3) a de três especialistas em design de jogos. No geral, o Cards GO apresenta-se como uma
ferramenta valiosa para design de jogos, pensamento criativo e colaboração. No entanto,
observou-se que os conceitos do jogo resultantes precisam ser mais bem detalhados. (Fava
et al. 2021) 466

2. Raimundo, José, Pedro Cardoso, Miguel Carvalhais e António Coelho. 2020. “Aspects
for Cultivating Creative Literacy Through Play: An analysis on primary literature review
and preliminary laboratorial work” Revista Lusófona de Educação. Lisboa: Centro de
Estudos Interdisciplinares em Educação e Desenvolvimento do Instituto de Educação
da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias.
https://doi.org/10.24140/issn.1645-7250.rle46.07

466 T.A.: “Abstract – Design thinking refers to a creative approach to deal with complex problems in design contexts. Originally
harnessed by designers, it is today within everyone’s reach, to be learned and employed in their practices. To make it accessible
and tangible to those who are not designers, a number of tools began to be developed and systematized. Among those, we highlight
the group of card-based tools, which enable individuals to develop their creativity and to generate innovative design concepts. In
order to explore these tools and to provide a scenario for creative ideas, we developed a card-based game — Cards GO — and
conducted a workshop experiment to evaluate the applicability of the game to conceive other game concepts. We assessed the
results of the workshop from three points of view: (1) that of the researchers, through direct observation; (2) that of the
participants, by means of a questionnaire about their intrinsic motivation; (3) that of three experts in game design. Overall, Cards
GO presented itself as a valuable tool for game design, creative thinking, and collaboration. However, it was observed that the
developed game concepts needed to be better detailed” (Fava et al. 2021).

352
Focada na área das Ciências da Educação, a Revista Lusófona de Educação foi escolhida
para publicar uma revisão de literatura e uma proto-framework para conceber jogos
para aumentar a criatividade, bem como explanar o seu potencial na área a que se
dedica. A publicação contribuiu para consolidar a fundamentação teórica da nossa
framework e os componentes em que consiste (ver secção 2.5).

Resumo – Este artigo inspeciona teoria emergente da revisão de literatura e de trabalho de


laboratório em jogos para o cultivo da literacia criativa. É discutível se os jogos podem ou não
instilar ou alienar a criatividade de alguém. Por um lado, podem ser um campo de exploração
livre de riscos e stress para as pessoas interagirem de formas sem precedentes; por outro,
podem alienar jogadores do mundo real. No entanto, eles têm o potencial de serem
transformados em ferramentas de pensamento, de aprendizagem e para articular
conhecimentos entre indivíduos. Com isso em consideração, identificamos dois grandes
grupos que se ramificam em quatro categorias principais: Comportamentos – compostos por
Atitudes e Competências – e Condições – compostos por Procedimentos e Recursos – que estamos
a estruturar numa framework a partir da qual extraímos hipóteses que são validadas através
de sessões de teste de jogo, a fim de a melhorar.

3. Carvalhais, Miguel, Pedro Cardoso, José Raimundo, e Ricardo Melo. 2019. “Designing
Games That Prioritize Meaning Over Fun.” Contemporânea - Revista Do Programa de Pós-
Graduação Em Artes Visuais - Universidade Federal de Santa Maria 2 (4): 1–8.
https://doi.org/10.5902/2595523341302

A revista Contemporânea foi escolhida por focar-se na análise e atualização do campo


das Artes, e por intersectar outras áreas de investigação. Aqui argumenta-se sobre a
precedência da geração de significado num jogo em detrimento do divertimento que
possa proporcionar. A contribuição para a investigação reside no conhecimento em
equilibrar divertimento e geração de significados na conceção de jogos.

Resumo – A maioria do design de jogos contemporâneo está focada no desenvolvimento de


um círculo vicioso hedónico, uma estética sem fricção que depende de familiaridade e
conforto para promover estados de fluxo e satisfação. Sem desconsiderar as vantagens de
desenhar para o círculo vicioso hedónico, este artigo questiona-o e desenvolve uma crítica
que advoga por um foco na fricção estética, uma mudança na experiência de jogar que dá
prioridade à construção de significado em detrimento da diversão.

4. Raimundo, José, Pedro Cardoso, Miguel Carvalhais, e António Coelho. 2019. “Bully
Who? Theatrical Play and Vicarious Experiences of Doing and Acting with Emotions”
DIGICOM: 3rd International Conference on Digital Design & Communication. Barcelos: IPCA -
Instituto Politécnico do Cávado e do Ave. https://digicom.ipca.pt/docs/DIGICOM2019-
Proceedings.pdf

A DIGICOM: 3rd International Conference on Digital Design & Communication incide nos
desafios do Design e da comunicação digital na sociedade, razão pela qual se escolheu
para apresentar um protótipo de jogo assente na teatralização criativa para
consciencializar para problemáticas sociais. O protótipo apontou a necessidade de

353
maior foco sobre dimensões criativas, e saber como usar assuntos e tópicos de jogo para
que este possa contribuir para aumentar a criatividade (ver secção 5.2.3).

Resumo – A media digital expandiu os horizontes criativos das pessoas ao colocar ao seu
alcance conhecimentos, ferramentas, procedimentos e práticas de Design, mas também
exigiu novas literacias. Os jogos podem estimular a reflexão e a interação de formas
alternativas, além de facilitar a aprendizagem e a articulação do conhecimento entre os
indivíduos, podendo ser valiosos para tais necessidades. Apesar disso, os jogos ainda lutam
para chegar às salas de aula e locais de trabalho como ferramentas para a criatividade, pois
os educadores não estão preparados para os usar para tais fins, o que limita seu uso em
âmbito e substância. Pensando nisso, desenvolvemos o Bully Who?, um protótipo de jogo
analógico para que os jogadores aprendam a lidar com o bullying de forma criativa, atuando
como palco para encarnar os papéis de agressores e vítimas, consciencializando os jogadores
sobre suas emoções e consequências envolvidas. Para verificar a viabilidade, usabilidade e
potencial, recorremos a sessões de jogo envolvendo uma pequena amostra de vinte e cinco
indivíduos socialmente diversos. Este estudo ajudou-nos a tirar várias conclusões: 1) simular
ações corporificadas e dramatizadas aumenta a consciência das próprias emoções e ajuda a
especular sobre o estado dos outros – algo valioso para cultivar a inteligência emocional; 2)
os jogos teatrais podem ajudar a estabelecer uma atitude favorável ao aprendizado baseado
em jogos; 3) os jogos podem servir de base para estabelecer uma ponte entre a troca
intergeracional para a resolução de problemas; 4) de acordo com os participantes, o protótipo
tem potencial para ser adaptado para estimular a discussão criativa sobre preocupações
sociais similares. (Raimundo et al. 2019) 467

5. Raimundo, José, Pedro Cardoso, Miguel Carvalhais e António Coelho. 2020. “Encalhado:
Especular, Simular e Criar Num Jogo Abstrato”. Em Actas Do 5º Encontro Sobre Jogos e
Mobile Learning, 347–358. Coimbra: Centro de Estudos Interdisciplinares do Século 20
(CEIS20). http://hdl.handle.net/10316/89364

O 5º Encontro Sobre Jogos e Mobile Learning foca-se na integração entre jogos e


dispositivos móveis para a educação. Foi escolhida para expor a proto-framework inicial,
enquanto método para conceber jogos para aumentar a criatividade com um caso de
uso. Os contributos para a investigação passam pelo uso da framework para prototipar
um jogo para aumentar a literacia criativa e torná-lo acessível e jogável através do
medium digital (ver secção 5.2.7).

