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Amor é um fogo que arde sem se ver;

É ferida que dói, e não se sente;


É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;


É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se e contente;
É um cuidar que ganha em se perder;

É querer estar preso por vontade;


É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor


Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
- Camões, Sonetos

“Amor é um fogo…”
Estrutura externa:
 Soneto, com versos decassilábicos: É/ fe/ri/da/ que/ dói/ e/ não/ se/ sen/te;
 O esquema rimático é ABBA/ABBA/CDC/DCD – rima emparelhada em BB, interpolada em AA e
cruzada nos tercetos (CDC/DCD);

Estrutura ideológica
 Tema: tentativa de definição do amor;
 Várias tentativas, baseadas numa relação de oposição semântica, apresentando-se duas
características contraditórias, numa estrutura idêntica em termos sintáticos, salientando-se o uso do
artigo indefinido “um”, para ilustrar o carácter indefinido do sentimento amoroso, e em recursos
expressivos como a anáfora, a metáfora – “fogo”, “ferida”, “contentamento”, “dor” – e o paradoxo –
“arde sem se ver”, “dor que desatina sem doer”, “contentamento descontente”;

Estrutura interna

 Duas partes lógicas:


 Versos 1-11: onze tentativas de definição, o que ilustra a dificuldade ou a impossibilidade de
definição cabal do conceito de amor;

2.º terceto: iniciado com a conjunção coordenativa adversativa “mas”, estabelece uma relação de
oposição com a 1.ª parte lógica, salientando a perplexidade do sujeito lírico perante a procura do
amor pelos corações humanos, sabendo estes que sofrerão.

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