467 T.A.: “Abstract – Digital media expanded people’s creative horizons by placing knowledge, tools, design procedures and its
practices within reach, yet it also called for new literacies. Games can encourage reflection and interaction in alternative ways,
and ease learning and the articulation of knowledge between individuals, thus they may be valuable for such requirements. In spite
of this, games are still struggling to find their way into classrooms and workplaces as tools for creativity, as educators are not
prepared to design them for such purposes, which limits their use in scope and in substance. With this in mind, we developed Bully
Who?, an analogue game prototype for players to learn to deal with bullying in a creative way, by acting as a stage for embodying
the roles of aggressors and victims, making players aware of their emotions and consequences involved. To check for viability,
usability and potential, we resorted to play-testing sessions involving a small sample of twenty-five, socially diverse individuals.
This study helped us draw several conclusions: 1) simulating embodied, dramatized actions increases awareness of one’s emotions
and helps speculating on the state of others’ – something valuable to cultivate emotional intelligence; 2) theatrical gameplay can
help establish an attitude favourable for game-based learning; 3) games can act as ground to bridge intergenerational exchange
for problem-solving; 4) according to participants the prototype has the potential to be adapted to stimulate creative discussion on
similar social concerns.” (Raimundo et al. 2019).

354
Resumo – A criatividade é crucial para sobreviver no atual contexto económico: para inovar,
correr riscos, refletir criticamente e atuar para resolver grandes problemas, algo que requer
literacia. A nossa investigação pretende fazer a ponte entre literacia criativa e videojogos.
Usamos videojogos porque são meios computacionais aptos a gerar representações abstratas
e simplificadas para explorar o mundo criativamente, com fins sérios ou em contextos
sociais. Para tal estamos a construir uma framework composta por aspetos para desenvolver
literacia criativa, identificados através de revisão de literatura e estado da arte, e avaliados
com recurso a protótipos de jogos. Atualmente a framework é composta por quatro categorias:
Atitudes, Competências, Recursos e Procedimentos. Neste contexto surge ENCALHADO, um
protótipo de jogo para criar ideias e estórias, através da interpretação dos seus componentes.
Serve para discutir questões que surgiram durante a construção da framework, como a
influência da intersecção entre tecnologias de jogo no desenvolvimento de literacia criativa.

6. Raimundo, José, Pedro Cardoso, Miguel Carvalhais, António Coelho, e João Jacob. 2018.
“Building creative literacy skills through cooperative and competitive gameplay (the
case of See, Hear, Touch no Evil).” VideoJogos 2018: 10th Conference on Videogame
Sciences and Arts. Porto, Portugal: Biblioteca Almeida Garrett.
https://vj2018.fba.up.pt/files/VJ2018-Proceedings-full.pdf

A VideoJogos 2018: 10th Conference on Videogame Sciences and Arts explora a investigação
em videojogos e a intersecção das suas práticas entre a academia e a indústria. A
conferência foi escolhida para apresentar dois jogos que exploram o equilíbrio entre
competição e cooperação e estímulo à sinergia entre jogadores. O caso de See, Hear, Feel
no Evil (2018) permitiu inspecionar o potencial de versões analógicas e digitais, e da
transcodificação entre estas (ver secção 2.5.3) no contexto desta investigação.

Resumo – Este artigo apresenta nossa pesquisa sobre uma framework colaborativa orientada
ao jogo para a literacia criativa, uma capacidade muito necessária para improvisar soluções
no cenário competitivo contemporâneo. Embora a media digital tenha democratizado
ferramentas e recursos, ela também contribui para o risco de alienar o potencial criativo
pessoal e/ou substituí-lo por conhecimentos técnicos, levando a chegar a soluções que não
são criativas, mas simplesmente expressam as capacidades do meio/sistema sendo usado.

Acreditamos que os jogos são capazes de responder a esta questão de forma eficaz, pois são
capazes de gerar experiências voltadas para a troca e articulação de conhecimentos entre as
pessoas, ao mesmo tempo em que são focados em estratégias de resolução de problemas.

Para explorar como os jogos podem ser usados para tais fins apresentamos um estudo de
caso: See, Hear, Touch no Evil. Um jogo multijogador, de roleplay, baseado em turnos, onde
os jogadores são livres para competir, cooperar ou colaborar com a intenção de estimular a
jogabilidade emergente. Escolhemos estas características porque as escolhas criativas
geralmente exigem a capacidade de acomodar perspetivas opostas para desencadear soluções
inesperadas.

355
Concluímos com o facto de que mecânicas de jogo complexas geram esforço cognitivo muito
exigentes para os jogadores, envolvendo a projeção e o estímulo de processos da mente
criativa. Evidências empíricas mostraram que a criatividade pode ir além do jogo em si, uma
vez que a crítica é aceite durante o jogo, algo que pode atrair os jogadores e o público para
assumir o papel de designer capaz de construir novas hipóteses de jogo. (Raimundo et al.
2018) 468

7. Raimundo, José, Pedro Cardoso, Miguel Carvalhais, e António Coelho. 2018.


“POLYOMINOES & AMOEBAS: A collaborative-competitive game” Poster e jogo
apresentado à VideoJogos 2018: 10th Conference on Videogame Sciences and Arts.
Porto, Portugal: Biblioteca Almeida Garrett. https://vj2018.fba.up.pt/files/VJ2018-
Proceedings-full.pdf

Esta publicação sobre o protótipo Polyomino & Amoebas (2018) foi submetida em
formato poster à VideoJogos 2018 pelas mesmas razões do ponto anterior. Permitiu
recolher evidências sobre a importância da sinergia entre jogadores e do design de jogos
simples (ver secção 5.2.4).

Conceito - Este poster apresenta um protótipo de jogo destinado a aumentar a


consciencialização sobre o valor da colaboração para resolver desafios. Para estimular esta
consciência, o jogo permite aos jogadores a liberdade de atingir objetivos a solo ou
combinados como um grupo, ao mesmo tempo que fornece feedback imediato sobre as
consequências de optar por qualquer curso de ação. (Raimundo et al. 2018) 469

468 T.A.: “Abstract – This paper presents our research on a collaborative play-oriented framework for creative literacy, a much-needed
skill to improvise solutions in today’s competitive setting. Although digital media has democratized tools and resources, it also
contributes to the risk of alienating one’s personal creative potential and/or replacing it with technical expertise, leading one to
arrive to solutions that are not creative but simply express the affordances of the medium/ system being used.

We believe that games are able to address this issue effectively, because they are able to generate experiences focused on the
exchange and articulation of knowledge between people, while being focused on problem-solving strategies.

To explore how games can be used for such purposes we present a case study: See, Hear, Touch no Evil. A multiplayer, role and
turn-based game where players are free to compete, cooperate or collaborate with the intent of stimulating emergent gameplay.
We chose this because creative choices often call for the ability to accommodate opposing perspectives to trigger unexpected
solutions.

We conclude with the fact that complex game mechanics generated too much cognitive effort for players, when designing games
for stimulating processes of the creative mind. Empirical evidence showed that creativity can extend beyond play itself, given that
criticism is accepted, something that may draw players and the audience into certain designer roles, able to build new hypotheses.”
(Raimundo et al. 2018).

469 T.A.: “Concept – This poster presents a game prototype aimed at raising awareness for the value of collaboration to solve
challenges. To stimulate such awareness the game allows players the freedom to accomplish goals single-handedly or combined as
a group, while giving immediate feedback on the consequences of opting for either course of action.” (Raimundo et al. 2018).

356
Apêndice C: Toolkit do Protótipo Final

Neste anexo pode ser encontrado o Toolkit do Jogo para a Literacia Criativa, para que este
possa ser replicável. Este Toolkit contém as instruções de jogo, e os respetivos
componentes com indicações para impressão. indicações para os imprimir.

Instruções

Figura D175. Componentes do Jogo para a Literacia Criativa (2022). 176

a) 4 baralhos de cartas com mecânicas de jogo para a criatividade;

b) 4 tabuleiros ações de jogo para a criatividade: Diálogo, Dialética, Tentativa-erro e Sinergia;

c) Posição das cartas mecânicas de jogo para a criatividade

d) post-its

e) Posição das cartas dimensão para a literacia criativa;

f) baralhos com cartas dimensões para a literacia criativa:


Diálogo, Dialética, Tentativa-erro e Sinergia;

g) marcadores: Início, durante e fim;

h) 1 tela de conceção de jogos.

Preparação: Baralham-se os baralhos com as mecânicas de jogo para a criatividade


individualmente, que depois se colocam de face voltada para baixo alinhados com a lateral
esquerda do tabuleiro (a). As cartas dos restantes baralhos com as dimensões para a
literacia criativa são posicionadas com o seu conteúdo visível, alinhadas com a lateral direita
do respetivo tabuleiro (f).

357
Objetivo: Conceber jogos para aumentar a literacia criativa.

Regras

1. O jogo desenrola-se por turnos de jogadores no sentido dos ponteiros do relógio.


Também pode ser jogado a solo;
2. Cada jogador no seu turno retira uma carta dos baralhos mecânicas de jogo
para a criatividade (a), colocando-a com o seu conteúdo visível na lateral
esquerda do tabuleiro ações de jogo para a criatividade respetivo (c);
3. De seguida, se estiver a jogar só, escolhe uma carta das dimensões para a
literacia criativa para associar com a carta anterior (f), colocando-a na lateral
direita do mesmo tabuleiro (e). Se estiver a jogar com mais jogadores, é o jogador
seguinte que escolhe esta carta para o primeiro jogador;
4. De seguida, o jogador em turno elabora num post-it uma associação para um
aspecto de jogo que faça a convergência entre os dois assuntos das cartas. A
associação é uma explicação concreta de como uma contribui para a outra num
contexto de jogo. O post-it é depositado entre as duas cartas no mesmo tabuleiro
(d);
5. Os turnos sucedem-se na sequência prevista a partir da regra 2, podendo
estender-se a outros tabuleiros, conforme as cartas mecânicas de jogo para a
criatividade forem reveladas;
6. Em qualquer momento um jogador pode definir uma das associações como a
atividade inicial do jogo, ou a sua condição de vitória/término. Para tal, deposita
neste tabuleiro o respetivo marcador (g);
7. O número mínimo de tabuleiros a preencher com estas combinações é dois,
podendo haver mais tabuleiros em jogo com cartas que lhes estejam relacionadas,
mas isso aumenta a complexidade do jogo final, o que é de evitar;
8. O jogo é dado por terminado quando os jogadores considerarem ter associações e
fases de jogo adequadas para poderem elaborar um conceito de jogo numa tela de
conceção de jogos (h). 470 Nesta fase os jogadores procuram elaborar nesta tela
aspetos do jogo a partir das associações feitas.

Fim do jogo: O jogo termina quando os jogadores acordarem entre si que têm associações
suficientes para avançar para a elaboração final de um conceito de jogo.

470 Esta tela conceptual de design de jogos foi criada por Nalin Sharma (sem data), que traduzimos para português para efeitos de uso
no âmbito desta proposta de protótipo. Esta tela foi escolhida porque das telas consultadas até ao momento era a mais completa
relacionado várias dimensões empregues num jogo, e incluía instruções para facilitar o preenchimento de cada campo/ aspeto de
jogo. A versão original pode ser encontrada no Anexo C. O seu uso pauta-se pelo Creative Commons Attribution – No Derivatives
4.0 International License. A tela foi acedida a 21 de janeiro de 2022 em http://1pgd.com/download/

358
Materiais para Impressão
Cada um dos tabuleiros ações de jogo para a criatividade seguintes, bem como, a Tela de
Conceção de Jogos e os marcadores: Início, Durante e Fim, e, cada um deve ser impresso
escalado ao comprimento de uma folha A4.

Tabuleiros, Tela e Marcadores

Figura D1. Tabuleiro Diálogo. 177

359
Figura D2. Tabuleiro Dialética. 178

Figura D3. Tabuleiro Sinergia. 179

Figura D4. Tabuleiro Tentativa-Erro. 180

360
Figura D5. Tela de Conceção de Jogos. 181

Figura D6. Marcadores: Início, durante e fim. 182

361
Cartas

Cada conjunto de cartas seguintes, deve ser impresso escalado ao comprimento de uma
folha A4. Após a impressão as cartas são separadas cortando pelas linhas a tracejado.

Figura D7. Cartas Diálogo. 183

Figura D8. Cartas Dialética. 184

362
Figura D5. Cartas Tentativa-Erro. 185

Figura D1.12 Cartas Procedimentos. 186

363
Figura D1.18 Cartas Recursos. 187

Figura D1.14 Cartas Competências. 188

364
Figura D9. Cartas Sinergia e Atitudes. 189

365
(página em branco)

366
Apêndice D: Extended Abstract

367
(página em branco)

368
Introduction
Creativity can be learned and augmented by using techniques that break with
conventional thinking and help us to generate new ideas (de Bono 1993). Creativity can
also occur both unexpectedly and voluntarily (Boden 2004) as it depends on personal
qualities, knowledge and skills grounded in a field of knowledge, as well as the
evaluation of individuals within that field (Gardner 1993). Because creativity is an
essential ability to thrive in all spheres of individual existence and an economic and
civilizational driving force, it must be nurtured in early classrooms. Unfortunately,
today's education still rigidifies the individual personality (Starko 2010), something
that can be counteracted by stimulating individuals to increase their number of creative
acts so that this becomes a desirable habit (Ribeiro 2018).

Literacy provides individuals with flexibility, something crucial today in the global
economy (Starko 2010). Being literate means understanding the world through written
and oral forms and rewriting it by articulating personal life experience, reason, and
everyday practices (Freire 2005); for example, knowing how to use critical reasoning
and mastering digital or analogue ways to construct meanings (Beavis et al. al. 2009).
In turn, new literacies, span multiple disciplines and modes of expression, allowing
the creation of all kinds of meanings (Kress 2005). Games are also modes of expression,
which is why they can bridge new pedagogies as they are able to complement the
education of literacies and the construction of new meanings in a sustained and fun
way (Gee 2004a).

With the notions of creativity and literacy in mind we arrive at creative literacy, which
we define as the ability to augment creativity. Creative literacy allows us to develop our
own identity, versatility, and will to act to respond to sociocultural, professional
expectations (Kiosses 2019). For example, having ideas for writing requires an
inquisitive attitude and the willingness to learn facts about reality by relating them to
educational materials through reasoning, imagination, and creativity (Masie et al.
2017). Further, our notion of creative literacy is linked to the concept of Creative Game
Literacy due to the interactive nature of games, which allows players to decode
information and learn in an integrated way. Both designing games and playing them
require creativity and critical thinking, therefore games can facilitate personal
development (Qian and Clark. 2016). This potential led us to define game within the
boundaries of this research from the notions of game space (Gray et al. 2010),
interaction (Costikyan 2015) and rules (Anthropy 2012): A game is a space apart from
everyday life with rules that define what can be done, information or objects to
interact with, and objectives to achieve.

369
In a nutshell, creative literacy combines creative production with education for media
literacy to lay a fundamental ground for people to cultivate holistic knowledge, reflect
better, challenge conventions and understand and transform all sorts of texts, and
games are modes of expression that we choose to cultivate this knowledge.

Problem Statement
Although creating is something we do naturally to a certain degree (Boden 2004), it
takes a continuous effort to embrace the change, which is what allows us to create new
things (Michalko 2003). The act of creating benefits from the pervasive context of
current digital media, in which games are included, a context that, according to Ricardo
Melo, allows the discovery of casual information, thus becoming a field of creative
opportunities for individuals to explore (2018). We chose games because they are
procedure-based systems (Bogost 2007) that players can exploit to stimulate their
creative actions and therefore to augment creative literacy. This possibility of
experimenting with procedures can improve the players' ability to deal with problems
in creative and serendipitous ways (Melo 2018). Further, many games are fun and
integrate deep meanings feeding players' motivation (Koster 2003; Frasca 2007).

This research intends to contribute to augmenting creative literacy through the act of
playing games, that is, to enable players to augment their creativity.471 The motivation
to augment creative literacy is grounded on the desire to fulfil ourselves through
creativity, to develop the player's knowledge through critical reflection stimulated by
game experimentation. Based on these considerations, we arrived at our main question:
How can games be used to augment creative literacy, and how can they be designed for such
purpose?

This main question is followed by a list of secondary questions:


a) What game mechanics or articulations between them can stimulate creative
actions?
b) What are the actions that provide space for creativity to occur in a game?
c) How to converge mechanics and actions into game flows that stimulate the
occurrence of creativity?

471 The notion of creativity adopted here is that of Margaret Boden “Creativity is the ability to come up with ideas or artefacts that
are new, surprising and valuable.” (Boden 2004, 1).

370
d) What are the dimensions resulting from these game flows that can augment
creative literacy? 472

Objectives

The previous questions guided us toward the following objectives:


1. Design a framework to analyse and design games that increase creative literacy
using:
a. Game mechanics that encourage the execution of creative acts by
players;
b. Game actions that stimulate behaviours or the adoption of creative
postures in players;
c. Dimensions of creative literacy that emerge from game mechanics and
game actions;
2. Using the framework, design and prototype games that explore the increase in
creative literacy.

Methodological Framework and Strategy


The method that we chose to design games to augment creative literacy is Design-Based
Research, because it reciprocates theory and practices while aiming at usability and
suitability for specific contexts (Wang and Hannafin 2005). This choice is also rooted
in the researcher's life experience because games played a leading role in his
development as an individual, namely in creative terms. This practical experience,
allied to a medium that, like other art forms, is prone to creativity, suggested this as a
process that can benefit other people. The general methodological strategy is similar
to the one adopted by Pedro Cardoso (2016), in which the researcher assumes roles
according to the tasks to be performed, to help plan the work and understand the object
of study from multiple perspectives:
• The player masters games through interaction in a process similar to all literacies;
• The developer codes game prototypes based on feedback from players, observers,
facilitators and communicators;
• The observer tests games and records his and other players' experiences in
objective ways, something critical for analysis. The observer is immersed in a game
critically and consciously, which helps to obtain data from play experiences;
• The researcher analyses gaming experiences through observation reports,
theoretical research, and walkthroughs;

472 This study focuses on dimensions tied to game mechanics and actions, however, the dimensions of the individual also play a key
role in facilitating and inhibiting creativity.

371
• The facilitator draws clear and concise information from the researchers' work to
help guide game experiences, often coordinating this role with that of the
observer;
• The communicator shares knowledge and information gathered by previous roles
through lectures, classes and workshops.

This strategy was chosen because game analysis requires a multifaceted and
exploratory approach, different from other mediums (Roth 2017). This strategy can still
introduce bias in our collected data because it is focused on a set of dimensions, and is
subject to our interpretation, in spite of this we tried to carry a rigorous analysis.

Theoretical Research

Our literature review focuses on researching theory in two main areas: creativity and
creative literacy. These areas were chosen for their potential to reveal aspects to
augment creative literacy. To guide this research, we used the procedures outlined in
Figure1.

→ →
STEP 1. STEP 2. STEP 3.
Literature review Identifying case studies Game analisys

Find keywords to narrow Search for game case To analyze the games
our research in phase 2. studies to analyse in phase obtained in phase 2, we
3 by using the previous sought, through close
keywords in online search readings, game mechanics
engines and game vending with potential to stimulate
platforms. creative acts, to serve as a
starting point for our
practices.
Figure 1. Diagram of theoretical procedures.

More specifically we explored:


5. How creativity and intelligence complement one another, the influence of
reason, emotion and expression in creative acts, the relation of such to culture,
society and individuals, and, solo and joint creation. This exploration helped us
to develop a definition of creativity within the scope of this investigation as a
ground for researching the next step;
6. Definitions and perspectives about literacy, the conditions, and methods for
teaching the individual to be creative, and the instruments for assessing
creativity. With these notions in mind, we developed a definition of creative
literacy within the scope of this research, to sort out the exploration of the state
of the art in games, focused on the next step;
7. Perspectives on games that augment creative literacy and game characteristics
that stimulate creative acts. This exploration allowed us to reach some
preliminary conclusions, i.e., game aspects aligned with the questions and

372
objectives within the scope of this research;
8. Sampling games by looking for academic publications in search engines and
video game vending platforms. Searches were carried out using keywords
pinpointed by our literature review, which we combined with boolean
operators. To this end, we adapted the technique of close readings,473 a type of
literary analysis for extracting meanings by examining how language is used in
complex texts (Snow and O'Connor 2013), which we used here to analyse video
games (Bizzocchi and Tanenbaum 2011). Here, close readings involve playing
to inspect game mechanics with potential to stimulate creative acts.

Research Practices

Our practical component involved procedures to research and to analyse case studies,474
and a protocol to develop and analyse game prototypes (Figure 2.).

→ →
PHASE 1. PHASE 2. PHASE 3.
Case study analysis Exploratory prototyping Prototype analysis

To analyse games To develop game To analyse prototypes


pinpointed by theory we prototypes we used the we used the following
used the following following procedure: procedure:
procedure:
1. Use Game Mechanics for 1. Inspect mechanics
1. Play and observe Creativity revealed in revealed in PHASE 2. to
2. Identify; step 1; understand their
3. Verify; 2. Low resolution relevance for
4. Correlate. prototyping (often in co- augmenting creative
design); literacy;
3. Improve prototypes; 2. Analyse how mechanics
4. Observe players playing from step 1 are included
these prototypes; in games, and what are
5. Return to step 1. the dimensions for
creative literacy they
stimulate;
3. Look for relations
between prototype
mechanics and their
respective results;
Figure 2. Diagram with practical procedures.

To identify case studies, we searched for keywords pinpointed by the theoretical


component. The overall strategy for inspecting case studies for game mechanics that

473 In literary studies close readings are a type of literary analysis centered on the linguistic and stylistic functioning of texts. In our
research, close readings are applied to video games as we seem them as interactive texts. The analysis procedures are as follows:
1) first, play the game while having in mind questions elaborated in the context of this research. As one reads, try to find moments,
aspects, conditions, rules or game dynamics that relate to that question, or that bring up relevant issues; 2) play again, this time
focusing on what was important in the previous step, noting precisely what is relevant; 3) examine the resulting aspects closely,
what patterns or ideas emerge? In this step, literal or metaphorical aspects can be revealed, as well as a diversity of perspectives;
4) based on these findings try to elaborate an answer to the initial question. This answer should reflect personal deductions,
speculation, and focus game particular issues; 5) build an essay around this answer using what has proved relevant to support it,
as an in-depth analysis of a few topics has more force than several topics observed superficially (Ceia 2009).

474 Case studies are detailed studies on a specific subject, often involve qualitative methods, and aim to clarify aspects of research,
challenge or sustain theories, resolve questions or inform research opportunities, based on a broader view of the case (McCombes
2019).

373
stimulate creative acts involved the next procedure:
5. PLAY to experience games first hand and OBSERVE games being played to note
reactions or phenomena provoked in players;
6. IDENTIFY game mechanics for creativity from step 1;
7. VERIFY if the mechanics in point 2 were recurrent across the analysed games,
or if combinations of these mechanics appeared in the whole sample;
8. CORRELATE patterns that emerged in step 3 to distinguish game actions for
creativity.

In turn, game development involved the following protocol:


6. Use game mechanics for creativity found in case studies as a starting point to
develop game concepts and prototypes;
7. Low fidelity game prototyping;
8. Improving prototypes and their respective instructions developed in step 2 by
drawing on results of game sessions;
9. Observe players playing these games to collect their feedback and to make
improvements;
10. Return to step 1 to develop new games with other mechanics.

…and the respective analysis procedure:


4. DESIGN games based on game mechanics for creativity revealed throughout our
literature review and case studies analysis;
5. ANALYZE how mechanics are integrated in each developed game, and the
dimensions for creative literacy that they can foster;
6. LOOK for correlations between mechanics and the results they can provide
among the game sample.

In short, our practices were guided by prototyping games with mechanics, actions and
dimensions mentioned in the previous procedures. The iterative prototyping process
often resorted to co-design, and we facilitated workshops tied to this development, by
collaborating with students and researchers working in areas of knowledge close to
ours. Most of the developed prototypes are low-fidelity analogue games to respond in
a timely manner to the requisites of this investigation. This choice was made to avoid
obstacles that could make prototyping difficult. Such obstacles are also the core
differences between analogue and digital games within this research scope:475 a) we
don't have programming skills to develop digital games, so, it would be more feasible

475 As with prototyping, the analysis was aimed at analogue games, however, we also analysed digital games to support digital
prototyping. These digital games were chosen so as not to pose difficulties to the respective analysis, that is, the obstacles
mentioned above.

374
to design and refine analogue games; b) Analog games have socializing characteristics
that can be witnessed first-hand, that is, they allow us to obtain faster and more direct
information about players' experiences and their respective creative actions in real
time.

Development
The thematic nature of this research seeks to develop a framework with a ludic
character, as we are focused on establish guidelines to develop games that respond to
the research objectives. We chose games because they have the potential to foster
synergy between players (Koster 2003), as they can benefit from the computational
power of game systems, which add to the semantic and ontological human
contributions (Boden 2004; Sautoy 2020). This interpersonal connectivity supported by
games should promote environments favourable to the exchange of information,
environments that, according to Steven Johnson (2010), are where innovation occurs.

The Proto-framework

Our preliminary literature review revealed several aspects aligned with issues and
objectives within the scope of this research. Such evidence led us to conclude that the
definition of creative literacy depends on the adoption of Behaviours that, in turn,
depend on Conditions. Behaviours can be defined as the way a person acts or behaves,
and emerge from the interaction between Attitudes, ways of thinking or feeling about
things or environments that affect the way of acting,476 and Competencies, skills that
allow us to perform certain actions.477

Conditions consist of an ecology of contextual factors, often linked to the


circumstances or configuration of the environment where creative acts take place, and
which therefore affect the way a person behaves. Conditions consist of Resources,
physical, digital or knowledge means available to explore and experiment to develop
skills to act, and Procedures, ways of doing or acting. These dimensions were
categorized in the proto-framework (Raimundo et al. 2020) reproduced in Figure 3.

476 Attitudes range from the willingness to learn, exchange information, collaborate, and develop critical thinking to evaluate ideas.
Such postures can broaden our horizons as they encourage us to learn skills and access resources to generate associations between
subjects to face circumstances or to innovate.

477 Competencies can be the sensitivity to identify things important to creative processes by using specific modes of reasoning, such
as metaphoric and divergent thinking, or expressing our opinions or the meanings we find when interacting with the actual and
digital world.

375
Figure 3. Proto-framework diagram (2020).

Core Categories and Structure

Meanwhile, our concurrent game review allowed us to relate this proto-framework’s


dimensions into game actions for creativity categories478 that can help design and
analyse video games to augment creative literacy, that we describe next:
• DIALOGUE is a conversation between game agents (Crawford 2003) whose stages are
forms of conversation aimed at specific creative literacy goals. Dialogue occurs
between the actions used by the player to understand and deal with the game, and
the designer's creative process that generate games for the players, or something
created by these in the course of the game;
• DIALECTIC emerges from the dialogue between rhetoric, the arguments that games
use to convince players about the value of their subjects, and criticism, an active
way for players to question or agree with such a perspective, sustained by reason;
• TRIAL AND ERROR479 is crucial for negotiating and sustaining dialogue and dialectic,
it occurs between actions that allow to overcome the opposition of the game and the
processes through which the player acquires personal competences by failing (Juul
2013);
• SYNERGY is the alignment of game agent forces when it is needed to create
something beyond the reach of a single player in a solo game, an alignment
motivated by individual interests, goals, or values.480

478 We employed different fonts to help distinguish the components of our framework throughout this document (the variables in bold
and their respective possible values to be regular), e.g.:

• Game mechanics for creativity and their values, such as grid movement, pattern recognition or
chance-taking;
• Game actions for creativity and their values, such as Trial-and-Error, Synergy Dialectic and Dialogue;
• Dimensions for creative literacy and their values, such as Divergent Thinking, Peer Dialogue or Common Space.
479 The term Iteration points to the repetition of a game process, which may not translate into progress in the game or the exchange
of different arguments by different agents in a dialectic or game dialogue. With this in mind, we opted for the term trial and error
as it points to the reciprocation of different arguments to make discoveries, new solutions, or the reinvention of the game process.

480 Acting solo or collaborating are attitudes that oppose, resist or make game artifacts compatible, and therefore produce the social
friction necessary to unveil something new. This friction can only emerge from the conflict of individual interests, like
preconceptions, ideals to be achieved sustained by culture, and personal interests. Being able to distinguish personal motivations
requires an introspection about our intuition and emotions, something crucial to persist in creative processes.

376
Conclusions drawn from case studies and prototype analysis consolidated these
categories as privileged components for our framework, and relations between them
and the proto framework's dimensions for creative literacy were also found. Further,
by comparing the operations of case studies and prototypes with game board
mechanics,481 we also pinpointed 4 categories of game mechanics for augmenting
creative literacy. Finally, all these categories and their relationships converged in a new
cyclic model (Figure 4).

Figure 4. Model illustrating how the game cycle occurs between behaviours, conditions, and their
respective components.

In this model, we relate Procedures to trial and error, as chance taking is a recurring
mechanic in some games (a total of 14 occurrences in 35 games). Trial and error may
involve: taking a chance; acting in a calculated way to reveal something; using
random systems such as Rock-Paper-Scissors; deciding when to use abilities
gained once per game; validating the game through victory points; recording the
most tangible outcome or game process with paper and pencil.

We associate Resources with synergy as they are states that allow players to relate with
the game system, therefore increasing the possibility of generating ideas. Synergy
involves cooperative play to take advantage of occasional and lasting mutual
assistance, or solo play, to test the limits and benefits of previous states and learn how
these can manifest themselves even when not apparent.

We relate Competencies to dialogue because, as with creativity, it requires a minimum


of intelligence, and because decoding the content of a game and its interaction requires
a minimum of player-game dialogic skills. Dialogue involves: limiting player
movement, as found in grid movement mechanics; take advantage of multiple
contributions to create something together or reflect on the use of game pieces in a
progressive turn order; streamlining the game with random turns determined by
relevant contributions; different departure or arrival points by means of a variable
startup; building playing decks as a primary form of interaction; building game

481 Mechanics were drawn from the Board Game Geek website, which was chosen because it is classified by other websites as being a
reference in the field of board and card games. Also, this website provides opinions on such games and a wide and structured list
about their mechanics. Website accessed July 6, 2021 at: https://boardgamegeek.com/browse/boardgamemechanic.

377
patterns to reinvent it.

We connect Attitudes with dialectic as the former can stimulate the reciprocation of
arguments between players, and between game and players. Dialectics involves:
dealing with the serendipity and randomness of events that introduce new states into
the game; recognizing patterns built by players (or game systems) for developing or
transforming things inside the game; checking what can happen in a game simulation
in order to criticize what is good or bad and feed dialogue with new arguments;
negotiating game arguments and voting on their relevance; generating storytelling,
conceive narratives in collective processes influenced by different players; and role-
playing, playing a character to see the world differently.

The unidirectional character of the early proto-framework limited the articulation of


its components, and therefore, the execution of game states for different purposes.
This limitation led us to realize that stimulating behaviours for increasing creative
literacy requires a multidirectional convergence of categories in different cycles (Figure
5).

Figure 5. Diagram with cyclical relationships between the game actions for creativity.

The cycle follows this sequence: 1) the game engages in dialogue with the player, a
conversation that can go beyond the game's issues; 2) a game communicates a position
on issues, a rhetoric or criticism, which tends to lead to the exchange of arguments in
a dialectic, the player's interaction with the game; 3) this interaction is streamlined
between game agents through trial and error, giving rise to states between risking and
doing; 4) and it is in the friction generated by the interests of players and of games
that possibilities for creative synergy between players, designers and game can be
found. As stated, game cycles may not follow this order because they can reciprocate a
multiplicity of dimensions for creative literacy and game mechanics for creativity in

378
diverse processes and sequences that feed back into each other. Our framework is
therefore comprised of all these components structured in table 1.

Table 1. Relationships between game mechanics for creativity, game actions for creativity and their
respective resulting dimensions for creative literacy.
Dimensions Conditions Behaviours
for creative
Procedures Resources Competencie Attitudes
literacy
s

• Destructive • Collective • Self- • Risk taking


Creativity Knowledge adaptation • Dialoguing
• Chance and • Common • Empathic • Confidante
Serendipity Space Thinking
• Collaborativ
• Iteration • Computation • Parallel and e
• Open al Power Lateral
Thinking
• Inquisitive
Questioning • Prototypes
• Metaphorical • Attentive
• Peer • Representatio
Dialogue ns and • Ludic
• Synergy • Memory
Analogical • Resilient
Thinking • Intuitive
• Divergent • Subversive
and
Convergent
thinking

Game Trial and error Sinergy Dialogue Dialectics


actions for
creativity

Game • Skills gained • Cooperative • Grid Movement • Events


Mechanics once per game game • Progressive • Pattern
• Taking • Solo Game Turn Order Recognition
for chances • Random turns • Simulation
creativity • Rock Paper • Variable • Negotiation
Scissors startup • Voting
• Victory • Deck • Storytelling
Points construction • Role-playing
• Paper and • Building
pencil Patterns

Framed by continuous lines are the dimensions of the early proto-framework and their
respective aspects. Framed by broken lines in the same columns are the privileged
variables, the game actions for creativity, and immediately below, the game mechanics
for creativity that correspond to them. All subcategories have the potential to be
related to one another, e.g.: the mechanics can be applied according to the intended
game result, as they approximate actions for creativity and specific dimensions to
augment creativity.

Conclusions
Grounded on the previous table we developed a visual representation of our framework

379
to make its operation more intuitive (Figure 6).

Figure 6. Diagram of our framework showing a game flow between mechanics for creativity,
actions for creativity and dimensions for creative literacy.

This framework is the answer to our primary research objective: A framework to analyse
and design games that augment creative literacy. The framework's potential lies in the link
between creativity and the player's game actions, as, according to Meskin, both focus
on problem-solving (2018). Also, it may be interesting to articulate the framework
components with James Gee's game design principles so that video games are accepted
as valid contributions to education (2004a). Still, changing this mindset about what
games can do forces you to debate the issue, which requires a game design grammar.
Because articulating our framework's components can help design games, they also
have the potential to expand Anna Anthropy's and Naomi Clark's game design
grammar (2014), widening the notion of a game as something that goes beyond the
sum of its parts.

In other words, our mechanics for creativity expand the vocabulary to rethink what
a game can be, our actions for creativity allow us to generate a diversity of games beyond
the conventional ones, and our dimensions for creative literacy enrich the cultural value
of a game with what it can bring in terms of creative discussion. How these categories
relate to one another allowed us to reach objective 1.a: encouraging the execution of
creative acts and the adoption of creative postures by players. Such acts and postures are
anchored in the dialogue category, through the conversation stimulus that emerges
between game agents. Objective 1.b is achieved through dialectics as it stimulates
arguments and critical reflection on game issues that prepare players to perform creative acts
in and out of the game. Objective 1.c is attained through synergy, by fostering
collaboration between different players with unique backgrounds and personalities to expand
creative possibilities. Trial and error complement the categories in all secondary
objectives, allowing experimenting and reciprocating ideas in players' conversation,

380
i.e. counter-argue or collaborate to refine ideas. These categories are also visible in the
results provided by game prototypes conceived during this research, so these categories
are the answer to our secondary objective, as they can be used to design and prototype
games that augment creative literacy.

Analysis and Concept Tool

For game analysis purposes, this framework allows to visualize an area of influence
that spans into the previous categories, something that we exemplify with Design and
Improvisation: Letterform (2021), a game for co-creating fonts and stimulating creative
thinking. We illustrate the components of this game in Figure 7, and then we also
instruct how it works.

Figure 7. Design and Improvisation: Letterform (2021) prototype: 1) mainboard; 2) regular dice; 3)
custom dice; 4) player identifying tokens; 5) pixels to build letters.

Components
The game consists of: 1) a board for iterating characters surrounded by a path to
record the players' progress; 2) a custom dice to determine aspects of the letters
to work ; 3) a regular dice to determine the number of letter pixels to work with;
4) Tokens to identify players; 5) pixel units to build letters (Figure7).

Rules
• The game is played in turns, starting with the youngest player and followed by
the remaining players in a clockwise order;
• Each player rolls the regular dice first to obtain the number of pixels to work
with and then rolls the custom dice three times to choose one of four aspects of
the letter to work on: a) Basic letter shape; b) Weight, strength or fragility; c)
Size, occupied area; d) Balance, symmetry or asymmetry; d) Unpredictability (a
self-proposed aspect);
• The player manipulates the number of pixels to build or to transform letters,
symbols or numbers according to the chosen aspect. Players work on top of each

381
other's contributions, adding, subtracting, rotating or overlapping pixels;
• The player's score is incremented each turn by calculating the sum of pixels
obtained with the 1st roll, to the aspect value of the 2nd roll. This sum allows
positioning the player's identifying token on the numbered path.

Victory conditions
The game unfolds until one player reaches the end of the path or until all players
consider the current result satisfactory. Otherwise, players return to the starting
point and keep iterating the letter.

Design and Improvisation: Letterform (2021) has simple rules for its players to create
multiple variations of letters or letter families. The flow for this game is detailed in a
diagram in the Figure 8., that correlates game mechanics for creativity, game
actions for creativity, the dimensions for creative literacy both work and their
contributions for augmenting creative literacy.

Figure 8. Game mechanics for creativity, game actions for creativity, dimensions for creative
literacy and their contributions for augmenting creative literacy in Design and Improvisation: Letterform
(2021).

The game starts with the synergy between solo play and cooperative play to energize
its actions. The game's dialogue is guided by a conversation with a variable start, by
building patterns according to players interests, in a progressive turn order to expand

382
co-creation efforts. Each player, in his turn, strikes a dialectic with the game to carry
pattern recognition of new game artifacts. This recognition allows the player to earn
victory points through trial and error, and from this step the game cycle returns to the
starting point.

Besides the potential for analysis, our framework also provides structured categories
to conceive games framed by this research, a vein that led us to propose another tool,
a game prototype to design games, The Game for Creative Literacy (2022).482 This game is
a practical implementation of the framework, to use its components as game elements
to generate new games that augment creative literacy in specific areas of interest. This
game requires players to generate associations within the range of game actions for
creativity. Such actions are articulated between game mechanics for creativity and
dimensions for creative literacy, and then it is decided how and when they take place
in the intended game flow. This flow is organized by committing the actions into the
fields of a game concept canvas, a document for converging the design aspects of a
game. Next, we illustrate this game’s components in Figure 9, and describe how it
works.

Figure 9. Game for Creative Literacy (2022) components.

Game components

482 The components for this game can be found in our thesis in Appendix D.

383
i) 4 decks of game mechanics for creativity cards;
j) 4 game actions for creativity gameboards: Dialogue, Dialectic, Trial and error and
Synergy.
k) Placement for cards: game mechanics for creativity;
l) Post-its;
m) Placement for cards: dimension for creative literacy;
n) Conditions and Behaviours decks, consisting of dimensions for creative literacy;
o) When and where markers: start, during and end;
p) 1 game design canvas483

Preparation
Shuffle the game mechanics for creativity decks placing them face down in the
left side of each game actions for creativity gameboards (a). The remaining card
decks with dimensions for creative literacy are placed with their content visible,
in the right side of their corresponding gameboard (f).

Objective
Design games to augment creative literacy.

Rules
9. Players take their game turns in a clockwise order. The game can also be played
solo;
10. Each player, in their turn, takes a card from the game mechanics creativity
deck (a) and places it with its contents visible on the left side of the respective
game action for creativity gameboard (c);
11. Next, if playing solo, the player chooses a card from the dimensions for
creative literacy deck and places it on the right side of the same gameboard
(e), to generate associations with the card on the previous step (f). If the game
is being played by several players, it is the next player who chooses this card
for the player in turn;
12. The player in turn generates an association on a post-it, a game aspect that
converges both card subjects. This association should be clear about how it
contributes for the game process. The post-it is placed between the two cards
on the gameboard (d);
13. Player turns follow the previous sequence from rule 2 and can extend to other
gameboards depending on revealed game mechanics for creativity cards;

483 This game design canvas was adapted from one created by Nalin Sharma (n.d.) and was chosen because it is comprised by many
game dimensions whose explanation is straightforward. The original can be found in our thesis in Appendix C. Its use is guided by
the Creative Commons Attribution – No Derivatives 4.0 International License. The canvas was accessed January 21, 2022 at
http://1pgd.com/download/

384
14.Players can set their associations as start, during and end game conditions at
any time, by placing the corresponding marker (g) on the respective concept
canvas field;
15. The minimum number of gameboards to be filled with associations are two.
The more gameboards are filled with associations, the more complex the game
will be, something to be avoided.

End
The game ends when players have established enough phases on the game design
canvas (h) to develop a game concept. In this step, associations are further
elaborated if they are still unclear.

Limitations

Players can lose their motivation to play depending on how they perceive the games
created with this framework, this is because increasing creative literacy requires effort
and commitment on their part. As such, games produced with our framework are
restricted to a precise use scope, to respond to creative tasks or to execute something
in a different way. In other words, the framework is useful to design: a) individual
games targeted at different stages of creative projects; b) games for complementing
pedagogical curriculums with creative literacy, to help educators encourage the creative
constructions and actions of their students.

Future Studies

Each of the frameworks’ dimensions is broad and deep, which can lead to complex
game designs, something to be avoided as simpler games can help players to focus
better on augmenting their creative literacy. This complexity is also the reason why
these dimensions deserve a more individualized and thus more circumscribed study.
That said, augmenting creative literacy depends on these dimensions, and, on
connections between the games created with it and concrete situations, to take
advantage of players’ individual perspectives to augment creative literacy.

This focus on the player along with the need to develop creative literacy from an early
age, frames our target audience: higher education students. Besides students we also
consider designers, because it is the researcher's discipline and one that can benefit

385
most directly from the contributions of this research. In this sense, some prototypes
were used by students and others by design professionals, showing potential for both
audiences.

The SARS-Covid 19 pandemic also imposed restrictions forcing us to adapt our work
plan to be fulfilled in these new circumstances. These restrictions turned out to be
timely as they accelerated the design of games in co-creation, and the development of
simple instructions to ensure they could be played remotely. 484
In other words,
prototyping became faster, simpler, and more objective within the intended scope of
creative literacy. With this research’s limitations in mind, next we propose several
future studies to keep experimenting with games for augmenting creative literacy and
improve our framework.

Studying the impact of the use of our framework on players' lives in alternative
contexts to those studied in the scope of this thesis by analysing the receptivity and
use of the framework by those beginning or with long-term careers, and the impact in
team building in professional contexts given its co-creation nature. Such impact will
vary according to the area of activity and expected contributions from creative literacy,
and given the growing importance of games as tools to boost creativity, it is expected
that this framework brings benefits to professional niches that need it. Those niches
are e.g.: business incubators, startups, individual entrepreneurs, or even research
laboratories connected to academia or industry or serving as an interface between the
two.

Analysing game mental models can reveal new dimensions for augmenting creative
literacy, this because players interpret the game designer's intentions in the light of
their own experience and emotions. This personal experience allows player to create a
System Theory (Carvalhais and Cardoso 2021), 485 a mental model that branches out
diverse simulations of the same game. In the same way that these game simulations
spring from the players' mental models, they can also simulate game mechanics for
creativity, game actions for creativity, and alternative dimensions for creative literacy
that the designer would not otherwise be aware of.

Studying the obstacles arising from game design that prevent augmenting creative

484 Some prototypes were used in workshops during the pandemic, so we were forced to restructure them to operate remotely, and
simultaneously, to be integrated into classroom contexts to help teams of students to devise answers for their projects. These
workshops involved teams of students in the Curricular Unit of Graphic Systems and 3D Animation with Stone Paper Scissors versus
Game Character Design (2021), and in the Curricular Unit of Digital Games with Checkers versus Video Game Design (2021). Both
workshops took place at the Faculty of Engineering at the University of Porto. The operation of Checkers Vs Video Game Conception
(2021) can be consulted in detail in our thesis in chapter 5 section 5.2.12. Rock Paper Scissors Vs Game Character Design (2021)
can be found in chapter 5 section 5.2.15.

485 Our translation from the original terms in Portuguese: “Teoria do Sistema” (Carvalhais and Cardoso 2021).

386
literacy, because during the investigation we looked for aspects of games that augment
creative literacy and came across others that undermine this objective. Therefore, it is
equally important to study what does not work, such as: a) games too complex or with
unclear instructions; b) games that prioritise their solution or to too much focus,
preventing the player from opening up to their experience; c) games that discourage
the player from trying again, that feed preconceived ideas, or are limited to certain
ways of acting; d) games designed with a restricted design vocabulary that prevents
innovation.

Expanding game design vocabularies, as these are seen here as language foundations
to talk about new game designs, and to improve communication between creators and
their individual development (Anthropy and Clark 2014). For example, trial and error
allows making unexpected associations that add to the player's creative vocabulary,
while synergy allows co-creating vocabularies through the confluence of different
players' game perspectives on the same game. Using vocabularies to create new game
designs depends on behaviours and conditions that emerge from dialogue and
dialectics, which in turn are sustained through trial and error and synergy.

Developing and studying The Game for Creative Literacy, because its effectiveness as a
game design method remains to be demonstrated, hence the need for a longitudinal
study involving developers, designers and students working in this research area.

Studying the effects that emerge from transcoding analogue to digital games to
consolidate the relevance of the framework as a tool to create games that operate in
different media and to research divergent effects. We propose this study because,
although our prototyping process was mainly focused on the development of analogue
games,486 the revealed framework principles are also valid for digital formats. E.g. See,
Hear, Touch no Evil (2018) was developed in both formats which, despite being governed
by the same mechanics, provide different experiences.

Studying more cases of games that use artificial intelligence (AI), as this will allow us
to better understand the influence of AI on game mechanics for creativity, the game
actions for creativity that they trigger, and finally the dimensions for creative literacy
that increase. In other words, by using AI in addition to the dimensions of our
framework we can design game prototypes with new aspects to augment creative
literacy.

486 The reasons for focusing the development of analogue prototypes are as follows: 1) we didn't know how to program; 2) the
development of digital prototypes is more time consuming than the development of low-fidelity and paper prototypes; and 3) we
needed agility to explore, test and reformulate prototypes.

387
Creating games with dimensions mediated by artificial intelligence is a line of study
that explores the possibility for human players to be assisted by AI to augment their
creative literacy, e.g. AI would pinpoint game mechanics for creativity, or categories of
actions for creativity to be employed by the game to span new dimensions for creative
literacy. A similar mediation process is embedded in Why Are We Like This? (2020), 487 a
game whose objective is for its players and game system to co-create stories.

Acknowledgements
Advisor: Pedro Cardoso, Universidade de Aveiro

Co-Advisors: Miguel Carvalhais, Faculdade Belas Artes da Universidade do Porto;


António Coelho, Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto

This research was developed with the financial support of Fundação para a Ciência e
Tecnologia (FCT), with a grant with reference: SFRH/BD/137169/2018.

487 Why Are We Like This? (2020) can be consulted in our thesis, in chapter 4, section 4.2.4.

388
Anexos

389
Anexo A: Conteúdos de Autores Referenciados no Capítulo 1

Figura A.1. Diagrama da influência das emoções na criatividade (Ivcevic e Hoffman 2019). 190

390
Anexo B: Conteúdos de Autores Referenciados no Capítulo 2

Figura B.1. Diagrama original do New London Group (1996), Multiliteracias: algumas metalinguagens
para descrever e interpretar elementos de design enquanto modos de significado.191

Figura B.2. Diagrama original de Mary Kalantzis e Bill Cope (2004), “Pedagogia como conhecimento
em ação”, Multiliteracias: algumas metalinguagens para descrever e interpretar elementos de design
enquanto modos de significado.

391
Figura B.3. Tabela original de Gary A. Davis, que sistematiza o seu modelo AUTA (1982, 27). 192

Tabela B.1. Dimensões teóricas do Inventário de Ambiente de Equipa.488 22

488 Tabela desenvolvida por Mathisen e Einarsen (2004), a partir do estudo de Anderson e West (1996)

392
Tabela B.2. Dimensões do Modelo Tridimensional da Criatividade do Produto (Horn e Salvendy
2009, 234).

393
Anexo C: Conteúdos de Autores Referenciados no Capítulo 7

Figura C1. 1 Page Game Design Canvas (s.d.) de Nalin Sharma. 193

394

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